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1 José Sidnei Gonçalves 2 1 - INTRODUÇÃO 1 2 A economia mundial caracteriza-se, no período recente, por dois movimentos aparente- mente contraditórios, mas que na verdade fazem parte do mesmo processo: globalização econô- mica e formação de blocos supranacionais. A globalização conduz ao enfraquecimento das políticas tradicionais dos Estados Nacionais que limitam a proliferação dos negócios e da produ- ção, gerando uma tendência de internacionaliza- ção das economias. A formação de blocos confi- gura-se como a resposta estratégica de um con- junto de nações, no sentido da integração eco- nômica, e até mesmo política, para uma inserção mais vantajosa nesse processo de globalização. De qualquer modo, ambos os movimentos con- duzem à lógica supranacional para a compreen- são das dinâmicas internas aos países, dentro das transformações da geografia mundial 3 . 1 Este trabalho representa uma discussão inicial, inserida num projeto de pesquisa mais amplo que está sendo rea- lizado pelo autor, denominado "Heterogeneidade e Com- petitividade da Agricultura Brasileira: as disparidades, os conflitos, os desafios e os corolários da inserção numa economia globalizada". A análise da competitividade rea- lizada neste trabalho baseia-se nas idéias de Michael Porter cujas premissas fundamentais associam-se à cria- ção e sustentação de um desempenho superior, tanto no universo das empresas como das nações. Essa concep- ção, que não sem razão origina-se de um profissional do marketing, coaduna-se perfeitamente com a formulação do mercado como construção histórica da sociedade e não resultado da ordem natural. Segundo esse autor são as estratégias, das empresas e das nações, que edificam o mercado ao forjarem desempenhos. O trabalho representa contudo o nível de apreensão do autor no tocante às idéias de Porter, estando, dessa maneira, longe de ser exaustivo, além de que possa conter incorreções e, para sanar essa deficiência, os interessados devem recorrer di- retamente aos originais do autor, e obter sua própria visão das idéias. 2 Engenheiro Agrônomo, Doutor, Pesquisador Científico do Instituto de Economia Agrícola. 3 O fato de crescer a importância dos determinantes supra- nacionais para o desenvolvimento econômico das diversas nações, não significa aceitar a postura liberal de que a "nação é um anacronismo" (POLANYI, 1980). Ao contrá- rio, trata-se exatamente de configurar papéis desempe- A inserção dos países nesses movi- mentos resulta da busca de criação de melhores condições para o enfrentamento dos novos desa- fios que a realidade lhes impõem, principalmente em relação à mudança de postura, rompendo com o comportamento tradicional das empresas e dos governos 4 . O estudo da competitividade e da complementaridade de produtos tem o condão de fornecer elementos importantes à formulação das políticas e das estratégias comerciais necessárias à inserção no mercado internacional. A implemen- tação e a consolidação de políticas de integração econômica entre nações ampliam o leque de in- teresses a serem orquestrados de forma a forjar a harmonia exigida por uma realidade de economi- as integradas. E o ponto detonador dessa ação relaciona-se ao conhecimento das possibilidades, fragilidades e condições favoráveis das várias economias em distintos segmentos. No caso brasileiro, trata-se de econo- mia continental por suas dimensões territoriais e produtivas, que amplia seus limites ao se integrar a outros países limítrofes com a formação do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL). Assim, a dinâmica interna está condicionada e condiciona o movimento mais abrangente do conjunto do novo espaço econômico. Por outro lado, estão in- tegrando-se nações historicamente colocadas em nhados pelos vários Estados Nacionais enquanto atores do processo de transformação, resultando em distintas possibilidades de desenvolvimento em função de im- portantes condicionantes internos. 4 Um aspecto interessante está no contraditório recrudes- cimento de movimentos nacionalistas em moldes tradicio- nais em várias partes do mundo. Afinal a internacionaliza- ção da economia confronta inúmeros dogmas nacionalis- tas que estão encrustrados no comportamento tradicional de vários governos, embora as empresas que atuam no exterior há muito tenham abandonado essa postura, pois muitas vezes agem especulativamente contra seus própri- os países de origem. Mesmo o discurso internacionalista de vários governos de países desenvolvidos está muito impregnado de conteúdos essencialmente nacionalistas, o que se reflete numa constante tensão entre os interesses dos grupos "internacionalistas" e "nacionalistas" em cada país.

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José Sidnei Gonçalves2

1 - INTRODUÇÃO 1 2

A economia mundial caracteriza-se, noperíodo recente, por dois movimentos aparente-mente contraditórios, mas que na verdade fazemparte do mesmo processo: globalização econô-mica e formação de blocos supranacionais. Aglobalização conduz ao enfraquecimento daspolíticas tradicionais dos Estados Nacionais quelimitam a proliferação dos negócios e da produ-ção, gerando uma tendência de internacionaliza-ção das economias. A formação de blocos confi-gura-se como a resposta estratégica de um con-junto de nações, no sentido da integração eco-nômica, e até mesmo política, para uma inserçãomais vantajosa nesse processo de globalização.De qualquer modo, ambos os movimentos con-duzem à lógica supranacional para a compreen-são das dinâmicas internas aos países, dentrodas transformações da geografia mundial3. 1Este trabalho representa uma discussão inicial, inseridanum projeto de pesquisa mais amplo que está sendo rea-lizado pelo autor, denominado "Heterogeneidade e Com-petitividade da Agricultura Brasileira: as disparidades,os conflitos, os desafios e os corolários da inserção numaeconomia globalizada". A análise da competitividade rea-lizada neste trabalho baseia-se nas idéias de MichaelPorter cujas premissas fundamentais associam-se à cria-ção e sustentação de um desempenho superior, tanto nouniverso das empresas como das nações. Essa concep-ção, que não sem razão origina-se de um profissional domarketing, coaduna-se perfeitamente com a formulação domercado como construção histórica da sociedade e nãoresultado da ordem natural. Segundo esse autor são asestratégias, das empresas e das nações, que edificam omercado ao forjarem desempenhos. O trabalho representacontudo o nível de apreensão do autor no tocante àsidéias de Porter, estando, dessa maneira, longe de serexaustivo, além de que possa conter incorreções e, parasanar essa deficiência, os interessados devem recorrer di-retamente aos originais do autor, e obter sua própria visãodas idéias.2Engenheiro Agrônomo, Doutor, Pesquisador Científico doInstituto de Economia Agrícola.

3O fato de crescer a importância dos determinantes supra-nacionais para o desenvolvimento econômico das diversasnações, não significa aceitar a postura liberal de que a"nação é um anacronismo" (POLANYI, 1980). Ao contrá-rio, trata-se exatamente de configurar papéis desempe-

A inserção dos países nesses movi-mentos resulta da busca de criação de melhorescondições para o enfrentamento dos novos desa-fios que a realidade lhes impõem, principalmenteem relação à mudança de postura, rompendocom o comportamento tradicional das empresas edos governos4. O estudo da competitividade e dacomplementaridade de produtos tem o condão defornecer elementos importantes à formulação daspolíticas e das estratégias comerciais necessáriasà inserção no mercado internacional. A implemen-tação e a consolidação de políticas de integraçãoeconômica entre nações ampliam o leque de in-teresses a serem orquestrados de forma a forjar aharmonia exigida por uma realidade de economi-as integradas. E o ponto detonador dessa açãorelaciona-se ao conhecimento das possibilidades,fragilidades e condições favoráveis das váriaseconomias em distintos segmentos.

No caso brasileiro, trata-se de econo-mia continental por suas dimensões territoriais eprodutivas, que amplia seus limites ao se integrara outros países limítrofes com a formação doMercado Comum do Sul (MERCOSUL). Assim, adinâmica interna está condicionada e condicionao movimento mais abrangente do conjunto donovo espaço econômico. Por outro lado, estão in-tegrando-se nações historicamente colocadas em

nhados pelos vários Estados Nacionais enquanto atoresdo processo de transformação, resultando em distintaspossibilidades de desenvolvimento em função de im-portantes condicionantes internos.

4Um aspecto interessante está no contraditório recrudes-cimento de movimentos nacionalistas em moldes tradicio-nais em várias partes do mundo. Afinal a internacionaliza-ção da economia confronta inúmeros dogmas nacionalis-tas que estão encrustrados no comportamento tradicionalde vários governos, embora as empresas que atuam noexterior há muito tenham abandonado essa postura, poismuitas vezes agem especulativamente contra seus própri-os países de origem. Mesmo o discurso internacionalistade vários governos de países desenvolvidos está muitoimpregnado de conteúdos essencialmente nacionalistas, oque se reflete numa constante tensão entre os interessesdos grupos "internacionalistas" e "nacionalistas" em cadapaís.

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©Sª« ª plano secundário nos movimentos mais gerais docapitalismo mundial circunscritos aos países de-senvolvidos do Hemisfério Norte. Esses paísesnão detêm apenas a hegemonia política, mastambém a produtiva e comercial no mercado in-ternacional sendo, no geral, tanto os principaisprodutores como os importadores e exportado-res. Portanto, ainda que as possibilidades sejamenormes nos limites do MERCOSUL, apenas aconvergência das várias potencialidades isoladasdas nações que o integram, bem como das quevierem a fazer parte do mesmo como o Chile,determinará o verdadeiro contorno das transfor-mações decorrentes desse processo. Noutras pa-lavras, a superação das dificuldades internas àconsolidação da integração econômica, enquantomercado comum, conforma apenas o inicio deum processo mais profundo. A decorrência dessecomeço, que se refletirá na busca de inserçãoconjunta no mercado mundial, exigirá políticaspúblicas concertadas que resultem num espaçoeconômico mais dinâmico.

2 - MERCADO MUNDIAL FORJANDO INTE-GRAÇÃO E COMPLEMENTARIDADE: pa-radigmas da economia clássica em ques-tão5

A análise da competitividade no mer-cado mundial, para entender a extensão do mo-vimento que lhe é inerente, exige um rompimentocom os limites estreitos da concorrência determi-nada pela teoria econômica tradicional. Aliás, opróprio entendimento dos economistas sobre oque é mercado tem se alterado com o cresci-mento da complexidade e extensão dos negócioslocais, nacionais ou internacionais. A economiamoderna reestrutura sua base conceitual que aleva a afastar-se progressivamente de pressu-postos consagrados pela economia política clas-sica, notadamente as postulações de tradição li-beral. O elemento fundamental dessa mudançarelaciona-se com o distanciamento da submissãoda teoria econômica a elementos "dados", consi-

5Não se tem a pretensão de rediscutir todo o universo daeconomia clássica no curto espaço deste item do trabalho,mas apenas destacar e discutir criticamente conceitos querelacionam-se diretamente com o tema do trabalho, qualseja análise da competitividade e complementaridade.Uma critica criteriosa da teoria econômica clássica, pelarelevância da contribuição dos seus pensadores, exigiria areleitura de um amplo conjunto de obras, o que se configu-ra como uma tarefa à parte.

derados imutáveis, neutros e resultantes da or-dem natural. A consideração desses elementostorna-se fundamental para a compreensão da di-nâmica da economia moderna.

As transformações da economia mun-dial levaram à inadequação de vários conceitosda teoria econômica clássica, destacando-se trêsdeles. O primeiro, um dos pontos centrais con-sagrados nessa formulação, corresponde à con-cepção de mercado como fruto da ordem natural,o que lhe conferiria o atributo da neutralidade. Asmudanças na economia mostram que o mercadona verdade é uma criação, continuamente recria-da, da sociedade e que assume a configuraçãodada por seu criador. Noutras palavras, o merca-do reflete as condições históricas sob as quais foiconstruído assumindo conformações distintas emcada tempo e lugar. Desse modo, países e em-presas não têm uma posição passiva, mas sãoconstrutores do mercado na dimensão de suasações produtivas e comerciais. POLANYI (1980)mostra o mercado nacional forjado pelo EstadoNacional nascente na passagem do feudalismopara o capitalismo e o mercado mundial comoproduto da expansão e consolidação da hege-monia inglesa no século XIX. Essa presença bri-tânica foi superada no século XX pela norte-americana que nos anos mais recentes tem sidoquestionada. Mas, em todos os tempos, o mer-cado internacional foi constituído à semelhançada imagem a ele determinada por nações hege-mônicas e grandes empresas comerciais6.

O segundo conceito integrante da eco-nomia clássica, e que não encontra adequação àrealidade atual, é a Lei dos Mercados de Say7. 6Uma discussão detalhada dos aspectos acima descritospode ser encontrada em GONÇALVES; MARTIN (1994).Numa abordagem histórica esse trabalho mostra a evolu-ção e transformação do comércio internacional desde aslutas coloniais que levaram à supremacia da Inglaterra esuas empresas, passando pela hegemonia norte-america-na no ciclo virtuoso posterior à II Guerra Mundial, até asrecentes alterações na institucionalidade regulatória com ofim das cláusulas econômicas dos acordos multilaterais deprodutos básicos e formação dos blocos econômicos.

7Formulada originalmente por Jean Baptiste Say (SAY, 1983),discípulo francês de Adam Smith, essa concepção foi incorpo-rada à teoria ricardiana de mercado e difundida por toda aeconomia no século XIX (RICARDO, 1983). À época Marx(1983) escreveria que se tratava de uma concepção infantil deum Say e indigna de um Ricardo. Apesar disso ela continuousendo admitida e disseminada por economistas, especial-mente neoclássicos, mesmo com os abalos da grande de-pressão do final do século XIX e outros acontecimentos queabalavam sua consistência à realidade. A crítica teórica maiscontundente foi realizada por Keynes (1983) com a teoria dademanda efetiva nos anos 30s do século XX.

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Ú ÍÕÖÒÑ¥ÊÚ ×ÙÑ Ï�ÒØ ÛØ ÊÜ¥ÒØ Ï�ÝÒÑ¥ÊDifundida com base na frase síntese de que "toda

oferta cria sua própria demanda" essa concepçãode mercado também atribui um papel passivo dasempresas e dos Estados Nacionais, pois bastariaproduzir que a venda estaria garantida, inexistin-do problemas de superprodução e de qualidade.Isso contradiz a capacidade dos países e dasempresas de romperem com obstáculos de dis-tintas ordens para constituírem mercados paraseus produtos com estratégias diversas. Por ou-tro lado, as condições do mercado internacional,cada vez mais exigente em qualidade e sujeito àconcorrência por diferenciação de produtos, tor-nam inapropriadas posturas passivas. Ademais adiferenciação de produtos procura a maior ade-quação possível às preferências dos consumido-res, conformando progressivamente economiasde demanda em substituição às economias deoferta, colocando os gostos do cliente como pré-requisito importante da produção.

O terceiro elemento a ser destacado éa teoria das vantagens comparativas, integranteprincipalmente da acepção ricardiana da econo-mia clássica. Nessa concepção as nações tende-riam a concentrar esforços na produção de mer-cadorias para as quais tivessem recursos abun-dantes forjando uma divisão internacional do tra-balho baseada na especialização produtiva, ouseja, cada qual eficiente na produção daquilo quetivesse vantagens comparativas8. Com recursosnaturais abundantes e mão-de-obra barata, a agri-cultura dos países latino-americanos possuiriacondições favorecedoras de desenvolvimento enuma situação de mercado aberto isso produziriaa expansão econômica. Entretanto, essas van-tagens comparativas valeram muito pouco, pois,em inúmeros produtos agrícolas, outras nações,partindo de condições mais adversas, forjaramparticipações no mercado mundial muito maissignificativas e consolidadas. Noutras palavras, asvantagens de recursos naturais e mão-de-obranão representam nada se não forem mobilizadaspela estruturação de atributos de competitividadecapazes de criar e manter mercados.

As transformações econômicas repre-sentando uma constante recriação do mercado,

8Nas próprias palavras de Ricardo (1983), "num sistemacomercial perfeitamente livre, cada país naturalmente de-dica seu capital e seu trabalho à atividade que lhe sejamais benéfica... Este é o princípio que determina que ovinho seja produzido na França e em Portugal, que o trigoseja cultivado na América e na Polônia e que as ferra-mentas e outros bens sejam manufaturados na Inglaterra".

de modo paradoxal, mas não contraditório, pro-vocam a crescente introdução do consumidorcomo personagem central nas tomadas de deci-sões econômicas. Não sem outra razão, poisdesde os anos 30s a economia keynesiana jáprivilegiava as decisões de gasto, notadamentede investimento, como mola propulsora da eco-nomia (KEYNES, 1983). Entretanto, as estraté-gias das empresas procuram, cada vez mais, "personalizar" produtos e atendimentos para ex-plorar ao limite essa preferência do consumidor.Nesse universo, a idéia de competitividade confi-gura-se como elemento central das reflexões so-bre as estruturas de mercados e formação depreços.

O conceito de competitividade não temuma definição muito precisa, ou seja, tem sidoutilizado com mais de um significado por diversosautores9. No decorrer deste trabalho será utiliza-do, por simplificação, a definição de que "a com-petitividade é a capacidade de uma empresaou unidade produtiva (ou de um setor ou deum país) de manter e incrementar de maneirasustentada no tempo sua cota em um deter-minado mercado" (PAOLINO, 1994). Trata-sedesde logo de um conceito relativo, ou seja, acompetitividade de um país só pode ser tomadaem relação aos demais competidores num mer-cado específico. Essa especificidade pode serdeterminada, com distintos graus de competitivi-dade das nações estudadas, em relação a mer-cado interno sujeito à abertura a produtos de ou-tros países, mercados integrados dos blocos eco-nômicos, como o MERCOSUL, e em relação aomercado mundial como um todo (PAOLINO,1994). Essas três perspectivas devem estar sem-pre presentes para deixar claro em relação a queestá se afirmando a existência ou não de compe-titividade de um complexo produtivo.

Outro aspecto dessa definição de com-petitividade está relacionado com seu sentido di-nâmico. Dessa maneira, confronta não apenas aidéia das empresas como agentes passivos nosmercados, mas também o pensamento governa-

9Muller (1994) apresenta uma discussão a respeito decompetitividade e concorrência, mostrando que os con-ceitos não são intercambiáveis não podendo, dessa ma-neira, ser utilizados como se tratassem de sinônimos. Poroutro lado, sustenta a idéia de que na verdade conta-secom um mapa de competitividade, um caleidoscópio, enão com um determinado conceito de validade geral. Parao exame de problemas particulares, deve-se elaborar oconceito adequado.

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apenas as vantagens comparativas. Nessa visão,como a especialização de cada país, que ocorrecomo resultado da ordem natural, não há sentidoem falar em competitividade. Entretanto, o mer-cado mundial mostra continuamente as empre-sas e as nações forjando mercado para seusprodutos com a construção de vantagens compe-titivas, mesmo onde as vantagens comparativassejam frágeis. Portanto, esse desempenho derivadas estratégias definidas pelas empresas e na-ções e das capacidades acumuladas pelos agen-tes produtivos da suas agriculturas.

No desenho dessas estratégias, certa-mente o poder geopolítico de cada nação e dassuas empresas, em dados espaços econômicosconfigura-se como essencial. Dessa maneira,ainda que a análise determine níveis reduzidosde competitividade em determinado tempo e lu-gar para um complexo produtivo, um aspecto fun-damental para a construção de propostas de po-líticas públicas está na determinação de qual acapacidade de cada Estado Nacional de executarexitosamente o conjunto de medidas sugerido.Noutras palavras, a capacidade de dada naçãode forjar vantagens competitivas para suas em-presas em dado espaço econômico define osdesdobramentos e os procedimentos a seremadotados10.

A busca de fortalecimento de suas po-sições competitivas no mercado mundial está nabase da formação de blocos supranacionais,pois, se integradamente a competitividade eco-nômica das nações de um bloco pode ser signifi-catimente maior que cada uma delas isoladamen-te. Trata-se de promover a interação das vanta-gens competitivas e da capacidade de forjá-lasexplorando a complementaridade dentro dos vá-rios complexos produtivos. Isso não apenas pelaconjunção da capacidade produtiva e comercial,mas principalmente pela união de poder geopolí-tico. A integração, por outro lado, amplia a possi-bilidades das complementaridades dentro do

10Mais uma vez cabe um alerta da impropriedade da for-mulação liberal pela qual, no mercado internacional resul-tante da ordem natural que determina vantagens compa-rativas, não faz sentido distinguir nações (POLANYI,1980). Por esse raciocínio, a análise econômica igualariapara todos os fins a Inglaterra à Guatemala, os EstadosUnidos à Trinidad-Tobago, quando na verdade o podergeopolítico dessas nações são significativamente diferen-tes e com isso suas respectivas capacidades de forjaremvantagens competitivas.

novo espaço econômico, mais amplo que os dasnações isoladas. Dessa maneira, se os objetivostranscendem os limites do bloco supranacional,também dentro do mercado comum aumentamas interações de forças de dinamismo. A compe-titividade dos complexos produtivos depende, as-sim, do nível de integração e de complementari-dade dos complexos produtivos do novo espaçoeconômico mais amplo.

3 - COMPETITIVIDADE DE EMPRESAS E NA-ÇÕES: premissas básicas da teoria dePorter11

A formulação de Porter tem como ca-raterística fundamental o entendimento de que asempresas (e nações) tem papel ativo na constru-ção dos mercados e se, por um lado, atendem ainteresses dos consumidores, por outro, procu-ram despertar nesses seus compradores prefe-rência por seus produtos. A atuação das empre-sas (e nações) realiza-se com a base em estra-tégias sustentadas por uma visão global do pro-cesso econômico e social, tendo com predicado,ao mesmo tempo que é influenciada pelo geral, acapacidade de intervir e modificar esse geral.Rompe-se portanto com a lógica teórica tradicio-nal, dentro da qual as empresas (e nações) sãomeros receptáculos das transformações, não ten-do como responder e romper com o destino aoqual inexoravelmente estão submetidas. Por essacondição da teoria de Porter, de que as empre-sas (e nações) não tomam simplesmente medi-das reflexas do movimento mais amplo é que sepode pensar em estratégias de inserção e modifi-cação do curso desse movimento.

3.1 - Criação de Vantagem Competitiva nasEmpresas

No livro "Estratégia Competitiva", da-tado de 1980, Porter desenvolve as premissas daanálise da indústria e da concorrência. Para o

11Este item apresenta uma resenha literal dessas premis-sas, utilizando como textos básicos a trilogia: "EstratégiaCompetitiva" (PORTER, 1986) "Vantagem Competitiva"(PORTER, 1989) e "A Vantagem CompetitIva das Nações"(PORTER, 1993). Maiores aprofundamentos exigem, ne-cessariamente, a leitura dos originais em que os elemen-tos aqui destacados são tratados com grande profundida-de argumentativa.

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autor "a estratégia competitiva é a busca de umaposição competitiva favorável em uma indústria, aarena fundamental onde ocorre a concorrência. Aestratégia competitiva visa estabelecer uma posi-ção lucrativa e sustentável contra as forças quedeterminam a concorrência na indústria" (POR-TER, 1986). Assim, a concorrência correspondeà estrutura de mercado de um setor produtivo, ecompetitividade à possibilidade de um empresa,frente às demais, de atuar lucrativamente dentrodesse mercado. Desde logo, por essa definição,concorrência e competitividade não são conceitosintercambiáveis e, assim, não podem ser utiliza-dos como sinônimos, pois competitivo é caracte-rística da empresa e concorrencial da indústria.Assim, o empresário para promover o cresci-mento da firma pode compor, com estratégiasconsistentes, boa posição competitiva para suaempresa.

A escolha da estratégia competitiva de-ve levar em conta dois aspectos centrais: a) atra-titividade da indústria em rentabilidade de longoprazo e b) determinantes da competitividade den-tro de uma indústria. Esses elementos não po-dem, contudo, serem tomados isoladamente edescontextualizados, pois existem indústrias atra-tivas nas quais estratégias erradas provocam ofracasso de empresas e indústrias pouco atrati-vas nas quais estratégias consistentes podemlevar uma empresa ao sucesso. Além disso, es-sas condições são dinâmicas uma vez que aatratividade da indústria e a posição competitivada empresa podem sofrer modificação, a primeirapor alterações estruturais da economia e a se-gunda como resultado de uma ininterrupta bata-lha entre concorrentes. A empresa como agentedesse processo pode alterar tanto sua posiçãocompetitiva como interferir decisivamente na pró-pria atratividade da indústria (PORTER, 1986).

A relevância da análise da estrutura in-dustrial está na compreensão ampla das regrasde concorrência que configuram a atratividade daindústria com o objetivo de promover mudançasnas mesmas para favorecer a empresa. Essasregras, em qualquer indústria, podem ser resumi-das em cinco forças competitivas: a) entrada denovos concorrentes, b) ameaça dos substitutos,c) poder de negociação dos compradores, d) po-der de negociação dos fornecedorese e e) rivali-dade entre os concorrentes existentes. Essas for-ças determinantes da rentabilidade da indústriainfluenciam os preços, os custos e os investi-

mentos que são efeitos e não causas do proces-so. Da mesma maneira, a rentabilidade da indús-tria não deriva do seu padrão tecnológico ou dotipo de produto, mas sim da estrutura industrial.As estratégias levam em conta, fundamentalmen-te, as tendências que têm o condão de alterar aestrutura industrial. Ao modelar a estrutura indus-trial a empresa pode estar modificando a atrativi-dade da indústria para pior ou melhor e com issoas regras de concorrência dessa mesma indústria(PORTER, 1986).

A busca de alterar as regras de concor-rência a seu favor leva as empresas a procurardescobrir inovações estratégicas capazes de as-segurar esse objetivo. Ao terem a possibilidadede modelar a estrutura industrial, as empresaslíderes têm um papel especial, pois podem pro-vocar impactos desproporcionais sobre essa es-trutura. Noutro aspecto, a empresa não está so-zinha nessa indústria e as concorrentes podemreagir com estratégias mais eficazes ou até mes-mo atuarem como destruidoras da estrutura daindústria para superarem desvantagens competi-tivas. Isso porque a empresa não pode definir suaestratégica sem levar em conta vários cenáriosde resposta dos concorrentes, pois uma dadaestratégia na interação na concorrência pode re-sultar em efeitos indesejáveis, destruindo a ren-tabilidade com a mesma facilidade que procuravamelhorá-la (PORTER, 1986).

A rentabilidade de uma empresa dentrode uma indústria, se ela está abaixo ou acima damédia, tem como base fundamental a vantagemcompetitiva sustentável. Essas vantagens com-petitivas originam-se da estrutura indústrial e po-dem ser de custos ou diferenciação. A combina-ção desses tipos configura 3 estratégias genéri-cas para constituir desempenhos superiores: li-derança de custo, de diferenciação ou de enfo-que, sendo que esta última pode ser enfoque nocusto ou enfoque na diferenciação. A empresadeve escolher o tipo de vantagem competitiva as-sociada ao escopo do alvo estratégico em queela será concretizada. As estratégias calcadas nocusto e na diferenciação buscam concretizar van-tagens competitivas em segmentos industriaisamplos, enquanto a de enfoque, em segmentosrestritos12 (PORTER, 1986).

12É importante destacar que as empresas devem definircom clareza sua estratégia genérica, pois fazer de tudopara todos resulta numa mediocridade estratégica que nãoproduz vantagem competitiva sustentável.

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presa utiliza fontes de vantagens inerentes àestrutura industrial como economia de escala,tecnologia patenteada, acesso privilegiado a ma-térias-primas, dentre outras. O objetivo é operarcom o mais baixo custo na sua indústria para umescopo amplo, atuando em muitos segmentos damesma indústria e até mesmo em indústrias cor-relatas. Por sua vez, ao optar pela liderança pordiferenciação a empresa procura ser a única nasua indústria com capacidade de atender a atri-butos do produto amplamente valorados peloscompradores13, obtendo como recompensa umpreço-prêmio. A base dessa diferenciação podeestar assentada no próprio produto, sistema deentrega, marketing entre outros fatores. Já a li-derança por enfoque caracteriza-se por buscarposição competitiva num escopo estreito dentroda indústria. A estratégia é definida para um seg-mento alvo seja por meio de custo ou de diferen-ciação. O enfocador busca vantagem competitivanesse "nicho de mercado", embora não possuavantagem competitiva geral na indústria (POR-TER, 1986).

A estratégia genérica, para concretizara obtenção de desempenho acima da média, de-ve ser sustentável frente aos concorrentes, o queexige a constituição de barreiras, continuamenterenovadas, para dificultar a imitação da estraté-gia. Por outro lado, cada estratégia genérica im-plica qualificações e exigências diferentes que setraduzem em diferenças na cultura e na estruturaorganizacional. A liderança nos custos exige con-trole rígido, minimização de despesas indiretas,busca de economias de escala que poderiam sertotalmente contraproducentes numa empresaque busca diferenciar-se, o que torna necessárioambiente criativo. Além disso, essa mesma es-tratégia genérica constitui a peça central do pla-nejamento estratégico da empresa, que não podeser uma relação de ações para distintos cenários,sem ter clara a vantagem competitiva que seprocura conseguir (PORTER, 1986).

13É fundamental estabelecer o que Porter entende porvalor para se evitar confusão com o teor clássico da teoriaeconômica para esse conceito. Em termos da competitivi-dade, valor é o montante que os compradores estão dis-postos a pagar por aquilo que uma empresa lhes oferece,sendo medido pela receita total; assim uma empresarentável é aquela em que o valor ultrapassa os custos, e éo valor, e não os custos, que devem ser analisados, poisempresas elevam custos para obter preço-prêmio na di-ferenciação (PORTER, 1989).

Em seqüência ao desenvolvimento desua formulação, no livro "Vantagem Competiti-va", datado de 1985, Porter procura desenvolvera maneira pela qual uma empresa pode escolhere implementar uma estratégia genérica a fim deobter e sustentar uma vantagem competitiva. Issoporque "o fracasso das estratégias de muitas em-presas deve-se à incapacidade de traduzir umaestratégia competitiva geral em etapas e açãoespecíficas necessárias para se obter vantagemcompetitiva" (PORTER, 1989). Para isso a em-presa deve criar valores para seus compradoresna forma de preços inferiores aos concorrentespara produtos similares ou produtos diferenciadosde tal forma que estimulem esse comprador apagar um ágio de preço por esse diferencial dequalidade.

A construção da estratégia capaz deconfigurar uma vantagem competitiva exige umaprofundamento interno à empresa dos condicio-nantes desse objetivo, com o uso da cadeia devalores para esse diagnóstico. Essa cadeia, quenada mais é que entender as importâncias dasvárias fases dentro do processo produtivo e comisso o potencial de redução de custos e de dife-renciação, permite desagregar as várias ativida-des estrategicamente sustentadoras das vanta-gens competitivas identificando os elos vitais parasua concretização. Associa-se a isso a idéia doescopo competitivo, ou seja, o alvo para o qualserá direcionado o esforço estratégico, ou me-lhor, a estrutura de mercado na qual a firma con-corre, de forma que a identificação dos elos fun-damentais realiza-se direcionado para esse alvoe, com isso, para aumento da eficiência, pode-seelencar atividades dentro da cadeia que pode-riam ser terceirizadas e realizadas melhor poracordo com outras firmas fornecedoras especiali-zadas e mais eficientes. Assim, a cadeia de valo-res pode definir o projeto de estrutura organizaci-onal da empresa e, embora ela varie segundocompradores, regiões, linhas de produtos e ca-nais de distribuição, pode ser compreendida notodo da unidade empresarial (PORTER, 1989).

A concretização de vantagens compe-titivas de custo para ser obtida exige procedimen-tos que levem a empresa à liderança nesse as-pecto. O custo também é importante para o dife-renciador que deve mantê-lo próximo à concor-rência de forma que o preço-prêmio recebidocompense o custo da diferenciação. A ausênciade uma metodologia sistemática para análise de

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custos na maioria das empresas está na basedos problemas, pois a maior parte dos estudosde custos aborda questões restritas adotandouma ótica de curto prazo, de corte no tempo, nãopossibilitando análises de fluxos. O desempenhodos custos em cada uma das atividades distintasda empresa acumula-se para formar a posiçãodos custos relativos. Portanto, é fundamental de-sagregar a estrutura de custos para o entendi-mento dos movimentos mais importantes possí-veis dentro da empresa (PORTER, 1989).

A análise de custos provém das ativida-des de valor, entendidas como aquelas embasa-doras da competitividade, e não dos custos daempresa como um todo, pois cada atividade devalor tem sua própria estrutura de custos, e ocomportamento de seu custo pode ser afetadopor elos e inter-relações com outras atividadesdentro e fora da empresa. O referencial paraanálise do custo não deve ser sua evolução histó-rica dentro da empresa, mas sua comparaçãocom o custo da concorrência e como a posiçãorelativa evolui no tempo. Isso porque a vantagemde custo resulta de o custo cumulativo da execu-ção das atividades de valor de uma empresa sermais baixo que o da concorrência. A desagrega-ção da cadeia de valores genéricos em atividadesde valor individuais deve refletir três principaiselementos que não são mutuamente exclusivos:a) o volume e o crescimento do custo representa-do pela atividade, b) o comportamento do custoda atividade e c) diferenças entre concorrentes naexecução da atividade (PORTER, 1989). A análise dos custos deve distinguiratividades de custos menores, porém crescentes,que podem vir a afetar a estrutura de custos no fu-turo, e atividades compartilhadas com outras em-presas (fornecedores) que podem vir a afetar ocomportamento dos custos, o mesmo ocorrendoem atividades em que a concorrência realiza demaneira diferente. O tempo escolhido para atribuircustos e ativos a atividades de valor deve reconhe-cer as flutuações sazonais ou ciclos (ou períodos)de interrupção que afetariam os custos. A compo-sição de custos em diferentes pontos no tempopode ajudar a esclarecer o efeito das mudançasde estratégia bem como a diagnosticar o própriocomportamento dos custos (PORTER, 1989).

A posição dos custos resulta do com-portamento dos custos de suas atividades de valorque reflete fatores estruturais denominados con-dutores de custos. O diagnóstico dos condutores

de custos de cada atividade de valor permite queuma empresa obtenha um entendimento sofistica-do das fontes de posição dos custos relativos e domodo como ela poderia ser modificada. Os dezprincipais condutores são: economias de escala14,aprendizagem, padrão de utilização da capacida-de, elos, inter-relações, integração, momento opor-tuno, políticas discricionárias, localização e fatoresinstitucionais. Esses condutores interagem paradeterminar o comportamento do custo e o impactorelativo dos mesmos é distinto entre atividades devalor (PORTER, 1989).

A análise estratégica de custos tem co-mo etapas necessárias: a) identificação da cadeiade valores apropriada e atribuir-lhe custos e ati-vos, b) diagnóstico dos condutores de custos decada atividade de valor e o modo como intera-gem, c) identificação das cadeias de valores dosconcorrentes e das fontes de diferenças de cus-tos, d) desenvolvimento de estratégia de reduçãoda posição de custos relativos por meio do con-trole dos condutores de custos ou da reconfigura-ção da cadeia de valores, e) verificar se os esfor-ços de redução dos custo não acabem com adiferenciação, ou fazer uma opção consciente derealizar essa tarefa e f) teste da estratégia deredução de custos com relação à sustentabilida-de (PORTER, 1989).

A procura de constituição de vantagemcompetitiva por diferenciação significa ofereceraos compradores um produto singular em relaçãoà concorrência a um preço compatível. Apesardessa importância, suas fontes nem sempre sãoentendidas dada uma visão limitada dessa ca-racterística fixando-se nas práticas de marketinge do produto físico ao invés de buscarem com-preendê-las na cadeia de valores. Para isso,necessita-se entender que qualquer atividade devalor pode ser fonte de singularidade afetando oproduto final e com isso a diferenciação. Ativida-des de valor que pesam pouco no custo total po-dem ter grande impacto diferenciador, bem comoa amplitude do escopo competitivo de uma em-presa pode elevar sua reputação e permitir queseus canais de venda ofereçam variedade de

14Economia de escala não é a utilização de capacidade,pois aumentar a utilização da capacidade espalha oscustos fixos por um volume maior de produtos, mas nãonecessariamente isso produz economia de escala, porexemplo, gerar deseconomias de escala nos fornecedoresde matérias-primas. A maior capacidade face à maiorcomplexidade e a custos de coordenação superiores poderesultar em deseconomias de escala.

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ção15 (PORTER,1989).A singularidade obtida numa cadeia de

valor provém de condutores, razões que criamum produto singular. Os principais condutores desingularidade são: a) escolhas de políticas pelasempresas na seleção de atividades e como reali-zá-las, b) elos dentro da cadeia de valores, sejainterno à empresa ou elos com fornecedores ouelos com canais de distribuição, c) oportunidadeem que a singularidade resulta do momento emque a empresa começa na atividade, d) localiza-ção que pode representar valor de proximidadedo comprador, e) inter-relações nas quais a sin-gularidade pode resultar do compartilhamentocom unidades empresariais irmãs, f) aprendiza-gem e vazamento, significando a capacidade deproduzir melhor pelo aperfeiçoamento de proces-sos e condições de evitar que os concorrentescopiem esse processo para configurar diferencia-ção sustentável, g) integração, pois a atuação emnovas atividades de valor pode tornar a empresasingular pelo desempenho e coordenação da ca-deia de valores, h) escala, pois existem ativida-des em que a singularidade torna-se impossívelem volumes menores, i) fatores institucionais quepodem resultar em singularidade, como a relaçãocom sindicatos de trabalhadores, permitindo defi-nições especiais das tarefas dos operários (POR-TER, 1989).

O mapa de condutores de singularidadede uma empresa permitem-na verificar em cadauma das suas áreas de singularidade, os conduto-res que a fundamentam, o que configura-se comoimportante para sustentar a diferenciação poisexistem condutores que oferecem mais sus-tentabilidade que outros. Por exemplo, pode sermais fácil a concorrência imitar escolhas de políti-cas do que singularidades de exploração de elos.Além disso, a diferenciação sustentável normal-mente exige maior dispêndio, pois o custo da sin-gularidade não é nulo nem desprezível. Por outrolado, algumas formas de diferenciação são maisdispendiosas que outras, visto que o custo dadiferenciação reflete os condutores dos custos

15Os canais podem se configurar numa fonte potente desingularidade, melhorando reputação, serviço, treinamentodo cliente e diversas outras fontes. As empresas normal-mente confundem qualidade com diferenciação, pois em-bora diferenciação envolva qualidade, tem o sentido maisamplo. Qualidade refere-se ao produto físico e diferencia-ção significa o conjunto de valores criados para o compra-dor em toda cadeia de valores.

das atividades de valor que sustentam a singulari-dade. Ao buscar diferenciação a empresa afeta oscondutores de custos de maneira adversa, acres-centando custos e, assim, os condutores de cus-tos têm papel importante na determinação dossucessos da estratégia de diferenciação (POR-TER, 1989).

A singularidade não resulta em diferen-ciação a não ser que o comprador lhe confira valorque justifique um preço-prêmio, que pode ser rea-lizado por redução dos custo do comprador ou ele-vação de seu desempenho. O valor criado pelaempresa para seu comprador é determinado peloconjunto de elos entre as cadeias de valores daempresa e a cadeia de valores de seu compradorque, normalmente, não se relaciona apenas com oproduto em si, mas também com o conjunto deatividades que lhe são inerentes como o sistemalogístico. A empresa precisa então conhecer acadeia de valores do comprador para intervir nelae principalmente entender que o relevante não écomo o produto foi planejado para ser usado, massim com realmente o comprador o utiliza comu-mentemente. O nível geral de diferenciação é cu-mulativo da singularidade para o comprador emtoda sua cadeia de valores (PORTER, 1989).

Por outro lado, não basta criar uma sin-gularidade de valor para o comprador se ele nãopercebe esse aspecto. Produtos de valor real me-nor, porém largamente percebidos, podem sermais competitivos que outros de valor real maior,porém, impercebidos. Outro aspecto relevante es-tá na identificação do comprador real. O tomadorda decisão de gasto pode não ser quem pagapelo produto (o médico e não o paciente escolheo remédio) e pode não ser o usuário (o agente decompras escolhe o produto usado na fábrica).Esse comprador real deve ser o objetivo no senti-do da disseminação dos valores advindos dasingularidade de um produto da empresa. Paraisso deve-se levar em conta os critérios de com-pra que são de dois tipos: a) de uso, referente àredução de custo ou elevação do desempenho docomprador, b) de sinalização, decorrente dosmeios utilizados pelo comprador para julgar qual ovalor real do seu fornecedor (PORTER, 1989).

Desse modo, as etapas a serem segui-das numa estratégia de diferenciação são: a) de-terminação do verdadeiro comprador, b) identifi-cação da cadeia de valores do comprador e o im-pacto da empresa sobre ela, c) conhecimentodos critérios de compra do comprador, d) avalia-

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ção das fontes existentes e potenciais de singula-ridade na cadeia de valores de uma empresa,e) identificação do custo das fontes de diferencia-ção existentes e potenciais, f) escolha da configu-ração de atividades de valor que crie a diferen-ciação mais valiosa para o comprador em relaçãoao custo de diferenciação, g) teste da estratégiade diferenciação escolhida quanto à sua susten-tabilidade e h) redução de custos nas atividadesque não afetem as formas de diferenciação es-colhidas (PORTER, 1989).

3.2 - Criação de Vantagem Competitiva dasNações

Desse universo calcado essencialmentena empresa, no livro "A Vantagem Competitivadas Nações" datado de 1993, Porter, com "a forteconvicção de que o panorama nacional tem papelcentral no êxito competitivo das empresas ... (pois)... alguns ambientes nacionais parecem mais esti-mulantes ao avanço e progresso que outros ...(resolveu contribuir) ... para o entendimento davantagem competitiva das nações ou dos atributosnacionais que estimulam a vantagem competitivaem determinadas indústrias, bem como das impli-cações tanto para empresas como para governos"(PORTER, 1993). Assim, o país influi na capaci-dade de suas firmas em concretizarem vantagenscompetitivas em dada indústria, e a interação entreas várias indústrias configura as condições deavanço e progresso das economias nacionais.

A questão central está em entenderporque uma nação com freqüência sedia distintasempresas líderes mundiais de uma indústria. Nãoexiste nação cujas empresas são competitivasem todas as indústrias, embora existam naçõescom muitas empresas competitivas. Recursos na-turais e mão-de-obra barata não sustentam van-tagens competitivas, pois países pobres em re-cursos naturais como Japão, Alemanha e Coréiatornaram-se competitivos, e nações de baixos sa-lários como México e Índia não se configuram co-mo modelos atraentes. A principal meta econô-mica de um país é produzir um padrão de vidaelevado e ascendente para seus cidadãos. A ca-pacidade de conseguir isso depende não da idéiaamorfa de competitividade mas da produtividadecom a qual os recursos nacionais (trabalho e ca-pital) são empregados. O único conceito signifi-cativo de competitividade é a produtividade nacio-

nal para obter altos salários e preços elevadosnos mercados internacionais (PORTER, 1993).

A nação pode especializar-se em indús-trias e segmentos mais produtivos e importar pro-dutos e serviços das rivais estrangeiras, no con-junto ela eleva a produtividade média da econo-mia. A competição internacional melhora a produ-tividade com o tempo, significando que algunssegmentos e indústrias perderão espaço para quea indústria nacional progrida. Assim, o emprego desubsídios, proteção ou outra forma de intervençãopara manter indústria reduzem o aperfeiçoamentoda economia e limitam o padrão de vida dos paí-ses16. O importante está na compreensão dos de-terminantes da produtividade e o ritmo de cresci-mento da mesma e não apenas na existência defatores de produção favoráveis ao desenvolvimen-to que pode não ocorrer se os fatores não foremmobilizados e aperfeiçoados (PORTER, 1993).

Grande parte das nações do comérciointernacional ocorre entre países avançados, comdotação de fatores semelhantes, isso torna a teo-ria das vantagens comparativas dos fatores insu-ficiente para explicar a realidade mundial. A tec-nologia deu às empresas capacidade de com-pensar fatores escassos por meio de novos pro-dutos e processos neutralizando ou reduzindocom isso a importância de fatores outrora prepon-derantes. Desse modo, o acesso a fatores abun-dantes tornou-se menos relevante que a tecnolo-gia e os conhecimentos para processá-los deforma efetiva e eficiente. A vantagem competitivaque repousa sobre os custos dos fatores é vulne-rável até mesmo a custos de fatores menores emalgum outro país ou a governos dispostos a sub-sidiá-los. Quase todas as exportações dos paísesmenos desenvolvidos estão ligadas a custos dosfatores e a competir no preço, e os programas de

16Segundo Porter a deformação governamental é predo-minante em indústrias como a agricultura. Entretanto, esseproblema torna-se crônico à medida que as duas agricultu-ras líderes no mercado mundial, representada pela dosEstados Unidos e União Européia (UE), praticam intensossubsídios e nada indica que os mesmos irão retroceder aníveis inferiores, tendo sido chancelados pela RodadaUruguai do General Agreement of Trade and Tarifs(GATT), com a manutenção dos vários mecanismos deproteção das agriculturas locais (FONSECA; BUAINAIN,1995). Por outro lado, a economia japonesa, extrema-mente protegida por vários mecanismos, conforma umexemplo de sucesso na indústria (TORRES FILHO, 1991).A questão central é a capacidade de cada país em or-questrar condições de criação de vantagens competitivas,no que políticas governamentais são importantes inclusiveas de proteção.

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C A desenvolvimento costumam ter como alvo novasindústrias com vantagens calcadas nos custos defatores. Entretanto, a questão mais relevante écomo empresas melhoram a qualidade dos fato-res, aumentam a produtividade dos mesmos ecriam novos (PORTER, 1993).

As condições de inserção de cada na-ção estão relacionadas com a estrutura da indús-tria que conforma-se como relevante para a com-petição internacional, pois: a) cria exigências parao acesso em diferentes indústrias, b) indústrias im-portantes para um padrão de vida elevado são es-truturalmente atraentes e c) a modificação estrutu-ral cria oportunidades autênticas para que os com-petidores entrem em novas indústrias. Nas indús-trias em geral há grande variedade de produtos,multiplos canais de distribuição e vários tipos deconsumidores, daí a necessidade de escolha pelaempresa do âmbito competitivo, ou seja, a exten-são de seu alvo dentro da indústria. Por outro lado,a vantagem competitiva, tanto de custo como dediferenciação, traduz-se em produtividades supe-riores frente aos concorrentes, mas qualquer queseja a estratégia, para ser bem-sucedida, deveatentar a ambos os tipos sem deixar de manter asuperioridade num deles (PORTER, 1993).

As empresas criam vantagem competi-tiva percebendo ou descobrindo maneiras novasou melhores de competir numa indústria levando-as aos mercados. Isso constitui o ato de inovaçãodefinido numa concepção ampla, tanto de melho-rias na tecnologia como melhores métodos oumaneiras de fazer as coisas. Nos mercados in-ternacionais, as inovações que proporcionamvantagem competitiva antecipam as necessida-des, tanto internas como externas. Por outro lado,as inovações que respondem a preocupações oucircunstâncias peculiares ao mercado interno po-dem retardar o sucesso competitivo. As causasmais típicas das inovações que influem na vanta-gem competitiva são: a) novas tecnologias quepodem criar novas possibilidades para o produtoem termos de como é produzido, comercializadoe distribuído, b) necessidades novas ou renova-das de compradores que alteram sua cadeia devalores, c) aparecimento de novo segmento naindústria ou nova maneira de agrupar as existen-tes e d) mudança significativa nos custos abso-lutos ou relativos de insumos como mão-de-obra,matérias-primas, energia, transporte, comunica-ções, mídia ou maquinaria (PORTER, 1993).

As empresas que agem primeiro na res-

posta a essas oportunidades de inovação têmmelhores condições de firmar vantagens competi-tivas. A empresa que busca manter ou ampliar suaposição competitiva deve perseguir sempre apercepção da inovação e, uma vez obtidas, trans-formá-las em vantagens competitivas sustentáveis.Vantagens de ordem inferior, como baixo custo damão-de-obra e matérias-primas baratas, são fáceisde imitar e de serem superadas. As vantagens deordem superior, mais duráveis, são tecnologias deprocessos, de diferenciação, reputação da marcaou relações protegidas com clientes e exigeminvestimento, tempo, conhecimentos e capacida-des avançadas, pessoal especializado e bem-treinado, além de relações estreitas com os princi-pais clientes (PORTER, 1993).

Os determinantes da vantagem nacionalsão: a) condições de fatores como trabalho es-pecializado ou infra-estrutura, b) condições da de-manda, c) indústrias correlatas e de apoio e d) es-tratégia, estrutura e rivalidade das empresas. Oefeito de um determinante é dependente do esta-do dos outros e, assim, a interação do conjunto dedeterminantes é que conforma resultante vanta-gem competitiva de cada nação. Duas variáveisadicionais podem influenciar o sistema nacional demaneira importante que são o acaso e o Governo.O acaso decorre de acontecimentos fora de con-trole que modificam a estrutura da indústria, permi-tindo que indústrias de um país superem as deoutro. Por seu lado, o Governo pode melhorar oupiorar a vantagem nacional (PORTER, 1993).

No tocante às cond ições dos fatores,os mais importantes para a vantagem competitivana maioria das indústrias, especialmente as indús-trias mais vitais ao crescimento da produtividadenas economias adiantadas, não são herdados,mas criados dentro do país, por meio de pro-cessos que diferem muito entre países e entre in-dústrias. Os principais fatores são recursos: huma-nos, físicos, de conhecimento, de capital e de infra-estrutura. Os fatores considerados básicos (re-cursos naturais, clima, localização e mão-de-obranão especializada ou semi-especializada) são her-dados passivamente e sua criação exige investi-mento privado e social modestos, não sendo muitoimportantes para uma vantagem competitiva na-cional sustentável. Os fatores adiantados (infra-es-trutrura de comunicação moderna, pessoal alta-mente educado e institutos de pesquisa sofistica-dos) são necessários para se conseguir vantagenscompetitivas de ordem superior como produtos

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da por direitos de propriedade. Os fatores adianta-dos de um país são, via de regra, construídossobre fatores básicos (PORTER, 1993).

Os fatores podem ser generalizados(sistema de rodovias, programador de computa-dor e educação superior) que podem ser empre-gados indistintamente em inúmeras indústrias eespecializados (pessoal especializado, tecnologiaem certos campos e infra-estrutura específica),relevantes para indústria específicas. A vantagemcompetitiva mais significativa e sustentável ocorrequando um país possui fatores ao mesmo tempoadiantados e especializados. Por outro lado, oconjunto de fatores configura-se como base de-preciativa para a manutenção da vantagem com-petitiva, a menos que esta seja aperfeiçoada eespecializada constantemente. Os países têmêxito em indústrias nas quais são particularmentebons na criação de fatores e no aperfeiçoamentodesses fatores imprescindíveis. Nenhum país po-de criar e aperfeiçoar todos os tipos e variedadesde fatores e, além disso, uma desvantagem defatores, especialmente básicos, pode levar a umdesafio inovador que resulta na criação de vanta-gens competitivas duradouras numa indústria,não apenas economizando fator, mas ampliandovantagens de fatores (PORTER, 1993).

No que diz respeito às condições dademanda interna, entendida como dinâmica emque a qualidade é mais importante que a quanti-dade, três atributos gerais são significativos: com-posição (natureza das necessidades do compra-dor), tamanho e padrão de crescimento, meca-nismos de transferência de preferência internaaos mercados estrangeiros. As vantagens com-petitivas são criadas na interação desses, criandoambiente interno que conduza à elevação doritmo da inovação e, principalmente, reflita-se nu-ma crescente sofisticação e eficiência dos pro-dutos e serviços consumidos no mercado interno.A internacionalização promove a inserção privile-giada de empresas atuantes nesses mercadosinovadores, propiciando-lhes posição competitivasuperior (PORTER, 1993).

As três caraterísticas da composição dademanda interna que têm significado para a van-tagem competitiva nacional são: a) estrutura dademanda do segmento que significa a distribuiçãoda demanda de determinadas variedades, ouseja, demanda segmentada, sendo valiosa numpaís a presença de grandes segmentos que exi-

gem formas mais sofisticadas de vantagem com-petitiva levando as firmas ao aperfeiçoamento, b)compradores sofisticados e exigentes que pressi-onam as empresas locais a atender com altosníveis de qualidade, características de produto eserviços e c) necessidades percursoras do com-prador local, pois as empresas de um país adqui-rem vantagem se os compradores nacionais pre-nunciam necessidades que se tornarão generali-zadas em vários países (PORTER, 1993).

O tamanho da demanda interna e seupadrão de segmento também são importantes pa-ra a criação de vantagens competitivas. O tama-nho da demanda interna é importante em indústri-as nas quais há economia de escala ou aprendi-zado ao estimular as empresas locais a investir emgrandes instalações, desenvolvimento de tecnolo-gia e melhoramentos produtivos. Nos padrões decrescimento, a existência de vários matizes decompradores, cada qual com suas idéias sobre asnecessidades de produto pressionando as empre-sas, motiva o progresso. Por outro lado, o rápidocrescimento interno leva as empresas a adotaremnovas tecnologias mais depressa com menor re-ceio de que os investimentos existentes se tornemredundantes e a certeza de que, com a construçãode grandes instalações, não gerarão ociosidade.Já a grande demanda interna inicial é relevante sea demanda interna prenunciar as necessidadesinternacionais, enquanto a saturação precoce domercado força as empresas a continuarem ino-vando e aperfeiçoando seus produtos e serviços(PORTER, 1993).

Ainda importante é a internacionaliza-ção da demanda interna, mecanismo pela qualimpulsiona os produtos e serviços de um país pa-ra o exterior. A primeira situação dessa ocorrên-cia é aquela em que os compradores internossão também externos, dissiminando padrões e ti-pos de produtos. A segunda, que apenas torna-se relevante para demanda interna avançada esofisticada, representa o fato de as necessidadese os desejos internos serem transmitidos ou in-culcados a compradores estrangeiros fazendocom isso que rompam os limites nacionais, numamudança que propicia a boa posição competitivade empresas do país de origem. No geral, ascondições da demanda interna, para consolidaruma posição competitiva superior para empresasnacionais, são relevantes na interação das mes-mas para criação de um ambiente estimulador daprodutividade e sofisticação (PORTER, 1993).

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¡   Outro determinante das vantagens com-petitivas das empresas nacionais está na compe-titividade das indústrias correlatas e de apoio.A posição competitiva de algumas indústrias for-necedoras conferem vantagens potenciais às em-presas do país em muitas outras indústrias, por-que produzem insumos amplamente usados e im-portantes para a inovação ou a internacionaliza-ção. O acesso rápido, eficiente, precoce e, por ve-zes preferencial, à maioria dos insumos economi-camente rentáveis resulta em preços atraentes eserviço eficiente. Além disso proporciona coorde-nação constante com ligações estreitas entre em-presa e fornecedores que favorece o processo deinovação e aperfeiçoamento constantes. Os forne-cedores externos raramente são um substitutocompleto, mesmo com subsidiarias locais. Asindústrias correlatas nas quais as empresas, aocompetirem podem coordenar ou partilhar ativida-des na cadeia de valores, ou aquelas que envol-vem produtos complementares permitindo açãoconjunta no desenvolvimento de tecnologia, ma-nufatura, distribuição, comercialização ou assis-tência, gerando vantagens de custo e mesmo dediferenciação no processo inovador (PORTER,1993).

Estratégia, estrutura e rivalidade dasempresas conformam outro determinante dasvantagens competitivas nacionais. Os paísestenderão a conseguir êxito nas indústrias em queas práticas administrativas e de organização pre-feridas no ambiente nacional são adequadas àsfontes de vantagem competitiva da indústria. Es-ses aspectos surgem do sistema educacional, dahistória social e religiosa, das estruturas familia-res e muitas outras condições nacionais freqüen-temente imponderáveis, mas singulares. As me-tas que as empresas buscam realizar bem comoas motivações de seus empregados e diretoresinfluenciam seu desempenho. Por outro lado, a ri-validade interna cria pressões sobre as empresaspara que melhorem e inovem. Os rivais locaispressionam-se mutuamente para reduzir custos,melhorar a qualidade e serviços e criar novosprodutos e processos (PORTER, 1993).

Conquanto não sejam determinantes,duas forças agem diretamente sobre eles e interfe-rem na criação de vantagens competitivas nacio-nais: o acaso e o Governo. Acontecimentos oca-sionais são importantes porque criam interrupçõesque permitem mudanças na posição competitivaao neutralizarem vantagens de competidores já

estabelecidos e criam potencial para que empre-sas novas possam suplantá-los e atingir vantagenscompetitivas em função de novas e diferentes con-dições. Já o Governo pode influenciar muito, paramelhor ou pior, os quatro determinantes condicio-nando suas dinâmicas. Por exemplo pode: a) afe-tar as condições de fatores por subsídios ou políti-cas salariais e previdenciárias e educacionais, b)influenciar as necessidades dos compradores compadrões e regulamentos locais para produtos queelevem a sofisticação, c) condicionar a demandainterna como importante comprador de muitos pro-dutos no país, d) influir na estratégia das empresase na rivalidade interna ao regular o mercado de ca-pitais, política fiscal e a concorrência de mercados(medidas anti-truste e anti-dumping) e e) estimularo processo inovador com políticas efetivas de ciên-cia e tecnologia. De qualquer maneira, o Governonão atua diretamente, mas afetando os determi-nantes da vantagem competitiva (PORTER, 1993).

4 - ESTADO E COMPETITIVIDADE DA AGRI-CULTURA

O Brasil como uma economia continen-tal tem na agricultura sua principal atividade eco-nômica, tanto na geração de cambiais como naformação da renda e do emprego internos. O pro-cesso de industrialização nessas economiasapresentam a particularidade de montagem deplantas indústriais com ligação direta com a agro-pecuária, seja como fornecedoras de insumos,seja como processadoras de matérias-primas.Trata-se, então, de indústrias da agricultura queconformam os parques industriais da indústria debens de capital na forma de adubos, defensivos emáquinas, bem como a principal indústria debens de consumo são as agroindústrias proces-sadoras e as indústrias de alimentos. Assim, numpaís continental como o Brasil, a irradiação do de-senvolvimento pelo amplo espaço geográficoconsiste no avanço pleno, pela industrialização,de sua agricultura17.

17Essa proposição está contida num clássico da análise dodesenvolvimento econômico brasileiro, a tese de IgnácioRangel apresentada à Comissão Econômica para a Amé-rica Latina e Caribe (CEPAL/ONU) na década de 50,quando o autor conceitua a transformação de uma eco-nomia continental agrária pela industrialização (RANGEL,1954). Sobre os impactos dessa transformação da agri-cultura, após ter sido realizada a industrialização brasileiraver Gonçalves (1997).

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4.1 - Líderes não por Obra do Acaso: inserçãointernacional das agriculturas das na-ções capitalistas desenvolvidas

A análise da agricultura no plano dasnações não pôde ser realizada, após o desenvol-vimento do capitalismo, como resultado da pre-valência de forças naturais, seja pelo lado dascondições dos fatores, seja pelo acesso aos mer-cados18. A construção das modernas agriculturasmundiais, apesar de a condição dos fatores tersido relevante, não apenas determinou o sucessode uma ou outra nação no que diz respeito à suainserção internacional. As principais nações nocontexto mundial, no que diz respeito ao desen-volvimento e inserção externa de suas agricultu-

18A preocupação fundamental deste item está em discutiros elementos genéricos que determinam os movimentosdo mercado internacional à medida que, no tocante à agri-cultura, a presença do Estado dá-se em diversos níveis:na sustentação do processo de desenvolvimento da agri-cultura no plano interno, na alavancagem das inserçõesexportadoras dentro dos marcos geopolíticos das zonasde influências das potências mundiais e da ação dasgrandes empresas comerciais e conglomerados financei-ros que dominam as transações internacionais. Dentrodesse quadro, pretende-de introduzir a realidade da agri-cultura brasileira.

ras, não apenas decorrem da superação da defi-ciência de fatores, como derivam de políticas pú-blicas ativas para sustentar a produção interna,de ações comerciais consistentes buscando umaposição de mercado desejável, bem como daação de empresas e estruturas financeiras quederam suporte à inserção pretendida. Noutras pa-lavras, não foi pelo mercado livre que os EstadosUnidos da América (EUA) e a União Européia(UE) se converteram nas mais importantes po-tências da agricultura mundial.

A construção da agricultura norte-ame-ricana no final do século XIX mostra com clarezaessa perspectiva. A região conhecida no momen-to atual como a mais importante produtora mun-dial de grãos, o Meio-Oeste, fora anteriormentedefinida pelos ingleses como o "deserto inabitávelda América". A conquista do Oeste nos EUA foirealizada com base em intenso apoio governa-mental, desde a definição da estrutura fundiáriaaté a constituição do padrão tecnológico adequa-do por meio da pesquisa agropecuária pública. Aorganização dos agricultores estadunidensestambém contribuiu de maneira decisiva para esseavanço com reivindicações, desde cedo, centra-das em objetivos estruturais como educação, tec-nologia e transportes, além dos amplos investi-mentos no aproveitamento de recursos hídricos.A política ativa de intervenção nos mercados, pri-meiro com os movimentos pela paridade do co-meço dos anos 20s, depois com o New Dealnavirada da década de 30 e os aprimoramentosposteriores das intervenções governamentais,conformou sólida estrutura de proteção setorial.Complementa esse arcabouço de medidas as deestímulo à exportação como a conhecida PL 480da década de 50, o que, em conjunto, fez dos Es-tados Unidos não apenas a mais importante na-ção indústrial, mas também a maior agriculturamundial19. 19A construção da agricultura norte-americana foi realizadacom base na ativa intervenção estatal. No processo de co-lonização do Oeste esse papel foi caracterizado por Mann;Dickinson (1980), para os quais a moderna agricultura dosEUA teve a intervenção estatal a constitui-la tanto apor-tando capital como principalmente viabilizando-a tecnologi-camente. Além disso, para Friedmann; Mcmichael (1989),a participação estatal foi elemento essencial para a eco-nomia americana constituindo o "complexo alimentar" jáno século XIX. Mais recentemente essa ação atingiu asrelações comerciais, numa política que, segundo Burbach;Flynn (1982), "os norte-americanos invocam os princípiosdo livre comércio e da vantagem comparativa dos defen-sores do Império Britânico no século XIX". Sobre os refle-xos das políticas agrícolas, no caso dos Estados Unidos,ver ainda: Enciso; Esquivel (1990); Goss; Rodefeld; Buttel

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Não apenas nos Estados Unidos e naUnião Européia, mas também no Japão como emtodo o mundo capitalista desenvolvido, a práticade políticas de proteção à agricultura revela-seuma regra. A questão mostra-se intrincada nãoapenas porque essas políticas favorecem incre-mentos de oferta e forçam o escoamento de ele-vados excedentes no mercado internacional comimpactos sobre os preços relativos. Os paísescapitalistas desenvolvidos são também os maio-res importadores mundiais, e a existência deenormes excedentes aumenta a expressão dastransações bilaterais entre essas nações, aomesmo tempo que permitem a adoção de fortesbarreiras de proteção, de cunho tarifário ou não-tarifário no comércio dos respectivos mercadosdomésticos. Dessa maneira, como grandes mer-cados, tanto de importação como de exportação,os países capitalistas desenvolvidos atuam sele-

(1980); Buttel (1990); e Maclennan; Walker (1982). Asmudanças nos acordos multilaterais podem ser vistas emBlau (1964) e Carvalho; Silva (1995).20A construção da agricultura com base na ativa interven-ção das politicas supranacionais dos governos europeuspode ser apreendida em Marques (1988) que historia aevolução da Política Agrícola Comum (PAC) bem como osinstrumentos de intervenção utilizados. Sobre os resulta-dos dessa política européia ver ainda Jordana (1989);Bonano (1989) e Hamilton (1991).

tivamente na definição de seus parceiros comer-ciais, via de regra apoiando com tratamento es-pecial ex-colônias de diversas partes do mundo,no caso europeu, ou parceiros preferenciais, nonorte-americano e japonês21.

A conquista de posições competitivasde mercado na agricultura mundial revela-se as-sim um luta incessante contra mecanismos quecriam obstáculos ao comércio, numa realidadeem que o mercado interno forte representa abase do desenvolvimento setorial. Os países emdesenvolvimento, incluindo nestes até mesmo osdenominados New Agricultural Countries (NACs),enfrentam o dilema de gerar cambiais a partir dasexportações da agricultura numa situação emque a inserção permitida significa nada mais que“franjas” de mercado não ocupadas pelas fortesagriculturas das nações importadoras22. Aindaque sejam em mercados não tradicionais comodo Oriente Médio e do Sudeste da Ásia, as difi-culdades são enormes, pois aí disputam com aforça geopolítica e o poder de mercado das ven-das subsidiadas das grandes nações. Em geral,para os países em desenvolvimento, avançar nassuas inserções no comércio internacional con-siste num enorme desafio, visto que, as fragilida-des macroeconômicas internas impedem o uso

21A execução de políticas ativas de estímulo a aumentosde oferta na agricultura obviamente não se resume aoscasos citados dos Estados Unidos e União Européia.Também outros países desenvolvidos como o Japão e osprincipais representantes do New Agricultual Coutries(NACs) como Brasil, Austrália e Argentina, integrantes dodenominado Grupo de Cairns nas negociacões da RodadaUruguay do GATT, também executam intervenções gover-namentais em favor de suas agriculturas. A diferençafundamental é que para esses últimos a capacidade derealizá-las mostra-se muito exígüa frente às necessidadesde praticá-las em níveis compatíveis com os vigentes nasprincipais nações, além de que ao invés de gerar cam-biais, exportam-se subsídios beneficiando os consumido-res dos países de destino dos produtos e não os internos.Para outros países desenvolvidos, como o Canadá e oJapão, além dos Estados Unidos e União Européia, pode-se consultar ainda o trabalho de Carvalho; Silva (1995).

22A superprodução na agricultura, numa situação em que omercado mundial passa a ser disputado não mais só pelosEstados Unidos, mas também pela União Européia e pelosNACs, faz universal a frase de Cox; Lowe; Winter (1986):"agora a agricultura é vítima de seus espetaculares suces-sos". Essa característica da agricultura nas principaisnações desenvolvidas ou em desenvolvimento deriva deestruturas de produção e logística construídas em níveisde oferta muito superiores aos observados e, nem sempre,cada país está disposto a reduzir sua inserção e quandotenta uma política nesse sentido, os agricultores elevam aprodutividade e aumentam ainda mais os excedentes. Issotem acontecido principalmente nos Estados Unidos e naUnião Européia.

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de mecanismos de estímulos similares23. Entre-tanto, as autoridades dos países em desenvolvi-mento ficam quase que num beco sem saída, àmedida que, não podendo alvancar suas agricul-turas para competirem de forma frontal com asnações capitalistas desenvolvidas, ainda assimencontram nesse setor as principais potencialida-des de gerar cambiais e financiar o desenvolvi-mento.

Desse modo, não apenas a agriculturapraticada nas nações líderes condicionam osmovimentos das transações internacionais a par-tir de políticas ativas de sustentação setorial, mastambém as estruturas do comércio. Como maio-res nações consumidoras e para onde se dirigemos fluxos de negócios nesses mercados estãoinstalados as maiores tradings companies, quecontrolam as principais rotas de trocas, seja naentrada, seja nas saídas desses países. O de-nominado sistema agroalimentar mundial con-forma-se como enorme oligopólios controlandoos principais mercados e com isso as principaisoportunidades de negócios. Essa realidade con-templa desde as frutas frescas, como a banana,passa pelas grandes empresas comerciais decommodities e na conformação das enormesredes de distribuição varejista. Essa característicada não neutralidade do comércio mundial origina-se nas grandes companhias comerciais (e guer-reiras) oriundas do avanço do comércio marítmoapós as grandes navegações, evoluiu da hege-monia inglesa para a norte-americana, atual-mente compartilhada por empresas de outras na-ções capitalistas24.

23Esse aspecto deriva do papel secundário das agricultu-ras dos países em desenvolvimento que, inclusive, foramprotegidas pelos acordos multilaterais de produtos básicoserigidos desde o pós-guerra, como exemplifica os casosdo café, cacau, miltifibras, dentre outros (BLAU, 1964).Nos anos mais recentes, houve a desmontagem progres-siva dessa estrutura de acordos multilateriais em nome daliberalização dos mercados, com o cessamento da vigên-cias das cláusulas econômicas (GONÇALVES; MARTIN,1994).24A expressão do domínio das grandes empresas suprana-cionais sobre as transações internacionais de produtos daagricultura pode ser aquilatada pelo faturamento dessesconglomerados frente à renda nacional de muitos países. Nosséculos anteriores o predomínio das grandes companhiascomerciais teve papel relevante na expansão do mercadointernacional (LE FRANC, 1948). Sobre o predomínio dasgrandes empresas no sistema agroalimentar mundial verGhersi; Rastoin (1981), enquanto o panorama no caso euro-peu pode ser encontrado em Green; Lanini (1996). Quanto aum produto isolado, sobre banana encontra-se a análise deGonçalves; Perez; Souza (1994). A discussão do poder dasmultinacionais frente aos estados nacionais foi realizada por

Essas grandes empresas comerciaisnão apenas dominam as principais rotas de ven-das nos principais mercados como principalmen-te inserem-se no amplo movimento de globaliza-ção financeira. Dessa maneira assumem demaneira decisiva a condição de empresas su-pranacionais, normalmente atuando em paraisosfiscais como mercados financeiros of shore. Comisso ganham significativa independência emrelação até mesmo aos governos nacionais deseus países de origem e, principalmente, atuan-do em mercados de capitais livres da ação diretados respectivos Bancos Centrais. As empresasdos países em desenvolvimento que consegui-ram inserir-se nesse sistema, ou o fazem combase numa posição subalterna atuando comalgum produto intermediário, o que a constituicomo fornecedora de matéria-prima de um pro-duto final dominado por corporações avantajadasda indústria de alimentos, ou quando se instalampioneiramente e conseguem sustentar-se emalgum nicho de mercado não explorado. Dequalquer maneira as que avançam muito, estru-turam-se como as grandes corporações e atémesmo perdem sua relação com a nação deorigem, tornando-se supranacionais na plenitu-de25.

Nesse contexto, mais que em nenhumoutro setor, na agricultura as intervenções esta-tais são determinantes da competitividade. Essaperspectiva parece contrariar as postulações dePORTER (1993) no sentido de que as posiçõescompetitivas sustentáveis de uma dada agricultu-ra nacional no contexto internacional deriva di-retamente das intervenções do Estado Nacionalem questão. Entretanto, do ângulo de que asvantagens competitivas são criadas não derivan-

Huntington (1977).25A conformação da macro-estrutura financeira em nívelmundial num processo em que grandes massas de capi-tais libertam-se das amarras dos Governos Nacionaisconsiste não apenas na maior novidade do capitalismomundial, mas também na mais importante preocupação efonte de instabilidades das economias nacionais. Quantomaior for a economia menor a possibilidade de sucesso deataques especulativos contra suas moedas nacionais, umavez que os Bancos Centrais em questão detêm mecani-mos de reação pronta em função da expressão em volumee em qualidade estratégica dos negócios realizados dentrodo país. Em economias em desenvolvimento, as possibili-dades de enfrentar tais ataques mostra-se muito comple-xa, com elevada possibilidade de insucesso, exigindocautela e parcimonia na gestão macroeconômica, evitan-do-se ficar refém do capital especulativo. Sobre a forma-ção da macro-estrutura financeira, ver o interessante tra-balho de Braga (1991).

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vas oriundas da base natural de cada nação,reforça-se as convicções de PORTER (1993) deque não basta ficar "deitado num berço esplên-dido". A agricultura constitui-se no setor funda-mental da inserção internacional de economiascontinentais como a dos EUA e da Europa Unifi-cada, mas a condição prévia de largas exten-sões cultiváveis significaram muito pouco frenteaos esforços de estruturação da moderna agri-cultura competitiva.

Na tarefa histórica de construção daagricultura moderna nessas economias, as políti-cas públicas jogaram papel decisivo forjando aforça e a estrutura setoriais. Criaram-se as es-trutururas de produção e de logística, ou seja, dealavancagem da oferta e da abertura de merca-dos, em que os subsídios públicos formam aregra e não a exceção. A escassez de terras emão-de-obra não consistiu em obstáculos insupe-ráveis, o progresso técnico criou terras agricultá-veis e mecanizou processos, na mesma medidaem que as políticas de exportação criaram mer-cados. A realidade atual do mercado internacio-nal de produtos da agricultura mostra que a am-pliação da inserção brasileira como dos demaispaíses em desenvolvimento depende fundamen-talmente da exploração de nichos de mercado.No conjunto, nas transações relevantes com osprincipais produtos, exige-se o esforço hercúleode superar os subsídios e os estímulos favorece-dores das principais agriculturas mundiais.

Outro aspecto, estratégico e poucopercebido, está no fato de que essas agricultu-ras apresentam como suporte fundamental desuas superioridades o tamanho e a qualidadedos respectivos mercados internos. Nesse sen-tido, as agriculturas pretendentes em se inserirnesse quadro, no mesmo patamar de oportuni-dades, devem buscar retaguardas no fortaleci-mento dos seus mercados internos. A análise daagricultura brasileira atual, em que a grita contraas políticas agrícolas dos países desenvolvidosmostra-se retumbante nos principais debatessetoriais internos, exige que se leve em conta opróprio modelo excludente de desenvolvimentoda agricultura brasileira modelo que concentraterras e renda, e com uma estrutura de ofertamais forte que a própria estrutura da demandainterna. Noutras palavras, um país que se auto-denomina com orgulho "celeiro do mundo" nãoconsegue sequer erradicar a fome, ou seja,

também aqui a modernização e a industrializa-ção da agricultura fizeram com que "a agricultu-ra se tornasse vítima de seus espetacularessucessos", mas como reverso da medalha,comprometendo seu próprio desenvolvimentofuturo por insuficiência de mercado. Esse era osentido fundamental da defesa de reformasestruturais realizada no debate em que se defi-niu o caminho da economia brasileira nos anos60s. Preferiu-se o atalho que, entretanto, signifi-cou o retorno ao ponto de partida26.

4.2 - Agricultura no Capitalismo Tardio Brasi-leiro: iniqüidades também não são obrasdo acaso nem do atraso27

O Brasil constitui-se numa economiacontinental, o que implica a preponderância daagricultura enquanto setor econômico. Isso por-que o processo de industrialização ganha comoparticularidade a predominância da agroindústriaprocessadora e da indústria de alimentos comoprodutoras de bens intermediários e finais, bemcomo a indústria de bens de capital organiza-sede maneira importante para fabricar fertilizantes,defensivos e maquinaria agropecuária. Outra par-ticularidade está representada pelo fato de a in-dustrialização ganhar força como interiorizaçãodo desenvolvimento, integrando diferentes re-giões ao processo de acumulação capitalista, ouseja, irradiando a formação das forças produtivasespecificamente capitalista por um universo geo-gráfico mais amplo. Uma terceira especificidadeestá representada pela conjunção de forças das 26A discussão em torno das alternativas de desenvolvi-mento da economia brasileira no conjunto das chamadasquestões de base realizou-se de forma intensa no começoda década de 60. Récem-saída da experiência exitosa deinternalização da indústria pesada, como resultado daadoção do Plano de Metas pelo Governo Juscelino Kubis-tchek no período 1957-61, a economia brasileira imersanuma crise de desaceleração cíclica forjava os rumos dociclo seguinte, no qual a agricultura era um elemento cru-cial. As posições fundamentais, nas suas diversas varian-tes, giravam em torno da realização ou não da reformaagrária como necessidade de estruturar o Brasil para odesenvolvimento futuro. Venceu a posição de avançar semmudar. Sobre esse debate ver Gonçalves (1997).

27Neste item pretende-se num primeiro momento mostraros elementos basilares da agricultura brasileira que têmcondicionado suas transformações e que impactam deforma direta sua competitividade. Num segundo momento,pretende-se abrir a análise enfocando essa realidade à luzdos argumentos de Porter (1993) para estudar a competi-tividade das nações.

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duas anteriores, ou seja, a criação de um grandemercado nacional num horizonte geográfico deporte continental, representando um papel ímparna definição das oportunidades de desenvolvi-mento nacional. Essa realidade, de nação inseri-da no processo de desenvolvimento mundial co-mo capitalismo retardatário, insere a agriculturabrasileira nesse movimento mais amplo de trans-formações produtivas e estruturais28.

O modelo fundamental da denomina-da agricultura moderna consistiu na internaliza-ção do padrão relacionado à 2ª Revolução Indus-trial, relacionado diretamente com a experiênciapioneira realizada nos EUA. Entretanto, trata-sede processo histórico em que as especifidadesinternas condicionam as transformações capita-listas submetendo as tendências mais gerais aoritmo e ao perfil produtivo da lógica nacional.Dessa maneira não há como tratar a experiênciahistórica de desenvolvimento da agricultura noBrasil como uma fotocópia tardia da expansãoda agricultura norte-americana. Estruturalmentehá distinções relevantes como: a) a da distribui-ção fundiária, uma vez que nos EUA houve pro-cesso redistributivo prévio enquanto no Brasilreforçou-se a grande propriedade da terra; b) osdireitos de cidadania são originalmente diferen-tes em função da organização da sociedade, quegeraram distintos caminhos para sair da escravi-dão, uma guerra sangrenta nos EUA e uma me-ra concessão legal das elites como no Brasil queevoluiu tendo o conservadorismo como marca,levando à permanência de resquícios coloniais-escravistas na forma de instrumentos de coerçãoextra-econômica na realidade brasileira; e c) ospadrões distributivos resultantes são significati-vamente diferenciados gerando uma economiade altos salários nos EUA e uma economia debaixos salários no Brasil29. Essas decorrências

28A análise sobre a particularidade do processo de indús-trialização em economias continentais como a brasileiraencontra sua mais original contribuição na obra de Rangel(1954), enfocando as transformações no que denominava"complexo rural" operadas pelo desenvolvimento capita-lista, que não se resumia somente de ordem técnica den-tro das propriedades rurais, mas representava a progres-siva urbanização de tarefas antes rurais formando novasagroindústrias. Sobre o capitalismo tardio brasileiro pode-se ver a obra clássica de Mello (1982), enquanto sobre aperiodização do processo da industrialização brasileira verCano (1993).29O processo de mudanças da sociedade brasileira, he-gemonizado por uma elite de corte conservador capaz derealizar transformações sem ruptura, ou seja, ensejar oprogresso econômico mantendo privilégios, pode ser visto

particulares do processo histórico de desenvol-vimento da agricultura na economia e sociedadecontinental brasileira, conformam-na como umarealidade das iniqüidades em aprofundamento, oque condiciona as mudanças.

Outra característica da agricultura bra-sileira está no seu cárater itinerante, pondendo-severificar o caminhar da hegemonia regional no di-namismo de expansão das lavouras, sempre àprocura de novas fronteiras de expansão. Assim,desenharam-se os caminhos do café do Vale doParaíba fluminense para o território paulista, des-viando-se para oeste rumo a Ribeirão Preto, paradepois atingir as terras da Alta Paulista e o nortedo Paraná, donde nos anos 70s deste século dámeia volta e expande-se em Minas Gerais, terrasque tinham renegado no final do século XIX. Onúcleo dinâmico, que já fora Bananal, mudou-separa Ribeirão Preto e depois para Londrina. Esseprocesso de canibalismo geográfico não foi su-perado, ao invés disso conheceu enorme impulsocom a tecnologia moderna que permitiu que ocafé, até então exigente em terra roxa pudesseocupar as terras menos férteis dos podzolizadose até mesmo as antes consideradas imprestáveisterras de cerrado, agora novo eldorado do caféde qualidade de bebida superior.

Essa itinerância pode ser observadatambém com outras culturas como a cana paraindústria nordestina que após séculos de predo-mínio no contexto nacional, atualmente tem seunúcleo dinâmico em São Paulo. Os grãos e fibrasque até pouco tempo atrás era sinônimo de Sul/Sudeste, em especial pela participação do Para-ná e Rio Grande do Sul, ganham o Brasil Central,e as antigas lavouras, símbolos do sucesso dapolítica governamental de crédito subsidiado quemodernizou o campo nos anos 70s, são relega-das a um plano secundário pela excelência doNovo Eldorado. Esse canibalismo geográfico, an-tes de representar um aspecto positivo pela in-serção de novas regiões à dinâmica da acumula-ção, representa o precoce sucateamento da infra-estrutura representada pela logística de armaze-nagem, comunicação, transporte e serviços, além

no clássico de Faoro (1991) sobre o poder político noBrasil, ou ainda na discussão de Rangel (1962) para quemo "feudal" representava exatamente essa capacidade daselites de ensejar mudanças mantendo o poder. O resulta-do do aprofundamento da concentração de renda pode servisto em Hoffmann (1992), bem como no estudo de Gon-çalves (1997), que abrange as grandes transformações daagricultura e os impactos para toda a sociedade.

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Esse aspecto da logística representaum elemento estratégico na definição da compe-titividade das cadeias de produção da agricultura.Estando associada aos custos de transação exi-gem recursos públicos para mantê-las em pa-drões de qualidade e custos de operação com-patíveis com a colocação de produtos nos princi-pais pontos de venda. Dessa maneira, num paísonde durante toda a década de 90 a área delavouras sempre se mostrou menor que a planta-da no final dos anos 80s, em cerca de 3 milhõesde hectares, a criação de novos eldorados repre-sentados pelas frentes de expansão exige subsí-dios e incentivos fiscais, ao mesmo tempo que aestruturação da moderna logística consome so-mas vultosas de recursos públicos. Em ambas aspontas desse processo são recursos públicosgastos para sustentar a acumulação privada, emespecial garantindo os elevados ganhos da es-peculação imobiliária pela valorização patrimonialdas terras, adquiridas por nenhum preço e que seconvertem em patrimônio valioso. E, nesse su-porte ao patrimonialismo privado que se perenizanas várias frentes de expansão das lavouras,sobra pouco espaço para a aplicação de recursosnoutras tarefas de Estado mais necessárias.Além do que, tudo parece por terminar, num su-ceder de obras inacabadas.

Essa característica de itinerância dasgrandes regiões brasileiras de lavouras só pou-pou da decadência, até agora, apenas as áreaspróximas de Ribeirão Preto e de Londrina. Asso-ciada intrinsecamente a ela está a prevalência domodelo texano das grandes lavouras. As referên-cias aos segmentos competitivos externamenteou de moderna produção interna da agriculturabrasileira, na maioria das vezes, não informamadequadamente de que se trata de lavouras cujabase técnica inclui a mecanização do processoprodutivo em níveis elevados, que inclusive estãosendo aprofundados com a mecanização da co-lheita. Nos anos 70s, a modernização das lavou-ras no Brasil atingiu principalmente o uso de ma-quinaria no preparo do solo, plantio e tratos cultu-rais, o que acabou por forjar uma demanda deforça de trabalho sazonalmente concentrada nacolheita. Nos anos 90s expande-se a mecaniza-ção da colheita, que reduz drasticamente a sazo-nalidade mas provoca uma perda expressiva deoportunidades de trabalho para uma imensa mas-sa de trabalhadores de baixa qualificação que,

sem outra ocupação produtiva, passam a peram-bular sua miséria pelas diversas zonas de produ-ção, em busca de uma mínima possibilidade desobreviviência.

Às grandes lavouras fornecedoras dematéria-prima, constituindo-se como imensasáreas de produção mecanizadas, junta-se a pe-cuária intensiva, normalmente em vastidões depastagens degradadas nas zonas velhas de la-vouras decadentes ou já decaídas, na formaçãode grandes vazios de oportunidades de trabalhoe uma estrutura de distribuição de renda profun-damente concentrada. O não desenvolvimentode alternativas de geração de renda e de empre-go, como a moderna produção e logística doscomplexos produtivos dos hortícolas de mesa,não permitiu a internalização do modelo californi-ano de lavouras, nem a proliferação de criaçõesintensivas. Essas atividades, associadas a me-canismos organizadores dessa produção comqualidade certificada para alcançar os exigentesmercados consumidores urbanos no País e noexterior, são essenciais para a construção deuma estrutura de negócios na agricultura, compe-titiva mas com maior eqüidade social. No Brasilisso apenas se configura como uma possibilidadeainda inexplorada.

Em função desse modelo de desenvol-vimento histórico, organizou-se uma sociedadecaracterizada pela heterogeneidade estrutural,onde as distâncias são enormes na ótica pro-dutiva, regional e social, com níveis de iniqüida-des que são insustentáveis. As médias, em fun-ção do fato de que a diferença constitui-se nouniversal definidor da realidade brasileira, en-quanto medidas de posição têm sua representa-tividade comprometida pela elevada dispersão.Os indicadores de competitividade nesse univer-so não conseguem explicitar a realidade e osmodelos econométricos quando comparam pro-dutos nacionais com os de outros países encon-tram enormes limitações para obterem resulta-dos aderentes ao movimento das transaçõesexternas da agricultura nacional. Muitas vezes,um segmento em que as inferências baseadasna média nacional revelam em condições de in-ferioridade na inserção competitiva, há exemplosde firmas que estão expandindo suas vendas pe-lo mundo. Para não passar em branco, pode-severificar a exportação da uva fina de mesa dospólos irrigados nordestinos que, se fosse produ-zida nos padrões da média da viticultura nacio-

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nal, não teria chances no exigente mercado eu-ropeu. Ao lado desse, há inúmeros outros querevelam como a disparidade extrema consistenum obstáculo sério à maior participação da agri-cultura brasileira no mercado internacional, ocu-pando uma posição compatível com sua poten-cialidade.

Esse mosaico de disparidades, que serevela em iniqüidades no plano econômico esocial, incia-se pela enorme amplitude dos gra-dientes de produtividade dentro de cada lavouraou criação, ainda que numa mesma região. Naprodução de feijão, por exemplo, no mesmo su-doeste Paulista onde, em 1997, encontravam-seprodutores de cultivos irrigados com área médiade 250 hectares, produtividade média de 3.500kg/ha (embora alguns alcancem 4.200kg/ha), aum custo médio de R$18,00 por saca de 60kg,ocorrem lavradores com área média de 15 hec-tares, produtividade de 600kg/ha (a despeito dealguns colherem menos de 400kg/ha), a um cus-to médio de R$28,00 por saca de 60kg. Assu-mindo que esses dois grupos de lavradores defeijão comercializem no mesmo mercado e namesma época, obtendo o mesmo preço, a dispa-ridade de renda bruta e de renda líquida sãoenormes. Não é difícil deduzir que, na persistên-cia dessa diferença ao longo do tempo, o apro-fundamento das disparidades consiste numadecorrência inexorável.

Mas as diferenças não são somentetecnológicas, resolvíveis apenas com a generali-zação do padrão produtivo, mesmo porque isso éefeito e não causa do processo. A disparidadetecnológica é produto da diferença de acesso aoconhecimento que decorre de impedimentos deordem econômica e cultural que se perpetuam notempo. O pré-requisito de que ambos os gruposde lavradores de feijão obtêm o mesmo preço pordestinarem seus produtos ao mesmo mercadonão se sustenta. Os maiores lavradores normal-mente dispõem de estruturas de secagem, bene-ficiamento e armazenagem do seu produto, alémde que, pela técnica mais apurada, que se iniciacom plantio de semente com maior pureza varie-tal, livres de moléstias (em especial manchas),melhor controle fitossanitário, produzem comuma qualidade significativamente superior aosdemais. Os diferenciais de preços, derivados dasuperiodade qualitativa, em anos normais, atingeíndices de 21%, na comparação entre as médiasdos dois grupos. Com mais esse fator, a desi-

gualdade ganha novo reforço para seu alargar-mento.

Porém, produtividade e a qualidadeainda mantêm a comparação centrada no pa-drão tecnológico, ainda que a estrutura de capi-tal esteja na base das diferenças até aquiapontadas. Entretanto, as oportunidades tornamainda mais díspares quando se agregam as re-lações com a estrutura de mercado. Os grandeslavradores de feijão pela escala de suas transa-ções normalmente absorvem a margem de co-mercialização destinada usualmente aos inter-mediários do interior, os compradores das pe-quenas cidades ou profissionais da corretagem,vendendo diretamente para as empacotadorasdo produto. Com menor custo da logística, po-dem obter condições mais vantajosas de negó-cios vendendo em outras praças, além do que,por possuírem armazéns, não negociam no afo-gadilho da safra, quando o excedente local deoferta pressiona os preços para baixo. Os pe-quenos lavradores vivem uma relação diame-tralmente oposta com a estrutura de mercado,pois, não possuindo armazéns e secadores, nãohá como guardar a safra por muito tempo. Alémdisso, precisam de dinheiro para saldar com-promissos, muitos dos quais são adiantamentosfeitos pelos próprios compradores, quando nãoenfrentam a necessidade de quitar financiamen-tos bancários, os quais, ainda que com jurosbaixos no caso do Programa Nacional de For-talecimento da Agricultura Familiar (PRONAF),são expressivos para a realidade desses lavra-dores. Para completar esse mosaico de iniqüi-dades, o poder de representação política relativoentre os dois grupos mostra um abismo emtermos de cidadania.

A heterogeneidade estrutural aqui re-ferida até o momento ainda apresenta um qua-dro de enorme amplitude das diferenças, dizrespeito apenas a uma lavoura em apenas umaregião de uma Unidade da Federação. Quandose agrega a essa discussão outros indicadores,outras atividades econômicas e as diversas re-giões brasileiras, o mosaico de iniqüidades as-sume um panorama complexo onde as médiasperdem por completo seu significado. O grandedesafio das propostas de transformação da rea-lidade nacional forma-se, assim, na necessidadeinadiável de romper com o aprofundamento dasdiferenças na mesma medida em que seja ala-vancada a base geradora de renda e de oportu-

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Dessa maneira, a competitividade daagricultura brasileira ainda que expressiva emimportantes cadeias de produção, não pode servisualizada sem ter em conta os elementos cen-trais da estrutura de produção do negócio agrí-cola, marcada pela prevalência histórica de lide-ranças conservadoras que, perenizando a domi-nação política em sucessivas mudanças sem rup-tura, permitiu erguer uma estrutura produtiva mo-derna, que confere ao Brasil a condição de NewAgricultural Country (NAC), ao mesmo tempo emque coloca à margem dos benefícios desse pro-cesso uma imensa massa da população. Numavisão de que o “desenvolvimento consiste na eli-minação de privações de liberdade que limitamas escolhas e as oportunidades das pessoas deexercer ponderadamente sua condição de agen-

te”30, o Brasil está muito longe de consolidar-secomo nação desenvolvida, a despeito do significa-tivo crescimento econômico verificado, em es-pecial nas últimas cinco décadas. Daí a leitura doscondicionantes da competitividade não poder serfeita sem ter em conta essa característica fundanteda economia e sociedade nacional. Nem a ques-tão pode ser resolvida apenas escalando o ramoascendente da curva de custo marginal, porque acurva de oferta é uma ficção marginalista numarealidade onde a reta orçamentária revela a indife-rença com que muitos foram tratados no processode transformação.

30A idéia de desenvolvimento como liberdade foi desenvolvidapelo pensador bengali Amartya Sen, para o qual a eliminaçãode privações de liberdades substanciais é constitutiva dodesenvolvimento. Na sua visão sem liberdade não há de-senvolvimento, tendo a liberdade um papel instrumental noprocesso de transformação rumo ao desenvolvimento, mas seé meio, ampliá-la consiste na finalidade do desenvolvimento.Na sua análise mostra que apesar de níveis baixíssimos derenda, os habitantes de Kerala, China ou Sri Lanka apresen-tam expectativas de vida muito mais elevados que países depopulações mais ricas como Brasil, África do Sul, Namíbia eGabão. Assim, há uma distorção no sentido do desenvolvi-mento brasileiro, realizado privando as massas de liberdadee, mais que isso, não ampliando as liberdades substanciaisdas mesmas (SEN , 2000).

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COMPETITIVIDADE DA AGRICULTURA NO MERCADO MUNDIAL GLOBALIZADO:as idéias de Porter e a realidade de iniqüidades

RESUMO: O trabalho apresenta uma leitura das idéias de Michael Porter, no sentido de suacontribuição para o entendimento da concepção da criação de vantagens competitivas e do processo decompetitividade das empresas e nações, na mesma medida que isso conduz ao conceito de mercado,criado com a ocorrência da ação dos agentes econômicos como sujeitos das transformações econômi-cas e não resultante da ordem natural. Esse paradigma rompe com o ideário clássico de mercado comoum espaço econômico a ser disputado e conquistado. Após apresentar as idéias de Porter, procura-seuma mediação com o concreto, discutindo a realidade de iniqüidades na qual assenta-se a agriculturabrasileira.

Palavras-chave: competitividade, vantagens competitivas, mercado, agricultura brasileira.

AGRICULTURE COMPETITIVENESS IN THE GLOBALIZED WORLD MARKET:Porter´s ideas and the reality of inequities

ABSTRACT: The paper presents a reading of Michael Porter's ideas, in the sense of his contri-bution for the understanding of the conception of the creation of competitive advantages and of the com-petitiveness process of companies and nations, to the extent to which it leads to the concept of createdmarket as of the occurrence of the economic agents' action as subjects of the economic transformationsand not resulting from the natural order. That paradigm breaks up with the classic ideas of market as aneconomic space to be disputed and conquered. After presenting the Porter's ideas, a mediation is soughtwith the concrete, discussing the reality of iniquities in which the Brazilian agriculture is settled.

Key-words: competitiveness, competitive advantages, market, Brazilian agriculture.

Recebido em 19/03/2003. Liberado para publicação em 04/04/2003.