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1 A PUBLICIDADE OPRESSIVA NO JORNAL DIÁRIO GAÚCHO: UM ESTUDO DE CASO ACERCA DA VIOLAÇÃO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA 1 RODRIGO SCALON 2 RESUMO Esta pesquisa faz parte de um estudo de caso que versa sobre a publicidade opressiva do jornal Diário Gaúcho. Busca-se, também, referenciais teóricos na análise da violência contemporânea e compreensão acerca das (anti)técnicas da mídia, sobretudo a imprensa escrita. O exame debruçou-se sobre a compreensão do outro – visto sempre como inimigo e como o espraiamento do medo pela imprensa gera lucro e demanda por lei e ordem. Examina- se, ainda, a discrepância entre o impresso nos jornais e o fato ocorrido que poderá colidir com o princípio da presunção de inocência. Analisar-se-á, dentre outros aspectos, as consequências da publicidade como práticas policiais tanto precipitadas como (im)parciais. Ao final, tecemos possíveis alternativas para tal desarmonia. Palavras-chave: violência; publicidade opressiva; presunção de inocência; liberdade de informação. INTRODUÇÃO “Bandido bom é bandido morto”; “tem mais é que prender mesmo”, mensagens como essas são diariamente proferidas por certos leitores de jornais enquanto comentam notícias violentas. Geralmente fatos envolvendo crimes contra a vida -, o discurso sempre termina com frases de intolerância. Não cogitam sequer a possibilidade dos imputados merecerem um julgamento. Devem ir para o cárcere ou (melhor) morrer. Caso diverso, é impunidade. Consoante a proeminência que o tema “mídia” recebe na seara criminológica atual, na celeridade com que as notícias circulam hoje e, consequentemente, na influência jurídico- penal que algumas acarretam, sopesando-se a inércia de nosso Poder Judiciário – se comparado à velocidade da imprensa que excede as fronteiras, torna-se imprescindível uma análise que se caracteriza por abordagem basilar a dogmática crítica. A pesquisa, ao mesmo tempo em que respeitará a nossa Constituição Federal, concernente ao direito à liberdade de imprensa e expressão, cotejará com a presunção de inocência do acusado, para tanto, este artigo constitui, no máximo, uma tentativa de trazer reflexões sobre tal fenômeno, pois o trabalho de análise tenta compreender/conhecer as coberturas jornalísticas ligadas ao crime - não encontrar uma resposta ou a “verdade real” sobre o fenômeno midiático atual. Não se trata, portanto, de uma dissertação para extinguir a imprensa, mas de arriscar-se em buscar aperfeiçoar da narrativa do jornalista até a consciência de suas limitações frente ao editor de texto. Neste caminho, tensionaremos ao máximo para ficar demarcado onde ocorrerá a colisão de princípios fundamentais trazendo o discurso jornalístico opressivo e a sua influência na demanda por punição. Ao mesmo ínterim, o trabalho estrutura-se em três capítulos. No primeiro, conceitua-se como a violência é e sempre foi um fenômeno inerente a qualquer sociedade e como nosso 1 Artigo extraído do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Aprovação com grau máximo pela banca examinadora composta pelo orientador, Prof. Alexandre Wunderlich, pelo Prof. Felipe Cardoso Moreira de Oliveira e pelo Prof. Marcos Eduardo Faes Eberhardt em 06 de dezembro de 2012. 2 Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela PUCRS. Contato: [email protected] ou (51) 97757026.

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A PUBLICIDADE OPRESSIVA NO JORNAL DIÁRIO GAÚCHO: UM ESTUDO DE CASO ACERCA DA VIOLAÇÃO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA1

RODRIGO SCALON2

 RESUMO

Esta pesquisa faz parte de um estudo de caso que versa sobre a publicidade opressiva do

jornal Diário Gaúcho. Busca-se, também, referenciais teóricos na análise da violência contemporânea e compreensão acerca das (anti)técnicas da mídia, sobretudo a imprensa escrita. O exame debruçou-se sobre a compreensão do outro – visto sempre como inimigo e como o espraiamento do medo pela imprensa gera lucro e demanda por lei e ordem. Examina-se, ainda, a discrepância entre o impresso nos jornais e o fato ocorrido que poderá colidir com o princípio da presunção de inocência. Analisar-se-á, dentre outros aspectos, as consequências da publicidade como práticas policiais tanto precipitadas como (im)parciais. Ao final, tecemos possíveis alternativas para tal desarmonia.

Palavras-chave: violência; publicidade opressiva; presunção de inocência; liberdade de informação.

INTRODUÇÃO

“Bandido bom é bandido morto”; “tem mais é que prender mesmo”, mensagens como

essas são diariamente proferidas por certos leitores de jornais enquanto comentam notícias violentas. Geralmente fatos envolvendo crimes contra a vida -, o discurso sempre termina com frases de intolerância. Não cogitam sequer a possibilidade dos imputados merecerem um julgamento. Devem ir para o cárcere ou (melhor) morrer. Caso diverso, é impunidade.

Consoante a proeminência que o tema “mídia” recebe na seara criminológica atual, na celeridade com que as notícias circulam hoje e, consequentemente, na influência jurídico-penal que algumas acarretam, sopesando-se a inércia de nosso Poder Judiciário – se comparado à velocidade da imprensa que excede as fronteiras, torna-se imprescindível uma análise que se caracteriza por abordagem basilar a dogmática crítica.

A pesquisa, ao mesmo tempo em que respeitará a nossa Constituição Federal, concernente ao direito à liberdade de imprensa e expressão, cotejará com a presunção de inocência do acusado, para tanto, este artigo constitui, no máximo, uma tentativa de trazer reflexões sobre tal fenômeno, pois o trabalho de análise tenta compreender/conhecer as coberturas jornalísticas ligadas ao crime - não encontrar uma resposta ou a “verdade real” sobre o fenômeno midiático atual.

Não se trata, portanto, de uma dissertação para extinguir a imprensa, mas de arriscar-se em buscar aperfeiçoar da narrativa do jornalista até a consciência de suas limitações frente ao editor de texto. Neste caminho, tensionaremos ao máximo para ficar demarcado onde ocorrerá a colisão de princípios fundamentais trazendo o discurso jornalístico opressivo e a sua influência na demanda por punição.

Ao mesmo ínterim, o trabalho estrutura-se em três capítulos. No primeiro, conceitua-se como a violência é e sempre foi um fenômeno inerente a qualquer sociedade e como nosso

                                                                                                               1 Artigo extraído do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Aprovação com grau máximo pela banca examinadora composta pelo orientador, Prof. Alexandre Wunderlich, pelo Prof. Felipe Cardoso Moreira de Oliveira e pelo Prof. Marcos Eduardo Faes Eberhardt em 06 de dezembro de 2012. 2 Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela PUCRS. Contato: [email protected] ou (51) 97757026.

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anseio quimérico por segurança cotidianamente não encontra efetividade. Não apenas. Analisa-se como a propagação do medo através dos jornais fomentam o discurso punitivo, pugnando sempre por mais pena e menos direitos.

No segundo, busca-se delimitar e investigar a construção dos discursos jornalísticos de categoria violenta - como foco o jornalismo popular local. Traça-se um paralelo entre a (anti)técnica e seletividade desses discursos que, de fato, são vinculados na maioria das vezes a fase inquisitorial do processo penal. Avalia-se, também, empiricamente com base em dois estudos de casos que repercutiram no cenário midiático nacional, como a aliança entre jornalismo e práticas policiais precipitadas podem causar danos indeléveis aos suspeitos.

No terceiro capítulo, traz-se a lume uma reflexão sobre a transgressão das garantias fundamentais dos casos examinados ante a publicidade opressiva e (im)parcial. Tenta-se, ainda, buscar soluções para tal desiderato, contendo como suporte da discussão a presunção de inocência, que está intrínseca a qualquer imputado de cometer um crime.

1 VIOLÊNCIA E MEDO 1.1 Crime e violência contemporâneos

Em abril de 1997, Galdino Jesus dos Santos, um chefe indígena que estava de visita em Brasília, foi queimado vivo enquanto dormia numa parada de ônibus. Cinco rapazes de boa família, que andavam farreando, jogaram álcool nele e lhe tocaram fogo. Eles se justificaram dizendo: - Pensamos que era um mendigo.3

“Socorro! Um assassinado a cada 13 minutos” – a seguinte mensagem estampava a

capa da Revista Veja em 07.06.2000. Na reportagem especial foi ressaltado que o Brasil estava perdendo a guerra contra o crime.4 O fenômeno da violência é nacional e há décadas estampa as capas dos principais jornais e revistas do país daquela maneira, preenchida de sensacionalismo.

A violência acima de tudo não é sinônimo de criminalidade. Por outro lado, a criminologia não se restringe apenas as características pessoais dos seus autores, mas vai além para compreender o contexto em que está inserido. Todavia, a criminologia “como um espaço privilegiado de produção de saber sobre o crimes e controle social, necessita mergulhar nessa complexa experiência contemporânea de forma a sofisticar seus instrumentos de interpretação”.5

Ruth GAUER aborda a violência6 7 como um tema central das Ciências Criminais. A autora leciona que “a violência é um elemento estrutural, intrínseco ao fato social e não o resto anacrônico de uma ordem bárbara em vias de extinção. Esse fenômeno aparece em todas as sociedades; faz parte, portanto, de qualquer civilização ou grupo humano”.8

                                                                                                               3 GALEANO, Eduardo H. De pernas pro ar. A escola do mundo ao avesso. Porto Alegre. L&PM. 2011. Pág. 101. 4 Fonte: Arquitetura da violência. Disponível em: http://www.uff.br/arqviol/banco_de_dados.html. 5 CARVALHO, Salo. Antimanual de criminologia. Rio de Janeiro. Lumen Juris. 2011. Pág. 35 6 No dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, o emprego da palavra significa: “1. qualidade do que é violento (a v. da guerra) 2. ação ou efeito de empregar força física ou intimidação contra; ato violento (derrubou a porta com v.) 3. exercício injusto ou discricionário, ger. ilegal de força ou de poder. 7 A Organização Mundial de Saúde (OMS) define violência como “uso de força física ou poder, real ou em ameaça, contra si próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha grande probabilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação”. Fonte: http://portal.saude.gov.br/portal/saude/profissional/visualizar_texto.cfm?idtxt=31079&janela 8 GAUER, R.M.C. A fenomenologia da violência. Curitiba. Juruá. 2007. Pág. 14.

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Desse modo, entendemos que a violência9 sempre existiu e sempre existirá. Está presente nos confins mais isolados de nosso mundo pós-moderno. É um fenômeno social. Atualmente nossa sociedade é diariamente compelida com notícias de homicídios, sequestros, extermínios em massa, dentre outros crimes que causam perturbação e, da maneira como são apresentadas pela mídia, espraiam medo e indignação em boa parte da população10 - pois há um discurso policial que justifica a si mesmo e que abastece os jornalistas.

Maria Stela GROSSI PORTO na revista Sociologia da UFRGS em 2002 trouxe dados que corroboram para uma melhor compreensão do que estamos investigando. A pesquisa realizada entre estudantes do ensino fundamental e universitários versava sobre as “Representações Sociais da Violência no DF” e obteve o seguinte resultado correspondente a pertunta abaixo:11

“Em sua opinião, notícias sobre violência ajudam a vender jornais?”12 Dentre os entrevistados, 87% responderam de modo afirmativo, restando 9% negativo e

4% indiferentes. Nesse caminho, considerar que a população em geral é atraída pela violência e os meios de comunicação funcionam como um mecanismo importante para atender a demanda é evidente. Seja no cinema, na televisão ou nos jornais, este fenômeno marca presença e aparece como uma obsessão temática que atravessa os tempos.13 De qualquer modo, podemos gostar ou não, mas a violência apresenta-se como uma realidade acessível por todos. Em suma, a sociedade precisa aprender a conviver e sobreviver com ela ou a ela.14

As rotineiras reportagens que abordam o crime aproxima o leitor do fato mas não discute soluções. O objetivo da mídia certamente não é incentivar atos violentos, mas sim fazer um recorte de uma das suas diversas faces cada vez que as noticia. Torna-se, todavia, essas notícias um tempero na vida de muitos, pois não aconteceram com os mesmos, familiares ou amigos, são leitores/telespectadores.

Michel FOUCAULT no livro História da Loucura analisou as políticas de internamento no século XVIII na Europa e revela que o internamento aparece como uma “paisagem do imaginário”. O autor informou que “o horror que agora cerca as fortalezas do internamento também exerce uma atração irresistível”15 logo, a exclusão e o apartamento físico deflagram fantasias de terror e cobiça.

Para FOUCAULT estas fantasias revelam simbolicamente a nossa adesão subjetiva pela violência,16 deixamos a palavra com o autor:

Esses são os sonhos através dos quais a moral, em cumplicidade com a medicina, tenta defender--se contra os perigos contidos mas muito mal encerrados no

                                                                                                               9 VELHO, Gilberto. Cidadania e violência. Editora UFRJ: Editora FGV. 1996. Pág. 10. 10 “Crime e violência são conceitos de naturezas distintas. O primeiro parte do ordenamento jurídico existente numa dada época em certa sociedade – que explicita os atos puníveis, sejam eles violentos ou não, classifica-os segundo a modalidade e a gravidade, e determina as penas aplicáveis a cada caso. Já o conceito de violência designa um aspecto das ações humanas, sejam elas puníveis ou não, que é a capacidade de causar danos físicos ao próprio agente e/ou a terceiras pessoas.” RAMOS, Silva. Mídia e violência: novas tendências na cobertura de criminalidade e segurança no Brasil. Rio de Janeiro. IUPERJ. 2007. Pág. 154. 11 GROSSI PORTO, Maria Stela. Violência e meios de comunicação de massa na sociedade contemporânea. Sociologias. UFRGS. 2002. Pág. 166. 12 Fonte: Pesquisa sobre “Representações Sociais da Violência no DF”, 1998. 13 CONTRERA, Malena Segura. Mídia e pânico: saturação da informação, violência e crise cultural na mídia. São Paulo. Annablume: Fapesp. 2002. Pág. 89. 14 CONTRERA, Malena Segura. Mídia e pânico: saturação da informação, violência e crise cultural na mídia. São Paulo. Annablume: Fapesp. 2002. Pág. 89. 15 FOUCAULT, Michael. História da loucura na idade clássica. Editora Perspectiva. 1978. Pág. 394. 16 Expressão de Vera Malaguti Batista.

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internamento. Esses mesmos perigos, ao mesmo tempo, fascinam a imaginação e os desejos. A moral sonha conjurá-los, mas algo existe no homem que se obstina em sonhar vivê-los, ou pelo menos aproximar-se deles e libertar seus fantasmas. […] As pessoas sentem prazer em povoar essas noites com inacessíveis prazeres; essas figuras corrompidas e carcomidas tornam-se rostos de voluptuosidade; sobre essas paisagens obscuras, surgem formas — dores e delícias […] O aparecimento do sadismo situa-se no momento em que o desatino, encerrado há mais de um século e reduzido ao silêncio, reaparece, não mais como figura do mundo, não mais como imagem, porém como discurso e desejo.17

Podemos então concluir que muitas pessoas buscavam e sentiam prazer com a violência

e desgraça alheia. Atualmente basta ligarmos a televisão para recebermos uma gama operações policiais e de produções jornalísticas sobre o crime. Se no século XVIII o apartamento físico era motivo de provocar uma atração irresistível, a violência que provém hoje dos televisores e jornais recebe o mesmo tratamento, pois existem programas sobre o “corredor da morte” que entrevista condenados antes de morrerem.

1.2 O medo do outro18

Vive-se uma época onde o medo encontra-se presente no cotidiano das pessoas nas

grandes cidades. Tal sentimento faz com que as pessoas procurem cada vez mais a segurança com cercas elétricas, carros blindados, câmeras de vigilância, bunkers, dentre outros aparelhos ou métodos19 – muitas vezes apresentados por telejornais para alertar e prevenir o telespectador sobre as rotas de fuga para tal desiderato. Assim, o medo da violência passou a fazer parte do cotidiano dos brasileiros.

Um exemplo citado por Eduardo GALEANO20 destaca de uma maneira interessante como o “ensino do medo” emerge nas grandes metrópoles através da mídia. Nossa sociedade celebra toda a vez que um delinquente morre após ser crivado a balas, pois serve como “efeito farmacêutico” para aliviar o incômodo que a atormenta. Não é novidade que o exemplo citado pelo autor uruguaio encaixa perfeitamente no subconsciente de muitos – para não dizer quase todos na sociedade. O medo e a insegurança são suprimidos assim que um criminoso é executado no noticiário, extingue-se o “refugo humano” ou a “sujeira” na qual não pactua com o capitalismo global.21 Como se atualmente existisse uma legitimidade à pena de morte quando o já assassinado era um traficante ou “favelado”.22

José Padilha 23 dirigiu um documentário intitulado “Ônibus 174” que tem como protagonista principal o Sandro Barbosa do Nascimento, um jovem sobrevivente da Chacina da Candelária de 1993, órfão de pais, morava pelas ruas do Rio de Janeiro onde praticava pequenos delitos para manter o vício. Naquela ocasião, como bem narrado no documentário, Sandro não necessitava sequestrar o ônibus, mas apenas assaltar. Com a presença de policiais há algumas quadras, foi interceptado o veículo e a partir deste marco zero o assalto tornou-se

                                                                                                               17 FOUCAULT, Michael. História da loucura na idade clássica. Editora Perspectiva. 1978. Pág. 394 e 395. 18 Expressão utilizada por Löic Wacquant. 19 Vide o documentário “Violência S.A” (2005) que investiga as relações humanas que existem por detrás da violência. Os medos dos quais levam as pessoas a trancarem-se em bunkers e como o medo pode ser rentável. Policiais e especialistas em segurança indicam técnicas de prevenção e possíveis “armadilhas” para escapar dos bandidos nas sinaleiras. Dentre elas, até cogita-se o bizarro uso de guilhotina para cortar as penas do suspeito. 20 GALEANO, Eduardo H. De pernas pro ar. A escola do mundo ao avesso. Porto Alegre. L&PM. 2011. Pág. 81. 21 BAUMAN, Zygmunt. Mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro. Jorge Zahar. 1998. Pág. 27 a 29. 22 “Silvio Cunha, presidente de uma associação de comerciantes do Rio de Janeiro, declarava em 1991: - Quem mata um jovem favelado presta um serviço à sociedade.” GALEANO, Eduardo H. De pernas pro ar. A escolar do mundo ao avesso. Porto Alegre. L&PM. 2011. Pág. 90. 23 Cineasta brasileiro, escritor e autor de filmes como: Ônibus 174 e Tropa de Elite 1 e 2.

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um sequestro. Inúmeras emissoras de jornais, rádios e televisão enviaram suas equipes para registrar o decorrer da trama24 em primeira mão através do “melhor ângulo”, assegurando ainda para o sequestrador um escudo protetor, porque não seria assassinado em rede nacional. As consequências da exclusão social ganharam espaço na mídia e nos lares de todos os brasileiros através do protagonista já estereotipado - e não poderia ser de outra maneira: vilão. Os papéis desde logo foram distribuídos pela mídia: policiais são mocinhos; os reféns são as vítimas; o Sandro é quem estava “fora do seu lugar”25 e não existe nenhum outro motivo a não ser a crueldade. No decorrer do documentário, é feito um levantamento minucioso de dados criminais e pessoais da vida de Sandro.26

Interessante o depoimento de uma das vítimas no documentário onde informa o abismo existente entre os “mundos” de dentro e fora do ônibus.27 Para Luiz Eduardo SOARES, a “invisibilidade do Sandro desaparece quando as câmeras de diversas emissoras estão direcionadas para sua pessoa” (informação verbal).28 Ao final, após um erro grotesco por parte do soldado do BOPE, que dá causa mortis de uma das reféns, Sandro foi assassinado por asfixia pelos policiais mesmo após ser imobilizado. Contudo, a multidão carioca ainda clamava por linchamento, arriscando inclusive invadir a viatura policial para espancar o sequestrador, 29 como narrado pelo diretor: “todos queriam um pedaço de Sandro, um souvenir”(Informação Verbal)30 e por fim, “condena-se o criminoso, não a máquina que o fabrica”,31 mas os “Sandros” continuam pelas ruas sem saber ler e escrever, resultado contínuo de quem nunca teve o mínimo de oportunidade igualitária para existir.

O circo midiático ressaltou, na época, como era inseguro perambular pelas ruas do Rio de Janeiro e a incompetência por parte da polícia,32 sugerindo um maior policiamento na cidade. A glamorização da violência por parte dos meios de comunicação, trouxe aquilo que                                                                                                                24 “O grau de violência dele está ligado diretamente a presença das câmeras. Ele sim estava preocupado em aparecer e mostrar a peça dele” Conforme depoimento do policial do BOPE. 25 Interessante a maneira como Zygmunt Bauman aborda a pureza em seu livro: O mal-estar na pós-modernidade. Bauman avalia como o mundo da pureza e da perfeição não aceita as coisas fora do seu lugar. O que está fora do lugar é traduzido como fora da ordem, e por estar fora da ordem, causam ameaças”. 26 Sua mãe grávida tinha sido assassinada a facadas em sua frete. Esteve diversas vezes detido no Padre Severino – uma instituição para recuperação de menores infratores carioca. Sandro nunca havia cometido homicídio. Adverte uma das psicólogas entrevistadas no documentário que Sandro jamais mataria alguém, pois não era um criminoso violento. 27 Dentro do ônibus o Sandro dizia que não ia matar ninguém, mas obrigou as reféns a encenaram um desespero. Fora do coletivo a impressão era a de um assaltante totalmente descontrolado e na iminência de matar todos, conforme as narrativas dos jornalistas aos arredores do coletivo. 28 Informação contida no documentário Ônibus 174. 29 Até porque “O menor de rua, assim como o mendigo ou o delinquente, colocam em xeque alguns princípios básicos dessa ordem social que tem como objetivo a norma a racionalidade absoluta, e isto de um modo tal que até a desordem deve obedecer padrões racionais” – devem ser suprimidos a todo custo, “pois colocam em risco, a todo momento, a integridade física e moral das pessoas”. GAUER. R.M.C. Obcit. Pág. 77. 30 Informação contida no documentário Ônibus 174. 31 GALEANO, Eduardo. De pernas pro ar. A escola do mundo ao avesso. Pág. 96. 32 A revista Veja na Edição 1.654 de 21/06/2000 publicou o seguinte trecho: “Perto de 35 milhões de brasileiros acompanharam ao vivo na segunda-feira passada o drama dos dez passageiros de ônibus feitos reféns por um criminoso no Rio de Janeiro. As cenas foram levadas ao ar pelas principais redes de televisão do país e pela CNN, que distribui as imagens em todo o mundo. Após quatro horas de agonia, o desfecho mostrou de forma definitiva que ou o Brasil faz uma remodelação completa na sua estrutura de combate ao crime ou a população terá motivos para correr – e não só quando vê um ladrão, mas também quando chega a polícia. Numa ação irresponsável, foi a PM fluminense, e não o seqüestrador, que sentenciou à morte uma das reféns, a professora Geisa Firmo Gonçalves, de 20 anos. Depois, numa atitude covarde, os policiais se vingaram do pivô da tragédia, Sandro do Nascimento, de 21 anos, conhecido pelo apelido de "Mancha". Quando a viatura estava a caminho do hospital, Sandro foi morto por asfixia pelos policiais. É de se perguntar o que mais será preciso acontecer até que se decida enfrentar de forma eficiente a chamada ‘questão da segurança’. Foram cinco tiros, dois golpes de imobilização e um enredo de tragédia. Espera-se que o episódo seja um dia lembrado como o começo do fim de um tempo de barbárie”.– disponível em: http://veja.abril.com.br/210600/p_042.html. Acessado em 07.05.2012.

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BAUMAN chamou de “ubiquidade dos medos” que pode ser propagada pelas lentes luminosas dos televisores.33 Não é necessário sair de casa para que o medo invada nossas vidas através de manchetes alarmistas. Para interagirmos com a violência e não precisarmos sair nas ruas inseguras,34 basta fazermos um exercício e acessarmos redes sociais como facebook e twitter que, de vez em quando, proliferam campanhas na maioria das vezes inúteis e alarmistas, vinculadas a certos casos que foram publicados com sensacionalismo na imprensa, ou seja, a morte televisionada e festejada - menos um. É notório que a mídia desperta no telespectador o seu anseio por punição através do seu discurso, “agregando imagens de apelo fácil, muitas vezes chocantes, ênfase sobre aspectos cruéis da criminalidade urbana violenta, entre outros recursos do gênero. Em razão da perseguição de bons índices de audiência”,35 atrelando ainda, uma “campanha de culpabilização coletiva dos pobres pela violência”.36

Vera MALAGUTI BATISTA fez um mergulho histórico para entender como os medos do passado foram ganhando novos sabores na torturante contemporaneidade.37 A autora procura esclarecer quais eram as demandas por ordem em uma sociedade escravista da época e desemboca em um Rio de Janeiro onde os “autos de resistência” legitimam a matar se a vítima for um suposto traficante.38 Segundo a historiadora:

[...] este ‘novo começo’ permanente, característico da pós-modernidade, constituindo-se em modelo de pureza que, no combate a metassujeira, tem que estar mudando rapidamente, dá a sensação que já nada parece seguro. [...] Se na Europa no século XIX o medo era da revolução, no Brasil e na América Latina esse temor era acrescido pelo fim da escravidão.39

Descortinar qual era o medo da época, para a autora, era de suma importância para

compreender o presente. Naquele contexto, uma rebelião escrava era compreendida como fato criminal e não político. Os advogados das lideranças Malês40 eram quase linchados pelas autoridades locais, devido às revoltas escravas que eram entendidas como atentados às ordens escravistas, ninguém compreendia aquelas rebeliões como algo legítimo e justo naquele contexto.

Informa, também a autora, que ao tomar conhecimento de um jornal intitulado “O Pão D’assucar” do período escravista, desvendou o já existente discurso padrão que tinha sido publicado à época, mas que ecoa até os dias de hoje nas grandes capitais: “termos huma força armada suficiente, que pela sua disciplina, gente escolhida de se compozer, nos inspire confiança e aos escravos infunda terror...”.41 Para MALAGUTI BATISTA isso seria a matriz histórica dos trabalhos de nossas polícias hoje. Inspirar terror nas comunidades pobres e

                                                                                                               33 BAUMAN, Zygmunt. Medo líquido. Rio de Janeiro. Editora Jorge Zahar. 2008. Pág.11. 34 Expressão utilizada por Zygmunt Bauman. 35 MELLO, Silvia Leser de. A cidade, a violência e a mídia. Revista Brasileira de Ciências Criminais. Ano 6. Nº 21. 1998. Pág. 193. 36 MELLO, Silvia Leser de. A cidade, a violência e a mídia. Revista Brasileira de Ciências Criminais. Ano 6. Nº 21. 1998. Pág. 194. 37 Expressão utilizada por Vera Malaguti Batista. 38 MALAGUTI BATISTA, Vera. O medo na cidade do Rio de Janeiro – dois tempos de uma história. Pág. 104. 39 MALAGUTI BATISTA, Vera. O medo na cidade do Rio de Janeiro – dois tempos de uma história. Pág. 84. 40 Termo usado no Brasil no século XIX para designar os negros muçulmanos que sabiam ler e escrever em língua árabe. Os malês possuíam um nível cultural superior, se comparados aos brasileiros da época: eram bilíngues e alfabetizados em árabe. Inconformados com a condição de escravos, articularam vários levantes que desaguaram no maior deles durante o Ramadã (mês de jejum islâmico) em Salvador, 1835. 41 MALAGUTI BATISTA, Vera. O medo na cidade do Rio de Janeiro – dois tempos de uma história. Pág. 192. Apud. O pão d’assucar. Nº 27. Rio de Janeiro, 7 de abril de 1835.

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segurança para as elites. Informa ainda MALAGUTI BATISTA que:

O projeto de construção da ordem burguesa no país se deparou sempre com o medo da rebeldia negra [...] No censo de 1849, o Rio de Janeiro tem a maior população escrava urbana das Américas. A preocupação com a segurança se traduz em todos os níveis [...] Esta cidade imprevisível da medo, produz o temor da mobilização contínua e as estratégias de suspeição generalizada. É através dessas estratégias que o medo branco engendra a cidade-armadilha com a sua paranoia da defesa da propriedade42.

Consoante a “defesa da propriedade” destacada pela autora, basta abrirmos nosso

Código Penal para percebermos como os crimes contra o patrimônio ganham uma proteção muito particular.43 Estamos a falar que hoje discutimos questões ligadas ao medo e violência ventiladas pelo viés policial e penal, produzindo uma demanda cada vez maior por um estado de polícia, tornando o direito penal a prima ratio quando deveria ser ultima ratio para soluções de conflitos. 44 Daí o porquê WERMUT ao estudar essas questões, coopera informando que:

A formação da opinião pública pelos meios massivos de comunicação acerca dos medos, da insegurança e da necessidade de afastá-los por meio da intervenção do sistema punitivo deságua na pressão popular sobre os poderes públicos para que as reformas penais necessárias para fazer frente à “cada vez mais aterradora criminalidade” sejam efetivamente levadas a cabo.45

Embora todo o midiatismo, como já informado, facilita a compreensão e procura

conscientizar as pessoas do que está acontecendo próximo ou não de suas moradias, para Jock YOUNG:

Os meios de comunicação de massa exibem uma pletora de imagens de criminalidade e desvio coletadas em todo mundo. Essas mercadorias de mídia são caracterizadas como notícia, por sua natureza atípica – são “notícias” porque surpreendem e chocam. Em sua quantidade esmagadora e característica berrante, elas devem sem dúvida causar um “medo” da criminalidade desproporcional ao risco real.46

Se desde a infância o medo está intrínseco nas histórias infantis,47 logo, desde crianças

começamos a ter uma visão do bom e mau sob uma ótica maniqueísta. É crucial provocar medo no ser humano para obedecer às ordens. A Revista Brasileira de Ciências Criminais em 2005 publicou o artigo: “Você tem medo de quê?” de autoria da Vera MALAGUTI BATISTA já citada no presente artigo, aonde fez uma análise dos discursos que associam as vitórias populares ao caos e a desordem.                                                                                                                42 MALAGUTI BATISTA, Vera. O medo na cidade do Rio de Janeiro – dois tempos de uma história. Pág. 36 43 Vide artigo 157 §3 segunda parte do Código Penal que corresponde ao latrocínio. Pena abstrata de 20 a 30 anos. 44 Chegou até a câmara dos deputados no início de 2006 um projeto de lei que restringia a liberdade provisória para presos condenados por crimes hediondos. Após o clamor midiático e a comoção que tomou conta do País com a morte do guri João Hélio com 6 anos. Em 07 de fevereiro de 2007 a votação foi aprovada por unanimidade. Ainda, cogitou-se, após o fato, a redução da menoridade penal. 45 WERMUTH, Maiquel Ângelo Dezordi. Medo e Direito Penal. Livraria do Advogado. Porto Alegre. 2011. Pág. 53 46 YOUNG, Jock. A sociedade excludente. Coleção pensamento criminológico. Rio de Janeiro. Editora Renavan. 2002 Pág. 49. 47 PINHEIRO, Paulo Sérgio. Prefácio da Obra: GLASSNER, Barry. Cultura do Medo. Trad. Laura Knapp. São Paulo: Francis. 2003. Pág. 11.

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Para MALAGUTI BATISTA a propagação do medo serve somente para detonar estratégias de controle da classe pobre nas grandes cidades. O medo anestesia. Não se questiona os porquês da violência em uma sociedade desigual e rigidamente hierarquizada, mas roga-se por mais pena, menos garantias no combate aqueles que ameaçam a ordem nas cidades brasileiras, perdendo-se cada vez mais na poeira o debate sobre das questões nodais da história do Brasil: igualdade, liberdade, acesso à terra enfim, direitos.48 Finaliza a autora, nos ensinando que “devemos nos opor a esta modernidade da sociedade do controle, desse capitalismo que descarta o trabalho, que precisa brutalizar e criminalizar a pobreza que ele mesmo mantém e gera. [...] E é por isso que nós do neoliberalismo, temos de nos perguntar: afinal nós temos medo do quê?”.49

2 A PUBLICIDADE OPRESSIVA NO DIÁRIO GAÚCHO: EXAME DE CASO

Alexandre MORAIS DA ROSA na sua tese de doutorado intitulada “Decisão no

Processo Penal como Bricolage de Significantes”50, para nosso deleite, dedica um capítulo aos famosos sangue-show51 conduzidos por jornalistas que remetam a ideia do “pão e circo” dos tempos primórdios, ligados à fascinação pela barbárie, i.e., que está presente nos subconscientes das pessoas.52 Afirma o autor, que os programas “escorre sangue” merecem um destaque principal, pois mesclam a vida real com ficção (jornalismo + novela) 53 e culminam totalmente com o princípio de presunção de inocência do suspeito – gerando ainda efeitos irreversíveis em sua vida.54

Partindo dessa linha de fascínio pela tragédia, podemos nos unir ao pensamento de ANGRIMANI que explicaria da seguinte forma como a notícia violenta agiria no consciente do telespectador:

Há, no propósito editorial sensacionalista uma descarga sádica, uma violência, um prazer na destruição, que provoca reações semelhantes no leitor [...] No papel de superego sádico, o jornal (também o radiojornal e o telejornal) sensacionalista age como um educador, proibindo e castigando, mas também com propósitos mais cruéis: há humilhação, domínio, (controle sobre o objeto) e uma perspectiva de quem quer ferir, causar dor.55

                                                                                                               48 MALAGUTI BATISTA, Vera. Você tem medo de quê?. Revista Brasileira de Ciências Criminais. Nº 53. Ano 2005. Pág. 47. 49 MALAGUTI BATISTA, Vera. Você tem medo de quê?. Revista Brasileira de Ciências Criminais. Nº 53. Ano 2005. Pág. 47. 50 MORAIS DA ROSA, A. Decisão no Processo Penal como Bricolage de Significantes. Curitiba. 2004. Versão tese disponível no site: http://tjsc25.tj.sc.gov.br/academia/cejur/arquivos/decisao_processo_penal_alexandre_rosa.pdf. Pág. 234. 51 Expressão utilizada por Alexandre Moraes da Rosa para caracterizar programas de televisão onde a morte é a principal protagonista. A desgraça alheia é o principal tempero dos programas. Vide: Balanço Geral, Brasil Urgente, SBT Rio Grande, Aqui Agora (já fora do ar), Linha Direta (já fora do ar), Você Decide (já fora do ar). 52 Vide Michael Foucault – Vigiar e Punir e História da Loucura. 53 Um programa que poderia estar enquadrado nesta categoria já não encontra-se mais no ar. Era o famoso ‘Linha Direta’ pertencente a Rede Globo e para Alexandre Morais da Rosa em sua tese Decisão no Processo Penal… Pág. 236. “Dentro da lógica da ‘Defesa Social’, o programa se enquadra ‘perfeita-mente’, dado que possibilita achar que o vizinho ou o garoto da esquina são o ‘bandido fugitivo’ e quando, enfim, ele é preso, respira-se aliviado: ‘menos um malvado solto’. 54 MORAIS DA ROSA, A. Decisão no Processo Penal como Bricolage de Significantes. Curitiba. 2004. Versão tese disponível no site: http://tjsc25.tj.sc.gov.br/academia/cejur/arquivos/decisao_processo_penal_alexandre_rosa.pdf. Pág. 236. 55 ANGRIMANI SOBRINHO, Danilo. Espreme que sai sangue: Um estudo do sensacionalismo na imprensa. 1995 (Coleção Novas Buscas em Comunicação, vol. 47); Pág. 78.

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Assim, todo o anseio por punição dos culpados de determinado crime, i.e., os mass media se valem de estratégias sensacionalistas com o intuito de impressionar o seu público e também instigar nele o sentimento de punir os suspeitos. Isto porque a sociedade cria estereótipos de que a criminalidade e a tragédia marcam presença somente nas classes baixas e sendo assim, noticiários apelativos – que se distanciam da objetividade e da imparcialidade, próprias das normas jornalísticas – são produzidas para o público popular e carente de instrução cultural. Nesse caminho, os telespectadores tendem a “busca pela justiça”56 e os meios de comunicação servem como baluartes e ratificam este comportamento como correto, quando estimulam as ações da massa, ou ainda, aduzem à narrativa do jornal um certo tempero de punição ao suspeito, pois “as grandes mídias são hoje obstáculo e não instrumento, para o debate democrático”57. Para Löic WACQUANT:

[…] as mídias contribuem para alimentar a sensação de que a delinquência, como uma maré, sobe inexoravelmente. Para em seguida ‘constatar’ essa sensação e nela ver a comprovação empírica do crescimento irresistível da criminalidade a partir da qual criam suas manchetes e o instrumento do aumento de suas vendas.58

Ignácio RAMONET deixa muito bem evidenciado que a imprensa foi indispensável

para a transição de um sistema autoritário para a democracia.59 A informação antes de tudo é uma mercadoria e essa ideia deve prevalecer para fortalecer o debate democrático60 - disso não olvidamos. Mas, o autor também descreve como a supermidiatização61 às vezes não significa boa informação.

Para exemplificar, pegamos a morte da Princesa Daiana que gerou pelo mundo a fora milhares de manchetes em jornais e mais de 2 milhões de telespectadores acompanharam o seu funeral. Para RAMONET, “na maioria dos países, a morte de Daiana foi chorada, mas não se tinha qualquer idéia do que ela podia dizer ou pensar. Em última análise, isto não era importante. Era uma desgraça acessível, que nos permitiu livrar-nos de toda uma angústia”62 – comparamos essa situação de “desgraça acessível” aos casos que provocaram um furacão nos meios de comunicação brasileiros.63

Dentro dessa intrincada lógica que a mídia diariamente produz suas notícias a violência urbana. Não existe filtro nem barreiras para a velocidade e o sensacionalismo64 com que

                                                                                                               56 Exemplos de desatinadas buscas pela ‘justiça’ são os casos: Isabela Nardoni, Suzane Von Richtoffen e Lindemberg Alves, onde multidões acamparam em frente aos respectivos foros para, dentro do possível, fazer parte do ‘julgamento’ e vibrar ao final com a pena proferida pela magistrada. 57 MALAGUTI BATISTA, Vera. Prefácio do livro Punir os pobres: a nova gestão da miséria nos Estados Unidos de Löic Wacquant. 2001. 58 WACQUANT, Löic. As prisões da miséria. Pág. 71. 2001. 59 Fazendo uma alusão a George Orwell e Adouls Huxley contra progresso de um mundo administrado pela polícia do pensamento. 60 RAMONET, Ignácio. A tirania da comunicação. Editora Vozes. Petrópolis. 1999. Pág. 3. 61 O autor traz em seu livro dois acontecimentos: A morte de Lady Di e o caso Clinton-Lewinsky que detonaram os maiores desencadeamentos de notícias da história dos meios de comunicação. Para o autor: “A imprensa britânica - a mais competitiva do mundo com onze jornais nacionais e nove jornais dominicais engajados numa luta sem piedade de todos contra todos, e onde todos os golpes são permitidos (baixa do preço de venda, prêmios promocionais, compra de confidências, etc.) atingiu, nos dias subsequentes á morte de Diana, recordes de vendas: The Sun, por exemplo, vendeu 3,9 milhões de exemplares; The MirroR; 2,4 milhões; The Daily MaIL 2,3 milhões, e The Daily Telegraph 1,1 milhão”. 62 RAMONET, Ignácio. A tirania da comunicação. Editora Vozes. Petrópolis. 1999. Pág. 5. 63 O caso Isabela Nardoni, Lindemberg Alves, João Hélio, Caso Jacson Nauta de Quadros e Caso Wanuzi Mendes Machado 64 DINES, Alberto. Sensacionalismo na imprensa. Comunicação e Artes. Uma semana de estudos sobre sensacionalismo. São Paulo. Número 4. 1971. Página 67-75. O autor divide o sensacionalismo em três grupos distintos. Primeiro: o gráfico – dirigido ao público que não estão acostumados a ler. Privilegia letras em formatos

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matérias ligadas à criminalidade sejam editadas pela busca da credibilidade, venda e audiência, v.g., o escândalo Gugu-PCC (Primeiro Comando da Capital).65 A intensidade do espetáculo ‘violência’ e a repercussão midiática antecipa, muitas vezes, a culpabilidade e joga o acusado no cadafalso para exposição a curiosidade e clamor público, 66 que por consequência ecoará na sua presunção de inocência e no direito a ter um julgamento imparcial, pois os “meios de comunicação não são neutros [...] Os leitores também não são neutros. Os meios de comunicação de massa são os nossos olhos e ouvidos, permitindo o nosso contato com o mundo dos acontecimentos”.67

Por tudo isso, neste capítulo, será necessário analisar dois casos de destaque sob a ótica de um leitor comum, afastado das normas constitucionais e infra-constitucionais, pois somente assim poderemos compreender as particularidades de cada caso nesse momento. Utilizaremos, então, um estudo básico e investigativo que limitar-se-á ao jornal popular de Porto Alegre: o Diário Gaúcho.

2.1 O Jornal Diário Gaúcho

O Diário Gaúcho68 (daqui pra frente chamaremos de “DG”) pertence ao Grupo RBS

(Rede Brasil Sul de Comunicação) de jornalismo. É destinado às classes B e C que residem na capital, grande Porto Alegre e principais cidades do Estado, autointitulado como “o jornal da maioria” tem como principal foco reportagens sobre polícia e futebol.69

O jornal segue o estilo dos periódicos sensacionalistas britânicos (tabloides), com títulos coloridos ou em destaque e que são apresentados em formatos populares da nossa língua. Segundo a Associação Nacional dos Jornais, o DG foi eleito como destaque no 5º Congresso

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                         grandes e com resumo da matéria. O linguístico – deriva das palavras que ganham destaque e que provocam sensações no leitor. E por último o temático – está atrelado às reportagens que vendem. 65 No feriado de 7 de setembro de 2003, o programa Domingo Legal do SBT apresentado por Gugu Liberato, exibiu uma entrevista gravada com dois membros do PCC. Os integrantes ameaçaram diversos jornalistas, policiais e, inclusive, o ex-prefeito de São Paulo. Cerca de 10 dias depois, os jornalistas envolvidos na trama acabaram confessando que tudo se tratava de uma farsa. Em 11 de novembro de 2003, a juíza da 2ª Vara Criminal de Osasco, Izabel de Castro, solicitou a polícia indiciar formalmente Gugu Liberato, o chefe de reportagem, o repórter, o produtor e dois atores do Domingo Legal, para responderem pelos crimes de imprensa e de ameaça. Fontes: http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2003/09/263558.shtml. Acessado em: 15.07.2012. Ainda, sobre o tema, Marcos Rolim na sua coluna entitulada “A mídia e o crime” na Zero hora de 05/10/2003. Pág. 17 – escreveu que: “A farsa promovida pelo programa do Gugu no SBT deveria permitir à mídia brasileira uma crise de lucidez.[…] os responsáveis agiram de forma condenável não apenas porque ‘montaram’ a entrevista, mas também porque decidiram explorar o medo. A iniciativa, assinala-se, é coerente com o discurso tipo ‘Lei e Ordem’ pelo qual costuma-se insistir em temas como ‘a ousadia dos bandidos’, ‘providências enérgicas’, ‘penas mais graves’, etc.” 66 Pertinente ao tema, no dia 04.01.2012 no programa Conversas Cruzadas da TVCOM, após a repercussão do caso da modelo que causou o acidente com vítimas em Xangri-lá, a enquete do programa perguntava o seguinte: Motorista bêbado, sem carteira de habilitação que causa acidente com vítima deve ir para a cadeia? 96% dos telespectadores votaram que sim. Após todo o aparato jornalístico que foi montado na Estrada do Mar captando as melhores imagens dos automóveis destruídos agregado a repercussão midiática e apelos por justiça em redes sociais, quer dizer, para 96% dos telespectadores deve ser suprimido a mínima possíbilidade investigação policial, ampla defesa, presunção de inocência, devido processo legal e enviar ao cárcere. 67 MELLO, Silvia Leser de. A cidade, a violência e a mídia. Revista Brasileira de Ciências Criminais. Ano 6. Nº 21. 1998. Pág. 193. 68 Em média, 150.000 (cento e cinquenta mil) exemplares do DG são distribuídos diariamente no estado. Fica acirrada a disputa pela segunda colocação entre DG e Correio do Povo. A ZH fica como detentora de maior tiragem. 69 Fonte: http://www.gruporbs.com.br/midias/index.php?pagina=jornal. Acessado em 20.05.12.

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de Jornais Populares ocorrido em 2011.70 Não existia, até o ano 2000, um jornal que trabalhasse sobre a fórmula crime-fofoca-esporte. Ademais, o DG, sempre premiou os leitores com utensílios domésticos - completando uma espécie de cartela com os selos anexados no diário durante o mês. Cada mês sempre foi um prêmio diferente.

Para realizar os objetivos deste capítulo, nos aliaremos a Ana Rosa Ferreira DIAS que servirá como um norte a ser seguido, pois sua tese71 tem como material de pesquisa o já extinto jornal “Notícias Populares”72 que muito tem em comum com o DG. Deixemos a palavra com a autora, por coincidir integralmente com a proposta do nosso jornal de análise

Quanto a conquista do público leitor, desenvolveu-se a estratégia do sensacionalismo no tratamento do fato noticioso aliado a um particular procedimento de venda e circulação do jornal. Por não trabalhar com esquemas de assinaturas, o sucesso das vendas precisava ser garantido diariamente e, nesse sentido, a formulação da manchete, como recurso de apelo à atenção, mereceu sempre cuidados especiais. Em resumo, visava-se à criação do impacto e à consequente compra por impulso. Com relação a distribuição do jornal, previu-se que o mesmo custaria menos que os demais; que, além das vendas nas bancas, valer-se-ia de jornaleiros ambulantes para oferecê-lo nas portas das fábricas e em bairros específicos [...] Os títulos grandes, sem a contrapartida noticiosa, a fragmentação exagerada [...] O que caracteriza o leitor de jornais como [DG] Notícias Populares é, não só o interesse por certos temais determinados (crime, sexo, esportes, etc.), bem mais restritos, mas também o fato de serem consumidores de opinião, ou seja, de assumirem a posição do jornal como um dado de fato, isto é, acharem o que leem corresponde a verdade.73

Existem notícias que sempre serão alvo favorito do sensacionalismo, como o “sangue e

sexo, o drama e o crime sempre fizeram vender, e o reino do índice de audiência devia alçar a primeira página, à abertura de jornais televisivos”.74 Notícias como essas sempre renderam muitas capas do DG, seguidas de reportagens em cadernos específicos. Nesta mesma esteira, a imprensa popular deverá informar como sendo leitor popular. Já que está intrínseca aos coloquialismos da linguagem, deverá então dirigir-se para o povo de uma maneira que possa dirimir as expectativas de leitura.75 Não é necessário um aprofundamento na matéria lida, mas um entendimento instantâneo da notícia que são do seu interesse e cotidiano.76 Por isso, “as manchetes merecem cuidados especiais porque delas depende o sucesso da venda do jornal, sendo necessário, portanto, motivar o leitor e facilitar o entendimento”.77

Nesses termos, coloca-se praticamente impossível o jornalista conceber e aprender tal fenômeno sem ter o mínimo de investigação e conhecimento sobre o tema. Saber suas causas, mais do que crucial, é informar ao leitor de uma maneira clara e precisa o acontecimento.

                                                                                                               70 Fonte: Associação Nacional dos Jornais. http://www.anj.org.br/sala-de-imprensa/noticias-dos-associados/diario-gaucho-e-destaque-do-5o-congresso-de-jornais-populares/?searchterm=Diário%20Gaúcho. 71 DIAS, Ana Rosa Ferreira. O discurso da violência – as marcas da oralidade no jornalismo popular. São Paulo. EDUC - PUCSP. 1996. 72 O jornal que mais exagerou no caso da “escola base”. Responsável pela capa sensacionalista muito conhecida no meio acadêmico dos estudantes de Direito publicando: “Kombi era motel na escolinha do sexo”. 73 DIAS, Ana Rosa Ferreira. O discurso da violência – as marcas da oralidade no jornalismo popular. São Paulo. EDUC - PUCSP. 1996. Pág. 23-30. 74 BOURDIEU, Pierre. Sobre a televisão. Tradução Maria Lucia Machado – Rio de Janeiro. Zorge Zahar. Ed. 1996. Pág. 22. 75 DIAS, Ana Rosa Ferreira. O discurso da violência – as marcas da oralidade no jornalismo popular. São Paulo. EDUC - PUCSP. 1996. Pág. 108. 76 DIAS, Ana Rosa Ferreira. O discurso da violência – as marcas da oralidade no jornalismo popular. São Paulo. EDUC - PUCSP. 1996. Pág. 108. 77 DIAS, Ana Rosa Ferreira. O discurso da violência – as marcas da oralidade no jornalismo popular. São Paulo. EDUC - PUCSP. 1996. Pág. 62.

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Como é sabido, inexiste a objetividade jornalística, Kleber MENDONÇA informou sobre esse assunto e nos ensina que “uma vez que o sujeito se constitui – e, neste momento, toma necessariamente partido no momento que escreve (ou fala). A própria escolha do que é ou não é um ‘fato’ já pressupõe obrigatoriamente um julgamento...”.78

O jornalismo, definitivamente, somente existe devido ao fato novo. O inédito que poderá ocasionar uma surpresa no seu leitor.79 Uma manchete somente faz sentido quando se encaixa em perfeito sincronismo com o ainda não deparado pelo seu consumidor. O procedimento jornalístico, então, é destacar o raro, o imprevisível, o caos80 – seja ele aparente ou verdadeiro – isso é notícia.81 O novo é o pedestal de toda a prática jornalística.

Assim, a partir de ingressar nesses dois casos poderemos testar os limites das teorias já informadas, logo, a questão central passará a ser enfrentada de maneira empírica. Faremos então uma rápida cronologia sobre esses dois casos que trazem excelentes condições para pesquisarmos a prática jornalística. Auferiremos, nesse sentido, uma maior ilustração como, de fato, a violência ao ser publicada de forma parcial, atropela as garantias constitucionais e as consequências são, para os suspeitos, indeléveis.

2.1.1 Caso Wanuzi Mendes Machado

Em 05.08.2011, 39 pessoas foram internadas sob suspeita de envenenamento na Escola Estadual Doutor Pacheco Prates da Zona Sul da Capital. No entanto, não havia suspeitos.

Na manhã seguinte, em 06.08.2011, chegaram às bancas e pontos de sinaleiras em Porto Alegre e Região Metropolitana exemplares do DG que estampavam na capa a suspeita Wanuzi Mendes Machado, após admitir ter misturado veneno na comida. A manchete seguia o padrão para chamar a atenção dos seus leitores. Conforme a notícia: “Merendeira pôs veneno na comida” remetia a uma ideia conclusiva de autoria e, também, foi decretada a sua prisão preventiva.

Sabendo que, a confissão quando concebida como a prova cabal de autoria sobre determinado crime, remetemo-nos a Nicolas EYMERICH e o seu Manual dos Inquisidores que informa seguinte:

Logo que um acusado confesse o crime pelo qual foi entregue à Inquisição, torna-se inútil conceder-lhe Defesa, embora nos outros Tribunais a confissão do criminoso seja insuficiente: a não ser que não exista um corpo de delito perfeitamente constatando a matéria de heresia. Apenas com a confissão do Inculpado, pode proceder-se à condenação; visto que, sendo a heresia um crime do espírito, muitas vezes não pode ser comprovado senão através da confissão do Culpado.82

                                                                                                               78 MENDONÇA, Kleber. A punição pela audiência: um estudo do Linha Direta. Rio de Janeiro. Quartet. 2002. Pág. 29. 79 YOUNG, Jock. A sociedade Excludente. Coleção pensamento criminológico. Rio de Janeiro. Editora Renavan. 2002. Pág. 189. “A chave para o interesse e a qualidade da notícia é, como disse numa outra ocasião, o atípico: aquilo que surpreende, que está em contraste com a presumida “normalidade” cotidiana (ver Young, 1971 a; Cohen e Young, 1981). Não é de supreender que criminólogos e estudantes venham se interessando pelo lado negative do atípico: vilões, assassinos em série, demônios populares e outros monstros. […] É exatamente os mesmos processos de seleção, ênfase e construção de notícias ocorrem aqui, como no lado escuro da existência humana. Assim, embora ondas de crimes sejam um dos pratos principais da imprensa, as curas “milagrosas” da criminalidade também são (sejam elas suplementos alimentares, circuitos fechados de televisão, Vigilantes do Bairro, teste de DNA ou tolerância zero em Nova Iorque). Pânicos e panacéias morais andam lado a lado, e constituem o estoque diário das coberturas noticiosas. 80 Expressão utilizada por Leão Serva, nos capítulos “O caos e os jornais” no livro já supracitado. 81 SERVA, Leão. Jornalismo e desinformação. São Paulo. Senac. 2005. Pág. 49-50 82 EYMERICH, Nicolas. Manual dos inquisidores. Lisboa. Editora Afrodite. 1972. Pág. 51.

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Ainda sobre a confissão, segundo FOUCAULT em Vigiar e Punir: nascimento da prisão, é de suma importância a confissão do suspeito, obtida mediante tortura, bem como tal procedimento ilustra uma vitória do poder estatal sobre o indivíduo, que deverá reconhecer o seu erro na prática do delito.83 A notícia de que a merendeira admitiu o crime é, para a população, o retrato do fato como ele realmente aconteceu – publicado no jornal. E essa ideia “nasce junto com a própria atividade jornalística. Como sugerem os demais jargões do tipo ‘testemunha ocular dos fatos’ ou ‘a verdade dos fatos, doa a quem doer’. Tudo se passa como se o ‘fato’ fosse um troféu caçado pelo bom jornalista”84. José ARBEX JÚNIOR, no seu livro “Showralismo – a notícia como espetáculo”, perguntou para vinte jornalistas dentre os seus diversos níveis de carreiras: “o que é notícia?” e “todos afirmaram com convicção que notícia é a narrativa do fato, e que a notícia mais “verdadeira” é aquela que mais fielmente “retrata o fato”85. Não é a intenção discutir o que é verdade, i.e., há mais de dois mil anos ela é tema de incansáveis debates filosóficos e jurídicos. O caso em epígrafe ganhou repercussão em sede nacional. O jornalista e apresentador do Brasil Urgente, José Datena, resolveu entrevistar a acusada.86 Negando a autoria do fato e informando ao jornalista que havia sido torturada na delegacia para confessar e, segundo a entrevista, foi coagida atráves de ameaças que citavam seu filho87 - “tortura-se o acusado, com o fim de o fazer confessar os seus crimes”,88 EYMERICH já havia escrito. Nesse rumo, a apresentadora Fátima Bernardes do Jornal Nacional ao anunciar no sábado (06.08.2011) que: "está foragida a merendeira que pôs veneno de rato na comida de crianças e professores de uma escola pública de Porto Alegre",89 cometeu um erro grosseiro ao esquecer de ouvir a defesa, rasgando com a ética do jornalismo. Oito horas antes de o Jornal Nacional ir ao ar, o advogado de Wanuzi negava tal informação -, bastava acessar o google e, também, o defensor deu entrevista à Rádio Gaúcha onde informou que “em hipótese alguma ela confessou esses fatos para o delegado de polícia. É, que, o delegado de polícia numa ânsia, que numa ansiedade que ele estava em dar uma satisfação para a sociedade, induzia ela a dizer o que ele queria ouvir”.90 Ainda, o seu advogado, Leandro Pereira, em 08.08.2011 impetrou um Habeas Corpus91 junto à segunda câmara criminal. A ação de impugnação interposta pelo advogado da paciente foi, em unanimidade, denegada. Conforme o seu voto, o desembargador relator, de maneira muito conexa ao tema proposto por esse artigo, salientou que “tal fato repercutiu não só na comunidade envolvida, como também, ganhou forte apelo através das notícias veiculadas pela imprensa regional e nacional, causando revolta e clamor social…”.92

                                                                                                               83 FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. Vozes. Petrópolis. 1987. Pág. 59. “O interrogatório é um meio perigoso de chegar ao conhecimento da verdade; por isso os juizes não devem recorrer a ela sem refletir. Nada é mais equívoco. Há culpados que têm firmeza suficiente para esconder um crime verdadeiro...; e outros, inocentes, a quem a força dos tormentos fez confessar crimes de que não eram culpados.” 84 ARBEX JÚNIOR, José. Showralismo: a notícia como espetáculo. São Paulo. Casa Carmela. 2001. Pág. 104-105. 85 ARBEX JÚNIOR, José. Showralismo: a notícia como espetáculo. São Paulo. Casa Carmela. 2001. Pág. 105. 86 http://www.youtube.com/watch?v=JevsOy6z0JM. Acessado em 03.06.12. 87 O próprio apresentador comete um erro ao confundir a revogação do mandado de prisão com a revogação da prisão. Também errou ao atribuir a rejeição da denúncia à suposta convicção judicial de que Wanuzi não envenenou a merenda. 88 EYMERICH, Nicolas. Manual dos Inquisidores. Lisboa. Editora Afrodite. 1972. Pág. 63. 89 Disponível em: http://youtu.be/i9VMh_j8mMM. Acessado em 15.07.2012. 90 Disponível em: http://youtu.be/i9VMh_j8mMM. Acessado em 15.07.2012. 91 Número: 70044336105 92 BRASIL. Estado do Rio Grande do Sul. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul – Comarca de Porto Alegre. Habeas Corpus nº 70044336105.... Pág. 07.

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Em 18.08.2011, o delegado responsável pelo caso concluiu o inquérito policial indiciando Wanuzi a 40 tentativas de homicídio qualificado. Seu advogado, solicitou uma cópia do áudio e vídeo do seu depoimento. Informou ainda, ao DG, que desconhecia o paradeiro de sua cliente e mesmo que soubesse não informaria, pois até mesmo as detentas do Madre Pelletier estavam ameaçando-a. Destarte, o processo93 que tramita na 1ª Vara do Júri de Porto Alegre teve a denúncia rejeitada. A manchete ganhou metade de uma página no DG em 14.09.2011 ao contrário da qual, quando a merendeira admitiu o delito que recebeu a capa do jornal. O Juiz da Primeira Vara do Júri, Leandro Raul Klippel, rejeitou a denúncia com base no artigo 17 do CP combinado com o artigo 395, inciso II, do CPP94 – conforme a sua conclusão em 12.09.2011. Muito importante ressaltar que na reportagem onde a denúncia é rejeitada, não foi especificado os motivos penais e processuais que embasaram a fundamentação do magistrado, que atuou de maneira singular. Como se não fosse importante para o leitor entender o que ocorreu na seara jurídica para o direcionamento do caso. Ainda assim, podemos acreditar de maneira pessímista, que o publicado no “chapéu” da página nos conduz à ideia de ineficiência da polícia – mesmo com a confissão não foi possível enviar ao cárcere. Ademais, todas as publicações feitas pelo jornal acabaram caindo por terra. A polícia prende e a justiça solta, diriam muitos ao ler a manchete do dia 12.09.2011 - o que é uma inverdade. A assunção do desatino caracterizado no fomento sobre o caso pelos meios de comunicação, não deveria ser atribuída a imputada, já que o clamor público e o assédio são alienígenas à Wanuzi Machado. Günter WALLRAFF dedicou o seu livro “Fábrica de Mentiras” a um jornal alemão chamando “Bild” – um tablóide diário com sede em Berlim. O jornal mistura fofoca de celebridades com histórias criminais. Acusado inúmeras vezes de enxertar o sensacionalismo em suas notícias para aumentar o seu número de leitores, o autor evidenciou como funcionava um jornal que é “uma oficina de mentiras” - logrando ainda com a “arte de deformar a realidade”. Destacamos a posição do autor:

Impresso é tudo aquilo que faz aumentar a tiragem – mesmo que, por acaso, seja verdade. E não impresso é tudo aquilo que não ajuda vender. Um príncipio clássico, simples e, ao mesmo tempo, de utilidade universal. Numa época em que se vive com pressa, exige-se um jornalismo rápido, muito rápido. […] Se os leitores acreditam ou não em tudo que se publica, não tem menor importância, desde que continuem comprando o jornal.95

O caso da merendeira, Wanuzi Mendes Machado, é a prova mais concreta de quando a

ausência de conhecimento do jornalista sobre o caso investigado pode acarretar numa exposição midiática precipitada seguida de erros por todos os lados. O jornalista está ligado diretamente ao delegado e boletins de ocorrência, ou seja, na fase inquisitorial da investigação preliminar. Torna-se, o jornalista, imprudente ao explicitar juízos de valores nessa fase de inquirição.

Como já arrolado, mesmo confessando o crime a suspeita goza de garantias constitucionais e processuais que devem ser respeitadas. No caso examinado, os jornalistas tiveram uma atitude mais crítica do que o normal, aliaram-se à uma única fonte policial para ressaltar o absurdo da situação contextualizando o fato mais do que fariam normalmente, só que esquecerem do lado da defesa.

                                                                                                               93 Processo: 001/2.11.0085672-0 94 Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal. 95 WALLRAFF, Günter. Fábrica de mentiras. Tradução de Carmen Fischer. – 2 ed. – São Paulo: Globo. 1990. Pág. 131.

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Com relação ao “clamor social” usado como fundamento da prisão preventiva, SANGUINÉ nos informa que é “inconstitucional atribuir à prisão preventiva a função de acalmar o alarma social ocasionado pelo delito, pois, por muito respeitáveis que sejam os sentimentos sociais de ‘vingança’, a prisão preventiva não está concebida como uma pena antecipada que possa cumprir fins de prevenção”.96 Por esse ângulo, segue ainda o autor nos conduzindo a um caminho legítimo que serve como válvula de escape para esse clamor social:

Essa espécie de “sede de vingança” coletiva que alguns parecem alentar por desgraça em certos casos aflora - não pode ser a prisão preventiva, encarcerando por qualquer motivo e o maior número possível dos que prima facie apareçam como autores dos fatos delitivos, mas uma rápida sentença sobre o mérito, condenando ou absolvendo, porque somente a decisão judicial prolatada em um processo pode determinar a culpabilidade e a sanção penal.97

De outro lado, o público que compra o jornal tem curiosidade de acompanhar o

desfecho da trama e ver, quase sempre, na cadeia os responsáveis. É o infantil, salvo engano, anseio por justiça da população que alavanca a tiragem diária do DG quando existem crimes dolorosos98 ou que lhe rendam grandes investigações policiais. WALLRAFF teve razão, quando escreveu sobre a indiferença do jornalista entre o acreditar ou não em uma machete publicada, desde que sigam comprando o jornal.

2.1.2 Caso Jacson Nauta de Quadros

Em 2008, Jacson Nauta de Quadros – de alcunha “Jundiá”, havia confessado doze

homicídios na região do vale dos sinos. Dos doze homicídios apenas seis foram confirmados pela polícia – na época. No dia 05 de agosto de 2011 uma jovem é sequestrada, estuprada e torturada. Dois homens são suspeitos. Em apenas três dias após o caso da merendeira sair da “pauta quente”99 do DG, a polícia civil convocou a imprensa gaúcha e abriu uma verdadeira busca ao, adolescente na data, “Jundiá” – o qual seria um “caso assombroso” de um adolescente “torturador e sádico” – nas palavras dos delegados ao DG em 09.08.2011.

Silvia RAMOS e Anabela PAIVA, no livro Mídia e Violência: tendências na cobertura de criminalidade e segurança no Brasil, dedica o capítulo 2 - “Dependentes de BO – o desafio de ir além das fontes policiais” – aos jornalistas que não conseguem transpor a barreira do que é informado pela polícia. Para a autora:

A cobertura da violência, da segurança pública e da criminalidade realizada pela imprensa brasileira sofre de dependência em alto grau das informações policiais. A polícia é a fonte principal – se não a única – na maioria esmagadora das reportagens. […] Os jornalistas ouvidos pela pesquisa argumentam que não há como evitar esta situação. Responsáveis pela repressão, registro e investigação de crimes e outros atos violentos, as polícias Civil, Militar e Federal são, naturalmente, a principal

                                                                                                               96 SANGUINÉ, Odone. A inconstitucionalidade do clamor público como fundamento da prisão preventiva. Revista de Estudos Criminais. Ano III – 2003. Nº 10. Pág. 115. 97 SANGUINÉ, Odone. A inconstitucionalidade do clamor público como fundamento da prisão preventiva. Revista de Estudos Criminais. Ano III – 2003. Nº 10. Pág. 115. 98 Para HULSMAN, a mídia quando informa um crime doloroso tende em dar voz as famílias das vítimas que clamam por uma vingança, mas este sentimento não deve ser perene, pois mesmo traz à tona uma questão: “Afinal, quem vai para a prisão? Se a mídia não se dedicasse apenas ao sensacionalismo, se não se preocupasse somente em dar repercussão a esses horríveis processos dos tribunais que considera mais importantes, poderíamos saber melhor o que se passa todos os dias nas centenas de saletas, onde juízes têm competência para condenar as dezenas de milhares de pessoas que povoam nossas prisões”. HULSMAN, Louk. Penas Perdidas. Niterói. Luam. p. 74. 1997. 99 No jargão jornalístico, é o assunto importante do dia.

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fonte de informações sobre a criminalidade. Nada haveria a criticar nesta prevalência não fosse o fato de que as forças de segurança são a única fonte das matérias em um expressivo número de casos. Um grande percentual de reportagens (mais de 50%) apresenta apenas uma pessoa ou instituição como a origem dos dados ou informações. Na maior parte das vezes, esta fonte está ligada a um batalhão da PM ou a uma delegacia da Polícia Civil. Tal predominância tem como contraponto a ausência de outros importantes atores sociais, raramente nas páginas. […] A relação dos jornalistas com as fontes policiais envolve dilemas e desafios que perturbam mesmo os profissionais mais experientes. Sentir-se usado pela polícia ou por autoridades do setor, utilizar o espaço editorial como moeda de troca para obter outras informações e ponderar os benefícios futuros de proteger uma fonte acusada ou suspeita de irregularidade são situações que os repórteres enfrentam cotidianamente.100

Ainda sobre os Boletins de Ocorrência (BO’s), uma pesquisa promovida pela Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI) informou que o jornalismo em torno da violência “esgota-se, em geral, como ‘caso de polícia’, tamanha a quantidade de reportagens originadas nos Boletins de Ocorrência (BO’s) das delegacias. […] poder-se-ia dizer que esse jornalismo é vítima dos “BO’s”.”101 Informa a pesquisa que a imprensa faz muito barulho quando o tema violência ganha destaque em suas colunas. Só que apenas “[…] atira para o alto. São balas perdidas, que não atigem o alvo da boa cobertura e por isso ferem o direito do leitor a uma informação de qualidade, pluralista e propositivista. É por isso que ela fica longe do ‘jornalismo de resultado’”.102 O fato de a polícia civil convocar a imprensa para, dentro do possível, ajudar a encontrar Jacson tem a ver com a relação que existe entre o jornalista e o policial. É uma troca de favores existente, como nos informa RAMOS:

Por um lado, os jornalistas precisam ser abastecidos de novidades. Por outro, as autoridades de segurança contam com a imprensa para manter os casos que investigam em destaque, assegurando recursos e valorizando o seu trabalho perante os superiores. […] Como diz um repórter de um jornal paulista: “Muitos jornalistas acabam criando laços de amizade com policiais. Isso cria um círculo vicioso, porque o jornalista usa a amizade para ter informações…”.103

Após uma busca desenfreada, o diretor regional da polícia civil, Bolívar Llantada, em depoimento ao DG informou que: “é o foragido número 1 da região. O que fizeram com ela [vítima] extrapola todos os limites do crime. Não vamos sair das ruas enquanto o Jundiá não for capturado” - em 09.08.2011. Para o delegado da 3ª Delegacia de Polícia de Novo Hamburgo, Ayrton Figueiredo Martins Júnior, o sequestro era para forçar o pagamento de uma dívida de tráfico, mas Jundiá foi além: “Mandaram um sádico” – em 09.08.2011. Jacson Nauta de Quadros esteve recolhido em 2008 no Centro de Atendimento Sócio Educativo (CASE). Segundo o diretor da CASE, Valdemir Estran, informou a equipe do DG que o menor teve um bom rendimento durante os três anos internado e completou: “pra mim, essa suspeita sobre ele é uma grande surpresa”. Em contrapartida, o delegado titular da 4ª DP de Novo Hamburgo, Enizaldo Plentz, informou ao jornal o descrédito com relação ao suspeito: “não acredito na recuperação dele. É um perigo”.                                                                                                                100 RAMOS, Silva. Mídia e violência: tendências na cobertura de criminalidade e segurança no Brasil. Rio de Janeiro. IUPERJ. 2007. Pág. 37-40. 101 Balas Perdidas: Um olhar sobre o comportamento da impresa brasileira quando a criança e o adolescente estão na pauta da violência. Brasília. Editora ANDI. 2000. Pág. 16. 102 Balas Perdidas: Um olhar sobre o comportamento da impresa brasileira quando a criança e o adolescente estão na pauta da violência. Brasília. Editora ANDI. 2000. Pág. 16. 103 RAMOS, Silva. Mídia e violência: tendências na cobertura de criminalidade e segurança no Brasil. Rio de Janeiro. IUPERJ. 2007. Pág. 40.

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Um dia após a decretação da prisão provisória de Jundiá, a Secretaria Nacional dos Direitos Humanos da Presidência entrou em cena, para mudar totalmente a exposição dos fatos que foram arquitetados pelos delegados Bolívar e Ayrton. A imprensa gaúcha, solicitada para “ajudar” na busca pelo suspeito, não poupou ânimos para tecer o recheio de suas páginas e, logicamente, alavancar a procura do jornal. Confirma RAMOS:

Tentar compreender os valores e os objetivos de um criminoso é uma meta válida para a imprensa. Não faz sentido estabelecer zonas proibidas na realidade. Autores de crimes são protagonistas de fatos que interessam à sociedade e, portanto, podem ser ouvidos – desde que de forma cuidadosa, sem ingenuidade ou impulsividade104.

Como no caso em análise era impossível escutar o suspeito, a imprensa partiu para entrevistas e trouxe informações relevantes para o caso. Levando o título de “reviravolta?” no DG, a reportagem informou ao público leitor que ao sair da CASE, Jacson entrou no Programa de Proteção para Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM) e estaria fora do Rio Grande do Sul na data do crime. Tendo como chapéu de reportagem: “trabalho policial sob suspeita” – no caderno Ronda Policial em 10.08.2011 - contava ainda com o depoimento do magistrado João Carlos Correia Grey que, de certa forma, conduziu ao leitor a duvidar da atuação policial no caso. Após a “precipitação policial” - segundo o Juiz da Infância e Juventude de Novo Hamburgo, foi revogado o pedido de prisão de Jacson. Conforme os “capítulos da novela” - modo como o próprio jornal chama o caso, a Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da República garantiu que o suspeito estava sendo monitorado. Ao ser questionado se, num intervalo, o suspeito poderia se deslocar até o Vale dos Sinos, o juiz respondeu: “só se tivesse alugado um jatinho”. O delegado Bolívar, diante da situação, preferiu permanecer em silêncio e que, tão somente, continuaria o trabalho em “buscar a verdade no caso”. Oportuno também, por ora, analisar a disparidade entre os depoimentos da vítima. Ao prestar depoimento na delegacia: “o jovem foi reconhecido pela vítima” ao contrário do informado ao Ministério Público onde comunicou: “não ter visto o rosto dos homens” em 10.08.2011. Da mesma maneira como avisamos no capítulo 1, sobre a propagação do medo que, por consequência, implica em uma maior ingerência penal, informamos também que a demanda por leis penais que resolvam os problemas hoje da criminalidade violenta são, impetuosamente, descortinadas e trazidas à baila em casos de grande destaque. O caso em análise não ficou ausente. Entrou em pauta, na ocasião, a discussão sobre o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) e a sua eficácia. O debate foi centrado no tempo de internação do menor infrator.105 Duas opiniões foram confrontadas, a de um professor universitário e sociólogo Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo e a do delegado Enizaldo Plentz. Essencialmente, em certos casos, conforme nos ensina Nilo BATISTA, o jornal fará o uso de um coringa assim que os argumentos estiverem esgotados e chamará os especialistas no assunto, igualmente quando a questão criminal tornar-se impossível e fora do círculo do jornalista, explica o autor:

Enunciados secundários do discurso criminológico da mídia (“a impunidade aumenta o número de crimes”; “nas drogas é como uma escada, passa-se das mais leves para as mais pesadas”; “penas elevadas dissuadem”, etc), que não alcançariam jamais constatação empírica, por serem completamente indemonstráveis, precisam

                                                                                                               104 RAMOS, Silva. Mídia e violência: tendências na cobertura de criminalidade e segurança no Brasil. Rio de Janeiro. IUPERJ. 2007. Pág. 203. 105 Dispõe o artigo 121, § 3 da Lei 8.069 de 1990 (ECA): “Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos”.

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de um respaldo “científico”, que os conduza respeitavelmente à doutrina dos editoriais. É aí que entram os especialistas. Como o discurso criminológico da mídia não representa o produto de um esforço na direção do saber, mas sim uma articulação retórico-demonstrativa […] ele selecionará os especialistas segundo suas opiniões coincidam ou dissintam daquelas crenças.106

Também, o mesmo autor informa que “os especialistas são chamados à complementação do noticiário, quando suas próprias ideias não sejam a noticia”.107 Mas, não deslembrando que “a fala do especialista esteja concorde com o discurso criminológico da mídia: se algum trecho se afasta do credo, será banido na publicação ‘editada’ da fala”.108 Necessária e consistente à análise do sociólogo Rodrigo Azevedo, porém, diante da repercussão do caso na mídia, o leitor do DG opiniou de maneira diversa,109 pactuando com as palavras pronunciadas pelo delegado de polícia. O que se pode observar, entretanto, é que o próprio DG, ciente dos erros observados nas entrevistas, desenvolveu-se numa direção que o aproxima, de maneira significativa do suspeito. Basta uma leitura sobre o publicado pelo jornal em 07.09.2011 - titulado de “Investigação confusa”. Como se pode perceber, de certa maneira, o jornal pressiona a polícia. A razão dessa insistência em saber a identificação do autor do crime é, evidentemente –, e aqui se trata de uma opinião nossa – uma tentativa de resguadar a credibilidade do jornal – mesmo já sendo baixa. Tal intriga pelo desfecho resulta até mesmo em um breve histórico do caso em um trecho da página: “Um mês após acusar um jovem de 19 anos de estuprar uma mulher em Novo Hamburgo, a Polícia Civil praticamente não avançou na investigação do polêmico caso que envolve entidades estaduais e federais”. No entanto, os efeitos desta espécie de confronto e análise de investigações trouxeram, certamente, um final indigesto para os delegados envolvidos e propício para os editores do DG seduzir os leitores através da manchete sensacionalista de capa a comprarem o periódico. Após meses de investigações e páginas de jornal dedicadas ao suspeito Jacson, o exame de DNA estava concluso. Tendo como capa do jornal o delegado Bolívar e, justamente, a informação do resultado negativo do exame que excluía o suspeito como autor do crime e, também, uma pergunta jocosa: “E agora, delegado?”.

                                                                                                               106 BATISTA, Nilo. Mídia e sistema penal no capitalismo tardio. Revista Brasileira de Ciências Criminais. N. 42. Ano 11. Janeiro/Março. 2003. Pág. 250. 107 BATISTA, Nilo. Mídia e sistema penal no capitalismo tardio. Revista Brasileira de Ciências Criminais. N. 42. Ano 11. Janeiro/Março. 2003. Pág. 251… “O caso do ‘maníaco do parque’ exumou a psiquiatria forense mais rasteira e atrasada; crimes ambientais chamam a opinião de biólogos e militantes verdes, que ingressam lepidamente em tormentosas questões jurídico-penais; na violência policial contra a classe média, a troupe dos direitos humanos ganha o centro do picadeiro, de onde é retirada, meio constrangida, quando o motim na penitenciária foi por fim controlado; etc”. 108 BATISTA, Nilo. Mídia e sistema penal no capitalismo tardio. Revista Brasileira de Ciências Criminais. N. 42. Ano 11. Janeiro/Março. 2003. Pág. 250. 109 Conforme opinião dos leitores Milton Ubiratan Rodrigues Jardim diz que o posicionamento do sociólogo "apenas mostra o medo que ele e os defensores dos Direitos Humanos, os responsáveis pelo ECA sentem pela gentalha que eles nos fazem crer que defendem".Marli Pacheco Buss acha que são "pessoas como Azevedo" que "tornam nossa cidade e o país cada vez mais violento e sem justiça". Dione Piccini se disse "apavorada" com as declarações do sociólogo Rodrigo Azevedo. “Se o Estado não está estruturado, nós, população, não podemos ficar à mercê de pessoas com tal desvio de conduta. Bandido não tem idade”. Disponível em: http://wp.clicrbs.com.br/editor/2011/08/09/caso-jundia-revolta-leitores. Acessado em: 15.07.2012.

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Sob o signo do olhar seletivo do Estado estudado por Vera MALAGUTI BATISTA,110 Jacson Nauta de Quadros ganhou um espaço sádico no DG. Como já havia comunicado, a descrença na recuperação de Jacson era evidenciada em depoimentos de ambos os delegados desde o início das investigações. O adolescente, em menos de 3 meses, foi execrado pela mídia e agentes do Estado.111 Após toda a atenção que o caso envolveu, restou apenas configurada a sua inocência, que pela visão policial ainda não estava configurado. Os casos trazidos à análise perderam-se na poeira dos arquivos da ZH. Mas, para os suspeitos expostos a todo aparato midiático restaram marcas inalteráveis. O DG não afixou outdoors na Av. Ipiranga proclamando vaga de emprego para recolocar a merendeira no mercado de trabalho, igualmente como os delegados não admitiram que erraram. De outra sorte, no momento em que não cogitamos analisar os processos, nos restringimos a examinar a cronologia dos fatos através de reportagens e entrevistas sob a ótica de um leitor comum que teve acesso as mesmas informações publicadas no jornal e, até mesmo, no site do TJRS. Devemos desde já ressaltar, que diante dos casos analisados, restaram idenficados os momentos onde ocorreram a violação das garantias constitucionais dos suspeitos. E é por essa transgressão que nos lançaremos ao capítulo seguinte, tendo como alicerces ambos os casos. Para tanto, será necessário, navegarmos pela nossa Carta Magna, que nos oferece as águas necessárias para, dentro do possível, testarmos os limites que antecedem a ruptura entre os direitos constitucionais do imputado e da imprensa.

Por arremate e pertinente ao proposto até aqui, Lola Aniyar DE CASTO esquematiza como a publicidade do delito pode ser basilar na construção da realidade social e lucro para empresas de comunicação. Para DE CASTRO, a notícia delitiva mescla com a substância da tragédia – para estar constituída uma tragédia basta que o leitor sinta-se tocado, afetado em sua rotina.112 Propugna, ainda, que a cobiça pelas informações ditas sensacionalistas são necessárias tais quais o volume de vendas do jornal. Assim, a regra de ouro para obter lucro é “sexo + crime + esporte” o que, diariamente, são injetados nas páginas do DG.

DE CASTO ao comparar o crime violento publicado em jornais e no entretenimento (cinema), naquele o fato é uma informação é interpretado como realidade o que cede espaço para uma percepção na qual os bandidos são repugnantes. No entretenimento, existem policiais torpes e bandidos fascinantes.113 114

3 A VIOLAÇÃO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA 3.1 A ruptura da presunção de inocência ante a publicidade abusiva O jurista italiano Luigi FERRAJOLI explica que a jurisdição deve ser concebida como a espinha dorsal a obtenção da prova de que um sujeito cometeu um crime, i.e., desde que a

                                                                                                               110 MALAGUTI BATISTA, Difíceis ganhos fáceis – drogas e juventude pobre no Rio de Janeiro. Renavan. Rio de Janeiro. 2003. Pág. 34. 111 MALAGUTI BATISTA, Difíceis ganhos fáceis – drogas e juventude pobre no Rio de Janeiro. Renavan. Rio de Janeiro. 2003. Pág. 36: “Não merecem respeito nem trégua, são os sinais vivos, os instrumentos do medo e da vulnerabilidade, podem ser espancados, linchados, exterminados ou torturados. Quem ousar incluí-los na categoria cidadã estará formando fileiras com o caos e desordem […]”. 112 DE CASTRO, Lola Aniyar. Criminologia da libertação. Renavan. Rio de Janeiro. 2005. Pág. 206. 113 DE CASTRO, Lola Aniyar. Criminologia da libertação. Renavan. Rio de Janeiro. 2005. Pág. 222. 114 Interessente o questionamento e oportuno para nosso trabalho a indagação de Hélio R. S. Silva: “O que significa hoje essa obsessão da mídia pela violência, o apelo publicitário da violência, o fato de a violência vir se constituindo na mais importante mercadoria à venda em nossas rádios, televisões e jornais, seja a desglamurizada violência de cada dia, seja a glamurizada violência dos filmes importados?” em: GAUER, R.M.C. A fenomenologia da violência. Curitiba. Juruá. 2007. Pág. 43.

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prova não tenha sido descoberta através de um juízo aceitável, até que tal prova não seja produzida, ninguém deverá ser considerado culpado e nem submetido a nenhuma pena.115 Em nosso país, a presunção de inocência está ancorada no artigo 5º, LVII, da Carta Magna de 1988 (ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória), sendo o princípio piloto do Processo Penal.116 FERRAJOLI adverte, ainda, que tal princípio é categórico para manter a civilidade e garantias em prol da tutela de prerrogativas dos inocentes, ainda que tenha-se que pagar o preço da impunidade de algum culpável.117 Segue o autor lecionando que, para a sociedade, basta ao culpado ser punido, pois o maior interesse é que todos os inocentes sejam protegidos.118 Simone SCHREIBER119 sublinha que o réu quando for presumido inocente significa, de um lado, que o detentor do ônus de provar a veracidade dos fatos que lhes são imputados é da parte autora na ação penal (via de regra, Ministério Público) e, caso haja resquício de dúvida, após a apreciação das provas, por outro lado, deverá ser decidido a favor do réu (in dubio pro reo). Se contra o réu sobre cai a ilicitude e culpabilidade de determinado delito, caberá então à defesa provar as eventuais excludentes de ilicitude e culpabilidade. Mas não só. Comunica também a autora que “a mera alegação do réu de que agiu, por exemplo, sobre uma excludente de antijuridicidade, não o exime de produzir prova de sua alegação”,120 nessa acepção, “a solução pro reo só existe se o juiz não chegar a um juízo de certeza contra o réu”.121 SCHREIBER nota ainda que:

Se houver várias formas de conduzir a investigação, deve-se adotar aquela que traga menos prejuízo ao imputado e que enseje a menor restrição possível de seus direitos. Eventual prisão anterior à condenação definitiva, por exemplo, deverá estar pautada em decisão judicial que indique quais as circunstâncias presentes no caso concreto autorizam e recomendam a excepcional privação da liberdade do réu.122

Firmou-se então, consoante ao já exibido, um debate sobre o impacto da presunção de inocência sobre o instituto das prisões cautelares. De início, como sustenta a autora, o princípio revogara o instituto da prisão cautelar. Mas tal tese não demorou muito para ser derrubada pelo Poder Judiciário sob o argumento de que a própria CF referiu-se à prisão em flagrante (processual), à liberdade provisória e à fiança (institutos ligados). SCHREIBER                                                                                                                115 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Revista dos tribunais. São Paulo. 2006. Pág. 505. 116 Por conceito de Processo Penal, nos é muito aprazível o ensinamento de Francesco CARNELUTTI em: As misérias do processo penal. Campinas. Bookseller. 2001. Pág. 46: “A tarefa do processo penal está no saber se o acusado é inocente ou culpado. Isto quer dizer, antes de tudo, se aconteceu ou não aconteceu um determinado fato: um homem foi ou não foi assassinado, uma mulher foi ou não foi violentada, um documento foi ou não foi falsificado, uma jóia foi ou não foi levada embora? Necessitaria saber o que é um fato, antes de tudo. São palavras que se usam pela intuição; que se compreendem aproximadamente, mas precisa refletir-se sobre. Um fato é um pedaço da história; e a história e a estrada que percorrem, do nascimento à morte dos homens e a humanidade .[…] Saber se um fato aconteceu ou não quer dizer, portanto, voltar atrás. Este voltar atrás é aquilo que se chama fazer história”. 117 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Revista dos tribunais. São Paulo. 2006. Pág. 506. 118 Nesse contexto, devemos pensar no que FERRAJOLI questionou: Vale mais um acusado livre com a certeza que nenhum inocente foi preso injustamente? Ou um inocente preso, mas todos os culpados presos também? 119 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág 187 e ss. e, principalmente, 190. 120 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág 191. 121 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág 192. 122 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág 193.

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lembra que a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1879 faz menção a detenção do imputado mesmo em sede excepcional.

Nesse sentido, a presunção de inocência não é limite para impedir a decretação das prisões processuais.123 Por outro lado, a súmula 9 do Superior Tribunal de Justiça, se amolda nos seguintes termos: “A exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a dignidade constitucional da presunção de inocência”.124 SCHREIBER após fazer um levantamento dos acórdãos que deram origem a tal súmula no seu livro: “A publicidade opressiva de julgamentos criminais”, evidenciou o debate que se travou naquele momento no STJ correlato a presunção de inocência frente as prisões processuais. Apesar dos julgados serem oscilantes com relação aos institutos, a impressão que a autora colheu é a de que, apesar de alguns julgadores asseverarem “a necessidade de fundamentação específica para a decretação da prisão processual, dado o princípio da presunção de inocência, pondera a tendência de temperar o princípio, prestigiando-se a prisão diante da gravidade do crime imputado e quando há grande repercussão do caso na imprensa”.125 Por tudo isso, e com base nos casos levados a cabo no capítulo dois deste artigo e, ainda, por estar em conciliação com a ideia aspirada, vejamos o que dizem os autores Gabriel José Chittó GAUER e Gustavo Noronha de ÁVILA sobre a discussão em tela:

Quando existe em nossa cultura ainda, notadamente, um ‘ranço’ ditatorial daqueles que não conseguem vislumbrar a importância de um processo penal democrático, garantias são suprimidas sem maiores problemas. Exemplo disso é o que ocorre na mídia, onde, mediante a exibição pública de mero suspeito nas primeiras páginas dos jornais ou telejornais. Execração esta que não ocorre como conseqüência da condenação, mas da simples acusação (inclusive quando esta ainda não foi formalizada pela denúncia) quando, todavia, o indivíduo ainda deveria estar sob o manto da presunção de inocência.126

A presunção de inocência, neste contexto, foi sepultada pelos dois casos já estudados e isso, inegavelmente, não duvidamos.127 Se por um lado temos o in dubio pro reo arejado pela presunção de inocência, em ambos os casos diante da publicidade abusiva e a busca frenética por parte dos delegados – sob o auxilio da imprensa – a eventual dúvida sobre ambos os suspeitos foi resolvida pelo in dubio pro societate. No caso da merendeira, Wanuzi Mendes Machado, sua prisão preventiva havia sido decretada pelo juiz plantonista de primeiro grau, sob o fundamento de que a custódia do réu se fazia necessária à garantia da ordem pública.128 Diante do publicado na imprensa e para obstar que a acusada prosseguisse cometendo crimes, v.g., colocar veneno em mais merendas escolares (?), sem nenhuma necessidade, foi

                                                                                                               123 Tem-se como prisões processuais as denominadas em flagrante, temporária, preventiva, e prisão decorrente da pronúncia e sentença condenatória recorrível – todas previstas em lei. 124 Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/sumulas/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=9&b=SUMU 125 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág 199. 126 GAUER, GJC e AVILA, G.N. Presunção de inocência, mídia, velocidade e memória – breve reflexão interdisciplinar. Revista de estudos criminais. Ano VII – Jan/Mar. 2007 – Nº 24. Pág. 107. “A imprensa tem o direito de informar (noticiar), desde os primeiros passos de uma investigação criminal? Pode divulgar nomes de suspeitos e, desse modo, estrangular com a sua imagem e honra, apesar da presunção de inocência?”. 128 “Evidente assim que existe risco a ordem pública. Não se descarta a reiteração em menor ou maior grau diante do desapego emocional da representada. Quem teve a capacidade de fazer o que fez, pode repetir o ato a qualquer momento, devendo, por isso, ser segregada.” BRASIL. Estado do Rio Grande do Sul. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul – Comarca de Porto Alegre. Acórdão 70044336105. Segunda Câmara Criminal. Impetrante: Leandro Pereira. Paciente: Wanuzi Mendes Machado. Coator: Juiz(a) dir. 1ª Vara do Júri do Foro Central de Porto Alegre. Porto Alegre, 25 de agosto de 2011. Pág. 10.

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algemada e exposta ao constrangimento. Gilberto THUMS pode nos ajudar sobre o teor de nosso pensamento sobre tal medida:

Na imprensa, este princípio [inocência] é desconhecido ou propositalmente ignorado em prol do sensacionalismo e dos interesses mesquinho de algumas pessoas. A concepção popular é no sentido de que, logo após cometido um crime e apontado o suspeito, este deve ser preso e iniciar o cumprimento de pena antecipadamente, ignorando-se completamente a existência da garantia do devido processo legal.129

Vê-se que o propósito de prender provisoriamente, em ambos os casos, foi o preservar a credibilidade da polícia civil e militar - principalmente no caso do Jacson, onde após uma busca frustrada, ironicamente, o jornal especulava a confiabilidade de ambas instituições. Muito antes do conhecimento do próprio suspeito, a imprensa já havia decretado a sua sentença e em nenhum momento cogitou-se em questionar seus familiares. Nessa definição, “a imprensa tem grande parcela de culpa ao intrometer-se indevidamente nos atos de investigação e de julgamento, expondo pessoas suspeitas a execração pública”.130 Interessa-nos, deixar demarcado, que os operadores do direito de nossa sociedade devem ter sensibilidade para conciliar os interesses das empresas jornalísticas e os direitos constitucionais dos imputados, levando em consideração a presunção de inocência, pois sobrepõem ao invocado pelos jornalistas de informar à população.131 THUMS adverte como a gravidade do delito não pode, por si só, ser único critério para decretar a prisão. Informa o autor de maneira muito correta, que "se o acusado não vive no mundo do crime, não ameaça as testemunhas, não apresenta perigo de fuga, não há perigo de ameaça à paz social, então não há fundamento para decretar-se sua prisão, a não ser o fato em si, de ter praticado um crime grave".132 Por essa visão, os tribunais pátrios, segundo o autor, a prisão preventiva tem sido aplicada sob o fundamento do clamor público - tendo em vista prestar-se a fundamentação subjetiva na sua aplicação. Conclui o doutrinador, informando que “o clamor público é provocado pela imprensa e os familiares da vítima exercem pressão na mídia, que acaba influenciando o julgador que prefere não se desgastar perante a opinião pública. Lamentável”.133 3.2 Liberdade de expressão e informação na fase inquisitorial do processo penal: alguns tensionamentos Chegado até aqui, e ante a divulgação abusiva que envolveu ambos os casos, tomaremos à análise como o excesso da publicidade e sigilo na fase inquisitorial do processo penal poderá suscitar discussões calorosas, tendo em vista que não há no Brasil uma lei específica de imprensa, após declarada a inconstitucionalidade pelo STF em 30 de abril de 2009. Por maioria, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou que a Lei de Imprensa (Lei nº 5250/67) é incompatível com a atual ordem constitucional (Constituição Federal de 1988). Julgando assim, procedente a Arguição de Descumprimento Fundamental (ADPF) nº 130. René Ariel DOTTI ao lecionar que o direito de informar diz respeito ao plano da comunicação social exercido pelos jornalistas ou qualquer pessoa que explana seu pensamento através do impresso, sons ou imagens. O de ser informado está garantido pela CF (art. 5º XIV). E, por último, o de se informar que é exercido por quem pesquisa assuntos do

                                                                                                               129 THUMS, Gilberto. Sistemas processuais penais. Lumen Juris. Rio de Janeiro. 2006. Pág. 153. 130 THUMS, Gilberto. Sistemas processuais penais. Lumen Juris. Rio de Janeiro. 2006. Pág. 156. 131 THUMS, Gilberto. Sistemas processuais penais. Lumen Juris. Rio de Janeiro. 2006. Pág. 157. 132 THUMS, Gilberto. Sistemas processuais penais. Lumen Juris. Rio de Janeiro. 2006. Pág. 160. 133 THUMS, Gilberto. Sistemas processuais penais. Lumen Juris. Rio de Janeiro. 2006. Pág. 160.

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seu interesse sejam eles no rádio, jornal ou televisão. Todos, sem exceção, devem estar inerentes aos anseios da sociedade civil.134 Por esse prisma, reconhece-se o direito à liberdade de informação e expressão.135 136 Neste diapasão, o Brasil, constituindo-se num Estado democrático137 de direito, denota-se que “é na democracia que a liberdade encontra campo de expansão. […] Quanto mais o processo de democratização avança, mais o homem se vai libertando dos obstáculos que o constrangem, mais liberdade conquista”.138 O artigo 5º e seus incisos IV, V, IX, XII e XIV combinados com os arts. 220 a 224 da nossa Constituição consistem em uma barreira inultrapassável que inibem os meios de comunicação de censura. Assim, prosseguimos com José Afonso da SILVA que nos assessorará a dirimir eventuais dúvidas sobre a liberdade de informação jornalística:

A liberdade de informação jornalística que fala a Constituição (art. 220, §1º) não se resume mais na simples liberdade de imprensa, pois esta está ligada à publicação de veículo impresso de comunicação. A informação jornalística alcança qualquer forma de difusão de notícias, comentários e opiniões por qualquer veículo de comunicação social. A constituição não chega a precisar o que se entende por veículos ou meios de comunicação social, que ela menciona o art. 220, §1º e 5º. Ao referir-se, em separado, a veículo impresso de comunicação (§6), poder-se-ia entender que ela não inclui a imprensa escrita entre os meios de comunicação social. Talvez até nem o seja. Mas o §1º do art. 220 ao garantir a plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social faz entrar aí também as informações jornalísticas impressas. Temos, pois, informações jornalísticas que são publicadas mediante: (a) veículos impressos de comunicação; (b) veículo de difusão (radiodifusão) sonora, de sons e imagens.139

Do comparação com documentos internacionais e o texto constitucional que a consagram, constata-se que a liberdade de expressão e informação são direitos subjetivos fundamentais e assegurados à todos que estão inseridos em uma sociedade democrática. Ainda assim, sabemos que como qualquer outro direito fundamental não é absoluto e deverá ter limites. O direito a informação pressupõe, antes de mais nada, o direito a uma informação verdadeira e completa (informação verbal).140 O jornalista, i.e., precisa narrar de maneira

                                                                                                               134 DOTTI, René Ariel. Livre informação jornalística e censura judicial. Boletim IBCCRIM. Ano 18. Nº 214 – Setembro – 2010. Pág. 2. 135 A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, aprovada pela Organização das Nações Unidas (ONU), proclama no seu artigo XIX: “Toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras”. Fonte: http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm. Acessado em 14.07.2012 136 A Convenção dos Direitos Humanos de 1969 – Pacto de San José da Costa Rica, proclama no seu art. 13 inciso I: “Toda pessoa tem o direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito inclui a liberdade de procurar, receber e difundir informações e ideias de qualquer natureza, sem considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer meio de sua escolha”. Fonte: http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/sanjose.htm. Acessado em 14.07.2012. 137 Entendemos democracia como José Afonso da SILVA em Curso de direito constitucional positivo. 23ª edição. Editora Malheiros. São Paulo. 2003. Pág. 128-133… “A democracia não precisa de pressupostos especiais. Basta a existência de uma sociedade. Se seu governo emana do povo, é democracrática; se não, não o é. […] O que dá essência à democracia é o fato de o poder residir no povo”. 138 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 23ª edição. Editora Malheiros. São Paulo. 2003. Pág. 233. 139 SILVA, Jose Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 23ª edição. Editora Malheiros. São Paulo. 2003. Pág. 245-246. 140 Informação explanada por Ana Paula Menezes Vieira.

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correta, v.g., não poderá narrar fatos imaginários. A liberdade de expressão e informação atinge o ápice de sua proteção quando é utilizada por tais profissionais. Contudo, pelo fato de ambas as liberdades aqui tratadas estarem sob o manto sagrado dos direitos fundamentais, não significa que possam imperar de maneira incondicional e assolar outros valores constitucionais enraizados. No tocante ainda a liberdade de informação, consubstancia-se o princípio da publicidade do Poder Judiciário que está consagrado e somente se refere a atos processuais (5º, LX) e julgamentos (art. 93, IX) – ambos artigos na CF, o que traz uma dúvida subjacente ao indagarmos sobre qual rumo deverá tomar os inquéritos policiais, se deverão ser conduzidos em público ou em segredo.141 Em nossa Carta, o art. 37, caput, institui o princípio da publicidade da Administração Pública em geral e o artigo 5º, XXXIII, assegura a qualquer pessoa o direito de receber informações dos órgãos públicos, do seu próprio interesse ou de interesse coletivo geral, "ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado".142 Isto posto, a publicidade assegura a qualquer um do povo participar a estar ciente dos atos do processo penal, audiências e tribunal do júri. Com efeito, SCHREIBER, nessa base de pensamento, assegura que "é possível assim sustentar a aplicação do princípio da publicidade ao inquérito policial, como de resto a todos os procedimentos administrativos que tramitam perante os órgãos públicos"143, ademais informa a autora que "a finalidade do inquérito policial é a apuração de fatos criminosos e diversas diligências investigatórias devem ser conduzidas sob o sigilo para que não se frustrem. O sigilo imposto no inquérito é, inicialmente, aquele necessário à elucidação do fato criminoso".144 É preciso, porém, que fique claro mais uma vez: ambos os casos analisados no capítulo precedente ganharam repercussão de nível nacional. Nos dois fatos, foi através da imprensa gaúcha que a decretação da prisão provisória ficou conhecida pelos leitores. Ambos os delitos foram narrados de maneira para que o leitor não tivesse dúvida sobre a autoria. Daí porque FERRAJOLI alertou que com o advento do fascismo a presunção de inocência entrou em crise. A prisão provisória tornou-se regra sempre que o delito desencadeasse o clamor público.145 Sabe-se que, não é preciso fazermos um raciocínio muito consistente para compreendermos que a lógica de nossas policias é a seletiva e repressiva. Tal fato é preocupante, pois ao levar à mídia esses momentos de repressão, o leitor avalia o procedimento como se não houvesse direito de defesa dos imputados.146 Colocam-se no lugar daqueles familiares próximos que sofrem com o delito. Compreendemos tal sentimento e o respeitamos. Entretanto, algumas reflexões são necessárias.                                                                                                                141 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág. 255. 142 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág. 261. 143 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág. 255. 144 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág. 256. 145 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Revista dos tribunais. São Paulo. 2006. Pág. 509. 146 Dois exemplos de atuação policialesca que foram exibidos na Record podem nos ajudar: o primeiro foi uma invasão de um sobrado onde foram encontrados dois estelionatários procurados pela polícia. Ao ser preso, um dos acusados indaga: “eu quero um advogado” o policial responde: “Que advogado? Tu está preso”. O segundo caso foi no mês de julho do corrente ano. Um delegado da região metropolitana ao fazer uma busca por ‘narcotraficantes’- segundo ele, na região do Vale dos Sinos, ingressou na casa do suspeito e o algemou. Um dos seus companheiros policiais diz em alto e bom tom diante das câmeras: “tu está preso. Nem tenta advogado”.

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Recorremos novamente a FERRAJOLI, que explicou como foi importante a publicidade do processo penal em sede de segurança para o réu, ainda sob o manto da publicidade e democracia o que tornava o juiz transparente. Hoje, o autor informa que a publicidade ganhou desvantagens graves para o imputado. A mídia, ao buscar notícias durante a fase inquisitorial, “acaba sendo uma publicidade somente da acusação – da incriminação, da prisão e talvez das provas de acusação – e não da defesa, convertendo-se assim de garantia contra o arbítrio em instrumento ulterior de penalização social preventiva”.147 Nilo BATISTA considerando esse tortuoso contexto, sustenta que, "a equação penal - se houve delito, tem que haver pena [...] pouco importa o fundamento legitimante [...] crêem na pena como rito sagrado de solução de conflitos".148 Tal assertiva nos é muito útil e muito amarga, levando em consideração a emergência carcerária que o nosso país alcançou, inclusive, níveis utópicos da barbárie. O ponto nevrálgico surge da liberdade de imprensa ante o inquérito policial que cederá lugar a dissonância de valores constitucionais. Neste norte, as perguntas para serem respondidas, segundo Flávia RAHAL, serão:

Será que, em um Estado Democrático de Direito, acusado, vítima e testemunha não podem ter direito subjetivo à privacidade, consubstanciado no segredo de justiça? Será que esse segredo que se impõe aos atos processuais deve necessariamente ser visto como forma de negar aos demais cidadãos o conhecimento do que ocorre na apuração dos fatos? Será que ele não deve, no mais das vezes, ser visto como instrumento de garantia de direitos individuais tão valiosos quanto o da informação, que são aqueles da privacidade e intimidade?.149

Em que incida o posicionamento de Ignácio RAMONET sobre a imprensa livre que

foi fator determinante para sair de um sistema autoritário para a democracia,150 a fogueira da inquisição continua ardente em nossas delegacias, fóruns e programas policiais, devido a enxurrada de imagens e reportagens onde o outro continua sendo o imperdoável e sem direitos – como já suscitado. A publicidade surgiu no sentido de proteger o indivíduo e assegurar seus direitos, mas em diversas vezes é utilizada somente para oprimir.151 No capítulo antecedente resolvemos fotografar dois casos e os alinhar, lado a lado, para compreender como a prática jornalística pode, muitas vezes, servir como combustível inicial da inquirição, e, mais ainda, os direitos fundamentais foram e são impetuosamente suprimidos todas as vezes em que o valor-notícia coloca em xeque-mate valores constitucionais solidificados. Por tudo já pesquisado, tentaremos no próximo tópico buscar algumas alternativas de índole constitucional para solucionar essa transgressão de direitos - nossa opinião poderá estar equivocada -, mas servirá de alguma forma como uma proposta – mesmo que restrita a um curto espaço. Além do que, é indispensável exploramos uma rota de fuga para ambos os casos analisados no artigo.

3.3 De Wanuzi a Jacson: propostas para o conflito constitucional

                                                                                                               147 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Revista dos tribunais. São Paulo. 2006. Pág. 569. 148 BATISTA, Nilo. Mídia e sistema penal no capitalismo tardio. Revista Brasileira de Ciências Criminais. N. 42. Ano 11. Janeiro/Março. 2003. Pág. 245. 149 RAHAL, Flávia. Processo penal: quando publicidade e sigilo oprimem. Boletim IBCCRIM. Ano 18. Nº 214 – Setembro – 2010. Pág. 12. 150 RAMONET, Ignácio. A tirania da comunicação. Editora Vozes. Petrópolis. 1999. Pág. 31. 151 RAHAL, Flávia. Processo penal: quando publicidade e sigilo oprimem. Boletim IBCCRIM. Ano 18. Nº 214 – Setembro – 2010. Pág. 12.

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A tarefa é árdua, como bem escreveu Fabrício Dreyer de Ávila POZZEBON em Mídia, direito penal e garantias:

[…] é inegável que quando se trata da mídia, como parte dessa sociedade de informação, este aparente conflito deve ser considerado: de um lado, o direito à privacidade, à imagem, ao contraditório, à ampla defesa e ao devido processo legal antes da divulgação dos dados de quem é presumido inocente pela Constituição (art. 5º, LVII). De outro, o direito à manifestação do pensamento (art. 5º, IV), à liberdade de expressão, independentemente de censura ou licença (art. 5º, IX), também como garantias fundamentais. Sem desconsiderar que esse direito à livre manifestação do pensamento, muitas vezes, como afirmado por Sarlet tem servido à proteção desses mesmos direitos individuais que, ocasionalmente, poderá violar.152

A publicidade propiciou para todos os porto-alegrenses e habitantes da região metropolitana, a participar, estar presente, nos atos policiais e judiciais que envolveram ambos os casos analisados no capítulo anterior. Sabemos que a linguagem jurídica é extremante erudita e técnica (informação verbal).153 A partir do momento em que a imprensa decodifica essa linguagem, ela torna acessível ao público destinatário para compreender o que está acontecendo, v.g., o caderno Ronda Policial do DG. E é nesta passagem do técnico para o público que surge o problema. Entre fato criminal e o público - como já observado nessa pesquisa, não existe uma imprensa imparcial. Muito diverso, existe uma visão muito parcial do jornalista em relação aos fatos que o mesmo está narrando. Nem sempre o jornalista respeita os fatos como eles realmente são.154 Ao informar ao público, as notícias que podemos observar do DG, eram destinadas ao leitor como se fossem aquilo que realmente os editores presenciaram. Tanto Wanuzi como Jacson, foram envolvidos em investigações criminais, assim que noticiadas, acabaram sendo humilhados e estigmatizados no clamor dos acontecimentos quando ainda não se tinha chegado a um denominador comum. A imprensa gaúcha transmitiu a notícia de tal forma que ambos foram tachados de réus e que deveriam ser condenados. Não esquecendo da atuação policial “exemplar” que convoca os meios de comunicação, nesse caso o DG teve total apoio para sentenciar quando o que estava ocorrendo era uma investigação. No inquérito policial, existe a incerteza sobre os acontecimentos, mas a divulgação prematura e opressiva do DG tornou certeza que os fatos foram praticados por ambos – sob a ótica do leitor. E a condenação pela mídia, ao contrário da condenação proferida por um magistrado é irrecorrível. Ambos, como já informado, não têm como recorrer muito menos encontrar abrigo da tempestade midiática. PELUSO pode ser útil para nós quando informa que:

Cria-se uma confusão entre emoção e realidade, pois a fascinação emocional impede a análise racional e realista do fato, inclusive porque o [leitor] […] não possui pleno controle de seu próprio campo de visão, que está estruturado pelos meios – escolha de cenas, reportagem, edição, etc. -, não pode olhar em uma ou outra direção o enfocar diferentes indivíduos ou objetos. Ante a hipersensibilização, a sociedade, que é uma sociedade insegura e por isso mais suscetível emocionalmente, não necessita mais sofrer o mal, pois ela o vê. O problema da violência passa a ser comunicacional e não mais experimental.155

                                                                                                               152 POZZEBON, Fabrício Dreyer de Ávila. Mídia, direito penal e garantias. Criminologia e sistemas jurídico-penais comtemporâneos. Ruth Gauer (org.). Porto Alegre. EDIPUCRS. 2008. Pág. 366. 153 Informação explanada por Ana Paula Menezes Vieira. 154 VIEIRA, Ana Paula Menezes. Processo penal e mídia. São Paulo. Revista dos tribunais. 2003. Pág. 87. 155 PELUSO, Vinicius de Toledo Piza. Sociedade, mass media e direito penal: uma reflexão. Revista Brasileira de Ciências Criminais. Nº 39. Ano 10. Julho/Setembro. 2002. Pág. 182.

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Simone SCHREIBER, em sua obra já utilizada nesse artigo, aposta em algumas propostas para solucionar essa colisão entre a liberdade de expressão e informação versus o direito a um julgamento criminal justo. Aqui, utilizaremos de sua tese para propor, dentro de nossas limitações, algumas saídas para não transgredir a presunção de inocência. Para tanto, é imprescindível grifar sendo “o crime um acontecimento público e a coletividade tem legítimo interesse de se manter informada e de receber e expressar opinião sobre o fato e suas repercussões jurídicas”.156 Dando continuidade, a autora sustenta que para tal desiderato torna-se crível a aplicação da proporcionalidade. Isso nos conduz a crer que o magistrado deve buscar soluções compatíveis para a solução de tal conflito,157 em nosso caso, uma medida que imponha a mais benéfica restrição ao direito contraposto –, liberdade de expressão – ainda necessitará ser justificada, haja vista o fim que deseja obter. Conexo ao nosso trabalho, SCHREIBER dispõe de uma gama de soluções plausíveis à colisão explorada, todavia, a que nos interessa no momento é a vedação de introdução de provas produzidas pela mídia no processo.158 Prossegue a autora nos comunicando que:

O descompasso entre a verdade midiática e a verdade processual […] traz duas ordens de questões. A primeira refere-se à possibilidade de proibir a veiculação na mídia de provas produzidas pelo jornalismo investigativo. […] A segunda é atinente à admissibilidade de inclusão no processo de provas produzidas pela mídia. A princípio, tais provas podem ser classificadas como documentos. […] O mesmo ocorre se se tratar de entrevista concedida pelo réu à imprensa, em que tenha admitido a autoria do crime ou outros fatos que o incriminem (e, por mais forte razão, no caso de gravação clandestina de confissão). […] Confissões obtidas em interrogatórios informais, sem que o imputado esteja ciente do seu direito de permanecer calado e de se fazer acompanhar de advogado, não são admitidas. […] Conclui-se que o ambiente de informalidade, motivo pelo qual eventuais confissões não podem ser inseridas validamente no processo. […] Além disso, nada obsta (antes recomenda) que o juiz indefira a apresentação de matéria jornalística que possa ser classificada como prejudicial ao réu. […] Material midiático que veicule a ‘verdade midiática’, a qual é essencialmente diversa da verdade construída sob o devido processo legal.159

Contudo, não podemos esquecer que a parcialidade está presente na cobertura de fatos criminais. Se, v.g., o material produzido pela imprensa é utilizado no processo pode ser prejudicial a todo o exame de provas colhidas sob o contraditório. O depoimento da própria vítima que, no caso de Jacson, afirmou diante da imprensa que o reconheceu e, pior do que isso, induziu todo um aparato policial para ir em busca de alguém que não estava no estado. Mais do que isso, simplesmente baseado em um material jornalístico – mas que poderia ser implantado no processo. Em resumo, SCHREIBER propugna que os juízes que presidem os Tribunais do Júri que:

[…] não admitam a introdução de documentos atinentes a reportagens produzidas sobre o caso que possam ser classificadas como prejudiciais. Ademais, tudo que se disse sobre a não admissibilidade

                                                                                                               156 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág. 383. 157 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág. 385. 158 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág. 390. 159 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág. 391.

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de prova ilícita ou prejudicial produzida pela mídia aplica-se aos processos de competência de juízes togados.160

De fato, a questão suscitada demanda muita reflexão, pois a mídia deve informar. O que propusemos aqui foi de alertar e condicionar o jornalista de suas limitações frente ao editor de texto. Mas podemos ansiar, mesmo que utopicamente, que a imprensa haja de maneira responsável e correta. O jornalista deve agir com cautela, com limite, e por estar protegido pelo manto da liberdade de expressão, deve compreender que antes de leitores sedentos por notícias violentas, existe um ser humano. A comunicação, hoje, constrói a realidade. Nos foge do campo de visão o que seria uma realidade – no sentido metafísico e ontológico, mas sabemos que é algo que existe. Está presente. GUARESCHI notifica que “hoje, algo passa a existir, ou deixa de existir, se é, ou não mediado […] é a isso que nos referimos. Realidades, fatos, hoje, existem, ou deixam de existir, se são, ou não, veiculados pelo meios de comunicação.”161 Deve-se ter ciência e saber a distinção entre verdade midiática e verdade processual.162 A verdade que a imprensa produz não coexiste com as garantias que estão intrínsecas ao processo penal, todavia, não devem ser avaliadas pelo juiz quando proferir uma sentença163. Mas para a mídia, como já informado, quando um magistrado não aceita a denúncia – como em ambos os casos – tal negação é lida por grande parte da sociedade como “mau funcionamento das instituições, artimanhas das partes, falha do sistema e da excessiva permissividade de alguns juízes”.164 O discurso que o DG oferece é do pânico e medo. Faz parte da lógica do mercado: notícia = produto. Mais segurança pública. Lei e ordem. Se na afirmação de alguns o DG apenas descreve a realidade como ela acontece,165 então estamos diante de um jornal que está acima do bem e do mal (?). Examinamos um jornal onde em nunca é contestado a fundo a problemática da violência em nossa sociedade, muito pelo contrário, o discurso apenas serviu para legitimar uma sólida fronteira contra eles, os outros (Jacson e Wanuzi) e segurança para nós, os bons. E só. Advertimos, no sentido de que a mídia siga realizando a sua parte na sociedade. Siga informando sobre acontecimentos cotidianos desde que princípios constitucionais sejam preservados, “punindo abusos, que não são a regra e sim a exceção. Sem elas, não temos nada.”166 Por fim, o jornalista/editor – diz-se que “alguns são vampiros: o que interessa a eles é o sangue”167 - seguirão na comando (ainda que sem limitações) devem encontrar caminhos para uma eficaz cobertura jornalística.

                                                                                                               160 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág. 393. 161 GUARESCHI, Pedrinho A. Mídia e democracia. Porto Alegre. PG. 2005. Pág. 62. 162 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág. 410. 163 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág. 410. 164 SCHREIBER, Simone. A publicidade opressiva de julgamentos criminais. Renovar. Rio de Janeiro. 2008. Pág. 410. 165 “A reboque desse gênero de jornalismo, 80% de todas as inserções […] delimitam-se apenas em descrever os crimes. Em menos de 8% das reportagens discute-se as causas do evento delituoso. E só em um terço desses 8% as causas vêm acompanhadas de uma discussão de soluções”. Balas Perdidas: Um olhar sobre o comportamento da impresa brasileira quando a criança e o adolescente estão na pauta da violência. Brasília. Editora ANDI. 2000. Pág. 17. 166 POZZEBON, Fabrício Dreyer de Ávila. Mídia, direito penal e garantias. Criminologia e sistemas jurídico-penais comtemporâneos. Ruth Gauer (org.). Porto Alegre. EDIPUCRS. 2008. Pág. 372. 167 DE CASTRO, Lola Aniyar. Criminologia da libertação. Renavan. Rio de Janeiro. 2005. Pág. 223.

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Concluímos que não foi a intenção sustentar que qualquer cobertura sobre fatos criminais é ilegítima. Devem ser caracterizadas entre lícitas e ilícitas,168 compreendidas como ilícitas as que violem a presunção de inocência do acusado. Ademais, sabemos que nos jornais não existe compromisso algum com a verdade, mas com ter uma boa notícia, i.e., ter uma notícia vendável, pois, “a mídia impressa é um tipo de comunicação na qual cada pessoa escreve o que quer, como quer, e é dirigida ao público em geral, ou a públicos específicos”.169 O problema é que as ‘pautas quentes’ que ganharam capas do DG não corresponderam ao ocorrido informado pelo jornal e, mesmo que estivessem correspondido, não se justificam os meios utilizados e a publicidade opressiva com ambos foram submetidos Wanuzi Machado e Jacson Quadros.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Primeira: a violência é um fenômeno complexo e está presente em qualquer civilização. Faz parte do cotidiano de todos de uma sociedade. Segunda: notícias sobre violência alavancam as vendas de jornais. As pessoas têm interesse em reportagens que abordam o crime e, muitas vezes, se comprazem com a desgraças alheia. Terceira: o discurso midiático que propugna um Direito Penal prima ratio para solução de conflitos restou desconsolidado na pesquisa. A divisão da sociedade entre bons e maus faz parte da alegoria jornalística diária. O outro representado nos jornais é sinônimo de perigo e deve ser aniquilado ou emparedado. Quarta: o medo está presente no cotidiano de todas as pessoas, ligado à mídia que funciona como um mecanismo para dissipar esse sentimento que, na maioria das vezes, é fruto de uma acirrada competição de mercado. Quinta: não existe filtro nem barreira para o sensacionalismo que recheiam notícias ligadas à violência urbana. Na incessante busca pela venda, competição e o famoso furo da notícia, tudo é admissível. O jornal Diário Gaúcho é dedicado a classe B e C de Porto Alegre e região metropolitana. Sua tiragem excede a marca dos 150 mil exemplares diários. Destinado a grande massa dos trabalhadores, o periódico encontra-se desde o ano 2000 nas bancas. Sexta: a violência urbana é o tema mais polêmico na seara do jornalismo. Analisou-se, nesse caminho, dois casos que repercutiram nacionalmente ventilados por condutas parciais de profissionais da comunicação e agentes do Estado: a “confissão” de Wanuzi Mendes Machado que de acordo com o magistrado que atuou no caso, utilizou o famoso “clamor social” como fundamento da prisão preventiva. Após o circo midiático montado, a denúncia foi rejeitada. Sétima: Jacson Nauta de Quadros foi indicado como principal suspeito de cometer o delito de estupro e tortura. A polícia, inclusive, solicitou ajuda ao Diário Gaúcho para auxiliar na busca pelo mesmo. Soube-se, mais tarde, que no dia do crime, Jacson estava em outro estado sob medida sócio-protetiva do governo, na qual, impossibilitava-o de liga-lo à cena do crime. A denúncia, no mesmo sentido, foi rejeitada pelo magistrado. Oitava: a liberdade de expressão e informação são direitos subjetivos fundamentais e assegurados à todos que estão inseridos em uma sociedade democrática. Ainda assim, sabemos que como qualquer outro direito fundamental não é absoluto e deverá ter limites. O direito a informação pressupõe, antes de mais nada, o direito a uma informação verdadeira e completa.

                                                                                                               168 Características levantadas por Simone Schreiber. 169 GUARESCHI, Pedrinho A. Mídia e democracia. Porto Alegre. PG. 2005. Pág. 69.

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Nona: a publicidade ganha desvantagens graves para o imputado no momento em que busca informações sobre o caso durante a fase inquisitorial do processo penal. Essa publicidade acaba tornando-se uma publicidade opressiva que propiciou para todos os portoalegrenses e habitantes da região metropolitana participar, estar presente, nos atos policiais e judiciais que envolveram ambos os casos analisados. Tanto Wanuzi como Jacson, foram envolvidos em investigações criminais, assim que noticiadas, acabaram sendo humilhados e estigmatizados no clamor dos acontecimentos quando ainda não se tinha chegado a um denominador comum. A imprensa gaúcha transmitiu a notícia de tal forma que ambos foram tachados de réus e que deveriam ser condenados. Décima: a proporcionalidade deve servir de norte para a conflitividade – no caso a mais benéfica que possa restringir o direito contraposto – a liberdade de expressão. A verdade que a imprensa produz não coexiste com as garantias que estão intrínsecas ao processo penal, todavia, não devem ser avaliadas pelo juiz quando proferir uma sentença. Deve, nesse sentido, ser vedado provas produzidas pelo aparato midiático.

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