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1. INTRODUÇÃO Este trabalho tem como produto final um vídeo-documentário que conta a história do artista Ivo Rodrigues, com ênfase na década de 80, tendo como fundo o cenário musical curitibano e a banda Blindagem, a qual Ivo Rodrigues fez parte nos últimos trinta anos. O vídeo-documentário, portanto não se trata de uma biografia completa da vida de Ivo Rodrigues, mas sim de fragmentos de sua carreira musical e pessoal. O documentário tem como objetivo contextualizar momentos da carreira de Ivo Rodrigues com fragmentos do cenário musical da cidade na década acima citada, resgatando a memória de um artista relevante para a cultura paranaense. Retratando também como era para uma das primeiras bandas de rock que surgiu na cidade, fazer e viver de música naquele contexto. Para a fundamentação teórica foram utilizados autores que falam sobre jornalismo cultural, como Daniel Piza e J.S. Faro. Também utilizamos autores que tratam do tema vídeo-documentário como Silvio Da-Rin e Bill Nichols. Sobre biografias e entrevistas, os métodos utilizados para construir o documentário, autores como Cremilda de Araújo Medina, Sérgio Vilas Boas e Antônio Carlos Gil. Também foram utilizados temas como Identidade Cultural da época resgatada, com os autores como Frederik Barth e Danys Cuche. O documentário tem como uns dos objetivos resgatar e registrar este pedaço da história e cultura paranaense.

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1. INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como produto final um vídeo-documentário que conta a história

do artista Ivo Rodrigues, com ênfase na década de 80, tendo como fundo o cenário

musical curitibano e a banda Blindagem, a qual Ivo Rodrigues fez parte nos últimos trinta

anos. O vídeo-documentário, portanto não se trata de uma biografia completa da vida de

Ivo Rodrigues, mas sim de fragmentos de sua carreira musical e pessoal.

O documentário tem como objetivo contextualizar momentos da carreira de Ivo

Rodrigues com fragmentos do cenário musical da cidade na década acima citada,

resgatando a memória de um artista relevante para a cultura paranaense. Retratando

também como era para uma das primeiras bandas de rock que surgiu na cidade, fazer e

viver de música naquele contexto.

Para a fundamentação teórica foram utilizados autores que falam sobre jornalismo

cultural, como Daniel Piza e J.S. Faro. Também utilizamos autores que tratam do tema

vídeo-documentário como Silvio Da-Rin e Bill Nichols. Sobre biografias e entrevistas, os

métodos utilizados para construir o documentário, autores como Cremilda de Araújo

Medina, Sérgio Vilas Boas e Antônio Carlos Gil.

Também foram utilizados temas como Identidade Cultural da época resgatada,

com os autores como Frederik Barth e Danys Cuche. O documentário tem como uns dos

objetivos resgatar e registrar este pedaço da história e cultura paranaense.

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2. DELIMITAÇÃO DO TEMA

Aqui tratamos o tema do trabalho proposto, que registra um fragmento da música

paranaense. Falaremos sobre a história da música ma cidade, o tratamento da mídia com

este segmento. E também que é Ivo Rodrigues e a Banda Blindagem.

2.1 HISTÓRIA DA MÚSICA EM CURITIBA

Na Curitiba do século XIX, Bento Menezes foi a figura de maior projeção no campo

musical. Fundador do Jockey Clube do Paraná, chegou a fazer apresentações públicas a

pedido do Imperador D. Pedro II e também fez parte da primeira “Banda de Música da

Capital”, integrada à Polícia Militar do Paraná, que até então era a única organização

musical oficializada no Estado do Paraná, participando de festas oficiais e civis. Em 1883,

por medidas econômicas, a banda chegou ao fim.

Quem também se destacou nesse período foi a família Itiberê. Os irmãos Brasílio e

João chegaram a formar duplas de projeção nacional. E o “Trio Paranaense”, fundado por

Charlote Frank, Renée Devrain Frank e Bianca Bianchi, que mais tarde foram professoras

da Escola de Música e Belas Artes do Paraná.

Para a historiadora Roselys Velloso Roderjan as bandas nessa época eram

indispensáveis em comemorações oficiais e festas populares. Para a historiadora

“Impressionante é o realce que se dá às bandas nos relatos das festas e comemorações,

fazendo-nos afirmar que foram elas a grande diversão da sede da Província, tendo o

mesmo acontecido nas cidades do interior” (RODERJAN apud SOUZA NETO, 2003,

p.48).

Foi no início do século XX que surgiram as primeiras gerações de instrumentistas,

pois as bandas particulares e orquestras familiares eram comuns. A música era ensinada

como complemento da educação e recreação. Era comum também a importação de

instrumentos musicais da Europa, que vinham direto para os portos de Paranaguá e

Antonina. A música que só podia ser apreciada através de bandas e orquestras locais

começa a ser difundida por meios mecânicos, como o rádio. E novos gêneros musicais

começam a surgir no Brasil. “Até o advento da Bossa Nova, anos de 1950, a música

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nacional esteve estagnada, pois nem mesmo as influências internas ou externas

conseguiram mudar significativamente o panorama musical brasileiro.” (ARANTES apud

SOUZA NETO, 2003, p.153).

No início da década de 1960, surge a Jovem Guarda, que divide espaço e

sucesso com a Bossa Nova e o fenômeno mundial do rock’n roll – e mais tarde com o

movimento da Tropicália - por todo o País. Segundo Arantes (2003), o rádio e a televisão

foram decisivos para a difusão da Jovem Guarda no Paraná. O maior exemplo foi o

programa Cabeludos pela Marumbi do radialista e produtor Mário Celso, que era

direcionado à juventude curitibana, e onde também se apresentavam ao vivo, atrações da

música local.

Ainda, segundo Arantes, estes estilos musicais faziam sucesso na capital

paranaense porque Curitiba, na época, tinha uma população constituída, em sua maioria,

por jovens. Conforme demonstram os censos realizados na cidade em 1960 e 1970. Em

1960, a população era de 515.141 habitantes em Curitiba. 290.732 eram jovens de 0 a 24

anos de idade. Já em 1970, a população era de 821.233 habitantes e 477.360 eram

jovens de 0 a 24 anos.

Entre os anos 60 e 70, começam a surgir em todo o Estado, com mais

intensidade na capital, conjuntos musicais influenciados pelo surgimento do Rock’n Roll e

da Jovem Guarda no Brasil. Eram conjuntos amadores formados por adolescentes entre

15 e 17 anos. The Snakers, Os Juvenis, Os Falcons, Os Carcarás e Os Metralhas que,

devido ao sucesso e profissionalismo, fizeram turnês internacionais em países como

Paraguai, Peru, México, Argentina, Chile e Estados Unidos”. (ARANTES apud SOUZA

NETO, 2003, p. 154).

Neste mesmo período, porém, não existiam gravadoras no Paraná. O artista

que quisesse gravar seu disco tinha que se deslocar até São Paulo. E isto era muito

comum. Os artistas gravavam seus discos na capital paulista e depois divulgavam e

vendiam em suas apresentações e nos bailes em Curitiba, Maringá, Londrina, Paranaguá.

Segundo Arantes (2003), em Curitiba, o rock’n roll e a Jovem Guarda se

destacavam de outros estilos musicais. Os meios de comunicação foram os principais

responsáveis deste destaque. Os dois canais de televisão da cidade e as emissoras de

rádio mantinham uma programação que se destacava entre os jovens. Programas de

televisão, como Ponto 6, A Festinha dos Metralhas e Alô Juventude e os de rádio, como o

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de Lourival Neves na Rádio Curitibana, Paulo Hilário na Rádio Colombo, Dirceu Graeser

na Rádio Clube foram os grandes responsáveis pela disseminação dos gêneros na

capital.

Além disso, jornais e revistas tinham colunas como a TV Programas para

divulgar o movimento jovem.

O Paraná, excetuando Rio de Janeiro e São Paulo, foi um dos raros e poucos Estados do Brasil a conseguir destaque no meio musical voltado à juventude na década de 1960. Cada bairro de Curitiba, cada município do Estado possuía um conjunto que tocava em bailes, festas e aniversários num momento raro da cultura paranaense, em que se produziu e consumiu música no próprio Paraná. (ARANTES apud SOUZA NETO. 2003 p. 156).

2.1.1 O CENÁRIO DO ROCK EM CURITIBA

Entre 1955 e 1960 o rock foi difundido no Paraná e em Curitiba através dos meios

de comunicação, como a televisão e o rádio. Segundo o produtor musical Manoel J. de

Souza Neto em seu livro A [des] Construção da Música na Cultura Paranaense, o rock,

nesse período, era apresentado apenas como uma curiosidade, não existiam grupos do

gênero. Algumas Big Bands locais incluíam o rock em seu repertório apenas para

acompanhar cantores em suas apresentações. O novo estilo musical ainda não era

comercializado por aqui. Só quem trazia discos de rock do exterior podia ouvir em sua

casa.

Inicialmente, alguns críticos comparam o novo gênero com o folk, o country norte-

americano e até mesmo o fandango, pois por sua simplicidade de construção musical era

ouvido pelas classes mais baixas da sociedade. Só na década de 1960, com o surgimento

da banda inglesa The Beatles e sua abundante repercussão, que o gênero do rock

começou a ser visto com mais seriedade por parte dos críticos.

O comportamento de se esperar era que se fizessem então festas de arromba, quebra-quebra nos cinemas, juventude transviada e descontrolada gritando pelas ruas. Mas, ao contrário do estardalhaço que se esperava, apareceram apenas algumas notinhas nos jornais dizendo que o rock não prestava e não era recomendado aos jovens. Apenas algumas pessoas se aventuraram na rebeldia. (SOUZA NETO 2003 p. 173).

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Ainda segundo Souza Neto (2003), o rock que chegou a Curitiba não veio

acompanhado de rebeldia e som alto. O rock de Curitiba “era um rock caipira,

comportado, domesticado e transformado e produto pela mídia, que coube como uma

luva nas emissoras de rádio paranaenses... já que a sociedade paranaense não estava

preparada para o rock’n roll.” (SOUZA NETO, 2003. p. 286).

Em 1958, quando o rock ainda era uma novidade na capital paranaense,

Sansores França realizou o show de calouros do programa Clube da Juventude na rádio

Tingui. Durante uma destas apresentações houve um encontro entre Paulo Hilário e

Vitório dos Santos, dois jovens entusiastas do gênero do rock na época. Com estas

apresentações nas rádios, veio a idéia de unir um grupo de rock para tocar em festas de

amigos e shows de calouros. O grupo passou a se chamar Little Devils. Um ano mais

tarde e com mais um integrante (o radialista Dirceu Graeser), o grupo conseguiu um

programa na rádio Guairacá, intitulado Ídolos da Juventude. Segundo Neto, este

programa marcou a mais importante “parceria na articulação roqueira do estado do

Paraná daquela época”. Desde então, artistas locais passaram a ter mais espaço nas

emissoras de rádio e televisão e em questão de pouco tempo surgiram mais e mais

bandas com músicas autorais.

Segundo Souza Neto (2003), foi na década de 1970 que as bandas de rock

local deixadas um pouco de lado pelo surgimento da disco music, começam a compor

com mais frequência. Foi nesse cenário que surgiu a banda A Chave.

A banda começou como várias outras, tocando em bailes, mas logo entraram

nas rádios locais com suas próprias criações, chegando a tocar também em rádios de

todo o circuito nacional. Consolidando o gênero do rock em Curitiba.

A Chave permaneceu no cenário do rock curitibano até 1979, quando com uma

divisão de integrantes deu lugar à banda Blindagem.

2.1.1.1 AS DÉCADAS QUE MARCARAM O ROCK NA CAPITAL

É na década de 80 que começam a surgir muitas bandas pelo Brasil. Isso

acontece porque os instrumentos já não são mais tão caros, assim como alugar estúdios

e gravar cds.

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É também nos anos 80, segundo o jornalista cultural Rodrigo Duarte (2003),

que começam a surgir as “tribos urbanas”, termo criado pela mídia na época para definir

grupos urbanos. E com o crescimento de um público interessado na cena rock, o gênero

ganha ainda mais força na cidade, com o surgimento de grandes grupos que fizeram

história e o crescimento de alguns já formados. Entre eles: Blindagem, Beijo AA Força, Os

Catalépticos, entre outros.

A virada dos anos de 1980 para 90 podem ser considerados os anos em que vai surgir a estrutura básica da cena local. Se antes existiam bandas, shows e alguns bares alternativos, agora começam a surgir programas de rádio, cadernos culturais, mais bares, lojas de discos, selos independentes. (DUARTE apud SOUZA NETO, 2003 p. 397).

É na virada dos anos 80 para os 90 que o rock local ganha mais destaque, não

apenas pela mídia, mas também por donos de casas noturnas, que começam a ceder

espaço para bandas de rock tocar ao vivo. “Bares como Cabareth Voltaire, Hole, Bardo

Cardoso, Hell, Poeta Maldito e Circus Bar foram espaços para shows que duraram pouco,

mas tiveram papel importante no início da década de 90.” (DUARTE apud SOUZA NETO,

2003, p. 399).

Ainda segundo Duarte, muitos bares dessa época foram responsáveis pelo

aumento do público em shows de banda locais, como o AeroAnta, Syndicate, Mary Jane

Pub, Jail Bar, entre outros.

Muitas lojas de discos também davam apoio a bandas locais, como é o caso da

Jukebox, que na metade dos anos 80, vendia discos de bandas locais de rock e metal. A

801 Discos, a Temptation Discos e a CD Club também eram lojas que ajudavam as

bandas de rock locais vendendo seu material na década de 1990. “Vale citar que todas

essas lojas eram as que mais apoiaram fanzines na cidade, além de ajudar a divulgar

shows de bandas.“ (DUARTE, 2003, p. 401).

Foi também nos anos 80 que surgiram os Festivais no cenário musical

underground da cidade. Um dos primeiros foi o projeto Radioatividade do Guairinha.

“Bandas como Paz Armada, Beijo AA Força, DeFalla e Cólera passaram pelo projeto.

Infelizmente, este não durou muito porque a direção do Teatro Guairá não via com bons

olhos o descontrole nas instalações do teatro.” (DUARTE apud SOUZA NETO, 2003, p.

403).

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Nesta mesma época também surgiu o “Paiol em Pólvora”, no Teatro Paiol. O

“BIG” (Bandas Independentes de Garagem), no bar Ninety Two Degrees, O National

Garage, no Círculo Militar, o “Rock de Inverno”, entre outros. Muitos existem até hoje.

Já nos anos 90, surgiram os selos independentes. Segundo Duarte (2003), o

selo independente acaba conquistando mais espaço na mídia do que o artista que lança

disco de forma independente. Os selos estabelecem mais contatos, possibilitando um

destaque maior para o artista. Como o Barulho Records, o Franzini, o De Inverno

Records, que lançaram coletâneas e discos independentes com tiragens menores.

No cenário nacional, o rock estourava e as grandes gravadoras iam atrás de

novos grupos com potencial de sucesso instantâneo entre os jovens, que eram os

grandes consumidores do gênero. “O sonho das bandas paranaenses tornou-se entrar

nessa febre nacional, mesmo que de forma inconsciente. Marca Registrada, Beijo AA

Força, entre outras, tentaram, mas não conseguiram.” (SOUZA NETO, 2003, p. 662)

Todos corriam atrás do sucesso, exceção apenas daqueles que preferiam fazer um som alternativo, ou seja, música de porão. O tempo passava e nem sinal do ouro para os paranaenses. O grupo que chegou mais próximo foi o Blindagem, que lançou discos através de gravadoras como Continental, Polygram e Warner, mas sem emplacar na grande mídia. (SOUZA NETO, 2003 p. 663).

Estas décadas também foram marcadas pelo surgimento de “cadernos

culturais”. Os dois mais importantes suplementos culturais (de música, principalmente)

encartados em jornais ditados na cidade, foram o Trendie nos anos 80 e o Caderno Fun,

nos anos 90. Segundo Duarte (2003), o caderno Trendie era de um visual mais agressivo

e linha editorial descompromissada e vinha como suplemento do jornal Correio de

Notícias. Inicialmente como coluna, mais tarde como tablóide. Fazia a linha fanzine1, sem

obedecer ao jornalismo padrão. Divulgava os artistas locais, especialmente os músicos

underground, os fanzineiros e os poetas. Já o Caderno Fun era mais comportado. Suas

edições foram publicadas pelo jornal Gazeta do Povo entre os anos 1996 e 2000. O Fun

foi muito importante para a cena local, pois abriu um grande espaço para as bandas

curitibanas, publicando artigos, resenhas e matérias variadas. Foi o caderno de segmento

1 Fanzines: Abreviação de fanatic magazine. Surgiu no fim da década de 70 junto ao movimento punk na Inglaterra. Trata-se de uma publicação independente e despretensiosa, com liberdade de expressão e de conteúdo, sem nenhum padrão específico.

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jovem com a maior tiragem no Estado, chegando a 60 mil exemplares semanais,

publicados às sextas-feiras.

2.2 A MÍDIA E O CENÁRIO MUSICAL DE CURITIBA

A maioria dos veículos de comunicação paranaenses, principalmente os que se

encontram na capital, tem uma programação voltada à música local. A Rádio 91Rock, por

exemplo, tem o programa Cena Independente, que é transmitido todo domingo ao meio

dia, e voltado às bandas independentes da cena local. Na Internet, existem diversos blogs

e sites que dedicam seu espaço à música local, com críticas e entrevistas de artistas

paranaenses, como, por exemplo, o site Mondo Bacana, criado pelo jornalista Abonico

Ricardo Smith e as colunas na Gazeta do Povo online, como A Noite Toda de Luigi

Poniwass e Sobretudo de Luiz Cláudio Oliveira.

Na televisão, o programa PLUG da RPC (Rede Paranaense de Televisão), que

é voltado ao público jovem, também cede bastante espaço à música da cidade e do

Estado, assim como a TV Educativa, que dedica um grande espaço na sua grade de

programação para a música local. No formato impresso temos os jornais Estado do

Paraná com o caderno Almanaque, Gazeta do Povo com o espaço Caderno G, entre

outros, como o Jornal do Estado que também possui espaço para a cultura local.

Segundo o jornalista Rodrigo Duarte (2003) foi ao fim da década de 1980 que

começou uma movimentação da mídia em torno da música local. “Apesar de não ser o

objetivo principal da cena, alguns grupos tiveram boas chances de alcançar uma projeção

maior. A cena começou a ter uma divulgação maior no cenário musical nacional”.

(DUARTE apud SOUZA NETO, 2003, p. 394).

Mas isso não durou muito tempo, logo as gravadoras passaram a ditar as

regras e interferir diretamente na produção e imagem dos artistas. “Isso, associado aos

acordos entre gravadoras e veículos de comunicação, levou o “jabá” a níveis

insuportáveis, tornando a mídia potencialmente arrasadora e excludente para a cultura

paranaense”. (SOUZA NETO, 2003, p. 662).

Para o jornalista curitibano Ivan Santos (2004), o público da capital paranaense

não dá atenção para a produção cultural da cidade, preferindo consumir o que vem de

fora. Dificultando assim uma identidade cultural própria da cidade de Curitiba.

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A programação das rádios de Curitiba é uma simples mimetização das do eixo

Rio-SP. Entretanto, alguns espaços específicos se abriram em três emissoras: A

rádio Educativa tem aberto muito espaço para artistas locais (não só de rock, mas

também de mpb, jazz, instrumental, etc). Também a 96 FM criou um projeto

chamado Geração Pedreira, que passou a abrir espaço sistemático na

programação da rádio para as bandas locais, divulgando shows, tocando as

músicas, etc. Na Transamérica, quem abriu espaço foi o Mauro Mueller, locutor,

produtor e também músico que tem tocado som de bandas locais independentes

em seus horários. Fora isso, o que rola mesmo é o que você escuta nas rádios de

qualquer capital brasileira. (SANTOS, 2004)

O tratamento dado pela mídia local à bandas curitibanas foi melhorando

gradualmente. “Graças à insistência/persistência das pessoas que produzem, dos

músicos, das próprias bandas e de uma abertura maior de espaços na mídia local.”

(IVAN, 2004).

Mesmo com a atenção que a mídia local dá aos artistas paranaenses, não é o

suficiente para alçá-los ao cenário nacional. A banda que mais se aproximou disso foi a

Blindagem.

2.3 BANDA BLINDAGEM

Até hoje considerada pelos seus fãs como “a cara do rock paranaense”, foi a

primeira banda do estado a conseguir destaque no cenário nacional. A repercussão do

grupo se deu através das rádios de todo o país, apresentações em São Paulo, Rio de

Janeiro, inclusive na Itália na década de 80, e aparições nos principais programas de

televisão da época. A banda foi formada inicialmente pelo vocalista Ivo Rodrigues, Paulo

Teixeira, Alberto Rodriguez, Paulo Juk e Rubén Romero.

Em 1981, a banda lançou seu primeiro LP intitulado “Blindagem”, pela

gravadora Continental. Nos anos seguintes, eles lançaram mais quatro compactos por

diferentes gravadoras. Em 1987, gravaram o segundo LP, “Cara x Coroa”, de forma

independente. Em 1998 foi reeditado para CD pela MNF Brazil. E em 1990 o LP

Blindagem também foi reeditado, com o acréscimo de duas músicas (Se houver Céu e

Verdura) criadas e cantadas pelo poeta paranaense Paulo Leminski. Em 1997, a

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Blindagem lança, de forma independente, o álbum Dias Incertos, também com as criações

de Leminski.

Em 2008, a banda lançou seu primeiro DVD, gravado ao vivo na apresentação

do festival Rock em Concerto, em parceria com a Orquestra Sinfônica do Paraná. Esta

primeira apresentação foi transmitida na íntegra pela Paraná Educativa. Essa parceria se

estendeu até 2010. Houve também outros espetáculos mais teatrais envolvendo a banda,

como o “Rock Horror Show”, em 1982, dirigido por Antônio Carlos Kraide, em que eles

dividiam o palco com atores no Teatro Guaira.

Desde 1997 a banda não lança novos discos. “Mas o Blindagem era uma

espécie de instituição que, mesmo sem lançar um disco de inéditas há treze anos,

continua saltitante pelos palcos do Paraná” (REBINSK, 2010)2

O jornalista Luiz Cláudio de Oliveira (2003) em entrevista cedida a Manoel Neto

diz reconhecer a importância da banda Blindagem. “Devemos reverenciar o Blindagem

por ser uma das primeiras bandas de rock de Curitiba. Mais que isso, eles têm o mérito de

estar na estrada até hoje, fazendo um som de qualidade.” (2003, p. 312).

Mas o que mais se destacou na banda Blindagem em todos esses anos foi sem

dúvida o seu líder, Ivo Rodrigues.

2.4 IVO RODRIGUES, “A CARA DO ROCK PARANAENSE”

Ivo Rodrigues nasceu em Porto Alegre e veio para Curitiba aos três anos de idade.

O contato com a música começou quando ainda era jovem, em programas de auditório

em rádio e televisão. Estudou no Colégio Adventista Paranaense e era apaixonado por

futebol. Seu time era o Coritiba Futebol Clube e em 2001 participou do programa Globo

Esporte, relembrando momentos importantes do seu time e pedindo paz às torcidas em

campo.3

Em 1966 participou do programa Troféu Barra Limpa na TV Paranaense, que

premiava cantores e conjuntos do Sul do País. Foi neste programa que Ivo conheceu

Paulo Teixeira, que se apresentava com sua banda Os Jetsons, que mais tarde se

2 Informações retiradas do site oficial da banda. 3 Informações retiradas do site oficial da banda e também cedidas por Ivan Rodrigues, filho de Ivo.

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tornaria A Chave. Ivo foi premiado no Troféu Barra Limpa como melhor cantor. E como

prêmio ganhou um programa semanal na TV Paranaense, chamado Juventude Alegria.

Ivo voltou a encontrar a banda A Chave em 1969 durante uma apresentação

que ambos faziam na Reitoria da UFPR (Universidade Federal do Paraná) e passaram a

se apresentar juntos. O primeiro show da nova parceria foi o espetáculo “Adeus 70”, no

Círculo Militar do Paraná. Ivo não conseguiu o sucesso que pretendia nacionalmente,

diferente do seu conhecimento no Paraná que o fez até se candidatar a vereador.

Além da banda, Ivo cantava em bares do centro da cidade. Era conhecido

pelos amigos como Tia Marli, por conservar um cabelo comprido e cacheado. “Essa figura

era um ícone tão importante quanto a gralha azul ou a araucária para os paranaenses.

Sua voz potente poderia ser reconhecida até mesmo por um recém-nascido curitibano”

(REBINSKI, 2010).

Em 2009 fez uma cirurgia de transplante de fígado, a qual esperava na fila

havia três anos. A partir de então teve várias complicações decorrentes da cirurgia.

Chegou a fazer shows com um dreno. No dia 09 de abril de 2010, aos 61 anos, faleceu de

uma parada cardiorrespiratória, decorrente de um câncer descoberto dias antes. (ANIBAL,

ANGELI, 2010).

A problematização deste projeto surgiu quando constatou-se a importância de

resgatar a memória de um dos mais importantes artistas do Paraná, uma figura

interessante e muito relevante para a cultura local. E, além disso, registrar o contexto da

cena musical paranaense em que se encontrava a banda Blindagem e seu líder no ápice

da sua carreira, que foi a década de 1980.

Como representar por áudio-visual fragmentos do cenário musical dos anos 80

em Curitiba por meio de uma biografia de Ivo Rodrigues?

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3. OBJETIVOS

3.1 OBJETIVO GERAL

Retratar momentos da trajetória musical e pessoal de Ivo Rodrigues por meio de

um vídeodocumentário biográfico.

3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

- Representar algumas características do cenário musical na década de 80, em

que se encontrava no auge a Banda Blindagem e seu líder Ivo Rodrigues. Como era o

tratamento da mídia e porque a banda não alcançou o grande público.

- Resgatar a memória de Ivo Rodrigues, um ícone do cenário de música local.

- Registrar os últimos anos e os últimos dias de Ivo Rodrigues num

vídeodocumentário construído com métodos jornalísticos.

- Contribuir com o acervo cultural do Paraná.

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4. JUSTIFICATIVA

Este trabalho tem como resultado final um vídeo-documentário biográfico sobre o

artista paranaense Ivo Rodrigues contextualizando sua história com o cenário musical da

cidade de Curitiba na década de 80 e a de sua banda Blindagem. Optou-se por esta

década por ser o momento em que o rock começa a crescer na cidade e a banda

Blindagem se tornou então, um ícone local do gênero.

Segundo uma pesquisa4 criada pelo site da rádio 91Rock, a banda Blindagem é a

maior banda da história musical da capital paranaense. Das duzentas pessoas que

responderam a seguinte questão: Qual é a maior banda da história da música de

Curitiba? 92% responderam Blindagem.

O tema proposto pelo projeto tem sua relevância social justificada por ser um

resgate de memória cultural sobre um artista (Ivo Rodrigues) que veio a ser o principal

ícone do rock paranaense até hoje.

Optou-se pelo formato de vídeodocumentário por se tratar de um tema cultural

relacionado à música, com muitas imagens de arquivo, sendo mais interessante optar

pelo áudio-visual. “O documentário, com seus padrões dramáticos e sua capacidade de

capturar a imaginação das platéias, possuía um grande potencial a ser explorado no

campo da difusão de valores e formação da cidadania.” (DA-RIN, 2004, p. 56)

Em 2006, os cineastas Débora Rodrigues dos Santos e João Francisco Hoffmann

produziram um curta-metragem sobre o artista, intitulado “Voz Disfarçada de Gente”. O

curta de 7 minutos e 44 segundos conta um pouco da história de Ivo Rodrigues narrado

pelo próprio. Além do curta e de algumas reportagens para a televisão e jornais, não há

nenhum material no acervo cultural paranaense que aborde mais profundamente a

história desta banda e o contexto em que se encontrava na cena musical da década de

80. Isto justifica a originalidade deste projeto.

Para o jornalismo, fica a contribuição de um tema baseado em um nome

expressivo da música paranaense deixado em forma de documentário. Contribuindo para

futuras pesquisas no campo do jornalismo cultural regionalizado que o faz aproximar da

cultura local beneficiando artistas, pesquisadores, simpatizantes e fãs do artista.

4 Pesquisa feita no mês de Novembro de 2007.

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5. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

5.1 A IDENTIDADE CULTURAL Apesar da grande ligação não se pode confundir noções de cultura e

identidade cultural. A cultura pode existir sem consciência da identidade, já as estratégias

da identidade podem manipular e até modificar uma cultura que não terá quase nada em

comum com o que era anteriormente.

5.1.1 A IDENTIDADE DO ROCK NOS ANOS 80

A cultura depende grande parte de processos inconscientes. A identidade

remete a uma norma de veiculação necessariamente consciente. Segundo Danys Cuche,

o conceito de identidade cultural se caracteriza por uma “polissemia e fluidez”. A questão

da identidade cultural remete a questão mais abrangente da identidade social5, da qual

ela é um dos componentes.

A identidade permite que o indivíduo se localize em sistema social e seja localizado socialmente. A identidade social é ao mesmo tempo inclusão e exclusão: ela identifica o grupo e o distingue. Nesta perspectiva, a identidade cultural aparece como uma modalidade de caracterização da distinção nós/eles, baseada na diferença cultural. (CUCHE, 2002, p.177).

Na perspectiva da cultura como herança, a identidade remete necessariamente

ao grupo original de veiculação do indivíduo. As raízes seriam o fundamento de toda

identidade cultural, isto é, aquilo que definiria o indivíduo de maneira autêntica. “A

identidade é sempre a resultante da identificação imposta pelos outros e da que o grupo

ou o indivíduo afirma por si mesmo”. (DEVEREUX).

Neste contexto, a identificação de um grupo ou indivíduo se dá a partir do

repertório que o fará se identificar com os demais. Desta maneira, a identidade é passada

através de gerações que mantêm a cultura viva imposta desde as suas raízes. É a

maneira de subtrair o indivíduo e o colocar numa posição única dentro da sociedade.

5 A identidade social de um indivíduo se caracteriza pelo conjunto de suas veiculações em um sistema social; veiculação a uma classe sexual, a uma classe de idade, classe social, de nação, etc. (DANYS CUCHE, 2002, p.177)

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Para Frederik Barth (1969) no processo de identificação, o principal é

estabelecer “fronteira”. Resulta de um compromisso entre o que o grupo pretende marcar

e a que outros querem lhe designar. Em certos casos podem ter compensações

territoriais. O que cria a separação “fronteira” é a vontade de se diferenciar e não as

diferenças etnoculturais e o uso de certos traços culturais como marcadores de sua

identidade específica. Nas sociedades tradicionais, o passado é venerado e os símbolos

são valorizados porque contém e perpetuam a experiência de gerações. A tradição é um

meio de se lidar com o tempo e espaço. (GIDDENS,1990, p. 33-8).

Deste modo, a identificação requer uma hegemonia que vem através de uma

imposição delegada e autônoma. Neste processo se dispensa a cuidado com as raízes

culturais. Estabelecer fronteira trás vínculos e proximidade entre indivíduos.

Nas tradições do pensamento Marxista “os homens fazem a história, mas

apenas sob a condição de que lhes são dados”. De acordo com a tradição, os indivíduos

não poderiam de nenhuma forma ser os “autores” ou os agentes da história, uma vez que

eles podiam agir apenas com base em condições históricas criadas por outros e sob os

quais eles nasceram, utilizando os recursos materiais e de cultura que lhes foram

fornecidos por gerações anteriores. Assim a identidade seria realmente algo formado ao

longo do tempo. (HALL, STUART, 2005, p. 34)

O fenômeno da exaltação da diferença que surgiu nos anos 70 levou tendências ideológicas diversas e opostas a fazer apologia da sociedade multicultural e a exaltação da idéia de cada um por si para manter uma identidade. “há o desejo de se ver cultura em tudo, de encontrar identidade para todos”. (CUCHE, 2002, p. 175-76).

A produção musical do rock no Brasil surgiu num cenário em que a liberdade

de expressão começava a ganhar força e sentido ao mesmo tempo em que o sistema

político ditatorial perdia espaço com a chamada abertura política. A expressão musical do

rock tenta neste contexto através das letras de suas músicas, trazer a tona o espírito

libertário da expressão, o questionamento de problemas sociais e políticos. Com o

aprisionamento e as feridas que a ditadura militar, a sociedade desacostumou a essas

reivindicações. A perda da identidade e a retomada de uma nova realidade fez despertar

numa época em que a liberdade de expressão voltava a exercer e reivindicar seus

direitos. Neste cenário um dos movimentos importantes no início da década de 80 foi o

Rock’In Rio.

19

O primeiro Rock’In Rio em 1985 coincidiu com a eleição de Tancredo Neves,

primeiro presidente civil, após 1964, e se constituiu em um espaço para a manifestação

do poder jovem “silenciado” desde os anos 60. “Esta produção discurso-musical, aparece

como trilha sonora que embalou vários movimentos sociais em busca de mudanças na

contribuição de identidade” i. (FLÁVIA ZANUTTO, 2008, 1º JIED).

É preciso considerar a década de 80, não como um corte, mas como a continuação de processos e mudanças que ocorrem no interior da sociedade brasileira. Uma das questões está relacionada com a especificidade e o grau de autenticidade daquilo que é chamado de identidade cultural”. (Oliven, George Ruben, 1981, p.1).

Com um público segmentado o rock pode marcar diferenças em relação a

produção discursiva da identidade. Tal fato permitiu uma reflexão sobre a identidade

dessa geração seguidora desta vertente musical.

5.2 JORNALISMO CULTURAL

É necessário entendermos qual é o papel do jornalismo cultural atualmente e

qual sua influência no critério de escolha dos leitores que irão consumir produtos culturais,

como os de segmento musical, que é o tema deste projeto.

Segundo o jornalista Daniel Piza (2004), o jornalismo cultural é uma espécie de

ampliação ao acesso de produtos culturais. Esse tipo de jornalismo precisa saber

observar este mercado sem preconceitos ideológicos. “A função jornalística é selecionar

aquilo que reporta influir sobre os critérios de escolha dos leitores, fornecer elementos e

argumentos para sua opinião. Tem o dever do senso crítico, da avaliação de cada obra

cultural.” (PIZA, 2004, p. 45).

Para o jornalista J. S. Faro (2008), apesar de uma presença quantitativamente

significativa, “o jornalismo cultural ainda não conseguiu produzir em torno de si reflexões

acadêmicas que dêem conta de sua complexidade.” (FARO, 2008, p. 2) Faro, em sua

análise cita uma matéria do jornalista Breno Castro Alves para o site Comunique-se6, que

aponta as dificuldades enfrentadas por jornalistas dessa área.

6 Matéria de 20 de abril de 2006. Os desafios do jornalista que cobre Cultura. www.comunique-se.com.br

20

O jornalismo cultural se propõe a cumprir a tarefa de cobrir, analisar e relatar os principais expoentes da produção cultural do gênero humano, em áreas tão diversas quanto dança artes plásticas, teatro, música ou cinema e em regiões que vão desde o sertão nordestino até as estepes russas. (CASTRO ALVES, 2006, p. 3).

Para Piza (2004), as primeiras características de jornalismo cultural no Brasil,

surgiram na década de 30, com Mário de Andrade, que escrevia textos críticos sobre

música, literatura, folclore e artes visuais. Publicados na época pelo jornal Diário de São

Paulo e pela revista O Cruzeiro, que surgia nesta mesma época. Mas foi só em 1950 que

surgiram os chamados “cadernos culturais”, que eram junções de resenhas e artigos

críticos em um só suplemento. Hoje, este tipo de artigo crítico, ganhou espaço diário nos

periódicos.

Segundo Piza, as características que o jornalismo cultural possuía sofreram

alterações na atualidade. Muitas, causadas pelas crises financeiras que os jornais

impressos enfrentaram e ainda enfrentam. Quando o auge do jornalismo cultural teve fim,

as editorias de cultura davam espaços a “assuntos que não fazem parte das chamadas

“sete artes” (literatura, teatro, pintura, escultura, música, arquitetura e cinema), como

moda, gastronomia e design” (PIZA, 2004, p.41).

Além das restrições do jornalismo cultural, segundo Faro, outra dificuldade em

analisar o fenômeno reside no conceito pouco rigoroso com que o tema tem sido

estudado. “Um exemplo, são as afirmações segundo a qual ‘todo jornalismo é cultural’,

uma espécie de truísmo ao qual se segue quase sempre uma outra tautologia: ‘todo

jornalista é um intelectual’.” (FARO, 2008, p.5).

Para Piza (2004), o jornalismo cultural não deveria ser restrito a montar

agendas, mas também, analisar as influências que as manifestações de arte trazem para

a sociedade. Esta análise permitiria que o jornalismo cultural voltasse a ser feito como

antes e para isso o jornalista deveria voltar à imparcialidade. Indicando a qualidade do

produto, informando a respeito dele, como mediador cultural entre o público e o consumo

do produto artístico.

É o único meio, acredito, de vencer os preconceitos em relação à chamada indústria cultural – seja o preconceito que supõe que ela esteja a serviço de uma ideologia opressora e produza apenas massificação e jamais a grande arte, seja o que supõe que ela é a mera expressão direta da vontade da maioria e se limita a atender aos diversos gostos vindos da sociedade. (PIZA, 2004, p.43)

21

O jornalismo cultural, segundo Faro, além de sua dimensão informativa e

mercadológica, é também de categorias valorativas e históricas, negociadas entre os

vários jornalistas que a produzem.

A resenha, a crítica teatral, a crítica literária, a avaliação da filmografia, estão permanentemente formulando um olhar que extrapola o âmbito específico do fato motivador da pauta e do texto e se estende sobre a própria tensão decorrente da avaliação jornalística – ou da avaliação produzida para sua inserção no produto (o suplemento, a seção, a revista especializada). (FARO, 2008, p.5)

Para Faro, no jornalismo cultural ocorrem alguns trâmites em torno da

avaliação e da análise da produção do jornalismo cultural representada pelos eventos

artísticos do mundo social, razão pela qual diversos veículos com as características já

apontadas se prestaram à condição de interpretadores.

5.3 VÍDEODOCUMENTÁRIO COMO GÊNERO JORNALÍSTICO

Segundo o americano Bill Nichols, em seu livro Introdução ao Documentário

(2001), os filmes documentários diferem, significativamente, dos filmes de ficção. “Eles

estão baseados em suposições diferentes sobre seus objetivos, envolvem um tipo de

relação diferente entre o cineasta e seu tema e inspiram expectativas diversas no

público.” (NICHOLS, 2001, p. 17).

Mas não existe uma separação absoluta entre os dois gêneros. Alguns

documentários utilizam muitas ferramentas que podem ser associadas a filmes ficcionais.

Como roteiro, encenação e interpretação, por exemplo. E o contrário também acontece,

muito filme de ficção se utiliza de muitas práticas que também associamos à não-ficção,

como, não-atores, câmeras portáteis, improvisação e imagens de arquivo, por exemplo.

Para o brasileiro Silvio Da-Rin, o domínio do documentário funciona como

catalisador de questões históricas que ao longo dos anos receberam respostas

contraditórias. “Periodicamente novos movimentos e escolas aí se confrontam, dando

lugar a sucessivas configurações do documentário.” (DA-RIN, 2004, p. 19).

Segundo Nichols (2001), normalmente os cineastas recorrem a este gênero

quando querem uma representação de questões relacionadas direta ou indiretamente

com o mundo que compartilhamos. Muitos gostam de enfatizar esta representação fiel e

autêntica, que por muitas vezes minimizam qualquer importância que venha a ter o

22

gênero ou a percepção do cineasta. “A tradição do documentário está profundamente

enraizada na capacidade de ele nos transmitir uma impressão de autenticidade.”

(NICHOLS, 2001, p. 20).

Os cineastas escolhem muitas vezes representar pessoas que não conhecem,

mas que de alguma forma tipificam ou detêm um conhecimento especial sobre um

problema ou um assunto de interesse. Há também os cineastas que escolhem apenas

observar os outros, sem interferir diretamente em suas atividades, mesmo que

eventualmente corram o risco de alterar comportamentos ou acontecimentos. “Os vídeos

documentários apresentam a mesma complexidade, o mesmo desafio, o mesmo fascínio

e a mesma emoção que qualquer um dos tipos de filme de ficção.” (NICHOLS, 2001, p.

21).

Ao longo da história do cinema, foram identificadas diferentes tendências para

o documentário, segundo Da-Rin (2004), com objetivações peculiares, como plataformas

estéticas, práticas consideradas superadas e resgate de antecessores. O que mantém o

gênero agregado é o fato de seus membros compartilharem referências, gravitarem em

torno de uma mesma tradição.

Nichols (2001) questiona “Que obrigação têm os documentaristas com as

pessoas que são temas de seus filmes, no que diz respeito ao público ou à própria

concepção de verdade?” (Ibid., p. 37) E diz que a maioria dos cineastas quando

constroem documentários, agem como representantes dessas pessoas que estão sendo

filmadas, e não como um membro incluso naquela comunidade ou naquele tema em

particular. Mas que frequentemente ocorre tensões entre a vontade do cineasta em fazer

um filme marcante e o desejo dos indivíduos em ter respeitados seu direito e sua

dignidade. “Experimentamos uma forma distinta de fascínio pela oportunidade de

testemunhar a vida dos outros quando eles parecem pertencer ao mesmo mundo histórico

a que pertencemos.” (Ibid., p. 18).

Frequentemente, segundo Da-Rin (2004), o termo “atualidades” é empregado

como sinônimo de “documentário”, desde os primórdios do cinema, fazendo oposição às

“ficções”. Mas esta concepção, além de ser superficial, encobre um significado mais

amplo para “atualidades”, no contexto de uma sociedade de massa. “O documentário veio

ao mesmo tempo revelar e possibilitar uma nova percepção de um mundo agitado,

23

articulando-se com as notícias, os relatos e as fabulações que circulavam em outros

meios de comunicação.” (Da-Rin, 2004, p.31).

Segundo Nichols (2001), pode-se construir um documentário com diferentes

formulações. Como por exemplo, “Ele fala deles – ou de alguma coisa – para nós”, essa

formulação passa uma idéia de separação entre quem fala (o cineasta) e seu público. É o

que o autor chama de Discurso Institucional, em que o filme, por meio de comentários de

um narrador em voz-over, nos informa aspectos sobre um tema de maneira impessoal. Já

a forma “Eu falo – ou nós falamos – de nós para você”, coloca o cineasta junto ao grupo

que ele representa no documentário. No cinema antropológico, essa formulação recebe

também o nome de “auto-etnografia”.

Nichols fala que não é possível definir o filme documentário de uma forma

simples, pois esta definição é sempre relativa, muitas vezes comparativa, definindo-se

pelos contrastes com outros de filmes de ficção ou experimentais e de vanguarda.

Se o documentário fosse uma reprodução da realidade, esses problemas seriam bem menos graves. Teríamos simplesmente a réplica ou cópia de algo já existente. Mas ele não é uma reprodução da realidade, é uma representação do mundo em que vivemos. Representa uma determinada visão do mundo, uma visão com a qual talvez nunca tenhamos deparado antes, mesmo que os aspectos do mundo nela representados nos sejam familiares. (NICHOLS, 2001, p. 27).

Segundo Da-Rin (2004) a palavra “documentário” se deve à uma necessidade

de legitimação. E em decorrência deste batismo, todos os cineastas que optavam por um

cinema não-ficcional tiveram que lidar com as conotações de evidência que o novo termo

“documentário” encerrava. “Dramatização, interpretação e intervenção social – estes são

os atributos do documentário para seus fundadores.” (DA-RIN, 2004, p. 93).

Nichols costuma denominar o documentário de “conceito vago”, pois nem todos

os filmes deste gênero são semelhantes. Não existe um padrão fixo para regras, técnicas

ou estilos que os caracterizem. As regras podem mudar o tempo todo. Sempre alguém

tentará novas abordagens que desafiem as convenções e ultrapassem os limites

determinados anteriormente sobre algum tema, que poderão ou não serem adotadas ou

abandonadas por outros cineastas. “Em nenhum momento, uma definição abarca todos

filmes que poderíamos considerar documentários.” (NICHOLS, 2001, p. 48).

Para compreender melhor a definição do filme documentário, é preciso abordá-

lo de quatro ângulos diferentes: O dos profissionais, o das instituições, o dos textos

24

(filmes) e o do público. O argumento que sustenta um documentário e a lógica que o

organiza é o que dá ao gênero sua particularidade. O documentário exibe um conjunto de

tomadas e cenas mais amplo que a ficção, com uma narrativa que gira em torno de um

personagem ou histórias centrais.

Os personagens, ou atores sociais, podem ir e vir, proporcionando informação, dando testemunho, oferecendo provas. Lugares e coisas podem aparecer e desaparecer, conforme vão sendo exibidos para sustentar o ponto de vista ou a perspectiva do filme. Uma lógica de implicação faz a ponte entre esses saltos de uma pessoa ou lugar para outro. (NICHOLS, 2001, p.51)

Segundo Nichols (2001), ao invés da montagem em continuidade, que é

utilizada no cinema de ficção, no documentário podemos utilizar a “montagem de

evidência”, onde unificamos o espaço, o tempo e os personagens dentro da cena, dando

a impressão de um único argumento convincente, que sustente a lógica do documentário.

“Costumamos avaliar a organização de um documentário pelo poder de persuasão ou

convencimento de suas representações e não pela plausibilidade ou pelo fascínio de suas

fabricações.” (NICHOLS, 2001, p. 58).

Bill Nichols define seis modos de se construir um documentário:

Modo Poético: Que enfatiza associações visuais e passagens descritivas. Esse

modo possui uma organização formal, chegando muito próximo do cinema experimental,

pessoal ou de vanguarda.

Modo Expositivo: Enfatiza o comentário verbal e a lógica argumentativa por

meio de uma narração. Esse é o modo mais comum e que as pessoas reconhecem mais

facilmente como documentário.

Modo Observativo: Esse modo enfatiza o engajamento direto no cotidiano das

pessoas que representam o tema que o cineasta escolheu para trabalhar. As pessoas e

os acontecimentos são observados por uma câmera discreta.

Modo Participativo: Se faz com a completa interação entre cineasta e tema.

Com entrevistas e outras formas de envolvimento ainda mais direto. Normalmente usa-se

também imagens de arquivo para situar questões históricas.

Modo Reflexivo: Chama a atenção para as hipóteses e convenções que regem

o cinema documentário. Incentiva nossa consciência a refletir sobre a construção e a

representação da realidade feita pelo filme.

25

Modo Performático: Chama a atenção para os aspectos subjetivos ou

expressivos do engajamento do cineasta com seu tema e a receptividade do público a

esse engajamento. Rejeita idéias de objetividade.

Os modos adquirem importância num determinado tempo e lugar, mas persistem e tornam-se mais universais que os movimentos. Cada modo pode surgir, em parte, como reação às limitações percebidas em outros modos, como reação às possibilidades tecnológicas e como reação a um contexto social em mudança. Entretanto, uma vez estabelecidos, os modos superpõem-se e misturam-se. Os filmes, considerados individualmente, podem ser caracterizados pelo modo que mais parece ter influenciado sua organização, mas também podem combinar harmoniosamente os modos, conforme a ocasião. (NICHOLS, 2001, p.71)

Os modos utilizados no vídeo-documentário deste projeto serão os modos

Poético e Participativo. Com associações entre imagem e descrição. E uma interação com

o tema através de entrevistas e com o uso de imagens de arquivo para situar o

espectador.

O vídeodocumentário tanto pode ser um produto audiovisual independente de

segmentos como também pode ser um material de gênero jornalístico.

É fundamental ressaltar a importância do documentário na construção e divulgação do conhecimento, além da possibilidade de desenvolvimento de uma participação ativa de uma determinada comunidade a partir da utilização do gênero, como no caso, no gênero jornalístico. (MILITÃO, ARAÚJO, CRUZ, AURÉLIO, 2007)

Para Cristina Melo (2002), o vídeodocumentário não só pode ser um gênero

jornalístico, como também apresenta práticas jornalísticas em sua construção. ”O fato de

ser um discurso sobre o real e utilizar imagens in loco são características que aproximam

o documentário da prática jornalística.” MELO (2002). Melo observa também que ao

contrário do que ocorre com os gêneros jornalísticos, no documentário é bem vinda a

parcialidade.

Este gênero é fortemente marcado pelo “olhar” do diretor sobre seu objeto. O documentarista não precisa camuflar a sua própria subjetividade ao narrar um fato. Ele pode opinar, tomar partido, se expor, deixando claro para o espectador qual o ponto de vista que defende. (MELO, 2002)

Mas nem todo documentário é parcial. Ele também pode ser apenas uma

espécie de grande reportagem. Como em Motoboys – Vida Loca, em que o diretor Caíto

26

Ortiz mostra a rotina dos motoboys em São Paulo, sem transformá-los em bandidos ou

heróis.

5.4 BIOGRAFIAS EM JORNALISMO

Muito tem se explorado entre a relação da biografia e do jornalismo, que nos

últimos tempos tem ganhado um grande espaço no mercado editorial e entre

espectadores, por fazerem de pessoas individuais seres complexos através de diversas

fontes.

Segundo o jornalista Sérgio Vilas Boas (2002) os profissionais de diversas

áreas das Ciências Sociais têm reivindicado classificações para as biografias que

produzem, as quais geralmente retratam personalidades de seus próprios campos de

formação e atuação.

Para Vilas Boas (2002) é inviável sustentar que “biografia jornalística” é a

modalidade elaborada e escrita por um jornalista com experiência profissional em jornal,

revista, rádio, televisão ou websites de conteúdo jornalístico. “Se as definições estivessem

circunscritas aos campos de formação, os jornalistas estariam muito restringidos. Teriam

de escrever sobre a vida de jornalistas renomados ou proprietários de empresa de

comunicação.” (Vilas Boas, 2002, p. 17).

Os biógrafos tendem a biografar um indivíduo que ao menos mereça seu

respeito e estimule sua capacidade individual de investigação. Mas outros fatores também

são importantes na construção biográfica, como o mercado, as preferências pessoais do

autor, sua relação com o tema, entre outros. “Tanto a lista de pessoas biografáveis no

mundo quanto às opções dos biógrafos são finitas e não se restringem a este ou àquele

campo. Até porque o(a) biógrafo(a) pode escolher quem irá biografar.” (Vilas Boas, 2002,

p.17).

Em rigor, biografia é a compilação de uma (ou várias) vida(s). Pode ser impressa em papel, mas outros meios, como o cinema, a televisão ou o teatro podem acolhê-la bastante bem. Por enquanto, não há certificados epistemológicos para o fazer biográfico. Para os propósitos deste trabalho, o que interessa é a escrita e o autor, a criação e a publicação, o personagem e sua interpretação. (Vilas Boas, 2002)

27

Segundo o americano Robert Young, citado por Vilas Boas (2002), a biografia é

uma disciplina com sua própria literatura, sua própria reflexão. Para ele, a biografia torna

históricos os acontecimentos. Tudo tem uma história, um passado, que pode ser

reconstruído e relacionado com acontecimentos que moldaram seu biografado. Sem

passado não há biografia. Uma única biografia pode conter ideias, narrativa, personagens

e subjetividade da vida humana.

Para Vilas Boas (2002), o jornalismo desenvolveu um conjunto de técnicas,

conceitos e princípios que o norteiam na hora de escrever sobre um acontecimento, sobre

o “ontem”. A maioria dos jornalistas trabalha para alimentar audiências com informações

sobre o que às vezes ocorreu há horas ou minutos atrás. Ao leigo, este é o modo mais

rápido de compreender o que é o jornalismo e o que um jornalista faz diariamente. Mas a

narrativa jornalística periódica não é a única possibilidade de contar - em rádio, jornal ou

TV – o que aconteceu. O jornalismo possui outras modalidades que fazem o leitor

compreender o passado.

Muitos biógrafos da atualidade têm formação em jornalismo ou experiência em

redações. “São os chamados repórteres especiais. Alguns preferem autodefinir-se

repórteres investigativos e renegam a tradição do biógrafo como catedrático.” (Vilas Boas,

2002, p.26).

Para o autor, a biografia possui dois princípios básicos: o de contar a história o

mais próximo possível da realidade e garantir a acessibilidade por meio de princípios,

funções e recursos do jornalismo, da literatura e da história. Autor, criação, estilo e obra

são indissociáveis. “O trabalho do biógrafo é autoral, mas raramente seu nome supera,

em interesse, o do personagem-tema. Estilista ou não, o fato de poder tornar-se autor por

si só não ilumina a proposição de que biografia é arte.” (Vilas Boas, 2002, p. 111).

Vilas Boas (2002) cita a inglesa Virginia Woolf que também discutia interesses

em torno da biografia. Para ela o processo biográfico impõe certas condições. A maior

delas é que cada palavra estaria baseada em fatos. “E por fato em biografia entendemos

o acontecimento que pode ser verificado por outras pessoas além do artista.” (VIRGINIA

WOOLF apud VILAS BOAS, 2002, p.112).

Para o americano Stephen B. Oates, para simular a vida de um sujeito o

biógrafo apóia-se na linguagem, nas imagens, diálogos, citações, detalhes,

personalidade, entre outras coisas, para a composição de uma biografia.

28

Uma biografia exemplar apresenta uma pessoa viva em um mundo vivo. É escrupulosamente precisa coerente do ponto de vista dramático e convincente do ponto de vista psicológico – é verdadeira em relação à vida do biografado e à história. (STEPHEN B. OATES apud VILAS BOAS, 2002)

Já a interpretação do personagem dada pelo biógrafo é a premissa analítica da

qual toda biografia vai depender.

Até mesmo se o biógrafo resolver contar sua história de forma estritamente narrativa, ele partirá dessa base analítica. Isto é algo que os críticos não conseguem entender quando desqualificam uma boa narrativa biográfica como “não sendo analítica”. Não existe boa narrativa biográfica que não seja analítica. O processo de escolha, estudo e interpretação é inteiro analítico. (Steve Weinberg apud Vilas Boas, 2002)

A narrativa biográfica segundo Vilas Boas (2002), escrita, oral ou visual, pode

ser uma importante aliada na luta contra o artificialismo. Por decorrer de experiências de

vida, a biografia é o reconhecimento das realidades humanas.

Muitos autores optam por fazer biografias também no formato de

videodocumentário, como Wilson Simonal – Ninguém Sabe o Duro que Dei, de Claudio

Manoel, Micael Langer e Calvito Leal; Senna, de Asif Kapadia; Person, de Marina Person;

Herbert de Perto, de Roberto Berliner e Pedro Bronz; Ziraldo - O Eterno Menino

Maluquinho, de Sônia Garcia, entre outros.

Para a jornalista Cremilda Medina a maneira mais eficiente de se conseguir

dados para uma boa biografia é através da entrevista e depoimentos.

5.5 ENTREVISTAS

Segundo a jornalista Cremilda Medina (2002), a entrevista não pode ser

encarada como uma simples técnica que obtém respostas pré-pautadas por um

questionário. Embora seja uma técnica eficaz, não atinge os limites possíveis do diálogo.

Um leitor, ouvinte ou telespectador sente quando a entrevista passa emoção e

autenticidade no discurso do entrevistado ou nas perguntas do entrevistador. Neste

momento ocorre uma identificação entre os envolvidos – fonte, repórter, receptor – que se

interligam.

29

Reforçar apenas o fenômeno de identificação e de fluência do diálogo na técnica da entrevista permanece na esfera do desempenho, da eficácia dos meios de comunicação coletiva. Enquanto insistirmos na competência do fazer, despojada de significado humano, pouco se avançara no diálogo possível numa sociedade em que impera a divisão, a grupalidade, a solidão. Se os meios são de comunicação, que se encare então o que é comunicar, interligar. (MEDINA, 2002, p.6)

Na maioria das entrevistas é o jornalista que dá o ritmo à pauta e normalmente

preestabelece as respostas, conduzindo o interlocutor aos resultados. “Desenvolver a

técnica da entrevista nas suas virtudes dialógicas não significa uma atitude idealista. No

cotidiano do homem contemporâneo há espaço para o diálogo possível.” (MEDINA, 2002,

p.7).

A entrevista é uma técnica de interação social informativa, que quebra

isolamentos grupais e individuais. “Todas as pessoas, de uma maneira ou de outra, são

envolvidas na entrevista, ora entrevistando, ora sendo entrevistadas. As duas situações

contêm aspectos objetivos e subjetivos.” (A. GARRET, 1981 apud MEDINA, 2002, p. 9).

Segundo o jornalista Edgar Morin (MORIN, 1973 apud MEDINA, 2002), a

entrevista pode ser classificada em quatro tipos:

Entrevista-rito: Trata-se de obter uma palavra, como as palavras dos campeões

nos finais dos jogos ou um vencedor com o prêmio na mão.

Entrevista anedótica: Normalmente entrevistas frívolas, complacentes, onde as

perguntas são quase sempre tolas, sobre fofocas e projetos. Nada comprometedor.

Entrevista-diálogo: Quando a entrevista se torna diálogo. O entrevistador e o

entrevistado colaboram para trazer a tona uma verdade a respeito do entrevistado ou de

um tema.

Medina (2002), também divide as entrevistas em cinco gêneros diferentes:

Conceitual: O entrevistador busca informação. Para ele a fonte a ser

entrevistada detém as informações necessárias. Normalmente com especialistas, como

sociólogos, cientistas, entre outros.

Entrevista/enquete: O tema é o fundamental da pauta e normalmente procura-

se mais de uma fonte para depor sobre o tema, com pautas ou questionários que dêem

unidade à enquete.

30

Investigativa: Quando o jornalista vai procurar a informação além daquelas que

estão ao seu alcance. Normalmente sobre temas de questões públicas, como

administração governamental, gestão de dinheiro público, abuso de poder, entre outros.

Confrontação/polemização: Envolvem temas polêmicos e o jornalista

desenvolve a habilidade de mediador, instigador, porta-voz do senso comum. Debates,

por exemplo.

Perfil humanizado: A entrevista com finalidade de traçar um perfil humano.

Uma entrevista aberta para compreender os conceitos, valores, comportamento e

histórico da vida de alguém.

Para este trabalho utilizaremos os métodos do gênero Perfil humanizado e a

forma de entrevista-diálogo que Medina nos mostra.

A partir da década de 1950, segundo Medina, começa a se valorizar a

humanização das fontes. Essa humanização com uma certa subjetividade, também foi

adotada por jornalistas norte-americanos nos anos 60, como por exemplo, Tom Wolfe.

“Ao lidar com o perfil humanizado, consciente ou inconscientemente se faz presente o

imaginário, a subjetividade. O entrevistado passeia em atalhos, avança e recua, perde-se

no tempo e no espaço.” (MEDINA, 2002, p. 43).

O repórter pode montar um perfil mesmo se as coisas não se sucedem de um

jeito ordenado na entrevista, exatamente como mandam os manuais de redação. O que

Medina (2002) quer passar é que é possível representar um diálogo mesmo fugindo da

objetividade.

31

6 METODOLOGIA

Para realizar esse projeto foram feitas algumas entrevistas informais sobre o

assunto a ser abordado para uma maior aproximação com o tema proposto. Também

foram realizadas pesquisas exploratórias, baseadas nos métodos de Antônio Carlos Gil

(1999), que destaca que este método de pesquisa é desenvolvido para se proporcionar

uma visão geral acerca de determinado fato. Segundo Gil, “o elemento mais importante

para a identificação de um delineamento é o procedimento adotado para a coleta de

dados.” (GIL, 1999, p. 65)

Além da pesquisa exploratória também realizou-se a pesquisa blibliográfica, que

segundo Carlos Gil (1999), é uma pesquisa feita mediante material já elaborado, com

contribuição de vários autores, principalmente em livros. Este material consultado abrange

tudo o que já foi tornado público em relação ao tema abordado neste projeto. Em jornais,

websites, livros, entre outros.

Para a produção do vídeo-documentário optou-se por analisar vários exemplos de

documentários nesse formato, de caráter biográfico, já que retratará o contexto musical de

uma época baseado na história de uma das principais bandas inseridas neste período.

Outro assunto abordado na fundamentação deste projeto foi o jornalismo cultural, já que o

vídeodocumentário está segmentado neste gênero do jornalismo.

6.1 MÉTODOS PARA A REALIZAÇÃO DO PRODUTO

Para a construção do vídeo-documentário realizamos entrevistas com pessoas

que trabalharam ou viveram direta ou indiretamente com Ivo, músicos, amigos, familiares,

integrantes das bandas que Ivo tocou. Pessoas que de alguma forma se envolvem ou se

envolveram com cenário musical daquela época. Utilizamos também material de arquivo –

pessoal e de matérias televisivas - com gravações e imagens que ajudem a situar e

contextualizar o objetivo proposto.

32

7 DELINEAMENTO DO PRODUTO

7.1.SINOPSE

Este documentário traça fragmentos da vida e carreira do cantor Ivo Rodrigues.

Uma biografia com ênfase nos últimos anos. Sua passagem pelas bandas A Chave e

Blindagem. E seu problema com o álcool, que o levou a morte em abril de 2010.

7.2 ARGUMENTO

Ivo Rodrigues, o ícone do rock paranaense. Um dos primeiros roqueiros da cidade

de Curitiba que conseguiu se manter e viver de música durante 30 anos com sua banda, a

Blindagem, que se mantém no topo desse cenário até os dias de hoje.

Considerado por muitos um dos melhores cantores de rock da capital paranaense e até

do país, conquistou com seu carisma o público paranaense. O documentário biográfico

tem como objetivo resgatar a memória da vida e carreira de uns dos personagens mais

interessantes da cultura paranaense. Retratando também a hist;orai da banda que o

seguiu nos últimos anos com algumas histórias e curiosidades destes 30 anos de estrada.

7.3 A PROPOSTA

O documentário pretende resgatar uma memória cultural da música paranaense,

como já foi dito anteriormente. Com o objetivo de mostrar alguns aspectos da vida de Ivo

Rodrigues. Sua relação com a música, com seus amigos e familiares e com o álcool.

Conhecer um mais a realidade de um ícone da música local.

Documentários com a mesma proposta: Senna, Herbert de Perto, Simonal – Ninguém

Sabe o Duro que Dei, Ziraldo – O Eterno Menino Maluquinho, Santiago, entre outros.

33

7.4 DESCRIÇÃO DO OBJETO

Este documentário é baseado em arquivos da vida de Ivo. Declarações de

personagens que viviam de perto com o líder da banda Blindagem. Integrantes da atual

banda, da ex-banda, amigos, filho e pessoas da mídia.

7.5 ABORDAGEM

O tipo de documentário realizado serão os de modo Poético e Participativo.

Entrevistas em formas de depoimentos, conversas com os personagens entrevistados.

Interligando as declarações com fotos e vídeos sobre o tema. Sem OFF.

7.6 ESTRUTURA

A estrutura do documentário é toda baseada nas entrevistas sobre o tema em

questão. Contextualidas com material audiovisual, como vídeos e fotos.

O documentário será dividido em “blocos” por assuntos, mas quem fará a ligação

destes blocos serão as próprias sonoras.

7.7 PÚBLICO ALVO

O público alvo deste projeto é muito amplo. Pois pode ser apreciado tanto pelo

público que goste de música, de rock. Como também pelo público interessado pela cultura

e arte paranaense. Sem contar fãs e admiradores que queiram saber mais sobre a vida e

carreira de Ivo Rodrigues.

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8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CUCHE, Danys, A Noção de Cultura nas Ciências Sociais. Bauru-SP: Ed. Edusc, 2002, 2ª Ed. 245 p. ISBN 85-86259-59-4 DA-RIN, Silvio. Espelho Partido – Tradição e Transformação do documentário. Rio de Janeiro. Ed. Azougue Editorial, 2004. 247p. ISBN 85-88338-39-4 GIL, Antônio Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São Paulo. Ed. Atlas, 1999. HALL, Stuart, A Identidade Cultural na Pós Modernidade. Rio de Janeiro: Ed. DP&A, 2005, 10ª Ed. 104 p. ISBN 85-7490-336-1 MEDINA, Cremilda de Araújo. ENTREVISTA: O Diálogo Possível. São Paulo. Ed. Ática, 2002. 96p. ISBN 85-08-01522-4 NICHOLS, Bill. Introdução ao Documentário. São Paulo. Ed. Papirus, 2001, 275p. ISBN 85-308-0785-5 PIZA, Daniel. JORNALISMO CULTURAL. São Paulo. Ed. Contexto, 2003, 143p. ISBN 8572442278 SOUZA NETO, Manoel J. [des]Construção da Música na Cultura Paranaense. Curitiba: Ed. Aos Quatro Ventos, 2004. 707p. VILAS BOAS, Sérgio. Biografias e Biógrafos – Jornalismo sobre Personagens. Summus Editorial, 2002. 185p.

8.1 REFERÊNCIAS 91 ROCK. Pesquisa 91Rock que mostra a banda Blindagem como a maior da história da música de Curitiba, Novembro/2007. Disponível em http://www.91rock.com.br ANÍBAL, Felippe; ANGELI, Gladson. Corpo do vocalista da banda Blindagem é velado no Cemitério Municipal. Gazeta do Povo, Curitiba, 09 abr. 2010. Disponível em:

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http://www.gazetadopovo.com.br/cadernog/conteudo.phtml?id=991091&tit=Morre-Ivo-Rodrigues-vocalista-da-banda-Blindagem&tl=1 COSTA, Marcelo. Curitiba não valoriza a cena local, diz músico. Portal Terra, São Paulo, 01 jul. 2004. Disponível em: http://musica.terra.com.br/interna/0,,OI335156-EI1267,00.html FARO, J.S. Nem tudo que reluz é ouro: contribuição para uma reflexão teórica sobre o jornalismo cultural. 2008. Tese (da UMESP) São Paulo, SP GUEDES, Adriana; MILITÃO, Antônio; ARAÚJO, Camila; CRUZ, Fernanda; AURÉLIO,

Marcos. Cem Anos Luz. 2007. Publicação Acadêmica de Estudos sobre Jornalismo e

Comunicação, em Ensaios. Disponível em:

http://www.eca.usp.br/pjbr/arquivos/ensaios8_d.htm

MELO, Cristina. O Documentário como Gênero Audiovisual. Pernambuco. 2002. Artigo da

Intercom. Disponível em: http://pt.scribd.com/doc/7273668/MELO-Cristina-O-

Documentario-Como-Genero-Audiovisual

REBINSKI JUNIOR, Luiz, Ivo Rodrigues, um ilustre desconhecido do rock. Digestivo Cultural, Curitiba, 12 mai. 2010. Disponível em: http://www.digestivocultural.com/colunistas/coluna.asp?codigo=3062&titulo=Ivo_Rodrigues,_um_ilustre_desconhecido_do_rock

Site oficial da Banda Blindagem, Disponível em: http://www.bandablindagem.com.br/ ZANUTTO, Flávia, Nos Embalos da Resistência: anos 80 Pop Rock e Identidade.. Tese de Doutorado. Disponível em: http//www.dle.uem.br/jied.

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9. CRONOGRAMA ALUNO/EQUIPE:

MÊS

Descrição de Atividades

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Entrevistas para o documentário e coleta de imagens de arquivo pessoal e em emissoras de tv

X X X X

Montagem e Edição do vídeo-documentário X X Redação e Edição final X X Apresentação Final X

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.10. APÊNDICE ROTEIRO GUIA Primeira Parte – Ivo começo Entrevistas com Alberto Rodriguez, Paulo Juk, Mauro Mueller, Ivan Rodrigues, Paulo Teixeira e Carlos Gaertner Segunda Parte – Leminski Entrevistas com Carlos Gaertner, Paulo Juk, Paulo Teixeira e Ivan Rodrigues Terceira Parte – Cenário Anos 80 e Blindagem Entrevistas com Paulo Juk, Mauro Mueller, Sandra Carraro e Paulo Teixeira Quarta Parte – Ivo Entrevistas com Paulo Juk, Sandra Carraro, Gerson, Paulo Teixeira, Rubén “Pato” e Ivan Rodrigues Quinta Parte – Álcool Entrevistas com Rubén “Pato”, Paulo Juk, Ivan Rodrigues, Paulo Teixeira e Gerson. Sexta Parte – Morte Entrevistas com Paulo Teixeira, Mauro Mueller, Sandra Carraro e Paulo Juk ENTREVISTADOS Alberto Rodriguez – Integrante da Blindagem e amigo Qual era a relação do Ivo com a banda? Qual era sua relação com o Ivo? Como era o Ivo nos bastidores? Paulo Juk – Integrante da Blindagem e amigo Como o Ivo entrou para a Blindagem? Como era o Ivo no palco? Por que a Blindagem não fez sucesso fora de Curitiba? Paulo Teixeira – ex-integrante da Chave, atual Blindagem e amigo Por que você saiu a Chave com o Ivo? Quando vocês começaram a notar que o álcool estava prejudicando o Ivo? Vocês conversavam sobre isso? Rubén “Pato” Romero – Integrante da Blindagem Como era o dia a dia com o Ivo? Ele era amigo além de colega de banda? Como era o Ivo sem a bebida?

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Ivan Rodrigues – Filho Como era o Ivo pai? Ele era a rotina dele? Vocês conversavam sobre o problema dele com o álcool? Carlos Gaertner – ex-Chave e amigo Como era o Ivo músico? Por que a Chave acabou? Ficou alguma mágoa entre vocês pelo Ivo ter saído da banda? Mauro Mueller – radialista e apresentador As bandas curitibanas tinham espaço na mídia nos anos 80? Como era a relação dos veículos paranaenses com as bandas locais? Por que a Blindagem não alcançou o sucesso? Sandra Carraro – radialista e amiga O Ivo fugia do estereótipo roqueiro? Por que as rádios não tocavam música paranaense nos anos 80? A quem você compara o Ivo no mundo do rock? Gerson – Motorista da Blindagem Como era o Ivo durante as viagens com a banda? Ele exagerava muito nas bebidas? Como foi o último show?