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1 OFICINA DE CIRCO: UM LOCUS  DE REFLEXÃO SOBRE A FORMAÇÃO E ATUAÇÃO DO/A PEDAGOGO/A À LUZ DE PAULO FREIRE Ibrantina Guedes de Carvalho Lopes 1  Targelia de Souza Albuquerque 2  Maria Edjane Paixão 3  RESUMO Este artigo problematiza a formação dos/as educadores e sua atuação como sujeitos históricos no Curso de Licenciatura em Pedagogia, tendo como questão central: em que medida a instituição colabora com a formação de professores/as  para a educação básica em uma perspectiva de democracia cidadã? Com base nos fundamentos da Pedagogia de Paulo Freire foi organizada uma metodologia de Oficina de Circo, em uma perspectiva interdisciplinar, na qual cada participante se integrasse à propos ta como c oautor. Os objetivos desse trabalho foram: c riar espaços de reflexão sobre a formação e atuação do/a pedagogo/a, e articular a atividade lúdica à reflexão crítica de natureza acadêmica, expressando os  pensares , saberes e sentires em dife rentes linguagens . A metodologia da oficina d e circo com a ancoragem na Pedagogia Freireana comprovou que se pode construir um trabalho lúdico no Ensino Superior, articulando teoria e prática científica e  pedagógic a; elaborar um plano coletivo e organizar atividades, integrando estudantes e professores/as do Curso de Pedagogia; reconhecer a identidade de cada sujeito em um processo de formação de professores/as; vivenciar a alegria que energiza e levanta a autoestima, favorecendo aos (às) mais tímidos (as) se incluírem às atividades, sentindo-se parte do grupo e aprender a trabalhar em equipe em uma perspectiva democrática. A avaliação da Oficina de Circo pelos/as seus/suas participantes informou que a sua validade como estratégia de mediação das relações interpessoais no ensino superior; de articulação entre as bases teóricas da formação do/da professor/a e uma práxis emancipadora, concretizada através do diálogo e de ações criativas e, especialmente, de reconhecimento de cada um/a e do grupo como coautores da prática pedagógica. Palavras-chave: Formação docente    Pedagogia    Identidade profissional    Paulo Freire 1  Mestre em Comunicação, UFPE; professora da disciplina Experiências Musicais da Faculdade Santa Catarina; sócia do Centro Paulo Freire, educadora musical da ETE de Criatividade Musical. E- mail: [email protected] 2  Doutora em Educação, pela PUC/SP; Coordenadora do Núcleo Paulo Freire da Faculdade Santa Catarina; Membro da Cátedra Paulo Freire da UFPE e Sócia do Centro Paulo Freire; professora visitante da FACHO; professora aposentada da UFPE. E-mail:  [email protected] 3  Especialista em Direito Educacional e em Administração e Planejamento Escolar; pedagoga da Secretaria de Educação de Pernambuco, técnica educacional da Secretaria de Educação de Recife,  professora das disciplinas Metodologia da Alfabetização e Princípios da Administração Escolar da Faculdade Santa Catarina. E-mail: [email protected]

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OFICINA DE CIRCO: UM LOCUS  DE REFLEXÃO SOBRE A FORMAÇÃO EATUAÇÃO DO/A PEDAGOGO/A À LUZ DE PAULO FREIRE

Ibrantina Guedes de Carvalho Lopes1 Targelia de Souza Albuquerque2 Maria Edjane Paixão3 

RESUMO

Este artigo problematiza a formação dos/as educadores e sua atuação comosujeitos históricos no Curso de Licenciatura em Pedagogia, tendo como questãocentral: em que medida a instituição colabora com a formação de professores/as

 para a educação básica em uma perspectiva de democracia cidadã? Com base nosfundamentos da Pedagogia de Paulo Freire foi organizada uma metodologia deOficina de Circo, em uma perspectiva interdisciplinar, na qual cada participante seintegrasse à proposta como coautor. Os objetivos desse trabalho foram: criarespaços de reflexão sobre a formação e atuação do/a pedagogo/a, e articular aatividade lúdica à reflexão crítica de natureza acadêmica, expressando os

 pensares, saberes e sentires em diferentes linguagens. A metodologia da oficina decirco com a ancoragem na Pedagogia Freireana comprovou que se pode construirum trabalho lúdico no Ensino Superior, articulando teoria e prática científica e

 pedagógica; elaborar um plano coletivo e organizar atividades, integrandoestudantes e professores/as do Curso de Pedagogia; reconhecer a identidade decada sujeito em um processo de formação de professores/as; vivenciar a alegriaque energiza e levanta a autoestima, favorecendo aos (às) mais tímidos (as) seincluírem às atividades, sentindo-se parte do grupo e aprender a trabalhar emequipe em uma perspectiva democrática. A avaliação da Oficina de Circo pelos/asseus/suas participantes informou que a sua validade como estratégia de mediaçãodas relações interpessoais no ensino superior; de articulação entre as basesteóricas da formação do/da professor/a e uma práxis emancipadora, concretizadaatravés do diálogo e de ações criativas e, especialmente, de reconhecimento decada um/a e do grupo como coautores da prática pedagógica.Palavras-chave: Formação docente  –  Pedagogia –  Identidade profissional  –  

Paulo Freire

1 Mestre em Comunicação, UFPE; professora da disciplina Experiências Musicais da FaculdadeSanta Catarina; sócia do Centro Paulo Freire, educadora musical da ETE de Criatividade Musical.E- mail: [email protected]

2 Doutora em Educação, pela PUC/SP; Coordenadora do Núcleo Paulo Freire da Faculdade SantaCatarina; Membro da Cátedra Paulo Freire da UFPE e Sócia do Centro Paulo Freire; professoravisitante da FACHO; professora aposentada da UFPE. E-mail: [email protected]

3 Especialista em Direito Educacional e em Administração e Planejamento Escolar; pedagoga da

Secretaria de Educação de Pernambuco, técnica educacional da Secretaria de Educação de Recife, professora das disciplinas Metodologia da Alfabetização e Princípios da Administração Escolar daFaculdade Santa Catarina. E-mail: [email protected]

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INTRODUÇÃO

A educação assume um papel estratégico na sociedade contemporânea, emespecial, quando o conhecimento se configura como “moeda de troca” nas

transações nacionais e internacionais e nos modos em que povos e nações

organizam e definem suas identidades no mundo globalizado.

 Nesse cenário, as instituições de ensino superior, em especial, as

responsáveis pela formação de professores/as, vêm sendo colocadas em xeque, em

virtude da sua responsabilidade com a constituição de educadores/as- cidadãos/ãs

capazes de colaborarem com a construção de um projeto social comprometidocom a emancipação das classes trabalhadoras e de seus filhos e suas filhas, com

vistas à melhoria da qualidade social.

Problematizar a formação dos/as educadores e sua atuação como sujeitos

históricos, autores e/ou coautores desse projeto nos cursos de Licenciatura, com

foco no Curso de Pedagogia se faz emergente.

Este artigo parte do ensinamento freireano de que a educação não muda o

mundo, mas sem esta, a transformação não acontecerá (FREIRE, 2007). Parte-se

assim do pressuposto de que a educação substantivamente democrática pode ser

um dos pilares da construção de uma sociedade digna, fraterna e justa.

 Neste contexto, a Instituição de Ensino Superior pode se constituir como um

dos importantes locus de formação de professores/as, desde que se transforme em

um espaço de problematização de seus fundamentos e práticas educativas. Há,

 pois, necessidade de uma revisão curricular e da criação de novas oportunidades

de diálogo entre os professores/as professoras formadores/as e estudantes, no

cotidiano institucional, para que sejam revistos os processos de formação

instalados e novas estratégias educacionais em uma perspectiva emancipatória

 possam surgir.

Este é o novo desafio que se impõe as Instituições de Ensino Superior, com

destaque para o Curso de Pedagogia: problematizar o conhecimento que nela é

veiculado, produzido, sob a forma de conhecimentos científicos, tecnológicos e

culturais, traduzidos em valores e atitudes, que se concretizam na IES e nas

instituições sociais a ela vinculadas. A questão que se coloca é a seguinte: em que

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medida a instituição colabora com a formação de professores/as para a educação

 básica em uma perspectiva de democracia cidadã?

Este foi o contexto motivador, para três professores (uma professora de

Teoria e Prática de Ensino e Currículo e Avaliação no Ensino Fundamental, uma

 professora de Música e um professor de Teatro) do Curso de Pedagogia da

Faculdade Santa Catarina, localizada no Bairro de Casa Amarela, Recife/PE

ousarem reinventar Paulo Freire e criar espaços para aprofundamento da seguinte

questão-problema: Como Paulo Freire pode contribuir para pensarmos a formação

e atuação dos profissionais de Educação em uma perspectiva emancipatória?

Construir uma metodologia de Oficina de Circo em que cada participante

fosse coautor da proposta; criar espaços de reflexão sobre a formação e atuação

do/a pedagogo/a à luz de Paulo Freire e demonstrar ser possível, no ensino

superior, a articulação entre a atividade lúdica e a reflexão crítica de natureza

acadêmica foram os principais objetivos deste trabalho.

1.  Fundamentos teóricos e metodológicos

Ao se falar em formação docente e, em especial, dos processos de formação

de professores para a Educação Básica, chama-se a atenção tanto para a formação

sob a responsabilidade de uma instituição de ensino superior, como a que se

desenvolve em outros espaços formativos, articulados ou não a esta, como: os

 processos de formação continuada no interior das escolas; aqueles coordenados

 pelos poderes públicos, através de seus órgãos de gestão educacional, em níveis

municipal, estadual e governamental; e como parte das lutas de resistência ativa e

cidadania, nos movimentos sociais.

 Nesse sentido, questiona-se a prática educativa que se realiza na instituiçãode ensino superior, em especial nos cursos de formação de professores/as, a

exemplo do Curso de Pedagogia, mas também em outros espaços extraescolares.

Porém, nesse momento, focam-se os desafios que estão postos para este curso e,

em sentido mais amplo, para a formação de educadores/as. Isto exige uma

reflexão profunda sobre o papel da educação na sociedade contemporânea e como

cada estudante e/ou professor se sente corresponsável pelo projeto emancipação

social.

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Paulo Freire tem contribuído com os seus exemplos de vida e suas obras

dentro e fora do Brasil, com destaque para a Educação como Prática da Liberdade,

Pedagogia da Autonomia, Educação na Cidade, Política e Educação, Essa Escola

Chamada Vida (coautoria com Frei Betto) e Sobre Educação Diálogos (em

 parceria com Sergio Guimarães), para que se possa elaborar um arcabouço teórico

e metodológico profícuo para se pensar a formação de professores/as  –  

educadores/as em diferentes espaços sociais.

Partindo do pressuposto de que é possível articular uma reflexão científico-

 pedagógica sobre a formação e atuação do/a pedagogo/a à luz de Paulo Freire com

uma atividade lúdica, construiu-se a metodologia da Oficina de Circo como um

momento privilegiado de reflexão e prática da Pedagogia de Paulo Freire. Os

conceitos-chave para a organização da fundamentação teórica e metodológica

foram: humanização, diálogo, criatividade, criticidade, ética, estética e esperança.

Este diálogo foi ampliado com outros autores na área de educação e de Artes, em

especial com estudiosos do Teatro e Circo, Caramês e Silva (2001), quando

demonstram como a história do circo transita entre os interesses do capital e uma

 proposta emancipadora de transformação cultural e social. Hoje tem espetáculo?

A contribuição teórica de Caramês e Silva (2001) se dá nas aprendizagens

da Cultura Corporal a partir da vivência das artes circenses acrescidas de outras

aprendizagens no plano das relações sociais, afetivas e discussões de valores que

se efetivaram, sobretudo, no pleno desenvolvimento das habilidades motoras. O

circo, as cores, a alegria, a descontração, a magia. A arte circense os elementos

constitutivos da produção do espetáculo possibilitaram a construção da proposta

de extensão vivenciada pelas autoras na Universidade Federal de Santa Maria

(UFSM) na área de Educação Física Escolar.

 Na Música, procurou-se estabelecer o diálogo com Brito (2011) queapresenta o educador musical Koellreuttter e a sua contribuição da prática

educativa focada na autonomia e humanização do/a estudante enquanto sujeito do

 processo. Hans-Joachim Koellreutter era alemão, mas escolheu o Brasil como

 pátria e aqui viveu entre os anos de 1937 a 2005. O educador musical muito

contribuiu para o ensino de música no país.

A proposta pedagógica pensada e desenvolvida por Koellreutter apresenta

como princípio fundante “a formação e exercício da cidadania do ser humanoíntegro e integrado” (Brito, 2011, p.28). O ser humano, portanto, constitui-se no

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objetivo maior da educação musical. Os princípios pedagógicos que orientam a

docência do educador musical dizem respeito à curiosidade epistemológica que se

constroi no diálogo, na escolha significativa do currículo e na prática do

questionamento constante.

Esse educador ainda propõe a atualização dos conceitos musicais de forma

que os elementos constitutivos da música do século vinte estejam presentes na

educação musical. Koellreutter propõe o aprendizado musical interdisciplinar em

diálogo com as outras áreas do conhecimento e elege a improvisação como

ferramenta para a construção do trabalho pedagógico musical (Brito, 2011, p.20).

O educador musical rompe com a proposta do ensino de música tecnicista,

racionalista e positivista. Nesse sentido, o educador dialoga com Paulo Freire no

que diz respeito ao pensamento epistemológico que corrobora para a

humanização.

2. Saberes necessários à formação de professores/as: contribuições de Paulo Freire

Quando abordamos a questão da formação docente, precisamos, em primeiro lugar,

responder à pergunta: qual o projeto de sociedade e de educação que sustenta esta formação?

Freire (2000b, p.101-2) nos ensina por qual educação/escola devemos lutar e como (re) criá-la

substantivamente democrática. Isto representa uma tela crítica para a leitura da qualidade da

escola. Ele coloca a formação de professores (as) como um de seus constitutivos básicos.

Ressalta que há “necessidade de formação permanente dos professores e professoras”, pois,

estes/as poderão ser os/as mediadores/as da transformação da escola, em parceria com os/as

educandos/as e suas famílias.

Como destaca Albuquerque (2006) em diálogo com Paulo Freire, é necessário garantir

uma formação aos (às) docentes, que além de possibilitar uma leitura crítica de mundo, os/asinstrumentalize a nele intervir, a partir de uma avaliação ética e crítica de “sua presença no

mundo”, das políticas, diretrizes e ações educacionais, possibilitando autonomia na

elaboração de projetos pedagógicos.

Reafirmamos, assim, ser necessária também a abertura constante da escola e de

seus/suas educadores/as à reorientação curricular, pois, a educação na sociedade

contemporânea exige um acompanhamento crítico das novas exigências sociais, para se

recriar e criar práticas pedagógicas, tendo como horizonte a transformação da sociedade e asuperação das injustiças.

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Os (As) professores (as) precisam reconhecer que a escola não é o único espaço de

veiculação do conhecimento, mas que esta representa um locus privilegiado de realização de

 práticas pedagógicas que garantam aos (às) seus/suas estudantes o direito de aprender, em

consonância com uma perspectiva de formação do sujeito crítico, consciente de suas

 possibilidades de atuação no contexto social.

Paulo Freire reforçava que a democratização do poder dos professores também, nos

seus modos de ensinar e avaliar,  poderia abrir novas possibilidades de interação social,

dentro e fora de sala de aula. Isso promoveria aos estudantes oportunidades de preencher as

lacunas curriculares –  herança histórico-cultural, concretizando ações pedagógicas voltadas à

superação dos obstáculos em seu processo de conhecer e restituindo-lhes o direito de

cidadania. (Freire, 2000a e 2000c). 

A relação ensinar e aprender para Paulo Freire se constroi nesse contexto.

Ela precisa ser compreendida na sua historicidade (Freire, 2000b), pois, são seres

humanos que se constituem como tais num processo constante de solidariedade e

de múltiplas relações, portanto estar disponível a novas aprendizagens, no sentido

mais abrangente do termo, é condição fundamental ao ensino.

 Nessa perspectiva, Freire (2000c) apresenta princípios para se compreender programas

e processos de formação de educadores (as) e orientar o exercício da ação docente. No

 período em que foi gestor da Secretaria Municipal de Educação da cidade de São Paulo,

constituiu uma equipe multidisciplinar, para organizar um programa arrojado de formação de

educadores (as). Os princípios básicos que embasaram esse programa de formação de

educadores (as) foram:

1) O educador é o sujeito de sua prática, cumprindo a ele criá-la e recriá-la.

2) A formação do educador deve instrumentalizá-lo para que ele crie e recrie a sua

 prática através da reflexão sobre o seu cotidiano.

3) A formação do educador deve ser constante, sistematizada, porque a prática se faz ese refaz.

4) A prática pedagógica requer a compreensão da própria gênese do conhecimento, ou

seja, de como se dá o processo de conhecer.

5) O programa de formação de educadores é condição para o processo de reorientação

curricular da escola.

6) O Programa de Formação de Educadores terá como eixos básicos: a fisionomia da

escola que se quer, enquanto horizonte da nova proposta pedagógica; a necessidade de suprirelementos de formação básica aos educadores nas diferentes áreas do conhecimento humano;

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a apropriação, pelos educadores, dos avanços científicos do conhecimento humano que

 possam contribuir para a qualidade da escola que se quer. (FREIRE, 2000 c, p.80).

 No livro: “Sobre Educação: Diálogos”, em parceria com Sérgio Guimarães, Paulo

Freire chama a atenção para o fato de que a instituição escolar tende a colocar os/as estudantes

em uma régua, ou mesmo, numa linha de partida, como se os sujeitos fossem iguais.

Isto também orienta os modos de ensinar e de aprender, muitas vezes, negando a cada

educando/a o direito de ser respeitado na sua singularidade e autonomia. É como se a escola

concebesse um aluno/uma aluna idealizado/a e quer que ele/ela se comporte de acordo com o

que se projetou para este/esta. (FREIRE e GUIMARÃES, 1982).

 No livro Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática docente,

cuja primeira edição data de 1996, Paulo Freire destaca três eixos que foram

tomados como referência para este estudo: “Não há docência sem discência”;

“Ensinar não é transferir conhecimento” e “Ensinar é uma especificidade

humana”. Este livro, nas suas dimensões ontológica, epistemológica e política

sintetiza a essência da obra freireana elencando o conjunto de saberes necessários

aos docentes na construção da prática educativa humanizadora. O livro instiga o

movimento dialético entre o ensinar e o aprender que se dá na passagem da

curiosidade ingênua à curiosidade epistemológica sem abrir mão tanto das

dimensões éticas quanto estéticas. Para Freire, neste movimento de construção do

 pensar certo, faz-se necessária a coerência na qual decência e boniteza estejam de

mãos dadas.

 Na discussão estética que emerge em Educação como Prática de Liberdade,

Freire ressalta a necessidade de que a criticidade seja capaz de desencadear outros

atos criadores, numa perspectiva que possibilite a integração entre arte e

educação. Partindo da Antropologia, Freire articula os conceitos de cultura e

natureza, demonstrando que homens e mulheres são produtores de cultura, portanto capazes de transformar que está dado, em nível de natureza, e construir a

história. Nesse sentido, o autor discute a necessidade do diálogo na perspectiva de

que educadores e educandos assumam a coautoria do projeto educacional no qual

se inserem. Freire rejeita, portanto as fórmulas doadas, autoritárias, verticais.

 No livro Pedagogia do Oprimido, Freire discute a humanização enquanto

categoria fundante da ação educacional. Pensar na educação com  os homens e

mulheres e não  para  eles e elas só é possível através do diálogo, atividade

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essencialmente humana. Freire anuncia que sem a possibilidade do diálogo não

 pode haver desenvolvimento humano, não pode haver educação.

 Na perspectiva emancipatória de Freire, a educação se concretiza na

exposição da palavra de todos/as, pois é necessário considerar que os/as

educandos/as e educadores/as tem tanto algo a aprender e como também a ensinar.

O diálogo permite a construção da relação horizontal, nunca autoritária, muito

 pelo contrário, democrática, solidária e participativa. Mas isso se realiza no

diálogo norteado pela crença do  ser mais, sendo este um fundamento na ação de

educar:

O diálogo é este encontro dos homens, mediatizados pelo mundo, para

 pronunciá-lo, não se esgotando, portanto, na relação eu-tu. “Esta é a razão por que não é possível o diálogo entre os que querem a pronúncia do mundoe os que não querem; entre os que negam aos demais o direito de dizer a

 palavra e os que se acham negados deste direito” (Freire, 2005, p. 91).

Uma educação para transformação, para a liberdade e para a autonomia se

constrói na instauração do processo dialógico e humanizador que demanda

 politicidade, já que não existe ação educativa neutra. Para Freire, educar é um ato

 político, permeado de concepções, de ideiais, de interesses, de intenções, nunca

neutra, essa ação não pode ser dissociada da consciência crítica que permite alibertação e a transformação, uma educação problematizadora, questionadora,

livre para pensar e lutar pelo interesse do coletivo, nunca por interesses

individuais ou de grupos. A consciência crítico-reflexiva é a condição para que se

construa uma práxis emancipatória nas quais as ações são gestadas pela autoria e

coautoria dos sujeitos humanos envolvidos que possibilita uma nova práxis:

A consciência crítica é a representação das coisas e dos fatos como se dão naexistência empírica. Nas suas correlações causais e circunstâncias. Aconsciência ingênua, se crê superior aos fatos, dominando-os de fora e, porisso, se julga livre para entendê-los conforme melhor lhe agradar. Aconsciência mágica, por outro lado, não chega a acreditar-se superior aosfatos, dominando-os de fora, nem se julga livre para entendê-los comomelhor agradar. Simplesmente os capta, emprestando-lhes um poder superior,que a domina de fora e a que tem, por isso mesmo, de submeter-se comdocilidade. É próprio desta consciência o fatalismo que leva ao cruzamentode braços à impossibilidade de fazer algo diante do poder dos fatos, sob osquais fica vencido o homem (Freire, 2007, p.113).

 Nesse sentido, a ação educativa se impõe enquanto utopia, como

 possibilidade. É ingênuo pensar que a educação sozinha poderá suprimir as

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desigualdades sociais. No entanto, se entendemos o homem na sua incompletude,

como ser inconcluso  que é, podemos afirmar que a educação problematizadora

 possibilita que educador/a e educando/a reflitam e dialoguem sobre o objeto do

conhecimento de forma a recriá-lo. O  pensar certo,  na perspectiva freireana,

concretiza-se na profundidade, na compreensão e interpretação dos fatos.

Uma educação que pretende formar para a autonomia necessita acreditar no

futuro como algo que pode mudado e conceber a História como possibilidade e

não como determinação. O papel dos homens na sociedade não é o de constatação

da realidade, mas de indagação desta e intervenção para promover inovações. A

constatação serve e faz sentido, não apenas para adaptar os homens e mulheres,

mas para intervir na realidade. A força de desenvolver a autonomia exige a

superação de limites. Por isso, é preciso encarar o futuro como problema, que a

vocação ontológica para  ser mais  em processo, sejam fundamentos para não

aceitar as injustiças do mundo.

Uma educação que propõe desenvolver a criticidade e a criatividade não

 pode estar a serviço da reprodução de uma sociedade desigual, injusta e que

 perpetua a desumanização das pessoas. Se o que nos faz seres humanos é a

capacidade de ser mais, é isso que nos constituem homens e mulheres, então não

 podemos aceitar uma educação que não seja para constante transformação de uma

sociedade que seja humana e ética.

A instituição de Ensino Superior, ao assumir a formação de educadores/as à luz de

Paulo Freire, seja em Curso de Pedagogia ou desenvolvendo processos de formação

continuada, precisa investir em um currículo emancipatório que se realize dentro e fora de

sala de aula. Nesse sentido, o desenvolvimento de metodologias que desafiem a concretização

do diálogo crítico acadêmico aliado à criatividade e a amplos processos de interação significa

também uma estratégia de formação de docentes em uma perspectiva freireana.A proposição de Oficinas pedagógicas, nas quais os/as participantes sejam autores e

coautores das ações planejadas e desenvolvidas significam espaços educativos, produtores de

aprendizagens articuladoras dos “saberes de experiência feitos”  aos conhecimentos

acadêmicos; de histórias de vida à produção coletiva de novas vivências. Esta foi a base

teórica que orientou a organização da Oficina de circo: um locus de reflexão sobre a

formação e atuação do/a pedagogo/a à luz de Paulo Freire.

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3.  Metodologia

A Oficina de Circo reuniu estudantes do Curso de Pedagogia da Faculdade

Santa Catarina durante a realização da Semana Pedagógica, que ocorre no mês de

maio de cada ano. Em 2012, participaram 20 estudantes e uma professora, além

dos três docentes coordenadores. Em 2013 a participação foi ampliada com 30

estudantes e quatro professores, dos quais dois de diferentes cursos da instituição.

Uma das docentes do Curso de Pedagogia (professora das disciplinas

Metodologia da Alfabetização e Teoria e Prática de Ensino nas primeiras séries da

Educação Fundamental), após o seu engajamento à proposta, participou da

 pesquisa de avaliação da Oficina de Circo, integrando-se como coautora deste

artigo.

A metodologia da Oficina se caracterizou por oito movimentos:

1º) inscrição por adesão dos participantes;

2º) planejamento coletivo da oficina;

3º) exposição dialogada sobre a história do Circo e a sua relação com os

modos de organização e produção cultural e social;

4º) dinâmicas para reconhecimento de cada participante como coautor do

espetáculo (articulação dos saberes de experiência feitos);

5º) organização do espetáculo do Circo e vivência dos papéis assumidos e

6º) articulação entre a vivência e os fundamentos da Pedagogia de Paulo

Freire;

7º) Avaliação formativa com sistematização e análise dos depoimentos

registrados por escrito e,

8º) elaboração de artigo para a socialização com todos/as participantes edivulgação ampla para críticas, aperfeiçoamentos e reinvenção. 

A seguir detalharemos as principais ações de cada “movimento”. 

1º) Inscrição por adesão dos participantes  –  a inscrição foi realizada com

antecedência e aberta aos/às docentes do Curso de Pedagogia. Percebeu-se, no

entanto, que houve interesse tanto de docentes como estudantes dos três Cursos

que funcionam na instituição: Administração, Ciências Contábeis e Pedagogia.

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Por razões de choque de horário com as oficinas específicas, o grupo ficou

formado com alunos/as do Curso de Pedagogia e mais quatro professores/as (dois

de diferentes cursos e duas do Curso de Pedagogia), além das docentes que

coordenavam os trabalhos.

2º) Planejamento coletivo da oficina  –   As coordenadoras da Oficina

mobilizaram alguns/algumas estudantes a colaborarem com materiais que

 poderiam ser utilizados na Oficina de Circo, além dos já existentes e fornecidos

 pela instituição. A professora de Música levou alguns instrumentos de percussão

 para a organização da “Bandinha do Circo”. Estas confirmaram a sua participação

na oficina. Foram apresentados ao grupo os passos da Oficina para que o grupo

tivesse a visão do trabalho em sua totalidade. A partir do diálogo sobre o título daoficina, construíram-se os principais objetivos da proposta e organizaram-se

alguns acordos de produção coletiva à luz de Paulo Freire. 

3º) Exposição dialogada sobre a história do Circo e a sua relação com os

modos de organização e produção cultural e social  –  com o uso do Power Point  

foram sendo projetadas lâminas que estimulava a reflexão sobre a história de

Circo e sua relação com os modos de organização social. O grupo participou de

uma viagem interativa sobre os diferentes tipos de espetáculos e personagens.

4º) Dinâmicas para reconhecimento de cada participante como coautor

do espetáculo (articulação dos saberes de experiência feita)  –   Foram

trabalhadas dinâmicas corporais e de relaxamento corporal e, especialmente,

facial, para facilitar a construção das personagens. Uma das dinâmicas que mais

atraiu o grupo foi “a construção de uma máscara que ia passando de mão em mão

e criando formas próprias, a partir da criatividade de cada sujeito singular”. Estadinâmica foi não verbal. Após a vivência, o grupo explicava sobre os seus

sentimentos e indagações. Nesse momento, cada participante relatou as suas

expectativas e expôs sobre como gostaria de atuar no circo.

5º) Organização do espetáculo do Circo e vivência dos papeis

assumidos  –   Foram colocados no chão, artefatos relacionados a um possível

espetáculo circense, entre vários adereços, adornos, objetos consagrados e

vestuário relacionados a personagens do Circo. Cada participante escolheu algum

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objeto que pudesse caracterizar a sua personagem. Foi sugerido que as pessoas

organizassem duplas, trio e colaborassem para que o espetáculo tivesse “a cara do

grupo” e divertisse a todos/as. O grupo foi questionado sobre quais as tarefas que

 precisavam ser realizadas coletivamente para que o espetáculo acontecesse. A

 partir das respostas, foi organizada uma planilha com as ações e os participantes

que seriam responsáveis por elas. Alguns exemplos podem ser destacados: a

decoração; a ordem de apresentação do espetáculo; a escolha do apresentador do

circo; a organização da “bandinha”, e assim por diante. Uma decisão coletiva foi a

tomada sobre o nome do CIRCO  –   a sua identidade. Foram sugeridos alguns

nomes e, por unanimidade, a escolha foi por: FASC CIRCUS em 2012 e CIRCO

E MAGIA em 2013. 

Entre luzes e cores, animação, concentração, a alegria e o prazer se deram as

mãos... e o espetáculo que uniu mentes, corações e corpos.... aconteceu. O circo

viveu a sua experiência coletiva, respeitando a autonomia de cada sujeito que ali

marcou a sua presença.

6º) Articulação entre a vivência e os fundamentos da Pedagogia de

Paulo Freire  –   Nesse momento, se organizou uma roda de conversa e nela foram

sendo retomados os constitutivos da Pedagogia de Paulo Freire: politicidade,

criticidade, dialogicidade, criatividade, eticidade e estética, entre outros,

relacionando-os com as vivências e a metodologia da Oficina de Circo. A

mediação das coordenadoras foi fundamental para exercitar a pedagogia da

 pergunta, com muitas problematizações a respeito da formação do/a pedagogo/a.

Após, a reflexão coletiva, cada participante se colocou sobre como tinha se

sentido como coautor daquela experiência e qual a relação das práticas vividas

com a sua atuação como profissional da educação básica.

7º) Avaliação formativa com sistematização e análise dos depoimentos

registrados por escrito  –  Após, a avaliação da Oficina na roda de conversa, foi

 proposta uma pesquisa de avaliação na qual educandos/as que vivenciaram a

Oficina de Circo enunciaram as aprendizagens freireanas construídas. Dentre elas

destacam-se a possibilidade de se construir um trabalho lúdico no Ensino

Superior, articulando teoria e prática científica e pedagógica; reconhecer a

identidade de cada sujeito em um processo de formação de professores/as;vivenciar a alegria que energiza e levanta a autoestima, favorecendo aos (às) mais

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tímidos (as) se incluírem às atividades, sentindo-se parte do grupo e aprender a

trabalhar em equipe em uma perspectiva democrática. O material de pesquisa

envolve as visões dos grupos distintos que participaram das oficinas nos anos

2012 e 2013.

8º) Elaboração de artigo para a socialização com todos/as participantes

e divulgação ampla para críticas, aperfeiçoamentos e reinvenção  –   O grupo

coordenador da Oficina propôs ao grupo a elaboração de um artigo sobre a

experiência para registro “como memória” e para socialização com os/as demais

educadores/as do Curso de Pedagogia e de outros espaços. Reafirmamos, com a

 produção deste artigo e a sua socialização interna e externa, que o movimento

dialógico da fase 8 foi realizado a contento.

4.  Pesquisa de avaliação: uma análise sobre a visão dos/as estudantes

Assumindo uma perspectiva dialógica e democrática de avaliação (Freire e

Guimarães, 1982), foi realizada a pesquisa de Avaliação, envolvendo os

 participantes do primeiro grupo (ano de 2012) e participantes do segundo grupo

(ano de 2013), considerados como um grupo singular em sua totalidade. É

importante ressaltar que a avaliação do primeiro grupo foi realizada na roda deconversa, oralmente, e através dos registros escritos num único momento, no final

da oficina; já no segundo encontro as questões avaliadas foram discutidas em dois

momentos distintos, oralmente no final da oficina e posteriormente foram feitos os

registros escritos.

As questões que permearam o processo avaliativo foram: O que foi

relevante na oficina de circo? Qual a importância dessa oficina para o/a estudante

de pedagogia? O que mudou após participar da oficina? Para a análise das

respostas dos/as estudantes utilizamos como base teórica os princípios da ética, da

estética, da criatividade, da criticidade, da autonomia e do diálogo da teoria de

Paulo Freire. A descrição dos achados permite compreender os constitutivos

freireanos no desenvolvimento de atividades acadêmicas no ensino superior.

Os/As estudantes que participaram da oficina ressaltaram que durante a

vivência foi possível perceber que o resultado final depende da colaboração e das

aptidões, do respeito aos saberes, das negociações de todos/as na construção do

coletivo. Nesse sentido, toda e qualquer forma de expressão humana se dá a partir

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da relação com os outros homens e mulheres e da compreensão do mundo, e isso

não pode ser privilégio de uma classe, mas a possibilidade real de crescimento,

enriquecimento e construção do  ser mais, capacidade ontológica dos homens e

mulheres.

 Na proposta do circo os participantes precisaram se lançar, assumirem a

autoria na construção do espetáculo. A experiência possibilitou que alguns

 participantes superassem as situações limitantes a exemplo da timidez. De acordo

com as respostas dos educandos/as a oficina favoreceu romper com a ideia da

impossibilidade diante da dificuldade, porque foi possível reconhecer que os

obstáculos podem ser superados. Nesse sentido, Paulo Freire aponta a

 possibilidade de superação da realidade e transformação da mesma:

A preocupação com os limites da prática, no caso, da prática educativa,enquanto ato político, significa reconhecer, desde logo, que ela tem uma certaeficácia. Se não houvesse nada a fazer com a prática educativa, não havia porque falar dos seus limites. Da mesma forma, não havia necessidade de falardos seus limites se ela tudo pudesse. Falamos dos seus limites precisamente

 porque, não sendo a alavanca da transformação profunda da sociedade aeducação pode algo no sentido desta transformação (Freire, 2001, p.28).

A relevância da oficina para os estudantes que participaram da mesma se dá

na possibilidade de se aprender com ludicidade, prazer e alegria. Isso significa quequando se reconhece a sala de aula enquanto espaço democrático de aprendizagem

é possível o rompimento com a sisudez e o reconhecimento de que mesmo quando

o diálogo epistemológico se processa em torno de temas sérios é possível que

aprender de forma lúdica. A estudante Nº 1 afirma:

 Esta oficina de circo foi muito rica para mim. Não fiquei envergonhada nem

 surpresa com tudo que iria acontecer, foi tudo lúdico e prazeroso. Para mim

 só veio a somar o pouco que sei e que aprendi vou tentar levar para minhavida profissional, junto com meus alunos de forma alegre e atenta a todos os

detalhes sem deixar escapar nada (Estudante Nº 1).

A política de educação que possibilitou a democratização do acesso no

ensino superior exige dos/das educadores/as a construção de estratégias e

situações de ensino e aprendizagem que sejam capazes de respeitar a diversidade e

singularidade de cada sujeito que nela está. Segundo as afirmações dos/as

estudantes, a oficina de circo permitiu que a diversidade e as individualidades

fossem respeitadas. Esta questão da diversidade e singularidade pode serobservada no depoimento do estudante de Nº 6:

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 Pela primeira vez fui considerada como uma pessoa importante em um

 grupo. Senti que eu fazia parte do espetáculo porque podia dar uma parte de

mim para realizá-lo. A nossa vida é como um espetáculo de circo. Seremos plateia assistindo o quê os outros fazem, ou seremos autores, atores e atrizes,

responsáveis pelo espetáculo. Senti que posso assumir ser diferente. Que não

 preciso ser igual para ser aceita pelo grupo, nem para aceitar as pessoas

(Estudante Nº 6).

Desta forma, ressalta-se que os múltiplos saberes que existem na sala de

aula exigem de quem ensina a capacidade de ouvir e identificar o que o outro sabe

e mediar o aprendizado em atitude de respeito ao saber do outro. Já que a prática

 pedagógica deve ser permeada pela tolerância, pela solidariedade e criatividade.

Os/As estudantes que participaram da oficina de circo ressaltaram que a

 proposta possibilitou refletir sobre a escola como espaço para a construçãocoletiva na qual além do respeito aos saberes, o espaço da sala de aula possibilita

uma ação educativa dialógica, estética e ética, como se pode ver nos depoimentos

a seguir:

 Esta oficina nos trouxe muitas oportunidades de refletir nossa prática ecomo podemos, como pedagogos, atuar nos mais diferentes espaços, além de

utilizarmos a arte em suas diversas possibilidades para enriquecer nossas

aulas ( Estudante Nº 3).

E ainda: 

 Foi um momento único, do qual eu nunca tinha participado e, como

 pedagoga, irei levar muito em minhas conquistas daqui pra frente. Esses

conhecimentos são muito importantes, a vivência principalmente, e espero

que não só eu, mas todos que participaram levem as alegrias para o mundo.(Estudante Nº 16).

Os/As estudantes, coautores da oficina de circo, pontuaram a importância de

se oportunizar, de se favorecer a participação de todos e todas nos trabalhos de

 produção do conhecimento, isso significa contemplar os diversos saberes,valorizar as individualidades e enriquecer os espaços de aprendizagem. A

estudante de Nº 15 também afirma que a experiência foi vivenciada contemplou

as aprendizagens elencadas: “ Ao participar dessa oficina do circo me surpreendi

com a interação que o grupo teve”. Todos se ajudavam, um torcia pelo outro. O

incentivo foi fundamental. Foi um trabalho muito proveitoso, estou saindo mais

leve do que cheguei (Estudante Nº15). 

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A complexidade da docência pelos muitos e diversos elementos que

 perpassam este trabalho e a urgência em promover um ensino de qualidade nos

remete, como disseram os/as estudantes participantes da oficina de circo, a

necessidade de se preparar os profissionais da educação permanentemente:

O espetáculo contribuiu para o meu crescimento como professora, pois pude

interagir de forma participativa junto com todos que estavam na oficina. E o

circo é uma forma animada de passar diversos conteúdos que irá contribuir

na minha formação (Estudante Nº 17).

A partir da reflexão de Paulo Freire que a educação se faz valorizando e

respeitando o saber do outro podemos dizer que as afirmações dos estudantes

sobre a oficina da qual participaram são fundamentais para que os professores (as)

formadores/as reflitam a prática docente a fim intervir de maneira critica

 possibilitando aprendizagens significativas no ensino superior:

 Esta oficina demonstrou que é possível o diálogo, a participação autêntica ea articulação teoria e prática com ludicidade no espaço acadêmico.   Areflexão final com base em Paulo Freire me fez descobrir como podemos

reinventar a pedagogia de Paulo Freire na Universidade. Criar, dialogar,

 participar e crescer foram coisas que aprendi na Oficina e vou levar para

minha formação como educadora (Estudante nº 6). 

 Nesse sentido, pensar na formação de pedagogos (as) prescinde refletir

sobre a diversidade de sujeitos envolvidos, isso nos força a prover um espaço de

aprendizagem com qualidade, que seja capaz de acolher e incluir todas as

diferenças, elaborando um projeto de ensino superior que possibilite um futuro

fértil no sentido da construção de uma sociedade justa, igualitária, democrática e

ética.

Considerações finais

A metodologia da Oficina de Circo constituiu-se em um momento

 privilegiado de reflexão e prática da Pedagogia de Paulo Freire. Foram muitas as

aprendizagens que resultaram desta vivência e análise crítica dos depoimentos

avaliativos dos participantes, orais e escritos. Dentre elas: a comprovação de que

 pode se construir um trabalho lúdico no Ensino Superior, articulando teoria e

 prática científica e pedagógica; a possibilidade de se elaborar um plano coletivo eorganizar atividades, integrando estudantes e professores do Curso de Pedagogia;

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o reconhecimento da identidade de cada sujeito em um processo de formação de

 professores/as em uma perspectiva freireana; a confirmação de que a alegria

energiza e levanta a autoestima, favorecendo aos (às) mais tímidos (as) se

incluírem às atividades, sentindo-se parte do grupo; a aprendizagem do trabalho

em equipe em uma perspectiva democrática; o acolhimento e o diálogo como

mediadores da proposta e a articulação entre ética e estética: aprendizagens que

dizem respeito a uma Pedagogia da Autonomia como possibilidade concreta no

ensino superior.

A oficina de circo suscitou muitas reflexões relativas às competências

dos/das professores/as, isso significa que é possível no ensino superior superar

 paradigmas de uma educação tradicional e forjar uma prática pedagógica capaz de preparar os/as educadores/as de forma consciente do papel social que temos, se

desejamos uma sociedade ética e humana.

Portanto, a avaliação da Oficina de Circo pelos/as seus/suas participantes

informou que a sua validade como estratégia de mediação das relações

interpessoais no ensino superior; de articulação entre as bases teóricas da

formação do/da professor/a e uma práxis emancipadora, concretizada através do

diálogo e de ações criativas e, especialmente, de reconhecimento de cada um/a edo grupo como coautores da prática pedagógica.

REFERÊNCIAS

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necessária. Recife: Centro Paulo Freire e Editora Bagaço, 2006.

BRITO, Teca Alencar de.  Koellreutter educador: o humano como objetivo da

educação musical . 2ª ed. São Paulo: Peirópolis, 2011.

CARAMÊS, Aline de Souza; SILVA, Daiane Oliveira. Atividades circenses como possibilidade para a Educação Física. Um relato de experiência.  EFDeportes.com,

 Revista Digital . Buenos Aires, Año 16, Nº 161, Octubre de 2011.http://www.efdeportes.com/ 

FREIRE, Paulo. Educação como Prática da Liberdade. Rio de Janeiro: Paz e

Terra, 1967.

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 ___. Pedagogia do Oprimido. 17 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

 ___. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a Pedagogia do Oprimido.Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

 ___. Pedagogia da Autonomia. 14 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2000a.

 ___. Política e Educação. 4 ed. São Paulo: Cortez, 2000b.

 ___. Política e Educação. 5 ed. São Paulo: Cortez, 2001.

 ___. Educação na Cidade. 4 ed. São Paulo: Cortez, 2000c.

FREIRE, Paulo e GUIMARÃES, Sérgio. Sobre Educação: Diálogos. V 1. Rio deJaneiro: Paz e Terra, 1982.