18 ideias para o sucesso

5
Saiba quais são as melhores práticas e os fatores de sucesso das iniciativas de inovação social brasileiras A reportagem é de Sandra Regina da Silva, colaboradora de HSM Management. O O que aumenta as probabilidades de sucesso de uma inovação social? Conforme Kriss Deiglmeier, que por muito tempo dirigiu o Centro de Inovação Social da Stanford University, uma das principais referências da área, o que constrói a inovação so- cial é principalmente retroalimentação entre os se- tores privado, público e o terceiro setor, gerando três mecanismos críticos de inovação social: “a troca de ideias e valores, as mudanças nos papéis e relacio- namentos, e a integração do capital privado com o apoio de recursos governamentais e filantrópicos”. Em outras palavras, quando ONGs, empresas e go- vernos atuam juntos, a probabilidade de alcançarem uma solução nova, que beneficie todos na sociedade, para um problema social é muito maior do que quan- do ficam isolados. Sozinhos, limitam as ideias a seus espaços e o resultado tende a ser ineficaz. Em fevereiro de 2014, a própria Deiglmeier deixou Stanford para ser CEO da Tides, facilitadora dessa retroalimentação. ideias 18 para o sucesso 66 | edição 103 dossiê

Upload: carlos-gustavo

Post on 10-Dec-2015

10 views

Category:

Documents


4 download

DESCRIPTION

Como se tornar uma pessoa de sucesso

TRANSCRIPT

Saiba quais são as melhores práticas e os fatores de sucesso das iniciativas

de inovação social brasileiras

A reportagem é de Sandra Regina da Silva,colaboradora de HSM Management.

OO que aumenta as probabilidades de sucesso de uma inovação social? Conforme Kriss Deiglmeier, que por muito tempo dirigiu o Centro de Inovação Social da Stanford University, uma das principais referências da área, o que constrói a inovação so-cial é principalmente retroalimentação entre os se-tores privado, público e o terceiro setor, gerando três mecanismos críticos de inovação social: “a troca de ideias e valores, as mudanças nos papéis e relacio-namentos, e a integração do capital privado com o apoio de recursos governamentais e filantrópicos”.

Em outras palavras, quando ONGs, empresas e go-vernos atuam juntos, a probabilidade de alcançarem uma solução nova, que beneficie todos na sociedade, para um problema social é muito maior do que quan-do ficam isolados. Sozinhos, limitam as ideias a seus espaços e o resultado tende a ser ineficaz. Em fevereiro de 2014, a própria Deiglmeier deixou Stanford para ser CEO da Tides, facilitadora dessa retroalimentação.

ideias18para o sucesso

66 | edição 103

dossiê

Segundo ela, as empresas (com fins lucrativos) estão liderando a luta em cada vez mais questões sociais e, com elas, começa-se a estruturar os ele-mentos que aumentam as chances de uma iniciati-va de inovação social dar certo, com um conjunto de melhores práticas bem similar ao das compa-nhias que visam o lucro e alguns fatores de sucesso mais específicos.

melhoReS pRáticaS e fatoReS de SuceSSo

Henrique Bussacos, empreendedor social liga-do ao Impact Hub, considera difícil elencar as melhores práticas de um negócio social. Em geral, em sua opinião, “o empreendimento social não é muito diferente de um empreendimento conven-cional; tudo o que contribui para ter sucesso em um vale para o outro, somado à sensibilidade em relação a questões sociais”. Pode-se dizer, contu-

do, que há alguns fatores de sucesso que podem ser considerados mais específicos do ramo.

A seguir, fizemos uma lista de melhores práticas e fatores de sucesso do setor 2.5. Contamos com a ajuda de Bussacos, que mantém conexões com um grande grupo de empreendedores sociais; de Fernan-da Bornhausen Sá, presidente do Social Good Brasil, evento voltado para a divulgação de tecnologia e co-nhecimento para a solução de problemas sociais, dire-tora da Clear Educação e Inovação e fellow do Syner-gos Institute, de Nova York; e de Carolina de Andra-de, gerente para inovação do Instituto Comunitário Grande Florianópolis, onde atua como coordenadora do Centro de Apoio à Inovação Social (Cais), e tam-bém gestora do Social Good Brasil.

Priorizar a intersetorialidade. Não é apenas em Stanford; no Brasil, essa também é a número um entre as melhores práticas de inovação social. Tra-

como a inovação social temeficácia+

• Os fatores de sucesso•

» Intersetorialidade

» Alinhamento com atividade empresarial

» Intensa experimentação » Foco no beneficiário do projeto

» Vivência de campo » Projeto tratado à parte

» Cocriação com o beneficiário

» Área de sustentabilidade estruturada

» Governança com “dois olhos”: um nos aspectos econômicos, outro nos sociais

» Definir os atores primeiro, a solução depois » Cultura de diálogo

• As práticas•

1. Equipe > indivíduo

2. canvas para definir modelo de negócio

3. Gestão de excelência

4. capacidade de focar

5. Comprometimento

6. lean startup

7. Design thinking foto

: iSto

ckph

oto

. íco

neS

: th

e no

un

pro

ject

edição 103 | 67

socialinovação

ta-se da capacidade de articular setores diversos e especializados. Em uma inovação social, a acade-mia pode dar contribuições tão importantes quan-to as do setor privado, as do governo e as do tercei-ro setor. “Isso permite o acesso a expertises diferen-tes que se complementam para gerar o resultado final ao beneficiário, tornando a iniciativa mais ágil e direta”, diz Bornhausen Sá. Para ela, não basta a interconexão formal; “a equipe tem de estar muito bem afinada”.

Definir os atores primeiro, a solução depois. Tra-ta-se praticamente da mesma receita do especialis-ta em gestão Jim Collins –“primeiro quem, depois o quê”. Determinar quem serão os principais ato-res antes de idealizar a solução de como transfor-mar algo tende a facilitar sobremaneira a execução dessa ideia –e seu êxito. Todos participam mais.

Atuar em equipe. Desprender-se da propriedade intelectual de um projeto mostra-se bem importan-te, porque uma equipe complementar e parceira é que costuma ser sinônimo de sucesso em inovação social. Em empreendimentos com objetivos so-cioambientais, o apego autoral é mais comum do que se pensa.

Definir bem o modelo de negócio –com o canvas. Os melhores projetos de inovação social têm um modelo de negócio cuidadosamente elaborado, es-clarecendo qual a proposta de valor, o público-alvo e como vão capturar recursos financeiros, seja com patrocinadores, seja oferecendo serviços para gerar receita. A ferramenta canvas tem sido muito utiliza-da para isso, como destaca Andrade.

çado com a disseminação dos ca-ses dentro da organização. Caso contrário, a iniciativa estará fa-dada à superficialidade.

Desenvolver a iniciativa como um projeto à parte. Pode ser uma incubadora ou uma unida-de de negócios separada, mas es-sa é a preferência entre grandes empresas, como observa Bussa-cos. Requer, contudo, ainda mais comprometimento com a causa.

Alinhar a inovação social com a atividade da empresa privada en-volvida. Isso é desejável não ape-nas em nome de criar valor com-partilhado, como prega Michael Porter [veja quadro na página 62], mas, conforme Bussacos, porque permite aproveitar as competên-cias das pessoas que já estão na companhia. “Ir por um caminho diverso é desperdiçar competên-cias e know-how existentes.”

Moldar a cultura da empresa pa-ra permitir diálogo com os di-versos stakeholders. O ambien-te mais propício para o diálogo, que depende da cultura corpo-rativa, é comum em casos de su-cesso de inovação social, segun-do Bussacos.

À esq., Carolina de Andrade, gerente para inovação social do Instituto Comunitário Grande Florianópolis e coordenadora-geral do Social Good Brasil; à dir., Fernanda Bornhausen Sá, presidente do Social Good Brasil e diretora da Clear Educação e Inovação

Gerenciar com excelência. Anali-sar e tomar decisões que aumen-tem a eficiência e a eficácia das atividades é um ponto comum dos negócios sociais bem-sucedi-dos, porque só assim se lida bem com a limitação dos recursos e as urgências das comunidades.

Ter foco. Os melhores negócios sociais já aprenderam que, quan-do se perde o foco, o beneficiário potencial sai prejudicado, como lembra Bussacos.

Obter o verdadeiro comprome-timento dos gestores. É crucial que estes tenham, além de amor pela causa, um real compromisso com a geração de um resultado de impacto, como reforça Bussa-cos. “Isso é o que possibilita con-tornar as dificuldades que surgi-rão para quebrar os paradigmas que será necessário quebrar.” O compromisso costuma ser refor-

68 | edição 103

dossiê

Ter uma área de sustentabilidade convencional já bem estruturada. Esta costuma puxar as demais áreas organizacionais e a disseminação da inovação social é facilitada.

Adotar a lean startup. O empreendedorismo enxuto –ou lean startup, em inglês– veste como uma luva na inovação social. “Assim como a lean startup é focada em desenvolvimento de clientes para novos negócios com etapas muito simples, nossas iniciativas preci-sam inovar com simplicidade com base no desejo do público-alvo”, explica Andrade.

Praticar o design thinking. O pensamento do de-sign se encaixa perfeitamente à inovação social, conforme Andrade, na medida em que busca so-luções de maneira criativa com empatia e cola-boração radical.

Focar o beneficiário do projeto. O foco sempre deve ser no usuário, visando tanto a viabilidade como a usabilidade do projeto por ele, e tem de ser reforça-do da concepção da ideia a sua execução.

Fazer intensa experimentação. “A ordem é ex-perimentar muito. É necessário fazer pequenas apostas, protótipos e testes antes de partir para um superplanejamento”, analisa Bussacos. Os negócios sociais que atuam dessa maneira sabem quanto isso é útil para não perder recursos e não haver desperdício em nenhuma área –e, de que-bra, também ajuda a ter mais insights.

Priorizar vivência de campo. Bussacos acrescenta como imprescindível a vivência de campo. Segun-

o Global entrepreneurship Monitor examinou as características do empreendedor social. entre os dados que se destacam estão a relativamente alta presença de mulheres e empreendedores sociais jovens e a diversidade da formação acadêmica e da trajetória profissional. homens tendem mais a iniciar um empreendimento social, mas a diferença da iniciativa entre gêneros nos empreendimentos sociais não é tão alta quanto nos empreendimentos comerciais tradicionais.

A relação de gêneros varia de país para país. por exemplo, na Malásia, Líbano, rússia, israel, islândia e Argentina, as mulheres prevalecem sobre os homens. nos estados unidos, finlândia e china, a distribuição entre homens e mulheres é quase igual. os homens são maioria no Brasil, Arábia Saudita, Marrocos e Bósnia, por exemplo.

pelo mundo, pessoas com idade entre 25 e 44 anos têm a mais alta propensão a se envolver com empreendedorismo social. isso indica que indivíduos que já estão estabelecidos mas ainda são jovens estão mais propensos a iniciar um empreendimento social. De outro lado, quanto mais perto da aposentadoria as pessoas estão, mais improvável é que iniciem uma empreitada dessa.

Ao examinar o nível educacional dos empreendedores sociais, o levantamento identifica a alta presença de indivíduos com nível superior; o engajamento com atividades de empreendedorismo social está, sim, relacionado com o nível educacional. isso é especialmente verdadeiro para as economias com mais baixo nível de desenvolvimento, inclusive. no Brasil, levantamento da Ande polo Brasil, fundação Avina e potencia Ventures mostrou que 78% dos empreendedores sociais têm curso superior. o mesmo levantamento indicou que quase 80% deles já tiveram outros empreendimentos.

o status mais comum da pessoa envolvida com o empreendedorismo social no mundo é o do profissional autônomo, seguido pelo que trabalha meio período, pelo estudante e por aquele que não trabalha.

no Brasil, as pesquisadoras Gilmara tavares, Lui za Balduino, tatiane Alexandre Silva e Vânia nassif identificaram algumas características do perfil comportamental desse empreendedor: ele acredita na causa, ama o que faz, não tem preconceitos, trabalha sem querer nada em troca, gosta de planejar, estabelece metas, faz projetos na vida pessoal e profissional, gosta de conviver com as pessoas e orientá-las, é tolerante, compreensivo e determinado, aceita desafios.

Empreendedoresinovadores

Kriss Deiglmeier, ex-diretora- -executiva do Centro de Inovação Social de Stanford, referência na área

por Sílvio Anaz

foto

S: D

iVu

LGAç

ão e

kLeB

er M

Arq

ueS

edição 103 | 69

socialinovação

o foco é obter um rendimento fi-nanceiro melhor.

“Mesmo os negócios sociais que alinham muito bem essas duas necessidades –por exemplo, um que ofereça um serviço de saúde, em que vender mais causa maior impacto social e financei-ro– terão de pensar em precifi-cação e precisarão definir o que fazer com as pessoas que não po-dem pagar nada”, justifica.

Bussacos acha salutar que as empresas envolvidas em negócios sociais revejam seu sistema de go-vernança em face da balança de poder dos stakeholders. “Ao ino-var na governança de uma orga-nização, alteramos as relações de poder entre os públicos de inte-resse, questionando nosso modelo mental de como nos organizamos e nos relacionamos. Esse proces-so pode ser transformador e nos ajudar a gerar mais impacto social positivo e realizar ações que de fa-to transformem a sociedade”, diz.

do ele, somente uma postura teórica sobre o assunto, o que é muito frequente em ONGs, re-presenta um grande risco. “O que acontece realmente lá na ponta? Uma visita de campo, o conhecimento das pessoas, uma conversa próxima a elas fazem muita diferença.”

Cocriar com o beneficiário. Mais do que o público-alvo ter empatia com o produto ou servi-ço social que será formatado, An-drade sugere que o beneficiário seja cocriador. “É o ‘criar com’, em vez de ‘criar para’. Assim há maior engajamento e maior im-pacto”, garante ela.

Fazer uma governança com “dois olhos”. Não há uma fórmula única de governança que se apli-que a toda e qualquer inovação social, mas “um ponto comum é sempre estar com o olhar sobre os aspectos econômicos e sociais e avaliar cada caso”, como diz Bussacos. Segundo ele, rotinei-ramente, há momentos em que há a necessidade de gerar um impacto maior e outros em que

o papel do GoveRno e o lucRoNo Brasil, duas questões particularmente delica-

das para uma atividade de inovação social dizem respeito ao papel do governo e à destinação dada ao lucro gerado, se for esse o caso.

Quanto ao governo, começa a haver um consen-so: a parceria com o poder público continua a ser fundamental, mas, no que tange a recursos financei-ros públicos, a prioridade é caminhar com as pró-prias pernas, dependendo o mínimo possível dele.

Na maioria das vezes, o Estado ainda se mostra indispensável na fase final de um projeto. Mas, se-gundo Bornhausen Sá, que também é presidente do Instituto Voluntários em Ação e idealizadora do Portal Voluntários Online, a preferência crescente é por, cada vez mais, não começar um projeto buscan-do recurso público.

Quanto ao lucro, ainda está para ser definido um parâmetro em relação a esse aspecto. Con-tinua vivo o debate entre Muhammad Yunus, economista bengalês que é o principal acionista do Grameen Bank e considerado o “pai” do mi-crocrédito, e Michael Chu, professor da Harvard Business School e diretor-gerente do Ignia Fund, baseado no México, além de sócio-fundador da Pegasus Capital, empresa de private equity na Ar-gentina. Se o primeiro defende ardorosamente o reinvestimento do lucro na iniciativa social, o se-gundo prega a distribuição do lucro [leia também entrevista com Paul Polak na página 118].

evolução Não restam dúvidas: a inovação social está se pro-

fissionalizando e evoluindo no Brasil, embora talvez não na velocidade necessária.

Segundo Bornhausen Sá, por exemplo, as startups ainda são mais propensas a investir em inovação so-cial do que as companhias estabelecidas.

Para Bussacos, na maioria das cidades brasileiras o conceito é pouco difundido, embora centros como São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Florianópolis, Belo Horizonte e Recife já tenham várias iniciativas e negócios sociais mapeados.

O importante é que a inovação social vai deixando de ser compreendida como uma “bala de prata”, nas palavras de Bussacos. Mais e mais empreendedores do setor não creem em soluções mágicas, da mesma forma que não creem em vampiros, e preocupam-se em ter a tecnologia e o conhecimento adequados pa-ra conseguir planejar e executar uma inovação social. As 18 medidas aqui citadas confirmam o esforço.

Henrique Bussacos, empreendedor social, cofundador de um negócio social inovador, o Impact Hub [veja case na página 76]

encaixe perfeito

Ferramentas novas das empresas, como lean

startup e design thinking, parecem feitas sob

medida para os negócios sociais e são cada vez

mais utilizadas

foto

: DiV

uLG

Ação

70 | edição 103

dossiê