1º simpósio culturas e diásporas africanas

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1 Simpsio Culturas e Disporas Africanas2 5 de dezembro de 2015Os Condenados da Terra 90 anos de Frantz Fanon

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Mesa 01Mesa 02Mesa 03Mesa 04

Grupos de TrabalhoGrupos de TrabalhoGrupos de TrabalhoFeira Cultural

Abertura do Simpsio

Conferncia 01

Atividade CulturalConferncia 02

Atividade CulturalConferncia 03

Atividade CulturalEncerramento (Show)

ApresentaoFoi como um estrondo no cu do ps-guerra. Em 1952, aparecia Pele negra, mscaras brancas, uma interpretao psicanaltica do problema negro. A introduo proclamava: preciso libertar o homem de cor de si mesmo. Lentamente, porque h dois campos: o branco e o negro. Seu autor, Frantz Fanon (1925-1961), foi ao mesmo tempo psiquiatra, ensasta e militante poltico ao lado da Frente de Libertao Nacional da Arglia (FLN), com a qual compartilhava a causa independentista. Martinicano, faz parte do grupo de intelectuais negros cuja importncia a Frana tem dificuldade em reconhecer, embora tratem de uma histria comum a todos. Anticolonialista radical, de escrita altamente literria e retrica, contribuiu para aclarar no s a histria, mas tambm reflexes e debates contemporneos. Preferem, no entanto, esquec-lo sob o rtulo de profeta fracassado.A temtica dos dois campos evocada por Fanon no exclusivamente uma oposio entre essas duas cores de pele; se inscrevem na antinomia opressores e oprimidos. Em sua viso, uma sociedade racista ou no e o racismo colonial no difere de outros racismos. Quando busca explicar uma ideia-fora e mostrar o escndalo que representa, sua prosa potica e retrica se revela. Alm disso, para ele, a libertao dos oprimidos passa pela recusa do mundo da interdio, pela afirmao do eu negado pelo colonizador, que os v como uma massa disforme e servial: O colonizado um ser aprisionado, o apartheid apenas uma modalidade da compartimentao do mundo colonial. A primeira coisa que o colonizado aprende a manter-se em seu lugar, a no ultrapassar os limites. por isso que seus sonhos so musculares, de ao, agressivos Sonho que salto, nado, corro, escalo. Sonho que estou gargalhando, que atravesso o rio com um pulo, que sou perseguido por carros que nunca me alcanam. Durante a colonizao, o colonizado no para de se libertar entre as nove horas da noite e as seis da manh. Pele negra, mscaras brancas nos conduz ao universo atribudo ao negro que foi sistematicamente condicionado pelo branco. So pginas apaixonantes nas quais a herana apesar das divergncias dos oradores da negritude e do texto Orfeu Negro, de Jean-Paul Sartre, se faz sentir por meio de encadeamentos lexicais metafricos e analticos do corpo, do olhar. Fanon examina o corpo, talvez por isso escreveu: A primeira verso deste livro foi ditada, andando de um lado para outro como um orador que improvisa; o ritmo do corpo em movimento, o sopro da voz recitando o estilo. Porm, a realidade supera a metfora: No primeiro olhar branco, ele sentiu o peso de sua melanina. Sculos de escravido e colonizao determinaram um olhar sobre o outro do qual difcil para no dizer impossvel, se despojar: Quando me amam, dizem que apesar da cor da minha pele. Quando me detestam, se justificam dizendo que no pela cor da pele. Em uma ou outra situao, sou prisioneiro de um crculo infernal.O racismo se traduz tambm na designao do negro, submetido conotao ancestral de sua cor, que se tornou evidncia, quase essncia: O negro, o obscuro, as sombras, as trevas, a noite, as profundezas abissais, denegrir a reputao de algum; e do outro lado: a mirada clara da inocncia, a pomba branca da paz, a luz ofuscante, paradisaca. A linguagem no pode expurgar essas conotaes, que aparecem tambm na religio: O pecado negro como a virtude branca. A anlise no era nova naquele momento, mas, de uma obra outra, Fanon foi mais longe. Seu ltimo livro, Os condenados da terra (1961), demonstra que a compartimentao da sociedade colonial e racista gera, obrigatoriamente, uma linguagem racista: Por vezes, o maniquesmo alcana o limite de sua lgica e desumaniza o colonizado. Dito de outra forma, como denunciou Jean-Paul Sartre durante a guerra da Arglia, o sistema colonial cria um sub-homem.Fanon prossegue: Falando claramente, [o maniquesmo] animaliza. Faz-se aluso aos movimentos arrastados durante o trabalho, ao cheiro que emana das vilas indgenas, s hordas, ao fedor, reproduo desenfreada, s gesticulaes. Demografia galopante, massas histricas, rostos nos quais no h qualquer trao de humanidade, corpos obesos que no se parecem com nada, preguia sob o sol, ritmo vegetal, todas essas expresses fazem parte do vocabulrio colonial. A desumanizao do colonizado justifica o tratamento ao qual submetido: Disciplinar, vestir, dominar e pacificar so as expresses mais utilizadas pelos colonialistas em territrios ocupados. A guerra da Arglia nada mais que a continuao paradoxal de um sistema que se baseia na fora e no desprezo. Dessa forma, a introduo de Lan V de la rvolution algrienne [O ano V da revoluo argelina] (1959) ressalta que desde o incio da guerra, [o colonialismo] francs no renunciou a nenhum radicalismo: nem o do terror, nem o da tortura. Calcularam mal: As represses, longe de sufocarem as revoltas, estimulam o progresso da conscincia nacional, analisa Fanon. Se, de fato, minha vida tem o mesmo valor que a do colono, seu olhar no me fulmina mais, sua voz no mais me petrifica. Sua presena no me perturba mais. Na prtica, sou eu quem o incomoda. No s sua presena no me importuna mais, como j estou lhe preparando tantas emboscadas que logo ele no ter outra opo seno fugir. Assim, a libertao psquica induz perda do medo, ao mergulho no combate pela independncia.Em que condies esse combate vai se desenrolar? Em Os condenados da terra postula que a descolonizao sempre um fenmeno violento. Isso porque violncia chama violncia e quando o opressor invade a menor parcela que seja de um territrio, difcil manter-se a pacificamente: Cada esttua, a de Faidherbe ou Lyautey, de Bugeaud ou do Sargento Blandan, todos esses conquistadores que pousaram sobre o solo colonial no param de significar uma nica coisa: Estamos aqui pela fora das baionetas.... evidente a resposta dos oprimidos, considerada estrondosa quando se trata de outros pases sob outros comandos. Fanon justifica a violncia? No em todos os movimentos: Condenamos, com o corao aflito, esses irmos que so jogados ao com a brutalidade quase psicolgica que faz nascer e mantm uma opresso secular. No obstante, Fanon nos convida uma compreenso da gnese da violncia e da nica alternativa deixada aos oprimidos para sua libertao. Sua descrio da compartimentao da sociedade colonial, com sua linha de partilha e sua fronteira indicada pelos quartis e postos de polcia, nos remete, alis, ao nosso universo militarizado que, bem longe de pacificar, produz ele mesmo o radicalismo que pretende combater.A perspiccia de Fanon vale tambm para sua anlise sobre o futuro de um pas descolonizado quando uma burguesia nacional (in)autntica sobe ao poder e no fornece ao povo capital intelectual e tcnico. Baseando-se no exemplo da Amrica Latina, ele previne sobre o risco de transformao de um pas em territrio de prazeres a servio da burguesia ocidental. Disseca a propenso dessa burguesia cinicamente burguesa de romper a unidade nacional jogando com o regionalismo. E conclui: Essa luta implacvel qual se entregam as etnias e tribos, essa preocupao agressiva de ocupar os postos livres pela partida do estrangeiro vo, igualmente, gerar competies religiosas. Assistiremos a confrontao entre as duas grandes religies reveladas: o islamismo e o catolicismo. Fanon alerta at para o perigo de um partido nico, que utiliza o passado para adormecer o povo, mand-lo lembrar da poca colonial e medir o imenso caminho percorrido. Quantos pases africanos nos vm cabea?Em reao colonizao, segundo ele, no se deve clamar por uma cultura negra como nico horizonte. Se houve obrigao histrica para os homens de cultura africana racializar suas reivindicaes, de falar antes em cultura africana que em cultura nacional, por outro lado isso vai conduzi-los a um beco sem sada. Suas crenas foram lanadas desde sua primeira obra numa frmula magnfica sobre a qual os adeptos do comunitarismo poderiam refletir: No quero cantar meu passado s custas do meu presente e futuro. Tal afirmao, no entanto, no se fecha a uma reflexo sobre a histria do colonialismo, a qual, como ele lembrava em 1952, se apoiou sobre a histria da Europa. O colonialismo baseou-se em valores que precisam ser repensados: Se em nome da inteligncia e da filosofia que proclamamos a igualdade dos homens, tambm em seu nome que decidimos extermin-los.Em 1961, a condenao de Fanon se amplificaria com uma veemncia radical: Abandonemos essa Europa que no para de falar no homem, ao mesmo tempo que o massacra onde quer que o encontre, em todos os cantos de suas ruas limpas, em todos os cantos do mundo. Afrontemos de uma maneira salutar essa Frana que, ao mesmo tempo em que se liberava do nazismo e se reconstrua, massacrava Stif (maio de 1945) ou Madagascar (maro de 1947). Essa Frana que, no fim da batalha, virava as costas aos seus irmos de combate senegaleses ou marroquinos que estavam na linha de frente. Escutemos essa voz que h mais de quarenta anos martela sua verdade incisiva, que poderia muito bem ainda ser a nossa: Podemos fazer qualquer coisa hoje em dia, sob a condio de no imitar a Europa, sob a condio de no sermos obcecados pelo desejo de alcan-la. A Europa adquiriu tal velocidade, louca e desordenada, que escapa a todos os outros condutores, a toda razo, que segue numa vertigem assustadora em direo a abismos dos quais melhor se distanciar rapidamente.Fanon sabe a qual Europa se refere, ele que soube homenagear os judeus da Arglia, os franceses daqui ou de l que abraaram a causa independentista. O gesto universal: Eu, o homem de cor, quero apenas uma coisa: que jamais o instrumento domine o homem. Que cesse para sempre a servido de homem para homem. Quer dizer, de mim para outro.