3ª - direitos humanos - 24.6.09
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3ª aula - 24.6.09 - Prof. Diego Oliveira
DIREITOS HUMANOS
INTRODUÇÃO
Conceito
Os direitos humanos devem ser diferenciados dos direitos do homem e
direitos fundamentais.
Direitos do homem são direitos naturais estudados pelo jus
naturalismo. Não são positivados, não estão escritos.
Direitos humanos são direitos previstos e tipificados em tratados ou,
até mesmo, em costumes internacionais.
Direitos fundamentais são direitos da pessoa humana previstos na
constituição federal. Direitos que têm proteção interna, nacional.
Essa diferenciação é meramente técnica e doutrinária, pois na prática
essas distinções não são respeitadas.
A CF/88 foi extremamente técnica ao diferenciar direitos fundamentais
de direitos humanos (art 5º, §1º), pois lida os direitos fundamentais como a
proteção interna e os direitos humanos como a proteção por tratados
internacionais.
A Carta da ONU também seguiu a mesma sistemática e, portanto, está
tecnicamente correta.
Hoje, na doutrina, começa-se a utilizar a expressão “direitos humanos
fundamentais” (Manoel Gonçalves Ferreira Filho) para englobar direitos
humanos e fundamentais igualmente, como se fossem uma coisa só.
Espécies de direitos fundamentais
A CF/88 divide os direitos fundamentais em 5 espécies:
- direitos individuais,
- direitos coletivos,
- direitos sociais,
- direito à nacionalidade,
- direitos políticos.
Principais características dos direitos humanos
Historicidade
Os DH são resultado de um processo histórico, surgiram e evoluíram no
decorrer da história.
Universalidade
Os DH pertencem a todas as pessoas, independentemente da raça,
local, sexo, etc.
Essencialidade
Os DH são essenciais.
Irrenunciabilidade
Não se pode renunciar o DH.
Inalienabilidade
Não é possível negociar um DH. Ex: é proibida a venda de órgãos.
Imprescritibilidade
Os DH são para a vida toda.
Inexauribilidade
Os titulares de DH não têm limite para o progresso, tendem a se
aumentar.
Vedação ao retrocesso social
Os DH não podem retroceder. Um Estado não pode assinar tratado com
objetivo de restringir DH. Impede que estado regrida nas sua situação jurídica
quanto aos DH.
Gerações de direitos
Para Bonavides são “dimensões de direitos”. Os DH são divididos em
três gerações
1ª geração - Direitos civis e políticos
Direitos de oposição ao Estado que tem como titular o próprio indivíduo.
Geralmente, estão no art 5 da CF/88.
Palavra chave: Liberdade.
Direitos de aplicabilidade imediata.
2ª geração – Direitos sociais, econômicos e culturais
São os direitos dos trabalhadores, previstos no art 6º da CF/88. Em
regra, têm aplicabilidade mediata.
Existem doutrinadores, principalmente trabalhistas, que criticam a
definição desses direitos de 2ª geração como de aplicação mediata, pois deixá-
los ao bel prazer do legislador é negá-los.
Palavra chave: igualdade.
3ª geração – Direito ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente
preservado
A disussão entre países desenvolvidos ou subdesenvolvidos é típica dos
direitos de 3ª geração.
Palavra chave: fraternidade.
4ª geração – direitos provenientes da globalização
São direitos caracterizados pela globalização. Para alguns autores esses
direitos existem, para outros não.
Obs. Existe forte crítica quanto à divisão dos direitos humanos em
gerações, afirmando dá a impressão de que os direitos surgiram de forma
sucessória. Porém, não foi bem assim que ocorreu. A geração de direitos não
se resume a uma ordem sucessória. Os direitos de segunda geração
começaram a ser protegidos internacionalmente a partir de 1919 com a criação
da OIT e os direitos de 1ª geração só passaram a ter uma proteção efetiva
após a 2ª GM, 1945.
Na ADI 9397, o STF afirmou que os direitos fundamentais, previstos no
art 5º da CF/88, não são os únicos, há outros espalhados pela constituição.
PROCESSO DE DEMOCRATIZAÇÃO NO BRASIL E A CF/88
O Brasil, em 1985, teoricamente, findou o período de ditadura militar,
com eleições indiretas que elegeram Tancredo Neves como presidente e José
Sarney como vice. Sarney apresentou EC para convocar ANC que deveria criar
a CF que temos hj.
A CF/88 rompe com a ditadura militar. Em 1989 ocorreram as primeiras
eleições diretas, em que foi eleito Collor de Melo.
A partir de 1985, o Brasil passou a ser um estado garantista, do bem
estar social, aliado à democracia. O processo de redemocratização inseriu o
Brasil na seara internacional e criou um sistema de proteção aos direitos
humanos. O direito internacional dos DH passou a ser aceito no Brasil com a
CF/88. É notório que democracia e direitos humanos são irmãos siameses. A
democracia permite que os TI adentrem o OJ nacional.
Os DH são viabilizados no país porque, atualmente, o Brasil é um estado
intervencionista, de bem-estar social. Embora o Brasil tenha avançado na área
de DH, o país ainda pratica muitos ilícitos internacionais humanitários. O Brasil
ainda desrespeita muitas normas de DH.
Ex: o Brasil já foi denunciado várias vezes na Comissão Interamericana
de DH, em Washington:
caso do presídio Urso branco em Rondônia
o Brasil já foi condenado pela Corte Interamericana no caso Damião
Ximenes Lopes em que teve que pagar indenização aos membros da família.
Robert Alexy embasa diversos votos do STF. Esse doutrinador afirma
que democracia não vive sem direitos humanos; os DH pressupõem a
democracia.
Finalidades da constituição por Canotilho
Canotilho, doutrinador português com grande influência no Brasil,
assevera que a CF tem que um cumprir 4 finalidades:
- normatizar a constituição de um estado;
- racionalizar ou limitar os poderes do estado;
- fundamentar a ordem jurídica;
- estabelecer um programa de ações.
A CF/88 E OS DIREITOS HUMANOS
A democracia permite a entrada de DH, quanto maior a amplitude dos
DH, maior aperfeiçoamento da democracia. É um ciclo.
Princípio da primazia dos DH
A CF/88 inovou ao criar o princípio da primazia dos DH no art 4º, II. Esse
p. caracteriza o rompimento da constituição atual com as constituições
anteriores.
CF. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações
internacionais pelos seguintes princípios:
II - prevalência dos direitos humanos;
O DIREITO INTERNACIONAL DE DH E A REDEFINIÇÃO DA
CIDADANIA
Redefinição da cidadania
CF. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel
dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado
Democrático de Direito e tem como fundamentos:
II - a cidadania;
O p. da cidadania tem previsão constitucional no art 1º, II. A cidadania
surgiu em razão do estado democrático. O Brasil adotou expressamente o
Estado democrático de direito e , por isso, temos cidadania.
Cidadania é o direito de participar da vida pública do Estado. Ex: direito
a voto, direito de petição. A 1ª vez em que se mencionou “cidadania” foi na
Declaração dos direitos do homem e do cidadão de 1979.
A cidadania contemporânea ganhou contornos mais amplos. O novo
conceito de cidadania envolve os direitos de 1ª e 2ª geração. Essa é a
cidadania moderna.
Conceito contemporâneo de cidadania
A cidadania, hj, envolve direitos nacionais e internacionais, de 1ª
geração e de 2ª geração. Esse conceito contemporâneo de cidadania está
previsto na Declaração Universal de DH de 1948.
A cidadania é fundamento constitucional. A CF/88 redefiniu o conceito
de cidadania, pois ampliou os direitos do cidadão.
A existência de cidadania depende de plena democratização dos DH. A
redefinição de cidadania, portanto, passa pela adoção dos DH.
O conceito contemporâneo de cidadania, por Flávia Piovesan, abrange a
indivisibilidade, universalidade, processo de especificação do sujeito de direito.
Elementos do conceito moderno de cidadania
Indivisibilidade
Os DH são indivisíveis. Não é possível dividir direitos de 1ª, 2ª ou 3ª
geração, ou em individuais ou coletivos, pois não podem ser divididos.
Universalidade
Amplo sentido de universalidade. Aplicam-se os DH a todas as pessoas
do mundo.
Processo de especificação do sujeito de direito
O entendimento de pessoa humana não pode ser meramente abstrato, é
necessário um entendimento concreto, específico. Considera o ser humano de
forma específica.
Assim, os tratados de DH devem ser especificados. Ex: TDH para os
indígenas, para as mulheres, para os pobres.
A CF/88 adotou esse aspecto de conceito contemporâneo de cidadania:
capítulos específicos destinados aos índios, à família, aos trabalhadores, etc.
Alguns pontos importantes
Cidadania na União Européia
A UE é uma comunidade em que vigora a supranacionalidade, pois é
composta por países com cidadãos dotados de cidadania na comunidade como
um todo e no próprio país de origem.
A cidadania na UE é moderna pq ganha contornos internacionais.
Eficácia irradiante
Essa expressão é utilizada por Daniel Sarmento.
Eficácia irradiante dos DF serve para a concretização da cidadania. Essa
teoria afirma que os DF se irradiam e devem ser respeitados por todos os
poderes do Estado, por isso, concretiza a cidadania.
Força jurídica vinculante
Expressão utilizada em votos do STF.
Essa expressão assemelha-se à eficácia irradiante. Assevera-se que o
Estado deve criar condições para o exercício dos DHF, para o exercício da
cidadania. Ou seja, o exercício de DH vincula o poder público.
Constitucionalismo concretizador
Após a CF/88, o Brasil adotou o constitucionalismo concretizador dos
DF. Isso significa que o país deve concretizar os DF, não podendo apenas
declarar direitos na Carta Magna, fazendo dessa uma mera carta de
recomendações.
Ex de atuação nesse sentido no Brasil: Programa nacional dos DH do
Ministério da Justiça.
A CF/88 E A INSTITUCIONALIZAÇÃO DOS DIREITOS E GARANTIAS
FUNDAMENTAIS
Institucionalização dos direitos e garantias fundamentais é a
normatização (colocação) dos direitos e garantias fundamentais na CF.
A diferença entre direito fundamental de garantia fundamental foi feita
por Rui Barbosa ao estudar a CF de 1891.
Direito fundamental é algo declarado, previsto no texto
constitucional.
Garantia fundamental é instituto para assegurar o direito, é medida
assecuratória do direito que trabalha em função do direito. Ex: HC, HD, etc.
Remédios constitucionais são espécies de garantias. Uma espécie
de garantia são os remédios constitucionais. Ex: HC, HD, MS, MSC, MI, AP,
etc. Assim, os direitos que possuem garantia, nem sempre, terão como
garantia um remédio constitucional. Nem todo direito precisa de um remédio
constitucional.
Ex: a CF/88 prevê direito ao juiz natural que é assegurado pela garantia
do inciso XXXVII da CF/88, que não é uma espécie de remédio constitucional,
é apenas garantia ao juiz natural.
DIREITOS HUMANOS E SUA PROTEÇÃO INTERNA
CF. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
Teoricamente, o art 5º caput da CF/88, protege brasileiro nato e
naturalizado (pois não distingue) e o estrangeiro residente no Brasil. Porém, de
acordo com a doutrina majoritária e jurisprudência pacífica do STF, esse caput
deve ser lido de forma sistemática, de modo que deve ser incluído nessa
proteção: o estrangeiro residente e não residente no Brasil, os turistas, os
apátridas e as PJ.
Os direitos fundamentais têm duplo sentido: formal e material.
Sentidos dos direitos fundamentais
Sentido formal dos DF
Os DF, no sentido formal, são os DF previstos expressamente na CF,
são os tipificados. São os formalmente previstos.
Sentido material dos DF
São os DF que decorrem dos princípios ou dos tratados internacionais.
São os DF com previsão implícita, ou seja, são os DF não tipificados, mas são
alcançados por meio de interpretação.
O art 5º, §2º CF/88 traz a possibilidade de DF em sentido material no OJ
brasileiro, ou seja, a cláusula de abertura ou norma de reenvio (por LFG).
CF. 5º, § 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não
excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou
dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
(Direitos fundamentais encontrados em toda a Constituição, forma implícita e
ordenamento internacional)
Limitabilidade dos direitos fundamentais
Os DF são caracterizados pela limitabilidade, ou seja, os DF não são
absolutos. Os DF podem ser limitados em caráter excepcional.
O STF aceita a quebra de sigilo de quaisquer dados desde que em
caráter excepcional.
Os DHF situam-se acima dois três interesses mundanos (interesses
particulares, interesses públicos e interesses de Estado). Porém, como os DHF
não são absolutos, pode ocorrer uma inversão dessa ordem, de modo que um
interesse público fique acima dos DHF, por exemplo.
Ex: prática de crime de lavagem de dinheiro o sigilo de dados é DHF,
porém, há violação do interesse público que, nesse caso, se sobrepõe ao DF.
Eficácia horizontal dos direitos humanos
A relação entre estado e cidadão, administração e administrado, deve
ser pautada pelo respeito aos DHF (ex: a polícia não pode adentrar o domicílio
a qualquer hora, exceto em situações excepcionais). A essa relação denomina-
se “eficácia vertical dos DHF”.
A eficácia horizontal dos DF ou eficácia privada ou eficácia externa, por
sua vez, refere-se às relações entre particulares. Os DF podem ser aplicados
nas relações entre particulares, aliás os DF devem ser respeitados também
nessas relações.
De acordo com decisões recentes do STJ/STF, os DF adotam a eficácia
horizontal dos DHF, como ocorre nos seguintes julgados: RE 160.228, RE
158.215-4, RE 201.819.
O STF, no RE 201.819, pelo voto do ministro relator Gilmar Mendes,
aceitou a aplicação direta dos DF a uma relação eminentemente privada. A
isso dá-se o nome de eficácia direta ou imediata dos DHF. Quando se aplica a
lei à relação particular temos a eficácia mediata ou indireta dos DF.
Constitucionalização do direito privado
Conjuntamente à eficácia horizontal dos DH, existe um fenômeno
denominado “constitucionalização do direito privado”. É esse fenômeno que dá
força à eficácia horizontal do DF.
Teoriza-se que a CF é a base para o direito privado, civil colmatando no
Direito civil constitucional.
A criação de microsistemas no OJ tem, também, por base a CF.
Como hoje preza-se pela valorização maior da dignidade da pessoa
humana, o direito privado passa por uma fase de despatrimonialização.
A constitucionalização do direito privado é influenciada pela força
normativa da CF/88.
Pontos esquecidos da aula passada:
Tese Universalista :
A CR adotou a tese universalista em relação aos Direitos Humanos ou
Fundamentais, ou seja, ela seguiu a linha da declaração universal dos Direitos
humanos (1948), para qual todo ser humano tem direito à proteção dos direitos
humanos.
Além dessa, existe a Tese do Relativismo Cultural, que não foi adotada,
leva em consideração determinadas culturas, até mesmo a etnia da pessoa, ou
seja, ela seleciona quem será protegido e os direitos que o protegem.
Princípio da vedação do retrocesso social
Tem origem na Alemanha, estando conectado com os direitos
fundamentais sociais. De acordo com JAS os direitos fundamentais sociais
precisam ser implementados pelo legislador infraconstitucional, uma vez que
são normas de aplicação mediata, de conteúdo programático.
Mas essa lei que o Estado vai elaborar não pode inviabilizar o exercício
dos direitos sociais garantidos na CR, ou seja, veda-se retrocesso social. Além
disso, o princípio da vedação do retrocesso social, de acordo com os
doutrinadores do Direito Internacional, é interpretado no sentido de que o
Estado não pode assinar tratados que diminuam direitos sociais existentes,
pois seria retroceder.
Na doutrina temos 02 posicionamentos:
1ª corrente (majoritária): o princípio da vedação do retrocesso social pe
reconhecido, mas está previsto de forma implícita na CR
2ª corrente (minortitária): está presente de forma expressa na CR,
estando no artigo 3º, II da CR. Diz que se interpreta que se é para garantir o
progresso ou desenvolvimento nacional, estaria se vedando o retrocesso.
Para essa corrente esse inciso teria um duplo sentido, dizendo que o
Estado deve fazer por implementar os direitos sociais e ao mesmo tempo não
permitir que os direitos já concedidos sejam exonerados.
O STF e o STJ já se manifestaram sobre o princípio da vedação do
retrocesso social, sendo que ambos aceitam a aplicação deste princípio (ADI
2065-0, 3105-8, 3128-7 – Resp. 617757).
Princípio da Dignidade da pessoa humana é absoluto?
- Para Ingo Sarlet: se for interpretado como um valor ele é absoluto, pois
o indivíduo é colocado ao lado da sociedade; mas se colocarmos com um
princípio ele é relativo.
- Kant: o princípio da dignidade humana é absoluto;
- Alexy: é relativo
- STF: já se posicionou várias fezes no sentido de que não existe direito,
nem mesmo princípio, absoluto.
- STJ: tem algumas decisões em que considera que o princípio da
dignidade humana é absoluto (ex.: Resp. 816.209; 845.228).
A tendência em concurso é dizer que é relativa, sendo a tendência do
STF e da doutrina de modo geral.
HC 88420 1ª turma do STF
Nesse HC inovou-se sobre a prisão cautelar, que não é requisito para
exerce o direito do duplo grau de jurisdição.
Aula 04 – Dia 03/07/09
Tratados Internacionais dos Direitos Humanos
1 – Relação do Direito Internacional com o Direito Interno:
Dualismo: não há conflito interno entre o direito interno e o direito
internacional. Para essa doutrina temos duas ordens, de modo que para que o
tratado seja incorporado precisa passar por um processo de incorporação
legislativa, não bastando a ratificação.
Para o STF o tratado deve ser promulgado e publicado, o que não indica
que o Brasil adota o dualismo, apesar dos constitucionalistas assim se
manifestarem.
Mas para os Internacionalistas o Brasil adota o Monismo, sendo que
esse seria o entendimento do STF.
Dualismo radical e o moderado