6 ‘era uma vez uma história - unicamp.br · seguindo para onde a sua imaginação os levar.”...

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  • Campinas, 8 a 14 de abril de 2013Campinas, 8 a 14 de abril de 20136 Campinas, 8 a 14 de abril de 2013Campinas, 8 a 14 de abril de 2013

    MARIA ALICE DA [email protected]

    Era uma vez uma histria

    contadaoutra vez

    Tnia Alves ( esq.), autora do estudo, e a professora Mrcia Strazzacappa, coordenadora do projeto: educao infantil como espao transformadore prazeroso

    Dissertao de mestrado integra projeto sobre

    educao infantil

    Ao abrir minhas janelas e avistar o Reino Encantado da Educao Infantil, aprendi a

    olhar e pude ver essas pequenas felicidades exis-tentes neste espao. Os habitantes deste Reino, adul-tos e crianas, podem ser para alm de reis, rainhas, prncipes e princesas, podem enveredar-se pelas trilhas das narrativas e adentrar no portal da dramatizao, seguindo para onde a sua imaginao os levar. Assim a educadora Tnia Alves inicia as consideraes sobre sua pesquisa desenvolvida para a dissertao Narra-tiva e dramatizao nos entrelugares da educao in-fantil. Sua investigao est entre as dissertaes de mestrado desenvolvidas dentro do Projeto Era uma vez uma histria contada outra vez, nico na regio Sudeste selecionado na primeira edio do Pr-Cultu-ra, financiado pelos ministrios da Cultura (MinC) e da Educao (MEC), em 2009.

    Parados, sentados ou debruados em centenas de pe-dacinhos de papel com letras e nmeros que mais fren-te deveriam memorizar para ser alfabetizados. Este foi o cenrio que chocou, na dcada de 2000, a ento novata educadora Tnia Alves. A experincia com dana, teatro e canto adquirida na infncia talvez no pudesse ser apli-cada naquele espao, mas alguns momentos de ousadia foram importantes no s para organizar cadeiras em cr-culo, mas tambm para ampliar o espao livre e iniciar movimentos e dramatizaes. Isso porque criana precisa movimentar o corpo, e Tnia resolveu proporcionar isso por meio da dramatizao e da arte de contar histrias.

    Enredos os mais variados surgiram e ainda surgem das experincias das prprias crianas e no do tradicio-nal teatrinho de escola, semipronto ou pronto, ou seria imposto. Assim Tnia foi transformando, em seu peque-no, o espao da educao infantil e ao mesmo tempo seu ambiente de pesquisa, j que l nasceram todas as refle-xes presentes na dissertao. Do mesmo modo, o espa-o da educao transformava sua prtica. Assim como a oportunidade de participar de cursos na academia, mu-dou sua vida. Depois de alguns anos da formatura em pedagogia pela Unicamp, em 2004, ela teve oportunidade de participar do curso Educao, corpo e dana, ofereci-do pelo Laboratrio de Estudos sobre Arte, Corpo e Edu-cao (Laborarte) da Faculdade de Educao em parceria firmada com a Prefeitura de Campinas.

    Ao cuidar de seu pequeno espao, Tnia viu sua iniciativa se transformar em projeto maior, dentro da escola e sequencialmente em outras unidades da rede pblica de ensino. As reflexes que permeiam a pes-quisa so feitas a partir do olhar obtido nessas expe-rincias todas. As reflexes autorizam Tnia a afirmar que possvel fazer do espao de educao infantil um ambiente transformador, alegre e prazeroso, com respeito ao direito da criana de viver sua infncia.

    Com respaldo na teoria histrico-cultural de Vygotsky e nas teorias da pedagogia da infncia, Tnia disse ter tomado a iniciativa de reclamar na educao infantil um trabalho que envolva a arte e as expresses corporais e estticas das crianas por meio da narrativa e da dramatizao. De acordo com as teorias, a crian-a precisa de tempo livre para criar, brincar, imaginar, fazer de conta, o qual imprescindvel para o desen-volvimento nesta etapa da vida. Ela acrescenta que, de acordo com os tericos, essa prtica supera a de um ensino antecipado, que acaba encurtando a infncia e desrespeitando o direito da criana.

    A desenvoltura torna mais convincente o encon-tro entre o real e o fantasioso no imaginrio narrado pelos pequenos contadores acompanhados por Tnia. Ao alinhavar a prtica s teorias que tratam as crianas como produtoras culturais, donas de seu processo de criao, a educadora constata que a arte pode ampliar o repertrio infantil, pois ao ouvir e narrar, o imaginrio delas desafiado e as torna mais criativas, desenvoltas

    e permite misturar o real com a fantasia. Nessa fase, as crianas aprendem mais enquanto brincam e entram nesse mundo do faz de conta.

    Tnia acentua que, de acordo com o modelo hist-rico-cultural, os traos de cada ser humano esto inti-mamente relacionados ao aprendizado e apropriao do legado do seu grupo cultural. A histria educativa e as experincias das crianas, relacionadas ao grupo social e poca em que eles se inserem, influenciam o comportamento e a capacidade cognitiva, de acordo com a pesquisadora.

    Diante disso, ela aponta a importncia de o profes-sor estabelecer uma prtica pedaggica que valorize a arte e suas linguagens artsticas. possvel que este tipo de trabalho acontea no ambiente de educao in-fantil. Procurei promover experincias estticas e cor-porais, no somente s crianas, mas s profissionais tambm. Tnia garante que as prticas vivenciadas durante a pesquisa se mostraram de grande impor-tncia no desenvolvimento da capacidade imaginria e criativa das crianas.

    Mais que um argumento, as palavras sobre a atuao profissional traduzem um sonho da educadora: o de po-der, um dia, apreciar ainda uma formao capaz de esti-mular profissionais de educao a desenvolverem ativida-des corporais com as crianas. Isso, em sua opinio, viria contrariar o modelo escolar em que os pequenos escola-res permaneam sentados na maior parte do tempo.

    O relato da vivncia proporcionada s professoras participantes, bem como as observaes pertinentes no texto da dissertao, deixam clara a necessidade de um investimento maior numa formao de qualidade das profissionais e no trabalho com a arte nas instituies de educao infantil. O lugar da arte ainda muito pequeno no ambiente da educao infantil.

    Ao contrrio da ideia de que em todas as unidades de educao infantil as crianas podem se expressar li-vremente para brincar, os registros revelam que existem muitas prticas pedaggicas a tratar as crianas pequenas igualmente s do ensino fundamental, com o objetivo de prepar-las para ingressar nesta escola. Segundo Tnia, as crianas acabam sendo submetidas prtica intensa do desenho de letras e nmeros que, muitas vezes, no lhes fazem nenhum sentido. Esse modelo institucional esco-larizante se revelou, durante minha trajetria profissio-nal, como uma organizao da vivncia infantil apartada dessas experincias artsticas e sensveis.

    Tnia constata que a escola infantil local de con-tradies, onde duas prticas se chocam: aquela que v a criana como produtora de cultura almejando um trabalho significativo com a arte, e outra escolarizante, com vista preparao para o ensino fundamental. A contradio, no entanto, no algo a ser expulso, mas deve ser vista nas negociaes entre as profissionais do espao educativo, como uma potencial ferramenta de movimentao do cotidiano infantil e uma possibi-lidade de formao de parcerias, argumenta. Para ela, quanto mais os profissionais oferecerem, neste espao, oportunidades de experincias ricas e diversificadas, mais as crianas tero a chance de vivenciar situaes desafiadoras que lhes tenham sentido, o que oferece condies para a formao de novos interesses infantis. Nesse ponto, o papel docente envolve planejamento, organizao do espao e execuo de atividades capa-zes de tornar isso possvel.

    LUGAR DA ARTEA explorao do espao escolar tambm questio-

    nada na dissertao de Priscilla Vilas Boas, intitulada A improvisao em Dana: um dilogo entre a criana e o artista professor. A expresso artstica escolhida

    por Priscila para trabalhar com crianas de 7 a 11 anos da Escola Municipal de Iniciao Artstica do Muni-cpio de So Paulo (Emia) foi a dana. As atividades de improvisao realizadas no espao, uma unidade do Departamento de Expanso Cultural da Secretaria Municipal de Cultura de So Paulo, ajudou a refletir sobre um modo de ensino que respeite o desejo de to-dos os envolvidos no processo de construo do conhe-cimento e se desprenda de estruturas rgidas impostas em muitos ambientes escolares. O projeto, segundo a educadora, prope a iniciao de seus alunos nas lin-guagens artsticas de maneira integrada e de forma a estimul-los a ser autores e propositores durante sua prpria construo de conhecimento em dana.

    Na academia, a discusso sobre o lugar da arte no ambiente escolar se amplia. O projeto Era uma vez uma histria contada outra vez, com patrocnio dos ministrios, um exemplo disso. Coordenadora geral do projeto e orientadora das dissertaes de Tnia e Priscila, Mrcia Strazzacappa no titubeou ao tomar conhecimento do edital, que previa um projeto com durao de dois anos e a titulao de trs mestres. En-trou em contato com as professoras Karenine Porpino, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, e Va-lria Figueiredo, criadora do curso de dana na Univer-sidade Federal de Gois, e submeteu o projeto. A ini-ciativa resultou em trs dissertaes, duas da Unicamp e uma da UFRN, oficinas de formao e na produo de um CD com libreto com mesmo ttulo do projeto.

    Mrcia ressalta a importncia de o professor poder ser um pesquisador na escola, j que este o ambiente de pesquisa de um educador. E tanto Tnia quanto Pris-cila puderam conferir a boa qualidade dos resultados da pesquisa dentro da escola. Para Mrcia, o projeto mais uma motivao para que o conto seja explorado no espao escolar e, dessa forma, a expresso artsti-ca. Professora da disciplina Educao, Corpo e Arte, ela explica que as atividades de expresso corporal tm tido impacto no trabalho de professores formados pelo curso de pedagogia. A disciplina que iniciou como ele-tiva, hoje exigida no currculo do curso.

    Alm da ps-graduao de Priscila e Tnia, Mrcia comemora o resultado apresentado no evento de encer-ramento do projeto, em dezembro do ano passado, em que, numa rodada de narrao de histrias, professores se desprenderam do n que os mantinha naquele cen-rio relatado por Tnia em sua primeira experincia pro-fissional. Optamos por ter um evento rico em qualidade e no quantidade de pessoas. Foi enriquecedor pela qua-lidade das histrias e do pblico, comenta Mrcia.

    A resposta dos professores-contadores deixa a espe-rana de que as letras antes recortadas, fragmentadas, agora esto unidas novamente nos enredos sados da imaginao dos pequenos autores. Os corpos mirra-dos, antes enfileirados, agigantaram-se diante a possi-bilidade de se comunicar com todos os cantos da sala, cada vrtice do ptio escolar. Descobriram que a roda de conversa da professora Priscila se move. E a sala de aula no ser mais a mesma.

    Ao abrir minhas janelas e avistar o Reino

    PublicaoDissertao: Narrativa e dramatizao nos entrelugares da educao infantilAutora: Tnia Alves

    Dissertao: A improvisao em Dana: um dilogo entre a criana e o artista professor.Autora: Priscilla Vilas BoasOrientadora: Mrcia StrazzacappaUnidade: Faculdade de Educao (FE)

    Foto: Antoninho Perri