6º encontro associaÇÃo brasileira de relaÇÕes internacionais · relaÇÕes internacionais 25 a...

18
6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE - MG Área Temática: Segurança Internacional, Estudos Estratégicos e Política de Defesa. A geopolítica do espaço cibernético Sul-americano: conformação de políticas de segurança e defesa cibernética? Selma Lúcia de Moura Gonzales - ESG-Brasília Lucas Soares Portela - ECEME

Upload: lamthu

Post on 04-Dec-2018

217 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE

RELAÇÕES INTERNACIONAIS

25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE - MG

Área Temática: Segurança Internacional, Estudos Estratégicos e Política de Defesa.

A geopolítica do espaço cibernético Sul-americano: conformação de políticas de segurança e defesa cibernética?

Selma Lúcia de Moura Gonzales - ESG-Brasília

Lucas Soares Portela - ECEME

Page 2: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

RESUMO

O chamado espaço cibernético é o ambiente onde as informações de todos os matizes, quer

econômicos, sociais, políticos, militares, sejam dados sigilosos ou não, trafegam e se

interconectam. Na contemporaneidade, não é possível escrever sobre segurança e/ou

defesa sem vincular essas temáticas ao espaço cibernético e sobre a complexidade que o

envolve: os crimes, os delitos, os roubos, os domínios etc. Assim, é possível afirmar que

existe uma geopolítica desse espaço com características específicas em cada local e

conforme os atores envolvidos e as políticas que o gerencie. Nesse sentido, a proposta

deste artigo é analisar as atuais políticas de segurança e defesa cibernética no âmbito dos

três países sul-americanos com maior densidade de internautas – Argentina, Brasil e

Colômbia – e a possível existência de um diálogo entre elas ou se está em configuração

uma nova geopolítica do espaço cibernético na região que influencia na conformação de

poder regional. Para a construção do artigo, fez-se, inicialmente, uma breve discussão

conceitual sobre a geopolítica do espaço cibernético. Em seguida, realizou-se um

levantamento das principais políticas de segurança e defesa cibernética a partir de dados

empíricos coletados em fontes primárias e secundária. A partir das análises realizadas

constatou-se que no espaço Sul-Americano as políticas voltadas ao espaço cibernético

ainda se restringem ao âmbito interno dos países, como um assunto doméstico.

Especialmente, nas políticas de defesa da Argentina, Brasil e Colômbia, verificou-se que as

questões cibernéticas não são tratadas de forma efetiva na esfera de uma organização

regional ou ainda de maneira conjunta, em que pese alguns esforços, por parte do Conselho

de Defesa Sul-Americano (CDS), para promover essa aproximação. Algumas iniciativas,

como os Planos de Ação de 2012 e de 2013, que propôs a criação de um Grupo de trabalho

para avaliar a viabilidade de estabelecer políticas e mecanismos regionais a fim de fazer

frente às ameaças cibernéticas ou informáticas no âmbito da defesa são exemplos de

iniciativas, todavia ainda não existe uma efetividade nas políticas promovidas, no sentido de

criar uma conformação regional, ainda que também não tenha sido constatado o ressuscitar

de uma velha agenda nas relações de poder, tendo no espaço cibernético o catalisador de

possíveis entraves que levem a litígios cibernéticos entre os Estados.

Palavras Chave: Espaço Cibernético. Geopolítica. América do Sul. Segurança e Defesa.

Page 3: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

1

INTRODUÇÃO

O chamado espaço cibernético é o ambiente onde informações de todos os matizes,

quer econômicos, sociais, políticos ou militares, sejam dados sigilosos ou não, trafegam e se

interconectam. É também o ambiente onde se estabelecem acordos, compras e vendas,

legais ou ilegais e manipulações diversas, sejam de dados ou de informações.

Nesse contexto, não é possível escrever sobre segurança e/ou defesa sem vincular

essas temáticas ao espaço cibernético e sobre a complexidade que o envolve: os crimes, os

delitos, os roubos, os domínios etc., em outras palavras, sem estar atento a uma geopolítica

do espaço cibernético.

Assim, a proposta deste artigo é analisar as atuais políticas de segurança e defesa

cibernética no âmbito de três países sul-americanos com maior densidade de internautas –

Argentina, Brasil e Colômbia – e, a partir da análise dessas políticas, verificar se existe ou

não uma conformação entre elas, em outras palavras, analisar se há similaridades entre as

políticas ou se está em configuração uma nova geopolítica do espaço cibernético na região.

Para a construção do artigo, far-se-á, inicialmente, uma breve discussão conceitual

sobre a geopolítica do espaço cibernético, com foco na América do Sul. Em seguida,

realizar-se-á um levantamento das principais políticas de segurança e defesa cibernética a

partir de dados empíricos coletados em fontes primárias e secundárias. Por fim, o artigo

buscará responder se existe a possibilidade de construção de uma integração ou

aproximação entre as políticas de segurança e defesa cibernética para mitigação de litígios

e delitos cibernéticos entre os países em análise (Argentina, Brasil e Colômbia) ou se

vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda nas relações de poder, tendo no espaço

cibernético o catalizador de possíveis entraves que levem a litígios cibernéticos entre os

Estados.

1. A GEOPOLÍTICA DO ESPAÇO CIBERNÉTICO

Antes de refletir sobre uma possível geopolítica do espaço cibernético na América do

Sul, faz-se necessário explicitar a perspectiva teórica que ora estamos assumindo, assim

como a proposição adjetiva do conceito de geopolítica para o espaço cibernético. Nesse

sentido, a primeira questão que se coloca é sobre a legitimidade do uso de um campo de

conhecimento voltado, a priori, ao espaço territorial para se referir ao espaço virtual.

Sob a perspectiva ontológica do neologismo geopolítica criado em 1899 pelo

professor de Teoria do Estado na Universidade de Uppsala, Rudolf Kjellén, não seria

possível vincular geopolítica e espaço cibernético, haja vista o sentido fundante do conceito,

o estudo dos fenômenos políticos influenciado pelo solo (situação geográfica, espaço

Page 4: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

2

ocupado e domínio territorial, consubstanciado em seus recursos a ser explorado). Ao

elaborar sua teoria, Kjellén concebia um espaço essencialmente continental, quiçá marítimo,

pois sua preocupação era o território estatal como um organismo ligado ao solo e em

constante luta por mais espaço.

Todavia, ao estudarmos fenômenos políticos, necessariamente, analisamos relações

de poder e, nesse sentido, o campo de conhecimento da geopolítica carrega, em sua

essência, análises sobre relações de poder e espaço. Não obrigatoriamente só o espaço

estatal, premissa fundamental da geopolítica tradicional, conforme nos esclarece Heriberto

Carou (2002, p.206),

La reflexión espacial sobre las relaciones de poder no se puede limitar ---como ocurría en la Geopolítica tradicional - a las existentes entre los Estados; olvidaría entonces los innumerables fIujos que ocurren al margen; operaría de forma reduccionista limitando «lo político» a «lo estatal». De este modo, aunque la Geopolítica crítica hace hincapié en la microescala de análisis (la que se ocupa del planeta entero), como era el caso en la tradicional, esto no puede significar el abandono de otras escalas, a riesgo de caer en un determinismo geográfico1. (grifo nosso)

Nesse sentido, consideramos que as relações de poder operam em diversas escalas

e dimensões, assim como apenas são colocadas em funcionamento no contexto espacial,

em outras palavras, o poder necessita de um espaço para existir, pois não pode operar ou

ser exercido no vácuo, considerando que é sempre relacional. Não há poder se não há

objeto referente, pois esse se exerce sempre em relação a algo ou a alguém.

Se no conceito de geopolítica de Kjellén estava subjacente a relação política e

espaço, então essas duas dimensões necessitam ser consideradas quando das análises

geopolíticas na contemporaneidade: a política (poder) e o espaço (geográfico) onde ocorre.

Nesse sentido, quais espaços podem ser considerados?

Na atual conjuntura, novos espaços se apresentam como locus onde as relações de

poder acontecem, assim como outros atores, além do estatal, participam desse jogo. Dessa

maneira, a análise geopolítica incorpora novas dimensões espaciais, outros atores e

poderes diversos.

Nesse sentido, o espaço cibernético se apresenta como mais um locus onde as

relações de poder (política) ocorrem. Poderíamos considera-lo como mais um espaço

geográfico? Quais categorias e elementos constitutivos esse “espaço virtual” comporta para

que possa ser considerado um espaço geográfico?

1 A reflexão espacial sobre as relações de poder não pode limitar-se, como ocorria na Geopolítica

tradicional, às existentes entre os Estados; pois, desconsideraria, assim, os inumeráveis fluxos que ocorrem à margem e operaria de forma reducionista limitando o político ao estatal. Desse modo, ainda que a Geopolítica crítica saliente a microescala de análise (a que se ocupa do planeta inteiro), como era o caso na geopolítica tradicional, isso não pode significar o abandono de outras escalas, pois se corre o risco de cair em um determinismo geográfico.

Page 5: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

3

Para Walfredo Ferreira Neto (2014, p.79, 85), o espaço virtual tem seu controle

realizado pelos atores mais aptos, apesar de ser visto como um espaço global e comum, por

isso passa a ser territorializado. Prossegue o autor: “no ambiente cibernético do globo, os

Estados definem seus territórios [...]. Como exemplos imediatos, mas não únicos, tem-se os

domínios dos sítios “.br”; “.us”; “.uk”; “.it”;..., que indicam perfeitamente os respectivos

territórios”

Nos elementos constituintes do espaço cibernético existem as fronteiras, que,

segundo Ferreira Neto (2014, p. 70,) devem ser vistas na forma de ponto, que pode ser ao

mesmo tempo uma informação em seu “pacote”, ou um “nó” de uma infovia, ou, ainda, uma

estrutura estratégica ou infraestrutura crítica selecionada graças aos recursos disponíveis ao

Estado.

Se aceitarmos a existência de um espaço geográfico cibernético, então é possível

falar de uma geopolítica cibernética, com características específicas em cada local e

conforme os atores envolvidos e as políticas que o gerencie, assim como conflitos, delitos,

crimes, políticas e estratégias elaboradas com o intuito de, ora gerir, ora proteger, expandir,

atacar, ou seja, políticas e relações de poder no e para o espaço cibernético.

2 ESPAÇO CIBERNÉTICO E POLÍTICAS DE DEFESA

Ao longo da história, encontramos diversos exemplos de civilizações que

valorizavam o discurso e seu estudo, como por exemplo, quando Roma era um império. A

importância desse exercício era tão grande para algumas civilizações que eles estudavam o

discurso por meio da oratória e retórica, como faziam os atenienses.

Por meio desses estudos, se lia não somente o conteúdo, mas também os interesses

e intenções do seu autor. Embora uma política não seja um discurso, ao analisarmos

podemos compreender valores e interesses dos agentes do jogo político (SERAFIM & DIAS,

2012). Cabe salientar, no entanto, que estamos falando de análise de políticas e não de sua

avaliação.

Embora ambos os termos pareçam sinônimo e possam ser aplicados às políticas, o

foco e resultado gerado são distintos (SERAFIM & DIAS, 2012). Uma avaliação consiste em

observar os resultados que determinada política gera, verificando sua eficiência diante de

dado problema. No caso deste artigo, não pretendemos olhar os resultados das políticas de

defesa cibernética da Argentina, Brasil e Colômbia, mas os interesses, posições e

interações desses países, por isso, analisar e não avaliar.

Dito isso, uma análise de políticas deve observar três níveis: institucional, processo

decisório e relação estado-sociedade, conforme demonstrado no quadro abaixo.

Page 6: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

4

Quadro 1 – Níveis de Análises de Políticas

Níveis de análises Descrição

Institucional Observa as interações dentro da(s) instituição(ões) envolvidas. Este nível observa o processo decisório dentro da organização, como também as relações que ela mantém.

Processo decisório Nesse nível observam-se os interesses dos agentes envolvidos, assim como a reação deles a estímulos internos e externos.

Relação Estado-Sociedade

Observa as regras e instituição do Estado. A relação de poder dentro delas e a interação dessas estruturas com a sociedade. Esse nível interliga os outros dois níveis, demonstrando os interesses por de trás das políticas empregadas.

Fonte: DAGNINO (2002).

Como as políticas de defesa geralmente consideram também o ambiente

internacional como motivador, a análise política deve abarcar um nível de Cenário

Internacional. Esse deveria considerar as relações de poder existente, tanto no âmbito

regional como global, a posição do país no cenário internacional, especialmente em

algumas temáticas, assim como os conflitos existentes, em síntese, uma análise geopolítica

do Cenário Internacional. Esse nível ganha mais destaque dentro da temática do espaço

cibernético, que apresenta características transfronteiriças.

Para podermos aplicar a análise proposta no início do tópico, devemos

primeiramente distinguir a defesa e segurança cibernética. A distinção desses conceitos

pode nortear a análise quanto à política adotada. Cabe ressaltar, entretanto, que essa

distinção é um exercício analítico no nível ontológico, pois no espaço cibernético os

conceitos se interconectam. (PORTELA, 2015).

Conforme Paulo Carvalho (2011), a defesa cibernética pode ser definida como o

conjunto de ações realizadas no espaço cibernético, visando à defesa de sistemas e

informações. Por essa perspectiva, a defesa cibernética apresenta valor na integridade da

força, especialmente no que tange à produção de conhecimento e inteligência. Cabe

ressaltar, que esse autor inclui não somente ações defensivas na defesa cibernética, mas

também ações exploratórias e ofensivas.

Por sua vez, a segurança cibernética é associada por Oscar Medeiros Filho (2014) à

dimensão da segurança pública. Para esse autor, a defesa cibernética está ligada a noção

de guerra, enquanto a segurança cibernética está associada à ideia de ilícitos. Assim, de

acordo com ele, a conceituação de segurança e defesa cibernética vincula-se a ameaça que

está se combatendo.

Moisés Naím (2006) aborda a questão num sentido similar, quando discorre sobre os

limites dos conceitos de segurança e defesa tradicional. Sobre esses dois conceitos Naím

(2006) infere que a defesa tem relação com guerra, defesa de interesses nacionais, garantia

Page 7: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

5

da sobrevivência e da soberania, enquanto a segurança pública tem relação com questões

de ilícitos. Assim, para distinguir segurança e defesa cibernética precisamos identificar o que

são delitos cibernéticos.

Estes podem ser categorizados em dois grupos: crimes cibernéticos e ataques

cibernéticos (PORTELA, 2015). De acordo com McGuire & Dowling (2013), a categorização

desses conceitos deve ser realizada por meio da analogia e aplicabilidade no ambiente

tradicional. Exemplificando, uma extorsão online é um crime cibernético, enquanto o roubo

de dados de uma base militar é considerado um ataque cibernético, por ser um ato de

espionagem e guerra.

Feitas as distinções conceituais, podemos categorizar as organizações de defesa

cibernética, de maneira geral, por meio de um plano cartesiano, em que um eixo apresenta

escala gradativa quanto a distinção do conceito de segurança e defesa cibernética e no

outro a classificação quanto a natureza da organização. Em um estremo, observamos

estruturas que tratam os temas de segurança e defesa cibernética com separação total e na

outra extremidade as que integram os temas ao ponto de abordá-los como sinônimos.

Quando classificamos as instituições da América do Sul nesse plano, encontramos o

seguinte desenho:

Figura 1 – Extrato das organizações de defesa cibernética da América do Sul (2016)

Fonte: Elaboração própria, baseada em Argentina (2010), Justribó et al (2014), Mandarino Jr. e Canongia (2010), Brasil (2012; 2013; 2015), Conpes (2011), Chile (2010; 2014), Paraguai (2013; 2015), Ecuador (2008; 2014), Uruguai (2005; 2014), França (2013; 2015) e Ministére de la Défense (2014; 2014b), Ministerio de Defensa (2015), Télam (2015), Contardo (2015), Velázquez (2015), Bonilla (2013; 2015), Infodefensa (2015) e IITCUP (2016).

A Bolívia e o Peru foram postos como indefinidos por não haver uma caracterização

formal, por meio de documentos e estruturas, que vise a defesa ou segurança cibernética.

Retornando ao caso dos países vislumbrados em nosso estudo, os três apresentam

Page 8: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

6

similaridades, por tratar os conceitos de segurança e defesa cibernética de modo distinto. A

maior divergência que podemos observar diz respeito a estruturas específicas para o

tratamento dos delitos cibernéticos.

A Colômbia apresenta estruturas estritamente militares, enquanto os outros dois têm

formação hibrida, com organismos militares e civis, tratando de defesa cibernética e

segurança cibernética, respectivamente. A distinção da organização entre Argentina e Brasil

está na interação entre as duas esferas. Embora o Brasil apresente organismos que se

comuniquem, a interação é limitada a consultas mútuas.

A seguir, apresentaremos de maneira sucinta, um breve panorama sobre como o

espaço cibernético é tratado nas políticas de defesa da Argentina, Brasil e Colômbia.

2.1 Espaço cibernético nas políticas de defesa da Argentina

No caso argentino, a estrutura militar é composta tanto por organismos que lidam

diretamente com as ações de defesa cibernética, como também por estruturas que prestam

apoio e se comunicam diretamente com as estruturas civis que lidam com a segurança

cibernética, conforme quadro:

Quadro 2 – Órgãos de Defesa Cibernética da Argentina

Vertente Órgãos Subordinação Principais funções

I

Unidad de Coordinación de Ciberdefensa

Jefatura de Gabinete de Asesores del Ministerio de Defensa

Realizar as recomendações e observar os manuais de procedimentos sobre ações no espaço cibernético, inclusive defesa;

Responsável pelas políticas de segurança da informação, proteção de infraestruturas críticas e tecnológicas vinculadas às questões cibernéticas.

Comité de Seguridad de la Información

Subsecretaría de Coordenación

Apoiar as autoridades e as iniciativas na área de segurança e defesa cibernética;

Implementar meios e canais necessários para despachar relatórios sobre incidentes e anomalias dos sistemas monitorados.

II Dirección General de Ciberdefensa

Estado Mayor Conjunto

Intervir no planejamento, formulação, direcionamento, supervisão e evolução das políticas de defesa cibernética no âmbito militar.

III Comando Conjunto de Ciberdefensa

Estado Mayor Conjunto

Conduzir operações de defesa cibernética em caráter permanente;

Garantir a defesa cibernética das operações militares dos instrumentos militares.

IV Grupo de Trabajo de Ciberdefensa

Secretaría de Estrategia y Asuntos Militares

Desenvolver pesquisas e produzir materiais sobre defesa cibernética.

Fonte: Elaboração própria baseada em baseada em Ministerio de Defensa (2015),Télam (2015) e Justribó et al (2014).

Page 9: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

7

A estrutura argentina é dividida em quatro vertentes, conforme quadro acima, das

quais, a primeira faz integração entre defesa e segurança cibernética e as outras três

operam quase exclusivamente com a defesa cibernética. Apesar de a Argentina apresentar

uma estrutura militar que lide com defesa cibernética e preste suporte a segurança

cibernética do país, em termos de documentos de defesa, a abordagem sobre espaço

cibernético ainda demanda produção.

Até 2015 não foram criados documentos oficiais específicos para uma estratégia de

defesa cibernética, mas a noção da importância de uma política já permeia os principais

debates (JUSTRIBÓ et al, 2014). Mesmo sem esses documentos formais específicos, o

espaço cibernético já é abordado em documentos macro, como o Livro Branco de Defesa

(LBD) da Argentina.

Na versão de 2010, além de considerar o espaço cibernético estratégico, o Livro

Branco argentino evidenciou o espaço cibernético como uma ferramenta de alerta. Os

argentinos compreenderam que por meio do espaço cibernético poderiam observar

possíveis ameaças estatais. Para tal, o livro previa tanto a construção de estruturas para

lidar com a temática do espaço cibernético, como as já evidenciadas, como também a

capacitação de pessoas.

Essa visão preliminar começou a tomar corpo no último Livro Branco, edição de

2015, que além de reconhecer a importância desse espaço, delimitou estruturas e função

relativas à sua proteção. O livro coloca ainda a necessidade de conscientização das forças

armadas sobre a importância do espaço cibernético. Dessa forma, embora ainda não

disponha de uma estratégia específica, a Argentina orienta a defesa cibernética em seu LBD

(MINISTERIO DE DEFENSA, 2015a).

Apesar de assinado pela presidência da república e pelo ministro da defesa

argentino, a elaboração do LBD foi realizada por meio de um grupo de trabalho apoiado por

um projeto do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Mais

especifico sobre a defesa cibernética o livro explica que:

El ciberespacio como ámbito u objeto de interés para la Defensa mereció distinta atención, planteos o abordajes en el MINDEF desde el año 2006, con la creación de un Comité de Seguridad de la Información y la constitución de grupos de trabajo para analizar desde el punto de vista estratégico y normativo sus implicancias para el Sistema de Defensa Nacional. El Consejo de Defensa Suramericano de UNASUR, por su parte, constituyó en el año 2012 un grupo de trabajo para establecer una política y mecanismos regionales para hacer frente a las amenazas cibernéticas. En este contexto, el MINDEF tomó la decisión de concurrir a la política nacional en la materia en dos dimensiones simultáneas: 1. Adhesión al Programa Nacional de Infraestructuras Críticas de Información y Ciberseguridad (Resolución JGM 580/2011), con el objeto de alcanzar los estándares mínimos de seguridad de la información con que debe contar la jurisdicción y sus organismos descentralizados.

Page 10: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

8

2. Coordinación de las diferentes capacidades y unidades especializadas generadas en el MINDEF, en el EMCO y en las Fuerzas Armadas, a fin de diseñar una política integral, una propuesta orgánico-institucional y desarrollar mecanismos integrados de respuesta. (MINISTERIO DE LA DEFENSA, 2015, p. 67).2

As políticas de defesa, de modo geral, são elaboradas pelos agentes que embasam

as decisões em referências majoritariamente nacionais. O fato de a Argentina ter organizado

a defesa cibernética utilizando orientações internacionais, especialmente da UNASUL e com

apoio do PNUD, demonstra a abertura do país para apoio externo. Tal ação facilita uma

possível cooperação com outros países, haja vista que buscou observar padrões

internacionais de aplicação.

Também evidenciamos uma motivação, por parte dos argentinos, de compartilhar

sua política de defesa com os países vizinhos. Por exemplo, o lançamento do Livro Branco

foi realizado também em outros países, como no Ministério da Defesa do Brasil. Durante

estes eventos, foi evidenciado a necessidade de cooperação entre os países para mitigar as

ameaças transfronteiriças, ou seja, foi exposta a consciência e disposição dos países em

cooperar.

2.2 Espaço cibernético nas políticas de defesa do Brasil

Diferente da Argentina, no Brasil não há organismos de defesa cibernética exclusivos

para a interação com instituições civis de segurança cibernética. Além disso, os organismos

brasileiros de defesa cibernética estão localizados a partir do nível estratégico, pois a

atuação do Ministério da Defesa do Brasil ocorre também nesses níveis (BRASIL, 2014).

Enquanto a defesa cibernética argentina é dividida por funções, no Brasil, ela é realizada por

força e nível estratégico, conforme abaixo:

2 O espaço cibernético como âmbito ou objeto de interesse para a Defesa mereceu distinta atenção,

planos e abordagem no MINDEF desde o ano de 2006, com a criação de um Comitê de Segurança da Informação e a constituição de grupos de trabalhos para analisar sob o ponto de vista estratégico e normativo suas implicações para o sistema de Defesa Nacional. O Conselho de Defesa Sul-americano da UNASUL, por sua parte, constituiu no ano de 2012 um grupo de trabalho para estabelecer uma política e mecanismos regionais para fazer frente a ameaças cibernéticas. Nesse contexto, o MINDEF tomou a decisão de combinar a política nacional em duas dimensões simultâneas: 1. Adesão ao Programa Nacional de Infraestruturas Críticas de Informação e Ciberseguridade (Resolução JGM 580/2011), com o objetivo de alcançar os padrões mínimos de segurança da informação com que deve contar a jurisdição e seus organismos descentralizados. 2. Coordenação das diferentes capacidades e unidades especializadas geradas no MINDEF, no EMCO e nas Forças Armadas, a fim de desenhar uma política integral, uma proposta orgânico-institucional e desenvolver mecanismos integrados de resposta. (MINISTERIO DE LA DEFENSA, 2015, p. 67).

Page 11: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

9

Quadro 3 – Órgãos de Defesa Cibernética do Brasil

Níveis Ministerio da

Defesa Exército Marinha Aeronáutica

Estratégico Estado-Maior Conjunto das

Forças Armadas

Centro de Defesa

Cibernética

Órgão de Defesa

Cibernética

Órgão de Defesa

Cibernética

Operacional

Elemento de guerra

cibernética do Estado-Maior

Conjunto

- - -

Tático

Destacamento Conjunto de

Guerra Cibernética

Destacamento de Guerra

Cibernética

Destacamento de Guerra

Cibernética

Destacamento de Guerra Cibernética

Fonte: Elaboração própria com base em Brasil (2015).

Com exceção do órgão estratégico do Ministério da Defesa, todas demais estruturas

apresentadas no quadro acima lidam diretamente com a defesa cibernética. O Estado-Maior

Conjunto das Forças Armadas tem como função delimitar aspectos político-estratégicos da

defesa cibernética, que serão aplicados pelos elementos de guerra cibernética do estado-

maior conjunto e seus destacamentos. Além disso, a Doutrina de Defesa Cibernética do

Brasil, datada de 2014, prevê que cada força deva ter seus próprios órgãos de defesa

cibernética, tanto no nível estratégico, quanto no nível tático (MINISTERIO DA DEFESA,

2014).

Apesar dessa disposição, o Livro Branco de Defesa do Brasil atribui ao Exército a

responsabilidade pela defesa cibernética (BRASIL, 2012). Dessa forma, por meio do

Comando de Defesa Cibernético (CDCiber), o Exército se articula com as demais forças e o

Ministério da Defesa para prover a defesa cibernética do Brasil. Para tal, há uma interação

mais próxima entre o CDCiber, o Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas e o

Destacamento Conjunto de Guerra Cibernética (BRASIL, 2012).

Quanto aos documentos brasileiros de defesa cibernética, a publicação já vem

ocorrendo não somente em documentos gerais, como o Livro Branco, como também em

documentos específicos, como a Doutrina de Defesa Cibernética do Brasil. Os primeiros

documentos a abordarem a defesa cibernética foram a Estratégia Nacional de Defesa

(2008) e a Política de Defesa Nacional (2008). Nesse primeiro momento, a abordagem foi

tímida, somente salientando a importância do espaço cibernético e atribuindo a

responsabilidade de sua defesa para o Exército.

Em virtude disso, todos os documentos de defesa posteriores também abordaram a

defesa cibernética. Dentre eles, podemos citar o Livro Branco de Defesa (2012), o Plano de

Articulação e Equipamentos de Defesa (2012), a Estratégia de Defesa (2012) e Política

Nacional de Defesa (2012). No que se refere ao Livro Branco de Defesa, a primeira versão

Page 12: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

10

deste documento foi fruto de um grupo de trabalho composto por militares e civis e ao final

foi submetido a um grupo de acadêmicos para recolher opiniões e incrementar a compilação

(MINISTERIO DA DEFESA, 2017). A versão mais recente do Livro Branco, além de todos os

processos que a versão anterior sofreu, também está sendo submetido à aprovação do

Congresso Nacional, gerando mais legitimidade ao documento.

Em síntese, esses documentos preveem a estruturação de um sistema de defesa

cibernética para o Brasil, com as estruturas anteriormente apresentadas, assim como o

orçamento para a criação de uma rede militar segura. Para tal, existe a previsão de

capacitação para os operadores desse sistema. De acordo com o documento, a capacitação

contará com uma Escola Nacional de Defesa Cibernética e um simulador (MINISTERIO DA

DEFESA, 2012),

2.3 Espaço cibernético nas políticas de defesa da Colômbia

Diferente dos dois países anteriores, em que os órgãos militares lidam com a defesa

cibernética e a esfera civil cuida da segurança cibernética, a Colômbia trata das duas

temáticas dentro da esfera militar, conforme abaixo:

Quadro 4 – Órgãos de Defesa Cibernética da Colômbia

Órgãos Subordinação Descrição

Comisión Intersectorial

- Único órgão da estrutura que é composto por civis e militares, mesmo tendo natureza militar. Essa comissão atua com defesa e segurança cibernética.

ColCERT Comisión Intersectorial

Diferente dos demais CERTs, o ColCERT está dentro da hierarquia militar, ele abordas a questões de defesa e segurança cibernética.

Comando Conjunto Cibernético

ColCERT Equipe encarregada da defesa cibernética da Colômbia. Está dentro da hierarquia militar.

Centro Cibernético Policial

ColCERT Equipe encarregada da segurança cidadã da Colômbia. Essa estrutura compõe a hierarquia militar.

Fonte: Elaboração própria com base em CONPES (2011).

A equiparação quanto à hierarquia dentro do ministério permite que a polícia nacional

seja como uma quarta força. Semelhante às forças policiais dos demais países, a instituição

colombiana lida com investigações policiais, segurança cidadã, narcóticos, sequestros,

extorsão, como também com trânsito e transporte (POLICIA NACIONAL, 2017). De forma

mais complementar, ela também opera com as questões relacionadas a terrorismo e como

uma polícia fiscal e aduaneira (POLICIA NACIONAL, 2017).

O tratamento dos crimes cibernéticos pela Colômbia segue a mesma relação. Não

vislumbramos no país colombiano uma estrutura civil que lide com as questões relacionadas

Page 13: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

11

ao espaço cibernético. Nesse país, tanto os delitos cibernéticos, quanto os ataques

cibernéticos são tratados dentro da estrutura militar.

A Colômbia orienta sua defesa cibernética por meio do documento CONPES

3.701/2011 (CONPES, 2011). Esse documento é citado pelo Decreto nº 2.758/2012 e a

Resolução nº 3.933/2013 do Ministério de Defensa Nacional colombiano como a Estratégia

de Segurança e Defesa Cibernética da Colômbia.

Essa estratégia traz alguns aspectos para compreender o contexto em que o

documento foi criado. O documento aponta a falta de estrutura para coordenar as segurança

e defesa cibernética do país, pois o ColCERT somente foi criado em 2013. Além disso, ele

evidencia que a segurança e defesa cibernética necessitam de uma ação conjunta entre

setor privado e público, entre civis e militares, questão que necessitava um maior

aprofundamento na Colômbia.

Em suma, como já discorrido, as análises de políticas podem considerar todos ou

alguns dos seguintes fatores: atores que o criam, interesses envolvidos, contexto em que foi

criado. Nesse tópico conhecemos um pouco de cada uma das políticas voltadas ao espaço

cibernético de três países sul-americanos: Argentina, Brasil e Colômbia, mas antes de

observarmos a compatibilidade e possibilidade de convergência entre elas, é importante

compreender o contexto geopolítico em que foram gestadas e os interesses e necessidades

daí advindos.

2.4 A geopolítica do espaço cibernético na América do Sul: breves considerações

sobre Argentina, Brasil e Colômbia

Conforme discorrido nos tópicos anteriores, com relação ao espaço cibernético Sul-

Americano, não há uma homogeneidade, no que se refere às políticas e estruturas

institucionais, assim como na abordagem sobre o conceito segurança e defesa cibernética e

as perspectivas com que são tratados.3 Por vezes, tanto a segurança quanto a defesa

cibernética são considerados por uma estrutura militar de defesa, ou em casos específicos,

há uma estrutura civil e outra militar.

A Colômbia trata segurança e defesa cibernética em uma única esfera: a da defesa,

o que pode gerar incompatibilidade conceitual ao integrar uma estratégia política conjunta

3 Entre los desafíos que deberá enfrentar la agenda del Consejo de Defensa Suramericano, en

materia de ciberdefensa, están las distintas percepciones de los países sobre la utilización de los medios militares y de seguridad interior. Estas concepciones, sobre los temas de seguridad y defensa, afectan a los distintos marcos normativos y doctrinarios que rigen los sistemas de seguridad interior y defensa nacional entre los países miembros de Unasur, por lo que la coherencia en el enfrentamiento de las cuestiones tocantes a la ciberseguridad y la ciberdefensa se difculta.(BUSTAMANTE, RIVERA, CAÑAS, 2015, p.112)

Page 14: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

12

com outros países da região. Tal fato vincula-se à necessidade histórica de combate aos

grupos armados locais e necessidade de combate aos delitos cibernéticos.

No caso argentino, a defesa cibernética está sob a responsabilidade da estrutura

militar, que também presta suporte à segurança cibernética e se vincula a órgão civis. Com

relação ao Brasil, as ações relativas à defesa cibernética estão sob a responsabilidade do

Comando de Defesa Cibernética, subordinado ao Ministério da Defesa.

Brasil e Argentina apresentam agendas semelhantes, principalmente em termos de

abrangência, já que seus órgãos de defesa cibernética englobam vários níveis do

planejamento estratégico.

Com relação às políticas cibernéticas, pelas análises realizadas, não se vislumbrou

entre os países analisados, uma disputa de poder. As políticas estão mais voltadas a

questões intramuros. Por outro lado, não há ainda uma conformação efetiva entre essas

políticas, o que fragiliza a cooperação com reflexos para o fortalecimento da defesa e

segurança cibernética na região sul-americana.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O espaço cibernético, diferente do estatal, ultrapassa fronteiras e envolve uma rede

mundial compartilhada globalmente. Nesse sentido, conforme Medeiros Filho (2014),

demanda novos arranjos de governança global, dentre os quais o debate sobre um regime

internacional para a discussão do tema.

Apesar de a questão cibernética não respeitar fronteiras políticas, constatamos que

no espaço Sul-Americano ainda é tratada prioritariamente no interior das fronteiras dos

estados-nações, como um assunto doméstico.

Pelas análises das políticas de defesa da Argentina, Brasil e Colômbia, constatamos

que as políticas cibernéticas não são tratadas de maneira efetiva no âmbito de uma

organização regional ou de maneira conjunta. Todavia, tem se observado esforços, por

parte do Conselho de Defesa Sul-Americano (CDS), para promover essa aproximação.

Algumas iniciativas, como os Planos de Ação de 2012 e de 2013, que propôs a criação de

um Grupo de trabalho para avaliar a viabilidade de estabelecer políticas e mecanismos

regionais a fim de fazer frente às ameaças cibernéticas ou informáticas no âmbito da defesa.

Também, conforme BUSTAMANTE, RIVERA e CAÑAS (2014, p. 110), o Plano de

Ação 2014 do CDS que propôs a realização de um Seminário sobre defesa cibernética,

realizado em maio de 2014 em Buenos Aires, onde foram acordadas ações no sentido de

Page 15: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

13

realizar atividades concretas na construção de uma política de defesa cibernética em escala

regional.4

Em agosto de 2014, a I Declaração de Cartagena da Reunião de Ministros do

Conselho de Defesa Sul-Americano, ratificou a importância de construir conceitos comuns,

estimular uma política em matéria de defesa cibernética e promover avanços com o Grupo

de Trabalho de Defesa Cibernética e com o Grupo de Trabalho de Telecomunicações da

COSIPLAN.

Embora haja algumas iniciativas nesse sentido também em organismos

internacionais, os países analisados tendem a priorizar o enfoque nacional em seus

documentos. Podemos afirmar que a preferência pelo tratamento doméstico se justifica na

medida em que o país precisa garantir inicialmente sua soberania nacional. Enquanto não

finalizam a organização da defesa cibernética no cenário nacional para efetivamente tratar a

defesa cibernética nos organismos supranacionais, alguns países sul-americanos buscam

aproximação com outros países por meio da cooperação bilateral.

Observamos, por exemplo, a decisão por parte dos Ministros da Defesa do Brasil e

Colômbia, em 2012, de criar uma Comissão Conjunta de técnicos das forças armadas a fim

de revisar e precisar as capacidades, dentre outros temas, o da defesa cibernética. Ou

ainda, a iniciativa bilateral do Brasil e Argentina, em 2011, de aprofundar a cooperação em

matéria de informática e defesa cibernética (BRÚCULO, VENCZEL, 2012).

Cabe destacar alguns aspectos positivos nas políticas analisadas com relação à

questão cibernética. Como são relativamente recentes e estão em processo de implantação,

assim como suas respectivas estruturas, facilitam o debate sobre o aprofundamento na

conformação e cooperação entre os países.

Em suma, este artigo procurou apresentar um breve esboço das políticas de defesa

voltadas ao espaço cibernético em três países da América do Sul: Argentina, Brasil e

Colômbia, no sentido de trazer ao debate a possível conformação de uma geopolítica do

espaço cibernético na região e a importância de se aprofundar a cooperação nessa área.

Todavia, não tivemos a pretensão de exaurir o assunto, haja vista a sua complexidade e

necessidade de maior aprofundamento.

4 Se acordó lo siguiente: 1. Crear un foro regional del Grupo de Trabajo de Ciberdefensa de los

Estados Miembros, a fn de intercambiar conocimientos, experiencias y procedimientos de solución. 2. Establecer una red de contactos con las autoridades competentes en el intercambio de información, que permita una colaboración permanente. 3. Defnir la plataforma y procedimientos de comunicaciones de la red de contactos. 4. Profundizar y sistematizar la reflexión sobre defniciones conceptuales de ciberdefensa y ciberseguridad. .(BUSTAMANTE, RIVERA, CAÑAS, 2015, p.111)

Page 16: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

14

REFERÊNCIAS

BONILLA, Javier. Centro de Ciberdefensa Militar en Uruguay. Defense.com. Seção Uruguay. Madrid, set. 2013. Disponível em <http://www.defensa.com/frontend/defensa/centro-ciberdefensa-militaruruguay-vn10000-vst342>. Acesso em: 22 abr. 2016. BRASIL (2012). Livro Branco de Defesa. Brasília: Ministério da Defesa. ______ (2013). Política Nacional de Defesa. Brasília: Ministério da Defesa. ______ (2015). Estratégia de segurança da informação e comunicações e de segurança cibernética da administração pública federal 2015-2018. Brasília: GSI. BRÚCULO, Celia Romina; VENCZEL, Alejandro Gustavo (2012). Defensa cibernética en América del Sur. Estrategias en la UNASUR ante ciberguerra y ciberdelito. VI Congreso de Relaciones Internacionales. Universidad Internacional de La Plata. Argentina. Disponível em: <http://sedici.unlp.edu.ar/bitstream/handle/10915/40184/Documento_completo.pdf?sequence=1>. Acesso em 20 abr. 2016 BUSTAMANTE, Gilberto Aranda; RIVERA, Jorge Riquelme; CAÑAS, Sergio Salinas (2015). La ciberdefensa como parte de la agenda de integración sudamericana. Línea Sur 9. Revista de Política Exterior. Disponível em: <http://sedici.unlp.edu.ar/bitstream/handle/10915/40184/Documento_completo.pdf?sequence=1>. Acesso em: 15 abr. 2017. CAROU, Heriberto Cairo (2002). El retomo de la geopolítica: nuevos y viejos conflictos bélicos. Sociedad y Utopía. Revista de Ciencias Sociales, n.19, Mayo 2002. Madrid, España. CARVALHO, Paulo Sergio Melo de (2011). Conferência de Abertura: o setor cibernético nas forças armadas brasileiras. In: BARROS, Otávio Santana Rêgo (Org.). Desafios estratégicos para segurança e defesa cibernética. Brasília: Secretária de Assunto Estratégicos da Presidência da República. CHILE (2010). Libro de la Defensa Nacional. Santiago: Ministerio de Defensa Nacional. ______ (2014). Orden Ministerial nº 3.380. Estado Mayor Conjunto. Santiago: Ministério de Defensa Nacional. CONPES (2011). Lineamientos de Política para Ciberseguridad y Ciberdefensa. Documento 3701. Bogotá: Departamento Nacional de Planeación. CONTARDO, Andrés Polloni (2015). Ciberseguridad: Estamos preparados. Revista Escenários Actuales, Ano 20, nº. 1. Chile: CESIM. DAGNINO, Renato et alii (2002): Gestão Estratégica da Inovação: metodologias para análise e implementação. Taubaté: Ed. Cabral Universitária. EQUADOR (2014). Agenda Politica de la Defensa (2014-2017). Quito: Ministerio de Defensa Nacional.

Page 17: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

15

______ (2008). Agenda Nacional de Seguridad Interna y Externa. Quito: Ministerio Coordinador de Seguridad Interna y Externa. FRANÇA (2015). French National Digital Security Strategy. Paris: ANSSI. ______ (2013). White Paper on Defence and National Security. Paris: Ministére de la Défense. FERREIRA NETO, Walfredo Bento (2014). Territorializando o “novo” e (re)Territorializando os Tradicionais: a Cibernética como espaço e recurso de poder. In: MEDEIROS FILHO, Oscar; FERREIRA NETO, Walfredo B.; GONZALES, Selma Lúcia de Moura (Org.) Segurança e Defesa Cibernética: da fronteira física aos muros virtuais. Coleção I - Defesa e Fronteiras Cibernéticas Pernambuco: Editora UFPE. IITCUP (2016). Missión. Bolívia: Academia Nacional de Polícias, 2016. Disponível em <http://www.iitcup.org/Mision.html>. Acesso em: 20 abr. 2016. INFODEFENSA (2015). Ecuador pone los ojos en los sistemas en ciberdefensa brasileños. Infodefensa. Quito, jun. 2015. Disponível em <http://www.infodefensa.com/latam/2015/06/10/noticia-ecuador-sistemas-ciberdefensa-brasilenos.html>. Acesso em: 13 abr. 2016. JUSTRIBÓ, Candela; GASTALDI, Sol; FERNÁNDEZ, Jorge A (2014). Las estrategias de ciberseguridad y ciberdefensa en Argentina: marco político-institucional y normativo. Informe de Investigación. Buenos Aires: Escuela de Defensa Nacional. MANDARINO JR., Raphael; CANONGIA, Claudia (2010). Livro verde: segurança cibernética no Brasil. Departamento de Segurança da Informação e Comunicações. Brasília: GSI. MCGUIRE, Mike. DOWLING, Samantha (2013). Cyber crime: a review of the evidence. Home Office Research Report 75. Reino Unido: Londres. MEDEIROS FILHO, Oscar (2014). Em busca de ordem cibernética internacional. In: MEDEIROS FILHO, Oscar; FERREIRA NETO, Walfredo B.; GONZALES, Selma Lúcia de Moura (Org.) Segurança e Defesa Cibernética: da fronteira física aos muros virtuais. Coleção I - Defesa e Fronteiras Cibernéticas Pernambuco: Editora UFPE. MINISTERIO DE DEFESA (2017). Livro Branco de Defesa Nacional. Brasília: MD. Disponível em <http://www.defesa.gov.br/estado-e-defesa/livro-branco-de-defesa-nacional>. Acesso em: 18 jun. 2017. ______ (2012). Política Nacional de Defesa / Estratégia Nacional de Defesa. Brasília: MD. MINISTERIO DE DEFENSA (2015). Decisíon Administrativa 15/2015. Buenos Aires: InfoLeg. ______ (2015a). Libro Blanco de la Defensa de 2015. Buenos Aires: MINDEF. NAÍM, Moisés (2006). Ilícito: o ataque da pirataria, da lavagem de dinheiro e o do tráfico à economia global. Rio de Janeiro: Ed. Jorge Zahar. PARAGUAI (2015). Decreto nº 3.275/2015. Poder Executivo. Assunção: Ministeério de Defensa Nacional.

Page 18: 6º ENCONTRO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS · RELAÇÕES INTERNACIONAIS 25 A 28 DE JULHO DE 2017 - BELO HORIZONTE ... vislumbra o ressuscitar de uma velha agenda

16

______ (2013). Primer Libro Blanco de la Defensa. Assunção: Ministerio de Defensa Nacional. POLICIA NACIONAL (2017). Líneas de emergencia. Bogotá: Gobierno da Colombia. Disponível em <https://www.policia.gov.co>. Acesso em 15 mai. 2017. PORTELA, Lucas Soares (2015). Movimentos centrais e subjacentes no espaço cibernético do século XXI. Dissertação [Mestrado em Ciências Militares]. Rio de Janeiro: ECEME. SERAFIM, Milena Pavan; DIAS, Rafael de Brito (2012). Análise de Política: uma revisão da literatura. Cadernos Gestão Social, Vol. 03, nº 01, jan-jun de 2012. Bahia: UFBA. TÉLAN (2015). Hackean radios de las Islas Malvinas y reproducen el himno nacional argentino. Diario Veloz. Argentina, abril. Disponível em <http://www.diarioveloz.com/notas/141776-hackean-radios-las-islas-malvinas-y-reproducen-el-himno-nacional-argentino>. Acesso em: 30 mar. 2016. URUGUAI (2005). Libro Blanco de la Defensa Nacional: aportes para um debate. Montevídeu: Ministerio de Defensa Nacional. ______ (2014). Política de Defensa Nacional. Montevídeu: Ministerio de Defensa. VELÁZQUEZ, Tomás (2015). Las Fuerzas Armadas paraguayas crean una unidad dedicada a lá Guerra Eletrônica. Defensa.com. Paraguai, abril. Disponível em <http://www.defensa.com/frontend/defensa/fuerzas-armadas-paraguayas-crean-unidad-dedicada-guerra-vn15398-vst335>. Acesso em: 11 abr. 2016.