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  • 8/7/2019 A-Amente_Kalu Rimpoche

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    A MENTE CLARA LUZ

    KALU RIMPOCH

    Kalu Rinpoche. Luminous mind: the way of the Buda. Compilado por DenisTndrup, traduzido por Maria Montenegro, prefcio de S.S. o Dalai Lama.Boston: Wisdom, 1997.

    KALU RIMPOCHE -

    ( Foi um dos mais renomados Mestres tibetanos contemporneos da escola

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    Senhor Lama, fonte de tudo o que til e desejado,Rogo das profundezas de meu corao Abenoe a mim e a todos os seres-sencientes-me dos seis reinosPara que sejamos liberados, assim que possvel,Do lodo de sofrimento do samsara,E ento nos abenoe para que,

    Na cessao e realizao da mirade de adeptosDa linhagem da transmisso oral,Nossas mentes possam se misturar indissoluvelmente com a sua.

    Esta prece, chamando de longe o amado Lama que nos guia no caminho para aliberao, foi composta extemporaneamente por Karma Rangjung Knkhyab, nomonastrio de Changchub Chling ou Dar Ling, no Buto, atendendo aosrepetidos pedidos de treze devotos praticantes.

    A Mente

    Temos uma certa noo superficial do que a mente. Para ns, o queexperimenta o sentimento de existir, o que pensa "sou eu", "eu existo". ainda o que consciente dos pensamentos e sente os movimentos emotivos,aquilo que, segundo as circunstncias, tem o sentimento de estar feliz ou

    infeliz.

    Fora disso, no sabemos o que , verdadeiramente a mente. Talvez sejamesmo provvel que nunca nos tenhamos feito essa pergunta.

    A mente sente, no os rgos

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    evidente, em primeiro lugar, que a mente no tem existncia material.No um objeto que se possa definir a cor, o tamanho, o volume ou a forma.Nenhuma dessas caractersticas aplicvel mente. No podemos apontar amente com o dedo, dizendo: " isso". Nesse sentido, a mente vazia.

    Entretanto, que a mente seja desprovida de forma, de cor, etc, no suficiente para concluir sobre sua no-existncia, pois os pensamentos, ossentimentos, as emoes conflituosas que ela sente e que produz provam quealguma coisa funciona e existe, que a mente no , portanto, somente vazia.Logo, o que esse sentimento de existir? Onde ele se situa? No exterior, oumesmo no interior do corpo? Se ele se situa no interior do corpo, quem osente? A carne, o sangue, os ossos, os nervos, as veias, os pulmes, o

    corao?Se vocs refletirem atentamente, iro admitir que nenhum membro, nemnenhum rgo reivindica sua prpria existncia, dizendo "eu". Assim, a menteno pode ser assimilada a uma parte do organismo. Tomemos o exemplo doolho. O olho no proclama sua prpria existncia. Ele no diz para si mesmo:"Eu existo", ou ainda: " preciso que eu olhe uma determinada formaexterior; esta bonita, aquela no o ; eu me apego a primeira e rejeito a

    segunda". O prprio olho no tem nenhuma vontade, no experimenta nenhumsentimento, nem apego, nem averso.

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    a mente que tem o sentimento de existir, que percebe, julga, se apega ourejeita. O mesmo vale para o ouvido e os sons, o nariz e os odores, a lngua eos sabores, a pele e os contatos, o rgo mental e os fenmenos. No so osrgos que percebem, mas a mente.

    O carro tem necessidade de um condutor

    Os rgos, inconscientes por natureza, no so a mente, so como uma casana qual se mora. Os moradores so o que se chama de conscincias:

    conscincia visual;conscincia auditiva;conscincia olfativa;conscincia gustativa;conscincia ttil;conscincia mental.

    Essas conscincias no existem de maneira autnoma. Elas nada mais so doque a mente.

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    Pode-se dizer ainda que o corpo como um carro e a mente o seu condutorQuando o carro est desocupado, apesar de possuir todos os equipamentospara rodar - o motor, as rodas, o combustvel, etc, - e de encontrar-se emperfeito estado de funcionamento, ele no pode ir a nenhum lugar. Do mesmomodo, um corpo desprovido de mente, mesmo que possua a totalidade dosrgos, no passa de um cadver. Apesar de ter olhos, ouvidos, um nariz, eleno pode ver, nem ouvir, nem cheirar.

    Alguns pensaro que a morte no atinge apenas o corpo, mas tambm a

    mente: o primeiro torna-se cadver, a segunda deixa simplesmente deexistir. Mas no o que ocorre. A mente no nasce, no morre, e no atingida pela doena. eterna. O que percebe as formas vistas pelo olho, ossons ouvidos pelo ouvido e os outros objetos atravs dos outros rgos dossentidos, o que consciente, o que no interrompido pela morte do corpo, portanto, a mente.

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    Como vimos, considerando-se que ela destituda de qualquer caractersticamaterial, no possvel designa-la como uma coisa visvel e facilmentereconhecida, caso contrrio algum poderia mostr-la para ns. De fato,possuindo uma mente, todos devemos consultar a ns mesmos e, guiados porum mestre, proceder a uma investigao que nos leve at a descoberta deque ela verdadeiramente. Qual sua forma, sua cor, seu volume? Ela estsituada no exterior ou no interior do corpo? So questes que necessitam deuma resposta verificada pela experincia, mesmo se tivermos recebidopreviamente explicaes tericas como estas dadas aqui.

    Escuta, reflexo, meditao

    A prtica do dharma compreende sempre trs etapas, chamadas escuta,reflexo e meditao.A escuta consiste em receber ensinamentos tericos e instrues. Seucorolrio indispensvel lembrar-se com fidelidade do que foi dito ou lido.

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    Claridade

    Todavia, a mente no como um espao obscuro que nem o sol, a lua ou as

    estrelas clareia, mas sim como o espao diurno ou ainda como o espao deuma sala iluminada. uma comparao, e apenas aproximada. Significa que a mente possui um

    certo poder de conhecer. No o prprio conhecimento, mas a claridade, afaculdade consciente, que o torna possvel. Esse poder compreende, almdisso, a faculdade de produzir a manifestao. Quando vocs pensam naAmrica ou na ndia, sua mente tem a possibilidade de fazer nascer a

    imagem interior desses locais. Esse poder de conhecer e a faculdade deevocar so a claridade da mente. Graas luz, vocs podem ver os objetosdentro da sala onde se encontram, estar conscientes da presena deles.Graas claridade, a mente tem, do mesmo modo, a faculdade de conhecer.

    O que entendemos por claridade da mente ligeiramente diferente daclaridade no sentido comum. Esta, de fato, permite unicamente o exerccioda funo visual, enquanto que a claridade da mente d a possibilidade nosomente de ver, mas tambm de ouvir, de sentir, de degustar, de tocar eestar consciente dos prazeres ou desprazeres do mental. Portanto, umaclaridade cujo campo de aplicao extremamente vasto.

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    Inteligncia sem obstruo

    A sala onde vocs esto sentados contm vacuidade (o espao da pea) eclaridade (a iluminao). No entanto, no suficiente para atribuir-lhe uma

    mente. Portanto, devemos encontrar um terceiro elemento de descrio.Para que a mente exista, deve-se acrescentar vacuidade e claridade, ainteligncia sem obstruo. esta inteligncia que permite conhecerefetivamente cada coisa sem confuso. No somente a mente temconscincia dos fenmenos - o que a claridade - mas ela os reconhece semconfuso - o que a inteligncia. No espetculo do que ela v, por exemplo,ela sabe o que o cu, o que uma casa, o que um homem, etc.

    Sobre o suporte da vacuidade e da claridade, surge a inteligncia semobstruo. a faculdade que identifica, avalia, compreende. quem diz, porexemplo: "Isto um objeto; ele bonito ou ele feio", identificao que seaplica tambm aos sons, dos quais se percebem a potncia e a qualidade, aosodores agradveis ou repugnantes, aos sabores e suas diferentes nuanas,s experincias mentais agradveis ou desagradveis.

    Assim, a mente conjuntamente vacuidade, claridade e inteligncia.

    Uma tal mente pequena? No, j que possui a faculdade de fazer aparecere de abraar todo o universo. Ento, ela grande? Tambm no podemosafirm-lo, visto que, ao sentirmos uma dor muito localizada, num local docorpo preciso, provocada, digamos por uma picada, assimilamos nossa mentea esse local minsculo, dizendo: "Sinto dor". Cada um identifica-se com seucorpo e a mente o penetra por inteiro: para um elefante, numa grande

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    escala, para um inseto, numa pequena escala. De fato, a prpria mente, forade toda assimilao, no nem pequena, nem grande. Escapa desse gnero deconceitos.

    Essa mente fundamental a mesma para todos os seres. Caso se reconheao seu modo de ser, neste caso ela nada mais do que o Despertar:

    a vacuidade o corpo absoluto (snsc. dharmakaya);a claridade o corpo de glria (snsc. sambhogakaya);a inteligncia, o corpo de manifestao (snsc. nirmanakaya).

    A unidade dos trs componentes - vacuidade, claridade e inteligncia - o

    que se chama de "mente". ainda o que se chama de tathagatagarbha, opotencial do Despertar. Quando os trs componentes no so reconhecidospelo que so, o estado de ser ordinrio.A vacuidade se exprime ento como mental, a claridade como palavra, a

    inteligncia sem obstruo como corpo.Os trs componentes da mente pura se condensam nos trs componentes da

    personalidade temporria. Pela meditao do mahamudra, a naturezaverdadeira da mente reconhecida e os trs componentes se revelam comoos trs corpos do Despertar. Na verdade, um Buda e um ser ordinrio soidnticos. Possuem fundamentalmente a mesma natureza. Um Budhha areconhece, um ser ordinrio no. a nica diferena.

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    Seria muito longo examinar detalhadamente todas as implicaes denatureza da mente, do ciclo das existncias e da liberao. Para resumi-lascitamos Gampopa:

    A mente sem criao artificial, felicidadeA gua sem poluio pura.

    Quando se deixa a mente permanecer tal qual em sua prpria natureza,ocorre a felicidade interior. A gua deixada em repouso sem agitao pura. A mente agitada por muitos pensamentos torna-se agitada; livre deuma superabundncia de pensamentos, guarda sua limpidez prpria. Nossamente, enquanto vacuidade, claridade e inteligncia, perfeitamente boa em

    si mesma, naturalmente livre de sofrimentos. Mas ns no a reconhecemos.Pensamos: "Sou eu", e ns mesmos nos prendemos com a corda do ego,pensando ento: " preciso que eu seja feliz, que eu evite tudo o que desagradvel". Imobilizada nesta atitude, a mente torna-se como quecontrada e cria seu prprio sofrimento.

    Os quatro vus

    Ainda que possuindo tathagatagarbha, ainda que sendo Buda por natureza,por que no experimentamos as qualidades desta natureza, e somos afetadospor todas as limitaes de um ser ordinrio? Isto se deve aos "vus".Quando apareceram esses vus? De fato, eles no tm origem, recobrem amente desde que ela existe, ou seja, desde sempre.

    O vu da ignorncia

    A mente fundamental ainda chamada "o potencial da partida para afelicidade". Pertence a todos os seres. No reconhec-la a ignorncia econstitui o principal vu que recobre a mente. Nossos olhos permitem quevejamos, claramente, os objetos exteriores; entretanto, no podem vernosso rosto nem ver a si mesmos. Da mesma maneira, a mente no se v a si

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    mesma, no se reconhece pelo que . este fato que chamamos o vu daignorncia.

    O vu dos condicionamentos latentes

    A primeira conseqncia da ignorncia a dualidade. Ali onde s hvacuidade, a mente concebe falsamente um eu, centro de toda experincia.Ali onde s h claridade, ela concebe objetos percebidos como outros. Estefenmeno pode ser compreendido mais facilmente se nos referirmos aosonho. No percebendo a verdadeira natureza do mundo onrico, ns ocindimos em dois: um sujeito ao qual ns nos assimilamos, e objetos queconstituem um universo exterior. Dividindo a mente nica em dois, vivemosno universo da dualidade sujeito-objeto. Este o segundo vu, o dos

    condicionamentos latentes.

    O vu das emoes conflituosas

    Da noo de eu procede necessariamente a esperana de obter o que agradvel e que conforte o eu em sua existncia, assim como o medo de noobter o que se deseja e viver situaes ameaadoras. Sobre o plo eu seintroduzem assim a esperana e o medo. O outro plo da dualidade, a noo

    de outro, engloba todos os objetos dos sentidos: formas, sons, odores,sabores, contatos ou objetos mentais.

    Todo objeto percebido como agradvel cria a alegria e todo objetopercebido como desagradvel, o descontentamento, sentimentos que setransformam em apego e em averso. Da dualidade eu-outro emanam

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    portanto, a esperana e o medo, assim como o apego e a averso. De fato,eles no vm de nenhum lugar seno da vacuidade da mente e no tm,portanto, nenhuma existncia material, nem nenhuma entidade prpria. Noos reconhecendo, do mesmo modo que no reconhecemos a verdadeira

    natureza dos fenmenos, conferindo-lhes uma realidade indevida; o quechamamos cegueira ou ainda opacidade mental.Assim, chagamos a um grupo de trs emoes conflituosas de base: apego,averso e cegueira, de onde procedem trs outras:

    do apego, a cobia;da averso, o cime;

    da opacidade mental, o orgulho.Isto resulta em seis emoes conflituosas principais. Todavia, considera-seque as trs emoes conflituosas de base podem se subdividir de muitasmaneiras. Assim, atribui-se ao apego 21 mil ramificaes relacionadas aostipos de objetos aos quais ele se aplica: apego a uma pessoa, a uma casa, aum veculo, etc. Do mesmo modo, desmembramos 21 mil variantes da aversoe da cegueira, assim como 21 mil emoes conflituosas compostas de um

    amlgama das trs precedentes. Obtemos um total tradicional de 84 milemoes conflituosas. Nossa mente habitada, assim, por uma grandequantidade de emoes conflituosas, que constituem um vu suplementar.

    O vu do karma

    Sob o domnio das emoes conflituosas, cometemos todos os tipos de atosnegativos com o corpo, a palavra e a mente, que formam o vu do karma.

    Portanto, temos assim quatro vus que se engendram sucessivamente:

    o vu da ignorncia: a mente no reconhecendo a si mesma;o vu dos condicionamentos latentes: a dualidade, ou seja, a ciso entre o eue o outro;

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    o vu das emoes conflituosas: as 84 mil perturbaes oriundas dadualidade;o vu do karma: os atos negativos cometidos sob o poder das emoesconflituosas.

    Pureza e desabrocharOs vus que recobrem a mente fazem com que sejamos seres ordinrios. OsBudas e os bodhisattvas do passado tambm eram, na origem, seres comuns.Eles seguiram mestres espirituais dos quais receberam instrues sobre anatureza da mente, meditaram e realizaram o mahamudra.

    Tendo se desfeito dos quatro vus, eles se tornaram puros e todas as

    qualidades inerentes mente desabrocharam. Em tibetano, puro se traduzpor sang e desabrochar por gye. A conjuno das duas slabas forma apalavra que significa Buda: Sang-gye, pureza e desabrochar. uma via queest aberta para ns: podemos receber instrues, meditar e obter arealizao do mahamudra, isto , o Despertar. A exemplo de Milarepa, possvel percorrermos o caminho em uma nica vida.

    Sinais da vacuidade

    Aquele que realiza a verdadeira natureza da mente compreende ao mesmotempo que todos os fenmenos, as coisas e os seres, os universos e todosaqueles que os povoam, so apenas uma produo da mente, vazia em suaessncia.

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    Um certo nmero de sinais nos indicam a vacuidade da mente e a ausncia deentidade prpria dos fenmenos, mas, geralmente, no prestamos atenoneles.

    No momento da concepo, quando a mente entra no ventre da me, os paisno podem v-la. Nenhum efeito materialmente perceptvel permite revelarsua vinda. No momento da morte, do mesmo modo, mesmo que o moribundoesteja rodeado de muitas pessoas, ningum v a mente sair do corpo.Ningum poderia dizer: "Ela saiu por aqui", ou ainda: "Ela saiu por ali".Talvez vocs tenham estudado durante muitos anos e armazenado muitosconhecimentos.

    No entanto, eles no esto dentro de um armrio, de uma casa ou do peito.No esto em parte alguma, pois so desprovidos de existncia em simesmos. Eles esto armazenados na vacuidade. noite, adormecidos, sonhamos e vemos um mundo inteiro, com paisagens,cidades, homens, animais, e todos os objetos dos sentidos, aos quaisadicionamos um movimento emocional feito de desejo, de averso, etc.Durante o prprio sonho, somos persuadidos da existncia real de todos os

    fenmenos onricos. Entretanto, uma vez acordados, eles desaparecem.

    No existem em parte alguma fora da mente daquele que sonha. o mesmoprocesso que se desenvolve durante o bardo do vir-a-ser. Formas, sons,odores, sabores, etc so percebidos como reais. As aparncias manifestadasdurante a vida que se completou no tm mais existncia. Depois, quando a

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    mente entra de novo em uma matriz, so ento as aparncias do bardo quese desfazem e no existem mais em parte alguma.

    Trs suportes de existncia

    A viglia, o sonho e o bardo de fato no tm realidade em si: so apenasmanifestaes da mente aos quais conferimos, erroneamente, uma entidadeprpria. Esses trs estados so descritos como trs corpos:O "corpo de maturidade krmica" designa o corpo e o ambiente percebidosdurante o estado de viglia, que so o resultado, depois de um longo processode amadurecimento, de karmas acumulados em vidas passadas.

    O "corpo dos condicionamentos latentes" se refere ao corpo e ao ambientedo sonho.O "corpo mental", enfim, designa o corpo e a experincia do bardo, regidosunicamente pelo pensamento.Pela sucesso contnua desses trs corpos se desenvolve nossa experincia

    no ciclo das existncias, falsamente tomada como real.

    Conscincia primordial, conscincia individualizada

    O fundamento da mente bom em si mesmo. a natureza do Despertar,semelhante gua pura. O Buda disse:

    Todos os seres so Buda,

    Mas a mente deles obscurecida por impurezas adventcias;

    Dissipadas as impurezas, eles so verdadeiramente Buda.

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    A ignorncia o no reconhecimento da natureza Desperta da mente. Delaprocedem todas as emoes conflituosas (desejo, clera, cime, etc) , assimcomo o fluxo dos pensamentos em modo dual. A natureza de Buda da mente ainda chamada potencial de conscincia primordial.

    Entretanto, por causa da ignorncia e da apreenso dual, seu funcionamentoperturbado torna-se um potencial de conscincia individualizado. Quandouma gua pura misturada com lama, ela perde sua qualidade de pureza etorna-se suja. Do mesmo modo, por causa das impurezas, a conscinciaprimordial torna-se conscincia individualizada.

    Conscincias diferenciadas

    Essa conscincia individualizada , enquanto modo de funcionamento, umaunidade designada pelo termo "potencial de conscincia individualizada".Dessa unidade, procedem, entretanto, sete conscincias individualizadasdiferenciadas, assim como os dedos so diferenciaes de uma nica mo.Elas so:

    a conscincia visual, que percebe as formas;a conscincia auditiva, que percebe os sons;a conscincia olfativa, que percebe os odores;a conscincia gustativa, que percebe os sabores;a conscincia ttil, que percebe os contatos;a conscincia mental, que identifica os fenmenos pelo pensamento;

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    a conscincia perturbada, que interpreta a percepo em termos de desejo,averso, cime, etc.

    Os rgos oriundos das conscincias

    Da faculdade de manifestao da mente surge o corpo. Os dois esto,portanto, estreitamente ligados. A existncia das oito conscincias na menteorigina a existncia no corpo dos suportes fsicos correspondentes que soos rgos dos sentidos. Os rgos so semelhantes s casas, inertes em si, eas conscincias aos homens que as habitam. Temos ento:

    os olhos como suporte da conscincia visual;

    os ouvidos como suporte da conscincia auditiva;o nariz como suporte da conscincia olfativa;a lngua e o paladar como suportes da conscincia gustativa;a epiderme como suporte da conscincia ttil;

    o rgo mental como suporte da conscincia mental, ainda que aqui o rgo ea conscincia se confundam na prtica.

    Quanto ao potencial de conscincia individualizada e conscincia

    perturbada, elas no possuem rgo correspondente que lhes seja prprio.Pode-se dizer que o primeiro tem como suporte o corpo em geral e asegunda, o conjunto dos rgos dos sentidos.

    Os objetos dos sentidos

    Enfim, as conscincias encontram seu reflexo, do ponto de vista exterior,nos objetos dos sentidos:

    as formas so o objeto da conscincia visual;os sons, o objeto da conscincia auditiva;os odores, o objeto da conscincia olfativa;os sabores, o objeto da conscincia gustativa;os contatos, o objeto da conscincia ttil;

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    os fenmenos mentais (os pensamentos), o objeto da conscincia mental.

    Os fenmenos exteriores podem tambm ser vistos como objetos dopotencial de conscincia individualizada, e os fenmenos, enquanto objetos

    das emoes conflituosas, como reflexos exteriores da conscinciaperturbada.Quando a mente obscurecida pela ignorncia, seu modo de funcionamento ede reao com o mundo regido, assim, por um processo em trs nveis:

    interiormente: as conscincias individualizadas;no nvel intermedirio: os rgos dos sentidos;

    exteriormente: os objetos dos sentidos.Bokar Rinpoche, principal discpulo e sucessor de Kalu Rinpoche, escreveuessa curta biografia de Kalu Rinpoche logo aps sua morte.

    A F Reavivada: Breve Exposio dos Atos do Lama Sublime

    Om soti

    Desde inumerveis kalpas nutristes teu serdo esplendor das duas acumulaes,Dominastes a criao, a perfeio e a bodhichitta,Usufrustes magnificamente dos dois benefcios,o teu e o dos outros,Rangjung Kunkhyab, prosterno-me a teus ps.

    Essas palavras enunciadas como uma oferenda servem de liminar a estetexto dedicado a um Lama glorioso e santo, um guia sublime cuja bondadeperfeita e a atividade maravilhosa aplicam-se a todas as tradies e aosseres nesta poca degenerada. Quando devemos nome-lo, ele chamado deo Senhor dos Refgios, Lama Vajradhara Kalu Rinpoche. A breve exposio

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    da atividade desse lama sublime servir de lembrana queles que tmdevoo por ele, assim como de alimento para a f.

    Numerosos grandes seres de viso profunda afirmaram que ele era a

    expresso da atividade de Jamgn Lama Lodr Thaye, profetizado peloBuda, que foi o diadema coroando todos os eruditos-realizados do Pas dasNeves, ao mesmo tempo que uma luz para todas as tradies.O Senhor dos Refgios, Lama Vajradhara Kalu Rinpoche, nasceu em 1904 naaldeia de montanhas de Trech, no Khan, no Tibet oriental. Seu pai eraLekshe Drayang, um adepto tntrico, dcima terceira encarnao dalinhagem dos tulkus de Ratak Palzang e sua me era conhecida pelo nome de

    Drlkar (Tara Branca). Inmeros sinais e pressgios extraordinriosacompanharam seu nascimento.Desde a infncia, mostrou naturalmente as marcas de um ser santo e deaprendizagem anterior: o desinteresse pelo ciclo das existncias, acompaixo pelos seres, o respeito pelo dharma e pelos lamas. Ele apreendeua escrita, a leitura e o sentido do dharma sem esforo, simplesmenterecebendo seu ensinamento.

    Aos treze anos, no mosteiro de Palpung, sede Kagypa do Tibet oriental, foiordenado monge por Jamgn Tai Situ Pema Wangchok e recebeu o nome deKarma Rangjung Kunkhyab, "Espontneo-Universal". Mais tarde reconheceu-se com unanimidade que o nome e o sentido combinavam.Aos dezesseis anos, fez retiro de trs anos e trs meses no grande centrode retiro de Tsadra Rinchendra, que tinha sido a sede de Jamgn Lodr

    Thaye. Do mestre de retiro, Lama Norbu Tndrup, cujas experincias erealizaes eram completas, recebeu ento as iniciaes novas e antigas,mais particularmente as instrues e as prticas dos Cinco Ensinamentos deOuro do grande realizado Khyungpo Neljor, do mesmo modo que se esvazia ocontedo de um recipiente. Durante os estgios de impregnao e derealizao dessas prticas, manifestou uma confiana, uma diligncia,

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    experincias e realizaes completamente no habituais.Antes e depois desse retiro, recebeu, estudou, meditou e praticouinumerveis ciclos de iniciaes que fazem amadurecer, e instrues que

    liberam, no contexto dos sutras e dos tantras da antiga e da nova escola, denumerosos grandes seres de todas as tradies, como o grande eruditoTashi Chpel, um discpulo de Jamgn Lodr Thaye, Situ Pema Wangchok,Khyentse Shenpen Ser, Plane Khyentse ser, Pao Tsuklak Mawai Wangchuk,Tsatsa Drubgyu, Dzokchen Rinpoche, Sechen Gyeltsap, Sechen Kongtrul eKhyentse Chkyi Lodr.

    Desejando renunciar a todos os confortos e todos os bens desta vida,

    satisfeito com o que possua, dedicou-se a nutrir a fora de sua aspiraopara praticar unicamente em ermitrios nas montanhas. Aos vinte e cincoanos tambm renunciou, exteriormente e interiormente, a todas as coisasmateriais, companheiros, servidores, relaes familiares, conforto, etc.Permaneceu, ento, em retiro em diversos lugares solitrios, como Lhapu,perto de Derge, e durante doze anos viveu do estritamente necessrio,entregando-se somente prtica com uma indefectvel perseverana.

    Depois, atendendo o pedido de Situ Pema Wangchok, voltou a Palpung ondeocupou durante muitos anos a funo de lama mestre de retiro nos doiscentros de retiro, Naroling e Niguling. Graas a isso, numerosos discpulosergueram a bandeira da prtica, sendo que um grande nmero vive ainda noKhan, assim como no Tibet central e na regio de Tsang.Aos quarenta anos, Rinpoche realizou uma peregrinao e fez oferendas emvrios lugares sagrados do Tibet central e do Tsang, visitando os santurios

    das duas principais esttuas de Lhassa, Jowo e Shakyamuni, assim como osgrandes mosteiros das diferentes escolas.Nessa ocasio, transmitiu os Cinco Ensinamentos de Ouro, da gloriosalinhagem Shangpa, conferindo as iniciaes que fazem amadurecer, asinstrues que liberam e as transmisses escriturais que servem de suporte,

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    a numerosos seres, como Kardorje, de Sera, Lhatsun Rinpoche, TokmeRinpoche e Mokchok-Je, de Drepung. Compartilhou, assim, com cada umdeles, os ensinamentos da linhagem Shangpa.

    Alm disso, revivificou os ensinamentos das tradies Jonangpa e Shangpaem diferentes lugares: principalmente no mosteiro de Taranata, TaktenPuntsokling, sede da escola Jonangpa, linhagem notvel por seu esplendor esua riqueza tanto cultural quanto espiritual, na sede-vajra de Shangshung (omosteiro de Khyungpo Neljor), assim como em Lhapu e Nyetang, mosteirosde Mochokpa. Sua atividade em favor da doutrina e dos seres foi imensa.Rinpoche foi em seguida para o Tibet oriental e permaneceu em Palpung e

    Hortok. Recebeu ensinamentos, estudou, meditou e praticou-os. Depois,difundiu-os, dando iniciaes, transmisses escriturais e explicaes. Assim,agiu amplamente em favor da doutrina e realizou o bem dos seres, tornandosignificativa toda conexo estabelecida com ele.Em 1955, em razo das perturbaes que atingiram o Tibet oriental, voltoupara o Tibet central. A princesa do Buto, Ashe Wangmo, por causa de suasaspiraes anteriores e de excelente disposio natural de sua mente,

    sentiu uma grande devoo por Rinpoche quando ouviu falar dele. Elasuplicou, ento, ao muito sublime e glorioso dcimo sexto Karmapa, que odesignasse abade do mosteiro de Jangtchup Chling, na provncia butanesade Kurt, e capelo da famlia real. Sua Santidade Karmapa concordou queera necessrio que Rinpoche fosse ao Buto, o que aconteceu em 1957.Durante muitos anos, manteve, protegeu e desenvolveu ali a doutrina.Estabeleceu, alm disso, novos centros de retiro das tradies KarmaKamtsang e Shangpa e fez construir stupas. Conduziu inumerveis pessoas

    dessa regio ao caminho da libertao e da oniscincia.Em 1966, Rinpoche estabeleceu-se em Sonada, no mosteiro de SamdrupDargyeling, onde criou logo de incio o centro de retiro.Em 1973, a pedido de Sua Santidade, o dcimo sexto Karmapa, ministrou em

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    Rumtek, sede da linhagem Kagypa, diferentes ciclos de instrues squatro eminncias que so luz dos ensinamentos Kagypa: Shanar Rinpoche,Situ Rinpoche, Jamgn Rinpoche e Gyeltsap Rinpoche. Transmitiu-lhes osseis dharmas de Naropa, que constituem o caminho dos meios hbeis na

    linhagem da prtica Karma Kamtsang, caminho da liberao. Ministrou-lhes,tambm, os Cinco Ensinamentos de Ouro da linhagem Shamgpa, as trezeiniciaes do Protetor e aquela de Dorje Purpa na tradio dos termas novos.De 1971 a 1989, Rinpoche foi vrias vezes para numerosos pases: EstadosUnidos, Canad, diferentes pases da Europa e do sudeste asitico.Inicialmente, conferia aos discpulos os votos de refgio nas Trs Jias.Insistindo sobre a lei do karma, a conduta que deve ser rejeitada ou

    adotada, ensinava o grande e o pequeno veculo. No contexto do vajrayana,em particular, dava as iniciaes que fazem amadurecer e as instrues queliberam. Conferia, mais especialmente, em vrias ocasies, a grande iniciaode Kalachakra. Entretanto, guiava principalmente seus discpulos, ensinando-lhes a meditao de Avalokita (Chenrezi), o Grande Compassivo.Em diferentes pases, Rinpoche fundou mais de setenta centros do dharma

    assim como vinte centros de retiro; construiu nesses locais vinte stupas.

    Confiou a responsabilidade desses centros e a tarefa de efetuar oensinamento do dharma a mais de trinta lamas, seus discpulos, que tinhamrealizado o retiro de trs anos. No mundo inteiro, sua bondade e suaatividade espiritual suscitaram imensos resultados para a doutrina e para osseres.Em 1983, Rinpoche deu uma prova suplementar de sua solicitude pelos seres,transmitindo as iniciaes e as explicaes do Tesouro dos Preciosos Termas

    aos quatro regentes do Karmapa, que so como as jias da coroa dosensinamentos Kagypas, assim como a numerosos lamas, tulkus e monges, emilhares de discpulos dotados de f, vindos da ndia, do Tibet, do Sikkim,do Buto, do Oriente e do Ocidente.Em 1986, em sua grande compaixo, decidiu tornar mais acessvel ao

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    conjunto do mundo a compreenso e a prtica do santo dharma nos trsveculos do buddhismo. Com esse objetivo, fundou um grupo de traduochamado "Comit Internacional para a Traduo da Enciclopdia dosConhecimentos, tratado que resume a essncia dos sutras, dos tantras e da

    cultura budista". Com o auxlio de eruditos tibetanos das diferentes escolas,tradutores ocidentais empenham-se atualmente nesse trabalho.Em 1988, Rinpoche projetou a construo de um stupa de uns trinta metrosde altura em Salugara, perto da cidade de Siliguri, no estado de BengalaOcidental, na beira de uma estrada muito importante. Esse stupa conteria ascinco espcies de prolas-relquias e seria um suporte de liberao pelaviso.

    Em fevereiro de 1989, Rinpoche foi a Sherab Ling, a sede de Sua EminnciaSitu Rinpoche. Em companhia deste ltimo e de outras eminncias, tomouparte no ritual de Mahakala, assistiu s danas sagradas e participou dasfestividades do Ano Novo Tibetano.Em seguida, Rinpoche foi a Dharamsala, sede do Dalai-Lama, onde encontrouSua Santidade, que manifestou seu interesse por sua atividade em favor dos

    seres e da doutrina e assegurou-lhe seu apoio.Em 15 de maro, Rinpoche voltou ao seu mosteiro de Sonada. Demonstrou,progressivamente, uma certa alterao de seu estado de sade. Seusecretrio particular e sobrinho, Gyaltsen sentiu-se ento incapaz deassumir a responsabilidade da situao. Exps a Rinpoche as grandesvantagens que teria se fosse transferido para Delhi, para a Frana ou paraqualquer outro pas do Oriente ou do Ocidente, onde receberia melhores

    cuidados.Todavia, Rinpoche no se mostrou favorvel a esta sugesto, dizendo que

    no haveria nenhuma utilidade em ir onde quer que fosse, que o melhor seriaficar ali onde estava. Seu estado de sade continuava a alterar-se eseguindo conselho mdico, foi a uma clnica, onde recebeu cuidados durante

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    trs semanas. Sua sade demonstrou, ento, sinais de melhora.

    Em 5 de maio, Rinpoche retornou a seu mosteiro de Sonada. Entretanto, nosdias que se seguiram, seu estado agravou-se de novo. Em 10 de maio de

    1989, s trs horas da tarde, aos oitenta e cinco anos, a fim de dar umexemplo queles que, como eu, tornaram-se mais medocres apesar de suaconexo com o dharma e continuam apegados permanncia, assim como porconsiderao aos seres que vivem em outras esferas de existncia, eleentrou na pura clara luz, a infinitude absoluta.

    Ns, seus discpulos e as pessoas que lhe eram prximas mergulhamos nastrevas do sofrimento, deixados sem refgio e sem protetor. Nesse momento

    de total confuso, suas eminncias Jamgn Kongtrul Rinpoche, ShamarRinpoche, Chatral Rinpoche, Situ Rinpoche e Gyeltsap Rinpoche vieramsucessivamente prestar homenagem ao kudung, o corpo sagrado de Rinpoche.Eles recitaram com fervor oraes de aspiraes para que se realizassemplenamente o que a mente de Rinpoche tinha concebido, inteiramente voltadapara o bem dos seres e da doutrina.

    Aliviaram nossa tristeza, assegurando-nos que no tardaria a vir uma nova

    emanao sublime, protetor dos ensinamentos e guia para mim mesmo, osdiscpulos e os seres. Nessa inteno, compuseram oraes de prontoretorno. Por outro lado, presidiam os rituais que foram realizados,manifestando assim sua bondade conosco.

    Resumindo, nosso nobre lama, desde a mais tenra idade, manifestou seudesinteresse pelo ciclo das existncias e, desviando-se dele, atravessou olimiar dos preciosos ensinamentos do Buda. Tornou-se um grande mestre-

    vajra dos trs tipos de votos, os da liberao individual, de bodhisattva e doVajrayana.

    Pela escuta, a reflexo e a meditao, assegurou seu prpriodesenvolvimento espiritual; pela explicao, o debate e a composio, fez obem para os outros; pela habilidade, nobreza e excelncia, fez seu prprio

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    bem e o do outro. Por essas nove qualidades prprias aos seres autnticos,exps, propagou, manteve e protegeu sem parcialidade a doutrina doVencedor, mais particularmente os preciosos ensinamentos das linhagensKarma Kagy e Shangpa Kagy.

    Por sua bodhichitta e sua bondade extraordinria, reviveu os ensinamentosestabelecendo comunidades para os monges, fundamento da doutrina doBuda, e criando centros do dharma, no Tibet central e no grande Tibet, nandia, na China, no Buto e no Sikkim, assim como em todas as partes domundo. Mostrou-se, assim, inigualvel em dar uma vida nova s instruessagradas.

    Dentre seus discpulos, que so os detentores de linhagens, encontram-senumerosos e excelentes amigos espirituais, como os regentes de SuaSantidade Karmapa na tradio Kagypa, e os lamas e tulkus de todas astradies. No mundo inteiro, teve inumerveis discpulos de boa fortuna,homens e mulheres. Alm disso, incontveis seres estabeleceram com eleuma conexo significativa. Todos foram colocados no caminho excelente daliberao e da oniscincia.

    Este breve resumo dos acontecimentos da vida de Rinpoche foi escrito porum discpulo de capacidade inferior que, durante muitos anos gozou daproteo amorosa desse lama, o grande Vajradhara em pessoa. Eu, que souchamado de Bokar Tulku, ou Karma Ngedn Chkyi Lodr, escrevi esse textoem 3 de junho de 1989, diante do precioso kudung. Por este ato, possa eu etodos os seres atingir o estado precioso desse nobre lama.Sarva Mangalam.

    Os Caminhos da Realizao

    Os estgios do caminho espiritual so delineados nos cinco caminhos darealizao. A prtica do Dharma comea com a tomada de refgio nas TrsJias e com a prtica de acordo com um entendimento da causalidade

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    krmica - evitar aes prejudiciais e realizar aes positivas. Baseadosnelas, cultivamos a compaixo, a meditao, a devoo, a yoga da divindade eassim por diante. Direcionando nossas energias para a prtica das seisperfeies, gradualmente aprofundamos estas prticas a um grau inferior,

    mdio ou superior, e juntamos uma acumulao de mrito que nos estabeleceem um ou outro destes trs nveis do [1] Caminho da Acumulao.Depois, conforme as qualidades positivas aumentam, a sabedoria perfeitadesenvolve-se. Neste ponto entramos no [2] Caminho da Preparao, cujonome reflete que um estado intermedirio que conta com uma experinciadireta da natureza essencial da mente. O Caminho da Preparao em si temtrs graus - inferior, mdio e superior -, correspondentes ao grau de

    acumulao de sabedoria que juntamos.Quando realmente percebemos a vacuidade - a natureza da mente - deforma direta, estamos no limiar do [3] Caminho do Insight. A naturezaverdadeira da mente autenticamente reconhecida como um velho amigo.Neste ponto, atingimos o primeiro estgio do bodhisattva, chamado AlegriaSublime. A primeira realizao verdadeira da natureza da mente o queconduz ao primeiro estgio do bodhisattva; isto ocorre junto com o

    desenvolvimento de qualidades extraordinrias, tais como a habilidade deproduzir cem emanaes de uma vez.

    O bodhisattva de primeiro nvel tambm possui doze grupos de qualidadesmultiplicados por cem. O Caminho do Insight tambm inclui trs nveis -inferior, mdio e superior. Quando a natureza vazia, clara e infinita damente total e definitivamente reconhecida de maneira direta, sem maisqualquer dvida, isto o nvel superior do Caminho do Insight.

    Em seguida vem o [4] Caminho da Meditao. Completando as duasacumulaes de mrito e sabedoria, a mente torna-se acostumada a umaexperincia estabilizadora da vacuidade. O bodhisattva avana gradualmentepelos bhumis ou nveis do bodhisattva: primeiro pelos sete nveisrelativamente "impuros" e ento pelos trs nveis "puros". Esta progresso

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    at o dcimo estgio, chamado Nuvem do Dharma, o Caminho daMeditao.Finalmente, o [5] Caminho do No Mais Aprender atingido quando o

    antdoto definitivo, que o estado da absoro adamantina, supera os muitosutis obscurecimentos restantes, que formam o sutilssimo vu queobscurece a conscincia. Isto a iluminao: a "purificao" (tib. sang) detudo a ser abandonado e o "desabrochar completo" (tib. gye) na sabedoriaprimordial, cujo resultado o estado bddhico (tib. sangye).

    Estes estgios so basicamente os mesmos, no importa se a abordagem Hinayana, Mahayana ou Vajrayana. Os trs yanas variam em seus mtodos,

    mas no em seus objetivos. Eles so diferentes veculos que servem a umcaminho, que atravessam os mesmos estgios e chegam ao mesmo lugar.

    Chamando o Lama Que Est Longe

    Namo Gurubhyah

    Por causa das profundas conexes de minhas aspiraes,

    Sua orientao perturba at as profundezasDo oceano de sofrimento do samsaraE me direciona ao caminho da liberao e do xtase permanente.Voc, cuja bondade nunca poderia ser restituda -Lama, oua-me por favor!

    Interrompendo os apegos e iluses infinitos do samsara,Atravs da disciplina dos trs votos,

    Voc me fez deixar os caminhos do samsaraE juntou minha mente ao Dharma com suas instruesQue amadurecem e liberam,Rei sublime dos guias -Lama, oua-me por favor!

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    A chama de sua sabedoria transcendenteConsome a moita de minha confusoE me mostra diretamente o rosto do dharmakaya autoconhecedor;Voc, que nesta mesma vida, me eleva ao reino da unio no-dual,

    Mestre onipresente de todas as famlias bddhicas -Lama, oua-me por favor!Senhor Lama, mestre do oceano de mandalas,Senhor Lama, que concebe todos os atingimentos,Senhor Lama, fonte de tudo o que til e desejado,Rogo das profundezas de meu corao -Abenoe a mim e a todos os seres-sencientes-me dos seis reinos

    Para que sejamos liberados, assim que possvel,Do lodo de sofrimento do samsara,E ento nos abenoe para que,Na cessao e realizao da mirade de adeptosDa linhagem da transmisso oral,Nossas mentes possam se misturar indissoluvelmente com a sua.

    Esta prece, chamando de longe o amado Lama que nos guia no caminho para a

    liberao, foi composta extemporaneamente por Karma Rangjung Knkhyab,no monastrio de Changchub Chling ou Dar Ling, no Buto, atendendo aosrepetidos pedidos de treze devotos praticantes.

    Kalu Rinpoche. Luminous mind: the way of the Buda. Compilado por DenisTndrup,traduzido por Maria Montenegro, prefcio de S.S. o Dalai Lama. Boston:

    Wisdom, 1997. Pg. 12.

    A Prtica do Chd

    As origens da prtica

    Por que praticar o Dharma? Acreditamos firmemente na realidade de um

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    ego, pensamos que existe verdadeiramente um "eu" muito limitado ao qualnos assimilamos. Disto decorrem inmeros sofrimentos, pois esse sentimentodo ego, que nos leva a desejar o que pode satisfaz-lo e a rejeitar o que odesagrada, submete-nos a mltiplas emoes conflituosas. O Dharma

    conduz-nos ao conhecimento que realiza a ausncia do eu e transforma asemoes em conscincia primordial.

    Inteligncia e realizao

    Para atingir esses objetivos, o Dharma prope diferentes abordagens: a dopequeno veculo, a do grande veculo e a do Vajrayana. Este compreendequatro classes de tantras: o Kriya-tantra, o Charya-tantra, o Yoga-tantra e

    o Anuttarayoga-tantra. No total, considera-se que o Dharma do Budacompreende 84 mil tipos de ensinamentos. Quando uma pessoa inteligenteaborda esses ensinamentos, seja o dos auditores no pequeno veculo, ou odos bodhisattvas no grande veculo, compreende facilmente que todos tmfundamentalmente a mesma funo e que todos prope abordagensespirituais profundas.

    A compreenso intelectual, entretanto, no tudo. Aquele que ensina o

    Dharma baseando-se somente em seus estudos, sem ter atingido um certonvel de realizao, ensina em funo unicamente de sua compreenso;privado do poder de clarividncia, da viso direta da natureza dosfenmenos, pode cometer certos erros. Mas, aquele que alcanou arealizao de um bodhisattva ou mesmo de um arhat possui uma viso diretaque lhe permite ensinar sem erro.

    Quanto quele que realizou o estado de Buda, tendo percorrido a totalidade

    das terras e dos caminhos, ele chegou ao estado ltimo: sabe perfeitamenteo que so os seres ordinrios, o que um Buda, o que o Despertar, assimcomo os meios para alcan-los. Nada escapa do campo de seu conhecimentoe de sua viso, e por isso chamado de "onisciente".

    No Tibet, a difuso do Dharma efetuou-se por dois canais, englobando as

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    duas maneiras de ensinar que acabamos de mencionar. Por um lado,encontramos um tipo de transmisso enfatizando mais a teoria, veiculadopor dez linhagens chamadas os "Dez Pilares do Conhecimento". Por outrolado, oito escolas enfatizaram a prtica dos ensinamentos, sendo chamada os

    "Oito Grandes Carros de Prtica". a uma dessas oito escolas que pertencea tradio de Chd de que falaremos.

    Cortar o ego pela raiz

    Chd significa "cortar".Todos nossos sofrimentos procedem dos efeitos dos trs venenos, o

    desejo-apego, a raiva-averso e a cegueira. Esses trs venenos so elesprprios o produto da assimilao de um eu. Chd, "cortar", refere-se aofato de cortar completamente, pela raiz, essa assimilao, de modo que osproblemas que resultam dela sejam automaticamente suprimidos. Tomemos oexemplo de uma rvore venenosa.

    Para livrarem-se dela, vocs podem tentar arrancar suas folhas e seusfrutos ou cortar seus ramos; mas ainda existem grandes chances de ver

    ramos, folhas e frutos surgirem de novo no ano seguinte. Se, por outro lado,vocs retirarem suas razes, podero estar seguros de que ela no brotarde novo. Chd repousa sobre esse mesmo princpio: cortar a raiz de todos osproblemas.

    Uma prtica inspirada no Prajnaparamita

    Chd est associado ao segundo ciclo de ensinamentos do Buda, referente ausncia de caractersticas. Neste ciclo, o Buda desenvolveu amplamente anoo de vacuidade exterior, a vacuidade interior, a vacuidade ao mesmotempo exterior e interior, a vacuidade da vacuidade, a vacuidade superior, avacuidade inferior, etc. Esses ensinamentos foram inscritos nos Sutras do

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    Prajnaparamita, cuja extenso das verses variam:

    o Prajnaparamita em Cem Mil Versos, compreendendo doze volumes nocnone tibetano;

    o Prajnaparamita em Vinte Mil Versos, quatro volumes;o Prajnaparamita em Oito Mil Versos, um volume.

    Com o objetivo de torna-los mais acessveis, esses ensinamentos foramretomados em seguida por grandes mestres da ndia, como Nagarjuna, queos codificou sob a forma do madhyamika, ou ainda Asanga, redator dos CincoTratados de Maitreya.

    Machig Labdrn, iniciadora da prtica de Chd, era ela mesmaextremamente versada nos textos do Prajnaparamita a ponto de elesconstiturem um fator essencial de seu desenvolvimento espiritual; por essarazo era chamada "Machig Drnma, a realizadora da palavra do Buda".O yogi indiano P'hadampa Sangye era, por sua vez, o depositrio de um ciclo

    de instrues sobre a vacuidade. Como existia um lao muito estreito demestre para discpulo entre P'hadampa Sangye e Machig Labdrn, o ciclo de

    ensinamentos do primeiro, shije, e o da segunda, Chd, transformaram-se emum nico. Nesse contexto, a meditao que prope Chd repousa sobre osdois princpios fundamentais do Mahayana.

    A vacuidade, ou seja, a realizao da ausncia de eu, onde acreditamos queexista um;

    A compaixo por todos os seres que sofrem por causa da ausncia dessa

    realizao.

    P'hadampa Sangye

    Vindo da ndia, chegou um dia no Tibet superior um "detentor doconhecimento" (snsc. vidyadhara) chamado P'hadampa Sangye (snsc.

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    Kamalashila). Ele era mais precisamente "vidyadhara de longa vida", isto ,possua o controle sobre a durao da vida. Dizia-se que tinha duzentos anosquando chegou ao Tibet.

    P'hadampa Sangye propunha um ensinamento chamado shije, "pacificar",cuja funo particular era dissipar os obstculos exteriores - ossofrimentos fsicos e as doenas -, assim como as perturbaes interiores -os pensamentos e as emoes conflituosas. Por isso esse sistema eraconhecido sob o nome "shije que pacifica todos os sofrimentos".P'hadampa Sangye visitou o Tibet na poca em que ali vivia Milarepa. Ambos

    atingiram a plena realizao e gozavam de uma grande reputao. Alm

    disso, em alguma parte na fronteira entre a ndia e o Tibet, tambm moravaum grande realizado, Dharmabodhi. Assim, na mesma poca e na mesmaregio encontravam-se trs seres excepcionais: Milarepa, P'hadampa Sangyee Dharmabodhi.

    Milarepa e Dharmabodhi

    Milarepa era discpulo de Marpa. Recebera dele todas as instrues e todas

    as iniciaes necessrias, de maneira que no se preocupava em buscar osensinamentos de um outro lama, por maior que fosse. Ele era discpulo de umnico mestre. Entretanto, seus prprios discpulos, particularmenteRechungpa, disseram-lhe um dia:- Dharmabodhi est residindo neste mesmo momento perto daqui. Por quevoc no vai v-lo?

    - No tenho nada para lhe perguntar, respondeu Milarepa. Acho que eletambm no tem nada para me perguntar. De que serviria visit-lo?

    - realizao do senhor com certeza muito grande - replicaram osdiscpulos - , entretanto, o senhor no estaria manifestando um pouco deorgulho ?

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    - No - respondeu Milarepa - , no sinto orgulho. Simplesmente no vejoutilidade para um tal deslocamento. Entretanto, se isso os preocupa tanto,irei de bom grado encontrar Dharmabodhi. Voc - dirigindo-se a Rechungpa -

    parte na frente com alguns discpulos; eu os encontrarei no caminho.Rechungpa e outros yogis colocaram-se, ento, a caminho e chegaram pertodo local onde Dharmabodhi morava sem terem encontrado Milarepa. Ento,viram aparecer no cu um stupa de cristal que pousou suavemente diantedeles: era Milarepa. Todos foram ao encontro de Dharmabodhi , que fez comque Milarepa se sentasse em uma poltrona semelhante a sua e os doismestres ministraram-se simultaneamente ensinamentos.

    Quando terminaram, Dharmabodhi prosternou-se diante do ilustre visitante,o que aumentou ainda mais a f de todos por Milarepa.

    P'hadampa Sangue d um chute em Milarepa

    Uma outra vez, Milarepa aceitou encontrar P'hadampa Sangye. Quando esteaproximava-se do local de encontro, Milarepa, advertido por suas faculdades

    supranormais, disse a si mesmo: "Vamos ver se o clebre P'hadampa Sangyepossui realmente todos os poderes que lhe atribuem".

    E transformou-se em uma pequena moita na beira do caminho. P'hadampaSangye chegou, passou perto da moita como se no visse nada e continuoucaminhando. "Ele no tem nenhum poder", disse Milarepa, "ele no mereconheceu!". Exatamente nesse momento, P'hadampa Sangye virou-se, deuum chute na moita e disse:

    - Seria melhor que voc no ficasse aqui, Milarepa. De qualquer modo, voc

    no viver mais muito tempo; eu ofereci sua fora de vida aos dakas e sdakinis. Eles agora a absorveram completamente, e por isso que vocmorrer hoje mesmo.

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    verdade, reconheceu Milarepa, retomando sua aparncia normal, achoque voc tem razo, eu morrerei hoje, pois me sinto muito doente.

    No diga! E o que voc est sentindo?

    - Bem, nas costas estou afligido pelo maha-ati; na frente, tenho o peitoafetado pelo mahamudra; por dentro, sinto que fui corrodo peloMadhyamika. Com certeza, logo irei morrer de tudo isso. Eis como serminha morte: o ego vai morrer na sabedoria do no-ego, as emoes vomorrer na conscincia primordial e os pensamentos vo morrer na vacuidade.Depois, Milarepa acrescentou:

    - Creio que voc verdadeiramente um grande realizado. Voc vem da ndiae mora nesse momento no meu pas: deixe-me honr-lo com uma refeio.- Ficarei muito feliz em ser seu convidado - respondeu P'hadampa Sangye.

    O yogi da ndia multiplicou-se ento por sete e os sete P'hadampa Sangyeocuparam cada um o alto de uma folha de grama.

    Milarepa, por sua vez, preparou a refeio: desfez a calota de seu prpriocrnio, colocou-a em sua mo e depositou ali seu crebro, que transformou-se num nctar maravilhoso. Em seguida, de seu umbigo fez aparecer o fogodo tummo para aquecer o precioso alimento.

    Depois, fez aparecer, por sua vez, sete Milarepa que se instalaramigualmente sobre as pontas de sete folhas de grama. Os sete P'hadampaSangye e os sete Milarepa compartilharam a refeio, improvisando

    alternadamente cantos sagrados.Depois disso, eles se separaram, muito felizes por terem se encontrado.

    No total, P'hadampa Sangye ficou cem ou duzentos anos no Tibet. Depois foipara a China onde considera-se que viva at hoje, sobre uma montanha

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    chamada Riwo Tse-nga, o "Monte dos Cinco Picos". Aqueles que renemmrito suficiente e possuem conexes krmicas privilegiadas podem, aindaem nossos dias, encontr-los

    P'hadampa Sangye e o mestre chinsDurante o perodo que viveu na ndia, P'hadampa Sangye teve um outroencontro clebre, com um mestre vindo da China, de nome Mahayana, queensinava exatamente a vacuidade. "Tudo vacuidade", dizia; "intil,portanto, abandonar os atos negativos ou realizar atos positivos: bastapermanecer na vacuidade".

    Inmeros tibetanos ficaram seduzidos por uma via aparentemente to fcilde ser seguida, de modo que o buddhismo importado da ndia estavaameaado por essa nova tendncia vinda da China. Aqueles que permaneciamligados ao buddhismo puro ficaram apreensivos. Sabendo da presena daP'hadampa Sangye no Tibet, pediram-lhe para vir combater as falsas visesdo mestre chins. "Se este mestre algum inteligente", respondeuP'hadampa Sangye, "um debate poder mostrar-se til; em se tratando deum tolo, nosso confronto ser estril".

    As pessoas disseram que no sabiam quem era exatamente o mestre chins,mas que lhes parecia que apenas ele, P'hadampa, por ser ao mesmo tempo umgrande erudito e um mestre realizado, poderia resolver as dificuldades nasquais se encontrava o buddhismo no Tibet. P'hadampa Sangye aceitou, ento,ir ao encontro de Mahayana.

    Quando este se aproximou dele para receb-lo, P'hadampa Sangye, erguendo

    seu basto, descreveu no ar trs crculos acima de sua cabea, depois trscrculos direita e trs esquerda, seguidos de um certo nmero demovimentos. Por meio de sinais, sem usar a palavra, ele perguntava:

    "O que a vacuidade? O que a verdade relativa? O que a verdadeltima?" O mestre chins entendeu as mensagens e respondeu. P'hadampa

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    Sangye viu, ento, que tinha um interlocutor digno dele.Os dois mestres puseram-se de acordo para organizar um grande debatepblico, para o qual seriam convidados os mais clebres eruditos e todas as

    autoridades locais em matria de filosofia budista. Fixaram o duelo: aqueledos dois que fosse vencido deveria voltar ao seu pas de origem, Mahayanapara a China, P'hadampa Sangye para a ndia.O debate ocorreu, longo e sutil. Finalmente, P'hadampa Sangye venceu e omestre voltou para a China. Entretanto, o vencedor fez uma homenagem aomrito de seu adversrio: "Quando um homem inteligente engaja-se em umavia falsa, pode, se lhe explicarmos o seu erro, reconhec-lo e abandon-la.

    Mas quando se trata de um tolo, ele permanecer surdo a toda tentativa deexplicao e s poder persistir em seu caminho errneo".O buddhismo tibetano conserva uma imensa gratido a P'hadampa Sangyeque permitiu que fosse restabelecida a viso justa e que florescesse de novono Tibet o Dharma perfeitamente puro.

    O mestre chins Mahayana era um verdadeiro erudito, algum que buscavaefetivamente a verdade, o que o levou a reconhecer seu erro. Uma pessoafalsamente inteligente, ao contrrio, jamais aceita questionar suas opinies.Ela sempre acredita que o que pensa definitivamente verdadeiro e fecha-se em suas idias.

    Sakyapandita e os dois monges incultos

    Uma histria tibetana ilustra bem a diferena entre a inteligncia aberta ea estupidez.Dois monges tinham vindo ver o grande erudito Sakyapandita.

    - Vocs conhecem bem os textos que vocs estudaram? - Perguntou-lhes

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    - Ns os assimilamos perfeitamente. - Responderam os dois companheiros.- Vocs poderiam dizer-me que tipo de atividade preciso abandonar (pang-

    j) e qual deve ser adotada (lang-j)?

    Ele esperava que eles dessem a resposta mais simples, isto , quais so osatos negativos e os atos positivos.Mas os dois tolos tomaram os dois termos por nomes de pssaros eresponderam arrogantemente que pang-j era uma determinada espcie elang-j uma outra. Depois, puseram-se a falar doutamente sobre oscostumes dos pssaros, os primeiros, segundo eles viviam na plancie e ossegundos nas montanhas.

    Sakyapandita, no tendo certeza se os monges tinham compreendido bemsua pergunta, se zombavam dele ou se eram verdadeiramente estpidos, fezuma nova pergunta simples: quais so os dezoito infernos?- Vejamos - disseram os dois monges --, temos os oito infernos quentes e os

    oito infernos frios, o que perfaz dezesseis....

    Faltavam-lhes dois. Eles no sabiam onde encontr-los, quando duas palavrasvieram a sua mente, sem que tivessem a menor idia do que significavam:- E temos tambm sha-nak e sha-mar!

    Sha-nak e sha-mar, "gorro negro" e "gorro vermelho", eram na realidade

    duas expresses que serviam para denominar o Karmapa e Situ Rinpoche, osdois lamas Kagypas mais clebres na poca.

    Sakyapandita ficou to entristecido com a ignorncia e a tolice dos dois

    monges que comeou a chorar. E os dois pretensiosos pensaram: "Coitado,ele no comeou seus estudos to cedo quanto ns e chora por causa de suaignorncia!"

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    Machig Labdrn, dons excepcionais

    Ainda na mesma poca, vivia na regio de Lab, nas cercanias da provncia deKhan, uma jovem que possua todas as qualidades: bonita, voz extremamente

    agradvel, inteligncia muito viva. Ela recebera a base de sua educaoespiritual de um mestre chamado Ngshechem, conhecido por ter sido oprimeiro tertn [revelador de tesouros] do Tibet. Depois tornou-se discpulade P'hadampa Sangye, por quem tinha uma grande f, mesmo antes deencontr-lo, simplesmente por ouvir falar dele.A jovem possua, alm disso, dons excepcionais na leitura oral. Difundira-seno Tibet que monges e lamas realizassem leituras em voz alta do Kangyur, a

    traduo tibetana do cnone budista; esta tambm era, para muitos yogismendicantes, uma maneira de obter alimento. No Kangyur, encontram-se osdoze volumes da Prajnaparanita em Cem Mil Versos, a explicao maisdesenvolvida do segundo ciclo de ensinamentos do Buda, tratando daausncia de caractersticas.

    A jovem de Lab era capaz de realizar em um nico dia a leitura dos dozevolumes, quando, para um leitor comum, eram necessrios quinze dias. No se

    contentando em ser especialista na tcnica da leitura, tinha acesso aosentido profundo do que lia, assimilando noes to sutis como os dezoitotipos de vacuidade. Essa jovem chamava-se Drnma, "Resplandecncia".Como nascera na regio de Lab, era chamada Machig Labdrn: "Me nica,Resplandecncia de Lab".

    Machig Labdrn e Thpa Bhadra

    Certa vez em que tinha sido convidada para fazer a leitura doPrajnaparamita, ela encontrou um grande realizado, chamado Thpa Bhadra,que tambm realizava esse tipo de leitura. Criaram entre si um lao muitoestreito e viveram, pelo menos aparentemente, como um casal comum. Algunsse chocavam com isso: "Esse homem e essa mulher so, ao que parece,grandes mestres e vivem como os mais comuns dos mortais!" Um dia,

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    entretanto, algum viu uma grande luz no interior da residncia do casal. Apessoa arriscou uma olhadela e viu como se o Sol e a Lua estivessemreunidos. Esse Sol e essa Lua eram de fato Machig e Thpa Badra. Tiveramvrios filhos, que eram cuidados por Thpa Badra, enquanto Machig viajava.

    Dois de seus filhos ficaram particularmente conhecidos, Gyelwa Samdrup eThnyen Samdrup, assim como sua filha Dorje Drlma. Os trs atingiram arealizao.A grande erudio de Machig, seus talentos excepcionais, sua grandeinteligncia fizeram com que muito rapidamente sua fama se propagasse portodo o Tibet, chegando at a ndia. Quando ela encontrou P'hadampaSangye, recebeu dele o ciclo completo dos ensinamentos da linhagem shije

    de onde provm a prtica de Chd.Leitura rpida

    Um dia, eruditos vindos da ndia propuseram a Machig de fazer um concursode velocidade de leitura. Ela aceitou, ainda que no visse muita utilidadenisso. Os textos tibetanos impressos no sentido da largura, so compostosde folhas independentes que compreendem em geral cada uma seis linhas.

    Uma pessoa comum l uma linha por vez. Machig lia seis linhassimultaneamente! Ela venceu facilmente o concurso e, nessa ocasio, falou desuas vidas precedentes.

    Lembrana de uma vida passada

    Ela revelou, especialmente, que tinha sido um yogi na ndia e que aindapodiam ser encontradas em uma gruta, da qual ela deu a localizao, as

    relquias de seu corpo passado. Dos yogis indianos, alguns tinham diferentespoderes e praticavam em particular a caminhada que permitia percorrercentenas de quilmetros em um nico dia. Assim, um deles foi ndia muitorapidamente, acompanhado de P'hadampa Sangye, para verificar as palavrasde Machig. Eles encontraram vestgios de sua vida passada de acordo com asindicaes que ela tinha dado. Compreenderam, ento, que Machig era

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    verdadeiramente um ser plenamente realizado, e tiveram uma f total nela.A fama de Machig ficou ainda maior.

    A converso do filho mau

    Dos filhos de Machig, havia um que seguia o mau caminho: roubava, andavacom bandidos, matava animais e recusava-se a escutar seu pai e sua me.No longe de sua casa vivia um ngagpa, isto , um yogi que tinha um cabelomuito longo, um pouco como os sadhus da ndia, e que tinha a faculdade delanar encantamentos. Ele possua um boi que utilizava para ir todos os diasbuscar gua em uma fonte distante. O mau filho de Machig foi um dia nacasa do yogi, roubou-o e matou seu boi. Quando se deu conta de quem era

    sua vtima, ficou aterrorizado: "Ele vai usar sua magia contra mim, vai mematar, com certeza", pensou. Correndo para a casa de Machig, implorou-lhe:- Me, eu roubei um ngagpa, matei seu boi, ele vai se vingar! Me, voc

    precisa me proteger!

    - No tenha medo, vou ajud-lo - assegurou-lhe Machig. - Mas para queminha proteo seja eficaz, preciso que voc pratique o Dharma; seno no

    poderei fazer nada por voc.

    - Eu aceito tudo o que voc quiser, me, vou praticar.Machig deu a seu filho, ento, as iniciaes e as instrues necessrias,

    depois levou-o a uma gruta, fechando magicamente todas as sadas.O jovem rapaz, na gruta, dedicou-se prtica de Chd durante muitos anos,

    meditando sem nenhuma distrao. Sua nica ligao com o mundo exteriorera um raio de luz que se infiltrava na gruta por uma minscula abertura eatravs da qual dakinis introduziam alimentos e bebidas. Depois de vriosanos de prtica, o filho de Machig tornou-se tambm um ser realizado.

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    O medo vazio

    A prtica de Chd leva realizao da vacuidade e compaixo. Ao mesmotempo, tem como particularidade permitir que nos desfaamos do medo e

    das noes de pureza ou de impureza material.Quando, por exemplo, o medo aparece ou um perigo surge, treina-se empensar: "Quem tem medo? a mente. Fora da mente, no h nada que possasentir medo. J que a mente vazia, o medo tambm vazio". Assim, nadamais parece aterrorizante.

    Para tornar o treinamento mais eficaz, Machig preconizava buscar para a

    prtica do Chd lugares aterrorizadores como os locais mal-assombrados,cheios de demnios e abandonados pelos homens, assim como locaisrepugnantes como os ossrios cheios de cadveres. A prpria Machigfreqentou dessa forma oitocentos desses lugares e sua realizao foiconsideravelmente aumentada.

    Sangye Nyentnpa e a gruta que desmorona

    Machig transmitiu a prtica de Chd principalmente a dezoito grandesdiscpulos, sendo um deles, na linhagem Kagypa, o Karmapa Rangjung Dorje.Na linhagem Shangpa Kagy, foi Bepel Neljor, "o yogi Escondido", igualmenteconhecido pelo nome Sangye Nyentnpa, que recebeu essa transmisso.

    Para praticar Chd, ele procurava freqentar locais aterrorizadores, cujafuno acabamos de mencionar.

    Um dia em que dormia em sua gruta, foi despertado por pequenos gro deterra que caiam sobre seu rosto. Ao abrir os olhos, constatou que a rochaacima dele estava trincando. Seu primeiro reflexo foi correr para a sada dagruta. Todavia, no momento de sair, lembrou-se que estava praticando Chdcom o objetivo de superar o medo. Ento, retornou, instalou-se de novo sob arocha ameaadora e permaneceu assim durante trs dias, praticando Chd e

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    meditando sobre a vacuidade. No final dos trs dias, abandonou a gruta livrede todo medo. Assim que transps o limiar, a rocha desintegrou-se.

    Um remdio para a loucura

    Chd uma prtica muito profunda que permite atingir rapidamente oestado de Buda se for praticada com perfeio. Mas tambm particularmente benfica para os seres assolados por medos, angstias,doenas ou atingidos pela loucura.

    Imaginemos uma pessoa dominada por uma neurose que a torna incapaz defixar-se em um lugar e a leva a errar permanentemente na natureza. Um

    praticante especialista na prtica de Chd ter condies de pr fim nessedesejo de fuga.A medicina tibetana repertoria 404 tipos de doenas dentre as quais 101 sodevidas a espritos malignos. Para curar esses tipos de doenas, no existeum meio mais eficaz do que a prtica de Chd.

    A essncia da prtica

    Cinco versos do ritual permitem-nos compreender a funo essencial daprtica.O primeiro desses versos diz: Concedais vossa graa para que eu evite

    envolver-me nas atividades do mundo ilusrio. Chd permite, de fato,reconhecer que todos os objetos exteriores so apenas aparncias ilusriase assim desapegar-nos deles.

    Em segundo lugar, temos: Concedais vossa graa para que eu me desfaa do

    apego por este corpo ilusrio composto pelos quatro elementos. Os mtodosmais poderosos ensinados por Machig levam-nos ao desapego do corpo e interrupo de pensar em termos de "eu sou esse corpo".

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    O texto continua: Concedei-me acolher como um nico sabor ascircunstncias adversas, as doenas, os espritos malignos e os obstculos. Aprtica permite no ser afetado pelas circunstncias adversas, libertar-sedos medos, dos perigos, das doenas e dos sofrimentos, permanecendo na

    essncia deles.O quarto verso menciona especialmente: Concedais vossa graa para que eureconhea meu prprio rosto na manifestao que nada mais do queexpresso da mente. Chd um meio eficaz para que todas as aparnciasliberem-se delas mesmas, o que significa que elas so reconhecidas comoprodues da mente. Sendo a prpria mente percebida como vazia, todas asaparncias liberam-se nessa vacuidade.

    Enfim, dito: Possa eu obter a liberdade nos trs corpos auto-conhecedores, existentes em si. Podemos com essa prtica obter a liberdadeinterior, o domnio de nossa prpria mente, reconhecida como sendoultimamente os trs corpos de um Buda: sua vacuidade, o corpo absoluto(dharmakaya), sua claridade, o corpo de glria (sambhogakaya) e a unio dosdois, o corpo de emanao (nirmanakaya).

    Consideremos, agora, alguns pontos que, no desenrolar mesmo do ritual, soespecficos da prtica de Chd e lhe conferem um carter particular.

    Oferenda de mandala

    Numerosas prticas incluem o que chamamos "oferenda de mandala": pensa-se que se oferecem aos Budas e s divindades, a montanha axial do universo,circundada pelos quatro continentes, os quatro crculos de montanhas de

    ferro, etc. A oferenda do mandala no Chd apresenta a particularidade deque, ao invs de pensar que oferecemos o universo sob esta forma, nossoprprio corpo que oferecido como mandala, cada parte sendo visualizadaem correspondncia com uma parte do universo:

    o tronco simboliza a montanha axial, a cabea corresponde aos diferentes

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    mundos dos deuses, os olhos so o sol e a lua, os quatro membros, os quatrocontinentes, etc. Dessa maneira, o prprio corpo torna-se o mandala douniverso.

    As noes de "eu" e de "meu" esto profundamente enraizadas em ns,cobrindo trs aspectos: em primeiro lugar, "eu"; em segundo lugar, "meucorpo"; em terceiro lugar, "meus negcios, meu terreno, minha casa, etc.".Desses trs, o primeiro o mais restritivo, o corpo vindo em segundo lugar enossas posses em terceiro.

    Uma das maneiras de nos desfazermos dessas fixaes, ao mesmo tempoacumulando mrito e purificando-nos, praticar a oferenda do mandala. Em

    geral, ela recai sobre o mundo exterior e portanto sobre o terceiro dosaspectos que acabamos de ver: oferecemos em imaginao o universo, tudo oque ele contm e todos os nossos bens. Em Chd, ao contrrio, oferecemosnosso corpo, situando-nos, portanto, em um nvel mais restritivo de apego.

    P'howa

    A prtica de P'howa, a ejeo da conscincia, efetuada no contexto de Chd,

    reveste tambm um carter particular. Apresenta-se sobre trs variantes: oP'howa exterior, com smbolos e suporte, o P'howa interior, com smbolos esem suporte e o P'howa secreto, sem smbolos nem suporte.

    O ego, a assimilao ao corpo, uma tendncia implantada ,muitosolidamente em ns. Para desfazer-nos dela, Chd integra a prtica deP'howa, a partir da qual, no curso do ritual, mente e corpo so consideradoscomo separados.

    Realizando P'howa, o meditador visualiza que o eu, ou a conscincia

    ordinria, enviada ao cu e que se funde na vacuidade do espao. Ento, elepermanece no estado em que a mente onipresente como o espao; oconhecimento, onipresente como a mente, e o Dharmakaya, onipresente comoo conhecimento. Esse P'howa, chamado a "Abertura da Porta do Cu",

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    considerado cem vezes superior a um P'howa ordinrio.

    Oferendas

    Em todo ritual, realiza-se em inteno s Trs Jias oferendas de gua,flores e incensos, imaginadas inumerveis. Em Chd, elas so efetuadassegundo um processo particular: so os deuses e os demnios vindos dosdiferentes rgos sensoriais que as apresentam. Dos olhos emanam osdeuses e as deusas que oferecem as formas, dos ouvidos aqueles queoferecem os sons, do nariz os que oferecem perfumes, etc.Alm disso, os rituais compreendem uma oferenda de torma. Em Chd, o

    nosso corpo, carne e sangue, que oferecemos como torma. Uma varianteconsiste em pensar que o universo o recipiente que contm a torma e queos seres que o povoam so a torma. Uma outra possibilidade, em Chd, ainda visualizar a pele como o recipiente, enquanto que a carne, os ossos e osangue so a torma. Enfim, possvel considerar que, sobre o suporte dasaparncias exteriores, oferecida, enquanto torma, nossa faculdade depensar.

    Quando se trata de demnios ou espritos malignos, a eles que realizamosmais especialmente oferenda: damo-lhes o amor, a compaixo, nossa carne enosso sangue.

    Os quatro tipos de convidados

    Dos diferentes tipos de oferendas efetuadas durante o ritual, as principais,utilizando o corpo sob diversas formas aps ter ejetado a mente pela

    prtica de P'howa, so chamadas "festim branco" e "festim vermelho",apresentadas para quatro categorias de convidados.Os "convidados de honra", agrupando as Trs Jias, os Budas, osbodhisattvas e os lamas; ns lhes oferecemos nosso corpo transmutado emdiferentes oferendas: exteriores, interiores, secretas.

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    Os "convidados de capacidades", isto , os protetores do Dharma, assimcomo os deuses ou espritos que, embora no estejam liberados, voltaram-separa o Dharma movidos por uma motivao fraterna pelos seres e que

    assumiram engajamentos junto ao Buda Shakyamuni, Padmasambhava ouMachig Labdrn. Pensamos que nosso corpo transforma-se naquilo que lhes agradvel.Os "convidados de compaixo", isto , os seres das seis classes. Todos

    foram nossos pais e mes e temos, portanto, em relao a eles uma dvida degratido que lhes testemunhamos pensando que nosso corpo torna-se tudo oque eles possam desejar.

    Os "convidados de crdito", compostos por espritos que tentam nosprejudicar. Eles o fazem em razo de uma dvida krmica que assumimos emrelao a eles em nossas vidas passadas: cometemos atos prejudiciais emrelao a eles, at podemos t-los matado. Tambm, como forma deremisso, oferecemo-lhes agora a carne e o sangue de nosso corpo com oqual se alimentam.

    Uma vez que a mente tenha sido enviada para fora do corpo, este transformado, pela visualizao , em uma grande variedade de oferendas quecorrespondem aqueles aos quais so endereadas .Em primeiro lugar, o corpo toma a forma de vrios objetos alegres eagradveis, oferecidos ao lama-raiz e a todos os lamas de linhagem. Estaoferenda e chamada nnupla, pois inclui para cada um trs elementos dapersonalidade dos lamas - corpo, palavra e mente - trs graus de oferenda:

    exterior, interior e secreta. Nessa mesma fase da meditao, a oferenda estendida aos yidams, aos Budas e aos bodhisattvas, sob quatro formas-exterior, interior, secreta e ltima.Num segundo momento, em inteno dos protetores e dos guardies doDharma, temos, sempre em seguida transformao do corpo, as

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    substncias de "reparao" e de "realizao".Em um terceiro momento, destinados s seis classes de seres, aparecemdons sob a forma de coisas belas de se ver, sons agradveis, pratos

    deliciosos, perfumes suaves, etc.Enfim, as oferendas so destinadas a uma quarta categoria de seres: oscredores krmicos. Durante inumerveis vidas passadas, de fato, realizamosatos que engendraram o sofrimento dos outros, que os tenhamos matado ouinfligido diversas dores. Portanto, karmicamente, temos uma dvida com eles,dvida que lhes permite, por exemplo, nos causar doenas. No ciclo dasoferendas que estamos tratando, ns lhes apresentamos nossa carne, nosso

    sangue, nossos ossos, ou qualquer parte de nosso corpo que imaginamos quelhes seja aprazvel.

    Dar seu corpo

    Geralmente, quando um adepto do Dharma assolado por medos, angstiasou perigos, o remdio orar s Trs Jias. Mas o praticante de Chdconsiderar que essas experincias desagradveis so produzidas por maus

    espritos e dir: "Esses seres, que so malficos hoje, foram no passadomeus pais e mes e manifestaram, ento, por mim a maior bondade. Sedesejassem, agora, nutrir-se com meu corpo, eu lhes ofereceria comprazer". E, dirigindo-se a eles, ele pensa: "Esse corpo que meu, faam deleo que quiserem, agrada-me mais do-lo a vocs do que conserv-lo para mim".

    Completa aceitao

    Na perspectiva de Chd, mesmo a doena pode ser integrada prtica.Quando ela surge, ao invs de rejeit-la, pensamos: " uma coisa boa; possaeu, graas a esta doena, tomar para mim as doenas e os sofrimentos detodos os seres!" Ao mesmo tempo, consideramos que esta doena pode serprovocada por credores krmicos. Que eles sejam sua causa, que eles amantenham ou que a levem a cabo, ns lhes dizemos: "Venham! Sejam bem-

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    so nossos credores krmicos so benfeitores superiores a cem outros.

    Questo - Um leigo pode praticar Chd ?

    Kalu Rinpoche - Sim, claro, para realizar esta prtica basta ter recebido ainiciao e ter total confiana nela. Se voc desejar realiz-la, deve receberexplicaes sobre ela de um lama qualificado.No Vajrayana acredita-se que o que recebemos depende em grande parte domodo que vemos as coisas: se considerarmos um lama como um Buda,receberemos dele verdadeiramente a graa de um Buda; se o considerarmoscomo um bodhisattva, receberemos dele a graa de um bodhisattva; se para

    ns ele apenas um homem bom, mas comum, nos ser concedida a graa deum homem bom; enfim, se no tivermos nenhuma f nele, no receberemosabsolutamente nada.A prtica de Chd inclui a linhagem dos "tantras-pai", linhagem dos meiosvinda do Buda Shakyamuni, passando em seguida por Manjushri, assim como alinhagem dos "tantras-me", linhagem do conhecimento, vinda de YumChenmo (A Grande Me), depois passando por Tara e a dakini Sukhasiddhi.

    Enfim, Chd integra tambm a linhagem dos tantras no-duais.

    Questo - preciso, necessariamente, ir aos cemitrios para praticar Chd?O problema que no h cemitrio em Montchardon!Kalu Rinpoche - Se voc desejar ir a um cemitrio, v, mas no necessrio.Um cemitrio um local onde encontram-se cadveres, alguma coisa deapavorante e repugnante. Milarepa dizia que temos um cadver

    permanentemente nossa disposio, nosso corpo! Existe ainda um outrocemitrio, o maior de todos os cemitrios: aquele onde morrem todos nossospensamentos, todas nossas emoes.

    Questo - necessrio ter feito as preliminares antes de praticar Chd?

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    Kalu Rinpoche - Sim, preciso, primeiramente, ter feito as preliminares.Existem, tambm, preliminares especficas para a prtica de Chd. Emboraencontremos essa prtica em todas as escolas budistas, os Sakyapas, osNyingmapas, os Gelugpas, ela est mais particularmente ligada escola

    Kagypa. Assim, se completarmos as preliminares da escola Kagypa, no verdadeiramente necessrio fazer as preliminares especficas de Chd.

    Questo - Se o praticante no est qualificado, essa prtica pode comportarperigos?Kalu Rinpoche - Se somos capazes de desenvolver uma compreensosuficiente da vacuidade e da compaixo, no h nenhum perigo. Nesse

    momento, mesmo que o chamamos causas adversas, demnios, obstculos,medos, todas as negatividades, podem ser transformadas.Machig Labdrn disse: Se voc tem um inimigo e voc decidir usar uma facapara livrar-se dele, talvez voc o consiga; talvez, tambm, seja ele que selivre de voc. Enquanto que se transformar esse inimigo em um amigo, seuinimigo desaparecer. Do mesmo modo, quando voc est doente e desejaficar bom, mas duvida que vai consegu-lo, o resultado ser incerto; ao passo

    que, se voc pensar que a prpria doena uma coisa boa, voc ficar curadopelo simples fato de que no h nada mais a ser rejeitado.

    O praticante atemorizado pelo damaru

    Apesar de tudo, necessrio um certo hbito da prtica antes de entrar emsituaes delicadas. Cita-se o exemplo de um praticante bastante medocreque decidiu, um dia, praticar Chd em um cemitrio.

    Enquanto era dia, as coisas se passaram bem, mas quando a noite chegou, eleficou totalmente inseguro.

    No entanto, ele comeou a soprar em seu kangling e a tocar o damaru. Derepente, uma bola do damaru bateu em seu rosto; acreditando estar na

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    presena de um demnio, aterrorizado, ele deixou tudo para trs e fugiucorrendo!

    A slaba sagrada

    Nos Cem Mil Cantos de Milarepa, encontramos preciosas explicaes sobreesse ritual, pois Milarepa responde detalhadamente muitas perguntas deuma mulher sobre a personalidade do lama instrutor, sobre a iniciao, sobrea prpria prtica, seus benefcios, etc. Nessa passagem dos Cem Mil Cantos,Milarepa tambm d explicaes muito detalhadas sobre o sentido da slabaPh'e (snsc. Ph'at) que repetida vrias vezes no ritual Chd. A fora dessaslaba, segundo Milarepa tripla:

    do ponto de vista exterior, permite retirar a mente do torpor;

    do ponto de vista interior, tem o poder de interromper um fluxo muitogrande de pensamentos;

    do ponto de vista secreto, faz com que a mente se libere na sua naturezaprpria que vacuidade, claridade, conhecimento sem descontinuidade.

    Nesse canto, Milarepa explica, tambm, os trs nveis pelos quais podemoscompreender uma iniciao. A imposio do bumpa sobre a cabea constitui ainiciao exterior; a meditao de nosso corpo como o corpo da divindade, ainiciao interior; e o reconhecimento da natureza essencial de nossa menteconstitui a iniciao ltima ou ainda a iniciao verdadeira.

    Questo - Qual a relao entre Chd e a Prajanaparamita?

    Kalu Rinpoche - Existe uma relao estreita, na medida em que Chd

    fundado sobre a compreenso da vacuidade e da compaixo, que tambm oponto de vista de todo o Vajrayana. Ora, a Prajanaparamita diz respeitoprecisamente compreenso da vacuidade.

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    Questo - Como conciliar a prtica de Chd com a prtica de um yidam?Kalu Rinpoche - Isto feito automaticamente. Quando, na prtica de Chd,

    fazemos P'howa, pensamos que a conscincia abandona nosso corpo e

    transforma-se na divindade Vajra Yogini (Dorge Pamo): portanto, tornamo-nos um yidam e permanecemos assim durante toda a prtica. Quanto a nossocorpo, que apenas um cadver, ns o oferecemos aos diferentesconvidados dos quais j falamos.

    Um Falso Comeo

    Assim que comecei a me interessar pelo buddhismo e pela psicologia, tive

    uma demonstrao ntida de como seria difcil conseguir a integrao destesdois mundos.Alguns dos meus amigos organizaram, na casa de um professor de psicologiada Universidade de Harvard, um encontro entre dois preeminentesprofessores budistas que nunca se haviam encontrado antes e querepresentavam duas tradies que, de fato, tiveram entre si pouco contatonos ltimos dois mil anos. Antes que os mundos do buddhismo e da psicologia

    ocidental pudessem se unir, as vrias correntes budistas teriam de seencontrar. E ns iramos presenciar este primeiro dilogo.

    Seung Sahn

    Os professores - Kalu Rinpoche, do Tibet, de setenta anos, um veterano comsua experincia de anos de retiro solitrio, e o mestre Zen, Seung Sahn,

    primeiro Zen coreano a ensinar nos Estados Unidos - testariam seusconhecimentos em proveito dos espectadores, estudantes ocidentais.Iramos assistir a uma importante cerimnia que costuma ser chamada decombate do Dharma (o embate de grandes mentes aguadas por anos deestudo e meditao), e aguardvamos o seu incio com a ansiedade que talencontro histrico nos provocava. Vestidos com suas tnicas drapeadas - a

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    do tibetano, marrom e amarela, a do coreano, cinza escura e negra - osmonges entraram acompanhados de uma comitiva de jovens de cabeasraspadas que seriam seus intrpretes. Sentaram-se sobre almofadas, natradicional posio de pernas cruzadas, e o anfitrio deixou claro que o

    mestre Zen, mais jovem, deveria comear.O lama tibetano se sentou muito sereno, manuseando um rocal de madeira(mala), enquanto murmurava continuamente Om Mani Padme Hum. O mestreZen - que adquiria renome por seu mtodo de lanar questes-relmpago aosalunos at que se sentissem forados a admitir sua ignorncia, para entoouvi-lo gritar: "Conserve essa mente que no sabe de nada!" - tirou dedentro de sua tnica uma laranja, estendeu-a ao lama e perguntou: - O que

    isto?"O que isto" a tpica pergunta que inaugura um debate, e podamosperceber que o monge coreano estava preparado para rebater qualquerresposta que lhe fosse dada.O tibetano continuou na mesma posio, impassvel, manuseando o mala, semfazer um nico movimento que indicasse a possibilidade de uma resposta.

    - O que isto? - Insistiu o mestre Zen, segurando a laranja diante do narizdo tibetano.Kalu Rinpoche se inclinou lentamente para o monge tibetano que estava aoseu lado fazendo s vezes de intrprete, e os dois se puseram a cochicharpor alguns instantes. Finalmente o intrprete se dirigiu platia e disse:

    - Rinpoche diz: "Qual o problema com ele? No h laranja no lugar de ondeele vem?"E o dilogo no foi alm.

    As Oito Conscincias e os Cinco Elementos

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    A natureza bddhica ou mente pura, essa sabedoria primordial, acima detudo vacuidade, lucidez e possibilidade infinita. a clara luz, encontrada portodos os seres no fim da dissoluo da conscincia no momento da morte ou,

    no bardo da agonia, seguida pelo bardo da vacuidade. Esta clara luz ousabedoria primordial bsica tem como sua essncia os cinco elementosprincipais: espao, ar, fogo, gua e terra. Como veremos, estes setransformam quando a mente e suas manifestaes so modificadas.Quando a natureza bddhica modificada pela ignorncia, ela se torna o solouniversal do samsara. Como tal, ela chamada a conscincia universal oufundamental, ou a oitava conscincia. Ela abarca e permeia tudo e dela

    surgem todas as iluses da conscincia individual.O desenvolvimento da deluso comea com a aparncia da dualidade. Oestado no-dual da vacuidade, lucidez e no-obstruo divide-se nadualidade sujeito-objeto e age a partir dessa percepo. Da vacuidade surgeo "eu-sujeito", da lucidez surge o senso de "outro", e da no-obstruosurgem todos os relacionamentos baseados na atrao, repulso e ignorncia.

    Com esta iviso, ocorre a conscincia contaminada ou dualista - a conscinciade que algum tem algo. Ela referida como sendo contaminada porque poluda com o dualismo, que a stima conscincia. Esta conscinciacontaminada tem um sqito de outras seis conscincias, correspondentes sdiferentes faculdades mentais: visual, auditiva, olfativa, gustativa, ttil emental.

    A Alterao dos Elementos na Mente e nos Bardos

    Vazio, luminosa e infinita em potencial, a mente pode ser entendida comotendo cinco qualidades bsicas: vacuidade, mobilidade, claridade,continuidade e estabilidade. Cada uma destas corresponde respectivamentea um dos cinco elementos principais do espao, ar, fogo, gua e terra. Jdescrevemos a mente como no sendo uma coisa tangvel; ela

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    indeterminada, onipresente e imaterial; vacuidade, com a natureza doespao. O espao e os estados mentais surgem constantemente na mente;este movimento e flutuao so a natureza do elemento ar. Alm disso, amente clara; ela pode ser conhecida, e essa lucidez clara a natureza do

    elemento fogo. E a mente contnua; suas experincias so um fluxoininterrupto de pensamentos e percepes. Esta continuidade a naturezado elemento gua. Finalmente, a mente o solo ou base a partir da qualsurgem todas as coisas conhecveis no samsara como no nirvana, e estaqualidade a natureza do elemento terra.As cinco qualidades da mente pura tambm tm a natureza dos cincoelementos. Entrando nas iluses e dualidade, a mente alterada, mas as

    produes da mente preservam a natureza dos cinco elementos emdiferentes aspectos.

    Toda manifestao o jogo da mente nas transformaes dos cincoelementos principais. Alm disso, h energias sutis sustentando a mentesuas mutaes, tradicionalmente chamados ventos ou ares. A mente, aconscincia e a mirade de experincias diversas so produzidas por estesventos-energias; so indistinguveis da mente e so a energia que as anima e

    influencia.As cinco qualidades bsicas da mente que acabaram de ser descritascorrespondem a cinco ventos ( em tibetano rlungs ou ares, tb conhecidoscomo elementos- em realidade movimentos, na China e em outros locais)como muitos sutis cuja energia manifesta-se na mente como as cincoluminosidades essenciais que so referidas como sendo extremamente sutis.Elas so respectivamente azul, verde, vermelha, branca e amarela.

    Estas luminosidades comeam a se manifestar no momento em que aconscincia restabelecida no fim do bardo da vacuidade. Elas fazem partedo processo do "nascimento", a emergncia da conscincia dualista. Asexperincias e projees da conscincia surgem subseqentemente a partirdas cinco luminosidades; elas produzem as aparncias dos cinco elementos

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    que so percebidos atravs da iluso, como o corpo mental e o mundoexterno.Todas as aparncias ilusrias que a conscincia experiencia so basicamente

    emanaes da mente, a manifestao dos cinco elementos principais,ocorrendo inicialmente como qualidades essenciais da mente, ento nosventos e luminosidades, e finalmente como aparncias. Cad um destes nveistem a natureza dos diferentes elementos: espao, ar, fogo, gua e terra.O processo de estruturar a conscincia ocorre a cada momento, um todos osnossos estados de conscincia, mas particularmente no comeo do bardo dovir-a-ser. Ento, durante esse bardo, pela interao dos cinco elementos, a

    conscincia projeta a aparncia de um corpo mental, uma forma sutil com aqual se identifica com um sujeito, enquanto ao mesmo tempo projeta estesobjetos, percebidos de um modo ilusrio como o mundo externo.Ento, este sujeito-conscincia, identificado com seu corpo mental,desenvolve relacionamentos com estes projees-forma que sogradualmente estruturadas como os outros agregados - sensaes,representaes e fatores. Os cinco agregados que juntos formar um

    individuo (formas, sensaes, representaes, fatores e conscincia) soassim criados. Mas neste estgio do bardo do vir-a-ser, a conscincia mentalvive todas as suas experincias apenas dentro de si mesmo, e o indivduoassim composto tem apenas quatro agregados e meio.

    Deste modo, as experincia do bardo do vir-a-ser durar at a concepo.No momento da concepo, a conscincia migrante, feita de quatroagregados e meio, combina-se com elementos externos presentes no smen

    do pai e no vulo da me. Ento, o embrio concebido inclui todos os cincoelementos em seu aspecto interior - conscincia - e em seus aspectosexternos que vm dos gametas dos pais.Por um lado, os cinco elementos do espao, ar, fogo, gua e terra existem noembrio e ento no corpo fsico, como cavidades, vento, calor, lquidos e

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    slidos; por outro lado, os eles existem como os princpios do estiramento,mobilidade, energia, fluidez e coeso. A forma tangvel que o corpo adquire o aspecto grosseiro do agregado da forma; um indivduo feito de cincoagregados assim criado, e gradualmente as cinco faculdades dos sentidos

    desenvolvem-se - visual, auditiva, olfativa, ttil, gustativa e mental.No reino destas diferentes faculdades sensoriais da conscincia mental,dois aspetos emergem - puro e impuro. A conscincia contaminada e aflitaprocede da conscincia dualista junto com tudo o que negativo, como raiva,ambio, ignorncia, apego, inveja e orgulho. Por outro lado, uma conscinciamental positiva surge da sabedoria primordial com as qualidades dasabedoria, compaixo, amor e f.

    Estes dois aspectos da conscincia mental estendem-se atravs das seisconscincias e das faculdades sensoriais. Isto resulta em uma variedade deexperincias dos seis tipos de objetos - formas, sons, odores, sabores,objetos tteis e pensamentos.Para fazer uma analogia, a conscincia fundamental como o mestre ou o

    rei; a conscincia mental como seu filho, o pr