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Cad. Metrop., São Paulo, v. 21, n. 45, pp. 531-550, maio/ago 2019http://dx.doi.org/10.1590/2236-9996.2019-4508
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A desindustrialização na região Sul
Deindustrialization in the South region of Brazil
José Alderir Silva [I]
ResumoEste estudo objetiva analisar a evolução da in-
dústria de transformação no Brasil com ênfase na
região Sul no período 2002-2014, de modo que
seja possível observar a contribuição sulista no
processo de desindustrialização do País. Para isso,
serão utilizados como forma de análise os indica-
dores clássicos da desindustrialização. Com efeito,
foi observado que a indústria da região Sul perdeu
participação em termos de valor adicionado e de
emprego nos indicadores nacionais, porém, a ma-
nifestação da desindustrialização pode ser confir-
mada apenas a partir da composição da estrutura
produtiva regional. Nesse sentido, constatou-se a
perda de participação da indústria de transforma-
ção combinada com a desconcentração da produ-
ção/emprego industrial sulista, o que configura um
processo de desindustrialização regional progressi-
vo e positivo nessa região.
Palavras-chave: desindustrialização; economia re-
gional; Rio Grande do Sul.
AbstractThis study analyzes the evolut ion of the manufacturing industry in Brazil focusing on the South region in the period 2002-2014, so that it is possible to observe the southern contribution to the country's deindustrialization process. For this, the classic indicators of deindustrialization will be used as a form of analysis. Indeed, it was found that the industry of the South has lost share in terms of value added and employment in national indicators, but the manifestation of deindustrialization can only be confirmed by the composition of the regional productive structure. In this sense, the loss of share of the manufacturing industry was verified, combined with the deconcentration of the southern industrial production /employment, which constitutes a progressive and positive deindustrialization process in this region.
Keywords: deindustrialization; regional economy; Rio Grande do Sul.
José Alderir Silva
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Introdução
Desde os anos de 1980, a indústria de transfor-
mação no Brasil tem apresentado uma perda
sistemática de participação no PIB, o que gerou
um intenso debate no âmbito acadêmico sobre
um possível processo de desindustrialização na
economia brasileira.
Entretanto, apesar dos significativos
avanços, a discussão sobre esse processo pou-
co avançou no âmbito regional, deixando a
entender que a desindustrialização ocorre de
forma homogênea nas regiões e estados. Con-
tudo, isso não é verdade.
Assim, com o objetivo de contribuir com
o debate, mas chamando a atenção para o
aspecto regional do processo de desindustria-
lização, o presente estudo busca analisar a evo-
lução da indústria de transformação na região
Sul e, por sua vez, em seus estados no período
2002-2014. Além disso, ao realizar esta análise,
busca-se observar se o processo de desindus-
trialização em vigor no Brasil pode ser explica-
do pela trajetória da indústria de transforma-
ções na região Sul.
Para isso, serão utilizados, como instru-
mento de análise, os indicadores clássicos da
desindustrialização. Com efeito, ao realizar-se a
análise, foi observado que a indústria de trans-
formação da região Sul perdeu participação, em
termos de valor adicionado ou de emprego, nos
indicadores nacionais na última década. Porém,
essa perda tem se concentrado no estado de
São Paulo, o que configura um processo de de-
sindustrialização regional regressiva “positiva”,
conforme os conceitos desenvolvidos por Silva
(2017), já que também ocorreu uma desconcen-
tração da produção industrial na região.
A estrutura deste paper está dividida em
mais quatro seções, além desta introdução. A
primeira seção aborda o debate sobre o proces-
so de desindustrialização na economia brasilei-
ra. A segunda seção tem por objetivo revisitar
o conceito de desindustrialização. Do mesmo
modo, a seção seguinte busca observar se os
estados da região Sul sofrem de um processo
de desindustrialização. Por fim, as considera-
ções finais.
O debate da desindustrialização no Brasil
A indústria de transformação da economia
brasileira tem apresentado uma trajetória de
perda de participação no PIB desde o início
da década de 1980, quando detinha cerca de
32% do PIB. No entanto, essa participação
caiu para 12% do PIB em 2014. Diante disso,
diversos autores passaram a debater a exis-
tência de um processo de desindustrialização
na economia brasileira.
Até o final da década de 1970, a política
econômica no Brasil foi caracterizada por um
processo de industrialização por substituição
de importações. Primeiro de bens de consumo
para, em seguida, desenvolver uma indústria
de base. Dentro desse processo de industriali-
zação, o Estado era a variável-chave tanto na
produção como na geração de estímulos ao se-
tor privado.
Contudo, diante do endividamento cres-
cente dos países, essas políticas com forte pre-
sença do Estado passaram a ser substituídas
por políticas liberais já no início da década de
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1980. Com efeito, ocorreu a abertura comercial
e financeira da economia brasileira, e o Estado
perdeu espaço para o mercado no que diz res-
peito à capacidade de induzir e coordenar os
investimentos privados.
Segundo Hiratuka e Sarti (2015), isso
culmi nou na deterioração da infraestrutura fí-
sica e no atraso do avanço tecnológico. Para
Arend e Fonseca (2012), até a década de 1980,
a estrutura industrial da economia brasileira
acompanhou o padrão internacional, mas, a
partir dos anos 1980, a estrutura industrial do
País perdeu dinamismo em relação à economia
mundial. Ou seja, o processo de catching up
que caracterizou a economia brasileira até a
década de 1980 foi substituído por um proces-
so de fall behind.
Portanto, não há discussão de que os
anos 1980 são o “divisor de águas” na traje-
tória da indústria de transformação no Brasil.
Porém, o que ocorreu com a indústria do País
desses anos em diante é fonte de um intenso
debate entre autores ortodoxos e heterodoxos.
Esse debate se encontra longe de um consenso,
não apenas entre autores de correntes econô-
micas diferentes, mas dentro da própria orto-
doxia e heterodoxia.
Assim, os denominados novo-desen-
volvimentistas defendem a hipótese de que a
economia brasileira sofre de um processo de
desindustrialização derivado à “doença ho-
landesa”, causada pela sobreapreciação real
do câmbio. Segundo Oreiro e Feijó (2010) e
Bresser-Pereira (2008), o aprofundamento da
abertura comercial e financeira na economia
brasileira, que teve início na década de 1980,
combinado com o boom das commodities nos
anos 2000, foi o principal responsável por essa
sobreapreciação cambial.
Além disso, Nassif (2008), ao realizar
uma análise da indústria de transformação por
intensidade tecnológica, observou que ainda
não ocorreu uma mudança da estrutura da in-
dústria na direção dos setores intensivos em
recursos naturais e, por isso, desconsidera a
hipótese de desindustrialização para a econo-
mia brasileira.
No entanto, para Cano (2014), o Brasil
sofre de um processo de desindustrialização
devido: (a) a abertura comercial e financeira
ilimitada; (b) o crescimento dos setores agríco-
la e mineral acima do da indústria de transfor-
mação, na última década; (c) a sobreapreciação
cambial; (d) o baixo crescimento da economia
internacional; (e) a alta taxa de juros; e (f) a re-
dução dos investimentos interno e externo na
indústria de transformação.
Todavia, Hiratuka e Sarti (2015) afir-
mam que existem transformações na estrutura
produtiva global que ainda não receberam a
devida atenção no debate sobre a desindus-
trialização no Brasil, como 1) a reorganização
das estratégias globais da atividade produtiva
por parte das empresas transnacionais, 2) a
interferência da China não apenas nos preços
das commodities, mas também nos preços dos
bens industriais; 3) o aparecimento de novos
competidores e a abertura de espaços seletivos
para a inserção dos países em desenvolvimento
nas redes de produção; e 4) o reforço de políti-
cas nacionais dos países desenvolvidos, diante
do cenário pós-crise, que objetivaram incenti-
var a mudança tecnológica e a reestruturação
industrial como forma de recuperar o dinamis-
mo econômico. Sendo assim, é necessário con-
siderar esses aspectos para se ter uma análise
mais pormenorizada do processo de desindus-
trialização na economia brasileira.
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Já, parte da ortodoxia, representada por
Bonelli, Pessôa e Matos (2013), afirma que a
desindustrialização no Brasil se trata, na verda-
de, de um ajustamento da estrutura industrial
em relação à dotação de fatores da economia
brasileira. Segundo os autores, o Brasil sofre,
não de uma doença holandesa, mas de uma
“doença soviética”, ou seja, o padrão da in-
dústria brasileira está muito acima do padrão
internacional quando se considera o grau de
desenvolvimento, população, nível tecnológico
e recursos naturais. Em outras palavras, o Brasil
possui um grau de industrialização muito aci-
ma do permitido por seus fatores de produção
e, portanto, com uma participação no PIB su-
perior ao nível considerado normal para uma
economia em desenvolvimento. Sendo assim,
o processo de desindustrialização deve ser en-
tendido como um processo de ajuste, no senti-
do de estar convergindo para um nível adequa-
do de desenvolvimento industrial, de modo que
as políticas liberais são as principais responsá-
veis pelo padrão de normalidade da indústria
nacional de acordo com a dotação dos fatores
produtivos da economia brasileira.
Além disso, outros autores ortodoxos,
como Barros e Pereira (2008), argumentam
que o Brasil não padece de um processo de
desindustrialização, mas atravessa um período
de modernização da indústria propiciado pelo
barateamento dos bens de capital importados
que foram favorecidos pela sobreapreciação
cambial. Diante disso, a desindustrialização po-
de ser entendida como um processo natural de
seleção das atividades industriais, cuja perda
de participação ocorre em atividades nas quais
o País não possui vantagens comparativas.
Não obstante, a dimensão regional tem
sido quase totalmente esquecida,1 tendo em
vista a desindustrialização ser tratada como
um processo homogêneo em todos os estados
da federação. Contudo, isso não é verdade. A
desindustrialização apresenta-se de forma dife-
renciada em todos os estados do País, de modo
que é fundamental seu estudo em nível regio-
nal para compreender melhor esse processo e,
assim, propor soluções adequadas a cada rea-
lidade econômica. Este será o objetivo do pre-
sente trabalho, mas antes é preciso conhecer o
conceito de desindustrialização e suas adapta-
ções ao nível de regiões e estados.
Revisitando o conceito de desindustrialização
A indústria de transformação é de suma im-
portância para o crescimento econômico. Se a
compararmos com os demais setores da econo-
mia, ela possui efeitos de encadeamentos tanto
para frente quanto para trás. Para Hirschman
(1958), os efeitos de encadeamento são os
transbordamentos através de externalidades
positivas para os demais setores que geram
maior dinamismo na economia.
Além desses efeitos de encadeamentos,
Kaldor (1957) também considera a indústria
um setor diferencial em relação aos demais se-
tores da economia, por possuir elevada produ-
tividade e maiores economias estáticas e dinâ-
micas de escala, assim como maior capacidade
de gerar crescimento e progresso tecnológico
para toda economia e por aliviar as restrições
externas ao crescimento, uma vez que os pro-
dutos industriais possuem alta elasticidade de
renda da demanda. Devido a essas caracte-
rísticas, Kaldor (1967) observou que os países
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industrializados tendem a apresentar cresci-
mento superior aos países cuja produção seja
intensiva em recursos naturais.
Desse modo, a desindustrialização no
sentido negativo do termo pode prejudicar
o dinamismo da economia. No entanto, a de-
sindustrialização nem sempre é ruim para a
economia, representando, na verdade, um pro-
cesso natural do desenvolvimento econômico.
Portanto, é necessário definir a desindustriali-
zação conceitualmente para que não ocorram
erros de interpretação quando for realizada a
análise para a economia da região Sul.
O conceito de desindustrialização apare-
ce, com maior evidência, no final da década de
1980, com o trabalho pioneiro de Rowthorn e
Wells (1987), em que esses autores a definem
como a redução da participação do emprego
da indústria de transformação no emprego to-
tal. Para os autores em questão, existem pelo
menos dois tipos de desindustrialização: a posi-
tiva e a negativa.
A desindustrialização positiva ocorre
quando a perda de empregos se dá de forma
relativa e absoluta, mas se trata de um pro-
cesso natural do desenvolvimento econômico.
Nesse caso, a indústria de transformação já é
altamente produtiva, e, mesmo com a redução
do emprego, tem-se um aumento da produção.
No entanto, essa redução do emprego relativa
e absoluta na indústria de transformação não
provoca o aumento do desemprego, pois os
trabalhadores da indústria de transformação
que perderam seu emprego são deslocados
para o setor de serviços. Desse modo, a econo-
mia encontra-se sempre em uma situação pró-
xima do pleno emprego. Por isso, Rowthorn e
Wells (ibid.) afirmam que a desindustrialização
positiva não é um fenômeno patológico, mas
um sintoma de sucesso econômico.
A desindustrialização negativa, por
sua vez, é um fenômeno patológico que po-
de afetar uma economia em qualquer fase
do desenvolvimento econômico. Nesse caso,
o emprego ocioso gerado pela indústria de
transformação não será absorvido pelo setor
de serviços, de modo que o desemprego au-
menta. Portanto, trata-se de um sintoma de
fracasso econômico.
Não obstante, com o objetivo de in-
corporar os efeitos kaldorianos mencionados
anteriormente, o conceito de desindustria-
lização foi redefinido por Tregenna (2009)
no final da última década. Para a autora, a
desindustrialização pode ocorrer tanto em
termos de emprego como em termos de va-
lor adicionado (V.A.). Assim, a desindustria-
lização pode ser conceituada como a perda
de participação do emprego e/ou valor adi-
cionado em relação a seus respectivos totais
de forma permanente. Nesse caso, a desin-
dustrialização será positiva se esse processo
coincidir com um nível de renda per capita
de país desenvolvido. E a desindustrialização
será negativa se esse processo ocorrer antes
que a economia alcance um nível de renda
per capita de país desenvolvido.2
No entanto, esses conceitos foram defi-
nidos em nível de país, mas, como o propósito
deste artigo, será analisar a situação da indús-
tria da região Sul, é preciso adequar esses con-
ceitos em nível regional e de estados. Embora
seja possível encontrar alguns trabalhos sobre
o processo de desindustrialização na pers-
pectiva regional, o trabalho de Silva (2017) é
pioneiro no sentido de buscar desenvolver o
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conceito e as causas da desindustrialização
regional e, ao mesmo tempo, permitir consi-
derar a heterogeneidade do processo em nível
de estados.
Silva (ibid.) adota a hipótese de que
cada região apresenta um estado onde o pro-
cesso de industrialização esteja avançado em
relação aos demais estados da região e, por
isso, denomina esse estado “avançado” e os
demais, “estados atrasados”. Além disso, o au-
tor utiliza o termo (des)industrialização, com
parênteses, pois é possível que, ao mesmo
tempo que esteja ocorrendo um processo de
desindustrialização no estado avançado, pode
se ter um processo de industrialização nos de-
mais estados.
Realizadas essas observações, ao relacio-
nar a participação da indústria regional no PIB
total da região com um processo de concentra-
ção/desconcentração da produção industrial
nos estados, Silva (ibid.) mostra que pode acon-
tecer três possibilidades de desindustrialização:
a estagnada, a regressiva e a progressiva.
A (des)industrialização regional estag-
nada ocorre quando se têm mudanças de par-
ticipação da indústria de cada estado no PIB
industrial regional que provoquem a perda de
participação da indústria de transformação da
região no PIB regional, mas de modo que a par-
ticipação da indústria regional no PIB industrial
nacional permaneça sem grandes alterações.
Esse conceito pode ser ampliado em uma ver-
são positiva e outra negativa.
Quando a participação da indústria do
estado atrasado apresenta aumento em detri-
mento da redução da participação industrial
do estado avançado, tem-se uma (des)indus-
trialização regional estagnada positiva. Ou
seja, é positiva porque ocorre um processo de
desconcentração da atividade industrial na re-
gião. No entanto, para ser positiva, a estrutura
produtiva de ambos os estados não precisa ser
modificada, mas o deslocamento da produção
de bens que eram produzidos no estado avan-
çado para o estado atrasado já é suficiente pa-
ra ser enquadrado nessa definição.
Porém, quando a participação da indús-
tria dos estados atrasados apresenta redução
em detrimento do aumento da participação
industrial do estado avançado, tem-se uma
(des)industrialização estagnada negativa. Ou
seja, negativa porque ocorre um processo de
concentração da atividade industrial no esta-
do avançado e, ao mesmo tempo, o aprofun-
damento das vantagens comparativas de cada
estado.3 Nesse caso, as diferenças da estrutura
produtiva dos estados não apenas são manti-
das, mas aprofundadas.
No caso da (des)industrialização regional
estagnada positiva, o estado avançado está
se desindustrializando, e os estados atrasados
estão se industrializando. No caso da (des)in-
dustrialização regional estagnada negativa, por
sua vez, tem-se o processo inverso.
A (des)industrialização regional regres-
siva ocorre quando se têm mudanças de par-
ticipação da indústria de cada estado no PIB
industrial regional que resultam na queda de
participação da indústria regional no PIB total
da região e no PIB industrial nacional.
A (des)industrialização regional regres-
siva positiva pode ocorrer quando se tem um
aumento de participação do estado atrasado
no PIB da indústria regional pari passu com
a redução da participação do estado avança-
do, de modo que isso implique um processo
de desconcentração das atividades indus-
triais na região.
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Já a (des)industrialização regional re-
gressiva negativa ocorre quando a perda de
participação da indústria regional no PIB da
região for acompanhada de uma regressão da
estrutura produtiva de ambos os estados, que
provoque o aprofundamento da concentração
das atividades industriais no estado avançado.
Não obstante, nesse caso, a estrutura
produtiva do estado atrasado é orientada para
a produção de bens nos quais possuem vanta-
gens comparativas, enquanto a estrutura pro-
dutiva do estado industrializado é regredida
em direção à produção de bens de baixo valor
agregado, mas com valor agregado ainda supe-
rior ao dos estados atrasados.
A (des)industrialização regional pro-
gressiva, por seu turno, ocorre quando se têm
mudanças de participação da indústria de cada
estado que implique a redução da participação
da indústria regional no PIB da região, acompa-
nhada de aumento de participação em relação
ao PIB industrial nacional.
Nesse caso, ocorre um processo de des-
concentração da produção em nível nacional.
No entanto, quando essa desconcentração im-
plicar a desconcentração da produção indus-
trial da região, tem-se um processo de (des)
industrialização progressiva positiva. Caso
contrário, se resultar na concentração da pro-
dução industrial no estado avançado, tem-se
um processo de (des)industrialização progres-
siva negativa.
Já, no caso da (des)industrialização regio-
nal progressiva positiva, a estrutura produtiva
do estado atrasado é orientada para a produção
de bens com maior valor agregado, decorrente
de um processo de desconcentração das ativi-
dades industriais, proporcionado apenas pela
transferência de atividades do estado avançado
para o estado atrasado, que, diante das vanta-
gens apresentadas por este último estado, tem
estímulos para aumentar a produção.
Cabe observar que o conceito de (des)
industrialização regressiva possui certa corres-
pondência com o conceito de desindustrializa-
ção precoce enquanto o conceito de desindus-
trialização progressiva tem semelhanças com o
conceito de desindustrialização natural, visto
anteriormente em nível nacional.
A industrialização na região Sul
A região Sul é composta pelos estados do Pa-
raná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, sen-
do a atividade econômica desses estados, em
seu início, essencialmente agrícola. No entanto,
a necessidade provocou a gênese de algumas
atividades produtivas que se tornou um proces-
so de industrialização dos três estados diante
de uma política nacional e regional de desen-
volvimento econômico. Portanto, antes de ana-
lisarmos o processo de desindustrialização, é
importante entender de forma sumária como
foi a industrialização dos estados da região Sul.
A industrialização do Paraná até a déca-
da de 1930 estava relacionada com a produção
do mate e da madeira que se destinava tanto
ao mercado externo quanto ao mercado nacio-
nal, sendo sua forma de produção arcaica e de
baixo nível tecnológico.
A partir de 1940, ocorreu um cresci-
mento industrial, mas atrelado à produção
do café, que foi realizada com a ocupação
do Norte do Paraná, sendo considerada uma
extensão da economia paulista. Assim, esse
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desenvolvimento industrial era mais provoca-
do pela expansão da economia paulista do que
propriamente por uma dinâmica local.
Com efeito, desenvolveu-se uma indús-
tria de alimentos voltada para a demanda lo-
cal, criada pela atividade cafeeira, sendo carac-
terizada pelo seu baixo nível tecnológico e pela
reduzida economia de escala. Além disso, havia
uma infraestrutura precária no que diz respeito
a transporte e energia. Esse modelo de desen-
volvimento industrial permaneceu até a década
de 1960.
Não obstante, essa situação começou a
mudar a partir da crise da economia cafeeira
no final da década de 1950, de modo que era
necessário encontrar outras formas de desen-
volvimento para o estado do Paraná. Paralela-
mente a isso, o Estado brasileiro passou a ter
maior presença na economia, com o objetivo
de eliminar os estrangulamentos do desen-
volvimento econômico brasileiro. Como havia
certo consenso de que o atraso do Paraná es-
tava relacionado a sua condição de produtor de
bens primários, a opção do governo paranaen-
se foi a via da industrialização.
Diante disso, o governo do Paraná assu-
miu duas linhas de desenvolvimento. Primeiro,
no sentido de eliminar as deficiências de infra-
estrutura e propiciar a possibilidade de maior
rentabilidade ao capital investido. Segundo, co-
mo financiador das empresas industriais.
Assim, em 1962, foi criada pelo estado
do Paraná a Companhia de Desenvolvimen-
to do Paraná (Copedar) e o Banco de Desen-
volvimento do Paraná (Badep). A criação da
Copedar e do Badep foi estratégica, uma vez
que a primeira instituição tinha por objetivo
aumentar a rentabilidade da atividade indus-
trial através de uma infraestrutura adequada,
e o Badep visava ao financiamento para as in-
dústrias que se instalassem no Paraná.
Assim, a indústria incipiente e de baixa
intensidade tecnológica da época do café foi
perdendo espaço para a indústria de bens com
maior valor agregado e intensivo em capital.
Com efeito, ocorreu a consolidação da Cidade
Industrial de Curitiba (CIC), que foi o principal
projeto executado pela política industrial do
estado e que permitiu realizar uma agressiva
política de atração de investimentos.
Todavia, a atração desses investimentos
se dava em decorrência da infraestrutura bási-
ca, dos incentivos fiscais e das economias de
aglomeração existentes na capital do estado.
Além disso, o interior do estado não apresenta-
va as mesmas condições para atrair os investi-
mentos industriais, o que, de certo modo, gerou
um processo de industrialização concentrado
no entorno da capital paranaense, restando, ao
interior, às indústrias ligadas à agropecuária.4
Em 1970 Curitiba já concentrava 28%
de toda a produção industrial do estado,
percentual que foi aumentando na década de
1980 para quase 53% com a instalação de
indústrias com maior valor agregado, como a
metal-mecânica e a indústria química. No iní-
cio dos aos 2000, esse percentual já era maior
que 60%.
Quanto ao estado de Santa Catarina, o
processo de industrialização visava atender
a demanda local, mas terminou por atender
ao mercado nacional e também ao mercado
externo. Entre os principais setores da indús-
tria catarinense se apresentam a indústria de
alimentos, têxtil, metal-mecânico, moveleiro
e a indústria de cerâmica. Essas atividades ti-
veram início em meados do século XX tendo
uma contribuição fundamental dos imigrantes,
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sobretudo, alemães e italianos. Contudo, tais
atividades passaram a ser intensificadas so-
mente a partir da década de 1940 com o proje-
to de industrialização nacional e pós-1960 com
a implementação do Plano de Metas no Brasil.
Com a política nacional de substituição
de importações ocorreu um desenvolvimento
maior da indústria paulista que passou a inte-
grar a economia brasileira, gerando efeitos de
transbordamentos, sobretudo, para os estados
próximos de São Paulo como os da região Sul.
Com efeito, a indústria catarinense tirou
proveito dessa proximidade e rapidamente se
adaptou à demanda da economia paulista, for-
necendo alimento, vestuário e carvão mineral.
No entanto, somente após 1945, a estrutura
industrial de Santa Catarina passou por um
processo mais intenso de diversificação e am-
pliação de setores, como o de papel e papelão,
pasta mecânica (resultado da diversificação do
complexo madeireiro), têxtil e carbonífero, que
tiveram sua produção ampliada com a criação
de novas indústrias. Nesse período também
ocorreu a criação de novos setores, como o
cerâmico, plástico, metal-mecânico, materiais
elétricos e de indústrias ligadas ao setor de
transporte. Além disso, ocorreu a industrializa-
ção da agricultura, que se transformou em um
complexo agroindustrial.
No entanto, esse avanço da industrializa-
ção em Santa Catarina esbarrava nas deficiên-
cias de infraestrutura do estado, como a falta
de energia, recursos financeiros, transporte
rodoviário e de portos. Contudo, somente em
meados da década de 1960, com a implemen-
tação do Plano de Metas, essas barreiras come-
çam a ser resolvidas. Como essas deficiências
de infraestrutura eram uma característica de
praticamente todos os estados da federação,
o Estado brasileiro passou a intervir, fornecen-
do crédito, investimentos no setor elétrico e no
setor de transportes.
No que diz respeito às dificuldades de
crédito, foi criado o Banco de Desenvolvimen-
to do Estado de Santa Catarina (BDE), o Banco
Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul
(BRDE), o Fundo de Desenvolvimento de Santa
Catarina (Fundesc), o Programa de Apoio à Ca-
pitalização de Empresas (Procape), o Programa
de Desenvolvimento da Empresa Catarinense
(Prodec) e o Programa de Fomento de Santa
Catarina (Badesc). Nos anos 1970, essa polí-
tica continuou com o Projeto Catarinense de
Desenvolvimento (PCD) e com o Programa de
Governo de Antônio Carlos Konder Reis. Com
efeito, diante de tudo isso, ocorreram a consoli-
dação e a integração da indústria catarinense à
economia nacional e internacional.
Não obstante, todo esse aparato de de-
senvolvimento econômico foi ser perdendo ao
longo dos anos 1980 e 1990, devido ao retor-
no das políticas liberais que provocaram mu-
danças estruturais significativas na indústria
catarinense. Segundo Goulart Filho (2002), é
nesse período que ocorrem a redução das ati-
vidades estatais, a reestruturação da indústria
cerâmica, o desmonte do setor carbonífero, a
reestruturação patrimonial no complexo eletro-
-metal-mecânico e no complexo agroindustrial,
a desverticalização e a retração no segmento
têxtil-vestuário e a desnacionalização no com-
plexo agroindustrial.
Já a industrialização no Rio Grande do
Sul teve início a partir da acumulação de capital
proporcionada pela principal atividade da épo-
ca, a pecuária. Essa indústria se caracterizou
pela produção de bens de consumo não durá-
veis, pelo aproveitamento das matérias-primas
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locais e pela produção de equipamentos e insu-
mos para o setor agropecuário. Assim, desde o
início, a indústria do Rio Grande do Sul manti-
nha estreita relação com a agropecuária.
A industrialização no estado gaúcho foi
beneficiada pelas dificuldades portuárias que
havia nos primeiros anos do século XX, uma
vez que a dificuldade de acesso ao estado pro-
porcionou certo isolamento do Rio Grande do
Sul em relação à concorrência da indústria do
restante do País e do exterior. Portanto, os fa-
tores de produção tinham que ser locais, assim
como o mercado de consumo.
Dada essa característica da economia
gaúcha de produzir para o mercado interno e
sua relação com o setor agrícola, a indústria
do Rio Grande do Sul ficou caracterizada, até
a década de 1950, pela produção de bens de
consumo não duráveis, pelo aproveitamento
de matéria-prima local e pelo fornecimento
de máquinas, equipamentos e insumos ao se-
tor agrícola.
No entanto, com a maior integração es-
pacial e econômica entre as regiões e estados
do País, que ocorreu depois da década de 1950,
essa vantagem locacional foi praticamente eli-
minada, e a indústria gaúcha passou a sofrer
com a concorrência dos produtos industriais
de outros estados nos mercados locais, o que
gerou transformações expressivas na estrutura
produtiva da indústria do estado.
A indústria gaúcha não estava preparada
para essa maior integração geográfica e eco-
nômica, uma vez que, em relação à indústria
paulista, a indústria do Rio Grande do Sul era
defasada tecnologicamente, com baixa esca-
la de produção, com formas arcaicas de pro-
dução e comercialização, com deficiência de
infraestrutura básica e energética. Tudo isso
contribuiu para a perda de competividade da
indústria gaúcha no mercado local e nos mer-
cados externos; ela foi paulatinamente perden-
do espaço nesses mercados para os produtos
da indústria paulista.
Tudo isso gerou uma crise na economia
gaúcha. Em meados dos anos 1960, ocorreu
um intenso debate em torno do tipo de indus-
trialização que o Rio Grande do Sul deveria
rea lizar. Assim, foi decidido que o estado de-
veria desenvolver um polo industrial dinâmico,
mas sem descuidar da indústria que utilizava
as matérias-primas locais.
Pelo lado da infraestrutura e do forneci-
mento de crédito, houve a criação do BRDE, a
criação do Conselho de Desenvolvimento do
Extremo Sul (Codesul), o aumento de recursos
derivados do então Banco Nacional de Desen-
volvimento Econômico (BNDE) que, juntos, per-
mitiram reduzir alguns gargalos em relação à
região Sudeste.
Diante disso, a indústria do Rio Grande
do Sul apresentou forte crescimento na déca-
da seguinte, sobretudo, as indústrias mais di-
nâmicas. Esse crescimento da indústria gaúcha
também foi impulsionado, em parte, pelo cres-
cimento da inovação no campo que buscava
aumentar a produtividade para a exportação
e, portanto, demandou mais máquinas, equipa-
mentos, insumos agrícolas, produtos químicos
e novas técnicas de plantio. Do mesmo modo,
o crescimento da indústria gaúcha foi em parte
provocado pelo crescimento da indústria pau-
lista, que também demandou bens intermediá-
rios da indústria gaúcha.
Nos anos 1990, com a abertura comercial
e a valorização do Real, aumentou a concorrên-
cia dos produtos importados no País e, sobre-
tudo, no Rio Grande do Sul, em decorrência
A desindustrialização na região Sul
Cad. Metrop., São Paulo, v. 21, n. 45, pp. 531-550, maio/ago 2019 541
de sua indústria ser fortemente ligada à agro-
pecuária a jusante e a montante, principalmen-
te nos setores exportadores.5 Diante disso, as
indústrias gaúchas passaram a adotar estra-
tégias com o objetivo de aumentar a produ-
tividade e se tornar mais competitivas diante
dos importados.
Não obstante, a partir de 1999, com
a desvalorização cambial e o surgimento da
forte demanda da China, deu-se início a um
novo ciclo de crescimento das exportações de
commodities relacionadas com a indústria gaú-
cha. Diante disso, o Rio Grande do Sul tornou-
-se o terceiro maior exportador do País nos
anos 2000, ficando atrás apenas de São Paulo e
de Minas Gerais.
Contudo, como visto, desde o início, a
dinâmica industrial da região Sul tornou-se
dependente do setor primário, sendo este, por
sua vez, dependente da dinâmica da economia
brasileira, sobretudo, da economia paulista e
dos mercados externos. Portanto, a indústria
sulista tornou-se, também, dependente desses
mercados. Em outras palavras, a dinâmica da
indústria da região Sul encontra-se fortemente
relacionada com o movimento da taxa de câm-
bio, do PIB dos principais importadores e dos
preços internacionais das commodities, bem
como do crescimento da economia brasileira.
Todavia, como será que se comportou
a indústria desses estados no período 2002-
2014? Será que esses estados continuaram
aprofundando seu processo de industrializa-
ção? E quanto à concentração da produção e
do emprego industrial, ocorreu alguma infle-
xão? A explicação para essas perguntas será
encontrada a partir da metodologia de Silva
(2017), cujos resultados serão analisados na
próxima seção.
A (des)industrialização na região Sul
Descrito como ocorreu o processo de industria-
lização dos estados da região Sul, esta seção
tem por objetivo verificar o comportamento da
indústria na região no período 2002-2014, com
o propósito de observar a ocorrência ou não da
desindustrialização. Para isso, será utilizada a
metodologia de Silva (2017), segundo a qual o
Rio Grande do Sul será considerado o estado
avançado em seu processo de industrialização
em relação aos demais estados da região.
A análise dos indicadores clássicos da
desindustrialização para a indústria de trans-
formação do Brasil, Gráficos 1 e 2, mostra que
ocorreu uma perda de participação em termos
de emprego de 2,3 p.p. no período 2007-2014.
No mesmo sentido, a indústria de transforma-
ção nacional apresentou uma perda de 5,8 p.p.
em termos de produção no período 2004-2014.
Essas perdas de participação mostram que
existe um processo de desindustrialização na
indústria brasileira.
No entanto, da perda de 2,3 p.p. que
a indústria brasileira apresentou em termos
de emprego, a região Sul foi responsável por
0,5 p.p. enquanto as demais regiões foram
responsáveis por 1,8 p.p. Em relação à perda
de 5,8 p.p., em termos de produção, a região
Sul foi responsável por 1,0 p.p. enquanto as
demais regiões foram responsáveis por 4,8
p.p. Portanto, a região Sul foi responsável por
parte considerável da perda de dinamismo
industrial no País, mais especificamente por
22% e 17% da perda total apresentada pela
indústria brasileira em termos de emprego e
produção respectivamente.
José Alderir Silva
Cad. Metrop., São Paulo, v. 21, n. 45, pp. 531-550, maio/ago 2019542
Gráfico 1 – Participação do emprego da indústria de transformaçãoda região Sul e do Brasil no emprego total do Brasil: 2002-2014
Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Rais (2019).
Gráfico 2 – Participação da produção da indústria de transformaçãoda região Sul e do Brasil no PIB do Brasil: 2002-2014.
Fonte: elaboração própria, a partir dos dados das Contas Regionais IBGE (2019).
A desindustrialização na região Sul
Cad. Metrop., São Paulo, v. 21, n. 45, pp. 531-550, maio/ago 2019 543
Todavia, a dinâmica do emprego in-
dustrial na região Sul está, de certa forma, re-
lacionada com a dinâmica na produção, uma
vez que se observa uma forte relação entre o
emprego e a produção da indústria de transfor-
mação na região sulista.
Quando a análise dos indicadores clássi-
cos para a indústria da região em foco é rea-
lizada considerando-se o PIB e o emprego to-
tais da região Sul (Gráfico 3), observa-se uma
trajetória de declínio em ambos os indicadores.
Em 2004, a indústria de transformação sulis-
ta era responsável por 22,8% do PIB regional
(eixo direito do Gráfico 3) e passou para 17,8%
em 2014, gerando uma perda de 5,0 p.p. no
período em foco. Em relação à participação do
emprego industrial no emprego total da região
(eixo esquerdo do Gráfico 3) também se obser-
va uma perda, passando de 74,6%, em 2007,
para 68,1%, em 2014, uma perda de 6,5 p.p.
nesse período.
Portanto, há sinais efetivos de que a in-
dústria de transformação da região Sul tem
sofrido de um processo de desindustrialização
regional. Contudo, qual a contribuição de cada
estado nesse processo de desindustrialização
regional? Será que algum estado seguiu na via
contrária, isto é, deu continuidade no seu pro-
cesso de industrialização?
Na Tabela 1, pode ser observado que em
2004, quando a indústria sulista alcançou seu
ápice em termos de participação na produção
no PIB regional, ou seja, 22,8%, os estado
de Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do
Sul foram responsáveis por 6,1 p.p., 7,9 p.p. e
8,9 p.p. desse total apresentado pela região.
Já a Tabela 2 mostra a contribuição de cada
estado no processo de desindustrialização da
região Sul em termos de emprego, de modo
que, em 2007, quando a região apresentou
seu maior percentual (74,6%) no período ana-
lisado, o estado do Rio Grande do Sul já vinha
Gráfico 3 – Participação da indústria de transformação (IT) da região Sulno PIB e no emprego total da região Sul (S): 2002-2014.
Fonte: elaboração própria, a partir dos dados das Contas Nacionais (IBGE, 2019) e da Rais (2019).
José Alderir Silva
Cad. Metrop., São Paulo, v. 21, n. 45, pp. 531-550, maio/ago 2019544
apresentando dificuldades desde 2004. Além
disso, os demais estados estavam aumentando
suas participações no emprego total da região.
Contudo, apesar de uma inflexão nesse ganho
de participação do emprego destes últimos
dois estados, em 2014 eles ainda possuíam
participações superiores às apresentadas em
2002, o mesmo não ocorrendo com o estado
do Rio Grande do Sul.
No entanto, depois da crise financeira in-
ternacional de 2008-2009, as indústrias desses
estados passaram por dificuldades, refletindo-
-se nos indicadores anteriormente analisados,
de modo que a participação da indústria de
cada estado no PIB regional caiu em 2014. A
participação de Santa Catarina passou para
5,6 p.p., a do Paraná passou para 5,8 p.p. e
a do Rio Grande do Sul passou para 6,4 p.p.,
2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Santa Catarina
Paraná
Rio Grande do Sul
5,4
6,0
7,6
5,5
7,3
8,2
6,1
7,9
8,9
6,2
7,5
8,5
6,2
7,4
7,8
6,0
7,1
7,3
6,1
6,9
7,5
5,4
6,8
7,9
5,5
6,4
7,8
5,9
6,5
7,3
5,7
5,6
6,9
5,2
6,2
6,6
5,6
5,8
6,4
Região Sul 19,0 21,0 22,8 22,3 21,4 20,5 20,6 20,1 19,7 19,7 18,1 18,1 17,8
Tabela 1 – Participação do PIB da indústria de transformaçãodos estados no PIB da região Sul: 2002-2014
Fonte: elaboração própria, a partir dos dados das Contas Regionais IBGE (2019).
2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Santa Catarina
Paraná
Rio Grande do Sul
20,5
20,2
27,6
20,6
20,8
27,5
21,8
22,0
28,4
22,1
22,2
27,0
22,9
23,0
26,8
23,5
24,1
27,0
23,1
24,1
26,4
22,5
23,8
25,5
22,5
23,5
25,6
22,1
23,2
25,3
21,4
22,7
24,5
22,1
23,0
24,2
22,0
22,6
23,5
Região Sul 68,3 68,9 72,3 71,3 72,7 74,6 73,6 71,8 71,6 70,5 68,6 69,3 68,1
Tabela 2 – Participação do Emprego da Indústria de transformaçãodos estados no Emprego total da região Sul: 2002-2014
Fonte: elaboração própria, a partir dos dados da RAIS (2019).
A desindustrialização na região Sul
Cad. Metrop., São Paulo, v. 21, n. 45, pp. 531-550, maio/ago 2019 545
constituindo uma participação total da região
de apenas 17,8% em 2014. Em relação à par-
ticipação do emprego no emprego total da
região (Tabela 2), a perda concentrou-se, so-
bretudo, no estado do Rio Grande do Sul, que
passou de 28,4 p.p., em 2004, para 23,5 p.p.,
em 2014.
Assim, é possível observar que a desin-
dustrialização na região Sul se deve, sobretudo,
ao desempenho da indústria de transformação
do estado do Rio Grande do Sul, dado que a
participação da indústria do estado de Santa
Catarina e do Paraná apresentou uma leve que-
da que se deve mais à conjuntura no período
analisado do que a uma mudança estrutural
em suas respectivas indústrias de transforma-
ção. Além disso, os indicadores analisados da
indústria de transformação do Rio Grande do
Sul sinalizam que pode estar em curso uma
mudança estrutural nesse estado.
Mas esse processo pode ser caracteriza-
do como estagnado, regressivo ou progressivo?
Para isso, é preciso analisar a evolução da par-
ticipação da indústria de transformação sulista
no PIB e no emprego industrial do Brasil, o que
pode ser visto no Gráfico 4.
Em termos de emprego, ocorreu uma ten-
dência de perda de participação até o ano de
2012, quando se iniciou uma recuperação. Con-
tudo, a participação do emprego em 2014 foi
menor do que a de 2004, quando teve início o
declínio desse indicador. Mas, quando conside-
rada a produção industrial, a região Sul obte-
ve um ganho de participação expressivo entre
2007 e 2014, cerca de 4,3 p.p.
Dessa forma, observa-se um processo de
desindustrialização regional progressivo na re-
gião Sul, uma vez que a desindustrialização na
região foi acompanhada de um ganho de parti-
cipação na indústria nacional.
Gráfico 4 – Participação da produção e do emprego da indústriade transformação da região Sul na produção e emprego
da indústria de transformação do Brasil: 2002-2014
Fonte: elaboração própria, a partir dos dados das Contas Nacionais (IBGE) e da Rais (2019).
José Alderir Silva
Cad. Metrop., São Paulo, v. 21, n. 45, pp. 531-550, maio/ago 2019546
Não obstante, é preciso analisar a com-
posição da indústria entre os estados para
poder caracterizar a desindustrialização como
progressiva positiva ou progressiva negativa.
Isto é, será que o processo de desindustriali-
zação foi seguido de uma desconcentração da
produção e do emprego industrial na região
Sul? A resposta pode ser encontrada na análise
das Tabelas 3 e 4.
Com efeito, observa-se uma desconcen-
tração da produção e do emprego entre os esta-
dos da região Sul, já que, enquanto a indústria
do estado do Rio do Grande do Sul apresentou
uma perda considerável de participação na
produção e no emprego regional, os estados do
Paraná e de Santa Catarina apresentaram um
aumento de participação.
Enquanto a participação da produção em
Santa Catarina passa de 28,4% para 31,3% e
a participação do emprego passa de 30% para
32% em relação à indústria regional no perío-
do 2002-2014, o estado do Paraná teve um
ganho de 1,0 p.p. em termos de produção e
de quase 4,0 p.p. em termos de emprego. Já,
o estado do Rio Grande do Sul teve uma per-
da de participação de produção de 4,0 p.p. e
de quase 6,0 p.p. em termos de emprego no
perío do 2002-2014.
2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Santa Catarina
Paraná
Rio Grande do Sul
28,4
31,8
39,9
26,2
34,8
39,0
26,7
34,5
38,8
27,9
33,8
38,3
29,0
34,6
36,4
29,4
34,8
35,7
29,7
33,7
36,6
27,0
33,6
39,4
28,0
32,5
39,5
29,8
32,9
37,3
31,2
30,8
37,9
29,0
34,4
36,7
31,3
32,8
35,9
Tabela 3 – Distribuição da produção da indústria de transformaçãodos estados da região Sul: 2002-2014
Fonte: elaboração própria, a partir dos dados das Contas Regionais IBGE (2019).
2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Santa Catarina
Paraná
Rio Grande do Sul
30,1
29,5
40,4
29,9
30,1
39,9
30,2
30,5
39,3
30,9
31,1
37,9
31,5
31,6
36,9
31,5
32,4
36,2
31,3
32,8
35,9
31,3
33,2
35,5
31,4
32,8
35,8
31,3
32,9
35,8
31,2
33,0
35,7
31,8
33,2
34,9
32,3
33,2
34,5
Tabela 4 – Distribuição do emprego da indústria de transformaçãodos estados da região Sul: 2002-2014
Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Rais (2019).
A desindustrialização na região Sul
Cad. Metrop., São Paulo, v. 21, n. 45, pp. 531-550, maio/ago 2019 547
Portanto, trata-se de um processo de de-
sindustrialização progressivo e positivo, uma
vez que a desindustrialização na região Sul
foi seguida de um ganho de participação na
indústria de transformação nacional e de um
processo de desconcentração da produção e
do emprego do estado do Rio Grande do Sul
para os estados do Paraná e, sobretudo, de
Santa Catarina.
Esse processo de desindustrialização
acentuado no Rio Grande do Sul deve-se ao
fato de a indústria de transformação desse
estado ser mais sensível a taxa de câmbio, a
crises externas e a perda de dinamismo da
economia brasileira do que a indústria dos
demais estados da região. A taxa de câmbio
ficou sobreapreciada no período 2004-2010,
gerando um processo de substituição da pro-
dução nacional por importados. Quando a taxa
de câmbio voltou a ficar depreciada, a crise ex-
terna e a desaceleração da economia brasileira
pós-2010 não permitiram uma recuperação da
indústria gaúcha. Combinado a isto, os preços
das commodities também caíram com a desa-
celeração da China no mesmo período. Como a
indústria gaúcha está relacionada com o setor
agrícola, essa desaceleração gerou uma queda
na demanda por máquinas e equipamentos
agrícolas, o que afetou fortemente a indústria
de bens de capital.
Considerações finais
Este artigo teve por objetivo analisar a evolu-
ção da indústria de transformação na região
Sul no período 2002-2014, com o propósito
de observar a existência de um processo de
desindustrialização.
Para isso, foi utilizada a metodologia de
Silva (2017), segunda a qual o processo de
desindustrialização regional pode ser de três
tipos: regressiva, estagnada e progressiva. No
caso da existência de um processo de desin-
dustrialização e se este for acompanhado de
um processo de desconcentração da produção
e/ou do emprego, tem-se uma desindustrializa-
ção positiva. Caso contrário, tem-se um proces-
so negativo.
Mas, antes de analisar os dados, foi rea-
lizada uma breve descrição da formação da
indústria nos estados do Rio Grande do Sul,
Santa Catarina e do Paraná. Na qual foi ve-
rificado que a indústria da região está ligada
ao setor agrícola, à economia doméstica e à
economia externa.
Em seguida, a análise dos dados mostrou
a existência de um processo de desindustriali-
zação progressiva positiva na região Sul, uma
vez que a perda de participação dos indicado-
res do emprego e da produção foi acompanha-
da de um ganho de participação na indústria
nacional e da desconcentração da produção do
estado avançado (Rio Grande do Sul) para os
estados atrasados (Paraná e Santa Catarina).
No entanto, este trabalho não esgota o
tema, mas abre espaço para uma discussão
maior, de modo que novos trabalhos possam ser
desenvolvidos no sentido de observar se o pro-
cesso de desconcentração da produção e do em-
prego industrial na região Sul tem beneficiado
as capitais dos estados, isto é, analisar a distri-
buição do emprego e da produção entre as mi-
crorregiões da região Sul. Uma análise estadual
do processo de desindustrialização também
pode ser desenvolvida, assim com uma análise
desagregada por intensidade tecnológica da in-
dústria de transformação para cada estado.
José Alderir Silva
Cad. Metrop., São Paulo, v. 21, n. 45, pp. 531-550, maio/ago 2019548
[I] http://orcid.org/0000-0002-1514-6999Universidade Federal Rural do Semi Árido, Departamento de Engenharias, campus Angicos. Mossoró, RN/[email protected]
Notas
(1) Exceto por alguns raros trabalhos como Sampaio (2015), Spindola e Lima (2014), Botelho, Sousa e Avellar (2014) Pereira e Cairo (2016) e Filho (2016).
(2) Para uma revisão conceitual sobre a desindustrialização, vide Silva e Lourenço (2014); e para, uma crítica aos indicadores clássicos, vide Silva e Lourenço (2016).
(3) Partindo da hipótese de que os estados atrasados e desenvolvidos apresentam, respectivamente, vantagens comparativas na produção de bens pouco e muito intensivo em capital.
(4) Vide Trintin (2006) e Barbosa, Carmo e Raiker (2015).
(5) Vide Calandro e Campos (2004).
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Texto recebido em 27/fev/2018Texto aprovado em 30/jul/2018