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  • 7/24/2019 a disciplina como disciplina

    1/10

    DIVERSOS

    A Psicologia Como Disciplina

    Antropol6g

    ic

    1. Introduo.

    2. A Antropologia como Ontologia.

    3. Viso Antropolgica

    dos Problemas Psicolgicos.

    1.

    INTRODUO

    4. Conceito de Pessoa

    e de Personalidade

    ELSO ARRUDA

    Por

    escolha dos meus pares, coube-me a

    honra

    de dirigir-vos as

    primeiras palavras magistrais do

    corrente

    ano, no Instituto de Psico

    logia. Embora j bastante assoberbado pelas inmeras tarefas da Di

    reo, no pude esquivar-me a essa distino, que

    eu

    pretendia fsse

    conferida a quem melhor a merecesse. Escolhi para tema os principais

    aspectos relacionados com a psicologia como disciplina antropo

    lgica.

    Sabem todos vocs que a antropologia, ramo da histria natural

    que lida com a espcie humana,

    um

    captulo da biologia a cincia

    dos sres vivos e

    uma cinci

    que

    requer

    o concurso de

    outras

    disci-

    Aula proferida na

    aberturas das

    atividades escolares de 1970,

    do Instituto

    de Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

    Arq. bras. Psic. apl.,

    Rio de Janeiro, 22 3) :131-139,

    jul./set. 1970

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    plinas, como a psicologia, a sociologia, a etnologia, enfim de tdas as

    disciplinas que, de algum modo, contribuem

    para

    o esclarecimento

    da

    natureza

    do homem. Neste caso, sem deixar de ser cientfica,

    mais cientfico-cultural

    Kulturwissenschaft)

    do que cientfico-natu

    ral

    Naturwissenschaft) ,

    e, no que tange ao conhecimento da mente

    e

    da

    conduta

    humana, pode

    ser

    entendida, como dizem os

    autores

    alemes,

    Geistwissen.schaftlich,

    ou seja, como cincia da alma humana.

    Por isso, costuma-se design-la

    Antropologia cultural para

    dis

    tingu-Ia

    da Antropologia clssica,

    que abrangia a antropometria e a

    etnografia. Por sua vez, a Antropologia filosfica, que indaga Que

    o homem e qual seu psto no cosmo? ,

    supera

    a antropologia cultu

    ral, pois considera o homem no s em seu

    ser

    natural como, tambm,

    dentro do ambiente espiritual que impregna o

    ser

    humano. A antro

    pologia cientfica e a antropologia filosfica seriam, assim, duas disci

    plinas, cuja coincidncia de preocupar-se com o mesmo objeto, o

    homem, no suprime

    sua

    radical diferena no sentido da pergunta

    que lhes

    d

    origem. Donde a necessidade,

    na

    prtica, de definir-se os

    limites

    de

    ambas para no retornarmos antiga posio da psicologia

    como disciplina filosfica.

    A antropologia cientfica nos leva ao conhecimento do homem,

    que, por seu turno, inclui o saber psicolgico e todos os saberes que

    nos permitem chegar quele conhecimento, como a biologia, a socio

    logia, a histria etc.

    No

    que tange

    a essa ltima, vale

    adiantar

    que o homem a

    criatura

    histrica

    por

    excelncia

    Mayr).

    No apenas um produto

    da evoluo biolgica. Como espcie, est historicamente ligado ao

    seu mundo e s circunstncias de

    sua

    vida (passada, presente e, por

    que no dizer, s perspectivas

    futuras).

    Por isso, Ortega y Gasset

    afirmou lapidarmente:

    o

    sO l

    10 I m circunstancia.

    Igualmente por

    isso, Van den Berg introduziu

    uma

    nova forma

    da

    abordagem hist

    rica do comportamento humano, designando-a como a teoria das

    mudanas ou

    metablrtica, que torna ainda mais vlida a introduo

    do

    parmetro

    histria

    em

    tda

    atividade que visa conhecer o homem.

    Poderamos, assim, representar a situao do homem no mundo e

    sua conduta com a frmula dinmica: C = f P X A (a conduta hu-

    H

    mana funo de sua pessoa, do seu ambiente e de

    sua

    histria).

    A histria assim um sistema - o sistema das experincias huma

    nas, que formam

    uma

    cadeia inexorvel e nica.

    O prprio conceito da cultura

    traz

    conotao histrica e biogr

    fica, pois deve-se ver a histria do homem como um todo: no

    h

    divrcio

    entre

    o homem pr-histrico, o selvagem e o homem civi

    lizado.

    H

    um

    continuum

    evolutivo. Para Ortega y Gasset, o homem

    no

    tem

    natureza, mas

    tem

    histria; e cultura um processo, que

    dura,

    exatamente

    como a vida e a existncia. No processo evolutivo,

    132

    A.B.P.A.

    3/70

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    3/10

    no foi a experincia em si que transformou os primatas em homem;

    o crebro humano seria produto

    da

    cultura (Hallowell).

    Por outro lado, a cultura smente pode ser herdada atravs de

    sua internalizao nas pessoas; um processo de criao e de con

    tnua recriao,

    j que a vida no dada, pronta, acabada; temos que

    faz-la, complet-la ns mesmos. Por isso, a vida um constante

    que

    fazer

    ou como diria Chamfort: O homem chega novio, a cada idade

    de sua vida.

    H portanto, em jgo, um permanente processo de sobrevivncia

    h u m a n ~ Por meio dsse processo, o homem se adapta s condies de

    vida, capta os conhecimentos, os desenvolve e os comunica, graas

    a sua inteligncia superior. Cultura , assim, inteligncia comunic

    vel, um processo bilateral, pela qual o homem desafia o tempo e o

    espao, aconselha-se com os mortos, guarda a experincia dos ante

    passados e acumula saber, oriundo das diversas partes da terra, qui

    do universo.

    2.

    A ANTROPOLOGIA COMO

    ONTOLOGIA

    A famosa inscrio

    Gnthi Seauton

    situada no fronto do templo

    de Delfos,

    j

    indicava que o verdadeiro estudo do homem o prprio

    homem, que deveria, preliminarmente, conhecer a si mesmo. Scrates

    afirmou que a vida, que no fsse examinada, no valia a pena ser

    vivida . Igual sentido tem a frase de Montaigne: La plus grande

    chose du monde

    c'est

    savoir

    tre

    soy. Essas afirmaes, que prece

    deram a revoluo cartesiana, simbolizada pelas frases Cogito ergo

    sum e Ego sum, ergo existo ,

    j

    indicavam o sentido antropolgico

    da investigao do ser. Ao alcanar com seu mtodo e, em seguida,

    investigar o ser pensante que o homem, Descartes criou verdadeira

    ontologia, concebeu as verdades fundamentais como experincias

    ontolgicas (Ferra er Mora), e embora no se adiantasse sua

    descoberta do sum (ser) nem perguntasse pelo sentido do ser, pode

    ser considerado como precursor da moderna antropologia, vista como

    reflexo de si mesmo para compreender a si mesmo, do ponto de

    vista da vida (Groethuysem) e como disciplina, cuja questo final

    a sua significao ontolgica do homem.

    A antropologia abrange e procura fundamentar a unidade do Ser

    e compreender o homem, atravs dessa unidade. O

    ser

    em especial o

    ser humano ao mesmo tempo o mais universal e indefinvel, porm

    mais compreensvel dos conceitos. Est sempre presente em nossa

    mente, porm sua investigao metdica exige meios adequados de

    captao.

    Como a cincia pode ser definida como um conjunto de propo

    sies verdadeiras ligadas por relaes de fundamentao,

    tem

    ela

    quanto investigao da conduta humana que utilizar mtodo apro

    priado e tomar a forma ou modo de ser dste Ente que o homem,

    ontolgicamente designado por Heidegger,

    Dasein.

    sicologia

    e ntropologi

    133

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    4/10

    inerente ao Dasein o ser-no-mundo; sua exegese deve

    ter

    como

    ponto de partida essa peculiaridade imanente do existir que inclui o

    estar no mundo (espacialidade) e a durao (temporalidade). A po

    sio do homem no cosmo (Scheler) e sua historicidade (Heidegger,

    van den Berg)

    so

    resultantes essenciais dessas imanncias.

    Portanto, a investigao do homem em geral e em suas particula

    ridades contm um sentido ontolgico e a forma de

    tratar

    o problema

    a utilizao do mtodo fenomenolgico, capaz de penetrar

    na

    inti

    midade das manifestaes do ser humano sem que se perca a noo

    de sua unidade,

    de sua

    complexidade e

    da

    globalidade

    ou

    totalidade,

    que sua caracterstica primordial. Como disse Heidegger, tda onto

    logia s possvel como fenomenologia, pois essa a nica maneira

    de torn-la evidente, aparente por si mesma.

    Em

    ltima instncia, a cincia do

    ser

    humano a antropologia;

    por

    seu turno, a psicologia de sentido cientfico sempre descansa em

    uma antropologia pois as peculiaridades do ser humano no podem

    ser investigadas sem um conceito geral

    ou

    global do homem (von

    Begsattel . A psicologia antropolgica parte do ponto de vista que

    pergunta

    pela existncia do homem sua posio no mundo sem des

    lig-lo de

    sua

    condio de

    ser

    ou ente. Exemplificando, no campo

    da

    psicologia social, a considerao antropolgica permite ver que o indi

    vduo membro de uma totalidade ntica supra-individual, na qual

    desempenha um papel ou funo. O indivduo como unidade social, a

    famlia, o casamento, os grupos sociais etc.,

    so

    totalidades nticas,

    vistas de um prisma unitrio, mesmo que essas unidades no sejam

    necessriamente simples, exatamente como ocorre na viso antropo

    lgica

    da

    cultura e

    da

    humanidade,

    em seu

    desenvolvimento histrico.

    A psicologia, como teoria

    da

    vida anmica, humana, exige que

    levemos seus

    temas

    s ltimas conseqncias. O homem deve

    ser

    assim considerado luz da pergunta: que existncia; que se realiza

    nas vivncias e quais so as possibilidades

    de sua realizao?

    A considerao antropolgica desemboca, portanto,

    em uma

    filo

    sofia

    da

    alma ou

    da

    mente

    e,

    atravs

    dela, seguindo o conceito de

    Windelband, de que filosofar pensar nos fatos at o fim, a psicolo

    gia evolutiva e a psicologia das diferenas individuais, por exemplo,

    teriam seus dados analisados em todos seus mnimos apectos,

    luz da idia global do homem, originada

    da

    realidade e

    da

    experincia.

    Afasta-se, contudo, do filosofismo, pela utilizao apropriada dos m

    todos das cincias

    naturais

    positivas, que lhe do consistncia. Cite

    mos exemplo que

    d

    Ph. Lersch, do ponto de vista antropolgico

    da

    psicologia:

    da

    faculdade humana de recordar. No homem,

    recordar

    no apenas reproduzir como em

    uma

    tela cinematogrfica ou em

    alto-falante, as imagens fotogrficas

    ou

    sonogrficas registradas

    em

    um filme ou uma fita magntica. muito mais do que isso: prever

    o futuro em funo do passado, ampliar o horizonte da existncia,

    dar

    continuidade

    linha existencial. Como diria

    C. G.

    Carus,

    atra-

    134

    A B P A 3 7(}

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    5/10

    vs da recordao, a existncia revela sua dupla face, epimetica (re

    trospectiva) e prometica (prospectiva), inseparveis. Pela memria,

    a existncia escreve

    sua

    histria,

    um

    perptuo devir (Bergson) ou,

    como diria, sua maneira, Nietzsche: um perptuo pretrito im

    perfeito. Verifica-se, portanto, que a anlise dos fenmenos e a exe

    gese ontolgica, dirigem a considerao antropolgica em psicologia;

    da serem os mtodos fenomenolgico e analtico existencial, os ade

    quados para essa maneira de abordar os fatos psicolgicos.

    Binswanger afirma que a anlise existencial no tem, no fundo,

    nada

    de

    nvo; um prolongamento

    natural da

    fenomenologia . an

    lise cientfica, emprico-fenomenolgica dos modos e

    estruturas

    dos

    fatos do

    Dasein,

    o ser humano em particular, em sua subjetividade,

    sua intersubjetividade e seu modo

    de

    ser a, e

    sua

    transcendncia.

    Que essa tendncia

    j

    se fazia

    sentir

    h muito, temos prova no con

    tedo e

    na

    disposio dos

    temas

    do Nouveau

    Trait

    de Psychologie,

    de George Dumas (em 7 volumes).

    Trata

    inicialmente,

    de

    maneira

    extensa, dos fundamentos da antropologia e sua importncia no de

    senvolvimento onto e filogentico do homem, indicando, na intro

    duo redigida pelo prprio Dumas, que: avant de traiter des

    mthodes de psychologie,

    avant

    mme d'indiquer dans une intro

    duction les tendances communes

    et

    les tendances differentes qui se

    manifestent dans ce Trait, nous avons voulu faire place quelques

    notions que nous tenons pour indispensables ceux qui tudient les

    faits de l'esprit, sans les

    separer

    arbitrairement des faits qui condi

    tionnent dans 1'organisme,

    ou

    qui les

    preparent

    dans l'evolution

    de

    l'espece. Destacam-se, logo no primeiro volume, os captulos: La Place

    de l'Homme dans la Srie Animale; Les Donnes de l Antropologie e

    e Probleme Biologique de la Conscience. Ainda mais importante indi

    cador da riqueza da concepo antropolgica em psicologia o livro

    de Philip Lersch, ufbau

    der Person

    (traduzido para o espanhol, sob

    o ttulo Estrutura da

    Personalidade

    A obra de Lersch um marco na

    psicologia contempornea e provoca, de modo definitivo, o reingresso

    da alma em psicologia, que se orienta para uma ontologia indutiva

    (Wellek),

    tendo por

    base o mtodo fenomenolgico (como anlise

    qualitativa da experincia) e o conceito de totalidade ou globalidade

    da pessoa humana, que volta a ser a chave da moderna psicologia. A

    partir da totalidade, desce Philip Lersch anlise dos fatos da expe

    rincia humana, em profundidade e em

    sua

    essncia, a saber: vida

    anmica (vivncia) persona, fundo vital e fundo endotmico, alma e

    mundo (e sua unidade) at alcanar as mais detalhadas manifesta

    es do ser humano. So revividos, ento, problemas dialticos apa

    rentemente sem importncia, na atualidade como o

    da

    unidade corpo

    e alma, vida e vida anmica etc. Para Lersch,

    tda

    psicologia no ser

    mais do que

    mera

    fachada, sem

    base

    verdadeira e sem

    estruturao

    interna, enquanto no conseguir tornar visvel, atravs de mltiplos

    fatos

    da

    experincia, uma imagem global do homem, de seu lugar no

    mundo e de seu mtuo enlace. Continua afirmando que conceito sob

    Psicologia e antropologia

    135

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    6/10

    o qual isso pode realizar-se o de pessoa. Neste, a vida anmica vista

    antropologicamente e a multiplicidade de seus contedos mutveis

    compreendida dentro da unidade da existncia humana, como algo que

    nle se realiza e em vista do qual se experimenta a si mesmo como

    "sendo no mundo".

    Cabe citar, tambm, aqui, os livros Le

    Deuxime Sexe

    de Sim

    mone Beauvoir e La

    Mujer

    de Buytendijk, ambos de base antropol

    gico-existencial. O primeiro liberta a mulher da condio primria

    de que os problemas

    da mulher foram sempre um problema do homem

    e que a histria

    da

    mulher est condicionada pela histria do homem.

    O segundo diz que a mulher homem (ente humano , cujo compor

    tamento dialticamente inseparvel da conduta daquele e cuja natu

    reza, aparncia e existncia, guardam determinadas peculiaridades.

    Destacamos tambm os trabalhos de Buytendijk sbre a dor e de

    Huizinga sbre o Homo

    Ludens.

    A dor, como todo fenmeno humano,

    existe, sentida e vivida. Como a angstia, ela rejeitada, escoto

    mizada e internalizada. A

    dor um sinal significativo, comunicativo,

    de algo que ocorre com o homem. Qualquer manifestao,

    por

    mnima

    que seja, que ocorra no ser humano, nunca pode

    estar

    desvinculada

    da

    personalidade total: um gesto, um piscar

    de

    olhos,

    um

    esgar, um

    muxxo, um

    ai

    representam

    tanto

    a personalidade total, como a mais

    complexa das aes ou os mais refinados sentimentos.

    No jgo e nas representaes, o homem se manifesta em

    tda

    plenitude. conhecido o aforismo: "No se

    representa

    bem o que no

    se tem." O jgo mais velho que a

    cultura

    e

    sua

    funo social indis

    cutvel. Nle, o homem se realiza e se completa. Nle a personali

    dade se afirma. No , portanto, um mero desgaste de energias:

    uma

    distrao, uma expanso, uma realizao, uma afirmao, em suma,

    vida

    3. VISO ANTROPOLGICA DOS PROBLEMAS PSICOLGICOS

    Os fatos fundamentais da vida psquica do homem so: O homem

    o

    ser

    animado

    por

    excelncia. Tudo o que acontece conosco, interna

    ou externamente, representa o cenrio onde se desenrola e culmina,

    do nascimento at a morte, nossa existncia projetada no mundo.

    A realidade anmica, cuja captao ingnua e emprica, no privi

    lgio, pode contudo

    ser

    vivida e comunicada em

    sua

    essncia, pelo

    artista e pelo poeta. Porm, pode ser captada sistematizadamente e

    adequadamente apresentada, pela cincia que denominamos psi

    cologia.

    O campo da psicologia se estende, assim, desde o conceito de

    vida

    at

    os transcendentes conceitos

    de

    ser

    e de

    existncia.

    Que

    a

    vida? Que

    a

    mente?

    A essncia ntima da vida continua

    sendo o mistrio mais impenetrvel com que tem lidado o homem.

    Da a impossibilidade de defini-la, sem que se caia em um trusmo

    136

    A.B.P.A. 3/70

  • 7/24/2019 a disciplina como disciplina

    7/10

    ou em uma tautologia, que nos levam a definir a coisa por ela mesma.

    As tentativas feitas, nesse sentido, resultaram em artifcios de lin

    guagem, contraditrios ou estreis, embora aceitveis, filosoficamen

    te. Assim, Claude Bernard afirmou A energia vital dirige os fen

    menos que no produz: os agentes fsicos produzem os fenmenos

    que no podem dirigir . Spinoza fz as seguintes afirmaes: Romo

    liber nulla de re minus quam morte cogitat; et ejus sapientia non

    mortis sed vitae medita io est . (No h nada sbre que um homem

    livre pense menos do que na morte; sua sabedoria surge da medita

    o sbre a vida e no sbre a morte) e Nec corpus mentem ad co

    gitatum nec mens corpus ad motum ne que ad quietem nec ad aliquid

    (si quid est) aliud determinare potest (Ningum pode determinar

    mente que pense, nem a mente pode determinar ao corpo que se mova

    ou fique quieto ou qualquer outra coisa, se que existe). Os estu

    diosos da fsica e da qumica se entusiasmaram, medida que foram

    verificando a correspondncia das leis fsico-qumicas com as leis que

    dirigem a maioria dos fenmenos biolgicos. Chegaram les a um li

    mite em que se daria a to almejada metabasis eis allo genos ,

    porm em determinado momento, tiveram que parar, porque, se

    bem verdade que muitas manifestaes vitais reproduzem a forma

    dos fenmenos fsico-qumicos (como o movimento brawniano), con

    tudo a passagem

    do

    inanimado para o animado e vice-versa, continua

    um mistrio.

    As

    passagens

    de Max Planck, de Schroedinger e de Rans Driesch

    por sse terreno, ainda insondvel, resultaram negativas. Schroedin

    ger, por exemplo, em sua monografia

    Que

    vida?

    termina em um me

    lanclico vazio de idias, perdido nas velhas questes do livre arbtrio,

    d soberania do Ego sbre as leis da natureza (Deus Factus Sum,

    L.: Eu

    me,

    tornei Deus) , finalizando

    por

    chegar experincia ltima,

    que lhe pareceu

    pOSSvel:

    a

    conscincia

    um

    singular

    cujo

    plural

    desconhecido.

    Irreverentemente, Schopenhauer perguntaria, como o

    fz a respeito da

    alma: Vida? que ma

    essa? (Geist, Leben? Wer

    ist denn der Bursche?)

    Por

    isso, devemos nos contentar em ressaltar alguns traos ou

    manifestaes que distinguem as formas vivas ou animadas das inani

    madas e que so caractersticas daquelas, pois s ocorrem nelas. No

    que nos interessa mais de perto, podemos dizer que o homem o ser

    vivo

    por

    excelncia e nle a vida uma totalidade que transborda e

    inclui o anmico (Lersch). Embora em todo ser anmico haja vida,

    nem tudo o que vive dotado de alma ou de capacidade de ter vivn

    cias. No homem, contudo, que se pode afirmar que tda vida vida

    anmica e que corpo e mente so inseparveis. Nesse sentido, Bumke

    afirma: Como corpo e mente

    Sg

    unem, no sabemos; porm, podemos

    afirmar que essa unio

    s

    d.

    Caracterizam a vida ou ser vivo: o crescimento e o desenvolvi

    mento, totalidade e estrutura; integrao e globalizao; autoconser-

    Sicologia e antropologia

    137

  • 7/24/2019 a disciplina como disciplina

    8/10

    vao, autoregulao e capacidade de regenerao; auto-atividade, co

    municao e adaptao; e temporalidade, reproduo e transmisso

    de seus caracteres.

    Vivncia e capacidade de vivenciar: Com a vivncia, a vida pene

    tra em uma nova dimenso. O anmico a vida chegada ao estado

    vigil

    da

    vivncia. Somente quem vive

    tem

    capacidade

    de

    vivenciar.

    Vivenciar viver em clivagem e tenso; uma iluminao interior,

    pela qual a pessoa se d conta do que se passa com ela e com seu

    mundo. A vivncia , portanto, o fenmeno elementar

    da

    vida anmica,

    que desborda nos sentimentos mais puros,

    nas cognies,

    na

    captao

    das essncias e nas vrias formas de comunicao, de relao inter

    humana e

    de

    valorizao (introcepo), que do direo e forma a

    tda vida genuinamente humana. Ao conjunto, d-se o nome de

    vida

    mental. Portanto, mente tudo referente pessoa que vivncia ou

    essencialmente relacionado com vivncia. Finalmente, chamaramos

    vida anmica ou

    alma

    ao palco espiritual e supra-individual do

    ser

    humano, que se sobrepe vida e vivncia, iluminando-as, numa

    nova dimenso e em um reino mais profundo e inobjetivo, de elevadas

    potencialidades (Palagyi). Como a vida, a alma indefinvel e objeti

    vamente no-captvel; porm, a cada instante, sentimos sua presena.

    Apenas se pode deduzir que

    h

    ntima ligao entre vida e alma, pois

    embora se possa afirmar que, nos animais inferiores

    h

    vida, sem alma,

    no podemos contudo afirmar que haja alma, onde no

    h

    vida.

    4.

    CONCEITO

    DE

    PESSOA

    E DE

    PERSONALIDADE

    A partir das noes bsicas apresentadas e da descrio dos fe

    nmenos, mais ou menos complexos, que ocorrem no ser humano,

    chegamos estruturao de uma totalidade: a pessoa e seu represen

    tante individual, a personalidade. Aqui, se verifica com tda plenitude,

    o aforisma da Pars pro to o e seu antagnico Toto pro pars Pela parte

    se

    conhece o todo e o todo se manifesta nas partes. Na pessoa humana

    se alcana essa transcendente peculiaridade de ser uma unidade dentro

    da multiplicidade Unitas multiplex), uma entidade individual, indi

    visvel, singular,

    aberta

    ao mundo onde vive e com o qual se relaciona,

    forma uma unidade fenomenolgica e fora da qual no pode sobrevi

    ver. A noo antropolgica-existencial bsica que a psicologia atual

    d, de personalidade, a seguinte: o padro unitrio e significa

    tivo

    de

    vida, em que o indivduo, atravs

    da

    coalescncia do mundo

    dos valres com

    sua

    prpria substncia, se

    apresenta

    com peculiares

    direo e forma de vida, genuinamente humanas. A personalidade

    pois

    uma

    categoria estritamente humana,

    que

    contm significaces

    bossociais, jurdicas, culturais e filosficas, que a

    tornam

    inimitvel,

    pelo menos

    at

    o atual nvel

    da

    razo.

    A personalidade uma totalidade com

    uma

    estrutura

    bsica

    for

    mada do fundo vital do fundo endotmico (uma esfera profunda e n

    tima das vivncias, que se manifesta nas pulses, emoes e senti-

    138

    A.B.P.A. 3/70

  • 7/24/2019 a disciplina como disciplina

    9/10

    mentos) e do setor externo das vivncias (conscincia e orientao,

    conduta ativa) e uma estrutura superior (atividades no tica e teleo

    blica, inteligncia e espiritualidade), e se integra com o mundo ex

    terno, formando com o mesmo uma unidade indissolvel. A indisso

    .ciabilidade do homem e do mundo, resulta do fato de que o mundo na

    tural exerce sua influncia sbre o homem como sbre qualquer ser

    vivo, porm o homem capaz de influir, por seu turno, sbre a natu

    Teza

    e

    mesmo, modific-Ia, criando novas condies, adaptando-se

    s suas necessidades e comodidades. No apenas o mundo natural,

    :mas tambm o mundo cultural, como so vivenciados, resultam da

    maneira como o homem insensivelmente os modifica ou transforma.

    J dissemos em outro trabalho que o homem est por

    trs

    das

    :grades por le mesmo implantadas, representadas pelas restries

    que a vida em comunidade impe. Afetado assim, em sua comunica

    bilidade, em sua liberdade, em sua naturalidade, o homem

    se

    angustia.

    Por

    isso, le estrutura e elabora conscientemente sua existncia e seu

    Saber acrca do universo, e ao mesmo tempo, objetiva sua prpria

    existncia e toma posio no cosmo. E por isso, tambm, surge a an

    gstia como sua sinistra companheira (Jaspers), e condio perma

    nente do

    ser no mundo.

    Essas, as consideraes que julguei interessante trazer-vos nesta

    -abertura de nossos cursos.

    IDORT

    - Instituto

    de

    Organizao Racional

    do Trabalho

    tem por finalidade: est.udar, difundir e aplicar

    os

    princpios e

    mtodos de racionalizao, no intuito de aumentar o

    bem-estar

    social, cooperando para o aumento da eficincia e coordenao

    do

    trabalho, em todos os seus ramos, de modo a

    proporcionar

    s ativi-

    dades

    produtores

    de riquezas ou de servios o mximo proveito para

    c indivduo, para a organizao e para a coletividade, pela elevac

    da produtividade e maior respeito dignidade da pessoa humana.

    J sica1Qgla

    e ntropologi

    139

  • 7/24/2019 a disciplina como disciplina

    10/10

    t vasto o programa editorial da UNESCO

    No

    Brasil sse valioso acervo de

    obras versando sbre aspectos variados das atividades culturais educacionais e

    cientficas do homem encontra-se sua disposio na Fundao Getlio Vargas

    atravs do seu Servio de Publicaes de suas Livrarias ou de seus revendedores

    autorizados em todo o Pas.

    Qualquer que seja o seu campo de atividade solicite o catlogo de obras da

    UNESCO a qualquer uma das nossas Livrarias ou a um dos nossos agentes de

    vendas autorizados.

    LIVRARIA ;

    Praia de Botafogo 188

    Caixa Postal 21.120

    Rio

    de Janeiro

    GB

    Avenida Graa Aranha 26

    Lojas C e H

    Rio de Janeiro

    GB

    Super Quadra 104 - Bloco A

    Loja

    Braslia DF

    Avenida

    Nove

    de Julho 2029

    Caixa Postal

    5534

    So Paulo SP

    AGENTES AUTORIZADOS

    Cear - Cincia e Cultura

    Rua

    Edgar Borges 89

    Fortaleza CE

    Organizao Sulina de Representaes

    Av

    Borges de Medeiros

    1030

    Prto Alegre RS

    KAPPA

    - Ind. e Com. Ltda.

    Rua

    Dr. Villa Nova 321

    So Paulo SP

    Fornecedora de Publicaes Tcnicas

    M M

    de Oliveira Marques

    Av Ipiranga

    200

    - Loja 40

    So Paulo

    SP

    Agncia Van Damme

    Goitacazes 103 s / 131

    Belo Horizonte MG

    Livraria Ghignone

    Quinze de Novembro

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    Curitiba

    PR

    Livraria Civilizao

    Brasileira S.

    A

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    Padre Vieira 9

    Salvador

    BA

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    Inijosa

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    Dantas Barreto 564

    13.

    0

    andar

    - s/1308

    Recife PE