a economia da saude

62
A ECONOMIA DA SAÚDE DESAFIOS PARA INCORPORAÇÃO DA DIMENSÃO ECONÔMICA NA PRODUÇÃO DE INFORMAÇÃO PARA A GESTÃO DO SUS EM SÃO PAULO

Upload: alex-itria

Post on 27-Dec-2015

24 views

Category:

Documents


2 download

TRANSCRIPT

Page 1: A Economia Da Saude

A ECONOMIA DA SAÚDE

DESAFIOS PARA INCORPORAÇÃO DA DIMENSÃO ECONÔMICA NA PRODUÇÃO DE INFORMAÇÃO PARA A GESTÃO DO SUS EM SÃO PAULO

Page 2: A Economia Da Saude

A ECONOMIA DA SAÚDE

DESAFIOS PARA INCORPORAÇÃO DA DIMENSÃO ECONÔMICA NA

PRODUÇÃO DE INFORMAÇÃO PARA A GESTÃO DO SUS EM SÃO PAULO

Page 3: A Economia Da Saude

A ECONOMIA DA SAÚDE

DESAFIOS PARA INCORPORAÇÃO DA DIMENSÃO ECONÔMICA NA

PRODUÇÃO DE INFORMAÇÃO PARA A GESTÃO DO SUS EM SÃO PAULO

A ECONOMIA DA SAÚDE

© Secretaria Municipal de Saúde, Escola Municipal de Saúde

Produção: Coordenação de Epidemiologia e Informação – CEInfo

Todos os direitos reservados. É permitida a reprodução parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte e não seja para venda ou qualquer fim comercial.

A responsabilidade pelos direitos autorais de textos e imagens desta obra é da Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo. O conteúdo dos textos publica-dos neste livro é de total responsabilidade dos autores.

FICHA CATALOGRÁFICA

São Paulo (Cidade), Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo. Co-ordenação de Epidemiologia e Informação (CEInfo). A Economia da Saúde: Desafios para incorporação da dimensão econômica na produção de informação para a gestão do SUS em São Paulo/ Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo. Coordenação de Epidemiologia e Informação (CEInfo), São Paulo, 2012.

AutoresCapítulo I. Januario Montone. Capítulo II. Sebastião Antônio Loureiro

de Souza e Silva, Tereza Setsuko Toma, Patrícia Coelho de Soárez. Ca-pítulo III. Oswaldo Y. Tanaka, Denise Cavallini Cyrillo, Edina Mariko Koga da Silva, Paola Zucchi. Capítulo IV e Capítulo V. Helio Neves, Katia Cristina Bassichetto.

DescritoresEconomia da saúde. Tecnologia em Saúde. Financiamento do SUS. SUS

(BR). Política de Saúde.

Apoio:

Page 4: A Economia Da Saude

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO – Margarida Lira 7

CAPÍTULO IO desafio de compatibilizar necessidades em saúde e o financiamento do SUS: importância da economia da saúde para a gestão do SUS na cidade de São Paulo – Januario Montone 11 CAPÍTULO IIEconomia da Saúde no processo de decisão e gestão de programas, ações e serviços de saúde

Intervenção do coordenador – Sebastião Antônio Loureiro de Souza e Silva 35

1 – Avaliação de Tecnologias em Saúde e avaliações econômicas: importância, método e desenvolvimento no mundo e no país – Tereza Setsuko Toma  43

2 – Uso da avaliação econômica nos processos de decisão de incorporação de novas tecnologias em saúde – Patrícia Coelho de Soárez 53

CAPÍTULO III Avaliação de tecnologia em saúde para tomada de decisão: impacto epidemiológico e econômico

1 – Custos para avaliação de tecnologias em saúde – Denise Cavallini Cyrillo 73

2 – Medicina Baseada em Evidências e Avaliação de Tecnologias em Saúde – Edina Mariko Koga da Silva 85

3 – Avaliação de tecnologia em saúde para tomada de decisão: repercussão epidemiológica e econômica – Paola Zucchi 87

Intervenção do coordenador – Oswaldo Y. Tanaka  97

CAPÍTULO IVConclusões e recomendações: próximos passos – Helio Neves e Katia Cristina Bassichetto 101 CAPÍTULO VRede de Avaliação de Tecnologia e Economia da Saúde – RECON – Helio Neves e Katia Cristina Bassichetto 115

Page 5: A Economia Da Saude

7•

A P R E S E N TAÇ ÃO MARGARIDA M. T. DE AZEVEDO LIRA1

Este livro pode ser considerado parte das iniciativas da Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo (SMS-SP) no sentido da incorporação de conhecimento nas áreas de economia e avaliação de tecnologias em saúde na produção da infor-mação para a gestão do SUS.

É fruto do Seminário “Desafios para incorporação da dimensão econômica na produção de informação para a gestão na SMS-SP”, realizado em 28 de setembro de 2012, que teve os seguintes objetivos:

• Aproximar gestores e profissionais quanto ao conhecimento nas áreas de economia e avaliação de tecnologias em saúde e da sua incorporação na produção da informação. • Explorar a aplicação das áreas de economia e avaliação de tecnologias de saúde na Gestão do SUS na cidade de São Paulo. • Apresentar o estado da arte sobre esta temática no plano local, nacional e internacional.• Lançar a Rede de Estudos e Cooperação em Economia e Avaliação de Tecnologias da Saúde na SMS-SP.

O Seminário foi organizado pela Coordenação de Epidemiologia e Informa-ção (CEInfo) da SMS, órgão cuja missão é “promover a produção e o uso da informação voltada para a gestão de políticas públicas de saúde e melhoria das condições de saúde para a população da Cidade de São Paulo”.

Considerando a complexidade da cidade, a incorporação de um novo campo de conhecimento na SMS está sendo tratada como um objeto em construção e as iniciativas de desenvolvimento institucional da CEInfo incluem a demanda de ampliação de suas atribuições para aprimorar o suporte aos processos de decisão e gestão na SMS-SP. Isto tem requerido o desenvolvimento de competências para a produção de informação estratégica; informação/avaliação econômica sobre tec-

1 Coordenadora da CEInfo – SMS – SP.

Page 6: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•8 9•

nologias de equipamentos, produtos e processos; bem como o desenvolvimento de tecnologia de informação e avaliação na área de Economia da Saúde.

Para além da aproximação conceitual, pretende-se identificar necessidades e abordagens que favoreçam contribuições e formulações coletivas, dando início, des-ta forma, ao processo de Planejamento Estratégico para o alcance destes objetivos.

É neste contexto que a proposta de registro do conteúdo apresentado no Se-do conteúdo apresentado no Se-minário ganha uma dimensão particular e se configura como um marco histó-rico da compreensão da CEInfo sobre a necessidade de aprimorar a produção de informação de caráter estratégico, voltada aos processos de gestão relativos à formulação e acompanhamento de políticas de saúde, qualificação do diálogo interinstitucional de políticas públicas e para pensar a melhoria das condições de saúde da população de São Paulo.

O livro se propõe a retratar o conteúdo apresentado no Seminário organiza-do pela CEInfo e contou com o apoio do Professor Eduardo Mota do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia. A equipe da CEInfo que organizou o evento e o material para o livro foi composta por Margarida M. T. de Azevedo Lira, Katia Cristina Bassichetto e Hélio Neves. Após uma primeira apresentação do Secretário Municipal da Saúde de São Paulo, tratando da rele-vância desta área do conhecimento para o aprimoramento da gestão, se seguiram dois painéis temáticos, compartilhados por profissionais que atuam nesta área, em diferentes instituições. Cada um dos painéis foi coordenado por dois ilustres professores universitários, que também debateram os conteúdos ali trazidos, en-contrando pontos em comum e aspectos complementares, além de exercer um papel mediador junto aos participantes do evento, que enriqueceram as mesas de dúvidas e comentários relevantes.

Todos os conteúdos apresentados no Seminário foram transcritos e os pa-lestrantes foram convidados a desenvolver conteúdo para este livro, baseado no conteúdo das falas realizadas no Seminário. Apenas a representante do Ministério da Saúde, Clementina Corah Lucas Prado, não conseguiu participar desta inicia-tiva, em função da sua agenda de trabalho.

Esperamos que esta publicação seja orientadora e inspiradora de outras ini-ciativas, certamente serão necessárias para que se atinja o objetivo proposto de incorporação da dimensão econômica na produção de informação para a gestão na SMS-SP e marque o início do processo de Planejamento Estratégico para o alcance destes objetivos.

CAPÍTULO I

DESAFIOS PARA A INCORPORAÇÃO DA DIMENSÃO ECONÔMICA NA PRODUÇÃO DE

INFORMAÇÃO PARA A GESTÃO NA SMS-SP

Page 7: A Economia Da Saude

11•

O D E S A F I O D E CO M PAT I B I L I Z A R N E C E S -S I D A D E S E M S AÚ D E E O F I N A N C I A M E N TO D O S U S : I M P O R TÂ N C I A D A E CO N O M I A D A S AÚ D E PA R A A G E S TÃO D O S U S N A C I D A -D E D E S ÃO PAU LO 1

JANUARIO MONTONE2

A decisão de organizar a Recon na Secretaria Municipal de Saúde da cidade de São Paulo está baseada na importância crescente da ferramenta Economia da Saúde na organização e gestão do sistema de saúde e na minha expectativa de que ela possa ajudar São Paulo a avançar, superando os limites que lhe são impostos hoje pelo esgotamento da capacidade de financiamento do município. É uma limitação presente em todas as capitais e maiores cidades brasileiras e a ideia é incentivar o debate de alternativas que possam ser construídas a partir do uso da Economia da Saúde como ferramenta para identificar as falhas estruturais do sistema e as oportunidades de construção de consensos capazes de superá-las ou reduzir seus impactos.

O Brasil vem passando por grandes transformações lastreadas em três grandes conquistas dos brasileiros: a redemocratização materializada na Constituição de 1988; a conquista da estabilidade econômica a partir do Plano Real; e o amplo processo de inclusão social e redução das desigualdades que está em curso. O SUS, próximo de completar seus 25 anos, não pode e não vai ficar imune a esse processo, porque as bases sociais que levaram à sua concepção estão em profunda alteração. Trata-se então de ampliar nossa capacidade de entendimento dessa rea- lidade em transformação de forma a apoiar a construção de consensos técnicos que nos permitam construir os consensos políticos necessários.

Como vamos usar São Paulo como base é importante registrar alguns grandes números desta cidade-estado de 11,3 milhões de habitantes, uma cidade que é a

1 Conferência apresentada em 28/9/2012, no Seminário: Desafios para incorporação da dimensão econômica na produção de informação para a gestão na SMS-SP.2 Secretário municipal da Saúde de São Paulo.

Capítulo I

Page 8: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•12 13•

veis para assegurar à população a melhor assistência à saúde e o melhor estado de saúde possível, tendo em conta meios e recursos limitados”.

ESTABELECER EVIDÊNCIAS PARA CONSTRUIR CONSENSOS

Saúde e Desenvolvimento

Alocação de Recursos

Regulação Econômica em

Saúde

Financiamento das Ações e

Serviços de Saúde

DESAFIOS DO SUS

• Financiamento Sustentável• Acesso e Modelo de Regulação• Modernização de Gestão• Modelo de Governança• Relação Público Privado

Eficiência das Ações e Serviços

de Saúde Economia da Saúde

Quando eu falo de trazer o instrumental da Economia da Saúde para esse debate estou me referindo à possibilidade usá-los como ferramenta de gestão do sistema de saúde e de integração do subsistema público de assistência à saúde e do subsistema privado, a saúde suplementar.

Ao analisarmos os grandes temas da Economia da Saúde o que se verifica é que essa sempre foi uma agenda externa ao SUS, sempre foi algo apropriado mais pelo setor privado de saúde do que pelo setor público e acabou quase virando uma dis-cussão de exclusão, quer dizer, nós, no setor público não discutimos custo, discu-timos a necessidade; quem discute custo, quem discute valor é o setor privado que quer reduzir o custo para aumentar seus lucros. Criamos, num certo sentido, uma aversão às informações econômicas, que na verdade são dados de realidade. O nú-mero, a rigor, não expressa uma posição, a leitura do número pode expressar uma posição política, ideológica, temática, mas o número em si, dificilmente. Eu creio que a Economia da Saúde pode crescer dentro do setor saúde como um todo, aí in-cluindo o setor privado, porque talvez pela experiência de ter passado pela Direção da Agência Nacional de Saúde na regulamentação dos planos privados de assistên-cia à saúde6, eu sempre fui e sou muito cioso de que nós tenhamos a noção de que o setor privado de saúde pertence ao SUS, não é um corpo estranho e sempre que ele é visto como um corpo estranho, ele se desloca, ele se descola e faz uma política própria, que não é uma política pública de saúde, mas uma política de mercado.

6 Diretor-presidente da – ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar (dez./1999 a dez./2003).

O desafio de compatibilizar necessidades em saúde e o financiamento do SUS

nossa alegria e a nossa dor em todas as ações de saúde. Como planejar o combate à dengue numa cidade com 3,5 milhões de imóveis? Como discutir os impactos no meio ambiente da circulação de seis milhões de veículos? É uma cidade mui-to rica, 12% do PIB brasileiro é produzido aqui, mas também muito desigual. Temos mais de 1,2 milhão de pessoas vivendo em condições subnormais de ha-bitação, o que é mais do que a população de 90% dos municípios brasileiros. Temos no coração desse portento, que é a cidade de São Paulo, uma outra cida-de profundamente desigual que é desvendada pelo trabalho técnico dos nossos especialistas da CEInfo quando constroem o Índice de Necessidade em Saúde (INS), que nós passamos a usar como verdadeiro instrumento gerencial. Eles, a rigor, não fizeram mais do que confirmar e demonstrar que as áreas de maior concentração dessa população vivendo em condições subnormais são as de maio- são as de maio- maio-res necessidades em saúde na nossa capital. A Região Metropolitana de São Paulo com seus 39 municípios e uma população de 19 milhões de habitantes, que só é menor que a do próprio estado de São Paulo, não é diferente reunindo a pujança e a desigualdade do estado maior rico da Federação.

A Região Metropolitana conta com cerca de 20 mil3 equipamentos de saúde registrados no CNES4, dos mais variados tipos, dos quais 14 mil5 estão na capital. São mais de 300 hospitais – 200 deles na capital.

Desses equipamentos existentes na Capital, 945 são unidades próprias da rede municipal de saúde. Houve uma expansão muito grande, hoje nós temos 441 Unidades Básicas de Saúde (UBS), 120 unidades de Assistência Médica Ambu-latorial (AMAs), enfim, são 945 equipamentos de saúde próprios, além da rede própria estadual e dos serviços privados contratados pela Secretaria Estadual e pela Secretaria Municipal de Saúde para atender a população. Com toda essa pujança, nós sabemos o quanto estamos longe, não só a Capital, mas na Região Metropolitana e, na verdade, no país, de construir um SUS com atendimento de qualidade.

A Economia da Saúde e os Desafios do SUS

Segundo Del Nero (Brasil. Ministério da Saúde, 2012) a Economia da Saúde é “o ramo do conhecimento que tem por objetivo a otimização das ações de saú-de. Ou seja, o estudo das condições ótimas de distribuição dos recursos disponí-

3 19.488 equipamentos de saúde.4 Cadastro Nacional de Equipamentos de Saúde (CNES).5 14,079.

Page 9: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•14 15•

há mais da onde buscar recursos. Não há uma luta política: “Vamos aumentar…”, a luta política já veio, já chegou, já avançou, nós temos agora é de descobrir uma maneira de isso virar outra coisa. Na cidade de São Paulo, a expansão quantitativa vem acontecendo. O investimento adicional à Emenda 29 permitiu um cresci-acontecendo. O investimento adicional à Emenda 29 permitiu um cresci-mento quantitativo do que se faz no SUS na cidade de São Paulo. Nós já atingi-mos 35 milhões de consultas entre a Secretaria Municipal e a Secretaria Estadual na Capital. Isso, na verdade, já ultrapassa os 2,5 a 3 consultas por habitante/ano que é o parâmetro considerado no setor. A nossa rede de AMAs já ultrapassou mais de 10 milhões de consultas por ano, as consultas de especialidade já estão muito próximas do padrão de 22% da Portaria 1.101, essa abertura de portas de acesso, evidentemente, levou a uma pressão de prescrições de medicamento, de exames laboratoriais. Atingimos 2,5 milhões de prescrições atendidas mensalmen-te na cidade e 27% delas vêm do setor privado, devidamente registradas, porque o nosso sistema é informatizado. Ao mesmo tempo nos aproximamos de 40% de cobertura da Estratégia de Saúde da Família (ESF). A pressão por exames, labora-toriais e de imagem, decorrentes também da abertura das consultas, ultrapassa 70 milhões aqui também somando Município e Estado. São 8,5 milhões de cartões SUS ativos. A diferença para a população SUS Dependentes, que é estimada em 6,5 milhões de habitantes, provavelmente está na questão do medicamento, por-que mesmo os usuários do setor privado sem uma nova consulta, apenas com a receita, a prescrição do próprio médico privado, acessam o nosso sistema.

Então, quantitativamente, em relação aos parâmetros da Portaria 1.101, nós avançamos muito, mas todos sabemos o quanto estamos longe ainda de ter um sistema adequado e um sistema que a população reconheça como adequado, não só em São Paulo, como no Brasil todo.

Creio que nesses últimos dois meses devo ter respondido umas 50 vezes so-bre a pesquisa que o DataFolha fez em julho de 2012 em seis capitais incluindo São Paulo, onde “saúde” apareceu como o maior problema da cidade para 29% da população. Ocorre que nas seis capitas pesquisadas pelo DataFolha a saúde foi o maior problema. Em Recife, foi o maior problema com 18%; em São Paulo, com 29%; em BH, com 33%; em Curitiba, com 36%; em Porto Ale-gre, com 37% e no Rio de Janeiro, com 46%. Dois meses antes, uma pesquisa nacional do DataFolha apontou a saúde como maior problema do Brasil para 39% da população. Evidente que, num ambiente de debate político eleitoral, esses números surgem com conotações diferentes, mas o que estou querendo reforçar é que, no Brasil todo, há um esforço nacional em relação à construção e nós continuamos muito longe, tanto na nossa visão gerencial e técnica, quan-to na visão da população, de ter um Sistema de Saúde que seja reconhecido pela própria população e ela defenda como os ingleses defenderam o seu sistema de saúde na abertura das Olimpíadas de Londres.

Estou convencido de que os gestores do SUS têm cada vez mais de incorporar essa dimensão do setor privado de saúde e trazer o ferramental que foi desenvolvido com foco no setor privado, como uma ferramenta de gestão do sistema de saúde, que nós vamos usar no setor público e vamos usar no setor privado e vamos usar no setor público, inclusive, para regular e controlar a ação do setor privado, porque se não o fizermos ficaremos emparedados nesse debate ao longo do tempo.

O que se percebe olhando com um pouco de tranquilidade os grandes temas é a contribuição que este ferramental pode nos dar em relação aos desafios do SUS, porque nós estamos chegando ao limite, não há muito que expandir nesse momento. Não só a cidade de São Paulo, mas os municípios de uma forma ge-ão só a cidade de São Paulo, mas os municípios de uma forma ge-, mas os municípios de uma forma ge-ral, os municípios grandes, em particular, estão atingindo o seu limite de com-petência do ponto de vista de implantação do Sistema Único de Saúde (SUS). Ontem mesmo, uma matéria do jornal Valor, falava que as capitais brasileiras já investem, em média, 19,3% do orçamento em saúde, ou seja, 28% a mais que a vinculação de 15%.

São Paulo cumpriu o cronograma da Emenda 29 e em 2004 aplicou os 15% da Receita Corrente7. São Paulo atingiu isso, cresceu nesse investimento a partir daí chegando a ultrapassar os 20%8 em certo momento. Fechamos 2011 em 19,35% rigorosamente nos termos da Emenda 29, ou seja, sem incluir os 187 milhões do nosso Hospital do Servidor Público Municipal e sem incluir outros R$ 200 milhões/ano referente aos inativos da Saúde. São exclusivamente as despesas de-finidas na Emenda 29. Não há mais espaço para grandes discussões de ampliação desse patamar no município, nem aqui, nem em lugar nenhum. Temos de lem-brar que Educação também tem uma vinculação institucional de 25%, no caso de São Paulo é 31%, e praticamente não há uma capital brasileira que não tenha um problema sério de serviço da dívida. No caso, em São Paulo é de 13%. Chegamos ao seguinte quadro: 22% de gastos totais na Saúde9, 31% alocados em Educação e 13% no serviço da dívida, temos um comprometimento de 66% do Orçamen-to. Claro que Educação com 31% e a dívida a 13% são situações específicas, eu não vi capitais com menos de 6 a 9% de serviço da dívida, então se ficarmos na média teremos (Saúde = 19,3% + Educação = 25% + Dívida = 9%) num total de 53,3% do Orçamento das Capitais comprometido nessas três grandes linhas. Então, a capacidade de expansão é reduzida e nós passamos a depender de ganhos tecnológicos, de ganhos de produtividade, de ganhos de integração, porque não

7 A regulamentação da EC 29/2000 determinava o aumento progressivo dos gastos entre 2000 e 2004 quando deveria ser atingido o patamar mínimo de 15% da Receita Corrente.8 20,42% em 2009.9 Gastos totais = gastos aceitos pela Emenda 29 + outros gastos.

O desafio de compatibilizar necessidades em saúde e o financiamento do SUS

Page 10: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•16 17•

Participei de um debate recente com o secretário municipal de saúde do Rio de Janeiro, Hans Dohmann, em que ele informava um investimento de quase 24% em saúde em 2012 e uma expansão de cobertura da ESF de 3% para 20% em quatro anos. A Associação Paulista de Medicina10 encomendou ao DataFolha uma pesquisa nacional de satisfação dos usuários de planos de saúde e o resultado foi que 77% tiveram problemas nos seus planos nos últimos dois anos. Então, nós não estamos registrando a insatisfação dos usuários apenas com o SUS.

Falando da cidade de São Paulo, eu avalio que para continuarmos construindo um Sistema realmente competente, eficaz e integrado teremos de vencer ao menos quatro grandes desafios: (a) o financiamento sustentável, porque o Município che-gou ao limite e temos de avançar na construção de alternativas; (b) a integração com a rede estadual, o que não é um privilegio só da cidade de São Paulo porque no Brasil inteiro o papel do nível estadual do SUS ainda não é uma coisa muito clara e isso tem impactos negativos tanto na questão do financiamento, quanto na questão da integração das redes, como mostrarei mais adiante; (c) a integração com a Região Metropolitana, que não só aqui, como todo lugar, em todas grandes capi-tais, ela é fundamental, porque normalmente o centro maior acaba atraindo dentro da regra de regulação do SUS e fora da regra de regulação do SUS, principalmente nas fronteiras; (d) a integração com o Setor de Saúde Suplementar que na cidade de São Paulo cobre 45% da população, no mínimo, mas o gestor do SUS só tem as estimativas, as estatísticas, porque ele não tem acesso ao cadastro de usuários das operadoras de planos privados de assistência à saúde.

Reforçando este desafio em particular, esse desconhecimento do gestor mu-nicipal em relação aos usuários do setor de saúde suplementar cria um imenso problema de planejamento e de competição desleal do setor privado em relação ao SUS. O setor privado tem na capacidade de pagamento e flexibilidade de contratação diferenciais competitivos que o sistema público nunca vai alcançar principalmente se mantida essa dupla miopia em que um setor dá as costas para o outro como se um dia um dos dois fosse acabar. O gestor SUS típico passa a acreditar que um dia o setor privado desaparecerá e o gestor privado típico parece pensar que um dia o setor será desregulamentado e se livrará dos contro-les do SUS. Eu, particularmente, acredito que nenhum dos dois vai acabar, não haverá desregulamentação, e nós temos de conviver com isso.

Os desafios que eu vejo para São Paulo, na verdade, são os reflexos municipais do que eu considero os principais desafios do SUS: (a) o financiamento susten-tável; (b) o modelo de acesso e regulação; (c) a modernização dos instrumentos de gestão no SUS como um todo; (d) o modelo de governança do SUS, que foi importante para a construção do sistema, mas é um modelo construído no

10 Onde estamos realizando este Seminário.

passado, num Brasil que não é o Brasil que nós temos hoje; e (e) a relação setor público versus setor privado.

“Macroeconomia” da Saúde

As ferramentas da Economia da Saúde podem construir evidências que aju-dem a construir consensos, porque são desafios extremamente espinhosos, tanto do ponto de vista técnico, como do ponto de vista político para que sejam ultra-passados. A governança do SUS, por exemplo, é feita entre atores autônomos, cada município tem uma autonomia gerencial, constitucional, então é um deba-te muito difícil de ser feito.

Seria utilizar a metodologia da medicina por evidência na avaliação dos temas Macroeconômicos do setor saúde, apoiando a construção de ferramentas espe-cíficas que melhorem nossa capacidade coletiva de discussão e de construção de alternativas que possam orientar e fazer avançar. A meta seria a de “estabelecer evidências para construir consensos”.

Apenas para ilustrar as possibilidades dessa iniciativas faço a seguir algumas abordagens superficiais de cada desafios apontado:

Financiamento sustentável

A Organização Mundial de Saúde (OMS) vem incluindo um novo indicador entre os que tradicionalmente são usados para avaliar os investimentos em saúde de cada país, como o percentual do PIB gasto em Saúde. Trata-se da relação entre os Gastos Públicos em Saúde como percentual dos Gastos Públicos Totais, in-dependente do PIB, independente do que seja. Em 2006 os Gastos Públicos em Saúde representavam 4% dos Gastos Públicos Totais e avançamos muito porque em 2008 já estávamos próximos de 7%11 e isso nos coloca na frente da Índia, que se mantém abaixo de 5%. Porém, Rússia e China estão mais próximos de 10% e nossos “países exemplos” como Inglaterra e Espanha estão em 15% e o Canadá, França e Alemanha estão acima disso.

Avaliando o que acontece especificamente no Brasil, o gasto governamental em saúde tem crescido. A Tabela a seguir12 demonstra isso com valores em Reais de 2010, deflacionados pela média anual do IPCA. O Gasto Público Nacional

11 Relatório da Organização Mundial de Saúde de 2011, base de dados de 2008. 12 A Saúde no Brasil em 2030, FIOCRUZ (et al.), Rio de Janeiro 2012, cuja leitura eu recomendo.

O desafio de compatibilizar necessidades em saúde e o financiamento do SUS

Page 11: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•18 19•

em Saúde dobra no período de 2000 a 2010, passando de R$ 64,79 bilhões em 2000 para R$ 138,71 bilhões em 2010. Vejam que no período abordado pela OMS esse valor foi de R$ 101,54 bilhões em 2006 (4% do Gasto Público Total) para R$ 119, 94 bilhões (quase 7%).

PARTICIPAÇÃO NO FINANCIAMENTO DO SUS – 2000 A 2010

Ano Federal % no total Estadual % no total Municipal % no total TOTAL

2000 38,74 59,8% 12,02 18,6% 14,03 21,7% 64,79

2001 40,04 56,1% 14,73 20,7% 16,55 23,2% 71,32

2002 40,64 52,8% 16,56 21,5% 19,76 25,7% 76,96

2003 38,93 51,1% 17,51 23,0% 19,71 25,9% 76,15

2004 43,94 50,2% 21,53 24,6% 22,05 25,2% 87,52

2005 46,70 49,7% 21,67 23,1% 25,5 27,2% 93,87

2006 49,17 48,4% 23,89 23,5% 28,48 28,0% 101,54

2007 51,58 47,5% 26,27 24,2% 30,77 28,3% 108,62

2008 53,62 44,7% 30,77 25,7% 35,55 29,6% 119,94

2009 61,21 45,9% 33,88 25,4% 38,35 28,7% 133,44

2010 61,97 44,7% 37,02 26,7% 39,72 28,6% 138,71

100%

60%

20%

90%

50%

10%

80%

40%

0%2000 20042002 2006 20092001 2005 20082003 2007 2010

70%

30%

Federal Estadual Municipal

A Tabela demonstra também a participação de cada esfera de governo no financiamento do SUS no período de 2000 a 2010, o que nos permite verificar claramente que tivemos uma dramática mudança na composição desse financia-mento. Os valores nominais crescem muito, no caso da União, ele passa de R$ 38,74 bilhões para R$ 61,97 bilhões de reais, mas, proporcionalmente, a parti-cipação da União que era de 59,8% em 2000 cai para 44,7%. Há um aumento no total dos recursos disponíveis ao SUS e há um importante desfinanciamento federal. Esse desfinanciamento – e aqui falamos do total de recursos federais, sejam transferências fundo a fundo, programas e outros gastos – é dramático por vários motivos, não é só pelo patamar, mas principalmente pela capacidade de intervenção redistributiva que hoje é exclusiva do recurso federal. Essa é a situação, em 2010, na Região Metropolitana de São Paulo. Na cidade de São Paulo, houve um investimento em saúde com recursos próprios de R$ 4,25 bilhões. Os outros 38 municípios somados atingiram um investimento de R$ 2,89 bilhões. E a União, nesses 39 municípios da Região Metropolitana, fez uma transferência, nas várias modalidades de R$ 2,37 bilhões. A parcela federal é a única, na verdade, capaz de ser equalizadora entre os municípios, porque o recurso estadual não tem gestão municipal, o modelo atual não é de transfe-rência fundo a fundo aos municípios, então ele é menos equalizador, uma vez que se dá pela implantação direta de serviços estaduais e não pela negociação econômico financeira, pelo apoio ao financiamento de ações específica dos mu-nicípios. Então, o fato de você ter uma redução no recurso federal não é só um debate de valores, é inclusive um debate de como se organiza o Sistema, porque hoje é o único recurso que serve de instrumento para induzir a racionalização da rede metropolita em seu conjunto. Por outro lado, enquanto tivemos essa importante redução de aplicação direta dos recursos federais no SUS, assis-timos a um importante aumento dos chamados gastos tributários. Os leigos entendiam gasto tributário como renúncia fiscal, mas a legislação brasileira e o consenso dos técnicos brasileiros já há muito tempo definiram que a renúncia fiscal é um gasto tributário, porque na verdade significa um recurso que você teria à disposição e abriu mão. Segundo a Receita Federal os gastos tributários no setor saúde são compostos pela renúncia fiscal decorrente de abatimento de despesas médicas no Importo de Renda de Pessoas Físicas e Jurídicas, no setor de Produtos Químicos, Farmacêuticos e de Medicamentos e referente às entidades Filantrópicas da Saúde. A somatória estava num patamar inferior a R$ 10 bilhões em 2006, mas já se aproximou dos R$ 14 bilhões em 2011 e a provisão, da Receita Federal, para 2012 era de quase R$ 20 bilhões. O gasto tributário de quase R$ 14 bilhões em 2011 deve ser equivalente aos gastos do Ministério da Saúde com o sistema SIA/AIH, ou seja o pagamento de todos os serviços prestados pelo SUS em todo o Brasil.

O desafio de compatibilizar necessidades em saúde e o financiamento do SUS

Page 12: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•20 21•

Usando como base o ano de 2010 podemos construir uma imagem sem refi-namento técnico, mas com dados oficiais do Ministério da Saúde (gastos públi-cos), Receita Federal (gastos tributários) e ANS (receita do setor de saúde suple-mentar). Isso nos leva a um total de gastos em saúde de R$ 234,42 bilhões em 2010, sendo que R$ 138,71 bilhões (59% do total) são gastos públicos em saúde e R$ 95,71 bilhões (41%) do setor privado, composto pela somatória da receita do setor de saúde suplementar e dos gastos tributários. Também podemos dizer que o gasto privado representou o equivalente a 69% do gasto público num país que tem um sistema universal de saúde e no qual o setor privado cobre cera de 25% da população.

SUS (União + Estados + Municípios) Setor Privado (Receita S. Supl. + GT)

GASTOS EM SAÚDE – BRASIL – 2010 (R$ BILHÕES)

Total = R$ 234,42 bilhões95,71

138,71

Esse é um quadro que não se sustenta a longo prazo, em quaisquer dos lados da equação e os instrumentos da Economia da Saúde podem nos ajudar a de-monstrar isso cada vez mais claramente, apoiando a busca de alternativas.

Acesso e Modelo de Regulação

Se abordamos o Modelo de Regulação novamente encontramos nos temas ligados à Economia da Saúde – como eficiência das ações e serviços e alocação de recursos – instrumentos poderosos para apoiar essa discussão. Como se esta-belece uma linha de cuidados no SUS? Ela é necessariamente fragmentada pelos Níveis de Atenção definidos para cada esfera. Um cidadão pode ser atendido em unidades das três esferas do SUS ao longo da linha de cuidado de seu trata-mento. Seu primeiro atendimento pode ter ocorrido numa unidade municipal

de Atenção Básica, com diagnóstico e início de tratamento numa unidade espe-cializada estadual e um procedimento cirúrgico em hospital estadual ou federal, além de um pós-operatório que pode ter sido do estado ou do município. Como garantir um fluxo razoável e um acolhimento aceitável nessa linha de cuidado composta por três níveis independentes entre si? É uma provocação? Claro que é uma provocação, mas no setor privado, nós temos uma experiência de regulação, com todas as diferenças possíveis é claro, mas guarda alguma semelhança com a parceria institucional que o SUS significa entre Município, Estado e União, que é o sistema de cooperativas médicas, as Unimeds. O Sistema Unimed hoje deve ser composto por centenas de Unimeds independentes, com atuação municipal, intermunicipal e estadual, mas, para atender a Legislação, elas têm uma Unimed Nacional, que complementa os serviços das Unimeds estaduais e municipais, de forma que um cidadão que compre um plano nacional da Unimed terá aten-dimento garantido em qualquer Unimed do Brasil. Se comprou esse plano na cidade de São Paulo e estiver, digamos, na cidade de Manaus, ele vai ser atendido em Manaus, pela Unimed de Manaus, dentro do que o plano dele previu e a Unimed de lá tem todo um sistema de compensação, pagamento etc. O Sistema se organizou para atender a legislação e disputar o mercado numa câmara de compensação com centenas de parceiros independentes entre si, mas estrategica-mente organizados no modelo (cooperativa) e numa marca (Unimed).

O que eles fazem nada mais é do que o nosso sistema de regulação, só que não com a regulação propriamente dita, mas regulam o acesso por demanda espon-tânea, mas o Sistema está estruturado e em pleno funcionamento, ele existe no mundo real, mesmo que em regras diferentes do SUS que tem acesso universal, porém gerenciado.

Modernização da Gestão

Quando falamos da Modernização da Gestão os temas de Economia da Saúde podem, no mínimo, nos fornecer dados de comparabilidade, quer dizer, o que é mais adequado hoje? Todos nós, no SUS e no Estado, procuramos alternati-vas para melhorar os serviços prestados ao cidadão. Existem discussões muito avançadas de uma nova reforma administrativa capitaneada pelo Ministério do Planejamento, com estudos publicados, consultas públicas, minutas de Projetos de Lei. Nós, do SUS, temos já instrumentos de Consórcios Intermunicipais, a modelagem das Fundações Estatais (a Fundação Pública de Direito Privado), as Parcerias Público-Terceiro Setor, as Organizações Sociais, as Parcerias Público--Privadas, que começam a surgir no setor saúde, nós já temos algumas implanta-das e outras em discussão. Do ponto de vista, não da opção de política pública,

O desafio de compatibilizar necessidades em saúde e o financiamento do SUS

Page 13: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•22 23•

porque cada gestor ou cada instância governamental vai fazer a sua diante de suas circunstâncias, mas eu falo do ponto de vista de ter instrumentos de compara-bilidade para tomar essas decisões, nós certamente podemos usar muito desse ferramental da Economia da Saúde e, a partir dele, ter decisões tecnopolíticas mais eficazes e efetivas para cada caso concreto, independentemente da posição política conceitual de cada um.

Modelo de Governança

O Modelo de Governança do SUS tem de lidar com (i) atores independentes, (ii) gestão por construção de consensos e (iii) limite de gastos arbitrados a partir dos limites do orçamento federal.

Tive a oportunidade de participar de alguns debates recentes e, num de-les, os representantes da indústria farmacêutica reclamavam que o processo de aprovação de uma linha de pesquisa envolve 28 atores governamentais di-ção de uma linha de pesquisa envolve 28 atores governamentais di- uma linha de pesquisa envolve 28 atores governamentais di-ferentes. No SUS, a rigor, nós temos mais de cinco mil atores envolvidos nos processos de decisão! O Modelo de Governança do SUS envolve todos os entes federativos, o que inclui a União, os 26 Estados e o Distrito Federal e os 5.500 Municípios brasileiros. Temos de construir políticas públicas a partir disso e nós continuamos a fazer isso como se a internet não existisse, como se as redes sociais não existissem.

O mesmo atraso verifica-se nas informações para tomada de decisões. A nos-sa burocracia estatal de controle econômico financeiro é tão detalhada – e tem de ser porque nós lidamos com o dinheiro público – que nos “esquecemos” de transformar essa massa de informações contábeis em dados gerenciais. Os gastos em Saúde do setor público de qualquer Prefeitura, do Estado ou União, quando você expõe aquele emaranhado de contas orçamentárias que só os especialistas conseguem entender – às vezes acho que nem eles… – e, pior, são sempre valo-res agregados, globais, que não demonstram, do ponto de vista prático, quanto custa uma unidade ou serviço dentro do sistema, ou quanto se gastou de alguma coisa dentro do sistema. Algumas áreas já têm experiências avançadas nisso, mas o SUS como um todo não tem, nós não conseguimos, com rapidez, dizer quanto custa uma consulta de atenção básica numa cidade como São Paulo, nós vamos dizer que “Olha, na rubrica tal o que se aplicou foi tanto, da fonte estadual, da fonte…e por aí vai”, mas não transformamos essa parafernália de números em re-latórios gerenciais, nem para nós mesmos. Vão dizer: “Ah, estão escondendo…”, não estão, não tem mesmo, porque não conseguimos transformar as informações num ferramental consistente, interativo e amigável. Parece incrível num mundo onde não existe decisão gerencial que não seja baseada em informações estrutura-

das, nos sistemas chamados de BI (business intelligence), ferramenta corriqueira em todas as organizações modernas. Vocês têm ideia que o orçamento da Secre-taria Municipal de Saúde da cidade de São Paulo é equivalente ao faturamento da Rede Globo? O orçamento aqui, eu vou repetir, é equivalente ao faturamen-to da Rede Globo. Agora comparem, e é óbvio que são ações diferenciais, mas comparem os instrumentos à disposição dos tomadores de decisão. O Brasil já está chegando ao século XXI, mas os nossos instrumentos de gestão ainda estão na primeira metade do século XX, para ser generoso.

Relação Público e Privado

Quando falamos do desafio de rever a relação público-privado, que é trágica, creio que é possível avançar muito também, com as discussões de avaliação e incorporação tecnológica e da necessidade de modernizar os nossos instrumen- e da necessidade de modernizar os nossos instrumen-tais e nossos parâmetros assistenciais.

Num rápido olhar, o que se pode observar hoje da dificuldade do gestor no nível municipal, principalmente em relação ao setor privado: há uma expansão de provedores privados por oferta espontânea de mercado ou de construção de mercado, não há uma política pública de indução ou restrição. Exemplo disso foi a entrada absurda de equipamentos de diagnósticos de última geração nes-se período recente, do real valorizado em relação ao dólar. Vou mostrar mais adiante os efeitos dessa “não política” que facilita a aquisição de um tomógrafo de última geração por U$ 400 mil dólares, gerando uma pressão de utilização pela oferta.

A saúde suplementar em qualquer cidade deste país é um comprador mais competitivo do que o gestor do SUS, não é só para contratação de profissio-nais como o médico; é o médico, a clínica, qualquer serviço que se analise, o setor de saúde suplementar, se vier competir com o SUS, ele nos tira o pro-fissional, ele nos tira o hospital, o que for. Há um estudo recente apontando que o SUS perdeu 42 mil leitos hospitalares. É fato que 10 mil, pelo menos, se referem a reforma psiquiátrica e, digamos, outros 15 mil sejam por mudança tecnológica do atendimento, melhoria da atenção ambulatorial e redução das internações, mesmo assim, nós estaríamos falando de 15 mil leitos a menos para o SUS no Brasil.

O modelo de medicina curativa adotado pelo setor de saúde suplementar tem um efeito ainda mais perverso numa cidade como São Paulo, porque o nosso usuário do SUS, e são 6,3 milhões, quer um SUS igual ao plano de saúde, ou seja, porta aberta. Ele não quer um SUS gerenciado, ele não quer um SUS mode-lo de saúde da família inglês, ele não quer ser “obrigado” a passar por um clínico

O desafio de compatibilizar necessidades em saúde e o financiamento do SUS

Page 14: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•24 25•

geral para ir a um cardiologista. Uma cidadã da periferia de São Paulo não admite chegar numa unidade de saúde pura do Programa de Saúde da Família13 e en-contrar só um médico da família, que é um generalista, ou só um médico clínico geral. Ela exige ginecologia, exige pediatria para o filho dela porque o padrão é de medicina por autorreferência, que temos no setor privado, é a herança mais cruel da estruturação do setor privado no Brasil. Particularmente, acredito que a cultura que criamos no país no período em que o setor privado ficou desregula-mentado é mais danosa para a organização do Sistema de Saúde do que a questão econômico-financeira propriamente dita, porque as pessoas se assustam quando você fala que o SUS é um sistema gerenciado. A imprensa se assusta, os gestores privados se assustam. Vivemos uma situação recente relativa ao Cartão SUS, com players do setor público vindo discutir implantação de um novo cartão usando a seguinte linha de raciocínio: “Não, mas aí, tendo um cartão com chip, ele (o usuário) pode entrar na internet e marcar um cardiologista”; “Não pode, não senhor”. Ou: “Ele pode pedir um medicamento dele pela internet”; “Não, não pode não senhor, porque o SUS não é assim”, mas nem nós, abrimos essa dis-cussão com força, ficamos incomodados não é, por quê? Porque tem o histórico americano do “managed care” e do “gatekeeper” e a resistência aos seus desman-dos. Essa foi uma experiência trágica da minha trajetória no Serviço Público; ainda como Diretor-Presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar, eu abri um debate no setor e nós exigimos que além de tudo que os planos oferecem por demanda de mercado e decisão própria e demanda dos seus usuários, eles tivessem um produto regulado, com gatekeeper etc., que teria necessariamente preços inferiores, e caiu o mundo. Nós tivemos de voltar atrás em uma semana: “Está interferindo no ato médico, está interferindo na liberdade de livre escolha do paciente”! E acabou a discussão e ela nunca mais voltou. Mas o SUS é isso, não é mesmo? Assistência gerenciada: “as ações e serviços púbicos de saúde inte-gram uma rede regionalizada e hierarquizada…14”. O SUS não é o setor privado, mas nos grandes centros é pressionado a atender como se fosse.

Além de tudo, o gestor público tem de conviver com o “usuário surpresa”. Todos os dados estruturados pela CEInfo são para 11 milhões e 300 mil habitan-tes, sendo as estimativas da população SUS dependente apenas isso, estimativas a partir das fontes disponíveis. Nós reduzimos a proporção da unidade básica de saúde por habitante de 1 unidade/29.500 habitantes para 1 unidade/ 25 mil habitantes, mas é para o total da população, então esse dado é cego, na verdade. Em conversa com dirigente do Ministério da Saúde soube que foram fornecidos

13 Insisto em utilizar “Programa” e não “Estratégia” pela baixa autonomia técnica, subfinanciamento e modelo de transferência de recursos do Programa.14 Do Artigo 198 da Constituição de 1988.

31 milhões de “números SUS” para Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que já os colocou no cadastro dos usuários de planos e os informou às operadoras, assim as novas carteiras vão trazer além do número da operadora, o número SUS, o cartão do plano também será um cartão do SUS. Perguntei se nós, gestores municipais, teríamos acesso a esse cadastro e fui informado que não, apenas as operadoras e a ANS. Então, do ponto de vista de organizar o Sistema, é um passo imenso e é desesperador ao mesmo tempo, porque a informação estará lá e o gestor não terá acesso à informação, por quê? Porque o cadastro do bene-ficiário tem proteção de sigilo comercial na regulamentação, os planos nunca abriram mão disso, mas temos de superar isso, porque nós abrimos uma unidade nova em uma região e, quando ela funciona bem, você atrai inclusive o usuário do setor privado. Então, você tem de planejar o tempo todo para 11,3 milhões de habitantes e vocês verão o resultado desse absurdo!

Esse quadro tenta mostrar um pouco dos impactos dessa distorção – e falo de São Paulo, para não falar da “casa alheia”. O parâmetro utilizado é o da Portaria MS nº 1.101/2002, que é o nosso padrão atual.

DUPLICIDADE E DESPERDÍCIO

São Paulo (11.300.000 hab.)

Previsto Existente SUS

Tomógrafos 1: 100 mil hab. 113 253 60

Ressonância Magnética 1: 500 mil hab. 13 128 24

São Paulo SUS (6.300.000 hab.)

Previsto Existente SUS

Tomógrafos 1: 100 mil hab. 63 253 60

Ressonância Magnética 1: 500 mil hab. 13 128 24

Aplicados para toda a população paulistana, de 11,3 milhões de habitantes, os parâmetros da portaria indicam a necessidade de 113 Tomógrafos e 23 equi-pamentos de Ressonância. Nós temos 253 equipamentos de Tomografia e 128 de Ressonância Magnética. Para atender o SUS, nós temos 60 Tomógrafos, dos 253 existentes, e 24, dos 128 equipamentos de Ressonância. Quando aplicamos exclusivamente à estimativa de população SUS Dependente, de 6,3 milhões de habitantes, os equipamentos disponíveis ao SUS ficam um pouco mais próximos da necessidade no caso dos Tomógrafos, com 60 equipamentos disponíveis ao SUS para 63 necessários, e ultrapassamos a necessidade de Ressonância que seria de 13 equipamentos e temos 24 à disposição do SUS.

O desafio de compatibilizar necessidades em saúde e o financiamento do SUS

Page 15: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•26 27•

Essa imensa pressão de oferta ao setor privado pressiona o setor público na proporção de exames solicitados. Os números são muito eloquentes. A quanti-dade esperada de solicitação de exames de tomografia e ressonância, que é um percentual do total de consultas esperadas, está na faixa de 50 mil exames/ano para Tomografias e 10 mil exames/ano para Ressonância. A rede SUS, unida-des municipais e estaduais, realizou em São Paulo 150 mil exames em 2004 e atingiu 400 mil exames em 2011, ou oito vezes o esperado! Para Ressonância foram 30 mil exames em 2004 e mais de 85 mil em 2012, também oito vezes mais que o esperado.

E temos fila para Ressonância, temos reclamações de falta de exames, é tema de debate político, é tema de imprensa, o que é isto aqui? Do que nós estamos falando aqui? Aqui nós não estamos falando de falta de recurso. Defendo forte-mente que o nível federal aumente os recursos do SUS, mas aqui falo de coisas que já estão acontecendo, sendo pagas pelo SUS, inclusive em escala federal – até onde nós vamos com isso? Aonde esse debate vai ser feito com um ferramental que não seja esse do debate político? Parece logico que os parâmetros da Portaria devem estar tecnicamente bastante desatualizados, então também há uma neces-sidade de revisão, mas, vamos dizer que hoje seja o triplo, a produção continuaria sendo suficiente, mesmo falando em população total, não da população SUS Dependente.

Os parâmetros da Portaria nº 1.001/2002 adaptados para o indicador de Taxa de Utilização que foi desenvolvido pela ANS para o setor de saúde suplementar e mede o número de exames realizados por grupo de 1.000 usuários, nos daria as seguintes referências de exames esperados: 5,04 exames/ano de Tomografia por grupo de 1.000 habitantes e 1,01 exame/ano de Ressonância. Um forte indica-dor de que os parâmetros atuais necessitam de revisão é que o SUS15 atingiu em 2011 uma Taxa de Utilização de 4,2 exames/1.000 hab. Para ressonância e de 17,6 exames/1.000 hab. para Tomografia.

Na cidade de São Paulo16 as taxas de utilização em 2011 foram de 7,9 exa-mes/ano para Ressonância e 35,8 exames/ano para Tomografia, considerando a população total. Se considerarmos a população SUS Dependente chegamos a 14,4 para Ressonância e 64,4 para Tomografia. Lembremos que ao menos 45% dos paulistanos têm acesso ao setor privado, cuja taxa de utilização, no segmento seguradoras de saúde, foi de 108,4 exames/ano para Ressonância e 107,8 exames ano para Tomografia.

15 Indicadores Assistenciais 2011 – Boletim da Saúde Suplementar – Fenasaude, 2012.16 SMS/SP e Indicadores Assistenciais 2011 – Boletim da Saúde Suplementar – Fenasaude, 2012.

Se somarmos esses dois componentes teremos que os 11,3 milhões de paulis-tanos realizaram 112,8 exames de Ressonância/1.000 habitantes e 172,2 exames de Tomografia/1.000 habitantes quando o esperado seriam, respectivamente, 1,01 e 5,04 exames/ano!

300,0

300,0

300,0

300,0

300,0

300,0

300,0

4,2

SUS

(Bra

sil)

SUS/

SP To

tal

SUS/

SP S

US

Dep

.

FEN

ASA

ÚD

E

Cana

Esta

dos

Uni

dos

Fran

ça

Chile

Aust

rália

7,9 14

,4

108,

4

46,7

97,7

60,2

7,4 23

,0

17,6 35

,8

64,4

107,

8

126,

9

265,

0

145,

4

50,2

93,0

TAXA ANUAL DE UTILIZAÇÃO (2011)

Ressonância Tomografia

O quadro acima compara essas taxas de utilização com a de vários países. Considerando a somatória público e privado, ou seja, 112,8 para Ressonância e 172,2 para Tomografia, a cidade de São Paulo está próximo dos padrões ame-ricanos. Fazemos 2,5 vezes mais Ressonância que o Canadá e 35% a mais de Tomografias. Em relação à França são 87% a mais de Ressonâncias e 18% de Tomografias. Se olharmos para a Austrália temos quase 5 vezes mais Ressonâncias e 85% mais Tomografias!

Então, tomando qualquer deles como parâmetro de avaliação estaríamos acima do necessário e, repito, continuamos a ter filas, esperas, reclamações. Qual desses países é o correto tecnicamente? Tenho, cada vez, a convicção de que esse conjunto de informações, que pode ser coletado e processado com as ferramentas da Economia da Saúde, pode nos ajudar nesse debate e talvez nos ajudem, também, nesta discussão que eu tenho chamado de Terceira Onda da Reforma Sanitária.

O desafio de compatibilizar necessidades em saúde e o financiamento do SUS

Page 16: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•28 29•

A Terceira Onda da Reforma Sanitária

O SUS foi uma imensa conquista social e política construída, ao longo de anos de lutas, pelos heróis do Movimento pela Reforma Sanitária, que se trans-forma numa política de Estado na Constituição de 1988 e, depois, com a Lei Orgânica da Saúde17 de 1990, em que se estabelece um sistema de saúde público, universal, incluindo a população que não estava ligada ao mercado formal de trabalho. Claro que foi o início de um processo. Quando cheguei ao Ministério da Saúde, nos idos de 1997, o que eu identificava ainda era o antigo Inamps, mas a estrutura conceitual é a estrutura da Reforma Sanitária. Então a Primeira Onda da Reforma Sanitária foi o próprio SUS.

A Segunda Onda ocorre entre 1998 e 2000 com dois movimentos comple-mentares importantes. Um deles foi a Emenda 29, que significou muito mais do que a CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira) para o nosso setor, como vocês sabem; a CPMF ajudou o gestor da saúde, garantindo um fluxo de recur-sos regular e permanente, mas ela não acrescentou recursos financeiros, porque o que entrava, cada real que entrou como CPMF, saiu um real de outra fonte, para outra atividade, então o patamar de recurso da saúde não se alterou. Óbvio que há uma discussão política de que “o recurso da CPMF foi usado em outras finalidades”, mas não é verdade, os recursos da CPMF foram usados na saúde, mas houve substituição de fontes. A regularidade do fluxo financeiro foi uma enorme vantagem para o gestor. Uma vantagem que os mais jovens aqui nem vão perceber, porque nós não convivemos com a inflação há um bom tempo, mas quem era gestor lá nos idos do início da CPMF se lembra que as áreas econômi-cas em geral, e nenhuma escapou disso, liberavam recursos para saúde depois de setembro, outubro. Então, no final do ano, o balanço era bonitinho, transferiu todo o recurso previsto, só que o gestor não conseguia usar porque o ano acabava. Além disso, os valores eram do orçamento nominal e a inflação já havia corroído 30%, 40%, 50%, 60% do valor real do orçamento. Era a chamada “festa da uva” e você não tinha como explicar para a população isso, por quê: “Mas como? O orçamento era um milhão, você recebeu um milhão, você que não conseguiu gastar esse dinheiro lá no final do ano”, então, a CPMF nos ajudou, aos gestores, porque ela obrigava a transferência mensal, como o fluxo era automático, movi-mentou a conta bancária, descontava CPMF, agregava no Sistema, então o gestor de saúde, principalmente o federal, passou a ter fluxo de caixa, passou a receber o valor nominal no mês, então em termos de ganho gerencial e ganho real pelo valor do recurso foi uma vitória, por conta da inflação. Quando a inflação galo-

17 Lei nº 8.080/1990.

pante acaba, isso vira só substituição de fonte mesmo. A Emenda 29 é diferente, ela realmente vincula um percentual da receita, caso dos Estados e Municípios, ou define um patamar mínimo de evolução do orçamento, no caso federal, ou seja, estabelece uma garantia.

O outro movimento foi a regulação do setor privado, cuja Lei é de 1998, mas começa a operar de fato a partir do ano 2000, com a criação da Agência Nacio-nal de Saúde Suplementar. Começam a ser criados os instrumentos para regular o mercado privado e o fazê-lo “conversar” um pouco mais com o setor público.

O que eu deixo sempre como reflexão, ou como provocação, é se nós não esta-mos no momento da Terceira Onda da Reforma Sanitária, que é olhar isso tudo que já foi construído e olhar o estado das artes e refletir sobre ele.

O quadro que se segue, apesar de tosco, tenta mostrar um pouco desse siste-ma, que embora único é constituído de dois subsistemas de assistência à saúde, um público a que têm direito todos os brasileiros e outro privado a que tem acesso 25% da população. Dito de outra forma, 25% dos brasileiros têm dois sistemas de saúde, o público e o privado, e os outros 75% dos brasileiros têm apenas o sistema público.

SISTEMA NACIONAL DE

SAÚDE197 milhões

SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE

SAÚDE COMPLEMENTAR

ASSISTÊNCIAÀ SAÚDE

ASSISTÊNCIAÀ SAÚDE

VIGILÂNCIA: Sanitária,

Epidemiológica e Ambiental

47 milhões

SUS – Sistema Único de Saúde ou SNS – Sistema Nacional de Saúde

Às vezes, em alguns debates, eu ainda encontro gestores do SUS que acham que o setor privado vai acabar se “fingirmos que ele não existe, trabalharmos direi- não existe, trabalharmos direi-mos direi-tinho e a população ficar satisfeita com o SUS, acaba o setor privado”. Não sei se acaba, pelo tamanho dele, talvez ele já seja “grande demais para quebrar”. O setor privado, por sua vez, age como se, em algum momento, a regulamentação do setor

O desafio de compatibilizar necessidades em saúde e o financiamento do SUS

Page 17: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•30 31•

fosse desaparecer e eles pudessem voltar à competição selvagem da implantação do mercado. A legislação é muito ampla na garantia dos usuários, certamente ainda temos um problema de “enforcement” , mas a legislação é muito avançada e somos o único país que regulou o produto “saúde” no mercado. Vários países regulam a movimentação financeira do setor privado de saúde, nenhum regula o produto que ele vende, como produto “saúde”. Vivemos uma dupla miopia, ou quase isso, um setor de costas para o outro. O setor de saúde suplementar com uma receita atendendo 47 milhões de pessoas com R$ 80 bilhões de orçamento em 2010, fora a renúncia fiscal, e o setor público atendendo a totalidade da população com R$ 138 milhões, no mesmo ano de 2010. Quer dizer, no fundo, nós temos aqui uma espécie de Sistema Nacional de Saúde Virtual, uma espécie de sujeito oculto aqui nessa discussão que deveria, talvez, estar mais presente fazendo com que a política de saúde integral e integradora dos dois subsistemas. Política que, por exemplo, integrassem a demanda por leitos hospitalares. Na cidade de São Paulo temos 35 mil leitos hospitalares, mas só metade atende o SUS. Tivemos um crescimento de quase 800 leitos municipais e 600 leitos estaduais, entre 2005 e 2011, mas o SUS da cidade de São Paulo perdeu mais de mil leitos, então o crescimento líquido foi inferior a 300 leitos. O setor privado revê um crescimento líquido de 4 mil leitos, no mesmo período. Então, do que nós estamos falando aqui?

O Ministro Jatene já apresentou uma proposta criando um modelo de Outorga Onerosa, similar ao do setor imobiliário. Quem tiver interesse em construir novos hospitais ou ampliar hospitais existentes nas regiões que já possuem o número de leitos por habitantes estabelecido nos parâmetros assistenciais, compraria da Prefeitura uma Outorga Onerosa efetuando o pagamento com o financiamento de leitos na periferia que só o poder público atende.

Esse sujeito oculto aqui talvez precisasse entrar no debate e esse sujeito oculto é o Estado, é evidente. É o Estado, não é o mercado, mas não é uma regulação para extinguir o setor privado, mas para construir um Sistema Nacional de Saú-de, integrado estrategicamente.

E, de novo, creio que o instrumental da Economia da Saúde pode, ao longo do tempo, nos ajudar na missão de melhorar a saúde, melhorar a condição das pessoas no dia a dia, construindo um ferramental técnico, um ferramental teóri-co, argumentos válidos e transparentes, que nos permitam avançar no SUS para o século XXI. Foi uma vitória política brasileira ter construído o SUS. Hoje o mundo todo começa a olhar para nosso sistema e discutem como pode ser apli-cado em seus países, mas talvez seja o momento de nós mesmos olharmos para essa experiência já construída, “subir nas costas dos nossos antecessores e olhar para frente”, usando uma figura de linguagem muito nossa. Olhar para o século XXI e usar todo o ferramental técnico disponível na área de saúde, ultrapassando aquela visão de isso é coisa da direita liberal. Ultrapassam os que dizem … “Mas

isso é de direita, isso é conversa de setor privado! O senhor é privatista.” Não sou, não e, em minha opinião, isso não é conversa de setor privado não, o setor privado foi mais rápido em agregar essas ferramentas em benefício do modelo de negócio deles, não no modelo de saúde, porque no Brasil ainda temos pelo menos uma geração para que o setor de saúde suplementar seja um modelo de saúde alternativo e não um modelo de negócio. Ele já está muito melhor do que estava há 10 ou 15 anos, quando era desregulado, mas ainda não é um modelo de saúde, ele ainda é um business na área de saúde e não é razoável que o ferramental da Economia da Saúde permaneça como um privilégio do setor privado

Nós, gestores do SUS, temos de entender que esse setor privado faz parte do SUS não para só ficarmos olhando, mas com todas as decorrências, inclusive discutir o seguinte: temos 45% de usuários de planos de saúde na cidade de São Paulo e Boa Vista, capital do Acre, tem 8%, mas ambas recebem o mesmo valor per capita do Piso da Atenção Básica e o setor privado não tem o menor incentivo para crescer no Acre, ou na região Norte como um todo, pelas dificuldades de garantir a grade de serviços obrigatórios. Quem pode estabelecer uma política pública que olhe para as características de ambos os subsistemas e use os pontos fortes de um para alavancar as deficiências do outro.

O agente oculto dessa discussão é o gestor público, mas nós gestores públicos temos necessariamente de nos qualificar ao longo do tempo, para essa discussão. E essas ferramenas que são construídas hoje no Ministério da Saúde, em diversas Secretarias Estaduais de Saúde, na Academia18, nós temos de apropriar isso como uma ferramenta do SUS e eu espero que São Paulo, neste momento, dê esse passo de apoio a uma visão que o Ministério tem desenvolvido e eu espero que seja uma semente para que o Conares – que congrega o Conselho Nacional dos Secretários Municipais de Saúde, os Secretários de Saúde das Capitas e os Presidentes dos Con-selhos Estaduais de Secretários Municipais de Saúde – proponha que isso aconteça nas capitais brasileiras, porque se somarmos apenas as cidades com mais de 200 mil habitantes, estamos falando de 60% da população brasileira. Se conseguirmos desenvolver ferramentais adequados pra estruturar o “nosso negócio”, que é fazer saúde pública para a população brasileira, o nosso negócio não é vender a saúde, é fazer a saúde, eu creio que daremos uma grande contribuição para essa construção do SUS do século XXI. Eu continuo acreditando que a única maneira de defender o SUS, de verdade, é fazer com que ele funcione de verdade. Bom trabalho, obri-gado e espero ter sido mais lowprofile possível, que não é a minha característica, mas o momento exige, para que essa iniciativa fique marcada como uma discussão tecnopolítica no setor saúde, fora do cenário que vivemos quando atravessamos a rua nesse ano eleitoral. Muito obrigado e bom trabalho a todos.

18 Em São Paulo as três principais Universidades têm áreas de Economia da Saúde.

O desafio de compatibilizar necessidades em saúde e o financiamento do SUS

Page 18: A Economia Da Saude

33•

CAPÍTULO I I

ECONOMIA DA SAÚDE NO PROCESSO DE DECISÃO E GESTÃO DE PROGRAMAS, AÇÕES

E SERVIÇOS DE SAÚDE

Page 19: A Economia Da Saude

35•

I N T E R V E N Ç ÃO D O CO O R D E N A D O RSEBASTIÃO ANTÔNIO LOUREIRO DE SOUZA E SILVA1

Obrigado pelo convite da Coordenação de Epidemiologia e Informação da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo para participar deste importante Seminário. A minha função como Coordenador é estimular o debate sobre os vários desafios para a incorporação da dimensão econômica na produção da in-formação para a gestão da saúde.

O meu agradecimento aos Coordenadores deste Seminário, que além do seu objetivo científico tem outra dimensão, digamos, emocional que se refere ao trabalho coletivo de construção do SUS. Isto porque no período que an-tecede a VIII Conferência Nacional de Saúde e as discussões do capítulo de Saúde na Constituição Federal de 1988, participei como Presidente da Asso-ciação Brasileira de Saúde Coletiva – Abrasco – de várias reuniões políticas, aqui na Sede da Associação Paulista de Medicina. Quero com este fato sinalizar a aliança estratégica construída entre a classe médica e uma organização da so-ciedade civil de recorte acadêmico, mas com muita expressão entre os diversos profissionais de saúde pública. Acredito que esse espírito de aliança permitiu que houvesse sucesso na incorporação em nossa Constituição de propostas que possibilitaram a construção do SUS como um sistema fundamentado no direito à saúde e na equidade. Então é muito importante estar aqui agora para participar deste debate e, como o Secretário Dr. Januário se referiu a uma terceira onda de reformas na saúde, para construir novamente esse arco de alianças e um possível consenso sobre os desafios da incorporação da Econo-mia na gestão da Saúde. Pois esse desafio interessa àqueles que trabalham na gestão pública da saúde e se preocupam com financiamento, custos, alocação eficiente dos recursos. Todos nós, médicos e outros profissionais da saúde, te-mos como missão contribuir para criar melhores condições de saúde, prevenir doenças e, como gestores, assegurar o acesso a serviços e tratamento digno. Nessa missão não deve haver contradição entre o gestor público que olha esse

1 Professor Emérito da UFBA. Atualmente é Vice-coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Saúde – INCT-S/CITECS e Vice-coordenador do Programa de Economia Tecnologia e Inovação em Saúde – PECS da Universidade Federal da Bahia.

Capítulo II

Page 20: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•36 37•

da produção, incorporação e difusão de Tecnologias no Sistema de Saúde e os impactos financeiros nos Sistemas de Saúde e nas finanças pessoais. Mas os desa-fios que estamos falando são de várias dimensões. A primeira se refere à distinção entre economia da saúde e economia dos cuidados à saúde, pois não consumimos saúde e quando temos uma doença procuramos os serviços de saúde, onde estão os recursos a serem demandados, para recuperá-la. A segunda dimensão é de natureza teórica e busca definir qual a natureza do “bem” que estamos tratando se um bem “normal” como qualquer mercadoria ou um bem de características especiais, a saúde, considerado um bem de mérito. Segundo a escola neoclássica poder-se-ia utilizar os mesmos métodos e conceitos para análise os problemas de saúde sob a ótica da Economia.

Entretanto o caráter especial desse bem, a saúde, há muito tempo analisado ao considerar a saúde entre os bens que não se comportam como mercadorias e por isto apresentam “falhas de mercado”. Outra característica da saúde, do ponto de vista da análise econômica, é o seu alto grau de incerteza o que torna difícil fazer estimativas ou predições sobre comportamento do mercado. Hu-manos são imprevisíveis, temos muitas incertezas e inseguranças na definição de saúde e como o investimento no cuidado à saúde se traduz em saúde. Em segundo lugar, a incerteza sobre qual o conceito de equidade que vamos adotar como fundamento da organização dos serviços de saúde para reduzir desigual-dades, originadas na forma injusta como vem sendo estruturada, do ponto de vista econômico, político e social a sociedade brasileira. Porque este é um princípio fundamental que diferencia tratar saúde como uma mercadoria ou um direito de cada um segundo as suas necessidades, que é a questão da equi-dade vertical. Do ponto de vista dos métodos e técnicas analíticas da economia existem uma série de identidades entre setor público e setor privado, que fo-ram, aqui, identificadas pelo Secretário Dr. Januário, principalmente no que se refere a produtos e processos do cuidado à saúde.

Entretanto as análises econômicas no setor privado, fundamentalmente, não levam em consideração a questão da equidade, mas, sim, questões como oferta e demanda, valor agregado aos serviços, o lucro e a saúde empresarial. Enquan-to que no setor público o objetivo não é só cuidar da saúde, mas também como corrigir certas iniquidades em relação ao acesso e uso de serviço de saúde. Isso torna a nossa missão mais complexa, pois não podemos nem devemos con-centrar equipamentos públicos somente em áreas de alta renda per capita. O racional seria fazer uma distribuição de acordo com as necessidades detectadas nesta população. Outro problema que eu considero importante para a melhor aplicação dos conceitos e métodos da economia no setor saúde é uma definição mais precisa do que é necessidade em saúde? Se perguntarmos aqui quais são as suas necessidades de saúde, certamente teríamos uma grande variedade de

Intervenção do coordenador

processo coletivamente e o médico que atende o indivíduo; ambos necessitam de conhecimentos de economia.

Ditas essas primeiras palavras conduzidas pela emoção, vamos apresentar os participantes da Mesa: Clementina Corah Lucas Prado, Economista do Minis-tério da Saúde – Departamento de Economia da Saúde, Investimentos e Desen-volvimento (Decid), Patrícia Coelho Soárez, Odontóloga, com especialização em Economia da Faculdade de Medicina da USP, e Tereza Setsuko Toma, Pediatra e Diretora do Núcleo de Análise e Projetos de Avaliação de Tecnologias de Saúde do Instituto de Saúde da Secretaria Estadual da Saúde.

Fui solicitado a fazer uma introdução, uma referência ao contexto desta Mesa sobre Economia da Saúde no Processo da Decisão e Gestão de Progra-mas, Ações e Serviços de Saúde. O Secretário Dr. Januário já apresentou uma visão geral sobre o tema, mas eu vou usar alguns minutos para colocar algumas ideias, algumas questões importantes para compreender o terreno que nós esta-mos trabalhando. Evidentemente precisamos de técnicas não só para produzir evidências sobre os resultados das intervenções em saúde pública, assim como para avaliar o custo destas intervenções. Mas precisamos de um pouco mais de teoria para compreender as relações entre economia e sociedade que se dão no setor Saúde. Precisamos conhecer o papel dos diversos atores que participam e orientam a escolha dos processos, das técnicas e dos indicadores para avaliação das intervenções, da sua eficácia ou efetividade, para que se possa avançar no conhecimento desta relação.

Eu considero que há, realmente, um grande desafio e quero parabenizar a Secretaria de Saúde de São Paulo, por estar disposta a enfrentá-lo, pois a incor-poração dos conceitos, métodos e técnicas da Economia da Saúde, do ponto de vista institucional, tanto no setor acadêmico, como na prática dos serviços de saúde é bem recente. Até recentemente existiam poucos Programas de Economia da Saúde e alguns tinham um viés neoclássico dos processos econômicos em saúde, basicamente a visão de mercado do setor econômico-privado da saúde. Eu sou médico e tenho de ser cauteloso nessas afirmações. Durante muitos anos trabalhei com epidemiologia, mas, na medida em que o Instituto de Saúde Co-letiva da UFBA integrava epidemiologistas no seu quadro, concluí que poderia iniciar um outro processo de formação na área de Economia da Saúde, mesmo sem ser economista, pois o trabalho era desenvolvido em equipe multidisciplinar. Assim com o apoio de Ministério da Saúde, do Ipea, e um apoio financeiro do DFID – Departament for Internacional Development – foi possível formar pessoal em economia da saúde no exterior e trazer professores de centros conceituados na área. Assim começou esse trabalho há 15 anos e, hoje, temos um programa relativamente estruturado e agora, mais recentemente, incluímos a área da Ino-vação e Tecnologia em Saúde, o que nos ajudou muito a entender os processos

Page 21: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•38 39•

uma avaliação criteriosa. Quem produz em grande parte são produtores de desigualdades.

Por outro lado, tenta-se colocar a organização de programas importantes para os sistemas de saúde, estruturados com base em tecnologias de processos como algo não moderno, não eficiente, como algo que é de países pobres. Tec-nologias inovadoras desenvolvidas pelo Ministério da Saúde, como o Programa Saúde da Família, o Programa de Atenção Primária à Saúde, o Programa de Controle de Diabetes e Hipertensão, que são tecnologias organizacionais mais custo/efetivas, pois são direcionadas à prevenção. Então, o entendimento das relações econômicas e da dinâmica da inovação pode orientar os gestores e for-muladores de políticas nesse processo. É importante que se entenda essa dinâ-mica porque ela vai orientar o que é necessário e válido instituir como política e processo de gestão da saúde. Uma das possíveis ações do poder público seria criar uma estrutura de regulação apoiada em informações confiáveis, de fácil apreensão, com informações econômicas, e como a opção por um ou outro destes paradigmas tem implicações para a sociedade. O paradigma que prioriza as tecnologias industriais são produtoras de desigualdades, pois são excludentes para os mais pobres e criam uma competição para a alocação de recursos para programas preventivos que poderiam beneficiar um número maior de pessoas. Não se trata de apresentar apenas os números do uso das tecnologias, dos gas-tos, dos custos, da efetividade, mas utilizar esses dados para demonstrar que a melhor condição de saúde está relacionada à necessidade de estabelecer alguma equidade no acesso e na utilização desses recursos sociais alocados para a saúde, que afinal são recursos sociais, onde a sociedade toda participa, contribui e colabora com parte do seu trabalho.

A intervenção do Estado no mercado de bens e produtos tecnológicos para o cuidado à Saúde justifica-se, primeiro por ser um bem de mérito e, segundo, porque é potencialmente produtora de desigualdade e finalmente por assegurar o direito constitucional a todos os cidadãos brasileiros do acesso aos serviços de saúde. Neste contexto tem sido cada vez mais frequente a presença do Judiciá-rio na garantia desse direito embora com distorções evidentes na aplicação des-se dispositivo constitucional. Infelizmente operadores do Direito e membros do Judiciário por falta de informação técnica em saúde ou falta de um processo de auditoria ágil têm trazido dificuldades crescentes para o sistema de saúde.

A Regulação em saúde é um vasto campo de aplicação de Teorias, conceitos e métodos da Economia da Saúde, que pode apoiar bastante as decisões dos gestores dos Serviços de Saúde. Cabe a esses gestores colocar entre os seus obje-tivos construir indicadores, informações, produzir evidências para sensibilizar os Judiciário ou contestar argumentos que não tenham fundamentos científicos. O aumento de custos com a incorporação de tecnologias sem comprovação da sua

Intervenção do coordenador

respostas. Essas respostas certamente estariam condicionadas a determinados paradigmas que adotamos e têm importância em nossas escolhas do que é mais importante para promover ou recuperar a saúde. Estes paradigmas definem não só a percepção das necessidades, mas a produção de tecnologias. Esses paradig-mas orientam, também, a organização dos sistemas de saúde ao priorizar tecno-logias industriais que alguns preferem chamar de tecnologias duras, tecnologias com base industrial, e outras tecnologias tipificadas com organizacionais que alguns chamam também de tecnologias sociais ou tecnologias leves, mas eu prefiro chamá-las de tecnologias de processos. Que forças são mais importantes na definição desses paradigmas.

Inicialmente, podemos propor que existem dois paradigmas em conflito na busca da hegemonia na estruturação dos cuidados a saúde. Assim o paradig-ma técnico-econômico prioriza as tecnologias industriais na organização dos serviços de saúde, e outro paradigma de processos, que prioriza as tecnologias sociais para o cuidado à saúde e tem como objetivo maior a promoção da saúde e a prevenção de doenças. Entretanto esses paradigmas não são total-mente excludentes, mas um dos paradigmas é o dominante e, considerando os números que foram apresentados, estamos perdendo um pouco nesse con-flito, pois o paradigma dominante nas sociedades modernas é o paradigma técnico-econômico baseado em tecnologias industriais. E por que está ganhan-do? Possivelmente porque o valor agregado dessas tecnologias é muito maior do que das tecnologias organizacionais e sociais. Uma preferência por esse ou aquele modelo em função do maior valor agregado para quem está utilizando um produto ou um bem aumenta o seu valor de mercado. Então, quem são os mais importantes players no fortalecimento do paradigma técnico-científico, baseado em tecnologias industriais? São os produtores de tecnologia, ou seja, a indústria de equipamentos, medicamentos, reagentes e produtos para diagnós-tico de doenças. Outro grupo é o dos produtores de necessidades ou de dese-jos. Esses dois grupos agem de forma sinérgica, pois ao criar uma tecnologia é preciso criar o desejo e a necessidade de consumo desta tecnologia. O exemplo da Apple é ilustrativo ao conseguir lançar produtos que são também objeto de desejo de potenciais consumidores. Produtores de desejos utilizam os meios de informação, televisão, marketing, design etc., para ganhar a mente e o coração das pessoas possíveis adquirentes dos seus produtos.

Os modelos de referência em relação aos sistemas de saúde de outros países, a exemplo dos Estados Unidos, cujo paradigma de cuidado à saúde prioriza tecnologias industriais, têm sido uma referência dominante, principalmente para o sistema privado de saúde, mas influencia o sistema público. Então, este processo precisa ser estudado e compreendido tanto na dinâmica da oferta, os incentivos à superutilização, a difusão e a incorporação de tecnologias sem

Page 22: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•40 41•

Além de uma questão técnica e ética envolve uma relação, estudada na eco-nomia, como relação Agente/Principal onde médico como o agente deve usar o seu conhecimento e guiar as sua ações exclusivamente para o benefício do seu paciente, que é o “principal” beneficiário de suas ações.

Daí a reflexão no início da minha intervenção da necessidade de construir alianças e buscar consensos entre gestores de sistemas de saúde e corporações médicas no sentido de incluir no processo de Regulação regras que não compro-metam os princípios da relação Agente/Principal.

Dr. José Claudio Domingos – Coordenador do Núcleo de Planejamento da SMS

Na verdade, não é um […] dentro do Planejamento tem encontrado que é associar ação ao desenvolvimento ou recurso disponível. A única área que soli-citou qualquer estudo foi o Conselho Municipal que sempre nos pede: “Qual é o custo-benefício dessa ação?” E a gente tem tentado discutir isso com a área financeira dentro da Secretaria e uma coisa que a gente esbarra é que todo or-çamentário desse país está nas mãos do Ministério da Fazenda, que define as regras e como todo custo é organizado no país. Então assim, quando a gente fala de orçamento, o Relatório Anual de Gestão, a gente tem o SIOPS como base, mas ele não compõe essa necessidade de trabalhar aquilo que a gente necessita frente ao financeiro, existe lá tudo acumulado de um jeito, numa lógica que eles não conseguem tirar, e assim, do outro lado, nós enquanto técnicos da saúde, que pensamos muito mais no benefício que aquela ação dará a sociedade sem fazer nenhuma discussão com aquilo que existe, que sobra e puxa para o lado, quando você estia, é um tecido que cobre todas as necessidades. Então todos os técnicos que trabalham sempre na posição, excelentes projetos, só que, assim, frustra na hora que termina, porque o financeiro não foi questionado, custos e benefícios, ciência e eficácia, eu acho que ela tem de ser juntada nesse corpo técnico que a Administração caminha. Sabemos que essa iniciativa do Secretário foi fundamental para começarmos a ter esse olhar de uma forma mais clara e não tão sonhadora como nós fomos, grandes sonhadores de propostas técnicas, que financeiramente, elas não conseguem atuar. Obrigado.

Sebastião Antônio Loureiro de Souza e SilvaObrigado. Eu quero primeiro agradecer a vocês que participaram dessa Mesa,

foi muito clara e estimulante.

Agradeço também, aos participantes do Seminário pela atenção, o interes-se e a disciplina de ficarem conosco e, também, notei importância que vocês deram a este debate. Creio que vocês foram despertados para a necessidade de

Intervenção do coordenador

eficácia tem sido frequente e preocupante em todos os níveis do SUS. A compre-ensão de que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado deve ser apoia-da em evidências científicas. Assim a regulação passa a ser um área prioritária na organização e funções de uma moderna Secretaria de Saúde.

Quero dizer que está de parabéns a Secretaria da Saúde por investir na área da Economia da Saúde e tomando essa área como um desafio.

Faz parte dos objetivos do Programa Integrado em Economia, Inovação e Saúde do Instituto de Saúde Coletiva da UFBA apoiar os esforços dos Serviços de Saúde em todos os níveis, para qualificação dos seus técnicos na área de Eco-nomia da Saúde e na difusão dos seus métodos, demonstrando a sua importância para a gestão pública da saúde.

A elevação dos custos em saúde, a complexidade dos conhecimentos cientí-ficos que instrumenta a prática do cuidado à saúde torna a Economia da Saúde um instrumento cada vez mais indispensável para o planejamento e a gestão dos programas e serviços de Saúde. A pressão para manter a sustentabilidade e go-vernabilidade dos sistemas de saúde tem se tornado a preocupação dos gestores porque essa é uma área que exige, além do conhecimento técnico, estratégias elaboradas de convencimento, de busca de consensos para manter o equilíbrio orçamentário, o controle sanitário, a satisfação dos usuários e um ambiente polí-tico propício a modernização da gestão.

Quero agradecer novamente a oportunidade de participar desse importante Seminário, de levantar algumas questões relevantes para a incorporação das várias dimensões da Economia na gestão do SUS. Nessa mesa estive em companhia de competentes profissionais. Agradeço as expositoras dessa mesa as excelentes apresentações, bem claras deste tema muito candente, e conflituoso, com muitos interesses, principalmente nos processos de Avaliação de Tecnologias e Avaliação Econômicas. Assim, as técnicas e as metodologias específicas devem ser feitas com o maior rigor científico possível e vocês viram aqui vários exemplos como devem ser feitas essas avaliações. Entretanto, o espaço social, onde se dão esses processos é um espaço de tensão entre a estrutura do poder público e a do po-der econômico das indústrias, que querem vender seus produtos e obter lucros. Então, além do cuidado técnico, dos estudos bem feitos, das pessoas bem capaci-tadas, ainda há uma deficiência muito grande de oferta de cursos com formação mais abrangente que incluam aspectos da microeconomia e da Economia Política da Saúde. É necessária uma análise estratégica e institucional para definir atores, interesses, alianças no sentido de tornar visíveis pactos informais estabelecidos entre profissionais de saúde, principalmente médicos, na difusão e incorporação de tecnologias industriais em função do poder corporativo a eles outorgados pela sua corporação, de prescrever ou indicar medicamentos e procedimentos e outras tecnologias industriais.

Page 23: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•42 43•

incorporar a dimensão econômica na Gestão da Saúde Pública e esse processo não interessa só aos economistas, mas a todos profissionais que trabalham no setor Saúde.

Então, muito obrigado a todos os presentes e em especial as colegas da mesa Está encerrada a sessão.

Texto 1

AVA L I AÇ ÃO D E T E C N O LO G I A S E M S AÚ D E E AVA L I AÇÕ E S E CO N Ô M I C A S : I M P O R TÂ N -C I A , M É TO D O E D E S E N V O LV I M E N TO N O M U N D O E N O PA Í STEREZA SETSUKO TOMA1

Judicialização

O cenário em que se dá a tomada de decisão no Sistema Único de Saúde (SUS) envolve vários atores: quem produz tecnologias, quem as prescreve/indica e quem tem potencial para acessá-las. Em anos recentes outro ator passa a ter relevância, o Juiz. Lidar com essa complexidade não tem sido fácil para quem responde pela tomada de decisão.

Estudos indicam que é cada vez mais frequente a “judicialização” na área da saúde, medida que reflete a interferência do Poder Judiciário em questões que, primariamente, são da competência dos Joderes Executivos ou Legislativos. Com relação à demanda por medicamentos, as ações deferidas pelos Juízes para garantia de direitos individuais muitas vezes referem-se à solicitação de produ-tos que são disponibilizados pelo SUS, outros para os quais faltam justificativas e evidências científicas e, até mesmo, prescrições incompletas que não poderão beneficiar o usuário. Discute-se que uma boa parcela de responsabilidade é de quem prescreve porque, muitas vezes, o médico desconhece a relação de medi-camentos que é fornecida pelo SUS e não adota os critérios para o uso racional dos mesmos.

Nesse contexto, é mais do que oportuna à discussão sobre a necessidade de que as decisões na área da saúde tenham como fundamento a Saúde Baseada em Evidências (SBE). A SBE originou-se da prática denominada Medicina Ba- seada em Evidências, surgida na década de 1990 com o objetivo integrar as melhores evidências de pesquisa com a habilidade clínica do profissional e a preferência do paciente. A premissa da SBE é que a experiência clínica pessoal

1 Diretora técnica de Saúde I do Núcleo de Análise e Projetos de Avaliação de Tecnologias de Saúde do Instituto da Saúde da SES-SP.

Page 24: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•44 45•

Sem dúvida, a pressão para incorporação de novas e custosas tecnologias tem sido um dos fatores determinantes para a expansão da ATS em nosso meio, po-rém é necessário superar essa limitação e aproveitar seu potencial para decisões sobre todas as tecnologias que possam beneficiar a população usuária do SUS.

Método na Avaliação de Tecnologias em Saúde

A ATS envolve as seguintes etapas da elaboração: formular uma pergunta qualificada para investigação, realizar uma busca eficiente nas bases de dados de literatura, selecionar os melhores e mais relevantes estudos, determinar a validade dos estudos através de uma análise crítica, realizar uma avaliação econômica (se a tecnologia é comprovadamente eficaz e segura), elaborar recomendações.

Assim como a revisão sistemática, a ATS tem como finalidade responder a uma questão específica. No exemplo abaixo, pretende-se realizar uma avaliação acerca da eficácia e segurança do uso de Palivizumabe. Para a definição da per-gunta utiliza-se o método do PICO, que se refere às iniciais dos seguintes termos em inglês:

P (population) – população de interesse: aquela com o problema de saúde específico para o qual a intervenção avaliada está indicada (exemplo: recém-nas-cidos prematuros e crianças de alto risco para complicações da infecção pelo vírus sincicial respiratório).

I (intervention) – intervenção: tecnologia a ser avaliada (exemplo: anticorpo monoclonal palivizumabe).

C (comparison) – comparação: tecnologia a ser comparada que pode ser o padrão-ouro em uso ou placebo quando não houver outra tecnologia (exemplo: placebo).

O (outcome) – resultado: desfechos de interesse para o problema de saúde em questão (exemplo: hospitalização, duração da hospitalização, necessidade de oxigenioterapia, mortalidade).

Para responder à pergunta de investigação é realizada uma busca ampla nas bases de dados de literatura, algumas das quais direcionadas para essa área. Reco-menda-se iniciar as buscas por informes de ATS e revisões sistemáticas com ou sem metanálise e depois os outros tipos de estudo, partindo sempre daqueles classifica-dos como os de melhor qualidade de evidência conforme o tipo de tecnologia es-tudada. Uma sugestão é realizar a busca nos seguintes sítios de internet: Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec)2, Agência Nacional

2 http://portal.saude.gov.br/portal/saude/Gestor/area.cfm?id_area=1611

Avaliação de Tecnologias em Saúde e avaliações econômicas

seja alicerçada em evidências científicas robustas, de maneira a reduzir as incer-tezas na área da saúde.

Avaliação de Tecnologias em Saúde

As tecnologias constituem uma parte indispensável de todo sistema de saú-de. No entanto, em um contexto no qual os recursos econômicos são limitados, a correta incorporação e difusão das tecnologias são um desafio para os sistemas de saúde no mundo inteiro. Para a incorporação de tecnologias no SUS é ne-cessária uma investigação das consequências clínicas, econômicas e sociais da utilização das mesmas. Este processo é chamado Avaliação de Tecnologias em Saúde (ATS).

O que são tecnologias em saúde? O conceito de tecnologias em saúde é abran-gente. Entende-se por tecnologias em saúde os medicamentos, produtos e pro-cedimentos por meio dos quais a atenção e os cuidados com a saúde devem ser prestados à população, tais como vacinas, produtos para diagnóstico, equipa-mentos, procedimentos técnicos, sistemas organizacionais, informacionais, edu-cacionais e de suporte, programas e protocolos assistenciais.

A ATS é uma ferramenta importante em nosso meio porque contribui para garantir três diretrizes básicas do SUS: descentralização, atenção integral e participação da comunidade (controle social). A descentralização redistribui o poder e a responsabilidade entre os diferentes níveis de gestão, que passam a decidir em cada instância sobre questões ligadas à regulamentação do setor e alocação dos recursos disponíveis. Portanto, a incorporação de uma tecnologia no setor Saúde pode ser regulamentada por diferentes atores. Para garantir a atenção integral, a alocação de recursos nos diferentes níveis deve levar em consideração diversos aspectos: os problemas de saúde da população, as tec-nologias disponíveis que poderão responder às necessidades da população, a suficiência de recursos para oferecer a tecnologia a todos que necessitem das mesmas, a definição dos que serão beneficiados e formas de propiciar o acesso às tecnologias, a avaliação sobre os efeitos dessa oferta de tecnologias. Para atender a diretriz de controle social é necessária a adoção de um processo claro e transparente de decisão nos processos de regulação, incorporação e utilização de tecnologias.

A ATS fundamenta-se no princípio da saúde baseada em evidências. Não se trata de um método para restringir o acesso da sociedade a inovação tecnológi-ca, mas tem como finalidade maximizar os benefícios a serem obtidos com os recursos existentes, de modo a assegurar o acesso da população às intervenções disponíveis, em condições de segurança, efetividade e equidade.

Page 25: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•46 47•

exemplos de países que adotaram as avaliações econômicas como requisito adi-cional para a tomada de decisão. O Brasil parece caminhar nessa direção com a criação da Conitec.

Avaliações econômicas de tecnologias em saúde

Avaliações econômicas são técnicas analíticas formais para comparar propos-tas alternativas de ação, tanto em termos de custos como de consequências. Ba-seiam-se no custo de oportunidade, ou seja, na compreensão de que a aplicação de recursos em determinados programas e tecnologias implica a não provisão de outros. Portanto, uma alocação eficiente de recursos é aquela em que os custos de oportunidade são minimizados.

Os tipos de análises econômicas completas incluem custo-efetividade, cus-to-utilidade, custo-minimização e custo-benefício, que se diferenciam entre si quanto à unidade de medida dos desfechos utilizados.

Uma barreira à realização de análises econômicas é a falta de informações so-bre custos na área de saúde.

ATS no mundo

Países como a Austrália, Canadá e Inglaterra têm uma tradição de décadas na utilização da ATS como base para a tomada de decisão.

A Canadian Coordinating Office For Health Technology Assessment (CCO-HTA) é uma entidade privada sem fins lucrativos de pesquisa em saúde finan-ciada pelos governos federal, provinciais e territoriais do Canadá. Foi criada em 1989 para fornecer informações, imparciais e confiáveis, sobre tecnologias de saúde para todas as instâncias governamentais.

A Austrália, em 1993, foi um dos primeiros países a incorporar estudos eco-nômicos na adoção de novas práticas em saúde, por meio do Pharmaceutical Benefits Advisory Committee.

O National Institute for Health and Clinical Excellence (Nice), vinculado ao National Health System da Inglaterra, foi criado em 1999. A orientação é basea-da em evidências para ajudar a resolver a incerteza sobre quais os medicamentos, tratamentos, procedimentos e dispositivos que representam o atendimento de melhor qualidade e que oferecem a melhor relação custo-benefício para o sistema nacional de saúde.

Em 1993, foi criada a International Network of Agencies for Health Tech-nology Assessment (INAHTA), uma rede internacional de agências de ATS que

Avaliação de Tecnologias em Saúde e avaliações econômicas

de Vigilância Sanitária (Anvisa)3, Rede Brasileira de Avaliação de Tecnologias em Saúde (Rebrats)4, Biblioteca Cochrane5, Center for Reviews and Dissemination (CRD)6, National Institute for Health and Clinical Excellence (Nice)7, Canadian Agency for Drugs and Technologies in Health (CADTH)8, International Network of Agencies for Health Technology Assessment (INAHTA)9, Australian Govern-ment Department of Health and Ageing10, Instituto de Efectividad Clinica y Sani-taria11, Pubmed12, Embase13 e Lilacs14, entre outros.

Os artigos selecionados que atendem aos critérios propostos para responder à pergunta de investigação devem ser analisados criticamente por meio de formulá-rios já validados, com relação ao rigor metodológico e apresentação dos resultados.

Se a análise da literatura indicar que a tecnologia é eficaz e segura, a realização de uma avaliação econômica pode ser imprescindível a depender do custo da tec-nologia. Uma busca nas bases de dados de literatura sobre avaliações econômicas e políticas de cobertura pode indicar o cenário da incorporação em outros países, porém os contextos sendo muito diferentes tornam tais avaliações pouco úteis para quem toma decisão.

A ATS é estratégia necessária para orientar o processo de incorporação de tecnologias em saúde, embora nem sempre seja suficiente demonstrar que uma tecnologia é de qualidade, segura e eficaz, porque nenhum sistema de saúde é capaz de cobrir todas as tecnologias eficazes. Canadá, Austrália e Inglaterra são

3 http://portal.anvisa.gov.br/wps/portal/anvisa/home4 http://200.214.130.94/rebrats/ - portal da Rede Brasileira de ATS5 http://cochrane.bvsalud.org/portal/php/index.php?lang=pt – contém o conjunto das 8 bases da Co-chrane Library; conjunto de bases da Biblioteca Cochrane Plus, reunidas pelo Centro Cochrane Ibero--Americano, que inclui conteúdos em espanhol; resumos de revisões sistemáticas Cochrane traduzidos ao português, produzidos pelo Centro Cochrane do Brasil. 6 http://www.york.ac.uk/inst/crd/ - parte do National Institute for Health Research (NIHR); é um departamento da University of York, Reino Unido.7 http://www.nice.org.uk/ - agência vinculada ao Sistema Nacional de Saúde da Inglaterra.8 http://cadth.ca/ - criada pelo governo canadense, é uma organização independente sem fins lucrativos que oferece informações baseadas em evidências para os gestores de saúde.9 http://www.inahta.net/ - site da rede internacional de agências de avaliação de tecnologias em saúde.10 http://www.health.gov.au/ - site do Ministério da Saúde da Austrália.11 http://www.iecs.org.ar/ - é uma instituição independente, sem fins lucrativos, sediada na Argentina.12 http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed - é vinculada à National Library of Medicine, dos Estados Unidos.13 http://portalsaude.saude.gov.br/portalsaude/index.cfm?portal=pagina.visualizarArea&codArea=392 - criado pelo Ministério da Saúde em parceria com a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes/MEC), o Portal Saúde Baseada em Evidências permite o acesso de profissionais de saúde ao Embase, entre outras bases de dados.14 http://lilacs.bvsalud.org/ - é o mais importante e abrangente índice da literatura científica e técnica da América Latina e Caribe. 

Page 26: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•48 49•

dos relatórios de ATS, a Comissão os submete a consulta pública por um período curto de tempo. Observa-se que as Secretarias estaduais e municipais de saúde têm tido participação muito tímida nessas consultas públicas.

ATS na Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo (SES-SP)

A discussão sobre ATS é muito recente na SES-SP, atribuindo-se à CCTIES – Coordenadoria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos de Saúde coordenar os esforços para a institucionalização da ATS no âmbito do SUS-SP15.

O Instituto de Saúde (IS), por orientação da SES-SP, criou, em 2009, um Centro de Tecnologias em Saúde, cuja missão é apoiar a SES-SP no desenvolvimento dessa área. As atribuições deste Centro consistem na realização da avaliação de tecnologias de saúde em uso e a serem incorporadas pelo SUS-SP, na proposição de parcerias e cooperação técnica para o desenvolvimento da avaliação de tecnologias de saúde com as diferentes instâncias dos sistemas pertinentes, na difusão do conhecimento produzido promovendo o fomento e a indução da avaliação de tecnologias de saúde, de acordo com a agenda de prioridades definidas pela SES-SP. Os dois núcleos a ele subordinados são o Núcleo de Análise e Projetos de Avaliação de Tecnologias de Saúde (Napats) e o Núcleo de Fomento e Gestão de Tecnologias de Saúde (NFGTS)16.

Em 2012, CCTIES e IS realizaram atividades visando à implementação da Rede Paulista de ATS, com a finalidade de ampliar e fortalecer os Núcleos de Avaliação de Tecnologias em Saúde (Nats) no Estado de São Paulo. Para tanto foram organizadas reuniões mensais com os Nats existentes e outros com potencial para desenvolvimento e oficinas para capacitar equipes desses Núcleos na elaboração de Pareceres Técnico-Científicos17.

Sabe-se que muitas decisões na área da saúde cabem aos próprios municípios, por isso é importante analisar as necessidades locais quanto à capacitação de pessoal e criação de setores específicos para atuar em ATS e análises econômicas.

15 http://www.saude.sp.gov.br/ses/institucional/coordenadorias/coordenadoria-de-ciencia-tecnologia-e--insumos-estrategicos-de-saude-ccties16 http://www.saude.sp.gov.br/instituto-de-saude/estrutura/centros/centro-de-tecnologia-de-saude-para-o--sussp17 http://ses.sp.bvs.br/php/level.php?lang=pt&component=61&item=1

Avaliação de Tecnologias em Saúde e avaliações econômicas

conta com 53 agências membros em 29 países, entre os quais o Brasil, com a missão proporcionar um fórum para a identificação e busca de interesses comuns a essas agências.

ATS no Brasil

O objetivo da ação da ATS no Ministério da Saúde é institucionalizá-la no SUS, através da promoção e difusão de estudos prioritários, capacitação de ges-tores, formação de rede de ATS e cooperação internacional.

Vale a pena ressaltar a atuação de dois componentes da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde (SCTIE), a Rede Bra-sileira de ATS (Rebrats) e a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec).

A Rebrats, criada em 2008, é uma rede de centros colaboradores e instituições de ensino e pesquisa no país que tem como objetivos: produzir e disseminar estu-dos e pesquisas prioritárias no campo da ATS, padronizar metodologias, validar e atestar a qualidade dos estudos, promover capacitação profissional na área e estabelecer mecanismos de monitoramento de tecnologias novas e emergentes. Atualmente conta com 44 membros, sendo 15 instituições de ensino e pesquisa, cinco instituições gestoras e 24 NATS de hospitais de ensino.

A Conitec, oficializada por meio da Lei nº 12.401/2011, contempla a re-presentatividade de setores relevantes da sociedade brasileira no seu plenário, além de órgãos afins do próprio Ministério da Saúde. A participação social está presente pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS), que reúne representantes de entidades e movimentos de usuários, de trabalhadores da área da saúde, do gover-no e de prestadores de serviços de saúde. Estados e Municípios têm sua participa-ção garantida por representantes do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (Conase-ms). O Conselho Federal de Medicina participa como órgão de classe envolvido diretamente com a legitimação das ações e procedimentos médicos.

A Conitec tem prazos definidos para sua atuação: 180 dias para a finalização da análise de cada proposta submetida, prazo que pode ser prorrogado, no máxi-mo, por mais 90 dias; oferta da nova tecnologia no SUS de, no máximo, 180 dias após publicar a deliberação em Diário Oficial da União, no caso de incorporação da tecnologia.

A Comissão tem mostrado grande atividade. Até setembro de 2012 foram registradas 74 demandas para incorporação (59 medicamentos, 11 produtos e quatro procedimentos); as indústrias foram responsáveis por 65 demandas, se-guidas de oito de associações médicas e uma do setor judiciário. Após elaboração

Page 27: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•50 51•

Chieffi AL, Barata RC. Ações judiciais: estratégia da indústria farmacêutica para introdução de novos medicamentos. Rev. Saúde Pública 2010; 44(3): 421-9. [Acesso em 12 de abril de 2012]. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S003489102010000300005&script=sci_abstract&tlng=pt

El Dib RP. Medicina baseada em evidencias. Como praticar a medicina baseada em evi-dências. [Acesso em 12 de abril de 2012]. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/jvb/v6n1/v6n1a01.pdf

Howitt P, Darzi A, Yang GZ, Ashrafian H, Atun R, Barlow J et al. Technologies for glo-bal health. Lancet 2012; 380: 507–35. [Acesso em 19 de novembro de 2012]. Disponível em http://www.thelancet.com/journals/lanonc/article/PIIS0140-6736(12)61127-1/fulltext?_eventId=login

Macedo EI, Lopes LC, Barberato-Filho S. Análise técnica para a tomada de decisão do forne-cimento de medicamentos pela via judicial. Rev. Saúde Pública 2011; 45(4):706-13. [Acesso em 12 de abril de 2012]. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/rsp/2011nahead/2603.pdf

Sant’Ana JMB, Pepe VLE, Figueiredo TA, Osorio-de-Castro CGS, Ventura M. Racionalida-de terapêutica: elementos médico-sanitários nas demandas judiciais de medicamentos. Rev. Saúde Pública 2011;45(4):714-21). [Acesso em 12 de abril de 2012]. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0034-89102011005000042&script=sci_arttext

Trindade E. A incorporação de novas tecnologias  nos  serviços de saúde: o desafio  da análise dos fatores em jogo. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 2008; 24(5):951-964. [Acesso em 12 de abril de 2012]. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/csp/v24n5/02.pdf

Avaliação de Tecnologias em Saúde e avaliações econômicas

Bibliografia

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Depar-tamento de Ciência e Tecnologia. Diretrizes metodológicas: elaboração de pareceres técnico-cien-tíficos/ Ministério da Saúde, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Departa-mento de Ciência e Tecnologia. 3ª ed., revisada e atualizada. Brasília: Ministério da Saúde, 2011. 80 p. (Série A. Normas e Manuais Técnicos). [Acesso em 23 de janeiro de 2012]. Disponível em http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/DiretrizesPTC.pdf

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Depar-tamento de Ciência e Tecnologia. Diretrizes Metodológicas: estudos de avaliação econômica de tecnologias em saúde/ Ministério da Saúde, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estra-tégicos, Departamento de Ciência e Tecnologia. Brasília: Ministério da Saúde, 2009. 145p. : il. (Série A. Normas e Manuais Técnicos). [Acesso em 23 de janeiro de 2012]. Disponível em http://www1.inca.gov.br/inca/Arquivos/publicacoes/avaliacao_economica_tecnologias_saude_2009.pdf

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Depar-tamento de Ciência e Tecnologia. Consolidação da área de avaliação de tecnologias em saúde no Brasil. Rev. Saúde Pública 2010; 44(2):381-3. [Acesso em 20 de abril de 2012]. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0034-89102010000200022&script=sci_arttext

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria-Executiva. Área de Economia da Saúde e Desenvol-vimento. Avaliação de tecnologias em saúde: ferramentas para a gestão do SUS / Ministério da Saúde, Secretaria-Executiva, Área de Economia da Saúde e Desenvolvimento. Brasília: Editora do Ministério da Saúde, 2009. 110 p.: il. (Serie A. Normas e Manuais Técnicos). [Acesso em 12 de abril de 2012]. Disponível em http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/avaliacao_tecnolo-gias_saude_ferramentas_gestao.pdf

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria-Executiva. Área de Economia da Saúde e Desenvol-vimento. Avaliação econômica em saúde: desafios para gestão no Sistema Único de Saúde / Mi-nistério da Saúde, Secretaria-Executiva, Área de Economia da Saúde e Desenvolvimento. Bra-sília: Editora do Ministério da Saúde, 2008. 104 p.: il. (Série A. Normas e Manuais Técnicos). [Acesso em 12 de abril de 2012]. Disponível em http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/livro_aval_econom_saude.pdf

Brasil. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 12.401, de 28 de abril de 2011. Altera a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, para dispor sobre a assistência terapêutica e a incorporação de tecnologia em saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS. D.O.U. de 29/04/2011, P. 1. [Acesso em 12 de agosto de 2012]. Disponível em http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/LEI_12401.pdf

Page 28: A Economia Da Saude

53•

Texto 2

USO DA AVALIAÇ ÃO ECONÔMIC A NOS PRO-CESSOS DE DECISÃO DE INCORPOR AÇ ÃO DE NOVAS TECNOLOGIAS EM SAÚDEPATRÍCIA COELHO DE SOÁREZ, MPH, PhD1

1. Introdução

Atualmente a atenção à saúde é praticada numa época de recursos financeiros limitados e cada vez mais regulados no setor saúde. Por outro lado, as necessida-des e desejos da população são sempre crescentes. Dada à escassez de recursos, é preciso então fazer escolhas. A avaliação econômica em saúde surgiu neste con-texto com o objetivo de orientar essas escolhas de forma transparente, organizada e sistemática. Na literatura científica, existe um número crescente de publicações sobre o tema. Dessa forma, é de fundamental importância que você, gestor pú-blico, possa ler, entender, interpretar e aplicar adequadamente os resultados das avaliações econômicas no planejamento de políticas em saúde, regulamentação e processos de decisão sobre incorporação de novas tecnologias, de forma a propi-ciar efetividade, eficiência e equidade ao sistema de saúde.

Este capítulo apresenta a disciplina da Economia da Saúde e introduz os con-ceitos-chaves da avaliação econômica em saúde; discute a construção de estimati-vas para os estudos de avaliação econômica; e finaliza com uma descrição resumi-da dos objetivos e resultados dos estudos de custo-efetividade para incorporação de novas vacinas no Programa Nacional de Imunização – PNI.

2. Economia da Saúde

A economia da saúde surgiu enquanto disciplina nos países desenvolvidos após a segunda guerra mundial, como uma estratégia de melhorar a eficiência dos gastos nos sistemas de saúde. A justificativa de estudos nesta área provém

1 Professora visitante no Center for Health Economics – University of York (2012) e docente do Departa-mento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Tem experiência na área de Saúde Coletiva, com ênfase em Economia da Saúde.

Page 29: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•54 55•

FIGURA 1 – ESCOPO DA ECONOMIA DA SAÚDE

O que é saúde? qual seu Valor?

Avaliação de todo o Sistema de Saúde

MicroeconomiaAvaliação

Econômica de tecnologias em saúde ACE, ACB

Planejamento,Orçamento e

Mecanismos de Monitoramento

O que influencia a Saúde? (Além da

Assistência à Saúde)

Equilíbrio de Mercado

Demanda por Assistência à Saúde

Oferta de Assistência à Saúde

Adaptado de Culyer & Maynard, 1997 (1)

Nas últimas três décadas, uma grande quantidade de estudos na área de eco-nomia da saúde foi realizada no país. Vianna sistematizou a evolução da produ-ção científica em economia da saúde publicada no Brasil, de 1986 a 1995. (2) Em 2000, Saes analisou as publicações no período de 1989 a 1998 e relatou que os estudos de avaliação econômica representavam 42,5% das publicações da área de economia da saúde no Brasil. (3) Em 2007, Andrade avaliou a produção científica brasileira em economia da saúde no período de 1999 a 2004 e verificou que 38% dos trabalhos desenvolvem análise de custo em saúde e 7% análises de custo-efetividade e custo da doença. (4) Recentemente, o Brasil foi apontado como o país da América do Sul que mais publicou estudos de avaliação econô-mica. (5, 6)

Uso da Avaliação Econômica

da constatação que os gastos com saúde, o percentual do Produto Interno Bru-to (PIB) destinado ao setor saúde vem crescendo em ritmo acelerado tanto em países desenvolvidos como em desenvolvimento. A elevação dos gastos pode ser explicada por vários fatores, dentre eles o envelhecimento populacional, as trans-formações nos padrões de morbimortalidade da população e a introdução de novas tecnologias.

Diante deste cenário, tornou-se explícita a necessidade de uma abordagem econômica das questões do setor saúde. A economia da saúde, apoiando-se no instrumental da economia, surgiu então, para tornar o uso dos recursos o mais eficiente possível no setor saúde.

Economia da saúde é definida como: “Estudo de como os indivíduos e socieda-des exercem a opção de escolha na alocação dos escassos recursos destinados à área da saúde entre as alternativas que competem pelo seu uso, e como estes escassos recursos são distribuídos entre os membros da sociedade”.

Seus principais objetivos são:

• Fornecer um conjunto de técnicas analíticas para auxiliar a tomada de deci-são no setor saúde para promover eficiência e equidade;

• Prover um modo de pensar sobre saúde e uso de recursos na assistência à saúde que reconhece a escassez;

• Maximizar os benefícios sociais obtidos a partir de recursos escassos.

A Figura 1 apresenta o escopo das principais áreas de atuação da Economia da Saúde. Esse capítulo vai explorar em mais detalhes apenas uma dessas áreas, a avaliação econômica em saúde, em particular o seu uso nos processos de decisão de incorporação de novas tecnologias em saúde (caixa em preto).

Page 30: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•56 57•

FIGURA 2 – DIAGRAMA DE UMA AVALIAÇÃO ECONÔMICA

Escolha

Programa A

Programa B

Custo A Custo A

Custo B

Custo B

Adaptado de Drummond et al, 2005 (8)

A regra geral quando se avalia os programas A e B é que a diferença entre os custos é comparada com a diferença nas consequências, numa análise incremen-tal que fornece a Razão de Custo Efetividade Incremental (RCEI), dada pela seguinte fórmula:

RCEI =Custos A - Custos B

Consequências A - Consequências B

A questão crítica é decidir se vale a pena pagar o custo adicional (incremen-tal) pelas consequências (benefícios) adicionais obtidas com a nova tecnologia. A RCEI é então comparada a um limiar de custo efetividade para garantir uma tomada de decisão eficiente.

O conceito de “custo de oportunidade” é central para a avaliação econômica. Em sistemas de saúde com financiamento público, onde os recursos são limita-dos, nem todas as intervenções disponíveis podem ser oferecidas para todos os que precisam ou querem essas tecnologias. O custo de oportunidade é o valor que atribuímos à melhor alternativa a que renunciamos ao utilizar o recurso na alternativa escolhida. A decisão de utilizar um recurso para financiar determinada tecnologia (por exemplo, um programa universal de vacinação contra rotavirus) significa a perda de oportunidade de utilizar esse mesmo recurso para financiar outra tecnologia (por exemplo, um programa universal de vacinação contra he-patite A).

Uso da Avaliação Econômica

3. Avaliação econômica em saúde

O crescimento exponencial dos gastos em saúde, especialmente a partir da década de 1980, tem contribuído para o aumento do interesse por estudos de avaliação econômica. Embora as novas tecnologias não possam ser consideradas como o único fator, elas têm sido apontadas como as principais responsáveis pela elevação dos gastos em saúde.

No setor saúde, novos medicamentos, procedimentos e exames diagnósticos são incorporados de forma acelerada, muitas vezes antes da comprovação da sua segurança, eficácia e efetividade. E, muito frequentemente, essas tecnologias não são substitutas, ao contrário, geralmente são acumulativas (por exemplo, a utili-zação da ressonância magnética não substitui o uso da tomografia computadori-zada nos exames diagnósticos). (7)

O desenvolvimento e a incorporação contínua de novas tecnologias nos sis-temas de saúde exercem uma enorme pressão nos orçamentos públicos, e uma quantidade crescente de recursos deve ser destinada ao setor saúde para oferecer o mesmo perfil de atendimento à população. Essa situação tem levado à necessi-dade de realizar escolhas entre diferentes tecnologias a serem incorporadas, o que estimula a busca pela eficiência na alocação de recursos no setor saúde.

É importante ressaltar que a avaliação econômica não pode ser considerada como a única base para formulação de políticas, é apenas um dos componentes que participam dos complexos processos de decisão na gestão de sistemas de saú-de. Outras dimensões, além da técnico-científica, possuem grande importância nos processos decisórios. Entre elas podemos citar os interesses políticos e econô-micos, as questões éticas, de equidade, e as preferências da sociedade em questão.

A utilização da avaliação econômica é mais relevante para pessoas diretamente envolvidas no processo de tomada de decisão sobre a alocação de recursos para programas de saúde, incluindo formuladores de políticas públicas, administra-dores de saúde e clínicos. Porém, todos os profissionais de saúde têm um papel fundamental na prestação dos cuidados de saúde, e decisões baseadas em avalia-ções econômicas têm o potencial de impactar as políticas de saúde e influenciar a forma como os profissionais de saúde atuam. Sendo assim, é importante que os mesmos tenham conhecimento sobre os princípios e a metodologia que supor-tam esse tipo de estudo.

Avaliação econômica é definida como uma análise comparativa entre dois cursos de ação alternativos em termos de custos e consequências. Desta forma o seu principal objetivo é “identificar, medir, valorar e comparar os custos e conse- quências das alternativas sendo consideradas”. (8) Neste contexto, “consequên-cias” são benefícios, desfechos ou impactos de saúde das alternativas comparadas.

Page 31: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•58 59•

tomada de decisão no setor saúde, elas constituem etapas importantes de uma análise econômica completa.

Quando a análise apenas apresenta uma lista dos custos e consequências, sem que haja cálculos ou comparações diretas entre as alternativas avaliadas, ela é chamada de análise de custo-consequência. Na literatura, não há um consenso quanto à classificação desse tipo de análise. Na análise de custo-consequência não é fornecido uma medida síntese de eficiência como a razão de custo-efetividade incremental. Com base nas informações apresentadas, é o tomador de decisão quem deve fazer a escolha de alocação de recursos.

Existem quatro metodologias principais de avaliação econômica completa de programas de saúde: análise custo-minimização (ACM), análise custo-efeti-vidade (ACE), análise custo-utilidade (ACU) e análise custo-benefício (ACB). O objetivo comum a todas elas reside na avaliação da oportunidade e adequação da intervenção ou programa, com base na comparação entre os custos de sua implementação e os benefícios derivados da mesma. As quatro formas de análise mencionadas avaliam os custos de um programa de maneira tradicional, ou seja, em unidades monetárias; por outro lado, a diferença crucial entre elas consiste na forma como os benefícios ocasionados pelos programas são medidos, em unida-des naturais (ACM, ACE e ACU) ou em termos puramente monetários (ACB).

Custo-minimização é o tipo de análise de duas ou mais intervenções que apresentam os mesmos desfechos em saúde. Como as alternativas são igualmente efetivas, a análise tem por objetivo identificar a alternativa de menor custo. Aná-lise de custo-minimização raramente é encontrada na literatura, pois o achado de intervenções que apresentem as mesmas consequências é incomum.

Custo-efetividade é o tipo de análise econômica mais encontrada na litera-tura. Nesta análise o interesse recai sobre a avaliação de alternativas que tenham consequências ou desfechos de interesse semelhantes. Estas alternativas podem diferir na extensão deste efeito e/ou nos seus custos. As unidades de desfecho que podem ser empregadas nas análises de custo-efetividade são muitas, entre elas podemos citar: números de casos evitados, número de vidas salvas por interven-ção, número de casos corretamente diagnosticados etc. Este tipo de análise eco-nômica permite a comparação de programas ou intervenções em saúde aplicadas a diferentes problemas, porém com desfechos semelhantes. Por exemplo, pode-se comparar o número de vidas salvas com a realização de cirurgias cardíacas com o número de vidas salvas com a adoção de uma lei que obrigue o uso de capacete por ciclistas.

Custo-utilidade é o tipo de análise que compara duas ou mais alternativas ba-seando-se no valor que a sociedade ou o indivíduo atribuem a um determinado desfecho de saúde. Os desfechos são mensurados em “utility” em uma escala de 0 (morte) a 1 (saúde perfeita) e podem ser baseados em instrumentos que men-

Uso da Avaliação Econômica

3.1. Tipos de avaliação econômica

Existem dois grandes tipos de avaliação econômica: parciais e completas. As diferenças entre elas estão: (1) na existência de comparação entre as alternati-vas e (2) no método de mensuração das consequências. (Tabelas 1 e 2)

TABELA 1 – CARACTERÍSTICAS DAS AVALIAÇÕES ECONÔMICAS EM SAÚDECUSTOS E CONSEQUÊNCIAS SÃO EXAMINADOS?

Não Sim

Não

Examina somente consequências

Examina somente custos

Avaliações Parciais Avaliação Parcial

Descrição de resultados Descrição de custos Descrição de Custos- -resultados

Sim

Avaliações Parciais Avaliações Completas

Avaliações de eficácia ou efetividade

Análise de custos Análise de Custo-minimização (ACM)

Análise de Custo-efetividade (ACE)

Análise de Custo-utilidade (ACU)

Análise de Custo-benefício (ACB)

Adaptado de Drummond et al, 2005 (8)

Algumas análises apenas descrevem as consequências de uma alternativa (por exemplo, descrevem os resultados de um único serviço ou programa de saúde), sem efetuar uma comparação com outras alternativas, são análises descritivas das intervenções e seus desfechos (Descrição de resultados). Outras análises descre-vem somente os custos de uma alternativa e são chamadas de descrição de custos. A maioria dos estudos de custo de doença (“cost of illness”) ou carga de doença (“burden of illness”) se enquadra nessa categoria. Quando os custos e conse- quências de um único serviço ou programa são descritos, a avaliação é chamada de descrição de custos-resultados.

Aquelas que comparam as consequências de duas ou mais intervenções, mas sem considerar os seus custos, destinam-se à avaliação de sua eficácia ou efetivi-dade. Quando os custos de duas ou mais alternativas são avaliados, sem levar em conta suas consequências, trata-se de uma análise de custos. Estes tipos de avalia-ções econômicas são considerados avaliações parciais. Apesar de não fornecerem dados suficientes sobre a(s) eficiência(s) da(s) alternativa(s) analisada(s) para a

Page 32: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•60 61•

3.2. Avaliação econômica e tomada de decisão

A avaliação econômica em saúde tem participado de forma crescente nas deci-sões sobre financiamento de novas tecnologias pelos sistemas de saúde. Em 1993, a Austrália foi o primeiro país a exigir evidência de custo-efetividade como parte obrigatória do processo de decisão de financiamento de medicamentos. Atual-mente, muitos outros países adotam a mesma política e exigem requerimento formal da evidência econômica como parte do processo de tomada de decisão em precificação, reembolso ou orientações oficiais sobre o uso de novas tecnologias em saúde. Por exemplo, Bélgica, Finlândia, Noruega, Canadá, Portugal, Suécia, Holanda, Reino Unido e Estados Unidos da América. (9)

Algumas agências internacionais de avaliação tecnológica (como o National Institute for Health and Clinical Excellence – Nice, do Reino Unido, Pharma-ceutical Benefits Advisory Committee – PBAC, da Austrália e Canadian Agency for Drugs and Technologies in Health – CADTH, do Canadá) exigem revisões sistemáticas da literatura econômica relevante para os processos de avaliação e formulação de políticas de saúde pública. (10)

O Brasil também tem procurado utilizar essa ferramenta de apoio à tomada de decisão para gestão racional do sistema de saúde. Na Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa, a Gerência de Avaliação Econômica de Novos Me-dicamentos tem utilizado de conceitos de Avaliação Tecnológica e Econômica em Saúde para a tomada de decisão sobre preço de novos medicamentos, desde 2004. (11)

O Ministério da Saúde, por meio do Departamento de Ciência e Tecnologia – Decit, tem fomentado a realização de estudos de avaliação econômica. Parale-lamente, a indústria farmacêutica também tem financiado estudos de avaliação econômica para fins de incorporação de tecnologias na tabela de procedimentos do Sistema Único de Saúde – SUS e da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS.

Desde 2006, o Decit tem desenvolvido diretrizes metodológicas para elabora-ção de revisões sistemáticas e estudos de avaliação econômica e tem colaborado com a Comissão de Incorporação de Tecnologias do Ministério da Saúde – Citec na avaliação de incorporação de novas tecnologias pelo Sistema Único de Saúde – SUS. (12-14)

Em 2011, a Citec foi substituída pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS – Conitec, que passou a assessorar o Ministério da Saú-de nas decisões de incorporação, exclusão ou alteração de novos medicamentos, produtos e procedimentos no SUS. (15, 16) A Conitec passou a exigir estudos de avaliação econômica e a usá-los nas suas recomendações de incorporação de novas tecnologias ou abandono de tecnologias já incorporadas pelo SUS.

Uso da Avaliação Econômica

surem qualidade de vida. A unidade de desfecho mais empregada para a medida da consequência ou efeito nas ACU, é o QALY (“Quality-Adjusted Life-Year”). A vantagem desta medida é que ela consegue combinar simultaneamente a redução de morbidade (ganhos em qualidade de vida) com a redução de mortalidade (ga-nhos em quantidade). Este tipo de análise econômica permite a comparação de intervenções destinadas a diferentes problemas de saúde. Por exemplo, pode-se comparar o número de QALYs ganhos com um medicamento oncológico com o número de QALYs ganhos com um Programa de Promoção da Saúde.

Custo-benefício é o tipo de análise econômica que compara duas ou mais alternativas, medindo os desfechos em saúde e os custos em termos monetários. Esses valores são atribuídos com base em valor de mercado, opinião de profissio-nais e preferências sociais. Entretanto, existe muita dificuldade para se atribuir valores monetários a determinados efeitos e condições de saúde, como por exem-plo, o valor da vida. Os métodos aplicados para este fim são bastante complexos e vários fatores podem influenciar as estimativas. Por essa razão essa análise tende a ser mais controversa e menos utilizada. No entanto, a ACB é a mais apropriada das análises quando o formulador de políticas tem uma perspectiva mais ampla e está preocupado com as possíveis mudanças que um projeto de saúde possa provocar no bem-estar social. É também a metodologia de escolha quando existe a preocupação com eficiência alocativa e comparações intersetoriais.

TABELA 2 – CARACTERÍSTICAS DAS AVALIAÇÕES ECONÔMICAS EM SAÚDE

Tipo de avaliação Custo Medida de consequência (desfecho)

Parciais – Descrevem ou avaliam somente as consequências ou custos

Análise de efetividade /eficácia   Unidades naturais (vidas salvas, casos

evitados etc.)

Análise de Custo Valor monetário  

Completas – Avaliam consequências e custos

Custo-minimização Valor monetário Unidades naturais (vidas salvas, casos evitados etc.)

Custo-efetividade Valor monetário Unidades naturais (vidas salvas, casos evitados etc.)

Custo-utilidade Valor monetário Medidas de “utility”: QALY, HYE

Custo-benefício Valor monetário Valor monetário

QALY: Quality-Adjusted Life-Year; HYE: Healthy Year-Equivalent

Page 33: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•62 63•

decisões metodológicas, pode levar à interpretação inadequada dos resultados, e lançar dúvidas sobre a credibilidade da avaliação (30). Há também críticas com relação à divulgação e oportunidade da informação produzida, embora essa crítica não seja exclusiva para avaliações econômicas (31). Problemas de confia-bilidade incluem a escolha inadequada dos pressupostos e métodos nas análises (por exemplo, técnicas de extrapolação de dados) e limitações dos métodos (por exemplo, consideração de custos indiretos relacionados à produtividade perdida) (30-32).

As avaliações também são criticadas por não levarem em conta a natureza di-nâmica das condições, resultados e custos, e por não terem uma visão abrangente de todos os fatores que pode ter um impacto sobre o custo-efetividade de uma intervenção, tais como a interação com programas existentes. Problemas relevan-tes incluem o uso de comparadores inadequados, a falta de dados do “Mundo real” na análise, falta de análise de subgrupo apropriada e a generalização pobre dos resultados (30, 31).

Avaliações não analisam todas as implicações econômicas de uma tecnologia, em particular, as consequências financeiras das decisões (30, 33). A análise de impacto orçamentário fornece informações complementares sobre as despesas orçamentárias e questões de “affordability” ou viabilidade de financiamento. A comparação de algumas características da avaliação econômica e da análise de impacto orçamentário é apresentada na Tabela 3.

TABELA 3 – COMPARAÇÃO ENTRE AVALIAÇÃO ECONÔMICA E DA ANÁLISE DE IMPACTO ORÇAMENTÁRIO

Avaliação Econômica Análise de Impacto orçamentário

Questão abordada É um bom investimento do dinheiro?

É viável?

Objetivo Eficiência das alternativas Plano para o impacto financeiro

Desfechos em saúde Incluída Excluída

Medida Custo adicional por unidade de benefício ou desfecho

Gasto total

Horizonte Temporal Geralmente mais longo (pode ser a vida toda)

Geralmente mais curto (1-5 anos)

Adaptado de “Guidelines for the economic evaluation of health technologies: Canada. Ottawa: 2006” (17).

Uso da Avaliação Econômica

Para que a avaliação econômica seja de alta qualidade e possa fornecer infor-mação útil, relevante e oportuna aos tomadores de decisão, ela deve ser baseada em rigorosos métodos analíticos. Atualmente encontram-se disponíveis inúme-ros “guidelines” para avaliação econômica (17-22). O “guideline” nacional foi publicado em 2009 (23). Esses “guidelines” estimulam o uso de uma abordagem consistente tanto na condução da análise, como na apresentação dos resultados das avaliações. Para os interessados em obter mais informações sobre como de-senvolver estudos de avaliação econômica, sugerimos a leitura dos livros de Gold et al. (24), Drummond et al (8, 25).

Além disso, para que ela possa efetivamente ser utilizada na tomada de deci-são, ela deve ser equilibrada e imparcial (confiável), transparente e acessível ao leitor ou usuário do estudo. Há muitas situações onde as avaliações econômicas podem auxiliar os tomadores de decisão (17):

• Decisões em vários níveis de governo ou órgãos administrativos (por exem-plo, Secretarias Municipais e Estaduais de Saúde, hospitais, planos de saúde) para financiar uma tecnologia, serviço, ou programa de saúde;

• Decisões de preços por órgãos reguladores do governo e fabricantes de tec-nologia;

• “Guidelines” de prática clínica;

• Prioridades para o financiamento de pesquisa por parte dos governos e pes-quisa de empresas de base;

• Vigilância pós-comercialização e atualizações de informações econômicas baseadas no uso da tecnologia no “mundo real”.

Avaliações econômicas podem fornecer informações valiosas para aqueles que tomam decisões sobre a alocação de recursos de saúde limitados. Em par-ticular, avaliações econômicas podem ser usadas para identificar intervenções que contribuem de forma positiva para a saúde da população, distinguindo-as daquelas que não representam bom investimento do recurso disponível. Além disso, as avaliações podem ser utilizadas em conjunto com outras abordagens, tais como orçamento-programa e análise marginal, para ajudar a definir prio-ridades (26-29).

Existem preocupações sobre a adequação das avaliações econômicas para a tomada de decisão. A falta de transparência em alguns estudos de avaliação eco-nômica, quanto à isenção dos seus financiadores e realizadores e consequentes

Page 34: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•64 65•

possam ser utilizados como bases empíricas para estudos populacionais. Os da-dos administrativos disponibilizados rotineiramente devem ser trabalhados para serem transformados em estimativas e este processo exige conhecimento clínico, epidemiológico, de pesquisa em serviços, saúde coletiva, expertise em construção de bancos de dados, domínio das especificidades de cada um dos Sistemas de Informação em Saúde, além de uma estrutura de informática capaz de operacio-nalizar grandes bancos de dados utilizados.

4. Estudo de caso: Processo de tomada de decisão da introdu-ção de novas vacinas no calendário de rotina do Programa Na-cional de Imunizações – PNI

O Projeto de pesquisa “Estudos de custo-efetividade da incorporação de no-vas vacinas à rotina do Programa Nacional de Imunizações: varicela, rotavírus, meningocócica C conjugada, hepatite A e pneumocócica conjugada”, coordena-do pela Professora Hillegonda Maria Dutilh Novaes, foi uma demanda do Pro-grama Nacional de Imunizações/PNI da Secretaria de Vigilância à Saúde/SVS do Ministério da Saúde e teve financiamento do CNPq e Ministério da Saúde.

O objetivo do projeto era realizar estudos de custo-efetividade para as vacinas contra varicela, rotavírus, meningocócica C conjugada, hepatite A e pneumo-cócica conjugada para contribuir no processo de tomada de decisão do PNI de incorporação dessas novas tecnologias ao calendário vacinal de rotina.

Foram desenvolvidas estimativas epidemiológicas, de utilização de serviços de saúde e de custos diretos e indiretos relacionados às doenças a serem pre-venidas pelas vacinas e da introdução dessas vacinas no PNI. Modelos mate-máticos de análise de decisão específicos foram construídos para cada uma das vacinas. Medidas sínteses do tipo razão de custo-efetividade incremental, bem como análises de sensibilidade univariadas, multivariadas e probabilísticas fo-ram apresentadas.

A construção das estimativas que alimentam os modelos matemáticos foi for-temente apoiada no uso de dados secundários provenientes de Sistemas de In-formação em Saúde – SIS (Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM, Sistema Informações de Nascidos Vivos – Sinasc, Sistema de Informações de Agravos de Notificação – Sinan, Sistema de Informações Hospitalares do SUS – SIH-SUS, Sistema de Informações Ambulatoriais – SIA-SUS, Sistema de In-formações da Assistência Básica – Siab, Sistema de Informações do PNI – SIP-NI), e de bases de dados provenientes de inquéritos nacionais como, a Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios – PNAD e a Pesquisa sobre Orçamento Familiar – POF, ambas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.

Uso da Avaliação Econômica

Existem barreiras que impedem o uso de avaliações econômicas para tomada de decisão, incluindo problemas de orçamento e falta de conhecimento econô-mico dentro de algumas instituições responsáveis pelo processo de tomada de decisão, as quais podem levar à interpretação inadequada das avaliações (33). Es-ses fatores ajudam a explicar por que avaliações econômicas não têm sido usadas com mais frequência nas decisões no setor saúde. Além da potencial utilidade dos resultados de uma análise econômica, a sua realização permite sintetizar conheci-mentos sobre a epidemiologia da doença sob estudo, seu impacto sobre o sistema de saúde (utilização de serviços e seus custos) e alternativas tecnológicas de inter-venção, de forma a oferecer aos usuários das informações uma forma estruturada de pensar e informações úteis sobre as implicações das decisões. Isso permite aos tomadores de decisão, uma visão mais ampliada do impacto de uma tecnologia, e decisões mais explícitas e transparentes. O teste final da avaliação é se de fato ela leva a melhores decisões em condições de incerteza e proporciona utilização mais efetiva e eficiente dos recursos.

A necessidade dos tomadores de decisão por informações econômicas mais completas é refletida no número crescente de “guidelines” produzidos mundial-mente (34). No entanto, seguir as orientações contidas nesses “guidelines” não eliminará a possibilidade de viés nas avaliações, em virtude da própria arte e julgamentos que permeiam a condução dessas avaliações.

3.3. Construção de estimativas

A evidência utilizada para construir as estimativas que alimentam os modelos de decisão das avaliações econômicas pode ser extremamente variada e obtida de diversas fontes; ensaios clínicos, estudos observacionais, bases de dados adminis-trativas, série de casos, opinião de especialistas e/ou análises secundárias (como revisões sistemáticas, metanálises). Raramente todas as evidências necessárias na avaliação econômica são extraídas de uma única fonte (35). O modelo é alimen-tado com dados disponíveis e pode combinar dados de múltiplas fontes primá-rias e/ou secundárias.

Em algumas situações, a construção de um modelo será baseada somente em dados secundários. A dificuldade dessa abordagem está relacionada à disponibili-dade de dados. Na maioria das vezes os dados disponíveis nas fontes secundárias, especialmente em bases de dados administrativas, não foram construídos para alimentar modelos de decisão, então é necessário ajustar os dados existentes para que eles possam ser incluídos na lógica que orienta o modelo de decisão.

Para desenvolver estimativas a partir de dados secundários é necessário um grande investimento técnico e científico na formatação dos bancos para que eles

Page 35: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•66 67•

5. Considerações finais

A avaliação econômica em saúde tem sido utilizada nas decisões de incor-poração de tecnologias nos sistemas de saúde. A avaliação econômica pode de-sempenhar um papel mais importante no futuro. Porém, desafios precisam ser superados para que ela alcance seus objetivos.

Cooperação entre produtores e usuários mostra-se essencial para garantir ava-liações de um escopo ampliado de tecnologias, reduzir duplicações e promover o alinhamento das avaliações com as prioridades em saúde.

Para maior aceitação da avaliação econômica, é necessário garantir processos transparentes e desenvolver a capacitação dos profissionais para conduzir estudos e dos tomadores de decisão para interpretar o conhecimento produzido pelos mesmos. Essa iniciativa deverá estar baseada no comprometimento político dos gestores do sistema de saúde em promover a produção e utilização dos resultados e recomendações das avaliações econômicas nos processos de decisão.

6. Bibliografia

1. Being reasonable about the economics of health. Selected essays by Alan Williams. Culyer A, Maynard A, editors. Cheltenham: Edward Elgar; 1997.2. SM V. Evolução e perspectivas da pesquisa em economia da saúde no Brasil. Brasília: 1998.3. SG S. Estudo bibliométrico das publicações em economia da saúde, no Brasil, 1989-1998 / Bibliometric study of publications in health economics, Brazil, 1989 to 1998: Universidade de São Paulo; 2000.4. Andrade EIG, Acúrcio FA, Cherchiglia ML, Belisário SA, Júnior AAG, Szuster DAC, et al. Pesquisa e produção científica em economia da saúde no Brasil. RAP. 2007;41(2):211-35.5. Iglesias CP, Drummond MF, Rovira J, Group NP. Health-care decision-making processes in Latin America: problems and prospects for the use of economic evaluation. Int J Technol Assess Health Care. 2005;21(1):1-14. PubMed PMID: 15736509. eng.6. Augustovski F, Iglesias C, Manca A, Drummond M, Rubinstein A, Martí SG. Barriers to generalizability of health economic evaluations in Latin America and the Caribbean region. Pharmacoeconomics. 2009;27(11):919-29. PubMed PMID: 19888792. eng.7. Vianna C, Caetano R. Avaliações econômicas como um instrumento de incorporação tecno-lógica em saúde. Cadernos de Saúde Coletiva. 2005;13(3):747-66.8. Drummond M, Sculpher M, Torrance G, O’Brien B, Stoddart G. Methods for the Eco-nomic Evaluation of Health Care Programmes. 3rd ed: Oxford Medical Publications; 2005. 379 p.9. Beutels P, Scuffham PA, MacIntyre CR. Funding of drugs: do vaccines warrant a different approach? Lancet Infect Dis. 2008 Nov;8(11):727-33. PubMed PMID: 18992409. eng.

Uso da Avaliação Econômica

Os resultados do projeto de pesquisa “Estudos de custo-efetividade da incor-poração de novas vacinas à rotina do PNI: varicela, rotavírus, meningocócica C conjugada, hepatite A e pneumocócica conjugada” estão apresentados na forma de razões de custo-efetividade incremental na Tabela 4 (36-40).

Como limiar de custo-efetividade, foi utilizado o critério da Organização Mundial da Saúde – OMS, no qual para que uma intervenção pode ser conside-rada custo-efetiva, a RCEI por Daly evitado deve ser até 3 vezes o valor do PIB per capita, quando a RCEI por Daly evitado é de 1 vez o valor do PIB per capita, a intervenção é considerada muito custo efetiva; e quando a RCEI é maior que 3 vezes o PIB, a intervenção não é custo efetiva. Considerando por exemplo, o PIB per capita do Brasil, em 2008, de R$ 15.240, a vacina que custou até R$ 45.720 (3*R$15.240) foi considerada custo-efetiva.

Todas as vacinas se mostraram custo-efetivas (são um bom investimento do dinheiro). Mas é preciso também realizar uma análise de impacto orçamentário para avaliar se as despesas orçamentárias incrementais com a compra das novas vacinas são viáveis e para garantir a sustentabilidade das vacinas incorporadas anteriormente ao PNI.

TABELA 4 – RESULTADOS DOS ESTUDOS DE CUSTO-EFETIVIDADE DAS VACINAS ROTAVÍRUS, VARICELA, PNEUMOCÓCICA CONJUGADA,

MENINGOCÓCICA C CONJUGADA E HEPATITE A

VacinasRCEI (Custo por ano de vida salvo)

Avaliação

Rotavírus R$ 1,028 Muito custo-efetiva

Varicela R$ 14,749 (muito custo- -efetiva) Muito custo-efetiva

Pneumocócica R$ 21,369* (custo-efetiva) Custo-efetiva

Meningocócica C R$ 21,620 Custo-efetiva

Hepatite A Cost-saving Econômica

*Custo por Daly evitado. Fonte: (36-40)

Page 36: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•68 69•

25. Drummond M, McGuire A. Economic evaluation in health care: merging theory with prac-tice. 1st ed. Oxford: Oxford University Press; 2001.26. Donaldson C, Mooney G. Needs assessment, priority setting, and contracts for health care: an economic view. BMJ. 1991 Dec; 303(6816):1529-30. PubMed PMID: 1782499. Pubmed Central PMCID: PMC1671822. eng.27. Mitton C, Donaldson C. Health care priority setting: principles, practice and challenges. Cost Eff Resour Alloc. 2004 Apr;2(1):3. PubMed PMID: 15104792. Pubmed Central PM-CID: PMC411060. ENG.28. Mitton C, Donaldson C. Priority setting toolkit: a guide to the use of economics in health-care decision making. London: BMJ Books; 2004.29. Ruta D, Mitton C, Bate A, Donaldson C. Programme budgeting and marginal analysis: bridging the divide between doctors and managers. BMJ. 2005;330(7506):1501-3. PubMed PMID: 15976426. Pubmed Central PMCID: PMC558464. eng.30. Drummond M, Brown R, Fendrick AM, Fullerton P, Neumann P, Taylor R, et al. Use of pharmacoeconomics information – report of the ISPOR Task Force on use of pharma-coeconomic/health economic information in health-care decision making. Value Health. 2003;6(4):407-16. PubMed PMID: 12859580. eng.31. McDaid D, Mossialos E, Mrazek M. Making use of economic evaluations. Int J Risk Saf Med. 2002;15:67-74.32. Hill SR, Mitchell AS, Henry DA. Problems with the interpretation of pharmacoeconomic analyses: a review of submissions to the Australian Pharmaceutical Benefits Scheme. JAMA. 2000; 283(16):2116-21. PubMed PMID: 10791503. eng.33. Hoffmann C, Graf von der Schulenburg JM. The influence of economic evaluation stu-dies on decision making. A European survey. The EUROMET group. Health Policy. 2000; 52(3):179-92. PubMed PMID: 10862993. eng.34. Hjelmgren J, Berggren F, Andersson F. Health economic guidelines--similarities, differences and some implications. Value Health. 2001; 4(3):225-50. PubMed PMID: 11705185. eng.35. Cooper NJ, Sutton AJ, Ades AE, Paisley S, Jones DR, Models WGotUoEiED. Use of evidence in economic decision models: practical issues and methodological challenges. Health Econ. 2007;16(12):1277-86. PubMed PMID: 18034447. eng.36. de Soárez PC, Valentim J, Sartori AM, Novaes HM. Cost-effectiveness analysis of routine rotavirus vaccination in Brazil. Rev Panam Salud Publica. 2008;23(4):221-30. PubMed PMID: 18505602. eng.37. Valentim J, Sartori AM, de Soárez PC, Amaku M, Azevedo RS, Novaes HM. Cost-effec-tiveness analysis of universal childhood vaccination against varicella in Brazil. Vaccine. 2008; 26(49):6281-91. PubMed PMID: 18674582. eng.38. Sartori AM, de Soárez PC, Novaes HM. Cost-effectiveness of introducing the 10-valent pneumococcal conjugate vaccine into the universal immunisation of infants in Brazil. J Epide-miol Community Health. 2012; 66(3):210-7. PubMed PMID: 20884668. eng.

Uso da Avaliação Econômica

10. Anderson R. Systematic reviews of economic evaluations: utility or futility? Health Econ. 2010 Mar; 19(3):350-64. PubMed PMID: 19378354. eng.11. Augustovski F, Melendez G, Lemgruber A, Drummond M. Implementing pharmacoecono-mic guidelines in Latin America: lessons learned. Value Health. 2011 2011 Jul-Aug;14 (5 Suppl 1):S3-7. PubMed PMID: 21839895. eng.12. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 3.323, de 27 de dezembro de 2006. Institui a comissão para incorporação de tecnologias no âmbito do Sistema Único de Saúde e da Saúde Suplementar (2006).13. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.587, de 30 de outubro de 2008. Dispõe sobre a Comissão de Incorporação de Tecnologias no Ministério da Saúde e vincula sua gestão à Secre-taria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, (2008).14. [Health Technology Assessment: institutionalization of actions in the Brazilian Ministry of Health]. Rev. Saúde Pública, 2006; 40(4):743-7. PubMed PMID: 17063254. por.15. Brasil. Ministério da Saúde. Lei nº 12.401, de 28 de abril de 2011. Altera a Lei n° 8.080, de 19 de setembro de 1990, para dispor sobre a assistência terapêutica e a incorporação de tec-nologia em saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde, 2011.16. Brasil. Ministério da Saúde. Decreto nº 7.646, de 21 de dezembro de 2011. Regulamenta a Lei n° 12.401, de 28 de abril de 2011, e Dispõe sobre a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde e sobre o processo administrativo para incorporação, exclusão e alteração de tecnologias em saúde pelo Sistema Único de Saúde – SUS, 2011.17. Guidelines for the economic evaluation of health technologies: Canadá. Ottawa: 2006.18. Chilvers M, Smith B. Economic Evaluation Guidelines: Performance Analysis & Develop-ment Branch Policy and Planning Division; 2009. Available from: http://www.community.nsw.gov.au/docswr/_assets/main/documents/econ_evaluation_guidelines.pdf.19. General Methods for the Assessment of the Relation of Benefits to Costs: Institute for Qua-lity and Efficiency in Health Care; 2009. Available from: http://www.ispor.org/PEguidelines/source/Germany_AssessmentoftheRelationofBenefitstoCosts_En.pdf.20. Guidelines for the Economic Evaluation of Health Technologies in Ireland 2010. Available from: http://www.hiqa.ie/publication/guidelines-economic-evaluation-health-technologies-ireland.21. Guide to the methods of technology appraisal: National Institute for Health and Clinical Excellence; 2008. Available from: http://www.nice.org.uk/media/B52/A7/TAMethodsGuideU-pdatedJune2008.pdf.22. Drummond MF, Jefferson TO. Guidelines for authors and peer reviewers of econo-mic submissions to the BMJ. The BMJ Economic Evaluation Working Party. BMJ. 1996; 313(7052):275-83. PubMed PMID: 8704542. Pubmed Central PMCID: PMC2351717. eng.23. Diretrizes Metodológicas: estudos de avaliação econômica de tecnologias em saúde. Brasília 2009. Available from: http://www.ispor.org/PEguidelines/source/Economic-Evaluation-Guide-lines-in-Brazil-Final-Version-2009.pdf.24. Gold MR, Siegel JE, Russel LB, Weinstein MC. Cost-effectiveness in Health and Medici-ne: Oxford University Press; 1996.

Page 37: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•70 71•

39. de Soarez PC, Sartori AM, de Andrade Lagoa Nóbrega L, Itria A, Novaes HM. Cost-effec-tiveness analysis of a universal infant immunization program with meningococcal C conjugate vaccine in Brazil. Value Health. 2011; 14(8):1019-27. PubMed PMID: 22152170. eng.40. Sartori AM, de Soárez PC, Novaes HM, Amaku M, de Azevedo RS, Moreira RC, et al. Cost-effectiveness analysis of universal childhood hepatitis A vaccination in Brazil: Regional analyses according to the endemic context. Vaccine. 2012; 30(52):7489-97. PubMed PMID: 23107593. eng.

CAPÍTULO I I I

AVALIAÇÃO DE TECNOLOGIA EM SAÚDE PARA TOMADA DE DECISÃO: IMPACTO

EPIDEMIOLÓGICO E ECONÔMICO

Page 38: A Economia Da Saude

73•

Texto 1

C U S TO S PA R A AVA L I AÇ ÃO D E T E C N O LO -G I A S E M S AÚ D EDENISE C. CYRILLO – PRONUT(FEA)-USP1

Introdução

Para falar de avaliação de custos, no contexto de avaliação de tecnologias em saúde, é necessário antes de qualquer coisa discutir o significado dos custos em geral. E isto nos leva a discutir brevemente as ideias associadas ao termo Economia.

A Economia de um país é normalmente retratada pelas atividades econômicas que ela abriga e pelo valor do Produto Nacional Bruto gerado a cada período, o qual em termos per capita reflete o valor de bens e serviços finais, em média, disponíveis a cada cidadão. De outro modo, a Economia é o conjunto e a organi-zação dos recursos aplicados na produção, visando a atender as necessidades ma-teriais dos cidadãos. É por isso que tradicionalmente os problemas econômicos básicos são referidos como: o que, como e para quem produzir.

No mundo atual existe uma imensa variedade de produtos e serviços passíveis de serem ofertados no mercado. Da mesma forma, existe uma imensa gama de possibilidades de como produzir cada produto conhecido. Responder à tercei-ra pergunta também não é trivial. Embora o mecanismo de distribuição esteja baseado na participação de cada cidadão – enquanto proprietário de fatores de produção – na geração do produto, por meio do mercado de fatores de produ-ção, esta se dá em um contexto de desigualdades, de aumento da população, de modificação do perfil demográfico implicando aumento da demanda e de sua diversificação.

Há pelo menos três séculos, os problemas econômicos básicos vêm sendo re-solvidos em sua grande parte pelo mercado, no entanto as desigualdades con-tinuam aumentando, os recursos naturais, base concreta da produção, sempre vistos como relativamente escassos para atender as inúmeras (e diversificadas) necessidades humanas vêm mostrando os seus limites absolutos.

1 Professora associada da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP.

Capítulo III

Page 39: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•74 75•

Nesse contexto, a Economia precisa fazer o melhor possível! Precisa ser efi-ciente! Ou seja, produzir o máximo possível dado o montante de recursos dispo-níveis. Na verdade é necessário fazer mais do que isso! Não apenas ser eficiente, mas ser custo-efetiva intertemporalmente, no sentido de escolher o que produzir de modo que o atendimento das necessidades humanas seja efetivo e sustentável. A solução para esse problema implica encontrar um caminho para uma produção seletiva e fundamental, que somente será viável se houver uma mudança no com-portamento do consumo, deslocando-se do “mais é melhor” para o “equilibrado é sustentável”.

O objetivo deste artigo é discutir o conceito de custo e eficiência, visando instrumentalizar os agentes econômicos para melhorar a alocação de recursos, o controle e a gestão dos recursos a eles subordinados. Em particular, no que tange a gestão dos recursos públicos na área da saúde, pressupõe-se que a compreen-são desta dimensão da alocação de recursos favorecerá a execução de avaliações econômicas adequadas, contribuindo assim para o aprimoramento e aumento da resolutividade do Sistema Único de Saúde.

1. Custos

No Jardim do Éden, de Adão e Eva, não havia restrições para o atendimento da demanda! A oferta era abundante, bastando se servir para suprir as necessidades.

No mundo contemporâneo todos têm de colocar seus fatores de produção para trabalhar na produção para que bens e serviços sejam produzidos e fiquem à disposição para atender às necessidades humanas. De modo que é necessário escolher onde aplicar os recursos para obter os melhores resultados e esse tipo de decisão terá de levar em consideração o Custo de Oportunidade.

1.1. Custo de oportunidade

Quando um recurso, seja ele um hectare de terra ou uma jornada de trabalho, é aplicado em determinada atividade ele deixa de estar disponível para ser aplica-do em qualquer outra! De modo que o custo do produto resultante de sua aplica-ção corresponde ao que se deixou de produzir na melhor alternativa desprezada. A esta ideia foi dada a denominação de Custo de Oportunidade:

“O Custo alternativo ou de oportunidade da produção de uma mercadoria X é o montante da mercadoria Y que deve ser sacrificado a fim de que os recursos

sejam alocados para produzir X em vez de Y. Esse é o custo social da produção”. Ferguson (1978).

Esta noção pode ficar mais clara por meio de um exemplo clássico: manteiga x canhões. Admitindo uma economia hipotética que, em tempo de paz, estivesse alocando 100% de seus recursos (pleno emprego) na produção de bens e serviços de consumo (por exemplo, manteiga). Dada a tecnologia disponível, a alocação eficiente dos recursos produziria um determinado PIB. Supondo que em dado momento, entretanto, essa economia entre em guerra, será necessário alterar a composição do seu PIB, sacrificando parte da sua produção de bens de consumo (manteiga) para produzir bens bélicos (canhões). Em outras palavras, recursos deverão ser retirados da produção de bens de consumo e alocados na produção dos bens necessários para ganhar a guerra.

Qual o custo dos bens bélicos a serem produzidos? Resposta: o valor dos bens de consumo sacrificados! Esta ideia é ilustrada na Figura 1, onde BCmax é o valor máximo do PIB (constituído de bens de consumo) produzido antes da entrada na guerra, G1 é a quantidade de bens bélicos que precisam ser produzidos. Para pro-duzir G1, será necessário sacrificar BCs em bens de consumo, retirando recursos da produção de bens de consumo para aplicá-los na produção de bens bélicos. Assim, G1 custa ao país BCs! BCs é o custo de oportunidade, é o custo social da produção G1 de bens bélicos! No segundo momento, portanto, o PIB do país terá nova com-posição, parte em bens de consumo (B1) e parte em bens bélicos (G1).

FIGURA 1 – ILUSTRAÇÃO DO CONCEITO DE CUSTO DE OPORTUNIDADE E DA CURVA DE POSSIBILIDADE DE PRODUÇÃO

Custos Para Avaliação De Tecnologias Em Saúde

Bens de Bélicos/t

Bens de Consumo/tB2 B1 BCmax

BCs

BCs = BCmax-B1 = Custo de G1

Curva de Possibilidade deProdução (CPP)G2

[

G1

0

Page 40: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•76 77•

A curva de Possibilidade de Produção (CPP) mostra as combinações possíveis da produção dos dois “tipos” de bens, dados a dotação de recursos da economia, o seu nível tecnológico e o pleno emprego dos seus recursos. A CPP tem esse for-mato (é côncava em relação à origem) refletindo os rendimentos decrescentes na produção, pois existem fatores que são mais adequados à produção de um bem do que de outros, de modo que a sua realocação para outro processo produtivo reduz a sua produtividade. A existência de rendimentos decrescentes explica a tendência dos custos crescentes. Quanto mais for produzido de um produto, coeteris paribus 2, maior será o seu custo de oportunidade, pois a cada aumento da produção de um bem, menos adequados serão certos recursos para a sua pro-dução.

Observe na Figura 1 que ao dobrar a produção de bens bélicos para G2 (= 2*G1), o seu custo (B1-B2), em bens de consumo é maior do que o custo de G1 (BCs).

1.2. Custo Econômico x Contábil

Na vida prática, as empresas determinam os custos de seus produtos compu-tando o valor da quantidade de insumos empregada na produção de suas linhas de produção. Embasando esse procedimento há três pressupostos: 1) Existe uma relação entre a quantidade de insumos (fatores de produção) e a quantidade má-xima que pode ser produzida por período de tempo, denominada função de produção; 2) os preços de mercado dos insumos refletem o seus custo de oportu-nidade, de modo que o custo computado a partir desses preços refletirá o custo de oportunidade do produto; 3) todos os recursos consumidos na produção são computados para fins do cálculo do custo.

A função de produção garante que cada combinação de insumos associa-se a um determinado nível máximo de produto. Na realidade, todavia, raramente, se encontrarão empresas que operam com funções de produção de um único bem. Em geral, são funções multiproduto, ou seja, uma combinação de insumos gera uma combinação de produtos produzidos pela empresa.

O segundo pressuposto significa que os preços foram formados em mercados competitivos, o que raramente ocorre na realidade. Em um mercado competiti-vo, a concorrência entre os agentes econômicos os induz a produzir ao mínimo custo e a vender a esse preço, representando assim o sacrifício de recursos para a sua produção. Vários problemas interferem e modificam esse resultado. Aqui serão destacados dois tipos.

2 Expressão latina que significa “tudo o mais constante”.

Existem atividades em que a empresa não remunera todos os recursos uti-lizados na produção, como quando ocorrem externalidades negativas, ou seja, a atividade produtiva gera custos para outros agentes que não participaram daquela decisão de produção. Nesses casos, o custo privado – o custo incorrido diretamente pela empresa ou unidade produtiva – se diferencia do custo social (do custo de oportunidade). Uma ilustração desse problema é o caso de uma indústria que polui um rio, que é fonte de atividade pesqueira à jusante. Com a poluição, a produtividade dos pescadores declina, assim como a renda extraída da pesca. Em outras palavras, parte da renda dos pescadores é sacrificada, pois o recurso “rio” é utilizado pela empresa que não incorre em desembolso pelo uso do mesmo e computa assim um custo para seu produto inferior ao custo de oportunidade. Sob a perspectiva da sociedade, o custo do produto industrial deveria incluir:

CPI = CDi + Cext

onde: CPI = Custo do produto industrial = custo social do produto industrial;CDi = custo desembolsado pela empresa (custo privado); Cext = a perda ocorrida na produção pesqueira (custo externo);

Outro exemplo de diferença entre custo privado e custo social, envolvendo externalidades, refere-se aos custos do tratamento de uma determinada doença, que além dos custos específicos do tratamento (custos dos serviços de saúde, medicamentos pagos pelos próprios pacientes, transporte até a unidade de saúde etc.) englobam os custos derivados das perdas de produção decorrente da falta ao trabalho devido à doença do paciente e eventualmente de um parente que o acompanhe.

O terceiro pressuposto, que também se relaciona com a ideia anterior, abrange outra categoria de insumos. Recursos próprios não implicam desembolsos diretos ao serem utilizados na produção. Estes recursos geram o que se denomina custos implícitos, recursos são consumidos, mas não ocorrem desembolsos por parte da empresa. Nestes casos, para computar o custo social do produto o valor desses re-cursos deve ser imputado buscando o seu custo de oportunidade. Dois exemplos devem ser aqui examinados.

Supondo que em determinada empresa o seu proprietário, além do capital, preste serviços inerentes à sua formação profissional em seu negócio. Não ne-cessariamente este indivíduo fará retiradas regulares a título de remuneração, de modo que seu contador, para fins fiscais e de apuração de resultados, não com-

Custos Para Avaliação De Tecnologias Em Saúde

Page 41: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•78 79•

putará gastos que não ocorreram. Entretanto, aplicando-se o conceito de custo de oportunidade, fica evidente de que se esse indivíduo estivesse empregado em alguma outra empresa receberia salário equivalente ao de mercado assim ao tra-balhar em seu negócio, ele sacrifica o salário que receberia em outro emprego. Do ponto de vista econômico, o custo de seu produto precisa incorporar, além dos custos de materiais, serviços públicos, salários de outros empregados, um salário imputado por sua participação na produção.

O segundo exemplo refere-se ao custo do capital empregado em determinado negócio ou organização. Uma vez realizado o investimento com recursos próprios na aquisição de imóvel, de equipamentos, de instrumentos, de estoques, os recur-sos monetários correspondentes não estão disponíveis para aplicações alternativas. Aqui novamente temos custos implícitos que não serão computados em nível con-tábil, mas em termos econômicos deverão ser considerados. Neste caso, os juros de mercado que poderiam ser obtidos do volume de recursos monetários aplicados no negócio representam o sacrifício de rendimento que a aplicação dos recursos no negócio implica. Em outras palavras, os juros que seriam recebidos de aplicação fi-nanceira representam o sacrifício médio que o agente incorre ao decidir a aplicação de recursos em seu negócio e não em outra atividade. Assim, o montante de juros que são sacrificados, representam o custo de oportunidade do capital, e deve ser incluído no cômputo do custo total do produto.

Em geral, o custo contábil limita-se a computar os custos explícitos de acordo com as regras fiscais do país (Martins, 2009), ao passo que o custo econômico inclui além dos custos explícitos, os custos implícitos, sejam eles decorrentes de externalidades negativas sejam eles associados a recursos próprios.

2. Custo para Avaliação de Tecnologia em Saúde

Quando uma nova tecnologia se apresenta, grande ênfase é dada sobre os resultados e benefícios que ela trará. Isso é particularmente verdadeiro em se tra-tando de tecnologias voltadas para a saúde, como novos medicamentos ou novos equipamentos diagnósticos, entre outros.

Considerando a escassez de recursos, a avaliação dos benefícios de uma nova tecnologia, entretanto, não é suficiente para determinar a sua adoção. Drum-mond et al. (2005) já indicava a importância de comparar os benefícios aos cus-tos associados à nova tecnologia, bem como de identificar entre os benefícios os custos evitados por ela. O autor também enfatiza a importância de se distinguir, na avaliação econômica de uma nova intervenção ou tecnologia, a perspectiva da análise, a qual por sua vez define quais os custos relevantes a serem considerados. Para Drummond et al. (2005) a perspectiva da sociedade implica a consideração

do custo social; na perspectiva da organização provedora dos serviços, o custo privado é o de maior interesse; na perspectiva do órgão pagador, a parte do custo que lhe compete é a de interesse; e na perspectiva do paciente, quando os custos incorridos diretamente por ele devem ser o parâmetro a ser comparado aos be-nefícios esperados.

Sob a visão de Drummond et al. (2005) o custo social em estudos de avaliação econômica em saúde engloba os custos diretos e os custos indiretos3. Os custos diretos envolvem três categorias: Custos do setor de assistência à saúde; Custos de outros setores; Custos do paciente e de sua família. Os custos indiretos corres-pondem às perdas de produtividade4 de algum modo associadas ao tratamento e/ou à doença ou à tecnologia. Além destes, também vale discutir os possíveis custos evitados por uma nova tecnologia, que se constituem parte dos benefícios a serem atribuídos a ela.

2.1. Custos do setor de assistência à saúde

Tratamentos ou aplicação de novas tecnologias de saúde ocorrem, preferencial-mente, em unidades de assistência à saúde, tais como hospitais, clínicas e unidades de diagnóstico, entre outras. A prestação de serviços dessas unidades implica o consumo de recursos e, consequentemente, custos que devem ser assumidos pela organização. Os recursos empregados por uma organização ou provedor de serviços de saúde envolvem desde a infraestrutura física (espaço, imóvel, mobiliário, equi-pamentos), os recursos humanos de diversas especialidades, os materiais de consu-mo gerais e específicos aos serviços de saúde fornecidos pela unidade. De acordo com a terminologia econômica, utilizada por Drummond et al. (2005), o cômputo dos custos incorridos pela organização no tratamento ou na utilização de uma nova tecnologia, parte dos custos diretos5, englobam os custos médicos e não médicos.

Os custos médicos são aqueles que envolvem insumos aplicados diretamen-te nos tratamentos, tais como medicamentos, materiais médicos, equipamentos diagnósticos, recursos humanos da área da saúde (médicos, enfermeiros, auxilia-

3 É importante salientar que o significado das expressões “custos diretos” e “custos indiretos” aqui expostas se diferencia da linguagem contábil. De fato, para a contabilidade os custos diretos relacionam-se ao valor dos recursos cujo uso é fácil e diretamente identificado com o produto ou serviço gerado, ou seja, têm corres-pondência ao que é chamado de custos médicos; ao passo que os custos indiretos, segundo a visão contábil, correspondem aos custos não médicos, conforme a terminologia da Economia da Saúde, aqui adotada.4 Externalidades negativas da doença ou do tratamento!5 Como mencionado adiante, do custo da assistência à saúde deve ser deduzida a parcela paga pelo paciente ao seguro saúde quando este for o caso.

Custos Para Avaliação De Tecnologias Em Saúde

Page 42: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•80 81•

res, nutricionistas etc.). Os custos médicos podem ainda ser divididos em custos específicos e não específicos ou compartilhados. Os primeiros representam os custos que são facilmente identificados com o tratamento, como por exemplo, o antibiótico para o tratamento de uma infecção com um uso rival6. Os custos não específicos são os que envolvem insumos compartilhados (uso não rival) cujo consumo específico a um determinado tratamento não é de fácil determinação. Um exemplo aqui seria o custo de um equipamento diagnóstico utilizado em vários e diferentes casos, sendo difícil a determinação da parcela de seu custo atribuído a cada uso em particular.

Os custos não médicos são aqueles que envolvem recursos necessários a qual-quer atividade e não têm um papel determinado no tratamento, como é o caso dos serviços de computação utilizados pela administração para controlar esto-ques, folhas de pagamento, ou ainda serviços de limpeza, lavanderia7.

Os custos diretos, entretanto, não ocorrem exclusivamente em nível do se-tor de assistência à saúde. Outros setores incorrem em custos em função das necessidades e ofertas de saúde, bem como os próprios pacientes e suas famílias incorrem em gastos em virtude dos problemas de saúde que enfrentam e/ou dos tratamentos que recebem.

2.2. Custos de outros setores

Aqui a gama de possibilidades se amplia e sua determinação depende em larga medida do problema em foco. Visando dar uma ideia do que pode ser conside-rado como custo de outros setores, Drummond et al. (2005) dão como exemplo os custos inerentes ao recolhimento e/ou atendimento de pacientes por serviço de resgate, ou ainda os serviços de atendimento domiciliar.

2.3. Custos do paciente e de sua família

Quando uma pessoa adoece e busca tratamento, mesmo que tenha acesso ao serviço público de saúde ou a um seguro saúde particular ela incorrerá em gastos diretos, em função da doença e do tratamento. Drummond et al. (2005) destacam nesta categoria os gastos com transporte até a unidade de saúde e even-tualmente de hospedagem, os gastos extras com alimentação, os pagamentos a

6 Uma vez que o paciente tenha tomado a capsula do medicamento, ela não estará disponível para outro paciente.7 Sua ausência pode prejudicar o tratamento, mas a sua presença não se associa especificamente ao serviço!

profissionais para cuidado domiciliar ao próprio paciente ou a seus dependentes, dada a impossibilidade pessoal de dar conta dessa tarefa, além do desembolso para o pagamento do seguro saúde quando este for o caso. Nesse contexto, o autor enfatiza que esta última parcela – o pagamento ao seguro saúde – deve ser descontado dos custos do setor de assistência à saúde.

Estas são as três categorias de custos que compõem os custos diretos, todavia, o custo social de um tratamento ou de uma intervenção em saúde não se esgota aqui. De acordo com o autor, é necessário computar os custos indiretos.

2.4. Perdas de produtividade

Os custos indiretos (ou externos) neste contexto são definidos por Drum-mond et al. (2005) e por Rascatti ( 2010) como o sacrifício de alguma forma associado à doença ou à intervenção em foco, em termos de produção. Em re-sumo, o fato de um trabalhador ficar doente e ter de faltar ao trabalho, em uma economia em pleno emprego, implicaria a queda da produção em virtude de sua ausência. A doença (como também o tratamento) impõe um custo, mensurado pelo montante perdido de produção. Esse tipo de custo se amplia na medida em que mais membros da família precisam abandonar o emprego ou licenciar-se para dar apoio e cuidados ao paciente. Ou ainda, se o paciente perde aulas e/ou reduz seu aprendizado em função da doença ou de seu tratamento, com implica-ções sobre a sua produtividade futura.

2.5. Custos Evitados, Benefícios Obtidos

Considerando-se que uma nova tecnologia visa uma maior resolutividade, entende-se que em comparação com os processos existentes ela oferecerá resulta-dos mais positivos do que os alcançados até então. Assim, por exemplo, para um novo imunológico, visando uma determinada doença que já dispunha de uma vacina, espera-se que a sua efetividade seja maior do que a prevalecente. Espera-se que um novo equipamento diagnóstico consiga detectar os problemas de modo mais precoce e com mais precisão do que os equipamentos tradicionais. Mas além desses resultados, em determinados casos, é possível identificar custos que deixam de existir graças à nova intervenção. Na medida em que a nova vacina é mais efetiva, a taxa de incidência declinará e menos pessoas deixarão de ir ao trabalho por causa da doença, reduzindo as perdas de produção derivadas desta. Em outros casos, uma nova terapia que reduz a taxa de mortalidade ou prolon-ga a vida ativa do paciente contribuirá para reduzir as perdas de produção que ocorreriam caso não existisse. Ou seja, os custos indiretos evitados, em função da

Custos Para Avaliação De Tecnologias Em Saúde

Page 43: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•82 83•

efetividade da intervenção, constituem, de fato, benefícios a serem computados como tal na avaliação econômica da intervenção.

Em resumo, os custos indiretos de uma doença, quando evitados em virtude de uma nova intervenção, precisam ser computados como benefícios desta.

3. À Guisa de Conclusão

Um dos principais problemas recorrentes no sistema de saúde brasileiro relacio-na-se à ineficiência. A formação do profissional de saúde ainda hoje não contempla de modo efetivo a questão econômica fundamental, qual seja a escassez de recursos. Além disso – ante o tipo de organização das atividades econômicas e da forma de participação no produto, a grande disparidade de conhecimentos e informações ao lado da característica inerentemente humana do egoísmo – as escolhas raramente são feitas considerando-se os custos e benefícios sociais envolvidos.

Institucionalizar diretrizes no sentido de incorporar às rotinas da gestão do sistema de saúde o monitoramento dos custos e a avaliação econômica de novas medidas, reformas ou tecnologias constitui contribuição importante para reorga-nização e sustentabilidade do SUS, para que ele alcance efetivamente seus objeti-vos de universalidade, integralidade e equidade.

Bibliografias

Beulke R e Bertó DJ. Estrutura e análise de custos. 1ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2001.Drummond MF, O’Brien BJ, Stoddart GI, Torrance GW. Methods for the economic evaluation of

health care programmes. Oxford New York Toronto, 2005.Ferguson CE. Microeconomia. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1978, p.231.Martins E. Contabilidade de Custos. São Paulo: Editora Atlas, 2009.Paulani, LM e Braga, MB. A nova contabilidade social. São Paulo: Editora Saraiva, 2000, p.14.Raskati, KL. Introdução à farmacoeconomia. Porto Alegre: Artmed, 2010.Sarti, M e Cyrillo, DC. Avaliação de custos em projetos de economia da saúde. In: Nita ME, Secoli SR, Nobre MRC, Campino ACC, Sarti FM, Costa AMN, Carilho FJ (Orgs). Avaliação

de Tecnologias em Saúde: Evidência Clínica, Análise Econômica e Análise de Decisão. Porto Alegre/RS: Artmed, 2009.

Texto 2

M E D I C I N A B A S E A D A E M E V I D Ê N C I A S E AVA L I AÇ ÃO D E T E C N O LO G I A S E M S AÚ D EEDINA MARIKO KOGA DA SILVA 1

Introdução

A medicina baseada em evidências (MBE) é o uso consciente, explícito e cri-teriosos da melhor evidência para a tomada de decisão sobre o cuidado de um paciente. Isso significa integrar a experiência individual com a melhor evidên-cia clínica disponível de pesquisas científicas. A prática médica tradicional era baseada em observação, conhecimento e experiência pessoal não sistematizada. Esses fatores permanecem essenciais, mas insuficientes, devendo ser associados a resultados de pesquisas clinicamente relevantes, com métodos adequados para responder a uma questão clínica.

A Medicina, durante muito tempo, baseou-se nas experiências pessoais, na autoridade dos indivíduos com maiores títulos acadêmicos e nas teorias fisio-patológicas. A Medicina Baseada em Evidências – ou em provas científicas rigorosas – tem, para nortear as tomadas de decisões sobre os cuidados em saúde, o compromisso da busca explícita e honesta das melhores evidências científicas da literatura médica. Portanto, essa concepção de Medicina tira a ênfase da prática baseada apenas na intuição, na experiência clínica não siste-matizada e nas teorias fisiopatológicas para se concentrar na análise apurada de métodos por meios dos quais as informações médicas foram ou serão obtidas. Dá especial atenção ao desenho da pesquisa, à sua condução e à análise estatís-tica. No tocante ao método de pesquisa, ele se baseia na associação de métodos epidemiológicos à pesquisa clínica chamada Epidemiologia Clínica. Esse con-junto se completa com métodos bem definidos para avaliação crítica e revisões sistemáticas da literatura médica.

Há ainda, além do julgamento competente e honesto das informações, a par-ticipação das preferências do paciente devidamente informado no processo de decisão do médico. A experiência profissional na aplicação daquilo que tem boa base científica permite o ajuste fino tanto da prática quanto da criação de novas

1 Vice-diretora do Centro Cochrane do Brasil.

Capítulo III

Page 44: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•84 85•

Avaliação de Tecnologias em Saúde

A necessidade de avaliações de tecnologias em saúde (ATS) cresce continua-mente, oriunda da tensão entre novas e sempre mais custosa nova tecnologias e o orçamento da saúde, seja este público ou privado, sempre limitado e finito. A ATS tem sido chamada de “ponte entre a evidência e a política de saúde”, porque busca oferecer a quem necessita informação baseada em evidências acessíveis, utilizáveis, que vão ajudar as decisões sobre a incorporação de novas tecnologias e a eficiente alocação de recursos. As tecnologias em saúde incluem drogas, apa-relhos médicos, procedimentos diagnósticos, clínicos e cirúrgicos.

A ATS é uma atividade multidisciplinar que avalia sistematicamente o desem-penho técnico, segurança, eficácia clínica, efetividade, custo-efetividade, impli-cações organizacionais, consequências sociais, legais e éticas da aplicação de uma tecnologia em saúde.

Ao contrário dos processos de registro de novas drogas e intervenções médi-cas, que avaliam a segurança e eficácia, a ATS foca o valor clínico e econômico da tecnologia comparado à clínica atual. A ATS ajuda a tomadores de decisão avaliar qual tecnologia é mais útil e definir melhor a alocações dos recursos financeiros, diminuindo a adoção de intervenções não seguras ou inefetivas, ou aquelas que apenas agregam alto custo, sem ganho em termos de saúde.

Medicina Baseada em Evidências e Avaliação de Tecnologias em Saúde

pesquisas. Assim, utilizando-se da Medicina Baseada em Evidências, não teremos a garantia de bons resultados, mas diminuem-se claramente as possibilidades de maus resultados, aumentando a eficiência profissional, com menor desperdício de recursos e energia do médico e do paciente.

Em suma, o médico, ao envolver sua conduta no compromisso com a boa evidência científica, não está diminuindo sua capacidade global de decisão que é e sempre será sua. A sensibilidade e experiência do médico continuam, só que com algo mais, que são informações precisas a orientá-lo naquilo que já foi tes-tado adequadamente à luz da ciência. Ele pode então ganhar experiência naquilo que funciona e evitar o que sabidamente pode comprometer os resultados do seu trabalho e a saúde dos seus pacientes.

A tradução do conhecimento oriundo das pesquisas para os profissionais da saúde é um processo complexo, repleto de desafios. Pode levar anos para que os achados científicos se tornem de conhecimento comum e mais ainda para real-mente alterar a prática. A prática da saúde baseada em evidencias é um objetivo comum a todos os indivíduos e organizações que necessitam revisar reavaliar e revitalizar as práticas na área de saúde, tornando o conhecimento mais atual ge-rado pela pesquisa em prática.

Revisão Sistemática e Metanálise

O rápido desenvolvimento das pesquisas científicas observado nas últimas dé-cadas está refletido nas milhares de publicações da área de saúde com estimados dois milhões de artigos novos publicados por ano. Nesse número crescente de publicações o problema da qualidade dos estudos é uma questão ainda não resol-vida. Consequentemente, as boas evidências, aquelas que o profissional deveria rapidamente tomar conhecimento, ficam perdidas, misturadas às pesquisas com resultados não confiáveis devido a problemas metodológicos.

Em resposta a esse problema, as revisões sistemáticas podem auxiliar o pro-fissional sumarizando essa grande quantidade de informações, com a aplicação de estratégias científicas que limitam os vieses para localizar, avaliar criticamente e sintetizar todos os estudos relevantes sobre uma questão clínica específica. A revisão sistemática é, portanto, uma síntese de estudos primários que contêm objetivos, material e métodos estabelecidos através de metodologia explícita e reprodutível. Essa revisão sistemática pode incluir uma metanálise, método es-tatístico para integrar os resultados de mais de um estudo para produzir uma estimativa sumarizada do efeito de uma intervenção. A metanálise, portanto, é apenas uma ferramenta estatística da revisão sistemática e nem todas as revisões necessariamente incluem a metanálise. Ela é realizada quando a revisão inclui mais de um trabalho quantitativo, quando os resultados são homogêneos permi-tindo sua síntese.

Page 45: A Economia Da Saude

87•

Texto 3

AVA L I AÇ ÃO D E T E C N O LO G I A S E M S AÚ D E PA R A A TO M A D A D E D E C I S ÃO : R E P E R C U S -S ÃO E P I D E M I O LÓ G I C A E E CO N Ô M I C APROFA. LIVRE-DOCENTE DRA PAOLA ZUCCHI1

Desde a década de 1960 existe o reconhecimento da importância de avaliar as tecnologias no seu aspecto amplo de benefícios e potenciais prejuízos à saúde.

Nesse cenário surge a Avaliação da Tecnologia em Saúde – ATS que consti-tuiu uma área do conhecimento direcionada à análise crítica do papel da tecno-logia no setor saúde e envolve uma revisão ampla das evidências que sustentam os benefícios e os riscos e as avaliações de eficácia, custo-efetividade e impacto na saúde do paciente e no sistema de saúde.

No setor saúde a avaliação das tecnologias torna-se importante durante a dé-cada de 1970 pelo aumento do número de tecnologias desenvolvidas, disponíveis no mercado e pela pressão para a sua incorporação nos sistemas de saúde. A partir daí torna-se essencial como ferramenta para auxiliar os gestores do setor saúde, sejam eles do setor público ou do setor privado, a tomarem suas decisões de forma mais adequada e tendo sempre em mente que os recursos financeiros disponíveis são limitados e finitos.

A avaliação da tecnologia em saúde cresceu mais recentemente nos diversos sistemas de saúde associada à expansão da atenção à saúde e ao desenvolvimento tecnológico e científico na área, gerando a introdução de novas tecnologias, com consequentes implicações sociais, políticas, econômicas e sanitárias aos serviços de saúde.

Podemos considerar como tecnologias no setor saúde, máquinas, procedi-mentos clínicos e cirúrgicos, medicamentos, programas e sistemas para prover cuidados à saúde. Essas tecnologias fazem parte dos programas de assistência à saúde e nas últimas décadas temos percebido o aumento da dependência dessa instrumentalização. A avaliação da tecnologia em saúde compreende como “tec-nologia em saúde” todo e qualquer método/dispositivo utilizado para promover a

1 Livre-docente pela Universidade Federal de São Paulo e Vice-diretora do Centro Interdepartamental de Economia da Saúde da Universidade Federal de São Paulo – Crides-Unifesp.

Page 46: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•88 89•

Na prática observada tanto no Brasil como internacionalmente, a expansão das áreas de intervenção relaciona-se tanto com a introdução de novas tecnolo-gias como novas indicações de tecnologias estabelecidas.

Observa-se na dinâmica do mercado de saúde, um aproveitamento de qual-quer oportunidade de agregar valor aos bens produzidos, determinando uma situação de permanente expansão potencial dos serviços, tratamentos e curas. Por isso a velocidade da incorporação da inovação tecnológica no setor saúde tem sido considerada uma das razões para o crescimento dos gastos no setor.

Os responsáveis pela decisão e os formuladores de políticas, em consonância com os anseios sociais, devem ser capazes de identificar as tecnologias com maior benefício para a sociedade e excluir as que possuem impacto incerto ou marginal, quando possível. Para isso, são necessárias ferramentas consistentes capazes de sis-tematizar a informação disponível e orientar a tomada de decisão. A avaliação da tecnologia em saúde tem sido apontada como um meio de obter esse resultado.

A avaliação da tecnologia em saúde é a síntese da evidência científica disponí-vel sobre as implicações da utilização das tecnologias em saúde, visando orientar tecnicamente a tomada de decisão sobre a gestão de tecnologias, seja com vistas à incorporação, descarte ou organização do acesso e compreende várias dimensões, necessitando assim agregar várias áreas do conhecimento.

O objetivo primário das avaliações da tecnologia em saúde é embasar decisões que são tomadas por diversos atores. Gestores do sistema de saúde e estabeleci-mentos de assistência à saúde, médicos, usuários e cidadãos decidem sobre dife-rentes níveis de adoção, ou não, e indicação das várias tecnologias para a saúde e muitas vezes não se preocupam com a repercussão sobre a saúde e o impacto financeiro dessa decisão, pensando no benefício do paciente e esquecendo-se da comunidade e mesmo que alguém financiará as ações.

A demanda por serviços e atenção à saúde é modulada pela própria oferta, por conhecimentos e pressões de interesses diversos, entre outros fatores deter-minantes ou modificadores e o objetivo dos estudos de avaliação da tecnologia em saúde é subsidiar a tomada de decisão quanto ao uso racional das tecnologias. Isso implica na seleção de tecnologias a serem financiadas e na identificação das condições ou dos subgrupos em que elas deverão ser utilizadas, no sentido de tornar o sistema de saúde mais eficiente para promover, proteger e recuperar a saúde da população. Dessa forma, em um cenário ideal, toda tecnologia que busque melhorar a saúde da população deve ser alvo de avaliação nos princípios da avaliação da tecnologia em saúde.

Neste processo, a sistematização do conhecimento consiste em obter evidên-cia de duas categorias distintas. A primeira refere-se à evidência que é pouco influenciada pelo contexto em que esta incluída. Nessa categoria encontram-se informações sobre acurácia (capacidade da tecnologia de acertar o diagnóstico),

Avaliação de tecnologias em saúde para a tomada de decisão

saúde, impedir a morte, tratar doenças e melhorar a reabilitação ou o cuidado do indivíduo ou da população. As tecnologias, neste contexto, não incluem somente equipamentos, também medicamentos, procedimentos médicos ou cirúrgicos e modelos tecnoassistenciais.

Adotando os mais variados métodos de pesquisa, a avaliação de tecnologias em saúde propõe-se a qualificar e quantificar de forma sistemática, bem como desen-volver o conhecimento científico, sobre uma tecnologia ou um conjunto delas, re-levante para um programa, visando à tomada de decisões, tanto de adoção quanto de abandono ou substituição de tecnologias. Essas decisões devem caracterizar-se por serem mais objetivas, embasadas numa informação com comprovação científi-ca, com análise dos recursos financeiros disponíveis e sob a orientação de critérios epidemiológicos e clínicos, promovendo uma atenção com segurança adequada e não ofereça riscos aos pacientes. Essa decisão deve respeitar os princípios básicos da justiça, da responsabilidade fiscal e os princípios e diretrizes do tipo de sistema de saúde onde a tecnologia será incorporada ou retirada.

A tomada de decisão pelo gestor de saúde deve sempre levar em conta o aten-dimento das necessidades da comunidade, analisando os critérios epidemiológi-cos, clínicos e não puramente econômicos. Essa decisão, portanto, em algumas situações, deve ser descentralizada e customizada, devendo-se levar em conta a realidade de saúde de cada população, analisando de forma adequada as carac-terísticas especificas de cada região. Deve-se considerar a possibilidade de não tomar a mesma decisão para microrregiões diversas.

Num país de dimensões continentais como é o caso do Brasil, que é constituí- do de diversos perfis epidemiológicos e necessidades de saúde, deve-se levar em conta quais são as ações prioritárias em processos de tomada de decisão referente à incorporação ou retirada de tecnologias em saúde.

A mudança nas tecnologias utilizadas para prover a assistência à saúde trouxe vários benefícios à longevidade e à qualidade de vida da população, mas também trouxe novos desafios e problemáticas. Neste cenário a avaliação da tecnologia em saúde, como instrumento de política de saúde, deve ser considerada em um con-texto de uso racional de metodologias para auxiliar a decisão e o gerenciamento de tecnologias, visando melhorar a assistência e a saúde da população-alvo.

O grande desafio para os governos e gestores de saúde é melhorar a qualida-de e a eficiência dos serviços de saúde, considerando a enorme complexidade dos sistemas públicos e privados de saúde e a dificuldade de se atingir metas diante de recursos restritos destinados ao setor saúde. A trajetória de uma tec-nologia não é um fenômeno isolado, seu impacto no sistema de saúde pode ser uma cascata que propicie outros desenvolvimentos tecnológicos e sua adoção poderá ter repercussão importante para o indivíduo, a comunidade e o sistema de saúde.

Page 47: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•90 91•

organizações voltadas ao desenvolvimento de estudos nessa área. Entre os países que adotaram essa estratégia podemos citar o Canadá, Reino Unido, Austrália, Dinamarca, França, Espanha, Brasil entre outros.

A avaliação da tecnologia em saúde tem como objetivo maior fornecer aos responsáveis pela decisão informações quanto ao potencial impacto e conse- quências econômicas de determinadas tecnologias ou mudanças na utilização de tecnologia antiga.

Há preocupação com as consequências diretas, indiretas ou secundárias, os benefícios e as desvantagens e o mapeamento das etapas envolvidas em qualquer transferência de tecnologia, tanto no setor privado quanto no público. Desse modo, é possível fornecer aos tomadores de decisão uma análise hierarquizada das opções para determinação de políticas de saúde, com entendimento das im-plicações econômicas, ambientais, sociais, políticas e legais para a sociedade.

No Brasil, pesquisas na área de avaliação da tecnologia em saúde foram des-critas há algumas décadas, provenientes de instituições de ensino e pesquisa, em caráter acadêmico, inseridas em linhas de pesquisa clínica e de saúde coletiva. Essa fase inicial foi mais voltada à construção de pesquisas de avaliação ou in-vestigatória, na qual o objetivo prioritário era a produção de conhecimento de qualidade e rigor metodológico.

Ainda na década de 1990, o cenário mostrava que as avaliações e as alterna-tivas metodológicas faziam parte das preocupações dos gestores, tanto no setor público quanto no setor privado, mas a pesquisa aplicada ao processo decisório ainda era incipiente.

No setor público, o interesse maior foi pela avaliação de programas, seguido pelas avaliações da qualidade e tecnologias. No setor privado, o interesse maior foi pelas propostas de gestão e garantia da qualidade, além da difusão dos siste-mas de acreditação e monitoramento de hospitais.

Na década de 2000, surgiram várias iniciativas com diferentes propósitos, mas fundamentalmente com o objetivo de regular o consumo desenfreado, a incorpo-ração de tecnologias e os custos da saúde.

No Brasil, a partir de 2002, uma mudança institucional mais profunda é desencadeada pelo Ministério da Saúde com a criação da Secretaria de Ciência, e Tecnologia e Insumos Estratégicos – SCITIE e do Departamento de Ciência e Tecnologia – Decit. Esse órgão conduzia as diretrizes e promovia a avaliação tecnológica para incorporação de novos produtos e processos por parte dos ges-tores, prestadores e profissionais dos serviços no Sistema Único de Saúde – SUS.

Em 2005, a Portaria nº 2.510/GM instituiu a Política Nacional de Gestão de Tecnologias em Saúde, do Ministério da Saúde, estabelecendo um novo fluxo de processo no âmbito da avaliação de tecnologia em saúde. A gestão de tecnologias em saúde passou a ser entendida como o conjunto de atividades relacionadas a

Avaliação de tecnologias em saúde para a tomada de decisão

eficácia (benefício da tecnologia sob condições ideais) e segurança (existência de efeitos colaterais adversos provenientes do uso da tecnologia). Na segunda cate-goria a evidência é fortemente sensível ao contexto ao qual pertence.

São exemplos as estimativas de efetividade (benefício da tecnologia sob con-dições da prática clínica habitual), custo-efetividade (análise comparativa de duas ou mais tecnologias em termos de seus custos e benefícios) e impacto orçamen-tário (estimativa do aumento do gasto proveniente da introdução e da difusão de uma tecnologia em um sistema de saúde), além dos aspectos sobre equidade (igualdade de atenção à saúde sem privilégios ou preconceitos) e ética (adequação à filosofia ou código delimitado pelos princípios de moralidade que são definidos por uma sociedade ou cultura).

Nesses casos, deve haver muita cautela em transferir as recomendações de estudos realizados em outros contextos para determinada situação, pois existe grande variabilidade nas questões relativas ao acesso ao sistema, à estrutura de custos do sistema de saúde e às especificações da região, tais como fatores epide-miológicos, culturais e morais e necessidade em saúde. Por isso é imprescindível a produção de conhecimento local, sendo necessário o envolvimento de institui-ções de ensino e mecanismos de fomento à pesquisa.

O uso da avaliação da tecnologia em saúde tem maior potencial nas esferas in-termediária e macro dos sistemas de saúde já que nestes o foco da atenção está dire-cionado ao conjunto de pessoas, seja na perspectiva regional, seja na nacional. Na esfera micro utilizam-se mais as ferramentas de medicina baseada em evidências, dado que o foco é o paciente, levando em consideração suas preferências, a habili-dade do profissional de saúde e a melhor evidência científica disponível. Nas esferas intermediárias e macro, a avaliação da tecnologia em saúde pode subsidiar a toma-da de decisão no que se refere a registro, incorporação, reembolso e acesso (grupos a serem beneficiados) às tecnologias, além da gestão e organização do sistema.

A avaliação da tecnologia em saúde pode também subsidiar a decisão sobre a melhor forma de disponibilizar as tecnologias incorporadas ao sistema de saúde. A avaliação da tecnologia em saúde não focaliza apenas os efeitos das tecnologias em saúde, mas também sistematiza informações relevantes para subsidiar deci-sões sobre gestão e organização dos sistemas de saúde.

Cabe ressaltar que a avaliação da tecnologia em saúde não é o único insumo para a tomada de decisão. Muitas vezes, a evidência científica é escassa ou ine-xistente. Assim, outras formas de informação subsidiam a tomada de decisão tais como a opinião dos profissionais, julgamento político, valores e tradições, pressão de outros atores a saúde ou da sociedade, contingências conjunturais etc.

Vários países têm identificado a avaliação da tecnologia em saúde como a pon-te entre o conhecimento científico e a tomada de decisão, gerando um processo de institucionalização dessa ferramenta nos sistemas de saúde, com a criação de

Page 48: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•92 93•

Além de um modelo de gestão o Decit/MS estabeleceu parcerias com institui-ções de ensino para elaboração de cursos de mestrado profissional e capacitação em gestão de tecnologia em saúde, com o objetivo de capacitar profissionais das Secretarias de Saúde, de hospitais e de agências reguladoras do SUS. A estratégia de integração de instituições acadêmicas com esse perfil foi o embrião para a construção da Rede Brasileira de Avaliação da Tecnologia em Saúde – Rebrats, criada com a finalidade de congregar estudos e pesquisas no campo prioritário de avaliação da tecnologia em saúde, para padronizar metodologias, validar estudos e disseminar resultado para gestores e sociedade.

Mais recentemente foi construído o Instituto de Avaliação de Tecnologias em Saúde – IATS, como parte do programa estratégico do CNPq para a criação dos institutos nacionais de ciência e tecnologia. O instituto, uma parceria de vários pesquisadores e oito instituições acadêmicas, foi concebido e executado por profissionais com experiência para atuar em diferentes etapas da avaliação da tecnologia em saúde. Tem por objetivo apoiar a formulação de políticas de saú-de, atendendo a demandas governamentais e não governamentais de instituições prestadoras de serviço e da sociedade.

Em 2006 o Brasil, por intermédio do Decit passou a integrar a Rede Inter-nacional de Agências de Avaliação de Tecnologias em Saúde – INATHA. Atual-mente um modelo de avaliação da tecnologia em saúde para o Brasil se encontra em fase de construção e consolidação. Nesse modelo, existe uma aproximação de todos os atores do sistema, tanto gestores públicos quanto privados. Muitos alicerces foram estabelecidos ao longo dos últimos anos e as ações concretas ainda são incipientes.

Nesse contexto a avaliação estruturada de tecnologias em saúde no Brasil per-mite evidenciar o melhor conhecimento disponível no momento da decisão, pois inúmeras escolhas podem ser feitas entre tecnologias estabelecidas ou inovações que muitas vezes competem entre si para a mesma indicação.

É relevante avaliar o benefício e os custos que as tecnologias para a saúde produzem ou tem potencial de produzir e quais as especificações a detalhar, visando promover o uso daquelas mais custo-efetivas e restringir ou retirar aquelas menos custo-efetivas ou obsoletas. Assim, talvez se alcance um geren-ciamento mais efetivo dos escassos recursos, possibilitando aumentar o acesso aos serviços.

A avaliação da tecnologia em saúde assegura aos envolvidos na decisão o aces-so à melhor informação disponível, o melhor embasamento no momento de realizar a decisão, além de propiciar uma defesa legal e civil daqueles envolvidos na decisão.

A avaliação da tecnologia em saúde representa a melhor resposta ao desafio da solidariedade e dos princípios de equidade de acesso. Neste contexto estruturar

Avaliação de tecnologias em saúde para a tomada de decisão

processos de avaliação, difusão, incorporação e retirada de tecnologias no âmbito do SUS.

Nesse processo, os referenciais institucionais, a legislação nacional, o orçamen-to público, as necessidades nacionais, regionais e locais de saúde, as competên-cias gestoras das três esferas governamentais, o controle social e os princípios de equidade que fundamentam a atenção em saúde nos pais são levados em conta.

Com a nova política de ciência e tecnologia o Brasil está planejando recon-quistar a parte da indústria local de equipamentos e artigos para a saúde que se perdeu com a abertura do mercado nos anos 1990.

No caso de decisões de tecnologias em um estabelecimento de saúde, como na esfera central, as escolhas múltiplas dificultam as decisões. Além disso, existe a evolução de uma tecnologia que faz com que as análises sejam escalonadas e re-feitas sempre que um novo aspecto modifique seu efeito, segurança ou indicação.

No Brasil, por lei, todas as compras de produtos para a saúde exigem o respec-tivo registro de autorização para a comercialização, sob pena de conivência com infração sanitária. Isso fez com que a Agencia Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa disponibilizasse para todos os produtos novos que um estabelecimento de saúde adquira no Brasil, uma avaliação de eficácia e segurança de base que permitiu a autorização para a sua comercialização.

Em 2006, o Ministério da Saúde adotou um novo modelo de gerenciamen-to das tecnologias, mediante regulamentação da Comissão para Incorporação de Tecnologias em Saúde – Citec, sob a coordenação da SAS – Secretaria de Atenção à Saúde e com a participação da SCITIE, da Secretaria de Vigilância em Saúde, da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS e da Agencia Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa (Portaria GM nº 152/2006).

Um grupo de trabalho, GT de avaliação da tecnologia em saúde é coordenado pelo Departamento de Ciências e Tecnologias – Decit e constituído por repre-sentantes das Secretarias de Atenção à Saúde – SAS, Secretaria de Ciência e Tec-nologia e Insumos Estratégicos – SCITIE, Decretaria de Gestão dos Trabalhos e Educação em Saúde, Secretaria de Vigilância Sanitária e da Secretaria Executiva, e ainda com a participação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa e da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS. Este grupo de trabalho definiu três critérios básicos para a eleição de tecnologias a serem avaliadas:

• Aquelas em desenvolvimento ou em fase de pré-registro na Anvisa;• As incorporadas ao sistema de saúde, mas com necessidade de avaliação eco-nômica ou com necessidade de avaliação de efetividade em novas indicações;• As registradas com pressão de incorporação.Esses critérios têm como objetivo priorizar os estudos que vão ao encontro das

estratégias e necessidades do SUS.

Page 49: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•94 95•

• Conscientização de que a riqueza da nação não cresce na mesma proporção e/ou é distribuída de forma a permitir que as expectativas do cidadão e da sociedade sejam minimamente atendidas.

Todos esses pontos nos mostram a importância de decisões responsáveis em nome de um todo e para um todo. Para avaliar e orientar a busca de maior efi- ciência do sistema de saúde, quatro aspectos têm sido considerados na avaliação de intervenções utilizadas nos sistemas de saúde:

• Segurança;• Eficácia (se funciona num cenário ideal);• Efetividade (se funciona num cenário real);• Eficiência de produtos e serviços (se estamos obtendo o melhor e o maior benefício possível pelos recursos utilizados).

A administração de recursos escassos torna-se necessária para a promoção da eficiência na produção de bens e serviços para a população, ou seja, busca-se a obtenção do volume máximo de resultados a partir de um volume limitado de recursos produtivos disponíveis, ou seja, se o sistema funciona ou atinge seus objetivos em um cenário ideal e num cenário real e se esta se fazendo o melhor com os recursos disponíveis.

A avaliação em saúde pode ser definida como o estudo de duas ou mais estratégias ou intervenções propostas para o sistema de saúde e, em ambas, os custos incorridos com sua implementação e as consequências em termos de ganhos em saúde com a redução da mortalidade e/ou da morbidade são dire-tamente comparados.

O ideal é que a tecnologia ou intervenção a ser questionada custe menos para o sistema de saúde e proporcione um maior ganho de saúde, quando com-parada com outra disponível. A avaliação em saúde deve ser realizada quando há um trade off com a adoção de uma nova tecnologia, ou seja, há um ganha--perde. A nova tecnologia produz mais saúde, porém consome mais recursos e tem maior custo ou produz menos saúde com o consumo de menos recursos, com menor custo. Nestes dois casos procura-se avaliar se o ganho adicional é justificado pelo consumo adicional de recursos e consequentemente maior custo ou se a redução do ganho de saúde é justificada pela liberação de recursos a investir em outros programas e estratégias de saúde. O que se procura fazer é maximizar o retorno para a sociedade ao longo do tempo para um investimen-to feito.

As principais justificativas para a execução de avaliações de tecnologias em saúde referem-se à redução das incertezas associadas às intervenções em saúde,

Avaliação de tecnologias em saúde para a tomada de decisão

a formalização de avaliação de novas tecnologias nos serviços de saúde pode ser uma solução para aumentar a eficiência dos sistemas de saúde.

A saúde tem sofrido grandes mudanças nas últimas décadas em decorrência de novos conhecimentos e desenvolvimento científico e tecnológico visando atender às necessidades e expectativas da população e gerando com isso um melhor bem-estar. Há por isso um grande desafio que é comum aos diversos e variados sistemas de saúde do mundo: como conciliar expectativas e necessi-dade de potenciais usuários dos sistemas de saúde com os recursos disponíveis para tal, num ambiente complexo e em rápida mudança como é o sistema de saúde? Como conciliar e definir, em termos de qualidade, acesso e custo da assistência à saúde?

A resposta seria oferecer assistência à saúde com qualidade, mínimas restrições ao acesso com um custo que seja suportável pela sociedade. É claro que o enten-dimento de qualidade, acesso e custos são diferentes nas diferentes sociedades e tipos de sistema de saúde. Podemos associar a essas três definições ainda à questão da prioridade que deverá também ser diferente.

É claro que para conciliar o desejo e a necessidade do usuário e os recursos disponíveis há um limitador econômico. Então, em um ambiente com recursos escassos e muita demanda, existe a necessidade de aplicação de fundamentos e princípios econômicos que auxiliem a tomada de decisão.

Uma característica importante é o reconhecimento da crescente complexidade e necessidade de gestão do sistema de saúde. Mais recentemente, com o poder crescente do usuário que tem maior educação e reconhecimento de seus direitos, observa-se uma preocupação com um sistema de saúde fundamentado nas neces-sidades do usuário. Assim, vários países discutem como evoluir ou construir seus sistemas de saúde de modo que atendam aos seguintes princípios:

• Qualidade mínima;• Acesso com a mínima restrição;• Custo máximo suportável pela sociedade.

Além disso, é preciso reconhecer algumas tendências que devem ser analisadas pelos sistemas de saúde:

• Usuário cada vez mais bem informado e demandando mais serviços e pro-dutos;• Aumento das opções de consumo;• Transição demográfica com envelhecimento da população;• Transição epidemiológica, embora não tenhamos ainda resolvido o proble-ma de doenças já de muito conhecidas estamos identificando novas doenças;

Page 50: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•96 97•

principalmente em nível populacional; à possibilidade de alocação racional dos recursos para a redução dos custos associados à saúde; à mensuração das contri-buições efetivas e ponderação dos efeitos colaterais provenientes de ações inova-doras em saúde e à possibilidade de reorientação de ações cujos resultados forem considerados insatisfatórios.

Bibliografia

1. Banta HD, Luce BR. Health care technology and its assessment: an international perspective.

New York: Oxford University Press; 1993

2. Banta D, Jonsson E. History of HTA: Introduction. Int J Technol Assess Health Care. 2009;25

Suppl 1:1-6.

3. Banta D, Almeida RT. The development of health technology assessment in Brazil. Int J Tech-

nol Assess Health Care. 2009;25 Suppl 1:255-9.

4. Goldbaum M, Serruya SJ. O Ministério da Saúde e a política de ciência, tecnologia e inovação

em saúde [The Brazilian Ministry of Health and science, technology, and innovation policy].

Cad. Saúde Pública = Rep. Public Health. 2006;22(3):470-1.

5. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência e Tecnologia. Insumos Estratégicos. Ava-

liação de Tecnologias em Saúde: institucionalização das ações no Ministério da Saúde [Health

technology assessment: institutionalization of actions in the Brazilian Ministry of Health]. Rev.

Saúde Pública = J Public Health. 2006;40(4):743-7.

6. Ministério da Saúde. Consolidação da área de avaliação de tecnologias em saúde no Brasil

[Consolidation of health technology assessment in Brazil]. Rev. Saúde Pública = J Public Health.

2010;44(2):381-3.

7. Banta D. Health technology assessment in Latin America and the Caribbean. Int J Technol

Assess Health care. 2009;25 Suppl 1:253-4.

8. Banta HD. Medical technology and developing countries: the case of Brazil. Int J Health Serv.

1986;16(3):363-73.

9. Neumann PJ. Lessons for health technology assessment: it is not only about the evidence.

Value Health. 2009;12 Suppl 2:S45-8.

10. Ferraz, Marcos Bosi; Soarez, Patricia Coelho de and Zucchi, Paola. Health technology asses-

sment in Brazil: What do Healthcare System Players Think About it?. São Paulo med. j. [online].

2011, vol.129, n.4 [cited 2012-11-27], pp. 198-205 .

Texto 4

I N T E R V E N Ç ÃO D O CO O R D E N A D O RDEBATEDOR: OSWALDO Y. TANAKA1

A utilização da avaliação de tecnologias para a tomada de decisão tem sido um grande desafio no SUS.

A apresentação da Profa. Paola mostra a crescente pressão do mercado para a incorporação de novas tecnologias para a atenção à saúde nos diferentes níveis do sistema de saúde sendo a velocidade de incorporação acelerada sem que possamos analisar a real efetividade desta incorporação na melhoria das condições de saú-de-doença da população usuária. Nesse sentido, estudos têm sido desenvolvidos para identificar evidências científicas que respaldem as incorporações tecnológi-cas e permita tomada de decisões mais objetivas. Definições políticas têm sido adotadas pelo Ministério da Saúde para agilizar/otimizar/objetivar os estudos de avaliação tecnológica, no entanto, a necessidade de manter o rigor científico tem resultado em defasagens de tempo que dificultam a utilização oportuna das in-formações necessárias para a tomada de decisão.

Na apresentação da Profa. Denise ficam explicitados os marcos referenciais teóricos necessários para a incorporação da dimensão econômica para a avalia-ção de tecnologias em saúde. O conceito de custo utilizado permite identificar a carência de informações no sistema para que seja adequadamente aferida. Identifica diversas alternativas de análise de custo e eficiência, apontando a finalidade e utilidade de cada qual. Fica clara a necessidade de um desenho de avaliação que englobe os distintos custos e a necessidade de ser baseado em fontes com grau de confiabilidade aceitável pelos distintos interessados na to-mada de decisão. No entanto, considerando a incipiência de nosso sistema de custo é possível identificar certa fragilidade nas fontes de dados o que dificulta a escolha e a confiabilidade das distintas alternativas de avaliação econômica de tecnologias.

A apresentação da Profa. Edina realça a importância de buscar e utilizar as evidências científicas existentes na literatura, principalmente nas revisões siste-máticas para respaldar a incorporação de tecnologias na atenção á saúde.

1 Professor titular e chefe do Departamento de Prática de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.

Capítulo III

Page 51: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•98 99•

CAPÍTULO IV

Tendo em vista os aportes teóricos apresentados, fica o desafio de qual seria a avaliação de tecnologia em saúde que deve ser impulsionada na instância da ges-tão que permitam tomadas de decisão mais objetivas que possam repercutir em melhoria das condições de saúde da população assistida pelos serviços municipais de saúde?

A tomada de decisão na gestão tem uma variável de difícil controle que é o tempo da tomada de decisão. Na gestão a decisão será tomada no tempo opor-tuno, isto é, no tempo político e não no tempo técnico. O tempo político, aqui mencionado, tem o objetivo de deixar claro que nesse campo não há possiblidade de se esperar o melhor trabalho científico para uma decisão que está sob pressão política imediata.

A avaliação de tecnologia feita por uma instância da gestão deve ter um foco claro e bem definido, que terá de ser captado/interpretado pelos técnicos envol-vidos na avaliação de tecnologia que possam emitir um juízo de valor sobre a tecnologia em questão no tempo político necessário para a tomada de decisão. Provavelmente terá de ser flexível o suficiente para coletar, analisar, comparar e emitir juízo de valor no tempo solicitado políticamente para a tomada de deci-são e possa ser aceitável/confiável pelos distintos interessados nessa incorporação tecnológica. Para tanto, deverá ser capaz de formular a pergunta avaliativa que explicita a necessidade da tecnologia em avaliação e a partir desta deverá realizar as adequações necessárias nos desenhos avaliativos que tenha familiaridade. As técnicas e os instrumentos operacionais deverão ser selecionados de acordo com o tempo disponível para a tomada de decisão. Se sugere utilizar ao máximo dados secundários disponíveis, o que agilizará o processo de coleta e análise de dados e se necessário utilizar parâmetros de significância menos exigentes, mas permitam esclarecer as relações para a tomada de decisão.

A avaliação de tecnologia em saúde para a tomada de decisão realizada por uma instância da gestão é um desafio a ser enfrentado, tendo em vista ser urgente no SUS. O crescente custo da atenção à saúde exigirá decisões mais objetivas que possam aumentar a eficiência no sistema e resultem em melhorias nas condições de saúde da população. Corremos o risco de aumentar o consumo de tecnologia na atenção, sem conhecer ou alcançar uma relação custo efetividade socialmente aceitável no SUS.

Page 52: A Economia Da Saude

101•

CO N C LU S Õ E S E R E CO M E N D AÇÕ E S : P R ÓX I -M O S PA S S O SHELIO NEVES E KATIA CRISTINA BASSICHETTO1

O seminário “Desafios para a incorporação da dimensão econômica na pro-dução de informação para a gestão da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo” constituiu-se como o primeiro momento de discussão pública sobre esta temática no âmbito desta Secretaria. Teve o mérito de possibilitar o afloramento de necessidades dos gestores de saúde e tangenciar possíveis contribuições da área de economia da saúde para o aprimoramento do papel dos municípios no contexto do SUS.

Abertura

Desde a mesa de abertura foi possível observar que há um mosaico de temas que podem ser objeto de estudo, como o apontado pelo Doutor Olímpio Bittar, repre-sentante do Secretário de Estado da Saúde de São Paulo, que menciona as grandes modificações ocorridas na atenção à saúde nos últimos 35 anos, com progressiva compartimentalização das ações em numerosas especialidades profissionais, adoção de um conjunto crescente de procedimentos e equipamentos diagnósticos e tera-pêuticos, cujas consequências não têm sido devidamente mensuradas e avaliadas para o contexto atual do SUS. Saudou o desenvolvimento do campo da economia da saúde como de grande utilidade para avaliações deste tipo na área da saúde.

Nesta mesma mesa de abertura os Conselhos Estadual e Nacional de Secre-tários Municipais de Saúde se fizeram representar pela Doutora Celia Cristi-na Bortoletto, Secretária Municipal da Saúde de Suzano, que afirmou serem as iniciativas dessa natureza da maior importância para os outros municípios, que utilizam as tecnologias desenvolvidas pelo município de São Paulo, o que lhes facilita o trabalho, devendo ser estendido para os municípios da Grande São Paulo, viabilizada a troca de conhecimentos e as ferramentas necessárias para isso.

1 assessores técnicos da CEInfo.

Capítulo IV

Page 53: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•102 103•

de saúde, que são permanentemente crescentes. Refere que os gestores do SUS precisam incorporar essa área do conhecimento, desenvolvida com mais vigor no setor privado e utilizá-la como ferramenta para aprimorar a gestão da saúde pública, inclusive, para regular e controlar a ação do setor privado.

Refere, ainda, que estamos chegando a uma situação limite, havendo pouco espaço de expansão dos recursos destinados pelas cidades para o atendimento da saúde das suas comunidades, sendo que as capitais brasileiras já investem mais de 19% do seu orçamento em saúde e, mesmo sendo acima do que determina a legislação, estes valores não conduzem à satisfação direta dos munícipes. Cita uma pesquisa nacional do DataFolha do primeiro semestre de 2012, em que para 39% dos entrevistados a saúde é o maior problema a ser resolvido no país. Na ci-dade de São Paulo essa mesma pesquisa mostrou a saúde como o maior problema para 29% dos que aqui vivem.

Segundo ele, para que tenhamos um sistema de saúde realmente com-petente, eficaz e integrado, precisamos enfrentar alguns desafios como: 1) financiamento – buscar mais recursos, pois os municípios estão cada vez mais pressionados; 2) integração com a rede estadual – o papel do nível estadual do SUS ainda não está muito claro, tanto no financiamento quanto na in-tegração das redes; 3) regulação do setor de saúde suplementar, que cobre 45% da população da cidade de São Paulo, com um imenso problema de planejamento e de competição desleal do setor privado em relação ao SUS; 4) modernização dos instrumentos de gestão e do modelo de governança do SUS, uma vez que o modelo atual foi construído no passado, quando as relações entre os setores ‘público e privado’ eram diferentes do que temos hoje, impondo-se a necessidade de investimento em ganhos tecnológicos, de produtividade e de integração do sistema.

Primeiro painel – O coordenador da mesa cumprimentou a SMS-SP pela disposição em enfrentar o desafio de incorporar os conhecimentos da área da Economia da Saúde, tema que é bem recente na academia e nas instituições pres-tadoras de serviços. Ao propor que compreendêssemos o assunto conforme duas categorias principais: as tecnologias duras, de base industrial, e as tecnologias leves, de base organizacional, de processos de trabalho, o Prof. Sebastião Loureiro nos remete a um paradigma técnico-econômico que é dominante nas sociedades modernas e baseia-se nas tecnologias industriais. Como consequência, afirma ele, tecnologias importantíssimas desenvolvidas pelo Ministério da Saúde (MS), como os programas “Saúde da Família”, “Cuidados Primários em Saúde”, “Con-trole de Diabetes e Hipertensão”, que são tecnologias organizacionais, altamente eficientes nas respectivas linhas de cuidados, não ganham o mesmo status das tecnologias duras, cuja força conduz a escolhas muitas vezes geradoras de exclu-

Conclusões e recomendações: próximos passos

Para a Dra. Margarida Lira, Coordenadora da Coordenação de Epidemiologia e Informação (CEInfo), a incorporação da economia da saúde é parte do desafio da produção de informação estratégica, que orienta a definição das políticas de saúde para o presente e para um futuro próximo. Para ela, a complexidade do SUS requer cada vez mais informações de diferentes matizes e põe na ordem do dia a avaliação de tecnologias e a economia em saúde como conhecimentos que podem contribuir para orientar políticas de saúde na lógica de atendimento às necessidades de saúde da população e não sob a lógica do mercado. Informa que há muitas instituições dispostas a apoiar a Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo (SMS-SP) nesta iniciativa e a construção desse conhecimento somente se fará com ampla colaboração interinstitucional e por aproximação progressiva, uma vez que se trata de novo campo do conhecimento, ainda não totalmente incorporado e desenvolvido, especialmente no que diz respeito à gestão local, municipal do SUS. Neste sentido, apresenta os quatro objetivos deste Seminário: aproximar gestores e profissionais quanto ao conhecimento nas áreas de econo-mia e avaliação de tecnologias em saúde e da sua incorporação na produção de informação; explorar aplicação das áreas de economia e avaliação de tecnologias de saúde na gestão do SUS na cidade de São Paulo; apresentar o estado da arte sobre essa temática em um plano local, nacional e internacional e lançar uma rede de avaliação de economia e tecnologia da saúde.

O Sr. Januario Montone, Secretário Municipal da Saúde, encerra a mesa de abertura deste Seminário apresentando sua compreensão sobre esta iniciativa como parte do desenvolvimento de uma importante ferramenta para o gestor do SUS no nível do município, que é onde a população efetivamente acessa o sistema no seu dia a dia. Refere que a economia da saúde é mais uma importante ferramenta de trabalho a ser incorporada por todos os gestores locais do SUS.

Síntese das apresentações

Passando às apresentações, o Secretário Municipal da Saúde de São Paulo propôs uma reflexão sobre o que considera um momento muito especial na cons-trução do Sistema de Saúde Brasileiro, denominando como um terceiro mo-mento da Reforma Sanitária – o de aprimoramento da gestão e do aumento da eficiência no uso dos sempre limitados recursos disponíveis para o atendimento das necessidades de saúde. Pontuou que a Economia da Saúde, apesar de poder se constituir em importante ferramenta neste sentido, tem sido mais apropriada pelo setor privado, comumente mais preocupado com a redução de custos. Este setor é motivado pela competição do mercado, diferentemente do setor públi-co, tradicionalmente mais ocupado em prover o atendimento das necessidades

Page 54: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•104 105•

vistas ao desenvolvimento da indústria farmacêutica, de equipamentos e de tec-nologias de saúde, tendo como objetivo tornar o Brasil independente em relação ao mercado externo. Sua área de Assistência Farmacêutica promove a ampliação do acesso dos cidadãos aos medicamentos e o estímulo ao seu uso racional pe-los Programas de Componentes Básicos, que garante custeio e distribuição de medicamentos e insumos essenciais à atenção primária; Componentes Especia-lizados, que fornece medicação de alto custo gratuitamente para doenças raras; e de Medicamentos Estratégicos, para doenças específicas como Aids, hanseníase, doenças do sangue e malária.O Decit, órgão da SCTIE/MS, tem as seguintes competências: participar da formulação, implementação e avaliação da Políti-ca Nacional de Ciência e Tecnologia em Saúde, tendo como pressupostos as necessidades demandadas pela Política Nacional de Saúde e a observância dos princípios e diretrizes do SUS; coordenar e executar as ações do MS no campo da Pesquisa e Desenvolvimento em Saúde, bem como promover a articulação intersetorial no âmbito do Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia; coordenar a formulação e a implementação de políticas, programas e ações de avaliação de tecnologias no SUS, bem como representar a SCTIE nos organismos responsá-veis pela incorporação de tecnologia no âmbito do MS; coordenar o processo de gestão do conhecimento em Ciência e Tecnologia em Saúde visando à utilização do conhecimento científico e tecnológico em todos os níveis de gestão do SUS; promover, em articulação com instituições de ciência e tecnologia e agências de fomento, a realização de pesquisas estratégicas em saúde; prestar cooperação técnica para o aperfeiçoamento da capacidade gerencial, assim como orientar, capacitar e promover ações de suporte aos agentes dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, no âmbito da Ciência e Tecnologia em Saúde; acompa-nhar as atividades da Secretaria Executiva da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, instituída no âmbito do Conselho Nacional de Saúde; coordenar a elaboração, a execução e a avaliação de programas e projetos em áreas e temas de abrangência nacional, no âmbito das atribuições da SCTIE; implantar me-canismos de cooperação para o desenvolvimento de instituições de ciência e tecnologia que atuam na área de saúde; e propor acordos e convênios com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios para a execução descentralizada de programas e projetos especiais no âmbito do SUS.

A Professora Patrícia Coelho Soárez, do Departamento de Medicina Preven-tiva, da Faculdade de Medicina a Universidade de São Paulo (FMUSP), informa que alguns países se utilizam desde a década de 1980 da Avaliação Econômica em Saúde como ferramenta para a tomada de decisões sobre o que deve ou não ser financiado pelo sistema de saúde. Considerando-se que mesmo em países com alto nível de desenvolvimento e elevados gastos per capita em saúde os recur-sos são sempre insuficientes para todas as necessidades, as avaliações econômicas

Conclusões e recomendações: próximos passos

são social. Indicou ainda que a produção de indicadores em economia da saúde deve trazer evidências que sensibilizem o Poder Judiciário, que vem se tornando importante indutor da incorporação de tecnologias industriais.

A Dra. Corah Prado informa que o Departamento de Economia da Saúde, Investimentos e Desenvolvimento (Desid) do MS completará 10 anos em 2013, com importante contribuição para o desenvolvimento de políticas do SUS, e utiliza o seguinte conceito de Economia da Saúde: “ramo do conhecimento que tem por objetivo a otimização das ações de saúde, ou seja, o estudo das condi-ções ótimas de distribuição dos recursos disponíveis para assegurar à população a melhor assistência à saúde e o melhor estado de saúde possível, tendo em conta, meios e recursos limitados”2.

Destaca-se da sua apresentação que, a despeito do expressivo crescimento dos gastos governamentais com saúde no Brasil, nos últimos anos, a proporção destes gastos ainda é bastante inferior a de diversos países, desenvolvidos ou emergen-tes. E as famílias ainda arcam com a maior parte dos gastos com saúde no Brasil, diferentemente do que ocorre em muitos outros países. Informou que um dos objetos de trabalho do Desid-MS é a regulação econômica, aspecto essencial no que diz respeito à produção e fornecimento de tecnologias industriais de interesse em saúde. Outro objeto de trabalho do seu departamento é a análise da alocação de recursos, que trata da eficiência alocativa, da capacidade de uma organização de saúde em utilizar os seus recursos físicos, humanos, medicamentos, materiais médicos, infraestrutura, nas proporções ótimas de cada um deles, e tem como finalidade verificar a eficiência das ações e serviços de saúde para as tomadas de decisões devidamente instruídas, considerados os custos e as consequências.

É importante que os municípios conheçam a estrutura e as competências des-te departamento para contar com estas referências para o trabalho a ser desenvol-vido (http://portal.saude.gov.br/portal/saude/Gestor/visualizar_texto.cfm?idtxt= 33124).

Outro órgão que se destaca neste cenário é a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE) do MS, responsável pela implementação das políticas de assistência farmacêutica, de avaliação e incorporação de tecnologias no SUS e de incentivo ao desenvolvimento industrial e científico do setor, incen-tivando nesta área o desenvolvimento de pesquisas em saúde no país, de modo a direcionar os investimentos realizados pelo Governo Federal às necessidades da saúde pública.

Em ação conjunta com outros ministérios e órgãos estatais, a Secretaria orienta a política do Complexo Industrial da Saúde para o setor público, com

2 Del Nero CR. O que é economia da saúde. In: Piola SF, Vianna SM (Orgs). Economia da saúde: conceitos e contribuição para a gestão em saúde. Brasília: Ipea, 2002

Page 55: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•106 107•

público em torno do assunto, como é o caso do Desid e do Decit, no MS, onde funciona a Rede Brasileira de ATS (Rebrats) e a Conitec, institucionalizada em 2011 e já citada anteriormente.

No caso do Estado de São Paulo, as atribuições neste campo estão sob a responsabilidade do Instituto da Saúde, quem conta com o Centro de Tecnologia de Saúde para o SUS/SP, o qual atua na realização da avaliação de tecnologias de saúde em uso e a serem incorporadas pelo SUS-SP, na proposição de parcerias e cooperação técnica para o desenvolvimento da ATS, com as diferentes instâncias dos sistemas pertinentes, na difusão do conhecimento produzido, promovendo o fomento e a indução do uso da ATS pelo SUS/SP, de acordo com a agenda de prioridades definidas pela SES-SP. Estas atividades são distribuídas entre o Núcleo de Análise e Projetos de Avaliação de Tecnologias de Saúde, que tem como missão produzir e elaborar informação necessária para apoiar a tomada de decisão sobre a introdução, difusão e utilização das tecnologias e informes de avaliação de tecnologias em saúde e o Núcleo de Fomento e Gestão de Tecnologias de Saúde, cuja responsabilidade é identificar e priorizar tecnologias que necessitem de avaliação, elaborar editais, selecionar propostas e manifestar-se conclusivamente a respeito de financiamentos de acordo com a agenda de prioridades definidas pela Secretaria. Informa, ainda, que se encontra em construção a Rede Paulista de ATS, com capacitação de pessoas para elaborar pareceres técnico-científicos e criação de Núcleos de Avaliação de Tecnologia em Saúde e disponibilidade do Instituto de Saúde em proporcionar assessoria para esses profissionais na elaboração de pareceres.

A Secretaria de Saúde do Estado da de São Paulo (SES-SP) conta ainda com a Coordenadoria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos de Saúde (CCTIES)4 com a atribuição de coordenar a política de aquisição de insumos estratégicos para as atividades relacionadas às áreas de sua competência e o Sistema de Sangue, Componentes e Derivados do Estado de São Paulo e por seus diferentes grupos tem como atribuição elaborar a Relação de Medicamentos Padronizados da Secretaria da Saúde, a avaliação de propostas de modificações nesta Relação, fornecer subsídios para o planejamento, programação, coordenação, avaliação e controle da distribuição de medicamentos à rede de prestação de serviços de saúde estadual, controlar as atividades hemoterápicas no âmbito do Estado, planejar a aquisição de insumos, gerenciar projetos e delinear estratégias para a incorporação de novas tecnologias nos serviços de saúde do SUS/SP.

O Professor Doutor Oswaldo Tanaka, Chefe do Departamento de Prática de Saúde Pública, da Universidade de São Paulo coordenou o segundo painel “Avaliação de Tecnologia e Saúde para Tomada de Decisão. Impacto

4 Coordenadoria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos de Saúde (CCTIES).

Conclusões e recomendações: próximos passos

permitem tomar decisões mais racionais na alocação de recursos, pois analisam os benefícios e os custos da adoção de cada política de saúde. Cita exemplos de estudos que têm sido desenvolvidos pelo grupo multidisciplinar de pesquisa em que atua, coordenado pela Profa. Maria Novaes, e têm contribuído com o Pro-grama Nacional de Imunização (PNI), respondendo a perguntas relacionadas à implantação de novas vacinas no calendário nacional, com o uso da avaliação econômica para estimar os efeitos clínicos e os custos econômicos para o sistema de saúde, considerando-se a hipótese de adoção ou não da nova tecnologia ou mesmo as distintas possibilidades de forma de adoção das mesmas.

Relata experiência junto à Universidade de York, como Professora visitante, onde observou que as decisões do governo eram coordenadas com a Universida-de, de forma que projetos de implantação de novas tecnologias pelo governo para os próximos quatro ou cinco anos passam a ser objeto de pesquisa da Universi-dade no presente, tornando a tomada de decisão menos intuitiva e mais baseada em evidências técnicas. Cita também a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec)3, que tem tido um papel muito importante no cenário nacional ao elaborar pareceres técnicos sobre assistência terapêutica e incorporação de tecnologia em saúde no âmbito do SUS e inclui em seus estudos indicadores de avaliação econômica e também análises de impacto orçamentário, dois aspectos distintos em economia das saúde.

Conclui afirmando que avaliação econômica em saúde é muito importante, mas é apenas um dos aspectos que o gestor considera para tomar decisões.

Para a Dra. Tereza Setsuko Toma há modernamente muitos atores influenciando a tomada de decisões em saúde, o que torna muito difíceis as tarefas dos gestores. Cidadãos mais exigentes, organizados em grupos de pressão, o Poder Judiciário determinando medidas nem sempre consideradas as mais racionais do ponto de vista técnico vêm tirando todos os gestores da zona de conforto e obrigando o SUS a estudar melhor a relação entre os custos e os benefícios da adoção ou exclusão de determinadas tecnologias. Entende que a prática de Avaliação de Tecnologias em Saúde (ATS) está muito centrada em medicamentos e equipamentos médico-hospitalares, sendo necessária a incorporação de estudos sobre outras tecnologias, como procedimentos técnicos, sistemas organizacionais, informacionais, educacionais e de suporte, programas e protocolos assistenciais. Fez notar que essas análises se baseiam em custo de oportunidade, que a aplicação de recursos em determinadas tecnologias implica na impossibilidade de provisão de outras, uma vez que os recursos são limitados. Informou a existência de diversas iniciativas organizacionais no poder

3 Conitec – Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS, vinculada ao Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias.

Page 56: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•108 109•

tatar que, apesar de tudo isso, a sociedade demanda o uso desta nova tecnologia, pergunta-se: mantida a tendência de crescimento dos gastos em saúde, da utili-zação de insumos e serviços e das inovações, conseguiremos melhorar ou manter os resultados em saúde a um custo que seja suportável? As análises no campo da economia devem aumentar a racionalidade na tomada de decisão.

O Professor Doutor Oswaldo Tanaka ao consolidar a discussão ocorrida no segundo painel diz que informação não é sinônimo de comportamento racional e, mesmo quando os técnicos têm razão, as coisas não andam pela razão. Mais informação traz também mais contradição, mais conflitos de interesses. As con-tradições com as quais precisamos conviver e administrar constituem o maior avanço da conquista democrática, sendo necessário suportá-las e ter coragem para enfrentá-las. A criação e incorporação de tecnologias contam com dinâmica tal que somente podemos minimizar seus efeitos e estabelecer algum grau de di-recionalidade, diminuir um pouco sua velocidade, dilema que não seria passível de solução, sendo, no entanto, passível de minimização, devendo a avaliação proporcionar mais objetividade às decisões.

Para o Professor Tanaka, quem faz avaliação deve ter uma hipótese, deve ter um foco e deve assumir qual direção quer seguir. A CEInfo deve ter foco e os problemas a serem enfrentados devem ser eleitos mais pela factibilidade dos pro-cessos, pela capacidade de oferecer respostas úteis e oportunas do que pela sua importância intrínseca.

Katia Cristina Bassichetto, assessora técnica da CEInfo, aponta como próxi-mos passos o fomento à Rede de Avaliação de Tecnologia e Economia da Saúde – Recon e a realização de uma oficina para levantar as necessidades dos gestores da SMS nesta área, o que subsidiará a elaboração de diretrizes e metas que serão consolidadas numa matriz de planejamento estratégico. Por ora trata-se de “dige-rir” tudo isso que foi apresentado. Refere também que a instituição está toman-do contato com o tema por meio de cursos, interlocução com técnicos da área e leituras de artigos com essas metodologias. Avalia que também é importante para a SMS-SP fazer parcerias e estabelecer cooperação técnica com os institutos citados. Verifica que há impasses e limitações, mas também há recursos, método, pesquisa, tecnologia, conhecimento, que pode se juntar num “caldo nutritivo” e afirma: “Acredito que o ser humano quando se depara com grandes impasses e grandes limitações reage […] estamos aqui […] sobrevivemos a tantos outros impasses históricos e o SUS é uma criação que merece reação à altura e acho que esse Seminário vem nesse sentido. Se há pouco tempo não tínhamos sequer conhecimento de alguns dos temas aqui tratados, percebemos que há solidarie-dade, generosidade, possibilidade de parcerias, e verificamos que não estamos sozinhos. Se o problema é grande, as possibilidades de cooperação também o são, e a abordagem dos assuntos que afligem o gestor do SUS pode ser feita de

Conclusões e recomendações: próximos passos

Epidemiológico Econômico” e propôs uma imagem-objetivo para os trabalhos: “Se formos capazes de fazer as avaliações de custo, se conseguirmos aproveitar as evidências na tomada de decisão e se formos capazes de utilizar as ATS como um instrumento de tomada racional de decisão, então chegaremos lá”.

Dra. Denise Cavallini Cyrillo, Professora Associada da Faculdade de Econo-mia e Administração e Contabilidade da USP apontou como questão central a alocação eficiente de recursos escassos entre fins alternativos e a apuração do custo é um ‘gargalo’ importante e frequentemente relegado, devendo ser visto a partir do conceito de custo de oportunidade: “O uso do recurso para determina-do fim o indisponibiliza para outras finalidades”. Entende que o poder público deve desenvolver e pôr em prática sistemas de custos no processo de decisão.

Da apresentação da Dra. Edina Mariko Koga da Silva, Vice-diretora do Cen-tro Cochrane do Brasil, destaca-se a necessidade de se avaliar novas tecnologias primeiramente considerando se de fato são seguras para o que se deseja, em se-guida, conhecer seu custo, analisando-se assim a utilidade, o benefício e a efetivi-dade. É a ideia da Saúde Baseada em Evidências, que consiste na integração das melhores evidências disponíveis, resultantes de pesquisas científicas de qualidade, com a habilidade do profissional de saúde e a preferência do paciente. Deve-se, portanto, tomar as decisões com base no custo, mas também nas evidências de que aquela tecnologia funciona conforme desejado. Portanto, trata-se de buscar maior racionalidade na incorporação de tecnologias, o que somente é possível com a produção de informações objetivas concretas.

O Centro Cochrane do Brasil é uma organização não governamental, sem fins lucrativos e sem fontes de financiamento internacionais, que tem por objetivo contribuir para o aprimoramento da tomada de decisões em Saúde, com base nas melhores informações disponíveis. Sua missão é elaborar, manter e divulgar revi-sões sistemáticas de ensaios clínicos randomizados, o melhor nível de evidência para as decisões em Saúde. O Centro está ligado à Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica da Escola Paulista de Medicina – Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp) e realiza revisões sistemáticas, pesquisa clínica e avalia-ções de tecnologias em Saúde. Além disso, promove workshops sobre revisão sis-temática e metodologia de pesquisa; oferece um curso gratuito on-line de revisão sistemática; e realiza consultorias científicas.

Para a Dra. Paola Zucchi, do Centro Paulista de Economia e Saúde da Uni-versidade Federal de São Paulo (Unifesp), as tecnologias tradicionais, geralmente com preços mais baixos, são mantidas quando da incorporação de novas tec-nologias, as quais, geralmente, têm preços mais elevados, são incorporadas de forma rápida e são também criadas em ritmo progressivamente mais veloz. Para a professora, muitas das novas tecnologias se destinam à mesma finalidade de outras já disponíveis, não trazem novos benefícios e têm custos maiores. Ao cons-

Page 57: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•110 111•

tes, públicos e privados, que fortaleça o gestor local no diálogo interfederativo e também com os agentes econômicos privados e com a sociedade civil organizada com interesse nas políticas de saúde, sem esquecer do necessário diálogo com o Poder Judiciário que, já foi dito aqui, é forte indutor da incorporação de tecno-logias, nem sempre com as melhores evidências de racionalidade.

Foi apresentada neste seminário uma fotografia do que pode vir a ser a rede que construiremos juntos. O papel da CEInfo deve ser essencialmente de coor-denação e motivação, não assumindo como seu papel principal o de produtor de informações, podendo fazê-lo no entanto, mas mantendo a intencionalidade de fomentar o surgimento de muitos lugares e atores participantes desse esforço, seja nas distintas áreas técnicas da Secretaria da Saúde, seja em outros setores da Pre-feitura ou ainda na universidade ou em instituições de pesquisa, podendo ainda ocorrer contribuição de pessoas que produzem conhecimento neste campo.

Por outro lado, cabe agora refletir sobre o que, sobre quais perguntas a cida-de precisa ver respondidas. Neste caso não se trata de saber o que o SUS inteiro precisa, mas o que o gestor local do SUS, a cidade, necessita e quais são aquelas perguntas que, de modo racional, merecem, devem ser enfrentadas, porque não são necessariamente as mais importantes que vamos conseguir enfrentar, mas quais são aquelas que temos condição de enfrentar e que vão contribuir oportu-namente para a ampliação da mais racionalidade na tomada de decisões.

Helena Taliberti, assessora da Coordenação de Vigilância em Saúde (Covisa) considera que uma importante questão para o município de São Paulo, muito peculiar, é que parte dos programas nacionais, estabelecidos nacionalmente, com seus respectivos indicadores, ações, metas, nem sempre adotam estratégias válidas para cidades como São Paulo. É importante que sejam avaliados tais programas nacionais implantados aqui, verificar como se comportam no Mu-nicípio, porque nem sempre eles são completamente factíveis e adequados na condição da nossa cidade. Isso se aplica ao combate às doenças e aos programas de prevenção.

O Dr. Alberto Igreja, que trabalha no SAMU, apresenta sua opinião […] “eu sou um pouco contra essa barreira de tecnologia porque eu acho que o nosso papel como gestores de saúde e como médico é exatamente lutar para defender o paciente. O juiz, o paciente, o acompanhante, eu acho que eles estão do nosso lado. O que nós não estamos sabendo é achar o recurso, é a essência […] recurso, eu acho que dá pra conseguir. O que nós estamos precisando é analisar melhor nossos processos internos […] o Serviço da Saúde está muito mais trabalhando do lado de cá do balcão do que indo lá ver a necessidade da população […] eu me sinto incompetente […] no momento em que eu não consigo dar uma assis-tência de Saúde para um paciente […] da maneira que o meu know how mostra que deveria ser. Quem vai pagar essa conta, nós temos de ir atrás disso”.

Conclusões e recomendações: próximos passos

maneira crescente e progressiva. A Recon deverá possibilitar a realização do que é esperado, criando as parcerias, dando um passo de cada vez, concretizando as tarefas, identificando, sistematizando e priorizando as perguntas dos gestores em cada tema de interesse. Acredita que o Seminário tenha atingido seus objetivos e a CEInfo tomou uma decisão acertada ao aceitar a missão de encarar mais esse desafio, mesmo reconhecendo que ainda se faz necessário desenvolver competên-cias neste campo”.

Hélio Neves, assessor técnico da CEInfo, entende que o Seminário ofereceu muitos elementos para pensar e refletir sobre o que é essa nova necessidade de conhecimento no plano municipal. Será realizada em breve uma oficina de tra-balho para refletir sobre qual é o norte, qual é a demanda que orienta a criação de uma rede como essa. Já existem várias redes cooperativas como se apresentou aqui, mas ainda há uma lacuna na reflexão específica sobre o espaço, o papel do Governo local, do Município, no Sistema Único de Saúde.

O Município, que recebe uma demanda gigantesca, sempre maior que sua capacidade de atender é, ao mesmo, o lugar mais próximo da comunidade, que acessa de modo imediato o gestor da unidade de saúde, o secretário, o prefeito, e tem dificuldade de acessar o Governador, o Ministro da Saúde, a Presidente da República. E tem obrigações muito distintas das demais esferas de governo, obri-gações muito palpáveis, concretas, e são também crescentes à medida das modi-ficações na demografia e nos padrões de adoecimento e morte por que passam o Brasil e as suas cidades, o aumento da capacidade de exigir da comunidade e tam-bém da incorporação de procedimentos por decisão judicial. Talvez ao município caiba mais examinar tecnologias de operação, de funcionamento, programas e de estruturas do sistema de serviços do que de avaliar a admissão de incorporação de novas tecnologias industriais, assunto que já é abordado de maneira rotineira em outras esferas de governo.

As instituições e as redes cooperativas que já existem produzem trabalhos ex-tremamente importantes para o SUS, mas não têm a missão de refletir sobre o lugar do Município nesse contexto. Então a ideia chave dessa nova rede em pro-posição é que o gestor local do SUS necessita de suporte, apoio, reflexão sistemá-tica, com maior densidade técnica sobre a dimensão econômica nas tomadas de decisão sobre as tecnologias em uso ou a serem adotadas na prestação de serviços de saúde à comunidade.

É claro que de alguma maneira essas questões já se apresentam no dia a dia das tomadas de decisão, ainda de modo pouco formal e mais intuitivo. Trata-se ago-ra de incorporar reflexões sistêmicas, sistemáticas, formais, objetivas, de caráter técnico, até aqui não adotadas nas rotinas das instituições. Trata-se de produzir, construir informação que favoreça o reconhecimento interno da racionalidade da tomada de decisões e também tal reconhecimento por parte dos demais agen-

Page 58: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•112 113•

CAPÍTULO V

Ao que foi contestado pela Dra. Edina Mariko que afirmou: não estamos fa-lando em cortar custos e economizar em cima da população. O que nós estamos falando é gastar no lugar certo. Muitas vezes o Samu não tem o equipamento necessário porque tem muito dinheiro sendo gasto no lugar errado. Contou que a revista Isto É noticiou o caso de uma mulher que precisava ser submetida a uma cirurgia para endometriose que deveria ser feita com uso de robô de acordo com seu médico. Ocorre que o convênio não queria pagar e a Justiça determinou ao convênio que pagasse R$ 70 mil. Qual é a evidência que a endometriose preci-sa ser operada por robô? Nenhuma. Tem de ser operada por alguém que saiba operar. Isso a gente vê a todo o momento. Tecnologia de 400 mil dólares por paciente. Que entra na Justiça e ganha. Não estamos falando para economizar na ponta. Estamos falando de racionalizar para cobrir todo mundo com o cobertor que temos, como falou Dra. Denise. E não estamos fazendo isso. A Drª Paola mostra em um artigo que a judicialização contempla a camada da população que não precisa, pois é esta a camada da população que teve acesso ao advogado e à informação.

Outro participante contribui afirmando que não se pode falar em Economia em Saúde se não se falar em Administração em Saúde e, para nós, funcionários públicos, não existe custo. Apresentou uma dica: orientar os esforços para a base, para o colega que não sabe por que está fazendo as coisas de modo a favorecer es-colhas inadequadas. Se um gerente de laboratório acha que o exame que oferece é gratuito, como é que se pode administrar adequadamente […] se para o gestor o serviço oferecido é de graça?

Outro participante perguntou ainda: como podemos envolver o cidadão nessa discussão?

Para a Coordenadora da CEInfo, Margarida Lira, este seminário foi um pri-meiro movimento da Secretaria sobre esse objeto, o qual deverá ser abordado por aproximações sucessivas, pois se trata de um desafio muito grande. Já vi-mos participando de capacitações e seminário/congressos neste campo e sabemos da necessidade de firmar parcerias e criar um corpo técnico capaz de dialogar com outras instituições sobre este tema e definir como devemos trabalhar estas questões. Por outro lado, não devemos duplicar esforços. Este é um campo de conhecimento muito vasto e precisamos criar interlocução, nos apoiar e fortale-cer mutuamente. Muitas iniciativas devem ser adotadas nos próximos períodos, tendo com o órgão estruturador a recém-criada Rede de Avaliação de Tecnologia e Economia da Saúde – Recon, que terá na CEInfo sua base operacional. Estou certa de que contaremos com o constante apoio de todos os que participaram do Seminário, cujo envolvimento na iniciativa representa um voto de confiança na condução deste projeto pela CEInfo.

Page 59: A Economia Da Saude

115•

Capítulo V

R E D E D E AVA L I AÇ ÃO D E T E C N O LO G I A E E CO N O M I A D A S AÚ D E – R E CO NHELIO NEVES E KATIA CRISTINA BASSICHETTO1

Introdução

A progressiva complexidade e os desenvolvimentos recentes do Sistema Único de Saúde (SUS) requerem a produção crescente de informações qualificadas, nos campos tradicionais de conhecimento que vêm sendo incorporados mais recen-temente para o planejamento e produção de respostas aos problemas de saúde da população de centros urbanos, exigindo visão interdisciplinar e a indispensável articulação entre órgãos de governo, instituições da sociedade civil e profissio-nais. A produção de informação estratégica passa a incluir, entre outros campos do conhecimento, a dimensão econômica, a avaliação de tecnologias de equipa-mentos, produtos, serviços, processos de trabalho e de informação aplicada aos processos de gestão e tomada de decisão.

Cabe considerar que as competências e atribuições na gestão da saúde pública apresentam distintas características nas três esferas de governo. No caso da gestão local, dada a proximidade da comunidade e da prestação direta de serviços e, ao mesmo tempo, a exigência de compatibilização entre os escassos de recursos e a crescente demanda para atendimento às necessidades de saúde, faz-se obrigató-rio o aprimoramento nos mecanismos de gestão, buscando maior eficiência nos gastos em saúde.

Assim, a tomada racional de decisões no contexto atual do SUS impõe aos seus gestores o conhecimento de um rol crescente de temas, sendo um deles a dimensão econômica no setor saúde, a avaliação de tecnologias de equipamentos, produtos, serviços e processos de trabalho e o aperfeiçoamento na produção de informação.

Neste sentido, há que se considerar que as mudanças que acompanham as transições demográfica e epidemiológica em curso, a ampliação da rede de unidades e as novas ações de proteção, prevenção, promoção, assistência e rea-

1 assessores técnicos da CEInfo

Capítulo V

Page 60: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•116 117•

Papel da Coordenação de Epidemiologia e Informação (CEIn-fo) nesta iniciativa

Como órgão que tem a missão de promover a produção e o uso da informação voltada para a gestão de políticas públicas de saúde e melhoria das condições de saúde para a população da Cidade de São Paulo, cabe à CEInfo – Coordenação de Epidemiologia e Informação da SMS/SP – fomentar este diálogo e contribuir para que desta articulação resultem produtos de informação qualificados.

Próximos passos

O desenvolvimento desta iniciativa requer que se desenhe um planejamento das ações, com suas diretrizes, metas e planos operativos, que tenham previamen-te passado por uma análise de viabilidade, permitindo definir os meios para sua consecução.

Como próximo momento de aproximação progressiva de um plano de tra-balho que atenda as demandas que se apresentam foi concebida a Oficina “De-safios para incorporação da Economia da Saúde e Avaliação de Tecnologias na Produção de Informações na SMS-SP” para identificar necessidades e formas de abordar estas questões, o que possibilitará a criação de um espaço de cooperação e de formulação coletiva de conhecimentos em apoio à gestão local do SUS, para aprimorar o diálogo interfederativo (com a União, o Estado, São Paulo e demais municípios); o planejamento da prestação de serviços à comunidade; os processos de incorporação de tecnologias, mediante comprovação de segurança, eficácia, efetividade e eficiência das ações de saúde; e o trato com as demais ins-tituições prestadoras de serviços de saúde suplementar ao SUS, da rede pública própria e privada.

Com esta oficina dá-se andamento ao processo de Planejamento Estratégico para o alcance desses objetivos, com a definição dos campos de trabalho e formas de produção, cooperação e instituição da Recon.

Os objetivos desta Oficina são:

• Identificar necessidades no que diz respeito às informações nas áreas de Eco-nomia da Saúde e Avaliação de Tecnologias para apoiar o processo de tomada de decisão na gestão local do SUS;• Identificar pessoas, grupos sociais e organismos públicos ou privados interes-sados no desenvolvimento deste projeto;

rede de Avaliação de Tecnologia e Economia da Saúde – RECON

bilitação em saúde, e o papel dos determinantes e das desigualdades sociais na situação de saúde da população devem orientar a gestão na definição, imple-mentação e avaliação de políticas públicas integradas para o presente e para o futuro próximo.

Este desafio, especialmente no que diz respeito à posição ocupada pelas cida-des, motiva a criação de um fórum técnico permanente para a reflexão e produ-ção de informações de interesse da Cidade de São Paulo e de outros centros ur-banos. Assim, a Rede de Avaliação de Tecnologia e Economia da Saúde – Recon é uma iniciativa da SMS-SP, se constitui em um espaço de colaboração e reflexão para a produção de informações e troca de conhecimentos sobre tecnologias e economia da saúde e visa à articulação entre instituições e pessoas que atuam na produção de conhecimento, bens e serviços da saúde neste campo, contribuindo para a definição de uma agenda de estudos e pesquisas a partir das necessidades identificadas no município de São Paulo.

Formar esta Rede parte do entendimento que as necessidades de informação se ampliam e se tornam mais complexas, ao envolver cada vez mais outros cam-pos do saber, em contribuição ao planejamento e obtenção de respostas para fazer frente aos problemas de saúde da população de centros urbanos, o que demanda uma visão interdisciplinar e a indispensável articulação entre órgãos de governo, instituições da sociedade e profissionais.

Objetivo da Recon

Promover a interação de agentes sociais em um fórum técnico permanente para refletir e apresentar sugestões sobre a construção de informações nas diversas dimensões de interesse. Sob este enfoque, promove-se a definição de uma agenda de estudos e pesquisas neste campo, que interessem tanto à Cidade de São Paulo quanto a outros centros urbanos nacionais e internacionais.

Quem poderá compor a Recon?

Gestores do SUS, órgãos públicos da área da saúde, instituições de ensino e pesquisa, organizações sociais e pessoas que atuam na produção de bens e serviços da saúde. A SMS-SP espera contar com a sua participação e integração à Recon!

http://recon.saude.prefeitura.sp.gov.br

Page 61: A Economia Da Saude

A Economia da Saúde•118 119•

cionar parte das suas linhas de estudo para temas de interesse da gestão local do SUS. É forte, também, a percepção de que o gestor local se fortalecerá à medida em que se aproprie das ferramentas de Economia da Saúde. Portanto, neste novo papel a CEInfo deverá se qualificar para favorecer a aproximação entre necessi-dades e respostas, podendo vir a se configurar como um novo modo de alcançar os resultados.

Este cenário, ao mesmo tempo em que é novo, assenta-se num conjunto de competências adquiridas pela CEInfo, nas últimas décadas, no desenvolvimento de pesquisas, estudos e instrumentos de análise de dados e produção de infor-mações para aplicação nos processos de gestão e para divulgação de temas de interesse da SMS e para a sociedade em geral.

Desafio aceito, a CEInfo coloca-se em campo para viabilizar o desenvolvi-mento deste novo campo de conhecimento necessário para fortalecer a gestão local do SUS.

Participe da Recon.E-mail: [email protected]

rede de Avaliação de Tecnologia e Economia da Saúde – RECON

• Propor modo de conduzir as relações institucionais para o atendimento des-tas necessidades;• Delinear agenda preliminar de temas para estudos e indicadores, que corres-pondam às principais questões de interesse do gestor local do SUS; e • Propor modo de funcionamento da Rede de Avaliação de Tecnologia e Eco-nomia da Saúde – Recon.

Posteriormente, para a estruturação da Recon serão necessárias: a eleição de um coordenador, a criação uma secretaria executiva para sua operacionalização, bem como a definição do seu regimento interno e de formas de viabilizar a sus-ção do seu regimento interno e de formas de viabilizar a sus-do seu regimento interno e de formas de viabilizar a sus-tentabilidade operacional e financeira da Recon.

Enquanto isso, a CEInfo inicia e pretende dar andamento a um conjunto de ações de modo continuado, como:

• Identificação, catalogação e acompanhamento de estudos de interesse para fomentar sua apropriação pelo gestor local do SUS;• identificação de meios para desenvolver estudos que adaptem os conheci-mentos existentes à realidade local;• promoção de competência de agentes públicos para compreensão e uso das ferramentas da economia da saúde;• identificação de temas e problemas na SMS-SP que possam ser tratados de maneira coordenada considerando a similaridade do objeto e da abordagem requerida para sua análise;• identificação de instituições ou pessoas que possam contribuir para a com-preensão dos problemas eleitos como de maior relevância pelo gestor local do SUS;• facilitação do acesso a estudos de interesse.

A CEInfo, no desempenho de suas atribuições também tem buscado desen-volver competências para incorporar este campo do conhecimento na produção de informações e análises de caráter estratégico, integrador e articulador das di-informações e análises de caráter estratégico, integrador e articulador das di-versas áreas de interesse para a gestão. A incorporação deste conhecimento per-mitirá o planejamento, estabelecimento de prioridades e avaliação de políticas, programas, ações e serviços da SMS, subsidiando a formulação de políticas de saúde que atendam às necessidades atuais e para o futuro próximo.

Outra habilidade que a CEInfo reconhece que necessita desenvolver refere-se à gestão de redes de cooperação, como é o caso da Recon, o que representará um novo desafio para este órgão. Há muitas áreas técnicas, profissionais e setores que no seu cotidiano têm construído respostas para as necessidades que se apresen-tam. Há muitas instituições atuantes nesta área de interesse que poderão dire-

Page 62: A Economia Da Saude