a gestão autônoma da medicação
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8/12/2019 A Gesto Autnoma da Medicao
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A Gesto Autnoma da Medicao: uma interveno analisadora de servios em sade
mental
Autonomous Medication Management: an analytical intervention in mental health careservices
Rosana Teresa Onocko-CamposI; Eduardo Passos
II; Analice de Lima Palombini
III; Deivisson
Vianna Dantas dos SantosI; Sabrina Stefanello
I; Laura Lamas Magalhes Gonalves
I; Paula
Milward de AndradeII; Luana Ribeiro Borges
I
I
Departamento de Sade Coletiva, Faculdade de Cincias Mdicas, Universidade Estadual deCampinas. R. Tesslia Vieira de Camargo 126, Unicamp. 13.083-887 Campinas
[email protected] de Psicologia, Instituto de Filosofia e Cincias Humanas, Universidade Federal
FluminenseIIIDepartamento de Psicanlise e Psicopatologia, Ps-Graduao em Psicologia Social e
Institucional, Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
RESUMO
Em um contexto de altas taxas de medicalizao da populao e face ao uso pouco crtico de
medicamentos psiquitricos em servios de sade mental, este artigo reporta aspectos de uma
pesquisa qualitativa que teve a oportunidade de intervir em prticas de cuidado em trs
grandes cidades do Brasil. Seguindo o princpio da Reforma Psiquitrica brasileira da defesa
dos direitos do usurio em participar das decises sobre seu tratamento, a pesquisa interveio
nos centros de ateno psicossocial (CAPS) buscando o "empoderamento" dos usurios emrelao ao uso de medicamentos em seus projetos teraputicos. Foram realizados entrevistas
e grupos focais. A partir desse material registrado, o artigo analisou algumas situaes que
atestaram, entre outras, a dificuldade de evitar o uso do poder sobre os usurios por via da
administrao de medicamentos psicotrpicos. Tambm se percebeu, nos servios
pesquisados, pouco dilogo sobre os medicamentos e a existncia de espaos de
estigmatizao onde os direitos dos usurios so inibidos ou aceitos com cautela.
Palavras-chave: Servios de sade mental, Tomada de decises, Autonomia pessoal,
Psicotrpicos
mailto:[email protected]:[email protected]:[email protected]:[email protected] -
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ABSTRACT
In a context of high rates of medicalization of the population and in light of the scantly critical
use of psychiatric medications in mental health services, this paper reports aspects of a
qualitative study that had the opportunity to intervene in care practices in three major
Brazilian cities. Following the principle of Brazilian Psychiatric Reform championing users'rights to participate in decisions about their treatment, the research intervened in
psychosocial care centers (CAPS) seeking the empowerment of the users regarding the use of
drugs in their therapeutic projects. Interviews were conducted and focus groups set up. From
this recorded material, the paper analyzed some situations that, among other things, attested
to the difficulty of avoiding the exercise of power over users via the administration of
psychotropic drugs. Little dialogue about drugs, and the existence of stigmatization spaces
where user rights are inhibited or "accepted with caution," was also detected in the services
surveyed.
Key words: Mental health care services, Decision-making, Personal autonomy, Psychotropicdrugs
Introduo
No Brasil, at a dcada de 80, os hospitais psiquitricos e os asilos eram os principais locais detratamento para pessoas com problemas mentais graves. A Reforma Psiquitrica instituiu uma
nova poltica de sade mental, que teve, como um de seus principais recursos, o
desenvolvimento dos Centros de Ateno Psicossocial (CAPS) para o tratamento em sade
mental na comunidade, possibilitando o seguimento ambulatorial e a ateno crise. A
transio de um modelo hospitalocntrico para um de sade mental comunitria deu-se pela
considervel reduo dos leitos psiquitricos e a implantao de servios substitutivos1. Estes,
alm das estratgias medicamentosas e psicoteraputicas, incluem nas suas aes os campos
da moradia, do trabalho assistido, do lazer e da cultura como formas legtimas e eficazes na
produo de vida e de sade desta clientela.
Em que pese os inegveis avanos com novos arranjos em sade mental, muitos so os
desafios a serem enfrentados no que diz respeito a uma efetiva mudana nas prticas de
ateno. Um deles diz respeito primazia do tratamento farmacolgico no conjunto de aes
dos profissionais de sade mental, a tal ponto que muitas vezes o tratamento em sade
mental reduz-se apenas aos psicotrpicos2.
Na cultura ocidental, cada vez mais pessoas utilizam intervenes mdicas como meio para
atingir a transformao de seu prprio eu3. A medicalizao e a "medicamentalizao" da vida
vm crescendo ano a ano4-6, imersas em caractersticas culturais que fazem com que, no atual
modo de vida estadunidense, o que anteriormente seriam caractersticas pessoais tornou-sedoena7. So contextos em que problemas no mdicos tornam-se "diagnosticveis" e
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"tratveis" como problemas mdicos8. medida que aumenta a srie de condies
medicalizantes dentro da jurisdio mdica, cresce a quantidade de drogas aprovadas para
trat-las9. O nmero de transtornos mentais reconhecidos cresceu muito nos ltimos 60 anos.
Mesmo que se considere que a evoluo cientfica est associada a uma maior identificao,
melhor especificao e compreenso do que se entende como patolgico, no se pode ignorar
que justamente a indstria farmacutica quem financia grande parte das pesquisas e eventos
educativos na rea, consolidando-se como uma das indstrias mais lucrativas no mundo e
influenciando a produo cientfica3,7.
Na sade mental brasileira, estudo anterior apontou que, independente do avano da Reforma
Psiquitrica, a medicalizao se mantm como prtica no reformada2. A hospitalizao e a
"renovao de receitas" sem a avaliao presencial dos usurios ainda so respostas comuns
diante das demandas que aportam ao sistema2. Essas prticas, que intencionavam evitar a
interrupo dos tratamentos e garantir o cuidado, terminaram por se tornar parte do
problema, com indivduos usando medicamentos por tempo indeterminado e submetidos a
um cuidado fragmentado.
Outro aspecto importante a prpria participao do usurio nas decises relacionadas ao seu
tratamento, presente na literatura cientfica dos ltimos 20 anos. Em alguns pases, como o
Reino Unido, combina-se o que se tem de evidncia cientfica com os valores (incluindo
preferncias, preocupaes, necessidades e desejos) individuais dos usurios e seus
familiares10. Os guidelinesoficiais do sistema nacional ingls deixam explcito que o
compartilhamento da deciso com o usurio deve ser condio imperativa para o seguimento
de qualquer tratamento11. Trata-se de algo que se iniciou na sade mental e tem se expandido
para outras reas da medicina10.
No Brasil, a Carta dos Direitos dos Usurios do Sistema nico de Sade garante premissa
similar do sistema ingls, contudo ainda pouco praticada no pas2. A experincia singular e
o significado do uso de medicamentos psicotrpicos, para a pessoa envolvida, raramente so
levados em conta. A participao dos usurios nas decises acerca do tratamento restringe-se,
muitas vezes, ao mero relato de seus sintomas12-14. Portanto, o baixo empowermentpoder e
autonomia pessoal e coletiva de indivduos e grupos sociais15que os usurios dos servios
possuem em relao ao seu tratamento, com pouca apropriao de informao e centralizao
das decises nos profissionais de sade, torna a prtica clnica mais vulnervel economia de
mercado e ao complexo mdico-hospitalar5. Da a importncia do protagonismo dos usurios
em organizaes e em movimentos deempowerment.
Reconhecendo o contexto de utilizao pouco crtica dos medicamentos nos tratamentos em
sade mental, bem como o valor simblico da medicao para aqueles que a utilizam, foi
desenvolvida em Quebec (Canad) uma nova abordagem de interveno denominada Gesto
Autnoma da Medicao (GAM)13,14.
A GAM uma estratgia de alterao das relaes de poder para garantir aos usurios efetiva
participao nas decises relativas aos seus tratamentos, o que pressupe como fundamental
o dilogo e a troca entre os atores envolvidos no cuidado em sade mental. Com o suporte de
um material impresso (Guia GAM), a proposta de que os usurios tenham acesso ainformaes sobre seus tratamentos e assim possam reivindicar seus direitos, dialogando
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sobre o lugar que a medicao e outras prticas ocupam nas suas vidas, refletindo sobre suas
redes sociais e sua qualidade de vida13,14.
Nascida no seio dos movimentos sociais de defesa dos direitos dos usurios de sade mental, a
estratgia GAM, no Quebec, teve inicialmente como foco o questionamento da medicao
objetivando a sua retirada. Entretanto, o seu desenrolar propiciou a abertura de espaos dedilogo e trocas de experincia de vida e de adoecimento, colocando em cena o
reconhecimento de que havia um sofrimento j existente antes do uso de medicamentos, de
forma que o foco da estratgia direcionou-se partilha dos significados desse uso.
Conforme o princpio de que a deciso quanto ao melhor tratamento se faz em uma
composio entre os saberes do usurio e da equipe de referncia, numa gesto
compartilhada do cuidado, e que o exerccio de cogesto engendra processos de
autonomia16,17, realizou-se uma pesquisa-interveno qualitativa em CAPS de diferentes
cidades no Brasil. Fez-se uso, junto a grupos de usurios desses servios, de uma verso
traduzida e adaptada do Guia GAM do Quebec, com vistas elaborao do Guia GAMbrasileiro (Guia GAM-BR)13.
A verso brasileira no manteve o tema da retirada da medicao, mas reforou a tomada de
decises compartilhadas entre usurio e profissional de sade. O guia dividido em passos,
onde a pessoa convidada a fazer um balano da prpria vida para alcanar uma melhor
qualidade. A dinmica grupal do uso do Guia visa: a partilha de experincias, a ajuda mtua, o
estmulo busca de informaes sobre medicamentos e direitos. As temticas abordadas
incluem questionamentos sobre qualidade de vida, rede social, relacionamentos interpessoais,
direitos dos usurios, conhecimento sobre os medicamentos em uso e o papel da medicao
na vida de cada um. Ao longo do processo, o guia GAM-BR contribui para a (re)apropriao dopoder decisrio por parte dos usurios, estimulando que eles participem e discutam com os
cuidadores seus tratamentos13.
A pesquisa-interveno no teve, porm, somente um sentido de produo de conhecimento
sobre a experincia do uso de psicofrmacos nos CAPS; ela propiciou tambm uma
oportunidade para intervir nas prticas de cuidado em sade mental18. Assumimos a direo
indicada pelo movimento institucionalista, na afirmao de que se trata de transformar para
conhecer e no de conhecer para transformar a realidade19. A anlise institucional francesa
uma importante aliada no campo da Reforma Psiquitrica, na medida em que evidencia a
dimenso poltica da pesquisa quando trata dos processos de institucionalizao. Portanto, oobjetivo deste artigo analisar as prticas em sade mental valendo-se da interveno da
estratgia GAM como deflagradora dessa anlise.
Metodologia
O arranjo operacional utilizado para colocar em prtica a estratgia da GAM foi o Grupo de
Interveno (GI). Trs GI foram realizados em CAPS, um no Rio de Janeiro (RJ), um em
Campinas (SP) e um em Novo Hamburgo (RS); e um quarto GI ocorreu na Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp-SP). Os GI ocorreram simultaneamente, por dez meses,
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atravs de encontros semanais ou quinzenais, perfazendo uma mdia de vinte encontros em
cada GI. Os pesquisadores desempenharam a funo de operadores dos grupos, para a qual se
fez necessrio aliar o conhecimento em pesquisa e a experincia clnica, considerando que o
trabalho grupal foi realizado com pessoas que sofrem transtornos mentais graves. Dentre
esses pesquisadores, trs eram psiquiatras, com experincia de atuao em CAPS. Dois deles
atuaram conjuntamente como operadores do grupo de Novo Hamburgo, e o outro em um dos
GI de Campinas, atuando em parceria com pesquisadores de outras formaes. No GI do Rio
de Janeiro, no houve participao de psiquiatras como operadores de grupo.
Os sujeitos que participaram dos grupos de interveno foram usurios dos servios de sade
mental e pesquisadores, conforme aFigura 1.Nos grupos, cada participante recebeu um Guia
GAM, e este indicava a sequncia de temas a serem abordados. Os critrios de incluso dos
usurios que participaram foram: ser portador de transtorno mental grave, usar psicofrmacos
h mais de um ano, manifestar vontade de participar do grupo. Os critrios de excluso dos
usurios foram: recusa em participar ou em assinar o termo de consentimento livre e
esclarecido, limitao cognitiva grave. Para o grupo realizado na Unicamp, foi critrio de
incluso tambm a capacidade de circulao pela cidade, pela rede de servios, e uma
trajetria de participao poltica no campo da sade mental. O convite aos usurios foi feito
nos espaos de reunio e assembleia dos servios, e a seleo dos participantes, com o intuito
de seguir os critrios estabelecidos pela pesquisa, realizou-se de maneira conjunta com os
trabalhadores dos servios onde os grupos aconteceram. Cabe ressalvar que, para alguns dos
usurios que participaram dos GI, o tratamento medicamentoso era acompanhado por
mdicos, no necessariamente do CAPS.
Foram feitos, antes e aps o desenvolvimento dos GI, grupos focais com os usurios
participantes e entrevistas com gestores e trabalhadores de cada local onde os GI
aconteceram. Esses trabalhadores e gestores no necessariamente participaram dos GI -
sistematicamente, houve participao de duas trabalhadoras junto aos GI que se realizavam
nos CAPS em que atuavam: uma no Rio de Janeiro e outra em Novo Hamburgo. No grupo
desenvolvido na Unicamp, pelo fato dos sujeitos terem mais autonomia e transitarem pelos
diferentes servios da rede de sade, foram realizados grupos focais somente com os usurios.
O contedo do roteiro, tanto das entrevistas como dos grupos focais, foi: a valorizao do
contexto do usurio nas condutas clnicas; a capacidade de gesto e compartilhamento de
decises (usurio e equipe); direitos do usurio, em especial no que se refere medicao
(acesso, informao, recusa); a voz do usurio no servio e na relao mdico/paciente; aexperincia de uso de psicofrmacos; e a viso sobre autonomia de cada um.
Os grupos focais e as entrevistas, realizados por pesquisadores diferentes daqueles que
conduziram os GI, foram audiogravados e transcritos integralmente. Essas transcries deram
origem a narrativas que foram construdas por quem conduziu cada grupo ou realizou a
entrevista20, sendo que cada uma dessas narrativas foi, posteriormente, validada por outro
pesquisador. Com os usurios, as narrativas validadas foram a eles apresentadas para outra,
final " o que temos chamado de grupo focal hermenutico20, com base nas formulaes acerca
da funo da narrativa21. Os usurios, no encontro com o texto produzido com suas vozes,
julgaram se seus pontos de vista estavam ali contemplados, contribuindo para a compreenso
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dos pesquisadores. Na anlise dessas narrativas, foram extrados os principais ncleos
argumentais que emergiam do material, relacionados ao objetivo da pesquisa.
A pesquisa, com aprovao pelo Comit de tica da Universidade Estadual de Campinas,
respeitou os aspectos ticos e legais implicados no trabalho com pessoas, sobretudo usurias
da rede de sade mental.
Resultados e Discusso
Como resultado da interveno realizada pela pesquisa, surgiram, no contexto dos CAPS,
diversas situaes analisadoras das suas prticas. Desde a abordagem inicial, gestores e
trabalhadores mostraram-se ambivalentes com a estratgia da GAM. Apesar de considerarem
importante o empowerment do usurio, num dos campos a equipe pediu para editar partes do
Guia GAM antes de us-lo nos GI, porque temia que a disponibilizao de informaes sobre
os direitos dos usurios e os efeitos colaterais dos medicamentos resultasse em no adeso ou
desistncia do tratamento.
Nas narrativas dos usurios, os CAPS foram descritos ora como lugar de tratamento e cuidado
positivamente avaliado, como fomentador de espao de escuta, de troca e produo de
trabalho; ora como promotor de sentimentos de baixo poder de troca e de participao. Os
servios pareceram estar igualmente marcados por dupla caracterstica: de apoio ao usurio,
mas tambm de tutela.
Em quase todos os grupos focais, os usurios apresentaram dificuldade de dar sentido ao fato
de frequentarem o servio:para mim no est claro por que devo fazer tratamento e vir aoCAPS, ao invs de ficar em casa. (GF usurios 1). Mesmo quando o CAPS fazia sentido para a
vida ou era experimentado como um lugar de acolhimento, no promovia, necessariamente,
conforme evidenciava a narrativa dos usurios, uma melhor compreenso de sua experincia
de adoecimento. Como mencionado em outras pesquisas qualitativas, a relao consigo
mesmo, com os outros e com o mundo abalada pelas situaes de crise. E as abordagens
psicoeducativas e psicofarmacolgicas que predominam nos servios de sade mental
contribuem para reduzir os espaos para nomear as experincias, elabor-las e lhes dar um
sentido22,23.
Nos grupos da GAM, o contato com o mdico e com os demais profissionais da equipe desade foi estimulado, especialmente no momento em que as dvidas sobre os medicamentos
e os tratamentos surgiram. Em todas as narrativas os usurios relataram que sentiam
dificuldade em conversar com o mdico e mencionaram a falta de informao que tm sobre
os seus prprios tratamentos medicamentosos. Reconheceram que falar muito difcil e
apontaram os mdicos como detentores da autoridade na relao: Teve um psiquiatra que
disse que ia dar os remdios que ele quisesse. Acontece, algumas vezes, de no conseguirmos
falar com o mdico. A voz no sai, tranca, parece que tem uma coisa que diz assim: - No fala e
no pergunta. (GF usurios 2)
Alm disso, mesmo quando o profissional era descrito como mais disponvel, sentiam-se, porvezes, vtimas de preconceito: achamos que os mdicos dos CAPS tm preconceito com a gente
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e pensam que no podem deixar a pessoa falar por ser portadora de doena mental. (GF
usurios 2).
Alguns usurios relataram que negociariam com seus mdicos, no fosse a falta de informao
e a dificuldade de comunicao, atreladas grande demanda e carncia de profissionais nos
servios: ... de uma forma geral, achamos que possvel negociar a medicao com osmdicos, mas nem sempre podemos. Um de ns, inclusive, nunca perguntou isso, porque achou
que eles iriam falar um 'no'. Outro, tem o interesse em fazer isso, mas o nico mdico [do
servio] muito ocupado, por isso difcil conversar. (GF usurios 3).
A mesma questo da insuficincia de pessoal tambm apareceu nos relatos de gestores e
trabalhadores, comprometendo, segundo eles, a qualidade do tratamento oferecido:Ainda
existe o fato de a equipe estar sempre reduzida e acaba ficando atrelada ao cuidado dos
pacientes intensivos, aqueles mais graves, que permanecem mais tempo aqui, o que impede a
sada para fora do CAPS. (Entrevista Gestor 2).
Em que pese tais dificuldades, alguns locais tentavam amenizar os problemas enfrentados pela
falta de recursos do servio: Na tentativa de acompanhar os casos, em uma regio que sofre
com a pobreza, utiliza-se bastante o transporte disponvel ao CAPS, mas tambm o prprio
carro dos funcionrios, pois consideramos o transporte insuficiente e nos vemos sem
alternativas.(Entrevista Gestor 3). Referindo-se grande demanda que chega ao servio de
sade, um gestor relatou que os atendimentos de grupo so a soluo. A utilizao de grupos
como consultas coletivas, para contornar a falta de recursos, termina por evidenciar uma
prtica clnica de baixa qualidade, no configurando o que seria esperado de um grupo
teraputico.
Os gestores relataram ainda que os servios esto mais voltados para tratar das crises j
deflagradas do que para dar um seguimento contnuo no tratamento que propiciaria a
preveno delas.Acaba que as parcerias so mais intensas nas situaes de crise do que no
cotidiano. Quando um paciente no est bem, tem que se correr pra montar a rede, o que um
problema, porque acho que idealmente a gente devia estar com essa rede constituda
permanentemente.(Entrevista Gestor 1).
Um dos trabalhadores disse sentir-se mais seguro com o trabalho em equipe, mas chamou
ateno para a situao atual de falta de pessoal: acabo trabalhando que nem em pronto-
atendimento, em que venho aqui, mas no sei mais o que est acontecendo com aquelepaciente, no consigo mais fazer seguimento... Ento, est bem ruim, sem qualidade nenhuma.
Parece que voc fica sem retaguarda. O processo de trabalho acaba desestruturando o prprio
trabalho... s vezes voc engolido pela demanda. (Entrevista trabalhador 3).
Esses trechos deixam claro o quanto a falta de investimento, a alta rotatividade de pessoal e os
recursos insuficientes interferem na qualidade do trabalho prestado. Tal situao j foi
evidenciada em pesquisas anteriores, tendo sido destacada como pano de fundo durante
nosso estudo24.
Os usurios identificaram tambm que, quando o assunto era medicao, os demais
profissionais do CAPS costumavam remeter a deciso ao mdico e pareciam pouco
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apropriados sobre o tema. Este padro se repetiu em narrativas dos usurios das trs cidades,
o que mostrou a dificuldade em se discutir o tratamento medicamentoso. Por outro lado, os
profissionais mdicos relataram que o monoplio das decises relacionadas aos
medicamentos no algo desejado por eles, mas uma exigncia que experimentam em funo
do modo como se organiza o trabalho no CAPS. Contaram que, no caso de queixas
possivelmente associadas a efeitos colaterais, os usurios eram remetidos diretamente a eles,
como se outro profissional no pudesse conversar ou abordar essa questo. Reforo a
importncia do compartilhamento em equipe, ouvir outros pontos de vista, mesmo assim, sinto
que a responsabilidade com a medicao est vinculada apenas a mim que sou mdico, no
sendo to importante para os outros profissionais.(Entrevista trabalhador 3)
Os trabalhadores no mdicos, por sua vez, referiram-se a uma tenso existente entre eles e
os mdicos, ressaltando que estes tm dificuldade em compartilhar o conhecimento sobre
medicamentos, o que, para eles, justificaria o fato dos profissionais no mdicos pouco
participarem em decises sobre o assunto. Ao mesmo tempo, identificaram esse monoplio
como uma das razes do baixo empowermentdos usurios em relao sua prpria
medicao: Entre mdico e paciente ainda existe aquela relao de poder; o mdico receita o
remdio e o paciente deve aceitar. (Entrevista Trabalhador 1). Por fim, os gestores afirmaram
que pouco se debate sobre os medicamentos no cotidiano dos servios, tanto com os usurios,
como entre os profissionais das equipes de sade mental.
Os usurios ponderaram ainda sobre a timidez, o receio de conversar e "ouvir um no", ou de
serem maltratados. Aqueles que expressaram suas ideias para os trabalhadores, aps a
vivncia da estratgia da GAM, indicaram que isso no significou que foram
ouvidos: Ganhamos uma lista dos nossos direitos no GAM, mas a gente tem trs minutos de
consulta pelo SUS, no d tempo de mostrar. Quando, certa vez, um de ns, tentou mostrar os
direitos para o mdico, ele desviou ligeiro, deu a receita e j chamou outro. Ele nem leu, nem
pegou pra ler, ele viu que a carta era dos direitos, deu a receita e disse pra voltar tal dia.(GF
usurios 2). Ainda segundo os usurios, a escuta do mdico era seletiva, voltada aos aspectos
orgnicos das experincias que lhes eram narradas:Outro colega de nosso grupo conta que os
mdicos no lhe ouvem. S ouvem quando tem um problema simples, como: dor de cabea,
clica... Desses a gente pode falar. (GF usurios 1)
A partir da experimentao dos usurios nos grupos de interveno da GAM, outra forma de
comunicao sobre os psicotrpicos pde ser vivenciada. Os usurios referiam-se ao grupo
como um local de troca de um "saber experiencial" sobre o medicamento, onde cada um pde
contar sua vivncia singular com o uso dos psicotrpicos. Ao mesmo tempo, utilizaram essa
experincia do GI como um contraponto para criticarem a forma de comunicao dos
profissionais que os atendiam. Criticaram a linguagem dos trabalhadores da sade, definindo-a
como tcnica e insuficiente para sanar as muitas dvidas: Como chegaram concluso de que
algum bipolar? Quando vai ser a hora de pararmos o remdio? (GF usurios 2). Sem
respostas para suas dvidas, os usurios revelaram alguns medos, como a impresso de que o
tratamento com mltiplos medicamentos pode matar ou causar um estado de coma
permanente. Na sua percepo, os mdicos orientam pouco sobre o tratamento
medicamentoso:falam apenas quanto voc vai tomar e em que horrio, mas no conversamsobre a adaptao ao remdio(GF usurios 3).
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A discusso suscitada pela estratgia da GAM fez com que os usurios chegassem concluso
de que tratamento e uso regular de medicamento quase se tornaram sinnimos nos CAPS. Eu
tenho medo de contar que parei os remdios porque o CAPS muito apegado a remdio e acho
que podia ser um pouco mais na conversa tambm (GF usurios 3). Alguns contaram ainda que
j foram ou so ameaados de serem internados se no tomarem os medicamentos. Outros
recursos teraputicos surgiram nas narrativas, mas no alcanaram o mesmo valor dado ao
tratamento psicofarmacolgico.
As narrativas desta pesquisa indicam que, nos CAPS onde foi feita a interveno, no havia
suficientes espaos de fala sobre o tratamento medicamentoso com o usurio ou entre os
profissionais das prprias equipes. Foram identificados vrios problemas associados
dificuldade de comunicao sobre esse tema: relaes desiguais de poder, coero, medo,
timidez, uso de linguagem tcnica, ausncia de escuta para a vivncia pessoal e atribuio
exclusiva de competncias. Considerando-se a mudana do modelo centrado na doena para o
modelo de ateno psicossocial preconizada pela poltica nacional de sade mental atual,
marcante o fato de que o que mereceu ateno dos trabalhadores, no discurso dos usurios,
foi justo aquilo que poderia ser de pronto subsumido ao jargo tcnico, de modo que as
experincias pessoais no eram ainda consideradas ou ficavam relegadas ao segundo plano.
Chamou-nos ateno que, no relacionamento com os trabalhadores dos CAPS, os usurios se
sentiram estigmatizados, sendo um dos objetivos desse dispositivo justamente diminuir o
preconceito.
A esse respeito, um estudo qualitativo indicou que as intervenes intensivas de sade mental
na comunidade podem ser percebidas como coercitivas e intrusivas pelos usurios, indo contra
o princpio de livre escolha e de apropriao do poder, podendo contribuir assim para a
estigmatizao23. Outro estudo, com 120 equipes que realizavam seguimento intensivo, na
comunidade, de pessoas com problemas mentais, visando a sua desinstitucionalizao,
demonstrou que mesmo tal modelo pode veicular a ideia de que a adeso s prescries
farmacolgicas a sua principal finalidade, apesar das evidncias cientficas dos efeitos
limitados desse tipo de tratamento na reduo ou eliminao de sintomas face ao processo de
restabelecimento e melhora geral na qualidade de vida dos usurios25. Mais significativa ainda
foi a constatao de que a mudana na poltica de sade mental, com a reforma psiquitrica,
impulsionada pelos trabalhadores da sade1, no garantiu mudanas das prticas,
predominando o modelo biomdico, centralizando o tratamento no uso de medicamento.
Nos trs campos da pesquisa, a forma relatada pelos gestores quanto atitude do servio
diante de um usurio que, com o juzo crtico preservado, recusa fazer uso de medicamento,
varia da no aceitao aceitao com ressalvas. Alguns trabalhadores relataram que recusar
o tratamento sugerido significaria a "no adeso" e, por conseguinte, o desligamento do
usurio do servio. Na recusa do usurio de tomar a medicao, muitos profissionais tm a
conduta de faz-lo assinar em seu pronturio e deslig-lo de todo o tratamento. Explica-se que
o CAPS est de portas abertas, mas que ele ter que iniciar de novo todo o processo: ir ao posto
de sade, consultar com o mdico clnico, pegar o encaminhamento, trazer para c, fazer o
acolhimento, etc. E, caso o usurio faltasse trs vezes, por exemplo, ou faltasse duas vezes ao
grupo de medicao e uma ao grupo de depresso, seria tambm desligado do tratamento.
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Assim, seria desligado aquele que no estivesse cumprindo com o plano teraputico(Entrevista
Gestor 2). Apesar de criticar tal ao, o gestor assume que essa a prtica em seu servio.
Ainda no discurso de um trabalhador: eu friso que o direito de no usar medicamento no pode
ser encarado como se o paciente pudesse fazer tudo o que quer. Eu no costumo dizer aos
pacientes diretamente que eles tm o direito de no usar, prefiro salientar que eles devem falarcom o mdico caso achem que o medicamento est lhes fazendo mal, de modo que possam
trocar por outro. (Entrevista trabalhador 1). Em outros relatos, os trabalhadores disseram que
no se deve deixar de atender os usurios de forma alguma. No caso destes decidirem no
aceitar a medicao ou no frequentar o CAPS, ainda assim, tentariam manter e adaptar o
acompanhamento, ora com visitas domiciliares, ora com conversas com os familiares.
Entretanto, ao adotarem essa prtica, sentiam medo de serem responsabilizados caso algo
indesejvel acontecesse e fosse associado ao acompanhamento do usurio sem o uso do
psicofrmaco.Alm disso, tem toda uma questo legal que pode me envolver, caso eu banque
junto com ele a possibilidade de ficar sem a medicao, em que poder haver
cobranas(Entrevista trabalhador 3).
Percebeu-se a existncia de um limite tnue entre o cuidado com a sade dos usurios e o
gerenciamento de suas vidas. Considero importante a incluso do contexto do paciente no
atendimento que realizo, pois isso ajuda em muito na administrao da vida deles, bem como
em meu trabalho...Tentamos fazer o possvel para que os pacientes venham ao CAPS
diariamente, que tomem os medicamentos aqui. (Entrevista trabalhador 1).
Alm disso, quando um usurio piora clinicamente, aps a equipe "confiar" na sua capacidade
de seguir corretamente o uso do medicamento prescrito, h dificuldade em reinvestir na
corresponsabilizao e permitir que o usurio autoadministre sua medicao, porconsiderarem que, quando ele se sentir bem, interromper novamente seu uso. Com o grupo
de interveno da GAM, alguns trabalhadores perceberam que os usurios reclamaram de no
poder discutir a medicao com o psiquiatra e os demais profissionais da equipe. Identificaram
que exatamente os usurios mais crticos eram os que menos aderiam aos dispositivos clnicos
ofertados pelo CAPS e no seguiam "corretamente" o tratamento indicado. Esses
trabalhadores no se indagaram se os tratamentos oferecidos no CAPS atendiam aos desejos
dos usurios, que fizeram reclamaes apoiados em seus prprios objetivos e expectativas
com o tratamento.
Verificamos, a partir do que se mostrou na pesquisa, que o usurio frequentemente ocupauma das duas posies frente ao tratamento prescrito: a de sujeito ou com pouca voz e pouca
participao no projeto teraputico atribudo ou excludo de seu prprio direito ao
tratamento, correndo o risco de tampouco ter apoio da famlia que, muitas vezes, refora e
garante sua adeso irrestrita ao prescrito no servio de sade. Nos casos de exceo, em que
os usurios mostraram maior protagonismo em seu tratamento, os trabalhadores pareciam
manter uma ligao mais frgil com eles e, ao mesmo tempo, enfrentavam a oposio de
colegas, o medo de responsabilizao e punio pelo que pudesse advir a esses usurios em
funo de seu protagonismo.
Nas entrevistas com os gestores, foram referidas diversas situaes em que se justificava aimpossibilidade do manejo de crise sem o uso de psicotrpicos: o nosso mandato, se a gente
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no fizer, o paciente estar a, correndo risco... fazendo algum correr risco. No desejvel
que ele v parar no campo jurdico ou penal. s vezes, tem risco que voc no
imagina! (Entrevista Gestor 1). Essas falas evidenciaram a predominncia do papel de tutela
sobre o de cuidado.
Nos momentos descritos como aqueles em que o usurio se coloca em risco ou expe outros arisco, foi defendido um agir de forma mais "firme", impondo a internao e/ou o uso do
medicamento, mesmo que involuntariamente. Justificou-se como um cuidado necessrio, ao
julgarem extintas as possibilidades de negociao. Quando o usurio se coloca numa situao
de risco, a gente obrigatoriamente interfere (Entrevista Gestor 1). Neste ponto, todos os
discursos foram congruentes, apontando para aes involuntrias como forma de proteo.
Infelizmente, no foram exploradas, no estudo, quais situaes eram consideradas de risco
pelas equipes e qual a possibilidade de negociao. No houve meno possibilidade da
elaborao de um plano para a crise, combinado previamente com o usurio, corroborando a
ideia de que h dificuldade de incluso do usurio na negociao da direo do seu
tratamento.
No momento em que o Guia GAM abordou os direitos dos usurios, estes apontaram os
espaos onde est previsto que falem: as "assembleias", a associao de usurios do CAPS e
outros grupos. Nos espaos criados para garantir a democracia institucional, a participao
acolhida e respeitada, segundo os prprios usurios. Todavia, quando o assunto est
relacionado gesto de seu prprio tratamento, como o direito de recus-lo, os usurios no
se sentiram ouvidos: se isso ocorre [recusa ao medicamento], pem remdio pela garganta,
do injeo ou, na internao, amarram logo (GF usurios 1). A recusa ao tratamento
medicamentoso coloca o usurio diante da ameaa de ser transferido para um lugar piorou de
desencadear uma nova crise, causando o retorno ao uso dos psicotrpicos.
Aps as discusses abordando os direitos dos usurios nos GI, alguns fizeram pedidos s
equipes dos CAPS para ter acesso ao pronturio e bula de seus medicamentos, porm
sentiram dificuldades em obter o que reivindicavam. Questionaram tambm a impossibilidade
de escolha do profissional que os atendia e os empecilhos para conversar com as pessoas com
quem se sentiam mais vontade. Eu liguei para o CAPS e falei que queria parar os remdios,
que queria conversar com a mdica de quem eu mais gosto. E eles falaram que quem vai me
atender uma outra que eu no gosto. O paciente no pode escolher quem ele quer que seja
sua referncia(GF usurios 3). Estudo brasileiro j apontou essa mesma dificuldade na ateno
bsica26.
A partir dos objetivos desta pesquisa-interveno, cujas prticas-alvo foram o
compartilhamento de decises e a garantia do direito dos usurios a participarem de seus
prprios tratamentos, a metodologia de trabalho da GAM foi vista como algo no habitual,
seja para os usurios, seja para os trabalhadores e os gestores. Em que pese os seus mritos, a
Reforma Psiquitrica brasileira foi fundamentalmente uma reforma estrutural, com aumento
do financiamento aos servios extra-hospitalares de base comunitria, resultando na forte
expanso do nmero de CAPS em territrio nacional27e, mais recentemente, na
implementao de redes de ateno psicossocial. Entretanto, no tangente aos tratamentos
medicamentosos, na forma como so oferecidos, a prtica ainda no superou o modelo
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biomdico prevalente. Alm disso, subsistem, nesses servios, espaos de controle, de
dominao e estigmatizao, onde os direitos dos usurios so inibidos ou aceitos com
cautela.
Alguns autores, como Bleger28, j identificaram a tendncia das organizaes em reproduzir os
problemas que elas se propem responder. Em outro estudo qualitativo, alguns CAPSestudados se apresentaram como espaos de captura, de anulao da potncia dos coletivos
de usurios29. A tendncia tutela, existente em diversos servios de sade, justificada pelos
"riscos potenciais" de um usurio de servios de sade mental para a sociedade, faz persistir a
ideia de que o usurio no capaz de discernir o que o melhor para ele, reforando sua
excluso no processo decisrio de seu tratamento30.
O tratamento medicamentoso revelou-se um assunto pouco debatido, seja pelos usurios, seja
pelos trabalhadores. Percebeu-se que os trabalhadores no mdicos pouco se apropriaram do
tema, endereando as decises acerca da prescrio medicamentosa exclusivamente aos
mdicos. Sem deter esse saber, como podero incentivar os usurios a dialogar e a negociarcom os seus prescritores, a fim de incluir o saber experiencial no projeto teraputico? Esta
questo torna-se mais premente em um contexto onde o conceito de tratamento raramente
se divorcia da prescrio medicamentosa.
A pesquisa levou-nos constatao de que ainda so necessrias mudanas nas prticas em
sade mental, especialmente no que se refere valorizao da experincia do usurio em seu
tratamento. Estimular a autonomia e o poder de agir dos usurios e mobiliz-los para que
descubram ou redescubram seus interesses e desejos, segue sendo um desafio para o cuidado
em sade mental - um cuidado cujas principais preocupaes deixem de ser o diagnstico, a
doena e a prescrio medicamentosa. A direo proposta que o usurio, em vez de ocuparum lugar de dependncia na relao com o servio, tenha o servio como espao a partir do
qual retome o seu lugar de cidado. Tem-se como exemplo, a partir do relato de usurios, o
Movimento de Sade Mental Comunitria do Bom Jardim em Fortaleza (CE)31. Atravs de
iniciativas como a estratgia da GAM, afirmamos a possibilidade de avanar, para alm de uma
reflexo sobre as prticas, em direo a mudanas e possibilidade de um cuidado
compartilhado em sade.
Colaboradores
RT Onocko-Campos, E Passos, AL Palombini, DVD Santos, S Stefanello, LLM Gonalves, PM
Andrade e LR Borges trabalharam juntos em todas as etapas do manuscrito.
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