a história da psicopatologia no brasil - benilton ferreira

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A HISTÓRIA DA PSICOPATOLOGIA NO BRASIL 1 Benilton Bezerra Jr Eu vou apresentar aqui algumas ideias que eu espero suscite uma conversa entre nós sobre Psicopatologia e sobre algumas mudanças que no campo da Psicologia vem acontecendo nos últimos anos e um pouco do horizonte que se prenuncia atualmente. O primeiro ponto que eu gostaria de comentar é o seguinte: a Psicopatologia é geralmente entendida como um campo específico do conhecimento: Psico-Pathos-Logos – o estudo do sofrimento psíquico. Nesse sentido é uma área especial da Psiquiatria em especial, mas não só da Psiquiatria e que envolve a definição, concepções do que seja doença mental, descrição do que são as doenças mentais, delimitação das categorias, montagens de qualificação etc. Esse é um aspecto importante e sobre o qual eu espero que a gente possa conversar, porque justamente é uma das coisas mais importantes no campo psi, no campo da psiquiatria, não só da psiquiatria, no campo social que é impregnado pela presença das teorias, dos conceitos e da prática psiquiátrica, tem havido o desenvolvimento de uma mudança muito grande nos últimos 40 anos, ou seja, nos últimos 100 anos a gente viveu uma mudança drástica, para alguns, uma revolução, para outros um pouco desastrada mudança na direção de uma psicopatologia que eu vou inventar de escrever daqui a pouco. Mas, além disso, e talvez seja esse o aspecto que eu acho mais interessante a gente discutir. A psicopatologia também diz respeito à vida cotidiana no sentido de que nós todos e hoje em dia cada vez mais absorvemos conceitos, palavras e que nós usamos nas nossas relações sociais, o tempo todo. Nós usamos cada vez mais para nos autodefinirmos, nós usamos para dar nome a certos sentimentos, cada vez mais, isso é uma característica dessa mudança, nós recorremos ao vocabulário psiquiátrico. Isso não sem consequências, é sobre isso também que eu gostaria que a gente pudesse conversar. Então, de certo modo, o primeiro ponto que eu gostaria de dizer, é claro, tudo que eu vou dizer pode ser contestado por pessoas que pensam de maneira diferente, mas é assim, é assim que é bom,

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A HISTRIA DA PSICOPATOLOGIA NO BRASIL1Benilton Bezerra JrEu vou apresentar aqui algumas ideias que eu espero suscite uma conversa entre ns sobre Psicopatologia e sobre algumas mudanas que no campo da Psicologia vem acontecendo nos ltimos anos e um pouco do horizonte que se prenuncia atualmente. O primeiro ponto que eu gostaria de comentar o seguinte: a Psicopatologia geralmente entendida como um campo especfico do conhecimento: Psico-Pathos-Logos o estudo do sofrimento psquico.Nesse sentido uma rea especial da Psiquiatria em especial, mas no s da Psiquiatria e que envolve a definio, concepes do que seja doena mental, descrio do que so as doenas mentais, delimitao das categorias, montagens de qualificao etc.Esse um aspecto importante e sobre o qual eu espero que a gente possa conversar, porque justamente uma das coisas mais importantes no campo psi, no campo da psiquiatria, no s da psiquiatria, no campo social que impregnado pela presena das teorias, dos conceitos e da prtica psiquitrica, tem havido o desenvolvimento de uma mudana muito grande nos ltimos 40 anos, ou seja, nos ltimos 100 anos a gente viveu uma mudana drstica, para alguns, uma revoluo, para outros um pouco desastrada mudana na direo de uma psicopatologia que eu vou inventar de escrever daqui a pouco.Mas, alm disso, e talvez seja esse o aspecto que eu acho mais interessante a gente discutir. A psicopatologia tambm diz respeito vida cotidiana no sentido de que ns todos e hoje em dia cada vez mais absorvemos conceitos, palavras e que ns usamos nas nossas relaes sociais, o tempo todo. Ns usamos cada vez mais para nos autodefinirmos, ns usamos para dar nome a certos sentimentos, cada vez mais, isso uma caracterstica dessa mudana, ns recorremos ao vocabulrio psiquitrico. Isso no sem consequncias, sobre isso tambm que eu gostaria que a gente pudesse conversar.Ento, de certo modo, o primeiro ponto que eu gostaria de dizer, claro, tudo que eu vou dizer pode ser contestado por pessoas que pensam de maneira diferente, mas assim, assim que bom, a gente pode dar as opinies e v-las confrontadas por pessoas que pensam de modo diferente.A primeira ideia que eu gostaria de acentuar, o seguinte: embora a psicopatologia como disciplina, digamos assim, como parte do campo mdico pretenda muitas vezes se apresentar como uma atividade cientfica, ela no . A psicopatologia ela uma atividade permanente, pelo menos nos ltimos 200 anos desde que se criou a ideia mesmo de doena mental e se criou a psiquiatria e tudo o que gira em torno dela um exerccio constante de demarcao do que a normalidade do que a diferena, mas ainda no patologia e do que uma diferena que a gente considera patolgica e, portanto que merece e que exige algum tipo de interveno.Ento, de certa forma, psicopatologia uma coisa da qual todos ns participamos na medida em que ns, como membros de uma sociedade caucionamos ou criticamos essas palavras que apontam, nomeiam, classificam positiva ou negativamente certas experincias psquicas e certos comportamentos. O que faz com que uma experincia que um de ns possa ter ou uma conduta que a gente possa apresentar seja considerada patolgica, no alguma coisa que se decida cientificamente no sentido de uma objetividade que no presta nenhum tributo a avaliao subjetiva. Ao contrrio, se a gente pode dizer que o sofrimento psquico, o sofrimento tout court (00:06:05/09), ele inerente existncia humana, e isso Buda j dizia h 2.500 anos atrs: viver sofrer. Por qu? Porque a vida, ela sempre implica frustraes, implica limites, implica acasos infelizes e, se h uma coisa que nos caracteriza em relao a outros animais que tm mentes, o fato de que ns sofremos, sabendo que estamos sofrendo e nos interrogando sobre as causas e sofrimentos e agindo de maneiras complexas em relao a ele e no de maneira meramente automtica como qualquer animal pode fazer.Ento, a psicopatologia como exerccio da, deixe dizer de outra maneira, a demarcao das fronteiras entre normalidade, diferena e patologia um exerccio constante de toda a sociedade e a gente vai, ressalva, de toda a sociedade desde que se constituiu esse campo especfico da psicopatologia e isso tem pouco tempo, 200 anos mais ou menos.Como exemplo dessas movimentaes no campo da psicopatologia, curioso a gente lembrar de alguns diagnsticos que foram inventados, utilizados e depois jogados no lixo, por qu? Porque em grande parte refletiam de maneira muito aguda percepes contextuais que foram deixadas para trs.Quando se comeou a construir ferrovias nos EUA, surgiu um diagnstico que era o diagnstico da espinha ferroviria railuby spine, era um diagnstico que era dado para pessoas que supostamente tinham traumatismos pelo sacolejo dos trens, uma novidade na poca. Durante horas seguidas, os mdicos chegaram a concluso que aqueles sacolejos produziam uma espcie de traumatismo mnimo que fazia com que o sistema nervoso central ficasse alterado e as pessoas ficassem nervosas, ansiosas etc e tal. Esse diagnstico, ele foi, teve uma presena, evidentemente, sumiu.Outros diagnsticos surgiram, por exemplo,Kraepelin, que um grande psiquiatra, o fundador, digamos da psiquiatria classificatria cientfica a grande figura que hoje em dia influencia a maneira, o olhar psiquitrico. EmilKraepelin, no final do sculo 19, produziu a primeira grande classificao psiquitrica. Ele, por exemplo, falava das parafilias, ou seja, das prticas e excitaes, imaginaes sexuais paraflicas, significa fora do que deveria acontecer e ele inclua entre as parafilias a sexualidade na velhice e na infncia.Kraepelinno tinha a noo de que sexualidade fosse alguma coisa que as crianas experimentassem e muito menos achava que velhos, e velhos vocs imaginem que no final do sculo 19, era a partir dos 50 voc j estava mais ou menos candidato a ser considerado um ancio. A sexualidade era considerada por ele uma estranheza, uma espcie de conduta fora do normal.Talvez, o diagnstico mais extravagante com o qual eu me deparei o de drapetomania foi um conceito inventado por um psiquiatra americano no sculo 19 e que significava um delrio, ou seja, um impulso irracional, a fuga que era tpica de certos grupos de pessoas, dos escravos. Os certos escravos tinham essa doena, ou seja, tinham um impulso a fugir e buscar a liberdade. Isso contrariava a natureza do escravo e, portanto era evidentemente uma patologia. O tratamento da drapetomania, eu no preciso explicar qual era. Era um tratamento de conteno desse impulso antinatural.H outros diagnsticos tambm que mais recentes a gente est falando que os psiquiatras e mdicos do sculo 19. Mas, se a gente pensar bem, a homossexualidade deixou de ser considerada como uma patologia comeou a ser considerada como uma patologia no sculo 19 deixou de ser considerada como patologia h muito pouco tempo atrs, em 1974. Foi quando, apenas por presso dos movimentos gays, a homossexualidade, depois de uma votao e de uma espcie de plebiscito, se decidiu que a homossexualidade no deveria ser considerada uma patologia.H outros casos de diagnsticos que so muito especficos numa certa cultura, por exemplo, o da personalidade mltipla, um transtorno que muito tpico dos EUA houve quase uma epidemia durante um tempo e depois sumiu.A histeria na poca de Freud era um diagnstico bastante comum, era digamos o sistema da poca e hoje em dia em uma presena completamente diferente.A depresso que nos anos 50, acometia, segundo as estatsticas 2% da populao hoje em dia, aparentemente, segundo as previses e clculos epidemiolgicos atingiro, um em cada quatro pessoas ao longo da vida.Ento, vocs veem como o quadro das chamadas doenas mentais ele varia conforme o contexto. Alguns diagnsticos simplesmente aparecem, desaparecem, outros vo mudando de nome, o caso da psicose manaco depressiva que transformou-se no transtorno bipolar e a gente vai ver depois, a importncia que teve essa transformao vocabular no lugar que essas pessoas ocupam socialmente da maneira como as pessoas se identificam e com isso a gente pode comear a pensar na importncia que tem o vocabulrio psicopatolgico na vida das pessoas, de uma maneira geral, de todos ns, mesmo aqueles que no temos ainda diagnstico psiquitrico, ns o tempo todo usamos, hoje em dia qualquer pessoa usa a palavra Autista como uma certa liberdade, usa a palavra bipolar com uma certa liberdade. Todo mundo enxerga crianas com provavelmente TDAH, a gente vai incorporando esse vocabulrio e isso de novo, no tm poucas consequncias.De todo modo, eu queria falar rapidamente sobre o que foi essa mudana fundamental que ocorreu em 1980 precisamente com o surgimento da 3 edio do DSM. O DSM para quem no sabe um sistema de classificao diagnstico de doenas psiquitricas criadas pela psiquiatria americana, mais adotada pelo mundo inteiro. No era pra ser, transformou-se na bblia do psiquiatra e essa mudana do DSM III, ela foi fundamental. Por qu? At o final da II Guerra Mundial, a psicopatologia ela era fundada numa certa concepo do sofrimento psquico, como uma espcie de dilacerao interna, vivido como um conflito, um enigma a ser decifrado, de tal maneira resumida todo sintoma era considerado signo de alguma coisa, o sintoma uma depresso, uma fobia, um delrio, eles tinham alguma significao, aquilo remetia a alguma coisa especial na trajetria singular daquele indivduo na sua relao com o meio.Ento, ser tomado por um sintoma, era quase automaticamente interrogar-se sobre o que est acontecendo comigo, tratar de um sintoma era tentar entender o que na vida daquela pessoa engendrou a casos, circunstncias que levaram aquela pessoa estar sofrendo daquela forma.Esse paradigma, digamos assim, se devia a vrias razes: a influncia de Freud desde final do sculo 19, a influncia da fenomenologia ao longo dessa primeira metade do sculo 19, a ausncia de terapias biolgicas. Para vocs lembrarem, o primeiro remdio antipsiquitrico de fato, surgiu em 1950 e poucos, a clorpromazina. Antes disso, nenhum tratamento biolgico, nenhum medicamento especificamente psiquitrico havia, de modo que, a terapia pela fala, a terapia de base psicossocial era basicamente o que havia no horizonte teraputico.Em 1952 com o surgimento da psicofarmacologia, uma coisa mudou radicalmente e de l pra c, o impacto dos psicofrmacos s tem feito aumentar. De novo, se nos anos 50/60, tomar um antidepressivo era alguma coisa que as pessoas tendiam a esconder, hoje em dia as pessoas exibem, dizendo: meu antidepressivo melhor do que o seu, qual o seu?, voc toma quanto? etc, isso aqui eu j tomei.A indstria farmacutica, ela teve um sucesso extraordinrio, uma das reas da economia mais lucrativas. Isso teve um impacto poderoso na mudana do paradigma da psicopatologia, da psiquiatria.Um outro elemento fundamental foi a crise de legitimidade da psiquiatria nos anos 60, sobretudo 70, torpedeada de vrios lados. De um lado, pelo fato de que os crticos externos psiquiatria diziam que o diagnstico psiquitrico no tem confiabilidade nenhuma.Cada psiquiatra diagnostica de um jeito muito pessoal, era verdade. As escolas francesa, alem, inglesa e americana, cada uma tinha um sistema de qualificao e aqui no Brasil, haviam os discpulos das escolas francesas, americanas, inglesa, da escola alem, sobretudo francesa e alem e, isso fazia com que por exemplo, fosse quase impossvel estabelecer pesquisas multicntricas.Foi feito uma pesquisa que se tornou clssica, filmando determinado nmero de pacientes que cujos filmes foram apresentados para psiquiatras ingleses e americanos. No eram nem franceses e alemes ou franceses ou americanos, eram ingleses e americanos, ambos anglfanos, da mesma cultura, e os mesmos pacientes eram na sua maioria diagnosticados como esquizofrnicos nos EUA e deprimidos na Inglaterra, ou seja, a confiabilidade do diagnstico psiquitrico comparado com os diagnsticos mdicos era muito baixa.Um outro caso rumorozssimo chamado O caso Losekam que era um psiclogo que juntou umas 12 pessoas e combinou com eles um experimento, muito engenhoso, simples, mas engenhoso. Ele combinou que num determinado dia todas essas pessoas que podiam ter sido apanhadas aqui, iriam cada uma para um servio de emergncia psiquitrico em um estado americano, iriam dizer apenas uma mentira: que ouviam uma voz e que essa voz s dizia somente trs coisas: oco, vazio e tuti. A escolha desses termos era proposital, porque oco, vazio o tipo da coisa que quando voc est deprimido, entediado, sem muito destino na vida, voc tem impresso de que a vida vazia etc e tal. Era para diminuir o impacto da voz, a voz no era persecutria, s dizia isso. E, alm disso, somente a verdade, nada mais que a verdade.Resultado: todos foram internados, todos com diagnstico de esquizofrenia paranide, exceto um com diagnstico de psicose manaco depressiva.Foram internados e continuaram fazendo a pesquisa, escrevendo na frente de todo mundo os relatrios das pesquisas, ningum reparou nada.Os nicos na verdade que repararam foram os prprios pacientes internados que disseram: voc jornalista, voc no doido, vocNum determinado dia eles vieram luz e disseram, isso era um experimento. Enfim, foi um desastre, teve vrias consequncias que depois no debate a gente pode voltar. Mas, esse era o tipo de crtica que se fazia psiquiatria nos anos 60/70.Alm disso, um outro elemento importante foi o fato de que os psiquiatras que at os anos 50, apenas, trabalhavam dentro de asilo com condies toscas de tratamento ou em consultrios fazendo psicoterapia, comearam a sofrer a concorrncia de outros profissionais, psiclogos, assistentes sociais, pessoas que tambm eram capazes de fazer psicoterapia, no podiam medicar, mas os mdicos tambm no medicavam muito.Houve uma espcie de guerra, no fundo de mercado, e os mdicos se viram ento, os psiquiatras se viram instados a definir um pouco melhor qual era o seu terreno e uma das maneiras de fazer isso, foi criar uma, um sistema de classificao de diagnstico que fosse mais confivel e que pudesse ser, digamos apropriado para pesquisas, para difuso do conhecimento diagnstico entre pessoas da sade pblica, por exemplo.Vocs imaginem o que era fazer programa de sade pblica mental em lugares onde havia pouqussimos psiquiatras e na Amrica Latina havia muito poucos psiquiatras e na frica muito menos ainda. Em muitas regies no havia, era preciso que enfermeiros, assistncias sociais, psiclogos, outros profissionais pudessem manejar os instrumentos, eles eram muito complicados.Ento, um conjunto de fatores fez com que os psiquiatras resolvessem mudar e a mudaram drasticamente, varrendo a influncia da psicanlise e da fenomenologia e fazendo vir tona um sistema de classificao que o que ns temos hoje.Um sistema de classificao baseado, sobretudo, na ideia de que sintomas so sinais. O sentido de um sintoma no importa muito. Ele agrupado num conjunto e esse conjunto significa uma referncia a um diagnstico, chamado agora de transtorno.A ideia do DSM era a de permitir que psiquiatras de todas as orientaes tericas pudessem conversar e isso fez com que eles avanassem na ideia de fazer um sistema classificatrio que no iria perguntar sobre a causa dos transtornos, iria simplesmente fazer um conjunto de rtulos, o que permitiria em tese que qualquer fenomenlogo, psicanalista Junguiano, psiquiatra biolgico etc, pudesse trabalhar com aquelas categorias.O que de fato aconteceu, foi que ao longo dessas dcadas, houve uma nfase cada vez maior na verso biolgica da psiquiatria, ou seja, o diagnstico que era aterico. Na verdade tornou-se uma espcie de fundamento para uma psiquiatria biolgica que hoje , pelo menos na psiquiatria oficial, a verso hegemnica.Houve muitas consequncias na adoo do DSM III, ele j passou por uma reviso em 87 e depois do DSM IV em 1994, uma reviso em 2000 e agora ns estamos no final da elaborao do DSM V.O que aconteceu com o nmero de diagnsticos psiquitricos com essa mudana? Explodiu. O DSM I tinha mais ou menos 160 diagnsticos, o DSM IV esse ltimo agora tem 374, 375. O nmero de diagnsticos possivelmente, aumentar com o DSM V, mais do que isso, a ideia de que a psicopatologia, ou seja, o estudo do sofrimento perdeu aquela perspectiva fenomenolgica, ou seja, o que significa isso? Significa a anlise da experincia de estar deprimido, anlise na primeira pessoa.O que estar tomado por um delrio de perseguio? O que estar tomado pela ideia de runa? Depresso? De pnico diante de um objeto inofensivo? Fobia? Essa explorao da experincia na primeira pessoa, hoje em dia com o DSM, foi varrida.Outra dimenso varrida, a dimenso psicodinmica. O que passa dentro do indivduo? Que tipo de conflito ele tenta resolver com sintoma, que sempre uma tentativa de soluo, de um conflito difcil de resolver. Essa discusso, ela tambm foi colocada num segundo plano, se que est em algum plano.O diagnstico psiquitrico hoje em dia to simples, que no s psiquiatras do diagnsticos e, portanto, medicam. Hoje em dia, quem mais medica antidepressivos e tranquilizantes, no so os mdicos em geral, ginecologistas, otorrinolaringologistas, oftalmologistas. Osteopatas se forem mdicos tambm receitam.Diagnsticos no apenas mdicos psiquiatras do, os outros mdicos tambm, mas todos profissionais da rea de sade mais os professores das escolas, mais os pais, ou seja, a vulgarizao e a simplificao do diagnstico, produziu uma espcie de enxurrada de diagnsticos na sociedade.Seu eu pegasse aqui um exerccio, se eu tivesse mais tempo eu teria feito isso, um exerccio mostrando a vocs alguns dos diagnsticos mais polmicos do DSM. Certamente, a maioria aqui sairia com algum tipo de diagnstico. Tantos eles so, ento simplesmente voc pode ser alocado num.Isso quer dizer que uma pessoa que tem um diagnstico desse tem uma doena mental? uma boa pergunta. Boa parte dos psiquiatras admite socialmente que no. Ter um transtorno mental no significa necessariamente que voc tenha uma doena, se por doena voc entender algum tipo de entidade antomo-clnica. Transtorno transformou-se numa espcie de acordo convencionado de que certas condutas, certas experincias, elas so estranhas, so esquisitas, elas merecem ser atendidas.Ento, se criam, por exemplo, diagnsticos como: Transtorno Explosivo Intermitente (TEI). Se tiver algum aqui de cabea quente, pavio curto, estourado, pode abraar esse diagnstico e dizer que a culpa no sua, que voc um doente, as pessoas tm que lhe compreender, bom mas tambm, talvez voc seja obrigado a se tratar.O Transtorno Desafiador de Oposio (TDO) que dado para crianas que no obedecem aos adultos que no gostam de fazer deveres, que botam a culpa nos outros pelas coisas que elas fazem. Eu no t brincando! nesse nvel o critrio de definio de um diagnstico que dado cada vez mais para crianas em idade escolar.Em alguns contextos sociais, mais at do que no Brasil, a difuso dos diagnsticos muito preocupante. Por exemplo: o uso de diagnstico de Transtorno Bipolar em crianas com menos de cinco anos, criana em processo de formao e j alvos desse tipo de diagnstico.Por qu que isso relevante? Porque um diagnstico psiquitrico ele no apenas uma espcie, no como se voc ter uma amigdalite, no como voc ter uma fratura, no como voc ter uma doena qualquer. voc ter um trao seu marcado, no seu olhar sobre si prprio, no olhar dos outros sobre voc. Dependendo do diagnstico Transtorno Bipolar numa criana de cinco anos tem um defeito de influir fortemente no engendramento de um destino, de um destino pessoal, de um destino social.Esse tipo de fato deveria fazer com que a gente pudesse cada vez mais discutir, ns os no especialistas sobre a pertinncia desses diagnsticos. E a pergunta, bom antes disso, apenas dar a vocs a importncia, o grau da importncia dessa discusso eu vou dar alguns exemplos de diagnsticos que foram propostos para o DSM V. Um deles, o mais polmico, talvez foi o de Sndrome de Risco de Psicose.Era a ideia de voc poder flagrar um adolescente que ainda no tinha apresentado os sintomas psicticos para intervir mais cedo, medic-lo e evitar que ele tenha a psicose.O motivo no sem interesse, a gente sabe que entre o aparecimento de sintomas e o tratamento, em mdia passe-se um ano. O que significa? (isso so pesquisas internacionais). O que significa um efeito ruim no prognstico. Quanto mais cedo o tratamento, melhor o prognstico. Entre o surgimento de prdomos, de situaes que parecem indicar que a criana ou adolescente possa ter aquela ecloso de um surto mais adiante, passam-se quatro anos, ou seja, h um perodo anterior presena do surto que quando o adolescente acolhido, tratado etc. Esse acolhimento pode mudar o seu destino, esse o raciocnio, o argumento.O problema qual ? que a adolescncia que a parte da populao para a qual se volta esse diagnstico por natureza turbulenta, o adolescente inquieto, o adolescente ensimesmado, o adolescente que, se sente esquisito, que tem comportamentos bizarros, pode ser um adolescente perfeitamente normal, muitos aqui devem ter tido uma adolescncia assim, seriam irreconhecveis hoje e esses seriam os falsos-positivos.Alguns crticos chegaram a calcular que, se esse diagnstico passar, provavelmente no vai passar, haveria cerca de 70% de falsos-positivos. Significaria que 70% das pessoas, dos adolescentes com esse diagnstico, simplesmente, no iriam desenvolver a psicose mais adiante.Mas, de novo, quem tem interesse nisso? Interesse direto: a indsria farmacutica. Interesse indireto: todo Establishment de assistncia sade mental, toda a rede de profissionais, toda a rede de servios etc e tal.H, portanto, na construo da psicopatologia, vocs vejam, muito, muito mais do que apenas discusso sobre o que uma doena mental, o que que a experincia do sofrimento. H interesses de toda ordem, corporativos, econmicos, polticos, sociais etc.Outro diagnstico, estranhssimo sugerido, foi o Transtorno Paraflico Coercitivo. Algum pode ter uma ideia do que pode ser isso? Transtorno Paraflifo, ou seja, uma atividade sexual ao lado (para, desviante) coercitivo. Esse diagnstico foi bolado para ser aplicado para certos estupradores que seriam considerados doentes. O estupro sendo considerado consequncia dessa doena mental.Isso uma discusso muito importante e muito crucial, por qu? Porque ele um exemplo de como na sociedade que a gente vive, cujas caractersticas a gente pode discutir daqui a pouco, a falta da tradio, a falta de agncias nmicas que regulam naturalmente a vida das pessoas, dos conflitos tm feito com que duas agncias sociais sejam cada vez mais convocadas para regular os conflitos da vida normal.Um a Justia, a judicializao da vida cotidiana cada vez maior. Isso comeou nos EUA, qualquer pessoa que veja filme americano j ouviu essa frase: eu vou lhe processarns nos vemos na corte. tipo da classe mdia americana, ns nos vemos na corte. Pois, isso est sendo transportado para o Brasil e vocs abrem os jornais e veem o juiz determinando solues para conflitos que antes eram solucionados com outras maneiras.E a outra agncia a Medicina, em particular a Psiquiatria. Nem toda conduta indesejvel. Nem todo crime expresso de patologia. Nem tudo que a gente diz no deve ser considerado patologia. Por exemplo, houve um outro diagnstico sugerido. Vou dar um outro diagnstico para terminar essa coisa dos diagnsticos que muito preocupante que o Transtorno Misto de Ansiedade e Depresso (TMAD). O TMAD se passar, vai fazer com que todos ns em algum momento da vida tenhamos esse diagnstico, porque impossvel viver uma vida pelo menos uma vida interessante que implica riscos, implica ganhos, mas implicam perdas, decepes, frustraes, sem que a gente atravesse algum perodo em que voc esteja bastante ansioso ou esteja um pouco deprimido, impossvel.Isso no significa que ns devemos chamar esses perodos de turbulncia de doena mental? De transtorno mental? Eu acho que no. Muita gente acha que sim. So os promotores dessa proposta. E para finalizar esse tpico, uma outra discusso enorme do DSM V a questo do luto. At agora, o luto era considerado um perodo em que as pessoas, evidentemente, iriam sofrer, ou seja, um diagnstico de Transtorno Depressivo Maior era dado a uma pessoa que estivesse sem prazer, sem vontade de fazer nada, sem poder dormir, inapetente, com humor triste, apragmtico, desde que isso no fosse resultado da perda de um filho, de um marido, de um pai, durante um perodo que, alis, era curto, duas semanas.Pois bem, houve gente que disse que ns devemos retirar essa clusula de excluso, ou seja, o sofrimento natural do luto passaria a ser considerado um transtorno. Qual a consequncia imediata disso? a de que, uma coisa voc falar de luto, vestir preto durante seis meses, chorar de maneira ritual, no se mostrar alegre, cumprir o ritual social de elaborao da perda.Outra coisa dizer: eu estou com TDM, voc est com TDM. O passo seguinte a isso , evidentemente, tratamento e tratamento hoje em dia, muito frequentemente medicao, ou seja, o impacto disso sobre a medicalizao da vida cotidiana seria espetacular.Ento, isso so exemplos para mostrar a vocs como a construo das categorias psicopatolgicas, a demarcao do que patolgico e do que no , depende de um conjunto de variantes e, deveria, digamos, contar com a participao do pblico em geral.De uma maneira geral, alis, de uma maneira cada vez maior, isso tem acontecido. O DSM V a primeira classificao psiquitrica que foi colocada na internet para ser discutida, ou seja, qualquer um de vocs pode entrar frum da DSM e colocar as crticas que vocs quiserem. Ento, vocs podem intervir, qualquer psiquiatra pode fazer isso, mas qualquer pessoa faz isso. E muitos grupos tm feito, grupos organizados tm feito isso, ou seja, um dos efeitos. Eu falei de alguns efeitos negativos dessa virada do DSM III, expanso diagnstica, proliferao exagerada de novos diagnsticos, ampliao excessiva do campo de medicao do sofrimento, apagamento da dimenso experiencial do sofrimento, da dimenso fenomenolgica e psicodinmica do sofrimento.Mais houve efeitos tambm positivos, porque na vida tudo assim, tudo tem ganhos e perdas, nada exatamente bom, exatamente ruim e, entre as coisas positivas decorrentes do DSM, esto o fato de que o estigma em relao doena mental baixou bastante, ou seja, se a Psiquiatria nos anos 50/60, era uma psiquiatria opressora, excludente, hoje em dia o problema dela no esse, o contrrio, dela ser inclusiva, todo mundo faz parte do seu raio de ao. Ela inclusive, ela mudou inclusive, ou ampliou o seu raio de ao.O que no apenas o de tratar o sofrimento cada vez mais o de promover sade mental, promover bem estar social, de aprimorar as nossas capacidades cognitivas, afetivas, sensoriais etc, que uma fronteira com a qual eu vou terminar a conversa daqui a pouco, que uma das fronteiras entre normalidade e diferena que mais espetacular. Ns estamos avanando para uma psiquiatria, uma medicina do aprimoramento e no apenas uma medicina, uma psiquiatria que visa tratar o sofrimento.Ento, para dar um exemplo clssico do impacto da desestigmatizao, vocs no vo nunca encontrar um vdeo, um filme, um livro escrito ou encenado por um psiquiatra que, nos anos 60/70 viesse a pblico dizer: eu sou um psictico manaco depressivo. Se eu chegasse aqui hoje e dissesse: eu sou um psictico manaco depressivo, provavelmente, as mesas iriam lentamente se esvaziar porque a palavra psictico-manaco-depressiva contm uma carga de dramaticidade e de periculosidade que o termo Transtorno Bipolar (TB) enxugou completamente.Primeiro porque a pessoa era um psictico manaco depressivo, agora ela tem um Transtorno Bipolar, ou seja, algo que era inerente sua, transformou-se numa particularidade. Com todos os equipamentos e todos os tratamentos que a gente tem hoje, vocs tm todo mundo aqui deve conhecer pessoas que tm um diagnstico de TB com uma vida perfeitamente normal.Mas, curiosamente, h psiquiatras cujo sucesso se deve ao fato de terem TB, de escreverem, de pesquisarem, de se apresentarem como uma pessoa com TB. O que antes era motivo de fuga dos possveis pacientes, hoje em dia um motivo de aproximao. Por qu? Porque o psiquiatra que tem o transtorno conhece por dentro o que aquela condio, tem mais a oferecer ao paciente do que outro que no tenha essa experincia.Ento, o DSM produziu tambm esses efeitos positivos, entre outros efeitos, alm da desestigmatizao h o que um socilogo chamado de Yan Hackmam, chama de efeito looping, o efeito de rebote, que muito exemplarmente ilustrado pelo caso dos Autistas.O Autismo era um diagnstico terrvel nos anos 50/60/70. A partir dos anos 80, o Autismo virou um diagnstico cada vez mais comum, talvez at excessivamente comum. As estatsticas em relao ao Autismo, elas explodem. A quantidade de pessoas que tem o diagnstico cada vez maior, inclusive tambm porque todos ns usamos a palavra com muita liberdade. Muita gente diz: fulano Autista, sem que queira dizer que um diagnstico preciso mais qualificando com o vocabulrio psiquitrico que torna a categoria bastante permevel.Mas, o mais importante do que isso, foi o fato de que, e esse o efeito rebote, muitos Autistas se apropriaram desse diagnstico e passaram a trabalhar sobre ele, a influir na maneira como eram tratados, a produzir leis que favorecem mecanismos de facilitao da sua vida na sociedade, ou seja, tornaram-se um grupo ativo como o movimento gay foi, o movimento negro foi, como o movimento das mulheres foi. Mais do que isso, essa prtica poltica dos Autistas, transformou-se num elemento de crtica e de renovao do prprio conhecimento psicopatolgico sobre o Autismo.E h uma quantidade enorme de livros, escritos na primeira pessoa por Autistas. H relatos de famlias, h uma quantidade de literatura impressionante. Isso fez com que, de fato, o conhecimento psicopatolgico sofresse uma influncia que antes inexistia, que era dos prprios pacientes serem autores do conhecimento que se volta sobre eles.Esse foi um aspecto bastante curioso e positivo do DSM nesses ltimos 50 anos. De qualquer maneira, eu queria mencionar antes de fazer a discusso, que eu acho mais importante que : qual a definio que ns podemos ter sobre Normal e Patolgico? Antes disso, eu queria fazer um pequeno comentrio sobre o contexto mais geral que eu mencionei a pouco dessas transformaes (00:40:38), ou seja, por que que a psiquiatria tomou esse rumo?Alm da indstria farmacutica, alm da crise de legitimidade dos diagnsticos, alm do avano do conhecimento biolgico, alm do trabalho corporativo dos psiquiatras de se transformarem mdicos respeitados, que outros elementos no nosso contexto social fazem com que a psicopatologia tenha tomado esse rumo que ela tomou? Se a gente admite a ideia de que a criao e a circulao dessas categorias no se d no vcuo, se d em certos contextos, por isso que um psiquiatra americano do sculo 18 pode criar um diagnstico como a drapetomania. Aqui a gente tinha o banzo que era um diagnstico dado para os escravos, todo mundo conhece.Se isso verdade, ento o contexto em que os conceitos psicopatolgicos emergem, as classificaes psiquitricas emergem, so um pano de fundo para essas classificaes de alguma maneira expressam. E qual esse pano de fundo social que ns vivemos nos ltimos 30/40 anos no mais do que isso? o cenrio que muita gente poderia de forma resumida classificar de ps-moderno, modernidade tardia, que resumidamente esse o nosso assunto, mas resumidamente poderamos caracterizar como sendo uma sociedade que perdeu a fora simblica das suas meta-narrativas, onde as grandes agncias nmicas, as agncias que organizam o nosso mundo, dizendo o que certo, o que errado, o que bom o que ruim, o que normal e o que no .Todas essas agncias, elas perderam a sua fora de modo que hoje ns somos cada vez mais autnomos em relao a elas. No h nenhum valor mais alto que se levante contra o qual a gente no possa fazer uma objeo. Ns somos, como diz o socilogo francs Alain Alemberg, ns somos mais autnomos do que nunca ou na verdade, ns vivemos na iluso de que somos mais autnomos do que nunca, por qu? Porque ns no precisamos nos ajoelhar diante de nenhuma autoridade. Qualquer autoridade hoje discutvel.Voc pode ser um catlico fervoroso e no aceitar mais a ideia de que o Papa infalvel. Voc critica o Papa e continua sendo catlico, que uma ideia impensvel nos 40/50.Hoje em dia a gente discute tudo. Tudo matria de escolha pessoal. At a anatomia hoje em dia a gente aceita que seja matria de escolha pessoal, se nasce homem vira mulher, se nasce mulher vira homem. A nica coisa que no se muda, costumo dizer, o time de futebol. No existe vira casaca vira casaca feito um unicrneo, s existe na imaginao, porque uma vez que voc marcado por uma adeso a um time ele pode ir para a segunda diviso, terceira, quarta, como os torcedores do Santa Cruz da minha terra de Recife so exemplo e voc fica ali marcado por aquele lao, ele inamovvel.Tirando o time de futebol, as outras relaes de identidade de pertencimento so todas friveis. Isso o que que produz na nossa vida cotidiana? Ns somos hoje cada vez mais instados a exercer essa autonomia, a refletir sobre o que que ns consideramos o que certo ou o que errado assinar em baixo de todos os valores. Eles s prestam se a gente concorda com eles, ou seja, ns somos cotidianamente instados a pensar quais so as referncias que devem nos nortear. Enquanto que em sociedades anteriores nossa, essas referncias eram mais ou menos dadas de diante mo. Voc entrava, ingressava naquele regime, sem essa necessidade de refletir individualmente tanto sobre isso. Essa reflexibilidade junto com essa destradicionalizao faz com que o discurso cientfico ganhe ou o discurso suavizam cientfico, ganhe uma espcie de valor que no tinha antes. Por qu? Porque hoje o discurso cientfico o nico que de alguma maneira se pretende portador de uma verdade que no pode ser discutida. Todas as outras obras so, mas a cincia um discurso que se apresenta como portador de uma verdade objetiva e que, portanto, imune a essa crtica permanente. claro que isso j discutvel em si. No campo da psicopatologia mais ainda, mas o caldo de cultura social que a gente vive, esse foi mais um dos elementos que fez com que a ideia de que ns devemos classificar cientificamente os nossos comportamentos tenham vingado tanto. Por isso a gente hesita muito menos em utilizar o diagnstico por categorias mdicas para classificar dramas e situaes existenciais.Alm disso, preciso, claro, lembrar os avanos da prpria tecnologia biolgica na ateno ao sofrimento psquico. inegvel que com os antipsicticos dos anos 50 e com os tranquilizantes nos anos 60 e os antidepressivos dos anos 70, a nossa vida mudou e em alguns aspectos mudou para melhor.As pessoas que tm problemas que a gente chama de psicticos tm hoje uma existncia social que seria impossvel sem ajuda dos neurolpticos e dos antipsicticos.Todos ns de alguma maneira, podemos recorrer a essas medicaes e antes ramos restritos a formas de tratamento basicamente verbal.De modo que o fato de que hoje a gente tenha um leque cada vez mais ampliado de um repertrio de psicofrmacos, evidentemente, contribui para esse processo de psicatrizao avanada da nossa vida cotidiana.A difuso do conhecimento mesmo mdico outro elemento dado pela tecnologia, pela revoluo tecnolgica, sobretudo pelo que a internet produziu. Qualquer pessoa que chega hoje para me procurar, j fez uma pesquisa, j chega com o diagnstico. De certa maneira, vem me pedir uma segunda opinio. Alis, eu acho que isso acontece com os mdicos em geral.Se voc tem uma coisa assim, voc olha, fotografa se voc fotografar e botar na internet e dizer assim, o que isso, vocs vo ter milhes de pessoas respondendo e voc vai poder vir com o seu diagnstico e voc discute no final se um carcinoma epitelial ou no. Voc pode discutir muito. Sobretudo, aqueles que tm acesso, o nmero cada vez maior de pessoas que tem acesso internet, a informao. E isso faz ento, com que tambm essas categorias se difundam de maneira muito fcil.Finalmente, e isso verdade mais em outros pases, do que no nosso, h o aspecto econmico do funcionamento da ateno. Vou dar um exemplo: nos EUA, onde no h uma medicina pblica de verdade, o Obama est tentando fazer isso, mas sofre uma resistncia enorme. Basicamente, todo mundo que atendido tem seguro sade se voc no atendido, enfim, a situao complicada. E os Seguros Sade foram um dos elementos que mais foraram a construo de um sistema de classificao como o DSM. Pra que? Para poder ter condies de estabelecer uma relao de custo x benefcio entre o atendimento dado, o diagnstico feito e o dinheiro aplicado.Aqui no Brasil, onde ns temos o SUS, que apesar de todas as dificuldades, uma experincia muito, muito poderosa e o problema que a gente tem em relao ao SUS lev-lo mais adiante, conseguir que ele tenha condies de cumprir a sua misso. Mesmo o SUS precisa financiar as suas atividades.Ento, um dos embaraos que a gente tem hoje que muita gente que trabalha nas equipes de sade da famlia, na ateno bsica, na periferia das cidades, mesmo aquelas pessoas que no querem psiquiatrizar problemas da vida, precisam atender pessoas que esto ali sofrendo nas coisas do dia a dia.Para que um atendimento seja pago pelo sistema que pblico, ele precisa ser registrado, para ser registrado ele no poder dizer eu fiz um atendimento na pessoa que estava meio triste. O sistema no vai pagar isso, precisa ter um diagnstico. Se a pessoa resistir muito, no mnimo ela vai ter que botar um Transtorno Mental Comum, que um diagnstico de TMC.Ento, isso vocs vejam como uma lgica, o que uma lgica contbil produz como efeito essa maior permeabilidade de volume de classificao psicopatolgica generalizada.Bom, eu queria terminar um pouco essas consideraes pra gente poder, ento, discutir. Lembrando a vocs, duas coisas: 1) Se eu conseguir fazer vocs admitir nessa ideia de que a psicopatologia uma coisa que, um exerccio cultural, ou seja, toda classificao psiquitrica, toda demarcao do que doena mental depende de um exerccio cultural, reflete o contexto histrico social de um determinado contexto. Ento, a questo fundamental com a qual a gente tem que se a ver : o que que a gente pode definir como sendo critrio de normal? O que , afinal, ser normal? No uma pergunta fcil e espero que a gente possa discutir isso daqui a pouquinho.Mas, s adiantando a discusso, existem basicamente duas maneiras de se responder essa pergunta. A primeira, ela tem uma ambio objetiva, ela quer ser cientfica, ela quer ser mais ou menos inequvoca, a gente tem que saber o que uma pessoa normal para poder saber o que que a normalidade (00:51:07). Isso precisa ser uma coisa clara e objetiva, uma perspectiva que a gente poderia chamar de naturalista. Como que ela alcana a ideia de normal? Basicamente com base na regularidade, na normalidade estatstica e na ideia de funo. Ento, voc mede o comportamento, as experincias de uma determinada populao, seja l qual for e voc tm aquelas que so mais recorrentes, aquelas que so mais prevalentes e a voc tem o parmetro de normalidade.Esse parmetro de normalidade, claro, no o mesmo para crianas, adultos jovens, adultos maduros, velhos. Podem no ser o mesmo em determinadas classes que so metodologicamente estabelecidas. Mas, dentro de uma classe, o que desvia daquela mdia, daquele padro considerado como fora do campo da normalidade. Esse digamos o mtodo, a maneira objetiva de definir o que ser normal.A outra maneira pela rapidez e pelo jeito com que eu descrevi, vocs devem ter percebido que eu no sou muito simptico a essa perspectiva. A perspectiva que me parece mais interessante, embora seja mais complicada a que a gente poderia chamar de Normativista ou Normativa.O que essa perspectiva preconiza? Ela preconiza a seguinte coisa: Ns, como seres humanos, somos dotados de um corpo que produz essa capacidade muito especial que a de fazer emergir uma mente, uma vida subjetiva que regula a nossa relao com os outros e com o meio ambiente.Essa relao como os outros como dizia Freud ela uma das fontes da nossa inevitvel infelicidade. Por que? Porque os outros nos frustram, nos do prazer e nos do desprazer. O prprio corpo fenece e envelhece, os acasos da vida s vezes nos atropelam. Sofrer inerente condio humana.O que que faz ento, com o que a gente possa dizer que um sofrimentox patolgico? A chave da resposta a essa pergunta a diferenciao entre o fato da a Normalidade e o valor da Normatividade (00:53:30). Deixa eu explicar: a normalidade estatstica normal porque comum, um fato. Boa parte dessas pessoas que esto dentro dessa Normalidade Estatstica, esto bem. Algumas das pessoas que esto dentro dessa Normalidade, embora estejam normais do ponto de vista estatstico, podem no estar nada bem do ponto de vista do Valor.Voc no ter sintomas no quer dizer que voc no esteja doente. Voc pode tambm estar fora dessa Normalidade e no estar doente. Voc pode ser excntrico, voc pode ter uma singularidade particular e ser apenas um diferente e no necessariamente um doente. De modo que, embora para efeitos prticos, essa ideia da Normalidade Estatstica tenha um valor no dia a dia.Na definio do que uma patologia, esse valor muito pequeno. Eu vou me reportar aqui a um autor clssico nessa discusso que Georges Canguilhem, um filsofo da biologia francs que definia o limite entre a Normalidade e a Normatividade com base na ideia no da Normalidade como um fato, mas da Normatividade como um valor.O que que ele queria dizer? Ele queria dizer que a vida, viver o tempo todo valorar, ele diz: mesmo para uma ameba, viver preferir ou excluir. Mesmo um ser que no tem conscincia, se ele vivo, ele no indiferente s condies da vida. Ele adere ou ele recua. Um vrus, se voc pe um retroviral, ele tenta se modificar para escapar do retroviral. Uma bactria tenta criar resistncia a um antibitico. Se uma bactria assim, imagine qualquer ser consciente.Todos ns o tempo todo, valoramos como positivo ou negativo a vida que ns levamos, o tipo de contexto em que ns estamos. E, segundo Canguilhem, o que ser saudvel? O que ser Normativo ser capaz de exercer essa potncia que todo ser vivo tem de manter a sua vida, de manter a sua diversidade e de ser reproduzir, ou seja, ser Normativo e, portanto, ser saudvel no no ter doenas, poder ao contrrio, poder passar pelo sofrimento, poder passar pela doena e se recuperar.Ser Normal nesse sentido, ser Normativo, ou seja, a Normalidade encontra um valor que no apenas o Normal como um fato estatisticamente mensurvel. E quando a gente comea a discutir isso e eu espero que a gente possa fazer isso depois, a gente comea a poder, ento, admitir que muitas pessoas que podem ter pelos critrios objetivos dados pelo DSM ou por qualquer classificao diagnstica um diagnstico dado, pode de fato se retrair em relao a ele, pode criticar esse diagnstico na medida em que ele possa ser apenas, possa dizer que expressa aquele comportamento aquela experincia, expressa apenas uma singularidade, uma idiossincrasia, alguma coisa que apenas uma diferena e no merece, no precisa, no deve ser considerado como doena.De novo, h um exemplo clssico, atualmente que o dos Autistas. Boa parte dos Autistas que se organiza num movimento de orgulho Autista (00:57:04) defende a ideia de que os Autistas existem sim, tm caractersticas de funcionamento mental diferente, sim, mas apenas diferentes. So como eles dizem, neurodiversos, enquanto que a maioria das pessoas neurotpica.A maioria de ns gosta de encarar as pessoas nos olhos. Muita gente no gosta de encarar as pessoas nos olhos. Por que considerar isso como um trao patolgico? Muita gente, latinos em geral, gostam de falar com as pessoas pegando nelas, tem gente que no gosta desse contato fsico. Por que considerar essa pessoa que no gosta desse contato fsico, como isso sendo um trao que evidencia alguma dificuldade? A gente s pensa assim, segundo esse raciocnio, porque cada classificao de patologia, implica a adoo s vezes no refletida, de um modelo ideal. E o modelo ideal que ns temos hoje de um sujeito que olha nos olhos, que encosta nas pessoas, um sujeito autnomo que no depende de ningum. um sujeito que capaz de ser flexvel, porque isso que a nossa sociedade exige de todos ns. algum capaz de mudar de camisa o tempo todo e isso o mercado de trabalho exige de todo mundo.Ento, o mundo em que a flexibilidade, o mundo em que a pluralidade de relaes, ela tomada como sendo um trao da vida cotidiana. Isso comea a se transformar num critrio de Normalidade, enquanto que as pessoas que so mais ligadas a outros valores, facilmente so colocadas como sendo no Normais e no apenas diferentes mais patolgicos.Ento, essa fronteira entre a Normalidade e a patologia, hoje em dia talvez uma das reas mais fascinantes da Psiquiatria e da Medicina, porque ela envolve a todos ns.O caso dos Autistas um exemplo, mas h outros. A homosexualidade talvez tenha sido o primeiro dos anos 70. O Movimento Gay foi o primeiro a dizer que eles eram simplesmente diferentes da maioria estatstica e isso no tem nada a ver com patologia. Houve outros movimentos mais curiosos, por exemplo, hoje em dia, voc a comunidade de prticas Sadomasoquistas (BDSM) que tambm defendem a mesma posio. Aquilo que era considerado automaticamente como patologia, perverso etc, at h algum tempo atrs, hoje em dia reivindicado como uma prtica, enfim, esquisita para a maioria, sem graa para a maioria. Mas, para um grupo de pessoas uma prtica perfeitamente normal. Por que? Porque ela no fere a Normatividade dos sujeitos, o sujeito pode ter uma prtica sexual completamente distinta da normal, enquanto comum e ainda assim ser Normativa. E o que significa ter uma prtica normativa em relao a uma pessoa, no fundo no fundo, significa uma coisa simples, voc se relaciona normalmente com algum, quando voc o tempo todo trata aquela pessoa como um sujeito, como voc.Quando de alguma maneira voc destitui aquela pessoa da condio de sujeito e voc passa a trat-la como instrumento do seu gozo, a voc ultrapassa a fronteira para alguma coisa que a gente no admite. isso que a gente chama de perverso (1:00:26) isso que cair para o campo da patologia.Ento, quando a gente toma esse critrio Normativo, a maior parte das pessoas que pratica BDSM perfeitamente normal, apesar de estar completamente fora da curva de Gauss, daquela curva na qual todos, todos no sei aqui, mas a maioria no sei, mas a maioria de ns, provavelmente est includa.E para terminar, outro ponto, outro desafio, digamos que ns estamos vivendo no campo da Psicopatologia, atualmente um desafio bastante promissor e muito interessante, o desafio promovido pelo movimento das deficincias. Por que? Porque at um tempo atrs, a deficincia era concebida num modelo como eles dizem, o movimento diz, o modelo da tragdia pessoal, ficar paraplgico, no ter um membro, perder uma funo, era viver uma tragdia, uma perda irreparvel, era voc se colocar como um objeto de cuidado, mas um cuidado mediado pela pena, pela piedade, por algum estar passando por uma coisa desastrosa.O movimento da deficincia mudou isso radicalmente. Em que sentido? No sentido de assumir que a condio humana de todos ns de dependncia. Ns todos somos deficientes em alguma coisa, por exemplo: eu sempre fui deficiente em esportes. No h quem me faa praticar algum esporte com o mnimo de competncia. O que que eu fiz? Bom, comecei a fazer outras coisas. H pessoas que so desafinadas, h pessoas que no enxergam, h pessoas que no ouvem, h pessoas que andam de cadeira de rodas. Qualquer uma dessas pessoas exibe mais ou menos algum grau de deficincia que aparece como? No contexto em que ela vive, ou seja, no meu contexto de vida, no ser um bom jogador de futebol, s me deu uns certos aborrecimentos quando eu era criana porque eu era o ltimo a ser escolhido na diviso dos times, um pouco mais do que isso. E frustrao eu tive quando adolescente e tal.Todo brasileiro com seis anos quer ser jogador de futebol, eu tambm quis, foi talvez uma das primeiras grandes frustraes, mas passou.Se voc tem uma cadeira de rodas e mora na Sucia, voc sofre muito menos o sentimento de deficincia, do que se voc mora pelo menos no Rio de Janeiro, no sei como Campinas. Mas, no Rio de Janeiro, no prdio onde eu moro, a deficincia ressaltaria. Por que? Aumentou, diminuiu a deficincia do indivduo? No. o contexto em que ele se movimenta que no est adaptado para aquela diferena.Ento, o Movimento da Deficincia, ao mostrar que a condio humana de dependncia permanente, varia o grau, em certos momentos todos ns se vivermos muito, seremos muito dependentes dos outros. Ento, porque considerar a deficincia uma tragdia? Ela uma dimenso da existncia humana.Ento, qual o horizonte para o qual aponta o Movimento da Deficincia? considerar que a sociedade tem que admitir essa premissa e se adequar as diferenas o mais amplamente possveis, no caso dos cadeirantes, no caso dos cegos.No Rio de Janeiro eu s conheo um sinal de trnsito para cegos que fica enfrente ao Instituto Benjamim Constant.Se voc anda em outras cidades do mundo e voc nunca viu, voc fica um pouco tec, tec, tec no sinal de trnsito, tec, tec, tec que diabo isso? A gente no sabe. Uma coisa banal em outros pases. um sinal que permite ao cego atravessar uma rua sem problema nenhum.O problema da cegueira em grande parte o contexto em que o cego vive, assim como todas as outras deficincias. E isso, se a gente toma para o campo da Sade Mental, muito valioso.Pode ser que significa tambm que, Caetano Veloso tem razo, de perto ningum normal. Freud dizia a mesma coisa. Todos ns nos arranjamos, fazemos uma equao que na maior parte do tempo pode funcionar, mas de vez em quando pifa. E o que que ns devemos fazer em relao a isso? Aquilo que o Movimento da Deficincia preconiza acolher, criar condies para que a vida seja o mais razoavelmente organizada para que a gente possa viver a nossa existncia sem nos depararmos com os limites que nos impedem.E, se os cadeirantes tm os limites da falta de rampas, as crianas hoje em dia, por exemplo, tm um limite, uma exigncia absurda de performance cognitiva. Todas as crianas hoje tm uma agenda quase igual minha, de segunda a sexta uma agenda de estmulos, estmulos, estmulos (1:05:28) e depois quando elas ficam hiperestimuladas, vem o diagnstico e diz elas esto hiperativas. Ento, vamos tratar dessa hiperatividade.Todos ns somos solicitados, exercemos a nossa autonomia e a sermos bem sucedidos, a sermos lindos, jovens, fortes etc e, quando a gente se depara com isso, a gente na verdade, se sente insuficiente.Na primeira metade do sculo 20 a gente poderia dizer que o paradoxo fundamental que a gente era obrigado a viver, era digamos, impulsos que esbarravam na represso socialmente organizada, hoje em dia o contrrio, hoje em dia ns vivemos numa sociedade que nos incita digamos, aps a permanentemente, nos d autonomia, ns podemos gozar do jeito que a gente quiser, praticamente no h proibio alguma.O que ser um transgressor, hoje? difcil. Pensem o que transgredir hoje? difcil. Porque tudo vira viral no twiter, passa a ser uma coisa que rapidamente absorvida, pode facilmente virar modelo.O que que ser subversivo, hoje? difcil. Dado o tipo de cultura que a gente vive. Num mundo como esse a gente poderia ento imaginar, todos so felizes, podem viver do jeito que querem. No, nunca houve tanta depresso, por qu? Porque diante da possibilidade de tudo fazer, o que a gente sente mais desorientao e sentimento de insuficincia por no estar altura dos ideais aos quais ns nos identificamos.Ento, voltando ao fio da meada, o que o Movimento da Deficincia nos alerta de que, melhor a gente prestar ateno naquelas caractersticas que nos definem e que dizem respeito nossa intrnseca relao com os outros, a nossa intrnseca relao com o meio e pensar em psicopatologia, pensar em sofrimento psquico, pensar em doena mental, no pensar apenas no crebro, no pensar apenas no inconsciente individual. pensar tambm, sobretudo, nesses aspectos ligados vida que o sujeito tem no mundo que ele habita, ou seja, deslocar a deficincia do indivduo deficiente para a relao com o mundo. Assim como, deslocar a ideia de doena mental do crebro, do psiquismo individual para a relao com o mundo, digamos uma proposta que eu acho, torna muito mais interessantes as alternativas que a gente pode construir para lidarmos com o sofrimento que inevitavelmente ns vivemos e viveremos.Agora, vou concluir, ns estamos como eu disse, vivendo um umbral do aprimoramento improvement. Ns j estamos vivendo isso, medicamentos, no so s medicamentos no, prticas alternativas, muito da cultura oriental, foi digamos incorporado nossa cultura ocidental com a desidratao dos aspectos valorativos ou espirituais e apenas a reteno daquilo que promessa de aprimoramento cognitivo, aprimoramento emocional por parte das pessoas, faz meditao para poderem serem mais capazes de enfrentar o stress da vida. Por exemplo, mas tambm nas prticas medicamentosas isso est acontecendo, o uso indiscriminado de Ritalina para ateno, de Modafenil para ficarem dispertos. O uso de antidepressivos para aumentar, ficar mais do que bem, como a expresso clssica, faz com que a gente veja no horizonte que essa questo da Normalidade enquanto Normatividade sofre tambm um impacto dessa exigncia de permanente aprimoramento que, evidentemente, eu vou fazer um curto circuito, eu acho que vocs vo entender, tem uma afinidade enorme com o tipo de sociedade, o tipo de economia que a gente vive hoje, que nos exige de sermos o tempo todo ativos, consumindo coisas, realizando coisas, buscando um gozo permanente.Isso est por baixo da produo das nossas doenas mentais mais tpicas: as depresses, as adies, as alteraes da relao com o prprio corpo e assim por diante.Bom, essas eram uma das ideias que eu queria trazer para vocs, na esperana de que vocs possam debater o que vocs tm a dizer sobre isso, me perguntando, me contestando ou fazendo comentrios.Abertura para os Debates (1:10:37)Benilton, boa noite, obrigado pela explanao clara e concisa. Eu tambm sou conterrneo, admito que de fato, mesmo mudando para a regio sudeste, aqui a gente no muda de time, mas no sou Santa Cruz, sou Esporte l.Sou profissional de sade aqui na regio de Campinas e enfrento um pouco de dificuldade no sentido de aceitao social daqueles que convivem com os portadores de alguns transtornos mentais.Quando voc traz a uma proposta de a histria da Psicopatologia, sobretudo de forma evolutiva, digamos assim, a gente fica pensando um pouco que de fato a gente tem muito a evoluir ainda e quando a gente v, por exemplo, que antigamente na proposta de tratamentos no caso com hospcios que era proposto a uma tcnica de recluso social, marginalizao, isolamento social. Hoje a gente, ps a Reforma Psiquitrica, a gente v a uma proposta um pouco diferente, um pouco mais de reinsero social.Um exemplo a o CAPS Centro de Ateno Psicossocial que prope a um tratamento de fora mais aberta com a sociedade. Mas, eu vejo que existe ainda um pouco de dificuldade das pessoas conviver com esses portadores de transtornos mentais.Ento, assim, na tua opinio qual que seria uma fonte mais produtiva de conscientizao social e, sobretudo, de aceitao e convivncia para que a gente possa conviver melhor com essas pessoas. Como que voc prope, qual seria a fonte, mdia, uma conscientizao, atravs de poltica etc. Qual que a tua opinio nesse sentido?BB: Certo. Qual o seu nome?PS: Mariavel. (profissional de sade).BB: Mariavel, essa tua pergunta muito pertinente e, eu acho que t digamos assim. o desafio com o qual a Reforma Psiquitrica mais tem que se haver, uma vez que ela j virou Poltica de Sade Mental, apesar das crticas que tm sido feitas a ela. Mas, a ideia de que o asilo uma coisa do passado, timo.Diga-se de passagem, nem todo mundo aqui da rea psi. No deve saber disso, quando o asilo foi inventado, ele foi uma ideia revolucionria porque Pinel, Esquirol que fundaram o asilo no sculo 19, eles tinham a ideia de que para tratar da loucura, era preciso criar um ambiente que no tivesse os problemas que a sociedade francesa da poca tinham. Ento, o asilo foi criado como uma espcie de uma sociedade ideal, com mais liberdade onde eles eram atendidos de maneira..O Hospcio Pedro II que foi criado em 1852 no Rio de Janeiro, eu no sei se vocs conhecem, o prdio da Reitoria da UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro na Urca, no Rio de Janeiro, era um palcio belssimo. E, claro, a proposta do asilo degenerou, virou o que ns conhecemos como manicmio, mais do que isso, criou-se em torno do asilo, a chamada cultura manicomial.O maior desafio da reforma no tanto a mudana na poltica de assistncia, por exemplo, acabar com esses macro-hospitais e criar CAPS e criar ambulatrios etc e tal. O maior desafio a cultura manicomial essa coisa que voc v quando voc sai com pacientes e v o olhar das pessoas, a dificuldade de interao, o medo. Como que voc combate isso? criando mais interao. E voc tem razo, a mdia, a televiso, que so as novelas quando numa novela aparece um esquizofrnico que no um monstro, isso produz um efeito. Quando voc circula com as pessoas pela cidade e elas podem interagir, isso produz um efeito (1:14:50). , do ponto de vista da poltica eu acho que a interao entre a assistncia e o resto das atividades da prefeitura, seria fundamental s quando a gente comea a conviver com o diferente, voc quebra aquele preconceito que havia.Eu vou dar um exemplo, assim, um exemplo pessoal. Uma das coisas que eu achei mais interessantes que a Gol fez. No Brasil j h uma legislao que obriga as empresas depois de um certo nmero a terem uma cota de pacientes com deficincia. A Gol em algum tempo atrs, ela fez isso e fez um gesto, acho muito interessante, colocar muitas pessoas com deficincias na linha de frente da ateno ao pblico. Ento, pela primeira vez voc via pessoas, com sei l, com braos diferentes, com pernas diferentes, pessoas com corpos diferentes, atendendo a voc numa boa, coisa que de uma maneira geral se esconde.A Gol naquela ocasio botou na frente. Isso eu tenho certeza que chocou muita gente, porque eu me lembro do impacto que eu tive quando eu vi e depois o sentimento de satisfao que eu tive de ver que aquilo claro, era um passo de Normalizao. Curiosamente, eu no sei se estou enganado, mas eu no vejo mais essas pessoas. No sei o que foi que aconteceu, mas isso eu achei um gesto muito importante. A mesma coisa como eu estava te contando antes, eu acho que vale para a Sade Mental. A gente criar maneiras de fazer com que as diferenas emerjam, foi assim tambm com os negros, foi assim tambm com os gays, ser assim sempre com qualquer categoria, n. Com as mulheres tambm, o Brasil at poder ter uma mulher presidente teve que ter uma trajetria nisso, n. A gente simplesmente no imaginava isso. Como voc ainda no v, sei l, negros neurocirurgies no Brasil. Uma das razes pelas quais eu, com todas as consideraes crticas que podem ser feitas, sou adepto poltica de cotas, por isso.Ns temos 500 anos de escravido nas costas e isso marca a gente de uma maneira que a gente no capaz de rapidamente sacar, somente quando a gente tiver. Aqui por exemplo, quantos negros tem? Reflete a realidade do Brasil? No. No reflete. Qualquer estrangeiro v isso. Recentemente houve um, agora no vou me lembrar quem foi, um americano, um negro americano, veio para o Festival de Paraty, timo Festival de Paraty, maravilhoso, ele chegou, levou um choque. Cad os negros? No tem. Ento, esse tipo de coisa que a gente v nos loucos, a gente tambm v. Se aqui tivesse 50% de negros, garanto que todo mundo que entrasse aqui ia achar estranho, no ia ser contra, mas por qu? Porque a gente no est acostumado.Ento, eu acho que, assim como as pessoas com doenas mentais crnicas e graves e tal, pra todo tipo de trao diferente, eu acho que essa a poltica, a visibilidade, ganhar o espao pblico, ganhar o direito de cidadania (1:18:00).Boa noite, professor.Pergunta via chat. A pergunta de Luisa a seguinte: muitas pessoas so acometidas por psicopatologias e as famlias no sabem como lidar, acham que frescura, falta de religiosidade. Como explicar a sociedade que esses problemas so reais?BB: Acho que a pergunta tem duas dimenses, a primeira a seguinte: muita gente, crianas, adultos, adolescentes sofrem muito sem que esse sofrimento seja reconhecido, isso um fato. Melhorar esse quadro significa fazer as pessoas se tornarem mais permeveis na presena do outro, mais acolhedor em relao ao sofrimento. E isso uma coisa que independe da necessidade de a gente classificar como Psicopatologia o sofrimento. No sei se estou me fazendo claro. Uma coisa reconhecer que existe por exemplo, muita violncia nas famlias no Brasil, muito mais do que a gente imagina.Quando acontece um quadro rumoroso que vai para os jornais, a gente se escandaliza, mas a quantidade de violncia contra crianas, contra mulheres no Brasil, impressionante, contra negros, contra pobres, a gente sabe disso. Ento, isso um trao da cultura brasileira. Ns somos muito violentos, ns produzimos muito sofrimento e ao mesmo tempo nos consideramos pessoas cordiais. E, somos. Esse um dos traos paradoxais da cultura brasileira.O homem cordial brasileiro o homem do corao. o homem que ao mesmo tempo afetuoso e capaz de fazer tudo pelos amigos e ns somos alegres e pegamos nas pessoas etc, conversamos. No Rio de Janeiro ento, voc vai ao supermercado voc pode bater papo com 10 pessoas que lhe perguntam qualquer coisa. Ns somos assim.Mas, tambm somos s vezes muito indiferentes ao sofrimento, por exemplo, de pessoas subalternas somos mais sensveis ao sofrimento dos nossos iguais, mas aos subalternos a gente v menos. Ento, essa pergunta, ela tem uma dimenso universal, ou seja, o sofrimento precisa ser acolhido. De novo, uma dvida que eu quis instalar em vocs. Todo sofrimento para ser acolhido, precisa ser reconhecido como psicopatologia? Eu hesitaria em dizer que sim, alis, ao contrrio. Eu diria francamente que no. Talvez, essa necessidade de classificar como psicopatologia para ento acolher, seja ento mais um problema do que uma soluo. Por qu? Porque a gente vai considerar que a soluo, o acolhimento, o tratamento, vai ter que ser feito de modo tcnico pelo sistema de ateno sade etc.A gente delega para o discurso tcnico e para os profissionais aquilo que deveria ser uma tarefa, um desafio de todos ns. No tenho certeza se respondi a pergunta como a pessoa que fez a pergunta imaginava, mas.Boa noite, meu nome Sara.E a quando voc comeou a dizer do Autismo. Eu sou psicloga. Trabalho na ONG que trabalha com Autismo e depois voc disse na rea da deficincia. E eu trabalho numa outra entidade que trabalha com deficincia mltipla. E a sua fala me fez pensar assim, n, quando voc at deu o exemplo do seu prdio, d importncia que muitas vezes eu vivo e a assim, parece que agora ficou mais clara, no sentido que a deficincia que a pessoa tem, a limita. Mas, a deficincia do social, da falta dos recursos do transporte, da sade, faz com que aquela deficincia fique muito mais do que realmente aquele indivduo tem, como no corpo, como na mente. E isso uma coisa assim que a gente no consegue, enquanto trabalhador ultrapassar em muitos momentos esses limites, n, da acessibilidade e da falta de medicao nos centros de sade e aquela pessoa fica com uma deficincia muito maior do que necessariamente ela tem como primria, vamos dizer assim.BB: . Voc reforou um ponto que eu acho, fundamental. A gente tem que e a gente eu digo, no s o movimento da deficincia j faz isso, n? Mas ns, na rea da Sade Mental e ns na populao em geral, precisamos reter essa ideia, como eu disse: deficincia uma coisa que algumas pessoas portam de maneira mais longa, s vezes a vida inteira. A maioria de ns, todos ns, algum dia portaremos em algum momento da vida, ou seja, enquanto isso no se entranhar na gente como uma percepo do que ser humano, a gente vai olhar os outros e esperar que eles sejam como ns os que andamos com as duas pernas, que temos olhos para ver, temos ouvidos para ouvir etc.A gente no vai ser sensvel s, eu diria, menos do que as limitaes, as especificidades dos corpos e mentes que so diferentes da maioria de ns. Poder insistir nessa ideia de que todos ns temos diferenas, ns temos deficincias, todos ns temos sintomas, todos ns podemos em algum momento, atravessar um perodo de grande turbulncia emocional e precisar da ajuda do outro. Insistir nisso, eu acho que uma tarefa fundamental para que a gente se torne sensvel.Um outro elemento o da militncia que permite que a gente produza leis, obrigaes que por exemplo, impeam que prdios sejam construdos, prdios nos quais por exemplo, onde eu moro, onde nenhum cadeirante pode se movimentar facilmente. E isso ns temos avanado bastante no Brasil. O movimento das deficincias no Brasil, ele ainda est em processo de crescimento. Mas, do ponto de vista legal a gente j avanou bastante.Mas o problema do Brasil que as leis as vezes precisam mais do que a sua existncia para de fato funcionarem, n?Leis existem, mas s vezes no colam, no pegam. Ento, a gente j tem legislao bastante boa, se ela fosse aplicada, o pas seria outro em relao a esse aspecto das deficincias.Boa noite.A minha pergunta a seguinte: eu sou advogado de profisso e queria fazer uma ligao entre a Psicopatologia com o Direito Criminal.Um dos conceitos no Direito Criminal que a pessoa tenha a entender o carter criminoso do ato que ele estaria praticando, teria praticado. justamente a nesse sentido, tm dois tratamentos distintos. Quando se reconhece que o ato foi cometido por uma pessoa que tenha um tipo de transtorno mental, tem um tipo de tratamento pela lei, seria a internao no caso de manicmio e quando tem o entendimento que a pessoa tinha um entendimento daquele ato criminoso, vai para a priso, pena privativa de liberdade.A pergunta a seguinte: Para definir essa linha divisria entre esse lado da patologia e o lado do entendimento de um crime com clareza. A cincia da psicopatologia, como que definiria? Existe essa linha clara ou no?BB: ngelo, essa pergunta alm de ser muito interessante, ela muito atual, porque uma das novidades que vem aparecendo nos tribunais, aqui no Brasil ainda de maneira insipiente, mas em outros lugares de maneira muito cada vez mais intensa. o uso de argumentaes e de tecnologias que tentam provar a existncia de um estado patolgico s vezes no crebro a partir de neuroimagens para por em questo exatamente a capacidade do indivduo naquele momento de saber que estava agindo em desconformidade com a lei.E a, esse um terreno muito complicado, muito pantanoso, porque, digamos, uma coisa algum ser tomado por um cime enlouquecido e matar num momento de violenta emoo. Transitoriamente, aquela violenta emoo foi maior que o raciocnio dele. Ele se arrepende, mas, o mal est feito. Isso tem um valor atenuante.Outra coisa voc mostrar uma imagem cerebral e dizer: essa imagem cerebral mostra que certos circuitos neurais funcionam ou no funcionam e a esses circuitos neurais que se deve atribuir o fato daquela pessoa ter agido dessa maneira ou no.No fundo, no fundo, est em questo um tema que o do livre arbtrio. Ns temos livre arbtrio ou no? E a resposta no simplesmente, claro que temos. Porque muita gente acha que no. H pessoas que defendem progressivamente a ideia de que ns, na verdade, nos iludimos de que decidimos coisas quando de fato o crebro decide por ns, milissegundos antes de ns tomarmos conscincia da deciso.Existe um trabalho famosssimo Libet que tratou exatamente disso. Ele mostrou como a deciso de eu fazer isso aqui, a conscincia de eu pegar esse copo precedida milissegundos pelo acionamento neural, que me far pegar o copo. Isso desmonta a ideia de livre arbtrio? uma discusso complexa.Ento, eu no vou te dar uma resposta pra isso. Porque as respostas podem ser mltiplas, mas o que eu digo que, cientificamente, difcil de voc responder essa pergunta. Eu diria at que de certo modo, impossvel. Porque voc sempre encontrar argumentos pr e contra. No fundo, o que est em jogo a nossa viso do que ser um humano, do que ser um sujeito racional, do que ter liberdade de escolha. E, portanto, o debate entre aqueles que acham que a cincia, no caso a biologia, poderia explicar e os que acham que no, a biologia explica como ns somos capazes de fazer coisas, mas no explica porque que eu fao isso ou aquilo.Uma coisa explicar como que o meu crebro est no momento em que eu estou tomado por uma ira de cimes ou porque eu estou deprimido ou quando eu delirando. Uma coisa encontrar correlao biolgica sem a qual evidentemente no ocorrer nada disso.A mente s funciona quando o crebro torna isso possvel. Mas, admitir que a mente a expresso do crebro funcionando, no a mesma coisa que dizer o que a mente faz causado, exclusivamente, pelo crebro. Por qu? Porque um crebro s produz uma mente humana e, portanto, decises humanas como essa de matar ou de roubar ou sei l o que for. Num contexto o qual o crebro est incrustado num organismo, ele no funciona sozinho. Nenhum crebro humano, jamais funcionou desincorporado.Toda vez que a gente fala de crebro e v a imagem do crebro, a gente naturalmente, tende a supor meio intuitivamente que ele pode funcionar ali como rgo separado. No pode. O crebro humano para funcionar como um crebro, verdadeiramente humano, precisa estar inscrito no corpo. E esse corpo precisa interagir com outros humanos.Se um indivduo humano no interagir com outros, ele simplesmente no vira um sujeito. Ele no produz uma mente como a nossa. H exemplos clssicos, um exemplo clssico talvez, seja o de Kaspar Hauser que foi um jovem que, desde pequeno, foi tratado, um caso real foi tratado numa cabana at os 18 anos. Ele no tinha contato com ningum. Era alimentado por baixo da porta, de vez em quando botavam pio, ele dormia. Ento, iam l davam banho, trocavam de roupa. At os 18 anos, ele nunca tinha visto falando com ningum.Aos 18 anos ele solto e vai para uma cidade e tem um fim trgico. E, h um filme sobre Kaspar Hauser do Werner Herzog, o que muito interessante e que demonstra essa tese. Ele fez um filme. Hoje em dia a neurocincia quem diz, no um psicanalista que est dizendo, a neurocincia quem diz.O crebro humano para fazer as redes neurais, construir as redes neurais, de modo que apaream um sujeito, ele precisa interagir com outros humanos.Portanto, se verdade que sem crebro, no h mente, sem vida social tambm no h mente. Por mais que a gente tenha um crebro muito bem formado.Quando a gente comea a deslocar o centro de gravidade do indivduo, do interior do indivduo para a relao do indivduo com o mundo em que ele vive, as coisas mudam de figura. Ento, as coisas mudam de figura. Ento, nem a cincia no tem explicao para tudo.A cincia tem explicao para certas coisas. H outras para as quais a gente precisa aduzir outros elementos que no so, por exemplo, da cincia biolgica.Para compreender porque que as pessoas agem de determinadas maneiras, preciso gente lembrar de que aquela pessoa um efeito, aquela subjetividade individual, o efeito, como se fosse um holograma que emerge da interao entre crebro, corpo e mundo. Mundo fsico e mundo simblico. A gente pode mudar asPublicado em 17/04/2013O que ser normal? O que significa patologia mental? Qual o limite entre uma diferena extravagante e a expresso de uma doena da mente? Como lidar com os que rotulamos como sendo loucos ou portadores de transtornos mentais? Estas e outras questes contextualizam a histria da psicopatologia no Brasil, tema deste Caf Filosfico CPFL, que ter a participao de Benilton Bezerra, psicanalista, psiquiatra e professor do Instituto de medicina social da UERJ. Uma das maneiras de refletir sobre a cultura brasileira, passada e atual, explorar as maneiras como o olhar psiquitrico e o imaginrio social lidaram, e lidam, com essas questes, afirma Bezerra. Segundo ele, a ainda pouco conhecida histria psiquitrica brasileira tem captulos tristes e outros vigorosamente estimulantes. A cultura brasileira atual atravessada pela expanso aparentemente ilimitada dos transtornos mentais. Este encontro visa abordar alguns dos tpicos centrais desse universo temtico.Benilton Bezerra possui graduao em Direito e em Medicina, mestrado em Medicina Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (1982) e doutorado em Sade Coletiva pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (1996). Atualmente professor adjunto no Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, pesquisador do PEPAS (Programa de Estudos e Pesquisas sobre Ao e Sujeito (IMS/UERJ) e membro da direo do Instituto Franco Basaglia no Rio de Janeiro. Membro da direo da ONG Casa da rvore. Participa como pesquisador do projeto de cooperao intercultural Brasil/Alemanha PROBRAL (CAPES/DAAD) sobre o tema: O sujeito cerebral: impacto das neurocincias na sociedade contempornea.Vocabulrio:1) Banzo: era como se chamava o sentimento demelancoliaem relao terra natal e de averso privao da liberdade praticada populao negra no Brasil na poca daDispora africana. Foi tambm uma prtica comum de resistncia escravido.A prtica do banzo era uma forma de protesto caracterizado como uma greve de fome. Tambm eram comuns, como forma de resistncia na poca, a prtica do suicdio, do aborto, do infanticdio, das fugas individuais e coletivas e a formao deQuilombo. (Wikipdia, a enciclopdia livre).2) Drapetomania foi umdiagnsticomdico proposto em1851por Samuel A. Cartwright, ummdicoque exercia a sua profisso emLuisiana, nosEstados Unidose que era membro da Louisiania Medical Association. O diagnstico visava explicar a tendncia humana de querer escapar. Incidentalmente, somente pessoas de origem africana sofriam deste mal na sociedade em que vivia o Dr. Cartwright. (Wikipdia, a enciclopdia livre).1TranscriodapalestraemvdeotransmitidapelatvculturanoprogramacaffilosficocomopsiquiatraBeniltonBezerraJr.emCampinasepublicadaem17/04/2013comaduraode1h32mine57segundos.Ovdeoestdisponvelnosite:http://www.youtube.com/watch?v=k4T4DZux6hk