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Um panorama completo da história, desafios para o presente e as perspectivas do futuro glorioso da Igreja

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Um panorama completo da história, desafios para o presente eas perspectivas do futuro glorioso da Igreja

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Todos os direitos reservados. Copyright © 2005 para a língua portuguesa da CasaPublicadora das Assembléias de Deus. Aprovado pelo Conselho de Doutrina.

Preparação dos originais: Kleber CruzRevisão: Daniele PereiraCapa e projeto gráfico: Rafael PaixãoEditoração: Leonardo Marinho

CDD: 261 – Sociologia CristãISBN: 85-263-0727-4

As citações bíblicas foram extraídas da versão Almeida Revista e Corrigida, edição de1995 da Sociedade Bíblica do Brasil, salvo indicação em contrário.

Para maiores informações sobre livros, revistas, periódicos e os últimos lançamentos daCPAD, visite nosso site: http://www.cpad.com.br

SAC — Serviço de Atendimento ao Cliente: 0800 701-7373

Casa Publicadora das Assembléias de DeusCaixa Postal 33120001-970, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

1ª edição: 2005

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XXIrapidez com que as mudanças estão acontecendo no mundo cada vezmais globalizado exige das organizações, neste começo de milênio, umabusca de adaptação às circunstâncias de um “novo tempo”. Para muitos

P R E F Á C I O

Aestudiosos da Teoria das Organizações, a própria sobrevivência das organizaçõesdepende de sua adaptação a uma realidade cada vez mais complexa e segmentada,onde a competitividade tem se revelado o maior dos desafios a serem enfrentados.

O sucesso das organizações está diretamente relacionado a uma correta avaliaçãodo ambiente em que elas se encontram, associada a uma conseqüente agilidadede ação diante dos desafios que lhes são propostos. Na mesma medida que oambiente social e tecnológico experimenta constantes mudanças, ele exige que asorganizações também desenvolvam processos dinâmicos e ágeis de mudanças. Arealidade que se evidencia é que o século XXI herdou do século XX uma evoluçãoacelerada do que se convencionou chamar de “Era da Informação”. A “Era daInformação” surgiu graças ao impacto provocado pelo desenvolvimento tecnológicoe pela tecnologia da informação. Na “Era da Informação”, o capital financeirocede lugar ao capital intelectual. A nova riqueza passa a ser o conhecimento, orecurso mais valioso e imprescindível. Para muitos analistas deste “novo tempo”,o conhecimento tornou-se o recurso mais importante no processo administrativodas organizações. O conhecimento assumiu a dianteira de todos os demais recursosorganizacionais, pois todos eles passaram a depender do conhecimento.

Conhecimento é a informação estruturada que tem ou agrega valor para umaorganização. Através dele, o trabalho e a comunicação são conduzidos a novas

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A Igreja no Século XXI

estruturas e a novas formas de interação social. O conhecimento, que é um recursohumano, é criado e modificado pelas pessoas através da convivência social, doestudo, do trabalho e do lazer. As organizações estão cada vez mais dependentes doconhecimento, e conseqüentemente sua eficácia está diretamente relacionada à suacapacidade de motivar as pessoas que delas fazem parte a buscarem o conhecimentopor meio da aprendizagem, que se torna a principal vantagem competitiva de umaorganização. Toda organização precisa inovar e aprender para enfrentar os desafiosque dificultam o seu progresso. A vantagem competitiva de uma organização somenteé sustentável através da perfeita utilização do conhecimento que ela detém, e aagilidade com que se adapta às constantes necessidades de mudanças. A aplicaçãocorreta do conhecimento como recurso disponível a uma organização depende dainteração de todas as pessoas que possuem tais recursos em torno do objetivofundamental de crescimento da organização, capacitando-a a cumprir os propósitospara os quais ela foi criada.

Para a organização chamada Igreja, mais do que para qualquer outra organização,o conhecimento é o recurso principal no desenvolvimento de suas atividades aserviço do Mestre. A Bíblia revela o conhecimento como uma bem-aventurançapara o homem que o busca (Pv 3.13). Em um determinado momento da vida dopovo de Israel, o profeta Oséias foi usado por Deus para exortá-los quanto àpossibilidade de virem a conhecer o fracasso em função da falta de conhecimento,e aos sacerdotes foi dito que seriam rejeitados por Deus, exatamente por nãobuscarem o conhecimento: “O meu povo foi destruído, porque lhe faltouconhecimento; porque tu rejeitaste o conhecimento, também eu te rejeitarei...”(Os 4.6a). O Novo Testamento classifica o conhecimento como um dom do EspíritoSanto, a ser buscado pelos membros da Igreja, a fim de ser aplicado na suaedificação: “Porque a um, pelo Espírito, é dada a palavra da sabedoria; e a outropelo mesmo Espírito, a palavra da ciência [ou do conhecimento]” (1 Co 12.8).

A busca do conhecimento pode se tornar de grande ajuda para que o homemencontre o verdadeiro caminho a ser trilhado, se realmente existir em seu coraçãoo desejo sincero de finalmente chegar a um desfecho feliz em sua busca. Oconhecimento que ele busca, quando alcançado, mostra-lhe, através da iluminaçãodo seu entendimento, os erros que porventura ele esteja cometendo, capacitando-oa corrigir os rumos da sua busca, desenvolvendo-se a partir daí o aperfeiçoamentodas suas veredas e da consumação da iluminação final do seu entendimento.

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Mas a vereda dos justos é como a luz da aurora, que vai brilhando mais e maisaté ser dia perfeito (Pv 4.18).

Nesta busca pela plenitude do conhecimento, o homem precisa saber que numdeterminado período da sua própria história surgiu um Mestre, nascido não parabuscar o conhecimento da verdade, mas para revelar ao homem a própria Verdadeque Ele representava. O Filho de Deus revelou ao homem a luz do conhecimentoda sua origem e do seu futuro, concedendo-lhe o poder de viver segundo asregras estabelecidas por sua revelação, capacitando-o a viver uma existênciasubordinada ao cumprimento da sua soberana vontade, proporcionado-lhe ao mesmotempo a recompensa por uma correta escolha quanto ao seu destino.

Jesus de Nazaré, o Messias enviado por Deus ao mundo, concede ao homem aoportunidade de se reconciliar com o seu Criador, mas também exige que eleassuma as suas responsabilidades dentro do longo processo de construção dahistória da “redenção”, que se aperfeiçoa à medida que a perfeita e soberanavontade de Deus se imponha sobre a imperfeita vontade do homem, com a vitóriada luz do conhecimento da verdade sobre as trevas da ignorância e da mentira. Aresponsabilidade do homem, de defesa dos princípios estabelecidos pelo ensinode Jesus para o desenvolvimento do processo da sua própria redenção, estácentralizada em “uma organização chamada Igreja”, a depositária fiel deste tesourode grande valor, que é o conhecimento de Deus revelado ao mundo por seu Filho,mostrando ao homem o caminho que o conduz à vida eterna.

Ao apresentarmos este modesto trabalho sobre os desafios enfrentados pela Igreja,e o papel desempenhado pelo verdadeiro conhecimento no enfrentamento de taisdesafios, o nosso desejo é que ele possa ser útil a todos aqueles que estão nasincera busca do aperfeiçoamento necessário para o desempenho da nobre missãopara a qual foram chamados: “testemunhar que Jesus Cristo é o Sol da Justiça, deonde provém a luz que liberta o homem, absolvendo-o de suas culpas e justificando-o diante do Supremo Juiz da história”.

XXIPrefáco

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XXIPrefácio .......................................................................... 5

Introdução .................................................................... 11

1. A Igreja e as Mudanças ............................................... 17

2. A Igreja e a Unidade ................................................... 39

3. A Igreja a Serviço do Mestre ...................................... 63

4. A Igreja e a sua Liderança .......................................... 85

5. A Igreja e a Ciência da Administração ....................... 109

6. A Igreja e a Teoria das Organizações .......................... 131

7. Evolução Histórica da Organização Chamada Igreja .... 155

8. A Igreja Contemporânea ............................................ 179

9. Organização Administrativa da Igreja ........................ 201

10. Governo: Um Dom de Deus ..................................... 225

Apêndice: A Igreja e as suas Responsabilidades Sociais .. 245

Bibliografia ................................................................. 251

S U M Á R I O

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Igreja representou um momento definitivo da história da humanidade, pois atravésdela o Filho de Deus revelou ao homem a vontade do Pai, capacitando-o a umareconciliação com o seu Criador, o que sem Jesus Cristo seria impossível. Aexpressão definitiva da obra reconciliadora realizada por Cristo manifesta-se pelopoder com que Ele revestiu a sua Igreja, dotando-a da capacidade indestrutível deresistir aos mais fortes ataques que lhe têm sido desferidos, desde a sua fundação.A Igreja de Jesus resistiu ao longo dos séculos, mantendo um constante crescimento,mesmo diante dos maiores desafios por ela enfrentados. Ela manteve-se firmediante dos ataques do Império Romano, dos povos bárbaros, do Império Otomano,dos erros e enganos dos falsos profetas. E continuará resistindo aos ataques dostiranos modernos e das ideologias complexas e sofisticadas que tentam profanar averdade pura e inabalável revelada ao mundo pelo Verbo encarnado, porque Ele éo mesmo ontem, hoje e eternamente.

Quando a batalha cósmica (de Cristo) chegou ao fim, os céus estremeceram...pedras se partiram, e o mundo poderia ter perecido... E então, quando Eleascendeu, seu divino Espírito deu vida e força ao mundo cambaleante, e todo ouniverso tornou-se estável mais uma vez, como se os braços abertos, a agoniada cruz, tivessem de alguma maneira entrado em todas as coisas.

Hipólito

O início do século XXI e, portanto, do terceiro milênio, ocorreu em ummundo que está enfrentando uma transformação acelerada em todos os setores dasua existência. Os aspectos mais importantes são o estreitamento das relaçõesentre os povos, os progressos tecnológicos e científicos e a revolução nos meios

XXII N T R O D U Ç Ã O

Um novo milênio começou com o século XXI, colocando diante da organizaçãochamada Igreja um tremendo desafio, num momento de extraordináriaimportância da sua existência que completa dois milênios. A fundação da

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de comunicação. O progresso da ciência e da tecnologia vem mantendo,principalmente nas áreas de comunicação, desde a segunda metade do século XX,um ritmo espetacular: “... muitos correrão de uma parte para outra, e a ciênciase multiplicará” (Dn 12.4b).

No entanto, diante deste novo mundo tecnologicamente desenvolvido ecom mais capacidade de produção por habitante do que existiu em qualqueroutro momento histórico, os problemas que a humanidade tem de enfrentar sãocada vez mais graves, entre os quais pode ser destacada, de um lado, a desigualdadeentre países ricos e pobres, e, por outro, a desigualdade econômica no seio dassociedades dos países ricos. A fome, as doenças e o analfabetismo são gravescarências sociais que afetam boa parte dos habitantes da terra. Os constantesconflitos existentes entre as nações estão se multiplicando, gerando graves etrágicas conseqüências que se manifestam nas guerras de maior ou menor alcance,mas todas elas provocando mortes e espalhando miséria (Mt 24.6,7).

Com a proximidade do fim do segundo milênio muitos tiveram a sensaçãode que o mundo estivesse morrendo. Durante décadas, o homem viveu com osentimento de que as armas por ele criadas poderiam destruir a vida humana doplaneta. O começo do terceiro milênio trouxe consigo uma nova ordem social, tãoassustadora quanto a antiga. Moléstias como a AIDS ameaçam o homem com umapeste de proporções incontroláveis. O crescimento da população mundial se revelagrande demais para ser sustentado pelos recursos naturais disponíveis,multiplicando o número dos que morrem de fome.

O ritmo em que a moderna tecnologia aumentou a capacidade do homemde transformar o ambiente é tal que, mesmo supondo que não vá ser acelerado, otempo disponível para tratar do problema deve ser medido mais em décadas queem séculos. O futuro do planeta Terra para os seus habitantes continua tãoinsondável quanto tenebroso, e muitos indagam sobre qual será o papel de Deusneste processo. Um número cada vez maior de pessoas desenvolve conceitos segundoos quais a religiosidade deixou de ser eficaz, se desvalorizando tanto, a ponto dedesaparecer.

Os secularistas do século XIX e início do século XX viam o ateísmo comoa condição irreversível da humanidade na era científica. Neste começo do séculoXXI, o ateísmo não é mais a ideologia dolorosamente adquirida de uns poucospioneiros intelectuais, mas um estado de espírito predominante. Antes, issogeralmente era produzido por uma determinada idéia de Deus, mas agora parece

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ter perdido sua relação inata com o teísmo e se tornado uma resposta automáticaà experiência da vida numa sociedade secularizada. Atualmente o ateísmo reivindicaser a conseqüência lógica de um sistema racional que esclarece toda a experiênciahumana sem a necessidade de se recorrer a Deus. Os ateus antigos eram consideradosgrosseiros e ignorantes. Hoje, são considerados as mentes mais brilhantes dosaber humano, e muitos deles estão no corpo docente das universidades de maiorprestígio e, na maioria dos casos, é o teísta quem parece ser obscurantista.Intelectuais como Jean Paul Sartre (1905-1980) chegaram a afirmar que, mesmoque Deus existisse, ainda seria necessário rejeitá-lo, pois a idéia de um Serdivino nega a liberdade do homem.

Os positivistas (filósofos que limitam a filosofia ao método científicoempírico) passaram a perguntar se fazia sentido acreditar em Deus. Para eles asciências naturais ofereceriam a única fonte confiável de conhecimento, porquepodiam ser testadas empiricamente. Positivistas como Freud acreditavam que acrença religiosa representava uma imaturidade que a ciência iria superar. Maisimpressionantes ainda foram as conclusões dos teólogos radicais da década de1960, que entusiasticamente seguiram Nietzche e proclamaram a morte de Deus.Thomas J. Altizer afirmou que a “boa nova” da morte de Deus liberta o homem daescravidão a uma divindade transcendente e tirânica. Paul Van Buren afirmou quenão era mais possível falar de Deus agindo no mundo.

Idéias falsas são os maiores obstáculos para a recepção do evangelho. Podemospregar com todo o fervor de um reformador e ainda assim suceder em ganharapenas um perdido aqui e outro acolá, se permitirmos que todo o pensamentode uma nação ou do mundo seja controlado por idéias, as quais, pelas irresistíveisforças da lógica, façam o cristianismo ser considerado como nada mais do queuma ilusão inofensiva.

J. Gresham Machen

Quando se faz uma análise das teorias desenvolvidas pelo homem, quanto àsua própria condição e com respeito às suas crenças, o que se observa é umaconstante tentativa de substituir Deus, colocando em seu lugar alguma coisa em quepossam crer, pois a verdade é que o homem não pode suportar o desespero manifestadopelo vazio e desolação, e em função disso procura encher o vácuo criado com arejeição de Deus, criando novos focos de sentido. Mas o que o homem precisa

XXIIntrodução

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reconhecer é que a sua própria história mostra que os ídolos, representadosliteralmente ou simbolizados por ideais filosóficos, não podem substituir Deus. Ohomem do novo milênio precisa ser confrontado com uma nova fé vibrante, e se aIgreja quer continuar ocupando o papel que lhe cabe nesta missão, para a qual foicomissionada por Jesus Cristo há dois mil anos, deve se voltar para a sua própriahistória, em busca de algumas lições e advertências.

O evangelho de Jesus Cristo confronta e desafia o mundo moderno com adeclaração de que somente Ele tem a resposta às perguntas do homem, bem comoa solução para todos os seus problemas. Em um mundo que está procurandosaída para suas tragédias e tribulações, o evangelho anuncia que a solução já seacha disponível. Em um mundo que olha ansiosamente para o futuro, que fala emplanos relativos ao futuro, o evangelho proclama que a busca humana estáequivocada não somente quanto à sua direção, como também é perfeitamentedesnecessária. O evangelho revela ao homem o grande erro em que ele incorre aovincular todas as suas esperanças a eventos futuros relacionados à sua própriacapacidade realizadora, e anuncia que tudo quanto é necessário para os homens,individual e coletivamente, já foi posto à disposição da humanidade há quase doismil anos.

Segundo C. S. Lewis, em seu livro Cristianismo Puro e Simples, JesusCristo não veio pregar nenhuma nova moral. A regra áurea do Novo Testamento— “faça aos outros o que quer que os outros lhe façam” — é o resumo do quetodos, no fundo, sempre souberam ser certo. Citando o Dr. Samuel Johnson — “Aspessoas precisam com mais freqüência ser lembradas do que instruídas” —,Lewis diz que o verdadeiro trabalho de cada mestre de moral é sempre nos trazerde volta, vez após vez, aos antigos e simples princípios que o homem faz questãode não ver. O evangelho confronta o homem e o exorta a fazer meia-volta, olhandopara Jesus Cristo e vendo-o como o único em quem se pode achar respostas esoluções.

A responsabilidade da Igreja é a de alertar o homem moderno quanto àsua necessidade de voltar ao ponto em que ele se perdeu, e dali partir por umnovo caminho que o leve de volta à sua origem, que é Deus, fonte de vida everdade. A Igreja é uma organização, e a finalidade de uma organização é “fazercom que homens comuns realizem coisas incomuns”. Nenhuma organização podedepender de gênios. As práticas, embora muitas vezes sejam monótonas erepetitivas, sempre podem ser postas em ação, sejam quais forem as aptidões,

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personalidade ou atitudes das pessoas. Não exigem genialidade, apenas aplicação.São coisas de fazer, não de falar. “Querer apenas não basta; é preciso fazer”. Ogrande teste de uma organização consiste em fazer com que seres humanos normaistenham um desempenho extraordinário, em fazer vir à tona quaisquer pontospositivos de seus membros e usá-los para que todos trabalhem mais e melhor. Acorreta administração de uma organização necessita de práticas concretas, palpáveise claras. Essas práticas devem ressaltar um progresso baseado em aspectos positivosdas pessoas e não nas suas deficiências. De nada vale aquilo que o homem nãopode fazer; nada será realizado se nada for feito. Só é possível criar algo a partirdo que existe de positivo; só é possível realizar algo através da ação.

Deus pode fazer coisas incríveis através de seu povo. Ele disse que construiriasua Igreja e que as portas do inferno não prevaleceriam contra ela. Portas sãodefensivas. Nós, seu povo, devemos estar na ofensiva. Por isso busque primeiroo Reino de Deus. Não se deixe envolver. Não fique sufocado. Não perca seuprimeiro amor pelo Senhor. Não leve uma vida morna.

Bill Hybels

O propósito básico da Igreja é glorificar a Deus. Essa, em poucas palavras,é a razão pela qual estamos neste planeta. No processo de nossa existência terrena,o propósito básico de Deus para nossas vidas não é o de fazermos um nome paranós mesmos, ou acumularmos riquezas, ou manobrarmos as pessoas de um ladoao outro segundo a nossa vontade. Pura e simplesmente é o de dar glória ao seunome. Ele nos permite ter algum sucesso ou algumas alegrias e benefícios emtroca do nosso trabalho.

Uma vez dada precedência aos escritos inspirados, não negligenciem nenhumaesfera do conhecimento. A presença de Jesus na terra santificou os domínios danatureza, e o que Ele purificou não chamem de impuro. Tudo que o Pai fez lhespertence, e vocês devem aprender disso. Podem ler o diário de um naturalista, ouda viagem de alguém, e tirar proveito dessa leitura. Sim, e mesmo de um velholivro sobre ervas ou de um manual de alquimia poderão colher mel, como o fezSansão da carcaça de um leão. Há pérolas em conchas e ostras, e frutas em galhosespinhentos. As veredas da verdadeira ciência, particularmente da história naturale da botânica, destilam gordura. A geologia, enquanto fato e não ficção, estárepleta de tesouros. A história — esplêndidas são as visões que faz passar diantede vocês — é eminentemente instrutiva. Na verdade, cada rincão dos domínios de

XXIIntrodução

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Deus na natureza pulula de preciosos ensinamentos. Sigam as trilhas doconhecimento, de acordo com o tempo, a oportunidade e os dotes particulares deque disponham. E não hesitem em fazê-lo por causa de alguma apreensão de quese instruirão a um nível demasiado alto. Quando a graça for abundante, o sabernão os inchará, nem prejudicará a sua simplicidade no evangelho. Sirvam a Deuscom o grau de educação que tenham, e dêem graças a Ele por soprar por meio devós, se são buzinas de chifres de carneiro. Mas, se há possibilidade de se tornaremtrombetas de prata, prefiram isto.

C. H. Spurgeon

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XXI“E Moisés deu ouvidos à voz de seu sogro e

fez tudo quanto tinha dito”(Êx 18.24).

A Igreja e as Mudanças

CAPÍTULO 1

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cenário é o deserto do Sinai. A época é o século XV antes de Cristo. Opovo é uma multidão de aproximadamente seiscentos mil homens maissuas famílias, constituído pelos descendentes dos doze filhos de Jacó,O

filho de Isaque e neto de Abraão. O homem escolhido por Deus para liderar opovo é Moisés, uma das figuras mais importantes e notáveis do Antigo Testamento.O acontecimento histórico é o Êxodo.

O Êxodo começa com o povo de Israel na condição de escravos indefesosna terra do Egito. A palavra é usada em sentido especializado, referindo-se àsaída de Israel do Egito após um longo período de escravidão. Dali o povo partiupara a Terra Prometida, numa história figurativa da redenção, mas plenamenteconfirmada como evento histórico.

Os israelitas saíram do Egito no mês xântico ou nisã, a quinze da lua, quatrocentose trinta anos depois que Abraão, nosso pai, tinha vindo à terra de Canaã eduzentos e quinze anos depois que Jacó veio ao Egito. Moisés tinha entãooitenta anos, e Arão, seu irmão, oitenta e três. Levaram consigo os ossos deJosé como ele havia determinado aos seus filhos.

Flávio Josefo

O resultado final do Êxodo foi a conquista da Palestina, por parte do povode Israel, mais de quarenta anos depois. Mas a jornada daquela multidão, emdireção à conquista da terra que lhes fora prometida, se revelaria árdua e difícil.Depois de terem se livrado da perseguição dos exércitos de Faraó, no grandemilagre da travessia do mar Vermelho, agora eles têm diante de si novos e grandesobstáculos. Aquela multidão de seiscentos mil varões se faz acompanhar de mulherese crianças, o que aumenta em muito as dificuldades a serem enfrentadas empleno deserto. Buscam águas na fonte, e as encontram amargas. Moisés, orientadopor Jeová, lança nas águas um lenho, e as águas se fazem doces.

Falta-lhes o alimento, e Jeová manda o “maná”. Falta-lhes a carne, e Jeovámanda as codornizes. Falta-lhes novamente a água, tão necessária durante a jornadapelo deserto, e Jeová ordena a Moisés que use a vara que tem consigo e fira a

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A Igreja no Século XXI

“rocha”, de onde brotará a água e o “povo beberá”. Os obstáculos vão sendosuperados um a um, e a multidão caminha sob a proteção da “nuvem” durante odia, e da “coluna de fogo” durante a noite. Jeová, o Deus de Abraão, de Isaque ede Jacó, não os abandona por um momento sequer. Logo em seguida, em plenodeserto, os filhos de Jacó recebem a visita de um povo com quem tinham parentescodireto e próximo: os amalequitas, filhos de Amaleque, neto de Esaú, irmão deJacó. Mas a visita não é amistosa. Eles vêm representados pelos guerreiros quecompõem o seu exército fortemente armado, e covardemente atacam a parte maisfraca e debilitada da multidão dos filhos de Jacó. Trava-se grande batalha, e ocomandante do exército hebreu, chamado Josué, sai à peleja, enquanto o líderMoisés, acompanhado de Arão e Hur, se colocava no cume de um outeiro. Maisuma vez, Deus concede uma grande vitória às doze tribos: “E, assim, Josué desfeza Amaleque e a seu povo a fio de espada” (Êx 17.13).

Reuel (Jetro), sogro de Moisés, tendo sabido desses felizes resultados, veioencontrá-lo, para também louvar a Deus com ele, e trouxe Zípora, sua filha, eos netos. Moisés sentiu tanta alegria que ofereceu um banquete a todo o povo,próximo da sarça que ele vira arder e que não se consumia. Arão, Reuel e todaaquela grande multidão cantaram em comum, nesse banquete, hinos em honrade Deus, a quem bendiziam como o Autor de sua liberdade e de sua salvação.Dirigiram também louvores a Moisés, a quem reconheciam dever, depois deDeus, tão gloriosos e felizes acontecimentos... No dia seguinte, Reuel notou queMoisés estava sobrecarregado pela multidão de negócios, porque todos se dirigiama ele para resolver as suas dúvidas e litígios, persuadidos de que nenhumoutro, senão ele, seria capaz de o fazer. O povo estava tão convencido dointeresse dele e de seu amor pela justiça que mesmo os que perdiam a causaacolhiam a sentença sem murmurar. Ele não quis então falar-lhe, para nãoperturbar o prazer que o povo sentia em ser julgado pelo seu admirável guia.

Flávio Josefo (História dos Hebreus — Livro Terceiro)

Jetro observou como Moisés estava trabalhando arduamente, a fim detentar solucionar os inúmeros problemas que o povo de Israel lhe trazia parajulgar, estando já bastante cansado e prestes a desfalecer. Assim, na primeiraoportunidade que teve, Jetro convidou seu genro Moisés para uma conversaparticular, sem serem incomodados:

— Moisés — pergunta Jetro —, por que você está atendendo sozinhotodos esses casos que lhe são trazidos? O que estas pessoas querem?

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— Bem, meu sogro, estas pessoas me procuram para que eu lhes dê ainterpretação da vontade e das leis de Deus.

— Desse jeito, você fica sem tempo para cuidar das questões realmenteimportantes. Por que você não manda outros fazerem esse serviço? Já pensou setodo mundo quiser vir falar com você?

— Ora, meu sogro Jetro, esse é o meu serviço. E depois, já imaginou seoutros fizerem algo errado?

— Isso não deve preocupá-lo, Moisés. Escolha pessoas competentes e deconfiança para resolverem assuntos menos importantes e reserve para si apenas oque se refira ao bem e à salvação do povo; aquilo que somente você pode suportaro peso, pois o Senhor tem lhe concedido graça e o tem usado para livrar essepovo de muitos perigos. Deixe que outros decidam as questões que surjam entreeles, em particular, e você poderá se consagrar inteiramente ao serviço de Deus,para se tornar ainda mais capaz de assisti-los em suas necessidades mais importantes.

— Jetro, quem diz que eles serão capazes de resolver os problemas quesurgirem?

— Moisés, treine esse pessoal. Ensine-lhes a lei e dê a eles as diretrizespara serem aplicadas. Faça-os responsáveis. Avise a todos que de agora em diante,eles deverão ser procurados. Aprenda a delegar autoridade, Moisés. Crie umsistema hierárquico. Forme grupos de 10 assistentes para falar diretamente com opovo; para cada grupo de 10 assistentes, designe um chefe. Ele será responsávelpela análise dos casos que os assistentes não souberem resolver. Para cada grupode 10 chefes, indique um supervisor; esse será o chefe de 100. O supervisorresolverá os problemas que os chefes de 10 não souberem resolver. Finalmente,para cada grupo de 10 supervisores, indique um chefe, o chefe de 1.000. Eleresolverá os problemas que os supervisores não souberem resolver. Assim, vocêsó terá que se ocupar com os problemas que os chefes de 1.000 não conseguiremsolucionar. Isso vai deixar tempo para que você cuide do que é realmente otrabalho de um líder, e não só de um administrador.

— E como fazer a escolha dos homens para assumirem estaresponsabilidade?

— Escolha os que você conhece e sabe que são competentes. Peça ao povoque indique outros e forme a equipe dessa maneira.

— Jetro, seguirei seu conselho, mas ainda tenho receios. E se esses homensnão aceitarem essa responsabilidade?

XXIA Igreja e as Mudanças

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A Igreja no Século XXI

— Ora, Moisés, você tem contato direto com Deus, que fala contigo.Consulte-o, e Ele saberá aconselhá-lo melhor.

E Moisés deu ouvidos à voz de seu sogro e fez tudo quanto tinha dito (Êx18.24).

“Então, despediu Moisés o seu sogro [o primeiro consultor de executivosda história], o qual se foi à sua terra” (v. 27).

Nos sábios conselhos de Jetro a Moisés, se destacam a sua grande prudênciae consideração para com o líder destacado por Deus para administrar os negóciosrelativos ao seu povo. No entanto, isto não impediu que Jetro declarasse o seudesagrado com os métodos de trabalho usados por Moisés, fazendo-o de tal modo,que Moisés pudesse perceber que da maneira como estava trabalhando, ele próprioseria prejudicado, bem como causaria problemas para o povo. As palavras de seusogro o fizeram perceber que, embora fosse evidente e clara a sua chamada parao desempenho daquela missão em nome do Senhor, se fazia necessário que Moisésreconhecesse suas limitações, e procurasse aperfeiçoar a sua condição de mordomodos negócios do povo de Deus, através do esforço pessoal na busca do conhecimento,que definitivamente o capacitaria para exercer as suas funções.

Na pergunta “Por que te assentas só?” está a base do conselho de Jetro aMoisés, como observação de alguém que, estranho à rotina dos fatos que envolviamo trabalho do administrador, pôde observar as falhas e avaliar as previsíveis másconseqüências que daí adviriam, com o desgaste desnecessário a que Moisésestava submetido. Jetro, com seu conselho, ensinou a Moisés como organizar seutrabalho, e Moisés, que segundo o relato de Atos 7.22, era “instruído em toda aciência dos egípcios e era poderoso em suas palavras e obras”, humildemente sedispôs a ouvir e aprender, adquirindo assim mais conhecimento a respeito dotrabalho de um verdadeiro líder, o que o capacitou para se desincumbir melhordas suas tarefas de administrar os assuntos relativos à vida do povo de Deus.

Apesar de Moisés estar plenamente convicto da liderança espiritual queexercia como profeta do Senhor, para se comunicar com o seu povo — fatoclaramente reconhecido por Jetro —, ele teve discernimento suficiente paracompreender que a tarefa para a qual fora chamado por Deus excedia os limitesespirituais, compreendendo também que o sucesso da sua missão espiritual estavana dependência direta do efetivo bom desempenho de suas tarefas administrativas,sendo que o aperfeiçoamento de tal desempenho exigia a implantação de um

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sistema mais eficiente de organização. Tendo feito as mudanças que se faziamnecessárias, Moisés lançou as bases de uma nova organização social para o povode Israel.

Logo em seguida às mudanças realizadas, segundo os conselhos de Jetro,tendo Moisés subido ao monte Sinai, ouviu de Deus as palavras registradas nolivro de Êxodo, capítulo 19, versículo 6: “Vós me sereis reino sacerdotal e naçãosanta” (Versão Almeida Revista e Atualizada). Aquele povo que era simplesmentea reunião de pessoas vinculadas a diversas tribos diferentes, com suas própriaslideranças, passava a ser uma “nação”, com governo centralizado e uma eficienteestrutura organizacional, capacitada à efetiva administração de suas necessidades.

O LÍDER E AS MUDANÇASO LÍDER E AS MUDANÇASO LÍDER E AS MUDANÇASO LÍDER E AS MUDANÇASO LÍDER E AS MUDANÇAS

Quando são analisados os resultados deste episódio, a conclusão que daíadvém é a de que os conselhos de Jetro provocaram grandes mudanças na vida dopovo de Deus, a partir da criação da estrutura que capacitou aquele povo a setornar efetivamente a nação que Deus escolhera para si. Mas as conclusões tiradascom a análise do diálogo entre os dois homens permite a constatação da realidadede que as mudanças positivas, ocorridas na organização da sociedade constituídapelo povo de Deus, se deram por causa de mudanças na maneira de pensar e detrabalhar do líder escolhido por Deus como responsável pela condução dos destinosdaquele povo. No caso de Moisés, as mudanças aconteceram porque houve por partedele a consciência da necessidade de mudar, em função do reconhecimento de quehavia falhas a serem corrigidas na sua maneira de trabalhar — falhas provocadasnão por ambição de poder, mas pelo excesso de zelo e pela ansiedade de responderpositivamente ao que Deus esperava que ele fizesse em favor de seu povo.

Nos conselhos de Jetro, que despertaram Moisés para executar umprocesso de ação mais dinâmico na administração dos assuntos do povo deDeus, o Dr. Grahan Scroggie observou alguns detalhes fundamentais,identificadores do caráter pessoal do líder que, convicto de seus deveres, seconscientiza da necessidade de efetuar mudanças, objetivando principalmenteo aperfeiçoamento do serviço prestado à coletividade. Estes detalhes simples,porém importantes, foram perfeitamente assimilados por Moisés, em função deseu reconhecimento da validade do que lhe estava sendo proposto por seusogro, como uma oportunidade de capacitação a um melhor desempenho damissão que lhe fora determinada por Deus:

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1. Que os sábios podem não ver uma necessidade evidente aos outros.2. Que um homem do povo pode, muitas vezes, fazer uma contribuição

importante para o bem comum, como fez Jetro.3. Que no serviço prestado a Deus não deve haver monopólio do poder.4. Que convém haver distribuição de tarefas.5. Que ninguém é capaz de fazer tudo.6. Que mais cedo ou mais tarde o homem é substituído; contudo, a obra

de Deus prosseguirá. Por isso, o líder deve ensinar outros a tomaremresponsabilidades.

7. Que não convém trabalhar demais, nem de menos.8. Que as necessidades de outras pessoas devem ser reconhecidas.9. Que sempre existe uma quantidade de poder não empregado e uma

capacidade oculta (como havia entre os israelitas).10. Que ninguém deve tentar fazer mais do que pode.11. Que nunca se deve cansar demasiadamente a paciência do povo.12. Que para cargos de responsabilidade, precisa-se de capacidade, piedade,

integridade e probidade.13. Que homens entendidos não devem hesitar em dar conselhos aos líderes, e

que os chefes não devem se recusar a receber conselhos e aproveitá-los.

Estes atributos destacados pelo Dr. Scroggie podem capacitar o líder a sereficaz no desempenho de suas funções. A ótica predominante na visão funcionalde muitos obreiros, quanto a ser eficaz, está na capacidade de “fazer certo ascoisas”, quando no contexto da realidade atual o verdadeiro mérito está nacapacidade de “fazer que as coisas certas sejam feitas”; isto é “eficácia”. “Aeficácia não é um dom com que as pessoas nascem; ela pode ser aprendida”. Aspessoas verdadeiramente competentes e conscientes do propósito elevado dachamada de Deus para liderar a “nação santa”, como Moisés o foi, são capazes decompreender que idéias brilhantes ou discernimento espiritual não significampor si só o cumprimento de tal missão. E, da mesma forma, seu ministério somentese torna eficaz através de muito esforço, árduo trabalho e busca incessante doaprimoramento através do conhecimento. A eficácia é um conjunto de regraspráticas que fundamentam a realização de um programa de trabalho, e regraspodem ser aprendidas com facilidade, embora exijam muito esforço para suaexecução. O administrador é responsável pela implantação de um eficaz sistemade trabalho, usando renovadamente as ferramentas do conhecimento teórico

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adquirido através da humildade, do esforço e da aplicação prática das regrasaprendidas.

Considerar a prática de mudanças faz parte do trabalho dos líderes. Obom desempenho de uma organização depende em grande parte da habilidade dolíder em se relacionar com as inovações. Tanto quanto foi com Israel, também emrelação à Igreja as mudanças fazem, definitivamente, parte da sua operação,podendo mesmo ser consideradas como um elemento básico no seu contextoadministrativo. As falhas verificadas por Jetro na administração dos negócios dopovo de Deus podem ocorrer na Igreja, considerando-se o seu nível de atuaçãorelacionado aos seus objetivos, o que exige mudanças no desempenhoadministrativo, a fim de que os alvos sejam atingidos.

As mudanças, ao contrário do que alguns imaginam, ocorrem diariamenteno processo administrativo, seja por projeto previamente elaborado, seja de formaespontânea seja por negligência. Ao executar mudanças, pela via do projetopreviamente elaborado, o administrador se capacita a controlar as reações futurasdecorrentes de tal processo, evitando os reais e incontroláveis prejuízos advindos demudanças por negligência. Qualquer organização tem de ser estruturada normalmentepara a mudança, e tem de criar mudança, e não apenas reagir a ela.

CONCEITOS DE MUDANÇASCONCEITOS DE MUDANÇASCONCEITOS DE MUDANÇASCONCEITOS DE MUDANÇASCONCEITOS DE MUDANÇAS

Existem dois conceitos básicos, e um tanto opostos, sobre mudanças:

1. Nenhuma mudança é a última. Isto equivale a dizer que um modoestático de administrar é quase impossível. A organização que não seadaptar às transformações de oportunidades e de influências podegerar para si mesma sérios problemas, geralmente com prejuízos muitasvezes irreparáveis. É preciso que todos os que se dispõem a se adaptaràs circunstâncias, implantando mudanças — e todos devem fazê-lo —,devem esperar que cada mudança implantada crie um conjunto deoutras mudanças.

2. A mudança é difícil. A maioria das pessoas e a maioria das entidadesorganizacionais se conformam com a maneira como os trabalhos sãoconduzidos, e, freqüentemente, fazer o trabalho como sempre foi feitoé a maneira mais fácil de se executar uma função. Mudar implica

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mudar os hábitos, os modelos de comportamento e às vezes as atitudesdas pessoas com respeito ao modo de execução das tarefas.

Mudar é difícil, sabendo-se que as mudanças devem começar peloreconhecimento das falhas existentes no sistema de trabalho, e pela busca dacorreção de tais falhas. Como parte do processo contínuo de crescimento, a buscapela correção se inicia pela mudança de conceitos e pensamentos fundamentadosna tradição. Estes, passados através de gerações, baseiam-se no princípio “doque sempre foi assim”, na cultura do comodismo da “providência divina” ou naauto-suficiência “da capacidade pessoal de fazer”. Segundo Maquiavel, político,escritor e historiador italiano, “não existe nada mais difícil para se pegar nasmãos, mais perigoso para se conduzir ou mais incerto em termos de sucesso doque tomar a liderança em introduzir uma nova ordem de coisas”.

O “costume de fazer”, que normalmente gera o conformismo com o queestá acontecendo, não importando como está acontecendo, e nem asconseqüências resultantes do que está acontecendo, é a maneira mais freqüentede executar uma função. Mudar uma estrutura organizacional implica na mudançade hábitos, conceitos e atitudes pessoais quanto ao modo de executar tarefas.As mudanças trazem incertezas quanto aos resultados e reações, masindependentemente da vontade daqueles que têm a obrigação de patrociná-las,as mudanças acontecem de modo infalível e, se não por planejamento, semdúvida acontecerão de forma espontânea ou por negligência, fugindo ao controledo responsável, acarretando conseqüências não desejadas e muitas vezes gerandoproblemas insolúveis. Ao efetuar as mudanças que são naturalmente necessáriasem qualquer âmbito administrativo — pois é quase impossível uma maneiraestática de administrar —, o responsável terá a oportunidade de prever asconseqüências e reações que advirão a partir daí, mantendo sob controle adimensão de tais conseqüências e monitorando o comportamento das reaçõesprovocadas nos eventos futuros.

A Igreja, através de seus líderes, precisa estar atenta para a necessidade derealização de mudanças, para poder vencer a estagnação insidiosa que pode semanifestar sobre seus programas de trabalho ou mesmo sobre todo o seu corpo. Nocaso de se permitir que a estagnação se desenvolva, atingindo níveis de perturbaçãodo progresso da obra, as mudanças se tornam mais difíceis. Com o passar do tempo,os membros vão se acostumando ao estilo lento de condução das atividades do“corpo”, o que exigirá uma verdadeira revolução para despertá-los da letargia a que

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foram submetidos. Apesar disso, os que se mantiveram como membros vivos de um“corpo” santo responderão aos apelos de um líder dinâmico e com sabedoria necessáriapara detectar o tamanho do problema, e estabelecer as regras de mudanças quepossibilitarão a reestruturação do aparelho organizacional da Igreja e a retomada docrescimento em níveis mais eficazes. À medida que as mudanças vão sendoimplementadas e o dinamismo volta a fazer parte do processo produtivo do corpo deCristo, outros membros também serão despertados para retomarem seu lugar comoparticipantes da ação conjunta que capacitará a Igreja a ser considerada — como opovo de Israel, sob a liderança de Moisés, o foi — a “Nação Santa” de Deus.

Homens como Moisés — e outros líderes constituídos por Deus — tiveramdiscernimento e visão quanto à oportunidade que lhes era proporcionada paraservirem, não apenas ao Senhor, mas também ao seu povo, empenhando o melhordo seu esforço para o engrandecimento da “nação santa” diante dos outros povos.Cuidar da idéia de mudança faz parte do trabalho dos líderes. A mudança édefinitivamente um elemento básico da operação da Igreja, assim como o foi como povo de Israel. Falhas entre o nível de atuação da igreja e seus objetivos exigemmudanças no desempenho, a fim de que os resultados sejam alcançados. Ocrescimento do volume de problemas no meio do povo de Deus acarretou paraMoisés uma situação em que o desgaste pessoal estava se tornando um problemamaior do que as questões que lhe eram trazidas, o que exigia uma reação imediata,como a que foi proposta por Jetro. À medida que a Igreja cresce, aumenta tambéma diversidade e complexidade dos problemas por ela enfrentados, o que passa aexigir do líder a necessária análise da implantação de mudanças no processoadministrativo, antes que a própria igreja venha a sofrer as conseqüências dodesgaste da sua liderança. O líder deve se guardar da possibilidade de vir a serum problema para a igreja, em vez de uma solução.

A Bíblia afirma que “Jesus Cristo é o mesmo ontem, e hoje, e eternamente”(Hb 13.8), mas a teologia cristã reconhece Deus como a força por trás de todamudança. Mudança para Deus tem o significado de crescimento. É por esta razãoque a própria redenção do homem consiste em uma transformação “de glória emglória, na mesma imagem, como pelo Espírito do Senhor” (2 Co 3.18).

MUDANÇAS SOCIAISMUDANÇAS SOCIAISMUDANÇAS SOCIAISMUDANÇAS SOCIAISMUDANÇAS SOCIAIS

Em muitas áreas das atividades sociais, inclusive na administração, osparadigmas (modelos, padrões) mudam constantemente. Existe variedade nas

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mudanças, quanto à velocidade, permanência e magnitude. Nas sociedadesprimitivas das antigas civilizações, a estrutura social se baseava na existência dastribos. A tribo estava no centro do universo, e tudo o que havia no exterior eradesconhecido e sem existência independente. No mundo medieval, o universo eramuito mais amplo, pois compreendia o globo terrestre, o céu e os astros queestão acima dele. Acreditava-se que a Terra era o centro do universo, e que ohomem ocupava posição única no processo criativo. Todas as coisas tinham umlugar fixo, assim como todo indivíduo tinha sua posição rigidamente estabelecidana sociedade feudal.

Nos séculos XV e XVI, os séculos do Renascimento social, cultural e político,bem como da Reforma Protestante, descortinaram-se novas perspectivas. A Terraperdeu sua posição central e se converteu em um dos satélites do sol; descobriram-se novos continentes e novas rotas marítimas; a invenção da imprensa permitiuque o homem ganhasse agilidade na busca da cultura e do conhecimento; o sistemasocial estático foi mudando gradativamente, e tanto as coisas quanto os homensperderam a imobilidade quase absoluta em que existiam, passando a se movermais facilmente. Dentro de um determinado período da Idade Média, algumasmudanças sociais drásticas se sucederam gradativamente, acabando por exercerdecisiva influência no término deste período da história da humanidade, entre osquais se destaca o surgimento da burguesia — classe social dominante, porqueseus membros possuem ou dispõem dos meios de produção —, a diminuição dasinvasões dos povos bárbaros e o fim das epidemias, o que gerou um crescimentodemográfico que os feudos eram incapazes de absorver, levando multidões decamponeses a se deslocarem para áreas urbanas. Foram essas as causas principaisdo surgimento do comércio, do renascimento urbano, da formação das monarquiasabsolutas, levando à morte o feudalismo e ao nascimento do capitalismo.

O NASCIMENTO DO CAPITALISMO O NASCIMENTO DO CAPITALISMO O NASCIMENTO DO CAPITALISMO O NASCIMENTO DO CAPITALISMO O NASCIMENTO DO CAPITALISMO (Revolução Industrial)(Revolução Industrial)(Revolução Industrial)(Revolução Industrial)(Revolução Industrial)

Capitalismo é um sistema econômico e social baseado nas idéias de iniciativaprivada nos negócios, de propriedade privada dos meios de produção, pelotrabalho livre assalariado, de lucros privados e acumulação de capital.

Na Europa, as características do capitalismo aparecem desde a Baixa IdadeMédia, do século XI ao século XV, com a transferência do centro da vida econômica,social e política dos feudos para as cidades. Por volta do século XVII, o capitalismo

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havia substituído o feudalismo como o sistema econômico geral, sob influência deum dos acontecimentos de maior relevância no contexto de mudanças por quetem passado a humanidade, que foi a Reforma Protestante no século XVI. Coerentescom o significado que atribuíram ao capitalismo, alguns autores, como Weber eTawney, deram ênfase à Reforma Protestante como causa da confirmação docapitalismo como sistema econômico e social no início da Idade Moderna.Sobrepondo-se à proibição e restrições de ordem moral da Igreja Católica quantoao empréstimo a juros, à prática da usura, bem como às limitações da doutrinado justo preço, a ética protestante dava o beneplácito ao sucesso do capitalistabaseado na operosidade, na parcimônia, na sociedade, enfim, na efetiva abnegaçãoao trabalho. Mais do que isso, apoiava a racionalidade da organização capitalistaassentada no trabalho livre. Para a doutrina protestante, a acumulação de capital,própria do sistema capitalista, tinha por finalidade não a busca especulativa dolucro, mas a produção de bens para atender às necessidades de um mercado real.

Nos séculos seguintes, o capitalismo que havia substituído o feudalismocomo o sistema econômico geral desenvolveu-se rapidamente, culminando com aRevolução Industrial na Inglaterra, no século XVIII. A economia tomou grandevulto, com o nascimento de gigantescas empresas, o acúmulo de grandes fortunasparticulares, o que naturalmente também originou muitos abusos contra os direitosindividuais.

Com a Revolução Industrial, a Inglaterra deixou de ser uma sociedadefeudal-mercantil, de economia preponderantemente agrária, tornando-se na modernasociedade do século XVIII, ou seja, numa economia industrial, caracterizada pelaprodução em grande escala, mediante a utilização crescente de máquinas, e comnotória ascensão da classe social, chamada de burguesia. Neste período de suahistória, as invenções tecnológicas receberam amplo estímulo como resposta danova sociedade capitalista ao desafio de um mercado em crescimento e cada vezmais ávido por novos bens. Foi uma mudança social, realizada por meios pacíficos,que teve caráter predominantemente econômico, com grandes repercussõespolíticas. A Revolução Industrial representou uma mudança de grande amplitude,e com muita velocidade, pois se consumou em pouco tempo, mudando inúmerascaracterísticas da sociedade, com influência até os dias atuais.

Formas de produção e consumo, urbanização, divisão da sociedade emclasses, profissões e muitos outros aspectos da sociedade fazem parte do paradigmacriado pela Revolução Industrial.

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A Revolução Industrial pode ser resumida em poucas tendências degrande alcance, como a invenção das máquinas que complementaram e substituíramo trabalho humano. Fábricas e grandes contingentes de trabalhadores braçaissurgiram em seguida. Grande parte das teorias e técnicas da administraçãonasceram dessas tendências. A Reforma Protestante e a Revolução Industrial, quederam origem ao capitalismo, foram grandes marcos da evolução histórica da vidado homem em sociedade, desde a antiguidade. Seus efeitos e conseqüências,ainda presentes na moderna sociedade, possibilitaram a sua extraordinária evoluçãocivilizatória.

O CAPITALISMO E O CRISTIANISMOO CAPITALISMO E O CRISTIANISMOO CAPITALISMO E O CRISTIANISMOO CAPITALISMO E O CRISTIANISMOO CAPITALISMO E O CRISTIANISMO

O capitalismo como princípio básico, excluídos os eventuais abusos, estáem íntima concordância com os ideais do cristianismo. O conceito de propriedadeprivada era uma das colunas de sustentação do judaísmo. Cada família possuía asua propriedade particular, protegida por detalhes da lei divina: “Mas assentar-se-á cada um debaixo da sua videira, e debaixo da sua figueira, e não haveráquem os espante, porque a boca do Senhor dos Exércitos o disse” (Mq 4.4). Masao mesmo tempo, a Lei de Deus (outorgada ao seu povo através de Moisés)também defendia os direitos dos pobres. Por decorrência, no cristianismo, odireito de propriedade privada não somente é exposto como normal, mas tambémcomo meio de proteger o indivíduo menos favorecido dos possíveis abusos cometidospela competitividade, às vezes exacerbada, do capitalismo, além de proteger atodos de medidas ditatoriais praticadas pelo Estado.

O sistema de propriedade privada é um incentivo ao desenvolvimentoeconômico e ao aprimoramento pessoal e comunitário do homem. O NovoTestamento defende com ênfase os direitos individuais, dando grande importânciaà existência e ao destino do indivíduo (Ap 2.17). A experiência comunitária, naIgreja Primitiva (At 4.32), foi totalmente voluntária e, de certa forma, um meio deproteger e favorecer o indivíduo, desamparado social e economicamente, em funçãoda postura ditatorial do Estado, detentor do poder político naquele momento. Aexperiência comunitária da Igreja Primitiva se esgotou naturalmente, na medidaque a Igreja, apesar das perseguições, desenvolveu um franco processo decrescimento. A partir daí se estruturou um sistema de beneficência assistencial,com recursos levantados nas igrejas mais favorecidas em prol dos cristãos maisnecessitados (1 Co 16.1). Porém, o cristianismo, ao mesmo tempo em que defende

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o capitalismo, se posiciona contra os eventuais abusos decorrentes das suas regrasde livre iniciativa, bem como se coloca contra a filosofia do comunismo, queafirma ser o mundo governado por princípios econômicos, e não por princípiosespirituais.

O conceito bíblico do homem, como criado à imagem divina, e a advertênciade Jesus de que “a vida de um homem não consiste na abundância dos bens queele possui” (Lc 12.15), constituem rejeição clara e explícita do materialismosecular da cultura ocidental, com sua fé na primazia dos valores materiais, tãoclaramente quanto a fé bíblica em Deus constitui negação do ateísmo que omarxismo confessa. De fato, enquanto se reconhece que os bens econômicostêm valor, a Bíblia, como um todo, torna bem claro que o propósito para o qualtais bens existem é atender às necessidades do homem; ela insiste, ainda, queas necessidades do homem só podem ser adequadamente entendidas levando-seem consideração sua imagem divina, e não apenas sua natureza física. A funçãoda vida econômica não é somente atender às necessidades físicas do homem, emuito menos simplesmente prover as suas necessidades mínimas de existênciafísica; antes, ela deve colocar à disposição do homem tal abundância de bensque torne possível uma vida humana civilizada.

E. C. Gardner

A partir do início do século XX, com os ideais filosóficos do socialismo edo capitalismo se digladiando pela imposição dos seus próprios conceitos, e nestabatalha dividindo as nações em capitalistas e socialistas, o ritmo das mudançassociais foi se acelerando, tornando-se mais amplo e persistente. A economiaglobalizou-se a níveis jamais imaginados; as mudanças tecnológicas passaram aoferecer, a breves espaços de tempo, inovações que exigem rápida adaptação aoseu desenvolvimento.

O NASCIMENTO DO SOCIALISMOO NASCIMENTO DO SOCIALISMOO NASCIMENTO DO SOCIALISMOO NASCIMENTO DO SOCIALISMOO NASCIMENTO DO SOCIALISMO

As constantes transformações econômicas e sociais, originadas com ocrescimento do capitalismo, acontecidas na Europa nos séculos que se seguiramao fim da Idade Média e início da Idade Moderna, principalmente com a RevoluçãoIndustrial, provocaram profundas desigualdades sociais, e deram origem a umsistema econômico e político que pregava a socialização dos sistemas de produçãoe o controle estatal (parcial ou completo) dos setores econômicos, opondo-se

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frontalmente aos princípios do capitalismo. Este sistema econômico recebeu onome de “socialismo”. A concentração crescente de trabalhadores muito pobresnos centros urbanos, vivendo em situação de miséria econômica, chamou a atençãopara a necessidade de reformas sociais. As causas das diferenças sociais passarama ser pesquisadas por vários estudiosos, com o objetivo de solucionar os problemasdas injustiças que essas diferenças geravam.

O precursor do socialismo foi o pensador e estadista inglês Thomas Morus(1477-1535), autor da obra clássica Utopia sobre o Modelo de Estado Ideal (1516),para quem a causa da injustiça social era a existência da propriedade particular.A partir de então, a palavra “utopia” passou a designar as teorias que pregam aigualdade social, sem apresentar meios práticos para consegui-la. O mais célebreteórico do socialismo foi o judeu alemão Karl Marx (1818-1883), filho de umadvogado judeu que se convertera ao cristianismo. Auxiliado por F. Engels, tambémalemão, publicou o Manifesto Comunista, a partir do qual o socialismo adquiriufundamentos científicos.

Karl Marx, por sua vez, destaca claramente no seu pensamento a diferençaentre comunismo e socialismo. Para ele, o socialismo seria um estágio preliminar,preparatório do comunismo. Assim o comunismo seria uma espécie de causa finalde realização da revolução social, visando à erradicação das desigualdades sociais,enquanto o socialismo seria o meio através do qual seria possível atingir essafinalidade. O comunismo tem como ideal mais elevado a abolição das classes e dapropriedade particular, que deve ficar sobre o controle do Estado, com o homemvivendo unicamente do seu trabalho. A tendência de afastamento do autoritarismoeclesiástico, que se seguiu à Reforma Protestante, levou à aceitação da idéia deque o homem deveria ocupar o centro de todas as coisas, em lugar de Deus, comopregado pela Igreja. Esta idéia tornou-se um dos pilares principais do pensamentosocialista. Para Karl Marx e os defensores das suas teses, as idéias de religião (“oópio do povo”), de moral, pátria e família são utilizadas pelas classes dominantescomo instrumentos para manter a submissão das classes trabalhadoras.

A IGREJA E O SOCIALISMOA IGREJA E O SOCIALISMOA IGREJA E O SOCIALISMOA IGREJA E O SOCIALISMOA IGREJA E O SOCIALISMO

A Igreja Católica Romana, numa tentativa de oposição à filosofiafundamentalmente materialista do socialismo, desenvolveu uma teoria socialcristã, baseada na solidariedade, visando à busca da justiça social. A mais alta

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expressão do “socialismo cristão” da Igreja foi a “Rerum Novarum”, encíclicado Papa Leão XIII, publicada em 1891. Embora esta encíclica papal reconhecessede forma expressa a propriedade privada como um direito natural e repudiassevigorosamente a doutrina marxista da luta de classes, condenava em termosveementes os lucros ilimitados. Apelava para que a dignidade dos trabalhadoresfosse respeitada como homens e como cristãos. A publicação da encíclica deugrande impulso ao desenvolvimento do socialismo cristão entre os católicosliberais, que procuraram exercer influência no sentido de uma legislação socialno mundo moderno. A doutrina social da Igreja Católica Romana foi ampliadapelo papa João XXIII, que tem sido chamado de “papa socialista”, com suaencíclica “Pacem in terris” (1958).

A IGREJA E AS MUDANÇAS SOCIAISA IGREJA E AS MUDANÇAS SOCIAISA IGREJA E AS MUDANÇAS SOCIAISA IGREJA E AS MUDANÇAS SOCIAISA IGREJA E AS MUDANÇAS SOCIAIS

A Igreja deve se posicionar, através da liderança eficaz e vigilante, comouma rocha numa corrente de mudanças sociais. O ímpeto da mudança está erodindoa superfície das estruturas da sociedade, num ritmo cada vez mais acelerado, e àmedida que as mudanças vão acontecendo na sociedade, a Igreja se vê nacontingência de estabelecer novas regras organizacionais, para manter o seu papelde relevância em seu relacionamento com ela. A história das civilizações registracom muita clareza a evolução de mudanças na estrutura da organização dasociedade, permitindo que análises comparativas sejam feitas entre a situaçãosocial do homem, num determinado período da sua história, e seu comportamentoreligioso naquele mesmo período. Isto permite ao espectador mais atento dadescrição dos fatos históricos o estabelecimento do correto perfil estrutural daIgreja, relacionado ao seu comportamento operacional no contexto social ao qualela pertence. Desta forma, os agentes de liderança serão capacitados a reconheceras necessidades de efetivação das mudanças exigidas, em função da constantemutabilidade do processo social, bem como a enxergar, onde, quando e comorealizar tais mudanças.

A Igreja, cujas estruturas organizacionais tinham sido totalmente reformadaspelo “protestantismo”, passou a desempenhar papel ainda mais relevante noprocesso de mudança social, na medida em que os princípios espirituais que,segundo os conceitos estabelecidos por Jesus Cristo, devem prevalecer sobre osprincípios econômicos na constituição da sociedade, dependem inteiramente da

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atuação e influência que ela deve exercer sobre o indivíduo, para que ascomunidades que compõem a sociedade em seus diversos segmentos se transformemem uma unidade de comunhão baseada no amor e fraternidade.

No início do século XX, na Europa, proclamou-se com grande otimismoque estava começando o século da Igreja, mas o que a história conta sobre oséculo XX contraria tão otimista perspectiva. Segundo o historiador Eric Hobsbawn,em sua obra Era dos Extremos, o século recém-terminado pode ser dividido emtrês “eras”. A primeira, da “catástrofe”, é marcada pelas duas grandes guerras,pelas ondas de revolução global, em que o sistema político e econômico da extintaUnião Soviética surgiam como alternativa histórica para o capitalismo, e pelavirulência da crise econômica vivida pelo capitalismo em 1929, principalmentenos Estados Unidos. É também nesse período que o fascismo e o descrédito dasdemocracias liberais surgem como proposta mundial. A segunda “era” do séculoXX compreende os anos dourados das décadas de 1950 e 1960 que, em sua pazcongelada, viram a viabilização e a estabilização do capitalismo, responsável pelapromoção de uma extraordinária expansão econômica e profundas transformaçõessociais. Entre 1970 e 1991 acontece o desmoronamento final, em que caem porterra os sistemas institucionais que previnem e limitam o barbarismocontemporâneo, dando lugar à brutalização da política e à irresponsabilidadeteórica da ortodoxia econômica e abrindo as portas para um futuro incerto.

O capitalismo que floresceu principalmente “nos anos dourados” das décadasde 50 e 60 do século XX trouxe como efeito principal sobre a personalidade dohomem o chamado fenômeno da “alienação”, ou seja, o processo de submissãoaos valores e instituições do capitalismo, aos quais o homem cegamente se sujeitou.Alienação pode ser considerada um tipo de experiência em que a pessoa se sentecomo um estranho no meio em que vive, podendo-se dizer que a pessoa sealienou de si mesma. Não se sente como centro de seu mundo, como criadora deseus próprios atos, que se transformam em seus senhores, aos quais obedece, eaos quais chega a prestar adoração. Uma pessoa alienada não tem contato consigomesma, como também não o tem com nenhuma outra pessoa. No sistema filosóficode Karl Marx, expresso em sua obra O Capital, alienação é o estado do homemem que “seus próprios atos se convertem para ele em uma força estranha, situadaacima dele e contra ele, em vez de ser governada por ele”.

O Antigo Testamento descreve como o monoteísmo e o politeísmo sediferenciam, não pelo número de deuses a que se prestam adoração, mas pela

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alienação do homem quanto às suas convicções. O homem gasta suas energias eseus talentos artísticos em fazer um ídolo, e depois adora esse ídolo, que não éoutra coisa senão o resultado de seu próprio esforço humano. Seu esforçotransformou-se em uma coisa, e essa coisa, tendo-se convertido em ídolo, já nãoé considerada pelo homem como resultado do seu próprio esforço produtivo, mascomo algo afastado dele, acima dele e contra ele, a quem adora e a quem sesubmete. O idólatra se inclina ante a obra de suas próprias mãos. O ídolo representasuas próprias forças vitais, em uma forma alienada. Na idolatria o homem seinclina ante a projeção de uma qualidade parcial sua, revelada em seu esforçopessoal, e se submete a ela. Não se sente como o ser pessoal, de quem irradiamatos vivos de amor e de união. Converte-se em uma coisa, assim como os seusdeuses, e fazendo o mesmo ao seu semelhante. “Os ídolos das nações são prata eouro, obra das mãos dos homens. Têm boca, mas não falam; têm olhos, e nãovêem; têm ouvidos, mas não ouvem, nem há respiro algum na sua boca.Semelhantes a eles se tornem os que os fazem, e todos os que confiam neles” (Sl135.15-18).

O século, XX que começou de maneira tão extraordinariamente promissorapara a Igreja, com o nascimento do movimento Pentecostal, proporcionando nãosó a renovação espiritual do cristianismo, como também uma renovação dosânimos quanto ao futuro da Igreja, termina com uma triste realidade: o mundovive um tempo cada vez menos espiritual, com as tradições e os valores cristãosenfraquecidos, sem capacidade aparente de exercer a devida influência sobre asdensas trevas que se abatem sobre a humanidade, refletindo a “glória de Cristo”,sendo “luz no mundo” e sal na terra.

Em função desta realidade aparente, muitos teólogos chamados de“modernos” afirmam reiteradamente que o homem contemporâneo, além de “nãoter religião”, não demonstra interesse em conhecer a religião. Mas ao contráriodo que as aparências insinuam, uma grande porcentagem das pessoas de hojerealmente está mais do que disposta a absorver qualquer coisa que se pareça,ainda que vagamente, com religião, como o prova o crescimento de muitosmovimentos que se dizem religiosos, que apregoam através de sua comunicação“atraente e simpática” termos como “mudança de conceitos”, “administraçãogentil”, “prosperidade”, “espiritualidade”, etc. Estes movimentos reconhecem ossinais dos tempos, e disto se aproveitam para expandir sua influência, o que,salvo honrosas e gloriosas exceções, não aconteceu com a igreja cristã.

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A Igreja no Século XXI

Embora as aparências dos fatos indiquem um caminho difícil para ocristianismo, a realidade pode ser exatamente a oposta. Segundo a opinião demuitos estudiosos das condições “sócio-religiosas” do mundo atual, aspossibilidades para o crescimento da Igreja hoje são mais promissoras do que nopassado. A história revela a esperança de que áreas onde a influência da igrejacristã diminuiu substancialmente, como as grandes cidades européias e muitasregiões da América do Norte, outrora consideradas verdadeiros baluartes da Igreja,podem se tornar palco de um novo desenvolvimento do cristianismo, desde que ocontexto social do tempo presente, com suas agudas necessidades espirituais, sejacorretamente avaliado pela liderança das igrejas formalmente estabelecidas.

No início do século XXI, a Revolução Industrial continua evoluindo, fazendoa sociedade humana ingressar na era pós-industrial, caracterizada pelapredominância das atividades de serviços em relação às agrícolas e industriais.Ao mesmo tempo continua em marcha a Revolução Digital, que começou emmeados do século XX e representou a complementação e substituição de certasatividades intelectuais por computadores.

A mudança na estrutura organizacional e no papel dos “gerentes” é umdos novos paradigmas mais importantes da administração. Embora os “gerentes”continuem desempenhando os papéis de autoridade e responsabilidade pelasdecisões, o processo administrativo pode e deve ser distribuído em toda a estrutura.O sucesso de Moisés no desempenho de sua missão, na liderança do povo deDeus, deveu-se principalmente ao seu reconhecimento da necessidade de mudarpara melhor administrar.

As mudanças na sociedade, de certa forma, forçam a Igreja a desempenharum novo papel, não no sentido de uma nova teologia ou doutrina, mas na buscade novos métodos e práticas. Do mesmo modo que os reformadores do século XVIbuscaram novos métodos de ação, visando a atender às necessidades espirituais epessoais do povo daquela época, a Igreja de hoje também deve estruturar suaspráticas a fim de torná-las condizentes com a natureza da sociedade contemporânea.É necessário a construção de um ambiente que incentive os cristãos modernos aum amadurecimento espiritual.

Uma das áreas para a qual a Igreja deve dirigir a sua atenção é a “família”.O homem deste começo de século XXI herdou um enorme vazio no relacionamentointerpessoal, nesta entidade chamada família, onde já não existe a mesmaprofundidade de amor e respeito mútuos, sentimentos essenciais para a boa

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qualidade na convivência, tanto na família, quanto na comunidade de forma geral.A Igreja precisa desenvolver esforços a fim de preencher este vazio. Ela precisa seconstituir em um núcleo onde a família se reúna, unindo-se a outras famílias,numa comunhão íntima de amor e confraternização. É preciso que a família ocupeum lugar central na estrutura da Igreja. “Antes, seguindo a verdade em caridade,cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo, do qual todo o corpo, bemajustado e ligado pelo auxílio de todas as juntas, segundo a justa operação decada parte, faz o aumento do corpo, para sua edificação em amor” (Ef 4.15,16).

A crescente mobilidade das pessoas na sociedade contemporânea é tambémum dos aspectos das mudanças com os quais a Igreja deve se preocupar. Aspessoas estão perdendo suas raízes; as facilidades de locomoção, a busca deambientes mais propícios para fixação de residência, além da procura de melhoresoportunidades de trabalho, têm levado as pessoas a uma mobilidade muito maiordo que no passado, o que acarreta o levantamento de barreiras para umaperfeiçoamento da maturidade em amor, pois o desenvolvimento do amor é frutoda comunhão que as pessoas têm entre si. O que faz o amor brotar e amadureceré o tempo e a comunhão contínua. A Igreja deve ser preparada no sentido deproporcionar uma base de integração eficaz para as novas famílias que buscam seintegrar à sua estrutura.

Um terceiro fator que exige da Igreja um posicionamento de realização demudanças é o fato de que tem havido um notável crescimento no nível de instruçãodas pessoas, proporcionado pelas enormes facilidades de acesso ao conhecimento,através do extraordinário desenvolvimento da tecnologia, principalmente na áreadas comunicações.

À medida que as pessoas se tornam mais bem preparadas culturalmente,passam a ser mais exigentes, pois adquirem condições de estabelecimento decritérios próprios de avaliação do que acontece ao seu redor. As pessoas esperamque a estrutura da Igreja lhes proporcione maiores oportunidades de participaçãona vida objetiva e dinâmica da organização à qual pertencem. Os membros daIgreja, além de se tornarem mais exigentes na audiência daquilo que lhes é ensinado,também querem participar do processo, compartilhando suas opiniões e problemas.

Estes fatores, entre tantos outros, exercem uma grande influência no sentidode transformação na organização burocrática da Igreja, levando-a a assumircontornos mais democráticos, onde a autoridade é compartilhada por um númerocada vez maior de pessoas, com a conseqüente diluição das responsabilidades.

XXIA Igreja e as Mudanças

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O estilo participativo de administração está rapidamente substituindo osultrapassados estilos autocráticos.

É necessário que os líderes vejam na história a fonte de inspiração para oenfrentamento dos desafios que as mudanças sociais representam para a Igreja,deixando de lado o saudosismo, que limita a sua visão, reconhecendo que vivemosum novo tempo, e que tentar trazer de volta ao tempo presente as coisas dopassado não será a solução dos seus problemas. O passado descrito pela históriapode e deve oferecer aos líderes a experiência que os capacite à realização dasmudanças que resultarão na confirmação das expectativas de revolução dos rumosda Igreja. Para tanto é necessário que se inicie um novo processo de Reforma, queseja um “protesto” contra o comodismo e o conformismo, operacionalizando asmudanças que clamam por estabelecimento, para o bem da Igreja, para a glóriado nome do Senhor Jesus, e para a continuidade do crescimento do Reino de Deusna terra.