a imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

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Page 1: A imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

A imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

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preponderancia-do-criterio-etario-no-configurar-da-violencia-presumida/

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

SESSÃO DO DIA 13 DE JUNHO DE 2006

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 016531-2004 �TIMBIRAS-MA

APELANTE: J. M. F.

Page 2: A imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

ADVOGADO:N. A. J.

APELADO: M. P. E.

PROMOTOR:B. S. S. R.

RELATOR: DESEMBARGADOR ANTONIO

FERNANDO BAYMA ARAUJO

ACÓRDÃO Nº

EMENTA: Penal. Processual. Apelação.

Estupro. Menor de 14 (quatorze) anos.

Violência. Ausência. Consentimento da

ofendida. Inocuidade. Violência presumida.

Prevalência.

I Se, de natureza sexual, o delito, e em detrimento de �menor de 14 (quatorze) anos, inócuo o questionar do

real emprego da violência, haja vista preponderante

aquela legalmente presumida (art. 224, a, do CP), � �ainda que aceitável o relativizar excepcional

Page 3: A imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

dessa presunção, como que, em casos em

que a vítima, embora em idade a não se

lhe permitir consentir, já precocemente

amadurecida e despertada para a vida

sexual.

II Recurso a que se nega provimento, contudo, de �ofício, ao réu, se lhe confere direito à

progressão de regime de cumprimento de

pena. Unanimidade.

Vistos, relatados e discutidos estes autos

de Apelação Criminal, sob o nº 016531-

2004, originários da Comarca desta

Capital, em que figuram como apelante e

apelado os acima enunciados, ACORDAM

os Senhores Desembargadores da Primeira

Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do

Estado do Maranhão, à unanimidade de

votos e de acordo com o parecer da

Procuradoria Geral de Justiça, em negar

provimento ao interposto recurso,

Page 4: A imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

contudo, de ofício, ao réu, se lhe assegurar

a progressão de regime de cumprimento

de pena, nos termos do voto do relator.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Criminal interposta

por J. M. F., de decisão do Juízo de Direito

da Comarca de Timbiras, neste Estado, em

face do constante nos autos do Processo

n° 331-01, que, em julgando procedente a

denúncia, com base no art. 213 c/c o art.

224, alínea a, do Código Penal, se lhe condenou à � �pena de 06 (seis) anos de reclusão, a ser cumprida em

regime fechado, na Penitenciária Agrícola de

Pedrinhas, em razão de, contra si,

imputado o fato de, em março de 2001,

mantido relações sexuais com a menor R.

S. A. R., à época do primeiro ato, com

apenas 12 (doze) anos.

Irresignado com o placitado, insurge-se o

aqui apelante, alegando merecedor de

reforma o atacado decisum, ao arrimo de

Page 5: A imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

insubsistentes no acervo, elementos

suficientes a supedanear edito

condenatório pela prática do delito do art.

213 c/c 224, a, do Código Penal, ante o denotar de � �que ausente violência ou grave ameaça,

pressupostos esses, essenciais à

caracterização do crime de estupro, daí

porque incomprovada a materialidade,

notadamente por se tratar de pessoa

idônea, primária, de bons antecedentes,

pai de família e de comportamento

exemplar.

Nesse aduzir, face ao depoimento, pela

ofendida, prestado em juízo, em que

noticiado suposto namoro com o ora

apelante iniciado em julho de 2001,

sustenta, a mais, carente de credibilidade

qualquer, o Laudo de Conjunção Carnal de

fls. 11, eis que elaborado em 02 de maio

de 2001, a aclarar, a seu ver, não, consigo,

perdido a virgindade, mas, sim, com um

Page 6: A imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

primo, com quem namorado cerca de 01

(um) ano, conforme a se extrair das

próprias declarações da mãe da menor.

Assevera, ainda, com vistas a desconstituir

o crime de estupro, o inaceitável e

incoerente argumento de que, entre si e a

vítima, existente atração, para,

sucessivamente, de forma inusitada,

reconhecer sua culpabilidade, na medida

em que pugnado pela desclassificação,

desta feita, pelo crime de atentado ao

pudor mediante fraude (art. 216, do CP),

ou, a outro ponto, acaso se lhe recainte

condenação, substituída a pena privativa

de liberdade por uma restritiva de direitos,

na modalidade de prestação de serviços à

comunidade.

Em contra-razões, de fls. 103 a 107, a

requerer o Órgão Ministerial, a

manutenção do questionado julgado, ao

Page 7: A imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

firmo de, à sua ótica, satisfatoriamente

configurados os elementos constitutivos do

crime de estupro decorrente de violência

presumida, enfatizando, a esse mister, o

crucial entender de que improcedentes os

posicionamentos suscitados pela defesa,

haja vista que não só confirmado o

ocorrido pela vítima e seus familiares,

mas, também, por pessoas outras.

Destaca, por derradeiro, completa

insciência da menor R. S. A. R, em relação

aos atos sexuais, de modo que desprovido

o seu consentimento, apesar de livre e

espontâneo, de valor qualquer.

Instada a manifesto, a douta Procuradoria

Geral de Justiça, em parecer de fls. 130

usque 138, da lavra do eminente

Procurador, Doutor SUVAMY VIVEKANANDA

MEIRELES, a opinar pelo improvimento do

apelo, ao fulcro de comprovada a

Page 8: A imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

materialidade e a autoria delitiva, além de

irrelevante o consentimento da vítima,

bem como inexeqüível o pedido

desclassificatório do art. 213 c/c o 224, a, � �para o 216, do Código Penal

É o relatório.

V O T O

Objetiva o recurso, ao que se vê, absolver

o apelante do crime de estupro, à adução

de não demonstrada a violência, tampouco

despontantes elementos probatórios

capazes de autorizar sua condenação, ou,

a outro modo, desclassificar sua conduta

para o tipo descrito no art. 216, do Código

Penal, como que, atentado ao pudor

mediante fraude, e, por fim, acaso

condenado, substituída a pena privativa de

liberdade, se lhe imposta, por uma

restritiva de direito, na modalidade

prestação de serviços à comunidade.

Page 9: A imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

Ao que dos autos se extrai, é que, no mês

de março de 2001, após constantes

assédios, sem o emprego de violência ou

grave ameaça, o aqui apelante, mantido

relações sexuais com a menor R. S. A. R., à

época do primeiro ato, com apenas 12

(doze) anos.

Essas práticas, segundo relato, em juízo,

da vítima, ocorreram após suposto namoro

às escondidas com o ora apelante, por

cerca de 03 (três) meses, sem

conhecimento de seus familiares e demais

pessoas da comunidade e, por conta disso,

mantido apenas uma vez ato sexual, com

seu consentimento, fato esse a ocasionar

sua defloração, conforme revelado pelo

Laudo de Exame de Conjunção Carnal de

fls. 11, assim como por sua gravidez.

Bem verdade, o denotar de que em crimes

perpetrados contra a liberdade sexual,

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como que, o estupro, busca o agente e,

como decerto, sempre na intenção de não

observado, lugar escondido ou longe do

contato visual das pessoas, consoante, in

casu, verificado, ou seja, tendencioso o

apelante a satisfazer seus instintos

sexuais, procurava a vítima, por sinal,

amiga de sua filha, menor de 14 (quatorze) anos, em � �situação de tempo e lugar devidamente abrigada de

olhares outros.

De se ressaltar, entretanto, que, mesmo

que nos dias atuais, flexibilizada a

concepção do conceito de violência

presumida prevista na alínea a, do art. 224, do� �

Código Penal, ainda dotada a palavra da vítima, de

alto valor probante, sobretudo se não dissidente das

demais provas coligidas, na proporção em que

efetivadas práticas delitivas dessa natureza, quase

sempre, como já enfatizado, ao resguardo dos

olhos de terceiro. Bem por isso, é que

uníssonas a melhor doutrina e a

Page 11: A imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

jurisprudência dominante, em atribuir às

declarações da ofendida, decisivo grau de

credibilidade.

A esse propósito, de se colher das

informações, em fase judicial, declinadas

pela vítima, o elucidativo trecho, litteris:

(…) que eram muito amigos, tendo iniciado o namoro�

no mês de julho do ano 2001; que o seu

relacionamento com acusado durou apenas três

meses; que o namoro era escondido de todos, tanto da

família da declarante como das demais

pessoas da comunidade; que mantiveram

relações sexuais apenas uma vez,

oportunidade em que o acusado penetrou

o seu pênis na vagina da declarante, vindo

esta a engravidar; que de tal

relacionamento nasceu uma criança, hoje

com 01 (um) ano de idade; que a

declarante consentiu com o ato sexual,

não tendo o acusado feito qualquer

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promessa; (…) que ainda era virgem ao se

relacionar com o acusado, não tendo tido

antes qualquer tipo de experiência sexual;

que o acusado foi o seu primeiro

namorado; que a declarante nunca gostou

de festas, somente saindo de casa a noite

para assistir televisão na casa dos vizinhos

(…). (sic) (fls. 44)�

A esse tom, de se inferir do dizer do

próprio autor do delito, J. M. F., em fase

inquisitorial, eis que não comparecido ao

chamamento para interrogatório, a

seguinte passagem:

Que, desde o mês de dezembro de 2000, que R. S., �começou a freqüentar sua residência, criando assim

amizade com a filha do indiciado e com o próprio

indiciado; (…) sempre que ia deixar os côcos

babaçú para V. no centro da cidade

convidava R. S. para ir junto, que R. S.

sempre aceitava o convite do indiciado,

Page 13: A imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

que o indiciado perguntou a R. S. se ela

teria a coragem de namorar com ele, que

R. S. respondeu ao indiciado que sim, que

no final do mês de dezembro o indiciado e

R. S. começaram a namorar, que no mês

de março de 2001, o indiciado começou a

ter relação sexual com R. S., que R. S. era

virgem (…). (sic) (fls. 16 e17)�

Assim, é que tenho escorreita e

adequadamente amoldado o depoimento

da vítima, ao descrito nas produzidas

provas material e testemunhal, daí porque

induvidoso o configurar dos elementos

constitutivos do crime, como que na forma

ínsita no art. 213 c/c o art. 224, alínea a, do � �Código Penal.

A título de melhor concretizar esse

posicionar, de se trazer à colação,

magistério de Guilherme de Souza Nucci,

Page 14: A imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

firmado em sua obra Código Penal Comentado, � �concebido, verbis:

Cremos que, de regra, a presunção não deve �comportar prova em contrário, sob pena de se

invalidar a regra penal, esvaziando o seu

conteúdo protetor e impingindo à pessoa

ofendida o dever de provar sua

honestidade, que é, em verdade,

presumida pela própria norma penal.

Ocorre que não se pode desconhecer a

realidade dos fatos na aplicação do direito.

Assim, em hipóteses excepcionais,

acreditamos poder o réu demonstrar que a

vítima, ainda que protegida pelo art. 224,

tinha pleno conhecimento e vontade do

que fazia, não se podendo falar em

violência ficta. Uma menor de 14 anos

prostituída, que já tenha tido inúmeros

contatos sexuais, com a ciência geral da

comunidade, inclusive de seus pais, não

poderia ser considerada incapaz de dar o

Page 15: A imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

seu consentimento. Não seria razoável e o �direito, em última análise, busca a justiça punir o �agente por estupro, caso mantenha com a jovem

conjunção carnal.

A presunção não é absoluta, cedendo às

peculiaridades do caso como são as já

apontadas, ou seja, o fato de a vítima

aparentar mais idade, levar vida dissoluta,

saindo altas horas da noite e mantendo

relações sexuais com outros rapazes,

como reconhecido no seu depoimento e

era de conhecimento público. (Op. cit. São �Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 693 e 694)

(Grifos nossos)

Desse modo, ao que se vislumbra de tudo

quanto aos autos colacionado, é que a

vítima não aparentava mais idade, levava

uma vida digna e tranqüila, sem sair à

noite para festas e outras localidades

similares, a não ser para assistir televisão

Page 16: A imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

nas casas dos vizinhos, sendo, ainda,

virgem, quando do ato sexual com o ora

apelante, fatos esses, a plenamente lançar

por terra a relatividade da presunção da

violência, nos moldes como descritos no

art. 224, alínea a, do Código Penal.� �

Ora, como de sabença curial, o crime de

estupro, dentre os demais contra os

costumes, por si só, destaca-se pela

natural violência a se lhe distinguir o tipo

legal, que, nas circunstâncias aqui se nos

mostradas, a só assumir contornos de

requinte e crueldade, em face da própria

condição de hipossuficiência material e

intelectual da ofendida, por se lhe

desfavoráveis tanto o poder de

discernimento, quanto a desenvoltura

física.

Aliado a essas explanações, de se

dessumir, indubitavelmente materializado

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o delito, ante Laudo de fls. 11, e

comprovada a autoria, ante a unicidade da

prova testemunhal, a ponto de autorizar

ratificado o edito condenatório.

De outra parte, no concernente à alegação

de descaracterizada a presunção de

violência, de igual forma, ao apelante,

tenho eu, melhor sorte não se lhe assistir,

eis que, além de contundentes os

testemunhos, no convergir de uma única

certeza, qual seja, a de que iniciada a

prática sexual antes que atingido a vítima,

14 (quatorze) anos, e, em nenhum

momento apresentado, à época do fato,

conhecimento a respeito dos apetites

sexuais, condição essa, que, acaso

ocorrente, apta a afastar a incidência da

violência ficta.

A essa feita, no pertinente ao aduzir de

que carecedor de credibilidade o Laudo de

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Conjunção Carnal de fls. 11, haja vista

elaborado em 02 de maio de 2001, e,

porquanto isso, a seu ver, a só aclarar que

a vítima perdeu a virgindade não com o

acusado, mas, sim, com um suposto

primo, com quem namorado cerca de 01

(um) ano, conforme a se dessumir do

depoimento prestado pela mãe da menor,

por certo e inarredável, destituído de

plausibilidade, vez que residente o

equívoco apenas na confusão de datas

causada pela menor, na medida em que se

dado o ato sexual, em março de 2001,

além do que, confessado, o próprio

apelante, se lha deflorado.

No tocante ao pretenso de ver

desclassificado o delito de estupro para

um outro de menor gravidade, como que,

atentado ao pudor mediante fraude, sem

maiores considerações e na mesma linha

de raciocínio, imperativo o afirmar de

Page 19: A imperatividade da preponderância do critério etário no configurar da violência presumida

imerecedor de êxito qualquer, conquanto

irrefutável levar-se em conta os

fundamentos acima declinados,

principalmente a efetividade de conjunção

carnal, requisito essencial e específico ao

delinear do tipo do art. 213, do Código

Penal.

Por derradeiro, de se me cumprir o

consignar de que constante, por cláusula

expressa, da atacada sentença, o regime

fechado para cumprimento da se lhe

aplicada sanção penal, sem que

especificado se integralmente ou não,

como prescrito no § 1°, do art. 2°, da Lei

n° 8.072/1990 (Lei dos Crimes Hediondos).

Dentro dessa ótica, preponderante o

reconhecer de que congruente o

interpretar do conteúdo imposto no

decisum, da forma menos gravosa ao réu,

pelo que correto e prudente o se lhe

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assegurar a progressividade do regime de

pena.

Isto posto e de acordo com o parecer da

douta Procuradoria Geral de Justiça,

somente de se me restar, ao recurso, se

lhe negar provimento, para manter a

questionada e bem motivada sentença,

contudo, de ofício, ao réu, se lhe garantir a

progressão de regime de cumprimento de

pena, o que assim o faço, com as

cominações e repercussões de direito.

É como voto.

SALA DAS SESSÕES DA PRIMEIRA CÂMARA

CRIMINAL DO PALÁCIO DA JUSTIÇA CLÓVIS

BEVILÁCQUA, em São Luís, Capital do

Estado do Maranhão, aos treze dias do

mês de junho do ano de dois mil e seis.

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Desembargador ANTONIO FERNANDO

BAYMA ARAUJO

PRESIDENTE e RELATOR

Participaram do julgamento, além do que

assina, os Senhores Desembargadores:

BENEDITO DE JESUS GUIMARÃES BELO e

MÁRIO LIMA REIS.

Funcionou como representante do

Ministério Público, o Senhor Procurador,

Doutor KRISHNAMURTI LOPES MENDES

FRANÇA.