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1 A importância da afetividade e do lúdico no processo de aprendizagem da língua portuguesa. 1 Camila da Silva Portela 2 RESUMO - O presente artigo aborda questões relevantes ao ensino da Língua Materna Língua Portuguesa, no que diz respeito às metodologias (tradicional e construtivista) utilizadas pelos professores para ministrarem suas aulas, o que pode afastar ou aproximar o educando de forma satisfatória do conhecimento. Traz também a importância do afeto nas relações entre professor e aluno, bem como no processo de ensino - aprendizagem, da mesma forma, apresenta o lúdico como recurso fundamental para compor a metodologia escolhida pelo profissional. A partir dos apontamentos, apresentou-se referenciais psicopedagógicos que podem auxiliar aqueles profissionais que ainda apresentam certa dificuldade em unir a afetividade e a ludicidade ao seu fazer pedagógico. Palavras-chave: Língua Portuguesa, metodologias, lúdico, afetividade ABSTRACT - The present article deals with questions relevant to the teaching of the Mother Language - Portuguese Language, regarding the methodologies (traditional and constructivist) used by teachers to teach their classes, which may distract or approach the student in a satisfactory way of knowledge. It also shows the importance of affection in the relationship between teacher and student, as well as in the teaching - learning process, in the same way, presents the play as a fundamental resource to compose the methodology chosen by the professional. From the notes, psychopedagogical references have been presented that can help those professionals who still have a certain difficulty in uniting affectivity and playfulness in their pedagogical work. Keywords: Portuguese language, methodoligy, playful, affectivity Considerações Inicias Mesmo diante a todas as transformações que se presencia na educação, é muito importante que se leve em consideração que o aprendente precisa ser estimulado, bem como incentivado a gostar daquilo que é apresentado para ele em sala de aula de forma lúdica e afetiva. De acordo com Winnicott (1975, p.80): É no brincar, e somente no brincar, que o indivíduo, criança ou adulto, pode ser criativo e utilizar sua personalidade integral: e é somente sendo criativo que o indivíduo descobre o eu (self). Ligado a isso, temos o fato de que somente no brincar é possível a comunicação. Sabe-se que três importantes habilidades envolvem o processo educativo: cognitivo (descobrir novos conceitos, construir novas ideias e valores); social (sujeito pertencente a um grupo com direitos e deveres) e emocional (saber lidar com sentimentos pessoais e do 1 Artigo de conclusão do curso de Especialização em Psicopedagogia Clínica e Institucional, do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu em Educação da Faculdade CNEC Farroupilha, mantida pela Campanha Nacional da Comunidade- CNEC. Profº. Orientadora Ms. Ilza Maria Cantarelli. 2 Acadêmica do curso de Especialização em Psicopedagogia Clínica e Institucional. Professora Licenciada em Letras da rede Estadual de Ensino da cidade de Farroupilha -RS.

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A importância da afetividade e do lúdico no processo de aprendizagem da língua portuguesa.1

Camila da Silva Portela 2

RESUMO - O presente artigo aborda questões relevantes ao ensino da Língua Materna –

Língua Portuguesa, no que diz respeito às metodologias (tradicional e construtivista)

utilizadas pelos professores para ministrarem suas aulas, o que pode afastar ou aproximar o

educando de forma satisfatória do conhecimento. Traz também a importância do afeto nas

relações entre professor e aluno, bem como no processo de ensino - aprendizagem, da mesma

forma, apresenta o lúdico como recurso fundamental para compor a metodologia escolhida

pelo profissional. A partir dos apontamentos, apresentou-se referenciais psicopedagógicos que

podem auxiliar aqueles profissionais que ainda apresentam certa dificuldade em unir a

afetividade e a ludicidade ao seu fazer pedagógico.

Palavras-chave: Língua Portuguesa, metodologias, lúdico, afetividade

ABSTRACT - The present article deals with questions relevant to the teaching of the Mother

Language - Portuguese Language, regarding the methodologies (traditional and constructivist)

used by teachers to teach their classes, which may distract or approach the student in a

satisfactory way of knowledge. It also shows the importance of affection in the relationship

between teacher and student, as well as in the teaching - learning process, in the same way,

presents the play as a fundamental resource to compose the methodology chosen by the

professional. From the notes, psychopedagogical references have been presented that can help

those professionals who still have a certain difficulty in uniting affectivity and playfulness in

their pedagogical work.

Keywords: Portuguese language, methodoligy, playful, affectivity

Considerações Inicias

Mesmo diante a todas as transformações que se presencia na educação, é muito

importante que se leve em consideração que o aprendente precisa ser estimulado, bem como

incentivado a gostar daquilo que é apresentado para ele em sala de aula de forma lúdica e

afetiva. De acordo com Winnicott (1975, p.80):

É no brincar, e somente no brincar, que o indivíduo, criança ou adulto, pode ser

criativo e utilizar sua personalidade integral: e é somente sendo criativo que o

indivíduo descobre o eu (self). Ligado a isso, temos o fato de que somente no

brincar é possível a comunicação.

Sabe-se que três importantes habilidades envolvem o processo educativo: cognitivo

(descobrir novos conceitos, construir novas ideias e valores); social (sujeito pertencente a um

grupo com direitos e deveres) e emocional (saber lidar com sentimentos pessoais e do

1Artigo de conclusão do curso de Especialização em Psicopedagogia Clínica e Institucional, do Programa de

Pós-Graduação Lato Sensu em Educação da Faculdade CNEC Farroupilha, mantida pela Campanha Nacional da

Comunidade- CNEC. Profº. Orientadora Ms. Ilza Maria Cantarelli.

2 Acadêmica do curso de Especialização em Psicopedagogia Clínica e Institucional. Professora Licenciada em

Letras da rede Estadual de Ensino da cidade de Farroupilha -RS.

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próximo), desta forma, fica claro que o ser humano não aprende sem que suas emoções sejam

valorizadas, respeitas e de certa forma acolhida pelas pessoas as quais convive, denominadas

neste contexto de ensinantes. Segundo Antunes (2006, p.5) afetividade é:

Um conjunto de fenômenos psíquicos que se manifestam sob a forma de emoções

que provocam sentimentos. A afetividade se encontra “escrita” na história genética

da pessoa humana e deve-se a evolução biológica da espécie. Como o ser humano

nasce extremamente imaturo, sua sobrevivência requer a necessidade do outro, e

essa necessidade se traduz em amor.

Infelizmente, alguns educadores apresentam certa dificuldade em escolher uma

metodologia que encante os alunos, ou seja, que os estimulem positivamente durante o

processo de ensino da língua materna, deixando de lado a afetividade, bem como a ludicidade,

pois caem em métodos tradicionais de ensino. Ribeiro (1992, p.81) afirma que:

A falta de dimensão afetiva dos professores com a gramática dificulta a defesa do

seu ensino e o esforço por parte do aluno. Nesse ambiente com pouca estimulação,

com escassos recursos, materiais e onde as atividades são pouco diversificadas e

exercidas de forma automatizada, desencadeia-se um sentimento de aversão e

repulsa pela gramática.

Desta forma, é muito importante que haja uma reavaliação do ensino da Língua Portuguesa

em sala de aula, baseando-se nos aspectos afetivos e lúdicos, pois só assim o processo de

aprendizagem atenderá a demanda esperada.

Aspectos relativos à Língua Portuguesa

Ao analisar o que os Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN’s, documento que

auxilia e orienta os profissionais da educação para a elaboração de sua prática docente, trazem

sobre o Ensino da Língua Portuguesa, verifica-se que a proposta abrange uma metodologia

que se aproxime da realidade dos educandos.

tornando-se a linguagem como atividade discursiva, o texto como unidade de ensino

e a noção de gramática como relativa ao conhecimento que o falante tem de sua

linguagem, as atividades curriculares em Língua Portuguesa correspondem,

principalmente, as atividades discursivas: uma prática constante de escuta de textos

orais e leitura de textos escritos e de produção de textos orais e escritos, que devem

permitir, por meio da análise e reflexão sobre os múltiplos aspectos envolvidos, a

expansão e construção de instrumentos que permitam ao aluno, progressivamente,

ampliar sua competência discursiva. (BRASIL, PCN’s, 1998, p.27)

Porém, é notável que as atividades de escrita, leitura e questões gramaticais

apresentam-se de forma tradicional, identificando-se com as que eram sugeridas no princípio

da ciência linguística, ou seja, o método de ensino é centrado no professor e o educando

apenas recebe as informações, memorizando-as e decorando-as. De acordo com Freire (1978,

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p. 66), “faz “comunicados” e depósitos que os educandos, meras incidências, recebem

pacientemente, memorizam e repetem”. Como resultado, tem-se alunos despreparados para

posicionar-se e fazer questionamentos acerca do que lhe é proposto.

O ensino da Língua Materna, muitas vezes, apresenta-se forma fragmentada, isto é,

de um lado o ensino da gramática normativa, aquela que rege as regras e normas da língua, e

do outro os aspectos ligados à leitura e à escrita. Porém, percebe-se que esta distinção e essa

subdivisão gera problemas no desenvolvimento do processo de ensino/aprendizagem.

Segundo Neves (2002, p.238):

É preocupante verificar que os professores contemplam a gramática, especialmente

como atividade de exercitação da metalinguagem [...] consideram que ela seja uma

disciplina normativa. Despreza-se quase totalmente a atividade de reflexão e

operação sobre a linguagem, do que resulta uma organização dos trabalhos em

compartimentos totalmente apartados: de um lado, redação e leitura com

interpretação (estruturação/representações/comunicação de experiências, mais

interpretação de experiências comunicadas), e de outro, gramática (conhecimento do

quadro de entidades da língua, e, também, alguns conhecimentos do que se

considera bom uso da língua).

Infelizmente, muitos professores sentem-se obrigados a cumprir com o que é

estabelecido nos planos de estudo para dada série, por isso ministram suas aulas de forma

tradicional. Outro aspecto que merece ser destacado é a visão que os professores têm com

relação à maneira como devem ministrar suas aulas, pois muitos foram educados acreditando

que o professor é o único dono da razão, detentor do conhecimento. De acordo com Becker

(2001, p. 16):

Como é esta aula? O professor fala e o aluno escuta. O professor dita e o aluno

cópia. O professor decide o que fazer e o aluno executa. O professor ensina e o

aluno aprende. Se alguém observasse uma sala de aula na década de 60 ou de 50, ou,

quem sabe, de dois séculos atrás, diria, provavelmente, a mesma coisa: falaria como

Paulo Freire, no Pedagogia do Oprimido. Por que o professor age assim? Muitos

dirão, porque aprendeu que é assim que se ensina. Para mim, esta resposta é correta,

mas não suficiente. Então, por quê mais?

Porém, há alguns professores que procuram por novas metodologias para o seu fazer

pedagógico, a fim de ressignificar o ensino da Língua Materna, pois acreditam que é através

do método construtivista, o qual se constrói o conhecimento junto com seu aluno, que se

obterá os resultados satisfatórios para o processo de ensino aprendizagem. Conforme Becker

(2001, p.72):

Construtivismo significa isto: a ideia de que nada, a rigor, está pronto, acabado, e de

que, especificamente, o conhecimento não é dado, em nenhuma instância, como algo

terminado. Ele se constitui pela interação do indivíduo com o meio físico e social,

com o simbolismo humano, com o mundo das relações sociais; e se constitui por

força de sua ação e não por qualquer dotação prévia, na bagagem hereditária ou no

meio, de tal modo que podemos afirmar que antes da ação não há psiquismo nem

consciência e, muito menos, pensamento.

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Para Piaget, a aquisição do conhecimento inicia no nascimento e vai se consolidando

ao longo do desenvolvimento humano. As assimilações são concretizadas através das

interações estabelecidas entre o sujeito, o meio físico e social (objeto), portanto trabalhar de

forma construtivista, é permitir que o aprendente aja, pense, reflita, construa diante do que

está ao seu redor, o que se estenderá ao longo de sua vida.

Segundo Piaget, o conhecimento não pode ser concebido como algo predeterminado

desde o nascimento (inatismo), nem como resultado do simples registro de

percepções e informações (empirismo): o conhecimento resulta das ações e

interações do sujeito no ambiente em que vive. Todo conhecimento é uma

construção que vai sendo elaborada desde a infância, por meio de interações do

sujeito com os objetos que procura conhecer, sejam eles do mundo físico ou do

mundo cultural. O conhecimento resulta de uma inter-relação do sujeito que conhece

com objeto a ser conhecido. (MOREIRA, 1999, p.75)

Sendo assim, para que o processo seja significativo para os educantos, deve-se

pensar em uma reorganização nas práticas pedagógicas, a fim de unir laços afetivos e lúdicos

à metodologia predeterminada pelo ensinante para ministrar suas aulas.

Desenvolvimento Humano e afetividade

Cada sujeito é um ser único, apresentando uma maneira particular de compreender o

mundo que o rodeia, agindo e atuando sobre ele. A partir das características particulares de

aprender de cada ser humano, nota-se que a aprendizagem acontece de diferentes maneiras.

De acordo com Spinello (2014, p.1):

O processo de aprendizagem se dá desde o nascimento até a vida adulta, pois

estamos sempre em busca de conhecimento e em constante adaptação. A

aprendizagem significativa valoriza a compreensão da valorização, o querer

aprender do sujeito espontaneamente. Na sociedade as pessoas apreendem

observando as outras. Nascemos sem o conhecimento amplo e a sociedade nos

molda.

As relações de aprendizagem se dão através de diferentes fatores, principalmente das

relações que estabelecemos com as pessoas que nos rodeiam, porém muitas vezes são

identificadas algumas dificuldades durante o curso, podendo ser de caráter pedagógico,

cognitivo, afetivo-social e até mesmo corporal, recebendo influências internas (biológicas,

emotivas) como externas (sociais).

Para Piaget (1973) a aprendizagem está relacionada ao estágio de desenvolvimento

do ser humano, portanto para se chegar a uma conclusão a respeito das dificuldades de

aprendizagem apresentadas por um sujeito, é necessário observar fatores internos e externos,

os quais podem influenciar positiva ou negativamente no processo.

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O ser humano que se encontra em pleno desenvolvimento, construindo seu

conhecimento e que apresenta dificuldades durante esse percurso, não pode ser julgado apenas

por seu potencial cognitivo, pois ele é fruto de uma relação existente entre seu íntimo

(aparelho biológico), suas ligações psico-afetivas e cognitivas e pelas relações estabelecidas

com o meio onde está inserido, Weiss e Cruz (apud GLAT, 2007, p.67).

Percebe-se que o meio a que o sujeito pertence, influencia na sua aprendizagem,

principalmente no que diz respeito às suas relações afetivas. Segundo Antunes (2006, p.5)

afetividade é:

Um conjunto de fenômenos psíquicos que se manifestam sob a forma de emoções

que provocam sentimentos. A afetividade se encontra “escrita” na história genética

da pessoa humana e deve-se a evolução biológica da espécie. Como o ser humano

nasce extremamente imaturo, sua sobrevivência requer a necessidade do outro, e

essa necessidade se traduz em amor.

Para Piaget (apud CUNHA, 2000) o processo de aprendizagem da criança acontece a

partir das relações e interações que ela vai estabelecendo com as pessoas com que convive, na

escola com seus colegas e professores, em casa com seus pais e familiares, assumindo um

papel de aprendende, enquanto outro torna-se ensinante. Desta forma, é de suma importância

levar em consideração que elementos emocionais e afetivos atuam significativamente na

aprendizagem, podendo influenciar em comportamentos como atenção e interação.

De acordo com Fernández (1991, p.47) “toda a aprendizagem é repleta de

afetividade, já que ocorre a partir de interações sociais”, portanto é no âmbito familiar, o qual

possui papel de maior importância , que a criança vai receber as primeiras manifestações de

amor, carinho e afeto, o que é de imprescindível para seu desenvolvimento cognitivo, as quais

serão complementadas com o que é aprendido e recebido na escola, logo, apresentam-se como

duas instâncias que terão papel primordial na formação integral do sujeito.

Piaget (1975, p. 226) afirma que “cada um dos personagens do meio ambiente da

criança ocasiona em suas relações com ela uma espécie de esquema afetivo, isto é, resumos

ou moldes dos diversos sentimentos sucessivos que esse personagem provoca”, portanto deve-

se observar que é a partir dessas relações que o sujeito pode se desenvolver, pois se há

diálogo, respeito, atenção e amor, a aprendizagem pode consolidar-se de forma satisfatória,

por outro lado se há a falta desses elementos nas relações, a aprendizagem pode ficar

comprometida.

Todo ser humano é regido pelas suas emoções e seus sentimentos, portanto estes

fatores podem interferir de forma negativa no processo de ensino aprendizagem, da mesma

forma que a falta de afetividade pode dificultar o seu desenvolvimento cognitivo,

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comprovando-se nas falas de Freire (1996, p.141), “a afetividade não se acha excluída da

cognoscibilidade”, mas é preciso tomar cuidado tanto com a falta de afeto como com afetos

desordenados que podem descontrolar os verdadeiros sentimentos”.

Percebe-se que o desenvolvimento intelectual está ligado significativamente com as

questões emotivas. Para Rozek e Serra (2015, p.167):

Dentre os aspectos considerados por Weiss, parece haver consenso na literatura de

que a cognição e as emoções são componentes importantes para que o sujeito possa

aprender. Piaget (1958) propõe que sejam considerados os aspectos afetivos em

todos os atos inteligentes. Os achados na literatura têm demonstrado que os aspectos

emocionais estariam relacionados com um melhor ou pior rendimento do aluno.

Desta forma, muitos sujeitos podem apresentar baixo rendimento escolar, inibições

cognitivas diante as relações estabelecidas no seu contexto familiar, assim como atraso

maturativo, que para Romero (apud COLL ,2004, p. 56) pode ser compreendida como uma “

condição dinâmica que depende das características neurológicas, neuropsicológicas e

psicológicas da pessoa e, em menor medida, mas de forma importante, também depende do

ambiente (familiar, escolar) em que ocorre o desenvolvimento”.

Nesse viés, percebe-se que o atraso maturativo pode explicar muitas defasagens seja

na construção do número, no desenvolvimento do raciocínio lógico matemático, na leitura e

na escrita, bem como apresentar transtornos de ansiedade e depressão.

Ludicidade no Ensino da Língua Materna

Sabe-se que o ensino da Língua Portuguesa é fundamental, pois é através dela que se

estabelecem relações comunicativas entre falantes e usuários da língua. Porém, alguns

profissionais escolhem metodologias tradicionais para transmitir seus conhecimentos, não

permitindo que o aluno construa – o de forma autônoma durante o processo de ensino

aprendizagem.

Diante a essa realidade, percebe-se que é de suma importância a busca por aulas mais

atrativas, as quais tornem o ensino e o conhecimento mais significativo. Portanto, é

imprescindível o uso de atividades lúdicas, que podem auxiliar de forma positiva na

aprendizagem. Conforme Huzinga (2004, p.41), “ o lúdico, em latim ludus, abrange os jogos

infantis, a recreação, as competições, as representações litúrgicas e teatrais, e os jogos de

azar”.

De acordo com Feijó (1992, p. 2), “o lúdico é uma necessidade básica da

personalidade, do corpo e da mente, fazendo parte das atividades essenciais da dinâmica

humana caracterizada por ser espontânea, funcional e satisfatória”. Sendo assim, a inclusão de

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atividades lúdicas não engrandece apenas o trabalho do professor, tornando as aulas mais

dinâmicas e prazerosas, permite também que o educando sinta satisfação em aprender e

desenvolva com interesse tudo que lhe é proposto. Da mesma forma que colabora para a

formação de um sujeito pensante e crítico diante às situações de aprendizagem em que

participa. Além disso, possibilita também a troca de conhecimentos e experiência com os

demais envolvidos no processo. O que se comprova nas palavras de Luckesi (2006, p. 06):

Percebe-se que a experiência do lúdico é uma importante contribuição para o

indivíduo que busca, de maneira constante, atuar no mundo com autonomia [...]

Mesmo quando o sujeito está vivenciando essa experiência com outros, a ludicidade

é interna; a partilha e a convivência poderão oferece-lhe, e certamente oferece

sensações do prazer da convivência, mas, ainda assim, essa sensação é interna de

cada um ainda que o grupo possa harmonizar-se nessa sensação comum; porém um

grupo, como grupo, não sente, mas soma e engloba um sentimento que se torna

comum; porém, em última instância quem sente é o sujeito.

Seguindo essa linha de pensamento Ronca e Terzi (1995 apud TEZANI, 2004, p. 96)

corroboram:

[...] o lúdico proporciona compreender os limites e as possibilidades da assimilação

de novos conhecimentos pela criança, visto que, mediante o desenvolvimento da

função simbólica e da linguagem, o indivíduo conhece e interpreta os fenômenos à

sua volta, trabalhando com os limites existentes entre o imaginário e o concreto.

Um olhar psicopedagógico no ensino da Língua Portuguesa

O ensinante deve buscar técnicas diversificadas que viabilizem, bem como

possibilitem ao aprendente a concepção do conhecimento com autonomia, envolvendo-os de

forma prazerosa. Sendo assim, é de suma importância buscar recursos, os quais auxiliarão no

percurso a ser percorrido, motivando-os na busca pelo novo, pelo desconhecido.

O vínculo que se estabelece entre professor/aluno resulta no sucesso ou insucesso da

prática pedagógica do educador, assim como no desempenho do estudante. Logo, há a

necessidade de se trabalhar de forma afetiva e lúdica para que haja a motivação no processo

ensino-aprendizagem. De acordo com Bock (1999, p. 121):

A motivação é, portanto, o processo que mobiliza o organismo para a ação, a partir

de uma relação estabelecida entre o ambiente, a necessidade e o objeto de satisfação.

Isso significa que, na base da motivação, está sempre um organismo que apresenta

uma necessidade, um desejo, uma intenção, um interesse, uma vontade ou uma

predisposição para agir. A motivação está também incluído o ambiente que estimula

o organismo e que oferece o objeto de satisfação. E, por fim, na motivação está

incluído o objeto que aparece como a possibilidade de satisfação da necessidade.

Para Fernández (1991) a aprendizagem é repleta de afetividade, devido aos vínculos

sociais que se estabelecem durante o processo. A afetividade está embutida nestas relações

seja entre ensinante e aprendente, seja entre conteúdo e conhecimento. É o afeto que assegura

e estimula o aluno na consolidação do seu conhecimento, criando uma conexão positiva e de

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confiança entre os participantes. De acordo com a autora (1991, p.47) “não aprendemos de

qualquer um, aprendemos daquele a quem outorgamos confiança e direito de ensinar”.

Durante todo desenvolvimento humano, a afetividade tem papel essencial. O

indivíduo aprende e qualifica seu conhecimento através das relações afetivas que estabelecem

na companhia dos demais seres. A afetividade está totalmente ligada à inteligência, o que se

confere nas palavras de La Taille (1992, p.65):

afetividade é comumente interpretada como uma "energia", portanto como algo que

impulsiona as ações. Vale dizer que existe algum interesse, algum móvel que motiva

a ação. O desenvolvimento da inteligência permite, sem dúvida, que a motivação

possa ser despertada por um número cada vez maior de objetos e situações. Todavia,

ao longo desse desenvolvimento, o princípio básico permanece o mesmo: a

afetividade é a mola propulsora das ações, e a Razão está a seu serviço.

Assim como a afetividade impulsiona o gosto pelo saber, as atividades, lúdicas

selecionadas pelo ensinante, também configuram um quadro motivacional, agradável e

prazeroso durante o processo ensino - aprendizagem. Consoante com Machado et al. (1990, p.

27) relata que “o lúdico são atividades motivadoras, impulsionam naturalmente o gosto e o

prazer pelo estudo, propiciam mais alegria aos alunos, conduzem à investigação de novas

técnicas de soluções de problemas”.

Segundo Winnicott (apud FERNANDEZ, 2001, p.127) “o brincar tem um lugar e um

tempo [...]. Para dominar o que está fora, é preciso fazer coisas, não só pensar ou desejar, e

fazer coisas leva tempo. Brincar é fazer”. Desta forma, o sujeito, ao brincar, age e interage

com o mundo à sua volta, consolidando-se como sujeito. É através da brincadeira que o

indivíduo evolui quer individualmente, percebendo suas capacidades e seus limites, quer em

grupo, aceitando e respeitando a opinião do outro. De acordo com Winnicott (1979, p.163), “a

brincadeira fornece uma organização para a iniciação de relações emocionais e assim propicia

o desenvolvimento de contatos sociais”.

Para Winnicott, não só as atividades lúdicas bastam, como também a criação de

espaços transicionais dentro da sala e aula, ou seja, espaços onde as brincadeiras se

estabelecem e que possibilitam melhor comunicação entre aluno e professor. Segundo J.

(1995, p.194), que traz no corpo do seu trabalho ideias de Winnicott, refere que “esse espaço

transicional persiste ao longo de toda a vida. Será ocupado por atividades lúdicas e criativas

extremamente variadas. Terá por função aliviar o ser humano da constante tensão suscitada

pelo relacionamento da realidade de dentro com a realidade de fora”. Desta forma, percebe-se

que não só a afetividade, mas, também, a ludicidade deve estar presente nas atividades

elaboradas pelos professores, pois assim, obter-se-á aulas mais atrativas, mas agradáveis e

envolventes. É importante levar em consideração que o cognitivo liga-se intimamente às

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emoções do sujeito, por isso o ensinante deve ter consciência de que os subsídios a serem

utilizados em sala de aula devem captar a atenção do aprendende para que se tenha sucesso e

não fracasso no processo ensino aprendizagem. Para Wallon (1971, p.91) "a emoção

corresponde a um estádio da evolução psíquica situado entre o automatismo e a ação objetiva,

entre a atividade motriz, reflexa, de natureza fisiológica e o conhecimento"

Considerações Finais

As mudanças presenciadas na educação nos últimos anos, exige que todos tenhamos

consciência de que a metodologia escolhida pelo professor, deve atender as necessidades dos

alunos, ou seja, ela deve não só ensinar, mas também envolver, motivar e cativar a todos para

ir além, criar, avaliar e agir perante ao que lhe é proposto, por isso cabe-nos a

responsabilidade de ressignificar a aprendizagem, valorizando cada particularidade e cada

avanço do sujeito.

Sabe-se que a aprendizagem é um longo processo de construção, o qual ocorre

simultaneamente com o sujeito e o meio em que ele faz parte, é que cada ser humano tem um

jeito particular de adquirir conhecimento e sua aprendizagem é única, desta forma é de suma

importância que relações afetivas sejam estabelecidas durante o processo, pois as emoções

estão ligadas à aprendizagem. Cabe ao professor, enquanto mediador do conhecimento, agir

de forma acolhedora, respeitosas e carismática, para que o educando sinta-se acolhido e parte

significativa do processo.

Já as atividades lúdicas, propiciam momentos desafiadores, motivacionais e

prazerosos, enriquecendo o fazer pedagógico dos professores, da mesma forma que

possibilitam momentos de troca de experiências, ideias entre o sujeito e o outro, seja o

professor ou colegas.

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