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A importncia da criao de registos de autoridade arquivstica para entidades produtoras de arquivos. O caso das entidades colectivas pblicas, criadas na segunda metade do sculo XX, produtoras de
arquivos de poltica cientfica em Portugal.
Ctia Joo Matias Trindade
Setembro de 2012
Dissertao de Mestrado em Cincias da Informao e da
Documentao rea de Especializao em Arquivstica
Dissertao apresentada para cumprimento dos requisitos necessrios obteno do
grau de Mestre em Cincias da Informao e da Documentao rea de Especializao em Arquivstica, realizada sob a orientao cientfica da Professora
Doutora Maria Fernanda Rollo, Professora Associada com Agregao do Departamento de Histria da FCSH da UNL e do Dr. Joo Manuel Santos Vieira, Assistente Convidado
do Departamento de Histria da FCSH da UNL.
A todos aqueles que me apoiaram, motivaram e contriburam, de algum modo, para que este trabalho pudesse acontecer.
Os meus agradecimentos poderiam preencher vrias pginas, pois acredito que tudo aquilo que somos e fazemos fruto das nossas vivncias e, alm disso, das nossas convivncias. Agradeo Aos meus pais, pela dedicao e esforos feitos para a minha formao pessoal e acadmica. Aos meus avs e irm, presenas constantes na minha vida e em tudo aquilo que fao. minha sobrinha, Madalena, pela motivao que, sem saber, me transmitiu e por todos os desenhos que deixou nos meus apontamentos e rabiscos. Ao Gonalo, pela sua presena e pacincia. s minhas mestres, conselheiras, confidentes e sempre amigas: Paula Meireles e Madalena Ribeiro. Aos grandes colegas, parceiros e amigos em diversos espaos, momentos e circunstncias: Miriam Agostinho, Ana Marta Guerreiro e Pedro Casquinha dos Santos. A todos os professores, nas diferentes instituies de ensino por onde passei. Agradeo especialmente professora Leonilde, que me ensinou a ser rigorosa e exigente comigo mesma; aos professores Lusa Diogo, Fernando vora e Fernando Almeida, que me incutiram o esprito de querer aprender sempre mais; professora Helena Carvalho Buescu, pelo marco que representou e ainda representa em todos os estudos que fao; aos professores Paulo Tremoceiro, Judite Paixo e Alexandra Loureno pelos primeiros ensinamentos de Arquivstica, pela amizade e pela disponibilidade que sempre demonstraram. A todo o corpo docente do curso de Cincias da Informao e da Documentao Arquivstica, da FCSH-UNL e simptica e unida turma (2010 2012), com a qual tive o prazer de partilhar salas de aula, muitas questes e momentos de boa disposio. Ao Professor Pedro Penteado, pela cedncia de bibliografia e pela disponibilidade demonstrada. Dra. Luclia Runa, pela sua disponibilidade e pelo seu grande contributo. A partilha de experincias, conhecimentos e as recomendaes bibliogrficas permitiram enriquecer este trabalho. Alm-fronteiras, no Brasil, Professora Doutora Georgete Rodrigues e, sobretudo, Professora Doutora Cynthia Roncaglio que, sem me conhecer pessoalmente, aceitou contribuir, partilhando o seu vasto conhecimento cientfico e alargada experincia profissional. Por ltimo, os meus maiores agradecimentos. Aos meus orientadores, Professora Doutora Maria Fernanda Rollo e Dr. Joo Manuel Santos Vieira. Agradeo a orientao cientfica, a motivao transmitida, os conhecimentos partilhados e alguns divertidos mas exigentes comentrios.
RESUMO
A importncia da criao de registos de autoridade arquivstica para entidades produtoras de arquivos. O caso das entidades colectivas pblicas, criadas na segunda
metade do sculo XX, produtoras de arquivos de poltica cientfica em Portugal.
Ctia Joo Matias Trindade
PALAVRAS-CHAVE: Descrio, Entidades produtoras, Registos de autoridade arquivstica, Arquivos de poltica cientfica.
Parece-nos indiscutvel que a ausncia de informao sobre os arquivos e as entidades que os produziram constitui, em muitos casos, razo para a inexistncia de um compromisso e responsabilidade perante a sociedade. Tal situao representa, igualmente, um entrave no conhecimento da histria e preservao da memria e impulsiona lamentveis situaes de voragens, abandonos e destruies totais ou parciais de arquivos. necessrio compreender-se os documentos de arquivo, as entidades responsveis pela sua produo e as actividades no mbito das quais estes foram produzidos como indissociveis. Propomos, por isso, o estabelecimento de uma ligao lgica e intelectual que perdure no tempo e no apenas durante o perodo de actividade da entidade produtora. Nesse sentido, consideramos fundamental no s o estudo e a descrio dos documentos de arquivo mas tambm o estudo e a descrio das entidades suas produtoras, tornando-se assim possvel identificar a provenincia dos arquivos e compreender o seu contexto de produo. Assim, para a descrio dos produtores, devem ser elaborados Registos de Autoridade Arquivstica (RAA), na medida em que estes permitem a sua identificao de forma unvoca e registam a sua histria e evoluo, relacionando-os com factores externos, como o contexto de criao e actuao, outras entidades e outros recursos, nomeadamente, arquivos e funes. No presente trabalho, defendemos a descrio de diferentes objectos em diferentes registos de descrio, em separado, j que cada um deles representa um registo autnomo e porque, atravs de pontos de acesso, todos podem ser acedidos a partir de todos, estabelecendo-se assim uma teia de informao. Com base nesta perspectiva e no contexto de desenvolvimento de polticas de Cincia em Portugal, enquanto produto da reflexo terica e como contributo visvel, apresentamos uma proposta de RAA para entidades colectivas pblicas contemporneas (extintas e activas), criadas na segunda metade do sculo XX e produtoras de arquivos de poltica cientfica em Portugal. Os RAA foram elaborados de acordo com princpios, critrios e metodologias explicitados no trabalho, todavia, cumprindo as directrizes estabelecidas pela Norma Internacional ISAAR(CPF), sobre a qual tambm se apresenta uma reflexo crtica. As entidades reflectem a identidade, a histria e a evoluo social, econmica, poltica e cultural de um pas. No s enquanto produtoras de arquivos mas tambm pelos valores anteriormente identificados, importa perpetuar as suas memrias e registar as suas histrias, tornando a informao pblica e colocando-a nos circuitos da investigao nacionais e internacionais.
ABSTRACT
The importance of creating archival authority records for archives creators. The case of public legal entities, created in the second half of the twentieth century, which
produce science policy archives in Portugal.
Ctia Joo Matias Trindade
KEY-WORDS: description, producing entities, archival authority records, science policy archives. It seems undeniable that the absence of information about archives and the entities that produced them is frequently the reason for a lack of commitment and responsibility towards society. Such a situation also stands for a barrier to the knowledge of history and preservation of memory and promotes regrettable situations of yawn, abandonment and total or partial destruction of archives. The archival documents, the entities responsible for their production and the activities within which they were produced must be understood as inextricably linked to each other. Therefore, we propose the establishment of a logical and intellectual link that can stand the test of time and doesnt only last for the period of activity of the producing entity. In this sense, we consider it not only crucial to study and describe the archival documents but it is also vital that we study and describe their producing entities, thus making it possible to identify the origin of the archives and understand its context of production. Thus, for a description of the creators, Archival Authority Records (Registo de Autoridade Arquivstica / RAA) should be created, since they allow their identification and record unequivocally its history and evolution, relating them to external factors such as the context of creation and performance, other entities and other resources, namely archives and functions. In this paper, we endorse the description of different objects in different registers of description, one by one, since each represents an independent record and because, through access points, every one of them can be accessed by the other, thus establishing an information "web". Based on this perspective and on the context of the science policy development in Portugal, as a product of theoretical reflection and as an visible contribution, we present a RAA proposal to the contemporary public legal entities (active and extinct) that were created in the second half of the twentieth century and to creators of science policy archives in Portugal. The RAA have been prepared according to principles, criteria and methodologies that are clarified in the paper, still complying with the guidelines established by the International Standard ISAAR (CPF), about which we also convey a critical analysis. The entities reflect a countrys identity, history and its social, economic, political and cultural evolution. Not only as archival producers, but also due to the values identified above, it is important to perpetuate their memories and record their stories, making information public and placing it in the circuits of national and international research.
ndice
Captulo I: Introduo 1
I.1 Formulao do problema 1
I.2. A motivao e os objectivos 4
I.3. A metodologia 7
I.4. A estrutura do trabalho 8
Captulo II: Sobre as teorias, prticas e polticas de descrio arquivstica 10
II.1. A descrio arquivstica 10
II.2. A descrio arquivstica em Portugal: do Instituto Portugus de Arquivos Direco-
Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas 16
Captulo III: Sobre as tcnicas de criao e gesto de registos de autoridades
arquivsticas (RAA) para entidades colectivas produtoras de arquivos 22
III.1. A importncia da criao de RAA 22
III.2. A aplicao da Norma ISAAR (CPF) 30
III.3. A criao e o modelo de gesto do FNAA 35
Captulo IV: Sobre a elaborao dos RAA 44
IV.1. Proposta de princpios, critrios e metodologia 44
IV.2. O exemplo das entidades colectivas pblicas, criadas na segunda metade do sculo
XX, produtoras de arquivos de poltica cientfica em Portugal 56
Concluso 58
Bibliografia 61
Lista de Quadros 69
Apndice: Proposta de ficheiro de autoridades arquivsticas para entidades colectivas
pblicas, criadas na segunda metade do sculo XX, produtoras de arquivos de gesto
e execuo da poltica cientfica em Portugal i
Apndice A: Instituto de Alta Cultura ii
Apndice B: Junta Nacional de Investigao Cientfica e Tecnolgica ix
Apndice C: Instituto Nacional de Investigao Cientfica xviii
Apndice D: Observatrio das Cincias e das Tecnologias xxiv
Apndice E: Instituto de Cooperao Cientfica e Tecnolgica Internacional xxx
Apndice F: Fundao para a Cincia e a Tecnologia, I.P. xxxvii
Anexos: xlvii
LISTA DE ABREVIATURAS:
AN / TT - Arquivos Nacionais / Torre do Tombo
AP - Administrao Pblica
APBAD - Associao Portuguesa de Bibliotecrios Arquivistas e Documentalistas
DGARQ - Direco-Geral de Arquivos
DGLAB - Direco-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas
EAC - Encoded Archival Context
EAD - Encoded Archival Description
FCT - Fundao para a Cincia e a Tecnologia
FNAA - Ficheiro Nacional de Autoridades Arquivsticas
IAN/TT - Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo
ICA - International Council on Archives
ICCTI - Instituto de Cooperao Cientfica e Tecnolgica Internacional
INIC - Instituto Nacional de Investigao Cientfica
IPA - Instituto Portugus de Arquivos
ISAAR (CPF) - International Standard Archival Authority Record for Corporate Bodies,
Persons and Families
ISAD (G) - General International Standard Archival Description
ISDF - International Standard for Describing Functions
ISO - International Organization for Standardization
JNICT - Junta Nacional de Investigao Cientfica e Tecnolgica
MARC-AMC - Machine Readable Cataloguing - Archival and Manuscripts Control
MEF - Macroestrutura Funcional
NP - Norma Portuguesa
PNDA - Programa de Normalizao da Descrio em Arquivo
RAA - Registo (s) de Autoridade (s) Arquivstica (s)
RPA - Rede Portuguesa de Arquivos
1
Captulo I: Introduo1
I.1 Formulao do problema
Dependendo do contexto em que referido, o arquivo pode ser entendido em
diferentes acepes: 1) um conjunto orgnico de documentos; 2) uma instituio ou
servio; 3) um edifcio. No mbito do presente trabalho, interessa-nos explicitar o
entendimento 1), ou seja, o arquivo enquanto conjunto orgnico de documentos
independentemente da sua data, forma e suporte material, produzidos ou recebidos
por uma pessoa jurdica, singular ou colectiva, ou por um organismo pblico ou privado
no exerccio da sua actividade e conservados a ttulo de prova ou informao2.
Interessa, igualmente, explicitar os conceitos de entidade produtora e de
actividade. Assim, entende-se por entidade produtora, ou produtor, a pessoa
colectiva, pessoa singular ou famlia, que produz, acumula, conserva e utiliza
documentos de arquivo, no decurso da sua actividade. 3 Por actividade,
genericamente, entendemos uma sucesso de vrias aces e/ou tarefas tendo em
vista um determinado fim. Das diferentes definies possveis, escolhemos aquela que
nos parece mais completa, tendo em vista os objectivos do presente trabalho,
portanto, actividade corresponde a: tarefas desempenhadas por uma entidade
coletiva para realizar cada uma das suas funes. Pode haver vrias atividades
associadas a cada funo. Em certos casos, algumas atividades podem ocorrer sob
diferentes funes. Atividades abarcam transaces que, por seu turno, produzem
documentos4
Considerando as definies supra citadas, acresce referir que a relao do
arquivo com a entidade que o produz e com as actividades que esta desempenha
1 Introduzimos alguma terminologia arquivstica no presente captulo, para a qual no apresentamos,
desde logo, as respectivas definies. Considermos que nem todos os termos representam, nesta fase do trabalho, a matria em anlise, pelo que a apresentao das suas definies no se justificaria. Optmos, pois, por apresentar as definies nos captulos em que os conceitos constituem a matria em anlise. 2 Definio clssica de Arquivo, sustentada por vrias correntes e tradies ao longo de mais de um
sculo. Cf. ALVES, Ivone [et al.] - Dicionrio de terminologia arquivstica, p.7. 3 Cf. DIRECO-GERAL DE ARQUIVOS Modelo para um Ficheiro Nacional de Autoridades Arquivsticas
(FNAA). [Em linha]. Disponvel em www: , p.8. 4 CONSELHO INTERNACIONAL DE ARQUIVOS - ISDF: Norma Internacional para descrio de funes.
[Em linha]. Disponvel em WWW:, p. 10
http://dgarq.gov.pt/files/2008/10/fnaa.pdffile:///C:/Users/cmatias/AppData/Local/Microsoft/Windows/Temporary%20Internet%20Files/Content.IE5/V2NEIFLI/www.ica.org/download.php%3fid=1152%3e
2
incontornvel para o entendimento do contexto de produo e reconhecimento da
provenincia do arquivo. 5 Consideramos, pois, que os arquivos, as entidades
responsveis pela sua produo e as actividades no mbito das quais eles so
produzidos so indissociveis, isto , apresentam uma relao lgica e intelectual que
deve perdurar para alm do tempo de existncia e actividade das entidades.6
De um modo geral, a ligao entre as entidades produtoras, as suas actividades
e os seus arquivos no sofre abalos ou rupturas enquanto a entidade se encontra em
actividade (no caso de uma entidade colectiva pblica, sobretudo se se mantiver sem
alteraes no seu regime jurdico, nas suas funes e atribuies). No entanto, as
rupturas e perdas de ligao podem surgir quando imposta alguma mudana na
entidade, nomeadamente por reestruturao, fuso, privatizao, extino, ou outra,
o que resulta, normalmente, em alteraes orgnico-funcionais na entidade ou no seu
desaparecimento.7
Como consequncia directa das mudanas supra citadas, os arquivos acabam
por se encontrar, em muitos casos, dispersos por vrias entidades detentoras.
Entendemos que, muitas vezes, a disperso arquivstica um fenmeno necessrio e
natural e no representa, necessariamente, uma desvinculao lgica e intelectual
entre o arquivo e o seu produtor. Todavia, se no forem tomadas as devidas
precaues arquivsticas, que garantam a continuidade da ligao entre o arquivo e a
entidade que o produziu, a identificao da provenincia do arquivo, realizada a
posteriori, pode ser dificultada.
Existem outros fenmenos, para alm da disperso fsica, que podem
repercutir-se negativamente na correcta identificao e descrio de um fundo e que
tambm se prendem com a falta de registos de autoridade para a entidade produtora,
como por exemplo, as alteraes de nome de uma mesma entidade e as relaes de
sucesso e de complementaridade funcional.
5 Entende-se por provenincia: Relaes entre os documentos e as organizaes e/ou indivduos que os
produziram, acumularam e/ou mantiveram e usaram no curso de suas atividades pessoais ou corporativas. Provenincia tambm a relao entre os documentos e as funes que geraram a necessidade dos documentos.. Cf. CONSELHO INTERNACIONAL DE ARQUIVOS ISDF, cit. 4, p.10. 6 Para fundamentao da relao que aqui se defende, ver: HEREDIA HERRERA, Antonia - Archivstica
General Teora y Prctica, p. 227. Sugerimos, tambm, a consulta do Quadro 3, no presente trabalho, representativo das relaes citadas entre os elementos: arquivos, entidades produtoras e actividades. 7 Ver Decreto-Lei n 200/2006. D.R. I Srie. 206, que determina o enquadramento procedimental
relativo extino, fuso e reestruturao de servios da AP e racionalizao de efectivos.
3
As mudanas que ocorrem nas entidades, a par de abandonos e frequente
ausncia de conhecimento, tornam-se tanto mais graves, quanto maior for a
necessidade de contextualizao para o desenvolvimento de estudos e alcance de
objectivos, sejam estes acadmicos, profissionais, pessoais.
Por conseguinte, importa pensar e repensar o estudo e a descrio dos
arquivos, propondo novas abordagens (mais abrangentes) e prticas que incidam no
s sobre os arquivos e os documentos de arquivo mas, tambm, sobre as entidades
produtoras de arquivos e sobre as funes desempenhadas nas entidades, realando
as relaes que existem entre si. Alm disso, entendemos como necessria a
elaborao de diferentes registos de descrio, atendendo s especificidades e
particularidades dos diferentes objectos utilizamos o conceito objectos em sentido
lato, designando por objectos em anlise, os elementos especficos sobre os quais
incidem as descries.8
Defendemos a importncia da criao e gesto de registos de autoridade
arquivstica (doravante designados RAA) para as entidades produtoras, como forma de
combater e contrariar a tendncia de separao lgica e intelectual, como condio
preponderante para o conhecimento e correcto entendimento dos fundos
documentais e, acima de tudo, pela sua importncia na promoo do acesso
documentao.
No que respeita escolha do caso de estudo as entidades colectivas pblicas,
criadas na segunda metade do sculo XX, ligadas execuo e gesto de polticas
cientficas em Portugal , esta no surge ao acaso. Identificamos, pois, as principais
razes da nossa escolha: 1) o crescente nmero de estudos, trabalhos, encontros e
discusses desenvolvidos no mbito da Histria e memria da Cincia em Portugal9,
8 No mbito deste trabalho, pensamos, especificamente, na descrio documental e na descrio de
entidades produtoras. No entanto, a separao de registos aplicvel, tambm, por exemplo, descrio de funes. 9 Referimos a ttulo de exemplo, a realizao de alguns eventos dedicados inteiramente ou em parte
Histria da Cincia em Portugal: ROLLO, Maria Fernanda [et al.] - O Arquivo de Cincia e Tecnologia. Da
JNICT FCT. CICLO DE SEMINRIOS EM HISTRIA & CINCIA.HETSCI | GRUPO DE ESTUDOS EM HISTRIA
E CINCIA, Lisboa, 19 Abril 2012. Fundao para a Cincia e a Tecnologia; RIBEIRO, Madalena; MEIRELES,
Paula - Arquivos de Cincia: O Arquivo Histrico de Cincia e Tecnologia da Fundao para a Cincia e a
Tecnologia, IP. COLQUIO HETSCI ESPAOS E ACTORES DA CINCIA EM PORTUGAL (SC. XVIII-XX),
Lisboa, 24 25 de Fevereiro 2012. Instituto de Histria Contempornea FCSH/UNL e Centro de Estudos de
Histria e Filosofia da Cincia da universidade de vora; CONGRESSO ANUAL DE HISTRIA
4
torna premente a identificao, o estudo e o registo das entidades produtoras dos
variados e, em alguns casos, dispersos fundos documentais existentes 10 ; 2) a
inexistncia de trabalhos desta ndole para o caso de estudo escolhido, at presente
data, bem como a sua possvel transposio e aplicao a outros sectores da
Administrao Pblica (AP) e no apenas ao da execuo e gesto de polticas
cientficas; 3) o conhecimento desenvolvido e o trabalho realizado nesta rea, desde
h alguns anos.
I.2. A motivao e os objectivos
Se a temtica confere uma identidade prpria ao presente trabalho, tambm a
razo pela qual esta eleita lhe atribui caractersticas que justificam a motivao e os
objectivos da escolha.
Objectivamente, pretendemos apresentar uma abordagem diacrnica e
sincrnica, atravs de um enquadramento terico geral (no exaustivo) da descrio
arquivstica, bem como das prticas e polticas implementadas em Portugal para o
desenvolvimento desta actividade. Pretendemos, igualmente, evidenciar objectos
sobre os quais a actividade pode incidir e salientar a importncia da delimitao da
informao para os registos de descrio dos mesmos.
Atendendo aos objectivos gerais definidos no Plano de projecto de dissertao
de mestrado, pretendemos, tambm, que o presente estudo contribua para a reflexo
acerca da importncia da identificao e descrio do contexto de produo dos
CONTEMPORNEA, I, Lisboa, 18 E 19 DE MAIO 2012.CEIS (20) e IHC, no qual destacamos a comunicao
proferida pelo investigador BRANDO, Tiago A Junta Nacional de Investigao Cientfica e Tecnolgica
(1967-1974); Referimos ainda o surgimento de um grupo de trabalho especfico, criado para promover e
desenvolver a investigao em Histria da Cincia em Portugal: HISTRIA E CINCIA: Grupo de Estudos
em Histria da Cincia HETSCI. [Em linha]. [Consult. 3 Agosto 2012]. Disponvel em
www.. 10
Para uma maior e melhor contextualizao ver, entre outros: CARAA, Joo Cincia e investigao em Portugal no sculo XX In Panorama da Cultura Portuguesa no Sculo XX, Vol. 1; FIOLHAIS, Carlos - A cincia em Portugal; GAGO, Jos Mariano Cincia em Portugal; GAGO, Mariano - O estado das cincias em Portugal; ROLLO, Maria Fernanda [et al.] - Histria e Memria da Cincia e da Tecnologia em Portugal. O Arquivo de Cincia e Tecnologia da Fundao para a Cincia e a Tecnologia. Boletim do Arquivo da Universidade de Coimbra, [Em linha]. Disponvel em www:, p. 233-261; PORTUGAL. Ministrio da Cultura e Educao. Fundao para a Cincia e Tecnologia - FCT [Em linha]. Disponvel em www:.
http://www.hetsci.org/http://iuc-revistas.com/ojs/index.php/boletimauc/article/view/478http://iuc-revistas.com/ojs/index.php/boletimauc/article/view/478
5
fundos documentais. Aspiramos, igualmente, que possa vir a ser um estmulo para a
discusso em torno da utilidade da criao de RAA para as entidades produtoras de
arquivos, nomeadamente 1) na identificao e salvaguarda do patrimnio arquivstico
nacional; 2) na preservao, organizao, acesso, recuperao e compreenso da
informao; 3) no estudo e registo do contexto de produo dos arquivos; 4) na
normalizao da nomenclatura das entidades; 5) e, por ltimo, no estabelecimento de
relaes entre entidades produtoras e entre estas e outros recursos, ou seja, entre
diferentes objectos.
Sendo a Norma Internacional de Registo de Autoridade Arquivstica para
Entidades Colectivas, Pessoas e Famlias ISAAR (CPF)11 o documento internacional
normativo que fornece as directivas para a elaborao de RAA para as entidades
produtoras, propomos 1) reflectir acerca das fontes que se consideram necessrias
consultar para o levantamento da informao relacionada directa ou indirectamente
com a entidade em estudo; 2) concluir acerca da pertinncia de alguns campos da
ISAAR(CPF), percebendo se so suficientes para compreender a criao e acompanhar
todas as mudanas que ocorrem numa entidade; 3) concluir acerca da consistncia
cientfica e clareza semntica da meta-informao no RAA e da importncia da
descrio das autoridades arquivsticas de forma unvoca, com recurso a vocabulrio
controlado.
Para alm do j referido, algumas reflexes sobre a poltica de criao e de
gesto de um ficheiro nacional de autoridades arquivsticas , igualmente, um
objectivo geral. Para a sua concretizao, apresentam-se algumas consideraes sobre
a criao e o modelo de gesto do Ficheiro Nacional de Autoridades Arquivsticas
(doravante designado FNAA)12.
11
Ver CONSELHO INTERNACIONAL DE ARQUIVOS - ISAAR(CPF): Norma Internacional de Registos de Autoridade Arquivstica para Pessoas Colectivas, Pessoas Singulares e Famlias. Disponvel em www:< URL:http://www.dgarq.gov.pt/files/2008/10/isaar.pdf>. 12
De referir que aps a entrega do Plano de projecto de dissertao de mestrado (em Fevereiro de 2012), o Ficheiro Nacional de Autoridades Arquivsticas (FNAA) foi formalmente lanado e apresentado publicamente pela Direco-Geral de Arquivos (DGARQ) (em 26-04-2012). No Plano de projecto estava prevista a anlise crtica da poltica de criao e gesto de um ficheiro de autoridades de entidades produtoras de arquivos, no abstracto. Contudo, com o lanamento do FNAA, esta abordagem passa para a esfera do concreto, no que respeita ao modelo criado, gesto e manuteno pensadas. A criao de um Grupo de Trabalho para o desenvolvimento do FNAA, na DGARQ, data de 2007, dando cumprimento ao estipulado no Artigo 2., alnea f), PORTARIA n. 372/2007. D.R. I Srie. 64.
http://www.dgarq.gov.pt/files/2008/10/isaar.pdf
6
Como contributo prtico, elaborada uma proposta de RAA para entidades
colectivas pblicas, criadas na segunda metade do sculo XX, produtoras de arquivos
no mbito da gesto e execuo de polticas cientficas em Portugal. Ordenadas
cronologicamente, por data de criao, as entidades que cumprem as caractersticas
estabelecidas no Plano de projecto de dissertao de mestrado13 so identificadas no
quadro infra.
Quadro 1: Entidades colectivas pblicas, criadas na segunda metade do sculo XX, produtoras de arquivos de gesto e execuo de polticas cientficas em Portugal
Entidades Datas de existncia
Instituto de Alta Cultura 1952 1976
Junta Nacional de Investigao Cientfica e Tecnolgica 1967 1997
Instituto Nacional de Investigao Cientfica 1976 1992
Observatrio das Cincias e das Tecnologias 1997 2002
Instituto de Cooperao Cientfica e Tecnolgica Internacional 1997 2002
Fundao para a Cincia e a Tecnologia, I.P. 1997 -
As propostas de RAA visam elucidar acerca da forma como se entende ser
necessrio descrever as entidades colectivas produtoras de arquivos, isto , garantindo
o registo da informao de forma clara, objectiva e entendvel para o cidado.
Importa referir que para o cumprimento de todos os objectivos propostos,
surgiram, como comummente acontece, alguns constrangimentos. Informamos, desde
j, acerca dos que causaram maior impacto no desenvolvimento do trabalho: a
escassez de suporte terico produzido sobre a matria, que representou, em muitos
casos, um bloqueio para maiores e melhores desenvolvimentos; e o tempo til para a
elaborao do presente estudo, o qual considermos demasiado limitado.
13
Definiu-se no Plano de projecto de dissertao de mestrado, que as entidades estudadas seriam as colectivas pblicas, formalmente criadas entre 1950 e 2000, que tivessem por misso a execuo e/ou gesto de polticas cientficas nacionais. Estes requisitos so aplicados e cumpridos cumulativamente.
7
I.3. A metodologia
Com a conscincia de que muito difcil, mesmo para um investigador
profissional e com experincia, produzir conhecimento verdadeiramente novo que faa
progredir a sua disciplina14, o presente trabalho surge, como j foi referido, enquanto
um esforo para evidenciar a pertinncia da criao de RAA para entidades produtoras
de arquivos e como proposta de metodologia a aplicar na sua elaborao.
Para o alcance deste propsito so cumpridas as seguintes etapas: 1) a
construo de um Plano de projecto de dissertao de mestrado; 2) a pesquisa e
recolha de fontes bibliogrficas para a sustentao terica do trabalho; 3) o
apuramento do estado da arte; 4) a exposio dos factos e o acompanhamento da sua
evoluo com recurso a contextualizaes histricas; 5) a anlise crtica do estado da
arte e, concomitantemente, a apresentao de uma metodologia de trabalho; 6) a
elaborao de uma proposta prtica, a qual implicou a repetio do passo 2), supra
identificado, porm, apenas com vista recolha de dados necessrios para a histria
das entidades em estudo.
Assim, no que concerne metodologia, seguimos como orientao o modelo
aplicado ao mtodo arquivstica, por Malheiro da Silva e Fernanda Ribeiro, isto , o
modelo quadripolar de Paul de Bruyne, desenvolvido por Lssard-Hbert, que
contempla quatro plos distintos: o epistemolgico, o terico, o tcnico, e o
morfolgico.15 A sua aplicao traduz-se do seguinte modo: o plo epistemolgico est
reflectido no Captulo I, atravs da identificao do objecto de estudo, da formulao
da problemtica e da definio da motivao e objectivos do estudo; o plo terico
est presente nos captulos II e III, atravs da exposio de conceitos, da caracterizao
do objecto de estudo e do estado da arte; o plo tcnico est presente no Captulo III,
atravs do contacto com a realidade; o plo morfolgico est, tambm, presente no
Captulo III, atravs da produo de reflexes e apresentao de concluses,
14
Cf. QUIVY, Raymond; CAMPENHOUDT, Luc Van - Manual de investigao em cincias sociais, p.19. 15
Cf. BRUYNE, P. de Dynamique de la recherche en sciences sociales; LSSARD-HBERT, M. Investigao qualitativa. Fundamentos e tcnicas; SILVA, Armando Malheiro da Arquivstica: teoria e prtica de uma cincia da informao, p. 217-226; SILVA, Armando B. Malheiro da - A gesto da informao arquivstica e suas repercusses na produo do conhecimento cientfico. [Em linha]. Disponvel em www., p. 1-31.
http://www.conarq.arquivonacional.gov.br/Media/publicacoes/ibericas/a_gesto_da_informao_arquivstica.pdfhttp://www.conarq.arquivonacional.gov.br/Media/publicacoes/ibericas/a_gesto_da_informao_arquivstica.pdf
8
transitando para o Captulo IV, com a apresentao dos princpios, critrios e
metodologia aplicados elaborao de RAA, e para a concluso do trabalho.
Como contributo prtico, em apndice, encontra-se a proposta de RAA para as
entidades colectivas pblicas criadas na segunda metade do sculo XX, produtoras de
arquivos no mbito da execuo e gesto de polticas cientficas em Portugal. Entende-
se que este contributo tambm representativo do plo morfolgico, na medida em
que os RAA elucidam acerca das concluses apuradas nos captulos III e IV.
I.4. A estrutura do trabalho
O presente trabalho apresenta uma estrutura que se divide em quatro
captulos: Introduo (Captulo I); Sobre as teorias, prticas e polticas de
descrio arquivstica (Captulo II); Sobre as tcnicas de criao e gesto de registos de
autoridade arquivstica (RAA) para entidades colectivas produtoras de arquivos
(Captulo III); e Sobre a elaborao de RAA (Captulo IV).
Optou-se pela diviso de todos os captulos em subcaptulos, de maneira a
criar-se uma estrutura e encadeamento da informao que facilite o acompanhamento
e compreenso da investigao realizada.
Assim, no Captulo I Introduo explica-se a problemtica e os objectivos
gerais e especficos do trabalho. Muito embora no seja recomendado no modelo de
apresentao de tese, cedido pela Faculdade de Cincias Sociais e Humanas da
Universidade Nova de Lisboa, opta-se por apresentar, em conjunto com os objectivos,
tambm as motivaes para a escolha do tema.
O Captulo II, no previsto no Plano de projecto de dissertao de mestrado,
consequncia de algumas leituras e revises bibliogrficas. Na fase de investigao
considerou-se necessria uma contextualizao histrica, espacial e temporalmente
alargada; o mesmo sucedeu na fase de redaco.
Os captulos III e IV so aqueles que, apesar da sua extrema importncia no
trabalho, levantaram maiores dificuldades. No entanto, apresentam-se,
contextualizam-se e analisam-se os dados e factos.
9
A importncia da criao de RAA para entidades colectivas produtoras de
arquivos, a utilizao da ISAAR(CPF), bem como a apresentao de uma proposta de
princpios, critrios e metodologia para a sua elaborao, so questes que marcam a
identidade deste trabalho, na medida em que representam os nossos principais
objectivos.
A anlise do FNAA acontece pela pertinncia que se considera ter no mbito do
presente estudo (com as devidas notas justificativas no seu desenvolvimento) e
encontra-se no Captulo III.
O Captulo IV , claramente, aquele em que se tenta reflectir a grande
componente prtica do estudo. Nele identificam-se os princpios, critrios e
metodologia para a elaborao dos RAA para as entidades colectivas pblicas.
Exemplifica-se atravs da sua aplicao a RAA para entidades colectivas produtoras de
arquivos de gesto e execuo de polticas cientficas em Portugal, criadas na segunda
metade do sculo.
De referir, tambm, que as notas de rodap (ao longo de todo o trabalho) so
notas de citao e, para alm disso, notas de carcter justificativo e explicativo. Quer
as citaes, quer as referncias bibliogrficas encontram-se de acordo com os critrios
estabelecidos pela NP 405.
As referncias bibliogrficas foram separadas em cinco grupos. No primeiro
grupo encontram-se os documentos normativos, tcnicos e orientadores. No segundo
grupo, a bibliografia que nos permitiu a realizao do enquadramento terico, no
mbito da Arquivstica. No terceiro grupo, a bibliografia que nos permitiu a recolha de
dados histricos que justificam a escolha das entidades e os respectivos contextos de
actuao. No quarto grupo, a legislao citada e/ou recomendada, que no inclui a
consultada para a elaborao dos RAA, j que essa identificada no prprio registo.
No quinto grupo a fonte Arquivo de Cincia e Tecnologia da Fundao para a Cincia e
a Tecnologia.
A Bibliografia composta por referncias bibliogrficas citadas e, tambm, por
apenas consultadas. Apesar de no citadas no presente trabalho, foram
complementares e constituram fontes de informao relevantes para a elaborao do
estudo.
10
Captulo II: Sobre as teorias, prticas e polticas de descrio arquivstica
II.1. A descrio arquivstica
Aunque la operacin de describir es nica, las acepciones del trmino son tan numerosas
como manuales, estudios, lxicos y diccionarios se han ocupado de su significado.
BONAL ZAZO, Jos Luis 16
Antes de mais, importa clarificar que a abordagem diacrnica e sincrnica
realizada para a descrio arquivstica, embora no prevista inicialmente, justifica-se
no apenas na perspectiva do interesse histrico, como tambm pelo contributo
epistemolgico que se considera poder ter. Ao olhar para o passado e ao traar um
percurso evolutivo da actividade em anlise, foi possvel compreender melhor o
momento presente.
Importa-nos expor o conceito genrico de tratamento de arquivo, pois,
tradicionalmente, a descrio entendida como sendo uma das suas fases. Assim,
quando falamos sobre o tratamento de arquivo, pensamos num conjunto de
actividades que se concretizam atravs de tarefas especficas. As actividades so: a
organizao (fsica e/ou intelectual), a classificao, a avaliao, a seleco, o
reacondicionamento, a aplicao de medidas de preservao e conservao e, entre
outras, a descrio arquivstica. 17 Algumas das actividades citadas implicam a
realizao de tarefas que intervm exclusivamente no suporte do documento, por
exemplo, a aplicao de medidas de preservao e conservao, outras, porm,
implicam a identificao, contextualizao e anlise de contedo e estrutura do
16
Cf. BONAL ZAZO, J. L. - La descripcin archivstica normalizada, origen, fundamentos, principios y tcnicas, p. 155. 17
O Dicionrio de Terminologia Arquivstica identifica dois tipos de tratamento: o Tratamento Arquivstico e o Tratamento Documental. Fornece, para o primeiro, a seguinte definio: Conjunto de procedimentos tcnicos que tm por objectivo a conservao, organizao, descrio e comunicao dos arquivos. Para o segundo: Conjunto de procedimentos tcnicos que tm por objectivo a conservao, organizao, descrio e comunicao de documentos e dos dados e informaes neles contidos. Cf. ALVES, Ivone [et al.], cit. 2, p. 97.
11
documento, assim como o estabelecimento de relaes entre este e outros recursos,
por exemplo, a descrio arquivstica.18
A propsito de tratamento documental em Arquivstica, a autora Fernanda
Ribeiro refere, evidenciando a dcalage existente entre a Biblioteconomia e a
Arquivstica: No campo da Biblioteconomia, as tcnicas de tratamento documental
esto suficientemente estudadas e tm uma aplicao generalizada (...). No campo da
Arquivstica, porm, as tcnicas de tratamento documental no esto devidamente
aprofundadas, nem as normas que existem tm aplicao consensual.19
De seguida, tenta-se, pois, clarificar o conceito de descrio, um dos mais
relevantes no presente trabalho. Assim, a descrio arquivstica consiste na
elaborao de uma representao exacta de uma unidade de descrio e das partes
que a compem, caso existam, atravs da recolha, anlise, organizao e registo de
informao que sirva para identificar, gerir, localizar e explicar a documentao de
arquivo, assim como o contexto e o sistema de arquivo que o produziu. Este termo
tambm se aplica ao resultado desse processo.20
Importa sublinhar que apesar do termo se aplicar actividade e ao resultado da
actividade, conforme descrito no pargrafo anterior, no mbito do presente estudo, o
nosso enfoque recai sobre a descrio enquanto actividade. Importa, igualmente,
referir que embora a actividade de descrio seja desenvolvida em qualquer estdio de
gesto de um arquivo (corrente, intermdio ou histrico), conforme refere a
especialista brasileira Georgete Rodrigues, a prtica actual est longe do cenrio ideal,
pois, a descrio acaba por ser, ainda, uma tarefa tpica dos arquivos permanentes.21
No que concerne ao nosso escopo de anlise, este est focado nos arquivos histricos.
18
Para uma viso mais alargada e detalhada da questo, veja-se, a propsito dos tipos de anlise documental, os propostos pelo Conselho Internacional de Arquivos: a anlise formal, a anlise dos contedos, a anlise de contexto e a anlise externa. 19
Cf. RIBEIRO, Fernanda - Indexao e controlo de autoridade em arquivos. [Em linha]. Disponvel em www.. p. 9. 20
Cf. DIREO-GERAL DE ARQUIVOS - Programa de Normalizao da Descrio em Arquivo; Grupo de Trabalho de Normalizao da Descrio em Arquivo - Orientaes para a Descrio Arquivstica. [Em linha]. Disponvel em WWW:. p. 300. 21
Cf. RODRIGUES, Georgete Medleg , orgs - Organizao e representao do conhecimento. [Em linha]. Introd. - A representao da informao em arquivstica: uma abordagem a partir da perspectiva da Norma Internacional de Descrio Arquivstica. Disponvel em
http://www.dgarq.gov.pt/files/2008/10/oda1-2-3.pdf
12
Durante dcadas, quer na prtica, quer no discurso terico, privilegiou-se a
descrio enquanto a) resultado de uma actividade concreta, b) e os seus objectivos, o
acesso informao. No entanto, ao longo destes mesmos anos, alguns autores
chamavam j a ateno para a importncia da descrio enquanto actividade.
Iniciamos a nossa abordagem diacrnica e sincrnica na dcada de 60, quando
o arquivista norte-americano, Theodore Schellenberg, embora atento actividade
subjacente descrio, dava maior enfoque aos instrumentos de descrio,
facilitadores do acesso aos arquivos. Tambm Antonia Heredia, arquivista espanhola e
sua discpula, defendeu a descrio como o conjunto das actividades necessrias para
produzir instrumentos que facilitassem o acesso aos fundos, ou seja, focando-se em b)
os seus objectivos, o acesso informao.22
Na dcada de 80, o Conselho Internacional de Arquivos (doravante designado
ICA) manteve o entendimento de Schellenberg, isto , considerou que a descrio
arquivstica era o produto resultante da actividade de descrever arquivos e no,
propriamente, uma actividade.23 Assim, no seguimento do que temos vindo a referir,
acresce explicitar que antes do surgimento de normas e segundo o especialista Bonal
Zazo, o entendimento de descrio estava assente numa das seguintes definies: 1) o
desenvolvimento da actividade; 2) o resultado da actividade, isto , os instrumentos de
descrio; e 3) o objectivo da descrio, isto , facilitar o acesso informao contida
nos documentos de arquivo.24 Apesar da existncia de trs definies, as aplicadas
comummente durante vrias dcadas, como j expusemos, foram as duas ltimas, ou
seja, a descrio entendida enquanto resultado final, materializado em instrumentos
de descrio, e a descrio entendida como o objectivo de comunicar o contedo dos
documentos.
Independentemente dos vrios entendimentos, os arquivos no descritos,
conforme afirmou Michel Duchein: so como o cofre do tesouro sem chave25, na
medida em que assim se tornam inacessveis e desconhecidos para os cidados.
www., p.212. 22
Cf. HEREDIA HERRERA, Antonia, cit. 6, p. 215. 23
Cf. BONAL ZAZO, Jos Luis, cit. 16, p. 156. 24
Cf. BONAL ZAZO, Jos Luis, cit. 16, p. 155. 25
Cf. DUCHEIN, M. cit. por HEREDIA HERRERA, Antonia, cit. 6, p. 216.
13
Cruz Mundet acrescentou: a descrio a parte culminante del trabajo
archivstico [...] encaminada a poner los documentos en servicio, es decir, hacer de ellos
un til disponible para la sociedad26 e a sua principal misso informar, tal como os
prprios documentos de arquivo.27
Podemos concluir que durante anos predominou uma certa indiferenciao
entre o que so os instrumentos de descrio documental28 e a actividade que permite
a sua produo. Porm, a partir de finais dos anos 90, a descrio arquivstica passou a
ser entendida e desenvolvida tambm numa outra perspectiva, como uma prtica,
uma actividade necessria para a produo de instrumentos e ferramentas que
permitem o conhecimento, o acesso, a recuperao e a divulgao da informao. Na
medida em que se trata de uma actividade que implica tcnicas e procedimentos
especficos, deu-se, ento, incio criao, traduo e ao desenvolvimento de normas
internacionais que orientam, regulam e normalizam a actividade.
Para a apreciao da actividade de descrio arquivstica orientada e
normalizada em Portugal, construmos o quadro infra (Quadro 2). Importa referir que
para a sua elaborao, partimos do entendimento da descrio arquivstica enquanto
actividade (Linha A); a partir da qual se realizam outras actividades que ocorrem
ligadas a objectos especficos, devendo estes ser descritos separadamente (Linha B);
tendo por base normas internacionais e documentos tcnicos e normativos nacionais,
especficos para a elaborao dos registos (Linhas C e D); e sendo criados, enquanto
produtos resultantes da actividade de descrio, instrumentos de descrio especficos
(Linha E). So ainda identificados os documentos tcnicos e normativos nacionais
existentes para a organizao, armazenamento, pesquisa e recuperao dos registos
(Linha F); e os produtos finais resultantes da organizao, em repositrios, onde so
armazenados os registos e a partir dos quais possvel realizar pesquisas e recuperar a
informao (Linha G) so apresentados em abstracto, para o caso dos Arquivos e em
concreto para as Entidades Produtoras de Arquivos.
26
Cf. CRUZ MUNDET, Jos Ramn Manual de archivstica, p. 255. 27
Cf. CRUZ MUNDET, Jos Ramn, cit. 26, p. 255. 28
Definio de instrumento de descrio documental: Documento segundo elaborado para efeitos de controlo e/ou comunicao, que descreve as unidades arquivsticas, acervos documentais ou coleces factcias. Os principais instrumentos de descrio so: roteiros, guias, inventrios, catlogos, registos e ndices. Cf. NP 4041. 2005, Informao e documentao - Terminologia Arquivstica, p. 18.
14
Foi nosso objectivo registar os dados recolhidos de forma sintetizada,
evidenciando, por um lado, como a aplicao das normas deve ser regida em funo
do objecto a descrever e, por outro lado, constatando a existncia/no existncia, at
ao presente, de normas internacionais e instrumentos tcnicos e normativos nacionais,
que apoiem a actividade no contexto nacional. Constitui, ainda, informao de
interesse relevante, as datas em que surgiram as primeiras edies, quer das normas
internacionais, quer dos documentos tcnicos e normativos nacionais (Linhas C, D e F),
na medida em que estes reflectem o modo como a actividade tem vindo a
desenvolver-se, bem como a preocupao e o enfoque que tem suscitado na
comunidade arquivstica.
Quadro 2: A actividade de descrio arquivstica orientada e normalizada em Portugal
A Actividade de primeiro nvel
Descrio arquivstica
B Objecto de descrio arquivstica
Arquivo Entidades produtoras
de arquivo Funes das
entidades
Entidades detentoras de
arquivo
C
Normas internacionais aplicadas na descrio arquivstica
ISAD(G): General International Standard Archival Description (1994)
EAD: Encoded Archival Description (1998)
ISAAR(CPF):International Standard Archival Authority Record for Corporate bodies, Persons and Families (1996) EAC: Encoded Archival Context (2004)
ISDF: International Standard for Describing Functions (2007)
ISDIAH: International Standard for Describing Institutions with Archival Holdings (2008)
D
Documentos tcnicos e normativos nacionais para a elaborao de registos de descrio arquivstica
Orientaes para a Descrio Arquivstica ODA (1999)
Orientaes para a Descrio Arquivstica ODA (1999)
- -
E Instrumentos resultantes da actividade
Registos de descrio documental
Registos de autoridades arquivsticas para entidades produtoras
Registos de autoridades arquivsticas para funes
Registos de autoridades arquivsticas para entidades detentoras
15
F
Documentos tcnicos e normativos nacionais para a organizao de registos
-
Modelo para um Ficheiro Nacional de Autoridades Arquivsticas (2008)
- -
G Produtos
Inventrio de arquivo Guia Catlogo, entre outros
Ficheiro Nacional de Autoridades Arquivsticas
- -
Relacionada com a actividade de descrio, apresentamos mais um conceito e
respectiva definio, em torno do qual o presente trabalho se desenvolve, e, por isso,
essencial para a sua compreenso o registo de autoridade arquivstica para as
entidades produtoras: forma autorizada do nome de uma entidade combinada com
outros elementos de informao que identificam e descrevem a entidade, podendo
remeter para outros registos de autoridade relacionados.29
Os autores Pedro Lpez Gmez e Olga Gallego (tericos de referncia da
Arquivstica espanhola) afirmaram, acerca da questo da provenincia e do contexto
de produo (onde? quando? porqu? e por quem? se produzem os documentos), que
a descrio dos fundos de arquivo uma enumerao dos seus atributos, que se
obtm analisando a sua provenincia, o tempo e o lugar da sua produo, as suas
origens funcionais, os assuntos a que se referem e os seus tipos de composio.30
Tambm o autor Luis Carlos Lopes escreveu que os documentos no podem ser
considerados isoladamente. A ligao ao seu produtor deve ser mantida, na medida
em que a informao arquivstica produzida dentro de um contexto especfico, no
seio de uma entidade, no mbito das suas funes e actividades.31
Bonal Zazo foi ainda mais longe e acrescentou que o nvel de detalhe e
profundidade da descrio depende de alguns factores, entre eles, a complexidade da
29
Cf. CONSELHO INTERNACIONAL DE ARQUIVOS ISAAR (CPF), cit. 11, p.13. 30
Cf. GALLEGO, Olga; LPEZ GMEZ, Pedro cit. por BONAL ZAZO, Jos Luis, cit. 16, p. 159. 31
Cf. LOPES, Lus Carlos cit. por BELLOTO, Helosa Liberalli - Como fazer anlise diplomtica e anlise tipolgica de documento de arquivo. [Em linha]. Disponvel em www: , p. 23.
http://www.arquivoestado.sp.gov.br/saesp/texto_pdf_17_Como%20fazer%20analise%20diplomatica%20e%20analise%20tipologica.pdfhttp://www.arquivoestado.sp.gov.br/saesp/texto_pdf_17_Como%20fazer%20analise%20diplomatica%20e%20analise%20tipologica.pdf
16
estrutura do fundo documental, determinada pela estrutura da entidade produtora e
pelas suas competncias.32
Conclui-se que so vrios os autores que atriburam entidade produtora um
papel determinante na compreenso, descrio e comunicao do respectivo arquivo.
Parece, pois, que a obrigatoriedade de contemplar as entidades produtoras e
os contextos de produo no estudo e na descrio dos arquivos indiscutvel. Porm,
importa questionar de que forma estes registos de descrio devem ser criados e
geridos e de que modo devem comunicar entre si. Assim, se por um lado, se acredita
que a necessidade de conhecer a entidade para o estudo do arquivo surge
naturalmente e , por conseguinte, mais do que evidente, por outro, importa reflectir
sobre a melhor forma de registar e transmitir a informao que se tem acerca da
entidade.
Mais adiante reflectiremos sobre a forma como entendemos ser necessrio
procurar, separar e estruturar a informao utilizada para a descrio das entidades
colectivas produtoras; quais as vantagens que podem advir da separao dos registos
de descrio, em funo do objecto descrito; e que outros interesses e propsitos
(para alm dos arquivsticos) podem ser atingidos com a criao e gesto de RAA
independentes, para as entidades colectivas produtoras.33
II.2. A descrio arquivstica em Portugal: do Instituto Portugus
de Arquivos Direco-Geral do Livro, dos Arquivos e das
Bibliotecas
nosso objectivo apresentar uma pequena sntese do percurso evolutivo da
descrio arquivstica, relacionando-a com a criao de RAA para as entidades
produtoras, isto , no pretendemos escrever a histria das prticas e polticas de
descrio arquivstica, mas sim olhar para os ltimos vinte anos da actividade em
Portugal e procurar compreend-la, relacionando-a com a realidade actual.
32
Cf. BONAL ZAZO, Jos Luis, cit. 16, p. 184. 33
Relativamente a esta questo, ver o Subcaptulo III.1 do presente trabalho.
17
Remonta-se, pois, ao incio da dcada de 90, quando o Instituto Portugus de
Arquivos (doravante designado IPA) 34 desenvolveu e testou a primeira aplicao
informtica de tratamento automtico de documentao histrica, a ARQBASE.35
Dando cumprimento s suas atribuies e competncias, nomeadamente na aplicao
de tcnicas de normalizao e tratamento informtico da documentao de arquivo, o
IPA no s utilizou e validou a ARQBASE no tratamento dos arquivos sua guarda,
como cedeu a aplicao a outras entidades e publicou o respectivo manual para a sua
utilizao36.
O lanamento de uma aplicao informtica pensada e desenvolvida
especificamente para a descrio arquivstica, tendo por base o modelo terico de
Michael Cook37, representou, no nosso entendimento, o primeiro grande passo dado
em Portugal, no mbito da descrio de documentao histrica, de forma
normalizada e automtica.
Anos depois, aps a extino do IPA, por fuso de meios humanos, financeiros
e da gesto dos servios dependentes, a entidade sucessora, Arquivos Nacionais /
Torre do Tombo (doravante designada AN/TT)38 teve por misso dar continuidade ao
trabalho iniciado e estudar, criar, desenvolver e aplicar prticas de descrio
arquivstica, tendo como objectivo contribuir para o progresso, equiparao e
normalizao das tcnicas de tratamento, concretamente de descrio, aplicadas aos
arquivos nacionais. Deste modo, pretendeu-se propiciar e potenciar a normalizao,
troca, partilha e disseminao da informao.39
34
O IPA foi a primeira instituio autnoma com atribuies no mbito da salvaguarda do patrimnio cultural do Estado e foi criada no seguimento da extino das Divises de Arquivos e de Servios de Documentao, do Departamento de Bibliotecas, Arquivos e Servios de Documentao do Instituto Portugus do Patrimnio Cultural. Para uma contextualizao mais alargada, ver: DECRETO-LEI n. 152/88. D.R. I Srie. 99; DECRETO-LEI n. 106-G/92. D.R. I-A Srie. Suplemento. 35
Ver FRANQUEIRA, Ana; GARCIA, Madalena; ANTNIO, Rafael - ARQBASE - Tratamento Automatizado de Documentao Histrica In ASSOCIAO PORTUGUESA DE BIBLIOTECRIOS, ARQUIVISTAS E DOCUMENTALISTAS - 2 Encontro Nacional de Arquivos Municipais. 36
FRANQUEIRA, Ana; GARCIA, Madalena, cit. 35. 37
O modelo terico dos britnicos Michael Cook e Margaret Procter, defende que existe uma hierarquia entre as entidades arquivsticas e, alm disso, que a cada uma delas deve corresponder uma unidade de descrio. Cf. COOK, Michael; PROCTER, Margaret - Manual of Archival Description. 38
Ver DECRETO-LEI n. 106-G/92. D.R. I-A Srie. Suplemento (relativo criao do AN/TT) e DECRETO-LEI n. 42/96. D.R. I-A Srie. 106 (que prev a extino do AN/TT). 39
Para uma sntese diacrnica dos principais momentos, ver: RUNA, L.; PENTEADO, P. Surfando de sigla em sigla. A DGARQ e a normalizao da descrio em Portugal. CONGRESO DE ARCHIVOS DE CASTILLA Y LON ACAL, p. 87-88. Agradecemos aos autores a cedncia do texto.
18
Foi tambm na dcada de 90 que surgiu a primeira edio da Norma
Internacional de descrio arquivstica ISAD(G)40, que aprovada pelo Conselho
Internacional de Arquivos (ICA) em 1994, foi traduzida para portugus logo no ano
seguinte, pela Associao Portuguesa de Bibliotecrios, Arquivistas e Documentalistas
(APBAD). Importa sublinhar, o facto desta verso portuguesa ter sido elaborada por
uma associao de profissionais a APBAD e no pela entidade que seria expectvel,
dadas as suas competncias e atribuies AN/TT. No obstante a constatao,
entendemos que tal ocorrncia no teve consequncias negativas na aceitao e
seguimento da ISAD(G), at porque a sua chegada j vinha sendo anunciada
comunidade arquivstica. disso exemplo o artigo de apresentao e divulgao da
primeira edio, publicado em 1994, na revista da Associao Portuguesa de
Bibliotecrios, Arquivistas e Documentalistas APBAD, intitulado Chegaram as
ISAD(G)41, de Ana Franqueira.
Em 2007, a Direco-Geral de Arquivos (doravante designada DGARQ),
enquanto rgo coordenador da poltica nacional de arquivos42, deu prossecuo ao
trabalho desenvolvido pelas entidades suas antecessoras (AN/TT e IAN/TT Instituto
dos Arquivos Nacionais / Torre do Tombo).
Assim, entendemos que, se por um lado o IPA um marco na histria da
descrio e normalizao em Portugal, na medida em que enceta os trabalhos e
discusses em torno das prticas de descrio e necessidade de normalizao, por
outro, o AN/TT, o IAN/TT e a DGARQ so, no nosso entendimento, as entidades que
assinalam a viragem, nomeadamente, atravs da transposio das tendncias e
prticas internacionais realidade nacional.43
Em 2000, por exemplo, foi criado o Programa de Normalizao da Descrio em
Arquivo (PNDA), dentro do IAN/TT, o qual implicou a constituio de um Grupo de
40
Cf. INTERNATIONAL COUNCIL ON ARCHIVES - ISAD(G): General international standard archival description. [Em linha]. 1 ed. Disponvel em WWW:
19
Trabalho, cujos principais objectivos eram: 1) Elaborar orientaes para a descrio
arquivstica; 2) Desenvolver aces de formao e divulgao das orientaes para a
descrio em arquivo, no mbito do IAN/TT e da comunidade arquivstica em geral; 3)
Elaborar pareceres relativos consistncia e coerncia das descries no mbito da
Rede Nacional de Arquivos; 4) Desenvolver o Ficheiro Nacional de Autoridades
Arquivsticas, a partir da criao de registos de autoridade propostos pelos servios
dependentes. 44
No mesmo ano, foi oficialmente apresentada a segunda verso da ISAD(G) 45,
cuja traduo portuguesa surgiu em 2004, elaborada por um Grupo constitudo pelo
IAN/TT e composto por arquivistas com experincias diversificadas.
A realidade demonstra que a normalizao da descrio arquivstica conquistou
uma posio de destaque na agenda da comunidade arquivstica internacional e,
naturalmente, da nacional, a partir do incio do milnio. Por ela e para ela produziram-
se estudos, artigos, documentos tcnicos e normativos, proferiram-se comunicaes
em eventos nacionais e internacionais.46
visvel a necessidade de normalizar a descrio de arquivos com a aplicao
da ISAD(G) e com as normas ISO relativas meta-informao descritiva47. Porm,
igualmente notria a associao e relao de dependncia da Norma Internacional de
Registo de Autoridade Arquivstica para Pessoas colectivas, Pessoas Singulares e
Famlias ISAAR(CPF) actual Rede Portuguesa de Arquivos (RPA).48
44
Cf. Despacho n. 54/GD/2004, de 11 de Junho, criado pelo IAN/TT. 45
Ver CONSELHO INTERNACIONAL DE ARQUIVOS - ISAD (G): Norma internacional de descrio arquivstica: [Em linha]. Disponvel em www: (consulta em 10-05-2012). 46
Veja-se, a ttulo de exemplo, a realizao de eventos internacionais com a participao portuguesa: CONGRESSO INTERNACIONAL DE ARQUIVOS. XV, Viena, 23 a 28 de agosto de 2004 - Arquivos, memrias e saberes; CONGRESO DE ARCHIVOS DE CASTILLA Y LON ACAL, V, Len, 2008. (participao de RUNA, L.; PENTEADO, P. Surfando de sigla em sigla. A DGARQ e a normalizao da descrio em Portugal). 47
Para informao relativa s normas ISO ver: CONSELHO INTERNACIONAL DE ARQUIVOS - ISAAR (CPF), cit. 11, p. 9. 48
A Rede Portuguesa de Arquivos uma rede da qual qualquer entidade, pblica ou privada, poder fazer parte, num processo comum de gesto, difuso e acesso dos seus documentos. Assim, tem como principal misso a divulgao do patrimnio arquivstico, tornando-o acessvel ao cidado, de forma rpida e eficaz. Atravs da sua articulao com outras redes de informao internacionais, como a EUROPEANA ou a APENET, a adeso a este repositrio permite a crescente divulgao e reconhecimento do patrimnio arquivstico. Para uma contextualizao diacrnica, veja-se: REAL, M. L. A Rede Nacional de Arquivos: um desafio no sculo XXI. Cadernos BAD, p. 36-59; CONSELHO SUPERIOR DE ARQUIVOS Para a Concepo e Planeamento da Rede Nacional de Arquivos. CSA/Doc.03/1999. [Em linha]. Disponvel em www.; DIRECO-GERAL DE ARQUIVOS - Rede Portuguesa de Arquivos (RPA): fundamentos para o seu desenvolvimento e
http://dgarq.gov.pt/files/2008/10/isadg.pdfhttp://dgarq.gov.pt/files/2008/10/csa_03.pdf
20
Relativamente ao surgimento da ISAAR(CPF), importa referir que em 1996 foi
lanada a primeira verso e em 2004 a segunda verso, cuja traduo para portugus
surgiu no mesmo ano e foi da responsabilidade do IAN/TT.
A aplicao da ISAAR(CPF) parece ter ficado consignada sombra permanente
das grandes mudanas de procedimentos e tcnicas que se impunham com a aplicao
da ISAD(G). Outra razo que pode justificar a marginalizao da ISAAR(CPF) face
ISAD(G), parece-nos ter que ver com o facto da segunda contemplar informao, tais
como os campos constituintes da Zona de Contexto, que esto cobertos tambm na
ISAAR(CPF).49
Actualmente, a Direco-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas
(DGLAB), que resulta da fuso da Direco-Geral do Livro e das Bibliotecas com a
Direco-Geral de Arquivos, tem, entre outras atribuies, a de assegurar a
coordenao do sistema nacional de arquivos50, o que garante a continuidade da
actividade da sua antecessora, DGARQ.
Para a Biblioteconomia, a elaborao de registos de autoridade bibliogrfica
uma prtica com mais de quarenta anos de existncia, imprescindvel, desenvolvida e
normalizada.51
gesto. Mdulo 1: Modelo Conceptual. [Em linha]. Disponvel em www..; DIRECO-GERAL DE ARQUIVOS - Rede Portuguesa de Arquivos (RPA): fundamentos para o seu desenvolvimento e gesto. Mdulo 2: modelo lgico. [Em linha]. Disponvel em www.; RUNA, Luclia; SOUSA, Joana Braga - Normalizar a descrio em arquivo: questionar, reflectir e aplicar. Cadernos A&B, p.80-108. 49
Relativamente s hipteses levantadas, trata-se de meras ilaes de nossa parte. No foi possvel validar ou contrariar estas ideias, mesmo assim, optmos por lanar as questes e especular sobre elas. No mbito deste trabalho -nos particularmente pertinente tentar perceber as razes que levaram (e ainda levam), no cenrio nacional, maior aceitao e utilizao de uma Norma ISAD(G) em relao a outra ISAAR(CPF). 50
Ver DECRETO-LEI n. 103/2012. D.R. I Srie. 95, que aprova a orgnica da Direco-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas. 51
Estamos cientes de que os princpios, metodologias e instrumentos de controlo de autoridade desenvolvidos e aplicados na actividade biblioteconmica poderiam constituir uma matria de elevado interesse no mbito do presente estudo, nomeadamente atravs da realizao de uma anlise comparativa face realidade Arquivstica. Porm, optmos por no entrar neste domnio, dada a ausncia de conhecimento cientfico sobre a matria e para benefcio e salvaguarda da economia do trabalho. Enquanto fonte citada e para uma melhor contextualizao, veja-se: Cf. CAMPOS, Maria Fernanda - Controlo de autoridades: novos contextos e solues. [Em linha]. Disponvel em: www.
http://dgarq.gov.pt/files/2008/10/rpa_mc.pdfhttp://dgarq.gov.pt/files/2008/10/rpa_ml.pdfhttp://www.google.com/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&frm=1&source=web&cd=1&ved=0CGYQFjAA&url=http%3A%2F%2Fpurl.pt%2F331%2F1%2Fdocs%2Fcomunicacao%2F12manha%2Fcontrolodeautoridade.doc&ei=QswSUNe9Jsy8iAeJwoGYAQ&usg=AFQjCNF9nlj2RRKekequBNalpr7co5RYmQ&sig2=GUj7jb0-JzOqTdJLU056Wghttp://www.google.com/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&frm=1&source=web&cd=1&ved=0CGYQFjAA&url=http%3A%2F%2Fpurl.pt%2F331%2F1%2Fdocs%2Fcomunicacao%2F12manha%2Fcontrolodeautoridade.doc&ei=QswSUNe9Jsy8iAeJwoGYAQ&usg=AFQjCNF9nlj2RRKekequBNalpr7co5RYmQ&sig2=GUj7jb0-JzOqTdJLU056Wghttp://www.google.com/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&frm=1&source=web&cd=1&ved=0CGYQFjAA&url=http%3A%2F%2Fpurl.pt%2F331%2F1%2Fdocs%2Fcomunicacao%2F12manha%2Fcontrolodeautoridade.doc&ei=QswSUNe9Jsy8iAeJwoGYAQ&usg=AFQjCNF9nlj2RRKekequBNalpr7co5RYmQ&sig2=GUj7jb0-JzOqTdJLU056Wghttp://www.google.com/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&frm=1&source=web&cd=1&ved=0CGYQFjAA&url=http%3A%2F%2Fpurl.pt%2F331%2F1%2Fdocs%2Fcomunicacao%2F12manha%2Fcontrolodeautoridade.doc&ei=QswSUNe9Jsy8iAeJwoGYAQ&usg=AFQjCNF9nlj2RRKekequBNalpr7co5RYmQ&sig2=GUj7jb0-JzOqTdJLU056Wg
21
Necessrio ser aguardar para saber se a aproximao formal e orgnica
estabelecida entre as bibliotecas e os arquivos, representar algumas mudanas nas
polticas e prticas arquivsticas, concretamente no que respeita descrio de
entidades produtoras, atravs de RAA, ou se, pelo contrrio, se vo manter como at
ao momento presente, pouco desenvolvidas e aplicadas.
Aguardar-se-, igualmente, pela contribuio e participao do rgo
coordenador, junto da comunidade arquivstica, para a clarificao, reflexo e
aprofundamento do conceito de tratamento de arquivo52, particularmente no que se
relaciona com a descrio de entidades produtoras de arquivos e com a criao de RAA
de forma independente (face aos registos de descrio documental) para as mesmas.
52
Ver a citao da autora Fernanda Ribeiro, no Subcaptulo II.1 (p.11) do presente trabalho.
22
Captulo III: Sobre as tcnicas de criao e gesto de registos de autoridades arquivsticas (RAA) para entidades colectivas produtoras de arquivos
III.1. A importncia da criao de RAA
No obstante a sua importncia no cmputo do trabalho, o presente captulo
foi aquele que nos levantou maiores dificuldades. Se para a Arquivstica, enquanto
rea cientfica, as bases tericas so poucas e ainda frgeis, para a temtica especfica
dos RAA pudemos contar apenas com parca bibliografia, na sua maioria artigos, que
tocam a questo sem a analisar em profundidade. Por outro lado, o facto de se ter
constatado a escassez de suporte terico, motivou-nos e levou-nos a pensar que
podemos estar a contribuir, modestamente, para a problematizao da questo e,
qui, para a discusso em torno da mesma.
No presente trabalho analisamos a descrio arquivstica, sobretudo, enquanto
actividade, mas j demos conta, no captulo anterior, que a mesma existe enquanto
actividade e, simultaneamente, como resultado da actividade. Identificmos e
explicitmos, igualmente, que a descrio arquivstica contempla vrios tipos de
descrio, dependendo do objecto/elemento a descrever, e que para orientar e
normalizar na elaborao dos registos, existem normas internacionais e, em alguns
casos, documentos tcnicos e normativos nacionais.
Entendendo-se o RAA para as entidades produtoras como um instrumento
resultante da actividade de descrio, especificamente aplicado a este objecto
entidades produtoras importou-nos reflectir sobre o RAA em conjunto com as
prticas e polticas de descrio documental, tentando entender a sua evoluo ao
longo dos anos, a ateno e preocupao que tm suscitado na comunidade
arquivstica internacional e nacional e o modo como estas prticas e polticas se
reflectem na criao de RAA independentes (em relao aos registos de descrio
documental aplicados a unidades arquivsticas).
Consideramos, pois, o estudo das entidades e a criao de RAA de inegvel
importncia para o conhecimento e compreenso dos arquivos, das actividades no
mbito das quais estes foram produzidos e, em ltima anlise, para a afirmao e
23
valorizao da Arquivstica, enquanto rea cientfica responsvel por prticas de
tratamento e difuso da histria e memria, pela produo e disponibilizao de
instrumentos que possibilitem a identificao dos arquivos e o acesso informao,
por parte do cidado.
A entidade observada neste trabalho como produtora de arquivos mas, fora
deste mbito, defendemos ser muito mais. A entidade per si, em nossa opinio, a
causa e a consequncia da histria, intervindo na mesma de forma activa. A entidade
representativa de momentos e pocas, sendo que a elaborao do RAA de forma
independente face a outros tipos de registo, para alm de poder perpetuar a histria e
memria da entidade, pode servir diferentes reas do saber e no, somente e
isoladamente, a Arquivstica. Entendemos que a elaborao do RAA para as entidades
produtoras no deve circunscrever-se ao contexto arquivstico, ao invs disso, deve ser
assumida e preconizada pela sua multiplicidade de interesses e possveis utilizaes. A
ttulo de exemplo, se considerarmos a elaborao de RAA para as entidades de gesto
e execuo das polticas cientficas nacionais entidades produtoras em estudo, no
mbito do presente trabalho para alm da finalidade arquivstica, de identificao e
descrio da entidade produtora e do estabelecimento das relaes entre esta e
outras entidades e entre esta e outros recursos, podemos ainda considerar o seu
interesse em possveis utilizaes para estudos na rea da Gesto Pblica,
particularmente, da Gesto da Cincia, e da Histria das polticas de cincia, do
progresso cientfico e desenvolvimento tecnolgico, no contexto nacional.
No que respeita relao entidade produtora arquivo, como j referimos
anteriormente, no possvel estudar e compreender documentos de arquivo sem o
conhecimento devido do seu contexto de produo, nomeadamente da sua
provenincia. 53 Do mesmo modo que defendemos no ser possvel ter um
conhecimento completo (orgnico e funcional; formal e informal) de uma entidade
sem o conhecimento devido dos documentos de arquivo por esta produzidos, que
53
Definio de provenincia, trata-se do princpio fundamental segundo o qual os arquivos de uma mesma provenincia no devem ser misturados com os de outra provenincia e devem ser conservados segundo a ordem primitiva, se esta existir. em virtude deste princpio que cada um dos documentos deve ser colocado no fundo do qual provm e, nesse fundo, no seu lugar de origem. Ver, para contextualizao mais aprofundada: ROUSSEAU, JEAN YVES; COUTURE, CAROL Os fundamentos da disciplina arquivstica, p.52-293.
24
atestam e provam aces, decises e, tambm, tramitaes internas de documentos e
relaes hierrquicas e funcionais, de outro modo no identificveis.
Partimos, pois, do pressuposto de que qualquer trabalho arquivstico deve
contemplar e analisar os trs elementos j referidos: arquivo, entidade produtora e
actividade, para os quais apresentmos definies no captulo introdutrio e
apresentamos, agora, um esquema representativo do modo com se relacionam entre
si:
Quadro 3: Relao entre arquivos, entidades produtoras e actividades
Estamos igualmente convictos de que os esforos desenvolvidos na
normalizao da descrio de documentos de arquivo 54 e na disseminao e
disponibilizao dos arquivos em rede55, que permitem o acesso informao de
forma eficaz e eficiente, tm dado resposta s principais necessidades do utilizador
mas no so ainda suficientes para dar resposta a todas as suas exigncias,
nomeadamente no que respeita identificao, estudo e acompanhamento da
evoluo das entidades produtoras de arquivos, s suas alteraes de nome, e /ou s
54
Para uma maior contextualizao, ver: PENTEADO, Pedro A normalizao em arquivos. Panormica nacional e internacional. [Em linha]. Disponvel em www: ; RUNA, Luclia Orientaes para a descrio arquivstica: normalizar para partilhar e recuperar. [Em linha]. Disponvel em: www: . 55
Existem vrios estudos e documentos produzidos neste mbito, que permitem uma abordagem diacrnica da questo em Portugal. Veja-se os que destacamos: REAL, M.L., cit. 48, p. 36-59; CONSELHO SUPERIOR DE ARQUIVOS, cit. 48; DIRECO-GERAL DE ARQUIVOS, cit. 48.
http://.culturadigital.pt/docs/dgarq_ppenteado.pdfhttp://www.apbad.pt/Downloads/congresso9/COM98.pdf
25
suas relaes de sucesso e de complementaridade funcional, entre outras que se
repercutem na correcta identificao e histria da entidade.
No presente trabalho, a razo principal que nos levou a reflectir acerca da
criao de RAA para as entidades produtoras de arquivos e a circunscrever esse estudo
s entidades colectivas pblicas, tem que ver com a dificuldade em acompanhar e
identificar, no universo das entidades da Administrao Pblica, as alteraes de
denominao, as transferncias de tutela, as extines e fuses de funes
desempenhadas56 e as relaes que estas entidades mantm com outras entidades
(produtoras e/ou detentoras) e outros recursos, tais como, funes e arquivos. Este
exerccio representa sempre um desafio e , ao mesmo tempo, incontornvel para a
salvaguarda e garantia dos direitos dos cidados57 e para a concretizao de vrias
aces desencadeadas pelos mesmos, nomeadamente a necessidade de se informar e
documentar acerca de um arquivo, de uma entidade, sua(s) antecessora(s) e
sucessora(s), e/ou de uma funo especfica. Por outro lado, se pensarmos
concretamente no arquivista e no desempenho da sua actividade, enquanto
profissional ao servio da informao, realamos a necessidade que este tem de
identificar e delimitar um fundo para a concretizao de tarefas como, por exemplo, a
avaliao e/ou a descrio documental.58
Contudo, apesar da importncia e das mais-valias que advm da elaborao e
difuso dos RAA, entendemos haver ainda muito trabalho a desenvolver para melhorar
a qualidade destes registos. Assim, to importante quanto a aceitao da sua
importncia e a prtica da sua criao, faz-lo com recurso a fontes credveis e que
permitam uma descrio das entidades de maneira no comprometida ou equivocada
face realidade.59
56
Ver, para um melhor enquadramento: Decreto-Lei n 200/2006, cit. 7. 57
Ver, para um melhor enquadramento e desenvolvimento: CASTELO, Cludia - Os arquivos como instrumento de controlo democrtico. APBAD. [Em linha]. Disponvel na WWW: . 58
O estudo e o entendimento da entidade produtora so necessrios no s para a descrio documental, como tambm para a avaliao. A aplicao dos critrios gerais para a conservao permanente ou eliminao de documentao depende disso. Os autores portugueses Fernanda Ribeiro e Malheiro da Silva tambm o defendem, atravs da identificao de tipos de indicadores para a avaliao e com os parmetros para a avaliao. Ribeiro, Fernanda - Novos caminhos da avaliao da informao.[Em linha]. Disponvel em: http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/artigo9821.PDF>. 59
Ver subcaptulos III.2 e IV.1, onde reflectimos sobre a questo e propomos um conjunto de fontes a consultar.
http://www.apbad.pt/Edicoes/EdicoesCongresso9.htm#Tema2http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/artigo9821.PDF%20.%20%20%20Consultado10
26
Remonta h sculos, conforme afirma a arquivista Fernanda Ribeiro, a prtica
de elaborao de instrumentos para o acesso informao: Ao longo da Idade Mdia
e do Antigo Regime tinham, essencialmente um carcter interno, em estreita ligao
com a funo servio que lhes era inerente *+ Com o despertar do interesse pelos
arquivos enquanto repositrios de fontes histricas, comea-se a assistir elaborao
de ndices.60 Atravs de ndices61 (onomsticos ou por outras vias), dava-se resposta
preocupao e misso de facilitar as buscas a bem do servio pblico, ou do interesse
de Partes.62 Por conseguinte, no estamos perante uma novidade dos tempos
modernos. Pensando especificamente nos ndices onomsticos, antes como agora,
foram pensados para listar e identificar produtores, de acordo com critrios de
ordenao e agrupamento pr-definidos, para efeitos de controlo, pesquisa e
recuperao de informao.
Contudo, conforme j referimos anteriormente, julgamos que no existe ainda
uma prtica regular de elaborao de RAA.63 Em nosso entendimento, duas das razes
que o podem justificar so: 1) a ideia generalizada, ainda presente, de que estamos
perante uma prtica tradicional aplicada Biblioteconomia e no Arquivstica, e 2) a
fraca adeso e utilizao da ISAAR(CPF), dada a existncia de uma Zona de Contexto,
que prev a descrio do produtor, na ISAD(G).
Sharon Thibodeau, no seu artigo intitulado Archival Context as Archival
Authority Record: The ISAAR(CPF), comea precisamente por distinguir os propsitos
e objectivos da ISAD(G) dos propsitos e objectivos da ISAAR(CPF). Afirma
peremptoriamente: The ISAD(G) establishes expectations for the description of the
archival material; the ISAAR(CPF) among other things provides guidance in
describing the records-creating context.64
60
RIBEIRO, Fernanda O acesso informao nos arquivos. Vol. I, p. 436. 61
Definio de ndice: Documento que regista, de acordo com uma ordenao pr-estabelecida (sequencial ou sistemtica), os descritores, designaes ou ttulos de um documento, acompanhados das correspondentes referncias de localizao ou cotas. Cf. ALVES, Ivone [et al.], cit. 2, p.57. 62
RIBEIRO, Fernanda, cit. 60, p.437 63
De acordo com o autor Thibodeau, os arquivos do Canad eram, data de produo do artigo, os arquivos melhor preparados para a aceitao da ISAAR(CPF). Cf. THIBODEAU, Sharon - Archival Context as Archival Authority Record: The ISAAR(CPF). Archivaria [Em linha]. Disponvel em www:, p. 80. 64
Cf. THIBODEAU, Sharon, cit. 63, p. 76.
http://journals.sfu.ca/archivar/index.php/archivaria/search/authors/view?firstName=Sharon&middleName=&lastName=Thibodeau&affiliation=&countryhttp://journals.sfu.ca/archivar/index.php/archivaria/search/authors/view?firstName=Sharon&middleName=&lastName=Thibodeau&affiliation=&country
27
Graas ao trabalho deste autor, foi-nos possvel retroceder um pouco no tempo
e apurar alguns factos sobre a actividade de descrio para as entidades produtoras de
arquivo, a sua aceitao na comunidade de arquivistas, bem como os seus
desenvolvimentos.
A descrio de entidades, conforme a percepcionamos e discutimos
presentemente (na forma de RAA), surgiu pela primeira vez documentada nos anos 60,
quando o arquivista Peter Scott descreveu as prticas do Commonwealth Archives
Office, Camberra (Austrlia). 65 Com a apresentao de um repositrio criado para
manter registos de entidades produtoras de arquivos, nomeadamente organizaes,
agncias e famlias, s quais os registos de descrio ao nvel das sries documentais
esto ligados, a questo da descrio das entidades produtoras e do contexto de
produo dos fundos documentais afirmou-se perante a comunidade arquivstica. O
mtodo australiano consistia num sistema em que os registos de descrio das
unidades arquivsticas incluam um ponto de acesso66, utilizado para estabelecer a
ligao com os respectivos registos das entidades suas produtoras.
A partir da experincia australiana, o reconhecimento do potencial dos
ficheiros de autoridades arquivsticas, criados a partir de um conjunto de RAA, para a
troca e recuperao de informao sobre arquivos, foi rapidamente aceite pela
comunidade arquivstica internacional. Porm, os formatos ento disponveis
aqueles que eram utilizados em bibliotecas , no respondiam s necessidades de
informao para as entidades produtoras de arquivos, nomeadamente os dados
contextuais que deveriam estar associados forma autorizada do nome de uma
entidade. O MARC-AMC (Machine-Readable Cataloging Archival and Manuscripts
Control) representa um exemplo de novo formato para o registo de informao
relacionada com entidades produtoras de arquivo, nos finais da dcada de 80, pensado
para a troca de informao automatizada.67
65
O Commonwealth Archives Office, Camberra, surgiu nos incios da dcada de 60, na Austrlia. O seu surgimento aconteceu aps a separao formal das bibliotecas e dos arquivos nacionais, passando as bibliotecas a denominar-se National Library of Australia e os arquivos de Commonwealth Archives Office. 66
Definio de ponto de acesso: Nome, termo, palavra-chave, expresso ou cdigo que pode ser utilizado para pesquisar, identificar e localizar descries arquivsticas, incluindo registos de autoridade., Cf. CONSELHO INTERNACIONAL DE ARQUIVOS - ISAAR (CPF), cit. 11, p. 13. 67
Cf. CAMPOS, Maria Fernanda, cit. 51.
http://en.wikipedia.org/wiki/National_Library_of_Australia
28
Passados alguns anos, em 1986, David Bearman e Richard Lytle desafiam os
leitores da revista Archivaria a aproveitar as mais-valias da aplicao do princpio da
provenincia, nomeadamente para a delimitao dos fundos e estudo dos mesmos,
tratando a descrio de entidades produtoras como RAA, nos seus sistemas de
informao de arquivo.
Tambm Cook se pronunciou, considerando a criao destes RAA como a
soluo para vrios problemas postos aos arquivistas, no que concerne definio e
demarcao dos fundos documentais. Valorizou, do mesmo modo, a potencialidade da
criao de RAA enquanto pontos de acesso, atravs dos quais era possvel estabelecer-
se ligaes e relaes permanentes. Afirma a este propsito: The creator is described,
and all the records in all media are described, and then the two are linked. The result
of this global or holistic linkage ultimately, one hopes, across archival institutions is
the fonds, physically and conceptually.68
Cremos, por conseguinte, que a aceitao da importncia da criao de RAA
para as entidades produtoras no questionada, j que depois de Scott, outros
arquivistas se pronunciaram, apoiando e reafirmando a ideia deste precursor. Cook
(como j referimos), Bearman, Evans, Lytle, Roe, Stibbe e Szary so alguns dos nomes
que aqui identificmos.69
Na dcada de 90, precisamente em 1993, o Grupo Ad Hoc Comission on
Descriptive Standards, criado pelo Conselho Internacional de Arquivos em finais da
dcada de 80, com a misso de elaborar as normas aplicveis descrio arquivstica,
considerou o RAA para as entidades produtoras um ponto de acesso essencial para a
recuperao de registos documentais.70 Poucos anos depois, em 1996, surgiu a
primeira verso da ISAAR(CPF) e em finais de 2003 era publicamente apresentada a
segunda, cuja edio se concretizou em 2004.
Perante objectos diferentes e normas de descrio que assumem essa mesma
diferena, sublinhamos novamente, que a descrio de documentos e de entidades
produtoras deveriam gerar registos de descrio distintos mas relacionveis entre si
68
Cf. COOK, Terry cit. por THIBODEAU, Sharon, cit. 63, p.78. 69
Cf. COOK, Terry cit. por THIBODEAU, Sharon, cit. 63, p.78. 70
Para a recolha de factos, nomeadamente, posies assumidas pelos autores, datas e trabalhos desenvolvidos optmos por resumir e traduzir o artigo de Sharon Thibodeau. Cf. THIBODEAU, Sharon, cit. 63, p.75-79.
29
atravs de pontos de acesso. Ambos os registos so necessrios para que haja
reciprocidade de correctos entendimentos aplicados aos objectos em anlise, isto , s
entidades produtoras de arquivo, aos respectivos arquivos e, ainda, s relaes
estabelecidas entre estes dois grupos.
A par da definio j explanada anteriormente71, olhamos para o RAA para a
entidade produtora (independentemente de se tratar de uma entidade colectiva,
entidade singular ou famlia), como para um carto do cidado. No caso, identifica e
distingue a entidade de outras entidades, no s atravs da informao registada no
campo Forma autorizada do nome mas, pelas demais informaes existentes em
campos propostos pela ISAAR(CPF), como por exemplo: as Datas de existncia; a
Histria; os Locais; o Status Legal; as Relaes (possveis entre entidades ou entre
entidades e outros recursos), entre outros.72
Importa-nos sublinhar a independncia e autonomia que ambos os registos
devem ter, um face ao outro. Deve existir uma relao de complementaridade entre
ambos, sem que isso obrigue constituio de um registo nico ou a dois com
replicao de informao.73
Justificamos a criao de RAA para as entidades produtoras de forma
independente por razes vrias, relacionadas com: 1) os vrios tipos de objectos
passveis de serem descritos, na medida em que para tipos de objectos diferentes,
devem elaborar-se registos de descrio diferentes; 2) a estruturao, organizao e
apresentao da informao, pois objectos distintos representam e levam criao de
informao distinta; 3) a responsabilidade social, nomeadamente na identificao,
salvaguarda e comunicao dos arquivos produzidos pelas entidades colectivas
pblicas74, na medida em que, conhecendo-se os arquivos existentes e reconhecendo-
71
Para consulta da definio de RAA j citada, ver Subcaptulo II.1 do presente trabalho. 72
Optmos por enumerar, nesta fase do trabalho, os campos conforme propostos na ISAAR(CPF), porm esta questo ser desenvolvida no Subcaptulo IV.1, onde apresentaremos os princpios, critrios e a metodologia para a elaborao de RAA, que sugerem algumas alteraes ao aqui referenciado. 73
Qualquer replicao de informao acaba por causar redundncia e pode causar rudo na recuperao e compreenso da informao. 74
Para melhor entendimento, veja-se a definio de arquivo pblico: 1 - produzido por uma pessoa de direito pblico; 2- propriedade de uma pessoa de direito pblico, no podendo ser transmitido ou onerado pelos modos do direito privado. So imprescritveis, inalienveis e impenhorveis; 3 consultvel pelo pblico. Nesta acepo, ope-se a arquivo reservado; 4 -de uma pessoa de direito pblico.. Cf. ALVES, Ivone [et al.], cit. 2, p.10.
30
se o seu valor enquanto patrimnio histrico e cultural, mais facilmente podero ser
desenvolvidas medidas que visem a sua proteco, tratamento e difuso.
Acreditamos, pois, que a elaborao de RAA para as entidades produtoras
permite a concretizao das se