a importância da justiça militar do rio grande do sul no controle da

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1 A IMPORTÂNCIA DA JUSTIÇA MILITAR DO RIO GRANDE DO SUL NO CONTROLE DA DISCIPLINA E DA HIERARQUIA DOS POLICIAIS DA BRIGADA MILITAR NA PERCEPÇÃO DOS JUÍZES, PROMOTORES DE JUSTIÇA, DEFENSORES PÚBLICOS E ADVOGADOS QUE ATUAM NA JUSTIÇA CASTRENSE GAÚCHA André Flores Coronel 1 Sumário: 1 Introdução. 2 Hierarquia e Disciplina como princípios basilares da Brigada Militar 3 A importância da Justiça Militar na preservação dos princípios fundamentais da Brigada Militar. 3.1 Discussões sobre a razão de existir. 3.2 Análise de dados da pesquisa. 4 Considerações Finais. Referências. RESUMO: O presente trabalho de conclusão de curso tem por objetivo a elaboração de artigo científico, requisito obrigatório para conclusão do Curso de Especialização em Políticas e Gestão em Segurança Pública, da Academia de Polícia Militar do Estado do Rio Grande do Sul. O objetivo geral é demonstrar a importância da Justiça Militar do Rio Grande do Sul no controle da disciplina e da hierarquia dos policiais da Brigada Militar na percepção dos juízes, promotores de justiça, defensores públicos e advogados que atuam na Justiça castrense gaúcha. O método é o dedutivo. A pesquisa tem natureza aplicada. A forma de abordagem do problema é qualitativa. Em relação aos objetivos, a pesquisa é exploratória. Os procedimentos técnicos adotados são bibliográfico, documental e de levantamento. Conclui-se que a Justiça Militar do Rio Grande do Sul é importante no controle da disciplina e da hierarquia dos policiais da Brigada Militar na percepção dos juízes, promotores de justiça, defensores públicos e advogados que atuam na Justiça castrense gaúcha. A toda evidência, pode-se pinçar de forma sólida as características que expressam a importância da Justiça Militar no tema proposto, que são o rigorismo, a celeridade processual e o escabinato. Palavras-chave: Justiça Militar. Disciplina. Hierarquia. Brigada Militar. ABSTRACT: This course conclusion work aims at the development of a scientific article, mandatory requirement for conclusion of specialization course in policy and management of public security, the Academy of Military Police of Rio Grande do Sul state. The overall objective is to demonstrate the importance of Justice of Rio Grande do Sul Military in control of discipline and hierarchy of officers of the Military Brigade in the perception of Judges, Prosecutors, Public Defenders and Lawyers working in the state's castrense Justice. The method is deductive. Research has applied nature. The way to approach the problem is qualitative. In relation to its objectives, the research is exploratory. The adopted technical procedures are bibliographical, documentary and lifting. We conclude that Justice Rio Grande do Sul's Military is important in the control of discipline and hierarchy of officers of the Military Brigade in the perception of Judges, Prosecutors, Public Defenders and Lawyers 1 Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Especialista em Direito Penal pela Universidade Federal no Rio Grande do Sul. Secretário de Juiz do TJM/RS. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Academia de Polícia Militar da Brigada Militar, como requisito parcial para conclusão do Curso de Especialização em Políticas e Gestão em Segurança Pública. Orientador Metodológico: Cap QOEM Gyovanni Bortolini Machado, Mestre em Direito Ambiental pela Universidade de Caxias do Sul, 2013.

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1

A IMPORTÂNCIA DA JUSTIÇA MILITAR DO RIO GRANDE DO SUL NO

CONTROLE DA DISCIPLINA E DA HIERARQUIA DOS POLICIAIS DA BRIGADA

MILITAR NA PERCEPÇÃO DOS JUÍZES, PROMOTORES DE JUSTIÇA,

DEFENSORES PÚBLICOS E ADVOGADOS QUE ATUAM NA JUSTIÇA

CASTRENSE GAÚCHA

André Flores Coronel1

Sumário: 1 Introdução. 2 Hierarquia e Disciplina como princípios

basilares da Brigada Militar 3 A importância da Justiça Militar na

preservação dos princípios fundamentais da Brigada Militar. 3.1

Discussões sobre a razão de existir. 3.2 Análise de dados da pesquisa. 4

Considerações Finais. Referências.

RESUMO: O presente trabalho de conclusão de curso tem por objetivo a elaboração de artigo

científico, requisito obrigatório para conclusão do Curso de Especialização em Políticas e Gestão em

Segurança Pública, da Academia de Polícia Militar do Estado do Rio Grande do Sul. O objetivo geral

é demonstrar a importância da Justiça Militar do Rio Grande do Sul no controle da disciplina e da

hierarquia dos policiais da Brigada Militar na percepção dos juízes, promotores de justiça, defensores

públicos e advogados que atuam na Justiça castrense gaúcha. O método é o dedutivo. A pesquisa tem

natureza aplicada. A forma de abordagem do problema é qualitativa. Em relação aos objetivos, a

pesquisa é exploratória. Os procedimentos técnicos adotados são bibliográfico, documental e de

levantamento. Conclui-se que a Justiça Militar do Rio Grande do Sul é importante no controle da

disciplina e da hierarquia dos policiais da Brigada Militar na percepção dos juízes, promotores de

justiça, defensores públicos e advogados que atuam na Justiça castrense gaúcha. A toda evidência,

pode-se pinçar de forma sólida as características que expressam a importância da Justiça Militar no

tema proposto, que são o rigorismo, a celeridade processual e o escabinato.

Palavras-chave: Justiça Militar. Disciplina. Hierarquia. Brigada Militar.

ABSTRACT: This course conclusion work aims at the development of a scientific article, mandatory

requirement for conclusion of specialization course in policy and management of public security, the

Academy of Military Police of Rio Grande do Sul state. The overall objective is to demonstrate the

importance of Justice of Rio Grande do Sul Military in control of discipline and hierarchy of officers

of the Military Brigade in the perception of Judges, Prosecutors, Public Defenders and Lawyers

working in the state's castrense Justice. The method is deductive. Research has applied nature. The

way to approach the problem is qualitative. In relation to its objectives, the research is exploratory.

The adopted technical procedures are bibliographical, documentary and lifting. We conclude that

Justice Rio Grande do Sul's Military is important in the control of discipline and hierarchy of officers

of the Military Brigade in the perception of Judges, Prosecutors, Public Defenders and Lawyers

1 Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Especialista em Direito Penal

pela Universidade Federal no Rio Grande do Sul. Secretário de Juiz do TJM/RS. Trabalho de Conclusão de

Curso apresentado à Academia de Polícia Militar da Brigada Militar, como requisito parcial para conclusão do

Curso de Especialização em Políticas e Gestão em Segurança Pública. Orientador Metodológico: Cap QOEM

Gyovanni Bortolini Machado, Mestre em Direito Ambiental pela Universidade de Caxias do Sul, 2013.

2

working in the state's castrense Justice. The entire evidence, we can clamp solidly the following

characteristics that express the importance of Military Justice in the proposed theme: rigor, promptness

and escabinato.

Keywords: Military Justice. Discipline. Hierarchy. Military Brigade.

1 INTRODUÇÃO

A Brigada Militar, segundo § 5.º do artigo 144 da Constituição Federal, é o órgão

responsável pela polícia ostensiva e pela preservação da ordem pública no Rio Grande do

Sul2, sendo a hierarquia e a disciplina sua base institucional, conforme dispõe o artigo 12 da

Lei n.º 10.990/97.3

Não obstante, como em qualquer agrupamento humano, encontram-se no meio militar

bons (grande maioria) e maus profissionais. Tal como na vida em sociedade, é essencial coibir

por meio de leis, processos, julgamentos e em sentenças precodificadas a ação do malfeitor,

no permanente interesse do bem comum.4

Imperioso realçar que a discussão sobre o comportamento dos policiais militares não

está restrita somente à caserna, na medida em que a sociedade e a mídia, diariamente, vêm se

defrontando e propagando notícias sobre a má conduta de policiais em todo o Brasil.

Releva, ainda, mencionar que a manutenção da Justiça castrense no Rio Grande do

Sul, atualmente, está sendo questionada na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, por

meio da proposta de Emenda Constitucional n.º 241/2015.5

Nessa perspectiva, é fundamental para a Corporação verificar a importância da Justiça

Militar do Rio Grande do Sul como instrumento de controle da disciplina e da hierarquia dos

policiais da Brigada Militar, algo que corresponde ao problema da presente pesquisa.

Destarte, o objetivo geral do presente artigo é demonstrar a importância da Justiça

Militar do Rio Grande do Sul no controle da disciplina e da hierarquia dos policiais da

Brigada Militar na percepção dos juízes, promotores de justiça, defensores públicos e

advogados que atuam na Justiça castrense gaúcha.

2 BRASIL. Constituição Federal da República Federativa do Brasil. Disponível em

http://www4.planalto.gov.br/legislação. Acesso em: 10 ago. 2015. 3 Estado do Rio Grande do Sul. Lei nº 10.990/97. Estatuto dos servidores militares do Rio Grande do Sul.

www.al.rs.gov.br/legis/. Acesso em: 10 ago. 2015. 4 A importância da Justiça Militar da União na preservação da hierarquia e da disciplina das Forças Armadas.

5 Projeto de Emenda à Constituição de autoria do Deputado Estadual Pedro Ruas que extingue a Justiça Militar

do Estado do Rio Grande do Sul e dá outras providências.

3

Para isso, o método utilizado será o dedutivo. Do ponto de vista dos objetivos, será

exploratória. Do ponto de vista da natureza, será básica. Do ponto de vista da forma de

abordagem do problema, a pesquisa será quantitativa. Por fim, do ponto de vista dos

procedimentos técnicos, será bibliográfica e de levantamento, por meio de um questionário

semiestruturado.

Com efeito, busca-se neste estudo direcionar a pesquisa a profissionais civis, evitando

a percepção sobre o tema por parte dos policiais militares, uma vez que não raras vezes são

alcançados pela Justiça Militar, seja como jurisdicionados ou até mesmo, no caso dos oficiais,

como juízes militares.

As vantagens e os benefícios que a pesquisa irá proporcionar revestem-se em ser um

trabalho científico capaz de sedimentar a posição da Brigada Militar sobre o assunto. Além

disso, as possíveis contribuições teóricas evidenciam-se no fato de eliminar posições políticas

ideológicas sobre a importância da Justiça Militar do Estado para o controle da hierarquia e da

disciplina dos policiais da Brigada Militar.

Registre-se que o resultado da pesquisa será apresentado à Academia de Polícia

Militar da Brigada Militar, como requisito parcial para conclusão do Curso de Especialização

em Políticas e Gestão em Segurança Pública.

Ademais, é de suma relevância para os gestores máximos da Corporação que tenham

conhecimento mais aprofundado sobre a importância da Justiça Militar no controle da

disciplina e da hierarquia de seus pares e subordinados.

Ainda, o problema a ser estudado tem a possibilidade de contribuir com o

desenvolvimento de outros trabalhos afetos ao tema.

Como justificativa pessoal, além do interesse desenvolvido pela matéria e a

necessidade de maior conhecimento na área, resta salientar a importância do tema, visto ser

premente o pouco conhecimento que o público interno e o externo da Instituição têm sobre a

influência da Justiça Militar do Estado no Controle da hierarquia e da disciplina dos policiais

militares.

Por fim, nesse momento de discussão pública e política sobre a importância da Justiça

Militar no Rio Grande do Sul, é imperioso que não só a Instituição possa ter dados balizados e

atualizados da Justiça Castrense e seus reflexos na Corporação, mas também a sociedade em

geral.

4

2. HIERARQUIA E DISCIPLINA COMO PRINCÍPIOS BASILARES DA BRIGADA

MILITAR

Inicialmente, destaca-se a necessidade de se realizar uma análise acerca do conceito e

das características dos princípios, uma vez que é fundamental a sua relevância para a

pesquisa.

A palavra “princípio” vem do latim “principium”, que significa, numa acepção vulgar,

início, começo, origem das coisas. Na ideia de Luís Diez Picazo, citado por Bonavides, “onde

designam as verdades primeiras”, bem como têm os princípios, de um lado, “servido de

critério de inspiração às leis ou normas concretas desse Direito positivo” e, de outro, de

normas obtidas “mediante um processo de generalização e decantação dessas leis”.6

Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, princípio é, por definição, mandamento

nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre

diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para exata compreensão e

inteligência delas, exatamente porque define a lógica e a racionalidade do sistema normativo,

conferindo-lhe a tônica que lhe dá sentido harmônico. Adverte o autor que violar um princípio

é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não

apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos.7

Conforme Robert Alexy, princípios são normas que ordenam algo que, relativamente

às possibilidades fáticas e jurídicas, seja realizado em medida tão alta quanto possível.

Princípios são, segundo isso, mandamentos de otimização, assim caracterizados pelo fato de a

medida ordenada de seu cumprimento depender não só das possibilidades fáticas, mas

também das jurídicas.8

Na visão de Canotilho, princípios são normas jurídicas impositivas de uma otimização

compatíveis com vários graus de concretização, consoante os condicionamentos fáticos e

jurídicos. Para o mestre português, os princípios se distinguem das regras pelo fato de estas

últimas serem “normas que prescrevem imperativamente uma exigência (impõe, permitem ou

proíbem) que é ou não cumprida”.9

6 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 228- 229.

7 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.

8 ALEXY, Robert, apud Alexandre. Princípio da supremacia do interesse público sobre o privado: destruição,

reconstrução ou assimilação? Revista Jurídica Consulex, ano XXII, n. 267, p. 63, 2008. 9 Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 6. ed., p. 1147, Almedina APUD ABOUD, Alexandre.

Princípio da supremacia do interesse público sobre o privado: destruição, reconstrução ou assimilação? Revista

Jurídica Consulex. Ano XXII. Nº 267. Ano 2008. p. 63.

5

Consoante os estudos de Dworkin, no caso de colisão entre regras, uma delas deve ser

considerada inválida. Os princípios, ao contrário, não determinam absolutamente a decisão,

mas somente contêm fundamentos que devem ser conjugados com outros fundamentos

provenientes de outros princípios. Daí a afirmação de que os princípios, ao contrário das

regras, possuem uma dimensão de peso demonstrável na hipótese de colisão entre princípios,

caso em que o princípio com peso relativo maior se sobrepõe a outro, sem que este perca sua

validade.10

Por fim, José Afonso da Silva diz que os princípios são verdadeiras ordenações que se

irradiam e imantam os sistemas de normas, ou são “núcleos de condensações nos quais

confluem valores e bens constitucionais”. Assim, os princípios, que começam por ser a base

de normas jurídicas, podem estar positivamente incorporados, transformando-se em normas-

princípios e constituindo preceitos básicos da organização constitucional.11

Assim, apoderando-se dos ensinamentos dos ínclitos autores, passa-se a estudar de

forma aprofundada os princípios da hierarquia e da disciplina, que fundamentam as

instituições militares e as relações de seus membros, compreendendo, por óbvio, a Brigada

Militar, como adiante se verá.

O autor Marcelino Fernandes da Silva, ao abordar a relevância da hierarquia e da

disciplina para os órgãos militares, citando a Roma Antiga, destaca:

A ordenação da convivência entre os diferentes níveis hierárquicos exige o rigor da

disciplina e a obediência irrestrita às ordens superiores. O respeito a tais princípios é

a base da sustentação das instituições militares.

A relação de subordinação hierárquica não reduz o subordinado à condição

meramente servil, mas conduz à ordem e disciplina, não impedindo, contudo, que o

militar, que se sinta humilhado ou ofendido em sua dignidade, possa recorrer ao

comando imediatamente superior para que solucione a questão.

Desde épocas mais remotas, passando pelas Fortalezas de Castro, em Roma, até os

nossos dias, qualquer Força Armada necessita estar alicerçada nestes dois pilares

fundamentais: hierarquia e disciplina.12

Segundo o referido autor, para as organizações militares a hierarquia e a disciplina são

pedras angulares, ou seja, são verdadeiros sustentáculos da Administração Militar. Destaca,

ainda, que estes princípios são indisponíveis por serem de ordem pública.

10

DWORKIN, Ronald. Taking Rights Seriouly. 6.ª tiragem. p. 26 APUD ÁVILA, Humberto. Teoria dos

Princípios. 9.ª ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2009. p. 37. 11

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 12. ed. São Paulo : Malheiros, 1996. 12

SILVA, Marcelino Fernandes da. Apud Antônio Pereira Duarte. Revista Direito Militar, n. 99.

Janeiro/Fevereiro 2013. A indisponibilidade dos princípios da hierarquia e da disciplina nas instituições

militares. p. 28.

6

No Brasil, as Forças Armadas, as Polícias Militares e os Corpos de Bombeiros

Militares são instituições públicas organizadas com base na hierarquia e na disciplina,

conforme dispõe, expressamente, a Constituição Federal de 1988, in verbis:

Art. 42. Os membros das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares,

instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina, são militares dos

Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.

[...]

Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela

Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com

base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da

República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e,

por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.

Segundo Ythalo Frota Loureiro, na legislação militar os princípios da hierarquia e da

disciplina são a base institucional das Forças Armadas, das Polícias Militares e dos Corpos de

Bombeiros Militares. Sendo assim, a Constituição Federal de 1988 teve o interesse especial de

dispor que as instituições militares são organizadas com base naqueles princípios.13

Roberto Carlos do Vale Ferreira, ao discorrer sobre as polícias militares, observa que a

razão está com o legislador constituinte, que, de forma livre, democrática e republicana,

reiterou a destinação dessas instituições estaduais, sujeitando-as aos rígidos e indispensáveis

princípios da hierarquia e da disciplina militar e, portanto, vedando-lhes a greve e a

sindicalização, dentre outros direitos, em tese, permitidos aos civis, forças especiais que o

são.14

Nesse passo, em consonância com a Constituição Federal, o legislador gaúcho tratou

de reforçar em várias passagens no Estatuto dos Servidores Militares da Brigada Militar do

Rio Grande do Sul que as bases mestras da Brigada Militar são a hierarquia e a disciplina, in

verbis:

Art. 2.º - A Brigada Militar, instituída para a preservação da ordem pública no

Estado e considerada Força Auxiliar, reserva do Exército Brasileiro é instituição

permanente e regular, organizada com base na hierarquia e na disciplina, sob a

autoridade suprema do Governador do Estado.

[...]

Art. 12 - A hierarquia e a disciplina militares são a base institucional da Brigada

Militar, sendo que a autoridade e a responsabilidade crescem com o grau

hierárquico.

§ 1.º - A hierarquia militar é a ordenação da autoridade em níveis diferentes, dentro

da estrutura da corporação, sendo que a ordenação se faz por postos ou graduações

e, dentro de um mesmo posto ou de uma mesma graduação, se faz pela antiguidade

13

LOUREIRO, Ythalo Frota. Princípios da hierarquia e da disciplina aplicados às instituições militares. Jus

Navigandi, Teresina, ano 9, n. 470, 20 out. 2004. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/5867>. Acesso

em: 10 Ago. 2015. 14

FERREIRA, Roberto Carlos do Vale. Militares Estaduais imperativo da Segurança Pública. Interesses

Criminosos querem a sua extinção. Revista Direito Militar. Nº 107. Maio/Junho de 2014. p. 18.

7

no posto ou na graduação, consubstanciada no espírito de acatamento à sequência de

autoridade.

§ 2.º - A disciplina militar é a rigorosa observância e o acatamento integral das leis,

regulamentos, normas e disposições que fundamentam o organismo policial-militar e

coordenam o seu funcionamento regular e harmônico, traduzindo-se pelo

cumprimento do dever por parte de todos e de cada um dos seus componentes.

§ 3.º - A disciplina militar e o respeito à hierarquia devem ser mantidos entre

servidores militares da ativa, da reserva remunerada e reformados.

[...].

Art. 29 - Os deveres policiais-militares emanam do conjunto de vínculos que ligam o

servidor militar à sua corporação e ao serviço que a mesma presta à comunidade, e

compreendem:

IV - a disciplina e o respeito à hierarquia.15

Desse modo, como se vê, existe um arcabouço jurídico em nível constitucional e

reprisado exaustivamente na legislação infraconstitucional estadual que reforça a necessidade

de preservação dos princípios da hierarquia e da disciplina na Brigada Militar, permeando

todas as suas atividades, especialmente a de polícia ostensiva e a da preservação da ordem

pública.

Nessa linha, sublinha Marcelino Fernandes da Silva que a hierarquia e a disciplina

militares são princípios constitucionais de caráter fundamentalista, pois constituem a base das

organizações militares. E, como princípios fundamentalistas, condensam os valores militares,

como o respeito à dignidade da pessoa humana, o patriotismo, o civismo, o profissionalismo,

a lealdade, a constância, a verdade real, a honra, a honestidade e a coragem. São princípios

que pretendem dar máxima eficácia às instituições militares, pois é inconteste que a hierarquia

e a disciplina militares conferem melhor eficiência às instituições que lidam com o controle

da violência.16

A hierarquia e a disciplina constituem a base das organizações militares e condensam

todos os valores da função militar, imprescindíveis para o exercício das atividades ligadas ao

manejo da violência e da segurança. Pode-se dizer, a exemplo do que foi lembrado ao tratar-se

especificamente da disciplina militar, que a manutenção da disciplina interessa não só ao

Estado, mas também ao próprio militar que, ao se ajustar às exigências disciplinares, tem a

esperança de que todos cumprirão seus deveres.17

15

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Lei n.º 10.990/97. Disponível em:

http://www.al.rs.gov.br/legiscomp/arquivo.asp?Rotulo=Lei%20Complementar%20n%BA%2010990&idNorma=

245&tipo=pdf. Acesso em: 10 ago. 2015. 16

SILVA, Marcelino Fernandes da. Apud Antônio Pereira Duarte. Revista Direito Militar nº 99.

Janeiro/Fevereiro 2013. A indisponibilidade dos princípios da hierarquia e da disciplina nas instituições

militares. p. 28. 17

THOMAZI, Robson Luis Marques. A hierarquia e a disciplina aplicadas às instituições militares: controle

e garantias no regulamento disciplinar da Brigada Militar. Porto Alegre, 2008. p. 129. Disponível

em: http://repositorio.pucrs.br/dspace/bitstream/10923/1789/1/000410953-Texto%2BParcial-0.pdf. Acesso

em: 10 ago. 2015.

8

A violação destes princípios traria consequências penais e administrativas para os

infratores, pois transgredir uma norma é a forma mais grave de ilegalidade, como ensina

Celso Bandeira de Mello:

Violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma norma. A desatenção

ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório,

mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou

inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa

ingerência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais,

contumélia irremissível e seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.18

Nessa senda, o controle de violação aos princípios da hierarquia e da disciplina pelos

policiais militares do Rio Grande do Sul, seja na esfera penal ou na cível, compete à Justiça

Militar estadual.19

3 A IMPORTÂNCIA DA JUSTIÇA MILITAR NA PRESERVAÇÃO DOS

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DA BRIGADA MILITAR

3.1 DISCUSSÕES SOBRE A RAZÃO DE EXISTIR

A existência e a manutenção da Justiça Militar são frequentemente questionadas pelos

mais diversos segmentos da sociedade. Nesse sentido, o próprio Conselho Nacional de Justiça

recentemente nomeou, através da Portaria n.º 216, de 29 de novembro de 2013, um grupo de

trabalho para elaborar diagnóstico da Justiça Militar nos âmbitos federal e estadual, visando

ao encaminhamento de propostas ao Congresso Nacional e às Assembleias Legislativas

estaduais.

A instituição do grupo de trabalho teve origem em requerimento de revisão disciplinar

do então Corregedor do Tribunal de Justiça da Justiça Militar de Minas Gerais, que se

insurgiu contra o arquivamento de representação disciplinar para apurar possíveis faltas

funcionais relativas à negligência na condução de processos criminais, o que teria resultado na

ocorrência de diversas prescrições.

18

SILVA, Marcelino Fernandes da, apud DUARTE, Antônio Pereira. A indisponibilidade dos princípios da

hierarquia e da disciplina nas instituições militares. Revista Direito Militar, n. 99, p. 28, jan./fev. 2013. 19

Segundo o § 4.º do art. 125 da Constituição Federal, compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os

militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares

militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir

sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças.

9

Após a compilação e a análise dos dados levantados, o Grupo de Trabalho concluiu,

em resumo:

1. Que a competência dos órgãos judiciais militares é restrita, excepcional e

funcional, e que, portanto, deve estar limitada às infrações cometidas dentro do

âmbito estritamente castrense pelo pessoal militar, razão pela qual da mesma forma

que a justiça militar estadual desde a emenda constitucional 45/2004, a justiça

militar federal deve julgar somente militares, excluindo-se a sua competência para

julgar civis; 2. Que existe a necessidade, sob o ponto de vista econômico e da

eficiência do sistema judicial brasileiro, de uma reestruturação da Justiça Militar e a

ampliação da sua competência, tanto no primeiro quanto no segundo grau de

jurisdição da União e dos Estados, a fim de que passem a processar e julgar, além

dos crimes militares definidos em lei praticados, respectivamente, por militares das

Forças Armadas e militares estaduais, questões relacionadas ao regime e à carreira

militar; 3. Que há necessidade de se adequar a estrutura e equalizar a carga de

trabalho da Justiça Militar àquela observada nos outros ramos da Justiça,

procedendo-se à diminuição do quantitativo de Ministros integrantes do Superior

Tribunal Militar; 4. Por fim, que há necessidade de se proceder à especialização da

Justiça Comum Estadual para a instrução e julgamento de processos de competência

militar, fato este que, por si só, reduzirá substancialmente o custo por processo, o

que poderá importar na extinção dos Tribunais de Justiça Militar Estaduais, com a

consequente criação de Câmaras Especializadas, mas não necessariamente

exclusivas dentro da estrutura dos Tribunais de Justiça dos Estados.

Por outro lado, o relatório apresentado pelo Conselho acabou sendo questionado sobre

a sua real extensão e profundidade. O renomado autor castrense Jorge César de Assis aponta

que, em todo o trabalho, já desde a sua parte introdutória, evidenciam-se equívocos

inescusáveis para um feito de tal magnitude, como, por exemplo, o de que o grupo, ao tecer

considerações gerais sobre o crime militar e desta forma transcrever o artigo 9.º do Código

Penal Militar, valeu-se de um exemplar desatualizado desse compêndio, já que o parágrafo

único transcrito no relatório ressentiu-se da alteração de redação que lhe deu a Lei n.º 12.432,

de 29 de junho de 2011.20

Aduz o autor, ainda, que o relatório apresentado a público pelo Grupo de Trabalho do

CNJ não logrou obter um diagnóstico real – e fiel – da situação da Justiça Militar, seja porque

não analisou 17 unidades da Federação, seja porque não chegou a estabelecer paralelos com a

Justiça comum.

No Rio Grande do Sul, nesse ano de 2015, foi apresentada na Assembleia legislativa,

por iniciativa do Deputado Estadual Pedro Ruas, do Partido Socialismo e Liberdade, o Projeto

20

ASSIS, Jorge Cesar de. O inusitado diagnóstico do grupo de trabalho do CNJ sobre a Justiça Militar.

Disponível em: <http://www.jusmilitaris.com.br/novo/uploads/docs/diagnosticocnj-corrigido.pdf>. Acesso em:

7 ago. 2014.

10

de Emenda à Constituição n.º 241/2015, que extingue a Justiça Militar do Estado do Rio

Grande do Sul e dá outras providências.21

De outra parte, verifica-se que a prestação jurisdicional da Justiça Militar do Rio

Grande do Sul atende os militares estaduais, indistintamente de posto ou graduação, que são

processados e julgados, como se observa no quadro abaixo:

Características judiciais e performance: condenações

TJM/RS Condenações 2010/2012

Oficiais condenados

Tenente-coronel (2)

Major (4)

Capitão (13)

Tenente (38)

57

Praças condenados

Sargentos (156)

Cabo (1)

Soldados (548)

705

Total de oficiais e praças condenados no período 762

Fonte: Pesquisa realizada por Marcelo Lopes Rosa no Curso de Especialização em Políticas e Gestão na

Segurança Pública.

Constata-se que a proporção de militares estaduais do Rio Grande do Sul condenados

na Justiça Especializada vai ao encontro da proporção existente em cada nível hierárquico da

instituição militar, o que demonstra a ausência de corporativismo, conforme se observa

abaixo:

Constituição proporcional: efetivo da Brigada Militar

0,15%

0,46%

1,31%2,00%

2,70%

0,00%

26,05%

67,33%

Coronel

Tenente Coronel

Major

Capitão

Tenente

Aluno Oficial

Sargento

Soldado

Fonte: Departamento Administrativo da Brigada Militar – referência 2012. Pesquisa realizada por Marcelo

Lopes Rosa no Curso de Especialização em Políticas e Gestão na Segurança Pública.

21

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Projeto de Emenda à Constituição n.º 241/2015.

http://www.al.rs.gov.br/legislativo/ExibeProposicao/tabid/325/SiglaTipo/PEC/NroProposicao/241/AnoProposi

cao/2015/Origem/Px/Default.aspx. Acesso em: 7 ago. 2015.

11

Militares condenados (%) – 2010/2012

Fonte: Pesquisa realizada por Marcelo Lopes Rosa no Curso de Especialização em Políticas e Gestão na

Segurança Pública.

Os dados abaixo se referem ao ajuizamento por parte do Ministério Público de

representações para a perda do posto e da patente para os oficiais e para a perda da graduação

das praças no período de 2011 a 2013 no Tribunal de Justiça Militar do Estado:

Representações para a perda do posto e da patente e da graduação das praças

Militares 2011/2013

Ajuizadas Excluídos

Oficiais 4 3

Praças 35 28

Total 39 31

Fonte: 25.ª Procuradoria de Justiça do Estado – Ministério Público.

Outro ponto que merece ser destacado é que vários instrumentos de política criminal

aplicados na Justiça comum não encontram guarida na Justiça especializada, aplicando ao

jurisdicionado um direito mais rigoroso. Apenas para exemplificar, na Justiça Militar não se

aplica a Lei n.º 9.099/1995, ou seja, não há transação penal ou suspensão condicional do

processo, por força da previsão legal contida no art. 90-A da referida Lei, bem como, em

regra, não se aplica o princípio da bagatela ou da insignificância.

De outra banda, importante referir o índice de reincidência na Justiça Militar do Rio

Grande do Sul, que é em torno de dois a 2,5%, consectário lógico da rápida e efetiva resposta

judicial aos desvios de conduta e da certeza da responsabilização, como se pode observar no

quadro abaixo:

Militares estaduais condenados e reincidentes no 1.º grau

Militares estaduais condenados no 1.º grau

2011 2012 2013 Total

201 183 167 851

Militares estaduais reincidentes no 1.º grau

12

2011 2012 2013 Total

6 6 2 14 (2,56%)

Fonte: Coordenadoria de Tecnologia, Informação e Comunicação do TJM/RS/Sistema Eletrônico de Gestão

Administrativa (SEGA) e relatórios semestrais e anuais das auditorias militares remetidos a Corregedoria-Geral

do TJM/RS.

A isto se soma o conhecido efeito pedagógico resultante das peculiaridades que

envolvem os processos e os julgamentos no foro castrense.

Os números apurados pelo Conselho Nacional de Justiça apontam para uma taxa de

reincidência de 70% entre os presidiários brasileiros, como alertava, em 2009, o então

presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, Ministro Gilmar

Mendes. Seu sucessor, o hoje ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal César Peluso,

reforçou o alerta dois anos depois, ao dizer que sete em cada dez presidiários brasileiros

voltam à cadeia.22

A baixa reincidência dos policiais também resulta do local do cumprimento da pena,

que ocorre em presídio militar, onde há excelentes condições de ressocialização do apenado,

e, igualmente, pelo efetivo acompanhamento pela autoridade administrativa e pelo juízo da

execução do integral cumprimento das condições do sursis concedido.

Apresentam-se abaixo os dados referentes à celeridade no Tribunal de Justiça Militar:

Celeridade processual

TJM – 2013

Recurso Criminal Prazo em dias

Média do Juiz mais célere 16

Média geral 24

1.º Grau – JME

Processo Prazo em dias

Ação criminal 313

Ação cível 170

Fonte: Coordenadoria de Tecnologia, Informação e Comunicação do TJM/RS/Sistema Eletrônico de Gestão

Administrativa (SEGA) e relatórios semestrais e anuais das auditorias militares remetidos a Corregedoria-Geral

do TJM/RS.

Com efeito, quanto maior for o tempo decorrido entre o ato criminoso e a devida

punição de quem o praticou, maior será o grau de ineficiência do aparato público de controle

social. Isto é, quanto maior for a diferença entre o tempo previsto em lei – morosidade legal –

22

R7 Notícias. http://noticias.r7.com/cidades/juristas-estimam-em-70-a-reincidencia-nos-presidios-brasileiros-

21012014. Acesso em 8 de Ago. 2015.

13

e o tempo real de processamento – morosidade necessária –, menor a capacidade de

incriminação do sistema.23

Por fim, enfatiza-se a composição dos órgãos da Justiça castrense, porquanto

apresentam a figura sui generis do escabinato nos processos e nos julgamentos dos crimes

militares definidos em lei, excetuando os crimes militares cometidos contra civis, que serão

julgados, singularmente, pelo Juiz de Direito do Juízo Militar.

O escabinato diz-se dos órgãos colegiados mistos formados na Justiça Militar por

integrantes das Forças Armadas e bacharéis, quatro oficiais e um Juiz de Direito nos

Conselhos Permanentes e Especiais de 1.º grau. Dez oficiais generais do último posto da

carreira, três advogados, um membro do Ministério Público Militar e um Juiz de carreira, no

Superior Tribunal Militar.24

Nas palavras de Celso Rodrigo Lima dos Santos, no Brasil a melhor forma que se

encontrou para oferecer um julgamento justo e equilibrado aos crimes militares foi a adoção

do escabinato na Justiça Militar, instituto que permitiu àquele ramo da justiça aliar a

experiência de militares, de longa trajetória nas forças armadas ou forças auxiliares, à técnica

e à vivência jurídica dos juízes civis que compõem os conselhos de justiças (1.ª instância), o

Superior Tribunal Militar (2.ª instância), ou os Tribunais de Justiça Militares (2.ª instância

estadual no RS, em SP e MG). Com isso, tem-se decisões mais justas e conectadas com a

peculiar realidade da caserna.25

Nesse diapasão, infere-se que o artigo 231 do Código de Organização Judiciária do

Estado do Rio Grande do Sul (COJE) reza que são órgãos da Justiça Militar do Estado: “I – O

Tribunal Militar; II – os Juízes-Auditores; III – os Juízes-Auditores Substitutos; IV – os

Conselhos de Justiça”.26

O Tribunal de Justiça Militar do Rio Grande do Sul, com sede na capital e jurisdição

no território do Estado, compõe-se de sete juízes, sendo quatro militares do mais alto posto da

Brigada Militar e três civis, todos de investidura vitalícia.

23 RIBEIRO, Ludmila M. Administração da Justiça Criminal na cidade do Rio de Janeiro: O tempo da justiça

criminal brasileira. In Coleção Segurança com cidadania / Secretaria Nacional de Segurança Pública do

Ministério da Justiça – Ano I, n. 3. Brasília, DF, 2009. 24

ASSUMPÇÃO, Roberto Menna Barreto. Direito Penal e Processual Penal Militar – Teoria Essencial do

Crime – Doutrina e Jurisprudência – Justiça Militar da União. Rio de Janeiro: Destaque, 1998, p. 20. 25

SANTOS, Celso Rodrigo Lima dos. Tribunal do júri e escabinato da Justiça Militar. Jus Navigandi,

Teresina, ano 18, n. 3490, 20 jan. 2013. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/23491>. Acesso em: 10 ago.

2015. 26

RIO GRANDE DO SUL. Lei nº 7.356/80. Código de Organização Judiciária do RS. Disponível em:

<www.al.rs.gov.br/legis/>. Acesso em: 8 ago. 2015.

14

3.2 ANÁLISE DE DADOS DA PESQUISA

Inicialmente, é importante destacar que a pesquisa de campo foi realizada com

autoridades dos diferentes órgãos responsáveis pela persecução criminal na Justiça castrense

do Rio Grande do Sul.

Objetivou-se, especificamente, analisar qual a percepção de Juízes do Tribunal de

Justiça Militar, Juízes de Direito do Juízo Militar, membros do Ministério Público, advogados

e Defensores Públicos no tocante às consequências que a Justiça Militar traz ao controle de

dois dos mais relevantes princípios da instituição: disciplina e hierarquia.

Assim sendo, a partir de um questionário estruturado formulado pelo pesquisador,

solicitou-se a explanação sobre o assunto conforme cada questionamento, considerando que

todas as perguntas diziam respeito à importância da Justiça especializada para a Brigada

Militar fazer valer os princípios da disciplina e da hierarquia em relação aos policiais.

O questionário estruturado apresentava as seguintes perguntas:

1) Como analisa a importância da Justiça Militar do Rio Grande do Sul no controle da

disciplina e da hierarquia dos policiais da Brigada Militar?

2) Acredita que a celeridade processual contribui para o controle da hierarquia e da

disciplina?

3) A participação de juízes militares contribui para o controle da hierarquia e da

disciplina militar?

4) Acredita que a decisão dos juízes civis interfere nas decisões dos juízes militares?

5) Percebe a existência de corporativismo nas decisões dos juízes militares?

6) Para a sustentação dos pilares da hierarquia e da disciplina, é fundamental a

existência da Justiça Militar?

Pois bem, realizado o necessário introito, passa-se a analisar as respostas dos

entrevistados.

A primeira pergunta questiona o pesquisado sobre a importância da Justiça Militar do

Rio Grande do Sul no controle da disciplina e da hierarquia dos policiais da Brigada Militar.

Analisando-se as respostas de todos os entrevistados, percebe-se, de forma unânime, que a

Justiça Militar do Rio Grande do Sul é imprescindível para o controle da hierarquia e da

disciplina dos policiais.

As respostas, em sua maioria, exaltam a necessidade de uma Justiça especializada

conhecedora do funcionamento da Instituição e da cultura militar, apontando, ainda, a rigidez

das decisões como ponto fundamental da sua existência.

15

Neste sentido posicionou-se o Dr. Luiz Eduardo Azevedo, Promotor da 1.ª Auditoria

de Porto Alegre, in verbis:

[...] No momento em que há uma polícia militarizada, é imprescindível a existência de

uma Justiça Militar a qual, necessariamente, deve ser mais rígida do que a justiça civil

devido às peculiaridades da caserna. E isso é mais latente no Brasil, onde a justiça

civil é por demais frouxa, especialmente no que concerne aos delitos de menor

potencial ofensivo. A rigidez é a pedra de toque para a manutenção da hierarquia e da

disciplina. A Justiça Militar Gaúcha é imprescindível para a manutenção dessas duas

vigas mestras da estrutura da Corporação, estando a desenvolver um bom trabalho

nessa área. Tanto isso é verdade que se pode dizer, com tranquilidade, ser a Brigada

Militar a Força Pública mais ordeira e disciplinada do país [...].

A contribuição da Justiça Militar para a garantia da qualidade dos serviços das

instituições militares também foi destacada pelos entrevistados. A Dra. Maria Ignez Franco

Santos, Procuradora de Justiça do Tribunal Militar, anota:

[...] A imputação de prática de crime militar acarreta prejuízos à administração

militar e à própria sociedade, na medida em que se espera do policial militar

idoneidade moral, correção de atitudes, cumprimento das leis e a garantia de

segurança da população. Trata-se a Justiça Militar de órgão fundamental para o

aperfeiçoamento dos quadros de pessoal das policias e dos corpos de bombeiros,

contribuindo para a garantia da qualidade dos serviços das instituições militares. Por

meio dos seus julgados, colabora na manutenção de elevado nível de disciplina dos

policiais militares, ao apurar desvios de condutas de servidores, responsabilizando-

os penalmente, além de decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da

graduação das praças. Exerce função preventiva da criminalidade por meio da

execução efetiva dos seus julgados [...].

A segunda pergunta refere-se à celeridade processual, oportunidade que os

entrevistados são instados a referir se ela contribui para o controle da hierarquia e da

disciplina.

As respostas, na quase totalidade, são no sentido de que efetivamente a celeridade

processual contribui para o controle da hierarquia e da disciplina. Nesta linha posicionou-se o

Juiz-Cel. Paulo Roberto Mendes Rodrigues, do Tribunal de Justiça Militar, in verbis:

[...] Este é o principal requisito da JME – garantir uma prestação jurisdicional

rápida. Hoje, muito além das metas estabelecidas pelo CNJ, vai o entendimento de

todos os magistrados (1.º e 2.º grau) que tem o foco da celeridade dos julgados.

Estamos julgando, como regra geral, em 1.º grau dentro de um ano e no 2.º grau a

média está em 60 dias. Assim, cumprindo nossa missão principal – a celeridade –

portanto estamos contribuindo com o controle da hierarquia e disciplina. Aliás, neste

ponto, é importante destacar que o número de processos é pequeno, o que indica que

a BM tem uma tropa disciplinada e que a JME cumpre seu papel [...].

16

O caráter educativo de um processo célere junto à tropa também foi muito lembrado

pelos entrevistados. Neste sentido posicionou-se o advogado Fábio César Rodrigues Silveira,

in verbis:

[...] A celeridade propicia aspectos de efetivo controle sobre os policiais que irão

irradiar para todos os integrantes da Instituição. Caso não tenhamos celeridade nos

procedimentos que chegam até o judiciário corremos o risco de ‘cair no vazio’ o

processo de persecução penal a que estão sujeitos os militares estaduais e, como

consequência, a fragilização da hierarquia e disciplina [...].

O único posicionamento discordante foi o da Defensora Pública de Santa Maria, Dra.

Tamara Flores Agostini, que asseverou: “Nem mesmo um processo célere contribui para a

defesa da hierarquia e da disciplina. Afinal, trata-se de valores que devem ser conquistados e

não impostos através da força ou da ameaça de um processo penal”.

A terceira pergunta indaga os pesquisados se a participação de juízes militares

contribui para o controle da hierarquia e da disciplina. As respostas foram na sua grande parte

uniformes em sentido afirmativo, baseando-se, principalmente, no fato de que os juízes

militares trazem a experiência da caserna na especificidade da atividade de polícia ostensiva e

dos bombeiros.

Neste passo, foram os apontamentos do Juiz-Cel. Fábio Duarte Fernandes, do Tribunal

de Justiça Militar, in verbis:

[...] a experiência adquirida na prestação do serviço, com o desenvolvimento das

atividades de polícia ostensiva e bombeiros, possibilita o conhecimento de uma

realidade sobre a vida do servidor militar que não há igual. O fato de termos os

conselhos permanentes de justiça no primeiro grau de jurisdição e a composição do

2.º grau com a participação de representantes da OAB, MP e carreira da

magistratura, efetiva o controle da hierarquia e disciplina que, se fosse de modo

diverso, estaria prejudicado [...].

Na mesma linha posicionou-se a Dra. Isabel Guarise Barrios Bidigaray, Promotora de

Justiça da 2.ª Auditoria, in verbis:

[...] A experiência tem demonstrado essencial a participação dos juízes militares nos

julgamentos, pois eles trazem para o processo a realidade do dia-a-dia dos Policiais

Militares, nem sempre do conhecimento dos civis que atuam no processo (Juízes,

Promotores de Justiça, Advogados, etc.), trazendo mais justiça às decisões tomadas

[...].

Importante enfoque trouxe a Dra. Maria Ignez Franco Santos, Procuradora de Justiça

do Tribunal de Justiça Militar, alertando sobre os reflexos da garantia da hierarquia e da

17

disciplina dos integrantes da Brigada Militar, “sob pena de grave risco aos cidadãos e à

sociedade”.

Distinguindo-se dos demais pesquisados, a Dra. Tamara Flores Agostini, Defensora

Pública da Auditoria de Santa Maria, realçou:

[...] a participação de juízes militares, parte dos quais não possui qualificação

jurídica, acaba gerando decisões sem base jurídica e fundamentadas unicamente em

critérios morais, o que não combina com o Direito Penal, que deve fazer uma análise

extremamente técnica e baseada na Constituição Federal. Além disso, o fato de os

juízes militares fazerem parte da corporação viola o princípio da imparcialidade,

gerando decisões, além de tecnicamente desqualificadas, parciais. Por isso, a

participação de juízes sem formação jurídica e materialmente parciais só fragiliza e

deixa ao descrédito a Justiça Militar [...].

O quarto questionamento diz respeito a se a decisão dos juízes civis interfere nas

decisões dos juízes militares. Analisando-se as respostas dos entrevistados, verificam-se

percepções difusas.

Dos 18 pesquisados, quatro afirmaram que sim; outros oito, que não, e, por fim, seis

mantiveram posição intermediária.

A fim de ilustrar o posicionamento dos entrevistados que entendem que a decisão dos

juízes civis interfere nas decisões dos juízes militares, traz-se à lume a opinião da Dra.

Mariluce Dias Bandeira, Juíza Titular da Auditoria de Passo Fundo, in verbis:

[...] Certamente no 1.º grau de jurisdição a avaliação dos juízes civis é um norte para

os demais juízes militares que compõem os Conselhos de Justiça e que irão proferir

seus votos nas sessões de julgamento. Vejo que os Oficiais atualmente, por

possuírem curso de Direito, estão muito bem preparados para atuarem nos

Conselhos de Justiça, mas, geralmente, atentam para os votos proferidos por esta

Magistrada, não existindo qualquer constrangimento deste Juízo quando há votos

divergentes, os quais são sempre fundamentados pelos oficiais [...].

Representando a visão daqueles que entendem que a decisão dos juízes não interfere

nas dos juízes militares, transcreve-se a posição da Dra. Dione Dorneles da Silva, Juíza de

Direito Substituta da 2.ª Auditoria de Porto Alegre, in verbis:

[...] Não acredito que a decisão dos juízes civis interfiram mais nas decisões dos

juízes militares que o contrário. No procedimento processual militar, o escabinato

composto por juízes civis e militares permite que o juiz togado seja informado

acerca das peculiaridades da caserna, fazendo-se necessário, inclusive, aportes de

conhecimento acerca da técnica policial militar, a fim de que as ações sejam bem

julgadas. Por outro lado, o juiz togado tem a funções de aportar conhecimentos

ténico-jurídicos aos conselhos de justiça, enriquecendo, dessa forma, os julgados,

com conhecimentos mais técnicos de Direito. Assim, a composição dos conselhos de

justiça mostra-se provido de conhecimentos jurídicos e técnico-policiais necessários

18

ao bom julgamento dos feitos. Em meus quatorze anos de magistratura nesta justiça

especializada, tive meus entendimento, algumas vezes, modificados após o aporte de

informações que os oficiais traziam ao conselho de justiça, acerca das peculiaridades

da caserna. E sei, por manifestações dos próprios oficiais, que, muitas vezes, o

aporte de conhecimento técnico-jurídico lhes orientou, também, em suas decisões.

Trata-se de um intercâmbio de conhecimento necessário para a boa apreciação dos

fatos submetidos a esta justiça especializada [...].

Por derradeiro, registra-se a posição intermediária com relação ao questionamento em

análise, evidenciada nos dizeres da Dra. Ângela Caren Dal Pos, Promotora de Justiça da 2.ª

Auditoria até pouco tempo, in verbis: “[...] A decisão do juiz civil poderá conduzir o que for

decidido pelos juízes militares no que diz respeito aos aspectos técnicos-jurídicos-processuais,

mas estes mantém suas convicções intactas, sem se deixarem meramente influenciar por

aquela [...]”.

De outra banda, a quinta pergunta indaga dos entrevistados se percebem a existência

de corporativismo nas decisões dos juízes militares.

As respostas podem ser separadas em três grupos, assim contabilizados: nove

entenderam que não há corporativismo; três entenderam que existe e seis apontaram que

aparece em casos pontuais.

Representando aqueles que responderam negativamente à indagação, reproduz-se a

resposta do Dr. Fábio César Rodrigues Silveira, advogado com atuação na Justiça castrense

em Porto Alegre, in verbis:

[...] Não. Entendo que a prevalência de corporativismo poderia ocorrer se não

houvesse decisão colegiada. A Justiça Militar é composta por juízes militares e civis

e, ainda, há a participação efetiva do Ministério Público. Todos os mecanismos

recursais e de transparência nas decisões estão presentes. Não vejo como poderia

haver corporativismo. Além do mais, as condenações do Judiciário Militar

demonstram uma rigidez elevada nas condenações que, se comparadas às decisões

da justiça comum, teríamos um prejuízo social muito grande. Julgo importante

salientar também que inúmeras decisões anulam atos de superiores hierárquicos que

não estão de acordo com os direitos e garantias constitucionais. Demonstrando

assim, a inexistência de discriminação das decisões com relação a graus hierárquicos

[...].

Em sentido contrário, destaca-se excerto da opinião do Dr. Luiz Eduardo de Oliveira

Azevedo, Promotor de Justiça da 1.ª Auditoria de Porto Alegre, in verbis:

[...] Não há como negar a existência de forte carga de corporativismo nas decisões

dos juízes militares, quando o réu é oficial de carreira. Mais ainda, se for oficial

superior. Em raríssimos casos obtêm-se veredicto condenatório. Os juízes militares

somente condenam em último caso, pois já vão predispostos a absolver o colega [...].

19

Ademais, aprofundando a opinião daqueles que entendem haver corporativismo,

percebe-se que ele é identificado principalmente quando o réu é oficial. Ainda, registrem-se as

sugestões apresentadas pelo Dr. Luiz Eduardo para dirimir o corporativismo nos julgamentos,

in verbis:

[...] Talvez a única forma de minorar essa questão fosse colocar mais um juiz civil

na sessão de julgamento, ficando dois civis e três militares, valorando mais os

aspectos técnicos, fazendo com que os Juízes Militares pensem melhor antes de

darem seu voto. Entendo, ainda, que a Academia de Polícia Militar deveria reforçar

a necessidade de os militares, quando convocados para atuar como juízes, adotarem

uma postura de maior independência e, acima de tudo, a consciência de julgarem de

acordo com a prova dos autos, deixando de lado a amizade e buscando a punição dos

culpados, por melhores pessoas que os réus sejam socialmente [...].

Aqueles que expressaram haver corporativismo em casos pontuais podem ser

materializados na resposta da Dra. Viviane de Freitas Pereira, Juíza Substituta da Auditoria da

Santa Maria, in verbis:

[...] A resposta a esta pergunta não pode ser genérica. Já percebi em situações muito

específicas, ou seja, em casos isolados. Não se pode afirmar, de forma alguma, que

os juízes militares sempre se orientam pelo corporativismo. Acredito, inclusive, que

muitos são extremamente rigorosos porque colocam a manutenção da instituição

militar acima dos interesses individuais [...].

Por fim, os entrevistados responderam se a existência da Justiça Militar é fundamental

para a sustentação dos pilares da hierarquia e da disciplina. O questionamento foi respondido

afirmativamente por praticamente todos os pesquisados, como, por exemplo, o Dr. Amilcar

Fagundes Freitas Macedo, Juiz do Tribunal de Justiça Militar, in verbis:

[...] Não quero dizer que devam existir tribunais de segundo grau, o que também

acho importante. Mas a justiça militar me parece imprescindível enquanto a força

pública de segurança for lastreada na hierarquia e disciplina. A aplicação dos

critérios utilizados na jurisdição comum, e falo disse depois de 16 anos atuando

como Promotor de Justiça, para o julgamento de crimes militares, levaria, sem

dúvidas, a quebra da hierarquia e disciplina. Isso é fácil de observar, numa pequena

amostragem, nas polícias militares de São Paulo e Minas Gerais, sem falar no Rio

Grande do Sul, que tem as melhores PMs do País. Coincidentemente, nesses Estados

temos o segundo grau de jurisdição da Justiça Militar, na forma de Tribunal [...].

A exceção coube mais uma vez à Defensora Pública de Santa Maria, Dra. Tamara

Flores, que entende que as sanções administrativas são suficientes para a manutenção da

hierarquia e da disciplina, in verbis:

[...] Na minha opinião e com base na minha percepção atuando na Justiça Militar é

de que para a sustentação dos pilares e da disciplina o essencial é a valorização do

20

agente por parte de seus superiores no dia-a-dia da função exercida. Não sendo isso

possível, acredito que sanções administrativas, obviamente quando as condutas

ilícitas não ultrapassarem o razoável, são suficientes para a sustentação de tais

pilares. Não se esqueça que estudos recentes de criminologia, mostra que a função

do processo penal e da pena dele consequente não possuem função educativa ou

inibitória, mas estritamente punitiva. Por isso, o direito penal não serve para proteger

valores como os da hierarquia e da disciplina, mas unicamente como retribuição e

vingança a um mal cometido [...].

Pois bem, encerrada a análise dos dados, passa-se às considerações finais.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A questão-problema buscou orientar o desenvolvimento do trabalho com o escopo de

demonstrar a importância da Justiça Militar do Rio Grande do Sul no controle da disciplina e

da hierarquia dos policiais da Brigada Militar na percepção de juízes, promotores de justiça,

defensores públicos e advogados que atuam na Justiça castrense gaúcha.

A primeira pergunta questiona o pesquisado sobre como analisa a importância da

Justiça Militar do Rio Grande do Sul no controle da disciplina e da hierarquia dos policiais da

Brigada Militar. As respostas de todos os entrevistados, sem qualquer divergência, foram no

sentido de que a Justiça Militar do Rio Grande do Sul é imprescindível para o controle da

hierarquia e da disciplina dos policiais.

Destacou-se nas respostas a necessidade de uma Justiça especializada conhecedora do

funcionamento da Instituição e da cultura militar, apontando, ainda, a rigidez das decisões

como ponto fundamental da sua existência.

Ao encontro da percepção dos entrevistados, evidencia-se que, ao contrário da Justiça

comum, não se aplica na Justiça Militar gaúcha a Lei n.º 9.099/1995, ou seja, não há transação

penal ou suspensão condicional do processo, bem como, em raríssimas vezes, se aplica o

princípio da bagatela ou da insignificância.

A segunda pergunta refere-se à celeridade processual, onde se instou os entrevistados

a se posicionar se ela contribui para o controle da hierarquia e da disciplina. As respostas, em

sentido uníssono, foram de que efetivamente a celeridade processual contribui para o controle

da hierarquia e da disciplina.

A resposta coaduna com a prestação jurisdicional extremamente célere prestada,

principalmente, no Tribunal de Justiça Militar, uma vez que, por exemplo, no ano de 2013,

um recurso criminal levou o tempo médio de 24 dias para ser julgado. A celeridade também é

21

vislumbrada no 1.º grau de jurisdição, porquanto uma ação criminal tramita em média 313

dias e uma ação cível, 170 dias.

A terceira pergunta indaga os pesquisados se a participação de juízes militares

contribui para o controle da hierarquia e da disciplina militar. As respostas foram na sua

grande parte uniformes em sentido afirmativo, baseando-se, principalmente, no fato de que os

juízes militares trazem a experiência da caserna e a especificidade das atividades de polícia

ostensiva e dos bombeiros. A percepção exteriorizada indica o acerto da composição em

escabinato tanto no 1.º grau de jurisdição como no Tribunal de Justiça Militar.

O quarto questionamento diz respeito se a decisão dos juízes civis interfere nas

decisões dos juízes militares. Analisando-se as respostas dos entrevistados, constataram-se

posições difusas, o que impede de chegar a uma conclusão determinante.

De outra banda, na pergunta cinco indagou-se dos entrevistados se percebiam a

existência de corporativismo nas decisões dos juízes militares. Em que pese 50,0% dos

entrevistados afirmarem peremptoriamente que não há corporativismo, em torno de 33,33%

entendeu que só existem em casos pontuais, e 16,67% afirmaram que efetivamente existe

corporativismo.

Contudo, constata-se que a proporção de militares estaduais do Rio Grande do Sul

condenados na Justiça castrense está em consonância com a proporção existente em cada

nível hierárquico da instituição militar, o que reforça a tese de ausência de corporativismo nas

decisões.

Por fim, os entrevistados responderam se a existência da Justiça Militar é fundamental

para a sustentação dos pilares da hierarquia e da disciplina. O questionamento foi respondido

afirmativamente por praticamente todos os pesquisados.

Desse modo, confrontando-se o resultado do questionário aplicado com o referencial

teórico levantado, percebe-se que o objetivo geral da pesquisa foi alcançado, pois os dados

demonstram a importância da Justiça Militar do Rio Grande do Sul no controle da disciplina e

da hierarquia dos policiais da Brigada Militar na percepção de juízes, promotores de justiça,

defensores públicos e advogados que atuam na Justiça castrense gaúcha.

A toda evidência, podem-se pinçar de forma sólida as características que expressam a

importância da Justiça Militar no tema proposto, que são o rigorismo, a celeridade processual

e o escabinato.

De outra parte, é importante salientar que o questionário foi remetido ao público alvo

por e-mail, sendo solicitado que as respostas retornassem pelo mesmo método. Nesse ponto,

22

registre-se que o pesquisador, com relação à maioria dos pesquisados, teve que reiterar

inúmeras vezes o pedido de resposta, inclusive por telefone ou contato pessoal.

Com efeito, o questionário foi endereçado por e-mail a quatro membros do Ministério

Público, dos quais três Promotores e uma Procuradora, três Defensores Públicos, três

advogados e doze magistrados. Todavia, duas Juízas, um Defensor Público e uma advogada

não responderam aos questionamentos, totalizando efetivamente a pesquisa na percepção de

dezoito autoridades.

Ainda, como fator de limitação do trabalho, devido à curta duração do Curso de

Especialização em Políticas e Gestão de Segurança Pública, não há possibilidade de um

aprofundamento na abordagem do tema proposto, bem como na aplicação das ferramentas

investigatórias mais abrangentes.

Por fim, sugere-se um minucioso exame acerca da influência dos Juízes civis nas

decisões dos juízes militares, porquanto inconclusiva neste trabalho, bem como sobre a

existência de corporativismo nas decisões dos juízes militares, mormente quando o réu for

oficial superior da Corporação.

REFERÊNCIAS

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destruição, reconstrução ou assimilação? Revista Jurídica Consulex, ano XXII, n. 267, p. 63,

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<http://www.jusmilitaris.com.br/novo/uploads/docs/diagnosticocnj-corrigido.pdf>. Acesso

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