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A IMPORTÂNCIA DA REFLEXÃO DA PRÁTICA PEDAGÓGICA PARA REDIMENSIONAMENTO DO ENSINO MÉDIO NOTURNO
Sueli da Silva Martins1
RESUMO
Neste texto apresentamos dados de trabalho realizado em um um dos Colégios Estaduais , do município de Apucarana, visando possibilidades de melhor entendimento sobre a realidade do aluno trabalhador, na perspectiva de criar espaços para debates e reflexões acerca da prática pedagógica dos educadores, visando proporcionar novas formas de ensinar e aprender. Iniciamos o trabalho discutindo com os alunos, questões que envolvem o ensino e a aprendizagem. Os dados também foram levantados e discutidos com os professores. A partir deste início foram feitos alguns encontros para discussão coletiva sobre a interferência dos aspectos levantados por professores e alunos na prática pedagógica. Buscamos com esse trabalho a partir da reflexão do trabalho pedagógico desenvolvido na escola superar a educação entendida como fator de ajustamento do aluno e da escola às necessidades da sociedade capitalista. Os dados resultantes desse trabalho mostram que a reflexão e estudo coletivo de professores e pedagogos sobre a prática pedagógica e a ação docente podem contribuir para o enfrentamento de processos pedagógicos que promovem a exclusão do aluno do ensino médio noturno.
PALAVRAS-CHAVE: Ensino Médio; Prática Pedagógica; Trabalho Coletivo; Redimensionamento da prática educativa.
ABSTRACT
In this text we presented data of the work accomplished at a State School, municipal district of Apucarana, seeking possibilities of better understanding about the hard-working student's reality, in the perspective of creating spaces for debates and reflections concerning the educators' pedagogic practice, seeking to provide new forms of to teach and to learn. We began the work discussing with the students, subjects that involve the teaching and the learning. The data were also lifted up and discussed with the teachers. Starting from this beginning some were made meetings for collective discussion about the interference of the lifted up aspects for teachers and students in practice pedagogic. We looked for with that work starting from the reflection of the pedagogic work developed at the school to overcome the education understood as factor of the student's adjustment and of the school to the needs of the capitalist society. The resulting data of this work show that the reflection and collective study of the teachers and educators about
1Professora Pedagoga da Rede Pública Estadual da Educação, Estado do Paraná. Participante do PDE - Programa de Desenvolvimento Educacional, cuja finalidade é a Formação Continuada em Rede e a integração das Escolas às IES - Instituições de Ensino Superior.
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the pedagogic practice and the educational action can contribute to face of pedagogic processes that promote the student's exclusion of high school. KEY-WORDS: High School; Pedagogic practice; Collective work; Resizing of the educational practice. 1 – INTRODUÇÃO
Este trabalho surge após implementação pedagógica direcionada
aos pedagogos, alunos e professores , visando possibilidades de melhor
entendimento sobre a realidade do aluno trabalhador, na perspectiva de
criar espaços para debates e reflexões acerca da prática pedagógica dos
educadores, visando proporcionar novas formas de ensinar e aprender.
A implementação foi resultante do Programa do Governo do
Estado do Paraná – PDE2 – Programa de Desenvolvimento Educacional,
iniciado no ano de 2007, direcionado a atender 44.400 professores da Rede
Estadual de Ensino, por meio de Grupos de Trabalho em Rede, e,
diretamente, 1200 professores, visando a promoção na carreira, bem como
sua formação continuada. Além desses profissionais envolvidos, houve
ainda um terceiro público que também participou do programa, conforme o
objeto de estudo que cada um desenvolveu, dos 1200 professores
selecionados. Deste público destacam-se: professores, pedagogos, alunos,
pais e comunidade.
O trabalho inicial foi realizado com os alunos, onde os mesmos
puderam expor suas opiniões em relação aos fatores que interferem no
processo ensino-aprendizagem, bem como suas perspectivas em relação ao
futuro.
Vários fatores que interferem no processo ensino-aprendizagem e
conseqüentemente na prática pedagógica ficaram mais evidentes, tais
como: A avaliação do processo ensino-aprendizagem, a prática pedagógica
do professor, a relação professor-aluno, a relação família-escola-educando,
bem como os problemas externos à educação como a violência, que
entendemos estar relacionada a fatores do contexto societário mais amplo.
2 Para maiores informações consultar http://www.pde.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=2
2
Esses dados nos trouxeram questionamentos, expectativas e
exigências de um novo direcionamento ao grupo de discussões
pedagógicas, como será apresentado a seguir.
2 - A PRÁTICA PEDAGÓGICA E A NECESSIDADE DE
REDIRECIONAMENTOS
Considerando que nossa trajetória educacional está envolta em
princípios ideológicos, culturais, sociais, históricos e econômicos e que estes
não são neutros e sempre apontam para uma intencionalidade, cabe-nos
questionar: Que problemas podem vir a inviabilizar a formação de cidadãos
que possam participar da sociedade de forma crítica no sentido de
vislumbrarem possibilidades de transformação da realidade social? Quais
fatores nos levam a resultados tão pouco desejáveis em relação à
aprendizagem e formação de nossos alunos?
Ao refletir sobre estas questões, enfatizando o espaço escolar
como espaço de adestramento ou contradição, Sapelli (2004), destaca:
“... Ora, se a base material da qual se construirá e consolidará a sociedade igualitária é precisamente da sociedade capitalista, cujas entranhas carregam as estratégias necessárias para a sua manutenção, qual a razão para ser professor? A lógica está no método, na apreensão da realidade. Como percebo os sujeitos? Compreendo-os como fonte da transformação ou como determinados pela estrutura?”
As palavras da autora nos remete a pensar que ao discutir
educação, precisamos discutir a concepção de homem, mundo e sociedade.
Faz-se necessário ainda discutir currículo e ao nos referirmos a este assunto,
concordamos com Sapelli (2004), que faz as seguintes colocações:
“Discutir currículo não é restringir-se a discussões meramente técnicas ou estratégicas. Discutir currículo é discutir vida, concepção de homem e de mundo, projetos de sociedade. É compreender, talvez relembrar, repensar, redefinir a função da escola e de cada profissional da educação. Definir que currículo é um ato político, tenhamos nós consciência ou não dele. Portanto, discutir currículo é um ato complexo, pois representa desvelar relações de poder
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que ocorrem na escola e para além dela. Exige a compreensão das concepções que sustentam a organização dos tempos e espaços escolares; a explicitação dos interesses que definem as políticas educacionais, a compreensão do que seja método, dentre outros aspectos.”
A discussão da prática pedagógica no espaço escolar nos revela
realmente a complexidade das relações e ações que ocorrem neste espaço.
Freire (2001, p. 21-22), argumenta que, pelo fato da escola ser um espaço
livre, se constitui em ambiente fecundo, onde devem ocorrer discussões
sobre as problemáticas pertinentes ao povo e, incorporar essas reflexões
numa dimensão curricular, conduzindo para sua valorização no sentido do
reconhecimento, pelo povo, do direito e dever da luta por uma escola de
qualidade, mais democrática, menos elitista e menos discriminatória
Assim, percebemos nas discussões e grupos de estudos, durante
a intervenção pedagógica realizada, algumas relações de poder elitista e
discriminatória, relações estas, até então implícitas por valores, idéias,
concepções muitas vezes representadas por uma contradição ao que está
posto no Projeto Político Pedagógico sobre o papel da escola. Essas
contradições nos levam a refletir sobre a cultura dominante na sociedade
atual.
Analisando as colocações sobre a função da escola postas no
Projeto Político Pedagógico e considerando que essa função vai muito além
do ato de ensinar e que são encontradas muitas contradições na prática
pedagógica, voltamos ao seguinte questionamento: “Quais os
condicionantes internos e externos contribuem para resultados tão pouco
desejáveis em relação aos índices de aprendizagem dos alunos e
conseqüentemente a sua permanência na escola?”
Considerando que é difundida na sociedade atual a necessidade
de formação de jovens com diferentes perfis, e que todos devem ter acesso
à educação básica e, considerando ainda que presenciamos condições
concretas de competitividade e exclusão social, torna-se um desafio para
nós educadores a formação desses jovens.
Diante desses e outros condicionantes, torna-se urgente que a
escola conheça as exigências da sociedade capitalista, a organização das
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forças produtivas, e os interesses que permeiam a educação para não correr
o risco de uma submissão passiva.
Zibas (2003) reforça e nos esclarece esta necessidade:
“(...) a par da inevitável instrumentação dos jovens, para que sobrevivam no mundo real, torna-se fundamental que a escola ensine a “leitura desse mundo”, ou, em outras palavras, que desenvolva a cidadania democrática, aqui entendida como a compreensão histórica das relações estruturantes do mundo econômico e social, de forma que a sociedade seja percebida como passível de ser transformada.”
Quando a autora se refere a este mundo real, percebemos que
este traz consigo sujeitos também reais, marcados em sua maioria pela
desigualdade social, pelo desemprego, pela miséria entre outros problemas,
como bem discutido por Frigotto (1995). Estes alunos quando conhecidos
por nós, deixam de ser idealizados, ação que reflete na prática pedagógica.
Esta referência traz a necessidade de que os educadores se
aproximem da cultura juvenil, visando a ampliação de possibilidades na
realização da prática pedagógica, tornando os conteúdos trabalhados mais
significativos aos alunos enquanto ponto de partida.
As dificuldades oriundas do desconhecimento das formas como
vivem os alunos, de onde eles vêm, e quais suas condições de
aprendizagem ficaram também perceptíveis em nossos grupos de estudos.
Os alunos do ensino médio noturno possuem expectativas de futuro, mas
enfrentam no seu dia-a-dia escolar o desconhecimento por parte dos
educadores destas perspectivas, bem como do contexto social ao qual
estão inseridos, como se já estivesse legitimado que alunos de periferia,
com poucos recursos econômicos não tivessem a intenção de um dia
melhorar suas condições de vida.
Percebemos na análise em questão que embora esta intervenção
estivesse sendo dirigida aos alunos do ensino médio noturno, esta mudança
de entendimento sobre a realidade e as expectativas dos alunos estende-se
também a outras modalidades de ensino. É preciso que enquanto
educadores possamos refletir e questionar a docência que exercemos para
os diferentes grupos que atendemos nas escolas.
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Arroyo (2004), em seu livro “Imagens Quebradas –Trajetórias e
tempos de alunos e mestres”, nos aponta que a as formas como aprendem,
pensam e se socializam crianças ou adolescentes, jovens ou adultos, que
trazem consigo as marcas da desigualdade social, da fome, da violência, do
desemprego dos pais, promovidas em grande parte pelo arrefecimento das
contradições oriundas da globalização da economia, cujos impactos ocorrem
na alternância entre estudos e sobrevivência, enfim, toda essa realidade
humana é ignorada e/ou secundarizada, quando o assunto é o ofício de
ensinar. É como se ensinar, e desenvolver a prática pedagógica estivessem
distanciados ou desconectos das vivências, do real.
Redirecionar nossas práticas pedagógicas significa pensar em
discutir e conhecer o sujeito, a sociedade e seus condicionantes. Significa
discutir currículo, além dos conteúdos a serem ensinados e de que forma
serão ensinados. Significa o entendimento de como os alunos aprendem, ou
por que alguns alunos não aprendem ou tem dificuldades de aprendizagem?
Ao invés de tais encaminhamentos, percebemos nas escolas
algumas práticas contraditórias. Se formos analisar a organização do tempo
e espaços escolares, a divisão das turmas muitas vezes se dá pelo nível de
conhecimento e/ou condições econômicas e sociais. É como se voltássemos
às décadas passadas onde os alunos considerados avançados eram
classificados para turma A, os medianos para a turma B e os ditos fracos
para a turma C. Há ainda a prática de que na relação docente/discente, a
turma C ou a “turma comprometida” seja repassada a docentes recém-
chegados na escola.
Em que ponto essas práticas pedagógicas estão levando os
professores, os profissionais da educação, a estimular a aprendizagem e o
desenvolvimento dos alunos? A organizar e direcionar a sua prática? Esta
prática é intencionada no Projeto Político Pedagógico como estratégia para
melhorar a aprendizagem e conseqüentemente o convívio entre alunos e
mestres? Há ainda neste Projeto qualquer justificativa teórica para tal
procedimento?
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Em um trabalho de pesquisas e relatos de experiências3,
desenvolvido por Arroyo (2004), com um grupo de professores, sobre como
se procedia a organização das turmas nos espaços escolares, a realidade
encontrada surpreendeu o coletivo da oficina. Após um trabalho
investigativo, o autor apresenta o relato de um professor: “Fizemos questão
de constatar o nível social e a cor das turmas classificadas como fracos e
verificamos que em sua maioria eram pobres e negros”. E continua um
outro professor:
“Se é verdade que existem níveis cognitivos, ritmos de progressão e aprendizagem, teremos de concluir por um simples olhar sobre os alunos (as) que compõem essas turmas, que negro e pobre têm ritmos de aprendizagem mais lentos e níveis cognitivos inferiores. Poderíamos ser denunciados por segregação social e racial”.
Relacionando tais dados apresentados por Arroyo (2004) e a
intervenção que apresento neste ensaio, entendo que foi priorizada na
intervenção uma intencionalidade pedagógica que procurou compreender
primeiro a realidade dos alunos do ensino médio noturno para
posteriormente se estender ao coletivo da escola.
Em uma reunião pedagógica, onde se faziam presentes todos os
professores, equipe de direção, equipe pedagógica e administrativa da
escola, um dos temas que estava sendo discutido era o sistema de
avaliação. Ao ser apontado para a equipe pedagógica, a prática de uma
avaliação emancipadora 4·, no sentido de uma real inclusão pela aquisição
do conhecimento, pelo fato de termos como dados coletados um altíssimo
índice de alunos que haviam sido aprovados por Conselho de Classe no ano
anterior, houve o seguinte posicionamento por parte de uma das
3 Relatos extraídos do Livro Imagens Quebradas – Trajetórias e tempos de alunos e mestres –pg. 343, onde traz em discussão por um grupo de professores, mediados pelo autor, a flexibilização dos agrupamentos dos alunos em sala de aula.
4 Acácia Kuenzer em seu texto “ As relações entre trabalho e educação no regime de acumulação flexível” nos aponta que na relação entre trabalho e educação no regime de acumulação flexível a desigualdade social aumenta. Neste sentido, do ponto de vista do trabalho, o mercado exclui a força de trabalho formal para incluí-la de novo através de diferentes formas de uso precário ao longo das cadeias produtivas. Do ponto de vista da educação, o processo educacional, através da precarização dos processos pedagógicos, inclui para excluir ao longo do processo...”
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professoras: “Nosso trabalho e dedicação é o mesmo para todas as turmas.
Porque os alunos da turma X não aprendem? ...Claro, não deixam a gente
dar aula... São todos reprovados, fora da idade série, indisciplinados etc”.
Ao verificar durante a minha intervenção, a procedência de tal
fato, o choque foi muito grande, pois rememorei um trecho comentado por
Arroyo (2004), ao abrir a porta da sala de aula de uma 5ª série do período
matutino. A realidade ali encontrada se aproximava daquela comentada
pelo autor: alunos que vinham de classes menos privilegiadas e que
cursavam aquela série por duas e até três vezes. Este fato nos leva a
questionar qual a intencionalidade do trabalho pedagógico realizado nas
turmas que se encontravam nesta situação.
Na análise de outras 5as séries do mesmo período, a constatação
foi inversa. Alunos e alunas em idade considerada correta para a série, e
dentro dos padrões definidos como normais.
Dentro deste contexto, se a escola possui turma com tais
peculiaridades o plano de trabalho docente dos professores são pensados
de forma a atender tais peculiaridades? E a organização do espaço e tempo
escolar são discutidos no coletivo da escola e posto no Projeto Político
Pedagógico? No Plano de ação da escola, quais as proposições traçadas
para lidar com tal realidade?
Analisando essas práticas na Escola onde foi realizada a
intervenção, chegamos à conclusão que a realidade era a mesma das
escolas analisadas no projeto de pesquisa realizado por Arroyo (2004.p
342), cujas características são apresentadas por escolas que se pautam em
“(...) velhos critérios seletivos, classificatórios, hierárquicos,
preconceituosos e excludentes com que as normas das secretarias nos
obrigavam a enturmar e reenturmar os educandos”.
Ainda que possamos considerar que estamos avançando nas
discussões, há muito a ser realizado para que possamos concretizar práticas
pedagógicas emancipadoras que possam efetivamente provocar mudanças.
Discutir os condicionantes que cada vez mais agravam a escola
pública não é tarefa simples e para propor ou realizar certos
encaminhamentos, temos de nos amparar em uma tarefa de reflexão com
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base em um suporte teórico que realmente venha ao encontro de nossas
intencionalidades, e estas devem estar claramente definidas.
Regina Leite Garcia (1984), comentou que numa sociedade
capitalista, as normas escolares tendem a eleger como normal não o aluno
da classe trabalhadora, que traz consigo um perfil psicológico, social e
cultural típico desta classe, mas sim o aluno da classe média. Esta prática
da normalização é própria desta sociedade que ao criar normas que vão
reger as instituições são orientadas por uma minoria social, detentora do
poder.
Percebemos assim, que no interior das escolas esta prática se
reproduz muitas vezes na ação pedagógica e na fala dos educadores. Ao
darmos voz aos alunos do Ensino Médio Noturno e também do Ensino
Fundamental do mesmo turno, sobre questões relacionadas a fatores que
interferem no ensino-aprendizagem, os fatores mais citados nas palavras
deles, foram:
“Os alunos não tem devolutiva das provas da disciplina “x”; “A maioria dos professores não respeitam os alunos”; Na disciplina “y” encontramos dificuldades, pois o professor passa exercícios e quer para o outro dia, sendo que não aprendemos ainda. Explica muito rápido e não há interação dos alunos”; “Temos dificuldades na disciplina “x”, o professor não devolve as provas, não explica a matéria o suficiente e caso o aluno perguntar há atrito”; “Temos dificuldades na disciplina “y”, pois quando pedimos explicação, a professora às vezes se recusa e por qualquer motivo quer nos encaminhar para a orientação, mesmo estando errado”;
E continuam os depoimentos:
“O professor da disciplina “y” passa trabalho e esquece que fizemos, não dá nota e já passa outra coisa e assim vai complicando”. “O professor “fulano” já aplicou provas em situação que havia apenas três alunos na sala de aula”; “O que atrapalha as aulas é o excesso de conversa dos alunos e má explicação dos professores”; “Alguns professores, pelas conversas, passam matéria até os alunos reclamarem e depois não explica”; “Os professores não querem saber se trabalhamos ou não. Se temos dificuldades em algumas disciplinas, não nos ouvem...”
Quando foi possibilitada voz aos professores a situação se
inverteu. Na maioria das falas houve as expressões: “Os alunos não querem
estudar”; “São indisciplinados”; “Não fazem tarefa”; “Conversam demais”...
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Neste momento foi apresentado o que os alunos pensavam e
juntos chegamos à conclusão que o problema maior poderia estar no
relacionamento professor-aluno, na metodologia e no sistema de avaliação.
Assim, traçamos alguns caminhos. Os professores sentiram-se sujeitos do
processo ensino-aprendizagem. Após alguns apontamentos, os educadores
entenderam ser viável que discutíssemos em nossos próximos encontros, a
relação professor-aluno e o Sistema de Avaliação.
Após a leitura do texto de Marlene Sapelli, “A Relação
Interpessoal entre Educando/Educador no Contexto da Pedagogia Crítica”,
fizemos grupos de estudos e paralelo a essas atividades, fomos repensando
as práticas pedagógicas. O primeiro passo foi dado: O pensar com
criticidade, o conhecimento e o respeito necessário na nossa relação com o
aluno. A nossa autoridade não confundida com autoritarismo. Pois partimos
de um encaminhamento de trabalho reflexivo baseado em Paulo Freire
(1967, p. 66) que diz que “[...] o diálogo é uma relação horizontal. Nutre-se
de amor, humildade, esperança, fé e confiança”, e ainda “a afetividade é
um compromisso a ser selado entre professor-aluno, não comprometendo
seu dever enquanto profissional”.
Quanto a outros determinantes, que no decorrer do processo de
implementação, durante as discussões foram vindo à tona, como foi o caso
do agrupamento de alunos das 5as séries, deixamos para nos aprofundar e
explicitar neste documento, que futuramente servirá como material de
apoio para novos estudos e melhor compreensão, a fim de novamente
revermos nossas práticas e redirecioná-las.
3 – CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO E OS CONDICIONANTES INTERNOS E
EXTERNOS A ELA - UMA DISCUSSÃO NECESSÁRIA.
Ao iniciarmos qualquer discussão inerente a educação é
importante compreendê-la como atualização histórica de cada indivíduo,
1
sendo o educador o mediador, oportunizando assim, por parte dos
educandos, a aquisição de conhecimentos e capacidades para o
enfrentamento de exigências postas por um determinado contexto social.
Como a escola não pode dar conta de todo o saber historicamente
produzido, devemos então, priorizar em cada série dos níveis e modalidades
da educação aqueles mais relevantes para a formação histórico cultural dos
cidadãos.
Considerando então, as diversas formas em que ocorre o
processo educacional, bem como o papel da educação, devemos analisar
algumas dificuldades que nos são colocadas e em que condições se
encontram os educadores no interior das escolas, ou seja, como os
educadores foram ou estão preparados para contribuir historicamente na
formação dos alunos.
Enfatizamos a necessidade de um estudo sobre o contexto social,
pois vivemos em uma sociedade capitalista dividida em classes, cujos
impactos da globalização e do pensamento neoliberal, vem refletindo na
educação, e conseqüentemente exigindo um novo perfil de aluno para
atender as exigências desse mercado.
O educador precisa considerar o contexto social e entender a
política educacional que constitui a base para o desenvolvimento de seu
trabalho pedagógico. Caso não se tenha compreensão desse processo,
corremos o risco de apenas legitimar uma seqüência de encaminhamentos
que irão afetar o homem, o trabalhador, enfim o cidadão.
Entendemos que a educação de qualidade deve atender
satisfatoriamente a todas as pessoas, independente da classe social a que
pertencem. É preciso atender as necessidades de um maior número de
cidadãos, independentemente de origem étnica, cultural, social, etc. Afinal
de contas, nossa nação se fundamenta na Constituição Cidadã, que garante
a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho (CF, art. 1º,
III e IV). A ordem econômica é fundada na valorização do trabalho humano,
tendo por fim assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da
justiça social (CF, art. 170).
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Para chegarmos mais perto deste atendimento, devemos
considerar a amplitude do contexto social, sua relação com a elaboração da
política educacional. Precisamos entender seus pressupostos, suas
implicações e seus interesses 5.
Enquanto a Legislação tem como fundamento a dignidade
humana e a justiça social, a sociedade sofre com condições concretas em
que ocorre a falta de qualidade e atendimento em relação à educação, à
saúde, a segurança, lazer e muitas outras coisas que seriam o mínimo
necessário para terem uma vida digna. Esta situação dificulta a
universalização dos direitos, aparentando haver uma desconexão entre o
que é legal e o que é real no exercício da cidadania do atual contexto.
Percebemos que a crise capitalista que se estende no século XXI
repercutiu em outros espaços, trazendo outras crises, como por exemplo, a
crise de identidade, de valores, de sobrevivência, da família, da relação com
o outro, a banalização da vida, a valorização do ter em detrimento do ser.
Enfim, a realidade social e educacional nos traz a partir destes
problemas inúmeros enfrentamentos a serem realizados na prática
pedagógica. Acreditamos que assim, poderemos estar contribuindo de
forma mais efetiva para a emancipação política, cultural e social dos alunos,
que é uma das funções sociais da escola, quando no processo da relação
ensino-aprendizagem , nos colocarmos como sujeitos iguais no processo
em questão, sujeitos de luta, como classe de oprimidos, pois como dizia
Paulo Freire: que sejamos professor-problema, mas no sentido de desocultar
a realidade. Assim, entendemos que a rebeldia, a falta de valores e a crise
de identidade dos alunos sejam superadas por uma consciência mais crítica
em face dos fatos que a causam.
Alguns apontamentos feitos por autores como Dufour (2001)
evidenciam esta crise instaurada. De modo mais imediato sabemos que no
contexto do neoliberalismo, além da desigualdade social, do desemprego,
da fome, da pobreza, dos problemas ambientais, da flexibilização da
5Sobre o assunto consulte “Uma análise da Constituição Federal e suas Emendas”, por Carina Fontes Silva e Daiana Vazquez Nogueira (1997) e “A redefinição do espaço público na organização da escola pública” - VIRIATO, Edaguimar Orquizas.
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economia, das mais diversas formas de exclusão social, há também uma
desvalorização dos preceitos morais e éticos e uma supervalorização do
sujeito livre e da individualização. Assim, a família estruturada em um
núcleo de pai, mãe e filhos, tal como o sistema de produção, está sendo
recomposta. Infelizmente, o impacto de tais acontecimentos vem deixando
os jovens mais vulneráveis e mais desencontrados.
Para Dufour (2001), a nova condição subjetiva dos indivíduos é a
da perda de referenciais. A ausência de amparo. O indivíduo não deve sua
existência a si mesmo, mas ao outro. “A figura do outro garante ao sujeito
“uma permanência”, uma origem, um fim, uma ordem”.
A perda de referências junto a outros aspectos como as novas
exigências do mercado de trabalho vem trazendo mudanças na sociedade.
No quadro de crise econômica e da evidente desobrigação do Estado na
esfera social, ressurgem os discursos e as práticas de revalorização da
família, onde esta se torna a grande responsável por prover as
necessidades dos indivíduos. Argumenta-se no discurso neoliberal, que
através da família podem-se encontrar chances de reconstruir o aspecto
multifacetado da pobreza.
“Assim, em um contexto social marcado pelo aumento do desemprego, no qual torna-se cada vez mais difícil a obtenção do trabalho assalariado e, por conseqüência, o acesso à cidadania, a família vem se tornando, talvez, quase a única possibilidade real para os indivíduos proverem as suas necessidades, principalmente diante da inoperância ou mesmo ausência de mecanismos de proteção social que levem em consideração os efeitos sociais recentes dos problemas originados da precarização do trabalho”. (ALENCAR, 2004:63)
Porém, deve-se explicitar que não devemos repassar a família,
encargos que são de responsabilidade do poder público. O desemprego
crescente, o rebaixamento dos salários, a precarização das condições e
relações de trabalho e desregulamentação dos direitos sociais, nos permite
entender a fragilidade da família para cumprir seu papel social.
No entanto, faz-se necessário repensar a relação família-escola,
oferecendo-lhes alternativas reais de participação na escola, assegurando o
princípio da gestão democrática como previsto na Constituição Brasileira.
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Nesse contexto, não podemos, enquanto educadores, ignorar
essa realidade. Precisamos discutir caminhos para superação dos reflexos
negativos que essa perda de referenciais, essa vulnerabilidade entre os
jovens das famílias da classe trabalhadora podem causar em nossa prática
pedagógica.
Neste sentido, na discussão da educação no atual contexto
capitalista é que a prática pedagógica deverá ser redimensionada. É preciso
pensar um Projeto Político Pedagógico construído coletivamente, onde
devem estar explicitadas as intencionalidades de efetiva participação para
transformação, envolvendo efetivamente a família e os demais segmentos
colegiados – APMFs, Conselhos Escolares e os Grêmios Estudantis.
Ainda que a Secretaria de Estado da Educação do Paraná tenha
avançado muito nos últimos anos nas discussões e capacitação dos
gestores e pedagogos, acerca de uma gestão democrática, há ainda um
grande caminho a percorrer. Percebe-se nas práticas escolares, a
necessidade de internalizar esse processo como um processo coletivo e pelo
coletivo, de se libertar de amarras históricas e políticas que visavam uma
democracia simplista e restrita à ordenação legal. Torna-se urgente
também, pelo constatado nas escolas, a formação pedagógica do gestor no
sentido de tornar a gestão democrática comprometida com a qualidade da
educação e com as possibilidades de transformação social.
Percebemos ainda, que a crise instaura-se também nas relações
entre professores e alunos. É na sala de aula que acontece o momento de
múltiplas relações. É o espaço onde professores e alunos se constroem e
revelam seus posicionamentos quanto à concepção de homem, mundo e
sociedade.
Será dentro deste espaço que a relação entre o professor e aluno
se manifestará, construindo assim o que chamamos de conhecimento
escolar e que a partir de um quadro científico, estabelecem um processo de
relações em diferentes níveis e através de comparações, análises,
ressignificação, reelaboram os elementos deste quadro transformando-os
em conhecimento. Quando alguém conhece e se apropria de algo que não
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lhe pertencia, passa a operar mentalmente com estes novos recursos, re-
construídos no pensamento e pelo pensamento.
Paulo Freire aborda em vários momentos, a importância de uma
boa relação professor-aluno, para o sucesso no processo ensino-
aprendizagem e revela: “Como professor devo saber que sem a curiosidade
que me move, que me inquieta, que me insere na busca, não aprendo nem
ensino.
Percebemos assim, os diversos fatores que interferem nessa
relação. Dentre eles podemos considerar a competência científica do
professor e sua prática pedagógica em sala de aula.
Será nessa prática pedagógica do professor que ocorrerá a
interação professor-aluno, favorável ou desfavorável. Para isso é preciso
apropriação de aspectos da realidade juvenil, visando entender como pensa
e sente o jovem, o adolescente que encontramos nos bancos escolares. De
acordo com Aquino (2003) os professores, os educadores precisam se
apropriar de tudo o que o aluno traz.
“Se for um piercing, que seja ele o disparador da reflexão da utilização dos ornamentos através dos povos e dos tempos. O estudante precisa ser transportado pelo tempo pelas mãos de alguém. O professor inicia a vida dos alunos e tem a obrigação de despertá-lo para o fato de que é na escola que repousa toda a riqueza da humanidade”.
Essas circunstâncias nos levam a perceber que nossas crianças e
jovens mudaram, como mudou também a sociedade, o modo de produção,
as formas de trabalho, etc.
Foi perceptível, durante a implementação pedagógica, a
dificuldades que os educadores têm em se aproximar da cultura juvenil e de
conhecer melhor os alunos. Demonstraram pouco interesse no primeiro
momento o qual estivemos reunidos, onde foi apresentado o perfil social e
econômico de nossos alunos, suas expectativas em relação aos estudos, ao
trabalho etc.
Foi incrível a constatação de que muitos educadores não
conheciam os alunos que estavam se relacionando, o que nos leva a pensar
que a educação bancária comentada por Paulo Freire ainda está vigorando,
como se o aluno apenas servisse como recipiente de conteúdos.
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Quando foi argumentado sobre as possíveis expectativas do
aluno do ensino noturno, em relação ao futuro, antes de ser apresentado o
resultado da pesquisa realizada, a maioria disse: “nossos alunos são alunos
trabalhadores e não tem intenção de continuar seus estudos”; ”eles não
tem expectativas, chegam atrasados e não levam os estudos a sério”. Que
contradição! Os alunos eram sim alunos trabalhadores, mas alunos com
sonhos, com expectativas de cursar o ensino superior, ter um ensino de
qualidade, de ter uma vida mais digna.
Arroyo (2004) pg.39, explicita estas contradições:
“Em vez de condenar os alunos não seria mais profissional perguntar-nos se eles são livres para escolher as formas indignas de viver sua infância, adolescência, juventude? Perguntar-nos se temos direito a excluí-los da escola e das salas de aula apenas porque suas condutas não cabem nos limites de nossas precárias condições de trabalho? É legítimo que os mestres sonhem com alunos bondosos, ordeiros, condescendentes, porém não é profissional condenar crianças, adolescentes e jovens por serem feitos violentos e ameaçadores pela vida. O fato é que as escolas vivem impasses antes não vividos. As imagens de infância são quebradas exatamente em tempos em que as condições de trabalho docente se deterioraram. Como sair desse impasse? Ao menos como equacioná-lo com profissionalismo? “
Esta constatação abriu espaço para que pudéssemos repensar a
prática pedagógica, a relação que temos com o outro e abrir espaço para
novas reflexões.
Percebemos nas discussões e reflexão sobre a relação professor
aluno, após a leitura do texto "A Relação Interpessoal entre
Educador/Educando no Contexto da Pedagogia Crítica” 6, pelos professores,
equipe pedagógica e direção, que os mesmos sentiram-se sujeitos de um
processo ensino-aprendizagem e de gestão onde há uma relação de poder,
hierarquia e autoritarismo, nas próprias relações interpessoais, no sistema
de avaliação da aprendizagem e nas metodologias utilizadas. Dar voz aos
alunos em um primeiro momento, contribuiu para esta conclusão.
Embasados neste processo de discussão e percepção da
necessidade de novos encaminhamentos em relação a uma avaliação da
6 Disponível em www.olhoscriticos.com.br. Acesso em 20/03/2008.
1
aprendizagem e práticas pedagógicas preocupadas com a transformação
social, não discriminatória e atenta aos modos de superação do
autoritarismo e poder pela prática desta avaliação, iniciamos novas
discussões, pois de acordo com Freire (1987,p.68):
“Desta maneira, o educador já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa. Ambos, assim, se tornam sujeitos do processo em que crescem juntos e em que os “argumentos de autoridade” já não valem. Em que, para ser-se, funcionalmente, autoridade, se necessita de estar sendo com as liberdades e não contra elas.”
4 – O SISTEMA DE AVALIAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES PEDAGÓGICAS
O ato de avaliar não ocorre desprovido de concepções sobre a
educação, a formação e a avaliação. Ele é dependente do que pretende o
Plano de Trabalho Docente do professor. Porém, na prática educativa,
freqüentemente não há compreensão de que toda prática pedagógica se
fundamenta numa determinada teoria pedagógica. O que aparenta é que o
professor realiza a avaliação desvinculada de toda uma teorização que
fundamenta o processo de ensino e aprendizagem. Nesse processo
raramente é feita uma análise do que se ensina, como se ensina e que
medidas poderão ser tomadas se a aprendizagem não ocorreu de fato.
Para Luckesi (1995) quando a avaliação escolar não é conduzida
de forma adequada, ela pode levar ao insucesso escolar, que por sua vez,
pode ter como conseqüência a evasão do aluno.
Na entrevista realizada com os alunos, mesmo que estes não
soubessem se expressar com termos claros, evidenciou-se que as formas
com que as avaliações eram conduzidas interferiam negativamente no
processo de ensino-aprendizagem e conseqüentemente nos resultados
desta aprendizagem.
Os relatos dos alunos revelaram as incoerências pedagógicas nas
formas de avaliação e como afirma Souza (1993), a avaliação do
rendimento escolar muitas vezes é utilizada “como parte de uma ação
1
política que visa discriminar (...) aqueles que a sociedade já mantém
discriminados sócio-econômica e culturalmente” (p.146).
Retomando os depoimentos dos alunos ao que se refere à prática
dos professores em relação às formas de avaliação, quando os mesmos
explicitam que: “Os alunos não tem devolutiva das provas da disciplina “x”;
“Temos dificuldades na disciplina “x”, pois o professor não devolve as
provas, não explica a matéria o suficiente e caso o aluno perguntar há
atrito”; “O professor da disciplina “y” passa trabalho e esquece que
fizemos, não dá nota e já passa outra coisa e assim vai complicando”. “O
professor “fulano” já aplicou provas em situação que havia apenas três
alunos na sala de aula”. Percebe-se a distorção que há entre o verdadeiro
sentido da avaliação, uma vez que segundo Luckesi (1994, p.82), a
avaliação deve ser compreendida como um “instrumento auxiliar da
aprendizagem e não um instrumento de aprovação ou reprovação dos
alunos”, dá aos sujeitos envolvidos no processo ensino-aprendizagem uma
base sólida para fundamentar sua formação.
Assim, a avaliação deveria ser entendida como um referencial
que gera parâmetros que devem ser previamente estabelecidos, descritos e
conhecidos pelos alunos, favorecendo a transparência do processo, a
orientação do trabalho discente e a co-responsabilidade do aluno no
processo de aprendizagem, fato este, que pela prática demonstrada não
está ainda amadurecido.
Luckesi (1995), também argumenta que devemos ter ciência de
que, durante uma avaliação, é solicitado ao aluno que este demonstre seu
íntimo, pois será necessário analisar o seu modo de aprender, sua
capacidade de raciocinar, seu modo de entender e de viver, entre outros
aspectos.
Constatando-se a necessidade de retomada acerca da avaliação,
uma das formas de subsidiar as discussões com o coletivo da escola foi a
verificação de como os professores registravam suas avaliações no Livro
Registro de Classe .
Ao perceber, que determinada disciplina estava com um número
muito elevado de notas baixas, verificou-se que os conteúdos que estavam
1
sendo trabalhados, as formas de instrumentos de avaliação aplicados e se
havia tido em algum momento, a retomada pelo professor, daqueles
conteúdos não aprendidos.
Averiguou-se, que a grande maioria, recuperava os instrumentos
utilizados para verificação da aprendizagem, isto é, se o professor havia
aplicado uma prova escrita com valor de cinqüenta pontos e outros
instrumentos, tais como, trabalho de pesquisa individual , com valor de
trinta pontos ; trabalho em grupo com valor de vinte pontos, totalizando os
cem pontos , mesmo que o aluno não tenha tido demonstrado resultados
satisfatórios de aprendizagem no trabalho de pesquisa individual, havia
registro de retomada ou revisão, somente do conteúdo avaliado na prova
escrita, ou seja, de cinqüenta pontos.
Dentro desta prática surgiram os seguintes questionamentos:
Que critérios de avaliação o professor havia estabelecido para aquele
conteúdo? Qual sua relevância? Por que o aluno não aprendeu? Os alunos
só têm direito a aprender cinqüenta por cento do que o professor planeja
ensinar? A metodologia usada pelo professor é a ideal para aquela turma?
Salientamos ainda alguns princípios da SEED – Secretaria de
Estado da Educação do Paraná, pois de acordo com sua política educacional
destaca:
“os princípios norteadores da educação no estado do Paraná apontam que precisamos garantir a aprendizagem de todos os alunos e que orientados por uma pedagogia progressista em que o conhecimento é fator imprescindível para a formação do cidadão e consequentemente transformação da sociedade que aí está e que a concepção de avaliação que fundamenta o nosso trabalho tem sua base no materialismo histórico crítico, de modo que a concepção de homem é do ser histórico, produtor de sua existência ... livre no sentido de agir intencionamente ...optar por uma coisa ou outra ...deste modo educa e educa-se, avalia e avalia-se , transforma e se transforma, faz-se humano”.
Apesar de todo o esforço e trabalhos desenvolvidos para uma
prática de avaliação para a inclusão social de fato, pelo conhecimento
historicamente produzido, percebemos que na prática a mesma continua
excludente e classificatória, e como afirma Dalben (1994):
“Encontra- se, no sistema escolar, a predominância de uma forma de avaliação de caráter estático, classificatório, centrado
1
no processo de formalização do ensino, cristalizando-o no tempo e no espaço, através de rituais, de diplomas, de certificados e de outros mecanismos. Assim, de um processo dinâmico que é, em sua essência, a avaliação segundo o nosso sistema de ensino, transforma-se em um produto, em um resultado, em que se anula toda a sua proposta de dialeticidade”
Portanto, a avaliação deve objetivar a melhoria dos processos de
ensino e de aprendizagem vigentes na instituição escolar. Não é condizente
propor mudanças estratégicas e manter a avaliação em situação idêntica
por décadas.
Destacando que um dos temas propostos pela CGE/SEED7 para
formação continuada dos pedagogos da rede estadual de ensino, nas
Jornadas Pedagógicas 8, neste ano de 2008, foi avaliação da aprendizagem,
fizemos uma retomada embasados em alguns materiais e textos estudados 9 nesses encontros.
Entendemos ser importante ressaltar algumas idéias de um dos
materiais produzidos pelo grupo de Pedagogos em uma das Jornadas
Pedagógicas, visto que este demonstra o entendimento pelos mesmos
sobre o tema. Apesar de todo o avanço demonstrado nas exposições de
trabalhos em grupos e na elaboração deste documento, sentimos a
dificuldade de interação entre esses profissionais e os demais segmentos da
escola – Professores, Pais, alunos e gestores.
Segue assim, o entendimento desse grupo de pedagogos, onde
são expostas as concepções e proposições sobre Instrumentos de Avaliação,
Concepção de Avaliação, Critérios de Avaliação, Relações existentes no
Processo ensino e aprendizagem e a Organização da Avaliação Escolar. Este
referencial nos auxiliará no entendimento das Propostas e estudos
realizados pela Coordenação de Gestão Escolar da Secretaria de Estado da
Educação do Paraná, bem como das equipes Pedagógicas dos Núcleos
Regionais da Educação com o objetivo de subsidiar a prática dos
professores nas salas de aula.
7 CGE-Coordenação de Gestão Escolar da Secretaria Estadual da Educação do Paraná8 Encontros bimestrais realizados pelas equipes pedagógicas dos Núcleos Regionais de Educação do Estado do Paraná, objetivando a formação dos gestores e pedagogos das escolas da rede estadual de ensino.9 - Materiais disponíveis em http://www.diaadia.pr.gov.br/cge/modules/conteudo/conteudo. php?conteudo=30
2
Ao se referirem sobre as possíveis formas de organização dos
instrumentos de avaliação no Plano de Trabalho docente, ficou evidenciado
pelo grupo que cada disciplina e conteúdo pode utilizar-se de instrumentos
conforme a realidade e necessidade de cada turma, intervindo assim, na
sua proposta metodológica. Porém, todos os instrumentos devem subsidiar
os processos pedagógicos de modo que o professor possa ter um
diagnóstico da realidade, a fim de traçar estratégias para melhoria do
processo ensino-aprendizagem.
Destacou-se ainda que o professor deva reconhecer no seu
próprio aluno as diferenças de aprendizagem, usando diferentes formas de
avaliar para que ele consiga alcançar seus objetivos dentro de suas
possibilidades.
Foi sugerido ainda pelo grupo, como formas de instrumentos os
portifólios, pesquisas, testes escritos e orais, seminários, observações
diárias, leitura entre outros.
Sobre concepção de avaliação defendem a idéia de que a
avaliação ideal a ser aplicada nas escolas deveria seguir as normas
emanadas pela Legislação vigente e conseqüentemente o que está descrito
nos Projetos Político Pedagógico, proporcionando ao aluno seu pleno
desenvolvimento através de oportunidades de instrumentos diversificados,
possibilitando ao mesmo a demonstração de seu conhecimento.
Considerando que a Deliberação nº. 007/99 do Conselho Estadual
de Educação do Paraná é a Legislação que dispõe sobre as Normas Gerais
para Avaliação do Aproveitamento Escolar, Recuperação de Estudos e
Promoção de Alunos, do Sistema Estadual de Ensino, em Nível do Ensino
Fundamental e Médio, traz em seu 1º artigo as seguintes colocações sobre a
avaliação da aprendizagem:
Art. 1.° A avaliação deve ser entendida como um dos aspectos do ensino pelo qual o professor estuda e interpreta os dados da aprendizagem e de seu próprio trabalho, com as finalidades de acompanhar e aperfeiçoar o processo de aprendizagem dos alunos, bem como diagnosticar seus resultados e atribuir-lhes valor.§ 1.° - A avaliação deve dar condições para que seja possível ao professor tomar decisões quanto ao aperfeiçoamento das situações de aprendizagem.
2
§ 2.° - A avaliação deve proporcionar dados que permitam ao estabelecimento de ensino promover a reformulação do currículo com adequação dos conteúdos e métodos de ensino.§ 3.° - A avaliação deve possibilitar novas alternativas para o planejamento do estabelecimento de ensino e do sistema de ensino como um todo.
Apesar dos pedagogos colocarem a importância sobre a
obediência à Legislação, apontaram algumas barreiras na efetivação da
pratica, tais como:
a) Resistência dos educadores a novos procedimentos teórico-
metodológicos;
b) Pedagogos com acúmulos de funções alheias, impedindo sua
intervenção pedagógica;
c) Tempo restrito para a prática da avaliação;
d) Excesso de projetos extraclasse.
Quanto aos critérios de avaliação, apontam que devem ser
definidos a partir de discussões coletivas, devendo estar em consonância
com o Projeto Político, sendo esses organizados e especificados no Plano de
Trabalho Docente.
No tópico direcionado às relações existentes no processo ensino
e aprendizagem, enfatizam que ao analisar a avaliação, que demonstrará o
resultado do processo ensino-aprendizagem, observa-se a necessidade de
uma interlocução entre a equipe-pedagógica, professores, alunos, pais e
Direção.
Visto que algumas escolas têm a prática de elaborarem a
“semana de prova”, o grupo destacou que este processo pode ter um
caráter de organização, mas que traz prejuízos ao educando, além de
contrariar o que se descreve no Projeto Político Pedagógico e no Regimento
Escolar, que trazem uma avaliação contínua e cumulativa.
Aponta ainda neste tema, a necessidade de uma construção
coletiva de critérios avaliativos. Os docentes devem explicitar aos seus
alunos os instrumentos utilizados, bem como seu objetivo e valor.
2
O texto “O que são critérios de Avaliação?”, elaborado pela
equipe da CGE-Coordenação de Gestão Escolar da Secretaria de Estado da
Educação, nos traz alguns esclarecimentos sobre o assunto:
“Os critérios decorrem dos conteúdos, isto é, uma vez selecionados os conteúdos essenciais que serão sistematizados, cabe ao professor definir os critérios que serão utilizados para avaliar o conhecimento do aluno. Para tanto, eles devem ser pensados no momento da elaboração do plano de trabalho docente e devem acompanhar a prática pedagógica desde os conceitos e os conteúdos que serão trabalhados até a forma (metodologia) e o momento em que forem valorados (peso) pelo respectivo sistema de avaliação. “Ousa-se defini-lo como o detalhamento do conteúdo, ou seja, a essência do mesmo, que o torna imprescindível para compreensão do conhecimento na sua totalidade. Os critérios, neste sentido, também são a via para se acompanhar o processo de aprendizagem, “devem servir de base para o julgamento do nível de aprendizagem dos alunos e, conseqüentemente, do ensino do professor. Portanto, o estabelecimento de critérios tem por finalidade auxiliar a prática pedagógica do professor, posto que é necessário uma constante apreciação do processo de ensino/aprendizagem”.(BATISTA, 200810)”
Outro aspecto considerado nas relações entre o processo ensino
aprendizagem foi a importância do pré-conselho de Classe11 , visando
buscar soluções e encaminhamentos de forma participativa, bem como
direcionar a elaboração de projetos de ensino paralelos, monitorias, além de
um trabalho direto do pedagogo com os professores, alunos e pais.
O grupo finalizou as discussões, relatando sobre a importância do
papel do pedagogo no sentido de atuar e mediar todas as relações
pedagógicas, envolvendo todos os segmentos, visando a melhoria, a
qualidade e efetivação de fato, do processo ensino-aprendizagem.
Com base nestas proposições pautadas pelos pedagogos das
sessenta escolas pertencentes ao nosso Núcleo Regional de Educação, foi
destacado, durante reunião pedagógica, prevista em calendário escolar,
alguns pontos deste documento, traçando um paralelo com a prática
realizada. Houve alguns questionamentos, inquietações, mas em todo o
10 Produção Didática elaborada pela profª. Angela Batista da Rede Estadual de Educação como produção final do PDE – PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO do Estado do Paraná em 2008.11 Momentos de reflexão, discussão e análise do processo ensino-aprendizagem, que antecedem os
Conselhos de Classe propriamente dito.
2
momento foi reforçado a importância de estarmos revendo nossas ações no
sentido de contribuirmos para um ensino de qualidade.
Foi exposto também, pelo coletivo da escola, pontos positivos
relacionados ao quanto avançamos nas discussões, pois dificilmente
paramos para repensar e redimensionar a nossa prática. Foi gratificante
sentir que podemos contribuir.
5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
O desenvolvimento deste trabalho oportunizou uma maior
interação entre o coletivo da escola no sentido de proporcionarmos tempo
para o repensar sobre as nossas práticas pedagógicas, considerando o
contexto social, econômico e político o qual estamos situados, para que a
partir daí , pudéssemos compreender melhor os resultados de nossas ações.
Nesta perspectiva, evidenciou-se uma mudança nas atitudes dos
educadores, que intecionaram a realização de práticas pedagógicas
refletidas e objetivadas, com base na discussão e entendimento quanto ao
tipo de aluno que queremos formar. Este é, em nosso entendimento, o início
de uma ação pedagógica que pretende ser coletiva visando com que a
escola enfrente formas aparentemente veladas de exclusão, organizando,
refletindo e entendendo as razões do desenvolvimento de seu trabalho
pedagógico, de sua ação docente.
Há de se destacar ainda, que este processo de discussões e
retomadas devam ser uma constante dentro do espaço escolar,
acompanhadas por grupo de estudos, capacitação continuada dos
educadores etc., no entanto, o excesso da demanda de funções que são
repassadas aos pedagogos das escolas aliadas a carga horária também
excessiva dos professores, dificultam muitas vezes esta interação.
2
Em relação aos alunos e pais, há ainda um caminho a ser
percorrido para que haja efetivamente sua participação no processo
pedagógico. Apesar dos Órgãos Colegiados - Grêmios Estudantis, APMFs
(Associação de Pais, Mestres e Funcionários), bem como os Conselhos
Escolares estarem evoluindo na perspectiva de uma Gestão Democrática,
estes segmentos ainda precisam ser mais bem consolidados.
Neste sentido, cabe também a nós, educadores, dispormos da
autonomia que nos garante a Legislação, para que de forma coletiva,
possamos adequar as nossas práticas a um currículo que venha a atender
as necessidades dos alunos da escola pública, que se diferenciam por
perspectivas de futuros desiguais e pela própria condição de existência.
6 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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