a internacionalizaÇÃo das polÍticas pÚblicas para a educaÇÃo crÍtica À flexibilizaÇÃo de...
TRANSCRIPT
-
A INTERNACIONALIZAO DAS POLTICAS PBLICAS PARA A
EDUCAO: CRTICA FLEXIBILIZAO DE UM DIREITO
HUMANO.
GONALVES JUNIOR, Luiz Claudio, UNISAL, U.E. Lorena
Eixo Temtico: Direitos Humanos: gesto e polticas pblicas para a educao.
Resumo
A educao est inserida no contexto dos direitos humanos por tratar-se de um direito que
deve ser garantido a todos os homens e por efetivar o princpio universal da dignidade da
pessoa humana. Apesar dessa importncia, o direito educao tem sido flexibilizado atravs
da internacionalizao de nossas polticas pblicas educacionais. Trata-se de um processo que
vem descaracterizando a noo de direito em nosso ordenamento jurdico. O objetivo da nossa
pesquisa mostrar de que maneira essa internacionalizao acontece e quem so os principais
atores envolvidos neste processo, seja sobre o aspecto do setor pblico ou privado. O
problema consiste em apontar algumas consequncias que j podem ser visualizadas no
sistema educacional brasileiro em decorrncia do processo de internacionalizao de nossas
polticas pblicas educacionais e sua interferncia na sociedade. Faremos uso de anlise
textual e interpretativa de revistas e livros, sendo certo que nossa metodologia de pesquisa
ser bibliogrfica. Concluindo, a importncia cientfica da pesquisa permitir observar o que
tem norteado nossas polticas pblicas educacionais, abrindo espao para uma melhor
discusso e reflexo sobre o tema no sentido de prevenir que o direito educao seja
totalmente descaracterizado a ponto de se tornar um aspecto secundrio no mbito social. Sob
o ponto de vista social, a importncia mostrar de que maneira a sociedade participa nesse
processo de internacionalizao, pois que a ideia mais coerente que haja uma gesto
democrtica sobre a educao. Sob o ponto de vista pessoal, entendemos que importante
chamar a ateno para a finalidade com que as polticas pblicas educacionais tem sido
criadas, assim como, alertar sobre os verdadeiros beneficirios do atual sistema educacional
brasileiro.
Palavras-Chave: Internacionalizao; Polticas pblicas; Educao; Flexibilizao; Direitos humanos.
Abstract
Education is placed within the context of human rights because it is a right that should be
guaranteed to all men and carry the universal principle of human dignity. Despite its
importance, the right to education has been relaxed through the internationalization of our
educational policies. It is a process that has descaracterizando the notion of law in our legal
system. The goal of our research is to show how this happens internationalization and who are
the main actors involved in this process, either on the aspect of public or private sector. The
-
problem is to point out some consequences that can already be seen in the Brazilian
educational system as a result of the internationalization of our public educational policies and
their impact on society. We will make use of textual analysis and interpretative magazines and
books, given that our research methodology is bibliographic. In conclusion, the importance of
scientific research will look at what has guided our public educational policies, making room
for better discussion and reflection on the topic in order to prevent that the right to education
is completely mischaracterized the point of becoming a secondary aspect in social context.
From the social point of view, the importance is to show how the society participates in this
process of internationalization, because the idea that there is more coherent democratic
management on education. From the personal point of view, we believe it is important to
draw attention to the purpose for which the public educational policies have been created, as
well as warn the real beneficiaries of the current Brazilian educational system.
Keywords: Internationalization; Public politics; Education; Flexibilization; Human Rights.
Introduo
A educao o principal instrumento para a completa formao do ser humano.
atravs dela que contribumos para o desenvolvimento do pas e passamos a ter uma melhor
convivncia com os outros. Aprendemos a valorar o nosso semelhante e, como consequncia,
respeitamos a sua dignidade e enfrentamos os mais variados problemas sociais. Diante da sua
importncia para a vida do homem em sociedade, a educao passou a ser o caminho para a
promoo e o respeito dos direitos e liberdades consagrados na Declarao Universal dos
Direitos Humanos, adotada e consagrada pela Assembleia Geral das Naes Unidas em 1948.
A prpria educao foi alada a condio de direito humano. Esses direitos trazem uma carga
axiolgica que est atrelada ao princpio da dignidade da pessoa humana, vindo a educao a
ter o importante papel de dissemin-la. Com a sua positivao no ordenamento jurdico
brasileiro, a educao recebeu o status de direito fundamental social, insculpida no Artigo 6
da Constituio Federal.
Em que pese a demonstrao de sua importncia, a educao no tem tido a
finalidade a que se destina em nossas polticas pblicas. H uma verdadeira
internacionalizao dessas polticas atravs de organismos internacionais como o Banco
Mundial (BM), a Organizao Mundial do Comrcio (OMC), a Organizao para a
Cooperao e Desenvolvimento Econmico (OCDE), dentre outros atores envolvidos nesse
processo. Tudo isso leva a uma verdadeira flexibilizao do direito humano educao, pois
esses organismos internacionais tratam a educao como uma verdadeira mercadoria e no
como um direito universalmente consagrado a todas as pessoas. Com o desvirtuamento de sua
TadeuRealce
TadeuRealce
TadeuRealce
-
finalidade, essa internacionalizao acaba beneficiando um pequeno e privilegiado grupo de
pessoas que tem interesse no setor educacional brasileiro e que domina o mercado de capitais,
excluindo desse benefcio os seus legtimos destinatrios.
1. O contexto histrico da educao entre os direitos humanos
Neste primeiro momento, precisamos entender o que so os direitos humanos. Aps
conceitu-lo, passaremos a analisar a educao em seu contexto, muito embora saibamos
tratar-se de uma associao imprescindvel. Sobre o conceito, vejamos:
O conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser humano que tem por
finalidade bsica o respeito sua dignidade, por meio de sua proteo contra o
arbtrio do poder estatal e o estabelecimento de condies mnimas de vida e
desenvolvimento da personalidade humana. (MORAES Apud QUEIROZ, 2001, p.
33).
Assim, qualquer direito que estabelea condies de vida e desenvolvimento da
personalidade humana constitui-se em direitos humanos. Esto relacionados prpria
essncia do ser humano.
O homem a nica criatura que precisa ser educada e, por educao, entenda-se o
cuidado desde a sua infncia, passando pela disciplina e a instruo com a formao. Assim, o
homem infante, educando e discpulo. (KANT, 2006, p.11).
Com as atrocidades desencadeadas pela II Guerra Mundial e com a consequente
violao dos direitos humanos, um movimento de promoo da paz e de repdio violncia
passou a ganhar fora, seno vejamos:
neste cenrio que se desenha o esforo de reconstruo dos direitos humanos,
como paradigma e referencial tico a orientar a ordem internacional contempornea.
Se a 2 Guerra Mundial significou a ruptura com os direitos humanos, o ps-guerra
deveria significar a sua reconstruo. (PIOVESAN Apud HADDAD, GRACIANO,
2006, p. 11-42).
Essa reconstruo passa pela proteo de direitos como a vida, a liberdade, a
igualdade, a solidariedade, a honra, dentre outros. Sem essa proteo, o respeito dignidade
da pessoa humana estaria comprometido. Portanto, para um ambiente de paz social, essa era
uma questo urgente. neste cenrio que a educao exerceria a funo de conscientizar as
pessoas sobre os seus direitos e os caminhos para efetiv-los, sempre com a finalidade de
TadeuRealce
-
exerccio de uma vida digna, sendo certo que a educao deve cumprir etapas, pois no se
esgota num nico ato. Analisemos os seguintes dizeres:
A educao implica etapas. A racionalidade uma conquista gradativa. Nas
primeiras etapas, educa-se o hbito e a formao de carter, forma-se a base moral
da educao. No fim do processo, alcana-se a dialtica em sua manifestao mais
pura. Assim, passa-se do sensvel para o inteligvel, do psicolgico para o lgico ou
ontolgico, tendo como fundamento o tico, a procura do bem. (PAVIANI, 2008,
p.77).
Considerada um valor intrnseco e reconhecido em nvel internacional, a dignidade
humana foi recepcionada pela Constituio Federal, tendo como propsito a busca da
igualdade, liberdade, justia e paz social, conforme o enunciado exposto a seguir: o princpio
da dignidade da pessoa humana est diretamente conectado ao Direito Internacional dos
Direitos Humanos, que objetiva garantir o exerccio dos direitos da pessoa humana
Constituio Federal de 1988 e Educao. (GOMES, 2009, p. 43-44).
Para ratificar o liame internacional da dignidade da pessoa humana, o processo de
afirmao dos direitos humanos pode ser visualizado no Artigo 1 da Declarao Universal dos
Direitos Humanos, que assim diz: todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e
direitos. So dotados de razo e conscincia e devem agir em relao uns aos outros com
esprito de fraternidade. (LAFER, 2005, p. 37).
A Declarao Universal dos Direitos Humanos vista como o verdadeiro marco no
processo de reconstruo dos direitos humanos, mas esses direitos tem origem com o nosso
nascimento e podem ser exigidos a qualquer tempo, conforme observado em suas etapas. Tem
dimenso universal e atinge a todos. A justificativa para os direitos humanos so as prprias
necessidades humanas:
Para entendermos com facilidade o que significam direitos humanos, basta dizer que
tais direitos correspondem a necessidades essenciais da pessoa humana. Trata-se
daquelas necessidades que so iguais para todos os seres humanos e que devem ser
atendidas para que a pessoa possa viver com a dignidade que deve ser assegurada a
todas as pessoas. Assim, por exemplo, a vida um direito humano fundamental,
porque sem ela a pessoa no existe. Ento a preservao da vida uma necessidade
de todas as pessoas humanas. Mas, observando como so e como vivem os seres
humanos, vamos percebendo a existncia de outras necessidades que so tambm
fundamentais, como a alimentao, a sade, a moradia, a educao, e tantas outras
coisas. (DALLARI, 2004, p. 13).
Com base no enunciado acima, possvel afirmar que todos ns somos iguais e
nenhum ser humano pode ter mais valor que outro. Eis a justificativa para o enfrentamento
das desigualdades e todas as formas de discriminao. A igualdade a que nos referidos diz
respeito a ser tratado como ser humano, independentemente de qualquer condio individual,
-
como ser rico, pobre, branco, negro, europeu, latino, etc...Essa igualdade pode ser analisada
no Art. 5 da Constituio Federal, que diz:
Art.5. Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no pas a inviolabilidade
do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos
seguintes: (...). (COSTA, 2002, p. 92).
Outros dois documentos de grande relevncia no plano internacional e que refletiram
a evoluo dos direitos humanos foram o Pacto Internacional dos Direitos Econmicos,
Sociais e Culturais e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Polticos, pois ambos
regulamentaram a Declarao Universal dos Direitos Humanos.
No que tange ao Pacto Internacional dos Direitos Econmicos, Sociais e Culturais,
h obrigaes assumidas no plano internacional que devem ser assumidas internamente
atravs das polticas pblicas. No caso especfico da educao, imperioso fazer planos e
destinar recursos financeiros s condies de acesso e permanncia no ensino, sem deixar de
dar ateno s oportunidades j criadas. (DUARTE, 2007, p. 691-713). No h como garantir
dignidade da pessoa humana sem uma educao de qualidade. Portanto, h incompatibilidade
no seu tratamento mercadolgico.
Um critrio de boa educao a capacidade do educando de saborear a vida.
Rousseau denunciava que os homens eram a mercadoria mais barata. Com a mundializao
do mercado, o que predominou foi a competitividade. Para dizer que somos orgulhosamente
filhos de Rousseau, temos de preservar a dimenso humana em contraposio ao treinamento
para a performance nesse mercado.(MAGALHES; STOER Apud STRECK, 2008, p. 75).
A qualidade foi preterida pela quantidade, tornando esse importante direito social
num instrumento privilegiado para o acmulo de capital dos grandes grupos empresariais que
atuam neste setor. o direito humano educao sendo violado por motivos de interesse
privado e que leva excluso.
2. A busca pela educao de qualidade atravs das polticas pblicas educacionais
Apesar de todas as dificuldades, avanamos em termos legislativos e de polticas
pblicas educacionais, mas ainda h muitos excludos. Todavia, podemos mencionar alguns
diplomas legais e movimentos que incidem ou incidiram sobre nossas polticas educacionais,
como: a) Tratados e Acordos de Cooperao Internacional institucionalizados no Brasil; b)
Influncia de Organismos Internacionais Governamentais e No-Governamentais; c)
TadeuRealce
TadeuRealce
TadeuRealce
-
Constituio Federal de 1988; d) Normas infraconstitucionais como: Estatuto da Criana e do
Adolescente (1990), Conselho Nacional de Educao (1995), Lei de Diretrizes e Bases
(1996), Fundef (1996), Plano Nacional de Educao (2001), Sistema Nacional de Avaliao
da Educao Superior Sinaes (2004), Saeb (2005), Plano Nacional de Educao em Direitos
Humanos (2003); Fundeb (2006); e) Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova; f) Frum
Mundial da Educao, dentre outros. (GOMES, 2009, p. 272-273).
O Plano de Desenvolvimento da Educao PDE, lanado pelo MEC em 24 de abril
de 2007, teve recepo favorvel pela opinio pblica por ter enfrentado o problema da
qualidade em todas as escolas de educao bsica no pas e por contar com 30 aes que
incidem sobre os mais diversos nveis e modalidades educacionais:
No que se refere aos nveis escolares, a educao bsica est contemplada com 17
aes, sendo 12 em carter global e cinco especficas aos nveis de ensino. Entre as
aes que incidem globalmente sobre a educao bsica situam-se o FUNDEB, o Plano de Metas do PDE-IDEB, duas aes dirigidas questo docente (Piso do Magistrio e Formao), complementadas pelos programas de apoio Transporte Escolar, Luz para Todos, Sade nas Escolas, Guias de tecnologias, Censo pela Internet, Mais educao, Coleo Educadores e Incluso Digital. (SAVIANI, 2007, p. 1231-1255).
No que se refere ao ensino superior, h cinco aes trazidas pelo Plano, sendo:
FIES-PROUNI, o qual facilita o acesso ao crdito educativo estendendo o prazo para
ressarcimento, assim como, permite o parcelamento dos dbitos fiscais e previdencirios das
instituies de ensino superior que aderirem ao Plano; o Ps-doutorado, o qual busca reter
no pas o pessoal em nvel de doutorado, evitando que os mesmos deixem o pas; Professor
Equivalente, facilitando a contratao de professores em universidades federais; Educao
Superior, com fulcro a duplicar, em dez anos, o nmero de vagas nas universidades federais
e o Programa Incluir: Acessibilidade na Educao Superior, ampliando o acesso a pessoas
portadoras de necessidades especiais nas instituies federais. (SAVIANI, 2007, p. 1231-
1255).
Conforme citaes, vemos que as aes englobam no s a formao do professor e
o fornecimento de material didtico, mas tambm o transporte escolar e a infra-estrutura das
escolas. No caso do ensino superior, o financiamento, o acesso e a manuteno sobre a
pesquisa so pontos que merecem ser destacados. Assim, o PDE direcionou-se positivamente
para o aspecto qualitativo da educao. O problema ainda reside na correo de algumas
disparidades nessas polticas, mas podemos criar expectativas de melhora e buscar um ensino
de qualidade para todos.
TadeuRealce
-
3. A internacionalizao das polticas pblicas educacionais
Em que pese o aspecto positivo visto no tpico anterior, muitos organismos
internacionais fornecem orientaes e traam diretrizes para o setor educacional. Sob a
alegao do combate pobreza e ao desenvolvimento econmico, influenciam a poltica
educacional de muitos pases. O Banco Mundial, a Organizao Mundial do Comrcio, a
Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico OCDE, o Fundo Monetrio
Internacional FMI, dentre outros, esto envolvidos neste panorama que desfavorece os
direitos humanos. (AKKARI, 2011, p.9).
O Banco Mundial, por exemplo, no faz qualquer imposio para submisso de suas
medidas. Por convenincia poltica e econmica, adaptamos nossa poltica educacional para
essas orientaes e diretrizes, ocasionando o que chamamos de internacionalizao das
polticas pblicas educacionais. Essas organizaes internacionais limitam a atuao estatal,
pois muito difcil uma articulao entre as exigncias internas e as diretrizes internacionais.
(AKKARI, 2011, p.15). Por ser um servio no exclusivo do Estado, aderimos a essas
diretrizes e orientaes, ocasionando uma transferncia parcial de responsabilidade para o
setor privado. o que ocorre com as parcerias pblico-privadas e a prpria privatizao de
empresas e servios pblicos. Vejamos os seguintes dizeres:
Acreditando que o uso racional dos insumos educacionais poderia ser obtido com
autonomia das instituies, estabelece que esse seja um dos mais urgentes eixos da
reforma educacional. Em suma, o Banco Mundial recomenda mais ateno aos
resultados, sistema de avaliao da aprendizagem, inverso em capital humano
atentando para a relao custo-benefcio; prope, alm da descentralizao da
administrao das polticas sociais, maior eficincia no gasto social, maior
articulao com o setor privado na oferta da educao. (SHIROMA; MORAES;
EVANGELISTA, 2007, p. 62).
A concepo de poltica social preconizada pelo Banco Mundial, permite que
visualizemos uma ideia neoliberal e de priorizao do aspecto econmico em relao ao
social. Focaliza as polticas nos pobres no no sentido de erradic-la, mas com o objetivo de
apenas mitig-la. O fundamento neoliberal consiste na remercantilizao dos direitos e das
polticas sociais. Para o Banco Mundial, o desenvolvimento social uma consequncia do
desenvolvimento econmico, e no o inverso. (TEIXEIRA, 2010, p. 650-680). Finalmente,
vale um breve comentrio sobre a Comisso Econmica para Amrica Latina e Caribe
CEPAL. Criada pela Organizao das Naes Unidas ONU - em 1948, seu objetivo
TadeuRealce
TadeuRealce
-
coordenar polticas de desenvolvimento social na Amrica Latina e Caribe, sendo certo que o
Brasil membro desta Organizao Internacional, conforme esclarecimentos:
Embora no seja uma instituio principalmente preocupada com a poltica
educacional, a CEPAL, na ltima dcada, passou a despontar como uma das
principais fontes das ideias direcionadoras das polticas deste setor em todo o
continente latino-americano e regio caribenha. A sua importncia decorre do papel
que ela passou a atribuir ao processo educativo, considerado um dos principais
responsveis pela elevao do patamar de competitividade internacional dos pases
desta regio, e capaz de fazer frente s diversas transformaes sucedidas na
economia ao nvel global. (OLIVEIRA, 2006, p. 17).
Portanto, uma organizao internacional que reconhece a importncia da educao
e que este pode ser o ponto crucial para combater a competitividade gerada pelo poder
econmico, admitindo ainda que de maneira indireta, a influncia deste ltimo sobre os
demais setores. O processo de internacionalizao flexibilizou o direito educao, pois
sendo uma mercadoria, no so todas as pessoas que tem acesso a mesma e o que era direito
passou a ser um privilgio de poucos, mesmo diante das vrias polticas educacionais que j
mencionamos.
4. Apontamentos decorrentes do processo de internacionalizao da educao brasileira.
possvel vislumbrar uma srie de consequncias geradas pela internacionalizao
das polticas educacionais, pois temas como descentralizao, privatizao da educao,
reduo de gastos pblicos, qualidade educacional, reformas curriculares, financiamento e
outros, so amplamente discutidos dentro dessa perspectiva. Sobre financiamento, por
exemplo, as orientaes do Banco Mundial so de que devemos fomentar a eficincia na
distribuio e na utilizao dos recursos oriundos dos impostos, entre e dentro das
instituies estatais. (AMARAL, 2003, p. 113).
Conforme j informamos, h um processo de comercializao da educao pelas
organizaes internacionais, fazendo com que esse direito atenda aos interesses de grupos
detentores de capital. Sob a gide da Organizao Mundial do Comrcio OMC, a educao
foi incorporada como um servio social, e no pblico. As instituies tem liberdade para
oferecerem seus cursos, inclusive, pela internet. (SPELLER Apud OLIVEIRA; CATANI;
SILVA JUNIOR, 2010, p. 13-28).
Com isso, o modelo de gesto da universidade brasileira passa a ser o empresarial,
com toda a sua objetividade de lucro e seguindo as lgicas do mercado. A fragmentao do
TadeuRealce
TadeuRealce
TadeuRealce
TadeuRealce
-
ensino e do conhecimento, a rapidez da formao profissional e a intensificao do trabalho
docente so apenas alguns resultados desse tipo de poltica educacional de vis mercadolgico
que atinge as instituies educacionais pblicas. No estamos falando de algo que ficou na
histria, mas que realmente acontece nos dias atuais. Raquel Gandini e Sandra Riscal
esclarecem que o Plano Diretor da Reforma do Estado, ocorrido a partir do ano de 1995,
apresentam projetos que buscam atender s exigncias das agncias reguladoras
internacionais e s demandas das organizaes sociais. (GANDINI; RISCAL Apud
OLIVEIRA; ROSAR, 2008, p. 41-60).
Um exemplo bem caracterstico da predominncia do aspecto econmico sobre o
direito educao est na elaborao das parcerias pblico-privadas. Menciona-se a compra
de material didtico fazendo com que o setor privado amplie o seu mercado e o setor pblico
transfira parte de sua responsabilidade sobre a educao para a iniciativa privada. (ADRIO;
GARCIA; BORGHI; ARELARO, 2009, p. 799-818).
Quanto oferta de vagas, temos a expanso das instituies de ensino pblico e
privado. Estas ltimas, verdadeiras empresas com foco nos resultados lucrativos e na relao
custo-benefcio. O exemplo mais atual dessa expanso est no ensino distncia EAD, o
qual est regulamentado pelo Artigo 80 da Lei n. 9.394/96 - Lei de Diretrizes e Bases da
Educao Brasileira LDB. (MAFRA Apud SILVA, 2003, p. 141-167). Mas embora esteja
positivado, o ensino distncia requer maiores cuidados:
O desenvolvimento de projetos educacionais a distncia com qualidade tcnica e
pedaggica requer cuidados em muitos sentidos. A gesto das mdias para uso em
educao um dos primeiros movimentos para a sua efetivao. Envolve no apenas
a anlise do investimento e a aquisio de equipamentos, mas o tratamento do
contedo que vai ser veiculado e a formao de equipes de profissionais tcnicos e docentes para o melhor uso do equipamento pela rea educacional, como um todo, e em cada projeto de ensino, em particular.(KENSKI Apud OLIVEIRA, 2010, p.
100-116)
importante esclarecer que muitos cursos presenciais apresentam a deficincia da
m qualidade e na educao distncia esse fato tambm ocorre. Acreditamos que at com
mais intensidade, pois trata-se de um mtodo que exige muito mais do aluno, alm de ser mais
difcil de ser fiscalizado pelo poder pblico:
Entretanto, h outro lado desse crescimento que no pode ser ignorado. Refiro-me
ao acompanhamento da qualidade dos cursos ministrados distncia. A validao
dos cursos distncia passou a exigir, em contrapartida, um controle redobrado.
Antes mesmo dessa mudana, o Ministrio da Educao j estabelecia algumas
exigncias s instituies que oferecem cursos distncia. Uma delas a prtica de
atividades obrigatrias compreendendo avaliao, estgios, defesa de trabalhos ou
TadeuRealce
TadeuRealce
TadeuRealce
TadeuRealce
-
prticas em laboratrios a serem realizadas nos chamados polos de apoio presencial. Neles, o aluno pode acessar a biblioteca, laboratrios, ter atendimento de
tutores, entre outras possibilidades. (DINIZ, 2007, p. 31).
Concluindo, h vrias exigncias que devem ser cumpridas pelas instituies. A
fiscalizao estatal muito importante neste contexto. H que se ter uma avaliao contnua
por parte do Estado para que a qualidade no fique demonstrada apenas no ato do
credenciamento do curso. Sabemos que h vrias instituies privadas que recebem incentivos
financeiros quando aderem a programas governamentais como o Programa Universidade para
Todos PROUNI, mas a preocupao com a qualidade do ensino ainda algo que precisa ser
trabalhado.
Concluso
A consagrao da educao entre os direitos humanos fato indiscutvel e de
extrema importncia para a reduo das desigualdades sociais. S haver uma sociedade mais
justa se os governos realmente priorizarem a educao em suas polticas pblicas. Sendo um
instrumento de promoo da dignidade da pessoa humana, as polticas pblicas educacionais
devem estar focadas na igualdade e na valorizao do ser humano. No caso das oportunidades
educacionais, essa igualdade no se restringe apenas ao direito de ir escola, mas tambm na
sua manuteno, sendo certo que todos devem t-la. A educao no est tipificada como um
direito fundamental em nossa Constituio Federal por acaso, mas decorrente de muitas lutas
reveladoras de violaes desses direitos. Nossa expectativa que esse direito se fortifique em
nosso ordenamento jurdico, mas tambm em nvel internacional.
No estamos defendendo qualquer tipo de sistema educacional. Pelo contrrio!
Acreditamos que o nico sistema educacional vivel proteo da dignidade da pessoa
humana aquele que preza pela qualidade. Uma educao que comece por uma famlia bem
organizada em sociedade e que priorize os valores humanos. No mbito formal, que as
instituies invistam na qualidade de seus professores, no dilogo com os alunos, no uso de
tecnologias que facilitem o aprendizado. Entendemos que o raciocnio crtico no pode ficar
restrito aos alunos, mas dever abarcar todos os responsveis pela educao, de maneira que
possam participar do processo de formulao das polticas pblicas. A ideia que as
instituies de ensino e a sociedade civil realmente faam parte de uma gesto democrtica
dentro do sistema educacional brasileiro.
-
De uma forma geral, no somos contra a internacionalizao das polticas pblicas.
Sabemos que organismos internacionais como a UNICEF e a UNESCO desenvolvem
excelentes projetos educacionais e promovem cultura de qualidade pelo mundo. Portanto, no
h como mensurar os benefcios j proporcionados por essas entidades e as parcerias da
decorrentes. Somos contrrios internacionalizao que flexibiliza o direito educao em
prol de fatores econmicos, transformando esse direito universalmente consagrado em mera
prestao de servio. A relativizao desse direito no pode ser promovida para atender
interesses de grandes empresrios que atuam no setor. Esses priorizam o acmulo de capital e
no a qualidade do ensino, o que prejudica sobremaneira a formao do cidado e,
consequentemente, o desenvolvimento de uma sociedade mais justa e igualitria.
Acreditamos que as parcerias pblico-privadas podem proporcionar os benefcios da
qualidade, mas o Estado no pode se afastar de sua responsabilidade de gesto e fiscalizao
desse bem pblico. Hoje, a educao tratada como mercadoria e as consequncias
proporcionadas pela deteriorao de sua qualidade so visveis: cursos distncia de baixa
qualidade, fragmentao do ensino e focado apenas no atendimento emergente do mercado de
trabalho, currculos desconexos com a realidade social e com exacerbada carga de tecnicismo
em detrimento da formao humanstica, professores despreparados e com baixa
remunerao, evaso escolar e uma produo de diplomas que est formando excludos, pois
os formandos desses cursos de baixa qualidade sero preteridos por formandos com melhor
formao acadmica.
Enfim, nossas polticas pblicas educacionais devem estar focadas em nossa
realidade. Internacionaliz-las sem atender nossas necessidades e sem reduzir nossas
desigualdades sociais melhor no faz-las. A ideia de um Estado Democrtico de Direitos
tambm passa pela democratizao da educao. Todos devem ser tratados como seres
humanos e ter acesso aos benefcios desse direito. Temos vrias polticas pblicas
educacionais que apresentam resultados positivos. Se tivermos que fazer parcerias, que sejam
feitas em benefcio da sociedade, e no de uma pequena parcela de empresrios que formam
verdadeiros oligoplios em detrimento da formao humana do povo brasileiro.
Referncias
ADRIO, Theresa; GARCIA, Teise; BORGHI, Raquel; ARELARO, Lisete. Uma
modalidade peculiar de privatizao da educao pblica: a aquisio de sistemas de ensino por municpios paulistas. Revista de Cincias da Educao. Interfaces entre o pblico e o
TadeuRealce
-
privado para oferta educacional: desafios contemporneos. Campinas, vol. 30, n. 108, p.799-
818, out. 2009.
AKKARI, Abdeljalil. Internacionalizao das Polticas Educacionais: transformaes e
desafios. Petrpolis/RJ: Vozes, 2011.
AMARAL, Nelson Cardoso. Financiamento da Educao Superior: Estado x Mercado. So
Paulo: Cortez; Piracicaba/SP: Unimep, 2003.
COSTA, Messias. A educao nas Constituies do Brasil: dados e direes. Rio de
Janeiro: DP & A, (Biblioteca ANPAE), 2002.
DALLARI, Dalmo de Abreu. Direitos Humanos e Cidadania. 2 ed. reform. So Paulo:
Moderna, (Coleo Polmica), 2004.
DINIZ, Jangui. Educao Superior no Brasil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
DUARTE, Clarice Seixas. A educao como um direito fundamental de natureza social.
Revista de Cincias da Educao. Educao Escolar: os desafios da qualidade. Campinas,
vol. 28, nmero especial 100, p. 691-713, out. 2007.
GANDINI, Raquel Pereira Chainho; RISCAL, Sandra Aparecida. A gesto da educao como
setor pblico no-estatal e a transio para o Estado Fiscal no Brasil. In: OLIVEIRA, Dalila
Andrade; ROSAR, Maria de Fatima Felix (Orgs.). Poltica e Gesto da Educao. 2 ed. Belo
Horizonte: Autntica, 2008.
GOMES, Maria Tereza Uille. Direito Humano Educao e Polticas Pblicas. Juru:
Curitiba, 2009.
KANT, Immanuel (Autor); FONTANELLA, Francisco Cock (Trad.). Sobre a Pedagogia. 5
ed. rev. Piracicaba/SP: Unimep, 2006.
KENSKI, Vani Moreira. Democratizao das mdias e a gesto em educao a distncia. In:
OLIVEIRA, Maria Auxiliadora Monteiro (Org.). Gesto Educacional: novos olhares novas
abordagens. Petrpolis/RJ: Vozes, 2010.
LAFER, Celso. A internacionalizao dos direitos humanos: Constituio, racismo e
relaes internacionais. Barueri/SP: Manole, 2005.
MAFRA, Mrio Srgio. Educao distncia: conceitos e preceitos. In: SILVA, Eurides Brito
da Silva (Org.). A Educao Bsica Ps-LDB. So Paulo: Pioneira Thomson Learning,
2003.
OBSERVATORIORealce
OBSERVATORIORealce
OBSERVATORIORealce
OBSERVATORIORealce
-
MAGALHES, A; STOER, S. Orgulhosamente filhos de Rousseau. In: STRECK, Danilo R.
Rousseau & a Educao. 2 ed. Belo Horizonte/MG: Autntica, (Coleo Pensadores & a
Educao), 2008.
OLIVEIRA, Ramon. Agncias Multilaterais e a Educao Profissional Brasileira.
Campinas/SP: Alnea, 2006.
PAVIANI, Jayme. Plato & a Educao. Belo Horizonte: Autntica, (Coleo Pensadores &
Educao), 2008.
PIOVESAN, Flvia. Concepo contempornea de direitos humanos. In: HADDAD, Srgio;
GRACIANO, Maringela (Orgs.). A educao entre os direitos humanos. Campinas/SP:
Autores Associados; So Paulo/SP: Ao Educativa, (Coleo educao contempornea),
2006.
MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais. So Paulo: Atlas, 1997. In:
QUEIROZ, Carlos Alberto Marchi de. Resumo de Direitos Humanos e da Cidadania:
roteiro prtico para concursos. So Paulo: Iglu, 2001.
RAMPAZZO, Lino. Metodologia Cientfica: para alunos dos cursos de graduao e ps-
graduao. 3 ed. So Paulo: Loyola, 2002.
SAVIANI, Dermeval. O Plano de Desenvolvimento da Educao: anlise do projeto do
MEC. Revista de Cincias da Educao. Educao Escolar: os desafios da qualidade.
Campinas, vol. 28, nmero especial 100, p. 1231-1255, out. 2007.
SHIROMA, Eneida Oto; MORAES, Maria Clia Marcondes de; EVANGELISTA, Olinda.
Poltica Educacional. Rio de Janeiro: Lamparina, 2007.
SPELLER, Paulo. Marcos da educao superior no cenrio mundial e suas implicaes para o
Brasil. In: OLIVEIRA, Joo Ferreira de; CATANI, Afrnio Mendes; SILVA JUNIOR, Joo
dos Reis (Orgs.). Educao Superior no Brasil: tempos de internacionalizao. So Paulo:
Xam, 2010.
TEIXEIRA, Rafael Vieira. Uma crtica da concepo de poltica social do Banco Mundial na
cena contempornea. Revista Servio Social & Sociedade. Crise Social: trabalho e
mediaes profissionais. So Paulo: Cortez, nmero 104, p. 650-680, out./dez. 2010.
OBSERVATORIORealce