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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
A LEI DE EXECUÇÃO PENAL E SUA EFETIVA APLICAÇÃO
TANIA MARA LEOBINO
Itajaí (SC),13 de junho de 2008.
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
A LEI DE EXECUÇÃO PENAL E SUA EFETIVA APLICAÇÃO
TANIA MARA LEOBINO
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí –
UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em
Direito. Orientador: Professor Mdo. Fabiano Oldoni
Itajaí (SC),13 de junho de 2008.
AGRADECIMENTO
Primeiramente a Deus, que me deu a vida , sabedoria e humildade para chegar até
meus objetivos. À minha mãe Maria Helena ,por tudo que
fez e ainda faz por mim, pois sem ela a realização deste sonho não seria possível.
À meu filho Willian, por toda compreensão e paciência de suportar toda a minha
ausência e sempre me apoiar nos momentos difíceis.
Aos professores, por toda jornada até aqui,
por todo conhecimento dividido.
Em especial ao Professor Fabiano Oldoni por
todo apoio.
DEDICATÓRIA
À minha mãe por ter acreditado que
um dia eu chegaria até aqui.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade
pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a
Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a
Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade
acerca do mesmo.
Itajaí (SC),13 de junho de 2008.
Tânia Mara Leobino Graduando
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade
do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Tânia Mara
Leobino sob o título a Lei De Execução Penal e sua efetiva aplicação, foi
submetida em 13 de junho de 2008 à banca examinadora composta pelos
seguintes professores: Fabiano Oldoni e Rogério Ristow, e aprovada com a
nota 9,50.
Itajaí (SC), 13 de junho de 2008.
Fabiano Oldoni Orientador e Presidente da Banca
Antônio A. Lapa Coordenação da Monografia
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CP Código Penal
CPP Código de Processo Penal
ROL DE CATEGORIAS
Ação penal
A ação penal pode ser definida com sendo o direito de solicitar, ao Poder
Judiciário, a aplicação do direito penal positivo ao autor de um crime 1.
Crime
A palavra “crime” comporta vários sentidos. Na linguagem dos teólogos,
serve para designar o pecado. Esse conceito ressalta em demasia o lado
ético. Na verdade “pecado” e “delito” são termos distintos.O primeiro
compreende toda a ética, enquanto o segundo abarca apenas o mínimo
ético necessário à convivência social.A idéia de delito como sinônimo de
pecado puramente moral, refoge à órbita jurídica, e,por, isso, deve ser2.
Pena
Sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de
uma sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal,
consistente na restrição ou privação de um bem jurídico, cuja finalidade é
aplicar a retribuição punitiva ao delinqüente, promover a sua
readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação
dirigida à coletividade3.
Preso
Pessoa que foi privada de sua liberdade individual, encontrando-se
recolhida a um a prisão.4
1 LEAL, João José. Direito Penal Geral, p. 457. 2 BARROS, Flávio Augusto de. Direito penal parte geral, p. 546. 3 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral, 2003, p.332. 4 SILVA, De Plácido e Vocabulário Jurídico/ atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Cláucia
Carvallho- Rio de Janeiro,2003,p.1088.
SUMÁRIO
RESUMO.............................................................................................. XI
INTRODUÇÃO ......................................................................................1
CAPÍTULO 1
DOS CRIMES E DAS PENAS
1.1 CONCEITO DE CRIME ......................................................................................3
1.1.1 CONCEITO FORMAL............................................................................................4
1.1.2CONCEITO MATERIAL ..........................................................................................5
1.1.3 CONCEITO ANALÍTICO........................................................................................6
1.2 DAS PENAS .......................................................................................................8
1.2.1 ESCOLAS PENAIS..............................................................................................14
1.2.2 CONCEITO ......................................................................................................17
1.2.3 CARACTERÍSTICA..............................................................................................18
1.2.4 CLASSIFICAÇÃO ..............................................................................................20
1.2.4.1 Penas Corporais ......................................................................................20
1.2.4.2 Penas privativas de liberdade...............................................................22
1.2.4.3 Penas restritivas de liberdade ...............................................................24
1.2.4.4 Penas privativas e restritivas de direitos ...............................................25
1.2.4.5 Penas pecuniárias ..................................................................................27
CAPÍTULO 2
A LEI DE EXECUÇÃO PENAL
2.1 DOS REGIMES PRISIONAIS.............................................................................30
2.1.1 Do Regime Fechado..................................................................................30
2.1.2 Do Regime Semi-aberto............................................................................31
2.1.3 Do Regime Aberto .....................................................................................31
2.2 ESTABELECIMENTOS PENAIS ..........................................................................31
ix
2.2.1 Da penitenciária ........................................................................................32
2.2.2 Da colônia agrícola, industrial ou similar ................................................33
2.2.3 Da casa do albergado..............................................................................35
2.2.4 DO CENTRO DE OBSERVAÇÃO ............................................................................37
2.2.5 DO HOSPITAL DE CUSTÓDIA E TRATAMENTO PSIQUIÁTRICO .......................................39
2.2.6 DA CADEIA PÚBLICA .........................................................................................40
2.3 DIREITOS E DOS DEVERES ..............................................................................42
2.3.1 DOS DIREITOS E DOS DEVERES DOS PRESOS............................................................43
2.3.2 ASSISTÊNCIA MATERIAL .....................................................................................45
2.3.3 ASSISTÊNCIA À SAÚDE .......................................................................................46
2.3.4 ASSISTÊNCIA JURÍDICA ......................................................................................47
2.3.5 ASSISTÊNCIA EDUCACIONAL ..............................................................................47
2.3.6 ASSISTÊNCIA SOCIAL ........................................................................................48
2.3.7 ASSISTÊNCIA RELIGIOSA ....................................................................................48
2.3.8 TRABALHO INTERNO E EXTERNO ...........................................................................49
2.4 DA PROGRESSÃO DE REGIME .......................................................................50
2.5 DA REGRESSÃO DE REGIME ..........................................................................51
2.6 DO LIVRAMENTO CONDICIONAL .................................................................53
CAPÍTULO 3
A LEI DE EXECUÇÃO PENAL E SUA EFETIVA APLICAÇÃO
3.1 OBJETIVOS DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL ....................................................57
3.1.1 A REINCLUSÃO SOCIAL .....................................................................................58
3.2 FATORES QUE IMPEDEM A EFETIVA RESSOCIALIZAÇÃO DOS PRESOS. ......60
3.2.1 A Superlotação das Prisões......................................................................61
3.2.2 Ausência de Individualização da Pena e de Classificação dos
condenados........................................................................................................63
3.2.3 A Degeneração da Identidade do Preso ...............................................64
3.2.4 Ausência de Trabalho para o Apenado Durante a Execução da Pena
..............................................................................................................................66
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................70
x
REFERÊNCIA DAS FOTES CITADAS.......................................................................72
ANEXOS................................................................................................................75
xi
RESUMO
A presente monografia trata através de pesquisas,
doutrinas, legislativas, demonstrar e analisar a aplicação da Lei de
Execução Penal. Analisar a realidade social com as leis e sua efetiva
aplicação, buscando os direitos e o valor do ser humano nos presídios,
pois, a realidade carcerária do Brasil esta longe das descrições das leis, na
atualidade o País não tem infra-estrutura para que a lei seja cumprida, os
presos vivem em cárceres em uma vida sub-humana, não tendo seus
direitos respeitados, cumprindo sua pena em celas superlotadas, não
tendo a oportunidade de trabalho para que possa a voltar em convívio
em sociedade com dignidade. Os valores constitucionais refletem em
todo ordenamento jurídico em especial no direito penal, porque este
incide diretamente na liberdade do individuo, devendo a realidade
jurídica voltar-se para a realidade dos detentos, visualizando o resgate do
preso, e devolvendo-o à sociedade de forma mais benéfica e prevenindo
o cometimento de novos crimes. A partir dessa visão busca a possível
mudança na aplicação da Lei.
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto a Lei de
Execução Penal.
O seu objetivo é analisar se a LEP está sendo
efetivamente aplicada.
Para tanto, trata-se no Capítulo 1, dos crimes e das
penas, trazendo o conceito de crime, conceito Formal, conceito material,
conceito analítico, bem como a análise das penas, escolas penais,
conceito, característica, classificação, penas corporais, penas privativas
de liberdade, penas restritivas de liberdade ,penas privativas e restritivas
de direitos e penas pecuniárias.
No capítulo 2, tratando da lei de execução penal, dos
regimes prisionais, do regime fechado, do regime semi-aberto, do regime
aberto, estabelecimentos penais, da penitenciária, da colônia agrícola,
industrial ou similar, da casa do albergado, do centro de observação, do
hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, da cadeia pública, direitos
e dos deveres, dos direitos e dos deveres dos presos, assistência material,
assistência à saúde, da assistência jurídica, assistência educacional,
assistência social, assistência religiosa, do trabalho interno e externo, da
progressão de regime, da regressão de regime e do livramento
condicional.
No capítulo 3, tratando da lei de execução penal e
sua efetiva aplicação, objetivos da lei de execução penal, a reinclusão
social, fatores que impedem a efetiva ressocialização dos presos, a
superlotação das prisões, ausência de individualização da pena e de
classificação dos condenados, a degeneração da identidade do preso e
ausência de trabalho para o apenado durante a execução da pena.
2
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das
reflexões sobre o tema.
Para a presente monografia foi levantada a seguinte
hipótese:
1. Embora a lei de execução diferencie os regimes
prisionais em fechado, aberto e semi-aberto, em termos legislativos, não
consegue ter sua aplicação efetivada.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na
Fase de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de
Tratamento de Dados o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados
expresso na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as
Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da
Pesquisa Bibliográfica.
CAPÍTULO 1
DOS CRIMES E DAS PENAS
Para se abordar o tema principal do presente trabalho,
mister se faz apresentar uma breve análise sobre os crimes e as penas no
ordenamento jurídico brasileiro. Assim sendo, o presente capítulo trata do
conceito de crime e as penas em geral, sua origem e seu histórico, as
escolas e as teorias penais, a conceituação, características e classificação
das penas, bem como, uma análise em especial das penas privativas de
liberdade e restritivas de direito, como aporte teórico necessário ao
estudo do tema principal do deste trabalho.
1.1 CONCEITO DE CRIME
Para compreender o direito penal se fazem necessário
o conhecimento do crime e sua conceituação.
Para Augusto Barros 5
A palavra “crime” comporta vários sentidos. Na linguagem
dos teólogos, serve para designar o pecado. Esse conceito
ressalta em demasia o lado ético. Na verdade “pecado” e
“delito” são termos distintos.O primeiro compreende toda a
ética, enquanto o segundo abarca apenas o mínimo ético
necessário à convivência social.A idéia de delito como
sinônimo de pecado puramente moral, refoge à órbita
jurídica, e,por, isso, deve ser.
Para o ordenamento jurídico o crime pode ser
conceituado em material, formal e analítico, abrangendo os crimes
dolosos, culposos e também as contravenções.
5 BARROS, Flávio Augusto de. Direito penal parte geral, p. 546.
4
A classificação dos crimes busca facilitar a inteligência
abstrata do fato real.
1.1.1 Conceito Formal
O conceito formal não se preocupa com o aspecto
ontológico, nem em sublinhar os elementos essências do delito: é a
definição fornecida pelo Legislador, variando, por isso, conforme a lei o
define.
No Brasil, o art. 1º da Lei de Introdução ao Código
Penal apresenta a seguinte redação: a infração penal a que a lei comina
pena de reclusão ou detenção quer isoladamente, quer alternativamente
ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração
penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de
multa, ou ambas, alternativa ou cumulativa.
Para Rios Gonçalves:6
Crimes formais são aqueles em relação aos quais a lei
descreve uma ação e um resultado, mas a redação do
dispositivo deixa claro que o crime consuma-se no momento
da ação, sendo o resultado mero exaurimento do delito. Ex.:
o art. 159 do Código Penal descreve o crime de extorsão
mediante sequestro: sequestrar pessoa (ação) com o fim de
obter qualquer vantagem como condição ou preço do
resgate (resultado). O crime por ser formal, consuma-se no
exato momento em que a vítima e sequestrada. A
obtenção do resgate é irrelevante para o fim da
consumação, sendo, portanto, mero exaurimento
De acordo com doutrinadores para a concretização
do crime formal, basta somente à ação não dependendo do resultado,
ação esta punida com detenção ou reclusão.
6 GONÇALVES,Victor Eduardo Rios. Direito penal, p. 54
5
Afirma Jesus:7
Que este conceito deriva da análise do crime sobre o
"aspecto da técnica jurídica, do ponto de vista da lei" (1).
Neste sentido, abundam definições: "` Crime é o fato
humano contrário à lei´ (Carmignani). ´Crime é qualquer
ação legalmente punível.` (Maggiore) ´Crime é toda ação
ou omissão proibida pela lei sob ameaça da pena.´
(Fragoso) ´Crime é uma conduta (ação ou omissão
contrária ao Direito, a que a lei atribui uma pena.´
(Pimentel)" , " ´todo ato ou fato que a lei proíbe sob ameaça
de uma pena (Bruno), ´o fato ao qual a ordem jurídica
associa a pena como legítima conseqüência(Liszt), ´ação
punível: conjunto dos pressupostos da pena
De acordo com Damásio, crime é toda conduta
contrária a lei, tanto a ação quanto a omissão contrária aos ditames da
legislação, sendo a mesma punível com penalidade.
1.1.2 Conceito Material
Sob o aspecto material ou substancial, crime é o fato
humano que lesa ou expõe perigo a bens jurídicos penalmente
protegidos.
Para Fernando Capez8:
O crime pode ser definido como todo fato humano que,
propositada ou descuidadamente, lesa ou expõe a perigo
bens jurídicos considerados fundamentais para a existência
da coletividade e da paz social.
Machado descreve que, "o conceito material busca a
essência do delito, a fixação de limites legislativos à incriminação de
condutas"9 fazendo com que o crime se torne um "desvalor da vida
7 DAMASIO, Jesus de. Manual de direito penal, p. 87. 8 MAGGIO,Rodrigues Vicente de. Direito penal, p.76 9 MACHADO, Luiz Alberto. Direito Criminal: Parte Geral, p. 78.
6
social"10, uma a violação dos sentimentos altruísticos fundamentais de
piedade e probidade, na medida média em que se encontram na
humanidade civilizada, por meio de ações nocivas à coletividade´ "11.
Para Machado12:
É evidente que, pela sua amplitude conceitual, a definição
material de crime tem sabor pré-legislativo, de orientação e
parâmetro à liberdade legislativa de criação de delitos...
Não presta à formulação dogmática pela sua volatilidade e
insegurança conceituais.
Fragoso13 leciona que:
Crime é, assim, numa definição material, a ação ou omissão
que, a juízo do legislador, contrasta violentamente com
valores ou interesses do corpo social, de modo a exigir seja
proibida sob ameaça de pena.
A "infração da lei do Estado, promulgada para
proteger a segurança dos cidadãos, resultante de um ato externo do
homem, positivo ou negativo, moralmente imputável e politicamente
danoso"14.
1.1.3 Conceito Analítico
O conceito analítico do crime põe em relevo os seus
valores essenciais, variando as opiniões a respeito da composição dos elementos
estruturais de sua definição.
Baliseu Garcia destaca os seguintes elementos:
Fato típico, ilicitude, culpabilidade e punibilidade. Já
Francisco de Assis Toledo elenca apenas três: fato típico,
10 FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal: Parte Geral, p. 144. 11 MACHADO, Luiz Alberto. Direito Criminal: Parte Geral, p. 78. 12 MACHADO, Luiz Alberto. Direito Criminal: Parte Geral, p. 78. 13 FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal: Parte Geral, p. 145. 14 CARRARA, Francesco. Programa do Curso de Direito Criminal, p. 45.
7
ilicitude e culpabilidade. Por sua vez, Júlio Fabbrini Mirabete
indica apenas dois: fato típico e ilicitude.
Para Leal:15
Trata-se de construção doutrinaria, que ainda hoje não
pode ser considerada definitivamente acabada. Até o
século XX a doutrina concebia o crime a partir de um
critério bipartido, constituído de dois elementos,um objetivo
representado pela ação ou omissão e o outro subjetivo,
representado pela culpabilidade.Em 1906 o jurista Alemão
Ernst Von Beling, reformulou o conceito analítico do crime,
inserindo um novo elemento a tipicidade, e o crime passou
a ser definido no ponto de vista dogmático, como conduta
humana, típica, antijurídica e culpável.
A concepção bipartida define o crime através de dois
critérios: o subjetivo e o objetivo, quer dizer a força moral e a força física:
Na força moral teríamos a culpabilidade e o dano moral do
delito, constituído pela intimidação e pelo mau exemplo
que o delito apresenta; na força física teríamos a ação com
que o agente executa o desígnio malvado e o dano
material do delito16.
É entendimento que a composição dos elementos
estruturais, hoje é tripartido, tendo a conduta humana típica, antijurídica e
culpável.
A tipicidade é a condição jurídica de perfeito
enquadramento da conduta ao modelo legal de crime, ou seja, a exata
coincidência entre esta e o tipo penal descrito na norma incriminadora.
A classificação analítica tem várias vantagens, como
demonstra a analogia de Machado “ainda que, formalmente, a água
seja água e, materialmente, seja um líquido insípido, inodoro e incolor que 15 LEAL, João José. Direito penal geral, p.184. 16 FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal: Parte Geral, p. 148.
8
serve para, entre outras coisas, saciar a sede, analiticamente a sua
composição é H2O”17.
Com o conceito analítico pode ser feito à análise de
todas as espécies de crimes existentes, tanto na parte especial do Código
Penal, como na Legislação Especial sem exceção.
1.2 DAS PENAS
A origem da pena é a vindita. Nos povos primitivos a
idéia da pena nasceu do sentimento de vingança, inicialmente na forma
privada, e posteriormente foi alçada à categoria de direito.
Segundo René Ariel Dotti,18"é generalizada a opinião
de que a pena deita raízes no instinto de conservação individual
movimentado pela vingança. Tal conclusão, porém, é contestada diante
da afirmação segundo a qual tanto a vingança de sangue como a perda
da paz não caracterizavam reações singulares, mas a revolta coletiva.
Era a chamada vingança de sangue, descrita por Erich
Fromm como “um dever sagrado que recai num membro de determinada
família, de um clã ou de uma tribo, que tem de matar um membro de
uma unidade correspondente, se um de seus companheiros tiver sido
morto”19.
Todavia, face ao advento do Estado e o surgimento
das religiões, as punições adquiriram uma posição de divindade, onde a
paz era uma dádiva oferecida pelos deuses e o infrator que perturbasse
17 MACHADO, Luiz Alberto. Direito Criminal: Parte Geral, p. 79. 18 MARCÃO, Renato; MARCON, BRUNO. Rediscutindo os fins da pena. Jus Navigand, Teresina, ano 6, n. 54, fev. 2002. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2661>. Acesso em: 29 jun. 2008.d 19 FROMM, Erich. Anatomia de destrutividade humana. Trad. Marco Aurélio de Moura Matos. Rio de Janeiro: Zahar, 1975, p. 366. Apud MARQUES, Oswaldo Henrique Duek. Fundamentos da pena, p. 3.
9
essa paz deveria ser punido em nome desses, através de uma vingança
privada sem qualquer limitação e, por conseqüência, em excessos.
Segundo ensina Fernando Capez, “o ofendido investia
com fúria desproporcional contra o agressor, bem como seus familiares,
gerando ódio do outro lado e, por conseguinte, revides contra os
excessos”20. Em face desses excessos, surgiram as Leis do Talião e o Código
de Hamurabi, que previa a pena pessoal, proporcional à agressão e
previamente fixada. Esse tipo de vingança se pendurou até serem
substituídas pelas penas públicas.
No período do Direito Romano, os delitos passaram a
ser considerados como um atentado contra a ordem pública é o que
descreve René Ariel Dotti:
A idéia da pena como instituição de garantia foi obtendo
disciplina através da evolução política da comunidade
(grupo, cidade, Estado) e o reconhecimento da autoridade
de um chefe a quem era deferido o poder de castigar em
nome dos súditos. É a pena pública que, embora
impregnada pela vingança, penetra nos costumes sociais e
procura alcançar a proporcionalidade através das formas
do talião e da composição21.
Mesmo com a desmistificação e o enfraquecimento
da divinização das penas, estas, continuavam a ser aplicadas, todavia
com menos entusiasmo. É o que esclarece Henry Goulart:
A partir do século XV, a elaboração de idéias liberais,
condicionada pela renovação de conceitos a respeito do
mundo e do destino do ser humano, acentua-se,
concretizada, afinal, no século XVIII, com os postulados da
Revolução Francesa [...] novas concepções surgem, então,
20 CAPEZ, Fernando. Direito penal: parte geral, 2000, p. 153. 21 DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema de penas, p. 31.
10
no campo penal e, com elas, doutrinas acerca do
fundamento do direito de punir22.
Em 1764 Cesare Bonessana, conhecido como Marquês
de Beccaria, editou o famoso livro “Dos Delitos e das Penas”, onde
advertia da necessidade de uma mudança radical no sistema punitivo,
apregoando uma visão mais humanista e utilitarista das penas.
Cesare Beccaria descreve que a moral política não
pode proporcionar à sociedade nenhuma vantagem durável, se não for
fundada sobre sentimentos indeléveis do coração do homem. Assim, toda
lei que não fosse estabelecida sobre essa base encontraria sempre uma
resistência à qual seria constrangida a ceder23.
Descreve Cesare Beccaria que se consulte o coração
humano e achará nele princípios que fundamenta o direito de punir: Nota:
Consultemos, pois, o coração humano; acharemos nele os
princípios fundamentais do direito de punir. Ninguém fez
gratuitamente o sacrifício de uma porção de sua liberdade
visando unicamente ao bem público. Tais quimeras só se
encontram nos romances. Cada homem só por seus
interesses está ligado às diferentes combinações políticas
deste globo; e cada qual desejaria, se fosse possível, não
estar ligado pelas convenções que obrigam os outros
homens. Sendo a multiplicação do gênero humano,
embora lenta e pouco considerável, muito superior aos
meios que apresentava a natureza estéril e abandonada,
para satisfazer necessidades que se tornavam cada dia
mais numerosas e se cruzavam de mil maneiras, os primeiros
homens, até então selvagens, se viram forçados a reunir-se.
Formadas algumas sociedades, logo se estabeleceram
novas, na necessidade em que se ficou de resistir às
primeiras, e assim viveram essas hordas, como tinham feito
os indivíduos, num contínuo estado de guerra entre si. As leis
22 GOULART, Henry. Penologia, p. 27. 23 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas, p. 17.
11
foram às condições que reuniram os homens, a princípio
independentes e isolados sobre a superfície da terra24.
Prossegue descrevendo que a incerteza de conservar
a liberdade, face aos temores que poderiam ser encontrados, tornava-se
inútil.
Cansados de só viver no meio de temores e de encontrar
inimigos por toda parte, fatigados de uma liberdade que a
incerteza de conservá-la tornava inútil, sacrificaram uma
parte dela para gozar do resto com mais segurança. A
soma de todas essas porções de liberdade, sacrificadas
assim ao bem geral, formou a soberania da nação; e
aquele que foi encarregado pelas leis do depósito das
liberdades e dos cuidados da administração foi
proclamado o soberano do povo. Não bastava, porém, ter
formado esse depósito; era preciso protegê-lo contra as
usurpações de cada particular, pois tal é a tendência do
homem para o despotismo, que ele procura sem cessar,
não só retirar da massa comum sua porção de liberdade,
mas ainda usurpar a dos outros25.
Para Cesare Beccaria eram necessários meios sensíveis
e bastante poderosos para comprimir esse espírito despótico, que logo
tornou a mergulhar a sociedade no seu antigo caos. Esses meios foram as
penas estabelecidas contra os infratores das leis.
Disse eu que esses meios tiveram de ser sensíveis, porque a
experiência fez ver quanto a maioria está longe de adotar
princípios estáveis de conduta. Nota-se, em todas as partes
do mundo físico e moral, um princípio universal de
dissolução, cuja ação só pode ser obstada nos seus efeitos
sobre a sociedade por meios que impressionam
imediatamente os sentidos e que se fixam nos espíritos, para
contrabalançar por impressões vivas a força das paixões
particulares, quase sempre opostas ao bem geral. Qualquer
24 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas, p. 17. 25 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas, p. 18.
12
outro meio seria insuficiente. Quando as paixões são
vivamente abaladas pelos objetos presentes, os mais sábios
discursos, a eloqüência mais arrebatadora, as verdades
mais sublimes, não passam, para elas, de um freio impotente
que logo despedaçam26.
Para o autor, “só a necessidade constrange os homens
a ceder uma parte de sua liberdade; daí resulta que cada um só
consente em pôr no depósito comum a menor porção possível dela, isto é,
precisamente o que era preciso para empenhar os outros em mantê-lo na
posse do resto”27.
Prossegue:
O conjunto de todas essas pequenas porções de liberdade
é o fundamento do direito de punir. Todo exercício do
poder que se afastar dessa base é abuso e não justiça; é
um poder de fato e não de direito; é uma usurpação e não
mais um poder legítimo. As penas que ultrapassam a
necessidade de conservar o depósito da salvação pública
são injustas por sua natureza; e tanto mais justas serão
quanto mais sagrada e inviolável for a segurança e maior a
liberdade que o soberano conservar aos súditos28.
Com base nestes ensinamentos se combateu a
repressões penal absolutista com a Revolução Francesa, estabelecendo-
se, os princípios do moderno direito penal que foram adotados pela
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789.
A Primeira conseqüência desses princípios é que só as
leis poderiam fixar as penas de cada delito e que o direito de fazer leis
penais não pode residir senão na pessoa do legislador, que representa
toda a sociedade unida por um contrato social. É o que descreve Cesare
Beccari: 26 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas, p. 18. 27 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas, p. 19. 28 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas, p. 19.
13
Ora, o magistrado, que também faz parte da sociedade,
não pode com justiça infligir a outro membro dessa
sociedade uma pena que não seja estatuída pela lei; e, do
momento em que o juiz é mais severo do que a lei, ele é
injusto, pois acrescenta um castigo novo ao que já está
determinado. Segue-se que nenhum magistrado pode,
mesmo sob o pretexto do bem público, aumentar a pena
pronunciada contra o crime de um cidadão29.
A segunda conseqüência é que o soberano só pode
fazer leis gerais, às quais todos devem submeter-se; não lhe compete
julgar se alguém violou essas leis.
Com efeito, no caso de um delito, há duas partes: o
soberano, que afirma que o contrato social foi violado, e o
acusado, que nega essa violação. É preciso, pois, que haja
entre ambos um terceiro que decida a contestação. Esse
terceiro é o magistrado, cujas sentenças devem ser sem
apelo e que deve simplesmente pronunciar se há um delito
ou se não há30.
Em terceiro lugar, mesmo que a atrocidade das
mesmas não fosse reprovada pela filosofia, e, por essa razão, esclarecida,
que prefere governar homens felizes e livres a dominar covardemente um
rebanho de tímidos escravos; mesmo que os castigos cruéis não se
opusessem diretamente ao bem público e ao fim que se lhes atribui, o de
impedir os crimes bastará provar que essa crueldade é inútil, para que se
deva considerá-la como odiosa, revoltante, contrária a toda justiça e à
própria natureza do contrato social31.
Passando adiante, estudam-se as escolas penais.
29 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas, p. 20. 30 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas, p. 20. 31 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas, p. 20.
14
1.2.1 Escolas Penais
Após a valiosa contribuição de Cesare Beccaria,
estudos sobre as bases do Direito Penal e os fins da pena desenvolveram-
se no culminar das idéias iluministas.
A primeira a surgir foi a Escola Clássica. Seus
seguidores, Francesco Carrara, Enrico Pessina, Giuseppe Carmignani,
Hegel entre outros, acreditavam num caráter eminentemente expiatório
da pena.
Para eles, considerava-se a pena como um castigo
justo imposto pela ordem jurídica ao indivíduo pela prática voluntária e
conscientemente do crime. Francesco Carrara bem explica:
A pena não é simples necessidade de justiça que exija a
expiação do mal moral, pois só Deus tem a medida e a
potestade de exigir a expiação devida, tampouco é mera
defesa que procura o interesse dos homens às expensas dos
demais; nem é fruto de um sentimento dos homens, que
procuram tranqüilizar seus ânimos frente ao perigo de
ofensas futuras. A pena não é senão a sanção do preceito
ditado pela lei eterna, que sempre tende à conservação da
humanidade e a proteção de seus direitos, que sempre
procede com observância às normas de Justiça, e sempre
responde ao sentimento da consciência universal32.
De outro lado Lombroso fundou a Escola Positiva, que
defendia que a criminalidade derivava de fatores biológicos, contra os
quais a vontade humana não podia lutar. “O indivíduo já vem ao mundo
estigmatizado por sinais de degenerescência, malformações e anomalias
32 CARRARA, Francesco. Programa de derecho criminal – parte geral. Bogotá: Temis, vol II, §601, pp.44-7. Apud MARCÃO, Renato Flávio. Rediscutindo os fins da pena. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=2661>.
15
anatômicas e funcionais relacionadas ao seu psiquismo”33. Carlos Crispim
Baiocchi Cappi descreve que:
Os militantes da Escola Positiva advogavam a tese de que o
criminoso deveria ser considerado um produto do meio
social, e como tal ser tratado. Afirmavam que o delinqüente
era envolvido pelo convívio social, que condicionava e
delimitava seu próprio caráter. Trata-se, portanto, a vontade
humana, de uma vontade viciada, visto que direcionada
pelas condições do meio social em que vive34.
Em face disso, os adeptos afirmavam que a pena não
deveria ser vista como um castigo e sim como um remédio social
necessário ao indivíduo doente. São ensinamentos de Julio Fabbrini
Mirabete:
Desde a origem até hoje, porém, a pena sempre teve o
caráter predominantemente de retribuição, de castigo,
acrescentando-se a ela uma finalidade de prevenção e
ressocialização do criminoso. A retribuição e a prevenção
são faces da mesma moeda e, como acentuava Everardo
da Cunha Luna, "a retribuição, sem a prevenção, é
vingança; a prevenção, sem a retribuição, é desonra".
Enquanto se proclama na exposição de motivos da lei de
Execução Penal o princípio de que as penas e as medidas
de segurança devem realizar a proteção dos bens jurídicos
e a reincorporação do autor à comunidade, a realidade
demonstra que a pena continua a ser necessária, como
medida de justiça, reparadora e impostergável, mas "as
suas finalidades adicionais, tais como prevenir a prática de
novos delitos e promover a reinserção social do condenado,
não são satisfatóriamente cumpridas35.
Sobre essas duas escolas José Geraldo da Silva afirma:
“enquanto a Escola Clássica se preocupava apenas com o crime e a
33 CAPEZ, Fernando. Direito penal: parte geral, 2003, p.155. 34 CAPPI, Carlo Crispim Baiocchi. As regras de Tóquio e as medidas alternativas. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3118>. 35 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 145.
16
pena, a Escola Positiva se preocupava com o criminoso e as
circunstâncias que o levaram à prática do ato delituoso”36.
Ao discorrer sobre as escolas penais Julio Fabbrini
Mirabete afirma que:
Com o surgimento da Escola da Defesa Social, de Adolfo
Prins e Fillipo Grammatica, e, mais recentemente, com a
nova defesa social, de Marc Ancel, tem-se buscado instituir
um movimento de política criminal humanista fundado na
idéia de que a sociedade apenas é defendida à medida
que se proporciona a adaptação do condenado ao meio
social (teoria ressocializadora). Adotou-se como assinala
Miguel Reale Júnior, outra perspectiva sobre a finalidade da
pena, não mais entendida como expiação ou retribuição
de culpa, mas como instrumento de ressocialização do
condenado, cumprindo que o mesmo seja submetido a
tratamento após o estudo de sua personalidade. Esse
posicionamento especialmente moderno procura excluir
definitivamente a retributividade da sanção penal37.
Frente às ideologias defendidas nas Escolas Clássica e
Positivista, surgiram algumas teorias mistas que deram origem às Escolas
Ecléticas.
Julio Fabbrini Mirabete, descreve que:
Para as teorias mistas, também chamadas ecléticas,
fundiram-se duas correntes. Passou-se a entender que a
pena, por sua natureza, é retributiva, tem seu aspecto
moral, mas sua finalidade não é só a prevenção, mas
também um misto de educação e correção. Para Pellegrino
Rossi, Guizot e Cousein, a pena deve objetivar,
simultaneamente, retribuir e prevenir a infração: punitir quia
peccatum ut ne pecceptur. Segundo tal orientação, a
pena deve conservar seu caráter tradicional, porém outras
medidas devem ser adotadas em relação aos autores de
36 SILVA, José Geraldo da. Teoria do crime, p. 72. 37 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 145.
17
crimes, tendo em vista a periculosidade de uns e a
inimputabilidade de outros. Seriam essas as denominadas
medidas de segurança38.
Quanto às Teorias que visam a explicar os fundamentos
de punir e os fins da pena, três são as principais: as absolutistas, as relativas
e as mistas.
1.2.2 Conceito
Originariamente a palavra “pena” vem do latim
poena, todavia com derivação do grego poine, significando dor, castigo,
punição, expiação, penitência, sofrimento, trabalho, fadiga, submissão,
vingança e recompensa.
Para Celso Delmanto a pena é “a imposição da perda
ou diminuição de um bem jurídico, prevista em lei e aplicada pelo órgão
judiciário, a quem praticou ilícito penal. Ela tem finalidade retributiva,
preventiva e ressocializadora”39.
Para Fernando Capez a pena é:
Sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em
execução de uma sentença, ao culpado pela prática de
uma infração penal, consistente na restrição ou privação de
um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a retribuição
punitiva ao delinqüente, promover a sua readaptação
social e prevenir novas transgressões pela intimidação
dirigida à coletividade40.
Pode-se afirmar que a pena é uma instituição muito
antiga registrada nos primórdios da civilização, sendo que, como se viu no
subtítulo anterior, era vista como uma manifestação para conservação
espécie humana, de sua moral e integridade, passando, posteriormente a 38 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 145. 39 DELMANTO, Celso. Et al. Código Penal comentado, p. 67. 40 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral, 2003, p.332.
18
ser vista como um meio de retribuição e intimidação, através de formas
cruéis de punição.
1.2.3 Característica
Devem existir na pena várias características, tais são:
legalidade, personalidade, proporcionalidade e inderrogabilidade. Para
Julio Fabbrini Mirabete:
O princípio da legalidade consiste na existência prévia de
lei para imposição da pena (nulla poena sine lege), previsto
no art. 1º do Código Penal. A característica da
personalidade refere-se à impossibilidade de estender-se a
terceiros a imposição da pena. Por isso, determina-se que
"nenhuma pena passará da pessoa do condenado",
proibindo-se, por exemplo, as penas infamantes41.
Neste mesmo sentido descreve Fernando Capez:
a) legalidade: a pena deve estar prevista em lei vigente,
não se admitindo seja cominada em regulamento ou ato
normativo infralegal (CP, art. 1º, e CF art. 5º, XXXIX).
Anterioridade: a lei já deve estar em vigor na época em
que for praticada a infração penal (CP, art. 1º, e CF art. 5º,
XXXIX)42.
A Constituição prevê a cominação da pena de "perda
de bens", permitindo expressamente que a decretação do perdimento de
bens possa ser, nos termos da lei, estendida aos sucessores e contra eles
executada, até o limite do valor do patrimônio transferido43.
Fernando Capez, por sua vez, sobre a característica da
personalidade descreve que “a pena não pode passar da pessoa do
condenado [...] Assim, a pena de multa, ainda que considerada divida de
41 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 146. 42 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral, 2005, p.358. 43 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 146.
19
valor para fins de cobrança, não pode ser exigida dos herdeiros do
credor” 44.
No mesmo sentido que Fernando Capez, Julio Fabbrini
Mirabete acredita que:
A exceção mutila o princípio da personalidade da pena. Os
efeitos secundários da pena de prisão com relação aos
dependentes do criminoso são corrigidos com medidas
sociais (auxílio-reclusão, descontos na remuneração do
sentenciado etc.) 45.
Com relação à proporcionalidade, leciona Fernando
Capez que “a pena deve ser proporcional ao crime praticado” 46. Julio
Fabbrini Mirabete, no mesmo sentido descreve que “deve haver, ainda,
proporcionalidade entre o crime e a pena; cada crime deve ser reprimido
com uma sanção proporcional ao mal por ele causado”47.
Essa característica, entretanto, é abrandada no direito
positivo: a Constituição Federal determina que "a lei regulará a
individualização da pena", e o Código Penal refere-se, quando da
aplicação da pena, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade
do agente do agente, à reincidência etc48.
Por fim, Julio Fabbrini Mirabete descreve que pena
deve ser inderrogável:
Praticado o delito, a imposição deve ser certa e a pena
cumprida. Tal caráter também é suavizado em várias
situações, conforme a lei penal. São os casos da suspensão
44 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral, 2005, p.358. 45 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 146. 46 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral, 2005, p.358. 47 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 146. 48 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 146.
20
condicional, do livramento condicional, do perdão judicial,
da extinção da punibilidade entre outros49.
Importante descrever que Fernando Capez apresenta,
ainda, a característica da humanidade, onde não se admite a pena de
morte salvo em caso de guerra declarada50.
Após a análise das características, passa-se a abordar
a classificação das penas.
1.2.4 Classificação
Doutrinariamente as penas são classificadas em:
1.2.4.1 Penas Corporais
As penas corporais são aquelas que atingem a própria
integridade física do criminoso. É o que leciona Julio Fabbrini Mirabete:
As penas corporais, em seu sentido estrito, atingem a própria
integridade física do criminoso. São os açoites, as mutilações
e a morte. Em favor das primeiras, dizia-se ser a única
adequada aos brutos e degregados, que só se
sensibilizaram por estímulos materiais e pelo temor dos
castigos, proclamando-se, ainda, a vantagem de dispensar
a pena prisão e todos os inconvenientes desta, inclusive as
conseqüências para a família do condenado. O suplício,
porém como demonstra Foucault, "entra logicamente num
sistema punitivo em que o soberano, de maneira direta ou
indireta, exige, resolve e manda executar castigos, na
medida em que ele, através da lei, é atingido pelo crime".
Tratava-se, assim, mais de um agente político de
denominação, em favor do Estado51.
49 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 146. 50 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral, 2005, p.358. 51 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 246.
21
As penas corporais cruéis foram abolidas na maioria
dos países civilizados, embora permaneçam em algumas noções.
Com relação à pena de morte, tão discutida, seus
defensores entendem ser a única que realmente intimida o
delinqüente perigoso, sendo um meio eficaz e econômico
de proteção à sociedade, enquanto seus opositores
alegam a sua imprestabilidade, inconveniência e
ilegitimidade. Imprestável porque não ficou devidamente
comprovado ser ela intimidatória. Inconveniente porque
nem todos os delinqüentes possuem condições de exercer a
amplitude de defesa principalmente pela diversidade do
grau econômico e porque há possibilidade de erro
judiciário. Ilegítima porque se é proibido o homicídio pelo
cidadão, o próprio Estado não tem o direito de tirar a vida
de quem quer que seja52.
Julio Fabbrini Mirabete, em síntese, descreve as
principais razões da supressão da pena capital:
(1) A exemplaridade da pena de morte não está
demonstrada ou parece discutível. (2) Muitos dos crimes
com ela punidos são praticados por doentes mentais,
alguns dos quais, por isso mesmo, escapam ao castigo
supremo. (3) Há chocantes desigualdades na aplicação
dessa pena, seja pelos diferentes graus de severidade dos
tribunais competentes, seja por motivo de ordem
econômica e sociológica, de modo a existir o risco de
constituir essa punição ameaça muito maior para os
criminosos carentes de meios econômicos que por causa
disso estão em piores condições para se defenderem. (4)
Apesar de todas as medidas de aperfeiçoamento do
processo judicial, existe sempre uma inegável possibilidade
de se praticarem erros judiciários. (5) A repercussão da pena
de morte é a tal ponto malsã que estudiosos chegam,
inclusive, a lhe atribuir caráter criminógeno. (6) Quanto à
proteção da sociedade, pode ser convenientemente
assegurada pela prisão perpétua. (7) A difusão do
52 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 247.
22
pensamento humanista faz a opinião pública considerar a
pena de morte inútil e odiosa. O caráter inviolável da vida
humana opõe-se a ela. Diante da nova redação da
Constituição Federal, no Brasil é permitida a pena de morte
no caso de "guerra declarada"(art. 5º, XLVII, a) e o Código
Penal Militar a prevê nos crime de traição (art. 355), de
favorecer o inimigo ( art. 356), de tentativa contra a
soberania do Brasil (art. 357) entre outros53.
Tem sido bastante discutida a realização de um
plebiscito para se decidir sobre a implantação da pena e morte no país.
Para Julio Fabbrini Mirabete:
Esse procedimento eleitoral é inócuo pois a restrição da
pena capital aos crimes praticados em estado de guerra é
uma garantia individual à vida (garantia material explícita
negativa) estabelecida na Constituição Federal, que proíbe
emenda com o sentido de abolir "direitos e garantias
individuais" (art. 60, 4º, IV) 54.
Pela Convenção Americana sobre Direitos Humanos55
o Brasil se comprometeu a não estender a aplicação da pena de morte.
1.2.4.2 Penas privativas de liberdade
As penas privativas de liberdade são as mais utilizadas
nas legislações modernas e podem ser divididas em prisão perpétua e
prisão temporária, sendo a primeira vedada em nosso ordenamento
jurídico. Para Julio Fabbrini Mirabete:
Originam-se as penas privativas de liberdade de outras
penas: enquanto aguardavam a execução (pena de
morte, desterro, galés etc.), os sentenciados ficavam
53 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 247. 54 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 247. 55 Pacto de São José da Costa Rica de 22-11-1969, aprovada pelo Decreto nº. 678, de 4-11-92.
23
privados da liberdade de locomoção, passando a ser a
prisão, depois, a própria sanção penal56.
Fernando Capez discorre sobre as penas privativas de
liberdade descrevendo que está se divide em três espécies, quais sejam:
reclusão, detenção e prisão simples57.
Ademais, Fernando Capez leciona que tais penais
serão classificadas em três regimes: o fechado, o semi-aberto e o aberto58.
Nas palavras do autor:
a) fechado: cumpre a pena em estabelecimento penal de
segurança máxima ou média. b) semi-aberto: cumpre a
pena em colônia agrícola, industrial ou em estabelecimento
similar. c) aberto: trabalha ou freqüenta cursos em
liberdade, durante o dia, e recolhe-se em Casa de
Albergado ou estabelecimento similar a noite e nos dias de
folga59.
Conforme Heleno Cláudio Fragoso a idéia central da
pena privativa de liberdade é "de que a prisão deve promover a custódia
do condenado, neutralizando-o através de um sistema de segurança, no
qual se esgota o sentido retributivo da pena e, ao mesmo tempo,
ressocializá-lo ou emendá-lo, através de um tratamento"60.
De acordo com o doutrinador as penas privativas de
liberdade, teria por objetivo reintegrar o infrator à comunidade; todavia, é
notável o fracasso do sistema prisional como meio de se alcançar tais
objetivos, pois, além de as taxas de reincidência ser expressivas, o
confinamento gera efeitos devastadores sobre a personalidade humana,
56 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 247. 57 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral, 2005, p.359. 58 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral, 2005, p.359. 59 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral, 2005, p.359. 60 FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal: parte geral, p. 356.
24
que acaba por se ajustar à subcultura prisional, uma vez que é insolúvel a
contradição entre as funções de custódia e reabilitação61.
Juarez Cirino dos Santos, afirma que a pena privativa
de liberdade "representa a máxima desintegração social do condenado,
com a perda do lugar de trabalho, a dissolução dos laços familiares,
afetivos e sociais"62.
Essas penas têm sido bastante combatidas por ser
instrumento degradante, que destrói a personalidade humana e
incrementa a criminalidade por imitação e contágio moral. Apontam-se
na exposição de motivos da Lei n.º 7.209 seus inconvenientes:
O tipo de tratamento penal freqüentemente inadequado e
quase sempre pernicioso, a inutilidade dos métodos até
agora empregados no tratamento de delinqüentes
habituais e multirreincidentes; os elevados custos da
construção e manutenção dos estabelecimentos penais; as
conseqüências maléficas para os infratores primários,
ocasionais ou responsáveis por delitos de pequena
significação, sujeitos, na intimidade do cárcere, a sevícias,
corrupção e perda paulatina da aptidão para o trabalho63.
Deve se deixar claro que o regime inicial de
cumprimento da pena, conforme o art. 110 da Lei de Execução Penal
(LEP)64 deverá ser indicado pelo juiz na sentença condenatória.
1.2.4.3 Penas restritivas de liberdade
As penas restritivas de liberdade limitam parte do
poder de locomoção do condenado, embora não sejam eles recolhidos à
prisão.
61 FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal: parte geral, p. 356. 62 SANTOS, Juarez Cirino dos. Teoria da pena: fundamentos políticos e aplicação judicial, p. 23. 63 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 248. 64 BRASIL, Lei nº 7.210, de Julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal.
25
Julio Fabbrini Mirabete cita como exemplos:
O banimento (perda dos direitos políticos e de habitar o
país), degredo ou confinamento (residência em local
determinado pela sentença), desterro (saída obrigatória do
território da comarca e do domicílio da vítima) etc. O
banimento, e consequentemente o degredo e o desterro, é
proibido por norma constitucional (art. 5 º, XLVII, a), e a Lei
n.º 7.209 eliminou medidas de segurança que implicavam
limitação da liberdade) 65.
A proibição de freqüentar determinados lugares e a de
ausentar-se da comarca onde o sentenciado reside sem
autorização do juiz, bem como seu comparecimento a juízo,
passaram a ser condições a serem postas no sursis (art. 78, p.
2º) 66.
As medidas de deportação e expulsão de estrangeiros,
previstas na Lei nº6.815, de 19-08-1980, que define a
situação jurídica do estrangeiro no Brasil, não são penas e
sim medidas administrativas, ocorrendo o mesmo com a
extradição, embora esta tenha por fundamento o direito
penal. 67
O principal fundamento da referida pena é o de
promover o emprego das medidas não privativas de liberdade.
1.2.4.4 Penas privativas e restritivas de direitos
As penas restritivas de direitos podem ser consideradas
subespécie das penas alternativas, uma vez que nem toda pena
alternativa impõe restrição a direitos.
As pena privativas e restritivas de direitos retiram ou
diminuem direitos dos condenados. Para Julio Fabbrini Mirabete, nada
mais são que:
65 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 248. 66 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 248. 67 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 248.
26
Sanções que guardam atualidade e necessidade e
mereceram do legislador da reforma penal grande
destaque, divididas agora em prestação pecuniária, perda
de bens e valores, prestação de serviços à comunidade ou
à entidades públicas, interdição temporária de direitos e
limitação de fim de semana68.
Segundo o autor, estão também estabelecidas a
perda de cargo, função pública ou mandato eletivo, a incapacidade
para o exercício do pátrio poder, a tutela ou curatela e inabilitação para
dirigir veículo.
Aroldo Costa Filho as define como “a sanção imposta
em substituição à pena privativa de liberdade, consistente na supressão
ou diminuição temporária de um ou mais direitos do condenado”69.
Fernando Capez assinala que as penas restritivas de
direito, embora autônomas, têm natureza de penas substitutivas, pois não
são abstratamente previstas no tipo penal, antes, decorrem de
substituição das penas privativas de liberdade nos casos em que se
encontrarem satisfeita os requisitos legais70.
Para Damásio de Jesus a substituição da pena
privativa de liberdade pela pena alternativa não é mera faculdade
judicial, mas, presentes as condições de admissibilidade, uma obrigação
do Juiz71.
68 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 249. 69 COSTA FILHO, Aroldo. Alternativas penais e processuais à pena privativa de liberdade. In MARQUES DA SILVA, Marco Antônio (coordenador). Tratado temático de processo penal, p. 42. 70 CAPEZ, Fernando. Direito penal: parte geral, 2003, p.199. 71 JESUS, Damásio de. Direito penal: parte geral, p. 532.
27
Fernando Capez aborda as inovações trazidas pela Lei
n° 9.714/9872 ao atual §2° do artigo 44 do CP, in verbis:
Com a nova redação do art. 44, não há mais que se falar
em cumulação de duas penas restritivas de direitos ou
aplicação cumulativa de uma delas com a pena de multa,
somente na hipótese dos crimes culposos com penas iguais
ou superiores a 1 (um) ano, uma vez que a Lei n° 9.714/98
passou a permitir a substituição e a conseqüente
cumulação, tanto para as infrações penais culposas,
quanto para as dolosas, em que a pena aplicada seja
superior a 1 (um) ano. Deste modo, seja dolosa, seja
culposa, se a pena imposta na sentença condenatória for
superior a 1 (um) ano, o juiz poderá determinar a
substituição da pena privativa de liberdade por duas
restritivas de direito ou por uma restritiva e uma de multa73.
Segundo o doutrinador, as expressões normativas
adotadas pelo legislador, carecem de perfeição.
1.2.4.5 Penas pecuniárias
As penas pecuniárias são as que acarretam diminuição
do patrimônio do condenado ou absorvem totalmente.
Para Julio Fabbrini Mirabete elas são de duas
modalidades: a multa e o confisco.
Consiste a primeira no pagamento de determinada
importância pelo autor da infração penal e é cominada
especialmente nos casos em que se percebe a cupidez do
agente do crime. Largamente empregada em nosso código
a pena de multa, tem-se apregoado sua imposição como
substituto das penas privativas de liberdade de curta
duração, dando-se ênfase a esse aspecto na reforma
penal. O confisco, que é o perdimento dos bens do agente,
72 BRASIL. Lei nº 9.714, de 25 de novembro de 1998. Altera dispositivos do decreto-lei n
o
2.848, de 7 de dezembro de 1940 - código penal. 73 CAPEZ, Fernando. Direito penal: parte geral, p.202.
28
não era permitido em nossa legislação, mas a nova
Constituição Federal prevê a cominação de pena de
"perda de bens", que pode ser executada contra os
sucessos até o limite do valor do patrimônio transferido74.
Nos termos do artigo 43, § 1º, do Código Penal, a
prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus
dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social,
de importância fixada pelo juiz, não inferior a um salário mínimo nem
superior a 360 salários mínimos. Entretanto, se houver aceitação do
beneficiário, a prestação pecuniária pode consistir em prestação de outra
natureza. O valor pago é deduzido do montante de eventual
condenação em ação de reparação civil, se coincidentes os
beneficiários.
Para Fernando Capez são de três modalidades:
prestação pecuniária em favor da vitima, prestação inominada e perda
de bens e valores75.
Nota-se que o autor acrescenta uma não abordada
pelo doutrinador anteriormente citado, a prestação inominada.
Conforme René Ariel Dotti a prestação pecuniária não
deve ser confundida com a multa reparatória prevista no artigo 297 do
Código de Trânsito Brasileiro, embora os dois institutos guardem entre si
algumas afinidades. Nesse sentido, ressalta que "a prestação pecuniária
não depende, necessariamente, da produção de um prejuízo material,
assim como se exige quanto à multa reparatória e a perda de bens e
valores"76.
A pena de multa e a prestação pecuniária possuem
natureza jurídica diversa; logo, não há impeditivo legal para que haja 74 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual do direito penal, p. 248. 75 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral, 2005, p.391. 76 DOTTI, René Ariel. Curso de Direito Penal: parte geral, p.459.
29
condenação consistente em prestação pecuniária substitutiva da pena
privativa de liberdade cumulada com a pena de multa, determinada
pelo tipo penal.
Para Luiz Régis Prado, a introdução das penas restritivas
de direito na legislação penal brasileira visou alcançar um dúplice
propósito, consistente em “aperfeiçoar a pena de prisão, quando
necessária, e de substituí-la, quando aconselhável, por formas diversas de
sanção criminal, dotadas de eficiente poder corretivo"77, o que veio
enfatizar o fim de prevenção especial atribuído às sanções penais.
No entanto, segundo Luiz Régis Prado, a possibilidade
de aplicação dessas penas, na legislação pretérita, era bastante mais
restrita "a adoção das penas restritivas de direito, a princípio, foi feita de
modo cauteloso, abrangendo tão-somente as penas privativas de
liberdade inferiores a um ano e os delitos culposos", quando
contemplados os demais requisitos autorizadores da sua aplicação.
Segundo Heleno Cláudio Fragoso, devido à sua restrita
aplicabilidade, quando introduzidas ao sistema penal brasileiro pela
reforma de 1984, "as penas restritivas de direito não tiveram qualquer
efeito para desafogar o sistema, uma vez que se destinavam apenas a
crimes muito leves” e "pelos quais ninguém cumpria pena privativa de
liberdade no Brasil, já que aos mesmos se situavam numa faixa já
reservada à suspensão condicional da pena, o que acabou por
representar um endurecimento inútil do sistema"78.
No próximo capítulo será estudo a Lei de Execução
Penal, necessária para que se possa, então, no capítulo terceiro, analisar a
sua efetiva aplicação.
77 PRADO, Luiz Régis. Curso de Direito Penal brasileiro: volume 1: parte geral : arts. 1º a 120, p. 479. 78 FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal: parte geral, p. 393.
30
CAPÍTULO 2
A LEI DE EXECUÇÃO PENAL
Superada as peculiaridades dos crimes e das penas,
trabalhadas no primeiro capítulo, o presente capítulo volta-se ao estudo
sobre a Lei de Execução Penal.
2.1 DOS REGIMES PRISIONAIS
2.1.1 Do Regime Fechado
No regime fechado o condenado fica isolado do
meio social e privado da liberdade física de locomoção, através de seu
internamento em estabelecimento penal apropriado, no caso, a
penitenciária de segurança máxima ou média.
Para João Leal:79
O regime é fechado quando arquitetura prisional, a
conduta da administração e o programa de execução
procuram manter o condenado, o internado ou preso
provisório em ambiente de maior restrição de liberdade de
locomoção e com maior cautela contra fuga.
O regime fechado é caracterizado por manter o
apenado em regime isolado, não tendo o mesmo contato com a
sociedade, sendo vigiado e tendo todos os seus atos vigiados.
79 LEAL, João José. Direito penal geral, p. 65.
31
2.1.2 Do Regime Semi-aberto
No regime semi-aberto, o condenado cumpre a pena
sem ficar submetido às regras rigorosas do regime penitenciário e a pena
é cumprida em colônias, industrial ou estabelecimento similar.
2.1.3 Do Regime Aberto
A razão desse regime pressupõe o baixo quantitativo
de pena, a não reincidência e, ainda, indicação de que o condenado
pode cumprir a sanção neste regime (art. 33, § 3ºdo CP).
Além de não ser reincidente, a pena aplicada deve ser
igual ou inferior a 4 (quatro) anos e, também, as circunstâncias como
personalidade, antecedentes, conduta social delineados no comando do
art. 59, do Código Penal devem ser favoráveis.
Destinam-se ao regime aberto os condenados aptos
para viver em semiliberdade, ou seja, aqueles que, por não apresentarem
periculosidade, não desejarem fugir, possuírem autodisciplina e senso de
responsabilidade, estão em condições de eles desfrutarem sem porem em
risco a ordem pública por estarem ajustados ao processo de reintegração
social80.
2.2 ESTABELECIMENTOS PENAIS
A lei de execução penal preocupou-se com a previsão
das classificações dos estabelecimentos penais em: a) a penitenciária
(destinada ao condenado à pena de reclusão, em regime fechado); b) a
colônia agrícola, industrial ou similar (destinada ao cumprimento da pena
em regime semi-aberto); c) a casa de albergado (destinada ao
cumprimento de pena privativa de liberdade em regime aberto e da
pena de limitação de fim de semana); d) o centro de observação 80 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal, p. 250.
32
(destinado à realização de exames gerais e criminológicos, assim como
pesquisas criminologias); hospital de custodia e tratamento psiquiátrico
(destinado aos inimputáveis e semi-imputáveis) e: e) e, por fim, a cadeia
pública (destinada ao recolhimento de presos provisórios, que ainda não
foram julgados definitivamente).
2.2.1 Da penitenciária
A penitenciária destina-se ao condenado à pena de
reclusão, em regime fechado81.
Ao ser acolhido na penitenciária a lei exige que o
condenado deva ser alojado em cela individual, com área mínima de seis
metros quadrados, dormitório, aparelho sanitário e lavatório.
Art. 88 - O condenado será alojado em cela individual que
conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório.
Parágrafo único - São requisitos básicos da unidade celular:
a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores
de aeração, insolação e condicionamento térmico
adequado à existência humana;
b) área mínima de 6 m2 (seis metros quadrados) 82.
Nas penitenciárias femininas devem ter, além dos
requisitos exigidos para as masculinas, outros mais, como a sessão para
gestantes e parturientes e creches com a finalidade de assistir o menor
desamparado, cuja responsável esteja presa.
Art. 89 - Além dos requisitos referidos no artigo anterior, a
penitenciária de mulheres poderá ser dotada de seção
81 BRASIL. Lei 7.210/84. Lei de Execução Penal. 82 Art.88, da Lei de Execução Penal.
33
para gestante e parturiente e de creche com a finalidade
de assistir ao menor desamparado cuja responsável esteja
presa83.
As penitenciárias serão construídas em local afastado
do centro urbano a distancia que não restrinja a visitação, o que tem se
tornado raro. “Art. 90 - A penitenciária de homens será construída em local
afastado do centro urbano a distância que não restrinja a visitação” 84.
Júlio Fabbrini Mirabete descreve que:
Por razão de segurança, determina-se que a penitenciaria
de homens seja construída em local afastado do centro
urbano. A possibilidade de motins e fugas exige que assim
seja para a segurança da comunidade que, de outra
forma, estaria envolvida em acontecimentos que poderiam
causar-lhes sérios perigos. Entretanto, a localização do
estabelecimento não deve restringir a possibilidade de
visitação de presos, que é fundamental no processo de
reinsercão social85.
Todavia não podem ser construídas senão distantes da
zona urbana, em locais afastados, sob pena de ferir a autonomia
municipal, que pode deferir e disciplinar as áreas industriais ou outras que
estejam distantes das zonas urbanas, assim como definir áreas destinadas
ao Estado para construção desses estabelecimentos.
2.2.2 Da colônia agrícola, industrial ou similar
A Colônia Agrícola, Industrial ou similar destina-se ao
cumprimento da pena em regime semi-aberto86. Nesses estabelecimentos
deve existir necessariamente trabalho como meio de tornar o condenado
mais útil a si mesmo e a própria sociedade.
83 Art.89, da Lei de Execução Penal. 84 Art. 90, da Lei de Execução Penal. 85 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, p. 242. 86 Art. 91 da Lei de Execução Penal.
34
Júlio Fabbrini Mirabete descreve que:
A colônia agrícola industrial ou similar destina-se ao
cumprimento da pena em regime semi-aberto, conforme
determina o art. 91 da Lei de Execução Penal. A par do
inegável avanço com o sistema da prisão semi-aberta,
notou-se nele alguns inconvenientes, entre os quais o de
estarem os estabelecimentos situados na zona rural e serem
destinados ao trabalho agrícola, situações a que não se
adaptaram os condenados da sociedade. Contornando tal
situação idealizou-se um sistema misto, com setores
industriais nas prisões semi-abertas ou mesmo com
instauração de colônias agrícolas industriais. Em razão disso,
a lei de execução destina esses condenados a cumprir a
pena em regime semi-aberto às colônias agrícolas, industrial
ou similar87.
No regime fechado, impõe a lei o alojamento do
condenado em cela individual e no semi-aberto, poderá ser alojado em
compartilhado coletivo.
Art. 92 - O condenado poderá ser alojado em
compartimento coletivo, observados os requisitos da letra a
do parágrafo único do art. 88 desta Lei.
Parágrafo único - São também requisitos básicos das
dependências coletivas:
a) a seleção adequada dos presos;
b) o limite de capacidade máxima que atenda os objetivos
de individualização da pena88.
Neste sentido nota-se que:
Os estabelecimentos semi-abertos têm configuração
arqueológica mais simples, uma vez que as preocupações
87 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, p. 245. 88 Art. 90 da Lei de Execução Penal.
35
com segurança as menores do que as previstas para a
penitenciaria. Funda-se o regime principalmente na
capacidade de senso de responsabilidade do condenado,
estimulado e valoriza que o leva a cumprir com os deveres
próprios de seu status, em especial o de trabalho, submeter-
se a disciplina e não fugir. Diante da legislação brasileira
que destinou-se os estabelecimentos de segurança média
para os condenados que cumprem a pena em regime
fechado, a prisão semi-aberta deve estar subordinada
apenas a um mínimo de segurança e vigilância. Nela os
presos devem movimentar-se com relativa liberdade, a
guarda do preso não deve estar armada, a vigilância deve
ser discreta e o sentido de responsabilidade do preso
enfatizado 89.
A cela individual no regime fechado justifica-se pela
necessidade do condenado ficar isolado, dada sua personalidade.
2.2.3 Da casa do albergado
Segundo Luiz Carlos Valois:
A Casa do Albergado é o estabelecimento penal destinado
aos apenados que cumprem pena privativa de liberdade
no regime aberto, seja como regime inicial, seja como
resultado de progressão de regime alcançada no curso da
execução penal, assim como também destina-se ao
cumprimento da pena de limitação de fim de semana, na
forma do art. 93, da Lei de Execução Penal90.
Nota-se do texto legal:
Art. 93 - A Casa do Albergado destina-se ao cumprimento
de pena privativa de liberdade, em regime aberto, e da
pena de limitação de fim de semana.
89 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, p. 246. 90 VALOIS, Luís Carlos. Casa do Albergado de Manaus. Página da Vara de Execuções Criminais do Amazonas. Disponível em: <www.internext.com.br/valois/vec>.
36
Art. 94 - O prédio deverá situar-se em centro urbano,
separado dos demais estabelecimentos, e caracterizar-se
pela ausência de obstáculos físicos contra a fuga.
Art. 95 - Em cada região haverá, pelo menos, uma Casa de
Albergado, a qual deverá conter, além dos aposentos para
acomodar os presos, local adequado para cursos e
palestras.
Parágrafo único - O estabelecimento terá instalações para
os serviços de fiscalização e orientação dos condenados91.
Júlio Fabbrini Mirabete92 descreve:
(...) há condenados cujo tipo de personalidade e cuja
atitude consciente de aceitação da sentença
condenatória e da pena aplicada fazem com que se
submetam à disciplina do estabelecimento penal sem
conflitos e sem intentar fuga.(...) Determina o art. 93 que a
Casa de Albergado se destina ao cumprimento da pena
privativa de liberdade, em regime aberto, e da pena de
limitação de fim de semana. A denominação Casa de
Albergado (ou seja, prisão-albergue), para designar o
estabelecimento destinado ao condenado em regime
aberto, é uma expressão feliz porque se refere a uma
simples prisão noturna, sem obstáculos materiais ou físicos
contra a fuga. A segurança, em tal estabelecimento,
resume-se ao senso de responsabilidade do condenado. A
prisão-albergue constitui-se uma modalidade ou espécie do
gênero prisão aberta, experiência que em outros países é
conhecida com denominações que equivalem, em
português, a ‘prisão noturna’ ou ‘semiliberdade’. Outra
espécie de prisão aberta é a denominada prisão domiciliar,
prevista na nova lei ao mencionar ‘regime aberto em
residência particular93.
91 Artigos 93, 94, 95 da Lei de Execução Penal. 92 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal, p. 250 93 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal, p. 250.
37
A Lei de Execução Penal estabelece que o prédio da
Casa de Albergado será situado em centro urbano (art. 94) e, ainda,
peremptoriamente, que cada região deverá ter uma Casa de Albergado
(art. 95):
Neste sentido tem-se que:
A própria lei dispõe, entretanto, que os mesmo conjuntos
arquitetônicos, podem abrigar estabelecimentos de
destinação diversa destes que devidamente isolados.
Diante dessas faculdades, na comarca em que não contar
com uma casa de albergado, o que infelizmente constitui a
regra, pode-se colocar em pratica o regime aberto
improvisando o alojamento em dependências de cadeia
pública, distritos policiais ou prédios públicos que não
estejam em uso, observando-se, porém, a obrigatória de
separação dos albergados com os presos processuais ou
que esteja cumprindo pena me regime diverso. Tal solução
é muito mais conveniente do que a concessão de regime
de albergue onde não exista casa de albergado, já que
esse regime destina-se exclusivamente os condenados com
situações especiais94.
Diz ainda no art. 203, § 2º, que no prazo de seis meses,
a contar da publicação desta lei, serão editadas as normas
complementares e regulamentares necessárias à eficácia dos dispositivos
não auto-aplicáveis.
2.2.4 Do centro de observação
No centro de observação realizar-se-ão os exames
gerais e o criminológico, cujos resultados serão encaminhados à comissão
técnica de classificação.
94 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal, p. 251
38
Art. 96 - No Centro de Observação realizar-se-ão os exames
gerais e o criminológico, cujos resultados serão
encaminhados à Comissão Técnica de Classificação.
Parágrafo único - No Centro poderão ser realizadas
pesquisas criminológicas.
Art. 97 - O Centro de Observação será instalado em
unidade autônoma ou em anexo a estabelecimento
penal95.
O art. 112 da LEP dispõe que a pena privativa de
liberdade será executada em forma progressiva, com a transferência para
regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver
cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e seu mérito
indicarem a progressão.
Mas a decisão será motivada e precedida de parecer
da Comissão Técnica de Classificação e do exame criminológico, quando
necessário.
“Art. 98 - Os exames poderão ser realizados pela
Comissão Técnica de Classificação, na falta do Centro de Observação” 96.
Nos demais casos a Comissão atuará junto ao Juízo da
Execução e será integrada por fiscais do Serviço Social.
Os exames psiquiátricos, ou outros requisitados pelo Juiz
poderão ser feito pelo psiquiatra que deve integrar a Comissão Técnica
de Classificação.
No caso de progressão a transferência para regime
menos rigoroso, deve ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver
cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e seu mérito
95 Art. 96, 97 da Lei de Execução Penal. 96 Art. 98 da Lei de Execução Penal.
39
indicarem a progressão, sendo que a decisão será motivada e precedida
de parecer da Comissão Técnica de Classificação e do exame
criminológico, quando necessário.
Segundo Júlio Fabbrini Mirabete97, os centros de
observação devem instalar-se em unidade autônoma ou anexa ao
estabelecimento penal.
Quando anexa ao estabelecimento penal não
significa que os centros se destinem apenas aos exames gerais e
criminológicos dos condenados do estabelecimento penal anexo.
2.2.5 Do hospital de custódia e tratamento psiquiátrico
O hospital de custodia e tratamento psiquiátrico é um
hospital-presídio:
Art. 99 - O Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico
destina-se aos inimputáveis e semi-imputáveis referidos no
art. 26 e seu parágrafo único do Código Penal.
Parágrafo único - Aplica-se ao Hospital, no que couber, o
disposto no parágrafo único do art. 88 desta Lei.
Art. 100 - O exame psiquiátrico e os demais exames
necessários ao tratamento são obrigatórios para todos os
internados.
Art. 101 - O tratamento ambulatorial, previsto no art. 97,
segunda parte, do Código Penal, será realizado no Hospital
de Custódia e Tratamento Psiquiátrico ou em outro local
com dependência médica adequada98..
Júlio Fabbrini Mirabete descreve que:
97 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução penal, p. 251. 98 Art. 99, 100, 101 da Lei de Execução Penal.
40
A adoção das medidas de segurança trouxe consigo a
exigência de diversos estilos arquitetônicos e da existência
de aparelhagem interna nos estabelecimentos penais
destinados a execução. Assim o Hospital de Custódia e
Tratamento Psiquiátrico é um hospital-presídio, pois, embora
se destine ao tratamento é também um estabelecimento
penal que visa assegurar a custodia do internado99.
Embora se destine ao tratamento que é o fim da
medida de segurança, pois, os alienados que pratiquem crimes,
assemelham-se em todos os pontos a outros alienados, diferindo
essencialmente de outros criminosos, não se pode afastar a coerção a
liberdade de locomoção do internado, presumidamente perigoso em
decorrência da lei100.
2.2.6 Da cadeia pública
A separação instituída com a destinação à cadeia
pública é necessária, pois a finalidade da prisão provisória é apenas a
custódia daquele a quem se imputa a prática do crime, com a finalidade
de que fique a disposição da autoridade judicial.
Descreve Júlio Fabbrini Mirabete que:
Destina a lei que cada comarca terá pelo menos uma
cadeia pública, justificando tal exigência a necessidade de
se resguardar o interesse da administração da justiça
criminal e a permanência do preso em local próximo ao sue
meio familiar. É evidente recomendável que o provisório
esteja próximo de onde se desenvolve o inquérito policial e
do juízo onde corre o processo penal pelo crime que é
acusado.
Sua presença nesses locais será muitas vezes necessária
para realização das investigações, audiência e julgamento.
99 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal, p. 254. 100 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal, p. 254.
41
Alem disso não deve ficar afastado de seu ambiente social
e familiar, nem participar do convívio com os reclusos para
cumprimento de pena, no próprio resguardo da presunção
de inocência, apanágio de todo cidadão101.
A cadeia pública deve estar localizada em centro
urbano para evitar o afastamento da família do preso provisório e facilitar
o desenvolvimento do processo.
Como ocorre com relação a casa de albergado, a cadeia
deve estar localizada em centro urbano para evitar o
afastamento do ambiente social e familiar do preso
provisório e para facilitar o desenvolvimento do inquérito e
do processo crime. Permite, porém, a lei que a cadeia
pública, como qualquer outro estabelecimento penal,
esteja no mesmo conjunto arquitetônico de outro de
destinação diversa, desde que ele devidamente isolado102.
A cadeia pública também é utilizada nos casos de
prisão civil e administrativa:
Art. 102 - A Cadeia Pública destina-se ao recolhimento de
presos provisórios.
Art. 103 - Cada comarca terá, pelo menos, uma Cadeia
Pública a fim de resguardar o interesse da administração da
justiça criminal e a permanência do preso em local próximo
ao seu meio social e familiar.
Art. 104 - O estabelecimento de que trata este Capítulo será
instalado próximo de centro urbano, observando-se na
construção as exigências mínimas referidas no art. 88 e seu
parágrafo único desta Lei.
Como afirma Foucault:
101 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal, p. 258. 102 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal, p. 259.
42
Aquilo que, no início do século XIX, e com outras palavras
criticava-se em relação à prisão (constituir uma população
‘marginal’ de ‘delinqüentes’) é tomado hoje como
fatalidade. Não somente é aceito como um fato, como
também é constituído como dado primordial103.
Denise de Roure descreve que “falar em reabilitação é
quase o mesmo que falar em fantasia, pois hoje é fato comprovado que
as penitenciárias em vez de recuperar os presos os tornam piores e menos
propensos a se reintegrarem ao meio social”104.
2.3 DIREITOS E DOS DEVERES
Não é novidade que os presos, em diversas vezes, são
vítimas de excessos e discriminações quando submetidos ao regime
penitenciário, violando-se os ditos “direitos humanos” do preso.
Júlio Fabbrini Mirabete leciona que:
Por estar privado de liberdade, o preso encontra-se em uma
situação especial que condiciona uma limitação dos
direitos previstos na Constituição Federal e nas leis, mas isso
não quer dizer que perde, além da liberdade, sua condição
de pessoa humana e a titularidade dos direitos não
atingidos pela condenação105.
Nota-se, que para o doutrinador, os maus-tratos e
castigos que, por sua crueldade ou conteúdo desumano, degradante,
vexatório e humilhante, atentam contra a dignidade da pessoa, sua vida,
sua integridade física e moral, estão proibidos. É o que prevê a CFRB/88106
no artigo 5°, XLIX:
103 FOUCAULT, Michel. Resumo dos cursos do Collège de France, p.31. 104 ROURE, Denise de. Panorama dos Processos de Reabilitação de presos. Revista Consulex. Ano III, nº 20, Ago. 1998. 105 MIRABETE, Júlio Fabrini. Execução Penal: comentários à Lei n° 7.210, de 11-7-84, p. 114. 106 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
43
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes: [...] XLIX - é assegurado
aos presos o respeito à integridade física e moral;
Portanto são vedados todos os tratamentos que se
davam aos condenados antigamente. Segundo Júlio Fabbrini Mirabete “a
prisão não deve impor restrições que não sejam inerentes à própria
natureza da pena privativa de liberdade”107.
2.3.1 Dos direitos e dos deveres dos presos
Conforme a Lei de Execução Penal, em seu artigo 44,
são direitos dos presos:
I - alimentação suficiente e vestuário; II - atribuição de
trabalho e sua remuneração; III - previdência social. IV -
constituição de pecúlio. V - proporcionalidade na
distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a
recreação; VI - exercício das atividades profissionais,
intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que
compatíveis com a execução da pena. VII - assistência
material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa.
VIII - proteção contra qualquer forma de sensacionalismo. IX
- entrevista pessoal e reservada com o advogado. X - visita
do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em
dias determinados. XI - chamamento nominal. XII -
igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da
individualização da pena. XIII - audiência especial com o
diretor do estabelecimento. XIV - representação e petição a
qualquer autoridade, em defesa de direito. XV - contato
com o mundo exterior por meio de correspondência escrita,
da leitura e de outros meios de informação que não
comprometam a moral e os bons costumes. XVI - atestado
107 MIRABETE, Júlio Fabrini. Manual de Direito Penal, p. 259.
44
de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da
responsabilidade da autoridade judiciária competente.
Somente os direitos previstos nos incisos V, X e XV
poderão ser supridos ou restringidos, exigindo-se ato motivado do diretor
do estabelecimento.
Por conseguinte, os deveres do condenado estão
descritos no artigo 39 que procura estabelecer os deveres elementares do
preso.
Art. 39. Constituem deveres do condenado: I -
comportamento disciplinado e cumprimento fiel da
sentença; II - obediência ao servidor e respeito a qualquer
pessoa com quem deva relacionar-se; III - urbanidade e
respeito no trato com os demais condenados; IV - conduta
oposta aos movimentos individuais ou coletivos de fuga ou
de subversão à ordem ou à disciplina; V - execução do
trabalho, das tarefas e das ordens recebidas; VI - submissão
à sanção disciplinar imposta; VII - indenização à vítima ou
aos seus sucessores; VIII - indenização ao Estado, quando
possível, das despesas realizadas com a sua manutenção,
mediante desconto proporcional da remuneração do
trabalho; IX - higiene pessoal e asseio da cela ou
alojamento; X - conservação dos objetos de uso pessoal108.
Prevê a lei um conjunto de regras inerentes à boa
convivência, em especificação exaustiva que atende ao interesse do
condenado, cuja conduta passa a ser regulada mediante regras
disciplinares claramente previstas. Cumpre ao condenado, além das
obrigações legais inerentes ai seu estado, submeter-se às normas de
execução da pena. Além da disciplina, que consiste na colaboração com
a ordem, na obediência às determinações das autoridades e seus
agentes no desempenho do trabalho.
108 Art. 39, da Lei de Execução Penal.
45
2.3.2 Assistência Material
É dever, do Estado, dar assistência ao preso e ao
internado, objetivando sempre a prevenção do crime e orientá-los ao
retorno à convivência em sociedade109.
A assistência material consiste no fornecimento de
alimentação, vestuário e instalações higiênicas aos presos e internados110.
Segundo Lúcio Paulo Nogueira:
A qualidade de vida que se pretende dar ao condenado,
no nosso modesto entendimento, não pode de forma
alguma ser melhor do que a que se dá ao homem livre, que
trabalha o dia todo, talvez recebendo uma remuneração
que não lhe permite ter uma vida digna, mas que continua
honesto e respeitando as regras de convivência social111.
Seguindo o seu raciocínio, e preciso dizer que ao preso
não seria justo ter melhores condições de vida do que o homem livre que
precisa trabalhar para sobreviver na sociedade competitiva, porém, não
se quer dizer que o preso não mereça respeito e tenha um tratamento
desrespeitoso e sofrido, decorrente da própria pena que lhe foi imposta,
mas que não tenha mais privilégios que tem o homem livre112.
Para o autor “o crime não retira do homem a sua
dignidade, mas também não deve o regime carcerário propiciar-lhe mais
benefícios do que aqueles que ele desfrutava quando em liberdade” 113
motivo pela qual o preso deve receber alimentação e condições
higiênicas adequadas. A alimentação deve ser distribuída no café da
manhã, no almoço e no jantar, devendo ser suficiente e equilibrado.
109 Art. 10, da Lei de Execução Penal. 110 Art. 12, da Lei de Execução Penal. 111 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal, p. 19. 112 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal, p. 19. 113 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execução Penal, p. 20.
46
Em se tratando do vestuário, deve ser uniformizado
para todos os presos, evitando que alguns se apresentem mais bem
vestidos que os outros.
No que tange aos locais de alojamento, devem
corresponder as exigências de higiene, no que concerne à cubagem do
ar, à superfície mínima, à iluminação e ao arejamento sendo que as
instalações sanitárias tem de ser satisfatórias às necessidades naturais do
preso.
2.3.3 Assistência à saúde
Os presos serão dados à assistência farmacêutica
indispensável ao tratamento médico, devendo ser organizado, de modo
que possam ser prestados os convenientes cuidados aos presos doentes,
bem como indispensável a assistência odontológica qualificada acessível
a qualquer preso ou internado. Nota-se:
A assistência à saúde do preso e do internado, de caráter
preventivo e curativo, compreenderá atendimento médico,
farmacêutico e odontológico. [...] Quando o
estabelecimento penal não estiver aparelhado para prover
a assistência médica necessária, esta será prestada em
outro local, mediante autorização da direção do
estabelecimento114.
Todavia, em muitos casos, na realidade, os
estabelecimentos penais não dispõem de equipamentos e pessoal
apropriados para o atendimento médico, farmacêutico e odontológico,
sendo que a rede pública, que também deveria prestar tais serviços, é
carente e não dispõe de condições adequadas para dar atendimento de
qualidade, o que se verá no terceiro capítulo do presente trabalho.
114 Art. 14, caput, e § 2º, da Lei de Execução Penal.
47
2.3.4 Assistência jurídica
O Código de Processo Penal determina que “nenhum
acusado, ainda que ausente ou foragido, será processado ou julgado sem
defensor”115.
Se o acusado não designar o seu defensor, o juiz lhe
nomeará, reservado o direito de, “a todo tempo, nomear outro de sua
confiança, ou a si mesmo defender-se, caso tenha habilitação”116.
Nota-se que ao acusado, obrigatoriamente, por
imposição constitucional, será dado um defensor, indicado por ele, ou
nomeado pelo juiz, em todas as fases do processo, e em todas as
instâncias e graus de jurisdição.
2.3.5 Assistência Educacional
A Lei de Execução Penal em seu art. 17 e 18 dispõe
que a assistência educacional compreenderá a instrução escolar e a
formação profissional, com o ensino de primeiro grau sendo obrigatório,
sendo que, no art. 19, determina que o ensino profissional, seja ministrado
em nível de iniciação ou de aperfeiçoamento técnico.
Para as mulheres, há determinação legal de que o
ensino profissional deve ser adequado à sua condição117. Aos que prezam
a leitura é necessário que se faça um processo de conscientização,
demonstrando os benefícios que o direito pode trazer dentro e fora do
cárcere.
115 Art. 261, do Código de Processo Penal Brasileiro. 116 Art. 263, do Código de Processo Penal Brasileiro. 117 Art.19, parágrafo único da Lei de Execução Penal.
48
2.3.6 Assistência Social
O artigo 10 da Lei de Execução Penal afirma que a
assistência ao preso e ao internado é dever do Estado e tem como fim
amparar o preso e o internado e prepará-los para o retorno à liberdade.
A assistente social é de grande importância no
processo de reinserção social do condenado nota-se:
Incumbe ao serviço de assistência social: I - conhecer os
resultados dos diagnósticos e exames; II - relatar, por escrito,
ao diretor do estabelecimento, os problemas e as
dificuldades enfrentados pelo assistido; III - acompanhar o
resultado das permissões de saídas e das saídas temporárias;
IV - promover, no estabelecimento, pelos meios disponíveis,
a recreação; V - promover a orientação do assistido, na
fase final do cumprimento da pena, e do liberando, de
modo a facilitar o seu retorno à liberdade; VI - providenciar
a obtenção de documentos, dos benefícios da previdência
social e do seguro por acidente no trabalho; VII - orientar e
amparar, quando necessário, a família do preso, do
internado e da vítima118.
Por outro lado, existem reclamações sobre a
preocupação do Estado em relação à assistência que deve ser
dispensada ao condenado, o que se tratará em subtítulo próprio.
2.3.7 Assistência Religiosa
A assistência religiosa é de suma importância na
reeducação do condenado. Para a celebração de missas, realização de
cultos e de outras atividades religiosas é indispensável que em todas as
prisões haja um local adequado e reservado119.
118 Art.23, da Lei de Execução Penal. 119 Determina o artigo 24, §1°, Lei de Execução Penal.
49
2.3.8 Trabalho interno e externo
O trabalho é de grande importância para reparar o
dano causado pela prática de uma conduta anti-social.
Conceitua-se o trabalho penitenciário como sendo “a
atividade dos presos e internados, no estabelecimento penal ou fora dele,
com remuneração eqüitativa e equiparado ao das pessoas livres no
concernente à segurança, higiene e direitos previdenciários e sociais”120.
O trabalho prisional serve de complemento para o
processo de reinserção social, promove a readaptação do preso,
prepara-o para uma profissão e evitar a ociosidade.
Para tanto, deve manter semelhança com o trabalho
livre, existindo, de igual forma as mesmas proteções, ou seja, estar sujeito
às normas da Consolidação das Leis do Trabalho. Porém, o condenado
não tem direito às férias, 13° salário e outros benefícios que se concedem
ao trabalhador livre.
O trabalho do preso e do internado deve ser
remunerado mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a três
quartos do salário mínimo121.Se providas as destinações a que ela obriga,
deve ser depositada a parte restante para constituição do pecúlio, em
caderneta de poupança, que será entregue ao condenado quando em
liberdade122.
Os maiores de sessenta anos poderão solicitar
ocupação adequada à sua idade e os doentes ou deficientes físicos
somente exercerão atividades apropriadas ao seu estado123.
120 MIRABETE, Júlio Fabrini. Execução Penal: comentários à Lei n° 7.210, de 11-7-84, p. 92. 121 Art. 29, da Lei de Execução Penal. 122 Art. 29 §2°, da Lei de Execução Penal. 123 Art. 32, §2°e §3°, da Lei de Execução Penal.
50
O limite máximo, de execução do trabalho deve ser de
oito horas e o mínimo de seis horas para a jornada normal de trabalho
devendo haver descanso nos domingos e feriados124.
A autorização de trabalho externo será revogada
quando o condenado praticar fato definido como crime, for punido por
falta grave, ou tiver comportamento contrário aos estabelecidos na lei125.
O comportamento contrário aos requisitos
estabelecidos na lei diz respeito à disciplina e responsabilidade do
condenado tanto no trabalho quanto na vida carcerária.
2.4 DA PROGRESSÃO DE REGIME
A progressão de regime tem o objetivo de ressocializar
o condenado dando a ele condições para que cumpra sua pena em
regime menos gravoso.
Conforme art. 112 da Lei de Execução Penal:
Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em
forma progressiva, com a transferência para o regime
menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o
preso tiver cumprido ao menos 1/6 da pena no regime
anterior e seu mérito indicar a progressão.
Conforme entendimento, para que o condenado
possa gozar deste benefício é necessário o cumprimento de 1/6 da pena
contado a partir do ingresso do condenado no regime prisional, seja
fechado ou semi-aberto.
Já nos crimes hediondos, com a nova redação dada
pela Lei 11.464/07 à Lei 8.072/90, a progressão passou a ser permitida a
esses crimes, sendo de 2/5 para os primários e de 3/5 para os reincidentes.
124 Art. 33, da Lei de Execução Penal. 125 Art. 37, parágrafo único da Lei de Execução Penal.
51
No tocante à Lei 9.455/97, que veio regulamentar e
definir os crimes de tortura, o seu artigo 1º, § 7º, determinou o cumprimento
da pena inicialmente em regime fechado, tendo novo dispositivo
regulado inteiramente a matéria quanto ao regime de execução da
pena, sendo evidentemente mais favorável que a Lei 8072/90.
2.5 DA REGRESSÃO DE REGIME
A regressão ocorrerá quando o condenado, durante a
execução, cometer fato definido como crime doloso ou falta grave; sofrer
condenação, por crime anterior, cuja pena, somada ao restante da pena
em execução, torne incabível o regime (artigo 111 da LEP); frustrar os fins
da execução ou não pagar, podendo, a multa cumulativamente imposta
(art. 118 LEP).
Veja-se os artigos 111 e 118 da LEP:
Art. 111. Quando houver condenação por mais de um
crime, no mesmo processo ou em processos distintos, a
determinação do regime de cumprimento será feita pelo
resultado da soma ou unificação das penas, observada,
quando for o caso, a detração ou remição.
Parágrafo único. Sobrevindo condenação no curso da
execução, somar-se-á a pena ao restante da que está
sendo cumprida, para determinação do regime.
Prosseguindo tem-se:
Art. 118 – A execução da pena privativa de liberdade ficará
sujeito a forma regressiva, com a transferência para
qualquer dos regimes mais rigorosos, quando o condenado:
I - Praticar fato definido como crime doloso ou falta grave;
52
II - Sofrer condenação, por crime anterior, cuja pena,
somada ao restante da pena em execução, torne incabível
o regime (art. 111).
§ 1º - O condenado será transferido do regime aberto se,
além das hipóteses referidas nos incisos anteriores, frustrar os
fins da execução ou não pagar, podendo, a multa
cumulativamente impostas.
§ 2º - Nas hipóteses do inciso I e do parágrafo anterior,
deverá ser ouvido, previamente, o condenado.
Neste sentido é entendimento do STJ:
Estando o condenado em regime semi-aberto ou aberto e
vier a cometer novo crime, o juiz da execução pode
determinar a suspensão provisória do regime enquanto se
processa o incidente. Embora a lei não preveja tal
suspensão, não teria sentido deixá-lo na mesma situação
em que se encontra, a fim de, aproveitando-se de sua
maior liberdade, continuar a praticar outras faltas126.
Conforme entendimento jurisprudencial o condenado
somente terá seu beneficio suspenso no caso de falta grave ou crime
doloso, porém, sempre o juiz há de ouvir o condenado.
É entendimento de Ricardo Luiz da Costa 127:
Poderia sustentar alguns que a regressão do regime de
pena teria um caráter cautelar, assemelhado ao da prisão
preventiva, em prol da sociedade, visto que a nova prática
criminosa demonstraria periculosidade do agente.
Entretanto, o caráter cautelar deve ser imediatamente
excluído, pois medidas desta natureza não tem prazo
mínimo para revogação da medida, que deve ser mantida
apenas enquanto for absolutamente necessária como
cautelar social. Enquanto isso, em tema de regressão de
126 STJ :HHC 473-SP,6ª T,DJU 4-6-1990,p.5067. 127 COSTA Ricardo Luiz da. Lei de Execução anotada, p 531.
53
regime, existe prazo mínimo para que seja ‘desfeita’ a
regressão, o qual é de 1/6 de tempo de pena faltante. Só
este elemento já mostra que a regressão tem caráter de
pena, (de maior restrição à liberdade individual) e não de
cautela, devendo ser a ela aplicada a todos princípios e
garantias referentes às penas, especialmente os do devido
processo legal e de igualdade de todos perante a lei.
Assevera ainda:
Outro aspecto que desrecomenda aplicação imediata da
regressão, sem o atendimento do devido processo legal é a
sua irreparabilidade. Se um apenado que se encontra em
regime semi-aberto é acusado de prática de um fato
delituoso, aceita a aplicação imediata e automática da
regressão, pode ocorrer que posteriormente se verifique que
não tenha sido ele o autor daquele fato criminoso. Mas
durante este período, terá ele permanecido em regime
fechado, cumprindo de forma mais gravosa do que a
devida, face à condenação que sofreu ou a algum direito
de que já tenha conquistado, impedindo de gozar de
benefícios externos, especialmente o de trabalhar para
sustentar sua família128.
Este tempo de cumprimento de pena de forma mais
gravoso é tempo perdido, desperdiçado, pois não existe na esfera penal
forma justa e legal de reparar a injustiça, especialmente porque não é
possível voltar-se no tempo e fazer-se as coisas acontecerem de forma
diferente129.
2.6 DO LIVRAMENTO CONDICIONAL
O livramento condicional é a última etapa do
cumprimento de pena no sistema progressivo, abraçado em geral por
128 COSTA Ricardo Luiz da. Lei de Execução anotada, p 531. 129 COSTA Ricardo Luiz da. Lei de Execução anotada, p 531.
54
todas as legislações penais, é mais uma das tentativas para diminuir os
efeitos negativos da prisão. Para Federico Córdova130:
É um período de transição entre a prisão e a vida, período
intermediário absolutamente necessário para que o
condenado se habitue às condições da vida exterior, vigorize
sua capacidade de resistência aos atrativos e sugestões
perigosas e fique reincorporado de modo estável e definitivo
à comunidade (...).
Para a maioria dos doutrinadores a liberdade
condicional é uma de adaptação do preso para que o mesmo possa se
reabilitar em sociedade, diminuindo desta forma a superlotação dos
presídios e também, um favor ou beneficio para o apenado, como prêmio
por sua boa conduta, determinando automaticamente a sua concessão
como se fosse um direito estabelecido em favor do preso.
Dispõe o Art. 83 do CP:
Art. 83 - O juiz poderá conceder livramento condicional ao
condenado pena privativa de liberdade igual ou superior a
dois anos, desde que:
I - cumprida mais de um terço da pena se o condenado
não for reincidente em crime doloso e tiver bons
antecedentes;
II - cumprida mais da metade se o condenado for
reincidente em crime doloso;
III – comprovado comportamento satisfatório durante a
execução da pena, bom desempenho no trabalho que lhe
foi atribuído e aptidão para prover à própria subsistência
mediante trabalho honesto;
130 Para Federico Córdova 338. E. Cuello Calón, La moderna penalogia, p.537.:
55
IV – tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo,
o dano causado pela infração;
V – cumprido mais de dois terços da pena, nos casos de
condenação em crime hediondo, prática de tortura, tráfico
ilícito de entorpecentes e drogas afins, e terrorismo, se o
apenado não for reincidente especifico em crimes desta
natureza.
Parágrafo Único: Para o condenado por crime doloso,
cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a
concessão do livramento ficará subordinada à constatação
de condições pessoais que façam presumir que o liberado
não voltará a delinqüir.
A teor do artigo 145 da LEP, pode o juiz suspender o
livramento condicional e ordenar a prisão do liberado, mas há
necessidade de ser ouvido o Conselho Penitenciário, sob pena de
infringência aos princípios do contraditório, da ampla defesa e à regra da
jurisdicionalidade da execução.
Pelo livramento condicional o liberado conquista a
liberdade antecipamente, mas em caráter provisório e sob condições. As
condições a que fica submetido o liberado podem ser de caráter
obrigatório ou facultativo e representam, na verdade, restrições naturais à
liberdade de locomoção131.
Nogueira explica que “as condições de caráter
obrigatório estão previstas no art.132, § 1º da Lei de Execução Penal132”
Somente a pena privativa de liberdade pode ser
objeto do livramento condicional, conforme art. 83, caput, do CP.
131 Ricardo Antunes Andreuci, et alii, Penas e medidas de segurança, p. 247 132 NOGUEIRA, Paulo Lucio Nogueira, Comentários a Lei de Execução Penal, p.159.
56
Esse instituto somente poderá ser concedido a pena
privativa de liberdade igual ou superior a dois anos (art. 83 do CP). A soma
de penas é permitida para atingir esse limite mínimo.
A soma das penas para fins de livramento condicional,
que era uma faculdade concedida pelo art. 60, parágrafo único do CP
de 1940, com redação da Lei n. 6.416, foi transformada em dever133.
Ensina Jair Leonardo Lopes que para fazer jus ao
livramento condicional, o apenado deve, obrigatoriamente, cumprir uma
parcela de pena aplicada. Os não reincidentes em crime doloso e com
bons antecedentes deverão cumprir mais de um terço da pena imposta,
e os reincidentes mais da metade.
133 COSTA JUNIOR, Paulo José da costa Jr., Comentários, v.1, p. 434, art. 84 do CP
57
CAPÍTULO 3
A LEI DE EXECUÇÃO PENAL E SUA EFETIVA APLICAÇÃO
A lei de execução penal, apesar de ser um avanço em
termos legislativos, não consegue ter sua aplicação efetivada, pois o
Executivo não faz sua parte, o que dificulta a garantia dos direitos e
deveres dos presos, já que as celas estão superlotadas, não havendo
trabalho para o preso e tampouco a individualização do pena.
3.1 OBJETIVOS DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL
Uma vez aplicada a pena ao autor da conduta ilícita,
dar-se-á início a execução penal.
Segundo MIRABETTE:134
Contém, o artigo 1º da Lei de Execução Penal duas ordens
de finalidade. A primeira delas é a correta efetivação dos
mandamentos existentes na sentença ou outra decisão
criminal, destinados a reprimir e prevenir delitos. Ao
determinar que a execução penal “tem por objetivo
efetivar as disposições da sentença ou decisão criminal”, o
disposto registra formalmente o objetivo da realização
penal concreta do titulo executivo constituídos por tais
decisões. A segunda é de “proporcionar condições para a
harmônica integração social do condenado e do
internado” instrumentalizada por meio de oferta de meios
pelos quais os apenados e os submetidos às medidas de
segurança possam participar construtivamente da
comunhão social.
134
MIRABETE, Julio Fabrini. Execução Penal –Comentarios à lei nº 7210, de 11/07/84, p.59.
58
A Lei de Execução Penal em seus mandamentos prevê
a correção e prevenção de que o condenado não cometa novos crimes,
preocupando-se, também, com a integração social do apenado ou
internado, para que o mesmo possa voltar a conviver em sociedade.
Para João Bosco135:
O aspecto humano, a finalidade educativa, da pena,
buscando recuperar o condenado para uma inserção
reintegradora do mesmo meio social, procurando não só a
defesa a sociedade como colocar um elemento produtivo
e reeducado no convívio com seus semelhantes.
A finalidade educativa da pena busca reintegrar o
condenado após o cumprimento de sua pena, novamente a sociedade,
fazendo com que o mesmo possa conviver harmoniosamente com os
demais cidadãos.
3.1.1 A Reinclusão Social
A reinclusão do preso à sociedade é o principal
objetivo da Lei de Execução penal, tendo em vista que após cumprir sua
penalidade o autor do fato criminoso será reintegrado ao convívio em
sociedade.
Para Silva136:
A definição da reinclusão social como meta principal da
execução penal, o alcance de tal objetivo esbarra na
incompatibilidade entre uma ação pedagógica
ressocializadora e o castigo que necessariamente deveria
da privação da liberdade.
No mesmo sentido Lemgruber137:
135 OLIVEIRA, João Bosco. A execução penal: uma realidade jurídica social e humana, p.16 136 SILVA, Haroldo Caetano da. Manual da execução penal, p.40.
59
No inicio do XIX falava-se no fracasso das prisões enquanto
medida capaz de transformar criminosos em cidadãos
respeitadores da lei. Jamais a privação da liberdade atingiu
o objetivo de “ressocializar” o infrator pela simples razão de
que é absolutamente contraditório esperar que alguém
aprenda, de fato, a viver em liberdade, estando privado de
liberdade.
Neste entendimento as penas privativas de liberdade
não atingem seu maior objetivo que é reinclusão do preso na sociedade,
pois, estando o autor privado de sua liberdade, o mesmo não tem como
aprender a voltar ao convívio em sociedade de forma harmoniosa.
Para Marcão138:
A melhor interpretação que se deve dar à lei é que mais
favoreça a sociedade e o preso, e por aqui não é possível
negar que a dedicação rotineira deste aprimoramento de
sua cultura por meio do estudo contribui decisivamente
para os destinos da execução, influenciando de forma
positiva em sua (re)adaptação ao convívio social. Aliás, não
raras vezes o estudo acarretará melhores e mais sensíveis
efeitos no presente o no futuro do preso, vale dizer, durante
o período de encarceramento e quando da reinserção
social, do que o trabalho propriamente dito, e a alegada
taxatividade da lei não pode constituir óbices a tais
objetivos, notadamente diante da possibilidade de
interpretação extensiva que se pode emprestar ao disposto
no art.126 da LEP. Tanto quanto possível, em razão de seus
inegáveis benefícios, o aprimoramento cultural por meio do
estudo deve ser um objetivo a ser alcançado na execução
penal, e um grande estímulo na busca de tal ideal é a
possibilidade de remir a pena privativa de liberdade pelo
estudo.
137 LEMGRUBER, Julita. Cemitério dos vivos, p.40. 138 MARCÃO, Renato Flávio, Curso de execução penal de acordo com as leis n. 10.763/2003 e 10.792/2003, São Paulo: Saraiva, 2004, p. 126/127. Disponível em: http:/ / jusvi.com/artigos/2619.Acessado em 21 de maio de 2008.
60
Conforme entendimento de Marcão, para que o preso
possa reincluir-se na sociedade faz-se necessário aprimorar a cultura por
meio de estudos, favorecendo tanto o preso quanto a sociedade.
3.2 FATORES QUE IMPEDEM A EFETIVA RESSOCIALIZAÇÃO DOS PRESOS.
Alguns fatores impedem a ressocialização do preso,
entre elas está a falta de interesse do Estado em buscar soluções para o
problema atual do sistema carcerário brasileiro.
Neste sentido Falconi139 afirma:
Vê-se a cruzeta como que o Estado trata seus
encarcerados. Se cumprir a parte final da norma jurídica,
tudo bem. Afinal nós somos ferrenhos apologistas da
laborterapia. O risco está em não se dar ocupação ao
preso e, ao final, matá-lo de inanição. Não se pode
esquecer, jamais, que vivemos na doente América Latina,
onde os detentores do Poder são, em grande parte,
vingativos, carrascos e desumanos. Somente lembram os
“Direitos Humanos” quando os destinatários são eles
próprios. A história está aí, viva e atual.
Na atual realidade carcerária, os presos ficam sem
ocupação, não tendo a possibilidade de praticar atividades laborativas,
com total desinteresse pelo Estado.
No Brasil o sistema penal é administrado pelos governos
estaduais e a organização dos presídios são de sua responsabilidade. O
sistema prisional tem a sua própria Secretaria de Segurança como
recomenda a Lei de Execução Penal, contudo fica aquém do ideal a
implementação de medidas que possam efetivar as disposições trazidas
pela LEP.
139 FALCON, Romeu. Sistema prisional: reinserção social? , p.109
61
Para ALVES:140
Seja qual for a estrutura organizacional que o Estado opte, é
dever dele manter sob sua custódia e em condições dignas
de tratamento, dentro dos limites legais, o condenado ou
mesmo aquele preso provisoriamente, mantendo um
distanciamento deste daquele, para os fins da execução
penal e dos Princípios Individualizadores da Pena. Mas, a
realidade é outra, e distante do rigor da lei, pois o que se
vê nos Estabelecimentos Provisórios são flagrantes
ilegalidades, desde a estrutura do prédio, até tratamento
recebido pelos presos que ali estão, em meio estão,
condenados, provisórios, sob medida de segurança e às
vezes, até menores, como ocorre nas cidades menores.
Para Alves é dever do Estado manter o condenado em
condições dignas e supervisionar suas condições na individualização das
penas, porém devido ao grande crescimento da população carcerária
esta situação está fora de controle, colocando os presos em celas
coletivas, ferindo desta forma os princípios mínimos exigidos para a
recuperação dos mesmos.
3.2.1 A Superlotação das Prisões
A superlotação das prisões torna-se cada dia mais
preocupante para a segurança dos presos e da sociedade, pois o preso
está sem ocupação, tendo tempo o suficiente para arquitetar fugas em
grande massa.
140 SILVA, Alves Léo. Fim da Superlotação dos Presídios. Disponível em: http://66.102.1.104/scholar?hl=pt-BR&lr=&q=cache:orb-TXjupEoJ:www.jefersonbotelho.com.br/wp-content/uploads/2007/03/acessado em 23 de maio de 2008.
62
Neste Sentido FACONI:141
Não se pode esperar progresso algum num universo repleto
de ociosidade, já que ali só se alimentam os vícios, como de
resto criam-se possibilidades reais à prática de ações
negativas, como foi o caso da inusitada fuga e 51 presos,
ocorrida na Casa de Detenção de São Paulo, que
conseguiram cavar, de dentro para fora, ou dos dois lados
concomitantemente, conforme disse o diretor da Casa, em
entrevista para a Revista “Isto É”, um túnel com
aproximadamente 100 metros de extensão, 3 metros de
profundidade e 60 centímetros de largura.
Conforme Falconi a superlotação é um problema, pois
os presos não tem atividades para se ocuparem durante o tempo que irão
cumprir a pena.
Para Alves142:
A Constituição Federal de 88 consagra direitos e garantias
fundamentais mínimas para o cumprimento da pena
privativa de liberdade, entre elas a individualização da
pena e em estabelecimentos distintos de acordo com a
natureza do delito, a idade e o sexo. E a integridade física
do preso o que não é garantida quando colocam o preso
para cumprir a pena numa cadeia superlotada e com
diferentes tipos de criminosos.
A falta de cumprimento dos princípios fundamentais é
um dos fatores que causam a superlotação dos presídios, e não
proporcionam ao preso o mínimo de dignidade humana e garantias para
que o mesmo possa a conviver em sociedade.
141 141 FALCON, Romeu. Sistema prisional: reinserção social?, p.110. 142 SILVA, Alves Léo. Fim da Superlotação dos Presídios. Disponível em: http://66.102.1.104/scholar?hl=pt-BR&lr=&q=cache:orb-TXjupEoJ:www.jefersonbotelho.com.br/wp-content/uploads/2007/03/acessado em 23 de maio de 2008.
63
3.2.2 Ausência de Individualização da Pena e de Classificação dos
Condenados
A lei de execução penal prevê que os condenados
serão classificados segundo os seus antecedentes e personalidade, porém
na atual realidade os presos são obrigados a dividir as celas com todo tipo
e detento.
Conclui Mirabette143:
É norma constitucional, do Direito brasileiro, que a lei
regulará a individualização da pena. A individualização é
uma das chamadas garantias repressivas, constituindo
postulado básico de justiça. Pode ser ela determinada no
plano legislativo, quando se estabelecem e se disciplinam
as sanções cabíveis nas varias espécies delituosas, no plano
judicial, consagrada no emprego do prudente arbítrio e
discrição do juiz, e no momento executório, processada no
período de cumprimento da pena que abrange medidas
judiciais e administrativas, ligadas ao regime penitenciário, à
suspensão da pena, ao livramento condicional,etc.
Esta previsão de individualização da pena está prevista
na Constituição Federal e na Lei de Execução Penal, e é uma das
garantias repressivas, dando ao preso o direito de ter cela individual para
o cumprimento de sua penalidade.
Para Oliveira144
Outro sério problema apresenta do nas prisões é o
alojamento de pessoas altamente perigosas, reincidentes,
cumprindo penas pelos mais diversos delitos, juntas com
presos, indiciados, presos em flagrante ou preventivamente,
doentes mentais e até jovens.
143 MIRABETE, Julio Fabrini. Execução Penal –Comentarios à lei nº 7210, de 11/07/84, p.56 144 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social, p.83
64
Na atualidade a lei não encontra ressonância na
realidade carcerária, eis que a par da superlotação das cadeias existe,
ainda, a falta de interesse de construir novos presídios, para evitar que os
presos que tenham cometido crimes de menor gravidade fiquem juntos
com detentos de alta periculosidade.
3.2.3 A Degeneração da Identidade do Preso
Com a privação da liberdade do apenado, o mesmo
acaba por perder em parte sua identidade, pois, mudou totalmente o seu
modo de vida.
Conclui Sá145:
A rotina prisional constitui-se de um conjunto de práticas
suficientes para coloca em choque a estrutura de identidade
do interno e determinar o delineamento de uma nova
identidade, com características de alguém que está sendo
possuído por uma instituição estatal.
O detento quando é deslocado para a prisão, tem
que se habituar a novas rotinas que em parte são imposta pelo Estado
como forma de repreensão e prevenção, e de outro lado tendo que
adequar-se a rotina dos presos ali chamados de veteranos, perdendo
parte de sua identidade.
Para Thompson146:
A elevação da segurança e disciplina a fins de alta
precedência reclama um controle ilimitado sobre o preso,
do que resulta o completo sacrifício de sua autonomia. Não
se lhe permite fazer escolhas: as opções são regradas
minuciosamente e as que dependerem de uma decisão
humana devem provir dos funcionários. Como teria de ser
145 SÁ, Geraldo Ribeiro. A prisão dos excluídos, p.46. 146 THOMPSON Augusto. A questão penitenciaria, p.60.
65
por varias razões, mas, sobre tudo, porque se trata de um
regime totalitário, as ordens não são justificadas e nem
explicadas. O interno está obrigado a seguir ordens porque
tem que fazê-lo, sem o direito de analisá-las, julgá-las ou
sequer compreende-las independente de experimentar o
sentimento de que sejam moralmente corretas. Lecionando
de maneira profunda, no seu senso de autodeterminação,
hesitante, sempre, entre fazer ou não fazer, o recluso
habitua-se a esperar que tomem decisões por ele, e isso lhe
descaracteriza a sua personalidade.
Desta forma o detento não tem direito de escolha,
prejudicando desta forma sua personalidade e comprometendo sua
identidade, pois habitua-se a sempre cumprir ordens, sem qualquer direito
de questionamento.
Ainda no pensamento de THOMPSON147:
Todos os dias, ao deixar o isolamento pela manhã, o preso é
revistado; ao voltar a tarde, a operação se repete. Isso,
contudo, não se antolha bastante. Durante a noite, com
alguma freqüência , pode se acordado pelo barulho de
chaves, a abrir cadeado do cômodo. Entram guardas.
Mandam que permaneçam encostados à parede, junto da
porta. Seus pertences, suas roupas, sua cama, tudo é
revirado. São as incertas revistas realizadas de surpresa,
numa galeria escolhida aleatoriamente, haja ou não
suspeita a seu respeito, a operação o inclui, pois a
burocracia fiscalizadora não perde tempo com as
avaliações subjetivas. Se caminha no pátio, da faxina para
o sanitário,pode ter os passos interrompidos por uma voz
seca: Você ai espere!” Um vigilante resolveu submetê-lo a
uma revista extra. Levanta os braços, abra as pernas, deixa-
se apalpar, mãos estranhas invadem-lhe os bolsos, dali retira
papeis, maço de cigarro, fósforo, cédulas de dinheiro e o
que mais houver; as vezes o maço é rasgado por inteiro, um
cigarro é desmanchado, bilhetes ou cartas, caso haja, são
lidos cuidadosamente. Minutos depois, indo do sanitário
147
THOMPSON Augusto. A questão penitenciaria, p.61.
66
para o refeitório pode ser novamente escolhido, por outro
guarda, para nova revista, e a operação se repete,
deforma idêntica. Pouco importa que não registre sua
historia prisional uma única infração: a vistoria será feita
com a mesma suspicácia, pois sua condição de preso gera
fortes razões para ser julgado um individuo absolutamente
carecedor de sua confiança. “Preso é preso”- dito corrente
entre os funcionários que iguala todos os internos como
objetivos depravados e perigosos
Ao ser inserido no regime prisional o preso não tem
mais sua autonomia, sendo submetido a qualquer tempo a revistas em seu
alojamento e pessoalmente, não tendo direito a privacidade ou qualquer
outro tipo de direito, basta tão somente ser preso para ser descriminado e
tratado de forma duvidosa.
Neste sentido o condenado que cumpriu sua pena é
alvo de descriminação e não consegue reaver sua identidade em sua
plenitude.
3.2.4 Ausência de Trabalho para o Apenado Durante a Execução da Pena
O trabalho é um direito do preso, porém devido a
superlotação das prisões o mesmo não é desenvolvido adequadamente,
e quando existente, abrange apenas uma pequena parcela dos detentos.
Afirma FOUCAULT 148 que “o trabalho é a providência
dos povos modernos: serve-lhes como moral, preenche o vazio das
crenças e passa por ser principio de todo o bem. O trabalho devia ser a
religião das prisões”.
Neste sentido Foucault afirma que a religião das prisões
deveria ser o trabalho, pois o trabalho dignifica o homem e o mantém
com a mente ocupada com ofício saudável e produtivo.
148 FOUCALT, Michel. Vigiar e Punir. Nascimento da Prisão, p 204.
67
Para Foucalt:149
O trabalho acaba com promiscuidade carcerária, com os
malefícios da contaminação dos primários pelos veteranos
delinqüentes, e dá ao condenado a sensação de que a
vida não parou para ele e continua um ser produtivo, além
de evitar a solidão, que gera neuroses, estas, por sua vez,
fator de perturbação nos estabelecimentos penais e
fermento de novos atos delituosos.
Afirma, ainda, o mesmo autor: “Sem dúvida, a
laborterapia é uma das formas mais eficazes de reinserção social, desde
que dela não se faça uma vil de escravatura e violenta exploração do
homem pelo homem, principalmente enclausurado” 150.
Machado Junior151:
Assim, estabelece-se o trabalho prisional como uma condição de dignidade humana e dever social do preso, sendo uma responsabilidade pessoal do mesmo (art. 28, LEP). Nas penitenciárias brasileiras o trabalho resume-se em atividades de pouca ou nenhuma apreciação econômica, cumprindo apenas a função interna supramencionada, inobservando-se a necessidade do preso da inserção no mercado de trabalho.
O trabalho prisional é de grande importância para a
inserção do preso no mercado de trabalho e na sociedade após o cumprimento
de sua pena, porém a deficiência nos estabelecimentos prisionais muitas vezes
impossibilitam o cumprimento deste direito do preso.
Para Lima Filho:152
149 FOUCALT, Michel. Vigiar e Punir. Nascimento da Prisão, p 40. 150 FOUCALT, Michel. Vigiar e Punir. Nascimento da Prisão. 22 ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2000. p 71. 151 Apud ADORNO, Rodrigo dos Santos. Uma análise critica à execução penal: a partir do estudo de uma penitenciaria do Grande do Sul. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n 288, 21 abr. 2004. Disponível em: HTTP://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5115. Acesso em 25 de maio de 2008
68
Apesar das determinações legais, os estabelecimentos
penais do país não oferecem oportunidades de trabalho
suficientes para todos os presos. [...] Para citar alguns
exemplos representativos entre os estabelecimentos
visitados pela Human Rights Watch: cerca de 15% da
população carcerária na Penitenciária Raimundo Vidal
Pessoa, em Manaus, estavam empregados; cerca de 50 a
60% da população carcerária na Penitenciária Estadual de
São Paulo estavam empregados; nenhum preso no Presídio
de Segurança Máxima de João Pessoa estava empregado;
cerca de 30 a 40 % da população carcerária do
Penitenciária Regional de Campina Grande tinham
emprego; cerca de 15% da população carcerária do
Presídio Central de Natal estavam empregados, e cerca de
20% da população carcerária do Presídio Central de Porto
Alegre tinham emprego.
As conclusões acerca deste estudo não são as mais
promissoras, pois na realidade a teoria está longe da prática, pois embora
não vise a apreciação econômica, a maioria dos presos não têm
oportunidade de trabalho.
Ainda Lima Filho:153
Deve-se ressaltar que o reduzido número de detentos
empregados é resultado da escassez de oportunidades de
trabalho, e não de falta de interesse da parte dos detentos.
Para começar, de acordo com a LEP o trabalho deveria ser
obrigatório, e não opcional. Mas ainda mais convincente,
152 LIMA FILHO, Osmar Araão Gonçalves de. Soluções legais para a recuperação do presidiário no Brasil: a proposta e a realidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1216, 30 out. 2006. Disponível em: HTTP://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9101. Acesso em 25 de maio de 2008. 153 LIMA FILHO, Osmar Araão Gonçalves de. Soluções legais para a recuperação do presidiário no Brasil: a proposta e a realidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1216, 30 out. 2006. Disponível em: HTTP://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9101. Acesso em 25 de maio de 2008.
69
na prática, é o incentivo criado pela própria lei para a
redução de sentenças. De acordo com esse dispositivo
legal, para cada três dias de trabalho, um dia deve ser
debitado da sentença do detento. Ansiosos para sair da
prisão o mais rápido possível, quase todos os detentos estão
dispostos a trabalhar, mesmo sem receber. Na verdade, os
detentos reclamaram muitas vezes da falta de
oportunidades de trabalho. A escassez de trabalho nas
carceragens das delegacias é uma das muitas razões pelas
quais os detentos se revoltam para serem transferidos para
as prisões.
O sistema carcerário não comporta espaço físico para
que os detentos possam trabalhar, já embora esteja expresso na
legislação o trabalho tem que ser obrigatório e o preso que trabalha tem
sua pena remida, causando desta forma ansiedade nos apenados para
trabalhar e cumprir o mais rápido possível sua penalização.
Comenta Reale Junior154:
Infelizmente, nossos presídios não têm proporcionado aos
condenados a oportunidade de trabalhar, o que seria
oportuno para reeducar, disciplinar e mesmo arrefecer os
ânimos de rebeldia e inconformismo daqueles que estão na
ociosidade. Somos da seguinte opinião: assim que o
indivíduo fosse condenado, deveria passar imediatamente
a trabalhar, como único meio de manter-se ativo e útil
socialmente, deixando –se de lado esse pieguismo de que o
trabalho do condenado é “forçado” e impedido pela
Constituição Federal.
Com o aumento da criminalidade ficou difícil o
controle da superpopulação carcerária, não dando oportunidade ao
preso de trabalho, tornando o cumprimento da pena do indivíduo
insuportável, permanecendo numa ociosidade criminosa.
154 REALE JUNIOR, Michael. Novos rumos do sistema criminal, p. 43.
70
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No primeiro capítulo foi analisado o conceito de crime
no ordenamento jurídico, o qual pode ser conceituado em material,
formal e analítico, sendo que este último põe em relevo os seus valores
essenciais, variando as opiniões a respeito da composição dos elementos
estruturais de sua definição. Também foi abordado a pena e suas
características, quais sejam: legalidade, personalidade, proporcionalidade
e inderrogabilidade. O princípio da legalidade consiste na existência
prévia de lei para imposição da pena (nulla poena sine lege), previsto no
art. 1º do Código Penal. A característica da personalidade refere-se à
impossibilidade de estender-se a terceiros a imposição da pena. Por isso,
determina-se que "nenhuma pena passará da pessoa do condenado",
proibindo-se, por exemplo, as penas infamantes Com relação à
proporcionalidade, a pena deve ser proporcional ao crime praticado.
No segundo capítulo foi abordado a LEP, notando-se
que a mesma diferencia os regimes prisionais em fechado, aberto e semi-
aberto. O regime fechado é caracterizado por manter o apenado em
regime isolado, não tendo o mesmo contato com a sociedade, sendo
vigiado e tendo todos os seus atos vigiados. No regime semi-aberto, o
condenado cumpre a pena sem ficar submetido às regras rigorosas do
regime penitenciário e a pena é cumprida em colônias, industrial ou
estabelecimento similar. Destinam-se ao regime aberto os condenados
aptos para viver em semiliberdade, ou seja, aqueles que, por não
apresentarem periculosidade, não desejarem fugir, possuírem
autodisciplina e senso de responsabilidade, estão em condições de eles
desfrutarem sem porem em risco a ordem pública por estarem ajustados
ao processo de reintegração social.
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Já no terceiro capítulo foi estudo a efetiva aplicação
da LEP, bem como os fatores que impedem a efetivação dos direitos e
deveres do presos, sendo que a hipótese restou confirmada, pois apesar
de ser um avanço em termos legislativos, a LEP não consegue ter sua
aplicação efetivada, pois o Executivo não faz sua parte, o que dificulta a
garantia dos direitos e deveres dos presos, pois as celas estão
superlotadas, não havendo trabalho para o preso e tampouco a
individualização do apenado.
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ANEXOS