a noção de cultura nas ciências sociais - capítulo 1

Upload: dani-soares

Post on 16-Jul-2015

565 views

Category:

Documents


3 download

DESCRIPTION

CUCHE

TRANSCRIPT

  • 5/13/2018 A No o de Cultura nas Ci ncias Sociais - Cap tulo 1

    1/5

    1Genese Social daIdeia de Cultura

    uma historta e, de certaas palavras fazem a hlstorla. Separa todas as palavras, e pam -

    cularmente verificavel no caso do termo "culm-ra". 0 "peso das palavras", para retomar uma ex-pressao da midia, e grandemente influenciadopar esta cel~ao com a historia, a hist6ria que asfez e a historia para a qual etas contribuem.( As palavras aparecem para responder a al-foumas Interrogacoes, a certos problemas que secolocam em periodos historicos determinadosJ; em contextos socials e politicos especiflcos.Nomear e ao mesmo tempo colocar 0 problemae, de certa maneira, ja resolve-to.A inven.;ao da nocao de cultura e em stmesma reveladora de tun aspecto fundamentalda cultura no seto da qual pode ser feita esta in-vencao e que chamaremos, poe falta de urn rer-rna mais adequado, a cultura ocidentaJ. Inversa-mente, e ' nificativo que a palavra "cultur.Cnioteoba equiv.uent or te das uas.orais das sociedades q,ue os etn61ogos estud~habitualm~t_s)b10 n a o implica, evidentemente(ainda que esta evidencia nao seja universalmen-te compartilhada!) que estas sociedades nao te-nham cultura, mas que etas nao se colocam a

    .9._uestao de sabel'se tem ou nw uma cul~ eainda menos de defirur S113pijzt,ria cuilUg...-Por esta razao, se quisermos compreender

    o sentido atual do conceito de cultura e sen usonas ciencias sociais. e tndispensavel que se re-constitua sua genese social, sua genealogia. Islae , trata-se de examlnar como foi formada a pala-vra, e em seguida, 0conceito cientif ioo que deladepende, logo, localizar sua origem e sua evoh . ..~ao semantica. Nao se trata de se entregar aqui aurna anallse Iingilistica, mas de evidenciar os la-r;os que existem entre a historia da palavra "cul-tura" e a historia

  • 5/13/2018 A No o de Cultura nas Ci ncias Sociais - Cap tulo 1

    2/5

    tando nisso seu model{ LatinoEltura, coosa-grado pelo latirn c1ass icQ no sentido figurado.: . . . l-o termo "cultura" no sentido figurad0.t.me~a a se impor no secolo XVII!:, Etc faz sua en-trada com-este sentido no Dictonarto da Acade-mia Frafu:esa (edic;ao de 1718) e e e n ta o q ua sesempre seguido de urn complemento: fala-se da"cultura das artes", da"culturn da s letras.da "cul-tura da s clencias", como se fosse preciso que acoisa cultivada estivesse expllcitada.

    A palavra faz parte do voca.bulano da lin-gua dQ .Dumin i smo , . scm ser, no eutanlo, muito_u~ada..llQQs fi1osofos)A Enciclopedta, que re-serva urn. longo artigo para a "cultura das terras",nao dedica nenhum artigo especffico ao senti dofignrado de "cultura", Entretanto, ela niio 0 igno-ra, pois 0 utiliza em outros artlgos ("Edllca,, ;-ao~,"Espfrito" ,"Letras" ,UFilosofia" ,"Ciencias") ,

    Progressivamente, "cultura" se libera deseus complementos e acaba por ser empregada-. si at a "fol'ma0io\ a "educa~'iio'~oes lrito. epois, em um movimento inverse aoobserva o anteriormente; passa-se de "cultural'como a ao ao de instnlir) a "cultura "como es-}ado (estado do espirito culti pcL'l insttu-~o,_es!!do do indlVlaUO '~~~ tern cultura") ...Esteuso e consagrado, no tim do seculo, pelo Dici-onario da.Academia (edi~ao de 1798) que estig-matiza "urn esprrito natural e sem cultura", subli-nbando com esta expressao a oposi~ao coned-tual.entre "natureza" e "cultura, '. Esla oposi~ao e.fu_ndam~tal para os J2.ensadores do RumlliiSiii

  • 5/13/2018 A No o de Cultura nas Ci ncias Sociais - Cap tulo 1

    3/5

    "Civiliz~o~e tao Iigada a esta concepcao pro-gresslsta da historia que os que se mostram ce-~com relacao a eta, como Rousseau ouVoltaire, evirarao utllizar este rermo poe seremminoritimoS}= nao estarem em condicoes de im-par uma outra.concepcao mais relativista.o usa de "cultura"e de "civilizat;. :ao"no sC-culo XVIII marca ent;3Q0aparedmentQ d~!_lovaconcept;ao@essacraliza~ da hist6ria~---.Q::__sof ia . .(da hist6riOl).BeJ ib_en.-da teologia ( da h is t6 -ria). As idetas otimistas de progresso, inscrltasn a s no

  • 5/13/2018 A No o de Cultura nas Ci ncias Sociais - Cap tulo 1

    4/5

    mente alemao. Como a unidade nacional alemanao estava ainda reallzada e nao parecia possivclentao no plano politico, a intelligentsia quetern uma ideia cada vez mals forte de "missao na-cional", vai procurar esta unidade no plano dacultura.A ascensao progressiva desta camada s0-cial anteriormente sem influencia que conse-guiu fazer-se reconhecer como porta-voz daconsciencia naciona! alema transforma entao osdados e a escala do problema da antitese "cultu-ra" - udviliz~ao". Na Alemanha, a s vesperas daRevo lw; ao Francesa,0t erm "1r"t : i~t t i l !iC3"o"pe~esua conoracao aristocratic a alema e passa a e v e -'>car a Franca e, de urna maneira gerat , as poten-cias oCldentals. Oa mesma maneira, a "cultllra " ,de marca distintiva da bucguesia intelectual ale-m a no sCculo XVIIi, val s e c convertida:noseru-10X I X , em marca disti;tiva da n~i-ti'Ps traces carncleristicos-(ji classe inteteC-" t U a ] , que manifestavam sua culrura, como a sin-ceridade, a profundidade, a espiritualidade, vanser a partir de entao considerados como especi-ficamente alemaes,

    Atr~s desta evolu~ao se esconde, segundoElias, urn me~~ ' ; ;e~anismO"pSlco.bgtco~oaum ~ent~ento de inferioridaae,-" meia ~de cultura e criada Dela dasse media que duvi-da deb mesma, que_se sente mais ou menos alf-j a d a " d o - p o d e r - e das honras e que procurn para1!i..wna Q u t r : l f O r f f i i " a e - I e g i I i i i i i d a d e soaar1-~ten-dida a . "nacao" alema, ela participa da mesrna in-

    26

    certeza, ela e a expressao de lima consciencia c~o de culmra caracterizada pela desconti-nacional que se questiona sobre 0carater espe- .nuidade, qu~l1iiQ._~!clllia. no entanto, uma ~9cifico do povo alemao que nao conseguiu alnda siYE...!'J)muniGl~O_et:ltre...Q$_ovos~ era baseadasua unlficacac politica.Diante do poder dos Es- em Uma outra filosofta da btstorta (titulo detados vizinhos, a Franca e a Inglaterra em parti- sell livro de 1774), dif~_da_ I~fra do Ilu-cular, a "na~ao"alema, enfraquedda pelas divi- ~inismo.JPor iSso, H e r d ; ' : - pode ser-consider.! . 0,soes politicas.esfacelada em multiples pnncipa- col!0ustip, precu~cei~dedos, procura afirmar sua existencia glorificando _"cultu~ "Poi Herder quem nos abriu os ollioS'"sua cultura. sabre as culturas" [Dumont, 1986, p, 134].

    Esta e a cazao pela qual a n~iio alema de Depois da derrota na batalha de lena, emKult";: dec :carla vez mais, a partlC do s6- 1806, e a oeupacao das tropas de Napoleao, a..culo XIX, para a delimita a . o e a. consoli ao consciencia alema vai conhecer uma renovacaodas diterencas nacionais:j'rata-se entao de uma do naeionallsmo que se expressara atraves de-"~~ particularista que se opoe a nor;ao fran- uma acentuado da interpcetar;ao particularista~a lmiversalista de "civilizacao", que ~ a ex- da cultm3 alema.b esforco para definir o''Caci-pressao de luna nacao cuja unidade nacional ter atemaose intensifica. Nao e somente a origi-aparece como conquistada h a rnuito tempo. nalidarle, na singularidade absoluta, da culturaJ li em 1774, mas de maneira ainda relativa- ..~ lemji_qy~~_m1rmada, mas tambem sua suI2.e-mente isoladaj johann Gottfried ~ em urn ~rior_i~ade~ Desta aflrmacao, certos Ideologostoto polemico fundamental, @ome do "ge- concluem que existe uma missao especifica donio nacional" de cada povo (Vo/ksgeist), tomava povo alemao com retacao a humanidade.partioo peliOivetstdade de culturas, ri,ueza di' A ideia alcma de cultura evolul entao POll-hi:iiiianiffii( e e ~ontra 0universalismo uniform~~ no seculo XIX sob a influencia do nacionalis-. zante (10Duminismo.que de considerava empo- mo. Ela se l iga cada vez mals ao conceito de "na-brecedor; Diante do que d e via como um impe- . . _ C ; a o " . A cultura vern da alma, do genio de urnrialismo in(e1ectual (fa filosotia francesa doU~; povo.A nac;aocultural precede e chama a nacaominismo, Herder pretendia devolver a cada politica. ~tw:a ..!lp-ar~.I::~__omoIm conjuntopovo seu orgulho, comecando pelo povo ale- de conguistas artisticas, intelectuais e moraismao. Para Herder, na realidade, cada ...2Qvo, atC"a- qlJ~_sonstituem o--pattimonio de uma __la~ao,~s de sua c~dtllt:l ~r6pria, t~m urn dest.ino ~~e- 5ons ide r ado -~adqU_ i~~dodermi i i : ; ime_ l1 t~_ e _(meo a reahzatl Pols cada cultura expnme a sua fundador de sua uni'

  • 5/13/2018 A No o de Cultura nas Ci ncias Sociais - Cap tulo 1

    5/5

    Estas conquistas do espirho nao devem sec 0 concdto frances co~_m~.l:~~~confundidas com as realizacoes tecnicas, ligadas id6a deLlfiirl~~o g6 ; _~~2~ ,S ' Entre osao progresso industrial e emanadas de lim raci- seculos XVIII e XIX na Fran4!;a,hi a continuidaonalismo scm alma. De maneira cada vez mais de do pensamento l.utiversa1ista~ alltuta, nomareada ao longo do seculo XIX, os autores co- sentido coletivo, e antes de tuCio a "cultura damanttcos alemaes op6em a cultura, expressao humanidade", Apesar da influenda alema, ada alma profunda de urn povo, a civilizacao de- ideia de unidade suplanta a consciCnda da di---finida a partir de entao pelo progresso material versidade: alem das diferen4!;as-que se podt;_~ligado ao desenvolvimento econornico e tecni-:_secvar entr.Ult~~~ve"cu1tum francesan~co. Esta ideia essendalista e particuIarista da ~hi a unidade da "cultura humaoa~:tm uma cele-cultura esta em perfeita adequacao com 0 con- i;;; ;)ilfereOOipromurcaoa na orbonne emoerto etnico-racial de na~ao - comunidade de in- 1882,0 que e uma narao?, Ernest Renan aIlt-dividuos de mesma origem - que se desenvolve mava sua conviccao: "Antes da cultura francesa,no mesmo momenta naAlemanha e que servira da cuhura alema.da cultura italiana, existe a cul-de fundamenro a consrltulcao do Estado-nacao tura humana,"alemao [Dumont, 19911. Os particulansmos culturais sao minlmtza-'--, Na Pranca, a evolucao da palavra no secu- dos, os'1i i tefecWaiSi11O:Kimlrem a concep~ao

    10XIX e tun poueo diferente.Urn certo interes- d'e'uma cuin;-~-n~d.~~"~-;;kSde rudo,'i'SSifu. . _ ! :OII" ~ _ ~ ~~. . ~~ _ _~~.~.~ ~se nos drmlos c1.Iltos pela Illosofia e aSlettas como recusam a oposi~o feita- pe10s alernaes

    alemas,\em pleno desenvolvimento contril5iii\l e.9~'1~!.JA ~s;ilis-talvez pam ampliar a acepcao da palavra france- ta frances.a..da-cultut'a-aCQf!_lpanha a concepcaosa. "Cultura" se enriqueceu corn uma dimensao _eldiv~~.9l surgida na Revolm;ao: perten-coletiva e na o se referia mais somenteao desen - cern a nacao francesa, explicara Renan, todos osvolVtmento intd7ci-~al do Individuo. Passou a que se reconhecern nela, quaisquer que sejarn--esign ..... t ambem urn conjunto de caracteres suas origens.propnos de l i m a mmuniaade, mas em urn sc?n- No seculo XX, a rjyalidade dos nacionalis-,.!.~.~eralmen!e ~.to e i~re~!? Encoritr..-se -- ..I1lQ,sranc::_~.uell!l1(}~~ ..~!lspf.~_nt~ent~ b i ! : .expressoes como "cultura francesa" (ou alema) tal na guerra af'i9r4~1i vaa exacerbar 0de-au "cultura da humanidade", "Cultura" est:" mui- - bate idea16s!,2.~duas-concep~oeraeto proxima da palavra "dvilizat;ob e a s vezes e ~ uiirn :a ,A s" alavras t o n i " i i i r , . s e nnog an s u '''''""Clo'"ssubstiruivel por ela, fmoarma~.Aos alemaes, que dizem defender a

    cultura (no sentido em que des a entendem), os

    29 30

    franc~ repltcam pretendendo ser os cam-~iViliz3