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A TECNOLOGIA APLICADA NAS AUDITORIAS DA CGU EM FAVOR DO APERFEIÇOAMENTO DA GESTÃO DE
PESSOAS
Ronald da Silva Balbe Henrique César Sisterolli Kamchen
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Painel 01/003 Aprimoramento da Gestão de Pessoas por meio de Auditorias com uso intensivo de TI
A TECNOLOGIA APLICADA NAS AUDITORIAS DA CGU EM FAVOR DO APERFEIÇOAMENTO DA GESTÃO DE PESSOAS
Isidro-Filho
Ronald da Silva Balbe Henrique César Sisterolli Kamchen
RESUMO
A Controladoria-Geral da União, criada em 2003, tem como atribuição assistir direta e
imediatamente ao Presidente da República no desempenho de suas atribuições,
conduzindo trabalhos de defesa do patrimônio público, controle interno, auditoria
pública, correição, prevenção e ao combate à corrupção, ouvidoria e incremento da
transparência da gestão no âmbito da administração pública federal. Nesse contexto,
a auditoria da gestão de pessoas se apresenta como uma eficaz ferramenta de
avaliação do desempenho dos administradores e das organizações. No início dos
anos 2000, em razão da crescente complexidade, do volume e da escassez de
recursos humanos no órgão de auditoria e controle interno, foram desenvolvidas
trilhas de auditoria por meio do cruzamento de dados computacionais da folha de
pagamento. Atualmente, tanto a atividade de análise de atos de admissão,
aposentadoria e pensão, como o cruzamento de dados do Siape (Sistema Integrado
de Administração de Recursos Humanos) e outros sistemas estruturantes do Governo
Federal fazem uso intensivo de Tecnologia da Informação e Comunicação. Sem os
modernos meios tecnológicos, a atividade de avaliação da consistência da folha de
pagamento de mais de 1 milhão de servidores ativos e aposentados seria
praticamente inviável. Ademais, com a ampla cobertura dos gastos, a CGU, vem
ampliando o rol de atividades, como por exemplo, a avaliação da governança da
gestão de pessoas, por meio da identificação de pontos vulneráveis e a proposição
de melhorias.
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1. INTRODUÇÃO
A administração pública contemporânea se encontra a cada dia que passa mais
sensível a mudanças, seja utilizando e adaptando as técnicas oriundas do setor
privado, seja abrindo maior espaço para o relacionamento mais intenso com os
organismos do terceiro setor e com o principal interessado e destinatário das políticas
públicas: o cidadão.
Em grande medida, as mudanças alteram processos de trabalho e modificam,
ou precisam modificar, a forma de atuar dos servidores públicos, razão pela qual são
cada vez mais necessários aprimoramentos nas práticas de gestão de pessoas.
Modernizar, inovar e até revolucionar as práticas de gestão parece ser o caminho
necessário para superar os desafios impostos aos governantes, sobretudo no
momento em que escasseiam os recursos e se elevam as demandas, fenômeno muito
comum em momentos de crise econômica, como vivem hoje os brasileiros.
Conforme registram Beck e Nascimento (2016), apenas cinco estados
gastaram menos do que 65% da receita corrente líquida com pessoal em 20151. O
governo federal não se encontra em situação semelhante (gastou cerca de 38%),
porém, não tem espaço para incrementos no orçamento sobretudo porque vem
enfrentando quedas na arrecadação com subsequentes reduções nas metas de
superávit.
Então, no que se refere à despesa de pessoal, quais seriam os problemas e
sobretudo quais seriam as soluções possíveis. Sem dúvida, parece haver consenso
quanto a necessidade exercer maior controle sobre a legalidade do gasto, contudo,
apenas contê-lo não resolve a questão mais estrutural que é a eficiência. Para esta,
há de se buscar remédios mais abrangentes e menos ortodoxos, como por exemplo
a adoção da gestão por competências. Mas é importante notar que as duas medidas
1 Lei Complementar nº 101/2000, também conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal fixa para estados e municípios o valor de 65% e 50% para União. Os gastos com pessoal não podem ultrapassar estes percentuais das receitas correntes líquidas. A partir de estudo conduzido pelo economista Raul Veloso com base nos relatórios resumidos da execução orçamentária de 2015, Beck e Nascimento (2016) relatam que apenas Amazonas (58%), Amapá (58%), Espírito Santo (65%), Rondônia (61%) e Roraima (60%) atenderam ao requisito. Mato Grosso do Sul não apresentou o citado relatório.
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– conformidade e desempenho – precisam caminhar em paralelo, já que a urgência e
a gravidade exigem respostas rápidas e consistentes.
Este artigo apresenta o panorama da gestão de pessoas no âmbito do Governo
Federal, o papel e as atividades desempenhadas pela Controladoria-Geral da União,
notadamente suas ações de auditoria na área de pessoal mediante o uso intensivo de
tecnologia da informação. Ao final, espera-se descrever a atuação do órgão e avaliar
a contribuição para o fomento da eficiência da gestão de pessoas no Poder Executivo
Federal.
2. O QUADRO DE PESSOAL NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL
A partir do senso comum, é muito frequente ouvir que há muitos funcionários
públicos no Brasil. No entanto, o percentual em relação ao total da população é
relativamente baixo se comparado com outros países, conforme demonstra
comparação da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico. O Brasil
tem no setor público cerca de 5% do total da população, quase a metade da média
dos países que compõe a OCDE e cerca de um terço dos países nórdicos. Números
semelhantes na comparação com o total de empregos públicos frente ao total de
empregos. A taxa no Brasil é de 12%, enquanto na citada organização é de 20% e em
alguns países nórdicos supera 30%(OCDE, 2010).
De acordo com o organismo, o total de servidores públicos no governo
brasileiro (federal, estadual e municipal) é bastante limitado em termos de tamanho,
mas está em expansão e torna-se cada vez mais caro OCDE (2010). A preocupação
com o custo se deve a dois aspectos: percentual desta despesa em relação ao
Produto Interno Bruto (12%) e percentual em relação ao conjunto das remunerações
dos trabalhadores na economia brasileira (28%).
No total, existem mais de 11 milhões de servidores e funcionários públicos,
estando distribuídos conforme quadro abaixo. Nota-se que o maior volume encontra-
se no nível municipal (54%). Já a proporção de aposentados e pensionistas é mais
relevante no nível federal (43%) e menor no nível municipal (13%).
5
Quadro 1. Total de servidores e funcionários públicos ativos e inativos
Nível Ativos Aposentados. e Pensionista Total
Federal 1,2 0,9 2,1
Estados e DF 2,6 0,4 3,0
Municípios 3,8 2,1 5,9
Total Geral 7,6 3,4 11,0
Fonte: Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (2011)
Em dezembro/2015 trabalhavam no Executivo 1,08 milhão, sendo 627 mil civis
e 363 mil militares. A esse conjunto juntam-se 17 mil do Ministério Público Federal, 24
mil do Poder Legislativo e 111 do Poder Judiciário (MPOG, 2016). A figura a seguir
apresenta a estrutura dos 24 ministérios, com destaque para os sete maiores em
termos de quantidade de servidores.
Figura 1. Estrutura do Poder Executivo Federal
Fonte: MPOG (2016)
Observação: Os outros ministérios são: 8º - Agricultura, Pecuária e Abastecimento (11 mil); 9º - Meio
Ambiente (9); 10º - Ciência, Tecnologia e Inovação (7); 11º - Transportes (6); 12º - Desenvolvimento
Agrário (6); 13º - Minas e Energia (4); 14º - Cultura (4); 15º - Relações Exteriores (3); 16º -
Desenvolvimento, Indústria e Comércio (3); 17º- Integração (3); 18º - Comunicações (2); 19º -
Desenvolvimento Social (0,9); 20º - Turismo (0,5); 21º - Esporte (0,5);22º - Cidades (0,4); e 23º -
Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos (0,2).
7º -Planejamento
16 mil
1º - Defesa400 mil ativos
10º17º
12º
2º -Educação
270 mil
5º –Fazenda33 mil
6º –Justiça32 mil
8º 9º 4º –Previdência e Trabalho
47 mil
3º -Saúde99 mil
14º 15º
1821º
19º 20º22º
16º
Presidência com 7 Secretarias e órgãos
18 mil
11º
13º
23º
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Fora o conjunto de servidores lotados nos órgãos da Administração Direta,
Autárquica e Fundacional do Executivo Federal e dos outros dois poderes, devem ser
computados como trabalhadores do Setor Público Federal funcionários públicos das
estatais. Conforme levantamento do Departamento de Coordenação e Governança
das Empresas Estatais (DEST) em 2013 existiam 559 mil funcionários públicos nas
empresas estatais, sendo 323 mil em 123 empresas do setor produtivo e 226 em 18
empresas do setor financeiro (DEST, 2014).
Em termos financeiros, a despesa de pessoal em 2015 atingiu a cifra de R$ 256
bilhões2, no entanto, o valor mostra certa estabilidade ao longo dos últimos 15 anos
quando comparada com as receitas da União. O período coincide com a fixação de
limites pela Lei de Responsabilidade Fiscal (50% da receita corrente líquida).
Conforme se nota no Gráfico 1, o valor médio é de 32%, oscilando 27,3 a 38%, já
tendo sido superior ao teto antes da referida lei.
Gráfico 1. Despesa média mensal (em R$)
Fonte: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (2016)
Observação: Inclui o Poder Executivo Federal, MPU, FCDF, militares e os Poderes Legislativo e
Judiciário; o limite de participação das Despesas de Pessoal foi fixado originalmente pela Lei
Complementar 82/1995, pela 96/1999 e finalmente pela 101/2001. Receita Corrente Líquida
corresponde Receita Corrente da União menos as transferências constitucionais e legais, contribuição
2 Neste total estão incluídos o Poder Executivo Federal (Administração direta e Administração Indireta: Autarquias, BACEN, Fundações, Empresas Públicas e Sociedade de Economia Mista), , Militares, MPU, FCDF e os Poderes Legislativo e Judiciário.
54,5
38
27,3
34,238
0
10
20
30
40
50
60
7
PIS/PASEP, os benefícios previdenciários, já deduzidos os valores relativos aos incentivos e às
restituições fiscais.
Ao traçar um comparativo da remuneração média dentro do serviço público
federal, observa-se uma discrepância entre os valores médios do Executivo e os
outros poderes, exceto o Banco Central. O Gráfico 2 apresenta a remuneração média
mensal calculada no total da despesa dividida pelo total de servidores no âmbito de
cada poder (ou segmento específico), o valor médio é de 32%, oscilando 27,3 a 38%,
já tendo sido superior ao teto antes da referida lei.
Gráfico 2. Remuneração média mensal e total de servidores (em R$)
Fonte: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (2016)
Observação: A remuneração média foi calculada com base no total de servidores dentro de cada poder
ou segmento.
A diferença entre as remunerações ocorre sobretudo em função do nível de
escolaridade dos servidores em cada segmento. Este perfil vem se alterando no
período mais recente mesmo na Administração Direta, Autárquica e Fundacional,
detentora dos menores níveis de escolaridade. Neste grupo em 1997, havia 57% de
nível intermediário e 34% de superior. Em 2015, esses valores se alteraram 36% de
nível intermediário e 51% de superior. Tal inversão decorre em grande parte pelo
preenchimento de novas vagas abertas nas universidades e institutos federais de
educação, conforme se percebe no Gráfico 3.
8.194,88
19.408,72
5.829,68
19.085,96
-
5.000
10.000
15.000
20.000
25.000
Adm. Dir, Aut,Fund.
Banco Central EmpresasPúblicas
Sociedades deEco. Mista
Militares MinistérioPúblico da União
Legislativo Judiciário
8
Gráfico 3. Ingressos no segundo o nível de escolaridade
Fonte: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (2016)
Observação: Em 2000, 2001 e 2002 estão sendo consideradas as informações que constam no
cadastro SIAPE. Entretanto, podem serinconsistentes as informações tendo em vista que o
preenchimento do campo "ingresso no serviço público", pelo órgão de origem não era obrigatório.
Outro ponto que merece destaque refere-se às aposentadorias dos servidores.
O Gráfico 4 demonstra os movimentos alternados ao longo do período de 1991 até
hoje. A explicação é que ocorreram no período duas grandes reformas no modelo de
aposentadoria do setor público, em 1998 e 2003, momentos em que grandes volumes
para em seguida voltar ao patamar anterior, como se observa de 1999-2002 e de
2004-2009. De 2010 a 2015, o volume se estabiliza na faixa de 15 mil aposentados
por ano, a quase totalidade na modalidade de aposentadoria integral, visto que
apenas os servidores que ingressaram Emenda Constitucional 20/1998, fazem jus ao
benefício de aposentadoria com renda mensal proporcional.
Gráfico 4–Aposentadorias
Fonte: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (2016)
0
2000
4000
6000
8000
10000
12000
14000
16000
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015
Superior Professor Superior Outros Intermediário (NI) Auxiliar (NA)
0
10.000
20.000
30.000
40.000
50.000
1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015
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Para encerrar a descrição a Administração Pública Federal, o Quadro 2
apresenta o panorama dos cargos, gratificações e funções divididas por gênero,
inclusive com a indicação da idade média. Os homens ocupam 57% dos cargos, sendo
mais elevado no cargo de direção das Instituições Federais de Ensino Superior (63%).
Quadro 2. Cargos, Gratificações e Funções separadas por gênero
Cargos, Funções e Gratificações
Masculino Feminino Total
Quant. Idade Média
Quant. Idade Média
Quant. Idade Média
DAS - Direção de Assessoramento Superior
12.911 46 9.689 44 22.600 45
CD - Cargo de Direção - IFES 5.147 46 2.937 46 8.084 46
FG - Função Gratificada - IFES 13.729 43 13.407 43 27.136 43
FGR - Função Gratificada - Lei 8.216/91
10.119 48 7.369 48 17.488 48
FUC - Função Comissionada de Coord. Curso
5.549 43 3.534 43 9.083 43
Outros(as) cargos, gratificações e funções
9.588 47 6.353 42 15.941 46
Total 57.043 45 43.289 45 100.332 45
Fonte: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (2016)
Observação: a lista completa possui 41 cargos, gratificações e funções, das quais foram destacadas
as cinco maiores, sendo as 36 restantes apresentadas na última linha.
A participação das mulheres nos cargos de direção (43%) é um pouco inferior
ao percentual de 46,2%, que representa a proporção do sexo feminino no total 578
mil servidores ativos no âmbito do Executivo. Ao se comparar com a situação das 500
maiores empresas brasileiras em pesquisa conduzida pelo Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID) 3 , os números são até positivos. De acordo com o
levantamento, as mulheres representam 35% do nível operacional, 38% entre as
supervisoras, 31% das gerências, 14% do quadro executivo e 11% dos conselhos
(VALOR, 2016).
3 A pesquisa foi enviada para as 500 maiores empresas em faturamento, contudo apenas 117 responderam. O estudo também abordou a questão da raça, que releva um resultado ainda mais desequilibrado. Apesar de representar a maioria da população, os afrodescendentes são apenas 36% do nível operacional, 26% dos supervisores, 6% da gerência e menos de 5% dos executivos e do conselho de administração (VALOR, 2016).
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3. ATUAÇÃO DA CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO
A Controladoria-Geral da União, órgão criado em 2003 com a atribuição assistir
direta e imediatamente ao Presidente da República, tem como uma de suas funções
precípuas a condução de auditorias de avaliação da execução de programas de
governo e da gestão dos administradores. Dentre outros trabalhos, a auditoria da
gestão de pessoas se destaca como uma eficaz ferramenta de avaliação do
desempenho dos gestores federais e das organizações por eles administradas.
Em uma análise retrospectiva, a CGU amplia as funções dos seis órgãos de
controle interno que a antecederam4. O Sistema de Controle Interno foi instituído na
Constituição de 1967, que segregou as atividades do controle externo, que seria
exercido pelo Tribunal de Contas da União, do controle interno, que ficaria incumbido
de assegurar regularidade à realização da receita e da despesa. Após a Constituição
de 1988, o Sistema de Controle Interno passa por grandes transformações, seja do
ponto de vista organizacional com a concentração de poder em uma organização, seja
do ponto de vista metodológico com a especialização em avaliação de programas
(BALBE, 2013)
O trabalho de auditoria dos atos e fatos relacionados à gestão de pessoal já faz
parte da tradição do órgão, bem como dos órgãos que o antecederam. Junto com o
desenvolvimento dos sistemas estruturantes na segunda metade da década de 1980
e início da década de 1990, se consolidou a atividade de análise atos de pessoal,
mediante a verificação da consistência das admissões, das aposentadorias e da
concessão de pensões de servidores do Poder Executivo Federal. A atividade ocorre,
4O primeiro órgão de Controle Interno foi o próprio Ministério da Fazenda, criado no início do século XIX. A segunda organização foi a Contadoria-Geral da República – CRG, unidade responsável por cuidar da contabilidade da União e zelar pelo cumprimento da legislação sobre contabilidade pública no período de 1921 até 1967. A terceira estrutura organizacional – Inspetoria-Geral de Finanças – funcionou de 1967 a 1979, momento em que o país vivenciou forte desenvolvimento econômico e elevada restrição da liberdade individual. O modelo organizacional Secretaria Central de Controle Interno – Secin, teve vida curta, de 1979 a 1986. A quinta organização “STN/Ciset” vigorou de 1986 a 1994, período de consolidação democrática e mudanças institucionais. Em 1994, foi criada a Secretaria Federal de Controle, ainda dentro do Ministério da Fazenda mas com maior independência em relação aos órgãos controlados (BALBE, 2013).
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desde o início, com o propósito de análise prévia do Controle Interno antes de os
processos seguirem ao Tribunal de Contas da União5.
Fonseca et al. (2013) revela que no bojo das reformas empreendidas nos
últimos 20 anos, a atividade de gestão de recursos humanos foi um dos alvos da
modernização. Em 2005 e 2006, foram editados dois decretos que trataram deste
movimento. O Decreto 5.378 instituiu Programa Nacional de Gestão Pública
eDesburocratização (Gespública) e o Decreto no 5.707, que instaurou a Política
Nacional de Desenvolvimento de Pessoal (PNDP), com a introdução da gestão por
competências como instrumento de desenvolvimento contínuo dos servidores
públicos e alinhamento de suas competências aos objetivos organizacionais.
Os citados decretos buscam aprimorar o funcionamento da máquina pública
estruturada após a Constituição de 1988 e sobretudo guiada a partir de 1990 pelo
novo regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das
fundações públicas federais, fixado pela Lei nº 8.112/1990. Até então, a Lei nº
1.711/1952 regulamentava as atividades de provimento, direitos e vantagens e regime
disciplinar dos funcionários públicos civis da União6.
É também do período a criação do Sistema Integrado de Administração de
Recursos Humanos (SIAPE)7. Em 1989, como parte da política de maior controle
sobre os gastos, foi tomada a decisão de centralizar o processamento das diversas
folhas de pagamento do Poder Executivo Federal. Tais mudanças, implementadas ao
longo da década de 1990 promoveram a centralização normativa da gestão pública.
Conforme registra Bresser-Pereira (1998), contraditoriamente com seu espírito
burocráticoracional-legal, a Constituição de 1988 permitiu que uma série de privilégios
5 Cabe ao TCU apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal (Art. 71, III, da Constituição). Em 1991, o Tribunal regulamentou a matéria por meio da Resolução TCU 255/1991, inclusive com a fixação da competência do órgão de controle interno para verificar a exatidão e suficiência dos dados e emissão parecer sucinto e conclusivo sobre a legalidade do ato. 6A citada lei faz parte do modelo burocrático de administração pública, que foi introduzido no País nos anos 30, no governo Vargas, com a criação do Departamento Administrativo do Serviço Público – DASP, criado pelo Decreto-lei n.º 579, de 30/7/1939). 7 O Siape foi instituído pelo art. 1º, do Decreto nº 99.328, de 19 de junho de 1990 com, dentre outras finalidades, o objetivo de dotar o Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal - SIPEC, criado pelo Decreto n° 67.326, de 5 de outubro de 1970, de instrumento de modernização da administração de recursos humanos e de viabilização da integração sistêmica nessa área;
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fossem consolidados ou criados. Como exemplo, o autor anota: “regime jurídico único”
para todos os servidores, independente da função exercida; estabilidade rígida.
Ao analisar a gestão de recursos humanos no Brasil, a OCDE (2010) verificou
que as reformas resultaram em mudanças fragmentadas e incompletas, com pouca
direção estratégica e sucessivas políticas descontinuadas no que se refere ao número
de servidores e suas remunerações.
Como estratégia para enfrentar a crescente complexidade, o volume e a
escassez de recursos humanos no órgão de auditoria e controle interno, no início dos
anos 2000foram desenvolvidas trilhas de auditoria por meio do cruzamento de dados
computacionais da folha de pagamento. Nesta época, foram criados os primeiros
mecanismos de trilhas de auditoria de pessoal com o objetivo de identificar a repetição
de falhas e buscar soluções capazes de impedir tais inconsistências voltassem a
ocorrer.
4. USO DA TECNOLOGIA PARA APERFEIÇOAR A GESTÃO DE PESSOAS
A gestão de pessoas cuida do ativo mais importante do serviço público. O bom
desempenho das mais diversas atividades e a execução dos programas de governo
depende enormemente da seleção e do desenvolvimento dos recursos humanos.
Desse modo, o esforço de avaliação da gestão de pessoas deve ser tratado como
uma prioridade dentro das organizações públicas, e dessa maneira, com muita
atenção pelos órgãos de auditoria e controle interno.
Atualmente na Controladoria-Geral da União, a atividade de auditoria da área
de gestão de pessoas pode ser dividida em dois grupos: Análise de atos de pessoal;
e Cruzamento de dados e desenvolvimento de trilhas de auditoria8. Em ambos os
grupos ocorre o uso intensivo de tecnologia da informação, mediante o cruzamento
8 Nos dois grupos, havendo fatos relevantes que impactam a gestão das unidades, cabe a unidade responsável pela auditoria consignar tais fatos no relatório de Auditoria Anual de Contas, ou mesmo promover uma Auditoria específica em algum ponto da gestão de pessoas, cuja técnica de cruzamento de dados não seja suficiente para atingir o objetivo de avaliar órgãos e para propor soluções e aprimoramentos da gestão pública.
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de dados e a disponibilização aos gestores de informações tempestivas por meio de
sistema informatizado na internet.
O primeiro e mais tradicional grupo de atividade é a Análise de Atos de
Admissão, Aposentadoria e Pensão. O trabalho teve início nos anos 90 logo após a
edição da Resolução do Tribunal de Contas da União n º 255/1991, que fixou
competência para o órgão de controle interno para verificar a exatidão e suficiência
dos dados e emissão parecer sucinto e conclusivo sobre a legalidade do ato.
Originalmente, o constituinte de 1988 fixou a atribuição ao TCU para apreciar, para
fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal (Art. 71, III, da
Constituição).
O Quadro 3 discrimina os três tipos deatos analisados pela CGU. Os atos de
aposentadoria representam aproximadamente 20% do total, com média de 18 mil nos
últimos oito anos. Já atos de pensão respondem por menos de 10%, com média de 9
mil atos. No que se refere às admissões, responsável pelos 70% restantes têm média
de 98 mil ou 67 mil se descontado o ano de 2011, que computou acréscimo
excepcional da contratação temporária para recenseadores do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE).
Quadro 3. Quantitativo de atos de pessoal analisados pela CGU
Tipo de Ato 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015
Aposentadoria 14.510 18.862 20.193 24.264 23.618 18.003 15.122 16.525
Pensão 9.975 10.442 10.536 10.303 10.517 8.709 7.479 6.018
Admissão 72.515 72.230 68.744 317.161 71.041 71.812 61.154 53.806
Total 97.000 101.534 99.473 351.728 105.176 98.524 83.755 76.349
Fonte: Controladoria-Geral da União (2016a)
Em razão das limitações operacionais para a realização da atividade de análise
de atos, a CGU vem buscando maneiras de acelerar o processo de análise. Para
tanto, a CGU vem adotando medidas para simplificar e agilizar a análise desde
conjunto de quase 100 mil processos por ano.
Em 2014, foi editada Portaria CGU nº 1.255/2014, de 6/6/2014, que institui uma
nova abordagem para a atuação, que passou a permitir análise seletiva para emissão
do parecer de Controle Interno dos atos de aposentadorias e pensões sujeitos a
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registro pelo TCU. Desde então, foi possível duplicar a produtividade da análise
promovida pelos técnicos da CGU. A alavanca utilizada foi o cruzamento de dados,
que permite o apontamento de quais campos dos sistemas teriam problema de
consistências e precisam ser corrigidos, dispensando de análise detalhada os outros
campos para os quais não houve indicativo de erro.
O segundo grupo de atividade é o Desenvolvimento e Disponibilização das
Trilhas de Auditoria de Pessoal. O trabalho se aprimorou mais consistentemente a
partir de 2009, contudo, somente em 2014 foi disponibilizado o Sistema de Trilha de
Auditoria de Pessoal (STA) em plataforma web. O mecanismo viabilizou o diálogo
mais célere e eficaz entre Unidades Pagadoras e o Sistema de Controle Interno.
Conforme relatório publicado em 2015, a CGU, por meio de cruzamento de
dados nos exercício de 2010 a 2014, foram constatadas mais de 330 mil
inconsistências em um conjunto de 72 trilhas de auditoria. Contudo, conforme Quadro
4, parte das inconsistências apontadas não voltaram a ocorrer, indicando a correção
das falhas anteriormente constatadas. A diminuição entre os anos 2012 e 2014 foi de
quase 50%.
Quadro 4. Evolução das inconsistências por exercício
2010 2011 2012 2014
Inconsistências 95.900 77.928 102.293 54.284
Valores 39,9 milhões 26,2 milhões 375,2 milhões 23,7 milhões
Quantidade de Trilhas 35 35 72 72
Fonte: Controladoria-Geral da União (2015)
Em resposta aos apontamentos da CGU, o Ministério do Planejamento, como
órgão central do Sistema de Pessoal Civil da Administração Pública, adotou diversas
providências visando à melhoria do processo de trabalho, do que é possível destacar:
criação de um “Novo modelo de gestão da folha de pagamento”, que incorporou ações
de prevenção e inteligência, modernizando e automatizando os processos,
proporcionando maior confiabilidade no processamento da folha; implementação do
Projeto de Melhoria da Qualidade dos Gastos da Folha de Pagamento com economia
efetiva de R$ 548,7 milhões anuais; implantação Trilhas de Auditoria diretamente no
Siape em rubricas que representam 80% das despesas com pessoal; utilização de
15
cruzamentos de dados do SIAPE com a base do SISOBI, esse batimento evitou um
gasto indevido da ordem de R$ 234,7 milhões (CGU, 2015).
O Gráfico 5 a seguir apresenta o total de inconsistências das trilhas de auditoria
de pessoal nos anos de 2014 e 2015, bem como as respectivas respostas dos
gestores de recursos humanos e o parecer inserido pelo órgão de controle interno.
Mais uma vez, fica demonstrado que, ao se utilizar os mesmos parâmetros (trilhas
idênticas e competências distintas), os valores se reduzem, dando um indicativo que
os gestores de recursos humanos adotaram as providências de correção dos
problemas apontados pela CGU.
Gráfico 5– Inconsistências das Trilhas de Auditoria de Pessoal
Fonte: Controladoria-Geral da União(2016b)
O cruzamento de dados do SIAPE e outros sistemas estruturantes do Governo
Federal ocorre mediante o uso intensivo de Tecnologia da Informação e
Comunicação. Sem os modernos meios tecnológicos, a atividade de avaliação da
consistência da folha de pagamento de mais de 1 milhão de servidores ativos e
aposentados seria praticamente inviável. No entanto, cabe ponderar que a estratégia
não se resume a efetuar os cruzamentos progressivamente, até porque, com os dados
crescendo em progressão geométrica9, não há limites para o desenvolvimento de
hipóteses e a execução de testes para aferir a regularidade dos pagamentos. A
tecnologia deve ser encarrada como uma aliada na“cruzada” pela maior eficiência na
gestão de pessoas.
9 De acordo com Calicchio e Dias (2016), a cada dois dias, cria-se mais conteúdo e dados do que todo o intervalo entre o ano de 1100 e 2003.
- 10.000 20.000 30.000 40.000 50.000 60.000 70.000 80.000
Inconsitências Encaminhadas
Inconsistências justificadas
Inconsistências analisadas
76.065
72.879
65.366
15.964
14.772
11.396
2015
2014
16
Nesse sentido, as trilhas de auditoria de pessoal buscam apontar os problemas
e agilizar a adoção das correções, de modo a propiciar maior tempo para outros
aspectos da gestão de pessoal que não apenas a legalidade e conformidade dos
pagamentos.
5. CONCLUSÃO
Atualmente, quadro de pessoal dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário
da União é de aproximadamente 1,2 milhão de servidores. A este conjunto devem ser
computados também os servidores aposentados e os pensionistas (977 mil). O
contingente completo responde por uma despesa anual de aproximadamente R$ 256
bilhões. O valor está abaixo o limite de 50% das receitas corrente líquida, estabelecido
pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
No âmbito do Executivo, área de atribuição da Controladoria-Geral da União, o
quadro é de aproximadamente 600 mil pessoas, distribuídas em 23 ministérios e
outros 7orgãos e secretarias da Presidência da República. Conforme levantamento
elaborado pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (2016), 36% da força
de trabalho no Executivo Federal possui nível intermediário de grau de escolaridade
e 51% tem nível superior. Cerca de 53% da força de trabalho é formada por servidores
do sexo masculino.
Diante deste quadro, a Controladoria-Geral da União vem realizando
regularmente auditorias sobre a área de gestão de pessoas, mais recentemente
inclusive com o uso intensivo da tecnologia da informação. A estratégia do uso eficaz
de ferramentas de TI visa ampliar a cobertura dos gastos, no entanto, não pode ser
vista como um fim em si mesma. A Controladoria-Geral da União busca, na verdade,
agilizar a solução dos problemas de legalidade e conformidade da folha de pagamento
e assim encontrar espaço e tempo para desenvolver outras tarefas na área da gestão
de pessoas, como por exemplo a avaliação da governança. O trabalho objetiva, por
meio da identificação de pontos vulneráveis, a proposição de melhorias na área. Como
destaque, para alguns componentes como: liderança da alta administração,
alinhamento estratégico e gestão do conhecimento.
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REFERÊNCIAS
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Forum, Belo Horizonte.
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VALOR (2016), Mulheres e negros são minoria em companhias no país, 9 de maio
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AUTORIA
Ronald da Silva Balbe - Controladoria-Geral da União,
Endereço eletrônico: [email protected];
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Henrique César Sisterolli Kamchen - Controladoria-Geral da União
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