abordagem do doente neurológico e localização de lesões neurológicas na espécie canina
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7/25/2019 Abordagem Do Doente Neurolgico e Localizao de Leses Neurolgicas Na Espcie Canina
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UNIVERSIDADE TCNICA DE LISBOA
Faculdade de Medicina Veterinria
ABORDAGEM AO PACIENTE NEUROLGICO E LOCALIZAO DE LESESNEUROLGICAS NA ESPCIE CANINA
ANA MARIA MEIRELES GRADIL
ORIENTADORDoutor Antnio Jos de Almeida Ferreira
2009LISBOA
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UNIVERSIDADE TCNICA DE LISBOA
Faculdade de Medicina Veterinria
ABORDAGEM AO PACIENTE NEUROLGICO E LOCALIZAO DE LESESNEUROLGICAS NA ESPCIE CANINA
ANA MARIA MEIRELES GRADIL
DISSERTAO DE MESTRADO INTEGRADO EM MEDICINA VETERINRIA
ORIENTADORDoutor Antnio Jos de Almeida Ferreira
2009
LISBOA
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DEDICATRIA
minha me, Ester Maria, e s minhas irms, Magda e Ctia, pela fora, apoio, confiana e
motivao constantes que me do. Agradeo-lhes os modelos de trabalho e fora de
vontade que so para mim em mais uma etapa importante, que aqui termina. Dedicotambm esta dissertao aos meus avs Josefa e Joaquim pelo apoio, confiana e
acompanhamento permanentes ao longo de mais este percurso, com a esperana de que o
faam por muito mais tempo. Ana Marta Brito e Ana Teresa Peres, pelo apoio que me
prestaram durante o estgio escolar e pela amizade incondicional nestes ltimos anos.
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AGRADECIMENTOS
Agradeo ao meu orientador e professor, Professor Doutor Antnio Ferreira pelo
acompanhamento prestado e pelo seu voto de confiana na escolha do meu tema, apesar
da dificuldade na abordagem deste.
Agradeo Doutora Querine Stassen, mdica veterinria especialista em Medicina Interna
na Universidade de Medicina Veterinria de Utrecht-Holanda, pelo seu apoio e ajuda na
escolha do meu tema e pelo seu profissionalismo.
Agradeo Doutora Henna Heikkila, mdica veterinria especialista em Medicina Interna na
Universidade de Medicina Veterinria de Helsnquia-Finlndia, pela sua capacidade
pedaggica, qualidade profissional e pela sua orientao e apoio constantes durante a
minha estadia em Helsnquia.
Agradeo Doutora Marjatta Snellman, mdica veterinria especialista em Diagnstico de
Imagem na Universidade de Medicina Veterinria de Helsnquia-Finlndia, pela tentativa
inesperada em me inserir no meio hospitalar e num meio cultural e profissional diferentes do
meu.
Agradeo ao meu pai, Carlos Gradil, pela sua tentativa constante de me integrar na
realidade que me espera e pela sua disponibilidade e ajuda na concretizao dos meus
estgios curriculares.
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RESUMO
ABORDAGEM DO PACIENTE NEUROLGICO E LOCALIZAO DE LESESNEUROLGICAS NA ESPCIE CANINA
A integridade do sistema nervoso pode ser avaliada atravs de um exame neurolgico
completo, realizado com o intuito de averiguar se o sistema nervoso se encontra afectado
num animal com um quadro sintomatolgico suspeito. O contributo do exame neurolgico
completo na deduo fivel da localizao de leses neurolgicas em doentes caninos
possvel tendo como base o conhecimento da anatomia do sistema nervoso e da sua
funcionalidade, bem como conjunto de sinais clnicos apresentados e a sua resposta
aos testes realizados de modo sistemtico. sumarizada a informao necessria para
a elaborao do exame neurolgico e sua interpretao crtica, tornando possvel a
elaborao de um diagnstico neuro-anatmico e tratamento adequados. O exame
neurolgico compreende os seguintes passos: avaliao do estado de conscincia e
comportamento, atitude e postura, tnus e massa musculares, reflexos espinhais,
nervos cranianos, palpao, percusso e resposta do doente a estmulo doloroso. O
Sistema Nervoso Central constitudo pelo crebro e medula espinhal e o Sistema
Nervoso Perifrico pelos sistemas aferentes somtico, visceral e proprioceptivo e
eferentes somtico e visceral. A apresentao e discusso dos casos clnicos daespcie canina acompanhados e o diagnstico neuro-anatmico realizado so feitos
com base no conhecimento adquirido, no exame neurolgico e nos exames
complementares de diagnstico.
PALAVRAS-CHAVE: sistema nervoso, exame neurolgico, diagnstico neuro-anatmico,
espcie canina.
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ABSTRACT
APPROACH TO THE NEUROLOGICAL PATIENT AND NEUROLOGIC LESIONLOCALIZATION IN THE DOG
The integrity of the nervous system can be evaluated through a systematic approach and
complete neurological examination, thus confirming the presence of a lesion in a patient with
concurrent clinical signs. A thorough neurological examination in the dog and its value in
determining the presence of a lesion and its location is made based on the anatomy of the
nervous system, the clinical picture of the patient and the examination results. The
knowledge necessary to perform the neurological examination and to correctly interpret it is
presented in this monography, aiding the reader to make a valuable diagnosis for a proper
treatment. The neurological examination consists of the following steps: evaluation of
behavior and level of consciousness, attitude and posture, tone and muscle mass, spinal
reflexes, cranial nerves, palpation, percussion and the patients perception to pain. The
Central Nervous System is composed of the brain and spinal cord and the Peripheral
Nervous System is divided into functional systems: somatic afferent, visceral afferent and
proprioceptive, somatic and visceral efferent. A presentation and discussion of neurologic
cases and subsequent neurolocalization of lesions is made based on the knowledge
previously acquired and on the neurological and ancillary examinations performed.
KEY-WORDS: nervous system, neurological examination, neurolocalization, dog.
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NDICE
OBJECTIVOS DO ESTGIO CURRICULAR .................................................................................................. 1
MONOGRAFIA: ABORDAGEM DO DOENTE NEUROLGICO E LOCALIZAO DE LESESNEUROLGICAS NA ESPCIE CANINA ............................................................................................. 1
1.INTRODUO .................................................................................................................................... 11.1. Escolha do tema....................................................................................................................... 11.2. Objectivos................................................................................................................................. 11.3. Locais de Estgio ..................................................................................................................... 2
2.REVISO BIBLIOGRFICA .................................................................................................................. 42.1. O Exame Neurolgico .................................................................................................................. 5
2.1.1. Estado de Conscincia e Comportamento............................................................................ 82.1.2. Atitude e Postura................................................................................................................... 8
Reaces posturais: .................................................................................................................... 92.1.3. Tnus e massa musculares ................................................................................................ 122.1.4. Reflexos espinhais .............................................................................................................. 122.1.5. Nervos cranianos ................................................................................................................ 132.1.6. Palpao e percusso......................................................................................................... 142.1.7. Percepo da dor e possvel deduo do prognstico ....................................................... 14
2.2. Diagnstico neuro-anatmico: Onde a leso?........................................................................ 162.2.1. Organizao Anatmica e Funcional do Sistema Nervoso Central:....................................... 16
Sistema de Neurnio Motor Central (UMN) .................................................................................. 18A. Crebro ......................................................................................................................................... 19
1. Prosencfalo:............................................................................................................................. 192. Cerebelo .................................................................................................................................... 223. Tronco Cerebral......................................................................................................................... 244. Sistema Vestibular..................................................................................................................... 26i) Sndrome Vestibular Central (SVC): .......................................................................................... 47
ii) Sndrome Vestibular Perifrico (SVP): ...................................................................................... 48iii) Alteraes vestibulares paradoxais: ......................................................................................... 48
B. Medula Espinhal ........................................................................................................................... 252.2.2. Organizao do Sistema Nervoso Perifrico (SNP) ............................................................... 33
A. Sistema Aferente Somtico Geral (ASG) ................................................................................. 35CN V (Nervo Trigmio): ............................................................................................................. 35
B. Sistema Aferente Somtico Especial (ASE): Sistemas Visual e Auditivo ................................ 351. Sistema Visual: Vias Centrais ................................................................................................... 36
1.1. Nervo ptico (CN II): .......................................................................................................... 361.2. Quiasma e Feixe pticos:.................................................................................................. 361.3. Crtex Visual: ..................................................................................................................... 37
2. Sistema Auditivo........................................................................................................................ 41C. Sistema Aferente Visceral Geral............................................................................................... 41
1. CN VII (Nervo Facial): ........................................................................................................... 412. CN IX (Nervo Glossofarngeo): ............................................................................................. 423. CN X (Nervo Vago): .............................................................................................................. 424. CN XI (Nervo Espinhal Acessrio): ....................................................................................... 42
D. Sistema Aferente Visceral Especial (AVE): Sistemas Olfactivo e Gustativo............................ 431. Sistema Olfactivo................................................................................................................... 432. Sistema Gustativo ................................................................................................................. 44
E. Sistema Aferente Proprioceptivo Geral (PG)............................................................................ 44F. Sistema Proprioceptivo Especial (SP) ...................................................................................... 45
G. Sistema Eferente Somtico Geral (ESG) ................................................................................. 491. Nervos Cranianos:..................................................................................................................... 51i. CN III (Nervo Oculomotor): ..................................................................................................... 50
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ii. CN IV (Nervo Troclear): ......................................................................................................... 50iii. CN VI (Nervo Abdutor): ......................................................................................................... 50iv. CN XI (Nervo Espinhal Acessrio): ....................................................................................... 52v. CN XII (Nervo Hipoglosso):.................................................................................................... 52
2. Nervos espinhais e Reflexos Espinhais .................................................................................... 522.1. Reflexos dos Membros Plvicos e Perineal ........................................................................... 53
i. Reflexo de flexo: ...................................................................................................................54ii. Reflexo perineal: ....................................................................................................................54
2.2. Reflexos dos Membros Torcicos e Panicular ....................................................................... 54i. Reflexo de flexo: ...................................................................................................................55ii. Reflexo Panicular: ..................................................................................................................55
H. Sistema Eferente Visceral Geral (EVG): Divises Simptica e Parassimptica ...................... 561. Inervao do globo ocular pelo Sistema Nervoso Autnomo: ..............................................562. Inervao pupilar: ..................................................................................................................563. Controlo da mico:............................................................................................................... 57
3.MATERIAL E MTODOS .......................................................................................................................57i. Tipo de estudo. ...........................................................................................................................58
ii. Populao-alvo ..........................................................................................................................58iii. Amostra .....................................................................................................................................58iv. Critrios de incluso..................................................................................................................58v. Critrios de excluso .................................................................................................................58vi. Processo de colheita de dados................................................................................................. 58viii. Anlise qualitativa dos dados obtidos ..................................................................................... 58
4.RESULTADOS:CASOS CLNICOS ........................................................................................................ 58CREBRO: ....................................................................................................................................60
Caso 1........................................................................................................................................ 60Caso 2........................................................................................................................................ 61
Caso 3........................................................................................................................................ 62Caso 4........................................................................................................................................ 62CEREBELO: ..................................................................................................................................63
Caso 5........................................................................................................................................ 63SISTEMA VESTIBULAR:............................................................................................................... 73
Caso 6........................................................................................................................................ 73Caso 7........................................................................................................................................ 74
COLUNA........................................................................................................................................ 64Cervical Cranial (C1-C5):............................................................................................................... 64
Caso 8........................................................................................................................................ 64Cervical Caudal (C6-T2): ............................................................................................................... 65
Caso 9........................................................................................................................................ 65Caso 10...................................................................................................................................... 66Caso 11...................................................................................................................................... 67
Toraco-lombar (T3-L3)................................................................................................................... 70Caso 12...................................................................................................................................... 70Caso 13...................................................................................................................................... 72
Lombossagrada (S1-S3)................................................................................................................ 72Outras Localizaes: .....................................................................................................................73
Caso 14:..................................................................................................................................... 73
5. Discusso......................................................................................................................................... 75Caso 1........................................................................................................................................ 75
Caso 2........................................................................................................................................ 78Caso 3........................................................................................................................................ 79Caso 4........................................................................................................................................ 80
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Caso 5 ....................................................................................................................................... 82Caso 6 ....................................................................................................................................... 90Caso 7 ....................................................................................................................................... 91Caso 8 ....................................................................................................................................... 83Caso 9 ....................................................................................................................................... 85Caso 10 ..................................................................................................................................... 86Caso 11 ..................................................................................................................................... 87Caso 12 ..................................................................................................................................... 88Caso 13 ..................................................................................................................................... 88Caso 14 ..................................................................................................................................... 90
6.CONCLUSES..................................................................................................................................... 93
NDICE DE FIGURAS
Figura 1: Casustica conjunta dos estgios realizados em Helsnquia e Utrecht....................3
Figura 2: Raas observadas mais relevantes ........................................................................ 4Figura 3: Formulrio do exame neurolgico (adaptado de Rijnberk & de Vries, 1995) ........... 6Figura 4: Classificao de leses do sistema nervoso central por zonas............................. 33Figura 5: Etiologias das patologias neurolgicas observadas durante os estgios em Utrecht,
Helsnquia e Lisboa (Hospital escolar da FMV, UTL).................................................... 59Figura 6: Raas de animais observadas com alteraes neurolgicas ................................ 59Figura 7: Ressonncia Magntica (Imagem T1): leso do crtex cerebral, lado direito........ 61Figura 8: Ressonncia Magntica (Imagem T1 com contraste de gadolnio): edema do crtex
cerebral, lado esquerdo. ...............................................................................................61Figura 9: Doente com hidrocefalia congnita e braquignatismo ........................................... 61
NDICE DE ILUSTRAES
Ilustrao 1: Organizao funcional dos pares cranianos no Tronco Cerebral (de Lahunta &Glass, 2009)23
Ilustrao 2: Organizao segmentar do Crebro (Lorenz & Kornegay,2004)........26
Ilustrao 3: Relao entre vrtebras e segmentos espinhais correspondentes (Fossum,2007)...40
Ilustrao 4: Cauda Equina (Nelson & Couto, 2003)........42Ilustrao 5: Arco reflexo do LMN. Feixes sensoriais e motores (adaptado de Sharp &
Wheeler, 2005)......43Ilustrao 6: Vias visuais centrais (adaptado de de Lahunta & Glass, 2009).......51Ilustrao 7: Vias do reflexo pupilar luz. A: msculo constritor da pupila, B: msculo
dilatador da pupila (adaptado de de Lahunta & Glass, 2009).54Ilustrao 8: A, Anatomia funcional dos msculos extra-oculares (adaptado de de Lahunta &
Glass, 2009)...61Ilustrao 9: Corte transversal da medula espinhal (de Sharp & Wheeler,
2005)...63Ilustrao 10: Divises do disco intervertebral (de Sharp & Wheeler, 2005)....84Ilustrao 11: Classificao de patologia discal(adaptado de Lorenz & Kornegay,
2004)...95
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NDICE DE TABELAS
Tabela 1: Palestras assistidas durante os estgios realizados em Helsnquia e Utrecht ........ 4Tabela 2: Sinais clnicos de patologia vestibular (adaptado de Wheeler, 2004) ...................49Tabela 3: Localizao relativa entre segmentos vertebrais e segmentos espinhais
correspondentes (adaptado de Bagley, 2005)...............................................................27
Tabela 4: Tipo de sinais motores consoante localizao da leso na medula espinhal(adaptado de Sharp & Wheeler, 2005)..........................................................................30Tabela 5: Classificao dos Sistemas funcionais do SNP (Adaptada de de Lahunta & Glass,
2009) ............................................................................................................................34Tabela 6: Sinais clnicos de leses do Sistema Visual (de de Lahunta & Glass, 2009). ....... 40
LISTA DE ABREVIATURAS
ARAS: Sistema Reticular Ascendente (Ascending Reticular Activating System)
BAER: Resposta auditiva evocada do tronco cerebral (Brainstem auditory-evoked response)
CKCS: Cavalier King Charles Spaniel
CN: Nervo craniano (Cranial nerve)
DAD: Doena articular degenerativa
FMV: Faculdade de Medicina Veterinria da Universidade Tcnica de Lisboa
FPC: Fragmentao do processo coronide
LCR: Lquido Cefalorraquidiano
LMN: Neurnio motor perifrico/Motoneurnio inferior (Lower Motor Neuron)
NUPA: No unio do processo ancneo
OCD: Osteocondrite dissecante
OD: Olho direito
OE: Olho esquerdo
ODH: Osteodistrofia hipertrfica
SNC: Sistema Nervoso Central
SNP: Sistema Nervoso Perifrico
TAC: Tomografia Axial Computorizada
UMN: Neurnio motor central/Motoneurnio superior (Upper Motor Neuron)
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O estgio curricular tem como objectivos proporcionar ao aluno finalista a oportunidade de
aplicar, integrar e consolidar os conhecimentos tericos e tcnicos adquiridos durante os 5
anos de formao. Esta etapa fundamental permite colocar o estudante em contacto com os
desafios, exigncias e a realidade actuais do mdico veterinrio, facilitando assim a suainsero no mercado de trabalho.
:
1.
1.1.
A escolha do tema desenvolvido surgiu no decurso de um estgio intra-curricular de trs
semanas efectuado em Agosto de 2007 na Universidade de Tufts, Massachussets-EUA.
Passei 2 das 3 semanas no servio de Neurologia do hospital escolar da referida faculdade.
Durante este perodo tive a oportunidade de conhecer uma realidade universitria
organizacional e estruturalmente diferentes da Faculdade de Medicina Veterinria da
Universidade Tcnica de Lisboa, onde me encontro inserida. Neste estgio pude
compreender a importncia da abordagem inicial ao doente e da realizao do exame fsico
e neurolgico sistematizados. A subsequente realizao do estgio curricular nos hospitais
das faculdades de Medicina Veterinria de Utrecht-Holanda e de Medicina Veterinria de
Helsnquia-Finlndia deu-me novamente a oportunidade de conhecer duas realidades e
modos de trabalhar diferentes entre si e distintos da realidade portuguesa. Nas consultas de
Neurologia a que assisti durante os estgios, pude constatar que a realizao sistematizada
do exame neurolgico permite a identificao da localizao da leso e oe estabelecimento
de medidas de diagnstico, de tratamento e ndice de prognstico adequados.
1.2.
Esta dissertao tem como objectivo principal enfatizar o contributo do exame neurolgico
completo na deduo fivel da localizao de leses neurolgicas em doentes caninos. O
sistema nervoso tem como capacidades a recepo, a conduo, a transmisso e a
integrao de informao. A integridade deste pode ser avaliada de um modo directo, pela
medio da actividade elctrica associada ao mesmo e de modo indirecto, pela actividade e
resposta motoras a estmulos variados (Rijnberk & de Vries, 1995). O exame neurolgico
completo um meio de avaliao indirecto, realizado com o intuito de averiguar se osistema nervoso se encontra afectado num animal com um quadro sintomatolgico suspeito
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(Rijnberk & de Vries, 1995; International Veterinary Information Service [IVIS], 2001). O
desafio consiste na compreenso dos vrios passos constituintes do exame neurolgico e
da importncia deste para a obteno de um diagnstico neuro-anatmico correcto. Esta
possvel tendo o conhecimento da anatomia do sistema nervoso e particularidades da
espcie canina, conjunto de sinais clnicos por eles apresentados e a sua resposta aos
testes realizados. Pretende-se assim:
1. Demonstrar a importncia do exame neurolgico como instrumento para a distino entre
doentes com patologia neurolgica e doentes com patologia de outros sistemas orgnicos;
2. Caracterizar os sinais clnicos indicativos de patologia neurolgica, assim como os testes
existentes mais adequados para os identificar;
3. Demonstrar a associao slida existente entre o conjunto de sinais neurolgicos
manifestados pelo doente e a respectiva localizao da leso neurolgica presente, atravs
da bibliografia consultada;
4. Proceder a uma anlise qualitativa dos sinais neurolgicos de cada doente identificados
no exame neurolgico para deduzir correctamente a localizao da leso neurolgica nos
casos clnicos observados.
5. Mostrar a existncia de indicadores reveladores de prognstico obtidos durante a
realizao do exame neurolgico completo.
1.4.
Decidi fazer o meu estgio curricular fora de Portugal por entender que diferentes sistemaseducativos e diferentes maneiras de trabalhar so uma fonte importante de aprendizagem
profissional e pessoal. A meu ver, foi um esforo acrescido presso de aprendermos e
lidarmos com a futura responsabilidade que a nossa profisso acarreta, com todos os
desafios e incertezas que nos esperam. Decidi realizar parte do estgio no hospital escolar
de animais de companhia de Utrecht-Holanda, por 6 semanas (o tempo mximo permitido) e
o estgio oficial em animais de companhia em Helsnquia-Finlndia, por um perodo de 3
meses (figura 1). Foi um desafio integrar-me em sistemas to diferentes do nosso, com uma
Lngua e Cultura prprias. Esta escolha levou-me a uma interiorizao de perspectivasdiferentes das minhas e a uma humildade necessria para as compreender e aceitar. Esta
tomada de conscincia permitiu-me tornar-me mais crtica em relao ao que vejo e ao que
penso enquanto aluna finalista de medicina veterinria e foi mais um passo importante no
meu percurso.
Em Utrecht, passei as manhs no hospital escolar de animais de companhia de 3 de
Novembro a 12 de Dezembro de 2008. Durante as tardes assisti a aulas leccionadas sobre
variados temas, onde so colocadas questes prticas. Passei 4 das 6 semanas no servio
de Medicina Interna, onde assisti a consultas das vrias especialidades existentes:Endocrinologia, Gastroenterologia, Hematologia, Cardiotorcica, Hepatologia, Neurologia,
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Oncologia, Teriogenologia e no servio de Internamento de Medicina Interna. Assisti a
consultas e componente cirrgica de Ortopedia durante uma semana e passei a minha
ltima semana na clnica de aves e de animais exticos.
Durante o estgio na Finlndia, de 5 de Janeiro a 31 de Maro de 2009, frequentei o hospital
escolar de animais de companhia diariamente. Estive uma semana no servio de
Imagiologia e as 3 semanas seguintes no servio de cirurgia (2 semanas em Ortopedia e 1
semana em Neurologia). Assisti a cirurgias e a aulas sobre temas destas 2 especialidades,
fiz parte integrante do trabalho clnico dirio e tomei parte nas cirurgias, sempre com o
auxlio dos alunos do meu grupo. Passei as 6 semanas seguintes no servio de Medicina
Interna. Assisti a consultas de Cardiologia, de Dermatologia, de Acupuntura, de clnica geral,
tive acesso ao servio de Cuidados Intensivos e ao servio de Internamento de Medicina
Interna, onde assisti e me envolvi nos tratamentos e procedimentos necessrios.
1 H
Dos animais que acompanhei, mantive registo de 149. Destes, 125 (84%) foram candeos,16 (10,7%) foram felinos, 3,4% foram aves (1 corvo e 4 periquitos) e 2% animais exticos (1
furo, 1 tartaruga e 1 coelho). Dos 149 animais vistos e registados, 69% so do sexo
masculino.
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2
1 H
Electrocardiografia Arritmias Supraventriculares e Ventriculares
Oftalmologia Patologia e casos clnicos
Hematologia Hemoparasitas
Imagiologia Ecografia aplicada a casos clnicos
Ortopedia Fracturas, Panostete, ODH, OCD, FPC, NUPA, DAD,
Luxaes, Poliartrite Imunomediada
Neurologia Localizao de leses e casos clnicos
Dermatologia Casos clnicos
Toxicologia Mordedura por vbora
Cardiologia Cardiomiopatias Felinas
Outras Relao mdico veterinrio/cliente e doente
2.
Sero apresentados de seguida os passos constituintes do exame neurolgico segundo
vrios autores, no qual sero introduzidos conceitos e testes que sero referidos ao longo
da dissertao, facilitando assim a organizao e a compreenso dos termos utilizados por
parte do leitor.
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2.1.
Apesar da crescente disponibilidade de exames complementares em medicina veterinria, o
exame neurolgico completo e o conhecimento antomo-funcional do sistema nervoso
continuam a ser os componentes mais determinantes no diagnstico clnico para alocalizao de uma leso neurolgica (IVIS, 2001). atravs do exame neurolgico que os
sinais clnicos anormais so avaliados. Estes sinais clnicos so a base das sndromes
neurolgicas e permitem a localizao de leses do sistema nervoso e a avaliao da sua
gravidade para a elaborao de uma lista de diagnsticos diferenciais adequada (Braund &
Sharp, 2003). Para tal devem ser obtidas uma anamnese cuidada, um exame fsico
completo seguido do exame neurolgico, avaliao da lista de problemas obtida e
estipulao dos exames complementares apropriados. A realizao prvia do exame fsico
completo muito importante pois a disfuno de outros sistemas orgnicos pode afectar osistema nervoso (Braund & Sharp, 2003; de Lahunta & Glass, 2009). A ordem pela qual as
diferentes partes do exame neurolgico so efectuadas funo da cooperao do animal,
que normalmente aumenta com o decorrer do exame. Se o doente estiver demasiado
ansioso ou agressivo, deve aguardar-se que ele acalme ou ento no se fazer o exame,
pois para alm do stress induzido no doente existe um risco real do clnico e assistentes se
magoarem a si e ao animal e os resultados obtidos no sero fiveis (de Lahunta & Glass,
2009). O clnico deve ter sempre em considerao as caractersticas inerentes raa do
doente em questo aquando da realizao do exame neurolgico, pois diferentes espcies eraas tm diferentes prevalncias etiolgicas que tm que ser tidas em conta para um
possvel desfecho favorvel de cada caso clnico observado (Rijnberk & de Vries, 1995).
Os instrumentos necessrios para proceder ao exame neurolgico so um plexmetro, uma
pina hemosttica e uma fonte de luz. Pode recorrer-se a uma zaragatoa humedecida para
se proceder ao reflexo corneano (Rijnberk & de Vries, 1995). Segundo Dewey (2003), o
exame neurolgico deve ser realizado de modo sistematizado, para permitir a obteno da
maior quantidade possvel de informao. Existem formulrios que devem ser seguidos para
no se omitir nenhum passo do exame. O formulrio apresentado de seguida adaptado do
formulrio usado na faculdade de Medicina Veterinria de Utrecht-Holanda.
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3 F ( & , 1995)
FORMULRIO DO EXAME NEUROLGICO
DONO DOENTE CLNICO
Nome: Nome: N de registo:
Morada: Raa: Especialidade:Cidade: Data de nascimento:
Contacto (Casa): Peso:Clnico:
Contacto (Emprego): N de Identificao: Data:
ANAMNESE
Motivo da consulta: Durao:
INCIO
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Atrofia Hipertrofia Dor muscular:Atonia Hipotonia Normotonia HipertoniaMEMBROS
Localizao das alteraes detectadas:
ALTERAES DA
CABEAPosio Forma Movimento
Msculos da mastigao Dto Esq Dto Esq Dto EsqPlpebras Dto Esq Dto Esq Dto Esq
Pupilas Dto Esq Dto Esq Dto Esq
Lngua Dto Esq Dto Esq Dto Esq
Ouvidos Dto Esq Dto Esq Dto Esq
Msculos faciais Dto Esq Dto Esq Dto Esq
Globo ocular Dto Esq Dto Esq Dto Esq
Mandbula Dto Esq Dto Esq Dto Esq
Viso Audio Olfacto
REFLEXOS/REACES (0=Ausente, 1=Presente, 2=Exagerado, 3=Clnus)
Reflexo pupilar directo Esquerdo DireitoReflexo pupilar consensual Esquerdo DireitoReflexo palpebral Esquerdo DireitoResposta de ameaa Esquerdo DireitoReflexo larngeo Esquerdo Direito
Reflexos
Cerebrais
Reflexo de tosse Esquerdo Direito
Posio da pata AD AE PD PEResposta de salto AD AE PD PEColocao tctil PD PE
Colocao visual PD PEHemi-andamento Normal Dfices
Teste do carro de mo Normal Dfices
Reaces Posturais
Reflexo postural
de extensoAEAD ADAE PEPD PDPE
Extensor radial do carpo Esquerdo DireitoPatelar Esquerdo DireitoFlexo AD AE PD PE
Reflexos Espinhais
Perineal/anal Dfices
Sensao dor Superficial Profunda
Focal Multifocal Difusa
Crebro Cerebelo Tronco CerebralLOCALIZAO
DA LESOMedula espinhal C1-C5 C6-T2 T3-L3 L4-S5
Perifrico:
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2.1.1.
O estado de conscincia do doente e a sua noo do meio que o envolve s podem ser
avaliados pela interpretao subjectiva do comportamento deste (Rijnberk & de Vries, 1995).
Deve ser dado tempo ao animal para este poder explorar a sala de consulta (Rijnberk & de
Vries, 1995; de Lahunta & Glass, 2009). Um comportamento alterado s pode ser avaliado
se ocorrer periodicamente ou se consistir em alteraes subtis, casos em que os relatos do
dono podem ser as nicas provas de uma possvel alterao neurolgica (Rijnberk & de
Vries, 1995; Dewey, 2003). Para se avaliar correctamente o estado de conscincia do
doente, o estmulo apresentado ao animal e a sua reaco a ele tm que ser
cuidadosamente descritos (natureza e durao de ambos) (Rijnberk & de Vries, 1995). O
doente pode estar alerta e atento ao ambiente que o rodeia, respondendo de modo
apropriado aos estmulos recebidos. Pode estar deprimido ou letrgico, em que responde
aos estmulos apresentados mas mostra pouca actividade espontnea. Se o doente estiveraptico e s responder a estmulos fortes, encontra-se num estado de estupor/semi-coma.
Quando em coma, o doente apresenta-se inconsciente e no possvel obter uma reaco
por parte deste, mesmo na presena de estmulos nociceptivos (Rijnberk & de Vries, 1995;
Dewey, 2003). O doente pode ainda encontrar-se num estado de demncia ou delrio,
desorientao, hiperactividade ou agressividade,durante o qual se apresenta consciente e
alerta mas com um comportamento alterado e uma resposta inadequada aos estmulos
apresentados (Dewey, 2003; de Lahunta & Glass, 2009).
2.1.2.
A avaliao da atitude do doente deve ser feita num piso no escorregadio com rea
suficiente para que o animal possa ser conduzido trela. importante avaliar se o animal
no se quer mover ou se no capaz de o fazer (de Lahunta & Glass, 2009). A atitude
referente posio da cabea e dos olhos do doente em relao ao seu corpo. O animal
pode ter uma inclinao da cabea (um dos pavilhes auriculares estar numa posio mais
baixa que o outro) ou pleurottonus (pescoo e o tronco em flexo lateral com a
concavidade virada para o lado da leso). Pode ter tremores musculares, um ngulo tarsalou uma posio da cauda anormais para a sua raa.
Existem padres caractersticos indicativos de um determinado diagnstico neuro-
anatmico. Segundo de Lahunta e Glass (2009), os padres de actividade motora podem
ser descritos em 2 tipos de parsia e 3 tipos de ataxia ou incoordenao. A parsia
caracterizada pela perda parcial de movimento voluntrio, em que h uma deficiente
capacidade em gerar movimento ou em suportar o prprio peso. O animal demonstra uma
mplitude de movimentos diminuda, cansa-se mais facilmente que o normal e revela uma
perda de tnus muscular. Esta definio inclui os 2 tipos de parsia: neuromuscular (do
neurnio motor perifrico ou LMN), ou do neurnio motor central (UMN). A primeira
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caracterizada por uma dificuldade do animal em suportar o prprio peso. Um doente
ambulatrio apresenta uma passada mais curta que o normal, pode apresentar tremores
musculares nos membros afectados e procurar deitar-se frequentemente. importante
excluir uma afeco ortopdica atravs de um exame ortopdico completo. A parsia do
neurnio motor central leva a um atraso no incio de cada passada, com uma mplitude
maior que a normal. Normalmente o sistema proprioceptivo geral tambm est afectado, o
que leva a uma parsia associada a uma ataxia proprioceptiva geral (descrita aquando do
referido sistema). Segundo Rijnberk e de Vries (1995), quando somente um dos membros
est afectado, esta chamada de monoparsiaou monoplegia (consoante a perda parcial
ou total de movimento voluntrio) e hemiparsiaou hemiplegia, quando apenas uma metade
do corpo est afectada. Quando apenas os membros plvicos esto afectados, esta
chamada de paraparsia/paraplegia e de tetraparsia ou tetraplegia, quando todos os
membros esto afectados.
A ataxia consiste numa alterao das actividades motora e de coordenao das diferentes
partes do corpo (Dewey, 2003). Esta pode ser de 3 tipos: proprioceptiva geral (PG),
vestibular (sistema proprioceptivo especial) e cerebelar (Dewey, 2003; de Lahunta & Glass,
2009) que sero descritas nos sistemas respectivos.
A postura referente posio do corpo do animal relativamente aco da gravidade
(Dewey, 2003). Uma postura normal compreende uma posio simtrica de todos os
membros e a apresentao da cabea, pescoo, tronco e cauda numa posio
caractersticas de animais saudveis da mesma raa. Alteraes na postura devem serdescritas em termos de localizao, direco e tempo. O doente pode apresentar a coluna
em cifose (hiperflectida), lordose (em hiperextenso) ou escoliose (curvatura lateral)
(Rijnberk & de Vries, 1995). Segundo Dewey (2003), as vrias posturas anormais podem ser
indicativas de disfuno neurolgica, que sero descritas consoante a leso do sistema em
que surgem. As alteraes de postura podem ser avaliadas atravs das reaces posturais
do doente.
: Estas testam as vias neurolgicas reflexas, ascendentes e
descendentes da medula espinhal e crebro (Braund & Sharp, 2003). As reaces posturaisso de extrema importncia na avaliao de disfuno do sistema nervoso pois s se
apresentam normais quando todos os componentes nervosos centrais e perifricos do
membro a testar esto intactos. A colocao do corpo do animal, ou partes dele, em
posies anormais pode indicar alteraes subtis no identificadas durante a observao da
locomoo do animal. Uma resposta alterada a estas ser assim o primeiro indcio de uma
leso progressiva do sistema nervoso central ou perifrico que afecte o movimento do
membro testado (de Lahunta & Glass, 2009). Segundo Dewey (2003), as reaces posturais
ajudam distino entre leses ortopdicas e leses neurolgicas, pois animais com lesesortopdicas normalmente no tm alteraes de propriocepo. O examinador tem que,
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contudo, pr a presso adequada no membro a testar para garantir uma resposta fidedigna
(Rijnberk & de Vries, 1995). Cada membro testado individualmente e as respostas entre os
membros contralaterais devem ser iguais entre si. Doentes com leses prosenceflicas
tero dfices posturais contralaterais leso e se tiverem leses no tronco cerebral
apresentaro dfices ipsilaterais a estas (Braund & Sharp, 2003). Num animal tetraplgico
ou paraplgico as reaces posturais estaro sempre alteradas, no tendo por isso valor de
diagnstico anatmico. Nos restantes membros, podem testar-se as seguintes reaces
posturais: teste de propriocepo/posio da pata, respostas de colocao tctil e de
colocao visual, resposta de salto, hemi-andamento, teste do carro de mo, reflexo
postural de extenso ereaco extenso do pescoo. As reaces posturais tm que ser
vistas no contexto dos sinais apresentados para uma correcta apreciao das alteraes
detectadas.
1. Teste de propriocepo/Posio da pata:Deve suportar-se o peso do animal e colocar-se
a face dorsal de uma das patas em contacto com o cho. A reaco normal do animal ser a
reposio imediata da pata na posio inicial. Uma leso neurolgica numa fase inicial pode
ser detectada atravs de alteraes de propriocepo (Rijnberk & de Vries, 1995; Dewey,
2003; de Lahunta & Glass, 2009).
2.Resposta de salto: Segundo de Lahunta e Glass (2009), esta a reaco postural mais
fidedigna. Quando o peso do animal colocado sobre um dos membros, a mudana do seu
centro de gravidade lateralmente levar a uma tentativa de manter o membro sob o corpo
para reajustamento do centro de gravidade. O deslocamento lateral do membro na direcodo movimento deve ser rpido e uma resposta diferente desta deve ser considerada
patolgica. Este teste um bom meio de detectar fraqueza e assimetria ligeiras e deve ser
efectuado quando os restantes testes no so elucidativos, assim como em animais grandes
em que o teste anterior difcil de realizar (Rijnberk & de Vries, 1995; de Lahunta & Glass,
2009).
3. Teste de hemi-andamento: Os membros de um dos lados do doente so levantados em
simultneo e o animal deslocado cranial ou lateralmente. O animal deve mover os
membros de modo coordenado.Leses:Em leses prosenceflicas unilaterais, o doente pode ter um andamento normal
mas apresentar neste teste um dfice contralateral leso. Em leses medulares unilaterais
graves o doente pode ser incapaz de suportar o seu peso no lado da leso. Se a leso
unilateral for toracolombar o animal pode no suportar peso no membro plvico do mesmo
lado. As leses cerebelares podem levar a hipermetria (Braund & Sharp, 2003). Este teste
pode ser feito em animais muito grandes, em que o teste anterior difcil de realizar (de
Lahunta & Glass, 2009).
4. Respostas de colocao:Nos ces em que a resposta de salto difcil de interpretar,podem avaliar-se as respostas de colocao. Na resposta de colocao tctil, o doente
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colocado em posio vertical com os olhos cobertos e deslocado na direco de uma
mesa at que as patas dos membros torcicos toquem nela. A resposta normal ser a flexo
ligeira dos membros, seguida de uma tentativa de apoiar os membros na mesa, deslocando
o membro para a frente. Este teste menos usado para os membros plvicos por dar
respostas menos consistentes. A ausncia de uma resposta normal no necessariamente
indicativa de leso neurolgica, devido a uma possvel supresso do arco reflexo pelo crtex
cerebral (Rijnberk & de Vries, 1995; Dewey, 2003; de Lahunta & Glass, 2009). Na resposta
de colocao visual repetido o teste anterior mas sem se cobrirem os olhos do doente. O
animal saudvel tentar colocar os membros torcicos na mesa antes de chegar a ela.
5. Teste do carro de mo:Em doentes cuja disfuno dos membros torcicos no muito
evidente pode testar-se esta reaco,em que se suporta o peso do animal sob o abdmen
(para que os membros plvicos no toquem no cho) e este deslocado para a frente. A
resposta normal ser a deslocao cranial alternada e simtrica de ambos os membros
torcicos. Deve segurar-se a cabea e o pescoo em extenso, o que aumenta a exigncia
sobre o sistema proprioceptivo geral (Rijnberk & de Vries, 1995; Dewey, 2003; de Lahunta &
Glass, 2009).
Leses: Os doentes com leses dos nervos perifricos, medula espinhal, tronco cerebral ou
prosencfalo, podem apresentar respostas alteradas (movimentos assimtricos, tropear ou
colocao da face dorsal das patas no cho). Em leses medulares mais graves h a
tendncia para a flexo da cabea, com o focinho a tocar no cho ou perto dele. Este teste
pode estar normal em animais com leses medulares toracolombares e com sndrome deSchiff-Sherington (Braund & Sharp, 2003).
6. Reflexo postural de extenso:De acordo com Braund e Sharp (2003), o doente apoiado
pelas axilas at que os seus membros plvicos toquem no cho. Estes ficam em extenso e
hipertonia para suportarem o peso do corpo. Frequentemente os animais do alguns passos
para trs quando os membros plvicos tocam no cho.
Leses: Em leses superficiais unilaterais da medula espinhal, apenas o membro do lado
no afectado se mover normalmente. Em leses profundas, nenhum dos membros se
mover. Se a leso for cerebral, o lado contralateral leso estar alterado e em lesesvestbulo-cerebelares ser o lado ipsilateral leso a apresentar dfices. Os membros
torcicos podem ser avaliados se se suportar o animal pela regio plvica (Braund & Sharp,
2003).
7. Reaco extenso do pescoo: Estas reaces so o resultado da coordenao dos
centros vestibulares com os msculos do pescoo e receptores articulares. O animal
colocado em estao, a sua cabea elevada e o pescoo colocado em extenso. Um
animal sem alteraes neurolgicas estender os membros torcicos e flectir parcialmente
os membros plvicos. Quando a cabea flectida ventralmente, ocorrer a semi-flexo dosmembros torcicos e a extenso dos membros plvicos. Quando a cabea rodada
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lateralmente o animal estender os membros torcico e plvico do lado para o qual se rodou
a cabea (Braund & Sharp, 2003).
Leses: Leses no sistema vestibular levam a alteraes ipsilaterais. Um animal com leso
medular cervical ou do tronco cerebral pode no estender os membros torcicos quando a
cabea elevada, estas articulaes flectem passivamente e o animal suporta o peso na
face dorsal da pata do membro apoiado (Braund & Sharp, 2003).
Segundo Braund e Sharp (2003), as reaces posturais mais relevantes so a resposta de
salto, o teste do carro de mo, o teste de propriocepo e o reflexo postural de extenso. A
ocorrncia de dfices em duas ou mais reaces em qualquer dos membros avaliados
indicativo de uma alterao neurolgica significativa. As reaces posturais do uma
indicao regional da zona afectada e o seu contributo para a identificao da localizao da
leso depender dos restantes passos do exame neurolgico.
2.1.3.
De acordo com Rijnberk e de Vries (1995), o tnus muscular avaliado pela resistncia
oferecida durante a execuo de movimentos passivos dos membros. Este pode ser
classificado como normal (normotonia), ausente (atonia), diminudo (hipotonia), aumentado
(hipertonia), com mudana sbita de hipertonia para hipotonia e hipertonia dos membros
torcicos e atonia dos membros plvicos (fenmeno de Schiff-Sherrington). O doente pode
apresentar tremores (movimentos rtmicos e oscilatrios) que resultam da contraco de
grupos de msculos antagonistas. Os tremores podem ser focais ou afectar todo o corpo doanimal. Pode ser um tremor postural (que ocorre quando o membro afectado ou a cabea
esto direccionadas contra a aco da gravidade) ou um tremor de inteno/terminal
(quando a parte afectada se direcciona para um alvo). Quando o doente apresenta um
relaxamento muscular retardado seguido de contraco muscular, este chamado de
miotonia e uma rigidez muscular que melhora com exerccio. De acordo com Dewey
(2003), na mioclonia verifica-se uma contraco muscular curta que resulta no movimento
de espasmo de uma das partes do corpo. Os tiques esto normalmente associados a
contraces no rtmicas dos msculos faciais (Rijnberk & de Vries, 1995).Deve fazer-se uma palpao cuidada para se detectar uma possvel atrofia muscular. Esta
pode ser neurognica (por desinervao do msculo palpado) ou no neurognica (por
desuso).
2.1.4.
Segundo de Lahunta e Glass (2009), os reflexos espinhais avaliam a integridade da medula
espinhal na zona que abrange o respectivo membro. Estesreflexos necessitam que as suas
componentes sensorial e motora estejam ntegras para ocorrerem de modo adequado. Nos
membros torcicos podem avaliar-se os seguintes reflexos: reflexo de flexo, do bicpede
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braquial(testa os nervos espinhais C6 e C7), do tricpede braquial (testa o nervo radial e os
segmentos C7, C8 e T1) e do extensor radial do carpo (testa a integridade do ramo profundo
do nervo radial, no antebrao). Estes ltimos reflexos so teis quando presentes mas tm
pouco valor quando ausentes, pois nem sempre so passveis de se obterem num animal
saudvel. O nico reflexo fivel nos membros torcicos o reflexo de flexo. Nos membros
plvicos, podem ser testados os reflexospatelar, tibialcranial, do gastrocnmioe o reflexo
de flexo sendo, o reflexo patelar o mais fidedigno neste membro.
Os reflexos espinhais sero descritos no Sistema Eferente Somtico Geral (ESG). Podem
ser classificados como estando ausentes ou como sendo fracos, normais, exagerados ou
clnicos (flexo e extenso repetidas em resposta a um nico estmulo) (Rijnberk & de
Vries, 1995; Dewey, 2003).
2.1.5.
Os nervos cranianos (CN) so constitudos por extenses e ligaes neuronais envolvidas
em funes dentro e fora da cabea, provenientes das estruturas intracranianas. Estes
nervos so anlogos aos nervos espinhais (com os corpos celulares dentro da medula
espinhal ou gnglios associados e que fazem ligao aos rgos perifricos). Os corpos
celulares dos neurnios dos nervos cranianos permanecem nos ncleos intracranianos e
ligam-se a receptores perifricos, a rgos no interior da cabea e por vezes a outras partes
do organismo (Bagley, 2005). Existem doze pares de nervos cranianos que so designados
pelo seu nome ou por numerao romana (de I a XII). Os pares de nervos cranianos so osseguintes, por ordem crescente de numerao: olfactivo, ptico, oculomotor, troclear
trigmio, abdutor, facial, vestbulo-coclear, glossofarngeo, vago, acessrio e hipoglosso
(Ilustrao 1). A sua avaliao atravs do exame neurolgico ser descrita nos sistemas em
que estes se inserem (Dewey, 2004; Wheeler, 2004; Bagley, 2005; Lorenz & Kornegay,
2005; de Lahunta & Glass, 2009).Quando existentes, as alteraes nos nervos cranianos
so ipsilaterais leso neurolgica (Lorenz & Kornegay, 2004).
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1 (
L & G, 2009)
2.1.6.
Segundo Rijnberk e de Vries (1995) e Dewey (2003) deve fazer-se a inspeco e palpaocuidadas e sistematizadas da cabea (integridade dos msculos faciais, auriculares, globo
ocular, abrir a boca do animal), coluna (alteraes na curvatura, atrofia, massas e dor
manipulao das vrtebras) e dos membros (dimenso, tnus e temperatura musculares,
alterao da conformao ssea). A palpao superficial deve ser seguida de uma palpao
profunda se no houver evidncia de dor manipulao das vrias zonas consideradas. A
palpao profunda permite a manipulao e deteco de zonas alteradas. Contudo
(segundo Rijnberk & de Vries, 1995) se o animal se queixar, se retrair ou se se verificar
tenso muscular palpao no necessrio manipular a zona desnecessariamente poispode comprometer-se uma luxao ou fractura instveis.
2.1.7.
A dor pode ser classificada como sendo superficial (rpida) ou profunda (lenta). A primeira
uma dor aguda, bem localizada e que tem como origem mais frequente a pele. Com uma
pina hemosttica deve pinar-se uma prega de pele e aplicada uma fora de presso
crescente at se obter uma resposta por parte do animal (flexo reflexa do membro ou
presena do reflexo panicular/msculo-cutneo) indicando a integridade dos neurniosaferentes e segmentos espinhais associados. Uma resposta de comportamento (ganir ou
EVG: Sistema Eferente Visceral GeralESG: Sistema Eferente Somtico Geral
ESG
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tentar morder o examinador) indica que as vias sensoriais ascendentes da medula espinhal
e do tronco cerebral at ao prosencfalo esto intactas.A dor profunda pouco localizada,
tem origem na pele ou em estruturas subjacentes e s deve ser avaliada quando o animal
no manifesta dor superficial. Com uma pina hemosttica exerce-se compresso crescente
dos dgitos ou da cauda at que surja uma resposta evidente por parte do animal. Um
movimento de flexo s indica a integridade do arco reflexo do membro testado. A dor
consciente implica uma resposta comportamental por parte do animal (vocalizao ou virar a
cabea na direco do estmulo aplicado) (Dewey, 2003).
De acordo com Sharp e Wheeler (2005), os feixes da substncia branca da medula espinhal
so compostos por fibras de diferentes dimetros, sendo a maioria destas mielinizada. As
fibras mielinizadas so as maiores, as com maior velocidade de conduo de impulsos
nervosos e as que transmitem a propriocepo. As fibras motoras so mielinizadas e de
dimetro mdio. A percepo dor transmitida por fibras mielinizadas de pequeno
dimetro e por fibras no mielinizadas. As fibras maiores so as mais susceptveis a leso
por efeitos de compresso, sendo as fibras no mielinizadas as mais resistentes. A
progresso dos sinais clnicos em leses de gravidade crescente influenciada por estes
factores. Assim sendo, leses ligeiras levam perda de propriocepo e em ordem
crescente de gravidade, perda de capacidade de suportar o prprio peso, perda de
movimento voluntrio e, por ltimo, perda de sensibilidade dor profunda. Igualmente
importante a posio relativa dos feixes na medula espinhal. Os feixes mais superficiais
(feixes proprioceptivos ascendentes) so os mais susceptveis a leses compressivas e osfeixes que transmitem a sensao dor tm uma posio mais central e protegida na
medula espinhal. Estes feixes esto dispersos pela medula a vrios nveis sendo por isso
necessria uma leso que comprima a maior parte do dimetro medular para se perder
totalmente a sensao dor profunda. Estas localizaes e o facto de as fibras
responsveis pela sensao dor serem as mais resistentes a leses so uma explicao
prtica do prognstico reservado de um doente que no exame neurolgico no mostre dor
profunda a um estmulo nociceptivo (estmulo nocivo).
Segundo Thomas (2000), aps a determinao da localizao da leso resta a identificaoda sua causa. Esta feita por anlise cuidada da anamnese e resultados dos exames
neurolgico e complementares. A etiologia das afeces neurolgicas mais frequentes pode
ser enquadrada em categorias gerais tais como alteraes de desenvolvimento,
degenerativas, metablicas, inflamatrias, txicas, vasculares e neoplasias.
Como referido anteriormente, os vrios testes realizados no exame neurolgico s tm
aplicao til se o clnico tiver um conhecimento estrutural e funcional do sistema nervoso
adequado, para poder interpretar os resultados obtidos correctamente. As bases do
conhecimento antomo-funcional do sistema nervoso sero apresentadas de seguida.
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2.2.
Todas as actividades fisiolgicas do organismo assentam na integridade e funcionamento
adequados do sistema nervoso e no conhecimento de que a avaliao clnica de alteraes
neurolgicas baseada nas seguintes premissas:
1. As leses neurolgicas do origem a sinais clnicos caractersticos da reaque afectam;
2. A ocorrncia de leses neurolgicas est associada, por norma, a reas
especficas do sistema nervoso;
3. Estes sinais podem ser usados para se localizar anatomicamente as leses
neurolgicas identificadas (Bagley, 2005).
O diagnstico neuro-anatmico consiste na abordagem do doente neurolgico e no
conhecimento das bases morfolgicas e fisiolgicas que permitem a identificao de leses
do sistema nervoso. A elaborao de uma lista de diagnsticos diferenciais facilitada pelaclassificao do sistema nervoso em termos anatmicos e funcionais. Esta permite a
identificao da localizao exacta da leso possibilitando assim a implementao da
teraputica mais adequada a cada doente. Segundo Bagley (2005) e de Lahunta e Glass
(2009) a classificao funcional do sistema nervoso facilita bastante a sua aprendizagem. A
organizao do sistema nervoso central descrita de seguida essencialmente apresentada
em termos anatmicos, sendo os seus constituintes posteriormente includos nos sistemas
funcionais do sistema nervoso perifrico que integram. A apresentao do sistema nervoso
perifrico ser feita de acordo com a classificao utilizada por Lorenz e Kornegay (2004) ede Lahunta e Glass (2009).
2.2.1.
Segundo Bagley (2005), o Sistema Nervoso Central (SNC) tem como papel a integrao das
vrias funes associadas aos estados de conscincia, cognitivo e de alerta do animal
resultando em respostas coordenadas do organismo e adequadas a cada situao. Apesar
de complexo, existe um padro relativamente constante de organizao dos nervos e suas
ligaes no sistema nervoso, que permitem uma compreenso dos seus componentes
estruturais e funcionais. Vrios destes componentes so responsveis pelas aces
voluntrias e motivaes, sendo considerados os centros superiores do sistema nervoso.
O SNC composto pelo crebro e pela medula espinhal. Em termos anatmicos, as
estruturas cerebrais podem ser classificadas segundo a sua posio relativamente ao
formen magnum: as estruturas situadas rostralmente ao formen so denominadas de
estruturas intracranianas e as localizadas caudalmente a este (medula espinhal e nervos
perifricos) so os componentes extracranianos do sistema nervoso. Dentro das estruturas
intracranianas, o tentrio do cerebelosepara os lobos occipitais dos hemisfrios cerebrais,
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cranialmente, do cerebelo (localizado caudalmente a esta estrutura de referncia). As
estruturas situadas cranialmente a este eixo formam a regio supratentorial e as estruturas
situadas caudalmente a ele formam a regio infratentorial. A regio supratentorial
constituda pelo telencfalo, diencfalo, parte rostral dos pednculos cerebrais, sistema
lmbico e hipfise. A regio infratentorial contm a ponte, o bulbo raquidiano e o cerebelo.
Segundo Bagley (2005), Lorenz e Kornegay (2004) e de Lahunta e Glass (2009) e a
nomenclatura vigente na FMV, o crebro constitudo pelas seguintes regies, no sentido
crnio-caudal: crtex cerebral (telencfalo), tlamo, hipotlamo e epitlamo (diencfalo),
cerebelo e tronco cerebral. O tronco cerebral constitudo pelos pednculos cerebrais, pela
ponte e pelo bulbo raquidiano ou medula oblonga. Ao conjunto do telencfalo e do
diencfalo d-se o nome de prosencfalo (Ilustrao 2).
2 ( L & K, 2004)
Em termos funcionais, o SNC pode ser dividido nos sistemas motor (eferente), sensorial
(aferente) e autonmo (aferente e eferente). O termo aferente refere-se conduo de
informao em direco ao centro e normalmente referente a uma funo sensitiva. O
termo eferente refere-se conduo de informao proveniente do centro e normalmente
indica uma funo motora por parte do rgo efector (Lorenz & Kornegay, 2004).
D
C
B
C C
C C
H
C
B
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()
A funo motora mediada por dois sistemas de neurnios, os neurnios motores centrais
(UMN) e os neurnios motores perifricos (LMN). O primeiro sistema tem um papel de
controlo, coordenao e iniciao das funes motoras voluntrias (Lorenz & Kornegay,
2004; Bagley, 2005; Sharp & Wheeler, 2005; de Lahunta & Glass, 2009). O sistema de
neurnio motor central um neurnio ou grupo de neurnios que no sai do sistema
nervoso central e que se projecta ao longo da medula espinhal para fazer sinapse (via
interneurnios) com o neurnio motor perifrico, influenciando este ltimo positiva ou
negativamente (Wheeler, 2004; Bagley, 2005). De acordo com de Lahunta e Glass (2009),
as funes do UMN so as seguintes:
1. Iniciao da actividade voluntria do sistema motor;
2. Manuteno do tnus muscular que permite a manuteno da posio do animal face
gravidade e execuo dos movimentos voluntrios;3. Controlo da actividade muscular associada s funes viscerais (cardiovascular,
respiratria e excretora).
O sistema UMN encontra-se dividido nos sistemas piramidal e extra-piramidal(Bagley, 2005;
de Lahunta & Glass, 2009). O sistema piramidal permite a execuo de movimentos
refinados mas no est envolvido na iniciao de movimentos. Regies associadas a
funes mais desenvolvidas e precisas correspondem a reas maiores nesta rea motora. O
sistema extra-piramidal est envolvido na locomoo e iniciao de movimentos voluntrios.
Nos animais de companhia, o sistema extra-piramidal tem um papel mais relevante que osistema piramidal e os seus corpos celulares esto dispersos por todas as reas do crebro
(de Lahunta & Glass, 2009).
:Uma perda total do papel de inibio dos neurnios a nvel do prosencfalo leva
ocorrncia de convulses. Leses no sistema piramidal resultam em dfices posturais nos
membros contralaterais, apesar de o animal ter um andamento normal. Leses no sistema
extra-piramidal tm mais relevncia clnica e resultam em pleurottonus, andamento em
crculo, andamento sem objectivo e disfunes motoras. Estas podem ser de origem
muscular (miotonia) e de origem nervosa (mioclonia) (de Lahunta & Glass, 2009). A maioriadas leses que afecta o UMN resulta na falta de inibio dos msculos extensores com
papel de aco contra a gravidade, o que leva a uma hipertonia ou espasticidade destes
msculos. Quando levantados, os animais mostram hipertonia e suportam o seu peso pela
hiperextenso de todos os membros. O animal apresentar os reflexos espinhais
aumentados, que podem ocorrer mais do que uma vez depois da aplicao do estmulo
(clnus ps-reflexo) (Rijnberk & de Vries, 1995; Dewey, 2003). Pode ocorrer o chamado
reflexo extensor cruzado pela mesma razo, em que alm da flexo do membro a ser
testado h uma extenso do membro contralateral. Deve ser considerado anormal se o
doente no apresentar nenhuma resistncia ao teste e indica uma disfuno na medula
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espinhal (Rijnberk & de Vries, 1995; de Lahunta & Glass, 2009). Este reflexo patolgico
suprimido num animal saudvel devido a impulsos sensoriais e pticos que actuam em
neurnios espinhais. Num animal em estao este reflexo fisiolgico porque permite a
manuteno da sua posio pela extenso de um membro enquanto o membro contralateral
flectido (Rijnberk & de Vries, 1995). O doente ter as reaces posturais diminudas a
ausentes pois como referido anteriomente, estas s se apresentam normais quando todos
os componentes nervosos centrais e perifricos do membro a testar esto intactos.
O sistema de neurnios inferiores (LMN) ser apresentado na seco referente medula
espinhal e nos sistemas que integra (componentes geral e visceral do Sistema Eferente
Somtico).
.
Este pode ser dividido em 4 reas (Wheeler, 2004):1. Prosencfalo;
2. Cerebelo;
3. Tronco cerebral;
4. Sistema Vestibular.
1. :
i. Telencfalo: O telencfalo composto pelo neopallium, rinencfalo e corpo estriado
(ncleos basais) do crebro e divide-se em dois hemisfrios cerebrais (de Lahunta & Glass,2009). Os hemisfrios cerebrais so constitudos por 2 componentes distintos, a substncia
cinzenta (composta por corpos celulares de neurnios) e a substncia branca (processos
axonais dos neurnios). O crtex cerebral constitui a superfcie externa do telencfalo,
formado por vrias camadas de corpos celulares, est localizado entre a pia mater (meninge
em contacto directo com o crtex, mais superficialmente) e a substncia branca (em
contacto com o crtex, situada mais profundamente). O crtex cerebral est associado a
funes como o estado de conscincia do animal, os estados emocional, mental,
comportamental, de percepo e de controlo das funes motoras (Bagley, 2005).
Os hemisfrios cerebrais esto funcionalmente divididos em 4 lobos:
a)Frontal: lobo associado ao controlo da actividade motora;
b) Temporal: lobo relacionado com o comportamento, aprendizagem, memria e funo
auditiva;
c) Parietal:lobo que controla funes sensitivas e auditivas;
d) Occipital:lobo responsvel pela integrao das funes visuais.
:O crebro uma estrutura relativamente grande e com funes bem localizadas,
pelo que o animal pode apresentar apenas alguns dos sinais de seguida referidos,
consoante a localizao da leso. Um doente com leso do telencfalo poder apresentar
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convulses (um sinal importante de disfuno do prosencfalo), alteraes comportamentais
e um estado mental alterado (desde depresso a semi-coma). As alteraes
comportamentais (temperamento alterado, perder o treino previamente adquirido e no
reconhecer o dono) sugerem a presena de alteraes do sistema lmbico (associado a
funes comportamentais e emocionais) ou dos lobos frontal ou temporal. Se a leso for
unilateral ou assimtrica, o animal pode andar em crculo (crculos grandes, normalmente
para o mesmo lado da leso) e pressionar a cabea contra objectos (sinal conhecido como
head pressing). O andamento em crculo no ajuda localizao da leso pois ocorre em
leses do prosencfalo, do tronco cerebral (sndrome vestibular central) e do sistema
vestibular perifrico. Leses do lobo frontal levam a um andamento sem objectivo (pacing).
Se o animal estiver deprimido, letrgico, em estupor ou em coma, pode ser uma indicao
de que houve separao do crtex cerebral do sistema reticular ascendente(ARAS). Uma
depresso acentuada normalmente indicativa de leses no tronco cerebral (Lorenz &
Kornegay, 2004; Wheeler, 2004). As leses cerebrais no levam a alteraes significativas
da locomoo mas o animal apresentar dfices das reaces posturais e sensoriais
contralaterais a leses unilaterais ou reaces posturais bilaterais anormais em situaes
subagudas e uma hipoalgesia bilateral generalizada. Ter posturas de cabea e pescoo
alteradas com alteraes de movimento e, ocasionalmente, pode apresentar uma parsia
ligeira da face, lngua e faringe (Lorenz & Kornegay, 2004; de Lahunta & Glass, 2009). A
presena de leses focais pode resultar numa perda de viso se o lobo occipital se
encontrar afectado. Neste caso, o doente ter reflexos pupilares intactos mas uma respostade ameaa diminuda e uma diminuio da sensao facial no lado contralateral ao da leso
(Lorenz & Kornegay, 2004, Wheeler, 2004).
ii. Diencfalo: Localizado rostralmente aos pednculos cerebrais e caudalmente aos
ncleos basais, composto pelo tlamo, epitlamo, hipotlamo e subtlamo. O diencfalo
tem uma estrutura simtrica e rodeia o terceiro ventrculo. O tlamo a rea de passagem
de axnios do tronco cerebral para os hemisfrios cerebrais e vice-versa e tem papel no
sistema ARAS para a manuteno do estado de conscincia, sono e alerta. (Bagley, 2005;
de Lahunta & Glass, 2009). O hipotlamo o centro principal de regulao da actividademotora visceral, cujos ncleos actuam como UMN do sistema nervoso autnomo.A poro
cranial estimula o sistema parassimptico e a poro caudal estimula o sistema simptico a
nvel sistmico (de Lahunta & Glass, 2009). responsvel pela regulao de actividades
fisiolgicas bsicas inerentes manuteno da homeostase do organismo tais como a
alimentao, homeostase da gua, da temperatura corporal e de funes reprodutoras.
Tambm tem como funo a regulao da actividade de uma parte significativa do sistema
endcrino do organismo por influenciar a hipfise (considerada a glndula principal do
organismo) (Bagley, 2005; de Lahunta & Glass, 2009).
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:Leses do tlamo (sistema lmbico) podem levar a agressividade, a um andamento
sem objectivo, andamento em crculo, perdas de resposta ao dono e de hbitos adquiridos.
A presena de alteraes variveis do estado de conscincia por interferncia no sistema
ARAS (estado de estupor a semi-coma) num animal capaz de se manter em p e andar
normalmente indicativo de leso dienceflica. Tal como nas leses cerebrais, a locomoo
no se encontra significativamente alterada mas as leses unilaterais levam a um dfice
contralateral das reaces posturais (Wheeler, 2004). Pode ocorrer tetraparsia ou
hemiparsia (sinais do tipo UMN), consoante a extenso da leso (Lorenz & Kornegay,
2004; Wheeler, 2004). O animal pode apresentar ocasionalmente ataxia vestibular, perda
contralateral da viso e hipoalgesia generalizada. Os sinais mais caractersticos de leso do
diencfalo esto relacionados com alteraes nas funes do hipotlamo e do eixo
hipotlamo-hipofisrio. Alteraes frequentes so de origem comportamental (agressividade
em leses hipotalmicas ventrais e letargia e fenmeno conhecido como star gazing, emque o animal olha para o cu, sem alvo fixo, em leses hipofisrias) (de Lahunta & Glass,
2009).Outras alteraes frequentes so de natureza endcrina, em que o animal apresenta
alteraes do apetite (polifagia ou anorexia consoante a regio afectada), do consumo de
gua (com polidipsia e poliria compensatria, pode beber menos gua) e da
termorregulao (Lorenz & Kornegay, 2004; Wheeler, 2004; de Lahunta & Glass, 2009). O
doente pode apresentar um padro respiratrio conhecido como respirao de Cheyne-
Stokes, caracterizado por um aumento e diminuio graduais do volume tidal intercalados
por perodos de apneia. O hipotlamo est envolvido no mecanismo de regulao daglicmia. Leses nesta rea podem levar a hiperglicmia e glicosria, de origem pouco
esclarecida. Uma alterao hipotalmica pode comprometer a regulao da frequncia
cardaca normal pelo sistema nervoso autnomo, podendo o animal apresentar uma
bradicardia significativa (de Lahunta & Glass, 2009).
Se o hipotlamo no estiver afectado, difcil diferenciar leses do telencfalo de leses do
diencfalo (Lorenz & Kornegay, 2004; Wheeler, 2004).
a) Convulses: Os neurnios so clulas excitveis em contacto entre si por ligaes de
estimulao e de inibio, num equilbrio constante. Se a estimulao for excessiva, aalterao neuronal consequente manifestada na forma de uma convulso. Esta representa
uma descarga neuronal excitatria no controlada, com incio no prosencfalo. Os neurnios
tm um limiar convulsivo que, quando diminudo, leva a convulses. Este o sinal de
alterao do sistema nervoso mais frequentemente encontrado na prtica clnica de animais
de companhia (de Lahunta & Glass, 2009).
b) Epilepsia: Patologia crnica com recorrncia de convulses (Thomas, 2000).
Cada convulso tem um perodo que a precede (prdromo), um perodo inicial de sinais
focais motores ou sensoriais (aura), o perodo em que decorre a convulso (ictus), um
perodo aps a convulso (ps-ictus). O perodo entre convulses chamado de inter-ictus.
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A classificao das convulses nos animais domsticos no tem uma relao directa com a
usada nos humanos, podendo estas ser classificadas como focais, parciais ou
generalizadas. Uma convulso focal consiste na descarga espontnea de um pequeno
nmero de neurnios no prosencfalo, mas sem expresso clnica. Uma convulso parcial
uma entidade clnica em que a convulso focal tem uma disperso limitada. A maioria
destas convulses ocorre em animais que tm uma leso estrutural. As convulses focais
podem ser divididas em simples ou complexas. Na primeira no se observam alteraes
comportamentais, ao contrrio do que sucede nas ltimas. Uma convulso parcial simples
pode resultar por exemplo em tremores, flexo dos membros, mioclonia, hipersilia e
midrase. Uma convulso parcial complexa implica uma alterao comportamental como por
exemplo, o olhar para o ar (star gazing), andar atrs da prpria cauda, agressividade ou
raiva anormais, morder o ar (fly biting) e perda de conscincia por breves perodos de
tempo, entre outros. Este tipo de convulses sugere o envolvimento de componentes do
sistema lmbico. Uma convulso generalizada a forma mais frequente nos animais de
companhia e afecta o crebro de modo difuso. O animal pode perder a conscincia, com
contraco dos msculos anti-gravitacionais, que leva a movimentos repetidos dos
membros. Pode tambm ter hipersilia, com pupilas dilatadas e urinar ou defecar durante
esse perodo. Este tipo de convulses dura normalmente 3 minutos, seguido de um perodo
de recuperao. O animal pode ter apenas uma convulso num perodo de 24 horas, ou
pode ter 2 ou mais convulses nesse perodo, com um intervalo inter-ictus normal
(convulses em salva). atribudo o nome de status epilepticusa animais cujas convulsesduram mais de 5 minutos ou aquando da ocorrncia de vrias convulses, durante 30
minutos, entre as quais o animal no recupera totalmente a conscincia. As convulses em
salva e o status epilepticusso emergncias mdicas (de Lahunta & Glass, 2009). Segundo
Thomas (2000), so vrios os factores que podem desencadear convulses, tais como
privao do sono, no ingesto da medicao anti-convulsiva, stress, estro em fmeas e
alteraes metablicas.
2. O cerebelo contm mais neurnios que todas as outras regies do crebro juntas,
resultando numa diminuio significativa do tempo de aco deste rgo. O cerebelo tem
um papel nos sistemas sensoriais, cognitivos e emotivos, sendo a funo mais importante
em termos clnicos a do controlo e coordenao da actividade motora. Para o fazer
necessita de vias aferentes que dem indicaes da posio da cabea, tronco e membros
e do sistema de neurnios motores centrais para poder haver a comparao da inteno do
movimento do animal com a actividade motora necessria para o conseguir (de Lahunta &
Glass, 2009). Este rgo ajuda tambm na manuteno do equilbrio e controla a postura doanimal (Lorenz & Kornegay, 2004; Wheeler, 2004).
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Vias cerebelares aferentes:
1. Proprioceptivas gerais: Os feixes espino-cerebelares provenientes da medula espinhal
(recebem os sinais sensoriais vindos dos msculos, rgos tendinosos, receptores tcteis
da pele e das articulaes) entram no cerebelo atravs dos pednculos cerebelares caudal
e rostral (Duarte, 2003; de Lahunta & Glass, 2009). Os feixes espino-cuneo-cerebelaresprovenientes do pescoo e membros torcicos entram no cerebelo atravs do pednculo
cerebelar caudal (King, 1987).
2. Proprioceptivas especiais: Os feixes vestbulo-cerebelares entram no cerebelo
provenientes da poro vestibular do nervo craniano VIII ou dos ncleos vestibulares (no
tronco cerebral) pelos pednculos cerebelares caudais.
3. Vias aferentes somticas especiais (sistemas visual e auditivo): Os feixes tecto-
cerebelares entram no cerebelo via pednculo cerebelar rostral. Os axnios dos sistemas
visual e auditivo provenientes do crtex cerebral passam pela ponte e entram no cerebelopelo pednculo cerebelar mdio contralateral (de Lahunta & Glass, 2009).
4. Sistema de neurnios motores centrais: Estas vias so complexas e difusas, incluindo
os feixes rubro-cerebelares (do ncleo vermelho at ao cerebelo), reticulo-cerebelares (com
origem no sistema reticular) e crebro-ponto-cerebelares (desde o crtex motor at ao
cerebelo atravs dos ncleos pontinos) (Duarte, 2003; de Lahunta & Glass, 2009).
Vias cerebelares eferentes:
Os neurnios eferentes do cerebelo encontram-se nos ncleos cerebelares profundos. As
clulas desses ncleos recebem estmulos inibitrios das clulas de Purkinje e sinapses
excitatrias de vias aferentes (Duarte, 2003). Os axnios das clulas de Purkinje (no crtex
cerebelar) so projectados para os ncleos vestibulares via feixes cerebelo-vestibulares e
para o sistema reticular via feixes cerebelo-reticulares atravs do pednculo cerebelar
caudal e os ncleos cerebelares projectam axnios para o tlamo, ncleo vermelho e tecto
atravs do pednculo cerebelar rostral (King, 1987; de Lahunta & Glass, 2009).
:Normalmente as leses cerebelares so difusas e ocorrem juntamente com leses
do tronco cerebral e no isoladamente (localizao anatmica protegida). No resultam emperda de nenhuma funo em particular mas numa resposta geral inadequada da actividade
motora (de Lahunta & Glass, 2009). Neste tipo de leses, o animal manifesta uma ataxia
cerebelar simtrica caracterstica. A ataxia, ou incoordenao, pode ser de 3 tipos: ataxia
proprioceptiva geral (por vezes referida como ataxia sensorial), ataxia vestibular e ataxia
cerebelar (chamada por vezes de ataxia motora). A ataxia cerebelar resulta na dificuldade
do animal em iniciar os seus movimentos e em regular a sua frequncia e mplitude. Esta
alterao tem o nome de dismetria, ocorrendo mais frequentemente uma hipermetria, que
caracterizada por um andamento com uma mplitude exagerada e com uma flexoexcessiva dos membros no incio do movimento. A iniciao do movimento dos membros
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lenta mas uma vez iniciada, o membro elevado mais que o normal pela flexo articular
exagerada, assentando no cho abruptamente, pela extenso exagerada das articulaes
(Dewey, 2003; de Lahunta & Glass, 2009). Este tipo de hipermetria deve ser diferenciado da
hipermetria causada por leses cervicais craniais com alterao dos sistemas UMN e de
propriocepo geral (PG), em que as articulaes dos membros esto em extenso durante
a fase inicial do movimento. Porque o cerebelo no tem papel na iniciao de movimento, a
parsia no um dos sinais caractersticos de leso cerebelar, a menos que haja
envolvimento concomitante do tronco cerebral. Estes animais tm frequentemente
alteraes graves de locomoo com espasticidade e ataxia hipermtrica mas o doente
capaz de suportar o seu peso. O tnus muscular est normal ou aumentado (Lorenz &
Kornegay, 2004; de Lahunta & Glass, 2009).Os reflexos espinhais podem estar exagerados
numa fase inicial. As reaces posturais so lentas e seguidas de uma resposta exagerada
(Lorenz & Kornegay, 2004; Wheeler, 2004; de Lahunta & Glass, 2009). O animal pode
apresentar tremores, que podem ser generalizados ou de inteno (quando se tenta
aproximar de um alvo, como o prato da comida). A disfuno dos componentes cerebelares
do sistema vestibular pode resultar numa perda de equilbrio e inclinao da cabea para o
mesmo lado ou para o lado contrrio ao da leso (aquando da sndrome vestibular
paradoxal) (Dewey, 2003; de Lahunta & Glass, 2009). A presena de leses agudas graves
do lobo rostral leva ocorrncia de opisttonus, com hipertonia dos msculos extensores
dos membros torcicos, movimentos clnicos dos membros plvicos e flexo das ancas
(rigidez descerebelada).
Os membros plvicos tambm podem estar em extenso se aporo ventral do lobo rostral do cerebelo estiver afectada. A rigidez desaparece ao fim de
alguns dias e os sinais de leso crnica (ataxia e tremores de inteno) surgem ao fim de
algumas semanas a meses. Em leses unilaterais, a ataxia cerebelar ipsilateral com
espasticidade, hipermetria e reaces posturais anormais (especialmente a resposta de
salto).Em leses cerebelares difusas, a resposta de ameaa pode estar ausente apesar de
o animal ter uma funo visual normal e, se apresentar nistagmo, este do tipo rpido-lento
sem orientao consistente (Lorenz & Kornegay, 2004; de Lahunta & Glass, 2009).
3.
Em termos anatmicos contm o diencfalo, os pednculos cerebrais, a ponte, o cerebelo e
o bulbo raquidiano (Bagley, 2005).Em termos funcionais inclui os pednculos cerebrais, a
ponte e o bulbo raquidiano (Lorenz & Kornegay, 2004).
a) Pednculos cerebrais: Contm os neurnios do nervo craniano oculomotor e troclear (III
e IV), que inervam os msculos extra-oculares. O centro parassimptico do reflexo pupilar
luz est localizado nos pednculos cerebrais assim como nos centros de controlo motor.
b) Ponte:Contm neurnios responsveis pela iniciao do movimento.
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c) Bulbo raquidiano: Constitui a poro mais