amazonas/rondÔnia/roraima/acre bahia/sergipe … · 6/5/1996 · distrito federal sia/sul trecho 2...

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  • Rua Henrique Schaumann, 270, Cerqueira Csar So Paulo SP CEP 05413-909 PABX: (11) 3613 3000SACJUR: 0800 055 7688 de 2 a 6, das 8:30 s 19:30

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    Filiais

    AMAZONAS/RONDNIA/RORAIMA/ACRE

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    PARAN/SANTA CATARINA

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    PERNAMBUCO/PARABA/R. G. DO NORTE/ALAGOAS

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    RIBEIRO PRETO (SO PAULO)

    Av. Francisco Junqueira, 1255 Centro Fone: (16) 3610-5843 Fax: (16) 3610-8284 Ribeiro Preto

    RIO DE JANEIRO/ESPRITO SANTO

    Rua Visconde de Santa Isabel, 113 a 119 Vila Isabel Fone: (21) 2577-9494 Fax: (21)2577-8867 / 2577-9565 Rio de Janeiro

    RIO GRANDE DO SUL

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    SO PAULO

    Av. Antrtica, 92 Barra Funda Fone: PABX (11) 3616-3666 So Paulo

  • ISBN 978-85-02-21612-9

    Capez, FernandoCurso de direito penal, volume 2, parte especial : dos crimes contra a pessoa a dos crimes contra o sentimento religioso e contra

    o respeito aos mortos (arts. 121 a 212) / Fernando Capez. 14. ed. So Paulo : Saraiva, 2014.Bibliografia.

    1. Direito penal I. Ttulo.CDU 343

    ndices para catlogo sistemtico:

    1. Direito penal 343

    Diretor editorial Luiz Roberto CuriaGerente editorial Thas de Camargo Rodrigues

    Assistente editorial Poliana Soares AlbuquerqueProdutora editorial Clarissa Boraschi Maria

    Produtor multimdia William PaivaPreparao de originais Ana Cristina Garcia, Maria Izabel Barreiros Bitencourt

    Bressan e Flavia Gutterres Falco de OliveiraArte e diagramao Isabel Gomes Cruz

    Reviso de provas Amlia Kassis Ward e Ana Beatriz Fraga MoreiraServios editoriais Camila Artioli Loureiro, Kelli Priscila Pinto e Surane Vellenich

    Capa Guilherme P. PintoProduo eletrnica Know-how Editorial

    Data de fechamento da edio: 5-11-2013

    Dvidas?

    Acesse www.editorasaraiva.com.br/direito

    Nenhuma parte desta publicao poder ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem a prviaautorizao da Editora Saraiva. A violao dos direitos autorais crime estabelecido na Lei n.9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Cdigo Penal.

    http://www.editorasaraiva.com.br/direito
  • SOBRE O AUTOR

    Fernando Capez Mestre pela Universidade de So Paulo (USP) e Doutor em Direito pelaPontifcia Universidade Catlica de So Paulo (PUCSP).

    Procurador de Justia em So Paulo, ingressou no Ministrio Pblico em 1988, onde, apsexperincia no Tribunal do Jri, integrou o primeiro grupo de Promotores responsveis pela defesado patrimnio pblico e da cidadania. Combateu a violncia das torcidas organizadas e a mfiado lixo.

    Lecionou durante dezoito anos no Complexo Educacional Damsio de Jesus, sendo, tambm,professor na Escola Superior do Ministrio Pblico de So Paulo, professor concursado daAcademia de Polcia do Estado de So Paulo e professor honorrio da Universidade PresbiterianaMackenzie.

    Autor de diversas obras, como Curso de direito penal (v. 1 a 4), Curso de processo penal,Limites constitucionais Lei de Improbidade Administrativa, Cdigo Penal comentado (coautor),Prtica forense penal (coautor) e Curso de direito constitucional (coautor), e vrios volumes daColeo Direito Simplificado (Penal Geral, Penal Especial, Processo Penal, Execuo Penal,Legislao Penal Especial e Constitucional), palestrante nacional e internacional. tambmcoordenador da Coleo Estudos Direcionados e Pockets Jurdicos.

    Suas obras possuem como principais virtudes: objetividade, linguagem direta, fcil e agradvel,amplo embasamento decorrente da larga experincia terica e prtica do autor, organizao lgicados temas em tpicos e subtpicos, contribuindo para a sua rpida localizao, alm dejurisprudncia atualizada, farta citao doutrinria e quadros sinticos.

    A utilidade dos trabalhos alcana desde experientes operadores do Direito, como juzes,desembargadores e ministros, membros do Ministrio Pblico estadual e federal, procuradores edefensores pblicos, delegados de polcia e advogados, at estudantes que se preparam para provas,exames da OAB e concursos pblicos.

    Alm de Procurador de Justia, foi eleito (em 2006) e reeleito (em 2010) para o cargo deDeputado Estadual em So Paulo, ocupando a Presidncia da Comisso de Constituio, Justia eRedao (CCJR) da Assembleia.

  • ABREVIATURAS

    ACrim Apelao CriminalAgI Agravo de InstrumentoAp. Apelaoart.(s.) artigo(s)c/c combinado comCC Cdigo CivilCComp Conflito de Competnciacf. conformeCF Constituio FederalCLT Consolidao das Leis do TrabalhoCNH Carteira Nacional de HabilitaoCP Cdigo PenalCPM Cdigo Penal MilitarCPP Cdigo de Processo PenalCTB Cdigo de Trnsito BrasileiroDec.-Lei Decreto-LeiDJU Dirio da Justia da UnioECA Estatuto da Criana e do Adolescenteed. edioFUNAI Fundao Nacional do ndioHC Habeas CorpusIBCCrim Instituto Brasileiro de Cincias CriminaisINSS Instituto Nacional do Seguro SocialIP Inqurito Policialj. julgadoJCAT/JC Jurisprudncia CatarinenseJSTJ Jurisprudncia do STJJTACrimSP Julgados do Tribunal de Alada Criminal de So PauloJTACSP Julgados do Tribunal de Alada Civil de So PauloJTAMG Julgados do Tribunal de Alada de Minas GeraisLCP Lei das Contravenes PenaisLINDB Lei de Introduo s Normas do Direito BrasileiroLT Lei de TxicosMin. MinistroMP Ministrio Pblicom. v. maioria de votosn. nmero(s)OAB Ordem dos Advogados do BrasilObs. Observaop. pgina(s)Pet. Petiop. ex. por exemploQCr Questo CriminalRE Recurso ExtraordinrioRECrim Recurso Extraordinrio CriminalRel. RelatorREsp Recurso EspecialRF Revista ForenseRHC Recurso em Habeas CorpusRJDTACrimSP Revista de Jurisprudncia e Doutrina do Tribunal de Alada Criminal de So PauloRJTJESP Revista de Jurisprudncia do Tribunal de Justia do Estado de So PauloRJTJRS Revista de Jurisprudncia do TJRSRJTJSC Revista de Jurisprudncia do Tribunal de Justia de Santa CatarinaRSTJ Revista do STJRT Revista dos Tribunais

  • RTARJ Revista do Tribunal de Alada do Rio de JaneiroRTFR Revista do Tribunal Federal de RecursosRTJ Revista Trimestral de Jurisprudncia (STF)RTJE Revista Trimestral de Jurisprudncia dos Estadoss. seguinte(s)STF Supremo Tribunal FederalSTJ Superior Tribunal de JustiaTACrimSP Tribunal de Alada Criminal de So PauloTFR Tribunal Federal de Recursos (extinto)TJMS Tribunal de Justia do Mato Grosso do SulTJPR Tribunal de Justia do ParanTJRJ Tribunal de Justia do Rio de JaneiroTJRS Tribunal de Justia do Rio Grande do SulTJSC Tribunal de Justia de Santa CatarinaTJSP Tribunal de Justia de So PauloTRF Tribunal Regional Federalv. videv. volumev. u. votao unnime

    v. v.

  • voto vencido

  • NDICE

    Sobre o autor

    Abreviaturas

    Nota do autor

    Ttulo IDOS CRIMES CONTRA A PESSOA

    Captulo I DOS CRIMES CONTRA A VIDA

    Art. 121 Homicdio

    Art. 122 Induzimento, instigao ou auxlio a suicdio

    Art. 123 Infanticdio

    Arts. 124 a 128 Aborto

    Captulo II DAS LESES CORPORAIS

    Art. 129 Leso corporal

    Captulo III DA PERICLITAO DA VIDA E DA SADE

    Art. 130 Perigo de contgio venreo

    Art. 131 Perigo de contgio de molstia grave

    Art. 132 Perigo para a vida ou sade de outrem

    Art. 133 Abandono de incapaz

    Art. 134 Exposio ou abandono de recm-nascido

    Art. 135 Omisso de socorro

    Art. 135-A Condicionamento de atendimento mdico-hospitalar emergencial

    Art. 136 Maus-tratos

  • Captulo IV DA RIXA

    Art. 137 Rixa

    Captulo V DOS CRIMES CONTRA A HONRA

    Art. 138 Calnia

    Art. 139 Difamao

    Art. 140 Injria

    Arts. 141 a 145 Das disposies comuns aos crimes contra a honra

    Captulo VI DOS CRIMES CONTRA A LIBERDADE INDIVIDUAL

    Seo I Dos crimes contra a liberdade pessoal

    Art. 146 Constrangimento ilegal

    Art. 147 Ameaa

    Art. 148 Sequestro e crcere privado

    Art. 149 Reduo a condio anloga de escravo

    Seo II Dos crimes contra a inviolabilidade do domiclio

    Art. 150 Violao de domiclio

    Seo III Dos crimes contra a inviolabilidade de correspondncia

    Art. 151, Caput Violao de correspondncia

    Art. 151, 1, I Sonegao ou destruio de correspondncia

    Art. 151, 1, II, III e IV Violao de comunicao telegrfica, radioeltrica outelefnica

    Art. 151, 2 Causa de aumento de pena

    Art. 151, 3 Qualificadora

    Art. 151, 4 Ao penal

  • Art. 152 Correspondncia comercial

    Seo IV Dos crimes contra a inviolabilidade dos segredos

    Art. 153 Divulgao de segredo

    Art. 154 Violao do segredo profissional

    ArtS. 154-A E 154-B Invaso de dispositivo informtico

    Ttulo IIDOS CRIMES CONTRA O PATRIMNIO

    Captulo I DO FURTO

    Art. 155 Furto

    Art. 156 Furto de coisa comum

    Captulo II DO ROUBO E DA EXTORSO

    Art. 157 Roubo

    Art. 158 Extorso

    Art. 159 Extorso mediante sequestro

    Art. 160 Extorso indireta

    Captulo III DA USURPAO

    Art. 161, Caput Alterao de limites

    Art. 161, 1, I Usurpao de guas

    Art. 161, 1, II Esbulho possessrio

    Art. 162 Supresso ou alterao de marcas em animais

    Captulo IV DO DANO

    Art. 163 Dano

  • Art. 164 Introduo ou abandono de animais em propriedade alheia

    Art. 165 Dano em coisa de valor artstico, arqueolgico ou histrico

    Art. 166 Alterao de local especialmente protegido

    Captulo V DA APROPRIAO INDBITA

    Art. 168 Apropriao indbita

    Art. 168-A Apropriao indbita previdenciria

    Art. 169, Caput Apropriao de coisa havida por erro, caso fortuito ou fora danatureza

    Art. 169, Pargrafo nico, I Apropriao de tesouro

    Art. 169, Pargrafo nico, II Apropriao de coisa achada

    Captulo VI DO ESTELIONATO E OUTRAS FRAUDES

    Art. 171 Estelionato

    Art. 172 Fatura, duplicata ou nota de venda simulada

    Art. 173 Abuso de incapazes

    Art. 174 Induzimento especulao

    Art. 175 Fraude no comrcio

    Art. 176 Outras fraudes

    Art. 177 Fraudes e abusos na fundao ou administrao de sociedades por aes

    Art. 178 Emisso irregular de conhecimento de depsito ou warrant

    Art. 179 Fraude execuo

    Captulo VII DA RECEPTAO

    Art. 180 Receptao

  • Captulo VIII DISPOSIES GERAIS

    Arts. 181 a 183 Imunidades

    Ttulo IIIDOS CRIMES CONTRA A PROPRIEDADE IMATERIAL

    Captulo I DOS CRIMES CONTRA A PROPRIEDADE INTELECTUAL

    Art. 184 Violao de direito autoral

    Art. 185 Usurpao de nome ou pseudnimo alheio

    Ttulo IVDOS CRIMES CONTRA A ORGANIZAO DO TRABALHO

    Art. 197 Atentado contra a liberdade de trabalho

    Art. 198 Atentado contra a liberdade de contrato de trabalho e boicotagem violenta

    Art. 199 Atentado contra a liberdade de associao

    Art. 200 Paralisao de trabalho, seguida de violncia ou perturbao da ordem

    Art. 201 Paralisao de trabalho de interesse coletivo

    Art. 202 Invaso de estabelecimento industrial, comercial ou agrcola. sabotagem

    Art. 203 Frustrao de direito assegurado por lei trabalhista

    Art. 204 Frustrao de lei sobre a nacionalizao do trabalho

    Art. 205 Exerccio de atividade com infrao de deciso administrativa

    Art. 206 Aliciamento para o fim de emigrao

    Art. 207 Aliciamento de trabalhadores de um local para outro do territrio nacional

    Ttulo VDOS CRIMES CONTRA O SENTIMENTO RELIGIOSO E CONTRA O

    RESPEITO AOS MORTOS

  • Captulo I DOS CRIMES CONTRA O SENTIMENTO RELIGIOSO

    Art. 208 Ultraje a culto e impedimento ou perturbao de ato a ele relativo

    Captulo II DOS CRIMES CONTRA O RESPEITO AOS MORTOS

    Art. 209 Impedimento ou perturbao de cerimnia funerria

    Art. 210 Violao de sepultura

    Art. 211 Destruio, subtrao ou ocultao de cadver

    Art. 212 Vilipndio a cadver

    Bibliografia

  • NOTA DO AUTOR

    A Constituio Federal brasileira, em seu art. 1, definiu o perfil poltico-constitucional do Brasilcomo o de um Estado Democrtico de Direito. Trata-se do mais importante dispositivo da Carta de1988, pois dele decorrem todos os princpios fundamentais do Estado brasileiro.

    Estado Democrtico de Direito muito mais do que simplesmente Estado de Direito. Este ltimoassegura a igualdade meramente formal entre os homens, e tem como caractersticas: a) a submissode todos ao imprio da lei; b) a diviso formal do exerccio das funes derivadas do poder, entre osrgos executivos, legislativos e judicirios, como forma de evitar a concentrao de foras ecombater o arbtrio; c) o estabelecimento formal de garantias individuais; d) o povo como origemformal de todo e qualquer poder; e) a igualdade de todos perante a lei, na medida em que estosubmetidos s mesmas regras gerais, abstratas e impessoais.

    Embora configurasse relevantssimo avano no combate ao arbtrio do absolutismo monrquico, aexpresso Estado de Direito ainda carecia de um contedo social.

    Pela concepo jurdico-positivista do liberalismo burgus, ungida da necessidade de normasobjetivas inflexveis, como nico mecanismo para conter o arbtrio do Absolutismo monrquico,considerava-se Direito apenas aquilo que se encontrava formalmente disposto no ordenamento legal,sendo desnecessrio qualquer juzo de valor acerca de seu contedo. A busca da igualdade secontentava com a generalidade e impessoalidade da norma, a qual garante a todos um tratamentoigualitrio, ainda que a sociedade seja totalmente injusta e desigual.

    Tal viso defensiva do Direito constitua um avano e uma necessidade para a poca, em quepredominavam os abusos e mimos do monarca sobre padres objetivos de segurana jurdica, demaneira que se tornara uma obsesso da ascendente classe burguesa a busca da igualdade por meiode normas gerais, realando-se a preocupao com a rigidez e a inflexibilidade das regras. Nessecontexto, qualquer interpretao que refugisse viso literal do texto da lei poderia ser confundidacom subjetivismo arbitrrio, o que favoreceu o surgimento do positivismo jurdico como garantia doEstado de Direito. Por outro lado, a igualdade formal, por si s, com o tempo, acabou revelando-seuma garantia incua, pois embora todos estivessem submetidos ao imprio da letra da lei, no haviacontrole sobre seu contedo material, o que levou substituio do arbtrio do rei pelo dolegislador.

    Em outras palavras: no Estado Formal de Direito, todos so iguais porque a lei igual para todos,e nada mais. No plano concreto e social no existe interveno efetiva do Poder Pblico, pois este jfez a sua parte ao assegurar a todos as mesmas oportunidades, do ponto de vista do aparato legal. Deresto, cada um por si.

    Ocorre que as normas, embora genricas e impessoais, podem ser socialmente injustas quanto aoseu contedo. perfeitamente possvel um Estado de Direito, com leis iguais para todos, sem que, noentanto, se realize justia social. que no h discusso sobre os critrios de seleo de condutasdelituosas utilizadas pelo legislador. A lei no reconhece como crime uma situao preexistente,mas, ao contrrio, cria o crime. No existe necessidade de se fixar um contedo material para o fatotpico, pois a vontade suprema da lei dotada de poder absoluto para eleger como tal o que bementender, sendo impossvel qualquer discusso acerca do seu contedo.

    Diante disso, pode-se afirmar que a expresso Estado de Direito, por si s, caracteriza agarantia incua de que todos esto submetidos ao imprio da lei, cujo contedo fica em aberto,

  • limitado apenas impessoalidade e no violao de garantias individuais mnimas.Por essa razo, nosso constituinte foi alm, afirmando que o Brasil no apenas Estado de

    Direito, mas Estado Democrtico de Direito.Estado Democrtico de Direito significa no s aquele que impe a submisso de todos ao

    imprio da lei, mas aquele em que as leis possuem contedo e adequao social, descrevendo comoinfraes penais somente os fatos que realmente colocam em perigo bens jurdicos fundamentais paraa sociedade. Sem esse contedo, a norma se configurar como atentatria aos princpios bsicos dadignidade humana.

    Verifica-se no apenas pela proclamao formal da igualdade entre todos os homens, mas naimposio de metas e deveres quanto construo de uma sociedade livre, justa e solidria, agarantia do desenvolvimento nacional, a erradicao da pobreza e da marginalizao, pela reduodas desigualdades sociais e regionais, pela promoo do bem comum, pelo combate ao preconceitode raa, cor, origem, sexo, idade e quaisquer outras formas de discriminao (CF, art. 3 , I a IV),pelo pluralismo poltico e liberdade de expresso das ideias, pelo resgate da cidadania, pelaafirmao do povo como fonte nica do poder e pelo respeito inarredvel da dignidade humana.

    A norma penal, portanto, em um Estado Democrtico de Direito no somente aquela queformalmente descreve um fato como infrao penal, pouco importando se ele ofende ou no osentimento social de justia; ao contrrio, sob pena de colidir com a Constituio, o tipoincriminador dever obrigatoriamente selecionar, dentre todos os comportamentos humanos, aquelesque de fato possuem real lesividade social.

    Sendo o Brasil um Estado Democrtico de Direito, por reflexo, seu Direito Penal h de serlegtimo, democrtico e obediente aos princpios constitucionais que o informam, passando o tipopenal a ser uma categoria aberta, cujo contedo deve ser preenchido em consonncia com osprincpios derivados desse perfil poltico-constitucional. No mais se admitem critrios absolutos nadefinio dos crimes, os quais passam a ter exigncias de ordem formal (somente a lei podedescrev-los e cominar-lhes uma pena correspondente) e material (o seu contedo deve serquestionado luz dos princpios constitucionais derivados do Estado Democrtico de Direito).

    Pois bem. Do Estado Democrtico de Direito parte um gigantesco tentculo, a regular e orientartodo o Direito Penal. Trata-se de um brao genrico e abrangente, que deriva direta e imediatamentedesse moderno perfil poltico do Estado brasileiro, do qual decorrem inmeros outros princpiosprprios do Direito Penal, que nele encontram guarida a orientar o legislador na definio dascondutas delituosas. Estamos falando do princpio da dignidade humana (CF, art. 1, III).

    Podemos ento afirmar que do Estado Democrtico de Direito parte o princpio da dignidadehumana, orientando toda a formao do Direito Penal. Qualquer construo tpica cujo contedocontrariar e afrontar a dignidade humana ser materialmente inconstitucional visto que atentatria aoprprio fundamento da existncia de nosso Estado.

    Cabe, portanto, ao operador do Direito, e principalmente ao juiz, exercer controle tcnico deverificao da constitucionalidade de todo tipo penal e de toda adequao tpica, de acordo com oseu contedo. Se afrontoso dignidade humana, dever ser expurgado do ordenamento jurdico.

    Em outras situaes, o tipo, abstratamente, pode no ser contrrio Constituio, mas, emdeterminado caso especfico, o enquadramento de uma conduta em sua definio pode revelar-seatentatrio ao mandamento constitucional (p. ex., enquadrar no tipo do furto a subtrao de umatampinha de refrigerante).

  • A dignidade humana, assim, orienta o legislador no momento de criar um novo delito e ooperador, no instante em que vai realizar a atividade de adequao tpica.

    Com isso, pode-se afirmar que a norma penal em um Estado Democrtico de Direito no apenasaquela que formalmente descreve um fato como infrao penal, pouco importando se ele ofende ouno o sentimento social de justia; ao contrrio, sob pena de colidir com a Constituio, o tipoincriminador dever obrigatoriamente selecionar, dentre todos os comportamentos humanos, aquelesque possuem de fato real lesividade social.

    Sendo a norma penal, princpio bsico da Repblica Federativa do Brasil, constituda em EstadoDemocrtico de Direito (CF, art. 1, III), uma lei com essas caractersticas de mera discriminaoformal ser irremediavelmente inconstitucional.

    Assim, o tipo penal ou a sua aplicao, quando, a pretexto de cumprir uma funo de controlesocial, desvincular-se totalmente da realidade, sem dar importncia existncia de algum efetivodano ou leso social, padecer irremediavelmente do vcio de incompatibilidade vertical com oprincpio constitucional da dignidade humana.

    imperativo do Estado Democrtico de Direito a investigao ontolgica do tipo incriminador.Crime no apenas aquilo que o legislador diz s-lo (conceito formal), uma vez que nenhumaconduta pode, materialmente, ser considerada criminosa se, de algum modo, no colocar em perigovalores fundamentais da sociedade.

    Imaginemos um tipo com a seguinte descrio: manifestar ponto de vista contrrio ao regimepoltico dominante ou opinio contrria orientao poltica dominante. Pena: 6 meses a 1 ano dedeteno.

    Por evidente, a par de estarem sendo obedecidas as garantias de exigncia de subsuno formal ede veiculao em lei, materialmente esse tipo no teria qualquer subsistncia por ferir o princpio dadignidade humana e, por conseguinte, no resistir ao controle de compatibilidade vertical com osprincpios insertos na ordem constitucional.

    Tipos penais que se limitem a descrever formalmente infraes penais, independentemente de suaefetiva potencialidade lesiva, atentam contra a dignidade da pessoa humana.

    Nesse passo, convm lembrar a lio de Celso Antnio Bandeira de Mello: Violar um princpio muito mais grave do que transgredir uma norma. A desateno ao princpio implica ofensa noapenas a um especfico mandamento obrigatrio, mas a todo o sistema de comandos. a mais graveforma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalo do princpio atingido, porquerepresenta ingerncia contra todo o sistema, subverso de seus valores fundamentais, contumliairremissvel a seu arcabouo lgico e corroso de sua estrutura mestra[1].

    Aplicar a justia de maneira plena, e no apenas formal, implica, portanto, aliar ao ordenamentojurdico positivo a interpretao evolutiva, calcada nos costumes e nas ordens normativas locais,erigidas sobre padres culturais, morais e sociais de determinado grupo social ou que estejamligados ao desempenho de uma atividade.

    Os princpios constitucionais e as garantias individuais devem atuar como balizas para a corretainterpretao e a justa aplicao das normas penais, no se podendo cogitar de uma aplicaomeramente robotizada dos tipos incriminadores, ditada pela verificao rudimentar da adequaotpica formal, descurando-se de qualquer apreciao ontolgica do injusto.

    Da dignidade humana, princpio genrico e reitor do Direito Penal, partem outros princpios maisespecficos, os quais so transportados para dentro daquele princpio maior, tal como passageiros de

  • uma embarcao.Dessa forma, do Estado Democrtico de Direito decorre o princpio reitor de todo o Direito

    Penal, que o da dignidade humana, adequando-o ao perfil constitucional do Brasil e erigindo-o categoria de Direito Penal Democrtico. Da dignidade humana, por sua vez, derivam outrosprincpios mais especficos, os quais propiciam um controle de qualidade do tipo penal, isto , sobreo seu contedo, em inmeras situaes especficas da vida concreta.

    Os mais importantes princpios penais derivados da dignidade humana so: legalidade,insignificncia, alteridade, confiana, adequao social, interveno mnima, fragmentariedade,proporcionalidade, humanidade, necessidade e ofensividade[2].

    De pouco adiantaria a construo de um sistema liberal de garantias se o legislador tivessecondies de eleger de modo autoritrio e livre de balizas quais os bens jurdicos a merecerproteo. Importa, portanto, mediante critrios precisos e nada vagos, quais so esses bens, nicos areceber a proteo da esfera mais rigorosa e invasiva do ordenamento legal, com a lembrana de queo enfoque a ser conferido no o de um instrumento opressivo em defesa do aparelho estatal, mas ode um complexo de regras punitivas tendentes a limitar o arbtrio e a excessiva atuao do Estado naesfera da liberdade do indivduo.

    Com base nessas premissas, deve-se estabelecer uma limitao eleio de bens jurdicos porparte do legislador, ou seja, no todo e qualquer interesse que pode ser selecionado para serdefendido pelo Direito Penal, mas to somente aquele reconhecido e valorado pelo Direito, deacordo com seus princpios reitores.

    O tipo penal est sujeito a um permanente controle prvio (ex ante), no sentido de que olegislador deve guiar-se pelos valores consagrados pela dialtica social, cultural e histrica,conformada no esprito da Constituio, e posterior, estando sujeito ao controle deconstitucionalidade concentrado e difuso.

    A funo da norma a proteo de bens jurdicos a partir da soluo dos conflitos sociais, razopela qual a conduta somente ser considerada tpica se criar uma situao de real perigo para acoletividade.

    De todo o exposto, podemos extrair as seguintes consideraes:1. o Direito Penal brasileiro s pode ser concebido luz do perfil constitucional do Estado

    Democrtico de Direito, que o Brasil, e de seus fundamentos;2. dentre esses fundamentos, destaca-se o respeito dignidade humana, que tambm atua como um

    princpio geral reitor que engloba os demais princpios contensores do Direito Penal;3. tais princpios buscam uma definio material do crime, isto , de acordo com seu contedo;4. estes contornos tornam o tipo legal uma estrutura bem distinta da concepo meramente

    descritiva do incio do sculo XIX, de modo que o processo de adequao de um fato passa asubmeter-se a rgida apreciao axiolgica;

    5. o legislador, no momento de escolher os interesses que merecero a tutela penal, bem como ooperador do direito, no instante em que vai proceder adequao tpica, devem, forosamente,verificar se o contedo material daquela conduta atenta contra a dignidade humana ou os princpiosque dela derivam. Em caso positivo, estar manifestada a inconstitucionalidade substancial da normaou daquele enquadramento, devendo ser exercitado o controle tcnico, afirmando aincompatibilidade vertical com o Texto Magno.

    com base nesses contornos iniciais que adentraremos o estudo da Parte Especial, com a

  • convico de que um fato, para ser considerado tpico, necessita muito mais do que a mera subsunoformal, requisito que bastava ao Direito Penal positivista do sculo XIX, mas se revela insuficientepara os dias de hoje, em que se discute muito mais a sua funo pacificadora e reguladora dasrelaes sociais dialticas e seu contedo material, do que o rigor inflexvel de uma dogmticafechada e vazia de contedo.

    1. Celso Antnio Bandeira de Mello, Curso de direito administrativo, 5. ed., So Paulo, Malheiros, 1994, p. 451.2. Cf. estudo sobre estes princpios em Fernando Capez, Curso de direito penal;parte geral, 3. ed., So Paulo, Saraiva, p. 16-24 e

    34.

  • Ttulo IDOS CRIMES CONTRA A PESSOA

    DOS CRIMES CONTRA A PESSOA

    CONCEITOO Ttulo I da Parte Especial do Cdigo Penal cuida somente dos crimes contra a pessoa e est

    dividido em seis captulos: Dos crimes contra a vida; Das leses corporais; Da periclitao davida e da sade; Da rixa; Dos crimes contra a honra; e Dos crimes contra a liberdadeindividual. Na arguta lio de Nlson Hungria, A pessoa humana, sob duplo ponto de vistamaterial e moral, um dos mais relevantes objetos da tutela penal. No a protege o Estado apenaspor obsquio ao indivduo, mas, principalmente, por exigncia de indeclinvel interesse pblico ouatinente a elementares condies da vida em sociedade. Pode-se dizer que, parte os que ofendemou fazem periclitar os interesses especficos do Estado, todos os crimes constituem, em ltimaanlise, leso ou perigo de leso contra a pessoa. No para atender a uma diferenciao essencialque os crimes particularmente chamados contra a pessoa ocupam setor autnomo entre as speciesdelictorum. A distino classificadora justifica-se apenas porque tais crimes so os que maisimediatamente afetam a pessoa. Os bens fsicos ou morais que eles ofendem ou ameaam estointimamente consubstanciados com a personalidade humana. Tais so: a vida, a integridadecorporal, a honra e a liberdade[1].

    Captulo IDOS CRIMES CONTRA A VIDA

    O Cdigo Penal tipifica os seguintes crimes contra a vida: homicdio (art. 121); induzimento, instigao ou auxlio a suicdio (art. 122); infanticdio (art. 123); aborto (arts. 124 a 128).

    Art. 121 HOMICDIO

    1. CONCEITOHomicdio a morte de um ser humano provocada por outro ser humano. a eliminao da vida

    de uma pessoa praticada por outra. O homicdio o crime por excelncia[2]. Como diziaImpallomeni, todos os direitos partem do direito de viver, pelo que, numa ordem lgica, o primeirodos bens o bem vida. O homicdio tem a primazia entre os crimes mais graves, pois o atentadocontra a fonte mesma da ordem e segurana geral, sabendo-se que todos os bens pblicos e privados,todas as instituies se fundam sobre o respeito existncia dos indivduos que compem o agregadosocial[3].

  • 2. OBJETO JURDICOObjeto jurdico do crime o bem jurdico, isto , o interesse protegido pela norma penal. A

    disposio dos ttulos e captulos da Parte Especial do Cdigo Penal obedece a um critrio que levaem considerao o objeto jurdico do crime, colocando-se em primeiro lugar os bens jurdicos maisimportantes: vida, integridade corporal, honra, patrimnio etc. Desse modo, a Parte Especial doCdigo Penal inaugurada com o delito de homicdio, que tem por objeto jurdico a vida humanaextrauterina. O ataque vida intrauterina incriminado pelos tipos de aborto (arts. 124 a 126).Discute-se acerca do conceito de vida. conhecido o aforismo de Galeno viver respirar epor extenso o de Casper viver respirar; no ter respirado no ter vivido[4]. E. MagalhesNoronha entende inexata essa conceituao, pois apneia no morte. Pode nascer-se asfxico semque se deixe de estar vivo. A respirao prova de vida, porm esta se demonstra por outros meios:batimentos do corao, movimento circulatrio etc.[5]. E, fazendo aluso ao ensinamento deVincenzo Manzini, completa: No sentido do art. 121, vida o estado em que se encontra um serhumano animado, normais ou anormais que sejam suas condies fsico-psquicas. A noo de vidatira-se ex adverso daquele de morte[6].

    3. OBJETO MATERIALGenericamente, objeto material de um crime a pessoa ou coisa sobre as quais recai a conduta.

    o objeto da ao. No se deve confundi-lo com o objeto jurdico, que o interesse protegido pela leipenal. Assim, o objeto material do homicdio a pessoa sobre quem recai a ao ou omisso. Oobjeto jurdico o direito vida.

    4. ELEMENTOS DO TIPO4.1. Conceito

    O tipo incriminador, ou seja, aquele que prev uma infrao penal, consiste na descrio abstratada conduta humana feita pela lei penal e correspondente a um fato criminoso. O tipo , portanto, ummolde criado pela lei, no qual est descrito o crime com todos os seus elementos, de modo que aspessoas saibam que s cometero algum delito se vierem a realizar uma conduta idntica constantedo modelo legal. A generalidade da descrio tpica elimina a sua prpria razo de existir, criandoinsegurana no meio social e violando o princpio da legalidade, pois a garantia poltica do cidadoest em que somente haver atuao invasiva do Estado em sua esfera de liberdade se ele realizar umcomportamento que corresponda taxativamente a todos os elementos da definio legal. O tipo composto dos seguintes elementos:

    a) Objetivos: referem-se ao aspecto material do fato. Existem concretamente no mundo dos fatose s precisam ser descritos pela norma. So elementos objetivos: o objeto do crime, o lugar, otempo, os meios empregados, o ncleo do tipo (o verbo) etc.

    b) Normativos: ao contrrio dos descritivos, seu significado no se extrai da mera observao,sendo imprescindvel um juzo de valorao jurdica, social, cultural, histrica, poltica, religiosa,bem como de qualquer outro campo do conhecimento humano. Por exemplo: mulher honesta,constante do revogado art. 219 do CP, e documento. No primeiro caso, temos o elementonormativo extrajurdico ou moral, uma vez que o significado depende de um juzo de valorao querefoge ao mbito do direito; na segunda hiptese, o elemento jurdico, pois o conceito de

  • documento extrado a partir do conhecimento jurdico.c) Subjetivos: a finalidade especial do agente exigida pelo tipo para que este se configure. Por

    exemplo, o revogado art. 219 do CP: Raptar mulher honesta (..) com fim libidinoso. Nesse caso,no bastava o dolo de raptar; era tambm necessrio o fim especial de manter relaes lascivas coma vtima. Assim, quando um tipo tiver elemento subjetivo, s haver fato tpico se presentes o dolode realizar o verbo do tipo + a finalidade especial. O elemento subjetivo do tipo, portanto, no seconfunde com o dolo de praticar o verbo; algo mais, ou seja, a finalidade especial exigidaexpressamente pelo tipo. o que a doutrina tradicional denomina dolo especfico. Quando a infraofor dolosa, mas o tipo no exigir qualquer finalidade especial, ser suficiente o dolo genrico. Emcontrapartida, quando, alm do dolo, o modelo incriminador fizer expressa referncia a um fimespecial, ser imprescindvel que esteja presente o dolo especfico. Assim, se, por exemplo, Aesquarteja a vtima em pedacinhos, certamente existe a conscincia e a vontade de produzir-lhe oresultado morte, configurando-se o homicdio doloso. Esse tipo no exige qualquer finalidadeespecial; logo, para o aperfeioamento integral da figura tpica irrelevante se o crime se deu comeste ou aquele fim. Para o homicdio, basta a vontade de praticar o verbo, de realizar o resultado,sem qualquer finalidade especial.

    4.2. Ao nuclearA ao nuclear da figura tpica refere-se a um dos elementos objetivos do tipo penal. expressa

    pelo verbo, que exprime uma conduta (ao ou omisso) que a distingue dos demais delitos. O delitode homicdio tem por ao nuclear o verbo matar, que significa destruir ou eliminar, no caso, a vidahumana, utilizando-se de qualquer meio capaz de execuo.

    4.3. Ao fsicaO delito de homicdio crime de ao livre, pois o tipo no descreve nenhuma forma especfica

    de atuao que deva ser observada pelo agente. Desse modo, o agente pode lanar mo de todos osmeios, que no s materiais, para realizar o ncleo da figura tpica. Pode-se matar:

    a) Por meios fsicos (mecnicos, qumicos ou patognicos): dentre os meios mecnicosincluem-se os instrumentos contundentes, perfurantes, cortantes; dentre os meios qumicos incluem-seas substncias corrosivas (como, p. ex., o cido sulfrico), que so geralmente utilizadas para causaro envenenamento do indivduo; finalmente dentre os patognicos incluem-se os vrus letais (como ovrus da Aids). Vejamos os seguintes exemplos: 1 ) O agente portador do vrus da Aids e conscientede sua natureza letal o transmite intencionalmente ao seu parceiro mediante ato de libidinagem. Amorte da vtima far com que o agente responda pelo delito de homicdio doloso consumado[7].Nesse sentido j se posicionou o Superior Tribunal de Justia: em havendo dolo de matar, a relaosexual forada dirigida transmisso do vrus da Aids idnea para a caracterizao da tentativa dehomicdio[8]. 2) O agente, sendo portador desse vrus e sabendo que letal, o injeta com umaseringa na vtima, a qual ele havia usado anteriormente, com o deliberado propsito de transmiti-lo.A posterior morte da vtima far com que responda pelo delito de homicdio doloso consumado.

    b) Por meios morais ou psquicos: o agente se serve do medo ou da emoo sbita para alcanarseu objetivo. meio psquico, por exemplo, o usado pelo personagem de Monteiro Lobato, fazendodolosamente o amigo apopltico explodir em estrondosas gargalhadas e, assim, o matando, por efeitode hbil anedota contada aps lauta refeio[9]. E podem os meios materiais associar-se aos

  • morais, como no caso de o marido desalmado que, custa de sevcias, maus-tratos etc., vaidebilitando o organismo da esposa, tornando-a fraca e enferma, e acabando por lhe dar o golpe demisericrdia com a falsa comunicao da morte do filho[10].

    c) Por meio de palavras: outros casos existem em que no h, como escreve Soler, descargaemotiva, mas o emprego da palavra, que, no sendo vulnerante, atua, contudo, to eficazmente comoo punhal, tal o caso de quem diz a um cego para avanar em direo a um despenhadeiro[11].

    d) Por meio direto: age-se contra o corpo da vtima, como, por exemplo, desferindo-lhe facadas.e) Por meio indireto: quando se lana mo de meio que propicie a morte por fator relativamente

    independente do criminoso ou de seu contato direto com a vtima, como, por exemplo, atra-la paralugar onde uma fera a ataque ou fique exposta a descarga de forte corrente eltrica.

    f) Por ao ou omissoAo. o comportamento positivo, movimentao corprea, facere. Exemplos: empurrar a vtima

    para um precipcio; desferir tiros com arma de fogo; desferir facadas etc.Omisso. o comportamento negativo, a absteno de movimento, o non facere. A omisso um

    nada; logo, no pode causar coisa alguma. Quem se omite nada faz, portanto, nada causa. Assim, oomitente no deve responder pelo resultado, pois no o provocou. A omisso penalmente relevante a constituda de dois elementos: o non facere (no fazer) e o quod debeatur (aquilo que tinha odever jurdico de fazer). No basta, portanto, o no fazer; preciso que, no caso concreto, hajauma norma determinando o que devia ser feito. Essa a chamada teoria normativa, a adotada peloCdigo Penal. O art. 13, 2, do CP prev trs hipteses em que est presente o dever jurdico deagir. Ausente este, no comete o agente crime algum. Do contrrio, como bem acentua Enrique Cury,qualquer um poderia ser acusado de no haver feito algo, para evitar um certo resultado. Por nohaver imprimido educao do filho a direo adequada, inculpando-lhe o respeito pela vidahumana, castigar-se-ia o pai do homicida; o transeunte, por no haver prestado ateno ao queocorria ao seu redor, e por no ter, em consequncia, prevenido oportunamente a quem iria ser vtimade um acidente; o arquiteto, por no haver projetado maiores cautelas, para impedir o acesso ulteriorde ladres. Assim, a extenso dos tipos no teria limites, e a prtica por omisso se transformarianum instrumento perigoso nas mos de todo poder irresponsvel[12]. Desse modo, no configuradanenhuma das hipteses do art. 13, 2, do CP, no possvel vincular o omitente ao resultadonaturalstico. Por exemplo: algum que simplesmente nega alimento a um moribundo, no evitandoque venha a morrer de inanio, por no se enquadrar em nenhuma das hipteses do art. 13, 2, doCP, no infringe o dever jurdico de agir (mas to somente um dever moral), no podendo responderpor homicdio doloso ou culposo. No caso, responder apenas por sua omisso (CP, art. 135). Noentanto, presente uma das hipteses do dever jurdico de agir, responder o agente pelo homicdio,doloso ou culposo, segundo a omisso for dolosa ou culposa.

    Exemplos:a) Dever legal (imposto por lei): a me que, tendo por lei a obrigao de cuidado, vigilncia e

    proteo, deixa de alimentar o filho, morrendo este de inanio. Dever responder por homicdiodoloso, se quis ou assumiu o resultado morte, ou culposo, se agiu com negligncia.

    b) Dever do garantidor (derivado de contrato ou liberalidade do omitente): a bab ou umaamiga que se oferece para tomar conta do beb, assumindo a responsabilidade de zelar por ele,permite que caia na piscina e morra afogado.

  • c) Dever por ingerncia na norma (omitente cria o perigo e torna-se obrigado a evit-lo):quem joga o amigo em um rio, por ter criado o risco do resultado, est obrigado a impedir o seuafogamento.

    Em todos esses exemplos, o agente, por ter o dever jurdico de impedir o resultado, de acordocom as hipteses do art. 13, 2, do Cdigo Penal, responde pelo resultado morte, a ttulo de dolo ouculpa. So os chamados crimes omissivos imprprios (tambm conhecidos como omissivos impuros,esprios, promscuos ou comissivos por omisso). Cumpre trazer aqui outra espcie de crimeomissivo: o denominado omissivo por comisso. Nesse caso h uma ao provocadora da omisso.Exemplo: o chefe de uma repartio impede que sua funcionria, que est passando mal, sejasocorrida. Se ela morrer, o chefe responder pela morte por crime comissivo ou omissivo? Seria porcrime omissivo por comisso. Essa categoria no reconhecida por grande parte da doutrina. Pode-se dar tambm a participao por omisso. Ocorre quando o omitente, tendo o dever jurdico deevitar o resultado, concorre para ele ao quedar-se inerte. Nesse caso responder como partcipe.Exemplo: policiais militares que aps lograrem capturar o bandido torturam-no at a sua morte,sendo a cena assistida por outros policiais que nada fazem para impedir tal resultado. Ora, essespoliciais, ao se quedarem inertes, aderiram com a sua omisso vontade dos demais policiais querealizavam a ao criminosa, devendo, portanto, ser responsabilizados pela participao no crime dehomicdio atravs de uma conduta omissiva. Quando no existir o dever de agir, no h que se falarem participao por omisso, mas em conivncia (crime silenti) ou participao negativa, hipteseem que o omitente no responde pelo resultado, mas por sua mera omisso (CP, art. 135).

    4.4. Crime material e prova da materialidade (exame de corpo de delito)Crime material. O delito de homicdio classifica-se como crime material, que aquele que se

    consuma com a produo do resultado naturalstico. O tipo descreve conduta e resultado(naturalstico), sendo certo que o resultado morte da vtima h de se vincular pelo nexo causal conduta do agente. Nexo causal o elo de ligao concreto, fsico, material e natural que seestabelece entre a conduta do agente e o resultado naturalstico, por meio do qual possvel dizer seaquela deu ou no causa a este. Ele s tem relevncia nos crimes cuja consumao depende doresultado naturalstico[13].

    Prova da materialidade (exame de corpo de delito). o meio de prova pelo qual possvel aconstatao da materialidade do delito. certo que nem mesmo a confisso do acusado da prticadelitiva prova por si s idnea a suprir a ausncia do corpo de delito; avente-se, por exemplo, ahiptese em que o confitente foi coagido a declarar-se autor do crime. Essa vedao, alis, expressa no art. 158 do Cdigo de Processo Penal. Por desrespeito a essa regra legal que sucedeuo famoso erro judicirio de Araguari que resultou na condenao dos irmos Naves pelo supostohomicdio de Benedito Pereira Caetano, que, anos depois, retornava, vivo e so, da Bolvia, paraonde se mudara, levando dinheiro subtrado a seus pais. A confisso dos acusados havia sidoextorquida pela violncia de um delegado militar[14]. O Cdigo de Processo Penal prev duasespcies de exame de corpo de delito, quais sejam:

    a) Exame de corpo de delito direto: sua realizao imprescindvel nas infraes penais quedeixam vestgios. Realiza-se mediante a inspeo e autpsia do cadver, na busca da causa mortis,sendo tal exame devidamente documentado por laudo necroscpico.

    b) Exame de corpo de delito indireto: no sendo possvel o exame de corpo de delito, por

  • haverem desaparecido os vestgios, a prova testemunhal poder suprir-lhe a falta (CPP, art. 167).Desse modo, a partir da palavra de testemunhas e da anlise de documentos demonstrativos darealidade tanatolgica (exame indireto) possvel constatar o resultado naturalstico. Por vezes,contudo, h a certeza da ocorrncia do delito de homicdio mas no se logrou achar o cadver, e certo que se somente o corpo da vtima fosse a prova do crime muitos casos restariam impunes.Ilustremos essa hiptese com o seguinte exemplo: dois indivduos, dentro de uma barca no rioUruguai, foram vistos a lutar renhidamente, tendo sido um deles atirado pelo outro correnteza, parano mais aparecer. Foram baldadas as pesquisas para o encontro do cadver. Ora, se, no obstante afalta do cadver, as circunstncias eram de molde a excluir outra hiptese que no fosse a da morteda vtima, seria intolervel deixar-se de reconhecer, em tal caso, o crime de homicdio. Faltava acerteza fsica, mas havia a absoluta certeza moral da existncia do homicdio[15]. Desse modo, aausncia do corpo da vtima no implica ausncia do corpo de delito. Alerte-se para o fato de que aausncia do cadver com a consequente comprovao da materialidade delitiva por testemunhas(exame de corpo de delito indireto) nem sempre acarretar a presuno da prtica de um homicdio,haja vista que, conforme adverte Nlson Hungria, desde que seja formulada uma hiptese deinexistncia do evento morte, no admissvel uma condenao a ttulo de homicdio. Averossimilhana, por maior que seja, no jamais a verdade ou a certeza, e somente esta autorizauma sentena condenatria. Condenar um possvel delinquente condenar um possvel inocente[16].4.5. Sujeito ativo

    Sujeito ativo da conduta tpica o ser humano que pratica a figura tpica descrita na lei, isoladaou conjuntamente com outros autores. O conceito abrange no s aquele que pratica o ncleo dafigura tpica (quem mata), como tambm o partcipe, que aquele que, sem praticar o verbo (ncleo)do tipo, concorre de algum modo para a produo do resultado; por exemplo: o agente que vigia olocal para que os seus comparsas tranquilamente pratiquem o homicdio, nesse caso sem realizar aconduta principal, ou seja, o verbo (ncleo) da figura tpica matar , colaborou para que os seuscomparsas lograssem a produo do resultado morte.

    Trata-se de crime comum, que pode ser cometido por qualquer pessoa. A lei no exige nenhumrequisito especial. No se trata de crime prprio, que exige legitimidade ativa especial; nem mesmoreclama pluralidade de agentes (no crime plurissubjetivo). Porm, com a inovao legislativatrazida pela Lei n. 8.930/94, que alterou a redao do art. 1 da Lei n. 8.072/90, o homicdio serconsiderado crime hediondo quando praticado em atividade tpica de grupo de extermnio, ainda queexecutado por um s agente. Importante destacar a recente alterao legislativa da Lei n. 12.720, de27 de setembro de 2012, que tipificou a conduta de extermnio de seres humanos, no art. 288-A doCdigo Penal. H tambm o novo 6 do art. 121, cuja pena aumentada de 1/3 (um tero) at ametade se o crime for praticado por milcia privada, sob o pretexto de prestao de servio desegurana, ou por grupo de extermnio (includo pela Lei n. 12.720, de 2012).

    Se for cometido por intermdio de conduta omissiva, deve o sujeito ativo ter as condiespessoais que o fazem juridicamente obrigado a impedir o resultado, nos termos do art. 13, 2, doCdigo Penal.4.6. Sujeito passivo

    o titular do bem jurdico lesado ou ameaado. Pode ser direto ou imediato, quando for a pessoaque sofre diretamente a agresso (sujeito passivo material), ou indireto ou mediato, pois o Estado

  • (sujeito passivo formal) sempre atingido em seus interesses, qualquer que seja a infrao praticada,visto que a ordem pblica e a paz social so violadas. No caso do delito de homicdio, o sujeitopassivo qualquer pessoa com vida, o ser vivo, nascido de mulher[17]. Consoante oensinamento de Jos Frederico Marques: sujeito passivo do homicdio algum, isto , qualquerpessoa humana, o ser vivo nascido de mulher, luomo vivo, qualquer que seja sua condio de vida,de sade, ou de posio social, raa, religio, nacionalidade, estado civil, idade, convico polticaou status poenalis. Criana ou adulto, pobre ou rico, letrado ou analfabeto, nacional ou estrangeiro,branco ou amarelo, silvcola ou civilizado toda criatura humana, com vida, pode ser sujeitopassivo do homicdio, pois a qualquer ser humano reconhecido o direito vida que a leipenalmente tutela. O moribundo tem direito a viver os poucos instantes que lhe restam de existnciaterrena, e, por isso, pode ser sujeito passivo do homicdio. Assim tambm o condenado morte.Indiferente , por outro lado, que a vtima tenha sido, ou no, identificada[18]. Note-se que no importante perquirir o grau de vitalidade da vtima, ou seja, se ela tem poucos minutos de vida, ou,ento, se apresenta um quadro clnico vegetativo por no mais haver soluo mdica para o seu caso.Enquanto houver vida, ainda que sem qualidade, o homem ser sujeito passivo do delito dehomicdio.

    Entretanto, em se cuidando de destruio da vida intrauterina, o delito ser o de aborto. Quando seinicia a vida humana extrauterina? Para delimitar o incio da existncia vital extrauterina, basta quese analise o delito de infanticdio (art. 123), que uma forma especializada de homicdio, para severificar que se for praticado durante o parto, j considerado o delito do art. 123, e no o delitode aborto. Desse modo, se o agente, por exemplo, um mdico, que no se enquadra nas condies doprivilgio, asfixiar o neonato durante o parto, praticar o delito de homicdio. Contudo fica aquesto: quando realmente comea o nascimento para se fixar o momento do homicdio? Dizerapenas que durante o parto por demais genrico. preciso delimitar o exato instante em que seconfigurar o delito de aborto e o delito de homicdio. Para tanto, devemos lanar mo de diversosensinamentos da doutrina a esse respeito: Alfredo Molinario entende que o nascimento o completoe total desprendimento do feto das entranhas maternas[19]. Para Soler, inicia-se desde as dores doparto[20]. Para E. Magalhes Noronha, mesmo no tendo havido desprendimento das entranhasmaternas, j se pode falar em incio do nascimento, com a dilatao do colo do tero[21]. Najurisprudncia h julgado no sentido de que, provocada a morte do feto a caminho da luz, por atoomissivo ou comissivo de outrem que no a me, quando o ser nascente j fora encaixado com vidano espao para tanto reservado na pelve feminina, o crime de homicdio. Iniciado o trabalho departo, vindo a ocorrer a morte do feto por culpa do Mdico Assistente, no h como cogitar-se deaborto, ficando bem tipificado o crime de homicdio culposo[22]. Todas essas noes servem parase ter uma compreenso de que, dependendo do que for considerado o incio do nascimento, poder-se- estar diante ou do delito de aborto, ou infanticdio, se presente o privilgio, ou homicdio, seausente o privilgio.

    O delito de homicdio em sua capitulao legal no exige que a vtima detenha qualquer qualidadeespecfica. Contudo, atentar contra a vida do Presidente da Repblica, do Senado Federal, daCmara dos Deputados ou do STF poder configurar a hiptese do art. 29 da Lei n. 7.170/83 (Lei deSegurana Nacional); da mesma forma, matar vtima menor de 14 anos de idade, se crime dolosolevar o agente a incidir na causa especial de aumento de pena (de um tero), prevista na parte finaldo 4 do art. 121 do CP, acrescida pela Lei n. 8.069/90 Estatuto da Criana e do Adolescente

  • (ECA); e, finalmente, matar com inteno de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, tnico,racial ou religioso, poder caracterizar o crime de genocdio (Lei n. 2.889/56).

    No se deve confundir a pessoa do prejudicado pelo delito com o sujeito passivo. No crime dehomicdio, o sujeito passivo o morto, ao passo que prejudicados so todas as pessoas que dealguma forma dependiam economicamente do falecido, como seus filhos e a viva.

    5. ELEMENTO SUBJETIVOO fato tpico, tradicionalmente, composto de quatro elementos: conduta dolosa ou culposa +

    resultado naturalstico (s nos crimes materiais) + nexo causal (s nos crimes materiais) +tipicidade. A mera subsuno formal da ao ou omisso ao tipo no suficiente para operar o fatotpico, sendo imprescindvel que a atuao do agente tenha sido dolosa ou, quando prevista talmodalidade, culposa. Sem dolo e culpa no existe fato tpico; logo, no h crime. O CP s conheceas figuras do homicdio doloso e do culposo, de maneira que a ausncia de um desses elementosacarreta atipicidade, pois no h uma terceira forma de homicdio. O tipo penal, portanto, tem umaparte objetiva, consistente na correspondncia externa entre o que foi feito e o que est descrito nalei, e uma parte subjetiva, que o dolo e a culpa. Por essa razo, o caso fortuito e a fora maiorexcluem a conduta, dado que eliminam a parte subjetiva da infrao, excluindo dolo e culpa, omesmo ocorrendo com a coao fsica, ou com atos derivados de puro reflexo. O elemento subjetivodo homicdio doloso o dolo.

    Dolo. o elemento psicolgico da conduta. a vontade e a conscincia de realizar os elementosconstantes do tipo legal, isto , de praticar o verbo do tipo e produzir o resultado. Mais amplamente, a vontade manifestada pela pessoa humana de realizar a conduta. H diversas espcies de dolo:

    a) Direto ou determinado: o agente quer realizar a conduta e produzir o resultado. Exemplo: osujeito atira contra o corpo da vtima, desejando mat-la.

    b) Indireto ou indeterminado: divide-se em dolo eventual e alternativo. Na primeira espcie oagente no quer diretamente o resultado mas aceita a possibilidade de produzi-lo, como no caso dosujeito que dispara em seu adversrio prevendo e aceitando que os projteis venham a alcanartambm quem est por detrs; j na segunda espcie o agente no se importa em produzir este ouaquele resultado (quer ferir ou matar).

    Difere o dolo eventual da culpa consciente ou com previso. Nessa modalidade de culpa oagente prev o resultado criminoso, embora no o aceite, pois confia que o resultado no sobrevir,ao contrrio do dolo eventual, em que o agente prev o resultado, e no se importa que ele ocorra.Exemplo de dolo eventual: se eu continuar dirigindo assim, posso vir a matar algum, mas noimporta, se acontecer, tudo bem, eu vou prosseguir. Exemplo de culpa consciente: se eu continuardirigindo assim, posso vir a matar algum, mas estou certo de que isso, embora possvel, noocorrer. No primeiro exemplo o agente responder pelo homicdio na modalidade dolosa, ao passoque no segundo responder pelo homicdio na modalidade culposa.

    c) Dolo geral ou erro sucessivo, ou aberratio causae: o agente, aps realizar a conduta,supondo j ter produzido o resultado, pratica o que entende ser um exaurimento, e nesse momentoatinge a consumao. Por exemplo: A esfaqueia a vtima e pensa que a matou. Ao tentar ocultar ocadver, jogando-a ao mar, vem efetivamente a mat-la por afogamento. Haveria tentativa dehomicdio (pelas facadas) em concurso com homicdio culposo (foi praticar a ocultao de cadver e

  • acabou matando), ou homicdio doloso? Responder por homicdio doloso, pelo dolo geral.Elemento subjetivo. Homicdio tentado e leso corporal. Distino. Prova. No homicdio

    doloso, o elemento subjetivo o dolo (animus necandi ou occidendi), consistente na vontadeconsciente e livre de matar. o animus necandi que o difere das demais modalidades de crimes.Como, no entanto, na prtica, possvel verificar, nos casos de tentativa com resultado lesocorporal, se o agente agiu animado pelo dolo de matar ou de lesionar? Isso porque, dependendode qual tenha sido o dolo, o agente responder por homicdio tentado ou por leso corporal, sendoeste ltimo delito menos grave. Ou ento, como possvel, na prtica, afirmar que o agente agiucom dolo eventual e no com culpa consciente, sabido que nesta o resultado criminoso tambmprevisto pelo agente mas no querido? Essa distino importante na medida em que, firmada aculpa consciente, o agente responder pela modalidade culposa em vez da dolosa do homicdio. Pararesponder a tais questes necessrio se faz analisar os elementos e as circunstncias do fato externo.So circunstncias externas e que auxiliam nesse esclarecimento a sede da leso ou a violncia dosgolpes, o instrumento utilizado, pois quem, por exemplo, desfere inmeras e violentas pauladas nocrnio de um indivduo, com certeza, no age com o nimo de lesion-lo, mas de mat-lo. Comosustentava Hungria, o fim do agente se traduz, de regra, no seu ato. O sentido da ao (ou omisso), na grande maioria dos casos, inequvoco. Quando o evento morte est em ntima conexo com osmeios empregados, de modo que ao esprito do agente no podia deixar de apresentar-se comoresultado necessrio, ou ordinrio, da ao criminosa, seria intil, como diz Impallomeni, alegar-seque no houve o animus occidendi: o fato atestar sempre, inflexivelmente, que o acusado, a no serque se trate de um louco, agiu sabendo que o evento letal seria a consequncia da sua ao e,portanto, quis matar. sobre pressupostos de fato, em qualquer caso, que h de assentar o processolgico pelo qual se deduz o dolo distintivo do homicdio[23]. Com relao dificuldade paradistinguir na prtica a culpa consciente e o dolo eventual, Hungria esclarece: o que deve decidir, emtal caso, so ainda as circunstncias do fato, de par com os motivos do agente. Somente eles poderodemonstrar que o acusado agiu com perversa ou egostica indiferena, consciente de que seu atopoderia acarretar a morte da vtima e preferindo arriscar-se a produzir tal resultado, ao invs derenunciar prtica do ato (dolo eventual); ou se agiu apenas levianamente, na inconsideradapersuaso ou esperana de que no ocorresse o resultado previsto como possvel (culpa consciente).Se o fato, com seus elementos sensveis, equvoco, ou se h dvida irredutvel, ter-se-, ento, deaplicar o in dubio pro reo, admitindo-se a hiptese menos grave, que a da culpa consciente[24].

    Culpa. Vide o tpico homicdio culposo.

    6. MOMENTO CONSUMATIVO E PERCIAS MDICO--LEGAIS REALIZADAS PARA CONSTATAO DA CAUSA MORTIS6.1. Crime consumado

    aquele em que foram realizados todos os elementos constantes de sua definio legal (CP, art.14, I). A consumao do delito nada mais que a ltima fase das vrias pelas quais passa o crime (o chamado iter criminis veja comentrio sobre o tema no tpico n. 7). No caso dos crimesmateriais, como o homicdio, a consumao se d com a produo do resultado naturalstico morte.Trata-se de crime instantneo de efeitos permanentes. instantneo porque a consumao seopera em um dado momento, e de efeitos permanentes na medida em que, uma vez consumado, no h

  • como fazer desaparecer os seus efeitos. Em que momento possvel dizer que ocorreu o eventomorte, e, portanto, a consumao do crime de homicdio? A morte decorrente da cessao dofuncionamento cerebral, circulatrio e respiratrio. Distinguem-se a morte clnica que ocorre coma paralisao da funo cardaca e da respiratria , a morte biolgica que resulta da destruiomolecular e a morte cerebral que ocorre com a paralisao das funes cerebrais. A mortecerebral consiste na parada das funes neurolgicas segundo os critrios da inconscinciaprofunda sem reao a estmulos dolorosos, ausncia de respirao espontnea, pupilas rgidas,pronunciada hipotermia espontnea (temperatura excessivamente baixa), e abolio de reflexos[25].O critrio legal proposto pela medicina a chamada morte enceflica, em razo da Lei n. 9.434/97,que regula a retirada e transplante de tecidos, rgos e partes do corpo humano, com fins teraputicose cientficos. Prev o art. 3 da citada lei: A retirada post mortem de tecidos, rgos ou partes docorpo humano destinados a transplante ou tratamento dever ser precedida de diagnstico de morteenceflica, constatada e registrada por dois mdicos no participantes das equipes de remoo etransplante, mediante a utilizao de critrios clnicos e tecnolgicos definidos por resoluo doConselho Federal de Medicina. Heleno Fragoso, ao comentar o critrio legal proposto pelamedicina poca, tambm o da morte cerebral, afirma: se assim for, o jurista no pode deixar deadmitir que a vida humana subsiste at que se declare a cessao da atividade cerebral, noexcluindo, portanto, que, tal seja o caso, possa haver homicdio culposo ou doloso diante de simplesmorte clnica[26]. certo que h casos em que, mesmo aps a morte cerebral, rgos vitaiscontinuam funcionando, havendo, inclusive, exemplo de gestante que chegou a dar luz nessascondies. Entretanto este o melhor critrio; afinal, com a destruio irreversvel das clulas e dotecido enceflico, no mais h a mnima condio de vida, embora possa o corpo vegetar por algumtempo ainda.

    6.2. Percias mdico-legaisExame necroscpico. Trata-se de exame de corpo de delito direto, conforme anteriormente visto,

    realizado nas infraes penais que deixam vestgios. o meio pelo qual os peritos-mdicosconstatam a realidade da morte e buscam a sua causa (o CPP, em seu art. 162, utiliza o termoautpsia), cujas concluses ficaro consubstanciadas no chamado laudo de exame necroscpico. Oart. 162 do Cdigo de Processo Penal fixa o prazo de seis horas depois do bito para possibilitar arealizao desse exame. Segundo o Prof. J. W. Seixas Santos, O prazo de seis horas no foiarbitrariamente fixado pelo legislador; o mnimo para se tentar constatar a realidade da morte poisos seus sinais certos, incontestveis, alm de exguos, s so evidentes tardiamente. Veja-se que ashipfises comeam a se fixar entre 8 a 12 horas e a rigidez cadavrica se inicia depois da primeirahora da morte e se completa dentro de 58 horas e estes so apenas sinais provveis[27].

    Exumao. Exumar significa desenterrar, no caso, o cadver. O exame cadavrico realizado,como j estudado, aps a morte da vtima e antes de seu enterramento. Contudo, pode suceder que,uma vez sepultada a vtima, haja dvida acerca da causa de sua morte ou sobre a sua identidade.Nesses casos procede-se exumao. Melhor dizendo, em determinadas eventualidades, quando osepultamento se realizou sem prvia necropsia, ou quando esta foi levada a cabo mas surgiremdvidas posteriores, que reclamaram tal medida, mister se faz proceder exumao e necropsia, ou reviso duma necropsia anterior feita[28]. requisito para a sua realizao que a morte tenharesultado de uma ao criminosa ou que haja indcios dessa circunstncia[29]. A exumao tem o seu

  • disciplinamento previsto nos arts. 163 e seguintes do Cdigo de Processo Penal. O diplomaprocessual no faz qualquer meno a autorizao judicial para se proceder exumao, contudo,sem a referida autorizao, o ato de exumar pode implicar a configurao dos delitos previstos nosarts. 210 e 212 do CP (violao de sepultura e vilipndio de cadver)[30].

    7. TENTATIVATentativa. Crime doloso. Considera-se tentado o crime quando, iniciada a sua execuo, no se

    verifica o resultado naturalstico por circunstncias alheias vontade do agente (CP, art. 14, II).Tratando-se de crime material, o homicdio admite tentativa, que ocorrer quando, iniciada aexecuo do homicdio, este no se consumar por circunstncias alheias vontade do agente. Para atentativa, necessrio que o crime saia de sua fase preparatria e comece a ser executado, poissomente quando se inicia a execuo que haver incio de fato tpico. O crime percorre quatroetapas (iter criminis) at realizar-se integralmente: a) cogitao nessa fase o agente apenasmentaliza, idealiza, planeja, representa mentalmente a prtica do crime; b) preparao so os atosanteriores necessrios ao incio da execuo, mas que ainda no configuram incio de ataque ao bemjurdico, j que o agente ainda no comeou a realizar o verbo constante da definio legal (ncleodo tipo); c) execuo aqui o bem jurdico comea a ser atacado. Nessa fase o agente inicia arealizao do verbo do tipo e o crime j se torna punvel, ao contrrio das fases anteriores; d)consumao todos os elementos que se encontram descritos no tipo penal foram realizados. NlsonHungria nos traz um critrio distintivo entre ato preparatrio e incio de execuo: ato executivo (oude tentativa) o que ataca o bem jurdico; ato preparatrio o que possibilita, mas no ainda, doponto de vista objetivo, o ataque ao bem jurdico. Assim, tendo-se em vista o homicdio, sero atospreparatrios: a aquisio da arma ou do veneno, a procura do local propcio, o ajuste de auxiliares,o encalo do adversrio, a emboscada, o fazer pontaria com a arma de fogo, o sacar o punhal; seroatos executivos: o disparo do tiro, o deitar o veneno no alimento destinado vtima iludida, o brandiro punhal para atingir o adversrio. Nos casos de irredutvel dvida sobre se o ato constitui um ataqueou apenas uma predisposio para o ataque, o juiz ter de pronunciar o non liquet, negando atentativa[31]. Dessa distino entre as vrias etapas do crime resulta que o conceito de tentativa nose estende aos atos preparatrios. O crime tentado exige o comeo de execuo. que no se podedizer que h crime quando nem sequer h o perigo de dano ao bem jurdico penalmente protegido.Consoante o ensinamento de Nlson Hungria: enquanto no atinge esse minimum de atuaoobjetiva, a vontade criminosa, do ponto de vista penal, um nada jurdico[32]. Para ns, s hincio de execuo quando o sujeito comea a praticar o verbo do tipo, ou seja, quando comea amatar, a subtrair, a constranger etc. Assim, se o agente recebe um tapa no rosto e, prometendomatar o seu agressor, vai at a sua residncia, pega a sua arma de fogo, retorna ao local da briga e preso em flagrante momentos antes de efetuar o primeiro disparo, no h como falar em tentativa dehomicdio, pois o agente ainda no havia comeado a matar. O incio de execuo, portanto, ocorrecom a prtica do primeiro ato idneo, isto , apto a produzir a consumao, e inequvoco produodo resultado. Antes de apertar o gatilho, por mais que se esteja no limiar do ataque, ainda no serealizou o primeiro ato idneo a produzir a morte da vtima.

    H quatro espcies de tentativa:a) Tentativa imperfeita (ou propriamente dita): trata-se da hiptese em que o processo

    executivo foi interrompido ao meio, sem que o agente pudesse esgotar suas potencialidades de

  • hostilizao, como, por exemplo: aps desferir um tiro no brao da vtima o agente surpreendidopor terceiro, que retira a arma de suas mos impedindo-o de deflagrar o restante das balas contraaquela e, portanto, de realizar o intento homicida.

    b) Tentativa perfeita ou acabada (tambm denominada crime falho): assim ser consideradaquando o agente esgotar o processo de execuo do crime, fazendo tudo o que podia para matar,exaurindo a sua capacidade de vulnerao da vtima, que, no obstante, salva; por exemplo:embora o agente deflagre todas as balas do revlver contra a vtima, esta sobrevive. A dosagem dadiminuio da pena pela tentativa levar em considerao a distncia que, a final, separou o agenteda consumao pretendida.

    c) Tentativa branca (ou incruenta): aquela que no resulta qualquer ferimento na vtima.Ocorre na hiptese em que o agente, por ausncia de conhecimento no manuseio da arma, porexemplo, desfere vrios tiros contra a vtima, mas por erro de pontaria atinge a parede da casa. achamada tentativa branca de homicdio.

    d) Tentativa cruenta: quando a vtima sofre ferimentos.Tentativa e crime culposo. No combinam, isto , no cabe tentativa em crime culposo, na

    medida em que a vontade do agente no est dirigida para a produo do evento criminoso, nemmesmo assume o risco de produzi-lo. Tentativa iniciar a execuo de um crime querendo aproduo do resultado, mas no o realizando por circunstncias alheias sua vontade. Pressupe,portanto, ao dolosa. Magalhes Noronha1[33] bem nos mostra a contradio entre o crime culposoe a tentativa: quer a falta de previso, quer a previso sem a vontade opem-se tentativa. Carrara,com o rigor de sempre, escreveu: A essncia moral da culpa consiste na falta de previso doresultado. A essncia moral da tentativa consiste na previso de um resultado no obtido e a vontadede obt-lo. H, destarte, entre a culpa e a tentativa uma contradio de termos. Imaginar uma tentativade culpa imaginar uma monstruosidade lgica. No obstante, algum quer insinuar a possibilidadejurdica dessa monstruosidade lgica. De fato, tentativa e culpa so noes antiticas: naquela oagente fica aqum do que seria; nesta vai alm do que desejava. Assinala, ainda, o autor: adoutrina geralmente concorde na impossibilidade da tentativa, pois falta a vontade dirigida aoevento; no existe nexo causal subjetivo entre a ao do sujeito ativo e o resultado; a conduta doagente no , assim, meio para o evento. Em tais condies seria difcil identificar-se a tentativa decrime culposo. Reflita-se sobre o caso de um chauffeur que em carreira desenfreada no colheu ummenor, porque o salvou um transeunte. Poder-se- dizer que o motorista tentou praticar um crimeculposo?.

    8. DESISTNCIA VOLUNTRIA E ARREPENDIMENTO EFICAZDesistncia voluntria e arrependimento eficaz (CP, art. 15) so espcies de tentativa abandonada

    ou qualificada. Nelas o resultado no se produz por fora da vontade do agente, ao contrrio datentativa, em que atuam circunstncias alheias a essa vontade. So incompatveis com os crimesculposos, uma vez que se trata de tentativa que foi abandonada. Pressupe um resultado que o agentepretendia produzir mas que, num segundo momento, desistiu ou se arrependeu. Havendo a desistnciavoluntria ou arrependimento eficaz, desaparece a possibilidade de se aplicar a pena a ttulo detentativa. O agente s responder pelos atos at ento praticados como delitos autnomos. Ambos osinstitutos so aplicveis ao crime de homicdio.

  • Desistncia voluntria. Trata-se de voluntria interrupo do iter criminis; o agente interrompevoluntariamente a execuo do crime, impedindo a sua consumao. Por exemplo: o agente tem umrevlver municiado com seis projteis. Efetua dois disparos contra a vtima, no a acerta e, podendoprosseguir atirando, desiste por vontade prpria e vai embora. No ocorrer, contudo, a desistnciavoluntria nas hipteses em que o agente deixa de prosseguir no intento criminoso por supor que aarma j no contm cpsulas a serem deflagradas ou ento por achar que logrou produzir o eventomorte.

    Arrependimento eficaz. O agente, aps encerrar a execuo do crime, impede a produo doresultado naturalstico. Aqui a execuo do crime realizada inteiramente, e o resultado que vem aser impedido, ao contrrio da desistncia voluntria. Por exemplo: o agente descarrega sua arma defogo na vtima, ferindo-a gravemente, mas, arrependendo-se, presta-lhe imediato e exitoso socorro,impedindo o evento letal.

    Tanto na desistncia voluntria quanto no arrependimento eficaz o agente impede que sobrevenhao resultado por vontade prpria. Dessa forma, afasta-se a possibilidade de se aplicar a pena a ttulode tentativa, e o agente s responde pelos atos at ento praticados como delitos autnomos. Noexemplo da desistncia voluntria o agente responder pelo delito de disparo de arma de fogo (art.15 da Lei n. 10.826/2003). No exemplo do arrependimento eficaz, responder pelo delito de lesescorporais de natureza grave (CP, art. 129, 1).

    9. CRIME IMPOSSVELCrime impossvel (tambm chamado de tentativa inidnea, tentativa inadequada ou quase-crime)

    aquele que, pela ineficcia absoluta do meio empregado ou pela impropriedade absoluta do objetomaterial, impossvel de consumar-se (CP, art. 17). Ningum pode pretender cometer um homicdioperfurando o trax de um adulto com um palito de fsforo. Seria ridculo. A consumao impossvel porque o meio absolutamente ineficaz. Por outro lado, quem metralha um morto,pensando que se trata de uma pessoa dormindo, no pode praticar homicdio, pois o objeto material totalmente inapto a receber a agresso. Nesses casos, o fato ser atpico, em face da impossibilidadede o crime se realizar. Segundo Nlson Hungria, na tentativa com meio absolutamente inidneo,falha uma das condies essenciais existncia de um crime, isto , a ocorrncia, pelo menos, de umreal perigo de dano. Na tentativa sobre objeto absolutamente imprprio, a atipicidade penal aindamais evidente: inexiste o bem jurdico que o agente supe atacar. D-se a ineficcia absoluta do meioquando este, por sua prpria essncia ou natureza, incapaz de produzir o evento a que estsubordinada a consumao do crime. Exemplo: Tcio, tendo resolvido eliminar Caio, ministra-lheerroneamente bicarbonato de sdio ao invs da dose de estricnina que adquirira para esse fim. D-sea absoluta impropriedade do objeto quando este, por sua condio ou situao, torna impossvel aproduo do evento tpico do crime. Exemplos: Tcio, supondo seu inimigo a dormir, quando narealidade est morto, desfecha-lhe punhaladas; Mvio, na penumbra da alcova, desfecha tiros sobre oleito em que supe achar-se deitado o seu inimigo, quando o certo que este ainda no se recolhera casa[34].

    Ressalve-se, porm, que, se for relativa a ineficcia do meio empregado ou a inidoneidade doobjeto material, no se h de falar em crime impossvel, mas em tentativa. Assim, uma arma de fogoapta a efetuar disparos mas que, s vezes, falha: picotando o projtil e, com isso, vindo a vtima a

  • sobreviver, ocorre a tentativa, pois o meio era relativamente eficaz. A consumao do crime, narealidade, foi impedida por uma condio acidental, alheia vontade do agente. Importante tambmnotar que a ineficcia e a inidoneidade dependem do crime que est sendo praticado, visto que umaarma de fogo de brinquedo pode ser ineficaz para o cometimento de um homicdio mas plenamenteeficaz para a prtica de um roubo, dada a sua aptido para intimidar.

    10. CONCURSO DE PESSOASO homicdio no plurissubjetivo ou de concurso necessrio, podendo ser praticado por um nico

    agente (monossubjetivo ou de concurso eventual). Pode ou no existir concurso de agentes.O Cdigo Penal prev, em seu art. 29, ao tratar do concurso de pessoas, as figuras de autor,

    coautor e partcipe. Conceitua-se autor como aquele que realiza o verbo da figura tpica (teoriarestritiva, que adotamos). No homicdio, autor aquele que mata. Importante observar que, segundoessa concepo, o mandante do crime no pode ser considerado autor, na medida em que norealizou materialmente o ncleo da figura tpica: quem manda matar, no mata. O mandante, no caso,ser considerado partcipe. H, contudo, forte corrente doutrinria adepta da chamada teoria dodomnio do fato, que sustenta ser autor todo aquele que detm o controle final da situao at aconsumao, pouco importando se foram realizados atos de execuo ou praticado o verbo do tipo. Omandante, embora no pratique o verbo, considerado autor para essa corrente, pois detm odomnio do fato at o seu final. O mesmo se diga do chamado autor intelectual, ou seja, aquele queplaneja toda a ao delituosa, ou aquele que coordena e dirige a atuao dos demais, embora no arealize materialmente. Seriam todos coautores[35]. No a nossa posio.

    O concurso de pessoas se perfaz pelo cometimento de um crime em coautoria ou participao. Acoautoria ocorre quando dois ou mais agentes, conjuntamente, realizam o verbo (ncleo) do tipo. Porexemplo: trs agentes golpeiam sucessivamente a vtima, que vem a falecer. Os trs realizarammaterialmente o verbo da figura tpica: matar. Partcipe aquele que, sem realizar o ncleo (verbo)da figura tpica, concorre de alguma maneira para a produo do resultado. H duas formas departicipao: a) moral atravs da instigao (instigar reforar uma ideia j existente), doinduzimento (induzir fazer nascer a ideia na mente do agente); b) material mediante auxlio, porexemplo: emprestar a arma do crime, levar o agente em seu veculo at o local do crime, vigiar olocal do crime para que o agente pratique a conduta delitiva. Para os adeptos da teoria restritiva omandante do crime considerado partcipe, haja vista que no realiza o verbo ncleo da figuratpica. Contudo, para os adeptos da teoria do domnio do fato o mandante o autor intelectual docrime e no partcipe, uma vez que detm o domnio do fato[36]. Cmplice expresso quemuitos, desde Welzel, equiparam a auxlio[37]. Preferimos no adotar esta terminologia.

    Autor mediato. aquele que se serve de outra pessoa, sem condies de discernimento, pararealizar, em seu lugar, a conduta tpica. A pessoa usada como mero instrumento de atuao. O autorpoderia ter utilizado uma arma, um co feroz ou qualquer instrumento, caso em que seria consideradoautor imediato, mas optou por servir-se de outra pessoa como executor, fazendo com que esta atuassesem conscincia, como uma longa manus sua, uma extenso de seu corpo, como se fosse simplesinstrumento, e, por essa razo, considera-se que a conduta principal foi realizada pelo autor mediato.Trata-se, portanto, de autoria, ou seja, o autor mediato quem realiza o verbo do tipo, s que com amo de outro. Por esse motivo, no cabe falar nessa figura para os chamados crimes de mo prpria,os quais precisam ser realizados pelo prprio agente em pessoa (com suas prprias mos). A autoria

  • mediata pode resultar de: a) Ausncia de capacidade penal da pessoa, da qual o autor mediato seserve por exemplo, induzir um doente mental a matar algum. Nessa hiptese, o executor do crimeno tem qualquer capacidade de discernimento; apenas um instrumento para a realizao do intentohomicida do autor mediato. b) Coao moral irresistvel que o emprego de grave ameaa contraalgum, a fim de que este faa ou deixe de fazer algo; ser o autor mediato aquele que por coaomoral irresistvel leva determinada pessoa prtica do delito de homicdio. c) Provocao de errodo tipo escusvel por exemplo, o autor mediato induz o agente a matar um inocente, fazendo-o crerque estava em legtima defesa. d) Obedincia hierrquica quando o autor da ordem sabe que esta ilegal mas, aproveitando-se do desconhecimento de seu subordinado, o induz prtica delitiva.

    Autoria colateral. Ocorre quando mais de um agente realiza simultaneamente a conduta, nohavendo liame subjetivo entre eles. Por exemplo, A e B, ao mesmo tempo, executam a vtima,sem que um conhea a conduta do outro. A ausncia de unidade de desgnios no configura oconcurso de pessoas, impedindo que todos venham a responder pelo mesmo crime. No caso, cadaqual ser responsabilizado de acordo com seu comportamento, isoladamente considerado. Dessemodo, no caso de morte por traumatismo cranioenceflico provocado por instrumentoperfurocontundente, se foi A quem deflagrou os projteis que atingiram a vtima nessa regio,tendo os disparos de B alcanado apenas as pernas daquela, A quem dever responder pelodelito de homicdio consumado, enquanto B somente responder pela tentativa[38]. Se houve liamesubjetivo, ambos respondero como coautores pelo homicdio consumado, j que todo aquele queconcorre para um crime incide nas penas a ele cominadas (CP, art. 29).

    Autoria incerta. Ocorre quando, na autoria colateral, no se sabe quem foi o causador doresultado. Na realidade, sabe-se quem realizou a conduta, mas no quem deu causa ao resultadonaturalstico. certo, no exemplo acima citado, que A e B atiraram, mas, se as armas tm omesmo calibre, como saber qual o projtil causador da morte? A atribuio da responsabilidade nocaso controvertida. Damsio E. de Jesus sustenta que condenar ambos pelo homicdio consumadoseria injusto, pois um deles, que seria o autor da mera tentativa, seria inocentemente punido por fatomais grave. Do mesmo modo, segundo ele, no caberia absolv-los, j que, pelo menos, praticaramuma tentativa de homicdio. Restaria, portanto, puni-los como autores de tentativa de homicdio,abstraindo-se o resultado, cuja autoria no se apurou, por adoo ao princpo in dubio pro reo . Paracorroborar tal assertiva cita os seguintes julgados: TJSP, HC 136.478, RT, 521/343[39]. Em sentidocontrrio: no se sabendo qual foi o verdadeiro autor do tiro mortal, lcito atribuir a todos queatiraram a coautoria (STF, RTJ, 108/569)[40]. No confundir com autoria desconhecida ou ignorada,em que no se sabe, sequer, quem praticou a conduta.

    Concurso de pessoas em crime culposo. Este estudo de suma importncia, tendo em vista a suaaplicao prtica aos crimes de homicdio e leses corporais decorrentes de acidente de veculo.Segundo a doutrina e a jurisprudncia, possvel o concurso de pessoas em delitos culposos, masprevalece a orientao no sentido de que somente h coautoria e no participao. Na arguta lio deDamsio E. de Jesus o crime culposo admite coautoria, porm no participao. O crime culposotem o tipo aberto, sendo tpica toda conduta que descumpre o dever objetivo de cuidado. Assim, autor aquele que, violando esse dever, d causa ao resultado. Todo grau de causao a respeito doresultado tpico produzido no dolosamente, mediante uma ao que no observa o cuidadorequerido no mbito de relao, fundamenta a autoria do respectivo delito culposo. Por essa razo,no existe diferena entre autores e partcipes nos crimes culposos. Toda classe de causao do

  • resultado tpico culposo autoria. No sentido do texto: STF, HC 61.405, RTJ, 113:517; RHC55.258, DJU, 12 set. 1977, p. 6169; TJSC, HC 5.148, RF, 257:311; Luiz Vicente Cernicchiaro,Questes penais, Belo Horizonte, Del Rey, 1998, p. 123[41]. Observe-se que se os agentes atuamsem a conscincia de que de alguma forma esto colaborando com a conduta culposa dos demaisagentes, no se configurar a coautoria, pois exige-se o nexo psicolgico, que a vontade conscientede concorrer para uma conduta culposa. Mais informaes sobre o tema sero encontradas no tpicohomicdio culposo. Entendemos ser possvel tanto a coautoria quanto a participao no crimeculposo. Autor ser aquele que tiver praticado o verbo do tipo, culposamente, enquanto partcipe, oque cooperou para o desfecho culposo, sem o cometimento do ncleo da ao tpica. Por exemplo:um motorista imprime velocidade incompatvel com o local, estimulado pelo passageiro. Ambosatuam com imprudncia. Vindo o veculo a atropelar e despedaar um ciclista, ser autor aquele quematou algum culposamente, ou seja, aquele que estava dirigindo o automvel, e partcipe o queinduziu e instigou o motorista a agir com imprudncia, estimulando-o a acelerar.

    Participao mediante omisso em crime de homicdio. possvel. Para tanto, basta que opartcipe tenha o dever jurdico de impedir o resultado. Se o omitente viola essa obrigao legal,acaba por concorrer para a produo do resultado, tornando-se partcipe. Exige-se, contudo, que oomitente concorra com o elemento subjetivo, qual seja, o de aderir com a sua conduta omissiva aocomportamento do autor principal, por exemplo: policial militar que assiste inerte, em atitude desolidariedade, o seu colega de trabalho desferir violentos golpes contra o delinquente at causar asua morte. O policial militar tem por lei a obrigao de impedir esse resultado, sendo certo que se,podendo evit-lo, no o fez, aderindo ao desgnio do autor, responder como partcipe pela omisso.Observe-se que no basta a mera omisso do dever jurdico de agir, necessrio tambm o vnculosubjetivo, ou seja, a vontade de aderir conduta do autor, do contrrio no estar caracterizada aparticipao. Assim, para o homicdio doloso so necessrios os seguintes requisitos: omisso +dever jurdico de agir (por lei, garantidor ou ingerncia) + dolo, isto , vontade de que o resultadotpico se produza. Para o homicdio culposo, a nica diferena seria a culpa, em vez de dolo, quantoao resultado. Se inexiste o dever jurdico de impedir o resultado, estaremos diante da hiptese deconivncia, tambm chamada de participao negativa. Dessa forma, o indivduo que, transitandopela rua, testemunha a prtica de um crime de homicdio no est obrigado a impedir o eventocriminoso, pois no tem o dever legal de impedir o resultado, respondendo apenas por sua prpriaomisso (delito de omisso de socorro CP, art. 135). Da mesma forma, aquele que temconhecimento prvio da futura prtica de um homicdio e, no tendo o dever jurdico de impedir oresultado, omite-se nas diligncias tendentes a impedi-lo, no pratica o delito em qualquer uma dasformas de coparticipao. Se, contudo, houvesse previso legal autnoma para essas condutasomissivas, a sim, poderia responder por uma infrao penal autnoma, mas jamais pelo concurso depessoas no crime de homicdio.

    Concurso de pessoas e ajuste prvio. O concurso de pessoas exige para a sua configurao aconvergncia de vontades para a prtica delituosa, ou seja, que os agentes tenham conscincia deque, de alguma forma, contribuem para a prtica delituosa, porm no se exige o prvio ajuste devontades, ou seja, no se exige que os agentes planejem em conjunto e com antecedncia, ouconcomitantemente, a concretizao do desgnio criminoso. Por exemplo: A, coincidentemente,avista o seu desafeto B sendo golpeado a pauladas pelo indivduo C; aproveitando-se dessaoportunidade, A resolve aderir conduta de C, passando tambm a desferir pauladas em seu

  • desafeto, cujo bito vem a suceder. A e C respondero por homicdio doloso em coautoria, noobstante a ausncia de prvio ajuste entre ambos. Difere essa hiptese da autoria colateral, namedida em que nesta os agentes no tm conhecimento um da conduta do outro, no h a adeso deuma conduta a outra, ao passo que no concurso de pessoas sem ajuste prvio um dos agentes adere conduta do outro, ou seja, tem conhecimento do propsito criminoso do indivduo e almejando omesmo acaba por aderir conduta dele.

    Participao posterior consumao do crime. inadmissvel a coautoria e a participaoposteriores consumao do crime. Para que se opere a coautoria necessrio que os agentestenham a vontade comum de executar e consumar o crime. Conforme j estudado, autor aquele querealiza o ncleo da figura tpica. Ora, se o crime j est consumado, impossvel realizar o verboncleo da figura tpica e, portanto, configurar-se a coautoria. O mesmo ocorre na participao. Dessemodo, se um indivduo presencia o seu colega praticando um homicdio e aps a consumao destevai ao encontro do agente a fim de auxili-lo na ocultao do cadver, no partcipe do homicdio,visto que no contribuiu para a realizao material do verbo da figura tpica. Responder ele pelodelito autnomo de ocultao de cadver. Observe-se, contudo, que possvel a participaoposterior, mediante auxlio, se este foi prometido antes ou durante a execuo do crime, pois nessahiptese h a vontade prvia do agente de colaborar de qualquer forma para a realizao do crime,ainda que posteriormente. No mesmo exemplo acima citado, temos que se antes da prtica do delito oindivduo previamente ajustou com o seu colega que o auxiliaria na ocultao do cadver, se aquelecolocasse em prtica o desiderato criminoso, configurada estaria a hiptese de concurso de pessoasmediante participao. Isso porque o indivduo quis de algum modo colaborar para o resultado final.

    11. FORMASO Cdigo Penal distingue vrias modalidades de homicdio: homicdio simples (art. 121, caput),

    homicdio privilegiado ( 1), homicdio qualificado ( 2) e homicdio culposo ( 3).Homicdio simples doloso (caput): Constitui o tipo bsico fundamental, o que contm os

    componentes essenciais do crime.Homicdio privilegiado ( 1): Tendo em conta circunstncias de carter subjetivo, o legislador

    cuidou de dar tratamento diverso ao homicdio cujos motivos determinantes conduziriam a umamenor reprovao moral do agente. Para tanto, inseriu essa causa de diminuio de pena, que possuifator de reduo estabelecido em quantidade varivel (1/6 a 1/3).

    Homicdio qualificado ( 2): Em face de certas circunstncias agravantes que demonstram maiorgrau de criminalidade da conduta do agente, o legislador criou o tipo qualificado, que nada mais que um tipo derivado do homicdio simples, com novos limites, mnimo e mximo, de pena (recluso,de 12 a 30 anos).

    Homicdio culposo ( 3): Constitui a modalidade culposa do delito de homicdio. Diz-se o crimeculposo quando o agente deu causa ao resultado por imprudncia, negligncia ou impercia (CP, art.18, II).

    Causa de aumento de pena ( 4 e 6): O 4 contm causas de aumento de pena aplicveisrespectivamente s modalidades culposa e dolosa do delito de homicdio; o 6 contm causa deaumento de pena para as situaes em que o homicdio praticado em atividade tpica de grupo deextermnio (com redao dada pela Lei n. 12.720/2012).

  • 11.1. Homicdio simples a figura prevista no caput do art. 121 do CP. Conforme j dissemos acima, o homicdio simples

    constitui o tipo bsico fundamental. Ele contm os componentes essenciais do crime.

    11.1.1. Homicdio simples e Lei dos Crimes HediondosHomicdio praticado em atividade tpica de grupo de extermnio. A partir da redao do art. 1,

    I, da Lei n. 8.072/90, determinada pela Lei n. 8.930, de 6-9-1994, o delito de homicdio simples(tentado ou consumado), quando cometido em atividade tpica de grupo de extermnio, ainda que porum s executor, passou a ser considerado crime hediondo. A lei exige, ento, que o homicdio sejapraticado em atividade tpica de grupo de extermnio, o que no se confunde com quadrilha ou bando,pois a lei no requer nmero mnimo de integrantes para considerar hediondo o homicdio simples. Ogrupo pode ser formado por, no mnimo, duas pessoas (como no caso da associao criminosa art.35, caput e pargrafo nico, da Lei de Drogas), admitindo-se, ainda, que somente uma delas executea ao. A finalidade especial em relao ao delito previsto no art. 288 do CP, qual seja, a deeliminar fisicamente um grupo especfico de pessoas, pouco importando estejam ligadas por um laoracial ou social, sendo suficiente que estejam ocasionalmente vinculadas. Por exemplo: no episdioconhecido como massacre de Vigrio Geral, ocorrido no Rio de Janeiro, as vtimas estavam,eventualmente, alocadas uma perto das outras, sem um liame n