2015 i nc u · projeto vincular nos permitiu perceber que as partilhas podem intensificar-se com a...
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pesquisa e docência,
arte e educação
2015V
INC
U LAR
VINCULARpesquisa e docência,
arte e educação2015
Carmen Lúcia Capra (Organização)
Núcleo Educativo MARGS-UERGS (Realização)
VINCULARpesquisa e docência,
arte e educação
Estagiárias-MARGS
Kellem Francini Santos
Gabriela Carvalho da Luz
PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS DE INICIAÇÃO
À DOCÊNCIA - PIBID
Sandra Monteiro Lemos – Coordenação Institucional
Carmen Lúcia Capra – Coordenação de Área – Artes Visuais
Thiago Iwaszko Marques Proença - Supervisão
Bolsistas de Iniciação à Docência
PIBID-UERGS-Artes Visuais
Claudine da Silva
Edicléi Schmidt
Fernanda Fernandes Freitas Almeida Maia
Jéssica da Rosa Pinheiro
Jozieli Weber
Maristela Couto Langhammer
Marivone Souza
Maxsoel Fuhr de Oliveira
Mayra Marques
Odalissa Sorrilha Aiolff
2015 – segunda edição
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO RIO GRANDE DO SUL
UERGS
Arisa Araujo da Luz – Reitoria
Eliane Maria Kolchinski – Vice-Reitoria
Armgard Lutz – Pró-Reitoria de Ensino
Clódis de Oliveira Andrades Filho – Pró-Reitoria de
Pesquisa e Pós-Graduação
Ernane Pfüller – Pró-Reitoria de Extensão
Ismael Mauri Gewehr Ramadam – Pró-Reitoria de
Administração
NÚCLEO EDUCATIVO MARGS-UERGS
Professores-AV-UERGS
Carmen Lúcia Capra
Igor Moraes Simões
Mariana Silva da Silva
Mariane Rotter
Sandra Monteiro Lemos
Funcionários-MARGS
Vera Lúcia Machado da Rosa – Coord.
Carla Adriana Batista da Silva
Roberto Fernandes Monteiro
VINCULARpesquisa e docência,
arte e educação
Concepção de design: Cristian Poletti Mossi
Diagramação: Carmen Lúcia Capra
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
V767
Vincular: pesquisa e docência, arte e educação / Carmen Lúcia Capra (organização); colaboração de: Adriana Aparecida Ganzer, Carla Giane Fonseca do Amaral, Larisa da Veiga Vieira Bandeira, Vivien Kelling Cardonetti. – 2. ed. –[s.l]: Uergs : Pibid : Margs , 2016.48 p..; il.
ISBN 978-85-60231-33-1
1. Literatura infantil. 2. Letramento visual 3. Ensino tecnológico. 4. Projeto Vincular. 5. Intercessões fílmicas. 6. Museus – Práticas educativas. II. Capra, C. L. III. Ganzer, A. A. IV. Amaral, C.G.F. V. Bandeira, L.V.V. VI. Título.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
CDU 37+7
Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário Daniel Magnus CRB 10/2233
Realização
Universidade Estadual do Rio Grande do Sul-UERGS
Núcleo Educativo MARGS-UERGS
Apoio
Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência
PIBID-UERGS-Artes Visuais
Palestrantes
Adriana Ganzer
Marília Forgearini Nunes
Carla Giane Fonseca do Amaral
Larisa da Veiga Vieira Bandeira
Ethiene Nachtigall
Vivien Kelling Cardonetti
Gabriela Bom
Organização e Coordenação
Carmen Lúcia Capra
Apoio:
2015 – segunda edição
SUMÁRIO
Apresentação
Carmen Lúcia Capra
Expectativas no espaço museal e o possível despraticar das normas
Adriana Ganzer
Leitura de imagem na literatura infantil: experiência de letramento visual
Marília Forgearini Nunes
Arte no Ensino Tecnológico no Projeto Vincular: compartilhar experiências de pensar
a formação contínua
Carla Giane Fonseca do Amaral
Da consanguinidade das Portâncias
Larisa da Veiga Vieira Bandeira
Intercessões fílmicas: encontros que instigam a pensar e problematizar a experiência docente
Vivien Kelling Cardonetti
Colaboradoras
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APRESENTAÇÃO
Carmen Lúcia Capra
Essa publicação apresenta trabalhos que constituíram a segunda edição do Projeto Vincular: pesquisa e
docência, arte e educação. O curso de extensão é uma promoção do Núcleo Educativo do Museu de Arte do
Rio Grande do Sul – MARGS, com apoio do Projeto Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência da
Universidade Estadual do Rio Grande do Sul – PIBID-UERGS, especificamente através do Subprojeto de Artes
Visuais. Foram realizados sete encontros, entre abril e outubro de 2015, reunindo pesquisadoras que produzem
conhecimentos acerca dos encontros entre educação e artes visuais a partir de museus, exposições de arte,
arte no ensino técnico, livros de imagens, literatura e cinema. Participaram docentes das redes de ensino da
região metropolitana de Porto Alegre, estudantes de cursos de graduação em artes visuais na modalidade
licenciatura, estudantes de pós-graduação, mediadores, professores universitários, funcionários do MARGS e
bolsistas de Iniciação à Docência do PIBID-UERGS, promovendo experiências da ordem da leveza e do jogo,
mas também do debate.
Nessa edição foi mantida a proposta de que as pesquisas não fossem somente apresentadas, mas praticadas
de alguma forma. Um dos mais importantes resultados – além de cada encontro ser único – é a importância da
escuta. Escuta que acontece porque se deu a palavra (e o lugar de fala), escuta como testemunho, escuta
como elemento para a construção conjunta de algo novo. Se na primeira edição pensávamos em realizar uma
tal prática de abertura e partilha de saberes, por meio de um jogo elaborat ivo, a segunda edição do
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Projeto Vincular nos permit iu perceber que as part i lhas podem intens if icar -se com a
entonação de mais vozes.
O primeiro texto, Expectativas no espaço museal e o possível despraticar das normas, de Adriana Ganzer,
apresenta a pesquisa realizada com crianças em museus, que teve como objetivo aprofundar as questões
educativas que podem ser geradas pelo encontro dos pequenos espectadores e a arte. O texto a seguir, de
Marília Forgearini Nunes, tem o título Leitura de imagem na literatura infantil: experiência de letramento visual e
aborda a leitura da imagem na literatura infantil. A pesquisadora desenvolveu a análise de livros constituídos
apenas por imagens, destacando a importância dessas obras para a produção de sentido e para o letramento
visual do leitor infantil. O terceiro texto trata da Arte no Ensino Tecnológico no Projeto Vincular: compartilhar
experiências de pensar a formação contínua, de Carla Giane Fonseca do Amaral, que investigou os possíveis
deslocamentos na docência no ensino tecnológico, a partir da relação de docentes com a arte contemporânea.
Larisa da Veiga Vieira Bandeira, em Da consanguinidade das Portâncias, escreve sobra a experiência de “sair
das salas da academia, e ganhar mundo”, chegando até os “encontros VINCULAR(es)”. Seu ponto de partida é
um certo método de trabalho, proposto inicialmente em oficinas de experimentação textual, que submete o leitor
aos detalhes e aos devires que ocorrem na leitura e na escritura. Encerra esta publicação o escrito de Vivien
Kelling Cardonetti, Intercessões fílmicas: encontros que instigam a pensar e problematizar a experiência
docente. O que impelem a pensar as imagens fílmicas, que aproximações e estranhamentos provocam e que
sentidos podem construir em diálogo com a docência são as questões apresentadas logo de início. Após
desenvolver os conceitos implicados na pesquisa, a autora indaga: a docência não se daria propriamente em
constante renovação junto ao vivido?
Convido a seguirem a leitura, desejando que com nosso trabalho – docente, investigativo, educativo e artístico –
possamos chamar a atenção à insubstituível participação que a arte e a educação têm na composição do país.
Somos pesquisadores, professores de escola e de universidades, estudantes, artistas, mediadores, agentes
culturais, que no encontro com diversos setores da população, contribuímos tanto para a formação do
pensamento, como para o trabalho no campo das artes, da cultura e da educação. Um país que deseja
desenvolver-se plenamente não pode fazê-lo sem considerar educação e artes como produtoras de
conhecimento, tampouco sem promover o acesso da população a esses dois bens públicos.
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Expectativas no espaço museal e o possível despraticar das normas1
[...] quem se recolhe diante de uma obra de arte mergulha dentro dela e nela se dissolve.
Walter Benjamin
No desejo de aprofundar questões educativas atinentes ao museu de arte a partir do olhar da criança e da
multiplicidade perceptiva de sua imaginação, apresento, aqui, fios entrelaçados de uma pesquisa1 na qual
crianças e eu, experimentamos maneiras distintas de olhar para a arte, para os museus de arte e seus serviços
educativos. Sigo o caminho da curiosidade e da imaginação para estabelecer uma relação dialógica entre o
museu de arte e as crianças participantes. Agradeço a oportunidade de participar desse momento do Projeto
Vincular e assim narrar no museu, espaço no qual parte das importâncias que evidenciam o olhar que se
sensibiliza no encontro entre espectador e arte e a formação de professores pesquisadores foram suscitadas.
As reflexões foram elaboradas a partir de Benjamin (1994) em diálogo com crianças, poetas como Manoel de
Barros (2006), teóricos da infância, da educação como Leite (2008), Sarmento (2007) e Ostetto (2006) e de
questões museais como Chagas (2009). Olhares e diálogos foram estabelecidos em conversas com crianças
nas quais registrei suas considerações, suas críticas, suas dúvidas e suas sugestões acerca de uma questão
central: como elas imaginam e elaboram considerações referentes à arte e ao espaço museal a partir da visita
1 Partes desse texto estão publicadas na Revista Gearte v. 1, n. 3 (2014) - Mediação em Artes Visuais.
Adriana Ganzer
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ao museu.
Espaços de narrativa2 foram criados no intento de promover a aproximação e ouvir suas percepções sobre e a
partir do trabalho educativo realizado no museu. Esses que são espaços de produção de conhecimento.
Assinalo que alimentar a imaginação da criança ao criar espaços de narrativa é uma forma de promover
sentidos outros para além do que já está estabelecido, é permitir que as crianças mostrem suas capacidades,
como também é construir espaços de trocas que permitam expressar seus sentimentos, sensações, ideias e
concepções que dizem respeito ao espaço do museu e ao encontro com as obras de arte na sua forma original.
Assinalo os momentos em que conversei com as crianças acerca da arte, do museu de arte, das suas
expectativas e imaginações, posto que percebi o quanto isso se tornou valioso para mim e também para elas e,
portanto, me questiono sobre como estimular e intensificar a relação com a arte, com o museu, com a educação
e com a vida desses meninos e meninas? Como elas descobrem a arte? Como acontece a experiência
estética? É possível entrelaçar afinidades entre a arte e as instituições de ensino não formal (os museus de
arte) com as instituições de ensino formal (as escolas)? Como ampliar os olhares e a percepção das crianças
fruidoras?
O menino Valdecir, em um de nossos encontros, disse o seguinte: “Foi uma pena não ter tirado fotos minhas lá
no museu mansão! Ia ser uma boa recordação, tão grande, tanta escada. Tenho uma história para contar e um
dia eu quero voltar lá”. Saliento essa fala, pois, para o menino que foi ao museu pela primeira vez, a experiência
é impregnada pelo encanto, pela curiosidade, pelo devaneio e pelo encontro com novas possibilidades para
além da sala de aula, a descoberta de um espaço outro – o espaço museal.
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2 A pesquisa aconteceu em momentos de conversas em escolas antes e após a visita e nos espaços
expositivos; os educativos investigados foram do Museu de Arte do Rio Grande do Sul – MARGS, do Santander
Cultural e da Fundação Iberê Camargo em Porto Alegre – RS – Brasil. Dessa atividade resultou a Dissertação
de Mestrado.
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Discutirmos arte com as crianças revela suas ideias, sua imaginação, seu pensamento e compreende um
universo maior, pois, visitar uma exposição de arte é uma oportunidade para ampliar o conhecimento cultural,
imagético e sensorial na formação do olhar. Aos olhos do contemplador, os saberes são ressignificados e,
numa combinatória de experiências, novos olhares são produzidos. Intensifico a necessidade de repensar, de
forma ampliada, as condições de interação entre a arte, a criança e o museu de arte, na oportunidade de
enlaçar as teorias da arte e da infância com o imaginário compreendido nas suas vozes.
Adriana: E o que vocês imaginam que vai acontecer lá, será que alguém vai receber vocês?
Eduarda: Eu acho que vai ter coisas diferentes.
Gabriel: Eu acho que vai ter um homem que vai estar lá na porta mostrando as coisas.
Guria: Vai ter um monte de câmeras.
Adriana: Ah é? Vai ter câmera pra quê?
Crianças: Pra espiar. Pra ver se alguém vai mexer...
Adriana: Pode mexer?
Crianças: Não! Porque daí estraga.
Considero o espaço museal (de arte) um local mágico e desafiador, que conta a história da arte e dos artistas
na formação da nossa história e da nossa cultura, como também provoca o gosto pela descoberta das
impressões sensoriais, o assombro e o encantamento pela linguagem visual. Para Chagas (2009, p.55) “olhar
efetivamente um museu é também se perceber olhado, olhar efetivamente um objeto de um museu é saber-se
olhado por ele”.
Considero o espaço museal (de arte) um local mágico e desafiador, que conta a história da arte e dos artistas
na formação da nossa história e da nossa cultura, como também provoca o gosto pela descoberta das
impressões sensoriais, o assombro e o encantamento pela linguagem visual. Para Chagas (2009, p.55) “olhar
efetivamente um museu é também se perceber olhado, olhar efetivamente um objeto de um museu é saber-se
olhado por ele”.
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Igualmente é sabido que o espaço não apenas determina o olhar, mas exige regras diferenciadas de
comportamento. A maioria das crianças já tinha informações dadas pelos professores a respeito do tipo de
cuidados a serem tomados quando se vai ao museu, ou seja, sobre as faixas em frente às obras para não se
aproximarem muito e também não tocarem, bem como: não correr, não tocar, não gritar... As próprias crianças
já vigiavam os colegas neste sentido: – “Tira o dedo daí!”; “Ô, não mexe!”; “Ih, te comporta meu! Ah, tinha que
ser... Fica quieto!”; “Olha com os olhos...”; “Como tu é curioso, fica quieto”; “Aquele ali, ó, é muito brincalhão,
mas ele se comporta...”.
Nesse sentido, ao considerar essas recomendações já interiorizadas pelas crianças, me questiono: seria
possível pensar na comunicação da arte com as crianças espectadoras e despraticar4 as normas adotadas
pelos serviços educativos dos museus? Poderíamos pensar em relações das crianças com as obras de arte e
ao mesmo tempo respeitarmos os preceitos museológicos? Inspirada na perspectiva do narrador benjaminiano,
observo as histórias tecidas e descrevo um exemplo em que a possibilidade de despraticar o já estabelecido e
dito no início da visita causou estranhamento e grande espanto para as turmas.
No momento em que as crianças são recebidas, acontece uma conversa atinente às normas museais. Destaco
uma turma que foi ao Museu de Arte do Rio Grande do Sul – MARGS para conhecer obras do artista plástico
Iberê Camargo5 que estavam expostas lá. As crianças foram recepcionadas por uma mediadora do museu que
deu as boas-vindas, contou um pouco sobre a instituição, sua fundação, o prédio histórico e também passou
algumas dicas de visitação: explicou que estavam em um museu de arte e que não poderiam comer e,
principalmente, não poderiam tocar nas obras. Ela explicou um pouco sobre a conservação das obras e avisou
que, se todos as tocassem, o contato dos nossos dedos poderia danificá-las. Após esse preâmbulo, passou o
grupo para os mediadores da Fundação Iberê Camargo.
Vale salientar que essa exposição estava composta de duas salas: a primeira com gravuras em metal do artista,
que todos observaram respeitando as indicações estabelecidas. Contudo, na outra sala encontramos obras
realizadas por artistas que trabalharam no atelier de Iberê e traziam características diferenciadas na sua elabo -
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4 Manoel de Barros (2006).
5 Vale destacar que o Museu Iberê Camargo estava em construção no momento da pesquisa (2007) e que
inaugurou sua nova sede em maio de 2008. Para saber mais acessar: www.iberecamargo.org.br.
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ração, pois foram criadas para serem tocadas. A mediadora reuniu a turma ao redor de uma mesa na qual
estavam as obras e pediu que uma das crianças fizesse sua intervenção, ou seja, mexesse na obra. Silêncio
total! Quem se atreveria, posto que tantas recomendações foram dadas? Aos poucos a turma se soltou e
interagiu. Perguntei a elas como era a sensação de poder tocar e, mais que isso, modificar uma obra no museu.
As respostas foram muitos sorrisos e declarações – “É muito maneiro”; “É show de bola, olha que bala!”;
“Adorei esta experiência”.
Com essa turma em outro momento na escola, retomamos esse assunto. Para a Camila, foi “interessante terem
falado as regras”. Já para o Tiago, “a Camila sempre vem com regras...”. Mas foi o Alan quem concluiu: “Ter
regras é bom, porque senão, como ia ter ordem? Por exemplo, não tocar, não chegar muito perto... sem regras
é difícil controlar as coisas”. Esse diálogo me fez perguntar: “Mas lá no museu, teve um momento diferente
disso e vocês mexeram nas obras... Como foi?”. Para a Laynara, a experiência foi “original! Brinquedos de
artes. Eu brinquei com o quebra-cabeça6 de pano”. Já Sabrina apontou: “Legal! Daí tu sente assim a obra!”.
Várias crianças também disseram que gostaram de brincar com a obra: “Tinha umas bolinhas coloridas7, dava
pra escrever o nome, por exemplo. Ou dava pra fazer desenhos...”. “Adriana escreve também: Gostei do artista!
Eu sei, era Iberê Camargo!”.
Um dos pontos dignos de nota foi perceber que aconteceram vários tipos de recepção e de mediação, isto é, a
presença dos mediadores determinou o estilo da visita e, decorrente disso, o tipo de conhecimento e forma
como foi produzido. A proposta museológicas organizada com obras para serem tocadas causou experiências
estéticas diferenciadas, mesmo contrárias às normatizações, surgiu como elemento que potencializou a visita.
Nessa perspectiva, pergunto: como o trabalho realizado pelo serviço educativo pode interagir e desafiar o
espectador, aproximar os conceitos e permitir a fruição e o defrontar-se com o mistério concernente às obras de
arte? Como pode proporcionar que aconteça o diálogo e a abertura ao encontro e a interpretação para além da
própria obra? A organização museológica pode contribuir?
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6 Obra da artista plástica Lucia Koch.
7 Obra do artista plástico Nelson Leirner.
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Isso se alicerça nas diferentes concepções que permeiam a ação educativa – concepções de museu, de arte,
de infância, de produção de conhecimento. Consequentemente, essas concepções marcam a forma como as
crianças são recebidas no museu; a maneira como o diálogo com elas é estabelecido e acolhido. Sobre suas
concepções de museu, mesmo que distante para a maioria das crianças, não percebi falas das crianças
atinentes a não saber o que é um museu; e raramente foi dito como um lugar de coisa velha. As respostas
muito comumente eram construídas com questões, que giraram mais em torno do que poderiam fazer no
museu, como, por exemplo: “Será que dá pra brincar lá?”; “Tem espaço para as crianças?”; “Tem esqueleto de
dinossauro?”; “Tem roda gigante?”.
Para essas tantas crianças com quem conversei, o museu é um local que guarda coisas valiosas, e ao
conhecerem os espaços, a sensação mais provocada foi de encantamento. Distante de sua realidade e longe
fisicamente – ouvi inúmeros comentários de que aquela poderia ser a primeira e única visita.
As concepções de arte inicialmente trazidas à tona estavam somente relacionadas com aquelas trabalhadas
pela escola. Entretanto, percebi que aos poucos, a partir das experiências no museu e dos debates feitos, esses
conceitos foram se ampliando e as próprias crianças estabeleceram percepções outras, ou seja, o que antes se
reduzia a desenho colorido e pintura foi ampliado. Sendo assim, com o objetivo de intensificar as diferentes
conceituações de arte que me foram ditas, retomo aqui algumas das tantas falas definidas pelas crianças:
“Desenhos”; “Estátuas”; “Coisas enfeitadas”; “Coisa de tinta”; “Coisas valiosas”; “Pra se emocionar!”; “A gente
pode ver obras de arte nos filmes, cinema também é arte”; “É tipo uma nuvem assim, fazer desenhos das
nuvens...”; “Arte eu acho que é poesia”; “Arte vem de dentro!”; “Arte é de aprender”; “Arte é cultura!”.
Em nossos encontros, falamos e ouvimos uns aos outros, paramos para pensar como as crianças imaginavam
os museus de arte e o que elas almejavam dessa experiência. Acredito que assim obtivemos comunhão entre
museu, educação e espectadores-fruidores, interligamos ideias, vislumbramos caminhos, ousamos imaginar e,
nesse diálogo provocado, aprendemos muito, as crianças e eu.
Destarte, esses momentos pautados pela experiência de ver e ao despraticar as normas rever e até mesmo
transver8 com as possibilidades do toque e das manipulações, suscitam mais questionamentos se concentra-
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8 Manoel de Barros (2006).
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mos nosso pensamento na transgressão e propormos aos apreciadores, sejam crianças e ou adultos,
experimentações estéticas diferenciadas a partir das concepções da própria arte pelos artistas e da organização
museal. Trânsitos entre o deleite e a ludicidade.
Essa minha exultação crianceira se aproxima do poeta Manoel de Barros que encontra palavras e expressões
que permitem o sentido do encantamento que se propagou nessa pesquisa que não encerrou e segue me
desacomodando a pensar e repensar na comunicação da arte com as crianças espectadoras e em como
podemos possibilitar esse despraticar das normas nos espaços musealizados. Um desafio, sem dúvida para o
modo de elaborar as exposições para que essas possam desafiar os espectadores-fruidores e proporcionar
uma aproximação maior – e quem sabe um diálogo mais próximo – com o mistério instigante das obras de arte.
Ademais, fica o pensamento para que possamos pensar e criar estratégias para que os serviços educativos
elaborem alternativas que possam aproximar a fruição ao mesmo tempo em que ponderem com as questões
patrimoniais exigidas e tão importantes aos museus e centros culturais. Conforme Chagas (2013, p. 28), o
desafio que importa encarar é “trabalhar a poética do museu e a poética do patrimônio”. Está posto o desafio. O
museu é um veículo de comunicação e de humanização.
15
Referências
BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas. Magia, técnica, arte e política. São Paulo: Brasiliense, 1994.
BARROS, Manoel de. Memórias inventadas: a segunda infância. São Paulo: Editora Planeta do Brasil, 2006.
CHAGAS, Mário. A imaginação museal: museu, memória e poder em Gustavo Barroso, Gilberto Freyre e Darcy
Ribeiro. Rio de Janeiro: MINC/IBRAM, 2009.
CHAGAS, Mário. Educação, museu e patrimônio: tensão, devoração e adjetivação. In: TOLENTINO, Atila
Bezerra (Org.). Educação patrimonial: educação, memórias e identidades. João Pessoa: Iphan, 2013. p. 27-31.
(Caderno Temático 3)
GANZER, Adriana Aparecida. “Eu começava a olhar uma coisa que me interessava e já tinha que olhar outra”:
refletindo sobre a relação dialógica entre o museu de arte e a criança. Criciúma, 2008. 154 p. Dissertação de
Mestrado. UNESC, Criciúma, 2008.
LEITE, Maria Isabel. Espaços de narrativa – onde o eu e o outro marcam encontro. In: CRUZ, Silvia Helena
Vieira (Org.). A criança fala: a escuta de crianças em pesquisas. São Paulo: Cortez, 2008. p. 118-140.
OSTETTO, Luciana. A arte no itinerário da formação de professores: acender coisas por dentro. Reflexão e
ação, Santa Cruz do Sul, v. 14, n.1, p. 29-43, jan./jun 2006.
SARMENTO, Manoel Jacinto. Culturas infantis e interculturalidade. Palestra proferida na Faculdade de
Educação da UFRGS em 13 de abril de 2007 – anotações pessoais.
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Leitura de imagem na literatura infantil: experiência de letramento visual
O texto literário infantil no contexto escolar é, normalmente, considerado a partir do elemento verbal que o
constitui. No entanto, temos observado na produção editorial desse gênero que a linguagem verbal vem sendo
associada de maneira significativa à linguagem visual ou que a linguagem visual predomina ao longo das
páginas, exigindo do leitor infantil e, consequentemente, do mediador de leitura um olhar mais atento às
imagens como elemento produtor de sentido.
Essa relevância da imagem como parte significativa na constituição do texto literário infantil tem sido discutida
em algumas publicações, reforçando a necessidade de se considerar o elemento visual não mais como enfeite
que acompanha um texto verbal ao longo das páginas de um livro. Obras como O que é qualidade em ilustração
no livro infantil e juvenil: com a palavra o ilustrador, organizado por Ieda de Oliveira (2008), Pelos Jardins
Boboli: reflexões sobre a arte de ilustrar livros para crianças e jovens, de Rui de Oliveira (2008), em âmbito
nacional, e How picturebooks work, de Maria Nikolajeva e Carole Scott (2006) (na versão traduzida com o título
Livro ilustrado: palavras e imagens (2011), bem como, Para ler o livro ilustrado, de Sophie Van der Linden
(2011), publicações estrangeiras mas traduzidas para a língua portuguesa, são exemplos que refletem sobre a
importância da imagem como elemento produtor de sentido na literatura infantil.
Marília Forgearini Nunes
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No entanto, mesmo que essas reflexões já estejam instauradas, observamos que a leitura da imagem na
literatura infantil, é uma ação que ainda necessita ter sua discussão ampliada. Em pesquisa1 realizada no
repositório de dissertações e teses da Capes (NUNES, 2013), constatei a escassez de estudos (na primeira
década dos anos 2000) que tenham como objeto empírico a mediação da leitura da imagem no texto literário
infantil. Os resumos das pesquisas envolvendo a imagem revelam que esse objeto de estudo é utilizado como
recurso no desenvolvimento da oralidade, mas não como objeto de leitura visando ao letramento visual dos
leitores infantis apesar de se constatar sua capacidade significativa em termos discursivos, não apenas
estéticos.
Diante dessa lacuna, essa mesma pesquisa procurou analisar alguns livros de literatura infantil constituídos
apenas por imagem – os chamados livros de imagem, livros álbum ou livros sem texto, dentre outras
denominações que identificam essas publicações. A intenção dessa análise era ampliar a reflexão sobre a
importância dessas obras, ou da imagem, na literatura infantil, como elemento a ser lido de maneira mais
atenta, pretendendo a produção de sentido, bem como enriquecer as práticas de leitura do leitor infantil, visando
ao seu letramento visual. Assim, esse ensaio ocupa-se de discutir uma das reflexões suscitadas ao longo dessa
pesquisa, a de que o livro de imagem não é somente uma narrativa visual, e, portanto, sua leitura não envolve
apenas o seu conteúdo narrativo, mas também precisa considerar o elemento sensível que apresenta ao olhar
leitor a imagem a ser lida: suas cores, formas e o modo como ocupam o espaço, bem como a materialidade do
livro em si. Dessa maneira, considerar a imagem a partir de seu conteúdo e expressão é o caminho que pode
ser estabelecido para uma mediação da leitura da imagem que possibilite o letramento visual do leitor infantil.
Tomamos como exemplo, para explicitar essa afirmação de que ler um livro de imagem não é algo que se
resume à compreensão da narrativa apresentada por suas imagens, a obra Onda (LEE, 2008). Seguindo a trilha
narrativa das imagens apresentadas ao longo das páginas desse livro, o que presenciamos é uma menina e seu
encontro com o mar, uma relação estabelecida na praia durante um tempo demarcado pela sequência de ações
fruto desse encontro. Um percurso fácil de ser identificado pelo leitor que se permitir o virar de páginas.
__________________________________________________
1 Pesquisa realizada durante o Doutorado em Educação, junto ao Programa de Pós-graduação em Educação
da Universidade Federal do Rio Grande do sul, financiada pelo Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq).
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No entanto, esse caminho pode ser menos curto, melhor experimentado se o leitor não se preocupar apenas
com a identificação dos elementos narrativos, mas também perceber como esses elementos se mostram ao
seu olhar. Se considerarmos a menina e o mar, os dois sujeitos da ação, podemos estabelecer uma distinção
cromática e eidética importante na produção de sentido. A menina se mostra uma figura constituída de traços
firmes, predominando a linha reta demarcada por meio do uso carvão que confere a ela uma coloração entre o
preto e os tons de cinza, dependendo da intensidade do traço. O mar surge em tons de azul mesclados ao
branco em linha suaves, enoveladas, fruto do uso da tinta aplicada ao papel usando pincel. Da oposição entre o
preto e os tons de cinza da menina com o azulado do mar, podemos inferir a tensão da personagem diante do
desconhecido, o oceano em movimento que se apresenta diante dela. Esse é um possível efeito de sentido
decorrente do uso do elemento sensível cromático em reciprocidade à temática do encontro de desconhecidos.
Compreender o uso da cor ou das formas, ultrapassar a perspectiva estética desses elementos e considerá-las
como elementos discursivos, produtores de sentido é o que a mediação da leitura do livro de imagem almeja e
precisa instigar no olhar leitor. Esse processo de mediação envolve estabelecer com o leitor uma interação que
é da ordem da inferência consciente, que olha a imagem, analisa-a, identifica seus elementos sensíveis, a
conjunção recíproca entre eles no estabelecimento de formas, na ocupação do espaço, na constituição de
figuras, na presença das cores.
Essa interação exige mais do que um mero planejamento fechado que guia o olhar por caminhos já
desvendados pelo mediador, demanda também uma conjunção de olhares – mediador e mediado – que se
voltam para o texto cada um com seu ponto de vista, de uma abertura ao sentido produzido em ato e não pré-
determinado, em suma, de um olhar que se entrega ao sentir e produzir sentido. Sem dúvida, um exercício de
sensibilidade que começa com o mediador e se abre ao mediado pretendendo que transcenda para outros
exercícios de olhar.
18
Referências
LEE, Suzy. Onda. São Paulo: Cosac Naify, 2008.
LINDEN, Sophie Van der. Para ler o livro ilustrado. Tradução de: Dorothée de Bruchard. São Paulo: Cosac
Naify, 2011.
NIKOLAJEVA, Maria; SCOTT, Carole. How picturebooks work. New York: Routledge, 2006.
______. Livro ilustrado: palavras e imagens. Traduçao Cid Knipel. Sao Paulo: Cosac Naify, 2011. 365p. Título
original: How picturebooks work.
NUNES, Marília Forgearini. Leitura mediada do livro de imagem no ensino fundamental: letramento visual,
interação e sentido. Tese (Doutorado em Educação), (Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto
Alegre, 2013).
OLIVEIRA, Ieda de (Org.). O que é qualidade em ilustração no livro infantil e juvenil: com a palavra o ilustrador.
São Paulo: DCL, 2008a, p.13-47.
OLIVEIRA, Rui de. Pelos Jardins Boboli: reflexões sobre a arte de ilustrar livros para crianças e jovens. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 2008b.
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ARTE E ENSINO TECNOLÓGICO NO PROJETO VINCULAR:
compartilhar experiências de pensar a formação contínua
Carla Giane Fonseca do Amaral
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Introdução
Uma escrita com liberdade. Por onde começar? Um título que talvez não dê conta de sintetizar o fascínio da
experiência de compartilhar o desenvolvimento de uma pesquisa onde ser ouvida por iguais acaba por se tornar
uma espécie de continuidade da investigação. Um sem fim da prática de pesquisar e ser deslocada pelo que
essa prática gera – a compreensão de que uma pesquisa talvez nunca acabe, e seja feita somente de “meios”
que se entrelaçam e produzem cada vez mais sentido, em cada momento de compartilhar.
Quando fui convidada a participar do Projeto Vincular, a ideia era apresentar minha pesquisa de Mestrado
desenvolvida na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e propor alguma prática para implementar o
vínculo dessa ao fazer docente dos ouvintes. A total liberdade para criar, que nós, tão apegados aos
parâmetros e normativas acadêmicas, às vezes nos parece tão estranha e tão difícil de lidar.
Desafio aceito. Pensamento em compasso. Como apresentar uma pesquisa realizada a partir de inquietações
enraizadas em um contexto tão específico quanto o do ensino técnico e tecnológico, no qual atuo? Mergulhei
em minha pesquisa finalizada a mais de um ano, para nela buscar “[...] interstícios entre escola e formação, no
território dos encontros, para extrair do encontro e do acontecimento o que se passa, buscar algo que nos force
a pensar.” (DIAS, 2015, p. 3).
Contando sobre a pesquisa
Frases como “Eu nunca fui, assim, de entender muito de arte, mas
eu acho que mobiliza coisas boas”, “Nao é o tipo de arte que eu
gosto de apreciar” e “Creio que a arte necessita de uma melhor
análise antes de ser inserida” são exemplos de comentários feitos
por docentes que atuam em um Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia da Região Metropolitana de Porto Alegre1,
ouvidas por mim, professora de arte nessa instituição.
Ao falar no Vincular, contei sobre a pesquisa já finalizada e mostrei
que essas frases indicavam que a presença da arte em um
ambiente dedicado ao ensino de técnicas específicas para o
mercado de trabalho provocava diferentes movimentos na escola,
especialmente entre docentes das mais diversas áreas de
conhecimento. Esses e outros comentários e reações apareciam
geralmente em momentos de exibição pública de intervenções
artísticas realizadas por estudantes, a partir das propostas
desenvolvidas na disciplina de Arte. No estudo da arte
contemporânea, costumo propor atividades que façam os
estudantes sair do habitual na escola, extrapolando o limite das
paredes das salas e as práticas tomam corpo pelo espaço público
do câmpus: corredores, área externa e saguão (Figura 1).
_________________________________________________
1 A Rede Federal engloba instituições que atendem tanto à
educação de nível médio integrada ao ensino técnico, à educação
técnica no modo subsequente e à educação de nível superior. O
IFSul Câmpus Sapucaia do Sul tem uma história de ligação com
cursos da área da transformação de termoplásticos, o que faz com
que, ainda hoje, ainda seja referência nessa área e definida por
muitos dos seus servidores como uma escola de “chao de fábrica”.
Ao observar os movimentos que a presença da arte provocava nesse contexto e acreditando no potencial da
arte para mostrar diferentes percepções sobre educação e formação docente, desenvolvi minha pesquisa de
mestrado, cujo objetivo central foi: investigar os possíveis deslocamentos na docência na EPT2, a partir da
relação desses docentes com a arte, em especial com práticas artísticas contemporâneas.
O conceito de educação ético-estética forjado por Nadja Hermann (2005, 2008) foi determinante nesse trabalho,
pois indica a contribuição da experiência estética para a vida ética, especialmente no âmbito da educação. Para
a autora, é possível construir uma forma de viver a partir da experiência “[...] que resulte em modificação do
sujeito.” (HERMANN, 2008, p. 17). Essa modificação provocada pela experiência estética em nossos sentidos
pode ter força suficiente para ampliar as relações entre a educação e a estética.
Michel Foucault tornou-se também foi decisivo nessa investigação por evocar continuamente um pensamento
que não deixa de se reinventar, que não deixa de buscar a diferença. No capítulo Modificações, de História da
Sexualidade II, Foucault (1998) conta sobre como suas pesquisas o levaram a um deslocamento, fazendo-o
afastar-se de seu projeto inicial de estudo e reorganizá-lo a fim de melhor organizar a história dos jogos da
verdade a respeito da sexualidade. Foucault não deixa esses descaminhos teóricos nos bastidores, ele os
evidencia em seus estudos, tratando essa mudança como parte essencial do seu pensamento filosófico,
dizendo “De que valeria a obstinação do saber se ele assegurasse apenas a aquisição dos conhecimentos e
não, de certa maneira, e tanto quanto possível, o descaminho daquele que conhece?” (FOUCAULT, 1998, p.
13).
Utilizei a noção de deslocamento como potência para a pesquisa, porque assim como Foucault, procurei efetuar
um desvio das convicções iniciais sobre a relação entre a arte e a EPT, abrindo os seus subterrâneos,
encontrando o que poderia ser caracterizado como um descaminho na relação entre a docência na educação
profissionalizante e a arte.
_________________________________________________
2 A sigla EPT será utilizada como abreviatura da expressão Educação Profissional e Tecnológica, pois assim
vem sendo aplicada na literatura da área desde o início da regulamentação da Rede Federal de Ensino
Tecnológico no Brasil.
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_________________________________________________
3 O Grupo de Artistas de Rua espanhóis e1000ink, trata da cor a partir de uma perspectiva lúdica e surpreendente.
Mais informações em http://e1000ink.blogspot.es/.
Para tanto, precisei desenvolver estratégias metodológicas que
aproveitaram as intervenções com arte que os alunos realizavam no
câmpus com a minha orientação. Um dos primeiros momentos em
que essas práticas foram utilizadas na pesquisa foi ainda durante o
ano de 2012, quando foi colocado em prática um projeto de
intervenções coloridas pelo Câmpus, baseado no trabalho do Grupo
de Artistas de Rua e1000ink3. Esse período coincidiu com a etapa de
planejamento da investigação, e como primeiro passo metodológico,
foi enviado um questionário por e-mail para todos os docentes do
Câmpus, a fim de recolher dados iniciais para a pesquisa.
O segundo passo metodológico foi a análise de diferentes
documentos, como: projetos de cursos, grades curriculares, portarias,
planos de ensino e ementas de disciplinas, que indicassem como o
ensino de arte se constituiu no câmpus em questão, para
compreender a posição da arte na trajetória dessa instituição, diante
do cenário de constantes reformas no ensino tecnológico.
O terceiro passo metodológico foi a realização de intervenções a
partir da exibição de vídeos artísticos criados pelos estudantes em
espaços de circulação, com aplicação de questionário que buscava
levantar dados sobre as impressões que a inserção dessas práticas
provocava nesses ambientes (Figura 2).
23
Em seguida, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com professores licenciados, não licenciados e com
formação pedagógica atuantes na EPT, na tentativa de produzir dados a respeito da formação inicial desses
profissionais; entender como se constituíam docentes e como se dava sua relação com a docência, com a arte
e com as intervenções artísticas públicas. Na tentativa de provocar intervenções com a arte junto aos sujeitos
da pesquisa, o guia de entrevista tornou-se, em determinados momentos, focalizado no tema da arte, quando
foram introduzidas imagens artísticas como estímulo e subsídio para a conversa (Figura 3).
24
O uso das imagens da arte em paralelo a algumas questões das entrevistas veio da aposta que a experiência
com a arte pode ser relevante para pensar a prática docente no ensino tecnológico. Nadja Hermann diz que
essa experiência “[...] se dá no relacionamento entre o sujeito e o objeto estético, e isso implica compreender
que o sujeito se transforma nessa experiência.” (HERMANN, 2010, p. 34). O uso das imagens como forma de
despertar dados que talvez não fossem movimentados de outras formas, aproveitou o potencial das
reproduções das obras de arte para possibilitar experiências diferenciadas no momento em que os sujeitos
participavam das entrevistas.
Sintetizando os resultados
Apesar de terem sido bastante amplas as frentes estudadas na pesquisa, trouxe para o Projeto Vincular os
resultados diretamente relacionados à relação entre a docência e a arte na EPT. Assim, puder contar que, nos
relatos quanto à afinidade dos docentes com a área da arte, de maneira geral, os dados indicaram que não
havia relação intrínseca entre a formação inicial dos docentes e sua proximidade com a arte na vida cotidiana,
pois tanto professores licenciados quanto não licenciados relataram diferentes posições pessoais em relação à
fruição da arte: alguns disseram já ter tido contato com arte em outros momentos, outros afirmaram não achar
significativa a proximidade com a arte. Alguns citaram o cinema e a música como práticas significativas como
um hobby, um descanso de sua rotina cansativa.
Algumas vozes permitiram constatar que também docentes sem licenciatura e de formação tecnicista pareciam
estar dispostos e abertos às práticas artísticas públicas na instituição. Há trechos nos questionários e
entrevistas que sugeriram que os professores que tem mais experiências pessoais com a arte na vida cotidiana
são os mais dispostos a um contato maior com a arte no ambiente escolar.
Ao investigar as concepções de arte presentes na EPT, percebi uma evidente a analogia do conceito de arte
aos termos: expressão, comunicação, criatividade e sensibilidade. Os vocábulos beleza, liberdade e
compreensão também foram citados diversas vezes e fazem eco à ideia de arte como prática redentora, capaz
de “ser inovadora” ou “humanizar o aluno”.
25
Foi importante notar que essas concepções de arte que se evidenciaram não eram diferentes entre docentes
licenciados ou não licenciados, o que me faz acreditar que não é a formação inicial dos professores a
responsável pela configuração dessas concepções e sim, a proximidade com a arte na vida pessoal dos
docentes é o fator que pode ser determinante na forma como se relacionam com a arte na escola.
Embora concepções tradicionais a respeito de arte persistam ainda na EPT, percebi que alguns docentes
apresentavam concepções de arte mais amplas, em compasso com a noção contemporânea de arte,
considerando seu potencial reflexivo e a multiplicidade do campo artístico. Nos dados, alguns docentes
pareciam dispostos a se colocar em uma posição de abertura a essas experiências. No material empírico, ficou
evidente que isso se dá na medida em que a presença marcante da arte torna-se cada vez mais marcante
nessa instituição e isso tem produzido deslocamentos na escola, no sentido de que a comunidade escolar
parece estar mais interessada por essas atividades, conforme relato a seguir:
[...] Acho que muitos colegas ao longo desse tempo que nós estamos aqui e que o curso tem
funcionado, também mudaram muito da sua percepção... Sobre eventos, sobre práticas de
eventos, exposição... Nós fazíamos no início, algumas atividades muito tímidas e, de alguma
maneira, eram meio vistas de canto e hoje nós fazemos grandes atividades no saguão e as
pessoas já passam, muitos já com curiosidade... E eles param, às vezes, para apreciar. Até de
colegas que já disseram: “Ah, estão no meio do caminho!”... Já ouvi muitas vezes esses
comentários “Ah, tem uma exposição, mas está no meio do caminho!” Ou seja, não está no meio
do caminho. Ela é justamente para estar aí nesse lugar, para se entender que vai ter que fazer um
esforço para desviar se não quiser, no mínimo, prestar atenção nela. (Professor E. Licenciado.
Entrevista realizada em junho de 2014).
Percebe-se que, as produções artísticas, marginalizadas em algumas situações, parecem se estabelecer entre
lutas e disputas e pontuam sua constância na formação dos estudantes, despertando olhares mais abertos
também por parte de docentes de outras áreas do conhecimento.
26
Por fim, ao finalizar a investigação indiquei que, embora a educação profissional muitas vezes ambicione por
um mundo e um tipo de educação permanentes, sob as quais seja possível fincar os pés, é possível pensar em
uma docência na EPT que desafia esses modelos e vai em busca de uma realidade diversa para a educação.
Como diz o filósofo dos aforismos “[...] a pessoa suscetível ao artístico, em face da realidade do sonho,
observa-o precisa e prazerosamente, pois a partir dessas imagens interpreta a vida e com base nessas
ocorrências exercita-se para a vida.” (NIETZSCHE, 2001, p. 28, §1). Diz Nietzsche que aquele que é suscetível
ao artístico, observa o sonho e a partir dele exercita-se para a vida. Com minha pesquisa entendi que a partir
desse utópico sonho do qual ele nos fala é possível pensar em uma EPT que se configura a partir do diálogo
com a pluralidade de sentidos e experiências desencadeados pela presença da arte contemporânea no
cotidiano escolar.
Experimentando o encontro
Ao contar sobre a pesquisa para os presentes naquela manhã de sábado no Projeto Vincular, pedi no final que
criassem uma forma bi ou tridimensional que representasse a maneira como os ouvintes acreditavam que as
pessoas de suas instituições de trabalho ser relacionavam com as atividades artísticas (Figuras 4, 5 e 6). A
ideia foi utilizar a forma criada como um dispositivo para abrir uma conversa sobre as possibilidades do ensino
da arte para provocar deslocamentos na educação e esse foi um dos momentos mais profícuos para repensar a
pesquisa e novamente refletir sobre a minha própria prática docente.
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Esse espaço de encontro foi capaz de forjar um tempo de respiro, um novo território onde não mais
experimentei a sensação de solidão tão comum aos pesquisadores com seus trabalhos. Acreditava eu que
pensar a EPT fosse um território de ainda mais solidão, pois há poucos que se interessam por entender as
relações da arte nesse sistema de ensino. Porém, no encontro com o outro oferecido no Projeto Vincular pude
experimentar a sensação de conforto em perceber em meus colegas de profissão desafios e preocupações tão
semelhantes, tão próximas, tão vizinhas.
Ao questionar e ouvir os relatos de docentes das mais variadas escolas e situações percebi, outra vez, o quanto
ser docente é um trabalho de fabricação de si mesmo cotidiano e o quanto esse trabalho pode ser atravessado
pelas dores, frustrações, indignações ou alegrias de estar junto e compartilhar espaços com o diferente. A
sensação de “nao-solidao” experimentada no encontro foi capaz de “vincular” em mim outra atitude, outros
saberes, outras vontades e outras percepções com relação ao estar, ser e fazer-me docente, a partir do qual
posso continuar dizendo com Nietzsche “Depois que cansei de procurar, aprendi a encontrar. Depois que um
vento me opôs resistência, velejo com todos os ventos.” (NIETZSCHE, 2001, p 17, §2).
29
Referências
DIAS, Rosimeri de Oliveira. Oficinar, inventar e formar: arte como possibilidade de se deslocar. Fermentário.
v.1. n.9, p. 1-19, 2015.
FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade 2: o uso dos prazeres. Rio de Janeiro: Graal, 1998.
HERMANN, Nadja. Autocriação e horizonte comum: ensaios sobre educação ético-estética. Ijuí: Editora Unijuí,
2010.
_____. Ética: a aprendizagem da arte de viver. Educação e Sociedade, vol.29, n.102, p. 15-32, 2008.
______. Ética e estética: a relação quase esquecida. Porto Alegre: EDIPUCRS: 2005.
LOPONTE, Luciana. Arte para a Docência: estética e criação na formação docente. Revista AAPE. v. 21, n. 25,
mar. 2013.
NIETZSCHE, Friedrich. A Gaia Ciência. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.
______. O nascimento da tragédia ou helenismo e pessimismo. São Paulo: Companhia das Letras. 2001.
30
Da consanguinidade das Portâncias1
Larisa da Veiga Vieira Bandeira
31
Com as portas e as entranhas. E as entrâncias. Com as salas de aulas, salas de estares. Salas de(s)
esperares. Com as malas, com os carregadores de malas. Com amá-la. Com as viagens curtas e breves, com
as viagens distantes e longas. Com as viagens que fazemos sozinhos. Com os que nos acompanham. Com os
portos, o cais, a âncora e as derivas. Com Manuel, os barros das estradas, dos livros, de Poesias. Com a
leveza. A aspereza, o peso, das Pedras. Com as importâncias, os (des) importantes das aspas, dos parênteses,
das linhas. Assim com tudo que acompanha uma pesquisa2 e com o que a faz sair das salas da academia, e
ganhar mundo, e perder rumo cheguei com ela ao Museu de Arte do Rio Grande do Sul, para lá encontrar as
cores, as formas, as molduras que, aquilo que já foi feito, ainda pode ganhar. Em cada um que lá estava outras
possibilidades para ler e escrever, com os alunos de EJA, com os alunos das séries iniciais, com os alunos que
sempre seremos. Outras oportunidades para ler e escrever, outras partidas para outros textos. Com estes que
procedem dos mesmos ventres, da mesma raça do mesmo espírito. Levo na mala as coisas que nos portam (os
_________________________________________________
1 São carregadores de portâncias os professores, os artistas, os alunos, os PIBIDIANOS, os que pesquisam
nos OBEDUCS, os extencionistas, os que lecionam, estudam, organizam encontros entre todos os outros, os
que se reúnem na consanguinidade da Educação.
2 A pesquisa aqui referida intitula-se: Um modo de ler e escrever na Educação de Jovens e Adultos – Oficinas
Biografemáticas transita conceitualmente na e com a Filosofia da Diferença e foi articulada ao Projeto
Escrileituras: um modo de ler-escrever em meio à vida, do Observatório da Educação (OBEDUC - Edital 038 –
livros, os escritos, as poesias). As portâncias, as coisas que podemos levar. Leves. Não sem peso, ou pesares.
Leves, porque já sem gravidade, ou tamanho, se mantém. Ainda na superfície da pele. Na gastura e nas
costuras do couro.
_________________________________________________
2010 – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), Instituto Nacional de Estudos
e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Propõe a utilização do método biografemático como
metodologia de trabalho e enfatiza a modalidade de oficinas como estratégia de experimentações textuais.
Toma a Biografemática como uma postura de escritura e de leitura, de seleção e de valorização dos signos da
vida; a qual, ao invés de percorrer as grandes linhas da historiografia, submete o leitor aos detalhes e aos
devires. Reivindicando uma postura multivalente do leitor estabelecida na coautoria entre quem lê e quem
escreve simultaneamente, as Oficinas operaram com a noção de Biografema, proposta por Roland Barthes para
pensar a escritura de vida aberta à criação de novas possibilidades de dizer e, principalmente, de viver uma
vida. Localiza a tradução como desdobramento tomando-a como um dispositivo que aciona e requer diálogos,
aproximações e modificação dos textos em processo singular. Utilizou os textos de AnaïsNin, Marina
Tsvetáieva, Lou Andreas-Salomé, como propostas de leitura e de escritura para a produção de novos sentidos.
Para realizar essas experimentações investiu-se em processos que problematizavam, indagavam e
transformavam os escritos em diversas formas, colocando a experimentação como condição própria da
aprendizagem. Vislumbra em sua prática resultados a partir de diferentes relações entre os elementos literários,
os alunos de EJA e a aposta feita em uma didática oficineira, na tradução da vida em textos com os quais
experimentou variações, transgressões e aberturas para outras possibilidades de leitura e escrita.
32
Da pesquisa só o que pode ser levado adiante pelos professores que estão diante de nós no museu, da
pesquisa só o que é possível portar. Para portar deverá estar à mão ser portátil, instável, errante, mutante. E,
ainda assim, transportado facilmente, carregado com as mãos, dentro / fora da mala. Para portar passará
adiante. Para que assim, possa ser levado na mala, na mão, na alma. Dos excessos das Portâncias, os
professores, e os pesquisadores, e os artistas, e os professores/pesquisadores e artistas sabem que quando
damos às coisas demasiada importância, tornamos elas impacientes, imperativas e assim ocupam todos os
espaços. Ficam impossíveis de carregar. Assim as coisas perdem lentamente suas portâncias. Algumas vezes
nos escapam pelas pontas dos dedos. Sabem eles (os professores/pesquisadores/artistas) que as portâncias
são em nós o inacessível à violências dos biógrafos, à procura sôfrega de justificativas para nossa morte, elas
são a impossibilidade de atribuição de sentidos às nossas vidas. As portâncias não se mantêm fiéis aos fatos
que as produziram, vão além dos objetos que as representam são da ordem dos encontros, da ordem desses
encontros VINCULAR(es) do sábado de manhã. Não estão presas a nós, e não nos prendem a elas, como se
fossemos ao mesmo tempo presa e armadilha. Sobre o volume, a forma, e a duração das portâncias: de forma
sonora e ressoante de volume peculiar, mineral, de intensa e fragmentada duração, não embolora, apodrece,
quebra ou enferruja, mas cria outras formas quando termina. No texto que cada um de seus participantes lê e
escreve, na sonoridade do coro das vozes em leitura e profusão, no que se alimenta cada professor para
prosseguir e dali seguir para as suas aulas. Sobre o VINCULAR saibam que se trata da espécie de coisas
atemporais que a todos os tempos presentifica. É falsificável, porém de cópia impossível. É incompartilhável e
atinge a leveza da cumplicidade. E o que lá acontece é inabrigável, por seu caráter, as portâncias trocadas
entre os que lá estão, ficam sujeitas a variações de temperaturas, de temperamentos, de tempestades, quanto
mais sujeitas, mais as resistem, expostas as variações, suportam tantas quantas as que são expostas,
imutáveis até o seu término, são a própria mudança, de tudo que muda e varia sobre elas, as tais, que sem
peso fazem das superfícies profundidades e sem tempo produzem intensidades sem as tais ausências. Os
professores, que lá estão, estiveram atarefados todos os dias da semana, mas, aos sábados de manhã
ocupam-se em extraír das coisas, o intolerável, o incabível, o insustentável, o indiscernível, para que as coisas
passem a ser (apenas) coisas, para que pareçam objetos, para que se tornem palpáveis, visíveis e suportáveis.
33
Para que desprovidas, de significados seja
possível com elas criar outras
possibilidades de habitar as casas, as salas
de aula, os corredores da escola e de
comungar os corpos. Porque ainda somos
todos humanos e precisamos de objetos
para forjar as portâncias aos sentidos, pois,
a nós cabe a memória e a fazer de tudo um
legado. Os objetos tornam as portâncias
lembranças reportáveis. Aos professores
que agora nos ajudam a carregar as nossas
portâncias, as nossas portâncias de
pesquisa, as nossas portâncias de sala de
aula e as nossas portâncias de vida , (essa
34
que tudo implica), que no final da manhã de sábado saem às ruas e tomam ar, com suficiente distração
para deixar os sabores chegarem primeiro aos ouvidos, as texturas aos olhos, os ritmos aos narizes, cores
à língua, contrariados e livres da execução automática de suas funções e quando audição, tato, olfato e
visão procuram-se menos nos sentidos e atribuições, para esse, que a cada sábado torna-se o carregador
de tantas e outras portâncias, cabe aqui um aviso, sobre o risco e o prazer de ser um carregados das tais
portâncias:
Você poderá distribui-las, mas não poderá deixa-las de herança,
poderá resistir a elas, mas não desistir delas
Aos carregadores:
Nenhuma garantia ou certeza de reciprocidade ou duração apenas a brevidade instantânea de carregar.
As
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Intercessões fílmicas: encontros que instigam a pensar
e problematizar a experiência docente
Uma tela pode ser inteiramente preenchida, a ponto de que mesmo o ar não passe mais por ela;
mas algo só é uma obra de arte se, (...), guarda vazios suficientes para permitir que neles saltem cavalos”
(DELEUZE; GUATTARI, 2005, p. 215).
Essa escrita, que é um recorte de uma pesquisa de doutorado¹, procura explorar como os encontros com três
imagens fílmicas tiveram a potência de instigar a pensar e a problematizar a experiência docente. Alguns
questionamentos passaram a fazer parte da investigação: o que as imagens fílmicas impeliram a pensar? Que
aproximações e estranhamentos essas imagens provocaram? Que construções de sentido puderam ser
invencionadas no jogo de compartilhamentos entre as imagens fílmicas selecionadas e a docência?
Alguns autores como Deleuze (2006, 2010), Deleuze e Guattari (2005), Larrosa (2007, 2010) e Foucault (1984)
foram convidados a dialogar na pesquisa, com a intenção de problematizar e de fazer movimentar alguns
conceitos junto às imagens fílmicas, às narrativas dos acadêmicos envolvidos e à experiência docente,
potencializando-os de tal maneira que singulares construções de sentido foram produzidas.
_________________________________________________
1 CARDONETTI, Vivien Kelling. Experiências educativas: ressonâncias de intercessões fílmicas. Santa Maria:
UFSM, 2014. Tese (Doutorado em Educação), Centro de Educação, Universidade Federal de Santa Maria,
2014.
Vivien Kelling Cardonetti
35
Para tanto, foram levadas em consideração algumas narrativas disparadas na experiência em assistir ao curta-
metragem ‘Los colores de las flores’ (com os acadêmicos do Curso de Graduação a Distância de Educação
Especial – EAD – da Universidade Federal de Santa Maria – UFSM), nas questões produzidas pelo encontro
com o filme ‘A Invenção de Hugo Cabret’ (assistido junto aos acadêmicos e supervisoras do Programa
Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID – Artes Visuais da UFSM) e no atravessamento entre o
filme ‘O Balão Branco’ e o livro ‘Pedagogia Profana’, de Jorge Larrosa (com os acadêmicos da Graduação em
Artes Visuais da UFSM, nas disciplinas de Estágio Supervisionado III e IV).
Ao estudar as narrativas de outros, transitamos em mundos que desconhecíamos, pois se entrelaçaram
pensamentos e impressões diferenciadas. Essa multiplicidade contribuiu para que insólitas composições
fossem acionadas, possibilitando outras conexões e alianças. À vista disso, mais alguns questionamentos
passaram a estar presentes na pesquisa: que horizontes de sentido foram impulsionados pela imagem fílmica e,
posteriormente, pelas narrativas produzidas pelos envolvidos nos encontros? Que impacto as narrativas
realizadas pelos acadêmicos tiveram no grupo e o que elas foram capazes de acionar? Que articulações foram
problematizadas entre as imagens fílmicas, as narrativas dos acadêmicos e os conceitos dos teóricos
convidados?
O que nos impele a pensar
Deleuze e Guattari (2005) expõem que o pensar não é algo inerente ou adquirido, o pensamento precisa ser
provocado, pois somente pensamos quando o pensamento é coagido, forçado. Dessa maneira, o pensamento
necessita ser atravessado e instigado por diferentes fluxos de forças que venham a interromper a apatia e a
paralisia que nos aprisionam. Deleuze (2006a, p. 91) evidencia que “o que nos força a pensar é o signo”. No
entanto, o signo não é o pensamento, e sim o que pode propelir o pensamento a se desprender de sua
estagnação.
36
“O signo é o objeto de um encontro; mas é precisamente a contingência do encontro que garante a necessidade
daquilo que ele faz pensar” (DELEUZE, 2006, p. 91). É neste campo de confluências que os signos são
emitidos, por isso eles não aparecem do mesmo modo e são decifrados de formas distintas, pois dependem da
conjuntura e implicações de cada encontro. É um equívoco confundir o sentido do signo com o ‘ser’ ou o ‘objeto’
que estabelecem, achando que o segredo do signo está no objeto ou no sujeito.
Por esperar que os objetos e os sujeitos nos desvelem os enigmas que almejamos, passamos a nos frustrar por
eles não atenderem ao esperado. Essa atitude nos esquiva de experienciar e de nos entregar intensamente a
outros signos. Desse modo, certos encontros acabam nos escapando pela tendência que possuímos em optar
pela facilidade das recognições.
A recognição não necessita de esforço, o trabalho é de associação e de reconhecimento, pois se reencontra
sempre com o habitual e com o familiar. Além de se unir ao sujeito ou ao objeto correspondente, conecta-se
também com valores vigentes e universais instituídos, por isso passa a ser uma operação redundante. O
pensamento, entretanto, é violentado, conta com as circunstâncias do instante e com aquilo que o impulsiona a
pensar. Está aberto ao incomum, ao intolerável, ao extraordinário. E é justamente esse encontro surpreendente,
movediço e oscilante que assegura a premência daquilo que é pensado.
O desconcerto de sermos afetados por diferentes intercessores (alguém, situações e coisas) nos tira o chão
firme, mas nos convida a viajar por caminhos imprevisíveis. Essas experiências, em algumas situações,
chegam sem bater à porta e acabam nos arrastando, propiciando um mar de possibilidades. O pensamento sai
de sua letargia quando os intercessores em um encontro impulsionam à invenção.
Deleuze revela que “a criação são os intercessores. Sem eles não há obra. Podem ser pessoas (...) mas
também coisas, plantas, até animais, (...). Fictícios ou reais, animados ou inanimados” (2010, p. 160).
Vasconcellos, a partir dos estudos em Deleuze, expressa que “o intercessor é qualquer encontro que faz o
pensamento sair de sua imobilidade natural, de seu estupor. Sem os intercessores não há criação. Sem eles
não há pensamento” (VASCONCELLOS, 2006, p. 7). É dessa forma que, ao levar todas essas questões em
consideração, o interesse se deteve em pesquisar como se dá em experiências educativas o encontro com
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alguns intercessores, em especial com as imagens
fílmicas. Deleuze menciona que “no cinema, as
imagens são signos. (...). O cinema faz nascer
signos que lhe são próprios e cuja classificação lhe
pertence, mas, uma vez criados, eles voltam a
irromper em outro lugar, e o mundo se põe a ‘fazer
cinema’” (2010, p. 87, grifo do autor).
Ao convidar a imagem fílmica para ser um dos
intercessores nesta pesquisa, a intenção foi de
forçar o pensamento a pensar outras coisas,
opondo-se a uma imagem naturalizada,
homogeneizada e sentenciosa que o pensamento
está acostumado a pensar. O cinema, por ser uma
matéria pensante, uma matéria inteligível, pode
impulsionar a criação de pensamentos, propiciando
atuar no mundo apresentado e ficcionar outras
possibilidades.
Entretanto, vale ressaltar que “é preciso fabricar
seus próprios intercessores” (DELEUZE, 2010, p.
160), pois quem elege os intercessores somos nós,
a escolha é sempre singular. Por mais que
venhamos a oferecer diferentes intercessores para
os nossos estudantes, não sabemos se estes serão
escolhidos e acolhidos como tal. Para alguns
estudantes eles podem fazer sentido, e não fazer
nenhum sentido para outros.
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Foi pensando nisso que, durante a pesquisa, passei a
denominar de intercessão fílmica os encontros com
filmes que me afetaram, pois me incitaram a pensar e
problematizar a docência. Não tenho como assegurar
que o mesmo ocorreu com todos os envolvidos no
processo, pois o campo de confluências em que cada
um estava enredado era distinto. Cada um selecionou
seus intercessores, aquilo que realmente fez sentido e
lhe contaminou. Ou, talvez, tenham apenas
participado do encontro, não se sentindo contagiados
a ponto de fabricá-los. Creio que a possibilidade está
apenas em oferecer oportunidades de encontros aos
nossos estudantes, mas sem a expectativa de que
realmente isso possa acontecer com eles.
Nesta investigação, foi possível perceber que o
encontro com as imagens fílmicas fomentaram o
pensar, arremessando-nos a uma paisagem
problematizadora. Não a imagem em si, mas a
relação que se estabeleceu com as imagens e com as
implicações do cenário circunstancial de cada
intercessão fílmica. A imagem é relação e por isso
não se tem como pensar a imagem individualmente,
pois ela é aliança. Vale pontuar, também, que ao
escolher o cinema como intercessor, não significa que
ele tenha mais potencialidade para dialogar com a
docência do que outros. Esta foi, na verdade, uma
escolha entre tantas.
Diante do que foi exposto, buscarei a partir de agora explorar algumas questões que teceram cada uma das três
intercessões fílmicas e que dispararam atravessamentos e diálogos com a docência. Esses questionamentos
elaborados no decorrer de cada encontro pareceram fazer sentido, instigando a problematização e a produção
de múltiplas e singulares cenas para a educação.
Intercessão Fílmica 1
Ao sermos atravessados pelas cenas do filme ‘Los colores de las flores’ (2011), foi possível problematizar as
nossas próprias experiências educativas. O movimento de se deixar cruzar por experiências alheias oportunizou
obter um determinado afastamento do que estávamos fazendo, passando a visualizar as situações e a nós
mesmos sob outro prisma.
Nós, como futuros professores, sabemos realmente valorizar as potencialidades dos nossos
estudantes, ou visualizamos somente suas limitações? Ou, ainda, será que respeitamos o jeito
como os nossos estudantes veem e significam o mundo, ou percebemos tudo conforme a nossa
visão de mundo? (Acadêmic@s EAD 05 e 06).
No filme, o menino Diego precisou vivenciar a cor de outra maneira, em função de não ter o recurso da visão.
Como lidamos com os desafios que aparentemente não estão ao nosso alcance? Como nos deixar tocar por
aquilo que no primeiro momento não faz sentido para nós? Como se deixar afetar por aquilo a que não estamos
habituados?
É possível ir um pouco mais além... O corriqueiro passa a ser um empecilho, pois os encontros que estão
naturalizados passam a não ser mais percebidos em todo seu horizonte de possibilidades. Como se deixar
afetar por encontros que já estão naturalizados em nós? Às vezes, mesmo tendo o recurso da visão, ficamos
cegos diante do que naturalizamos. Como permitir ao que naturalizamos, outras experiências que o
modifiquem?
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Essa intercessão fílmica também nos levou a pensar na experiência educativa, reverberando outras questões:
como estamos fazendo uso das nossas experiências educativas? Os momentos de inquietude e incerteza que
são suscitados são negados ou prevenidos? E quando eles surgem, como lidamos com essas situações?
Estamos oferecendo brechas para as interrupções e os escapes? Estamos propiciando espaços vazios onde os
estudantes tenham oportunidade de inventar outras coisas? De que maneira procuramos afirmar ou negar as
possibilidades de vida que atravessam e povoam os encontros?
As problematizações realizadas nessa intercessão passou a ser um vetor de ressonâncias que impulsionou o
questionamento do inquestionável, o deslocamento, a ocupação de outros lugares e a invenção de outras
tessituras. Pôr em movimento uma multiplicidade de composições, algumas paradoxais, leva-nos a pensar que
o mundo é permeado de capturas e que a diferença talvez se encontre em estar aberto às dissonâncias.
Foucault (1984, p. 3) coloca que a problematização necessita ser compreendida “nao como uma adaptação das
representações, mas como trabalho do pensamento”. Ao problematizar, estamos movimentando e provocando
o pensamento, desafiando-o a questionar as significações hegemônicas e as certezas que nos acompanham.
A potência da problematização está na sua capacidade de expandir o espectro do que pode ser interrogado e
problematizado, e está, também, na ampliação do número de possibilidades que podem ser invencionadas a
partir de um problema ou de um conjunto de problemas. Ao vislumbrar outras facetas àquilo que,
perpetuamente, foi apresentado sempre da mesma maneira, passa-se a desenhar outras paisagens de vida e a
conceber o mundo como um processo de criação do novo.
Assim sendo, a problematização não tem a intenção de paralisar, e sim acionar a construção de um objeto de
pensamento livre. Como alega e esclarece Foucault (1984, p. 2), o pensamento “nao é o que habita uma
conduta e lhe dá sentido; é antes o que permite tomar distância com relação a este modo de agir ou de reagir,
de assumir como objeto de pensamento ou de questionar seu sentido, as suas condições”. O exercício do
distanciamento consiste em ter liberdade e coragem de se separar do que se faz, do que se acredita, do que se
tem como verdade, e se abrir a outras possibilidades.
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Intercessão Fílmica 2
Buscou-se neste encontro escolher um filme que fugia dos parâmetros da experiência escolar e que
apresentava outros signos para fazer relações com a educação, possibilitando um campo amplo de
possíveis e evitando relações conhecidas e simplistas. Alguns questionamentos foram decisivos na
escolha do filme ‘A invenção de Hugo Cabret’ (2011): como impedir a cilada do comodismo e da
obviedade, em que se elegem filmes que ilustram ou representam o que se deseja discutir? Por que existe
dificuldade em optar por imagens cinematográficas que desafiam a problematizar outros temas? Como
problematizar uma imagem fílmica sem recair em questionamentos corriqueiros, absolutizantes e
previsíveis?
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No momento em que o professor faculta antecipadamente o sentido essencial de um filme, conduzindo os
estudantes a pontuarem aspectos que ele mesmo outorgou, “está também cancelando, de uma forma autoritária
e dogmática, a possibilidade de escuta” (LARROSA, 2007, p. 146). Acreditar no estudante, sem subordiná-lo
e/ou subestimá-lo, requer oferecer momentos em que a problematização, a negociação, as escolhas e as
invenções estejam presentes. Kastrup reforça essa questão comentando que “nao há possibilidade de extrair a
invenção, a criação cognitiva, de uma cognição que opera com base num programa fechado, no interior de
limites invariantes e intransponíveis” (2007, p. 168).
A seguir, algumas questões elaboradas pelo grupo do PIBID Artes Visuais que fomentaram diálogos com a
docência:
O filme acontece na estação, um lugar de passagem. Como você se vê dentro da escola, que
também é um lugar temporário para você e para o estudante?
O segurança da estação representa a ordem/regras e o dono da loja de brinquedos vive
amargurado com o seu passado. Como pensar o presente/futuro da docência sem destruir
sonhos?
Em que situações escolhemos nosso melhor sorriso, como o inspetor? A docência mereceria hoje
nosso melhor sorriso?
Pensando na cena das crianças na biblioteca, de que maneira você acha que podemos despertar o
interesse dos estudantes para a pesquisa?
Hugo era perseguido e maltratado por causa de suas vestes e atitudes. Como saber se aquele
estudante mais bagunceiro, respondão, na verdade é alguém que, com muita coragem, está
enfrentando uma situação que não foi de sua escolha?
O cenário inquiridor criado nessa intercessão fílmica pôde ser vivido como um campo amplo que acolhe todas
as possibilidades que o pensamento é capaz de inventar, pois se deixou atravessar por diferentes composições,
algumas inusitadas, paradoxais, realistas e ficcionais. Por se utilizarem dessas particularidades para
movimentar fluxos de pensamento e ultrapassar limites, as experiências com imagens fílmicas passaram a ser
um território propício para o diálogo com a educação e a problematização da própria experiência docente.
As questões levantadas nesse encontro não estavam aguardando respostas, pois o que interessava era o
espaço intenso e fecundo que se havia criado, impulsionando a problematização. Isso nos provoca a pensar
que mais importante que a resposta é a potência da questão, é o que ela nos faz pensar, “porque a resposta
poderia matar a intensidade da pergunta e o que se agita nessa intensidade” (LARROSA, 2010, p. 41).
Intercessão Fílmica 3
Nessa intercessão, além do filme ‘O Balão Branco’ (1995), foi facultado mais um elemento neste encontro,
explorando o cruzamento de um novo intercessor, o livro Pedagogia Profana (2010), de Jorge Larrosa. O
propósito era que os conceitos e signos implicados no livro tivessem o papel de tensores, propelindo a pensar a
docência através de uma maior gama de perspectivas.
A seguir, a atenção passa a incidir na narrativa do Acadêmico 01 do Estágio Supervisionado IV, pois parece
repercutir ecos, incitando a pensar e produzir diálogos com o movimento inquiridor da imagem.
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Ao terminar o filme nada parece fazer sentido, nada... Para uma criança sair de casa já é se
aventurar, mesmo que tenha ar de tragédia, atravessando por cobras, contrabandistas e baleias. A
busca pelo peixe dourado parece árdua, mas se ali teve analogias ou metáforas, perdi, e aquele
balão branco ainda é uma incógnita (Acadêmico 01 Estágio Supervisionado IV).
Teixeira; Larrosa e Lopes exprimem que “o silêncio do cinema (...) pode comover nossas ideias e nossas
palavras, pode colocá-las em movimento, pode fazer-nos falar e fazer-nos pensar” (2006, p.17). As imagens
silenciosas podem ser potentes para disparar o pensar, pois oferecem o silêncio necessário para que possamos
nos ouvir.
É nesse sentido que o silêncio impactante no final do filme nos violenta a pensar: o que aconteceu? A menina
Razieh conseguiu comprar seu peixe tão almejado? Qual o sentido do balão branco na última cena? Um hiato
se coloca no fim do filme, e isto parece inquietar. Por apresentar um final incerto, sem um ‘fechamento’, sem um
‘ponto final’, isso causa incômodo e tira dos eixos.
Paradoxalmente, são essas mesmas sensações de desconforto que também passam a capturar e instigar a
pensar na experiência educativa, movendo-nos a problematizar questões ainda não exploradas. Por que este
sentimento, em que tudo necessita ter um encerramento? Por que precisamos deixar tudo tão amarrado, sem
espaços para outros finais, ou melhor, outros ‘meios’ e outras possibilidades? Por que na experiência educativa
necessitamos tudo explicar e arrematar? Por que precisamos fazer o ‘fechamento’ de nossas aulas, como se
elas necessitassem de uma conclusão? Não poderíamos deixar ecoando problemas, em vez de encerrar com
respostas?
Intercessão fílmica: um encontro sempre em vias de acontecer...
As experiências suscitadas nas três intercessões fílmicas realizadas junto aos acadêmicos foram distintas. Nos
encontros surgiram inesperadas relações com a docência, pois diversos signos passaram a estar envolvidos e
imbricados, oportunizando espaço para outras questões. As condições de emergência envolvidas em cada
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intercessão passaram a ser responsáveis pelas problematizações fomentadas e, também, pelas alianças e
arranjos invencionados.
Ainda que venhamos a retomar às intercessões fílmicas buscando exaurir todas as possibilidades, será sempre
um movimento contínuo e inesgotável. Mesmo porque a cada visitação desponta o caráter irreversível de um
encontro, pois o campo de confluências será distinto e não será mais sobre o mesmo indivíduo que os
acontecimentos atuarão.
Ao expor a pesquisa de doutorado e revisitar as três intercessões fílmicas junto com os professores
participantes da 2ª Edição do Projeto Vincular, em setembro de 2015, foi possível constatar que as
ressonâncias dissipadas na apresentação tiveram a propriedade de se renovar neste novo encontro,
evidenciando o quanto as problematizações podem ser inexauríveis. Foi neste cenário plural e inquieto que os
professores presentes, naquela manhã de sábado, sentiram-se provocados a compor mais algumas questões:
Em que medida temos constituído nossas práticas educativas como desafios?
Que espaço temos dado, em nossas práticas educativas, para as experiências singulares trazidas
pelos estudantes?
De que maneira podemos trabalhar com os conteúdos já legitimados como ‘fatos’ injetando neles
um tanto de invenção, de criação? (Professores participantes da 2ª Edição do Projeto Vincular,
setembro de 2015)
Isso nos permite pensar que as três intercessões fílmicas estarão sempre em vias de acontecer, sempre serão
um convite para que outras narrativas e imagens se aproximem ou saiam de cena, para que inusitadas
questões sejam produzidas e para que singulares problematizações possam ser desencadeadas.
A docência não seria justamente isso? Um processo ininterrupto em constante renovação junto ao vivido? Uma
oportunidade de nos reinventarmos a cada acontecimento? Uma circunstância favorável a que nos deixemos
contagiar e afetar, potencializando a nossa capacidade de agir? Uma obra repleta de vazios que nos convida a
ousar, a inventar e a celebrar a vida?
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Referências
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Forense Universitária, 2006.
________________. Conversações [tradução de Peter Pál Pelbart]. 2ª ed. São Paulo: Ed. 34, 2010.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. O que é a Filosofia? [tradução de Bento prado Jr. e Alberto Alonso
Munhoz]. 2ª ed. 4ª reimp. Rio de Janeiro: Ed. 34, 2005.
FOUCAULT, Michel. Polêmica, Política e Problematizações. Entrevista disponibilizada em maio de 1984, na
internet. Disponível em:
http://websmed.portoalegre.rs.gov.br/escolas/quintana/polemica_politica_problematiz.htm Acesso em: 22 fev.
2016.
KASTRUP, Virgínia. A invenção de si e do mundo. Uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da
cognição. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.
LARROSA, Jorge. Literatura, experiência e formação. Caminhos investigativos I: novos olhares na pesquisa em
educação/Marisa Vorraber Costa (org.) – 3. ed. Rio de Janeiro: Lamparina editora, 2007. p. 129-156.
_____________. Pedagogia Profana: danças, piruetas mascaradas. 5. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2010.
LARROSA, Jorge; LOPES, José de Souza Miguel; TEIXEIRA, Inês Assunção de Castro. Olhar a infância. In:
TEIXEIRA, Inês Assunção de Castro; LARROSA, Jorge; LOPES, José de Sousa Miguel. (Org.). A infância vai
ao cinema. 1ªed. Belo Horizonte: Autêntica, 2006, p. 11-25.
VASCONCELLOS, Jorge. Deleuze e o Cinema. Rio de Janeiro: Editora Moderna Ltda, 2006.
47
Filmografia
A INVENÇÃO de Hugo Cabret. Direção de Martin Scorsese. Estados Unidos, 2011. Disponível em
http://www.saudadeeadeus.com.br/filme415.htmAcesso em: 13 de dez. 2012.
LOS COLORES de las flores. Produtora Films Bosalay. Espanha, 2011. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=BhheUpOB640 Acesso em: 20 de agosto 2012.
O BALÃO Branco. Direção de Jafar Panahi. Irã, 1995. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=_3k7sKDZTtk Acesso em: 30 de maio 2013.
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Colaboradoras
Adriana Aparecida Ganzer
Mestre em Educação pela UNESC (2007). Dissertação premiada pelo Minc Iphan, Prêmio Mario
de Andrade (2008): “Eu começava a olhar uma coisa que me interessava e já tinha que olhar
outra”: refletindo sobre a relaçao dialógica entre o museu de arte e a criança. Professora na
graduação em Artes Visuais (Licenciatura e Bacharelado), graduação em Pedagogia e Curso
Superior de Tecnologia em Fotografia na Universidade Feevale. Coordenadora do subprojeto do
Pibid Artes Visuais na Universidade Feevale. Editora do Blog Repensando Museus. Integrante do
Projeto “Cidade das Crianças”, UFRGS, GEARTE, Usina do Papel, Usina do Gasômetro.
Pesquisadora do GPA: Grupo de Pesquisa em Arte e do GEPEI: Grupo de Pesquisa em
Educação Imaginativa na UNESC. Possui graduação em Artes Plásticas Licenciatura e
Bacharelado pela UPF (1993). E-mail: aaganzer@gmail.com
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Foto
: Lilia
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ano
Carla Giane Fonseca do Amaral
Vive e trabalha em Sapucaia do Sul-RS. Professora licenciada em Artes Visuais (UFPEL-
2007), especialista em Educação (IFSul-2010) e Mestre em Educação pelo Programa de Pós-
Graduação em Educação da UFRGS (2014), onde atualmente é doutoranda em Educação.
Docente do Instituto Federal Sul-rio-grandense Câmpus Sapucaia do Sul, atuando nos cursos
técnicos integrados em Plásticos, Informática e Eventos. Tem experiência nas áreas de
Educação, Artes e Design, com ênfase em Ensino de Arte e Formação Docente, atuando
principalmente com os seguintes temas: Ensino Tecnológico, Artes Visuais e Formação
Estética. E-mail: carlagiamaral@gmail.com
Marília Forgearini Nunes
Licenciada em Letras (UFSM), Mestre em Letras (UNISC) e Doutora em Educação (UFRGS).
Professora Adjunta na UFRGS, atuando no Departamento de Ensino e Currículo da Faculdade de
Educação. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Educação e Arte (GEARTE/UFRGS).
mariliaforginunes@gmail.com
Foto
: Lilia
ne G
iord
ano
Larisa da Veiga Vieira Bandeira
Licenciada em Pedagogia pela Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (2008 - 2012). Mestrado em Educação pelo PPGEDu/UFRGS (2012-
2014). Experiência em Formação Continuada para Professores da
Educação Infantil , séries iniciais e Educação de Jovens e Adultos.
Pesquisadora no Programa Observatório da Educação: Escrileituras: um
modo de ler-escrever em meio à vida e no Grupo de Pesquisa Sujeitos,
Inclusão, Narrativas, Identidades e Subjetividades (SINAIS) da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Doutoranda da Linha de
Pesquisa Estudos Culturais em Educação PPGEDu/UFRGS (2015-2019).
E-mail: lvvbandeira@gmail.com
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Foto
: Lilia
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ano
Vivien Kelling Cardonetti
Possui Doutorado em Educação pelo PPGE, na Linha de Pesquisa Educação e
Artes, na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), RS e Graduação em Artes
Visuais - Licenciatura, pela UFSM, RS. Atuou no ensino fundamental e médio da
Rede Pública Estadual Santa Maria, RS e como professora Externa do Curso de
Graduação à Distância de Educação Especial, na UFSM, RS. É membro
pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Arte, Educação e Cultura
(GEPAEC) vinculado ao CNPq. Atualmente é professora Substituta do
Departamento de Metodologia do Ensino (MEN) do Centro de Educação (CE) na
UFSM, RS, atuando nos cursos de Graduação em Pedagogia Diurno e Noturno,
Educação Especial e Licenciatura em Artes Visuais.
E-mail: vicardonetti@gmail.com
Carmen Lúcia Capra
Professora de Artes Visuais na Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS). Licenciada em
Educação Artística pela Universidade de Caxias do Sul (UCS). Mestre e Doutoranda em Educação pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) (2013-2017). Pesquisa a formação docente em artes
visuais com interesse na docência em escola. É integrante do Grupo de Pesquisa Arteversa.
E-mail: caluc.arte@gmail.com
UERGS
www.uergs.edu.br
PIBID-UERGS
http://www.pibiduergs.com/
Blog Artes Visuais UERGS
https://artesvisuaisuergsblog.wordpress.com/
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