a orientaÇÃo educacional e a alfabetizaÇÃo nas escolas de ... · vimos ainda alternativas de...
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
A ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL E A ALFABETIZAÇÃO
NAS ESCOLAS DE ENSINO FUNDAMENTAL:
ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO DO
LEITOR
RITA DE CASSIA MOURA DO VALLE
Rio de Janeiro
2010
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RITA DE CASSIA MOURA DO VALLE
A ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL E A ALFABETIZAÇÃO
NAS ESCOLAS DE ENSINO FUNDAMENTAL:
ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO DO
LEITOR
Monografia de conclusão do
curso de Pós-Graduação “LATO
SENSU” em Orientação
Educacional e Pedagógica
apresentado à Universidade
Cândido Mendes – Instituto a Vez
do Mestre – AVM.
Rio de Janeiro
2010
3
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar ao meu querido e fiel Deus Nosso Senhor Jesus Cristo.
Não posso deixar de agradecer aos meus Pais, pelo apoio incondicional.
À todos da UCAM e do Instituto a Vez do Mestre – AVM, principalmente aos
professores pelo imenso carinho e por nunca deixar de responder meus
questionamentos, bem como pela grande oportunidade de aprendizado.
Aos colegas de curso, pois juntos trilhamos um importante etapa de nossas
vidas.
À minha amiga Simone, pelo seu exemplo de dedicação, perseverança e fé.
À Cláudia Helena, minha grande amiga em todos os momentos, que mais que
me apoiar, não me deixou desistir frente ao desafio.
Por fim, ao meu esposo Dinarte e filho Víctor, meus amores e companheiros de
uma vida.
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DEDICATÓRIA
Dedico esta monografia ao meu Grandioso
Deus Nosso Senhor Jesus Cristo por todas
as bênçãos e vitórias que tem me dado ao
longo da minha vida.
5
RESUMO
O objetivo de estudo desta pesquisa surgiu da necessidade de refletir
sobre a prática docente na formação de leitores, a realidade do cotidiano
escolar bem como as dificuldades encontradas durante o processo de
aquisição da leitura e escrita pelos alunos, buscando ressaltar a importância de
um trabalho sistematizado da orientação educacional e pedagógica na direção
do desenvolvimento das habilidades de leitura, escrita e do contínuo
letramento. Sendo assim, partindo dos princípios teórico-metodológicos que
norteiam as recentes concepções de alfabetização, este trabalho relata a
importância de que novas abordagens sejam estabelecidas para garantia do
sucesso da formação de leitores nas séries iniciais do Ensino Fundamental.
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METODOLOGIA
Esta monografia segue os princípios de uma pesquisa bibliográfica, a
partir de documentos já elaborados, tais como: livros consoantes à temática
abordada bem como demais publicações alusivas à aquisição, estimulação e
aprimoramento dos processos de leitura e escrita.
Em SANTOS (2003) encontramos que:
Nenhuma atividade humana prescinde do uso do método, do simples ato de se preparar um almoço até as atividades para se colocar uma nave girando em torno da Terra. Mas o método não surge de forma desorganizada quando o ser humano se vê frente a um problema que carece de solução. (p. 91)
Portanto, a metodologia aqui eleita surgiu de antecipações mentais e
observação direta em torno da questão que está sendo pesquisada.
Uma vez determinados os objetivos para os quais se direciona o
presente trabalho, serão localizadas e consultadas fontes bibliográficas que
servirão de respaldo para as idéias aqui expostas.
Para SANTOS (2003)
Pesquisa não é somente querer e conhecer o assunto da pesquisa. A escolha do método e da técnica a serem usados numa pesquisa passa pela criatividade, imaginação, iniciativa e disciplina dos estudiosos, além do sentimento de originalidade, isto é, da volta ao princípio, ao estudo. (p. 175)
Assim sendo, este estudo sistematiza-se e desenvolve-se com base em
material já publicado, visando uma melhor interpretação e conclusão a respeito
de como se processa a aquisição e desdobramento da leitura e escrita nos
alunos.
Discorrendo sobre os processos envolvidos nas atividades de leitura,
espera-se que este trabalho traga uma contribuição, não com a finalidade de
esgotar o debate que se faz urgente diante das dificuldades enfrentadas por
7
professores e por alunos, mas antes para estimular a reflexão com o
embasamento teórico que requer tão relevante problema.
8
SUMÁRIO
Introdução....................................................................................................... 09
Capítulo 1
A escola e a formação do leitor ................................................................... 11
Capítulo 2
Abordagens Teórico – Metodológicas:
O pensamento pedagógico e as práticas leitoras ...................................... 18
Capítulo 3
Análise e reflexão sobre o ensino da língua ............................................... 34
Conclusão....................................................................................................... 41
Índice ............................................................................................................................ 42
Bibliografia ..................................................................................................... 43
9
INTRODUÇÃO
Vivemos em uma sociedade letrada na qual a leitura e a escrita fazem
parte da vida diária das pessoas. No entanto, há algum tempo, a alfabetização
tem sido uma questão bastante discutida pelos que se preocupam com a
Educação.
Atualmente, é comum ouvir dos professores que os alunos não gostam
ou não sabem ler e que isso influencia negativamente no processo de
aprendizagem. Encontramos nas escolas alunos desinteressados, sem
motivação e sem perspectiva para o aprendizado, para a sua própria vida.
Talvez, isso de deva ao fato de que alguns professores e escolas promovam o
ensino sem considerar os aspectos afetivos e sociais envolvidos no processo
de aquisição do conhecimento. Uma preocupação excessiva com o
desenvolvimento cognitivo e individual parece criar uma barreira no processo
ensino-aprendizagem, pois não considera o contexto sócio-cultural no qual o
aluno se insere.
O objetivo de estudo desta pesquisa surgiu da necessidade de refletir
sobre a prática docente na formação dos leitores, a realidade do cotidiano
escolar e as dificuldades encontradas durante o processo de apropriação da
leitura e da escrita pelos alunos. Assim, ao pesquisar no campo da linguagem,
ocorreu a necessidade de fundamentação teórica sobre o tema e como
metodologia adotamos a pesquisa bibliográfica como fonte de dados e principal
instrumento.
No primeiro capítulo, abordamos o papel da escola na formação do leitor.
Destacamos a leitura como atividade fundamental desenvolvida pela escola
para a formação dos alunos. E evidenciamos alguns aspectos políticos que
visam assegurar para as crianças o direito de se alfabetizar e participar do
mundo letrado.
No segundo capítulo, apresentamos as abordagens teórico-
metodológicas que norteiam as novas concepções de alfabetização e suas
contribuições para compreender como o aluno aprende e assim chegar ao
domínio da leitura e da escrita enquanto prática social.
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No terceiro capítulo, ressaltamos a importância de se refletir sobre o
ensino da língua. Vimos ainda alternativas de ações pedagógicas, as
contribuições da Orientação Educacional às práticas pedagógicas e fatores a
observar durante o ensino para superar as dificuldades e promover o
desenvolvimento dos alunos. Buscamos também a compreensão da natureza
da leitura e da escrita e constatamos que não existem receitas prontas para o
ensino, e sim atividades bem planejadas que possam garantir ao aluno uma
aprendizagem significativa.
Finalmente, trazemos considerações finais, relatando a importância de
pensarmos novas abordagens que estabelecem relações de confiança,
segurança e desenvolvimentos dos alunos, o primeiro passo para um trabalho
de sucesso.
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CAPÍTULO 1
A ESCOLA E A FORMAÇÃO DO LEITOR
Aprender a ler é um processo continuo que tem inicio mesmo antes da
escolarização, mas é na escola que esse aprendizado acontece de forma mais
sistemática. Quando se trata de formar o leitor, a escola tem um papel muito
importante, que consiste em relacionar as práticas sociais de leitura com as
práticas escolares do ensino e aprendizagem.
Um dos grandes desafios da escola hoje é transformar seus alunos em
bons leitores, fazer com que os alunos percebam a leitura não só como um
meio para conhecer o mundo e resolver problemas práticos, mas também
como uma das formas de desenvolvimento pessoal e de felicidade é uma tarefa
difícil para os educadores. Segundo ZILBERMAN e SILVA (2002)
O funcionamento das instituições é mais significativo que sua organização, dado ser ele dinâmico como a leitura. A competência (ou falta de) por parte da escola é altamente expressiva, pois traduz a maneira como ocorre o relacionamento entre as classes sociais. (p. 114)
Contudo, a escola é um local de aperfeiçoamento permanente que pode
oferecer as condições necessárias para explorar as muitas dimensões da
leitura e também da escrita, mas por onde começar?
Há anos discute-se sobre a importância da leitura nos processos
educacionais. Entretanto, tais discussões pouco têm contribuído para
instrumentalizar o professor em seu trabalho com a formação do leitor,
principalmente no que diz respeito ao desenvolvimento das produções textuais
e ao incentivo do ato de ler por prazer.
Ainda hoje, não obstante os avanços nos estudos lingüísticos e
abordagens diferenciadas para investigações teóricas e metodológicas sobre
os mecanismos de leitura, são constatadas dificuldades vividas por alunos e
12
professores, tanto no processo de estimulação e aquisição de hábitos de leitura
quanto na consolidação desses saberes.
Sendo assim, esta pesquisa pretende analisar as dificuldades no
processo de leitura e escrita nas séries inicias do Ensino Fundamental,
investigando como o conhecimento pode ser organizado de forma articular os
diferentes saberes que os alunos possuem com o processo de apropriação da
leitura e da escrita e estabelecer a importância de um trabalho sistematizado
na direção do desenvolvimento das habilidades cognitivas e do contínuo
letramento.
1.1 A leitura em questão
Uma das queixas mais freqüentes dos professores do Ensino
Fundamental é de que os alunos não compreendem o que lêem e apresentam
muitas dificuldades quanto à construção da escrita, a produção de textos
coerentes, a articulação das idéias a capacidade de argumentação.
É comum que docentes das mais variadas áreas atribuam o fracasso
aluno ao fato de não “saberem ler”, o que se fundamenta no fato de que o
desempenho do aluno não só quanto à linguagem, mas em todas as áreas do
conhecimento, está diretamente relacionado à capacidade de compreensão,
principalmente do texto escrito.
Segundo FAZENDA (1994) “essa dificuldade redunda numa escrita
fechada e pouco clara que muitas vezes provem da dificuldade em
compreender e interpretar textos tão difícil como o domínio da escrita, e que
não se resolve da noite para o dia.” (p. 14)
Assim sendo, quanto mais avançada na escolaridade, mais o aluno se
desinteressa e menor se torna a sua ligação com a leitura, o que intervém
negativamente no desenvolvimento das habilidades de escrita nas séries
iniciais do Ensino Fundamental.
É por isso que ler e escrever é a coisa mais importante que a escola tem
que ensinar nos dias atuais. Embora considerando que muito já foi dito sobre a
questão, pretendemos abordar esse aspecto mais detalhadamente, segundo os
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princípios de uma pesquisa bibliográfica, a partir de documentos já elaborados,
consoantes à temática abordada, bem como demais publicações alusivas à
aquisição, estimulação e aprimoramento dos processos de leitura e escrita
acrescentando dados importantes para sua compreensão.
Queremos que os alunos aprendam a ler, escrever e a se expressar não
somente para a escola e “sim para o mundo”. (FREIRE, 1983), lançando mão
dos conhecimentos com autonomia e adequação.
1.2 O desafio de ensinar a ler
O trabalho com a leitura deve ser uma prática constante, tanto no
ambiente escolar, quanto fora dele. Seu principal objetivo deve ser formar
leitores competentes e que gostem de ler. No entanto acreditamos que, se o
objetivo principal é viabilizar a leitura na escola como possibilidade de um
encontro prazeroso, as fórmulas que são trabalhadas, não correspondem a
essa prática.
De acordo com os PCN Língua Portuguesa (BRASIL, 1997, p.54) para
se formar um leitor competente é preciso “formar alguém que compreenda o
que lê, que possa aprender a ler também o que não está escrito, identificando
os elementos implícitos (...)”.
Na formação do leitor é preciso ter claro que não é apenas um processo
de decodificação de letras e palavras, não é somente converter as letras em
sons. Ler é um processo de atribuição do sentido ao texto, é a construção do
significado do texto para o leitor. Por meio da leitura, o conhecimento de mundo
das crianças bem como seus conhecimentos lingüísticos e textuais são
acionados e valorizados. O aluno leitor é levado ainda a refletir sobre os textos
lidos.
A construção desse caminho emancipatório se baseia na concepção de
leitura como prazer, como prática significativa que possibilite ao aluno uma
leitura contextualizada e requer que a escola restabeleça os papeis a serem
assumidos pelo professor, pelo aluno e as práticas alfabetizadoras
desenvolvidas neste processo.
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1.3 Ler para quê?
Geralmente é nas séries iniciais do ensino fundamental que se formam
os leitores. Não é uma tarefa fácil, que se faz da noite para o dia. Portanto,
toda atenção dispensada à leitura é da maior importância e ela deve ser tratada
como um fim em si, por sua complexidade. Segundo INOSTROZA (1998, p.46)
“ler é uma atividade complexa de tratamento de várias informações por parte
da inteligência. Ler é um processo dinâmico de construção cognitiva, ligado à
necessidade de atuar, no qual intervém também a afetividade.”
Desta forma, para aprender a ler, um indivíduo necessita de um processo
interativo das relações interpessoais e faz-se necessário construir uma
representação adequada dos fins de leitura, bem como do ato de ler, ou seja,
os educandos devem começar a descobrir a funcionalidade do saber – ler (para
que serve?). Perceber que o texto é um meio de comunicação que quer dizer
algo, tomando consciência das diversidades das práticas de leitura.
Para superar esse desafio é fundamental que a escola não limite o
acesso do aluno somente do livro didático, mas incentive e amplie o seu
contato com diversos tipos de textos e demais materiais que sejam fontes de
formação e informação. A diversidade textual cria condições para que os
alunos produzam e interpretem os mais variados textos que circulam
socialmente e fazem parte da vida dos indivíduos. A leitura e a escrita
desvinculadas do uso sociais e da interação com outros textos concorrem para
a produção de não-leitores. Então, o ensino da leitura e da escrita deve servir
como instrumento que possibilite maior participação em sociedade.
A escola pode garantir aos alunos o uso da língua (oral e escrita)de
forma significativa, compreendendo o mundo que os cerca e ajudando-os a
expressar-se de maneira crítica em diferentes contextos. Educando-os para a
cidadania. Para COLL (1998):
A educação deve proporcionar ao indivíduo um crescimento pessoal, possibilitando que ele se integre socialmente (...). A
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escola tem como finalidade tornar esse indivíduo membro ativo, capaz de provocar mudanças e criações culturais. (p. 28)
Nessa concepção, a prática pedagógica para a alfabetização da criança,
deve criar condições favoráveis para que desenvolvam habilidades que as
levem a aprender a aprende. Verificar como os alunos avançam no processo
de leitura e escrita, repensar as práticas educativas, vislumbrando algumas
possibilidades de avanços para os educandos, torna a escola um espaço de
produção em que linguagem seja concebida como um processo social.
1.4 O aluno como leitor-aprendiz
Com relação às habilidades de leitura e escrita dos alunos e a dificuldade
para compreender o que lê, a escola é considerada deficiente, com
metodologia de ensino mecanicista, que influencia em profundidade a formação
do leitor.
Acreditando nas possibilidades oferecidas por um caminho alternativo,
buscamos como orientadores, trilhar uma perspectiva mais emancipadora no
campo da formação de alunos-leitores. Nesta perspectiva, a leitura não é vista
como um dever e sim um elo para despertar a consciência do aluno-aprendiz
em relação ao mundo real. Defendendo a idéia de que os educadores podem
oferecer aos alunos a oportunidade de interagir com os textos para a aquisição
e apropriação adequada da leitura e da escrita.
O ato de ler pode ser compreendido na escola como uma atividade livre,
também é importante estimular o desenvolvimento crítico e criativo dos alunos,
por meio de discussões que visem a troca de idéias e a compreensão dos
sentidos atribuídos aos textos.
Como desdobramentos de uma leitura crítica e criativa, podem ser
desenvolvidos atividades que façam com que o leitor aprendiz busque
significados e sentidos que surgem com a leitura. Oportunizar sempre o contato
com diferentes textos a fim de que se familiarize e desenvolva maior
competência na leitura.
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Nesse sentido, o ato de ler pode ser revestido de prazer de gosto e de
fruição na escola, para tanto é necessário que também o professor sinta esse
prazer como leitor e que evite impor regras a essa prática de leitura. Para
Barthes (1973)
Texto de prazer: aquele contenta enche, da euforia; aquele que vem da cultura, não rompe com ela está ligado a uma prática confortável de leitura. Texto de fruição: aquele que coloca em situação de perda, aquele que desconforta, faz vacilar as bases históricas, culturais, psicológicas do leitor, a consistência dos seus gostos, dos seus valores e das suas recordações, faz entrar em crise a sua relação com a linguagem (p. 49).
Portanto, o trabalho desenvolvido pela Orientação Educacional no
Ensino Fundamental, deve ser o de criar o gosto pela leitura, propiciando o
desenvolvimento do comportamento leitor. Fazer com que os estudantes se
tornem leitores autônomos e críticos.
1.5 Política e Alfabetização nas escolas
O contexto social no campo da educação aponta para a alfabetização
com um dos maiores desafios da escola e dos educadores brasileiros. Há que
se considerar problemas particulares que se tornaram relevantes em nossa
sociedade atual, o que se convencionou chamar “crise de leitura”.
Segundo ZILBERMAN e SILVA (2002) há
Por uma parte, a constatação das carências no campo da educação, incluindo-se entre outras, as deficiências do processo de alfabetização nas escolas, a pequena quantidade de leitura dos textos em sala de aula, a má qualidade do material a ser lido; por outra, a concorrência dos meios de comunicação de massa (...) prejudiciais à relação do leitor com o universo social e cultural. (p. 08)
A escola, atualmente, tem tentado reverter esse quadro, investindo no
estímulo à leitura, reconhecendo que o ato de ler é fundamental na formação
17
do aluno e que desenvolver habilidades de leitura é uma de suas
responsabilidades.
Numa pesquisa implementada pela Câmara Brasileira do Livro em
parceria com o Ministério da Educação é publicada na Revista Nova Escola
(agosto, 2006) demonstra que 61% dos brasileiros têm pouco ou nenhum
contato com os livros. Na mesma pesquisa mostra que enquanto na França, o
número de livros por um indivíduo no período de um ano é de sete exemplares,
no Brasil a média é de 1,8 por pessoa.
Investimentos na aquisição de livros que garantam o acesso à leitura
didática e paradidática vêm sendo implementados pelo Programa Nacional do
Livro Didático, (PNDL), desde 1985.
Com a finalidade de distribuir gratuitamente livros escolares aos
estudantes das escolas públicas, o PNDL contribui para melhorar o ensino nas
séries iniciais do Ensino Fundamental, conferindo ao professor a tarefa de
escolher o livro didático.
O programa é administrado pelo FNDE, com o funcionamento de Salário-
Educação e recursos do Orçamento Geral da União. Entre os anos de 1994 e
2003, segundo a Revista Nova Escola, o PNLD investiu 3,2 bilhões de reais, na
compra de livros para estudantes.
Contudo, um grande contingente de crianças não aprendem a ler e a
escrever na escola brasileira. Por isso, entendemos que o desafio da
alfabetização é muito maior do que apenas uma questão metodológica, refere-
se também uma questão política.
Para GARCIA, (1998)
Discutir alfabetização é discutir o projeto político que se pretende para este país, não apenas pelas conseqüências sociais do analfabetismo, mas também porque o modo se direciona a prática pedagógica traz uma determinada concepção de mundo e de homem. (p. 25)
De acordo com o SAEB (Sistema de Avaliação do Ensino Básico) sobre
a avaliação realizada em 2001, apenas 4,48% dos estudantes da 4º série
apresentam um nível adequado par continuar seus estudos no segundo
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segmento do Ensino Fundamental, 36% está num nível intermediário, ou seja
começa a desenvolver habilidades de leitura e 59%, a grande maioria dos
alunos encontram-se nos estágios mais elementares de compreensão de
leitura e da escrita ou seja , não desenvolveram habilidades de leitura e
escrita, embora sejam na escola.
Os dados do SAEB também mostram que o fracasso do analfabetismo é
maior entre as crianças pobres, trabalhadoras e negras.
Todos esses dados confirmam que o problema do analfabetismo tem
suas raízes no modelo-sócio político-econômico de nossa sociedade, ou seja,
esse modelo não assegura a todos os brasileiros a igualdade de acesso a bens
econômicos e culturais incluindo o domínio da língua escrita.
Diante do que foi explicado e fazendo uma síntese entre o cenário da
leitura nas escolas de nível básico, o acesso ao material e o distanciamento
entre o investimento feito e a realidade que se apresenta, pretendemos analisar
os principais desafios que os professores e Orientadores educaionais
enfrentam para alfabetizar e formar leitores no Ensino Fundamental.
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CAPÍTULO 2
ABORDAGENS TEÓRICO-METODOLÓGICAS:
O PENSAMENTO PEDAGÓGICO E AS PRÁTICAS LEITORAS
O pensamento pedagógico tem se modificado ao longo os tempos e
circulam idéias que se contrapõem a um modelo de escola tradicional.
Atualmente, destaca-se a importância de considerar o saber da criança, bem
como a necessidade de que o professor estabeleça um contato afetivo com os
alunos para que façam um bom vínculo com a escola e com o próprio
aprendizado.
É importante refletir como essas idéias chegam ao cotidiano escolar e
como se pode transformar a visão educacional a partir de uma nova prática
pedagógica. GARCIA (1998) afirma:
Reconhecer a professora como capaz de teorizar sobre sua própria prática é para nosso grupo um principio teórico-epistemológico que alicerça nossa ação política e que nos faz considerar a escola como um espaço de teoria em movimento permanente de construção, desconstrução e reconstrução. (p. 219).
Sendo assim, entendemos que o cotidiano escolar deve-ser um espaço
de teoria em movimento, na medida em que a articulação teoria e prática
apontam novos caminhos para a prática pedagógica.
A escola de hoje, tal como concebida no século XIX, não tem dado conta
da tarefa de educar de acordo com a demanda de nosso tempo. No entanto,
não nos basta uma reforma superficial, de fachada. A escola precisa de uma
transformação estrutural. Numa dimensão epistemológica, o processo de
mudança no contexto escolar diz respeito a novas formas de relação do
homem com os valores, com os saberes constituídos culturalmente.
A abordagem educacional, hoje, assenta-se na necessidade de
posicionamento crítico diante das informações recebidas, que precisam ser
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selecionadas, processadas, reorganizadas, face às que já existiam, e
devolvidas em forma de novo conhecimento.
A aprendizagem, nessa perspectiva, possui duas dimensões: a primeira
reside em um processo individual, no qual o educando elabora a informação e
aprende, interagindo apenas com objetos; a segunda se fundamenta em um
processo dinâmico de interação, com a informação e com outros indivíduos
(objetos e sujeitos), para a construção do conhecimento. Essa segunda
dimensão permite que o conhecimento seja elaborado, pois é colocado em
confronto com outras experiências, com outras visões de mundo. É, portanto,
desestabilizado, para ser reorganizado posteriormente. A aprendizagem passa
a ser fruto de um processo de construção coletiva. Essa abordagem de
aprendizagem em interação precisa ser paradigma na Educação.
Hoje, já não temos verdades a ensinar; temos habilidades a desenvolver. E por já não termos o que ensinar, devemos ensinar a aprender. Tornar-se essencial, portanto, que a Educação se alicerce em modelos flexíveis, que tornem o aluno capaz de se readaptar, rapidamente, (...). Nesse contexto, muito se tem discutido a utilização de novos recursos no ambiente escolar. Tal discussão, no entanto, sempre esteve adstrita a perspectivas ideológicas, filosóficas ou mesmo sociológicas, sem que pesquisadores se dispusessem a verificar, mais objetivamente, quais os efetivos benefícios da utilização de tais recursos sobre a aprendizagem (VILLARDI, 2001).
Se já não temos o que ensinar, nem podemos prever planejar o que
precisamos saber; admitimos uma busca por novos paradigmas para a
Educação.
2.1 A formação da identidade através da língua escrita.
Pensar na escola é pensar em sua inserção social. Não se pode
preocupar em apenas fazer uma escola para garantir o futuro dos alunos, mas
sim favorecer uma formação mais ampla, que dê subsídios para que os sujeitos
possam construir uma vida mais digna e mais feliz.
21
Portanto, a escola tem hoje um papel muito importante na formação geral
das pessoas: Propiciar aos educandos vivências que contribuirão para a sua
formação e a valorização da própria identidade.
É na escola que a criança vai poder relacionar-se com o seu grupo,
fortalecer sua autoconfiança e reconhecer-se como sujeito capaz de aprender,
relacionar-se e produzir cultura. Sendo assim, ela precisará reconhecer que o
espaço da escola é um campo rico de experiências de vida e de criação, de
relacionamentos entre diferentes indivíduos que nela convivem. Desta forma, a
identidade do aluno pode ser constituída a partir das múltiplas experiências que
ele tem ao longo de sua vida, bem como as experiências de leitura e escrita e
tantas outras vivenciadas ao longo de seu processo de formação enquanto
cidadão.
Vivemos numa sociedade altamente letrada, portanto, uma das
condições para uma participação social de verdade é dominar a leitura e a
escrita. Estamos cercados de leitura por toda a parte. Alem disso muitas
atividades do dia-a-dia exigem a leitura e a escrita, no entanto ainda é comum
encontrarmos pessoas que lêem muito delimitadamente, os chamados
analfabetos funcionais, ou seja, embora saibam ler e escrever tem dificuldade
em utilizar a leitura e a escrita com autonomia, muitas vezes a distancia entre a
escrita, e a leitura e a compreensão é resultado de um aprendizado que não
favoreceu o sujeito a encontrar sentido naquilo que esta lendo.
Dessa forma, aprendendo a “decodificar” de forma separada do aprender
a interpretar formam-se leitores com dificuldade em fazer leituras interpretativas
e, conseqüentemente, escritores com dificuldade de se utilizarem da língua
escrita como forma de expressão.
De acordo com VYGOTSKY (1989):
Ensina-se as crianças a desenhar as letras e construir palavras com elas, mas não ensina-se a linguagem escrita. Enfatiza-se de tal forma a mecânica de ler o que está escrito que acaba obscurecendo-se a linguagem escrita com tal (p.119 a)
22
Segundo o autor, a escrita não pode continuar a ser ensinada as
crianças como uma complicada habilidade motora por se constituir “um sistema
particular de símbolos e signos..., que designam os sons e as palavras da
linguagem falada os quais, por sua vez são signos das relações e entidades
reais” (id.p.120).
Os homens criaram os signos, como a linguagem, a escrita, os números,
os gestos por meio dos quais produziram cultura. Nesse sentido, a linguagem é
“constituidora da consciência e organizadora da ação humana”.
Pela linguagem, o homem se diferencia dos outros animais e toma
consciência de si mesmo, de sua realidade, agindo coletivamente e
cooperativamente, transforma-se e transforma o mundo em que vive. Tomando
consciência se sua identidade, através da linguagem, base da comunicação
entre homens.
Para VYGOSTSK (1989), existe uma conexão entre o pensamento e a
linguagem de forma que o “pensamento nasce através das palavras. Uma
palavra desprovida de pensamento é uma coisa morta, e um pensamento não
expresso por palavras permanece uma sombra” (p.131 b).
A medida em que a criança internaliza os sistemas de signos
construídos culturalmente, como aprender a ler e a escrever, sua consciência
sobre a realidade vai se modificando, os processos mentais mudam.
Aprendendo a ler e as escrever, a criança internaliza formas culturais de
comportamento.
2.2 As teorias de Alfabetização.
Atualmente, os modos de aquisição e trocas de conhecimento vêm
sendo modificados. As práticas tradicionais de ensino, aos poucos estão sendo
substituídas por outras concepções, tendo em vista a necessidade de pensar
na formação de um novo indivíduo capaz de lidar com as mais diversas
situações.
E como fazer isso na escola?
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Percebemos que o ensinar não desapareceu. O que precisamos é (re)
aprender a ensinar. Assim, para que aprendizagem aconteça é necessário e
fundamental que haja essa mudança nas concepções alfabetizadoras que o
educador se conscientize de que está sempre aprendendo, que está sempre
em um processo de mudanças e de aquisição de novos estágios do saber.
Podemos afirmar que o novo provoca mudanças na maneira como
pensamos, conhecemos e aprendemos. Por isso a escola, enquanto espaço de
transformação deve participar dessas modificações para tornar possível que o
aluno perceba uma educação de melhor qualidade, mais participativa e
interativa.
O mundo, as relações e as identidades mudaram, assim como as concepções e as práticas educacionais. Em função dessas mudanças, não podemos mais pensar nem praticar a pedagogia e o currículo como antes. (CORAZZA, 2000, p.27)
As metodologias tradicionais da alfabetização concebem a aprendizagem
da escrita como transcrição linear de sinais sonoros (fala) em sinais gráficos
(escrita), reduzindo a alfabetização aos aspectos de codificação oral (para
escrever) e decodificação da escrita (para ler). Ao confundir métodos de ensino
com processo de aprendizagem, que neste caso, se dá por meio da
memorização e da repetição. Na abordagem associacionista aprender a ler e a
escrever é dominar a técnica de codificação e decodificação. Ou seja, na
concepção associacionista, o ensino se fundamenta no jogo combinatório e
mecânico grafia-som, som-grafia e no treino da percepção auditivo-visual.
Sabemos que o processo de codificação decodificação faz parte de
aprendizagem da leitura e da escrita. No entanto, a alfabetização, por sua
complexidade, envolve outros aspectos que se relacionam à codificação–
decodificação. São processos de significação e de atribuição de sentidos: A
apropriação da leitura e da escrita é, portanto um processo complexo de
codificação do oral e decodificação do escrito que se desenvolve não pela
memorização e repetição, mais sim através da elaboração de significados e da
produção de sentidos.
24
O saber ler e escrever serve para abrir os olhos da gente, não
apenas para aprender o mundo dos outros, mas para também aprender o mundo da gente. (Secretaria Municipal de Educação. SÃO JOÃO DE MERITI, 1998, p.59)
2.3 A concepção construtivista de Alfabetização.
As bases da visão construtivista colocam o aluno no centro do processo
da construção do conhecimento e exigem dele uma postura participativa.
Nesse processo de alfabetização, o aluno é visto como um sujeito ativo e não
mais um receptor onde são depositadas letras e palavras. Ele participa do
processo, questionando e é incentivado pelo professor em suas indagações.
Na concepção construtivista, o aluno é o sujeito que constrói o seu
conhecimento a partir das interações que estabelece com aquilo que vai ser
aprendido.
A concepção construtivista de Emília Ferreiro fundamenta-se na teoria
de Jean Piaget, no que diz respeito ao estudo da forma como a criança pensa
e constrói seu percurso de aprendizagem da escrita. A principal contribuição
para a prática pedagógica é a possibilidade de compreender o processo de
alfabetização das crianças, a partir de suas hipóteses e assim planejar as
atividades e as intervenções pedagógicas, tendo como ponto de partida e como
os alunos organizam o seu pensamento para expressarem suas idéias e o
mundo que os cerca. Segundo FERREIRO, (2001, p. 17) “quando uma criança
escreve tal como acredita que poderia ou deveria escrever certo conjunto de
palavras, está nos oferecendo um valiosíssimo documento que necessita ser
interpretado e avaliado.”
Sendo assim, é preciso valorizar as produções espontâneas realizadas
pelas crianças, pois são elas os indicadores mais claros para se compreender
a natureza da escrita.
A criança ainda que proveniente das classes sociais usuárias de um
repertório restrito de palavras, já é capaz de construir frases com certa lógica.
25
Cabe ao educador entender que saber algo sobre alguma coisa não significar
expressá-lo da forma socialmente esperada.
Desta forma, o construtivismo permite compreender as etapas que as
crianças passam na aprendizagem da escrita e possibilitar ao professor
alternativas para a intervenção pedagógica. Portanto, trabalhar com
construtivismo é deixar que a criança construa por si esmo, porém, com a
intervenção sistemática do professor, durante o processo da aprendizagem.
Emília Ferreiro nos apresenta cinco níveis de aprendizagem no que se
refere ao desenvolvimento do pensamento da criança durante a aprendizagem
da escrita: o pré-silábico, o intermediário I, o silábico, o intermediário II ou
silábico-alfabético e o alfabético.
No nível pré-silábico, mais ou menos aos 5 anos, é comum a criança
permanecer um bom tempo desenhando. Em certo momento, ela percebe que
alguns traços podem significar alguma coisa e começa a desenhar a partir de
uma representação mental que possui de formas e objetos conhecidos. A
criança mistura as letras que conhece para escrever qualquer coisa e, nessa
fase, ela espera que a escrita do nome das pessoas e dos objetos corresponda
à sua idade e ao seu tamanho.
O nível intermediário I é marcado pelo conflito de transição entre os
níveis pré-silábico e silábico. Nesse momento, a criança busca a
correspondência entre a letra e o seu valor sonoro, percebendo certa
estabilidade nas palavras.
O nível silábico caracteriza-se pela descoberta, por parte da criança, da
correspondência grafônica presente na escrita e pela atribuição de um valor
sonoro a cada sílaba.
O intermediário II ou silábico-alfabético é o nível marcado pelo conflito
cognitivo vivido pela criança na transição do nível silábico para o alfabético.
O nível alfabético é a fase da apropriação do conhecimento do sistema
lingüístico e de sua organização e, ainda, pelo reconhecimento da distinção
entre letra, palavra e frase.
A alfabetização em uma abordagem construtivista não se baseia em
métodos, mais em princípios. Esta concepção modifica o olhar de como o
26
sujeito aprende, promovendo questionamentos sobre as práticas desenvolvidas
nas escolas. Colocando o sujeito no centro do processo ensino-aprendizagem
cria uma filosofia que gera novos princípios metodológicos e sob esta
perspectiva pode-se pensar que para aprender é preciso agir sobre o objeto do
conhecimento. É preciso compreender a lógica do aluno e deixar que ele
exponha as suas hipóteses sobre o objeto do conhecimento. Assim o aluno
aprende quando é estimulado a pensar, refletir sobre as suas hipóteses,
ampliando e aprofundando seus conhecimentos. Nesse sentido, o aluno
aprende quando é estimulado por uma proposta de trabalho desafiante e
quando estabelece conflitos cognitivos.
O processo de ensino da leitura e da escrita, sob a perspectiva
construtivista, deve partir da lógica que a criança concebe em seu nível
psicogenético. É a partir da concepção de escrita postulada pela criança que o
professor poderá propor situações de conflito cognitivo, levando-a ao domínio
da escrita alfabética.
O construtivismo não é uma prática ou um método, não é uma técnica de ensino nem uma forma de aprendizagem; não é um projeto escolar; é, sim, uma teoria que permite (re) interpretar todas as coisas... (BECKER, 1993, p. 89)
Como vimos à concepção Construtivista não é um método, portanto não
pressupõe a criação de atitudes que não façam parte de um contexto com o
qual o professor está trabalhando. É preciso propor aos alunos atividades,
desafios, que tenham sempre sentido, significado dentro de um contexto. É a
partir do envolvimento e da interação entre as crianças e o professor que as
hipóteses serão desequilibradas e reequilibradas num verdadeiro processo de
construção da aprendizagem.
O trabalho de alfabetização pela teoria construtivista pressupõe a
intervenção constante sobre as respostas que os alunos apresentam durante o
processo. É a partir das hipóteses explicitadas pelos alunos que o professor
organiza as atividades e propostas de intervenção coletiva. Isso quer dizer que
o professor alfabetizador, além de ter um saber teórico a respeito das hipóteses
27
vivenciadas pelas crianças no processo de construção da escrita, deve ter
clareza das ações que levam o domínio da escrita a patamares mais elevados.
Assim sendo, a organização de procedimentos alfabetizadores envolve o
trabalho simultâneo de leitura, produção de texto e análise dos elementos que
organizam um texto escrito. Trabalhando com textos significativos ao universo
da criança, o professor investe em atividades de leitura e escrita, antes mesmo
de a criança dominar o código escrito. A proposta construtivista defende que o
professor trabalhe com textos significativos e que desenvolva jogos e
atividades reflexivas que possam desencadear uma série de conhecimentos
que aprofundam a relação da criança com a leitura e a escrita.
No campo da ortografia, de acordo com o paradigma construtivista, as
crianças que refletem sobre o modo de organização do sistema de escrita
apresentam menos dificuldades para escrever. A aprendizagem ocorre a partir
de situações que obrigam o aluno a estruturar uma lógica em respostas aos
desafios propostos e isso permite a construção de novos conhecimentos. O
aluno é encorajado a expor seu ponto de vista e ultrapassar seus limites na
interação com o objeto de estudo. Nesse sentido, o aluno amplia a sua visão
sobre o funcionamento da escrita, internalizando regras presentes em nosso
sistema ortográfico pela reflexão das palavras em diferentes contextos de uso
da escrita.
2.4 A Concepção sociointeracionista de Alfabetização
A concepção sociointeracionista reconhece a ação recíproca entre o
sujeito e seu meio no processo de desenvolvimento do homem, no seja, no
processo de internalização de formas culturais de comportamento, que a
apropriação da leitura e da escrita representa para a criança, o papel do outro é
fundamental, pois o que o outro diz ou deixa de dizer é constitutivo do
conhecimento. Nessa abordagem a criança constrói conhecimento,
permanentemente, nas situações de interação que vive fora e dentro da escola.
Ela aprende com a professora, com as outras crianças e com outros adultos.
28
O conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal elaborado por
Vygostsky confirma o caráter interativo e social da construção do conhecimento
ao apontar o desenvolvimento dos sujeitos aprendizes, possibilitadas pela
cooperação num momento anterior que darão suporte para as realizações
posteriores, individualmente. Sendo assim, a criança fará sozinha amanhã o
que hoje realiza em cooperação com os outros.
Defendendo a natureza social do conhecimento, Vygostsky aponta
também que “aprendizado e desenvolvimento estão inter-relacionados desde o
primeiro dia de vida da criança” (1989). Desta forma, propostas de atividades
que favoreçam a aprendizagem na escola devem orientar e estimular
processos internos de desenvolvimento. O papel do educador nessa
perspectiva é o atuar como mediador para que as crianças, a partir da troca e
da interação possam superar seus próprios limites, ao mesmo tempo em que
se desenvolve.
O processo inicial da leitura e da escrita, a partir da perspectiva de
Vygostsky, enfatiza as funções interativas e constituidoras do conhecimento
por meio da escrita. A alfabetização é um processo discursivo, a criança
aprende a ouvir, a entender o outro pela leitura, aprende a falar, a dizer o que
quer pela escrita. Enquanto escreve, a criança aprende a escrever e aprende
sobre a escrita. Enquanto lê a criança aprende a ler e aprende sobre a leitura.
Na perspectiva histórico-social, a construção do conhecimento sobre a
escrita não envolve apenas o aspecto cognitivo, mas está inserida também nas
representações sociais. Reconhecendo como uma atividade discursiva, a
escrita implica uma elaboração conceitual pela palavra e não apenas uma
atividade cognitiva.
Na visão sociointeracionista de Vygostsky, podemos afirmar que o
pesquisador “considera o desenvolvimento da complexidade da estrutura
humana como um processo de apropriação pelo homem de experiência
histórica e cultural.” (FREITAS e FREIRE, 1999, p. 11).
Para Vygostsky, organismo e meio exercem influência recíproca um
sobre o outro, por conseguinte, o biológico e o social não estão dissociados.
29
Nestas interações ele transforma e é transformado. Por isso mesmo, a
referência sociointeracionista identificada ao seu pensamento.
2.5 Alfabetização e Letramento
Na perspectiva sociointeracionista, a alfabetização diz respeito às
práticas sociais que envolvem a leitura e a escrita. Tal perspectiva entrelaça os
conceitos de alfabetização e letramento, na medida em que salienta um caráter
provisório das aprendizagens (estamos sempre nos alfabetizando em alguma
área do conhecimento e nunca estamos completamente alfabetizados) e
salienta as características sócio-históricas da apropriação do sistema da escrita
por um grupo social. O letramento é um fenômeno social, resultante da ação de
ensinar e aprender a ler e escrever, e denota estado ou condição que um
sujeito ou grupo social obtém como resultado de ter-se, apropriado da escrita
de sua língua materna.
Do ponto de vista teórico, os conceitos de alfabetização e letramento,
embora estejam associados, apresentam distinções precisas. Para Tfouni
(1995), a alfabetização se ocupa da aquisição da escrita por um sujeito ou
grupo social, enquanto o letramento focaliza os aspectos sócio-históricos da
aquisição de um sistema escrito por uma sociedade, referindo-se ainda ao
estado ou condição de quem não apensa sabe ler e escrever, mas cultiva e
exerce as práticas sociais que usam a escrita.
Os estudos de Soares (1998) confrontam teoricamente os processos de
letramento e de alfabetização, ao mesmo tempo em que busca construir uma
definição para os termos alfabetizar, alfabetização e letramento. Assim,
segundo a autora, alfabetizar é “ensinar a ler e a escrever, é tornar o indivíduo
capaz de ler e escrever”, alfabetização é “a ação de alfabetizar” e letramento é
“o estado ou condição que adquire um grupo social ou indivíduo como
conseqüência de ter-se apropriado da escrita e de suas práticas sociais.”
(SOARES, 2003).
O conceito de letramento articulado ou conceito de alfabetização traz um
novo enfoque para os usos e as funções sociais da escrita e para o processo
30
de apropriação do código escrito, o que do ponto de vista da prática
pedagógica acarreta profundas transformações, pois envolvem diretamente as
práticas sociais de leitura e escrita que contém outros saberes.
Os estudos acerca da psicogênese da língua escrita, que consolidaram o
paradigma construtivista no campo da alfabetização, contribuíram para ampliar
a compreensão dos educadores sobre a complexidade do processo de
apropriação da leitura e da escrita; a alfabetização, mais do que a aquisição de
um código, envolve um processo complexo de “elaboração de hipóteses sobre
a representação lingüística” (SILVA e COLLELLO, 2001, p.1).
Tal compreensão possibilitou a incorporação da dimensão sociocultural
nos estudos sobre a alfabetização, o que acarretou uma ruptura (pelo menos
no campo teórico) definitiva com a concepção tradicional do processo ensino-
aprendizagem, que vê a aprendizagem da leitura e da escrita com um
fenômeno estritamente escolar e a sala de aula como seu espaço privilegiado.
Os fundamentos teóricos desta ruptura são as teorias interacionistas de
Vygostsky e Piaget, que vêem a aprendizagem como uma relação de interação
entre o sujeito e o meio sociocultural. No paradigma sociocultural, os processos
cognitivos estão associados ao contexto social e cultural no qual o sujeito está
inserido. É o contexto que fornece as informações necessárias à elaboração de
significados pela criança, que dá sentido ao que foi aprendido e condiciona as
aplicações e usos deste conhecimento na vida cotidiana.
É nesta perspectiva paradigmática que se inserem os estudos sobre
letramento. Conceito fluido, palavra com múltiplos significados.
Mesmo na área acadêmica, o conceito é ainda fluido: letramento tem sido palavra que designa ora as práticas sociais de leitura e escrita, ora os eventos relacionados com o uso da escrita, ora os efeitos da escrita sobre uma sociedade ou sobre grupos sociais, ora o estado ou condição em que vivem indivíduos ou grupos sociais capazes de exercem as práticas lê leitura e de escrita... (SOARES, 2002, p.15).
Relembrando o que dissemos na aula anterior, numa perspectiva
reducionista e simplificadora, a alfabetização é entendida como ato de
31
ensinar/ação de aprender a ler e a escrever e o letramento, como estado ou
condição de quem não necessariamente sabe ler e escrever, mas cultiva e
exerce as práticas sociais que usam a escrita.
TFOUNI (2002) aponta que escrita, alfabetização e letramento são
fenômenos indissociáveis, interdependentes e complementares, portanto não
podem ser tratados isoladamente.
Os argumentos de Tfouni nos possibilitam pensar o processo de
apropriação da leitura e da escrita, a partir dos ensinamentos entre duas lógicas
opostas: a lógica da simplificação e a lógica da complexidade.
Assim, buscamos analisar os conceitos e as práticas de alfabetização e
letramento a partir da tensão dialógica simplificação/complexidade.
O cotidiano da escola é marcado por conflitos e negociações, resultante
das diferentes lógicas que circulam nesse espaço-tempo. A lógica simplificadora
do paradigma hegemônico está em permanente contradição com a
complexidade do cotidiano (da escola e da vida social). No que se refere ao
processo de apropriação da leitura e da escrita, podemos observar em relação
às questões que envolvem os conceitos de alfabetização e letramento, que tal
tensionamento está presente tanto ao nível das práticas (empiria), quanto no
nível espistemológico (teoria) como no nível político (ideologia), mais amplo.
A perspectiva da simplificação vê a escrita como uma tecnologia (um
produto cultural), a alfabetização, como um processo de aquisição do sistema de
escrita (alfabético e ortográfico) e o letramento, como prática social de leitura e
escrita. Assim, o processo de apropriação da leitura e da escrita, está inserido e
é tratado como resultado da relação produto-processo.
A lógica simplificadora reduz a alfabetização a alfabetização à
aprendizagem da leitura e da escrita – o que significa adquirir a tecnologia, ou
seja, a aquisição individual de habilidades para codificar em língua escrita e para
decodificar a língua escrita. Portanto, na organização escolar, a alfabetização é
datada e situada, com tempo determinado e conteúdo específico. Assim, ao final
de um ano (no sistema seriado), dois ou três anos (no sistema ciclado), a criança
deve ter adquirido, a partir de uma abordagem formalista da escrita, as
habilidades necessárias para a leitura e escrita. A lógica simplificadora vê a
32
alfabetização como uma etapa do processo de escolarização, algo que chega ao
fim num tempo previamente determinado.
Ainda numa perspectiva simplificadora, vemos que a alfabetização,
concebida como conteúdo e prática escolar, apresenta a linguagem escrita,
como uma representação fundada na correspondência entre um sistema gráfico
e um sistema sonoro, ignorando (ou negando) seu conteúdo histórico-social.
FERREIRO (1985, p.9) adverte: “enquanto discutem coisas consideradas
“essenciais”, tais como: “prontidão”, correspondência som-grafema etc., algumas
pessoas se esquecem da natureza do objeto de conhecimento (a escrita)
envolvendo essa aprendizagem.”
A produção do conceito de letramento são formulações simplificadoras e
lineares do complexo processo de apropriação da escrita, que responde à
necessidade (ideológica) de nomear as coisas, os fatos e fenômenos, os fatos e
fenômenos para controlá-los, por meio de um saber específico.
Na perspectiva da complexidade, a alfabetização está associada à
incompletude humana: como seres incompletos que somos, estamos em
permanente estado de aprendizagem, estamos sempre nos alfabetizando em
algumas áreas do conhecimento. A alfabetização não é um produto (como
anuncia a lógica da simplificação), mas um processo complexo, caracterizado
pela incompletude – engendrada pela centralidade que a leitura e a escrita
ocupam na sociedade ocidentais contemporâneas.
Na perspectiva da complexidade, a alfabetização não esta estritamente
vinculada às práticas escolares, pelo contrário, associa-se a prática sociais e
culturais mais amplas – o que numa aproximação freireana poderíamos chamar
palavramundo. Assim, a lógica da complexidade procura “...tratar a escrita como
um processo que é tanto o meio como o produto da experiência de cada um no
mundo” (GIROUX, 1983, p. 66), o que do ponto de vista epistemológico põe por
terra a oposição alfabetização/letramento.
Na perspectiva da complexidade, alfabetização e letramento são parte e
todo do complexo processo de apropriação da escrita. Para a complexidade, a
parte está no todo e o todo está na parte – cada parte é em si mesma um todo e
33
cada todo é parte te um todo – mais amplo – pois a totalidade jamais será
alcançada.
É a incompletude dos processos de alfabetização e letramento que
constituem sua complexidade. Assim não podemos distingui-lo como dois
processos dissociados, mas como uma relação complexa entre parte e todo de
um mesmo e único processo – o processo de apropriação da leitura e da escrita.
A separação simplificadora entre alfabetização e letramento tem
contribuído mais para confundir do que ajudar os professores e Orientadores. O
pensamento complexo, ao conceber alfabetização e letramento como um único
processo, possibilita tanto a ampliação da compreensão dos conceitos, quanto a
diversificação das práticas pedagógicas. Ao compreender que alfabetização-
letramento são parte e todo de um único processo, o professor é capaz de
perceber que aquele seu aluno, que ainda não sabe ler e escrever, possui
saberes que traduzem níveis de letramento.
34
CAPÍTULO 3
ANÁLISE E REFLEXÃO SOBRE O ENSINO DA LÍNGUA
Esta pesquisa contribuiu para que pensássemos nas implicações
pedagógicas do ato de alfabetizar, ampliando as possibilidades de refletir sobre
ações educativas que possam desencadear e orientar o desenvolvimento dos
alunos durante o processo de aprendizagem da língua. De acordo com
CAGLIARI (2004) “a compreensão da natureza da leitura, da escrita e de suas
funções e usos é indispensável a quem se dedica à alfabetização”. (p. 101)
Para o autor, “a alfabetização é o momento mais importante da formação
de uma pessoa, principalmente numa realidade em que a evasão escolar
tornou-se freqüente (p. 148)”. Assim sendo, pretende-se despertar os
orientadores para a necessidade de conhecer e considerar na sua prática
escolar todos os fatores envolvidos no processo de alfabetização, pois construir
uma assistência adequada que impulsione os educandos ao aprendizado é um
desafio para o professor.
Portanto, para promover o desenvolvimento pleno do aluno, entendemos
que a Orientação Educacional podemos ajudar a pensar, refletir, e analisar a
realidade que se apresenta, a partir docotidiano e que a escola deve ser um
espaço privilegiado, com propostas pedagógicas transformadoras que propicie
a construção dos conhecimentos pautada em experiências, reflexões e
argumentações que possibilitem uma estruturação conjunta de todas as
potencialidades do indivíduo, fazendo-o descobridor de si mesmo e do mundo.
3.1 A Orientação e as contribuições à prática pedagógica
A partir do conhecimento que se tem hoje, principalmente no que se
refere à concepção de linguagem, é possível compreender aspectos
importantes do processo de aprendizagem da leitura e da escrita e, portanto,
compreender quais conteúdos o professor precisaria ensinar e como e para
que ensiná-los.
35
É importante ficar claro para o Orientador que conhecer uma língua é
uma coisa e conhecer a sua gramática é outra. Sendo assim, não se pode
trabalhar a linguagem sem compreender a sua natureza, como nos indicam os
Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa:
O domínio da língua tem estreita relação com a possibilidade de plena participação social, por meio dela que o homem se comunica, tem acesso à informação, expressa a defende pontos de vista, partilha ou constrói visões de mundo, produz conhecimento. Assim, um projeto educativo comprometido com a democratização social e cultural atribui à escola a função e a responsabilidade de garantir a todos os seus alunos o acesso aos saberes lingüísticos necessários para o exercício da cidadania, direito inalienável de todos. (BRASIL, 1997, p. 90)
As informações sobre os processos de aprendizagem indicam que:
• O princípio didático básico das atividades de análise e reflexão sobre a
língua é sempre partir do que os alunos já sabem sobre o que se
pretende ensinar e focar o trabalho nas questões que representam a
dificuldade dos alunos.
• Numa concepção de aprendizagem como construção em que se
trabalha com um modelo de ensino por resolução de problemas, o texto
“mal escrito” aparece como objeto sobre o qual os alunos podem pensar,
e, com a ajuda do professor, buscar melhorá-lo. Fazendo isso, vão se
tornando mais competentes, tanto para produzir melhores textos como
para desenvolver um olhar crítico sobre a sua produção textual.
• Como vimos nos Parâmetros Curriculares Nacionais, a expressão
análise e reflexão sobre a língua não se refere à atividade de reconstruir
com os alunos um quadro de conteúdos constantes nos manuais de
gramática, como, por exemplo, a classificação morfológica: substantivo,
verbo, pronome etc., e sim focalizar aspectos do texto dos alunos que
precisam ser melhorados.
36
• A intervenção do professor deve estar voltada para: instrumentalizar o
aluno, dando-lhe condições de revisar o seu próprio texto e fazer com
que aprenda a partir do erro cometido; a apropriação de recursos
lingüísticos e para ajudar os alunos e refletir sobre os usos da língua
escrita.
• Se o objetivo do professor é trabalhar a análise e reflexão sobre a língua
para melhorar a qualidade da produção lingüística do aluno, além da
escuta, leitura e produção de textos, as situações didáticas devem estar
centradas em atividades que exigem uma reflexão de natureza
eplilingüística.
• Saber nomear em as categorias gramaticais não significa ser capaz de
construir bons textos. Essas categorias servem para falar da língua e
não para produzir-la.
• “O trabalho em grupo constitui-se de um espaço privilegiado de
discussão de estratégias para resolução de questões sobre a língua:
busca de alternativas, de verificação de diferentes hipóteses, de
comparação de diferentes pontos de vista entre os alunos para
resolução de tarefas de aprendizagem.” (BRASIL, 1997, p. 90-91)
• Nem todas as situações de análise e reflexão sobre a língua precisam
estar dirigidas aos problemas do texto. É importante que o professor
ajude o aluno a construir um olhar atento para observar, em um texto
bem elaborado de autores reconhecidos, de que forma, por exemplo, o
autor resolveu o problema dos diálogos, das repetições, como ele faz
uso da pontuação etc.
Espera-se que o ensino deixe de ser visto como transmissão de
conhecimentos prontos e passe a ser uma tarefa de construção por parte do
aluno e que o professor não seja a sua única fonte de informação. No caso da
língua escrita, nenhuma tarefa escolar substitui a leitura, muita leitura. É
37
preciso, portanto, que o objetivo do trabalho da Orientação nas Escolas seja de
transformar a classe em uma comunidade de leitores onde o professor funcione
como modelo. Para tanto, faz-se necessário partir do que os alunos já sabem
sobre o que se pretende ensinar e focar o trabalho nas questões que
representam dificuldades para que adquiram conhecimentos que possam
melhorar sua capacidade de uso da linguagem. Nesse sentido, pretende-se
que o aluno evolua não só como usuário, mas que possa assumir,
progressivamente, o monitoramento da própria atividade lingüística.
Se o objetivo é que os alunos utilizem os conhecimentos adquiridos por
meio da prática de reflexão sobre a língua para melhorar a capacidade de
compreensão e expressão, tanto em situações de comunicação escrita quanto
oral, é preciso que a Equipe de Orientação organize o trabalho educativo nessa
perspectiva.
Finalmente, é preciso voltar a enfatizar o papel que o trabalho em grupo
desempenha em atividades de análise e reflexão sobre a língua: é um espaço
de discussão de estratégias para a resolução das questões que se colocam
como problemas, de busca de alternativas, de verificação de diferentes
hipóteses, de comparação de diferentes pontos de vista, de colaboração entre
os alunos para a resolução de tarefas de aprendizagem.
Nesse contexto, a reflexão sobre o ensino da língua no cotidiano escolar
e sua complexidade deve fundamentar toda a ação da Orientação Educacional.
Compartilhar experiências e colocar em prática os conhecimentos
pedagógicos, considerando que os saberes e os fazeres estão sempre
relacionados é um desafio constante para a Orientação nas escolas. O
Orientador, enquanto mediador educacional deve favorecer o diálogo entre os
professores e os alunos, buscando uma aprendizagem mais ativa, motivada e
compartilhada.
A intervenção do Orientador Educacional no universo escolar a partir de
decisões éticas e políticas, diminui a distância que separa professores e alunos
em suas dificuldades de vida e de aprendizagem. Para tanto, é necessário dar
suporte aos educadores, para que realizem trabalhos inovadores em
alfabetização, descobrindo novas técnicas e construindo o novo. Mostrar para
38
os profissionais da educação que eles estão ousando em construir esse
caminho. Como em GARCIA (1994) “é papel nosso funcionar como espelho e
mostrar para esses profissionais que eles estão ousando.” (p. 65).
Sendo assim, o fazer pedagógicos deve integrar as experiências vividas
e projetadas pelos indivíduos no processo de aquisição da leitura. A
importância do uso das experiências cotidianas é fundamental para o
entendimento das experiências inéditas em leitura e escrita, que influem no
presente e com certeza, também influirão no futuro dos alunos.
3.2 Compreender, eis a questão
Compreender a importância da alfabetização reside no fato de ela ser
parte inevitável da vida no mundo atual e condição indispensável para sua
transformação. Como nos lembra FREIRE (1979):
Só assim a alfabetização cobra sentido. É a conseqüência de uma reflexão que o homem começa a fazer sobre sua própria capacidade de refletir. Sobre sua posição no mundo. Sobre o mundo mesmo. Sobre seu trabalho. Sobre seu poder de transformar o mundo. (p.142).
A alfabetização, como uma força de transformação do mundo, só
encontra sentido no uso que dela fazem indivíduos e sociedades. No mundo
contemporâneo, a dimensão local vem sendo ressignificada em sua
potencialidade transformadora. O mesmo se aplica às práticas alfabetizadoras.
O uso local da alfabetização articula-se ao contexto social e à percepção
intuitiva dos alfabetizandos que longe de ser universal, é culturalmente definida
e expressa um estilo de vida específico, os quais devem se construir nos eixos
norteadores da formulação de programas e ações alfabetizadoras.
O mundo contemporâneo traz novos desafios para a alfabetização,
articulando-a a um projeto social comprometido com uma sociedade mais justa
e mais democrática; visa a ampliar a participação social, exigindo voz para
todos; à potencialização individual, solicitando educação para todos; à
expressão de identidades e conhecimentos, buscando alfabetizações criativas
39
e recíprocas (BRASIL 2003, p.50) de garantia de um direito. Não é suficiente
descobrir-afirmar-produzir ambientes alfabetizadores (escolares ou não). É
fundamental a consolidação de ambientes alfabetizados e, nesse sentido, a
escola cumpre um importante papel, em especial a escola das classes
populares que de fato possibilitem a ampliação dos níveis de domínio dos
diferentes códigos presentes na vida cotidiana contemporânea.
Não há dúvida que a escola, bem como a Orientação Educacional,
exercem um papel decisivo na vida dos educandos. GRINSPUN nos ajuda a
compreender como a Orientação pode articular escola e vida para construir
uma ligação estreita entre o cotidiano vivido e o saber escolarizado.
A Orientação deverá trabalhar coma relação escola/vida. Pensar a vida significa pensar relações entre o vivo, o inerte, o homem, a natureza, o trabalho, a produção as linguagens, os silêncios. Pensar a escola (ou as diferentes escolas), consequentemente, significa assumir que essas mesmas relações estão presentes também no espaço escolar. (GRINSPUN, , p. 170).
Sendo assim, devemos primar por uma educação que favoreça o
conhecimento e a vida, identificados com todos os conceitos que perpassam
pelas diversas áreas do saber, inclusive, a leitura e a escrita. Nesse momento,
a Orientação Educacional poderá ser um dos caminhos que auxiliarão
professores e alunos durante a aprendizagem.
Finalmente em GARCIA (1987, p. 29) vimos que para uma sociedade ser
construída, são necessários homens críticos criativos e comprometidos,
confiantes em sua própria capacidade e nas possibilidades de sua classe
tornar-se dirigente. Cabe à escola, portanto, validar o conhecimento que o
aluno já traz quando entra na escola, reconhecer a sua fala como uma das
variedades lingüísticas, nem mais certa, nem mais errada, simplesmente
discriminada socialmente por ser a fala dos subalternos se, a partir da fala do
aluno, ajudá-lo a falar por escrito. Lendo, o aluno terá acesso à totalidade do
conhecimento universal. Pensando criticamente, ele entenderá que na
totalidade do conhecimento universal existe um conhecimento que mascara a
40
realidade e existe o conhecimento que a desvela, concluindo que o
conhecimento não é neutro. Pensando criticamente, ele se valerá da totalidade
do conhecimento para dele retirar fundamentos e criar condições para enfrentar
os desafios que o seu cotidiano lhe coloca.
Durante a realização desta pesquisa foi possível perceber que o conceito
de alfabetização, de fato, altera-se, em função das mudanças no mundo e na
sociedade, das quais não podemos nem devemos fugir, como Orientadores e
educadores. Talvez o maior desafio hoje, seja educar para a realidade, para
um mundo que está em permanente mudança, com uma velocidade que nem
sempre conseguimos acompanhar.
Por esse motivo, a leitura e a escrita precisam ser compreendidas como
formas de manifestação desse mundo, plena de significado para nós,
professores e Orientadores e para os alunos. Para que a apropriação da leitura
e da escrita aconteça no processo de alfabetização é preciso que os alunos
leiam diferentes tipos de textos e que estes, além de sentidos, tenham
significados pautados na realidade vivenciada por eles.
A grande questão que se apresenta, para a Orientação Educacional e
Pedagógica nas escolas refere-se à dificuldade de realizar essa perspectiva na
prática, no cotidiano da sala de aula. Não basta dizer que os livros didáticos
não alcançam esse objetivo, nem que as cartilhas não servem para mais nada,
sem dizer quais são as alternativas que encontramos para a sala de aula. Já se
sabe que não se trata de oferecimento de receitas prontas, mas do
fornecimento de pistas para que se possa trilhar, de forma criativa, o próprio
caminho.
41
CONCLUSÃO
Percebemos que a aprendizagem do aluno não depende somente da
interação com objetos, nem exclusivamente do indivíduo, mas é um processo
que envolve tanto a influência do meio em que vive, quanto à relação com as
outras pessoas, a troca de experiências, possibilitando a construção do
conhecimento a partir de reflexões sobre o cotidiano. Sabendo dessa
diversidade de caminhos para a aprendizagem, das descobertas que surgem a
todo momento durante a alfabetização, não podemos nos focar em uma
abordagem teórica específica, em apenas uma teoria, temos que estar
vigilantes para o novo. O tempo não nos permitiu que esgotássemos a questão,
mas fica a certeza de que novas leituras trarão enriquecimentos futuros.
Durante o processo de pesquisa descobrimos que o trabalho de orientar,
estimular e aperfeiçoar a leitura e a escrita no Ensino Fundamental não
acontece pelo simples fato de se treinar professores, recorrer a metodologias
ou abordagens bem sucedidas anteriormente, mas de ousar estabelecer uma
relação que propicie segurança, confiança e desenvolvimento dos alunos. A
formação de sujeitos capazes de utilizar socialmente a leitura e a escrita como
forma de se relacionar como os outros, consigo mesmo e com o mundo é o
grande objetivo da Orientação Educacional e Pedagógica nas escolas.
Nessa pesquisa, cada tentativa, erro ou acerto, trouxe a certeza de que
ensinar a leitura e a escrita no Ensino Fundamental dentro da realidade que se
apresenta, deve ser a ponte, o elo entre todas as iniciativas de ensino-
aprendizagem e de que acreditar no progresso individual e social do aluno é o
primeiro passo para um trabalho de sucesso.
42
I�DÍCE
Introdução .................................................................................................................... 09
Capítulo 1
A escola e a formação do leitor .................................................................................. 11
1.1 A leitura em questão .......................................................................................... 12
1.2 O desafio de ensinar a ler ................................................................................... 13
1.3 Ler para quê? ..................................................................................................... 14
1.4 O aluno como leitor-aprendiz ............................................................................ 15
1.5 Política e alfabetização nas escolas ................................................................... 16
Capítulo 2
Abordagens Teórico – Metodológicas:
O pensamento pedagógico e as práticas leitoras ...................................................... 19
2.1 A formação da identidade através da língua escrita .......................................... 20
2.2. As teorias de Alfabetização .............................................................................. 22
2.3. A concepção construtivista de Alfabetização ................................................... 23
2.4. A Concepção sociointeracionista de Alfabetização .......................................... 27
2.5. Alfabetização e Letramento .............................................................................. 29
Capítulo 3
Análise e reflexão sobre o ensino da língua ............................................................... 34
3.1. A Orientação Educacional e as Contribuições à prática pedagógica ................ 34
3.2. Compreender, eis a questão .............................................................................. 38
Conclusão...................................................................................................................... 41
Bibliografia ................................................................................................................... 43
43
BIBLIOGRAFIA
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DIFICULDADES DE LEITURA E ESCRITA NAS SÉRIES
INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL:
ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO DO
LEITOR
Monografia de conclusão do
curso de Pós-Graduação “LATO
SENSU” em Orientação
Educacional e Pedagógica
apresentado à Universidade
Cândido Mendes – Instituto a Vez
do Mestre – AVM.
COMISSÃO EXAMINADORA:
Prof.
_____________________________
Prof.
_____________________________
Rio de Janeiro, _____de_______________de 2010.
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