a teoria behaviorista e os modelos do homem
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A TEORIA BEHAVIORISTA E OS MODELOS DO HOMEM
Albert Bandura American Psychologist, 1974, Dezembro, pp.859-869
Discurso presidencial de posse no encontro da Associação Americana de Psicologia, Nova
Orleans, agosto de 1974. Copyright, 1974, pela Associação Americana de Psicologia.
Impresso sob permissão.
Tradução: Mônica C. Pecegueiro do Amaral
Resumo da tradução e revisão: Eliane Falcone
A preocupação com o controle e a manipulação derivados da psicologia provém
principalmente das concepções do behaviorismo. Essas preocupações são expressas por
escritores populares e por teóricos, e são contestadas pelos fatos empíricos do
comportamento humano.
No decorrer dos anos, os termos “behaviorismo” e “condicionamento” passaram a ser
associados a imagens terríveis, incluindo cães salivantes e manipulações de animais. Assim,
para aqueles que desejam depreciar idéias e práticas que desaprovam, basta rotulá-las de
behavioristas ou precursoras pavlovianas de um estado totalitário.
De início, julgava-se que o condicionamento ocorria automaticamente. Após
observações mais cuidadosas, constatou-se que ele era mediado cognitivamente, ou seja, a
pessoa reconhece que os eventos estão correlacionados e aprende a predizê-los e a ter
reações antecipatórias compatíveis.
A capacidade de se aprender com experiências correlatas reflete sensibilidade, mas
como Pavlov demonstrou pela primeira vez esse fenômeno com cachorros, esse tipo de
aprendizagem passou a ser encarado como um processo animal inferior. Se ele tivesse
optado por estudar a hiperatividade fisiológica associada a estímulos relacionados à tensão,
ou ao desenvolvimento de reações empáticas a expressões de sofrimento em seres
humanos, o condicionamento teria sido encarado de modo mais esclarecido. Esperar que as
pessoas permaneçam insensíveis a experiências assustadoras, humilhantes, repulsivas,
tristes ou agradáveis é exigir que elas sejam sub-humanas. Assim como as experiências
contíguas do tipo direto ou vicário podem promover efeitos negativos como temores e
aversões, elas também promovem algumas das qualidades dignificantes do homem. As
avaliações depreciativas dos princípios da aprendizagem, que aparecem com freqüência em
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publicações especializadas e leigas, degradam tanto a ciência da psicologia quanto o público
que essa retórica ofensiva pretende influenciar.
Nas teorias que reconhecem apenas o papel das conseqüências externas proximais e
afirmam que elas determinam o comportamento de forma automática, as pessoas são
encaradas como joguetes mecânicos das forças ambientais. Porém, ainda que muitas vezes
influentes, as conseqüências externas não são os únicos determinantes do comportamento
humano, nem operam automaticamente.
Através da observação do efeito de suas atitudes, os indivíduos acabam por distinguir
quais comportamentos são apropriados em quais situações. Então, esta informação
adquirida serve como um guia para o comportamento. Contrariamente ao que indicam as
metáforas mecanicistas, nos seres humanos as conseqüências alteram o comportamento
através da influência mediadora do pensamento.
Além de informativas, as conseqüências funcionam como motivadores, devido ao seu
valor incentivador. Por representarem simbolicamente conseqüências previsíveis, as
conseqüências futuras podem ser transformadas em motivadores do comportamento
presente. Muitas das coisas que fazemos visam obter benefícios futuros e evitar problemas
futuros. Nossas altermativas de ação estão em grande parte sob o controle previsivo. Assim,
a proposição, amplamente aceita, de que o homem é governado pelas conseqüências de
suas respostas, aplica-se melhor às conseqüências antecipadas do que às conseqüências
reais. Quando a suposição difere da realidade, o que não é raro, é pequena a influência do
controle das conseqüências reais sobre o comportamento, até que experiências repetidas o
impregnem de expectativas realistas (Bandura, 1971; Kaufman et al., 1966).
Se os homens fossem governados somente pelas conseqüências imediatas, há muito
eles teriam se tornado peças de museu em meio a outras espécies extintas. Não que o
nosso futuro esteja indiscutivelmente assegurado. Nas sociedades que só visam lucros a
curto prazo, as conseqüências imediatas desse estilo de vida destrutivo põem em perigo as
chances de sobrevivência do homem a longo prazo. Porém, a não ser que sejam
extraordinariamente poderosas, as conseqüências imediatas não pesam necessariamente
mais que as conseqüências remotas (Mischel, 1974). Nossos descendentes continuarão a ter
um futuro somente porque aqueles que prevêem conseqüências adversas das práticas atuais
a longo prazo mobilizam a opinião pública no sentido de apoiar contingências que favoreçam
o comportamento de sobrevivência. Por exemplo, os pesticidas perigosos são geralmente
proibidos antes que as populações sejam afetadas por seus resíduos tóxicos. A capacidade
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que os homens possuem de processar informações proporciona a base para o
comportamento perspicaz. A capacidade dos homens de fazer com que conseqüências
remotas recaiam sobre o comportamento atual através do pensamento preditivo reforça
ações previstas.
As explicações sobre o reforçamento originalmente pressupunham que as
conseqüências reforçam o comportamento sem um envolvimento consciente. A idéia de que
os reforçadores podem agir sub-repticiamente ainda prevalece e provoca temores de que
técnicas de reforçamento mais desenvolvidas possam permitir que as autoridades
manipulem as pessoas sem que elas saibam ou consintam. Embora a questão empírica
ainda não esteja totalmente resolvida, há poucos dados que indiquem que as recompensas
funcionam como fortalecedores automáticos do comportamento humano. O comportamento
não é muito afetado por suas conseqüências sem a consciência do que está sendo reforçado
(Bandura, 1969; Dulany, 1968). Depois que os indivíduos distinguem a relação instrumental
entre a ação e a conseqüência, recompensas condicionais podem levar a um comportamento
conformado ou contestador, dependendo de como eles avaliam os estímulos, os
influenciadores e o próprio comportamento, e de como os outros reagem. Assim, o
reforçamento, na medida em que veio a ser mais bem sucedido, passou de um simples
reforçador mecânico do comportamento para uma influência informativa e motivadora.
Considerando-se que as pessoas não vivem isoladamente, elas podem observar o
comportamento dos outros e se beneficiar com as conseqüências observadas, tanto quanto
com as suas próprias experiências (Bandura, 1971b). O reconhecimento do comportamento
vicário pressupõe a existência de capacidades de avaliação, na atuação das influências
reforçadoras. As pessoas comparam as conseqüências do próprio comportamento com
aquelas que advém do comportamento dos outros em uma situação semelhante. Assim, a
mesma conseqüência pode ser considerada como recompensa ou punição, dependendo dos
referenciais usados para a comparação social.
Pode-se explicar melhor a conduta humana pela influência da relação entre
conseqüências observadas e conseqüências diretas do que por qualquer um desses fatores
isoladamente. Entretanto, o comportamento não é totalmente predizível a partir de um
coeficiente relacional, porque as justificativas sociais alteram o impacto das disparidades nas
conseqüências. Reforçamentos injustos são prontamente aceitos quando as pessoas são
categorizadas em níveis sociais e recompensadas segundo sua posição, e não segundo o
seu desempenho. Injustiças arbitrárias também podem ser toleradas, se os desprivilegiados
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são levados a acreditar que possuem atributos que fazem com que tenham menos direito a
um tratamento igualitário. As injustiças persuasivamente justificadas têm efeitos mais nocivos
sobre o indivíduo do que os atos reconhecidamente injustos, uma vez que levam a uma auto-
desvalorização por parte dos menos favorecidos. Reações negativas a reforçamentos
injustos, reconhecidamente injustificados, podem igualmente ser reduzidas através de
contemporizações. Se as pessoas são levadas a crer que o tratamento injusto será corrigido
num futuro previsível, este se torna menos repulsivo para elas.
As pessoas regulam suas ações, em parte por conseqüências que elas mesmas
produzem (Bandura, 1971b; Thorensen e Mahoney, 1974). O desenvolvimento de funções
auto reativas propicia ao homem a capacidade de autogoverno. Eles fazem coisas que levam
à auto satisfação e à auto valorização e evitam agir de modo que leve à auto punição.
As fontes de auto reforçamento ou de reforçamento externo podem funcionar como
influências suplementares ou opositoras sobre o comportamento. Assim, os indivíduos
costumam entrar em conflito quando são recompensados por condutas que eles
pessoalmente condenam. Quando as conseqüências que nós condenamos possuem mais
influência do que os incentivos recompensadores, as influências externas são relativamente
ineficazes. Por outro lado, se certas atividades produzem recompensas mais fortes do que a
auto censura, o resultado é uma aceitação sem entusiasmo. Entretanto, quando o amor-
próprio é ferido devido a condutas condenáveis, ele pode ser restabelecido através de auto
justificativas. Voltaremos a essa questão brevemente.
Outro tipo de conflito entre conseqüências externas e internas surge quando os
indivíduos são punidos por comportamento que eles têm em alta consideração. Os
dissidentes e não conformistas freqüentemente se encontram nessa situação. Um
comportamento pessoalmente apreciado só é expresso se seu preço não for muito alto.
Quando as conseqüências ameaçadoras são sérias, a pessoa inibe atitudes que considera
louváveis, mas que estão sob alto risco de punição. Por outro lado, essas atitudes são
prontamente executadas quando a possibilidade de punição é reduzida. Entretanto, existem
indivíduos cuja auto-imagem depende de tal modo de determinadas convicções, que eles se
submetem prolongadamente a maus tratos, mas não aceitam o que para eles é injusto ou
imoral.
As conseqüências externas exercem uma maior influência sobre o comportamento
quando são compatíveis com as internas. Isto se dá quando atos responsáveis são uma
fonte de auto estima, e atitudes puníveis, uma fonte de auto censura. Para aumentar a
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compatibilidade entre influências sociais e pessoais, as pessoas escolhem amigos que
compartilhem de padrões de conduta semelhantes aos seus, e assim garantem um apoio
social para seu sistema de auto reforçamento.
As teorias individualistas da moralidade dos atos pressupõem que a internalização de
padrões de comportamento cria um mecanismo de controle permanente dentro do indivíduo.
Daí em diante, as restrições da consciência atuam como controles permanentes de
comportamentos repreensíveis. Entretanto, a realidade do comportamento humano contradiz
esta teoria. Muitos dos sofrimentos e maus tratos de que se tem notícia são, na verdade,
impostos por pessoas decentes e honestas. E algumas das mais impressionantes mudanças
na conduta moral, como por exemplo, no caso da violência política e militar, são feitos sem
se alterarem as estruturas da personalidade e os padrões morais. Sem dúvida, o controle
pessoal é mais complexo e flexível do que as teorias indicam.
Embora as influências auto reforçadoras sirvam como reguladores do comportamento,
elas podem ser separadas dos atos consumáveis, através de práticas autojustificativas
(Bandura, 1973). Uma técnica consiste em tornar um comportamento desumano pessoal e
socialmente aceitável, definindo-o em termos de altos princípios morais. As pessoas não
realizam atos que normalmente considerem maléficos ou destrutivos, a menos que
justifiquem essas atividades como servidoras de um propósito moral. No decorrer dos anos,
muitas crueldades foram cometidas em nome de princípios religiosos, ideologias sinceras
reguladoras. Comportamentos que o próprio indivíduo censura também podem ser
parcialmente justificados ao serem contrastados com outras desumanidades flagrantes.
Justificativas morais e comparações paliativas são especialmente eficazes porque elas não
somente eliminam barreiras impostas pelo próprio indivíduo, mas também porque empregam
a auto recompensa a serviço de atitudes repreensíveis. O que antes era normalmente
inaceitável se torna uma fonte de orgulho.
Uma prática dissociativa comum é a de ocultar e de distorcer a relação entre as
atitudes e suas conseqüências. As pessoas fazem coisas que normalmente repudiam se
uma autoridade legítima as sancionar e assumir a responsabilidade pelas conseqüências. Ao
lançar a responsabilidade sobre outra pessoa, os participantes não se julgam mais
responsáveis pelo que fazem, e assim não caem em reações de auto proibição. A ausência
de auto censura também pode ser facilitada com a divisão da responsabilidade pelo
comportamento culpável. Através da divisão do trabalho, da divisão da responsabilidade pela
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tomada de decisões e de cooperação, as pessoas podem concorrer em práticas prejudiciais,
sem se sentirem pessoalmente responsáveis ou se auto condenarem.
Um outro recurso utilizado é a atribuição da culpa à vítima. As vítimas são culpadas
por elas próprias incorrerem em maus tratos, ou circunstâncias extraordinárias são evocadas
como justificativas por atitudes questionáveis. Assim, não precisamos nos censurar por
cometermos atos determinados pelas circunstâncias. Um outro método de se amenizar a
auto punição é o de desumanizar a vítima. Fazer mal a pessoas consideradas sub humanas
ou degradadas causa menos auto reprovação do que se elas fossem consideradas seres
humanos dotados de sensibilidade.
Dada a variedade de técnicas autodesinibidoras, uma sociedade não pode depender
exclusivamente do controle pela consciência para garantir um comportamento ético e moral.
Embora o controle pessoal geralmente sirva como uma força auto-diretiva, ele pode ser
invalidado por sanções sociais que levam à destruição. A doutrinação e as justificativas
sociais dão sentido aos acontecimentos e criam antecipações que determinam o
comportamento. O controle pela informação, que está enraisado em processos cognitivos, é
mais geral e poderoso do que o condicionamento pela contiguidade de eventos. Assim, além
de códigos pessoais benevolentes, o cultivo do humanitarismo requer que o sistema social
contenha salvaguardas que neutralizem práticas sancionadoras prejudiciais e preservem o
comportamento compassivo.
Uma orientação conceitual não apenas determina quais facetas do homem serão
estudadas a fundo, mas também como se empreendem mudanças no comportamento
humano. Por exemplo, as aplicações iniciais dos princípios de reforçamento foram guiadas
pela idéia, então largamente difundida, de que as conseqüências alteram o comportamento
automática e inconscientemente. Uma vez que o processo era supostamente mecânico, para
serem eficazes, os reforçadores tinham que ocorrer imediatamente. Assim, os participantes
dos programas de mudança de comportamento não sabiam por que estavam sendo
reforçados e, num esforço para garantir que os efeitos fossem imediatos, os reforçadores
eram introduzidos assim que as respostas requisitadas eram emitidas. O efeito geral foi um
tedioso processo de modelagem que produziu, na melhor das hipóteses, resultados
medíocres de modo eticamente questionável. Em muitos círculos públicos e profissionais, o
reforçamento ainda implica num controle sub-reptício, muito embora a teoria e as práticas do
reforçamento tenham se desenvolvido muito além desse nível.
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A compreensão de que o reforçamento é um modo desarticulado de indicar condutas
apropriadas levou ao uso de fatores cognitivos na modificação do comportamento. Não é de
surpreender que as pessoas mudem mais rapidamente se lhes forem dito quais
comportamentos são passíveis de recompensa e quais são passíveis de punição, do que se
tiverem que descobri-los observando as conseqüências de seus atos. Capacidades que não
fazem parte de seu repertório podem ser desenvolvidas com muito mais facilidade com a
ajuda de instrução e modelação do que pela confiança única e exclusiva nos sucessos e
fracassos de um desempenho não orientado.
À medida em que pesquisas posteriores revelaram que os reforçadores funcionam
como motivadores, reconheceu-se que as conseqüências servem como fontes de motivação
que, para sua eficácia, dependem amplamente das preferências por certos estímulos por
parte daqueles que estão se submetendo à mudança. Portanto, as pessoas não absorvem
indiscriminadamente as influências que incidem sobre elas. As conseqüências de certos atos
não necessariamente ocorrem de imediato. Os homens sabem reduzir cognitivamente
atrasos entre o comportamento e os reforçadores subseqüentes, sem com isso reduzir a
eficácia das estimulações.
Neste segundo estágio evolutivo, as práticas de reforçamento passaram do controle
unilateral ao contrato social. Acordos positivos atestam que, se as pessoas fizerem certas
coisas, elas terão direito a certas recompensas e privilégios. No caso de sanções negativas,
condutas repreensíveis levam à punições. O processo é definido em termos de reforçamento,
mas a prática é a da relação social. A maioria das interações sociais é governada por
acordos condicionais, embora geralmente não sejam expressas em termos de reforçamento.
Entretanto, descrevê-las de um outro modo não altera a sua natureza.
Refletindo os valores mais importantes da nossa sociedade, as práticas de
reforçamento tradicionalmente favorecem formas utilitárias de comportamento . Mas a
situação está mudando. Com a crescente reticência quanto a estilos de vida materialistas, as
práticas reforçadoras estão sendo cada vez mais usadas para desenvolver potencialidades
pessoais e qualidades humanistas. Essas novas mudanças no compromisso com valores
provavelmente ocorrerão mais rapidamente na medida em que as pessoas dedicarem
menos horas ao trabalho visando a obtenção de renda e mais tempo ao lazer para o auto
enriquecimento.
Outra mudança de certa importância é a renovada preocupação com os direitos
individuais. As pessoas buscam um papel de colaboração no desenvolvimento de
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contingências sociais que afetem o curso e a qualidade de suas vidas. Como parte dessa
tendência social, até as atitudes tomadas em nome da psicoterapia estão sendo examinadas
quanto a sua ética e seus propósitos sociais. Essas preocupações deram impacto a
prescrições que garantam que as técnicas de reforçamento sejam usadas a serviço do
desenvolvimento humano e não como instrumentos de controle social.
Um assunto também intimamente ligado a isso é a relativa atenção dedicada a
questões de mudar pessoas ou alterar instituições sociais para enriquecer a vida. Se os
psicólogos quiserem ter um impacto significativo nos problemas comuns da vida, eles devem
aplicar suas medidas corretivas às práticas sociais prejudiciais, ao invés de se limitarem a
tratar as vítimas de tais práticas. É claro que é mais fácil falar do que fazer isso. Os
profissionais, quaisquer que sejam suas especialidades, são mais fortemente reforçados por
usarem seus conhecimentos e suas habilidades a serviço de operações existentes do que
para mudá-las.
Os métodos de mudança do comportamento discutidos até aqui recaíam sobre as
conseqüências externas das ações. A evidência de que as pessoas podem exercer algum
controle sobre seu próprio comportamento incentivou mais mudanças ainda nas práticas de
reforçamento. O interesse começou a transferir-se de controlar o comportamento para o
desenvolver a capacidade de auto governo. Nesta última visão, o controle é transferido em
grande parte para as mãos das próprias pessoas: elas arranjam o incentivo ambiental para
um comportamento desejado; elas avaliam seu próprio desempenho e servem como seus
próprios agentes reforçadores (Goldfried e Merbaum, 1973; Mahoney e Thorensen, 1974).
Certamente as funções auto reforçadoras são criadas e ocasionalmente mantidas por
influências externas. Mas o fato de terem uma origem externa não anula o fato de que, uma
vez estabelecida, a auto influência determina em grande parte que atitudes uma pessoa
tomará.
O reconhecimento das capacidades auto governantes representa um avanço
substancial da dependência exclusiva do controle ambiental. Mas essas práticas auto
influenciadoras que estão surgindo ainda estão profundamente enraizadas em transações
físicas - as conseqüências auto aplicadas são, na maioria das vezes, materiais. Mudanças na
forma e na fonte do reforçamento tendem a aparecer na medida em que a deficiência de
conseqüências materiais for reconhecida. A maioria das pessoas valoriza seu amor-próprio
acima de bens materiais. Elas se baseiam largamente em suas próprias auto exigências e
em sua auto aprovação como guias para seu comportamento. Ignorar o papel importante do
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auto reforçamento encoberto na regulação do comportamento é rejeitar uma capacidade
exclusivamente humana.
Aqueles que reconhecem apenas as conseqüências externas limitam suas pesquisas
e práticas dessas influências e assim, acabam por conseguir evidências que reforçam suas
concepções. Aqueles que também reconhecem as influências pessoais tendem a escolher
métodos que revelem e desenvolvam as capacidades de auto governo do homem. A visão
do homem contida nas tecnologias behavioristas é, portanto, mais do que simplesmente uma
questão fisosófica. Ela afeta quais potencialidades serão cultivadas e quais serão
esquecidas.
Nossas teorias custaram muito a reconhecer que o homem pode aprender através da
observação, tanto quanto pela experiência direta. Este é um outro exemplo de o quanto um
forte apego a paradigmas ortodoxos torna difícil uma transcendência dos limites do
compromisso conceitual. Tendo relegado os determinantes cognitivos, os primeiros
behavioristas propuseram a idéia de que a aprendizagem só pode ocorrer quando
apresentamos respostas e experimentamos seus efeitos. Essa herança ainda está muito
conosco. A forma rudimentar de aprendizagem baseada na experiência direta foi
exaustivamente estudada, enquanto que a aprendizagem observacional, um aprendizado
mais profundo e mais forte, foi amplamente ignorado.
A capacidade de representar simbolicamente atividades moldadas permite ao homem
adquirir novos padrões de comportamento através da observação sem desempenho
reforçado. Ao observarmos o comportamento de outras pessoas, formamos uma idéia sobre
como um certo comportamento é apresentado e em ocasiões futuras usaremos essa
informação como um guia para a nosa própria conduta. Na verdade, pesquisas conduzidas
segundo os princípios da teoria da aprendizagem social mostram que virtualmente, todos os
fenômenos provenientes da experiência direta podem ocorrer numa base vicária pela
observação do comportamento de outras pessoas e de suas conseqüências (Bandura,
1969). A modelação elimina o tempo perdido com o desempenho de respostas
inapropriadas. Uma vez que erros podem causar conseqüências sérias, senão fatais, as
perspectivas de sobrevivência seriam mínimas se as pessoas tivessem que contar apenas
com os resultados de suas próprias ações para informá-las quanto ao que fazer.
Além de fornecer padrões de respostas específicas, as influências adquiridas com a
modelação podem gerar um comportamento produtivo e inovador. Nesse último processo, os
observadores extraem aspectos comuns de várias respostas aparentes e formulam regras
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gerais de comportamento que lhes permite ir além do que já viram ou ouviram. Pela síntese
de aspectos de diferentes modelos, em novos amálgamas, os observadores podem adquirir,
pela modelação, novos estilos de pensamento e ação. Uma vez iniciadas, as experiências
com esses novos padrões propiciam mudanças evolutivas posteriores. O que era um
pequeno distanciamento da tradição finalmente se torna uma nova visão.
A idéia equivocada de que a modelação produz simplesmente mimetizações de ações
específicas é contestada pela crescente evidência de que a observação de modelos
abstratos é um meio altamente eficaz de se chegar a um comportamento cognitivo de
autogoverno (Bandura, 1971c; Zimmerman e Rosenthal, 1974). Baseadas em regras
extraídas das observações, as pessoas mudam seus juízos de valor, seus esquemas
conceituais, seus estilos lingüísticos, suas estratégias de processamento de informação e
outras formas de funcionamento cognitivo. Contudo, avaliações equivocadas continuam a ser
tomadas como pontos vulneráveis da teoria.
Nos últimos anos, a aprendizagem observacional tornou-se mais amplamente aceita,
mas alguns teóricos só querem dar-lhe respeitabilidade científica se ela for reduzida ao
desempenho. Como conseqüência, são usados paradigmas de comportamento que estão
enraizados na premissa tradicional de que as respostas devem ser apresentadas antes de
serem aprendidas. A reprodução instantânea de respostas observadas é favorecida,
diminuindo assim o papel de funções cognitivas que têm atuação extremamente importante
quando se trata de reter as respostas durante um período de tempo mais longo.
Quando a aprendizagem é estudada através da modelação, uma gama maior
de determinantes e mecanismos intervenientes ganha importância. A aprendizagem
observacional é governada por quatro processos: (a) as funções de atenção regulam a
entrada sensorial dos estímulos e a percepção da ação a ser modelada; (b) através da
codificação e de ensaios simbólicos, as experiências transitórias são transformadas, para
efeito de representação na memória, em guias duradouros do comportamento; (c) processos
de reprodução motora integram atos constitutivos em novos padrões de resposta; e (d)
processos de incentivo e motivação determinam se as respostas adquiridas pela observação
serão postas em prática. Estudada sob esta perspectiva, o aprendizado observacional
aparece, não como um processo mecânico de reprodução, mas sim como um processo
construtivo que envolve o julgamento.
Uma vez que a aprendizagem observacional envolve uma série de subfunções que se
desenvolvem com a maturidade e a experiência, obviamente ela depende de um
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desenvolvimento prévio. Diferenças em perspectivas teóricas determinam diferentes
metodologias para o estudo de como a capacidade de aprendizagem observacional é
adquirida. Quando a modelação é definida em termos de formação de cadeias estímulo-
resposta, os esforços visam aumentar a probabilidade de respostas imitativas através do
reforçamento. A modelação pode ser fortalecida, recompensando-se comportamentos
semelhantes, mas essas demonstrações não ajudam muito na identificação precisa do que
está sendo adquirido durante o processo, ou na explicação de falhas na imitação sob
condições favoráveis de reforçamento. Do ponto de vista da aprendizagem social, a
capacidade para a aprendizagem observacional é desenvolvida através da aquisição de
habilidades de observação discriminativa de codificação da memória, da coordenação dos
sistemas ideomotor e sensoriomotor e da avaliação das prováveis conseqüências para um
comportamento semelhante. Entender como as pessoas aprendem a imitar passa a ser
entender como as devidas subfunções se desenvolvem e operam.
No decorrer dos anos, defensores das formas mais radicais do behaviorismo não só
não se interessaram por processos mentais, como também enumeraram uma série de
razões pelas quais os eventos cognitivos são inadmissíveis em análises causais. Disseram, e
ainda dizem, que as cognições são inacessíveis, a não ser através de auto relatos pouco
confiáveis, que elas são inferências a partir de efeitos, que são epifenomenais ou que são
simples menteficcionais. Diziam que os progressos na análise experimental do
comportamento iriam finalmente mostrar a sua inutilidade. As evidências, entretanto, provam
exatamente o contrário. Existe agora um vasto campo de pesquisa no qual a cognição é
ativada instrucionalmente com resultados impressionantes. As pessoas aprendem e fixam
melhor com auxílios cognitivos do que através da repetição de ações reforçadoras (Anderson
e Bower, 1973; Bandura, 1971c). À medida em que aumentam os dados indicando que a
cognição tem uma influência causal sobre o comportamento, os argumentos contra os
determinantes cognitivos estão perdendo sua força.
Os últimos avanços transferiram a ênfase do estudo da aprendizagem de respostas
para a análise da memória e da cognição. Através desse esforço, obtivemos uma melhor
compreensão dos mecanismos pelos quais a informação é adquirida, arquivada e
recuperada. Porém, o aprendizado envolve muito mais do que somente a aquisição e fixação
de informações. As teorias behavioristas se dirigiram para o comportamento, mas ignoraram
determinantes internos, enquanto que as abordagens cognitivas ficavam imersas no
pensamento, mas dissociadas do comportamento. Num estudo completo do comportamento
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humano, os processos internos devem estar ligados às ações. Assim, explicações de como a
informação resulta em atos capazes devem ainda se preocupar com a organização e a
regulação do comportamento. A aprendizagem social engloba tanto os processos internos do
organismo quanto os determinantes relativos às ações.
Especulações sobre a natureza humana inevitavelmente levantam questões
fundamentais sobre o determinismo e a liberdade humana. Ao examinarmos essas questões,
é fundamental fazermos uma distribuição entre os aspectos metafísicos e os aspectos
sociais da liberdade.
Consideremos primeiramente a liberdade no sentido social. Considerar a liberdade
uma ilusão, como alguns escritores afirmam, ou uma realidade social de considerável
importância, depende de como a interpretamos. Dentro da perspectiva da aprendizagem
social, a liberdade é definida em termos do número de opções à disposição das pessoas e
do seu direito de exercê-las. Quanto mais alternativas de comportamento e prerrogativas
sociais as pessoas têm, maior é a liberdade de ação.
A liberdade pessoal pode ser limitada de vários modos. Deficiências comportamentais
restringem as possibilidades de escolha e assim reduzem as oportunidades de realizarmos
nossas preferências. Deste modo, a liberdade pode ser ampliada cultivando-se
competências. Auto-repressões que provém de temores injustificados e a autocensura
severa restringem a gama de atividades que o indivíduo pode exercer ou até almejar. Neste
caso, a liberdade é restabelecida com a eliminação das auto-repressões disfuncionais.
Para maximizar a liberdade, uma sociedade deve estabelecer certos limites ao
comportamento, uma vez que a licença total por parte de um indivíduo certamente esbarrará
na liberdade de outro. Proibições sociais contra comportamentos que são socialmente
prejudiciais criam restrições adicionais ao comportamento. Os conflitos quanto a restrições
do comportamento geralmente surgem quando vários membros de uma sociedade
questionam as práticas convencionais e quando sanções legais são usadas mais para
fortalecer um certo tipo de moralidade do que para proibir comportamentos que sejam
socialmente prejudiciais.
Deixar que os indivíduos se envolvam em atividades que são prejudiciais para eles
próprios, mas não para a sociedade, é uma questão que tem sido amplamente discutida nos
últimos anos. Aqueles que são contra essa posição, alegam que é difícil uma pessoa, que
não viva reclusa, prejudicar a si mesma sem prejudicar outras. Se estas atividades levarem a
incapacidades, a sociedade acabará por sustentar o seu tratamento e a sua subsistência. Os
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que são à favor não acham que esta alegação seja suficientemente convincente para
justificar uma proibição específica, já que algumas das atividades prejudiciais que a
sociedade aprova são tão nocivas, ou piores, do que aquelas que ela proíbe. As mudanças
normativas referentes ao comportamento individual têm tendido a favorecer uma ética
individualista. Conseqüentemente, muitas atividades que eram proibidas por lei estão isentas
de sanções legais.
Alguns grupos têm a sua liberdade cerceada por discriminações socialmente aceitas.
Neste caso, as alternativas de uma pessoa são limitadas pela cor da pele, pelo sexo, pela
religião, pelo passado étnico, ou pela classe social, independentemente das suas
capacidades. Quando a autodeterminação é prejudicialmente restringida, aqueles que sofrem
essas restrições eliminam as injustiças mudando as práticas que comprometem ou
contemporizam os ditos valores da sociedade.
A liberdade tem a ver tanto com direitos, quanto com opções e restrições do
comportamento. A luta do homem pela liberdade visa principalmente a estruturação de
contingências sociais a fim de que certas condutas sejam isentas de controle aversivo.
Depois que leis protetoras são implantadas no sistema, existem certas coisas que uma
sociedade não pode fazer a um indivíduo, não importa o quanto queira. As proibições legais
ao controle social geram liberdades que são realidades, não apenas sentimentos ou estados
de espírito. As sociedades diferem umas das outras nas suas instituições de liberdade e no
número e tipos de condutas que são oficialmente isentos de controle punitivo. Por exemplo,
sistemas sociais que protegem jornalistas de controle punitivo são mais livres do que aqueles
que permitem que o poder autoritário seja usado para silenciar suas críticas ou seus veículos
de comunicação. As sociedades que possuem um sistema judiciário independente garantem
mais liberdade social do que aquelas que não possuem.
Nos discursos filosóficos, a liberdade é freqüentemente considerada como a antítese
do determinismo. Quando definidos em termos de opções e direitos, não há qualquer
incompatibilidade entre a liberdade e o determinismo. Segundo esta perspectiva, a liberdade
não é definida negativamente como a ausência de influências ou simplesmente como a falta
de restrições externas. Ao contrário, ela é definida positivamente em termos das habilidades
que uma pessoa possui sob seu controle e do exercício de auto-influência da qual a
liberdade de escolha dependem.
Análises psicológicas de liberdade levam, em última instância, a discursos sobre a
metafísica do determinismo. Será que as pessoas são determinantes parciais do seu próprio
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comportamento, ou será que elas são dirigidas exclusivamente por forças alheias ao seu
controle? A antiga polêmica sobre esta questão foi revivida pela alegação de Skinner (1971)
de que, afora as contribuições genéticas, o comportamento humano é controlado
exclusivamente por contingências ambientais. Por exemplo, “uma pessoa não age sobre o
mundo. O mundo é que age sobre ela” (p.211). O maior problema desse tipo de análise é
que ela trata o meio-ambiente como uma força autônoma que automaticamente modela e
controla o comportamento. O meio tem causas tanto quanto o comportamento. Geralmente,
o meio ambiente é apenas uma potencialidade até que seja efetivado e informado por ações
apropriadas. Os livros não influenciam ninguém, a menos que alguém os escreva e outros os
escolham e os leiam. Recompensas e punições ficam ao nível das potencialidades até que
ações apropriadas as efetivem. É verdade que o comportamento é regulado por suas
conseqüências, mas as contingências são, em parte, criação da própria pessoa. Através dos
seus atos, as pessoas exercem um papel ativo na produção de contingências reforçadoras.
Assim, o comportamento, em parte, cria o meio e o meio influencia o comportamento,
reciprocamente. À famosa expressão, mudam-se as contingências e muda-se o
comportamento, deveria ser acrescentada a recíproca, muda-se o comportamento e mudam-
se as contingências.
A imagem de eficácia do homem, que provém da pesquisa psicológica, depende de
qual aspecto do sistema de controle recíproco decidimos analisar. No paradigma que
favorece o controle ambiental, os pesquisadores analisam como o meio altera o
comportamento [C=f(M)]. Por outro lado, o paradigma do controle pessoal examina como o
comportamento determina o meio [M=f( C)]. No primeiro caso, o comportamento é o efeito e
no segundo, a causa. Embora as fontes recíprocas de influências possam ser separadas
para fins experimentais, no dia-a-dia o controle de ambas as operações se dá
concomitantemente. Em intercâmbios contínuos, o mesmo evento pode assim ser um
estímulo, uma resposta, ou um reforçador ambiental, dependendo do lugar na seqüência
onde decidamos começar a análise.
Uma pesquisa da literatura sobre o reforçamento confirma até que ponto nos
aprisionamos a um paradigma unilateral para representar um processo bilateral. O controle
ambiental é exageradamente estudado, enquanto que o controle pessoal tem sido
relativamente ignorado. Para citar apenas um exemplo, existem inumeráveis demonstrações
de como o comportamento varia sob diferentes padrões de reforçamento, mas não existem
quase estudos sobre como as pessoas, individual ou coletivamente, conseguem dar forma
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aos padrões de reforçamento segundo seu próprio gosto. A escassez de pesquisas sobre
controle pessoal se dá, não porque as pessoas não exerçam influência sobre o seu meio ou
porque esses esforços sejam infrutíferos. Muito pelo contrário, o comportamento é um dos
determinantes mais importantes das futuras contingências. Como revelam as análises de
intercâmbio seqüenciais, indivíduos agressivos, através de sua conduta, transformam o meio
em que vivem num meio hostil, enquanto aqueles que demonstram uma resposta favorável,
produzem um meio agradável, dadas as mesmas condições (Raush, 1965). Todos
conhecemos indivíduos problemáticos que, com seu comportamento hostil, instalam um
clima social negativo por onde passam.
Deve-se salientar que, algumas doutrinas que atribuem um controle proeminente no
meio ambiente, em última instância, fazem uma ressalva ao reconhecerem que o homem
pode exercer um certo grau de contra controle (Skinner, 1971). O conceito de interação
recíproca, entretanto, vai muito além da idéia do contra controle. O contra controle mostra o
meio ambiente como uma força instigante à qual os indivíduos reagem. Como já vimos, as
pessoas efetivam e criam o meio assim como o rejeitam.
As pessoas podem ser consideradas parcialmente livres, na medida em que podem
influenciar as condições futuras, dirigindo o seu próprio comportamento. Embora a escolha
de certas atitudes seja determinada pelas alternativas existentes, os indivíduos podem
exercer algum controle sobre os fatores que governam suas escolhas. Nas análises
filosóficas, todos os eventos podem ser submetidos a uma cadeia infinita de causas. Estas
discussões geralmente enfatizam o modo como as ações humanas são determinadas por
condições prévias, mas ignoram a parte recíproca do processo que mostra que as próprias
condições são, em parte, determinadas pelas ações prévias do homem. As aplicações de
práticas de auto controle demonstram que as pessoas são capazes de dirigir seu próprio
comportamento como as convier, dispondo das condições ambientais que mais seguramente
o principiem e administrando conseqüências auto-reforçadoras que o sustentem. Elas podem
receber instruções de como fazê-lo e algum apoio externo inicial pelo seu esforço, mas as
influências que elas mesmas produzem contribuem significativamente para a obtenção de
seus objetivos futuros.
Alegar, como os deterministas ambientais fazem, que as pessoas são controladas por
forças externas e assim postular que elas reorganizam a sociedade aplicando a tecnologia
comportamental arruina a premissa básica do argumento. Se os seres humanos fossem de
fato incapazes de influenciar suas próprias ações, eles poderiam descrever e prever eventos
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ambientais, mas dificilmente poderiam exercer qualquer controle intencional sobre eles. No
que se refere à defesa da mudança social, entretanto, deterministas ambientais radicais
tornam-se defensores fervorosos do poder do homem de transformar o meio na busca de
uma vida melhor.
Nas análises causais retrospectivas, as condições são geralmente mostradas como
dirigindo o homem, enquanto que projeções de análises deterministas do estabelecimento e
obtenção dos objetivos revelam que as pessoas podem alterar as condições segundo seus
propósitos. Algumas fazem isso melhor do que outras. Quanto maior a sua antecipação, a
sua proficiência e a sua auto-influência, maior será o progresso na direção de seu objetivo.
Devido à capacidade de influência recíproca, as pessoas, ao menos parcialmente, modelam
seus destinos. Não é o determinismo que está em questão, mas o fato dele ser tratado como
um processo de controle unívoco ou biunívoco. Considerando-se a interdependência do
comportamento e das condições ambientais, o determinismo não satisfaz a visão fatalista de
que o homem é somente um objeto de influências externas.
As perspectivas psicológicas do determinismo, como outros aspectos teóricos,
influenciam a natureza e o alcance da prática social. Os deterministas ambientais tendem a
usar seus métodos basicamente a serviço de padrões de comportamento institucionalmente
recomendados. Os deterministas pessoais têm mais tendência a cultivar as potencialidades
de autogoverno do homem. Esta última perspectiva behaviorista tem muito em comum com o
humanismo. Os teóricos do behaviorismo, entretanto, reconhecem que a “auto-realização”
não está de modo algum confinada às virtudes humanas. As pessoas possuem inúmeras
potencialidades que podem ser realizadas para o bem ou para o mal. No decorrer dos anos,
os homens têm sofrido consideravelmente nas mãos de tiranos auto-realizados. Assim, uma
ética egocêntrica de auto-realização deve ser temperada com uma preocupação com as
conseqüências sociais do comportamento. Os behavioristas geralmente enfatizam as fontes
de controle ambientais, enquanto os humanistas tendem a restringir seus interesses ao
controle pessoal. A aprendizagem social engloba ambos os aspectos desse processo de
influência biunívoco.
Quando o meio-ambiente é considerado como um determinante influenciável, dá-se
menos valor às qualidades humanas dignificantes e às suas realizações. Se a inventividade
deriva de circunstâncias externas, devia-se creditar ao meio-ambiente os sucessos das
pessoas e responsabilizá-lo pelos seus fracassos ou desumanidades. Em contraposição à
visão unilateral, as realizações dos homens resultam da interação recíproca das
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circunstâncias externas, com uma enorme variedade de determinantes pessoais, incluindo
potencialidades naturais, competências adquiridas, ponderação e um alto nível de auto-
iniciativa.
Os compositores, por exemplo, ajudam a formar os gostos musicais com seus
esforços criativos e o público, por sua vez, prestigia suas apresentações até que
representantes de um novo estilo criem novas preferências por parte do público. Todas as
formas de arte subseqüentes resultam de um processo biunívoco semelhante, pelo qual nem
os artistas nem as circunstâncias são responsáveis isoladamente.
Realizações superiores em qualquer campo requerem considerável autodisciplina.
Depois que os indivíduos adotam padrões avaliativos, eles dedicam muito tempo a melhorar
o seu desempenho até que sejam satisfeitas suas próprias exigências. Neste nível de
atuação, a persistência está amplamente sob o controle do auto-reforçamento. As
habilidades são aperfeiçoadas, tanto para a auto-satisfação, quanto para satisfazer às outras
pessoas.
Sem influências autoproduzidas seria difícil manter a maioria dos esforços inovadores.
Isto se dá devido ao fato de que, a princípio, o não convencional é rejeitado, e só é aceito à
medida em que prova ser funcionalmente útil e ganha defensores de prestígios. Como
resultado, os primeiros esforços dos inovadores são rejeitados e não são recompensados
nem reconhecidos. Na história dos esforços criativos, é comum artistas e compositores
serem desprezados quando se distanciam muito do convencional. Alguns ganham
reconhecimento mais tarde em suas carreiras. Outros estão tão convencidos do valor de seu
trabalho que trabalham incansavelmente durante toda a vida. Os avanços ideológicos e
tecnológicos, em menor proporção, seguem um curso semelhante. A maioria dos esforços
inovadores recebe algum apoio nos estágios iniciais, mas as condições ambientais por si só
não são especialmente favoráveis a desenvolvimentos não convencionais.
A ação da influência recíproca também criou uma preocupação geral de que os
progressos no campo da psicologia levarão a um aumento na manipulação e no controle das
pessoas. Uma resposta comum a essas apreensões é afirmar que todo comportamento é
inevitavelmente controlado. Assim, as influências sociais não dizem respeito ao
estabelecimento de controle onde antes não havia nenhum. Este tipo de argumento é válido
no sentido de que toda a ação tem uma causa. Mas não é o princípio da causalidade que
preocupa as pessoas. No nível social, suas apreensões se concentram na distribuição do
poder de controle, nos meios usados, nos propósitos para os quais serão usados, e na
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existência de mecanismos com capacidade de exercer controle recíproco sobre práticas
institucionais. No nível individual, elas estão apreensivas com as implicações da psicoterapia
na programação das relações humanas.
Possíveis saídas para o uso exploratório das técnicas psicológicas são geralmente
discutidas em termos de salvaguardas individuais. Um maior conhecimento sobre os modos
de influência é proposto como a melhor defesa contra manipulações. Quando as pessoas
sabem de que modo o comportamento pode ser controlado, elas tendem a resistir às
tentativas evidentes de influência, tornando assim a manipulação mais difícil. Esse
conhecimento por si só, entretanto, é de pouca utilidade.
Já foi possível impedir esse tipo de exploração antes mesmo que existisse a disciplina
da psicologia para formular princípios e práticas de mudança do comportamento. A mais
segura fonte de oposição ao controle manipulativo encontra-se nas conseqüências
recíprocas das interações humanas. As pessoas resistem à exploração e continuarão a
resistir no futuro, porque a aceitação produz conseqüências desfavoráveis para elas.
Tentativas sofisticadas de influência de modo algum reduzem a relutância em ceder ao que é
pessoalmente prejudicial. Devido às conseqüências recíprocas, ninguém é capaz de
manipular os outros indiscriminadamente e todos vivenciam algum sentimento de importância
quando se trata de conseguir o que querem. Isto acontece em todos os níveis de atuação,
quer individual, quer coletivo. Os pais não conseguem que os filhos façam tudo o que eles
querem e os filhos, por sua vez, sentem-se impelidos pelos pais de fazer o que eles próprios
desejam. Nas universidades, os administradores, o corpo docente, os alunos e ex-alunos,
todos acham que os outros grupos têm excessiva influência na promoção de seus interesses,
mas que seus próprios grupos não têm poder suficiente para alterar as práticas institucionais.
Na arena política, o Congresso acha que o poder executivo tem poder demasiado e o
executivo, por sua vez, acha que suas iniciativas de implementação de suas políticas são
frustradas por ações contrárias do Congresso.
Se a proteção contra a exploração contasse apenas com as salvaguardas individuais,
as pessoas continuariam sujeitas a pressões coercitivas. Deste modo, elas criam sanções
institucionais que impõem limites ao controle do comportamento humano. A integridade dos
indivíduos é garantida em grande parte por salvaguardas sociais que restringem práticas
impróprias e incentivam a reciprocidade através do equilíbrio de interesses.
O fato de os indivíduos estarem familiarizados com as técnicas psicológicas não lhes
permite usá-las com os outros. Por exemplo, os industriais sabem perfeitamente bem que a
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produtividade é maior quando os trabalhadores são pagos pelo trabalho produzido do que
pelo tempo de trabalho. Entretanto, eles não podem usar o sistema de reforçamento mais
vantajoso para eles. Quando os industriais possuíam autoridade exclusiva, eles pagavam aos
trabalhadores por peça. A disparidade do poder entre os empregadores e os empregados
resultou num enfraquecimento gradual dos níveis de produção. À medida em que o
trabalhismo adquiriu força econômica de persuazão através da ação coletiva, foi possível
negociar salários garantidos primeiramente em termos diários, depois semanais e mensais, e
finalmente anuais. De tempos em tempos, novas contingências contratuais mutuamente
aceitas são adotadas. Com o passar do tempo, a medida em que melhores meios de ação
conjunta foram desenvolvidos, outros grupos usarão sua influência para modificar acordos
que beneficiam certos setores da indústria e do trabalho, mas que afetam de modo negativo
a qualidade de vida de outros setores da sociedade.
Como o exemplo anterior demonstra, um maior conhecimento de como influenciar o
comportamento não eleva necessariamente o nível de controle social. Ao contrário, nos
últimos anos, testemunhamos uma difusão do poder, criando maiores oportunidades para
influências recíprocas. Isto permitiu às pessoas contestar injustiças sociais, provocar
mudanças nas práticas institucionais, reagir contra violações dos seus direitos e aumentar as
queixas e processos legais contra contextos sociais que até então operavam sob controle
unilateral. O fato de mais pessoas exercerem o poder por si não garante uma sociedade
mais justa. Numa análise final, a consideração importante refere-se a que propósitos o poder
serve, não importando de que forma esteja distribuído. Tampouco o conhecimento dos meios
de influência necessariamente produz respostas mecânicas nas relações pessoais.
Quaisquer que sejam suas orientações, as pessoas imitam, exteriorizam e reforçam aquilo
com o que se identificam. Um comportamento resultante do planejamento e do compromisso
não é menos autêntico do que uma ação improvisada.
O clichê de 1984 e seus mais recentes similares desvia a atenção do público das
influências reguladoras que impõem ameaças constantes ao bem estar da humanidade. A
maioria das sociedades instituiu sistemas recíprocos protegidos por códigos legais e sociais
para prevenir o controle ditatorial do comportamento humano. Embora surjam abusos do
poder institucional, não é um governo totalitário que constitui o perigo imediato. Há mais
riscos na busca de proveitos pessoais, quer materiais, quer não, do que no controle pela
coerção. As práticas sociais prejudiciais surgem e resistem a mudanças, mesmo no âmbito
de uma sociedade aberta , quando muitas pessoas delas se beneficiam. Para dar um
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exemplo comum, tratamentos injustos de grupos desprivilegiados com vistas a lucros
particulares têm aceitação geral sem precisarem de um controle despótico.
É claro que o homem tem muito mais contra o que lutar do que somente contra as
desumanidades que cometem entre si. Quando as conseqüências negativas de estilos de
vida que seriam recompensadores se acumulam e não são imediatamente percebidas, as
pessoas se tornam elas próprias agentes de autodestruição. Assim, se várias pessoas se
beneficiam com atividades que progressivamente degradam o seu meio ambiente, elas
acabarão por destruí-lo. Embora os indivíduos contribuam para o problema de modo diverso,
todos sofrerão igualmente as conseqüências prejudiciais. Com o crescimento populacional e
a disseminação de estilos de vida extravagantes, sobrecarregando recursos limitados, as
pessoas terão que aprender a lidar com novas realidades da existência humana.
A psicologia não pode dizer às pessoas como elas devem viver suas vidas. Contudo,
pode dar-lhes meios de operar mudanças sociais e pessoais. E pode ajudá-las nas suas
escolhas de valor avaliando as conseqüências de estilos de vida alternativos e de práticas
institucionais. Como uma ciência preocupada com as conseqüências sociais da sua
aplicação, a psicologia deve também cumprir ainda uma obrigação maior para com a
sociedade, fazendo com que as influências se enquadrem no sistema público de modo a
garantir que suas descobertas sejam usadas a serviço do bem da humanidade.
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21
QUESTÕES SOBRE O TEXTO DE BANDURA 1) Quais as funções das conseqüências do comportamento? 2) As relações entre as conseqüências diretas e as conseqüências observadas podem ser
incongruentes. Como isso acontece e quais as conseqüências? 3) Que mecanismos as pessoas utilizam para manter o auto-reforçamento? 4) Que mudanças estão sofrendo as práticas reforçadoras? 5) Em que consiste o auto-governo? 6) Quais as vantagens da modelação?
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