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ANÁLISE DESCRITIVA DA DEGRADAÇÃO AMBIENTAL DO RIO
DOCE NO TRECHO URBANO DO BAIRRO SÃO PAULO AO
BAIRRO SÃO TARCÍSIO EM GOVERNADOR VALADARES/MG
Amanda Lima Oliveira. Aluna do 5º período do Curso de Tecnologia em Gestão
Ambiental do IFMG, Campus Governador Valadares. ambiental.amanda@gmail.com Daniela Martins Cunha. Professora Mestre do Curso de Tecnologia em Gestão
Ambiental do IFMG, Campus Governador Valadares. daniela.cunha@ifmg.edu.br
RESUMO
A expansão urbana desordenada e o aumento populacional trazem consigo
uma série de consequências que atingem os recursos hídricos. Esse quadro de
desequilíbrio dos recursos hídricos urbanos é resultado de ações da sociedade
com o meio ambiente, não se limitando somente às descargas de efluentes,
mas principalmente, do uso e ocupação inadequada das bacias hidrográficas.
Este trabalho tem como objetivo apresentar de forma descritiva o processo de
degradação ambiental do Rio Doce no trecho urbano do bairro São Paulo ao
bairro São Tarcísio do município de Governador Valadares - MG. Para
obtenção de dados, realizaram-se visitas para observar e identificar os
impactos ambientais. Somaram-se registros fotográficos e conversa informal
com moradores ribeirinhos que residem no local. Para adquirir dados teóricos
foram feitas pesquisas bibliográficas em livros, artigos científicos e sites da
internet. Assim, ao longo do trecho estudado foi possível observar uma grande
quantidade de impactos ambientais gerados pela população, como a
disposição inadequada de lixo na margem do Rio Doce, despejo de esgotos “in
natura”, desmatamento e ocupação irregular.
Palavras-chave: Rio Doce; degradação ambiental; impacto ambiental;
ABSTRACT The unplanned urban expansion and population growth brings with it a number
of consequences that affect water resources. This plight of imbalance of urban
water resources is a result of environmental actions, not limited only to effluent
discharges, but mostly, the use and inadequate occupation watershed. This
work aims to present a descriptive process of environmental degradation of Rio
Doce in the urban stretch of São Paulo neighborhood to São Tarcísio
neighborhood. To obtain data, visits were made to observe and identify the
environmental impacts, including photographic records and informal
conversation with river dwellers, residing locally. To acquire theoretical data,
bibliographic searches were made in books, journal articles and websites. Thus,
along the studied stretch was possible to observe a large amount of
environmental impacts generated by the population, as the inappropriate
garbage disposal on the bank of Rio Doce, the issue of sewer “in natura",
deforestation and illegal occupation on its banks.
Keywords: Rio Doce; environmental degradation; environmental impact;
2
1. INTRODUÇÃO
A bacia do Rio Doce foi uma das últimas regiões ocupadas em Minas Gerais.
No auge da mineração, a Coroa Portuguesa, temerosa do contrabando através das
águas do Rio Doce até o mar, no Espírito Santo, proibiu a ocupação dessa área,
conhecida como “Sertões do Rio Doce” (ESPÍNDOLA apud GUIMARÃES, 2007). Essa
zona, coberta de majestosa mata atlântica, serviu de barreira natural ao contrabando
do minério precioso, durante o período minerador. As autoridades capixabas tinham
ordem expressa de prender qualquer um que chegasse ao litoral pelo Rio Doce. Nessa
empreitada, os habitantes indígenas e a floresta eram aliados da Coroa Portuguesa
(ESPÍNDOLA apud GUIMARÃES, 2007).
Entretanto, quando os veios auríferos se esgotaram, a ocupação do território
tornou-se, ao contrário, interessante ao Estado. Inicia-se o processo de incentivo à
ocupação dos “Sertões do Rio Doce” (ESPINDOLA apud GUIMARÃES, 2007).
Entre as medidas tomadas, ofereciam-se isenção de pagamento de dízimos
por dez anos e moratória de seis anos aos devedores da Fazenda Real, além da
liberação de taxas de importação e exportação dos produtos comercializados através
do Rio Doce (BORGES apud GUIMARÃES, 2007). Aos fazendeiros que para lá se
deslocassem também era facultado o uso do trabalho indígena. Apesar das vantagens
oferecidas, poucos foram os que se aventuraram a adentrar aquela fronteira da
Capitania. Após a Independência do país, D. Pedro I ofereceu outras vantagens para
estimular a colonização da região (BORGES apud GUIMARÃES, 2007). Embora a
suspensão do regime sesmarial date de 1822, um documento de 1824 indica que
estava facultada a concessão de sesmarias a todos os que, até 1836, se dirigissem
para a região do Rio Doce e ali se dispusessem a cultivar a terra e a comercializar
seus produtos (BORGES apud GUIMARÃES, 2007). Entretanto, essas iniciativas não
alcançaram os resultados pretendidos. Apenas na segunda metade do século XIX,
Figueira, posteriormente Governador Valadares, transforma-se em entreposto
comercial de envergadura considerável. O Rio Doce, navegável do povoado até a foz,
possibilitou sua consolidação como porto de canoas e troca de mercadorias (SIMAN
apud GUIMARÃES, 2007).
A cidade foi planejada antes mesmo de ser ocupada e passou por diversos
planos ao longo da sua história recente, cada qual correspondendo ao modelo vigente
na época. Apesar dessa trajetória de planejamento urbano, o resultado não difere do
que se conhece como caos urbano: desigualdades, ausência de moradia para grande
parte da população, falta de infraestrutura, violência urbana, entre outros
(GUIMARÃES, 2007).
3
As preocupações com a ocupação e o desenvolvimento do Sertão do Rio Doce
foram acompanhadas pelo interesse oficial em “organizar e planejar” espacialmente
esse desenvolvimento. A partir da decisão de Peçanha, foi elaborada a planta
topográfica que deu origem ao atual traçado urbano (Figura 1), pelo agrimensor
Olympio Freitas Caldas, entre 1915 e 1920 (CARNEIRO; FONSECA apud
GUIMARÃES, 2007).
Desse modo, surge a cidade planejada em tabuleiro de xadrez, a partir dos
eixos Norte-Sul e Leste-Oeste, ignorando a existência do traçado sinuoso do rio.
(GUIMARÃES, 2007).
Figura 1 - Traçado urbano de Governador Valadares.
Legenda:
1. Casas classe pobre e
operária;
2. Praças;
3. Comércio varejista,
artigos de alimentação;
4. Casas classe média
e alta;
5. Indústrias;
6. Comércio e artigos
manufaturados;
7. Serviços públicos,
administrativos, escolas etc.
Fonte: Dados modificados a partir de Strauch (1958).
A efetiva ocupação da região só se deu a partir da construção da Estrada de
Ferro Vitoria-Minas (EFVM), iniciada em 1903 em Vitória (CBH-DOCE, 2013).
No processo de ocupação e exploração regional, a cidade de Governador
Valadares emergiu como pólo. A estação da estrada de ferro, inaugurada em 1910,
reforçou a posição da localidade como entreposto comercial de todo o Médio Rio
Doce. Nos anos de 1920, a vila de Figueira (hoje, Governador Valadares) girava em
torno de uma rua, próxima de onde passava a linha de ferro, margeando o rio
(ESPINDOLA, 1999).
4
A cidade de Governador Valadares foi favorecida pelo crescimento da
economia e pela expansão demográfica regional, quando a população chegou a
20.357 habitantes, na década de 1950 (ESPINDOLA, 1998).
A demanda crescente por moradia e outros serviços básicos, decorrente do
grande afluxo de pessoas, estimulava a expansão física da cidade (GUIMARÃES,
2007). Iniciativas polêmicas como a do prefeito Raimundo Albergaria se fizeram notar.
Através do mecanismo de aforamento e da expansão territorial em novos bairros, esse
prefeito pretendeu atender à crescente demanda de lotes e moradia. “Os bairros
construídos por ele foram: Nossa Senhora das Graças, São Tarcísio, Alto do Carapina,
Esgoto, Lourdes, Santa Terezinha (SOARES, 1983)”. Esses bairros novos foram
criados nas adjacências da área central. (GUIMARÃES, 2007)
Entretanto, as condições sanitárias não acompanharam esse processo e nem
mesmo o processo de urbanização e desenvolvimento dos primeiros bairros surgidos
em Governador Valadares (COELHO apud GENOVEZ; VILARINO; SUPERBI, 2012).
Dados do SAAE (2007) reafirmam tal precariedade: em 1960, o número de
ligações (dos domicílios à rede de abastecimento de água) era de 5.780,
correspondendo a um contingente de 30.000 habitantes. Sabe-se que a população era
de 70.494 habitantes nessa época (ESPÍNDOLA, 1999). Cerca da metade estava,
então, desprovida desse serviço básico. Outras fontes indicam que, na década de
1960, avançando nos anos 1970, inicia-se o processo de expansão da rede de
abastecimento de água aos bairros (SOARES, 1983). Os domicílios sem o serviço de
água estavam concentrados nos bairros mais periféricos, não por coincidência,
retornando à FIG. 1, a porção oeste, principalmente as proximidades do Córrego
Figueirinha, tem como ocupação predominante casas de classe operária e pobre
(STRAUCH, 1958).
Diante do exposto, Messias (2010) explica que a expansão urbana
desordenada e o aumento populacional trazem consigo uma série de consequências
que atingem os recursos hídricos. Esse quadro de desequilíbrio dos recursos hídricos
urbanos é resultado de uma série de ações da sociedade com o meio ambiente, não
se limitando somente às descargas de efluentes, mas principalmente, do uso e
ocupação inadequada das bacias hidrográficas.
A compreensão histórica da ocupação urbana de Governador Valadares ao
longo do Rio Doce possibilita identificar os motivos pelos quais pessoas deslocaram-
se para áreas de risco, construindo suas casas nas margens do Rio, posteriormente
formando bairros. Essa situação trouxe para a cidade e para um dos bens mais
preciosos, o Rio Doce, uma série de problemas, favorecendo um cenário de
degradação ambiental.
5
A Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA), em seu Art.3°- Inciso II define
que a degradação da qualidade ambiental pode ser entendida como: “a alteração
adversa das características do meio ambiente”.
A Lei não evidencia se o causador da degradação é o ser humano em si, uma
consequência de atividade antrópica ou até mesmo um fenômeno natural como um
raio que atinge determinada floresta e acaba por destruir a mesma por meio de um
incêndio. O que fica explícito neste conceito é que a degradação ambiental
caracteriza-se como um impacto ambiental negativo (SANCHEZ apud MENEGUZZO;
CHAICOUSKI, 2010).
Conforme a Resolução n° 01/86 do Conselho Nacional do Meio Ambiente
(CONAMA), impacto ambiental pode ser definido como:
Qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: I - a saúde, a segurança e o bem-estar da população; II - as atividades sociais e econômicas; III - a biota; IV - as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; V - a qualidade dos recursos ambientais.
Apesar de o termo impacto ambiental ser utilizado na lei para indicar
negativamente as ações antrópicas, um impacto ambiental também pode ter aspectos
positivos, ou seja, ele pode ser tanto maléfico quanto benéfico. Portanto, é importante
que o termo seja qualificado em negativo ou positivo, tornando possível sua relação
com a área a ser estudada.
Para Botelho (apud MESSIAS, 2010), “a bacia hidrográfica pode ser
conceituada como área da superfície terrestre drenada por um rio principal e seus
tributários, sendo limitada pelos divisores de água”.
Estudos relacionados à degradação ambiental em bacias hidrográficas são de
vital importância para o entendimento de aspectos da relação sociedade-natureza. Tal
análise constitui-se num instrumento que pode fornecer subsídios para um
planejamento que tenha por meta a qualidade de vida e a sustentabilidade ambiental
(MENEGUZZO, 2006).
Especificamente no meio urbano "A degradação do ambiente e,
consequentemente, a queda da qualidade de vida se acentuam onde o homem se
aglomera: nos centros urbano-industrais. Aqui, os rios, fundos de vales e bairros
6
residenciais periféricos dividem o espaço com o lixo e a miséria" (MENDONÇA apud
MENEGUZZO, 2006).
Não obstante as atividades industriais contribuírem com o processo de
degradação do Rio Doce, esta pesquisa deu ênfase única e exclusivamente às áreas
urbanas. A influência urbana no processo de degradação do Rio é elevada, a
legislação ambiental com as indústrias é mais exigente e punitiva, mas com a
população ainda há dificuldades em sua execução. Por isso a necessidade de levantar
questões, como exemplo, o lixo jogado nas margens e no Rio, para que possam ser
discutidas na comunidade e que sejam de caráter informativo para quem ainda não
tem conhecimento dos impactos negativos. Também que essas questões sejam
relevantes para o poder público na elaboração das políticas públicas, e não menos
importante, que cheguem até àquelas instâncias e instituições que possuem poder
deliberativo de provocar mudanças e melhorias na sociedade.
Assim, este trabalho tem como objetivo geral apresentar de forma descritiva o
processo de degradação ambiental do Rio Doce no trecho urbano do bairro São Paulo
ao bairro São Tarcísio. Como objetivos específicos foram estabelecidos: a) Identificar
os atuais impactos ambientais negativos provocados pela ocupação antrópica às
margens do Rio Doce entre os bairros São Paulo e São Tarcísio; b) Descrever estes
impactos.
2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
2.1. Caracterização da área de estudo
A bacia hidrográfica do Rio Doce está situada na região Sudeste, entre os
paralelos 18°45' e 21°15' de latitude sul e os meridianos 39°55' e 43°45' de longitude
oeste, compreendendo uma área de drenagem de cerca de 83.400 km², dos quais
86% pertencem ao Estado de Minas Gerais e o restante ao Estado do Espírito Santo.
Limita-se ao sul com a bacia hidrográfica do Rio Paraíba do Sul, a oeste com a bacia
do Rio São Francisco, e, em pequena extensão, com a do Rio Grande. Ao norte,
limita-se com a bacia dos Rios Jequitinhonha e Mucuri e a noroeste com a bacia do
Rio São Mateus (CBH-DOCE, 2013) (Figura 2).
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Figura 2 – Mapa da Localização da Bacia Hidrográfica do Rio Doce.
Fonte: IBGE (2013), ANA (2013), OLIVEIRA (2013).
O Rio Doce, com uma extensão de 853 km, tem como formadores os Rios
Piranga e Carmo, cujas nascentes estão situadas nas encostas das serras da
Mantiqueira e Espinhaço, onde as altitudes atingem cerca de 1.200 m. Seus principais
afluentes são: pela margem esquerda os Rios Piracicaba, Santo Antônio e Suaçuí
Grande, em Minas Gerais, Pancas e São José, no Espírito Santo; pela margem direita
os Rios Casca, Matipó, Caratinga-Cuieté e Manhuaçu, em Minas Gerais, e Guandu, no
Espírito Santo (CBH-DOCE, 2013).
A cidade de Governador Valadares está situada no Leste do Estado de Minas
Gerais e às margens do Rio Doce. A Princesa do Vale, como também é conhecida, foi
fundada em 1938 e conta atualmente com uma população aproximada de
275.568 habitantes (IBGE apud PREFEITURA DE GOV. VALADARES, 2013).
O trecho urbanizado do Rio Doce escolhido para estudo compõe-se em quatro
bairros, a saber, Bairro São Paulo, Santa Teresinha, Centro e São Tarcísio (Figura 3).
8
Figura 3 – Mapa da Localização dos bairros no trecho estudado.
Fonte: IBGE (2013), ANA (2013), CRUZ (2013).
Em visita ao setor de Geoprocessamento do SAAE-GV (Serviço Autônomo de
Água e Esgoto) de Governador Valadares, foi fornecido o número estimado de
pessoas por bairro estudado. O bairro São Paulo possui um número estimado de
7.021 pessoas, o bairro Santa Teresinha 4.979, o Centro, por ter uma extensão maior
é divido em A e B, sendo o lado A mais próximo do rio e sua população estimada é
17.062, entre casas e comércios, e o bairro São Tarcísio possui um número menor de
moradores, 592. O número total estimado de moradores nos bairros estudados é
29.654.
2.2. Tipo de método utilizado
Para a elaboração desta pesquisa utilizou-se uma abordagem qualitativa,
exploratória e descritiva.
Na pesquisa qualitativa, o cientista é ao mesmo tempo o sujeito e o objeto de
suas pesquisas. O desenvolvimento da pesquisa é imprevisível. O conhecimento do
pesquisador é parcial e limitado. O objetivo da amostra é de produzir informações
9
aprofundadas e ilustrativas: seja ela pequena ou grande, o que importa é que ela seja
capaz de produzir novas informações (DESLAURIERS apud GERHARDT; SILVEIRA,
2009).
A pesquisa exploratória não requer a elaboração de hipóteses a serem
testadas no trabalho, restringindo-se a definir objetivos e buscar mais informações
sobre determinado assunto de estudo. Tais estudos têm por objetivo familiarizar-se
com o fenômeno ou obter uma nova percepção dele e descobrir novas ideias.
(CERVO; BERVIAN; DA SILVA, 2007).
Ainda segundo os autores, a pesquisa descritiva observa, registra, analisa e
correlaciona fatos ou fenômenos (variáveis) sem manipulá-los. [...] Desenvolve-se
principalmente, nas ciências humanas e sociais, abordando aqueles dados e
problemas que merecem ser estudados, [...] os dados, por ocorrerem em seu habitat
natural, precisam ser coletados e registrados ordenadamente para seu estudo
propriamente dito (CERVO; BERVIAN; DA SILVA, 2007).
2.3. Fonte de Dados
Para identificar e descrever os impactos realizaram-se 03 (três) visitas “in loco”,
com duração aproximada de 02:30 hs (duas horas e trinta minutos) cada visita, todas
feitas no mês de Agosto do ano de 2013. Somaram-se registros fotográficos da área
pesquisada, e conversa informal com 04 (quatro) moradores ribeirinhos que
encontravam-se no local, para entender e conhecer melhor seus hábitos e atitudes
em relação ao Rio Doce. Também foi feita uma visita em novembro de 2013 ao Setor
de Geoprocessamento do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) para colher
informações sobre os bairros pesquisados. Para obtenção de dados teóricos foram
feitas pesquisas bibliográficas em livros, artigos científicos e sites da internet.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
O morador urbano, independentemente de classe social, anseia viver em um
ambiente saudável que apresente as melhores condições para vida, ou seja, que
favoreça a qualidade de vida: ar puro, desprovido de poluição, água pura em
abundância entre outras características tidas como essenciais. Entretanto, observar
um ambiente urbano implica em perceber que o uso, as crenças e hábitos do morador
citadino têm promovido alterações ambientais e impactos significativos no ecossistema
urbano (MUCELIN; BELLINI, 2008).
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Os autores acima representaram bem a divergência entre o querer e o fazer, o
desejo da população é viver em excelentes condições de moradia, mas, sem
generalizar, muitos ainda não colaboram para que esse ambiente seja favorável a
todos.
Ao longo do trecho estudado foi possível observar uma grande quantidade de
impactos ambientais negativos gerados pela população, como a disposição
inadequada de lixo na margem do Rio Doce (Figuras 4 e 5).
Figura 4 – Resíduos de construção civil nas Figura 5 – Resíduos sólidos urbanos nas margens do Rio Doce - Bairro Santa Terezinha margens do Rio Doce - Bairro São Paulo
Fonte: Própria / Agosto 2013 Fonte: Própria / Agosto 2013
Um dos grandes problemas resultantes do lixo acumulado é a proliferação de
insetos e roedores, transmissores de doenças, os quais encontram nos resíduos as
condições adequadas de abrigo, alimentação e reprodução (MOTA, 2010).
Outro problema identificado é o aspecto estético desagradável, que causa a
falta de harmonia com a natureza, descaracterizando o ambiente e o mau odor oriundo
de animais em decomposição e do lixo orgânico.
Mota (2010) explica que há uma interrelação muito grande entre a poluição do
solo e a da água. Fertilizantes, pesticidas, lixo e esgotos, quando dispostos no solo de
forma não controlada, podem ser transportados para os mananciais superficiais ou
subterrâneos de água, e causarem a poluição dos mesmos.
A cidade de Governador Valadares sofre com alagamentos anualmente no
período chuvoso, e o lixo que é depositado inadequadamente na margem do Rio é o
mesmo que retorna às residências dos moradores ribeirinhos. Ou seja, além de poder
gerar mais poluição devido o contato água/lixo, pode também gerar problemas de
saúde devido ao contato humano com a poluição.
11
Mucelin e Bellini (2008) explicam que a vivência cotidiana muitas vezes
mascara circunstâncias visíveis, mas não perceptíveis. Mesmo contemplando casos
de agressões ao ambiente, os hábitos cotidianos concorrem para que o morador
urbano não reflita sobre as consequências de tais hábitos, mesmo quando possui
informações a esse respeito.
Outro impacto negativo observado é o despejo de esgoto “in natura” no Rio
Doce (Figuras 6 e 7). Em outros bairros da cidade, o esgoto é despejado nos córregos,
mas o destino dessas águas é o mesmo, o Rio Doce.
Figura 6 - Emissão de esgoto “in natura” Figura 7 - Emissão de esgoto “in natura” Bairro São Paulo Bairro São Paulo
Fonte: Própria / Agosto 2013 Fonte: Própria / Agosto 2013
Dados fornecidos em visita ao SAAE-GV informam que há um total de 138
pontos de lançamento de esgoto na cidade. Para Matos (2010) o esgoto bruto (sem
tratamento) ou os efluentes de fossas sépticas, quando lançados diretamente nos
cursos d’água, podem causar grandes impactos no habitat aquático e marinho,
diminuindo a concentração de oxigênio dissolvido no meio e contaminando a cadeia
alimentar por bioacumulação de substâncias tóxicas.
Sobre a redução do oxigênio dissolvido Mota (2010) explana que ao se lançar
matéria orgânica em um manancial de água, ocorre uma grande proliferação de
bactérias aeróbias que, ao efetuarem a decomposição da mesma, utilizam o oxigênio
do meio liquido para a sua respiração. O consumo do oxigênio dissolvido, pelas
bactérias, pode reduzi-lo a valores muitos baixos, ou mesmo extingui-los totalmente,
com impactos sobre a vida aquática aeróbia (MOTA, 2010).
Um exemplo para a explicação do autor é a mortandade de peixes, pela falta
de oxigênio, que foi consumido pelas bactérias aeróbias. Tal atitude impacta
12
diretamente às pessoas que se sustentam da pesca, que é uma atividade comum na
cidade.
Outro tipo identificado de degradação ambiental que o Rio sofreu é o
desmatamento das margens (Figuras 8 e 9). A área verde encontrada na beira de rios,
córregos, lagos, represas e nascentes é conhecida como mata ciliar. No trecho
estudado a mata ciliar está sendo destruída dando espaço a grandes áreas
desprotegidas.
Figura 8 – Ausência de mata ciliar no Figura 9 - Ausência de mata ciliar Rio Doce - Bairro Santa Terezinha no Rio Doce - Bairro São Paulo
Fonte: Própria / Agosto 2013 Fonte: Própria / Agosto 2013
As matas ciliares funcionam como filtros, retendo defensivos agrícolas,
poluentes e sedimentos que seriam transportados para os cursos d'água, afetando
diretamente a quantidade e a qualidade da água e consequentemente a fauna
aquática e a população humana (ÁRVORES BRASIL, 2013). São importantes também
como corredores ecológicos, ligando fragmentos florestais e, portanto, facilitando o
deslocamento da fauna e o fluxo gênico entre as populações de espécies animais e
vegetais. Em regiões com topografia acidentada, exercem a proteção do solo contra
os processos erosivos (ÁRVORES BRASIL, 2013).
Para proteger as matas ciliares, o Ministério do Meio Ambiente (2014) justifica
que foram instituídas pelo Código Florestal (Lei nº 4.771 de 1965 e alterações
posteriores) as Áreas de Preservação Permanente, que consistem em espaços
territoriais legalmente protegidos, ambientalmente frágeis e vulneráveis, podendo ser
públicas ou privadas, urbanas ou rurais, cobertas ou não por vegetação nativa.
Segundo o atual Código Florestal Brasileiro, Lei nº 12.651/12, artigo 4°, inciso I,
considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os
efeitos desta Lei, “as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e
intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular”.
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Nos bairros São Paulo e Santa Terezinha, verificou-se, em alguns trechos, que
a Área de Preservação Permanente é usada pelos moradores ribeirinhos, como
espaço para lazer e para a criação de animais.
A ocupação irregular também é uma das consequências indesejáveis do
processo de crescimento urbano desordenado. Nos quatro bairros foram identificadas
residências às margens do Rio Doce (Figuras 10, 11, 12 e 13).
Figura 10 - Residência na margem do Figura 11 - Residência na margem do Rio Doce - Bairro São Paulo Rio Doce - Bairro Santa Terezinha
Fonte: Própria / Agosto 2013 Fonte: Própria / Agosto 2013
Como pode ser observado, o Centro e o bairro São Tarcísio não possuem
nenhum tipo de faixa separando as casas do Rio, o que também pode ser considerada
degradação ambiental, pois, além do desmatamento, instalaram-se na extensão que,
legalmente, deveria estar a Área de Preservação Permanente (APP).
Figura 12 - Residências na margem do Rio Doce situadas no bairro São Tarcísio
Fonte: Própria / Agosto 2013
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Figura 13: Residências na margem do Rio Doce situadas no Centro. Ao fundo encontra-se o
Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE).
Fonte: própria, Agosto/2013.
Fonte: Própria / Agosto 2013
O artigo 27, inciso II da Lei Complementar n° 004/93, que dispõe sobre o uso e
a ocupação do solo urbano no Município de Governador Valadares-MG, determina que
“integram a Zona de Preservação Permanente as faixas de 100,00 m (cem metros) de
largura de cada lado do Rio Doce, em atendimento ao disposto no Código Florestal e
suas alterações;
Na área estudada, percebeu-se que existe uma significativa discordância entre
a Lei e a realidade mostrada, cenário de degradação ambiental sendo o Rio Doce o
principal prejudicado.
A deficiente estrutura urbana para os bairros estudados promoveu grandes
problemas ambientais, a população ocupa as áreas de expansão natural do Rio, que
na época das cheias retoma às casas, alagando todo o espaço que, por Lei, não
deveria estar habitado. Além do lixo carregado para o leito do rio que pode contaminar
os recursos hídricos, o problema torna-se ainda mais agravante quando esse lixo
depositado irregularmente, considerado atrativos a animais e insetos vetores de
doenças pode, também, contaminar a população, gerando não só danos ao meio
ambiente, mas grande problema de saúde pública.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A urbanização nas margens do Rio Doce provoca um processo de degradação
que, somando-se a hábitos cotidianos dos moradores tem gerado impactos negativos
sobre os recursos hídricos. Nos bairros São Paulo e Santa Terezinha, os quais
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possuem vias, em alguns pontos, que separam as residências do Rio, é comum a
prática da disposição de lixo doméstico e entulhos na margem, o mau cheiro e o
esgoto lançado sem tratamento no Rio influenciam um ambiente atrativo a animais
vetores de doenças.
O Centro e o bairro São Tarcísio foram edificados totalmente nas margens do
Rio, ignorando qualquer limite de segurança para a população. No período de chuvas,
todos os bairros estudados sofrem inundações, isto vai se tornar um problema a partir
do momento em que as águas invadem a planície e carregam tais resíduos para
dentro do leito do rio, também ressalta-se a possibilidade de contaminação da
população através do contato água/lixo.
Com este estudo percebeu-se que a degradação ambiental do Rio Doce é
resultado de muitas ações negativas da sociedade com o meio ambiente, e mesmo
havendo leis para preservar e minimizar tais agressões, elas não são respeitadas pela
população, nem pelo poder público responsável em fiscalizar e proteger a área.
É necessária a implantação da Educação Ambiental nas escolas como parte
do processo de aprendizagem da criança, também na comunidade para que a família
esteja consciente das atitudes que auxiliam na degradação o Rio Doce, e adquira
atitudes ambientalmente corretas. A responsabilidade sócio-ambiental de cada pessoa
deve ser colocada em prática e não ser apenas teoria em livros ou conteúdo para a
mídia em geral. Deve ser concretizada em práticas ambientalmente corretas.
Os fatos evidenciam a falta de conhecimento da população e o pouco interesse
em recuperar a área estudada, e diante da importância e complexidade do tema
exposto, recomenda-se que este estudo seja base para trabalhos futuros, e que seja
utilizado como instrumento de informação e consciência ambiental para a sociedade.
5. REFERÊNCIAS
ÁRVORES BRASIL. Recuperação de Matas Ciliares. Disponibilizado em: <http://www.arvoresbrasil.com.br/?pg=reflorestamento_mata_ciliar>. Acesso em: 23 out. 2013. BRASIL. Lei n. 12.651, de 25 de maio de 2012. Código Florestal brasileiro. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12651.htm>. Acesso em: 15 fev. 2014.
BRASIL. Lei complementar n. 004, de 1993. Dispõe sobre o uso e a ocupação do
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