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7/22/2019 Artigo de Vera Dodebei
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MEMRIA E INFORMAOuma proposta de modelizao discursivo-conceitual
Vera DodebeiProfessora Associada III
UNIRIO
dodebei@gmail.com
Evelyn Goyannes Dill OrricoProfessora Associada I
UNIRIOorrico.evelyn@gmail.com
Resumo
Considerando as fronteiras conceituais entre memria e informao discutem-se, nesta comunicao,categorias consideradas fundamentais para a representao do campo terico da memria social, utilizando-se um conjunto terico-metodolgico interdisciplinar e experimental, que denominamos de modelizaodiscursivo-conceitual. O estudo tem por justificativa principal servir de instrumento terico de organizaodo conhecimento tanto para o campo da informao, quanto para o da memria. Utilizou-se a combinao de
dois conjuntos tericos de anlise: Anlise Documentria, ou de Contedo (AC), e Anlise do Discurso (AD)para a obteno de conceitos e categorias representativas do campo da memria social, bem como de sua redede sentidos. Como resultados, so apresentados dois mapas discursivo-conceituais: o primeiro composto porseis categorias paradigmticas, suas subcategorias e a possibilidade de estabelecer redes de sentido; o segundo o resultado do exerccio de representao feito no pr-texto da obra de Paul Ricoeur.
Rsum
Considrant les limites conceptuelles entre la mmoire et l'information, il sont discutes, dans la prsentecommunication, les catgories considres comme essentielles la reprsentation du champ thorique de lammoire sociale, en utilisant un cadre thorique et mthodologique interdisciplinaire et exprimentale, quenous appelons modlisation discursive-conceptuelle. L'tude a pour principale justification de pouvoir treutilise comme un instrument thorique de lorganisation des connaissances la fois pour le domaine de
l'information, et pour la mmoire. Nous avons utilis une combinaison de deux sries d'analyses thoriques:LAnalyse Documentaire, o de Contenu (AC), et lAnalyse du Discours (AD) pour obtenir des conceptset des catgories reprsentant le domaine de la mmoire sociale, ainsi que son rseau de significations. Lesrsultats prsents se posent sur deux cadres discursive-conceptuel: le premier se compose de six catgories
paradigmatiques, des sous-catgories et de la possibilit d'tablir des rseaux de sens ; et, le deuxime est lersultat de l'exercice de rpresentation fait sur la partie pr-textuelle de loeuvre de Paul Ricur.
Abstract
Considering the conceptual boundaries between memory and information it is discussed, in thiscommunication, categories considered critical to the representation of the theoretical field of social memory,using a theoretical and experimental interdisciplinary methodology, which we call discursive-conceptualmodeling. The study has as main purpose to be a theoretical knowledge organization instrument for both thefield of information, and of memory. It is used a combination of two sets of theoretical analysis: DocumentaryAnalysis, or Content (AC) and Discourse Analysis (DA) to obtain representative concepts and categories forthe social memory field, as well for its meanings network. As main results, it is presented two conceptual-discourse maps: the first consists of six paradigmatic categories, subcategories and the possibility ofestablishing some meaning networks; and, the second is the result of a representative exercise which was donefrom the pre-textual part of Paul Ricoeurs work.
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1 INTRODUO
Em continuidade s nossas pesquisas sobre as fronteiras conceituais entre memria
e informao discutem-se, nesta comunicao, categorias consideradas fundamentais para
a representao do campo terico da memria social, utilizando-se um conjunto terico-
metodolgico experimental, que denominamos de modelizao discursivo-conceitual.O estudo apresentado tem por justificativa principal servir de instrumento terico de
organizao do conhecimento tanto para o campo da informao, quanto para o da
memria.
Para responder, ainda que provisoriamente, - o que a memria da humanidade?
como ela se organiza entre o individual e o coletivo? de que modo ela se constitui e se
apresenta em patrimnio nas redes de informaes digitais? e como os pesquisadores dos
campos da Cincia da Informao e da Memria Social organizam suas redes de referncias
autorais, conceituais e discursivas? (Dodebei; Orrico, 2011) utilizamos como campo
emprico deste estudo dois conjuntos de dados.
O primeiro construdo por meio das anlises documentrias (Coyaud, 1972) e de
contedo (Bardin, 1991) obtidas pela indexao dos trabalhos apresentados ao GT10 da
Associao Nacional de Pesquisa e Ps-Graduao em Cincia da Informao e reas afins
ANCIB que foi objeto de comunicao no segundo colquio da Rede Mussi em 2011. Os
resultados daquele estudo apontaram para 11 categorias obtidas por inferncias de classes,
segundo os pressupostos das abordagens tericas da anlise conceitual (Dahlberg, 1978;
Dodebei, 2005).
As categorias obtidas por induo, a partir da literatura indexada, representavam
os seguintes temas: colees de memria, suportes de memria, procedimentos terico-
metodolgicos; memria; cultura; ensino e pesquisa; polticas da informao e do
patrimnio; informao; espaos da memria; aes informacionais e memorialsticas; e,
temas de pesquisa.
O segundo conjunto de dados tem como campo de observao o programa dadisciplina Memria Social e Instituio(MSI) oferecida aos cursos de mestrado e
doutorado em Memria Social e sua evoluo nos 5 ltimos anos. A observao ocorre sob
dois focos: o primeiro, de carter geral ou extensivo tem por base metodolgica, igualmente
ao estudoanterior, a Anlise Documentria ou de contedo (AC) e modeliza os conceitos
tericos a partir dos itens que compem o contedo programtico do curso, conforme sua
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ementa:
Memria social e processos de institucionalizao. Relaes de poder e sabercomo prticas sociais e institucionais. Instituio como processo. Documento eInstituio: materiais da Memria Coletiva e da Histria. Estatutos do Documento:fonte, prova, expresso da verdade e superfcie de inscrio. As instituies-memria: arquivos, bibliotecas, museus. Documento e Monumento
O contedo programtico de MSI compe-se de numerosos pontos de vista pelos
quais podemos observar as relaes da memria com as instituies sociais. A experincia
de mais de cinco anos coordenando e orientando as discusses acadmicas nesse tema
nos indicou que a organizao desses tpicos da ementa, recortados de um campo de
conhecimento transdisciplinar, exigiria que definssemos com maior rigor os contextos
tericos dos discursos autorais que julgssemos fundamentais para obter o equilbrio entre:
extenso, intenso (compreenso) e consistncia conceitual do programa do curso.
Ao produzir snteses dos discursos autorais para compor os itens do programa da
disciplina compreendeu-se que essas snteses discursivas poderiam gerar as inferncias
que ligam os conceitos, compondo-se, assim, um mapa inicial do domnio dos estudos em
memria social, como no exemplo: .
Na verdade, ao extrairmos esses termos do contexto textual em que esto imersos,
atribuirmos a eles o papel de descritores dos referidos textos, e ainda ao agrup-los no
escopo do conjunto de textos de uma disciplina, estabelecemos um conjunto simblicoque acaba por constituir uma rede de sentidos. O mapa conceitual, abaixo, gerado a partir
dessas snteses foi objeto de comunicao submetida ao XIII ENANCIB (Dodebei, V;
Orrico, E., 2012).
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Fig. 1 Mapa conceitual sobre a memria. Fonte: as autoras
O segundo foco, de carter especfico ou intensivo, tem por base a Anlise de
Discurso (AD) em Pcheux (1993) e lana sua lente de aumento para o conceito de justa
memria (iluminado do mapa fig. 1) de um dos autores referenciados no programa docurso, o filsofo francs Paul Ricouer. Selecionamos ento como corpus intensivo para este
experimento os segmentos pr-textuais de sua obra Memria, histria e esquecimento
(2007).
2 ANLISE DOCUMENTRIA, OU DE CONTEDO (corpus extensivo para ocontexto conceitual)
Os resultados do estudo empreendido por Dodebei e Orrico (2011) apontaram para
11 categorias conceituais obtidas por inferncias de classes, segundo os pressupostos das
abordagens tericas da anlise conceitual (Dahlberg, 1978; Dodebei, 2002). As categorias
obtidas por induo, a partir da literatura indexada, representavam os seguintes temas:
colees de memria, suportes de memria, procedimentos terico-metodolgicos;
memria; cultura; ensino e pesquisa; polticas da informao e do patrimnio; informao;
espaos da memria; aes informacionais e memorialsticas; e, temas de pesquisa.
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Figura 2 Categorias temticas obtidas por indexao livre e de nuvensFonte: Dodebei; Orrico, 2011
O quadro conceitual (fig. 2) foi fruto de uma classificao preliminar para os173 conceitos obtidos pela indexao automtica dos 35 trabalhos apresentados, com 58
autores/co-autores participantes e 459 autores citados nas listas de referncias. Com relao
aos conceitos atribudos a cada trabalho foram utilizadas as palavras-chave selecionadas em
lngua natural pelo autor, acrescidas por palavras simples obtidas por indexao automtica
dos resumos de cada trabalho realizada pelo programa Wordle
A deciso de utilizar nuvens, que so a sntese imagtica de contedos utilizada
em quase todos os programas de construo de blogs e outros stios na internet, foi a de
aumentar o grau de exaustividade da indexao para os autores que indexaram seus textos e
de criar palavras-chave para aqueles que no os indexaram. Utilizamos o limite de criao
de 15 palavras e ainda retiramos aquelas que julgamos no significativas. Apresentamos um
exemplo com um dos resumos:
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Fig 3 Indexao por nvens. Fonte: Dodebei; Orrico, 2011
Com esta metodologia de anlise documentria, ou de contedo, obtivemos um
conjunto de conceitos categorizados por paradigmas ou subordinaes, mas a metodologia
no nos permitiu determinar as relaes associativas ou de coordenao entre os conceitos
para a formao dos sintagmas representativos dos discursos fundamentais que enquadram
o domnio da memria social. Sabemos que essas relaes sintagmticas s podem ser
construdas pelo contexto discursivo, o que lhes dar garantia literria (Dodebei, 2002) e
representatividade no domnio.
3 PAUL RICOEUR E O CAMPO DA MEMRIA (corpus intensivo para o contextodiscursivo)
Para darmos incio anlise do contexto discursivo, optamos por nos pautar em
um autor reconhecidamente importante para o campo da memria, sobretudo por uma desuas publicaes considerada como o extrato de sua obra, o livro Memria, Histria e
esquecimento(2007). Nesse livro ele apresenta um debate em torno das grandes questes
sobre esses temas, ao procurar estabelecer um dilogo com uma grande rede de autores que
se dedicaram ao tema da memria.
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importante ressaltar que vamos trabalhar com a traduo para a lngua portuguesa,
admitindo que no Brasil contemporneo que estamos procurando enquadrar o domnio
da memria social. Nesse sentido, mais vale o enunciado produzido em portugus, j que
ele que vai ajudar a construir o universo conceitual da temtica, do que o enunciado
exato utilizado pelo autor em sua lngua materna. Evidentemente a linha discursiva por eleutilizada vai estar condicionada ao perodo scio-histrico em que foi produzida, o que
imperioso considerar para uma anlise do discurso. No entanto, importa-nos pensar em
como os campos conceituais da memria e da informao esto sendo construdos, ou seja,
por quais cadeias parafrsticas as redes de sentido esto sendo formuladas, j que estamos
pensando no campo terico conceitual brasileiro contemporneo.
O autor que nos guia pela anlise Ricoeur, que viveu ao longo do sculo XX,
de 1913 a 2005, tendo se sobressado como grande pensador francs no perodo que se
seguiu Segunda Guerra Mundial, lanando mo de um largo espectro terico que abrangia
lingustica, psicanlise, estruturalismo e hermenutica. Desde cedo ele se interessou pela
histria a partir de uma perspectiva filosfica, objetivando definir a natureza do conceito
de verdade em histria e diferenciar a objetividade no campo da histria da objetividade
no campo das cincias exatas. Mais tarde ele se dedicar s questes culturais e histricas
a partir de uma perspectiva fenomenolgica e hermenutica, fomentando uma discusso
sobre a memria e a memria cultural.
A escolha de Ricoeur para esta anlise deve-se tanto por sua posio referencial no
campo, mas porque sua obra traz um grande balano de autores, o que nos faz pensar que,
ao analis-lo, no estamos olhando uma rede de sentidos particular, mas, ao contrrio, uma
sntese de variadas correntes tericas.
Ao focalizarmos o texto de Ricoeur que norteia a disciplina Memria e Instituio,
inicialmente decidimos selecionar as partes iniciais de cada unidade de captulo, porque
nessas partes ele se dirige diretamente ao leitor, orientando-os na leitura do ponto de
vista tanto estrutural, que diz respeito organizao do texto propriamente dito, quantoconceitual, que diz respeito fundamentao terica que sustenta sua argumentao. Ele
intitula esse segmento de texto de Nota de orientao.
Dito isso, percebemos que o autor, no incio do texto, explica a organizao que
faz de sua obra. Alm disso, ele define o enunciador de suas materialidades verbais da
seguinte forma: ao utilizar a primeira pessoa do singular o pronome eu ele afirma que
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assume o argumento; ao utilizar a primeira do plural o pronome ns ele espera arrastar
o leitor com ele. Tendo isso como pressuposto, vamos ao que ele diz.
Ao adentrarmos a obra propriamente dita, no incio desta nossa anlise, percebemos
que h um rico material discursivo na parte pr-textual que se encontra nas primeiras
pginas do livro: dedicatria e epgrafes. O livro apresenta uma dedicatria, Em memriade Simone Ricoeur, esposa do autor, seguido, na pgina seguinte, de uma frase de
Vladimir Jankelevich, filsofo, que teve aulas com Bergson, e musiclogo francs, filho
de pais mdicos russos, cujo pai foi um dos primeiros tradutores de Freud na Frana,
que diz Aquele que foi j no pode mais no ter sido: doravante, esse fato misterioso,
profundamente obscuro de ter sido o seu vitico para a eternidade. Ressalte-se que
ilustramos a relao com Bergson, tendo em vista a dedicao que esse filsofo dirigiu ao
tema da memria em sua obra.
Interessante observar a relao entre a funo da dedicatria e das epgrafes para
uma obra e dessas em particular com as propostas da prpria obra. A comear, a obra
foi dedicada memria da esposa falecida e se apropria da fala de outrem para dizer que
quem j foi no pode ter a sua existncia questionada. A nova materialidade discursiva que
utiliza para dialogar com a anterior utiliza a palavra vitico, retomando uma concepo da
igreja catlica para quem esse termo liga-se ideia de proviso para o caminho, em que
o caminho no s o da terra, mas o do cu, o da vida eterna. Se, por um lado, aquele que
foi sem questionamento foi mesmo, por outro acabar por desafiar o tempo, pois ficar para
sempre na vida eterna.
Ora, o livro abre-se para o tema da memria - e por via de consequncia para o do
esquecimento - memria que, embora obscura, a condio sine qua non de sua prpria
permanncia e continuidade.
Em contrapartida, estabelecendo um elo com o outro tema do ttulo, Histria, o
autor, ainda como epgrafe, se apropria de uma imagem que se encontra no Mosteiro de
Wiblingen, na cidade de Ulm, Alemanha, cuja descrio :Num lugar escolhido da biblioteca do mosteiro ergue-se a magnfica escultura
barroca. a figura dupla da histria. Na frente, Cronos, o deus alado. um anciocom a fronte cingida; a mo esquerda segura um imenso livro do qual a direita tentaarrancar uma folha. Atrs, e em desaprumo, a prpria histria. O olhar srio e
perscrutador; um p derruba uma cornucpia de onde escorre uma chuva de ouro eprata, sinal de instabilidade; a mo esquerda detm o gesto do deus, enquanto a direitaexibe os instrumentos da histria; o livro, o tinteiro e o estilo. (Ricoeur, 2007, p. 15)
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Essa imagem emblemtica para o que se vai ler nas materialidades discursivas que
compem o texto de Ricoeur. A figura do tempo, tentando eliminar parte do que existiu (a
pgina de um livro), sendo impedido pela figura da histria que, se por um lado instvel,
por outro possui instrumentos no suscetveis destruio: livro, o suporte da informao;
tinteiro, instrumento de registro dessa informao, a tinta; e o estilo, modo personalssimode registrar e narrar os fatos.
De fato, esses itens pr-textuais nos introduzem no universo temtico-conceitual
com que Ricoeur constri a sua narrativa. Ao iniciar o livro propriamente dito, Ricoeur
apresenta um texto que ele intitula de Advertncia. Nesse texto, ele adverte o seu leitor,
dizendo que o que se vai ler uma pesquisa que tem origem em diversas preocupaes:
umas pessoais, outras profissionais, e outras que ele chamaria de pblicas.
Nas primeiras pessoais - ele diz que vai dirigir o seu olhar para a sua longa
vida, na qual teria ficado uma lacuna na problemtica do Tempo e Narrativa e Si mesmo
como um outro, escritos em itlico porque nos faz remontar a duas de suas obras que,
segundo o prprio autor, so obras em que h um enfrentamento direto entre a experincia
temporal e a operao narrativa, deixando impasse sobre a memria e, ainda pior, sobre o
esquecimento, duas dimenses que ele denomina de nveis intermedirios entre tempo e
narrativa. Lanar mo dessa forma de identificar o conceito de memria dimenso
qualific-lo como escala gradativa entre dois nveis: memria, em um deles; esquecimento,
no outro. Assim, do ponto de vista pessoal, foi oportuno dedicar a obra memria da
esposa falecida, de quem no se pode mais nada questionar, at mesmo a prpria existncia,
impedindo-a de adentrar a dimenso do esquecimento.
Permanecer por toda a eternidade dialogar com a divindade grega do tempo,
Cronos. Ao longo de toda a obra, Cronos vai estar ligado figura descrita no Mosteiro de
Ulm: aquele que detm a ocorrncia dos fatos, o livro, mas que quer eliminar alguns deles,
a pgina a ser arrancada. o que se pode compreender quando, no interior do livro, v-se
que Ricoeur est preocupado com de que h lembrana? em uma tentativa de alcanar ajusta memria.
Em relao s segundas profissionais Ricoeur retoma o personagem que se situa
atrs de Cronos na escultura do Mosteiro de Ulm: a Histria. O autor quer dar continuidade
ao debate estabelecido entre os profissionais da rea, sempre confrontados com os vnculos
entre memria e histria. Descrever uma imagem em que a Histria situa-se atrs do tempo
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(Cronos), tentando-o impedir de arrancar alguns fatos do que haveria de ser registrado
(a pgina do livro) ilustrar o embate entre a narrativa do tempo (memria) e o registro
documental (histria).
Por fim, pelas terceiras pblicas ele expressa claramente que quer exercer o seu
dever cvico ao buscar a poltica da justa memria. uma preocupao do autor que, nosatisfeito em se perguntar De que h lembrana?, tambm quer buscar saber De quem a
memria? Quem seriam aqueles que, por trs da Histria, a estariam produzindo?
Mais uma vez, essas perguntas tm relao estreita com a escultura de Ulm, em que
Cronos, ao mesmo tempo que detm o livro dos fatos, quer arrancar uma pgina do livro;
alm disso, supervisionado pela histria, que, por um lado, desestabiliza a cornucpia,
por outro, evidencia os instrumentos do registro. Um dos instrumentos, estilo, serve
para nos dizer que os registros esto submetidos ao crivo estilstico do ser humano. Em
ltima instncia um ser humano que vai registrar os fatos, da maneira que lhe aprouver.
Sabendo-se que o autor tem na psicanlise uma das fontes tericas de sustentao de seus
argumentos, de se prever que a maneira de registrar est impregnada da subjetividade
(estilo) de quem registra.
As snteses discursivas do corpus analisado acabaram por compor um novo mapa,
ligado quele apresentado (fig. 1) cujo elo se encontra no foco direcionado ao conceito
de justa memria que embala as discusses sobre memria e esquecimento na obra
de Ricoeur. Vale ressaltar que o mapa atende aos preceitos da lgica classificatria,
principalmente no que se refere s hierarquias e instncias conceituais, mas em nenhum
momento pretendeu atender regra da completude, quer dizer, abarcar todos os sentidos
discursivos possveis no corpus analisado.
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Figura 4 Mapa discusivo-conceitual. Fonte: as autoras
Verifica-se na disposio dos conceitos que Ricoeur vale-se das discusses
fundantes da filosofia de Plato e Aristteles para dimensionar os tempos da memria e, a
partir destes, analisar fenomenologicamente a memria sob dois ngulos: a memria como
objeto na ideia da lembrana e a memria como processo, exerccio ou o que podemos
denominar de memorao. A justa memria, seu conceito organizador do discurso,
aparece na rede de sentidos dos usos e abusos da memria e ilustrada pela imagem
daquele que lembra (o deus do Tempo), e daquele que o pode controlar (a Histria) . Quanto
ao esquecimento, conceito que fecha a sua obra como um todo, este se encontra, neste
momento, apenas subentendido por oposio ao objeto lembrana. Ao valer-se de
dilogos principalmente com Henri Bergson e Freud, Ricoeur se resguarda de expor esse
par de oposio, em funo do carter psicolgico que sustenta o discurso dos dois
filsofos, ilustrado pelo estilo que um dos instrumentos de registro da memria.
4 ALGUMAS CONSIDERAES SOBRE OS USOS DAS ANLISES DECONTEDO E DO DISCURSO
O trabalho anterior (Dodebei; Orrico, 2011) do qual depreendemos as categorias,
nos permitiu perceber que h dois caminhos metodolgicos que tm crescido muito
na abordagem desse campo de interface entre informao e memria: anlise de
contedo (AC) e anlise do discurso (AD). Em que pese as especificidades de cada
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arcabouo metodolgico, e sem querer contemplar uma ampla discusso entre o que os
aproxima ou diferencia, queremos to somente indicar que optamos por experimentar
metodologicamente a AD neste trabalho e apresentar sucintamente a justificativa da opo.
A AC tem como pressuposto norteador buscar uma realidade construda a priori,
ou seja, procura alcanar uma significao profunda ou estvel que seria conferida peloenunciador de determinado enunciado, cabendo ao analista desvelar o que estivesse por
debaixo da enunciao. Desse modo, cabe a ela identificar alguns termos que serviriam
para traduzir o significado do texto inteiro, como utilizado, por exemplo, nas palavras-
chave. Ao contrrio disso, a AD procura articular a linguagem, especificamente o discurso,
com o contexto scio-histrico em que foi produzida, o que significa dizer que a AD leva
em conta as condies de produo das materialidades discursivas em anlise. Dessas
condies de produo faz parte a memria discursiva, isto , o saber discursivo que torna
possvel todo o dizer e que retorna sob a forma de preconstrudo, o j-dito que est na base
do dizvel, sustentando cada tomada de palavras (ORLANDI, 1999, p.31).
Isso posto, podemos dizer que interessa menos AD o que foi dito, e mais como
o foi. Desse modo, no lhe basta identificar um termo que resumiria um significado
complexo e amplo que, do ponto de vista positivista j estaria dado, mas o modo como
determinados conceitos vo sendo formulados por sujeitos scio-historicamente situados,
que acabam por construir redes de sentido.
A partir dessa observao, podemos dizer sucintamente que, enquanto a AC estaria
a servio de revocao, identificando uma grande quantidade de textos que possam estar
relacionados a um determinado termo selecionado, a AD pode estar servio da preciso,
visto que se dedica a compreender como um determinado conjunto de materialidades
discursivas produz sentido. Dessa forma, apresentamos a proposta de anlise da categoria
nuclear memria e de outras que lhe so complementares, a partir do texto de Paul
Ricoeur debatido na disciplina Memria e Instituio, do programa de Ps-Graduao
em Memria Social. Acreditamos, por fim, que a combinao das duas metodologiasaplicadas ao processo de representao do conhecimento pode auxiliar inmeras atividades
de organizao deste conhecimento tanto para o campo da informao como para o
enquadramento do domnio em memria social.
REFERNCIAS
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