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Universidade Federal de Santa Catarina
Centro de Filosofia e Ciências Humanas
Curso de Graduação em Ciências Sociais
GABRIELA RIBEIRO CARDOSO
Atores sociais, recursos e interesses: o processo de construção da
1ª Conferência Estadual de Segurança Pública de Santa Catarina
Florianópolis
2010
2
GABRIELA RIBEIRO CARDOSO
Atores sociais, recursos e interesses: o processo de construção da 1ª
Conferência Estadual de Segurança Pública de Santa Catarina
TCC apresentado ao curso de graduação em
Ciências Sociais da Universidade Federal de Santa
Catarina, como parte dos requisitos necessários para
o bacharelado. Orientador: Prof. Dr. Julian Borba.
Florianópolis
2010
3
GABRIELA RIBEIRO CARDOSO
Atores sociais, recursos e interesses: o processo de construção da 1ª
Conferência Estadual de Segurança Pública de Santa Catarina
TCC apresentado ao curso de graduação em
Ciências Sociais da Universidade Federal de Santa
Catarina, como parte dos requisitos necessários para
o bacharelado. Aprovado em 28/05/2010, pela banca
composta pelos seguintes membros:
Banca Examinadora:
_____________________________________
Prof. Dr. Julian Borba (orientador)
Departamento de Sociologia e Ciência Política, UFSC
_____________________________________
Prof. Dr. Erni José Seibel
Departamento de Sociologia e Ciência Política, UFSC
_____________________________________
Profa. Lígia Helena Hahn Lüchmann
Departamento de Sociologia e Ciência Política, UFSC
Maio de 2010.
4
Agradecimentos
O TCC me pareceu muitas vezes uma tarefa árdua, distante e sempre incompleta.
Entretanto, não é um trabalho que se realiza só, pois é fruto de uma longa trajetória de
vivência acadêmica na qual conheci e compartilhei momentos de incerteza, felicidade,
descoberta com muitos amigos, professores e familiares. Para que este momento fosse
possível, devo um imenso agradecimento aos meus pais, Antonio e Isa, que mesmo sem
entender inicialmente “o que um cientista social poderia fazer”, apoiaram-me
incondicionalmente. Mais que isso, devo-lhes muito do que sou. Eles sempre serão um
referencial de vida e determinação. À minha irmã Sabrina e ao meu sobrinho Luiz Felipe, que
trouxe muita luz para a família.
Muitas pessoas fizeram parte de minha trajetória. Desde os colegas da minha turma
de graduação de 2005/01, as quais me acompanharam em muitas etapas, as amizades que
encontrei quando participei do Levis, em especial Dani, Rosa, Andresa e Emília, com as quais
iniciei um “ritual de passagem” enquanto pesquisadora e pude sempre partilhar boas histórias.
Relembro aqui os queridos colegas do NIPP, Yasmin, Luci e Rafael, e também do IRIS Carol,
Denise e o nosso amigo Luiz Christiano. As amizades de Tubarão, como a de Ana Paula, que
sempre estiveram ao meu lado.
Foram muitos os professores que contribuíram para a minha formação nas Ciências
Sociais e gostaria de realizar um agradecimento geral para tod@s. De modo especial, ao
Professor Theophilos, pelas diversas oportunidades que me propiciou. Devo também muito ao
Professor Julian, por ter aceitado ser meu orientador. Desde então se mostrou um grande
mestre. Agradeço também ao professor Seibel, as reflexões sempre estimulantes e que
auxiliaram no desenvolvimento deste trabalho; a professora Marisol, pelo grande incentivo na
graduação. A professora Lígia, pelas contribuições neste trabalho. Quero ainda registrar um
agradecimento ao Marcos Farias, pelo intenso aprendizado e amizade que desenvolvi durante
o estágio no Ministério Público Federal.
A todos os delegados, informantes, integrantes do Ministério da Justiça, que de
forma dedicada participaram desta pesquisa, sem os quais o trabalho seria inviável.
Não poderia deixar de lado meu noivo Felipe, a quem muito amo pela combinação de
simplicidade, coragem e inteligência, que sempre acreditou mais em mim que eu mesma e me
apoiou durante todo este trabalho. Por fim, gostaria de dedicar este trabalho ao meu irmão
Filipe que sempre esteve e estará presente em minhas lembranças, pois sonhadores como ele
são “meio imortais”.
5
“O conhecimento é uma escolha tanto de um modo de vida quanto de uma carreira; quer o saiba ou não, o trabalhador intelectual
forma-se a si próprio à medida que trabalha para o aperfeiçoamento de seu ofício”. ( Wright Mills)
6
Resumo
A realização de Conferências Nacionais tem sido mobilizada pelo governo federal de uma forma sem precedentes. O presente trabalho dedica-se a 1ª Conferência Nacional de Segurança Pública (1ª Conseg), realizada em agosto de 2009, tendo como objetivo identificar de que forma os atores sociais envolvidos na 1ª Conferência Estadual de Segurança Pública de Santa Catarina mobilizaram recursos individuais e coletivos para a aprovação de diretrizes. A articulação dos recursos é compreendida a partir da análise do processo de construção da 1ª Conferência Estadual de Segurança Pública – 1ª Conseg. Por sua vez, compreendo este processo de construção em diversas etapas: desde a própria concepção do projeto, o desenho institucional juntamente com as observações da etapa municipal eletiva de Florianópolis, as conferências livres e as observações da etapa estadual de Santa Catarina. Tratar desta engenharia institucional se revela importante para poder adentrar no objetivo do trabalho.
Palavras-chave:
Conferência; Recursos; Segurança Pública.
7
Listas de siglas
Acadepol.......................................................................................Academia de Polícia Civil
ACORS............................................... Associação dos Oficiais Militares de Santa Catarina
APRASC.............................................................. Associação dos Praças de Santa Catarina
CDH ........................................................................................ Centro de Direitos Humanos
COE ................................................................................. Comissão Organizadora Estadual
CON ................................................................................ Comissão Organizadora Nacional
Conseg ........................................................... Conselho Comunitário de Segurança Pública
CRP ...................................................................................Conselho Regional de Psicologia
CUFA .......................................................................................... Central Única das Favelas
DEPEN ..................................................................... Departamento Penitenciário Nacional
GM ........................................................................................................... Guarda Municipal
GOB ................................................................................................... Grande Oriente Brasil
PET ......................................................................................... Programa de Ensino Tutorial
PM ................................................................................................................. Polícia Militar
PRONASCI ............................... Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania
SINTESPE .............................................. Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público
SINTRASP ......................................... Sindicato dos Trabalhadores em Segurança Pública
SSP .................................................................................... Secretaria de Segurança Pública
UNESC .............................................................. Universidade do Extremo Sul Catarinense
8
Lista de tabelas
Tabela 1: Relação de faixas de habitantes e quantidades de representantes eleitos/as nas etapas
estaduais e municipais...............................................................................................................42
Tabela 2: Etapas realizadas no país por número de participantes.............................................69
Tabela 3: Notícias sobre a Manifestação da Aprasc publicadas no Diário
Catarinense............................................................................................................................... 85
Tabela 4: Segmento que representou na Conferência Estadual............................................... 89
Tabela 5: Associações que os delegados de Santa Catarina participam................................ 100
9
Lista de ilustrações Quadro 1: As etapas do processo preparatório na linha do tempo............................................41
Quadro 2: Delimitação da Conferência.....................................................................................44
Quadro 3: Três dimensões do Projeto Metodológico............................................................... 46
Quadro 4: Composição da Mesa de Abertura.......................................................................... 54
Quadro 5: Mapeamento das Conferências Livres em Santa Catarina.......................................73
Quadro 6: Associações citadas pelos delegados de Santa Catarina....................................... 101
Imagem 1: Auditório da Acadepol........................................................................................... 53
Imagem 2: Mesa de abertura da Conferência Municipal de Florianópolis.............................. 54
Imagem 3: Momento interativo de votação............................................................................. 64
Imagem 4: Momento de apuração dos resultados.................................................................... 66
Imagem 5: Conferência Livre no presídio feminino................................................................ 72
Imagem 6: Conferência Livre no presídio masculino.............................................................. 72
Imagem 7: Conferência Livre da Cufa..................................................................................... 75
Imagem 8: Composição da mesa de abertura........................................................................... 77
Imagem 9: Participantes da Conferência................................................................................. 78
Imagem 10: Integrantes da APRASC...................................................................................... 78
Imagem 11: Guardas Municipais............................................................................................. 79
Imagem 12: Apresentação de Hip-Hop.................................................................................... 81
Imagem 13: Praça votando na diretriz da desmilitarização......................................................83
10
Lista de gráficos Gráfico 1: Etapas realizadas no país........................................................................................ 69
Gráfico 2: Envio do documento final da conferência.............................................................. 87
Gráfico 3: Delegados da etapa nacional por segmento............................................................ 90
Gráfico 4: Participantes da Conferência Estadual por sexo..................................................... 91
Gráfico 5: Participantes da Conferência Estadual por sexo e segmento.................................. 92
Gráfico 6: Delegados de Santa Catarina por sexo................................................................... 92
Gráfico 7: Delegados da etapa nacional por sexo ................................................................... 93
Gráfico 8: Delegados da etapa nacional por sexo e segmento................................................. 94
Gráfico 9: Delegados de Santa Catarina por escolaridade...................................................... 94
Gráfico 10: Delegados da etapa nacional por escolaridade.................................................... 95
Gráfico 11: Delegados da etapa nacional por escolaridade e segmento................................. 96
Gráfico 12: Delegados de Santa Catarina por renda mensal................................................... 97
Gráfico 13: Delegados da etapa nacional por idade................................................................ 99
Gráfico 14: Interesse dos delegados em algum partido político............................................ 102
Gráfico 15: Preferência ou simpatia por algum partido político............................................ 103
Gráfico 16: Delegados de Santa Catarina por filiação partidária........................................... 103
Gráfico 17: Instituições que a entidade já recorreu................................................................ 104
Gráfico 18: Entidades que a associação apóia...................................................................... 105
Gráfico 19: Veículo de comunicação que a entidade possui................................................. 106
Gráfico 20: Opinião dos delegados sobre a participação paritária........................................ 107
Gráfico 21: Participação dos delegados de Santa Catarina em conferências........................ 107
Gráfico 22: Participação dos delegados de Santa Catarina em diferentes
conferências........................................................................................................................... 108
Gráfico 23: Delegados de Santa Catarina por eixo temático................................................. 109
Gráfico 24: Delegados de Santa Catarina por eixo temático................................................. 110
Gráfico 25: Participantes da Conferência Estadual por eixo temático.................................. 112
Gráfico 26: Participantes da Conferência Estadual por eixo temático e segmento............... 111
Gráfico 27: Temas mais polêmicos que ocorreram na Conferência...................................... 113
Gráfico 28: A Conferência conseguiu abarcar as prioriedades para a política nacional de
Segurança Pública? ............................................................................................................... 114
Gráfico 29: Como o (a) Sr. (a) avalia seu poder de influenciar as decisões? ....................... 114
11
Sumário
Introdução ............................................................................................................................... 12 Capítulo 1: Democracia e participação, segurança pública e conferências ....................... 13
1.1 No horizonte da teoria democrática ................................................................................ 13 1.2 Conselhos gestores na perspectiva dos recursos e poder ................................................ 16 1.3 Democracia e Segurança Pública .................................................................................... 22 1.4 Os desafios e dilemas da participação nas Conferências Nacionais ............................... 28
Capítulo 2: Entre o feito e o pretendido: balanço da metodologia utilizada ..................... 33 Capítulo 3: O processo de construção da 1ª Conseg ............................................................ 40
3.1 O processo de construção e o projeto da 1ª Conseg ........................................................ 40 3.2 Parcerias da 1ª Conseg: PNUD e Via Pública ................................................................ 45 3.3 Projeto Metodológico ...................................................................................................... 46 3.4 A proposta do texto base ................................................................................................ 49 3.5 Observações da Conferência Municipal de Florianópolis .............................................. 52 3.6 Conferências Livres: o momento preparatório para a Conferência Estadual .................. 69
Capítulo 4: Atores sociais, recursos e interesses na 1ª Conferência Estadual de Segurança Pública ................................................................................................................... 77
4.1 Observações da Conferência Estadual ............................................................................ 77 4.2 A análise do relatório da Conferência Estadual .............................................................. 87 4.3 Análise dos dados ............................................................................................................ 89 4.3.1 Recursos Individuais dos participantes da Conferência Estadual e dos delegados . 91 4.3.2 Recursos individuais subjetivos ............................................................................. 100 4.3.3 Recursos Coletivos ................................................................................................ 105 4.3.4 Percepções dos delegados sobre a Conferência ..................................................... 107 4.3.5 Resultados da Conferência .................................................................................... 112
Considerações Finais ............................................................................................................ 119 Referências Bibliográficas .................................................................................................... 121 Anexos .................................................................................................................................... 124 Questionário ........................................................................................................................ 125
Apêndice ................................................................................................................................ 131
12
Introdução
A realização de Conferências Nacionais tem sido mobilizada pelo governo federal de
uma forma sem precedentes. Neste sentido, alguns analistas apontam que as Conferências
tornaram-se um “ícone” do projeto democrático-participativo desenvolvido pelo governo
Lula. Embora a ideia de Conferência em si não seja algo novo, tendo em vista que a 1ª
Conferência de Saúde foi realizada em 19411, a diversidade de áreas, discussões e, sobretudo,
o aumento quantitativo da participação são aspectos jamais vistos. Somente de 2003 a março
de 2010 foram realizadas 64 Conferências Nacionais, o que equivale a 61% de todas as 105 já
realizadas no Brasil. Estas Conferências contaram com a participação de mais de 5 milhões de
pessoas. Neste sentido, até mesmo uma Secretaria Nacional de Articulação Social foi criada
com o intuito de “promover e acompanhar a implementação de instrumentos de consulta e
participação popular de interesse do Poder Executivo”2.
Os dados citados anteriormente possibilitam situar a dimensão destes processos e
este trabalho se propõe analisar de que forma os atores sociais mobilizam recursos para a
aprovação de diretrizes na 1ª Conferência Estadual de Segurança Pública. Entretanto, esta
articulação é compreendida a partir da análise do processo de construção da 1ª Conferência
Nacional de Segurança Pública – 1ª Conseg. Compreendo este processo de construção desde a
sua própria concepção, bem como o desenho institucional, juntamente com as observações da
etapa municipal eletiva de Florianópolis, as conferências livres e a etapa estadual de Santa
Catarina. Tratar desta engenharia institucional revela-se importante para poder adentrar no
objetivo do trabalho.
O texto do Relatório Final da 1ª Conseg deixa claro que o duplo objetivo da
Conferência consiste em definir princípios e diretrizes para a política nacional de segurança
pública e consolidar instrumentos de participação nesta área. A proposta da Conferência
assume o compromisso de tentar sanar a dívida histórica com o processo de democratização,
ao criar oportunidade para promover um debate sobre o modelo de segurança pública para o
Brasil. Ou seja, a proposta da Conferência apropria-se do debate que é realizado na literatura
sobre segurança pública, assumindo-o enquanto uma prerrogativa a ser modificada.
1Fonte:http://www.cnrh.gov.br/preconferencia/apres/Participacao_Social_17_mar_2010_WEBER_AVELAR.pdf Acesso em 09/05/2010. 2 http://www.presidencia.gov.br/estrutura_presidencia/sec_geral/art_social/ Acesso em 09/05/2010.
13
Capítulo 1: Democracia e participação, segurança pública e conferências
O capítulo 1 tem como objetivo tratar de três eixos principais do trabalho que são:
democracia e participação, recursos, segurança pública e conferências. A discussão acerca da
teoria democrática é realizada com o intuito de situar em quais correntes teóricas e sobre quais
pressupostos a proposta da própria Conferência está relacionada. Após uma sintética
introdução sobre o horizonte da teoria democrática, discuto os conselhos gestores de políticas
públicas na perspectiva dos recursos e poder. Na sequência, abordo a relação entre
democracia e segurança pública, com ênfase nas concepções sobre segurança pública que
permeiam o debate e como se desenvolveram as políticas públicas no governo Fernando
Henrique Cardoso e Lula. Por fim, apresento um panorama da discussão sobre as
Conferências, apontando os desafios e dilemas da participação reservados à área da segurança
pública.
1.1 No horizonte da teoria democrática
Alguns autores realizaram esforços no sentido de organizar o debate sobre teoria
democrática. É a partir destas abordagens que introduzo a discussão. Nesta perspectiva,
destaco as contribuições de Nobre (2004) e a revisão de Miguel (2005) publicada na BIB.
Nobre (2004) destaca que a democracia é quase uma unanimidade, porém, o termo é ao
mesmo tempo fluido e escorregadio. De modo semelhante, Miguel expõe que “a democracia
tornou-se o horizonte normativo da prática e do discurso político”, entretanto, este consenso
esconde divergências entre o sentido abstrato e normativo (governo do povo) e as
manifestações empíricas (regimes eleitorais) (MIGUEL, 2005:2).
Desta forma, é importante indagar acerca dos “sentidos” da democracia. Para tanto,
Nobre e Miguel3 desenvolvem classificações um pouco diferenciadas acerca da teoria
democrática. Nobre situa a disputa atual em duas arenas que estão imbricadas e necessitam ser
compreendidas: a primeira em torno de macroestruturas que definiram o quadro institucional
mais abrangente de um regime democrático (eleições, separação dos poderes...), e a segunda
3 Miguel, por sua vez, considera que não existe uma “taxonomia correta”, em face da dificuldade de desenvolver-se a esquema abrangente e sem dificuldades acerca da teoria democrática. Por isso, trabalha com cinco diferentes correntes que possuem maior repercussão no debate acadêmico que são: a democracia liberal-pluralista; a democracia deliberativa; o republicanismo cívico; a democracia participativa e o multiculturalismo.
14
sobre a criação de novos espaços de participação e deliberação que desafiam as
macroestruturas de um regime democrático.
Centrarei a discussão a seguir a partir de três modelos de democracia (liberal-
pluralista, democracia participativa e democracia deliberativa) que considero relevantes para
desenvolver na sequência o debate sobre recursos e para destacar quais são as correntes
teóricas que o projeto das Conferências está vinculado. Nobre apresenta cinco modelos
teóricos da democracia que se constituem pontos de referência ao debate contemporâneo, os
quais apresentarei de forma sucinta. O primeiro modelo é o elitista e o autor central é
Schumpeter que considera a democracia como “luta entre líderes políticos rivais, pertencentes
a partidos e disputando o direito de governar”. (NOBRE, 2004:31). Nesta perspectiva, a
democracia se refere a um arranjo institucional que reproduz as condições sociais e
econômicas. Já o segundo modelo refere-se ao modelo pluralista, desenvolvido por Robert
Dahl. Neste modelo, o cerne é desvendar a lógica de distribuição de poder na sociedade
democrática ocidental e a democracia é vista como garantia de competição entre grupos de
interesse. O terceiro modelo é o legal, defendido por Hayek e Nozik que desenvolve uma
defesa das liberdades negativas4 e o Estado mínimo.
De forma mais abrangente, Miguel trata dos modelos elitista, pluralista e legal de
forma unificada, na abordagem da democracia liberal-pluralista. Aqui o ponto de partida
para a atual concepção liberal de democracia é a abordagem de Schumpeter, na qual o
governo é formado pela luta competitiva dos votos do povo. De modo conclusivo, caracteriza
esta visão como “profundamente desencantada quanto às possibilidades de que a democracia
cumprisse quaisquer de suas promessas fundamentais – governo do povo, igualdade política,
participação dos cidadãos na tomada de decisões” (MIGUEL, 2005:10). Na linha de
Schumpeter, Anthony Downs destaca que o objetivo do governante é realizar os interesses
dos outros.
Outro autor que influenciou de forma determinante a concepção liberal corrente de
democracia foi Robert Dahl, ao negar a existência de uma classe dominante. Ao invés de uma
minoria governante, existem muitas minorias que disputam entre si e que devem ser
consideradas pelos governantes. Denomina este modelo de “poliarquia” – a existência de
múltiplos centros de poder na sociedade. As poliarquias seriam o resultado dos processos de
democratização, que possuem as dimensões de inclusividade – a ampliação do número de
pessoas no processo político; e de liberalização – o reconhecimento do direito de contestação.
4 Para este debate acerca da liberdade negativa e da liberdade positiva, uma referência importante é o artigo de Isaiah Berlin “Dois conceitos sobre liberdade”.
15
Miguel destaca que esta abordagem tem sido criticada pela ausência da dimensão social ao
isolar a esfera política em relação ao restante do mundo social e reduzir a política a um
processo de escolha.
Após o debate liberal-pluralista, Miguel e Nobre destacam o debate sobre
democracia participativa. A teoria da democracia participativa floresceu nas décadas de 1960
e 1970. Não propõem o retorno da democracia direta, por isso, desenvolvem um arranjo
institucional que possui como horizonte o aprimoramento da representação. Aqui a
democracia é percebida e valorizada como um “processo educativo”; por isso as influências
desta residem em Rousseau e John Stuart Mill como seus precursores intelectuais. Estes
também “se insurgem contra a rígida separação entre Estado e sociedade civil e advogam a
implantação de mecanismos democráticos nos espaços da vida cotidiana”. Os autores mais
representativos desta corrente são: Carole Pateman e C.B. Macpheron. Convém ressaltar que
aqui se rompe com a ideia, presente na teoria democrática liberal, de que agir politicamente
restringe-se às elites (Ibidem., p.25).
Por último destaco as contribuições da democracia deliberativa, que se tornou a
principal alternativa teórica à democracia liberal-pluralista, norteada pela filosofia de
Habermas. Os democratas deliberativos incorporam parte do ideal participacionista, mas dão
ênfase aos mecanismos discursivos da prática política. O processo de deliberação5 ressalta a
participação como regulada por normas de igualdade e simetria, na qual todos têm as mesmas
chances de iniciar atos de fala, questionar, interrogar e abrir o debate. Além disso, a igualdade
de participação e a autonomia são resgatadas como valores fundamentais (MIGUEL, 2005).
Na concepção de democracia deliberativa de Habermas, os conceitos de sociedade civil e
esfera pública são centrais (LUCHMANN, 2002).
Luchmann (2002) não coloca em modelos distintos os conceitos de democracia
participativa e democracia deliberativa. Assim, considera que a democracia deliberativa ou
participativa articula participação social em condições de igualdade e liberdade, processos de
decisão advindos de uma discussão coletiva e pública, condições de pluralismo e busca a
promoção da justiça social (LUCHMANN, 2002:44). Este modelo difere-se da democracia
representativa, pois “propõe que as decisões sejam fruto de discussões coletivas e públicas”,
5 Miguel apresenta duras críticas à teoria deliberativa de Habermas, especialmente por considerar que a comunicação face a face proposta pelo autor colocaria uma série de problemas, pois trata que este modelo seria impróprio para o entendimento da política. Considera que a participação de representantes sociais em fóruns deliberativos pode levar a desmobilização e ser uma forma de cooptação. Neste sentido, aponta o debate entre Rawls e Habermas.
16
enquanto a representativa deposita no sufrágio universal a autoridade para o exercício do
poder (Ibidem, p.15-16).
Para sintetizar as contribuições teóricas mencionadas anteriormente, gostaria de
enfatizar a relação destas com a participação. Assim, trago as contribuições de Ugarte (2004)
no artigo “Que participação para qual democracia?”, no qual discute que além da obviedade
de relacionar a participação enquanto fundamento da democracia, é importante problematizar
em melhores termos o conceito de participação. Por isso, propõe que a importância atribuída à
participação está fortemente determinada pela teoria da democracia que se encontra como
referência.
A democracia legitima-se “mediante a participação autônoma dos destinatários das
normas em sua elaboração” (UGARTE, 2004:95). Por isso, considera a democracia e a
participação estão intimamente relacionadas. Na sua análise, apresenta uma perspectiva de
noção mínima de democracia oriunda de três diferentes teorias ou concepções de democracia:
A teoria do public choice de Schumpeter; as teorias deliberativas e teorias
constitucional/substantivas. Trarei as contribuições de Ugarte sobre as duas primeiras teorias,
tendo em vista que são mais relevantes para este trabalho.
Logo, a controvérsia entre estas teorias diz respeito à participação cidadã. A teoria
econômica e elitista de Schumpeter observa o processo democrático com realismo, considera
os indivíduos egoístas e incapazes de participar da tomada de decisões. “O que conta é a
eleição do líder (...) e não a participação cidadã na tomada de decisões” (Ibidem, p. 97). Esta
teoria influencia na “escola do public choice”, que predomina na Ciência política norte-
americana. As teorias da democracia deliberativa opõem a do “public choice” e o elemento
central da democracia é a participação dos cidadãos na deliberação. Consequentemente, “a
participação é a fonte de legitimidade e justificação moral da democracia e, por isso mesmo,
representa o valor político de maior grau. (...) A idéia de fundo é simples, maior participação,
melhor democracia” (Ibidem, p. 99). É esta última concepção que embasa a participação
social nas Conferências Nacionais.
1.2 Conselhos gestores na perspectiva dos recursos e poder
Cortês (2007) destaca que até o início dos anos 90 a literatura internacional apontava
a quase impossibilidade de criar canais mais participativos nos países em desenvolvimento
pelas características de suas instituições políticas. Contrariando esta perspectiva, vários
autores chamam a atenção para mecanismos participativos em diversas áreas e níveis, como
17
conselhos da área de saúde, trabalho, assistência social e a experiência do orçamento
participativo.
Ao discutir a relação entre as oportunidades políticas6 e a participação, Luchmann e
Borba (2007) destacam que o Brasil teve dois grandes condicionantes histórico-institucionais
para a instituição de novos canais de participação: a Constituição de 1988 e a ascensão
política de partidos de esquerda como o PT. Trata-se de um novo tipo de participação que
está relacionado a um “novo arcabouço institucional-legal do Estado”, a exemplo dos
conselhos gestores, ou está mais diretamente ligada ao “projeto ou vontade política dos
governantes”, a exemplo do Orçamento Participativo (LUCHMANN & BORBA, 2007:18).
No processo de implementação destas políticas, o município tem participado crescentemente
de decisões sobre políticas públicas e os conselhos municipais passam a se envolver mais
(CORTÊS, 2007).
Os Conselhos tornaram-se elementos-chave no contexto de descentralização e os
governos municipais ampliaram o seu papel político. Orientados por esta discussão, Fuks e
Perissinotto (2006) tratam da participação nos conselhos gestores de políticas públicas de
Curitiba e analisam a capacidade dos atores de influenciar o processo decisório. Tal aspecto é
relevante por se tratar de instituições que servem para ampliar a participação popular, assim,
esta perspectiva preocupa-se com os efeitos produzidos pela participação: “a ampliação dessa
participação só produzirá o efeito que dela se espera caso os novos participantes sejam
capazes de exercer o poder em seu interior, seja interferindo no processo decisório, seja
moldando a agenda pública” (FUKS & PERISSINOTTO, 2006:69).
Na sua análise, Fuks e Perissinotto destacam que uma das questões centrais dos
fenômenos políticos é a questão do poder e quando se discute sobre uma política pública, o
objetivo é saber “quem tem o poder”. Para responder esta questão, os autores apontam duas
perspectivas teóricas que compreendem o poder como “a capacidade de influenciar o processo
decisório” que são descritas como duas “orientações metodológicas distintas”: o método
posicional e o método decisional (Ibidem, p. 67).
Na visão do método posicional, destacam-se as contribuições de Wright Mills em “A
elite do poder”, na qual afirma que o poder de tomar decisões está nas “altas rodas”, ou seja,
nas mãos dos indivíduos que “ocupam as posições institucionais estratégicas numa
comunidade” (Ibidem, p. 68). Em outra perspectiva, os autores do método decisional
6 Segundo Rennó, “estruturas de oportunidades políticas são fatores que afetam a participação e a capacidade de mobilização dos setores sociais”. (LUCHMANN & BORBA, 2007:17)
18
identificam uma inadequação em Mill entre a definição conceitual do poder e o seu método, o
que tornaria difícil a operacionalização do conceito de poder. Nesta abordagem, Dahl enfatiza
a importância dos processos decisórios concretos, nos quais os indivíduos ou grupos sociais
são capazes de exercer o poder e fazer prevalecer as suas preferências sobre as dos demais.
Convém citar que Marques (2003) ao revisar a literatura das ciências sociais sobre o
poder na cidade, considera o método posicional e o método decisional enquanto correntes
teóricas que se dedicaram desta questão do poder. Assim, o que Fuks e Perissinotto
denominam de “método posicional” é considerado por Marques como a concepção teoria da
“teoria das elites”. Para os adeptos desta teoria, as políticas públicas seguiriam os interesses
da elite e os principais cargos seriam ocupados por ela. Logo, “as ações do Estado, assim
como as suas estruturas, reforçariam o processo, sendo parcialmente responsáveis pela
reprodução do poder da elite” (MARQUES, 2003:28).
No que se refere ao “método posicional” de Fuks e Perissinotto, é tratado por
Marques como a vertente pluralista. Neste debate, Dahl aponta como principal problema da
teoria das elites o fato de reservar pouco espaço para os políticos. Assim, os pluralistas
diferenciam-se da teoria das elites, pois para eles não haveria um único grupo na sociedade
capaz de controlar as várias questões da política simultaneamente. Nesta perspectiva, a
sociedade seria composta por uma “pluralidade de grupos, cada qual com seus instrumentos
de poder e seus interesses específicos e temáticos. Cada grupo se interessaria por
determinadas questões e mobilizaria seus recursos para agir em uma esfera determinada”
(Ibidem, p. 31). A condução das políticas públicas seria fruto do resultado das lutas políticas
entre os grupos.
Para cada uma destas duas correntes teóricas, Marques tece críticas contundentes.
Como crítica central que permeia o debate, aponta o fato de o Estado ser considerado como
um “espaço vazio” a ser preenchido pelos membros das elites ou pelos grupos de interesse.
Ao desenvolver estas críticas, situa-se dentro da abordagem relacional do Estado e propõe-se
seguir os estudos neo-institucionalistas ao afirmar que “as agências estatais devem ser
estudadas de maneira plena, não determinando a priori a sua subordinação a qualquer agente
ou processo presente na sociedade” (Ibidem, p. 51).
Apesar das críticas, Marques propõe-se a fazer sínteses analíticas a partir das três
teorias (teoria das elites, pluralismo e marxismo), desde que realizadas de forma cuidadosa.
Entretanto, convém situar que o autor destaca que a integração dessas tradições é impossível
em nível teórico, e que estas são mutuamente excludentes em decorrência das origens do
19
poder político e pelas unidades básicas da ação social. Ou seja, a análise de Marques7 objetiva
realizar uma síntese entre as abordagens centradas na sociedade (liberal-pluralismo, elitismo e
marxismo) e as abordagens centradas no Estado (institucionalismo) em uma visão quase que
complementar.
Cientes das potencialidades das duas abordagens, Fuks e Perissinotto (2006) utilizam
como referencial o método posicional e o método decisional de modo articulado. Neste
sentido, diferem-se de Marques, pois não levantam a possibilidade de incongruências entre as
abordagens teóricas. Consequentemente, estabelecem que uma conjugação destes
procedimentos possibilitaria a relação entre a posse de recursos e a capacidade de influenciar
no processo decisório. Assim, os autores discutem uma relação de complementaridade entre
as duas posturas metodológicas sobre o poder e, no decorrer das suas análises, destacam
elementos da vertente institucional.
É interessante destacar que a compreensão dos autores acerca do conceito “recursos”
abrange atributos das posições sociais e institucionais. Assim sendo, a análise dos recursos
permite explicar o predomínio dos gestores no processo decisório, bem como analisar os
constrangimentos estruturais que definem a participação. Logo, existem dois tipos de
recursos: os recursos individuais que possuem uma dimensão objetiva (perfil
socioeconômico) e uma dimensão subjetiva que abrange aspectos motivacionais da
participação como interesse por política, filiação partidária e associativismo. Já os recursos
coletivos referem-se aos recursos organizacionais, políticos, bem como o apoio financeiro e
material. Sustentam o argumento de que uma explicação da influência política pautada na
posse de recursos convencionais é limitada. Justamente por isso, incluem na análise os
recursos considerados “não-convencionais” que possuem a forma individual ou coletiva. Estes
recursos não-convencionais estão associados às formas de engajamento político, a rede de
apoio político e aos padrões de ação política.
Para estudar a influência política em uma determinada instituição, Fuks e
Perissinotto enfatizam a necessidade de levar em consideração o contexto no qual ela se
insere, ou seja, o “seu peso no sistema mais amplo de arenas públicas”, bem como a
percepção dos diversos atores envolvidos a respeito desta instituição (FUKS &
PERISSINOTTO, 2006:76). Assim, apontam a importância de considerar além do contexto
institucional, o contexto histórico da arena, pois:
Sem levarmos em consideração o contexto histórico da arena, não estaremos em condição de avaliar o peso da participação de cada ator envolvido, assim como o
7 Conforme exposição do professor Julian Borba em 28/04, durante a disciplina “Estado e Políticas Públicas”.
20
padrão de interação entre os grupos. O legado constituído pelas lutas e alianças. (A história prévia da área em questão, a forma pela qual o conselho foi instituído por exemplo, como fruto de uma longa mobilização de forças sociais ou a partir de iniciativa do Estado), tudo isso define o “perfil” do conselho, condicionando, de alguma forma, a influência dos grupos nessa arena. (Idem)
Além das considerações ao contexto institucional e ao contexto histórico, os autores
ressaltam a relevância de diversas variáveis locais, como associativismo, orientação
ideológica do governo local, força dos partidos, cultura política. Tais fatores estariam
relacionados com o padrão de interação no interior deste tipo de instituição. Convém
mencionar ainda que existem outros autores que relacionam estes fatores em análises sobre o
orçamento participativo e os conselhos gestores.
Ao tratar das possibilidades e limites do Orçamento Participativo de Porto Alegre
enquanto experiência de democracia deliberativa, Luchmann (2002) levantou fatores
semelhantes como determinantes para o sucesso do modelo participativo que são: vontade,
projeto e comprometimento político do governo; tradição de organização e de lutas sociais,
acúmulo de experiência participativa e associativa e desenho institucional.
Mais recentemente, Luchmann (2008) parte do pressuposto de que os estudos sobre
as experiências participativas destacam que a “idéia de participação da sociedade civil não
garante, por si própria, a reversão de uma lógica de poder em direção ao aprofundamento da
democracia”, o que demanda que se qualifique a participação e os fatores que a impedem
(LUCHMANN, 2008:45). Assim, propõe-se a analisar de modo específico, os impactos do
desenho institucional na dinâmica dos conselhos. Segundo Kiser e Ostrom apud Luchmann
(2008, p. 49), o desenho institucional caracteriza-se por um “conjunto de regras que são
utilizadas por indivíduos para determinar quem e o que está incluído em situações de decisão,
quais ações podem ser tomadas, como ações individuais são transformadas em coletivas”.
No que tange a análise dos conselhos gestores, Cortês (2007) discute que a
constância da participação depende da capacidade de organização dos grupos sociais e a
participação favorável das autoridades municipais pode ser um fator determinante no êxito de
processos participativos ao viabilizar ou obstaculizar o acesso dos participantes e
proporcionar infra-estrutura. Assim sendo, expõe os seguintes fatores como influentes sobre o
processo participativo em conselhos municipais: estrutura institucional da área de política
pública em que se localizam; organização do movimento popular e sindical e dos grupos de
interesses de usuários no município; posições das autoridades municipais em relação à
21
participação; natureza da policy network setorial que pode comportar a existência de policy
community8 na qual se aliam profissionais e lideranças populares.
Na sequência, Cortês conclui que a capacidade organizativa dos grupos sociais varia
de acordo com a região do país e esta pode assegurar que o envolvimento de seus
representantes seja legítimo, autônomo e continuado. Desta forma, os conselhos “têm seu
funcionamento limitado e condicionado pela realidade concreta das instituições e da cultura
política dos municípios brasileiros” (CORTÊS, 2007:132). Tal perspectiva é interessante para
observar distinções nas Conferências Municipais realizadas em Santa Catarina, ou em um
plano mais macro, entre os estados brasileiros9.
Por fim, Fuks e Perissinotto desenvolvem uma avaliação crítica das abordagens
utilizadas e consideram que “a abordagem decisional revelou-se limitada para explicar a
influência política no interior dos conselhos estudados”, tendo em vista que a conduta dos
atores no processo decisório e os resultados deste estão relacionados a fatores exteriores. No
que se refere à abordagem posicional e a importância dos recursos, analisam que as
conclusões observadas indicaram que:
Recursos são condições necessárias, mas não suficientes para que haja participação e o exercício efetivo da influência política, já que os atores com menos recursos tinham uma atuação mais intensa e eficaz dentro dos conselhos do que outros que possuíam uma quantidade maior de recursos de diversas naturezas (FUKS & PERISSINOTTO, 2006:78).
É interessante identificar que os próprios autores teceram críticas com relação às
abordagens metodológicas utilizadas. Assim, propuseram-se a superar as limitações de
abordagens que consideram apenas o processo decisório ou os recursos possuídos pelos atores
políticos. Nesta visão, resumir a influência política nos termos dos recursos ou na influência
direta no processo decisório seria “reduzir a explicação de tal fenômeno a um formalismo
incapaz de dar conta das circunstâncias reais que as arenas se estruturam e o processo
decisório se desdobra” (Ibidem, p. 78). Mais do que uma relação de exclusão entre as
abordagens sobre o poder, os autores apontam para uma relação de complementaridade que
trate tanto das dimensões estruturais que modelam as preferências dos atores, quanto às
interações concretas entre os atores.
A exposição realizada anteriormente sobre as abordagens posicional e decisional
orienta a análise sobre o processo de construção da 1ª Conferência Estadual de Segurança
8 Estabelecem relações entre especialistas, grupos de interesse e o governo. Assim, vêm substituindo o centro político tradicional e dão relevo a acadêmicos, profissionais, que pelo contato com servidores dos ministérios ou secretarias, influem no processo de tomada de decisões. (Cortês, 2007) 9 Convém relembrar que este trabalho está focado na Conferência Estadual de Santa Catarina.
22
Pública. Entretanto, embora considere importante os recursos individuais e coletivos para
compreender a dinâmica de interação entre gestores, trabalhadores e sociedade civil,
considero necessário relacionar com uma perspectiva institucional. Por conseguinte, destaco
também as contribuições de Luchmann (2008), especialmente no que se refere à relevância do
desenho institucional e de Cortês (2007), que destaca a estrutura institucional da área de
política. É este esforço que orienta a discussão teórica sobre a área da segurança pública.
1.3 Democracia e Segurança Pública
O crescimento da criminalidade e da violência adquiriu relevo na agenda social,
sendo amplamente discutido na área de segurança pública. Além disso, este fenômeno possui
constante visibilidade nos meios de comunicação. Santa Catarina também faz parte deste
contexto e presenciou nos últimos doze anos, entre outros fenômenos, um crescimento sem
precedentes da taxa de homicídios10. Este fato faz com que a sociedade pressione pela
intervenção governamental e que a segurança pública seja uma questão de destaque para
estes.
Kant de Lima, Misse e Miranda (2000) realizam um balanço bibliográfico para a
BIB11 acerca da produção brasileira sobre violência, criminalidade, segurança pública, justiça
criminal e mapeiam a produção teórica entre o período de 1970 a 2000. As quatro áreas
temáticas ocupam uma posição importante nos debates entre os cientistas sociais brasileiros,
especialmente pela complexidade, interesse público e acúmulo de interpretações. É possível
contextualizar que a contribuição sociológica sobre as temáticas inicia-se nos anos 70 e
alcança a institucionalização durante os anos 80.
Ao realizar a revisão teórica sobre a área violência, Zaluar (1999) destaca que para
compreender a discussão acerca da “criminalidade e violência”, é importante levar em conta a
relação entre o campo intelectual e o campo político que marca os debates e as afirmações. Ao
circunscrever os modelos explicativos que orientam os debates, destaca que os textos
produzidos na década de 198012 estão marcados pela preferência da explicação sociológica no
modelo marxista dicotômico, que opõe a classe oprimida ao Estado.
10 A taxa de homicídios em Santa Catarina aumentou de 8,5 em 96 para 12,7 em 2008. (MATTOS MONTEIRO, 2009) 11 Boletim bibliográfico brasileiro. 12 Dentre os demais modelos citados pela autora estão: o modelo da construção da nação que inseria os pobres no campo e na cidade, o modelo de organização da sociedade civil, a tratar sobre a civilidade, (ong’s, movimentos sociais e governos) e o modelo da sociabilidade violenta, que considera a violência como cerne do social.
23
No que tange a área de segurança pública, Kant de Lima, Misse e Miranda
desenvolvem mais reflexões e destacam que até pouco tempo era um tema quase exclusivo da
ótica jurídica, amparado em uma perspectiva normativa e militar. Entretanto, os autores
argumentam a necessidade de considerar a área da violência enquanto um objeto privilegiado
das Ciências Sociais:
No entanto, constitui-se em um objeto privilegiado de estudo para as Ciências Sociais, pois é provavelmente a única esfera de atuação do Estado acerca da qual há algum consenso quanto à legitimidade do monopólio, já que é uma atividade revestida de dinâmicas próprias e orientada na perspectiva da garantia da ordem. (KANT DE LIMA, MISSE, MIRANDA, 2000:55)
No que se refere às políticas da área de segurança pública, os autores apontam as
posições analíticas assumidas dividindo-se entre as políticas públicas de segurança repressivas
e as preventivas. A ideia de repressão permanece com vigor na área de segurança pública, na
medida em que este debate não se “distanciou muito das discussões sobre como ‘exterminar’
a violência, continuando sob a forte pressão das percepções sociais de insegurança e medo,
bem como das taxas, muitas vezes crescentes, de criminalidade urbana” (Ibidem, p. 55). Neste
sentido, tratar a questão da segurança pública, implica em concebê-la enquanto um fenômeno
complexo. Convém mencionar que esta relação entre repressão e prevenção esteve presente
no debate sobre a 1ª Conseg, refletindo-se na própria composição dos eixos temáticos.
O campo da segurança pública apresenta particularidades que merecem ser exploradas,
especialmente no que se refere ao descompasso com o processo de democratização que
culminou no “status político superior” recente por parte do Estado e que ainda precisa ser
reafirmado13 (SOARES, 2007). Neste sentido, as contribuições de Sérgio Adorno (2008),
Luiz Eduardo Soares (2007), Sapori (2007) são relevantes, na medida em que analisam as
políticas públicas na área da segurança adotadas a partir da experiência democrática. Estas
contribuições enfatizam a experiência mais recente brasileira, especialmente dos últimos dez
anos, a qual não foi plenamente contemplada pelas mais extensas revisões da literatura da
área.
Segundo Adorno (2008), os analistas afirmam que no Brasil nunca houve políticas de
segurança pública e de justiça criminal até o término do regime ditatorial. Já Sapori (2007) e
Kant de Lima, Misse e Miranda (2000) apresentam uma postura diferenciada de Adorno ao
13 Tanto é verdade que o princípio mais votado referia-se a segurança pública enquanto política de Estado.
24
destacar que na verdade, ocorreram sim políticas públicas, contudo, estas possuíram apenas
um caráter repressivo, voltadas para o gerenciamento de crises.
Para Kant de Lima, Misse e Miranda (2000, p. 56), a temática das políticas de
segurança pública constituiu-se no regime militar em preocupação nacional pautada no
“aprofundamento do modelo institucional autoritário”. Logo, já no final do período militar, a
percepção sobre a violência institucionaliza-se e o Ministério da Justiça criou um Grupo de
Trabalho para analisar o fenômeno do crime e da violência. A Constituição de 1988 também
foi importante na área da segurança pública, pois expressou “uma reforma na concepção
ideológica e doutrinária da segurança pública”, o que significou o reconhecimento do Estado
democrático (Idem).
Neste sentido, Sapori (2007) é ainda mais enfático e destaca que o cenário da
segurança pública não permaneceu inerte nas últimas duas décadas. Assim, desenvolve uma
noção de políticas públicas ampliada, pois trata também da ausência de decisões, das
omissões. Ou seja, destaca a importância de realizar-se uma trajetória da área:
Não se pode afirmar que nas duas últimas décadas não se implementaram políticas de segurança pública na sociedade brasileira. Conforme argumentado anteriormente, muito da atividade política está voltada para a manutenção do status quo, e não para a implementação de mudanças. A noção de políticas públicas deve englobar não apenas os processos decisórios e os conseqüentes cursos da ação, como também a ausência de decisões e, portanto, de intervenções governamentais. É desse ponto de vista que podemos identificar uma trajetória de política de segurança pública em nossa história recente. (SAPORI, 2007:107)
Após essas observações, Sapori elenca as mudanças que ocorreram no arranjo
institucional da justiça criminal como a criação dos juizados especiais criminais, ouvidorias
de polícias, a proliferação de guardas municipais e o incremento de projetos sociais
executados por organizações não-governamentais14. As duas últimas mudanças citadas são
importantes para a compreensão dos atores sociais envolvidos na 1ª Conferência Estadual de
Santa Catarina, o que tratarei nos próximos capítulos. Enquanto mudança mais expressiva em
curso considera a relação entre as polícias e a sociedade civil e, neste aspecto, realiza uma
defesa da polícia militar. Segundo o autor, está em curso um “processo de modernização”
nessa organização que não ocorre da mesma forma nas polícias civis. De alguma forma,
Sapori dá o “tom” da divergência entre a polícia civil e a política militar, assumindo a
perspectiva da última. Além disso, defende a tese de que as diversas polícias militares
14 Dois exemplos destes trabalhos sociais são o Grupo Cultural Afro Reggae, no Rio de Janeiro e o Instituto Sou da Paz em São Paulo.
25
brasileiras têm mostrado a possibilidade de compatibilizar seu caráter militar com sua
atividade civil, o que é polêmico dentro da literatura da área.
Em uma perspectiva diferenciada de Sapori, destacam-se os trabalhos de Soares e
Adorno que desenvolvem análises específicas das políticas públicas. Soares (2007) propõe-se
a descrever o processo e compreender os principais movimentos que marcaram a experiência
recente de formulação, implementação das políticas de segurança pública e menciona as
dificuldades que o termo avaliação15 suscita nesta área. Esta ressalva é interessante para
sinalizar as especificidades da segurança pública frente a outras.
Por outro lado, Adorno (2008) enfatiza a existência de uma complexa rede de
interesses, de atores e de agências que intervêm na disputa pela definição institucional das
políticas de segurança, tais como: política militar, polícia civil, poder judiciário, polícia
federal; políticos profissionais com ou sem mandatos; governantes nos postos executivos e
nas administrações públicas; formadores de opinião, pesquisadores e estudiosos; lobistas
voltados para a mobilização de interesses corporativos; empresas de segurança privada.
De modo específico sobre a trajetória das políticas públicas, destaco algumas
considerações sobre as ações do governo Fernando Henrique Cardoso e de Lula. Segundo
Soares (2007), a proposta desenvolvida no governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) é
caracterizada como uma “tímida gestação” de um novo momento na medida em que
desenvolveu o primeiro plano de segurança pública da história democrática. Até então o
campo da segurança pública marcava-se por indiferença no âmbito do Estado. Assim,
conferiu “status político superior” à área ao reconhecer a importância e a gravidade da
situação.
Da “tímida gestação”, o primeiro governo Lula foi identificado como a “proposta
audaciosa que a política abortou” (SOARES, 2007). Lula apresentou em 2005 o Plano
Nacional de Segurança Pública. Este foi recebido com respeito até pelos adversários políticos,
pois partiu do pressuposto de que a segurança pública é matéria de Estado e não de governo.
Adorno (2008) destaca que este governo tomou medidas semelhantes às de FHC, mas
investiu na capacidade de atuação, pois além de coordenar a política nacional de segurança
pública, promoveu maior presença da sociedade civil nos conselhos gestores de políticas
públicas.
O segundo governo Lula é caracterizado, por Soares, como tendo retomado
compromissos, mas ao mesmo tempo adiando questões polêmicas. Em 20/08/07, Lula lançou
15 Tendo em vista que políticas inadequadas podem ter bons resultados.
26
o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) e dentre as medidas do
Pronasci estão: valorização dos profissionais de segurança pública; reestruturação do sistema
penitenciário; combate à corrupção policial; o envolvimento da comunidade na prevenção do
crime.
Tanto Soares quanto Adorno reconhecem que, no decorrer da trajetória descrita,
ocorreram mais continuidades do que descontinuidades. Contudo, mesmo reconhecendo que
os avanços são inegáveis, ambos ressaltam que estes não alcançaram inteiramente suas metas
pelo não rompimento das heranças do regime autoritário. Soares (2007) resume suas
contribuições ao afirmar que “a transição democrática não se estendeu à segurança pública,
que corresponde a um testemunho vivo de nosso passado obscurantista e, do ponto de vista
dos interesses da cidadania, ineficiente” (Ibidem, p. 86). Neste sentido, vários pesquisadores
(ADORNO 2008, SALLA 2003, ZALUAR 2007, SOARES, 2007, SAPORI 2007, FREY &
CZAJOWOSKI, 2009) destacam o paradoxo entre a democratização e a área da segurança
pública com nuances diferentes. Este paradoxo, por sua vez, complexifica-se com o
desenvolvimento da 1ª Conseg.
Ao levantar a ideia de “democratização inacabada”, Zaluar (2007) propõe-se a debater
os dois paradoxos que identifica no período da redemocratização. O primeiro paradoxo refere-
se ao questionamento do motivo pelo qual o período pós 1978 foi acompanhado por taxas
crescentes de criminalidade, especialmente entre os jovens. O segundo paradoxo diz respeito
ao questionamento à ideia de uma nação construída pelos ideais de cordialidade e da
conciliação e que mudou essas idéias após a crítica de intelectuais sobre a ausência de
cidadania nelas. Dada a amplitude do debate, centro-me nas reflexões realizadas sobre o
paradoxo referente ao incremento das taxas de criminalidade nos jovens.
Para buscar compreender o porquê da focalização das taxas de homicídios em homens
jovens em todos os países nos anos de 1980 e 1990, Zaluar utiliza três dimensões analíticas. A
primeira refere-se à importância e aos limites das explicações macro-sociais sobre a
criminalidade violenta, como a pobreza e a exclusão social em relação aos mecanismos
transnacionais de crime organizado que aliam tráfico de drogas e arma de fogo,
desenvolvendo uma interação perversa entre pobreza e juventude em muitos países. A
segunda dimensão abrange a inércia institucional que explica as violações persistentes dos
direitos civis e a ineficácia do sistema de justiça que tem raízes históricas profundas. Por
último, destaca os processos micro-sociais dos homens jovens no tráfico de drogas, ou seja, a
concepção de masculinidade e a sua relação com as armas de fogo.
27
A autora argumenta que o crescimento do tráfico de drogas não pode ser explicado
apenas pelas modificações ocorridas no consumo, na pobreza ou como “estratégias de
sobrevivência” aos jovens. A combinação entre pobreza e urbanização acelerada, sem o
desenvolvimento econômico necessário aos migrantes e trabalhadores pobres não são
suficientes para compreender os conflitos armados que matam jovens. Assim, o argumento
central de Zaluar consiste em não apenas articular pobreza e criminalidade, mas em discutir
como “a pobreza e a falta de emprego para os jovens pobres se relacionam com os
mecanismos e fluxos institucionais do sistema de Justiça na sua ineficácia no combate ao
crime organizado. Essa atravessa todas as classes sociais e está conectada aos negócios legais
e aos governos” (ZALUAR, 2007:35).
A abertura do regime militar teve consequências apenas nos direitos políticos e no
sistema eleitoral, mas para a autora não teria recuperado a cultura urbana de tolerância e
negociação. A ditadura teve como efeito destruir a cultura democrática que se manifestava nas
práticas sociais cotidianas de respeito e civilidade com o outro, deveres do cidadão,
negociação. O próprio regime militar teria contribuído para a disseminação do crime
organizado ao empregar tortura, prisões ilegais e censura.
Em uma perspectiva menos centrada nas explicações micro-sociais, Adorno (2003;
2008) preocupa-se com questões referentes ao acesso à justiça e violação de direitos humanos,
centrando-se assim na própria atuação do Estado na área da violência. Mais do que
conseqüência de mudanças na sociedade, destaca o crescimento da violência como decorrente
de problemas não resolvidos há muito tempo. Nesta perspectiva, enfatiza que ao mesmo
tempo em que a Constituição de 1988 consagrou liberdades civis e públicas na ampliação dos
direitos sociais, “a desigualdade de direitos e de acesso à justiça agravou-se à proporção
mesma em que a sociedade se tornou mais complexa e densa” (ADORNO, 2008:10). Além
disso, Adorno, Cardia e Poleto (2003) ressaltam a preocupação com a violação dos direitos
humanos e relacionam as formas institucionais de violência, como linchamentos e abusos da
força policial, enquanto um legado do período autoritário:
No Brasil, nem as graves violações de direitos humanos desapareceram com o retorno à democracia, nem o crime violento foi reduzido. O uso abusivo de força letal pelos agentes de polícia, linchamentos executados por grupos de pessoas - estimulados ou não por agentes policiais - e a ação de grupos de execução sumária (grupos de extermínio, esquadrões da morte) sobreviveram à transição e suas ações continuam a ocupar as páginas da chamada imprensa nacional. (ADORNO, CARDIA, POLETO, 2003:6)
28
Ao frisarem as lacunas existentes no que se refere ao acesso à justiça, concluem que
uma democracia deste tipo pode ser considerada “uma democracia muito estreita” (Ibidem, p.
5). Deste modo, introduzem uma agenda interessante de questões para reflexão: por que a
democracia falha em erradicar as desigualdades econômicas e sociais? Qual papel exerce a
persistência das formas institucionais de violência no contexto da violência?
Como este é um debate amplo na área da violência, ressalto que o mesmo é
desenvolvido de forma sintética, tendo apenas o intuito de apontar as linhas gerais da
discussão. A discussão realizada anteriormente teve como intuito perceber as relações
estabelecidas pela literatura entre o processo de democratização, segurança pública e
violência.
1.4 Os desafios e dilemas da participação nas Conferências Nacionais
Os trabalhos que discutem o papel das conferências são escassos frente ao amplo
debate sobre conselhos gestores e orçamento participativo. A pesquisa realizada por Enid da
Silva (2009), publicada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA é a mais
abrangente, pois analisa a participação social entre 34 das 38 conferências nacionais
realizadas entre 2003 e 2006. Na sua análise, destaca a realização das conferências como um
“ícone” deste período, ressaltando-as como inseridas dentro do projeto “democrático-
participativo” do Governo Lula:
As conferências nacionais se tornaram um ícone do período de 2003 a 2006 em função da frequência em que foram realizadas, do expressivo contingente de pessoas e movimentos sociais envolvidos nas esferas municipais, estaduais e nacional e dos novos temas que foram introduzidos ao debate da esfera pública federal. (SILVA, 2009:7)
Assim, com o intuito de dinamizar o diálogo com a sociedade na administração
pública, o governo colocou em prática a estratégia de apoio à realização de conferências
nacionais. A autora compreende as conferências nacionais como espaços públicos ampliados
de participação social e menciona que do ponto de vista quantitativo ocorreu “expansão da
participação social na esfera pública social brasileira”, pois apenas no período analisado dois
milhões de pessoas participaram (Ibidem, p. 21).
No entanto, Silva destaca um questionamento relevante deste processo ampliado de
participação: o Estado terá capacidade de responder a quantidade expressiva de novas e
antigas demandas? Em outras palavras, “a burocracia do Estado teria sido capaz de dar
procedimento aos resultados da participação social, transformando as resoluções dos
29
conselhos, as deliberações das conferências em medidas e políticas públicas concretas que
melhoraram a qualidade de vida da população?” (Idem).
O expressivo número de conferências16 realizadas e a diversidade de temáticas
tratadas colocam especialmente o desafio da intersetorialidade17 entre as diferentes áreas de
políticas públicas. Neste sentido, Silva aponta que, de um lado o resultado das conferências
expressa um “rico processo de participação social”, mas, de outro lado, explicita “interesses
diferentes e muitas vezes conflitantes entre si, que dificultam sobremaneira seu
encaminhamento no ciclo de elaboração e planejamento de políticas públicas” (Ibidem, p. 32).
Como exemplo, cita a divergência das deliberações produzidas pela Conferência das Cidades
e as deliberações da Conferência pelo Meio Ambiente, a destacar a ampliação de áreas de
preservação ambiental.
Apesar de levantar os desafios proporcionados pelas conferências, Silva é otimista,
pois considera as conferências como responsáveis pelo aprofundamento da democracia, na
medida em que reconhecem novos atores e incluem novos segmentos. Afirma ainda que “as
conferências nacionais têm o potencial de se transformar em espaço público forte, caso as
deliberações vinculem-se ao processo decisório” (Ibidem, p. 33). A partir das entrevistas com
os Coordenadores das Conferências, Silva ressaltou a necessidade de uma coordenação
horizontal entre as Conferências para afastar-se do processo de desarticulação entre as
conferências. Outra sugestão foi a criação de mecanismo para a prestação de contas aos atores
sociais que participaram destes processos.
As questões observadas por Silva parecem ter sido observadas para a concepção do
projeto da 1ª Conferência Nacional da Segurança Pública. É interessante observar a relação
com as outras Conferências antes mesmo da 1ª Conseg ser lançada em 2009. Neste sentido, o
pesquisador Clóvis Souza realizou a pesquisa “Segurança Pública nas Conferências
Nacionais”, fomentada pelo Ministério da Justiça. Este trabalho teve como objetivo identificar
nas 47 Conferências Nacionais realizadas entre 2003 e 2008 quais diretrizes tratam da
temática da segurança pública, já relacionando com os eixos temáticos nas quais o texto-base
está estruturado. Os resultados apontam para a discussão da segurança pública em apenas 5%
16 Destaco algumas das 34 conferências analisadas: 10ª Conferência Nacional de Direitos Humanos, 1ª Conferência Nacional das Cidades, 5ª Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, 1ª Conferência Nacional do Meio Ambiente, 1ª Conferência Nacional da Juventude, 1ª Conferência Nacional do Esporte, 1ª Conferência Nacional de Políticas Públicas para as Mulheres, 1ª Conferência Nacional da Promoção da Igualdade Racial, 1ª Conferência Nacional da Cultura. 17 Cada conferência gerou em média 270 deliberações. Do total das deliberações, 55% era de competência compartilhada, ou seja, envolviam questões que tinham interface com outras áreas do executivo ou a atuação de mais de um ministério. Além disso, mais da metade das conferências analisadas apresentou deliberações recorrentes de outras conferências, mas que não resultaram em medidas.
30
das Conferências Nacionais. Entretanto, esta pesquisa destaca o interesse maciço em um eixo
temático específico, o eixo 5 que se “Prevenção social do crime e das violências: construção
da cultura da paz”. Nas conclusões, Souza faz apontamentos semelhantes aos de Silva,
destacando a falta de referência à forma de encaminhamento de tantas deliberações:
Por fim, cabe considerar que, embora as conferências nacionais tenham mobilizado muita gente no país para tratar de incontáveis questões públicas relevantes, não fica explícito nos relatórios finais a forma de encaminhamento das deliberações. Assim, para que se alcance efetividade na implementação das propostas, cabe ao Ministério da Justiça dar continuidade à qualificação de suas ações na promoção da participação, reforçada com esta sistematização de resultados relacionados ao tema em pauta na Conferência Nacional de Segurança Pública (SOUZA, 2008: 147).
No que se refere a uma análise mais detalhada sobre a proposta da 1ª Conseg,
existem trabalhos recentemente publicados como os de Lyra (2009), Soares, Rolim e Ramos
(2009) e Sapori (2010) que tratam dos significados da realização de uma Conferência na área
da segurança pública enfatizando os desafios e dilemas da participação neste campo. Num
certo aspecto, todos apontam para o ineditismo da 1ª Conseg enquanto um “marco histórico”,
especialmente no que se refere à participação da sociedade civil.
O livro de Lyra, “Participação e Segurança Pública no Brasil: teoria e prática” foi
publicado antes da realização da 1ª Conseg e agrega diversos artigos sobre a temática. Nesta
obra, o autor destaca que o processo de mobilização da 1ª Conseg apresenta características
inéditas pelo fato da mobilização ocorrer na área da segurança pública, considerado como
pouco permeável a participação. Ao considerar a Conferência como marcada pelo ineditismo,
ressalta o caráter democrático da composição da Conseg e que as propostas de
democratização da segurança pública e o processo de discussão podem gerar mudanças,
especialmente no que se refere à participação na gestão pública. Entretanto, Lyra questiona as
organizações que compõem a representação da sociedade civil, mencionando que estas
deixam muito a desejar, seja do ponto de vista de sua representatividade, quanto de sua
inserção nas lutas históricas. Por fim, atribui importância às Conferências Municipais e
Estaduais preparatórias, considerando-as como oportunidades de aprofundamento das
propostas de democratização da gestão pública na segurança pública que podem pressionar
propostas avançadas.
A iniciativa da 1ª Conseg é considerada por Soares e Rolim (2009) como um marco
histórico “ao importar para o campo da segurança uma dinâmica participativa bem-sucedida
nas áreas da saúde, assistência e educação”. Por conseguinte, apontam o duplo desafio da
Conferência, que consiste na necessidade de romper com medidas ideológicas,
compreendendo a segurança como direito universal e a discussão de um novo modelo de
31
polícia. Neste debate sobre um novo modelo de polícia, Soares, Rolim e Ramos (2009)
realizaram um trabalho de fôlego denominado “O que pensam os profissionais da segurança
pública”, o qual também foi financiado pelo Ministério da Justiça e publicado no mesmo mês
de realização da 1ª Conseg. Os autores comentam ainda que esta pesquisa é indissociável do
processo desencadeado pela Conferência, bem como seus resultados visam enriquecer a
produção desta.
Nesse trabalho, foram entrevistados quase 65.000 profissionais entre policiais
militares e civis, guardas municipais, bombeiros militares e agentes penitenciários. Embora se
fale muito sobre estes profissionais, os autores consideram que poucas vezes se ouve o que
eles têm a dizer. A partir desta indagação, os profissionais foram interrogados nos seguintes
temas: o modelo de polícia que consideram ideal para o Brasil, a questão da hierarquia e a
disciplina em seu ambiente de trabalho, a importância do controle externo e accountability, a
atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário e as situações de vitimização a que estão
cotidianamente submetidos. Nas análises ressaltam que os policiais desejam mudanças
institucionais:
Ao contrário do que talvez suponha a opinião predominante na sociedade brasileira a respeito dos policiais, eles, em sua grande maioria, desejam, sim, mudanças institucionais profundas, querem novas polícias, não aprovam as polícias em que atuam, nem concordam com o atual modelo organizacional, e estão maduros para discutir esses temas tão complexos e urgentes (SOARES, ROLIM e RAMOS, 2009:18).
O artigo de Sapori “Torre de Babel” analisa a 1ª Conseg após a sua realização e
apresenta uma visão mais crítica do processo. Destaca que, juntamente com a inovação
proporcionada pela participação da sociedade civil, outro aspecto relevante foi a
autonomização da segurança pública em relação aos temas dos direitos humanos. A área de
Direitos Humanos já realizou diversas conferências, entretanto, as discussões não
contemplariam à questão dos direitos individuais, pois centrar-se-iam na ação do Estado no
controle do crime. Considera como principal mérito da Conseg, a separação da área da
segurança pública dos direitos humanos, que embora considere como “umbilicalmente
conectados”, estes possuem singularidades na elaboração de políticas públicas (SAPORI,
2010: 162).
Assim sendo, Sapori destaca que um dos fatos que “saltou aos olhos” na Conferência
foi a presença maciça de entidades representativas de categorias profissionais que compõem a
área de segurança pública. Estas categorias se articularam na aprovação de princípios e
diretrizes, o que reforça o objetivo do presente trabalho:
32
Associações e sindicatos de praças, oficiais, agentes de polícia, peritos criminais, delegados, agentes penitenciários e bombeiros militares foram os protagonistas da Conferência. Suas propostas acabaram por conformar em boa medida os princípios e as diretrizes que compõem o documento final (Ibidem, p. 162).
Sapori compara a Conferência como uma “Torre de Babel”, fruto dos interesses
corporativos que se distinguem consideravelmente. O produto final da Conferência
assemelha-se a uma “colcha de retalhos”, já que as diretrizes são às vezes contraditórias, não
se complementando de forma sistêmica. É pessimista quanto à possibilidade dos resultados da
Conferência orientarem políticas públicas e aponta que apenas com a sucessão de
conferências nacionais é que se pode esperar uma agenda mínina.
33
Capítulo 2 - Entre o feito e o pretendido: balanço da metodologia utilizada
Para além de simplesmente descrever a metodologia utilizada no trabalho, considero
crucial uma reflexão acerca do desenvolvimento metodológico. Mais do que um processo
rígido, estanque de produção científica, é importante, por sua vez, expor o que foi planejado
inicialmente, e de que modo as etapas da pesquisa desenvolveram-se. Neste sentido, o balanço
da metodologia aqui proposto considera as especificidades que cercam o objeto das ciências
sociais.
A descrição das etapas metodológicas realizadas a seguir envolve as dimensões
consideradas fundamentais por Borba e Luchmann (2007) para a continuidade das pesquisas
em Ciências Sociais sobre participação. Os autores destacam a necessidade de articulação das
dimensões quantitativas (perfil sócio-econômico) para discutir a elitização da participação e
qualitativa na análise da participação (que abrange a qualidade do debate), pois o desafio dos
processos participativos é diminuir os custos da participação, propiciando o caráter inclusivo e
oportunizar condições de igualdade.
Primeiramente, a metodologia estava prevista em três etapas principais. A primeira
parte dizia respeito às observações realizadas sobre algumas etapas eletivas da 1ª Conseg, as
quais foram realizadas em Santa Catarina e que são: 1ª Conferência Municipal de Segurança
Pública de Florianópolis e 1ª Conferência Estadual de Segurança Pública de Santa Catarina.
As observações da Conferência Municipal de Florianópolis e Estadual constituem uma etapa
“mais etnográfica” do trabalho, na medida em que foram utilizadas ferramentas como notas
de campo18, diário de campo, observação participante, já que atuei como relatora dentro de
um grupo temático.
Para situar essa etapa da pesquisa, é necessário discorrer brevemente sobre a
etnografia enquanto metodologia. Em “A Interpretação das Culturas”, Clifford Geertz (1989)
destaca que para compreender o que é ciência é preciso voltar-se para aquilo que os
praticantes da ciência fazem. E o que é feito na antropologia social, é a etnografia. Logo,
compreender o que é a prática de etnografia leva a compreender o que representa a análise
antropológica como forma de conhecimento. A prática da etnografia consiste em estabelecer
relações, selecionar informantes, transcrever textos, levantar genealogias, mapear campos,
manter um diário. Mais do que a técnica, a etnografia é definida pelo tipo de esforço
18 As tomadas de notas são importantes no processo de produção etnográfica ao constituir um momento mais inicial da pesquisa. As notas de campo são acontecimentos que descrevem as experiências e observações que o pesquisador tem feito enquanto participante intenso no processo e podem registrar palavras-chaves referentes à acontecimentos importantes, condensados para o desenvolvimento posterior. (EMERSON, et al. 1995)
34
intelectual que representa “um risco elaborado para uma descrição densa”. (GEERTZ, 1989:4)
Na perspectiva da antropologia interpretativa de Geertz, a etnografia é uma descrição densa,
pois os dados são construções de construções de outras pessoas, ou seja, os textos
etnográficos são interpretações de segunda ou terceira mão, já que o etnógrafo não é capaz de
perceber o que os seus informantes percebem, mas sim “com que” ou “por meios de que”
percebem. Cabe ao etnógrafo “inscrever” o discurso social produzido na interação
intersubjetiva, “salvar” o que foi dito, anotando-o: “ao fazê-lo, ele transforma de
acontecimento passado, que existe apenas em seu próprio momento de ocorrência, em um
relato, que existe em sua inscrição e que pode ser consultado novamente” (Ibidem, p. 14). Ao
considerar a etnográfica microscópica, propõe generalizações e abstrações teóricas por meio
de eventos e recortes específicos.
A etnografia, enquanto fruto da experiência da observação participante, condiciona o
que é observado e definitivamente tratado como “dado” ou “achado”, em inseparável do
processo de observação. Assim, os métodos determinam como o pesquisador de campo vê,
experiencia e aprende, o que considero essencial nas observações que desenvolvi acerca da
Conferência Municipal de Florianópolis.
A postura do pesquisador em campo requer que ele não tente ser uma “mosca na
parede”, invisível, pois nenhum pesquisador de campo pode ser completamente neutro, ou
seja, ser observador detalhado e atento e ao mesmo tempo estar fora do fenômeno observado.
Contudo, é importante considerar que o questionamento à neutralidade não significa uma
“ausência” de objetividade do trabalho etnográfico. Neste sentido, as contribuições de Weber
são essenciais ao debate, já que o autor reconhece que a sociologia é influenciada por
inúmeros fatores e reflete escolhas do pesquisador, valores e opções políticas. Neste caso, o
cientista deve guiar-se pela objetividade, o que significa deixar claro quais são os seus
pressupostos e controlar os resultados da investigação com rigor metodológico. O texto “A
objetividade do conhecimento nas ciências sociais” coloca em suspensão o conceito de
“objetividade” ao expor que as causas que determinam um acontecimento individual são
sempre infinitas, multicausais. Assim, propõe que a “objetividade” do conhecimento nas
ciências sociais depende do fato empírico estar orientado por idéias de valor (que não
expressam hierarquia entre valores) e são justamente estas que conferem valor de
conhecimento.
Dessas etapas, contei ainda com gravações das cerimônias de abertura, explicações
sobre os eixos temáticos e metodologia, bem como fotografias. Como foram muitas horas de
gravação, optei por transcrever alguns momentos que considerei mais interessantes para
35
exemplificar detalhes do processo e explicitar seus significados. A tarefa de registrar detalhes
da Conferência não é das mais fáceis, especialmente pelos múltiplos atores envolvidos e pela
dinamicidade que marca o próprio evento. Por isto, desenvolvi com maior detalhamento a
descrição da Conferência Municipal de Florianópolis, por considerar necessário compreender
as etapas que marcam a Conferência, o seu desenho institucional, o processo de votação e da
elaboração de princípios e diretrizes. Como a etapa municipal agregou bem menos
participantes (cerca de 100) do que a Estadual (cerca de 700), foi possível apreender de forma
mais nítida as articulações e participação dos segmentos. Além disto, não esperava que as
atividades de relatoria fossem tão intensas na etapa estadual.
Outra parte dessa primeira etapa está intrinsecamente relacionada com as
observações, na medida em que forneceu subsídios (ou não) para realizá-las. Por já possuir os
relatórios da Conferência Municipal de Florianópolis, da Conferência Municipal de Blumenau
e de algumas Conferências Livres, supus erroneamente que seria fácil obter o relatório da
conferência que faltava: o da Conferência Estadual de Santa Catarina. Atribuí importância a
estes relatórios por considerá-los peças fundamentais para identificar quem organizou a etapa
da conferência, local de realização da mesma, autoridades presentes, os princípios e diretrizes
elaborados, além de mapear a participação entre os segmentos, identificando instituições e
movimentos sociais, dados gerais sobre os delegados, processo de votação e até imagens do
processo. Por conseguinte, os relatórios desenvolvem breves descrições, discorrem sobre a
forma de utilização do texto-base e avaliam de modo geral a etapa.
É necessário frisar que trato tanto das etapas preparatórias quanto das eletivas de
modo indissociável da Conferência Estadual, pois estas dão sustentação a princípios e
diretrizes, articulam redes de atores sociais, mobilizando-as para a estadual. No decorrer da
Conferência Estadual, tais aspectos tornaram-se muito perceptíveis, pois tive contato com
participantes que foram eleitos delegados nas Conferências Municipais e estavam presentes na
etapa estadual, ou então que participaram, organizaram as etapas municipais e foram eleitos
delegados na Conferência Estadual. Para tratar do processo de construção da Conferência
Estadual e do papel desempenhado pelas Conferências Livres, utilizei os relatórios de três
destas Conferências que obtive acesso pela internet, além de diversos sites.
Além dos relatórios constituírem um campo para a pesquisa, expressam ainda a
publicização ou negligência dos resultados da Conferência, conduzindo a questionamentos
sobre as formas pelas quais as conferências são encaradas em alguns estados: será que
prevalece o “evento” em si, o momento de “festividade” ou existe realmente uma
preocupação com o que é produzido na Conferência?
36
No decorrer dessa pesquisa, percebi que a dimensão pública dos relatórios finais das
Conferências, ou seja, a divulgação do documento produzido nos debates é um aspecto
delicado e muitas vezes deficiente. Assim sendo, necessitei do relatório da Conferência
Estadual para obter dados (como e-mail, telefone) dos delegados eleitos, com a finalidade de
contactá-los para que respondessem ao questionário formulado (descrito na sequência).
Entretanto, obter o relatório da Conferência Estadual tornou-se uma verdadeira via-crúcis.
Primeiramente solicitei o relatório da Conferência para o Coordenador de Projetos da
Conferência do Ministério da Justiça, o qual me respondeu uma semana depois com alguns
documentos, mas não com o relatório. Na sequência, solicitei-o pessoalmente em 08/10/2009
ao Assessor do Secretário Estadual de Segurança Pública, integrante da Comissão
Organizadora Estadual - COE e delegado indicado como gestor. Expliquei sobre a minha
pesquisa e entreguei uma cópia do projeto. Polido, a resposta foi positiva, sendo que seria
solicitado ao Marcos Pamplona, responsável pela organização da etapa estadual e pelo
relatório. Por fim, afirmou que enviaria nos próximos dias. Em 22/10/2009, liguei novamente
para o Assessor a fim de marcar uma entrevista. Ele ficou surpreso por não terem repassado o
relatório. Em 27/10/2009, liguei novamente e solicitei o relatório.
Após várias tentativas sem sucesso, decidi mudar de estratégia. No final de outubro,
entrei em contato com o mobilizador da conferência em Santa Catarina e Rio Grande do Sul
para solicitar o relatório. Foi uma surpresa saber que o mobilizador da Conferência também
afirmou não ter recebido o documento, o que pareceu bastante estranho. Solicitei que me
enviasse os contatos dos delegados eleitos, o que realmente foi concretizado e possibilitou
entrar em contato também por telefone com os mesmos. Em 04/11/2009, recebi um e-mail de
Marcos Pamplona, que afirmou enviar em breve o relatório final. Neste momento forneceu-
me a lista com os princípios e diretrizes aprovados e o relatório das pré-inscrições com dados
gerais sobre a conferência.
Depois de quase dois meses de tentativas sem resultado, entrei em contato
novamente com os representantes do Ministério da Justiça, os quais conheci na etapa estadual.
A partir do Coordenador Nacional de Mobilização, Guilherme Leonardi, consegui o relatório
em 18/12/2009 – quase três meses após a primeira tentativa. Contudo, mesmo após explicar
sobre o meu trabalho, ele pediu que não divulgasse e não repassasse a ninguém o relatório!
Realmente não consegui entender o porquê de tanta polêmica por causa de um relatório. Na
verdade, no momento em que pude ler o relatório percebi as inúmeras lacunas do
preenchimento, as quais analisarei no próximo capítulo.
37
A segunda etapa prevista esteve relacionada até certo momento com a obtenção do
relatório da Conferência Estadual. Esta fase diz respeito à aplicação de questionários com os
delegados eleitos na etapa estadual e nas etapas municipais eletivas dos três segmentos,
sociedade civil, trabalhador e gestor. Os questionários foram desenvolvidos a partir do
conceito de recursos, com o objetivo de identificar os recursos individuais e subjetivos dos
delegados que incluem: perfil sócio-econômico, motivações para a política, associativismo,
expectativas com a conferência; e os recursos organizacionais e coletivos mobilizados pelos
delegados: organizações que participam, grupos que apoiam a entidade que participa,
conferências livres mobilizadas, entre outras questões (FUKS & PERISSINOTTO, 2004,
2006).
O modelo que orientou a elaboração do questionário foi desenvolvido por Fuks e
Perissinotto para a pesquisa “Estudo dos Conselhos Municipais de Curitiba”, disponível no
CIS19, com as análises publicadas em 2004, no livro “Democracia e Participação: os
conselhos gestores no Paraná”. Algumas questões abertas também foram incluídas no
questionário, tais como: a opinião sobre a paridade entre os segmentos, os três temas que
consideraram mais polêmicos na Conferência Estadual, o que consideram prioritário para a
política nacional de segurança pública e a percepção sobre as suas participações nas
conferências.
A primeira alternativa para a aplicação dos questionários consistiu em enviar os
questionários via e-mail aos delegados que já possuía o contato em decorrência da
participação nas conferências. Em 17/09/2009, encaminhei o questionário para oito delegados
em um e-mail que explicava o objetivo do meu trabalho e pedi colaboração com a pesquisa.
Os três delegados que prontamente responderam participaram do mesmo grupo de trabalho
que fui relatora. Em 18/09/2009, enviei o questionário para outros delegados que consegui o
contato. Normalmente, um pouco menos da metade das pessoas respondiam ao e-mail.
Embora o meu orientador tenha alertado sobre o baixo retorno de questionários via e-mail,
não esperava que tivesse tantas dificuldades para aplicá-los, levando quase três meses para
atingir vinte e três questionários. Tentei entrar em contato com os quatro delegados eleitos na
etapa estadual e originários de Brusque. Contudo, tanto o e-mail quanto o telefone que obtive
eram do Secretário de Segurança de Brusque, o qual viabilizou a participação deles na
Conferência Estadual. Solicitei os contatos destes delegados ao Secretário, mas ele me
forneceu apenas os nomes. Outra tentativa sem sucesso foi com os integrantes da Central
19 Disponível em http://www.nadd.prp.usp.br/cis/DetalheItem.aspx?cod=B31.
38
Única das Favelas - Cufa de Laguna, que elegeu três delegados. Conversei algumas vezes por
telefone com os representantes, mas não obtive retorno nos questionários.
Convém ressaltar que, apesar das dificuldades com os questionários, muitas pessoas
foram bastante receptivas, respondendo-o de forma completa. Foi interessante perceber que o
questionário respondido por e-mail desenvolveu também um processo reflexivo. Em um caso,
o delegado encaminhou-me uma nova versão do questionário respondido, após refletir melhor
sobre as suas respostas. Recebi ainda elogios de uma delegada de Lages, que considerou a
internet uma boa ferramenta para encurtar distâncias.
Acrescento uma quarta etapa como extremamente importante ao trabalho. O acesso
a blogs e sites dos integrantes da conferência, sindicatos, prefeituras, jornais locais, ONG’s e
do próprio Ministério da Justiça possibilitaram uma gama de informações que ampliaram a
compreensão sobre a Conferência. A pesquisa em sites e blogs mostrou-se uma ferramenta
essencial para situar os diferentes atores sociais envolvidos e perceber as suas articulações,
nem sempre fáceis de compreender para quem não é trabalhador de segurança pública.
O Ministério da Justiça criou um site específico para a conferência
(www.conseg.gov.br), o qual era constantemente atualizado com informações sobre as
diversas etapas pelo país, realizava conferências virtuais, juntamente com diversos
documentos (texto-base, manual metodológico, entre outros) e diversas pesquisas que foram
fomentadas pelo próprio Ministério.
De um modo geral, era mais fácil acessar notícias dos estados e dos municípios neste
site do que no site das prefeituras, ou no caso da Conferência Estadual de Santa Catarina, no
site da própria Secretaria de Segurança Pública. Será que esta centralização de informações
apenas no site da Conferência Nacional é a proposta mais interessante? Acredito que os
estados e municípios possam se engajar nesta tarefa e contribuir para a divulgação das etapas
locais, pois em nível local é necessária à divulgação de informações. Com relação ao material
coletado por meio do site da 1ª Conseg utilizo:
• Texto-base da Conferência (2009);
• Manual Metodológico (2009);
• Caderno de Propostas para a etapa nacional (2009);
• Relatório Final da Conferência Nacional (2010);
• Pesquisa sobre “Perfil dos participantes da 1ª Conseg”, realizada pelo Instituto Via
Pública (2009);
39
• “Segurança Pública nas Conferências Nacionais” (2008), realizada pelo consultor
Clóvis de Souza, a pedido do Ministério da Justiça;
• “O que pensam os profissionais da segurança pública, no Brasil” (2009), realizada por
Luiz Eduardo Soares, Marcos Rolim, Souza e financiada pelo Ministério da Justiça-
SENASP e PNUD.
No projeto de TCC, estava prevista a realização de entrevistas com os integrantes da
Comissão Organizadora Estadual – COE e com o mobilizador da etapa catarinense, por
considerar relevante uma articulação da metodologia quantitativa com a qualitativa. Contudo,
estas entrevistas tornaram-se inviáveis pelas dificuldades encontradas na obtenção do relatório
e na aplicação dos questionários. Neste momento, precisei realmente rever o que foi
pretendido para a metodologia e adaptá-la às circunstâncias vivenciadas, para não inviabilizar
a pesquisa. Além disto, os materiais que reuni deram conta dos objetivos planejados e
possibilitaram também dados qualitativos.
40
Capítulo 3: O processo de construção da 1ª Conseg
3.1 O processo de construção e o projeto da 1ª Conseg
A 1ª Conferência Nacional de Segurança Pública – 1ª Conseg está vinculada a
proposta iniciada em 2007 pelo Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania –
Pronasci, durante o segundo mandato do Governo Lula. O programa tem como objetivo
diminuir o índice de homicídio das regiões metropolitanas brasileiras. Apresenta, enquanto
propostas, a articulação de políticas de segurança com ações sociais, priorização da prevenção
e busca atingir as causas que levam à violência, ou seja, enfatiza a prevenção sem abrir mão
da repressão. Dentre os principais eixos do Pronasci, destacam-se: a valorização dos
profissionais de segurança pública; a reestruturação do sistema penitenciário; o combate à
corrupção policial e o envolvimento da comunidade na prevenção da violência. Para o
desenvolvimento do Programa, o governo federal investirá R$ 6,707 bilhões até o fim de
201220. Nas regiões metropolitanas que registram as elevadas taxas de homicídio, o Pronasci
tem implantado os “Territórios de Paz” para enfrentar e prevenir a criminalidade e a violência.
As considerações que seguem acerca da 1ª Conseg são desenvolvidas com base
especialmente no Relatório Final da 1ª Conferência Nacional, documento produzido pelo
Ministério da Justiça e divulgado em fevereiro de 2010. Neste documento, expõem-se dados
gerais de todas as etapas, enfatizando a nacional, além da apresentação do projeto da
Conferência (histórico, processo preparatório, objetivos). De um modo geral, há também uma
avaliação sobre o processo com textos dos integrantes das diferentes coordenações:
metodologia, mobilização, projetos especiais, entre outras. Por último, abordam as ações que
estão sendo encaminhadas para o momento “Pós-Conseg”.
Por conseguinte, o processo preparatório21 da Conferência envolveu todas as etapas
e atividades que antecederam a Etapa Nacional e incluiu as Conferências Municipais
Preparatórias e Eletivas e as Conferências Estaduais. Tanto nas etapas Eletivas quanto nas
Preparatórias, foram produzidos até sete princípios e vinte e uma diretrizes, encaminhados
diretamente ao Caderno de Propostas da Conferência Nacional. No Manual Metodológico da
20 http://www.pronasci.gov.br/pronasci 21 Esse processo está dividido em nove etapas: I. Constituição do Grupo de Trabalho para a elaboração do projeto da 1ª CONSEG; II. Constituição da Coordenação Executiva do Ministério da Justiça; III. Constituição do Fórum Nacional Preparatório; IV. Constituição da Comissão Organizadora Nacional; V. Elaboração do Texto-Base; VI. Lançamentos de etapas (nacional, estaduais e municipais; VII. Instalação e acompanhamento das Comissões Organizadoras Estaduais (COE) e Comissões Organizadoras Municipais - COM; VIII. Desenvolvimento das etapas preparatórias: Conferências Livres, Conferência Virtual, Seminários Temáticos, Projetos Especiais, Conferências Municipais Preparatórias e Eletivas e Conferências Estaduais;IX. Sistematização das Propostas
41
Conferência (2009), existe um esforço em definir o que são os princípios e diretrizes. Os
princípios são definidos enquanto os valores que orientam uma política e são redigidos de
modo afirmativo. Já as diretrizes tratam de aspectos mais específicos e estão relacionadas
com os debates dos eixos temáticos, ou seja, o seu foco é voltado para cada eixo.
Diferentemente de outras áreas, as políticas públicas de segurança não estiveram
inseridas num sistema de co-gestão participativa que compartilhasse entre Estado e Sociedade
o planejamento e a implementação de ações. Assim, o Ministério da Justiça compreende este
processo de gestão democrática enquanto uma marca e um compromisso do Governo federal
que considera as Conferências como “um amplo espaço de discussão, negociação, produção
de consensos e compartilhamentos de poder” (BRASIL 2010:23).
O texto do Relatório Final deixa claro o duplo objetivo da Conferência que consiste
em definir princípios e diretrizes para a política nacional de segurança pública e consolidar
instrumentos de participação nesta área. Logo, a redação do objetivo geral é elaborada da
seguinte forma: “Definir princípios e diretrizes orientadores da Política Nacional de
Segurança Pública, com participação da sociedade civil, trabalhadores e poder público como
instrumento de gestão, visando efetivar a segurança como direito fundamental” (Ibidem, p.
29).
No que concerne essa proposta, existe a ênfase em construir e desenvolver espaços
de participação na área da segurança pública, a partir do reconhecimento das fragilidades
destes espaços. A proposta da Conferência assumiu o compromisso de tentar sanar a dívida
histórica com o processo de democratização ao criar oportunidade para promover um debate
sobre o modelo de segurança pública para o Brasil. Apostaram em uma concepção de Projeto
Metodológico que consideraram inovador e ousado. Ou seja, a proposta da Conferência se
apropria do debate que é realizado na literatura sobre segurança pública, o qual desenvolvi no
capítulo 1, assumindo-o enquanto uma prerrogativa a ser modificada.
Dentre os pressupostos da 1ª Conseg, destacam-se o caráter deliberativo, a
participação do Estado, trabalhadores e sociedade civil, conferências nos três níveis de
governo, sistema descentralizado e participativo de co-gestão da política de segurança
pública. Contudo, o caráter deliberativo não significa tornar as deliberações com pesos legais,
pois as deliberações deverão ser submetidas às instâncias responsáveis. O Ministério da
Justiça considera que a deliberação também está no peso político das diretrizes.
O primeiro passo para a construção da Conferência diz respeito à instituição de um
Grupo de Trabalho ministerial, a fim de discutir questões iniciais. Juntamente com esta
iniciativa, o Grupo de Trabalho organizou quatro grupos de convidados especializados em
42
segurança pública, democracia participativa, redes e movimentos da sociedade civil na área
penitenciária e trabalhadores da segurança pública. Após esta etapa, designou-se a
Coordenação Executiva da 1ª Conseg. Na sequência, instalou-se o Fórum Preparatório
Nacional que agregou mais de 150 entidades e teve como objetivo orientar a preparação e a
elaboração da Conferência. O Fórum continuou permanentemente mobilizado para a
participação do processo da 1ª Conseg. Fruto deste Fórum, originou-se a Comissão
Organizadora Nacional – CON, instância máxima deliberativa, com papel decisivo na
formulação e regulação das etapas, composta de forma tripartite. A CON aprovou o
Regimento Interno, os Eixos Temáticos e seus membros tiveram diversas atribuições desde
mediadores políticos, articuladores até fiscais do processo.
Quadro 1: As etapas do processo preparatório na linha do tempo
Ano Período Etapas Preparatórias 2008 Julho Instalação do Fórum Preparatório
Setembro Instalação da Comissão Organizadora Nacional - CON Dezembro
Instalação das Comissões Organizadoras Estaduais – COEs Lançamento oficial da 1ª Conseg
Fonte: www.conseg.gov.br/gráfico / Quadro autora
A proporção adotada entre os segmentos foi de 40% da sociedade civil, 30% dos
trabalhadores e 30% do poder público. As etapas da Conferência dividiram-se entre Etapas
Preparatórias que abrangeram as Conferências Municipais, Conferências Livres, Conferências
Virtuais, Seminários Temáticos, Projetos Especiais, conforme o esquema anterior. Estas
etapas tiveram um caráter mobilizador e propositivo, mas não eletivo. Com as etapas
preparatórias, pretendeu-se envolver um público mais distante de processos participativos. Já
as Etapas Eletivas abarcaram as Conferências Municipais Eletivas e as Conferências
Estaduais, com a atribuição de eleger delegados. As Etapas Municipais Eletivas foram
realizadas nos municípios com mais de 200 mil eleitores e/ou integrantes do Programa
Nacional de Segurança com Cidadania - PRONASCI. Ao todo, 125 municípios puderam
realizar as etapas eletivas, pois já participavam do Pronasci ou contavam com mais de 200 mil
eleitores. Estas etapas tiveram a participação de 25.645 pessoas e foram organizadas em
diferentes formatos.
Conforme previsão do Regimento Interno, o poder executivo municipal tinha a
prerrogativa de convocar as etapas municipais e de conduzi-las, com a participação de
43
entidades da sociedade civil e dos trabalhadores da segurança pública. Caso não o fizesse até
30 de março de 2009, poderiam ser convocadas pela sociedade civil e pelos trabalhadores até
o dia 30 de abril de 2009. Já o período definido para a realização das etapas municipais
estendia-se de 1º de fevereiro a 30 de maio de 2009.
De cada etapa municipal eletiva saíram dois representantes diretamente para a etapa
nacional: um da sociedade civil, um do poder público. Nas Conferências Estaduais, saíram
representantes dos três segmentos com quantidade estabelecida por critérios populacionais, de
acordo com tabela 1. Os Estados receberam recursos financeiros entre R$ 100.000,00 e
350.000,00, além dos materiais.
Tabela 1 – Relação de faixas de habitantes e quantidades de representantes
eleitos/as nas etapas estaduais e municipais
Faixa Habitantes dos estados Quantidade de representantes
1 Até 3,5 milhões 30
2 De 3,5 a 7 milhões 51
3 De 7 a 10 milhões 67
4 De 10 a 15 milhões 86
5 De 15 a 20 milhões 105
6 Acima de 20 milhões 124
Fonte: Relatório Final da Conferência Nacional
Com relação aos trabalhadores, puderam eleger-se trabalhadores de doze categorias
diferentes de forma equitativa, conforme Fluxograma de Representantes das Etapas Eletivas.
44
Fonte: Manual Metodológico
O recorte da Conferência foi construído a partir do contato com as iniciativas de
outras Conferências Nacionais, contemplando as especificidades da segurança pública. É
importante identificar que o Manual Metodológico (2009) teve a preocupação em delimitar o
desenho institucional da Conferência ao estabelecer critérios de definição sobre o “o que é” e
“o que não é” a Conferência. O quadro a seguir expõe estas “regras” que explicitam a
abrangência e os limites. Dentre as regras, destaco a determinação de que a Conferência não é
um espaço para reivindicações corporativas, pois consideram que a iniciativa não se trata de
um “congresso de trabalhadores”. É nítida a preocupação de que a Conferência não caísse no
corporativismo e propunham que a Conseg deveria buscar uma “visão universal e sistêmica
do tema, evitando-se discussões e debates técnicos e corporativos”. (Op. Cit. p.30)
Outra delimitação diz respeito à negação de vazão de programas máximos, ou seja,
um conjunto de propostas previamente definidas a ser aprovado na Conferência. Na verdade,
aconteceram momentos nos quais diretrizes previamente formuladas em Conferências Livres,
como a diretriz do “Ciclo Completo de Polícia, não necessariamente fruto do debate público,
oque tratarei a seguir.
45
Quadro 2: Delimitação da Conferência
O que é a Conseg O que não é a Conseg
Espaços de diálogos, debates e proposições (deliberações) sobre a Política Nacional de Segurança Pública.
Espaços de deliberações sobre reivindicações corporativistas. “A conferência não é um congresso de trabalhadores”.
Espaço de eleição de representantes que levam adiante ideias/propostas aprovadas.
Espaços de denúncias individuais.
Instância convocada e coordenada pelo Poder Executivo.
Instância de vazão de programas máximos. (Conjunto de propostas previamente definidas).
Instância de concertação política. Espaço isento de regras (democratismo – assembleia soberana). Sujeitos derivados e não constituintes.
Mapeia e explicita dissensos e consensos. As divergências também foram registradas.
Espaço de debates acadêmicos (não se trata de um congresso intelectual).
Fonte: Manual Metodológico/Relatório Final da 1ª Conseg
É interessante observar ainda que das regras estabelecidas no Manual Metodológico
para o Relatório Final, acrescentou-se que é papel da Conferência mapear e explicitar os
dissensos e consensos. Logo, esta proposta é provavelmente fruto da experiência adquirida
durante as diferentes etapas da Conferência, que ao articular redes sociais, também expôs os
conflitos latentes nas instituições e nas diferentes regiões no país.
3.2 Parcerias da 1ª Conseg: PNUD e Via Pública
Com a finalidade de realização da 1ª Conseg, o Ministério da Justiça contou com a
cooperação técnica do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD, o que
fomentou diversas ações referentes ao projeto da Conferência. Tal cooperação possibilitou
ações como a Feira do Conhecimento de Segurança Pública e diversas pesquisas: a Consulta
Nacional aos Policiais, a pesquisa sobre Redes Sociais, Consulta às Escolas, ações de Projetos
Especiais, Cursos de Capacitação22 para integrantes das Comissões Organizadoras Estaduais
ministrados por representantes do PNUD.
Essa parceria também se refletiu na própria concepção da Conferência, pois seu lema
é “Segurança com Cidadania: Participe dessa mudança”, tendo como pressuposto o conceito
22 Em parceria com o PNUD, realizaram o curso presencial “Convivência e Segurança Cidadã” que contou com a participação de representantes do escritório do PNUD em Bogotá.
46
de “segurança cidadã”. O PNUD23 sistematizou as experiências de segurança pública no final
da década de 90 e introduziu o conceito de “segurança cidadã”, que consiste em um modelo
de segurança baseado em uma abordagem multidisciplinar e integrada de políticas públicas.
O Ministério da Justiça também realizou parceria com o Instituto Via Pública,
organização da sociedade civil de interesse público – OSCIP. Conforme informação obtida
com o Coordenador de Projetos na Conferência, este Instituto também foi o responsável por
gerenciar o ambiente virtual da conferência, no qual foram armazenados os relatórios de todas
as etapas. Convém destacar que o Ministério da Justiça fez um investimento24 considerável
em pesquisas. A parceria com o Via Pública já está conectada com a possibilidade de uma 2ª
Conseg e teve como objetivo (Ibidem, p. 37):
Desenho de metodologia e implementação de procedimentos de monitoramento e avaliação do planejamento e da realização da 1.ª Conferência Nacional de Segurança Pública - CONSEG, segundo seu Plano de Gestão, nos seguintes componentes: conteúdo e metodologia, mobilização, comunicação, sensibilização, capacitação, consultas, participação, gestão, aspectos gerais e sugestões e acompanhamento de resultados. Realização de pesquisas quali-quantitativas. Metodologia para avaliação de impactos pós-conferência.
3.3 Projeto Metodológico
A Coordenação de Metodologia da Conferência analisou as opções e inovações
proporcionadas pela metodologia. Assim, explicitaram que o projeto metodológico foi
concebido a partir de experiências profissionais em outros processos de Conferências
Nacionais do período de 2003 a 2008, das quais destacaram: I Conferência Nacional do Meio
Ambiente (2003); I Conferência Nacional Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente (2003); II
Conferência Nacional Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente (2005/2006); I Conferência
Nacional de Políticas Públicas de Juventude (2007/2008) e I Conferência Nacional de Cultura
(2006). Dentre estas, a Conferência Nacional da Juventude foi a que mais forneceu
contribuições para a concepção da Conseg. Com o intuito de captar pessoas e grupos
diferentes, a 1ª Conseg foi realizada com a maior diversificação das etapas já feitas no país.
23 “Desde 2003, em parceria com o Ministro da Justiça, o PNUD tem desenvolvido um conjunto de projetos de cooperação técnica que tem como base esse modelo de Segurança Cidadã e também modelos de governabilidade, que visam reforçar as capacidades de gestão dos vários níveis de governo”. (Relatório Final, p. 36) 24 Segundo informações obtidas no site do Instituto, somente na consultoria prestada pelo Via Pública, o contrato foi firmado em R$ 851.489,00 por um ano de atividades. http://www.viapublica.org.br/atividades.html - Acesso em 03.02.2010
47
A Equipe de Metodologia destacou que apostou em uma concepção de Projeto
Metodológico que consideraram inovadora. Assim, o Projeto Metodológico foi avaliado em
três dimensões: política, pedagógica e técnica, conforme o quadro abaixo:
Quadro 3: Três dimensões do Projeto Metodológico
Dimensão Política Dimensão Pedagógica Dimensão Técnica - Conferir igualdade de condições de participação aos três segmentos envolvidos.
- “Contribuir para fomentar a participação dos atores envolvidas direta e indiretamente no campo da segurança pública”.
- Apresentou consistência e mostrou-se viável na prática.
- “Inovar ao assumir que momentos de votação de Regimento Interno, amplamente adotado por outras conferências não contribuem para torná-las mais participativas”.
- “Tornou possível o diálogo entre os três segmentos (...) o que mudou o patamar de articulação entre organizações e pessoas atuantes na área e gerou condições para a emergência de diversos desdobramentos no período pós-Conseg”.
- Embasada em práticas de outras conferências.
- “Inovar e ousar ao propor o Momento Interativo como metodologia de diálogo e de priorização de propostas”.
- Elaboração de 6 Manuais Orientadores que foram instrumentos fundamentais para a disseminação da metodologia.
Fonte: Relatório Final da 1ª Conseg / Sistematização autora
Segundo a Coordenação de Mobilização, o investimento em mediação qualificada
contribuiu para tornar possível o ideal democrático. Logo, “a equipe de mediação foi base
para a efetivação das inovações, sendo constituída por profissionais de um campo em
expansão no Brasil – o desenho e desenvolvimento de processos participativos” (Ibidem, p.
40). Esta frase merece ser observada em detalhes, pois o “campo em expansão” que se
referem está relacionado com a existência de empresas privadas especializadas na atividade
de mobilização. Embora o Relatório Final não faça nenhuma menção de forma específica,
identifiquei que a empresa privada Holon ficou responsável pela condução das atividades de
mobilização na 1ª Conseg. Obtive esta informação ao observar alguns textos do diretor da
empresa Eduardo Rombauer no decorrer do Relatório.
48
No site da empresa Holon25, sua atuação é descrita como responsável por “soluções
em desenvolvimento e inovação social”, cuja missão é “catalisar processos integrativos para
fortalecer a atuação consciente e sustentável de pessoas, grupos, organizações e
comunidades”. A Holon afirma possuir experiência singular em apoiar processos
participativos das mais variadas escalas e características. Dentre os seus clientes estão
Ministério da Cultura; Ministério da Justiça; Ministério da Saúde; Ministério do
Planejamento; Orçamento Participativo da Prefeitura de São Paulo; Secretaria de Cultura do
Estado de São Paulo; Secretaria Nacional de Juventude, entre outros. No site da empresa,
existe um link que destaca os “serviços” prestados, dos quais constam os “Processos
Participativos”. Para atuar nos processos participativos, utilizou-se dos seguintes recursos
metodológicos: Mediação de Encontros, Participação em Larga Escala, Educação Popular e
Mobilização Social.
A Coordenação de Mobilização aponta como inovações do projeto metodológico: o
“voto cruzado”, criado para ampliar o diálogo entre a sociedade civil e trabalhadores; o
relatório padrão com número máximo de propostas; diversificação de etapas por meio das
25 www.holonbrasil.com.br
49
Conferências Livres e da Virtual que para o Ministério da Justiça facilitaram a participação da
população pelas diversas linguagens e formatos. A equipe de mobilização foi formada por 13
consultores especializados em mobilização que mantiveram contato permanente com as
Secretaria Estaduais e Municipais de Segurança e com as Comissões Organizadoras Estaduais
(COE) e Comissões Organizadoras Municipais (COM). Esta equipe possibilitou ao Ministério
da Justiça “ampliar a interação entre as pessoas permitindo a emergência de práticas
democráticas inovadoras que romperam com tendências de corporativismo, competição e
autoritarismo”. (Idem)
3.4 A proposta do texto base
O Ministério da Justiça caracterizou a elaboração do texto-base como um
“documento plural e pedagógico”, construído em várias mãos. A seleção dos conteúdos a
serem debatidos pautou-se no perfil da violência no Brasil. Para Paula Miraglia (2010), o
texto-base deve ser compreendido enquanto um dos marcos iniciais do processo. A natureza
do texto refletiria o caráter inédito da conferência e cumpriria diferentes funções, isto é,
“informar e subsidiar o debate, além de delimitar o conjunto de temas a serem tratados pela
Conseg” (MIRAGLIA, 2010:26). A elaboração foi fruto de pesquisa documental, entrevistas
com gestores do Ministério da Justiça e interlocução com a CON. Miraglia caracteriza o texto
como o “registro de determinado momento histórico” que “expressa a amplitude do debate e
os compromissos assumidos quando da proposta de realização de uma conferência nacional
sobre segurança pública” (Idem, p. 26). Com relação aos temas tratados, destaca a
importância dos participantes se reconhecerem no conteúdo:
O texto-base pretendia fazer com que diferentes atores, num campo tradicionalmente pautado por disputas, se sentissem contemplados e fossem capazes de ser reconhecer no seu conteúdo – era uma liga para um processo que demandava diálogo e troca permanentes (Idem).
O texto-base está estruturado em oito partes. Na primeira parte, é oferecido um
panorama geral que trata da Segurança Pública no Brasil e enfatiza-se que a inclusão do tema
ocorreu de forma tardia no debate sobre o processo de democratização e proposta de
consolidação de um novo paradigma por meio da Conferência. As outras sete partes referem-
se aos eixos-temáticos da Conferência, os quais apresentarei de forma sucinta.
O Eixo 1 intitula-se “Gestão Democrática: controle social e externo, integração e
federalismo”. A discussão parte dos princípios do federalismo democrático e da premissa de
que a política de segurança orienta-se por uma abordagem sistêmica. Assim, é destacado o
50
papel dos municípios na segurança pública e a política de integração sistêmica dos entes
federados ressalta a criação de Gabinetes de Gestão Integrada (GGIs). O novo paradigma de
segurança pública distribui a responsabilidade da gestão das políticas, por isso, o eixo enfatiza
a importância de mecanismos de participação como as conferências e os conselhos. Portanto,
preveem a reativação do Conselho Nacional de Segurança Pública (Conasp), a realização
periódica de Conferências Nacionais de Segurança Pública e a regulamentação e estruturação
dos Conselhos Comunitários de Segurança Pública. Por último, apontam a relevância de
diretrizes nacionais a respeito de mecanismos de controle formal como as corregedorias,
ouvidorias, inspetorias.
O Eixo 2 denomina-se “Financiamento e gestão da política pública de segurança”.
Critíca a falta de racionalidade das políticas públicas na área da segurança e a carência de
princípios básicos de gestão. Como exemplo desta defasagem, é citada a ausência de dados
estatísticos e indicadores confiáveis. Assim, destaca-se a importância de discutir o modelo de
financiamento da segurança pública, buscando formas estáveis para o financiamento do
sistema. Propõe uma profissionalização na gestão de segurança que seja alimentada por
metodologias de avaliação de políticas públicas e por indicadores de desempenho da
segurança pública. Outra proposta do eixo consiste na criação de um observatório nacional de
segurança pública pelo Ministério da Justiça para formular, monitorar indicadores nacionais e
disponibilizar informações aos estados e municípios. No final, discute-se o papel da
segurança privada no sistema público de segurança e a necessidade de uma política
regulatória para fiscalizá-la.
O Eixo 3 trata da “Valorização profissional e otimização das condições de trabalho”.
Analisa que grande parte dos trabalhadores de segurança pública não se sente
profissionalmente realizada e não se sente reconhecida. O texto propõe que o papel do policial
também é de um educador que deve ser valorizado e destaca a importância de investimento
em formação, qualificação e melhores condições de trabalho. Além disto, discute-se a
necessidade de programas de promoção da saúde integral do policial e a otimização das
condições de trabalho. Tal aspecto está acompanhado pela definição de patamares mínimos
de vencimento para os profissionais de segurança pública visando um novo regime de jornada
de trabalho. Finalmente, aponta-se a construção de mecanismos de modernização das
academias e centros de formação das instituições de segurança pública.
O Eixo 4 aborda a “Repressão qualificada da criminalidade”. O modelo tradicional
de segurança pública investe em viaturas, armamentos e possui pouco sucesso no combate e
prevenção da criminalidade. O eixo propõe uma modernização da ação policial por meio do
51
policiamento de proximidade, que prevê maior interação com a comunidade, “já o incremento
da polícia técnica-científica, o aperfeiçoamento dos métodos de investigação criminal e
persecução aumentam as possibilidades de resolução dos crimes” (BRASIL, 2009:29). Na
sequência, destacam-se as “estratégias de diminuição da letalidade policial” que incluam a
incorporação de tecnologia menos letal. Por último, trata-se de outro tema polêmico: “a
repressão policial a grupos sociais vulneráveis”, pois se considera que “a ação policial
repressiva deve incluir estratégias de reconhecimento da heterogeneidade social presente nas
comunidades vulneráveis” (Ibidem, p. 30). Embora o título do eixo seja repressão qualificada
da criminalidade, os argumentos levantados no texto parecem usar com cautela o termo
“repressão”, entretanto, em alguns momentos o termo é utilizado sem tanta clareza quanto ao
seu objetivo.
O Eixo 5 trata da “Prevenção social do crime e das violências e construção da cultura
de paz” e situa-se contraditoriamente logo após a discussão sobre repressão qualificada. O
eixo ressalta a multicausalidade do fenômeno da violência e aposta na “articulação entre as
ações preventivas policiais e ações não policiais focadas na redução do crime e da violência”,
ou seja, prevê ações sociais mo repertório de prevenção (Ibidem, p. 31). As estratégias de
desarmamento e a garantia de implementação do Estatuto do Desarmamento são consideradas
passos fundamentais para a restrição da circulação de armas de fogo. Outro aspecto da política
preventiva, diz respeito ao policiamento comunitário. Discute-se também que a ampliação dos
atores envolvidos na elaboração e implementação das políticas públicas envolve a
responsabilização de outros órgãos do poder público para a intersetorialidade da política de
segurança. Por último, destaca-se o papel dos meios de comunicação em torno do debate da
violência e criminalidade. Assim, propõe-se um “diálogo permanente entre os profissionais de
comunicação, gestores e trabalhadores da segurança pública e especialistas na área” (Ibidem,
p. 33).
O Eixo 6 intitula-se “Diretrizes para o Sistema Penitenciário”. A partir dos desafios
enfrentados pelo Sistema Penitenciário, discute-se que a política nacional deve tratar da
promoção integração social e da cidadania. Já no que tange a gestão da política criminal, o
texto propõe que o financiamento e gestão da política criminal “devem ser construídos com
foco na participação, na prevenção à criminalidade na promoção de segurança” (Ibidem, p.
34). O Sistema Prisional pode contar com mecanismos de controle formal (corregedorias,
ouvidorias e inspetorias). A qualificação dos trabalhadores e gestores da administração
penitenciária é uma forma de assegurar a capacitação destes profissionais. Por fim, ressalta a
52
importância de que o atendimento e a infraestrutura das penitenciárias reconheçam as
especificidades de gênero.
O Eixo 7 trata das “Diretrizes para o Sistema de Prevenção, Atendimentos
Emergenciais e Acidentes”. Os grandes centros metropolitanos enfrentam problemas advindos
do processo de urbanização (enchentes, incêndios), o que demanda o aperfeiçoamento dos
sistemas de emergência por meio dos investimentos nos sistemas de prevenção e emergências.
O texto propõe a expansão do número de cidades atendidas pelos sistemas emergências,
aumentar a eficiência dos sistemas emergenciais e desenvolver projetos preventivos sociais
comunitários.
3.5 Observações da Conferência Municipal de Florianópolis
A Conferência Municipal de Segurança de Florianópolis realizou-se durante os dias 6
a 8 (de quarta-feira a sexta-feira) de maio, na Acadepol – Academia de Polícia Civil situada
em Florianópolis. Logo, a Conferência ocorreu em dias de semana, principalmente no período
da manhã e da tarde, em pleno horário de trabalho. Isso pode ter dificultado a participação da
sociedade civil e de muitos outros presentes. É importante ressaltar que o próprio local de
realização da conferência já informa muito sobre o perfil dos responsáveis pela organização,
pois não se trata somente de uma infra-estrutura física adequada. Ou seja, o local reflete
aspectos de organização que se desdobram na própria participação da sociedade civil. A
Acadepol além de muito distante do centro de Florianópolis ou da Universidade Federal de
Santa Catarina, também pode ser simbolicamente um espaço distante para os que não são
profissionais de segurança pública.
A partir de então, pude perceber a grande participação da guarda municipal de
Florianópolis na organização desta etapa da Conferência e, de uma forma mais geral, a sua
participação nos eixos. O meu conhecimento sobre a 1ª Conseg, e mais especificamente sobre
a Conferência Municipal de Florianópolis, ocorreu a partir do contato com a Guarda
Municipal de Florianópolis Andresa Ventura, formada em Ciências Sociais pela UFSC e
pesquisadora no Laboratório de Estudos das Violências. Recebi o convite de Ventura para
participar da atividade de mediação nos grupos de trabalho da Conferência. Este convite
concretizou-se pela Comissão de Organização acreditar que a universidade seria mais isenta
para desenvolver este tipo de atividade do que somente os policiais. Contudo, embora a
Comissão de Organização da conferência tenha buscado universitários, as atividades de
53
relatoria e mediação acabaram sendo desenvolvidas por Oficiais da Polícia Militar, Guardas-
Municipais, Policiais Civis, entre outros.
No primeiro dia de conferência (06/05/2009), cheguei ao local por volta das 17:40 h
da tarde e neste momento cerca de 10 oficiais já marcavam presença e seriam constantes nos
demais dias. Inicialmente, fiquei bastante confusa, pois apenas conhecia duas guardas
municipais, enquanto as outras pessoas, especialmente os membros da COE – Comissão
Organizadora Estadual, já se conheciam de etapas anteriores. Neste dia, conversei primeiro
com um dos Coronéis, membro da COE e perguntei como estavam as etapas da Conferência
no Estado. Ele comentou que acompanhou a Conferência realizada em Chapecó e que a
Polícia Militar havia realizado uma Conferência Livre dos Policiais Militares na semana
anterior a conferência, em um hotel de Florianópolis. Enfatizou que não se tratava de uma
Conferência dos Oficiais, mas sim dos Policiais Militares. Isto é importante destacar, pois
existe um racha visível entre estas duas categorias – ambos não dialogaram ao longo do
evento.
Acredito que as Conferências Livres desempenham um papel interessante a ser
observado, no sentido de promoverem a articulação de propostas consolidadas dentro dos
grupos para serem encaminhadas à Conferência Estadual. Outras instituições também
realizaram suas próprias Conferências Livres, muitas vezes mobilizadas dentro de um tema de
interesse na Conferência. Discorrerei posteriormente, sobre os possíveis sentidos e proporção
destas conferências em Santa Catarina e no país.
Na medida em que os participantes iam chegando, formavam-se grupos no hall de
entrada. Os membros da APRASC trajavam camisas brancas e não o uniforme da PM. Os
Oficiais da Polícia Militar estavam rigorosamente fardados, o que apontava a primeira
impressão de racha. Além do mais, os Oficiais compuseram um dos grupos mais articulados e
perceptíveis durantes os três dias da Conferência. Os Guardas-Municipais de Florianópolis
desempenharam um papel de destaque em nome da prefeitura municipal na organização do
evento. Posteriormente, soube da participação das psicólogas policiais, que lançaram uma
candidata da sociedade civil. Da sociedade civil, havia alguns membros da ONG LGBTT
“Arco-Íris”, e um destes viria a candidatar-se. A participação da sociedade civil não despertou
atenção inicialmente. Só consegui identificá-la especialmente no período de votação, ao longo
dos três dias de Conferência.
54
Imagem 1: Auditório da Acadepol
Fonte: Guarda Municipal de Florianópolis
O auditório da Acadepol tem capacidade para 200 pessoas, mas estiveram presentes
cerca de 100 pessoas. As primeiras cadeiras estavam reservadas para oficiais, membros da
guarda, representantes da prefeitura. Mais atrás sentaram-se os guardas-municipais de
Florianópolis, na sequência, os de São José. Nas últimas fileiras estavam os membros da
APRASC (em torno de 10 pessoas) e havia também uma representante da Associação das
Mulheres dos Praças (as “Mulheres que Lutam”), trajando camiseta roxa e que também
compareceu todos os dias. Conheci inicialmente, alguns poucos membros da sociedade civil,
um estudante de Direito e membro do Programa de Ensino Tutorial – PET e Daniela Félix,
mestre em Direito e que integrou a COE.
A Conferência iniciou com atraso, por volta das 19:30 h. A mesa de abertura foi
iniciada por Dias, diretor da Guarda Municipal de Florianópolis. A tabela 1 descreve a
composição da mesa de abertura26, fator interessante para perceber quais instituições estavam
presentes ou ausentes. Convém ressaltar que apesar da prefeitura municipal estar encarregada
da organização da conferência, o prefeito Dário Berger não esteve presente na Conferência.
26 O mestre de cerimônia da conferência mencionou a presença das seguintes pessoas: Tenente Coronel João Schotner de Amorim – representando o comando geral da Polícia Militar, Júlio Machado – diretor da Guarda Municipal, Del. Ildo Rosa, Moisés Menezes - comandante da guarda municipal de São José, Fabiana de Macedo - representante do Conselho da Mulher, Dalva Calper coordenadora de políticas públicas para a mulher, Theophilos Rifiotis – coordenador do Levis, Sebastião de Souza presidente do Conselho de Canasvieiras, Ricardo Camargo Vieira, vereador.
55
Quadro 4: Composição da Mesa de Abertura
Nome Cargo/Instituição que representa
1. Marcos Pamplona Coordenador da Conferência Estadual 2. Dita Pereira Secretário Municipal de São José,
(representando Djalma Berger) 3. Deputado Amaury Soares Deputado Estadual, (representando a
Assembléia Legislativa) 4. Ronaldo Benedet Secretário de Segurança 5. Wagner Moura Mobilizador da 1ª Conseg (representante do
Ministério da Justiça (organizador das conferências em Santa Catarina e Rio Grande do Sul)
6. Jean Loureiro Representa a Câmara de Florianópolis 7. Rubens Carlos Elias Representa o prefeito Dário Berger. 8. Coronel Edson de Souza Secretário da Defesa (representando o
prefeito de São José) Fonte: autora
Imagem 2: Mesa de abertura da Conferência Municipal de Florianópolis
Fonte: Guarda Municipal de Florianópolis
As falas das autoridades foram um pouco longas e nesta noite também estava
prevista a palestra do professor da UFSC Theophilos Rifiotis. Destacarei apenas alguns
discursos que considerei mais interessantes, como o de Wagner Moura, mobilizador da
conferência e que ressaltou a importância do momento histórico que acontece no país em
56
relação ao tema da segurança pública. Após saudar todos os presentes, especialmente o
Secretário de Segurança Pública de Florianópolis, o Secretário de Segurança Pública do
Estado e o Deputado Amaury Soares, entre outros, dimensionou um pouco das expectativas
do Ministério da Justiça. Nesta perspectiva, a Conferência emerge como um processo de
mobilização de segmentos que até então não compartilhavam soluções, ou seja, como um
aprendizado, um processo, mais do que um resultado final capaz de “solucionar” todos os
impasses da área:
“Gostaria de dizer que este processo de mobilização que passa o país, nós do Ministério da Justiça não temos dúvida de afirmar que recém temos iniciado esse processo, (...), pautar um novo modelo de construção dessa política pública que aplica tantos e tantos sonhos de uma eficiência e eficácia que possa responder de forma a refletir aquilo que a sociedade espera. Evidentemente nós não vamos resolver todos os problemas que tem que ser resolvidos (...), mas por outro lado a gente não tem dúvida que com a conferência inicia um modelo que, no mínimo, vem colocando, na melhor das expectativas, esse processo de mobilização de segmentos que até então não dispunham de uma ferramenta de gestão para sentar e discutir de maneira compartilhada soluções. A resposta da sociedade é melhor do que poderíamos estar esperando. Santa Catarina tem sido receptiva e vem acontecendo um processo de mobilização. Nos dias 24, 25 e 26 ocorrerá a Conferência Estadual. Sabemos que nossa democracia é nova, sem uma polícia que funciona, mas precisamos melhorá-la (...)”. (Grifo meu)
Outro discurso que abordo, é o do Deputado Amaury Soares, também sargento da
Polícia Militar e presidente da APRASC, que representou a Assembléia Legislativa, e diria
que também, os praças da PM. A participação do Deputado Amaury Soares em diversas
etapas representa um recurso organizacional da APRASC, pois o Deputado manifesta os
interesses desta associação. Diferentemente do discurso de outras autoridades, cumprimentou
os integrantes do Sindicato dos Trabalhadores em Segurança Pública - SINTRASP, Sindicato
dos Trabalhadores no Serviço Público Estadual de Santa Catarina, e claro, os praças da
Polícia Militar. Assim, teceu uma reflexão sobre o enorme desafio que é o diálogo:
“É a 1ª Conferência, o desafio que abraçaram é imenso pois não existe a cultura do diálogo entre iguais. O desafio é imenso porque a maioria dos trabalhadores não tem o direito reconhecido de manifestar a sua opinião. É preciso partir do pressuposto que todos podem falar de igual para igual. É preciso reconhecer o seu direito de organização27. Para debater é preciso organizar a demanda e partir do pressuposto da autonomia. Os praças que estão aqui hoje, estão de teimosos. (...) Estamos todos dispostos ao diálogo. (...)”.
O secretário de Segurança Pública de Santa Catarina esteve presente na cerimônia de
abertura e também destacou a importância histórica do momento. No seu discurso abordou
diversos temas que envolvem a área da segurança pública de forma superficial. Mencionou a
inadequação do Código Penal vigente, mostrou indignação com relação à Lei Anti-Drogas,
27 Provavelmente referia-se a greve dos policiais militares.
57
que estaria mostrando-se ineficiente por apenas liberar o usuário com um Termo
Circunstanciado. Generalizou, ainda, ao citar que 80% dos homicídios são por causa das
drogas. Talvez o ponto mais importante de sua fala esteja relacionado a participação da mídia
que contribui para a construção simbólica da violência e que esteve ausente em toda a
conferência. Cito um pequeno trecho, no qual relaciona a área da segurança pública com a
saúde (sem desenvolver esta reflexão), e destaca que questões de segurança “não são só
questão de polícia”, o que se refere a um debate que permeia a própria conferência.
“A saúde pública avançou porque encarou os problemas de frente. Os EUA que tem leis mais rígidas e tem a maior população carcerária do mundo. A esquerda destaca o problema social, e a direita quer punir. Temos que focar o debate para encontrar soluções Questões de segurança não são só questão de polícia. Pena que tanta gente fala, é muito fácil vender na mídia, e hoje a gente não vê aqui participação. Segurança não é como educação que você sabe e aprende, é uma sensação que passa isto e tem que ser discutida também. Espero que mais cidadãos participem. Meus parabéns”.
A última fala da noite foi a palestra proferida pelo antropólogo e professor da UFSC
Theophilos Rifiotis, coordenador do Laboratório de Estudos da Violência, intitulada “Co-
produção de segurança pública”. Convém destacar que o formato da Conferência buscou
sempre trazer algum palestrante que fosse pesquisador na área28. Na sua argüição, Rifiotis fez
ressalvas quanto à idéia de participação, as formas pelas quais é possível estabelecê-la,
especialmente por relacionar parceiros de instituições diferentes, o que por sua vez, é
essencial dentro da Conferência. Algo que despertou atenção dos policiais presentes foi a
importância de compreender a própria prática do policial, que na maior parte do seu tempo
desenvolve ações rotineiras.
Após o encerramento da cerimônia de abertura, ocorreu um coquetel que era um
espaço de socialização mais informal. Neste momento, conheci um membro da Associação
dos Moradores da Serrinha e que questionou se a escolha do local havia influenciado na pouca
participação da sociedade civil. Já neste momento de conferência, alguns questionamentos
que norteiam o trabalho surgiram: será que o local da Conferência interferiu na participação
da sociedade civil? Qual é a contribuição da organização da Conferência na divulgação e
participação da sociedade civil?
No segundo dia da Conferência (07/05/2009), ocorreu na parte da manhã a
contextualização da metodologia que foi realizada pelo mobilizador da etapa em Santa
Catarina e Rio Grande do Sul, que também apresentou o texto-base e explicou as minúcias do
28 Por exemplo, em Joinville esteve presente Marcos Rolim, mestre em Sociologia e consultor em segurança pública e Direitos Humanos. Em Blumenau, esteve presente a antropóloga Luciane Patrício, que representou o Ministério da Justiça e na Conferência Livre de São José o juiz e professor Rubens Roberto Rebello Casara, Doutorando em Ciências Criminais.
58
processo eletivo que ocorreria no dia seguinte. Destacou que todas as etapas geram um
relatório padrão e que em cada etapa são escolhidos até 7 princípios e 21 diretrizes. Discorreu
sobre uma regra que é nova em relação às demais conferências: as etapas municipais eletivas
elegem representantes diretamente para a etapa nacional. Assim, valorizam-se as conferências
nos municípios.
É necessário refletir sobre o papel desempenhado pelo mobilizador em cada estado,
pois este pode contribuir para a articulação das Conferências Livres e também na organização
e orientação das mesmas. Na verdade, isto também é um elemento a ser considerado para
compreender a quantidade de Conferências Livres em nível nacional. Além disto, o
mobilizador dimensionou o próprio horizonte das expectativas com relação à Conferência
Estadual, ressaltando que o processo é longo, resultante do acúmulo social proporcionado pela
própria mobilização:
“Esse é um processo longo, nem tudo que a gente tem expectativa vai estar acontecendo nessa 1ª Conferência Nacional. Eu falava da saúde, ela já realizou mais de 10 conferências, tá indo pra 13ª, se eu não me engano. Então é um processo que tem muito acúmulo social, seja da parte dos trabalhadores, seja dos gestores, seja da sociedade civil. (...) Então eu pediria para que a gente tenha inclusive uma certa generosidade com nós mesmos envolvendo o processo. Lembrando que nós teremos muitas oportunidades no decorrer da história para ir qualificando esse processo participativo. E só iniciando nós poderemos dar continuidade. (...) Esse momento é fato, é um momento histórico, um momento de largada e na sequência a gente vai qualificando. Quem sabe daqui a dois anos, quando ocorrer a 2ª Conferência aqui em Florianópolis, a gente vai ter um processo ainda mais vibrante, mais qualificado do que o que vamos ter nestes três dias”.
Outro aspecto interessante de suas explanações realizadas no segundo dia, diz
respeito à relação estabelecida com as conferências de saúde, apreendidas enquanto um
“norte”, um “ideal” a ser atingido pela Conferência Municipal. Em outros momentos esta
referência esteve presente, aliás, o próprio texto-base da 1ª Conseg utiliza as Conferências de
Saúde para reforçar a idéia de que a conferência não é algo novo, pois existem desde 1942,
data da primeira conferência de saúde. Contudo, mesmo a Conferência de Saúde sendo
referência, não há no discurso do mobilizador menção aos condicionantes da participação
nesta área, a exemplo do movimento sanitarista.
No Relatório da Conferência Municipal de Florianópolis (2009, p. 4), a presença do
mobilizador é descrita como decisiva, ou seja, enquanto “peça chave” para a própria
Comissão Organizadora Estadual no decorrer do processo:
É importante ressaltar que a presença do Sr. Wagner Moura foi decisiva nessa etapa municipal, pois ele a todo o momento era peça chave, tanto nas dúvidas, que iam surgindo no decorrer da Conferência, quanto no auxílio às decisões da Comissão Organizadora. Portanto, cabe salientar, que seu esforço em participar da Conferência, foi fundamental para os ótimos resultados alcançados com o evento.
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No intervalo da manhã, alguns guardas municipais de São José comentaram sobre a
Conferência Livre que organizariam em maio sobre o tema do eixo 4: “a construção de uma
cultura da paz”. Convém comentar que duas das diretrizes levantadas pela Guarda Municipal
de São José, a municipalização da segurança pública - que consiste em dar autonomia aos
municípios pensarem a aplicação dos recursos - e a polícia comunitária foram aprovadas na
conferência. Outra diretriz que foi defendida pelos guardas municipais tanto de Florianópolis
quanto de São José, foi o “reconhecimento do poder de polícia da guarda municipal”.
Questionei a uma Guarda Municipal sobre o que afinal de contas seria o “poder de polícia” e
a mesma informou que se tratava de reconhecer um poder que institucionalmente já possuem,
mas que não era reconhecido por outras forças policiais.
Após o intervalo, o Delegado da Polícia Federal Ildo Rosa proferiu a palestra “Crime
e Violência, educação e prevenção: uma opção de cada um”, na qual tratou especialmente
sobre a experiência da Colômbia e as ações que foram lá implementadas e culminaram na
redução das taxas de homicídios. Após o encerramento da palestra, ocorreu o momento de
articulação das candidaturas e escolha dos eixos temáticos. Não havia um momento específico
na programação para que os candidatos expusessem suas idéias publicamente, o que fez com
que as alianças ocorressem de forma informal. Os nomes das candidaturas tinham que ser
definidos até às 16:00h da tarde, ou seja, havia poucas horas para a definição dos nomes.
Assim, antes e durante o almoço, os grupos procuraram articular os nomes no “boca-a-boca”.
O próprio mobilizador respondeu que não existia a previsão de tempo para defesa de
candidatura. “A defesa de candidatura é feita no “olho no olho”, na circulação que cada um
faz, não tem espaço onde vai ser possível abrir 2, 3, 5 minutos”, ressaltou. Isto é outra
característica do próprio desenho institucional da Conferência a ser considerada.
Na etapa municipal eletiva, os trabalhadores de segurança pública puderam eleger um
trabalhador municipal, ou seja, esta vaga ficou ao encargo da Guarda Municipal de
Florianópolis. Foram reservadas duas vagas para a Guarda Municipal em Santa Catarina,
contudo, os demais municípios eleitos não possuem Guarda Municipal.
A Guarda Municipal reuniu-se para tirar um único nome como representante dos
trabalhadores da segurança. A APRASC reuniu-se com os membros da sociedade civil que ali
estavam: Alexandre Gouveia da ONG Arco-Íris, e outros membros da ONG, representante do
Movimento Negro Unificado, representante do DCE da UFSC, que discutiram amplamente
para fechar um único nome que se comprometesse a levar as questões de todos os segmentos
em frente. Não acompanhei diretamente esta discussão, por não conhecer muito as pessoas e
60
também por estar preocupada com a atividade de relatoria que desenvolveria à tarde. No fim,
este grupo da sociedade civil decidiu pela candidatura de Gouveia e fizeram aliança com os
membros da APRASC.
O mobilizador também enfatizou que policial militar na ativa não poderia candidatar-
se a uma vaga da sociedade civil, mesmo que tivesse uma atuação comunitária. Logo, é
estabelecida uma distinção entre policial militar na ativa e aposentado, pois estes últimos
podem se candidatar a uma vaga. Isto ocorreu na etapa estadual, na qual um policial militar
aposentado foi eleito representante da sociedade civil pela sociedade.
Na eleição, era necessário votar em três nomes da sociedade civil e nos trabalhadores
da segurança pública. Com relação à sociedade civil, não poderia haver três candidatos
pertencentes a uma mesma entidade. Assim sendo, os grupos precisavam estabelecer alianças
entre eles para que pudessem viabilizar as candidaturas. Os trabalhadores votavam na
sociedade civil e vice-versa para propiciar maior interação entre os segmentos. Outro detalhe:
era obrigatório votar em um nome feminino para cumprir a representação de gênero e não era
possível deixar um nome em branco, pois os votos seriam anulados.
Cada participante escolhia em qual dos sete eixos gostaria de participar e inscrevia-se
nele. Para melhor compreensão sobre as etapas da Conferência Municipal, exponho o
fluxograma metodológico extraído do Manual Metodológico da Conferência, o qual também
orientou a realização das conferências estaduais.
Fonte: Manual Metodológico
61
Como já havia sido previamente, fui convidada para participar das atividades de
mediação dentro dos grupos temáticos. Participei de uma breve reunião coordenada pelo
mobilizador que contou com a presença de vários integrantes da Comissão Organizadora
Estadual – COE. Nesta reunião, dividiu-se o grupo entre mediadores e relatores, de acordo
com os eixos temáticos. Wagner Moura teceu breves considerações sobre a metodologia da
Conferência, especialmente no que se referia à diferenciação entre os princípios e diretrizes,
além das atribuições do mediador e do relator. Assim, explicitou que o mediador deveria
controlar o tempo de fala de todos os participantes, priorizar a circulação da fala e também
tomar cuidado para não “falar demais”. Mencionou ainda que o texto-base é importante para
balizar o debate, mas não é “camisa de força”. Optei por desenvolver atividades de relatora e
não de mediadora, por considerar um pouco complicada esta tarefa, pois era necessário
organizar o debate e sistematizar os argumentos. Neste momento, considerei interessante atuar
no eixo 2, que tratava da gestão da política pública de segurança.
O encontro iniciou às 14:00h na sala de aula da Acadepol. Cada membro apresentou-
se dizendo o nome e qual a sua instituição. Apresentei-me como pesquisadora da UFSC.
Compuseram este eixo quatro integrantes da Guarda Municipal de Florianópolis e um
integrante da Guarda Municipal de São José, quatro representantes da Polícia Militar (Coronel
J., Major A. e Tenente W., Praça N.) e dois representantes do Conseg, um deles também no
sistema prisional. Em relação aos outros grupos, este possuía um tamanho médio com 13
integrantes, tendo em vista que havia grupos menores com 3 ou 4 integrantes, como o do eixo
6, ou grupos maiores, como eixo 4 e eixo 5. Outro aspecto relevante da composição deste
grupo, diz respeito à participação essencialmente de trabalhadores e gestores da segurança
pública. Uma interrogação emerge desta observação: em que medida o tema “políticas
públicas” atrai mais integrantes do próprio Sistema de Segurança Pública em detrenimento
de representantes da sociedade civil? Em que medida o próprio desenho institucional da
Conferência possibilita estas divisões? Tratarei desta questão com maiores detalhes no
capítulo quatro, a partir dos dados obtidos tanto no questionário aplicado e nas informações
das pré-inscrições.
O mediador do eixo foi o membro da COE, assessor do Secretário de Segurança
Pública e que acompanhou diversas etapas da Conferência no estado. Inicialmente, o
mediador esclareceu que do eixo sairiam no máximo 3 princípios e 7 diretrizes.
Complementei com a explicação dada por Wagner Moura sobre a diferença entre princípio e
diretriz. O princípio seria uma frase afirmativa que demonstra convicção, um valor
fundamental ou conjunto de valores que aponta o que é fundamental para a política nacional
62
de segurança pública. Já a diretriz estaria relacionada com o eixo e seria uma idéia para ser
traduzida em um conjunto de ações.
Primeiramente, o texto-base foi lido pelo mediador e por outros participantes do eixo
da página 7 a 17, depois da página 25 a 26. Cada participante ia colocando suas questões que
depois eram debatidas coletivamente. Nesta etapa inicial não houve a preocupação de
distinguir diretrizes e princípios.
“Segurança pública como política de Estado” foi levantada pelo Coronel J., que
comentou sobre a polícia como trabalho de organização da sociedade toda, e que não pode
mais ser política de governo, pois a descontinuidade é um problema. “Segurança Pública
voltada para o cidadão” também foi abordada. O grupo concordou com a necessidade de
considerar segurança pública como política de estado. A. da Guarda Municipal abordou a
necessidade da formação do policial e de maior qualificação.
“Política pública pautada nos direitos humanos” foi abordada pela integrante da
Guarda Municipal que destacou a necessidade de fomentar projetos e planos que tratassem
dos direitos humanos, da valorização do ser humano que considerem como primordial os
direitos humanos dos cidadãos e agentes. O Coronel J. reforçou esta colocação ao tratar de
“polícias públicas para a prevenção”. Ou seja, para ele, dever-se-ia discutir “ordem pública”.
Citou como exemplo o projeto educacional desenvolvido pela polícia militar na Chico
Mendes, que culminaria em um conjunto de ações que geram bem-estar social e estaria
relacionado com a comunidade. Na discussão com o grupo, todos concordaram com esta
colocação. Coronel A. reforçou a idéia de “políticas públicas para a prevenção com a
participação da comunidade”. Para ele, a política pública deve priorizar a prevenção. Citou
como exemplo o projeto PROERD, que, segundo o Coronel, faz com que os jovens evitem
cometer delitos. Destacou a necessidade de assegurar que haja recursos para estes projetos,
pois estes possibilitam a inclusão social. Por último, o Coronel A. apontou como problema a
descontinuidade entre as políticas públicas. A partir da discussão sobre segurança pública
com prevenção, a Guarda Municipal ressaltou a importância de “verbas fixas para a
segurança”, a exemplo do que acontece na área da educação. Coronel A. destacou a
necessidade de um percentual definido, uma regra que valha permanentemente, ou seja, uma
política nacional que trate do orçamento. Pela fala de A. e da Guarda Municipal, levantou-se
o debate sobre “adoção orçamentária fixa para a segurança, como ocorre na educação, saúde”.
O Guarda Municipal A. comentou que uma verba que poderia ser utilizada na segurança às
vezes é gasta numa política de governo voltada para o interesse próprio, ou seja, o dinheiro
acabaria sendo aplicado quando houvesse interesse.
63
Então, F., da GM, questionou sobre quem iria gerar a verba e debateu-se sobre “o
conselho que gerencie a administração financeira dos recursos na segurança pública” e
envolvesse sociedade civil, polícia... M., do Conseg, ressaltou a necessidade do orçamento ser
diretamente voltado para a segurança através de mecanismos que obrigassem isso, para que
não se caísse nas “armadilhas da democracia”. S., do Conseg ressaltou a necessidade de ter
um Conselho Municipal de Segurança Pública que envolvesse diferentes entidades e
culminasse na criação de um fundo de segurança.
Após este debate sobre os recursos e gestão, o policial aposentado N. levantou a
importância dos dados estatísticos, algo que embora fosse atribuição deste eixo, não havia
sido discutido. Como policial aposentado, expôs como diretriz a “desmilitarização da polícia”
e disse defender a unificação da Polícia Militar e da Política Civil – algo que não estava sendo
debatido neste eixo. Levantou-se então a necessidade de um banco de dados nacional. G., da
Guarda Municipal, ressaltou a necessidade de padronização dos dados para a consulta pública.
Coronel A. levantou então a ideia de um “sistema único e completo de informações”, para que
a instituição que primeiro gerasse determinada informação, fosse registrada e que não
houvesse repetição. F., da GM, comentou que atualmente o SAMU e bombeiros geram a
mesma ocorrência e se houvesse um sistema único com unificação das informações, isto não
ocorreria. A., da GM, destacou a importância de uma “central única de atendimento de
ocorrências” que agregue as informações em um mesmo banco de dados. Outra guarda
levantou então a necessidade da unificação do registro das informações e de sua padronização
para que não ocorressem diferenças.
O intervalo do eixo ocorreu no meio da tarde, o que possibilitou a conversa entre os
participantes de diferentes eixos, bem como o conhecimento do que estava sendo debatido em
cada eixo. A maioria dos grupos participou deste momento e considero os Oficiais da Polícia
um grupo organizado e que verificou se a diretriz do seu interesse havia entrado ou não em
algum eixo. Assim, pelo que pude observar no eixo temático do qual participei, os Oficiais
trouxeram propostas previamente articuladas dentro do seu grupo. Após o intervalo da tarde
do eixo, um dos Oficiais presentes apresentou uma proposta previamente escrita ao grupo e
que foi aceita. O comentário entre os oficiais após a reunião dos eixos, era saber se aquela
proposta previamente combinada havia sido aceita em algum eixo para que pudessem votar
nela na sexta-feira.
O grupo retornou após o intervalo. S., do Conseg, relatou o problema das milícias e da
segurança privada e propôs uma política regulatória na segurança. O Coronel A. concordou e
destacou a possibilidade de estabelecer mecanismos para a regulamentação da segurança
64
privada no controle e supervisão das empresas de segurança. Após o início da formulação dos
princípios e diretrizes e após a discussão, o Coronel A. leu para o grupo uma proposta
previamente formulada: “Estabelecer o ciclo completo para as polícias nas respectivas áreas
de atuação29”. Diferentemente das outras, esta proposta mal chegou a ser discutida e esta
diretriz teve votação maciça por parte dos Oficiais.
Após os debates que ocorreram até o final do tarde, os princípios e diretrizes foram
formulados sem grandes dificuldades ou polêmicas. Em outros grupos, soube que as
discussões foram mais acirradas, a exemplo do eixo 4, que contava com maior diversidade
entre os segmentos. Estão listados abaixo os princípios e diretrizes formulados:
Princípios 1. Segurança Pública como política de Estado. 2. Criação de um sistema único de informação. 3. Segurança pública pautada nos direitos humanos.
Diretrizes
1. Criação de conselho gestor deliberativo de segurança pública formado por trabalhadores de segurança pública, sociedade civil organizada, poder público e entes federativos.
2. Implementação de uma dotação orçamentária na Lei de Responsabilidade Fiscal para a segurança pública.
3. Padronização nos registros de ocorrência e sistema único de informações. 4. Central unificada dos órgãos de segurança pública para o atendimento de
emergências. 5. Controle e supervisão dos serviços de empresas de segurança privada e de
monitoramento eletrônico pelos órgãos do Estado. 6. Maior investimento em políticas públicas preventivas. 7. Estabelecer o ciclo completo para as polícias nas respectivas áreas de atuação.
Após o término das atividades dentro dos eixos temáticos, os mediadores e relatores
produziam um sintético relatório com informações gerais sobre o número de participantes e
como transcorreram os debates. Além disto, os mediadores e relatores também atuaram na
sistematização dos princípios e diretrizes, na medida em que estes poderiam esclarecer
possíveis dúvidas quanto à especificidade de cada proposta formulada. Neste momento, foram
29 Segundo Costa (2009), o ciclo completo consiste na execução das funções judiciário-investigativa e ostensivo-preventiva pela mesma instituição policial.
65
compilados os princípios e diretrizes de acordo com cada eixo para a votação que ocorreria no
dia seguinte.
No terceiro dia de conferência, os princípios e diretrizes elaborados nos eixos
temáticos ficaram expostos em cartazes no pátio da Acadepol, o que caracterizou um
momento mais informal da Conferência, a fim de que as propostas fossem discutidas e
votadas. Este processo durou cerca de uma hora e cada participante recebeu 10 bolinhas para
votar nas diretrizes e princípios, podendo votar no máximo três vezes em cada proposta.
Assim, os grupos interessados em determinadas propostas marcavam presença e rodeavam as
suas propostas, conforme está retratado no fundo da imagem abaixo. Neste momento, os
participantes também decidiram em quais delegados votariam da sociedade civil e dos
trabalhadores. Acredito que muitos arranjos já haviam sido feitos, do tipo: quem votaria em
determinada proposta para ter apoio no momento da eleição?
Imagem 3: Momento interativo de votação
Fonte: Guarda Municipal
Logo após a votação dos princípios e diretrizes, teve início a eleição dos delegados
que participariam da Conferência Nacional. A Conferência Municipal teve como prerrogativa
eleger um representante dos trabalhadores e um da sociedade civil. Dos candidatos da
sociedade civil, a candidatura de Alexandre Martins emergiu de conversas ocorridas na tarde
do dia anterior. Ele foi o único candidato que trouxe propostas formuladas previamente, bem
66
como quais grupos estavam apoiando-o. Tal qual um candidato em eleição, fez a sua
campanha com o material que expunha:
Processo de indicação: “Nossa candidatura se deu em negociação e por consenso em reunião das entidades representativas da sociedade civil e cidadãos interessados, entendendo que o critério desta escolha é o de compromisso com o coletivo e não a representação individual. Estiveram presentes as seguintes entidades:
• ADEH Nostro Mundo; • APRASC; • Associação Estrela-Guia; • Centro Cultural Escrava Anastácia; • Conselho Regional de Psicologia; • Diretório Central dos Estudantes – DCE – UFSC; • Movimento Negro Unificado – MNU; • Movimento GLBT; • Sindicato dos Trabalhadores em Saúde;
Dentre suas propostas principais, destaco algumas: defesa incondicional dos Direitos
Humanos, compreendendo-os na sua essência de princípios fundamentais, a todos os
cidadãos, incluídos os trabalhadores da Segurança Pública; combate a todas as formas de
preconceito étnico/raciais, de orientação sexual ou identidade de gênero; por uma Segurança
Pública concebida no espírito de coletividade, contrário à apresentação individualizante
contida no texto-base; desmilitarização da Segurança Pública; defesa da inclusão da
Promoção da Segurança Pública para além das questões preventivas e repressivas, que
contempla, por exemplo, a “construção da cultura da paz”. Destaco estas diretrizes para
chama a atenção sobre de que forma os participantes da sociedade civil e trabalhadores
articularam-se para a eleição de representantes e na agregação de interesses.
No total, dez pessoas candidataram-se a uma vaga de representante da sociedade civil.
Nestas candidaturas fizeram-se presentes dois representantes do Conseg de Canasvieiras, um
representante do Conseg de Carianos, um representante da Grande Oriente Brasil, um
representante da Fraternidade Feminina, uma representante do Conselho Regional de
Psicologia e um representante da Pastoral Carcerária. Os eleitores contabilizaram 93 pessoas.
Apesar da campanha, Alexandre Gouveia não conseguiu eleger-se, pois quem se elegeu foi a
representante do Conseg. Já no que se refere aos trabalhadores, elegeu-se a Guarda Municipal
Andresa Ventura com consenso.
A última etapa da Conferência foi realizada no auditório da Acadepol. Neste
momento, contabilizaram-se os votos de cada princípio e diretriz, observando-se a diretriz
67
mais votada em cada eixo temático, o que é outro aspecto do desenho institucional da
Conferência que merece ser considerado. Na imagem 11, é possível visualizar novamente a
atuação da Guarda Municipal de Florianópolis no processo de organização da Conferência.
Imagem 4: Momento de apuração do resultados
Fonte: Guarda Municipal de Florianópolis
A diretriz mais votada foi a “desmilitarização das polícias militares”, extraída do eixo
3 “Valorização profissional e otimização das condições de trabalho”, e que contabilizou 112
votos, rendendo muitos aplausos dos presentes, especialmente dos integrantes da APRASC. A
segunda diretriz mais votada foi “estabelecer o ciclo completo para as policias nas respectivas
áreas de atuação”, extraída do eixo 2 “financiamento e gestão da política pública de
segurança”, muito mobilizada pelos Oficiais da Polícia Militar. A terceira diretriz mais votada
foi aclamada pelos Guardas Municipais e extraída do eixo 4: “Repressão qualificada da
criminalidade” e propôs “reconhecer as Guardas Municipais como órgão de segurança pública
com poder de polícias”.
É necessário ainda analisar que as diretrizes eleitas diferem significativamente na
quantidade de votos, pois enquanto a mais votada contabilizou 112 votos, a sexta colocada
soma 27 votos, ou seja, existem claras diferenças de mobilização entre os eixos e em torno de
diretrizes específicas. Nesta etapa da Conferência, destacaram-se pela forte presença três
grupos em especial: os Praças da Polícia Militar, os Oficiais da Polícia Militar e os Guardas
Municipais, o que pode ser percebido pelas diretrizes eleitas.
Em quatro momentos, convocou-se a plenária para o desempate de diretrizes, sendo
que uma delas, como a PEC 308/04 foi defendida em plenária como uma “luta histórica
68
dentro do sistema prisional”. Nos quadros a seguir, é possível visualizar os princípios
escolhidos e as diretrizes e seus respectivos eixos temáticos e números de votos:
ORDEM DE PRIORIDADE
PRINCÍPIOS
1
As políticas de segurança pública devem priorizar a prevenção.
2
A segurança pública deve ser tratada como política de Estado.
3
As políticas de segurança pública voltadas à garantia e proteção dos direitos humanos.
4
As políticas públicas devem garantir a valorização profissional e otimização das condições de trabalho de tal sorte a zelar pelo profissional, a fim de que este possa cumprir seu mister.
5
Unificação das polícias com carreira única.
6
A política de segurança pública deve priorizar a integração das informações como política nacional.
7
Participação da sociedade civil de forma paritária, nas políticas públicas de segurança em todas as instâncias.
Ordem de prioridade
DIRETRIZES
Eixo Temático
relacionado
Número de votos30
1 Desmilitarização das policias militares. 3 112 2 Estabelecer o ciclo completo para as policias nas
respectivas áreas de atuação. 2 92
3 Reconhecer as Guardas Municipais como órgão de segurança publica com poder de polícias.
4 77
4 Implantação da defensoria pública em SC como forma de ampliação ao acesso à justiça e agilização da prestação jurisdicional.
6 26
5 Articulação de redes sociais de políticas em favor da não violência na difusão da cultura de paz e incluir orientação sexual na constituição federal, que trata da não discriminação.
5 36
6 Disseminar a polícia comunitária, alicerçada na proximidade, parcerias, pro - atividade e resolução criativa dos problemas de segurança.
5 27
7 Programa Saúde do Trabalhador da Segurança Pública: garantindo a assistência psicológica,
3 32
30 Os votos indicados com * referem-se aos que não consegui identificar nos registros.
69
médica, jurídica aos agentes de segurança pública, sem prejuízo nos salários, enquanto afastado.
8 Outorga gradativa competência aos municípios. 5 * 9 Implementação de uma dotação orçamentária na
lei de responsabilidade fiscal para segurança pública.
2 26
10 Integrar o sistema de segurança publica aos demais sistemas de proteção social (saúde, defesa civil, etc) buscando aperfeiçoar o desempenho dos seus organismos nessas atividades.
7 *
11 Implementar um número único para identificação civil em âmbito nacional
4 *
12 Controle de resultados das políticas públicas (interno/externo)
5 *
13 Implantar a perícia psicológica junto aos Institutos Médicos Legais
4 *
14 Piso mínimo nacional de salário aos agentes de segurança pública
3 16
15 Criação de conselho gestor deliberativo de segurança pública formado por trabalhadores da segurança pública, sociedade civil organizada, poder público e entes federativos.
2 14
16 Estudar as causas da violência, visando buscar subsídios á sua prevenção
1 13
17 Maior investimento em políticas públicas preventivas.
2 *
18 Padronização nos registros de ocorrências e sistema únicos de informações.
2 *
19 Instituir (GGIs) – Gabinetes de Gestão Integrada nas esferas estaduais e municipais como estrutura responsável pela coordenação, integração e ação integrada dos organismos de segurança pública com entidades públicas e sociedade civil.
1 10
20 Promover a criação de conselhos Estaduais e Municipais de Segurança Pública.
1 10
21 Garantir a profissionalização dos trabalhadores do sistema penitenciário, visando uma identidade profissional dos trabalhadores desta atividade, a exemplo do que propõe a PEC 308/04.
6 9
3.6 Conferências Livres: o momento preparatório para a Conferência Estadual
Antes de tratar de forma mais específica da Conferência Estadual de Segurança
Pública, considero necessário tecer algumas considerações sobre o momento preparatório para
70
esta conferência representado pelas Conferências Livres. Com efeito, considero complicado
discorrer sobre a etapa estadual sem dimensionar as atribuições desempenhadas por estas
etapas. No contexto mais geral da 1ª Conseg, as Conferências Livres destacaram-se
nacionalmente, pois constituíram o tipo de etapa que mais ocorreu em todo o país, somando
1140 conferências e mobilizando 66.847 participantes.
Gráfico 1: Etapas realizadas no país
Fonte: Relatório Final da 1ª Conseg / autora
Tabela 2: Etapas realizadas no país por número de participantes
Etapas Participantes
Participação direta em todas as etapas 225.395 Participação via web (fevereiro a julho) 256.598 Atividades de mobilização 42.468 Conferências estaduais 17.439 Conferências municipais eletivas 25.645 Conferências municipais preparatórias 19.006 Conferências livres 66.847 Seminários temáticos 3.270 Projetos especiais 24.108 Cursos de capacitação presenciais e EAD 1.883 Consulta aos policiais 64.137 Etapa Nacional 3.060
Pessoas envolvidas no processo 524.461 Fonte: Relatório Final da 1ª Conseg
As Conferências Livres contabilizaram 17 em Santa Catarina e envolveram 1.720
participantes, número que fica bem atrás da participação nos demais Estados do sul do país:
71
Rio Grande do Sul com 5.085; Paraná com 8.560. Em Santa Catarina, tais conferências
concentraram-se em Florianópolis, num total de 12. O modelo das Conferências Livres é
relativamente recente na ampla existência das conferências no Brasil, já que foi inaugurado na
Conferência Nacional da Juventude em 2007 e aplicado também nas Conferências de Cultura
e Comunicação (2009-2010). Segundo o Manual Metodológico, estas conferências possuem o
objetivo de ampliar a diversidade de segmentos na 1ª Conseg e estimular o debate em torno
dos temas propostos como eixos temáticos. Já no Relatório Final da Conferência, as
Conferências Livres são descritas como responsáveis por estimular o protagonismo da
sociedade civil e passam a assumir um caráter mais amplo.
Anteriormente mencionei o papel da empresa Holon na mobilização da 1ª Conseg. O
diretor desta empresa, Eduardo Rombauer, possui um artigo no Relatório Final, no qual
analisa as Conferências Livres e descreve que elas estão marcadas pela liberdade (de
organização, divulgação, na forma e informalidade), diversidade, criatividade e inovação
(enquanto outra opção metodológica). De certa forma, as Conferências Livres possibilitam a
flexibilização da metodologia e do próprio desenho institucional aplicado nas demais etapas,
ao permitir a escolha de eixos temáticos específicos. É curioso que consta no site da empresa
Holon que as Conferências Livres foram uma ideia da própria empresa inaugurada na
Conferência da Juventude. Ou seja, mais do ser responsável pela mobilização, a Holon
também realiza propostas sobre o desenho institucional de conferências. Rombauer menciona
ainda as potencialidades das Conferências Livres, concebidas como responsáveis pelo
fortalecimento da democracia participativa por possibilitarem (BRASIL, 2010, p. 61):
• “Fortalecimento do protagonismo dos cidadãos e cidadãs”;
• “Inclusão de novos segmentos sociais” (especialmente de presidiários e
indígenas);
• “Fortalecimento das redes sociais” (podem criar novas redes ou dinamizá-las);
• “Qualidade das discussões” (maior espaço para metodologias e experiências
participativas apropriadas pela sociedade civil);
• “Otimização de recursos” (baixos custos de realização);
Entretanto, a partir da amplitude adquirida por este tipo de etapa, considero que
existem estes muitos papéis desempenhados, que devem ser mais bem contextualizados. Por
exemplo, deve ser o caráter inclusivo atribuído às Conferências Livres para o envolvimento
de segmentos distantes (como os presos) do debate das políticas de segurança pública. Na
experiência catarinense, a realização de duas Conferências Livres nos presídios, conforme as
72
imagens a seguir, não significou que os(as) presidiários(as) participassem na etapa estadual.
Na verdade, participaram da etapa estadual alguns universitários e trabalhadores envolvidos
na organização destas conferências. A Conferência Livre realizada no Presídio Feminino de
Florianópolis foi desenvolvida por grupos de pesquisa universitários. Contou com a presença
de dez mulheres presas em regimes e situações variadas: condenadas, provisórias, regime
fechado e semi-aberto. Segundo consta no Relatório da Conferência Livre do Presídio
Feminino (2009), esta conferência forneceu “vez e voz” as presidiárias:
Aquelas que não tiveram a oportunidade de participação nas outras etapas pela impossibilidade de locomoção por conta da prisão, ganharam com a Conferência Livre voz e vez, e deixaram as suas contribuições e maiores necessidades pautadas em Princípios e Diretrizes.
Côrtes (2007), ao tratar da participação em conselhos municipais de políticas públicas,
analisa que a constância desta depende da capacidade de organização dos grupos sociais, e
que a participação favorável das autoridades municipais pode ser um fator determinante no
êxito de processos participativos ao viabilizar ou obstacularizar o acesso dos participantes e
proporcionar infra-estrutura. Neste sentido, destaca o conceito de policy network31 e policy
community, especialmente pela última ser formada por profissionais interessados em construir
um canal participativo e possibilitar o estabelecimento de alianças entre acadêmicos e
profissionais da área. É possível perceber que as Conferências Livres nos presídios ocorreram
especialmente pela existência de policy community que articulou grupos de pesquisas
universitários, trabalhadores de segurança pública e presidiários.
Mesmo sem negar as inovações proporcionadas por este modelo, é importante
questionar por que a análise de Rombauer, incorporada pelo Ministério da Justiça, afirmou
que estes segmentos não teriam a oportunidade de participar se não fosse por intermédio das
Conferências Livres, ou seja, por que este espaço não foi ampliado para aqueles que mais
sentem as ações na área da segurança pública?
31 Klaus Frey define policy network como “as interações das diferentes instituições e grupos tanto do executivo, do legislativo como da sociedade na gênese e na implementação de uma determinada policy”. [Heclo, 1978, p. 102 apud Frey, 2000 p. 221]. Policy aqui se refere ao conteúdo de determinada política pública.
73
Imagem 5: Conferência Livre no presídio feminino
Fonte: Relatório da Conferência Livre
Imagem 6: Conferência Livre no presídio masculino
Fonte: Relatório da Conferência Livre
No momento em que consideramos outros segmentos, as Conferências Livres tiveram
um papel fundamental para mobilizar as redes sociais na participação de outras etapas da
conferência, como na estadual. Além deste papel, possibilitaram a participação de segmentos
dos trabalhadores de segurança pública em torno de determinados eixos temáticos e, como
74
conseqüência da mobilização, as Conferências Livres fortaleceram as candidaturas de
delegados que se destacaram nesta etapa para a Conferência Estadual.
Contudo, uma das dificuldades encontradas para levantar dados sobre as Conferências
Livres consiste na carência de informações sistematizadas. Neste sentido, tanto no Caderno de
Propostas quanto no Relatório Final, só é possível identificar quem foi o responsável pelo
envio do relatório e o município de realização da conferência. Logo, a ausência de
informações sobre uma etapa de tanta importância é algo realmente problemático, pois neste
formato não foi possível observar qual é o tipo de Conferência Livre. Em face de tamanha
expressividade destas conferências, desenvolvi um breve mapeamento das Conferências
Livres que ocorreram um Santa Catarina, a partir de dados coletados em diversos sites e nos
relatórios da Conferência Livre da Cufa e do Presídio Masculino e Feminino, considerando
osaspectos principais:
Quadro 5: Mapeamento das Conferências Livres em Santa Catarina Conferência Livre Organizações que
coordenaram a etapa Eixos
discutidos Local Data
Conferência Livre PET-Direito
CPGD PET DIREITO Universidade Sem Muros Ministério da Justiça
- UFSC 25 e 26 de março
Conferência Livre da Polícia Militar
Polícia Militar - Cambirela Hotel - Florianópolis
04 de maio
Conferência Livre de Psicologia: comissão de psicólogos trabalhadores de segurança pública
Conselho Regional de Psicologia
Eixos 1, 3, 4, 5, 7.
Hotel Valerim Plaza - Florianópolis
04 e 05 de junho
Conferência Livre do Centro dos Direitos Humanos Maria da Graça Bráz
Joinville
Conferência Livre do Mont Serrat
Centro Cultural Escrava Anastácia
- Igreja Nossa Senhora do Mont Serrat
11 de julho
Conferência Livre da Polícia Civil
Polícia Civil (?) - Acadepol 16 de julho
Conferência Livre de Peritos Criminais
Instituto Geral de Perícias
Eixos 1, 2, 3 e 4
Hotel Porto da Ilha - Florianópolis
13 de julho
Conferência Livre da Polícia Rodoviária Federal
8ª SRPRF/SC, SINPRF/SC, SEST/SENAT, SSP
- 17 de julho
Conferência Livre da CUFA Eixos 1 e Colégio 25 de
75
Cufa – SC Movimento Hip-Hop na Correria ONG Ação Já Representante da GM de Florianópolis Psicóloga da Polícia Civil Mestre em Criminologia pela UFSC
5 Estadual Celso Ramos – Florianópolis
julho
Conferência Livre do Presídio Feminino de Florianópolis
Universidade Sem Muros Núcleo de Estudos sobre Preconceito e Intolerância - NEPI
Eixo 6 Presídio Feminino - Florianópolis
27 de julho
Conferência Livre dos Sentenciados da Penitenciária de Florianópolis
Setor de Psicologia da Penitenciária de Florianópolis
Eixo 6 Penitenciária de Florianópolis
21 de julho
Conferência Livre de Criciúma
Associação dos Municípios da Região Carbonífera Conselho Empresarial de Criciúma Corpo de Bombeiros Defesa Civil Municipal Departamento de Administração Prisional Governo do Município de Criciúma Polícia Civil/6ª ARPOC Polícia Militar Abadeus União das Associações de Bairros de Criciúma
Todos Unesc - Criciúma
18 e 19 de junho
Conferência dos Conselhos Comunitários de Segurança de Brusque
Brusque
Conferência do Conselho da Comunidade da Comarca de Ituporanga – SC
Ituporanga
Um aspecto que se destaca desse levantamento é a intensidade da realização das
Conferências Livres - CL com a aproximação da etapa estadual. Somente no mês julho, sete
conferências foram realizadas. É possível perceber, ainda, que segmentos como a Polícia
Militar realizaram a sua conferência antes de diversas outras etapas municipais. As CL
concentram-se ainda na capital do estado, sendo que nos demais municípios que realizaram
76
Conferências Livres (Brusque, Criciúma, Joinville, Ituporanga e Quilombo), somente
Quilombo não teve delegado eleito. Tal aspecto remete ainda a importância desta etapa para a
eleição dos delegados na etapa estadual. O relatório da Conferência Livre da Cufa destacou
esta questão ao mencionar que:
A discussão nesta conferência permitiu que os participantes de movimentos sociais se inscrevessem para a etapa estadual a ser realizada na próxima semana, inclusive com indicação de candidatos a representar a sociedade civil em Brasília, na etapa nacional.
A CL da Cufa foi a única realizada em um colégio e contou com a participação de
dezessete pessoas de diferentes movimentos sociais (conforme quadro), incluindo o
mobilizador da conferência na região sul.
Imagem 7: Conferência Livre da Cufa
Fonte: Relatório da Conferência Livre
No mapeamento, é possível perceber as CL realizadas por segmentos de trabalhadores
de segurança pública como os Policiais Militares, a Polícia Civil, os Psicólogos Policiais, os
Policiais Rodoviários Federais, os Peritos Criminais, que juntas somam cinco conferências.
Ou seja, tais conferências articulam também o debate destes trabalhadores enquanto
segmento. Convém observar que é inexpressiva a atuação dos Conselhos Comunitários de
Segurança Pública para a organização de CL, pois apesar dos 292 Consegs espalhados pelo
estado, apenas dois realizaram conferências.
77
Capítulo 4: Atores sociais, recursos e interesses na 1ª Conferência Estadual de Segurança Pública
4.1 Observações da Conferência Estadual
Após ser desmarcada por duas vezes e adiada em um mês, desde a data inicial (24 a 26
de junho de 2009), em decorrência de problemas de organização, a Conferência Estadual
transcorreu no mesmo local que a Conferência Municipal de Florianópolis, a Acadepol –
Academia de Polícia Civil. Contudo, desta vez o número de participantes foi muito maior do
que na etapa municipal (com cerca de 700).
Por já ter participado anteriormente como relatora na conferência municipal, fui
convidada para atuar novamente nos Grupos de Trabalho. Desta vez, acompanhei reuniões de
orientação sobre esta atividade, as quais foram conduzidas pelo Mobilizador da Conferência
no Sul, Wagner Moura e pelo Coronel Gomes. Wagner Moura possuía um papel importante
dentro da conferência, pois além de ter acompanhado pessoalmente a etapa municipal de
Florianópolis, esteve presente em duas conferências livres realizadas na semana anterior a
Conferência Estadual. Assim sendo, articulou a realização da Conferência Livre da Cufa em
Florianópolis, o que contribuiu para a presença expressiva desta além de apresentações de
Hip-Hop durante o evento.
Moura reconheceu que a mudança das datas desorganizou parte da participação. Nas
duas reuniões de orientação, estiveram presentes em grande número: aspirantes a oficiais da
polícia militar, em menor número, peritos criminais, membros da polícia rodoviária federal, e
em número reduzido, representantes da sociedade civil. Na primeira reunião, somados
comigo, haviam quatro pessoas: eu, representantes do Centro de Direitos Humanos de
Blumenau e representante da Cufa de Laguna.
Na sequência, Wagner Moura destacou a importância desta atividade para o
desenvolvimento da Conferência e esclareceu de antemão que os participantes destas funções
não poderiam se candidatar como delegados em decorrência da exposição que estas atividades
possuem no grupo. Foi-nos fornecido também um material explicativo sobre a conferência,
contendo sínteses das temáticas dos eixos e a diferença entre princípios e diretrizes. A partir
desta orientação, ocorreu uma modificação no grupo no dia seguinte: o representante da Cufa
desistiu e os peritos se rearranjaram, ou seja, alguns foram substituídos.
Outro questionamento importante feito pelo mobilizador foi sobre o interesse prévio
dos participantes por algum eixo específico e comentou que o Eixo 5 era o preferido da
78
sociedade civil, por exemplo. É importante destacar a visibilidade do Eixo 5, pois foi o que
obteve maior número de inscritos, cerca de 120 e teve que ser subdivido em três espaços
diferentes. Já os peritos demonstraram interesse no Eixo 4, sobre a repressão qualificada da
criminalidade, além de já terem realizado Conferência Livre sobre este tema. Desta forma,
decidi participar do Eixo 5, para que pudesse ter um maior contato com participantes da
sociedade civil e acompanhar uma discussão diferente da que havia presenciado na
Conferência Municipal de Florianópolis.
A conferência teve início na terça-feira a noite, com a seguinte mesa de abertura:
Imagem 8: Composição da mesa de abertura
Fonte: Blog APRASC
Compuseram a mesa de abertura: Ronaldo Benedet - Secretário de Segurança Pública
que representou o governado do Estado; Marcos Pamplona - Coordenador da etapa de Santa
Catarina, Guilherme Leonardi - Mobilizador da conferência, representado o Ministério da
Justiça; Maria Guilhermina Cunha - Integrante da COE, representando a sociedade civil;
Felipe - Integrante da COE e representando o segmento dos trabalhadores da segurança
pública; Dilnei Valter da Silva - Deputado Estadual; Ideli Salvati - Senadora da República,
Promotor César Grubba; José Trindade dos Santos - Presidente do Tribunal de Justiça de
Santa Catarina e Celito Cordioli - Associação dos Peritos.
79
Imagem 9: Participantes da Conferência32
Fonte: Blog APRASC
Ao fundo da imagem acima, é possível perceber a presença maciça dos oficiais da
Polícia Militar, alvo de polêmicas no decorrer da fase estadual.
Imagem 10: Integrantes da APRASC
Fonte: Blog APRASC
32 Com relação as demais autoridade presentes, convém mencionar que estiveram presentes: o
Deputado Estadual Amaury Soares; o Dr. Maurício Estuduaki; Paulo Roberto Sell – prefeito de Brusque; Francisco Emanuel da Silveira – representando a OAB; vice-prefeito de Blumenau; Diretor da Guarda Municipal de Florianópolis; Diretor da Acadepol; Comandante da Polícia Militar; Presidente da Federação dos Conselhos Comunitários; representante do prefeito de Lages; Vereador da cidade de Joinville; Subcomandante-geral do Corpo de Bombeiros; Superintendente da Polícia Rodoviária Federal; Representante do prefeito de Biguaçu e Coordenador Estadual da Polícia Comunitária. Assim como na Conferência Municipal de Florianópolis, o prefeito Dário Berger não esteve presente.
80
Já mais ao canto do ginásio, estiveram presentes os Praças da Polícia Militar, trajados
tal como na Conferência Municipal, com as camisetas brancas da APRASC que pediam a
desmilitarização da Polícia Militar. Na imagem 11, visualiza-se os Guardas Municipais que
tiveram grande atuação durante a Conferência. Estiveram presentes Guardas Municipais dos
seguintes municípios: Tubarão, Florianópolis e São José.
Imagem 11: Guardas Municipais
Fonte: Blog Aprasc
Como me propus a realizar descrições mais gerais acerca da dinâmica da Conferência
Estadual, não desenvolverei uma descrição detalhada de cada dia, mas apenas aspectos que
considerei marcantes. Tendo em vista esta perspectiva, exponho a fala da senadora Ideli
Salvati, que considerou a 1ª Conseg como um momento de ouvir a sociedade e tirar
deliberações dela, pois ressalta que não é possível fazer política pública sem ouvir.
“É exatamente esta política adotada pelo presidente Lula de ouvir e tirar as deliberações de políticas públicas para serem adotadas, ouvindo a sociedade, os parceiros federativos (...) Não é possível encaminhar políticas públicas sem ouvir a sociedade, sem dar a oportunidade em todos os cantos de nosso país, e aí foram dezenas de conferências municipais, regionais, até chegar na aberturada conferência estadual que vai preparar, (...) a representação de todos os segmentos, dos trabalhadores, da sociedade civil (...) temos representante da polícia rodoviária federal, da guarda municipal, dos conselhos comunitários de segurança, que eu acho que é uma marca forte aqui em Santa Catarina”.
81
Salvatti apontou a necessidade de acabar com a dicotomia entre repressão e prevenção,
já que as duas têm que andarem juntas. Citou o Programa Nacional de Segurança Pública com
Cidadania (Pronasci) - exemplo para enfrentar a criminalidade e conciliar repressão e
prevenção. Um aspecto interessante do seu discurso foi o fato de ter mencionado a presença
dos jovens membros da Central Única das Favelas33 de Santa Catarina, que entraram e
colocaram uma faixa no fundo do Ginásio com o nome da Cufa durante a exposição da mesa.
A Senadora destacou que em outros momentos, jovens trajados daquela forma, de bermuda,
calça larga, seriam vistos como “suspeitos”, mas ali, a presença deles era muito importante.
A Cufa teve uma expressão considerável na Conferência Estadual, com a eleição de
quatro delegados para a etapa nacional. Entretanto, não consegui a participação destes
delegados nos questionários. A Cufa também marcou presença nacionalmente na Conseg,
conforme postagem no blog com o seguinte título: “Cufa na Conseg – DF, AL, GO, PB, MG,
PI, SC e RJ” de 07/09/2009, momento no qual os delegados catarinenses reuniram-se com os
delegados dos outros estados para discutir os princípios e diretrizes a serem trabalhados nos
Grupos de Trabalho e socializar informações, troca de experiências dos estados. A Central
possui convênios com entidades públicas e privadas como a Eletrosul, a Secretaria de
Segurança Pública de Santa Catarina, a Prefeitura de Laguna.
Após a participação na etapa estadual e nacional da Conferência, é possível perceber
no blog da Cufa, a intensificação do contato com a Secretaria de Segurança Pública e o
Ministério da Justiça, no momento pós-conferência. Os integrantes da Cufa foram recebidos
pela Senadora Ideli Salvatti e pelo próprio Ministro da Justiça Tarso Genro, sendo que o
ministro elogiou a CUFA e o trabalho que vem sendo feito através dos projetos. A partir do
exemplo da Cufa, é possível identificar que a Conferência potencializou a articulação de redes
sociais e ampliou os recursos organizacionais.
A participação de Santa Catarina na Comissão Organizadora Nacional34, que é a
instância máxima deliberativa da 1ª Conseg, foi mencionada pelo Coordenador Nacional de
Mobilização durante a mesa de abertura. Desta comissão, fizeram parte os catarinenses
representantes da sociedade civil e dos trabalhadores: Movimento Nacional de Direitos
Humanos – MNDH; Associação Nacional dos Oficiais Militares Estaduais – AMEBRASIL;
33 A Central Única das Favelas é uma organização reconhecida nacionalmente pelas esferas políticas, sociais, esportivas e culturais. “A principal missão da CUFA-SC é funcionar como um pólo de produção cultural e de distribuição de oportunidades para os jovens, particularmente, negros e residentes em favelas através de projetos e ações promovidas nos campos da educação, esporte, cultura, cidadania e desenvolvimento humano”. http://cufalagunasc.blogspot.com/ 34 A Comissão Organizadora Nacional (CON) é composta de maneira tripartite, com 37 cadeiras distribuídas entre os segmentos sociedade civil, trabalhadores da área de segurança pública e Poder Público.
82
Federação Nacional de Entidades de Oficiais Militares – FENEME; Associação Brasileira de
Criminalística – ABC. Esta inserção nas etapas nacionais é importante para fortalecer estes
segmentos, o que pode ser considerado como um recurso organizacional.
Um diferencial da composição desta mesa de abertura para a que presenciei na
Conferência Municipal de Segurança Pública, foi a presença de Maria Guilhermina da Cunha
como representante da sociedade civil na Comissão Organizadora Estadual e militante no
movimento GLBTT. Assim, pregou o combate à violência doméstica contra a mulher e a
homofobia.
Durante o coquetel de abertura, o Secretário de Segurança de Brusque comentou que,
se tivesse mais tempo, teria trazido três ônibus com participantes para a conferência, pois em
decorrência das mudanças de datas, conseguiu organizar “apenas” um ônibus com
participantes. Nesta articulação municipal, estiveram presentes vários professores de Brusque
e o município elegeu sete delegados. É importante ressaltar a vontade política da prefeitura de
Brusque ao organizar a participação da sociedade civil na Conferência Estadual.
No início do segundo dia da Conferência, ocorreu a reunião dos Grupos de Trabalho
em torno dos eixos temáticos. As atividades deste dia foram inauguradas pela apresentação de
um grupo de Hip-Hop, conforme imagem abaixo, o que marca a abertura de um espaço
diferenciado.
Imagem 12: Apresentação de Hip-Hop
Fonte: Blog Daniela Félix
Nessa etapa, atuei como relatora em um dos três Grupos de Trabalho que foram
formados sobre o eixo 5, o mais procurado na Conferência Estadual, com cerca de 120
83
inscritos. O mediador do grupo de trabalho foi o assistente social Sérgio, que organizou a
Conferência Municipal de Blumenau e elegeu-se nesta mesma etapa. As atividades do eixo e
sua participação foram bem intensas, seja pelo domínio do próprio texto-base, seja pela
contextualização da trajetória das conferências a partir de sua experiência nas conferências de
saúde. Estiveram presentes cerca de 30 participantes, na sua maioria da sociedade civil:
professores da educação básica e de nível superior; integrantes de vários Consegs; de Ong’s
como o Abadeus, do movimento GLBTT e de instituições que atendem menores infratores.
Também estiveram presentes vários guardas-municipais, alguns policiais civis, policiais
rodoviários federais e um policial militar. O ponto de partida das discussões foi o debate de
diretrizes que os próprios participantes elaboraram previamente ou debatidos em outras etapas
da Conferência. A partir daí discutiram-se as propostas.
As discussões do eixo foram bastante intensas e surgiram muitas observações em
relação a educação. Durante as atividades dos grupos de trabalho, integrantes da Comissão
Organizadora Estadual - COE passaram em cada grupo e perguntaram quantos Oficiais
estavam presentes. Este questionamento ocorreu a partir de denúncias de outras instituições
policiais sobre o número de Oficiais presentes na Conferência, já que este número era
limitado. Neste grupo, havia um Oficial que se apresentou como Policial Militar. Os demais
participantes estranharam a não identificação enquanto Oficial. Estranhamente, no segundo e
terceiro dia muitos oficiais estavam “à paisana”. Na sequência, exponho as denúncias
realizadas sobre este tema pelos Praças.
No terceiro dia, ocorreu a votação dos princípios e diretrizes e a eleição dos delegados.
A “desmilitarização da polícia militar” foi a diretriz mais votada, tendo 360 votos, o que
revela a capacidade de organização da Aprasc, bem como a sua articulação com outros
grupos, como as Guardas Municipais. A Aprasc criou um blog que acompanhou passo a passo
cada dia da conferência. Neste blog, os integrantes da Aprasc colocaram diversas fotos
registrando a atuação na conferência e as instituições que os apoiaram.
84
Imagem 13: Praça votando na diretriz da desmilitarização
Fonte: Blog APRASC
No mesmo blog também foram feitas denúncias sobre a participação dos Oficiais, com
postagens como: “Oficiais são escalados para participar da 1ª Conseg. E praças são
boicotados”:
“A APRASC denuncia o esquema montado pelo comando das instituições militares para facilitar a participação de oficiais na etapa estadual da 1ª Conseg, através de escalas e pagamento de diárias. Por outro lado, além de dificultar a participação de praças, que não ganharam a liberação das escalas de trabalho, algumas vagas de praças foram ocupadas por trabalhadores tutelados pelo oficialato. Com o objetivo de verem suas diretrizes aprovadas, os comandantes recrutaram praças fiéis aos oficiais para ocupar as vagas pertencentes à representação legítima e autônoma da categoria”.
Segundo nota do Comandante da PM no mesmo blog,
“A tese principal a ser defendida pelo oficialato é a conquista do "ciclo completo", que concederia poder de polícia aos oficiais, tema que vai de encontro aos interesses dos delegados da Polícia Civil. Outra tese importante, mas que foi omitida na ordem do comandante, é a derrota da diretriz de desmilitarização. As duas intenções não foram efetivadas: a diretriz desmilitarização foi a mais votada de toda a conferência; e a tese do ciclo completo não foi eleita entre as sete mais votadas por eixo, ficando em segundo lugar em seu próprio eixo, atrás ainda do tema "autonomia da perícia criminal".
85
Para compreender melhor a cisão entre os Praças e os Oficiais, é necessário
contextualizar brevemente as origens deste conflito que marcou as etapas da Conferência em
Santa Catarina. A Conferência também deve ser compreendida enquanto espaço de exposição
dos conflitos e problemas de cada estado, ou seja, pode ser que em outros estados as tensões
se deem em outro plano. Um marco deste conflito é a manifestação que ocorreu em dezembro
de 2008, quando as mulheres dos Praças fecharam o acesso aos quartéis e ao comando da
corporação. Policiais militares e bombeiros pediram o cumprimento da Lei 254 e aprovada em
2003, que prevê a diminuição da diferença entre os salários dos Oficiais (coronel, tenente-
coronel, major, capitão, tenente). Os manifestantes defenderam que o maior salário da
corporação não poderia ser quatro vezes superior ao menor. O jornal Diário Catarinense
denominou o caso como “Motim na PM” e o Governador Luiz Henrique afirmou na época
que: “este é um movimento guerrilheiro, e não reivindicatório. Não negocio com faca no
peito”. (Diário Catarinense, 26/12, p. 4).
O porta-voz da Aprasc disse que a categoria sabia que estava quebrando a hierarquia
da corporação (o que é reivindicado na diretriz da desmilitarização). A greve foi considerada
ilegal pela Justiça, que determinou uma multa de R$ 30 mil por dia. O comentador político
86
Moacir Pereira ressaltou que “a causa da greve é política e que a determinação dos militares e
a firme disposição de luta de suas mulheres é tão evidente que eles se mostram prontos para
qualquer tipo de atendimento das reivindicações” (Opus Cit, p. 3).
O governo de Santa Catarina pediu ajuda da Força Nacional de Segurança e a punição
dos envolvidos no movimento. Segundo a Aprasc, os manifestantes somariam 350. Para o
porta-voz do movimento, Edson Fortuna, “o mérito da mobilização é das mulheres, que
tomaram a frente e acabaram construindo uma adesão que superou qualquer expectativa”
(28/12, p. 30).
O sargento e deputado Amaury Soares assumiu uma incontestável posição de
liderança no movimento. Soares se elegeu em 2006 com a reivindicação dos Praças,
especialmente com a promessa de colocar em vigor a Lei 254. Após seis dias de manifestação,
encerrou-se o protesto.
O comandante da PM afirmou que “os pilares da instituição, hierarquia e disciplina –
foram afrontados e negou que o movimento teve a participação somente das mulheres”
(Diário Catarinense, 29/12, p. 4). Os Oficiais temeram que a anistia dos Praças participantes
do movimento comprometesse a hierarquia e a disciplina e “para os responsáveis por quartéis
em Santa Catarina, impedir animosidade entre oficiais e praças (...) é tão importante quanto
garantir a punição aos envolvidos” (Idem). O próprio comandante da PM apontou que haveria
resquícios do “motim”, pois “mensagens agressivas” foram colocadas no blog da Aprasc.
Os praças voltaram ao trabalho sem acordo com o governo alegando que os prejuízos à
sociedade eram muito grandes e suas famílias estavam muito expostas. No artigo “PM: a crise
e o racha”, Moacir Pereira analisou que a crise na PM dividiu praças e os oficiais35.
Tabela 3: Notícias sobre a Manifestação da Aprasc publicadas no Diário Catarinense
Título Data Seção Página
Mulheres de militares de SC fazem protesto 23/12/2008 Geral 24 Rebelião na polícia 24 e 25/12/2008 Moacir
Pereira 3
Segurança: quartel fechado 24 e 25/12/2008 Reportagem Especial
4 e 5
Motim na PM: Governador determina punições
26/12/2008 Reportagem Especial
4 e 5
35 “A crise que estourou na Polícia Militar de Santa Catarina, com a paralisação parcial das atividades, o bloqueio de 34 unidades e a imobilização de 172 viaturas, não dividiu apenas os praças. Rachou, também, a oficialidade. É o que constata entre coronéis ativos e da reserva, que têm formas divergentes de avaliar as conseqüências das novas medidas disciplinas anunciadas pelo comando geral” (Diário Catarinense, 30/12, p. 3).
87
A crise na política 28/12/2008 Moacir Pereira
3
Os líderes do movimento 28/12/2008 Geral 30 Motim da PM: Comando promete punição 29/12/2008 Reportagem
Especial 4 e 5
PM: a crise e o racha 30/12/2008 Moacir Pereira
3
4.2 A análise do relatório da Conferência Estadual
No artigo intitulado “Participação da Comunidade em Espaços Públicos de Saúde:
uma análise das Conferências Nacionais de Saúde”, Guizardi et al (2004) discutem o
significado das Conferências na formulação das políticas e consideram os relatórios finais
como fundamentais na luta política cotidiana, pois são peças fundamentais dentro da proposta
da conferência, na medida em que constituem “repertórios de argumentos oferecidos aos
atores sociais que participam do processo político” (Opus cit, p. 18). Além desta perspectiva
dos relatórios como repertórios dos grupos sociais, trato os relatórios como uma dimensão de
publicização do desenvolvimento da conferência, que possibilita caracterizar aspectos centrais
para a reflexão sobre a participação.
Enid da Silva (2009), em pesquisa publicada pelo Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada - IPEA, analisa a participação social nas Conferências Nacionais realizadas entre
2003 e 2006 com base na Pesquisa Nacional das Conferências promovida pela Secretaria
Nacional de Articulação Social36 (SNAS). Sobre o processo de encaminhamento dos
resultados das conferências nacionais, Silva destaca que embora o processo de prestação de
contas seja fundamental, o que é feito dos resultados não é de conhecimento amplo. Logo,
mais da metade dos coordenadores nacionais não sabe como se dá a forma de
encaminhamento para a esfera pública federal e cada conselho/ministério os processa da
forma que convém. Além disso, nenhum processo da conferência previu qualquer
metodologia participativa de acompanhamento dos resultados. Conforme exposto no gráfico
desenvolvido pelo estudo, 22% das conferências não enviaram o documento final com os
resultados aos participantes, sendo que a maior parte levou de três meses a um ano (62%).
36 Dentre as atribuições da Secretaria Geral, cabe ao órgão assistir imediatamente ao Presidente da República no desempenho de suas atribuições no que se refere ao “relacionamento e articulação com as entidades da sociedade civil e à criação e implementação de instrumentos de consulta e participação popular de interesse do Poder Executivo” (Lei nº 10.683, de 28 de maio de 2003, com as alterações determinadas pela Lei nº 11.129, de 30 de junho de 2005 e pela Medida Provisória nº 259, de 21 de julho de 2005)
88
Gráfico 2: Envio do documento final da conferência
Fonte: SGPR/SNAS – Pesquisa das Conferências Nacionais/ IPEA
Ao observar o gráfico acima, observa-se que a 1ª Conseg enquadrou-se nos maiores
percentuais, pois disponibilizou o relatório final da etapa nacional seis meses após a
realização desta, além de manter constantes atualizações com relação ao momento “pós
Conseg”. Contudo, considero que o grande entrave ocorreu nas demais etapas, especialmente
nas Conferências Estaduais.
O Relatório da Conferência Estadual de Santa Catarina não foi encaminhado aos
participantes, apenas foram enviados os princípios e diretrizes eleitos. O relatório também não
foi disponibilizado pelo site da Secretaria de Segurança Pública. Alguns membros da
Comissão Organizadora Estadual relataram que também não o possuíam. Além das
dificuldades já descritas para obtê-lo, as informações estão bastante incompletas.
Na Lista das organizações que coordenaram a etapa apenas consta a empresa de
eventos que colaborou com a conferência, mas não há qualquer referência aos integrantes da
Comissão Organizadora Estadual. A descrição analítica da etapa foi muito sintética, sem
informações mais detalhadas sobre a composição da mesa de abertura, número de
participantes presentes. Além disto, existem dados equivocados, pois foi citado que o Prefeito
da Capital esteve presente, o que não é verdade. A avaliação da etapa resume-se a três linhas,
que não possibilitam dimensionar o desenvolvimento da Conferência. Não é possível
identificar quais foram os problemas que quase comprometeram a etapa, provavelmente
referem-se ao questionamento quanto ao número de Oficiais presentes:
A etapa transcorreu com grande participação da sociedade civil e trabalhadores. Sentimos dificuldade para realizar o credenciamento, que quase comprometeu a etapa. A avaliação geral foi positiva, pois envolveu os participantes na discussão do texto base, com a elaboração de princípios e diretrizes e suas respectivas priorizações. O texto sistematizado segue neste relatório.
89
A lista de presença é a parte mais problemática, pois não fornece informações sobre o
segmento no qual os participantes se enquadram (sociedade civil, trabalhadores e gestores).
Sendo assim, não é possível saber se a paridade entre os segmentos foi respeitada. Além da
inexistência de informações sobre os segmentos, o campo referente às instituições está
preenchido de forma incompleta, o que não permite qualquer dado sobre a participação dos
Oficiais, Guarda Municipal, Polícia Civil, Praças, etc. Com relação a sociedade civil, não
existe nenhum tipo de informação acerca das organizações que representaram. Também não
constam informações sobre os municípios de origem dos participantes. Contudo, considero
que o erro mais grave do relatório diz respeito à contagem equivocada do número de
participantes: constam apenas 98 participantes na lista participantes, o que não é verdade, pois
a Conferência Estadual contou com a presença de quase 700 participantes. Como é possível
explicar tamanho equívoco? Isto demonstra no mínimo a negligência do poder público
catarinense com a Conferência.
Os relatórios das Conferências Municipais que tive acesso destinaram uma parte do
documento para a lista de representantes eleitos, com dados pessoais e informações para
contato dos delegados. No relatório da Conferência Estadual, esta parte simplesmente não
existe e também não há qualquer menção aos delegados que foram eleitos e ao próprio
processo eletivo.
4.3 Análise dos dados
A análise dos dados apresentada a seguir, está organizada a partir da concepção de
duas dimensões de recursos, proposta por Fuks e Perissinotto (2004;2005). Nesta perspectiva,
os recursos subdividem-se em recursos individuais, que possuem uma dimensão objetiva
como o perfil sócio-econômico e uma dimensão subjetiva, que abrange aspectos
motivacionais da participação como interesse por política, engajamento partidário, militância
partidária e associativismo; já o segundo tipo de recursos se refere aos recursos coletivos que
são os recursos possuídos pelas entidades que os delegados representam, ou seja, envolvem
recursos organizacionais, uma rede de apoio político que determinada instituição possui
políticos, bem como o apoio financeiro e material.
Antes de adentrar diretamente na parte analítica, convém explicar quais são as três
bases de dados compõem esta análise: a) a primeira consiste nos questionários aplicados junto
aos delegados de Santa Catarina; b) a segunda base é formada pelo Relatório das Pré-
90
inscrições da Conferência Estadual e abrange informações dos participantes da Conferência
Estadual de Santa Catarina; c) a terceira base é a pesquisa “Perfil dos Participantes da
Conferência – tratamento preliminar”, produzida pelo Instituto Via Pública que apresenta
dados produzidos sobre os delegados da 1ª Conseg (sem dividi-los por estados). Com efeito, é
possível identificar que esta análise realiza um esforço de relacionar diferentes fontes de
dados a fim de possibilitar reflexões mais abrangentes.
A primeira fonte de dados envolveu os delegados de Santa Catarina. Conforme
descrevi anteriormente, de um universo de 61 delegados, divididos entre gestores (11),
sociedade civil (30) e trabalhadores (20), foi possível entrevistar 23 pessoas. Assim sendo,
obtive uma amostra que correspondeu a 38,3% do total. Participaram da pesquisa 11
delegados da sociedade civil, 9 delegados dos trabalhadores e 3 delegados do segmento
gestor.
Tabela 4: Segmento que representou na Conferência Estadual
Frequência % Gestor 3 13,0 Trabalhador 9 39,1 Sociedade Civil 11 47,8 Total 23 100,0
Fonte: Pesquisa empírica autora
Aliado aos dados produzidos pelos questionários, também está compilada a segunda
base de informações, o “Relatório de Pré-Inscrições da Conferência Estadual”. Estas
informações foram fornecidas em uma planilha do Excel pela própria Secretaria de Segurança
Pública de Santa Catarina, no momento em que solicitei o Relatório desta Conferência. São
bem mais completas do que as informações extraídas no próprio Relatório Estadual. Nesta
base constam informações de 553 participantes da etapa estadual, as quais estão organizadas
nas variáveis sexo, segmento, entidade, eixo temático e categoria. Convém mencionar que
estas informações não contemplam a totalidade de participantes da Conferência (cerca de
700). Entretanto, como não possuo nenhum tipo de informação quantitativa adequada no
Relatório Estadual, tais dados apresentam aspectos interessantes para análise.
Por último, utilizo também a pesquisa realizada pelo Instituto Via Pública37
denominada “Perfil dos Participantes da Conferência – tratamento preliminar”, disponível
no site da 1ª Conseg em formato pdf. A pesquisa foi realizada no decorrer da etapa nacional e
37 O Instituto Via Pública foi contratado pelo Ministério da Justiça com os objetivos de avaliar e monitorar o processo participativo nas diversas etapas da Conferência, caracterizar o perfil sociodemográfico e político-institucional dos representantes, além de avaliar o processo de gestão com sugestões para a 2ª Conseg.
91
contou com a colaboração de 738 delegados do Brasil, o que correspondeu a 30,08% do total.
Ressalto aqui, alguns dados principais deste trabalho, especialmente para comparar com os
resultados obtidos nos questionários aplicados na etapa estadual. No que se refere à
participação dos delegados da etapa nacional, o Instituto Via Pública entrevistou 47,9% dos
representantes da sociedade civil, 32,8% dos trabalhadores e, em menor número, os
representantes do poder público, com 19,3%. Estes dados revelaram maior engajamento na
pesquisa por parte da sociedade civil, menor participação do poder público, já que 30% dos
delegados eram deste segmento.
Gráfico 3: Delegados da etapa nacional por segmento
Fonte: Via Pública/Ministério da Justiça
Apresento a análise organizada pelos três tipos de recursos e, por último, exponho a
percepção dos delegados sobre a 1ª Conferência Estadual. Deste modo, inicio as análises a
partir dos gráficos referentes à Conferência Estadual e na sequência, os comparo com os
dados produzidos nacionalmente pelo Instituto Via Pública.
4.3.1 Recursos Individuais dos participantes da Conferência Estadual e dos delegados
No que tange aos participantes da Conferência Estadual por sexo, observa-se pelos
dados das Pré-Inscrições que 28% são do sexo feminino, ao passo que 72% são do sexo
masculino, o que expõe uma grande discrepância. É importante relembrar que a questão de
92
gênero foi uma preocupação do desenho institucional adotado pela Conferência, pois esta
representação era condição para a validade dos votos.
Gráfico 4: Participantes da Conferência Estadual por sexo
Fonte: Base Pré-Inscrições Secretaria de Segurança Pública/ Gráfico autora
A desigualdade de gênero torna-se ainda mais intrigante quando se observa o sexo
por segmento. Consoante o gráfico 4, nota-se que nas participantes do sexo feminino, o maior
percentual concentra-se no segmento trabalhador (50%), o qual é seguido pela sociedade civil
(40%) e, por último, no segmento gestor (10%). Entre os participantes do sexo masculino,
ocorre uma super concentração no segmento trabalhador (74%), o qual é seguido pela
sociedade civil (15%) e, por último, nos gestores (11%). De modo geral, a área da Segurança
Pública é composta em grande parte por trabalhadores do sexo masculino38, o que se reflete
na participação de gênero na Conferência. Contudo, a análise destes dados deve também
considerar que a maioria dos inscritos no momento das Pré-Inscrições era do segmento dos
trabalhadores (67%), enquanto a sociedade civil e trabalhadores corresponderam
respectivamente, a 22% e 11%.
38 Na Conferência Estadual de Santa Catarina, não identifiquei nenhuma Oficial do sexo feminino. Nem mesmo no grupo de Aspirantes a Oficiais elas estavam presentes.
93
Gráfico 5: Participantes da Conferência Estadual por sexo e segmento
Fonte: Base Pré-Inscrições Secretaria de Segurança Pública/ Gráfico autora
Já o gráfico 5 retrata o total de delegados eleitos de Santa Catarina por sexo,
apresentando uma diferença significativa do gráfico 3. Neste gráfico, a desigualdade de
gênero diminui consideravelmente, pois 39 dos 61 delegados eleitos de Santa Catarina são do
sexo masculino, enquanto 22 são do sexo feminino, valores que se distanciam dos 72% de
participantes masculinos observados no gráfico 2. É um aspecto interessante e que pode estar
relacionado com a representação de gênero observada no momento das eleições, ou seja, o
desenho institucional pode ter contribuído para diminuir as desigualdades de gênero.
Gráfico 6: Delegados de Santa Catarina por sexo
Fonte: Pesquisa empírica autora
94
Os dados a respeito dos delegados da etapa nacional por sexo retratam constatações
semelhantes aos dos delegados eleitos em Santa Catarina. Nesta etapa, 66% dos
representantes são do sexo masculino, enquanto 34%, são do sexo feminino.
Gráfico 7: Delegados da etapa nacional por sexo
Fonte: Via Pública/MJ
Quando se observa a representação de gênero por segmentos em nível nacional,
identifica-se que as delegadas do sexo feminino são oriundas, em sua maioria, da sociedade
civil (46,8%); na sequência, estão as representantes de trabalhadoras (27,7%) e, por último, do
poder público (15,2%). Logo, pode-se afirmar que nacionalmente a sociedade civil é mais
igualitária no aspecto gênero. Em contrapartida, o segmento poder público é o mais desigual
nacionalmente, tendo em vista que 84,8% dos delegados deste segmento são do sexo
masculino. Os trabalhadores, por sua vez, também expõem esta desigualdade, pois 72,3% dos
representantes são do sexo masculino e apenas 27,7% do sexo feminino. Tais observações
revelam características marcantes da área de segurança pública.
95
Gráfico 8: Delegados da etapa nacional por sexo e segmento
Fonte: Via Pública/MJ
Ao tratar da escolaridade entre os delegados entrevistados de Santa Catarina,
constata-se um grande percentual com pós-graduação completa (43,5%), incompleta (26,1%).
Ou seja, 69,6% dos delegados apresenta pós-graduação completa e incompleta. No momento
em que se considera do Ensino Superior Incompleto em diante, observa-se que 95,6%
realizam alguma etapa do Ensino Superior, o que remete a uma altíssima taxa de escolaridade.
Gráfico 9: Delegados de Santa Catarina por escolaridade
Fonte: Pesquisa empírica autora
96
A escolaridade dos delegados da etapa nacional também apresenta a maior
concentração na pós-graduação (45,2%), seguida pelo ensino superior (40,7%). Somente os
delegados com nível superior e pós-graduação somam 85,9%, semelhante ao que foi
observado em Santa Catarina.
Gráfico 10: Delegados da etapa nacional por escolaridade
Fonte: Via Pública/MJ
Conforme gráfico 11, os dados referentes aos delegados da etapa nacional
apresentam características interessantes ao serem observados por escolaridade e segmento. O
segmento do poder público possui a mais alta escolaridade, haja vista que 57,7% dos
delegados vinculam-se à pós-graduação. Além disto, o segmento demonstra os mais baixos
percentuais de participantes com ensino superior (37,7%) e ensino médio (3,1%). De modo
semelhante, o segmento dos trabalhadores concentra-se igualmente na pós-graduação
(49,6%), no ensino superior (39,8%) e retrata os seus menores percentuais no ensino médio
(8,5%) e no ensino fundamental (0,9%). A partir destas considerações, é possível verificar
uma altíssima escolaridade no segmento poder público e trabalhador. Quando se observa a
sociedade civil, identifica-se a concentração maior deste segmento no ensino superior
(40,7%), seguido da pós-graduação (34%), o menor percentual entre os três segmentos. A
sociedade civil revela ainda a maior concentração de delegados no ensino médio (17,1%).
Embora ocorra diferenciação na escolaridade entre os segmentos, ainda assim vigora
uma altíssima escolaridade. É importante contextualizar que na pesquisa realizada por Soares,
Rolim e Ramos (2009), os que possuem nível médio somam 42,2%, sendo que os que
possuem nível superior completo e incompleto são o maior grupo com 53,6%. Já nos dados
97
aqui analisados, a maior concentração ocorre no nível de pós-graduação, o que reforça a ideia
de que na Conferência participaram os trabalhadores de maior escolaridade na segurança
pública. Entre os segmentos, o poder público apresentou a mais alta escolaridade e a
sociedade civil possui a escolaridade mais “baixa”. Portanto, a sociedade civil retrata o
segmento mais diversificado neste aspecto. Ao tratar do Conselho de Assistência Social de
Curitiba, Perissinotto (2004) desenvolveu uma análise semelhante e identificou a mais alta
escolaridade entre os gestores.
Gráfico 11: Delegados da etapa nacional por escolaridade e segmento
Fonte: Via Pública/MJ
Após levantar a escolaridade dos delegados catarinenses, é interessante indagar
acerca da formação destes. Destacam-se os seguintes cursos: Direito (6); Formação de
Oficiais da PM (3); Psicologia (3); Economia (2) e Pedagogia (2). Dentre as profissões,
sobressaem-se os Oficiais da Polícia Militar (3), que cursaram a Formação de Oficiais da PM;
os Guardas Municipais (2); os Policiais Civis (2); os Professores (2) e as Psicólogas (2).
No momento em que se analisa os delegados de Santa Catarina por áreas de pós-
graduação, identifica-se a recorrência nos cursos de pós-graduação em Segurança Pública (4);
seguido por Políticas Públicas (2); Saúde Pública (2) e Direito (2). Assim, existe maior ênfase
ao curso de pós-graduação em Segurança Pública, provavelmente fruto dos incentivos por
parte do Ministério da Justiça39 para a formação continuada dos profissionais de segurança
39 Conforme estabelece o Pronasci.
98
pública. Ou seja, 17,4% dos delegados entrevistados dedicaram-se anteriormente à temática
da Conferência.
Os dados sobre a renda dos delegados são relevantes para dimensionar o perfil sócio-
econômico. A faixa de renda com maior ocorrência corresponde ao percentual acima de cinco
salários-mínimos, que totaliza 65,2% dos entrevistados. A sociedade civil é o segmento que
apresenta maior concentração na faixa de renda mais baixa (de 2 a 5 salários-mínimos), com
oito delegados neste patamar. A pesquisa desenvolvida pelo Instituto Via Pública não
divulgou informações sobre a renda dos delegados.
Gráfico 12: Delegados de Santa Catarina por renda mensal
Fonte: Pesquisa empírica autora
As análises realizadas anteriormente sobre a escolaridade e a renda dos delegados
apresentam resultados semelhantes aos identificados em outras pesquisas sobre participação
em conselhos gestores, conforme Fuks & Perissinotto (2004).
Nesta perspectiva, Borba & Luchmann (2007) discutem as principais variáveis
explicativas sobre as diferenças no perfil dos participantes em experiências de orçamento
participativo e de conselhos gestores, a partir de dados de alguns municípios catarinenses.
Logo, destacam a existência de diferenças significativas entre ambos, pois “enquanto o
orçamento participativo incorpora em seu desenho institucional elementos que potencializam
a inserção dos setores mais pobres da população, os conselhos gestores guardam, em sua
estrutura, um tipo mais elitizado de participação”. (Op. Cit. p. 3) A análise acerca do perfil
dos delegados da 1ª Conferência Estadual de Segurança Pública e da 1ª Conseg aponta à
tendência de “elitização da participação”, a exemplo do que ocorre nos conselhos gestores.
Discorrer sobre a idade dos delegados que participaram da 1ª Conseg também é um
fator relevante, pois os jovens são apontados nas estatísticas nacionais de homicídios como os
99
que mais morrem, além de comporem majoritariamente o sistema prisional. Em Santa
Catarina, a dissertação de Mattos Monteiro (2009) analisou a dinâmica das taxas de homicídio
no estado, ressaltando que as vítimas de homicídios possuem um perfil bem específico, isto é,
na grande maioria são jovens, negros, do sexo masculino e com escolaridade baixa. Em
consonância com este perfil, o Pronasci apresenta, como público-alvo, os jovens de 15 a 24
anos que considera “à beira da criminalidade”, ou seja, aqueles que se encontram ou
estiveram em conflito com a lei, além de presos ou egressos do sistema prisional40. Entretanto,
os delegados da 1ª Conseg possuíam na sua maioria entre 40 a 50 anos de idade (32,3%),
seguidos pela faixa etária de 30 a 40 anos (29,1%).
No gráfico 13, identifica-se a idade de acordo com o segmento, o que revela
especificidades na distribuição etária. O segmento poder público apresenta maior
concentração na faixa de 40 a 50 anos (40,2%), posteriormente entre 50 a 65 anos (31,8%). Já
a sociedade civil concentra-se nas faixas etárias mais elevadas. Entre 50 a 65 anos (31,5%) e
de 40 a 50 anos (28,7%). Por último, o segmento dos trabalhadores possui a maior parte dos
delegados, entre 30 a 40 anos (42,4%) e entre 40 a 50 anos (33,9%). Os trabalhadores também
envolvem o maior percentual na faixa de 20 a 30 anos (14,7%). Por outro lado, é praticamente
insignificante a participação de jovens com menos de 20 anos. De um modo geral, tais dados
indicam uma baixa representatividade dos jovens na Conferência. Ao observar a média de
idade dos delegados entrevistados na Conferência Estadual de Santa Catarina, encontra-se
uma média de idade de 38 anos, semelhante ao encontrado nos dados nacionais. Ainda assim,
considero necessário ressaltar a participação dos jovens da Cufa durante a Conferência
Estadual.
40http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJE24D0EE7ITEMIDAF1131EAD238415B96108A0B8A0E7398PTBRNN.htm Acesso em 05/03/2010.
100
Gráfico 13: Delegados da etapa nacional por idade
Fonte: Via Pública/MJ
Quando se identifica os delegados eleitos em Santa Catarina por municípios de
residência, ocorre uma predominância da capital Florianópolis (30,3%), sucedida por São José
(17,4%). Portanto, somente os municípios da Grande Florianópolis concentram quase metade
dos delegados entrevistados, o que corresponde a 11 pessoas. Os demais municípios41 que
apresentaram ao menos um delegado foram aqueles que realizaram Conferências Municipais
Preparatórias ou Conferências Livres. Ou seja, a eleição dos delegados está relacionada com o
envolvimento dos municípios em etapas anteriores a Conferência Estadual, o que remete à
ideia de um processo de construção da Conferência. Assim, é difícil tratar da etapa estadual
sem considerar as etapas preparatórias. Outro aspecto a ser citado, é que durante a
Conferência Estadual, alguns trabalhadores de outros municípios reclamaram da falta de
auxílio com hospedagem, pois apenas para a sociedade civil era fornecido hotel nas
proximidades da Acadepol.
4.3.2 Recursos individuais subjetivos
Os recursos individuais subjetivos abrangem questões de cultura política, como o
associativismo, filiação partidária, militância e remetem a uma dimensão importante do
conceito de poder, ou seja, a vontade de exercê-lo. Perissinotto (2004, p. 55) aponta que de
41 Balneário Camboriu, Brusque, Ituporanga, Lages, Blumenau, Criciúma, Joinville, São José, Florianópolis.
101
acordo com a literatura clássica e mais recente, “indivíduos que possuem vida associativa
tendem a se interessar mais pelos assuntos políticos”. Os delegados entrevistados de Santa
Catarina engajam-se majoritariamente em Associações Profissionais (13), ONG’s (10),
Conselhos municipais e gestores (7). Em menor ocorrência, são citadas as Associações de
Bairro (5) e os Sindicatos (5). No momento em que se relaciona as Associações Profissionais
com os Sindicatos, estes somam juntos 18 ocorrências, o que representa um número bem
significativo de entidades profissionais. É interessante observar que a Maçonaria também é
citada, ficando no mesmo patamar que movimentos religiosos, com três ocorrências. A
Maçonaria marcou presença na Conferência Municipal de Florianópolis, elegendo ao menos
um delegado na etapa estadual.
Tabela 5: Associações que os delegados de Santa Catarina participam
Sim Não Não respondeu Outros 8,6 91,4 0 Movimentos religiosos 13,0 82,6 4,3 Maçonaria 13,0 78,3 8,7 Sindicatos 21,7 73,9 4,3 Associações de bairro 21,7 73,9 4,3 Conselhos municipais e gestores 34,8 60,9 4,3 Ong's 43,5 52,2 4,3 Associação profissional 60,8 34,9 4,3 Fonte: Pesquisa empírica autora
Na questão em que os delegados citaram quais são as associações das quais fazem
parte, merece destaque a diversificação de Sindicatos e Associações Profissionais. Estão
presentes os Sindicatos de Servidores Públicos, de Trabalhadores em Segurança Pública, entre
outros, assim como diversas associações que representam os Policiais Civis, Oficiais
Militares, Psicólogos, Assistentes Sociais, Advogados. Outra associação citada é a Asscif –
Associação Comercial Industrial de Florianópolis, que segundo a delegada eleita de um
Conseg de Florianópolis, esta associação é a que mais apoia os Consegs no município,
fornece infra-estrutura como salas, veículos de comunicação. Esta delegada justificou a
parceria ao afirmar que o “comércio é quem mais precisa de segurança”.
Por conseguinte, são mencionadas as seguintes ONG’s Abadeus, situada em
Criciúma e que trata da proteção da criança e do adolescente; o Centro Cultural Escrava
Anastácia42 que visa inserir os jovens da periferia de Florianópolis em processos educativos;
42 “Surgido a partir da força e intuição das mulheres da comunidade do Mont Serrat, que queriam abrir possibilidades para que seus filhos não se deixassem enredar nas malhas do tráfico e da criminalidade, o CCEA
102
que se engajaram na Conferência Municipal de Florianópolis, na Conferência Estadual e
elegeram uma representante. Apesar da grande existência dos Consegs no Estado, estes são
citados por apenas três delegados, o que indica uma baixa presença destes conselhos nos
delegados de Santa Catarina. No que se refere aos Movimentos Sociais, é citado o Centro de
Direitos Humanos de Blumenau – CDH que elegeu um delegado, o Movimento Catarinense
de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais. O Movimento de Direitos Humanos
de Santa Catarina atuou em nível nacional para a realização da 1ª Conseg.
Outra possibilidade interessante de pesquisa consiste na realização de um
mapeamento por meio da análise de redes das entidades presentes na 1ª Conseg, identificando
de que forma elas se relacionam. Por exemplo, existem Consegs recebem apoio da Asscif; a
ONG Abadeus tem como parceira a Igreja Evangélica.
Quadro 6: Associações citadas pelos delegados de Santa Catarina
Ong’s Abadeus
Centro Cultural Escrava Anastácia Unesc – ABC União das Associações de Bairros de Criciúma
Sindicatos Sindicato Servidores Públicos Sindprevs-SC - Sindicato dos Trabalhadores em Saúde e Previdência do Serviço Público Federal Sintespe - Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Estadual de SC Sintrasp – Sindicato dos Trabalhadores em Segurança Pública de Santa Catarina
Movimentos religiosos Igreja Assembléia de Deus Igreja Católica Primeira Igreja Batista de Florianópolis
Associações de bairro Associação de Moradores Norte Azul Associação dos Moradores do Loteamento Anita Garibaldi
Associação profissional 6ª Arpoc – Associação Recreativa dos Policiais Civis Acors – Associação dos Oficiais Militares APROSMIVI (Serviço Social) Assif – Associação Comercial Industrial de Florianópolis
assumiu como missão, o empoderamento de sujeitos individuais e coletivos das periferias da Grande Florianópolis, e sua inserção social, através da implementação de processos educativos que possibilitem o aumento da autoestima, da capacidade de leitura e compreensão da realidade sócio-cultural e o compromisso comunitário e cidadão”. http://www.ccea.org.br/missao.php. Acesso em 04.02.2010
103
Associação Brasileira de Ensino de Psicologia Asspef CRB14 – Conselho de Biblioteconomia OAB – Ordem dos Advogados do Brasil
Conselhos municipais e gestores Conseg Canasvieiras Conseg Criciúma Conseg de Blumenau, Federação dos Consegs de SC Conselho da Comunidade da Comarca de Ituporanga Núcleo Gestor do Plano Diretor de Criciúma Conselho Municipal de drogas, Conselho municipal alimentar.
Movimento social CDDH – Centro de Direitos Humanos de Blumenau MCLGBTT – Movimento Catarinense de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais
Fonte: Pesquisa empírica autora
Os delegados de Santa Catarina declararam não possuir muito interesse nos partidos
políticos, pois 14 delegados disseram não se interessar nos partidos políticos (60,9%). Quando
interrogados acerca dos partidos políticos, o PT foi o que apresentou mais adeptos, com 6
ocorrências (26,1%), seguido pelo PSDB e PMDB com 3 ocorrências cada (13%). Ou seja, o
partido político que os delegados mais se identificam é o partido do Governo, que promove a
participação social pelas Conferências.
Gráfico 14: Interesse dos delegados em algum partido político
Fonte: Pesquisa empírica autora
104
Gráfico 15: Preferência ou simpatia por algum partido político
Fonte: Pesquisa empírica autora
No momento em que se considera a filiação partidária, 15 delegados (65,2%)
declaram não estar filiados em algum partido. Neste quesito, o PT e o DEM apresentam
apenas 2 filiados cada – número inferior ao dos interessados nestes partidos.
Gráfico 16: Delegados de Santa Catarina por filiação partidária
Fonte: Pesquisa empírica autora
105
4.3.3 Recursos Coletivos
Os recursos coletivos dimensionam a força de atuação das entidades. Para tanto,
foram realizadas questões referentes as instituições que as entidades já recorreram. Neste
aspecto, o gráfico 17 retrata que as instituições com maior expressividade foram o poder
executivo (91,4%) e o poder legislativo (91,4%). Na sequência, apareceu o poder judiciário
(78,3%); na última colocação ficou o Ministério Público (65,2%) que não esteve presente
entre os delegados indicados. O gráfico 18 refere-se às entidades que prestam apoio às
entidades, novamente destacaram-se os Sindicatos, Confederação, Federação com (56,5%) e,
se somar com outras entidades de classe, como as Centrais Sindicais, este percentual atinge o
número bem expressivo de 78,2%. Em segundo lugar, a Universidade é lembrada (52,2%),
assim como as Instituições Religiosas (43,5%). Por último, a Maçonaria marca presença
(21,7%).
Gráfico 17: Instituições que a entidade já recorreu:
Fonte: Pesquisa empírica autora
106
Gráfico 18: Entidades que a associação apoia
Fonte: Pesquisa empírica autora
Outros recursos coletivos importantes são os que abrangem as dimensões materiais,
como os veículos de comunicação. Grande parte dos delegados entrevistados (17) afirmou que
a sua entidade possui algum veículo de comunicação, o que corresponde a 74%. Dentre os
veículos mencionados, destaca-se em primeiro lugar os sites (15), depois os boletins (12),
jornal (8) e até mesmo os blogs são assinalados. Conforme já pude descrever na metodologia,
os sites e blogs desempenharam uma atuação interessante na divulgação de notícias sobre a
Conferência, assim como Conferências Livres realizadas e até mesmo contribuíram para a
articulação e divulgação das candidaturas dos delegados. O blog da APRASC é um bom
exemplo destas múltiplas atribuições da internet, tornando-se um recurso coletivo
organizacional muito poderoso.
107
Gráfico 19: Veículo de comunicação que a entidade possui:
Fonte: Pesquisa empírica autora
4.3.4 Percepções dos delegados sobre a Conferência
Nessa última parte da análise, discorro acerca da opinião dos delegados sobre
questões centrais da Conferência Estadual que abrangem a participação dos segmentos, os
eixos temáticos discutidos, os temas mais polêmicos debatidos, a visão dos delegados sobre o
que foi decidido para a política nacional de segurança pública e como avaliam a sua influência
na Conferência. A 1ª Conseg teve em seu desenho institucional uma composição tripartite
entre os segmentos: 40% sociedade civil, 30% trabalhadores, 30% poder público. Por isso,
questionei os delegados sobre a opinião deles no que se refere à participação paritária. A
maioria (17) mostrou-se favorável e defendeu este posicionamento das mais diversas formas,
entretanto, uma delegada entrevistada da sociedade civil foi enfática ao afirmar que se
envergonhou da participação da sociedade civil, considerando-a muito segmentada e que se
fosse gestora não gostaria de negociar com ela:
As pessoas não estão maduras para participar. Houve muitas brigas, conflito de ego que ficou ridículo. Nossa, isso é a participação da sociedade civil? Se fosse do governo, não gostaria de ter aquelas pessoas lá. Cada um puxando a brasa para a sua sardinha, enquanto cada um ficar levantando a sua bandeira fica difícil.
Convém complementar que esta mesma delegada defendeu outras posições
polêmicas no decorrer da Conferência, como mudanças no Estatuto da Criança e do
Adolescente, especialmente na redução da maioridade penal. Ou seja, existem alguns
participantes da sociedade civil que apresentaram deliberações em certa medida
conservadoras.
108
Gráfico 20: Opinião dos delegados sobre a participação paritária
Fonte: Pesquisa empírica autora
A participação dos delegados em outras Conferências pode expressar maior
familiaridade com o formato de uma Conferência. Neste sentido, Perissinotto (2004, p. 62) ao
tratar do Conselho de Assistência Social de Curitiba, avalia a participação das entidades nos
Conselhos e destaca que “quanto mais uma entidade participa esse tipo de instituição, mais
expertise ela adquire e, portanto, mais eficaz pode ser sua atuação”. Na Conferência de Santa
Catarina, a maior parte dos delegados (14) nunca tinha participado antes de uma Conferência.
Neste sentido, a 1ª Conseg pode ter desempenhado também um papel inclusivo para os
segmentos que não participavam desta experiência.
Gráfico 21: Participação dos delegados de Santa Catarina em conferências
Fonte: Pesquisa empírica autora No que se refere às outras Conferências, são apontadas em primeiro lugar a
Conferência de Direitos Humanos (5), depois as Conferências de Saúde (2) e também de
109
Assistência Social (1). As outras Conferências citadas são: Conferência das Cidades (1);
Conferência da Criança e do Adolescente (1); Conferência LGBTT (1); Conferência sobre
Entorpecentes e de uso de drogas psicotrópicas (2). A experiência em Conferências pode ser
apreendida como um recurso individual subjetivo, na medida em que aqueles que
participaram deste tipo de experiência já tinham familiaridade com o processo.
Gráfico 22: Participação dos delegados de Santa Catarina em diferentes conferências
Fonte: Pesquisa empírica autora O interesse dos delegados nos eixos temáticos informa muito sobre a participação
destes na Conferência, pois como demonstrei no capítulo anterior, cada eixo temático
apresenta uma agenda de discussões diferenciada. Além disso, os eixos temáticos necessitam
serem analisados à luz do desenho institucional da Conferência, questionando-se em que
medida eles propiciaram um debate amplo, com diversificação e inclusão de atores sociais, ou
agrega demandas de grupos específicos. Ao contrapor as observações da Conferência
Municipal de Florianópolis, na qual participei do eixo 1 e as observações da Conferência
Estadual na qual participei do eixo 5, foi possível identificar uma diferença significativa
quanto ao perfil da participação.
Conforme gráfico 23, os delegados catarinenses participaram majoritariamente no
Eixo 5 – Prevenção da Violência e Construção da Cultura de Paz. Contudo, como é possível
identificar no gráfico 24, a participação no eixo 5 apresenta uma vinculação estrita com a
sociedade civil, pois quase todos os delegados da sociedade civil participaram deste eixo (12).
110
Gráfico 23: Delegados de Santa Catarina por eixo temático
Fonte: Pesquisa empírica autora
Gráfico 24: Delegados de Santa Catarina por eixo temático
Fonte: Pesquisa empírica autora
Em contrapartida, os dados das pré-inscrições expostos no gráfico 25 apontam um
interesse maior pelo eixo 3, mas a análise destes dados é incompleta quando não se cruza com
os segmentos participantes de cada eixo. Quando se realiza este cruzamento entre segmento e
eixo temático (de acordo com gráfico 26), novamente o eixo 5 destaca-se como composto
pelos interesses da sociedade civil (49%), ao passo que o eixo 3 - “Valorização profissional e
otimização das condições de trabalho” mobiliza principalmente a participação dos
111
trabalhadores (29%). Outro constraste interessante diz respeito ao eixo 4 – “Repressão
qualificada da criminalidade”, que mobiliza o maior número de gestores de todos os eixos
com 24%, e um número pequeno da sociedade civil (5%). Assim, a análise da composição dos
eixos temáticos deixa clara a dicotomia entre repressão e prevenção (descrita no capítulo 1)
no desenho institucional da Conferência e o respectivo interesse por parte dos gestores e da
sociedade civil em demandas diferenciadas. A partir destas exposições, é possível tecer
questionamentos quanto a possibilidade de interação e deliberação entre os três segmentos, e
afirmar que, neste sentido, o desenho institucional dificultou o debate.
Gráfico 25: Participantes da Conferência Estadual por eixo temático
Fonte: Base Pré-Inscrições Secretaria de Segurança Pública / Gráfico autora
112
Gráfico 26: Participantes da Conferência Estadual por eixo temático e segmento
Fonte: Base Pré-Inscrições Secretaria de Segurança Pública / Gráfico autora
4.3.5 Resultados da Conferência
Soares, Rolim e Ramos (2009) destacam na pesquisa “O que pensam os profissionais
da segurança pública, no Brasil” que a grande maioria dos policiais deseja mudanças
institicionais, que querem “novas polícias” e não concordam com o atual modelo
organizacional. Consideram ainda que os policiais militares são mais “mudancistas” do que os
civis e que não haveria diferenças significativas neste quesito entre os oficiais e os não-
oficiais na Polícia Militar. Neste sentido, apontam que apenas 15% dos policiais militares
brasileiros defendem a manutenção do atual modelo de polícia e, inversamente, nos policiais
civis, os percentuais atingem 56,4% entre os delegados e 51,2% entre os agentes.
Os pesquisadores também questionaram a opinião dos profissionais de segurança
pública sobre o modelo de polícia que consideram ideal. Dos policais militares não oficiais,
42,1% preferem que a polícia seja unificada e que seja civil. Já entre os oficais, não passam de
15,8% os que se identificam com a unificação de polícias da forma civil. Sendo assim, os
autores apresentam uma conclusão interessante e apontam que os oficiais demonstram mais
apreço a “identidade militar” do que os não-oficais.
É justamente esta discussão sobre o modelo de polícia que é colocado pelos delegados
entrevistados da Conferência Estadual como o tema mais polêmico discutido nesta etapa, com
113
32,1% de ocorrências. Trata-se da diretriz amplamente defendida pelos Praças da
“Desmilitarização da Polícia Militar”, que justamente representa um questionamento ao
caráter militar da instituição.
Gráfico 27: Temas mais polêmicos que ocorreram na Conferência:
Fonte: Pesquisa empírica autora
114
Com efeito, percebe-se uma rejeição ao modelo militar e aos seus princípios fundantes
de hierarquia e disciplina. É importante analisar com cautela a mobilização dos Praças para
compreendê-la de uma forma mais aprofundada, pois ao mesmo tempo em que envolve
reinvindicações corporativas, expressa um questionamento mais amplo sobre a própria
instituição. A análise de Soares, Rolim e Silva aprofunda os significados do questionamento à
ordem militar e apontam às mudanças que emergem:
É possível que essa rejeição ao modelo militar de um contingente tão expressivo de profissionais guarde relação direta com as opiniões manifestadas a propósito de alguns tópicos particularmente sensíveis, como hierarquia e disciplina, e com processo de vitimização, decorrentes do modo pelo qual o formato militar tem sido praticado e vivido, nas polícias brasileiras. (...) O “não” ao modelo militar vigente talvez possa tornar-se um “sim” caso a forma de que ele se reveste mude em aspectos cruciais como: o regimento disciplinar, o proverbial desrespeito aos direitos constiticionais dos policais, a hierarquia enrijecida atravancando a plasticidade e o dinamismo da gestão e do trabalho na ponta, a vinculação ao Exército enquanto grilhão que imobiliza a estrutura organizacional e a cultura corporativa. (SOARES, ROLIM e SILVA: 2009:3)
O gráfico 28 expõe a opinião dos delegados entrevistados sobre a potencialidade da
Conferência em conseguir abarcar as prioriades para a política nacional de segurança pública.
As respostas sinalizaram uma considerável divisão nas opinões, pois 57% consideraram que
as prioridades da área foram contempladas e 39% apontam que não. No que se refere ao poder
dos delegados de influenciar as decisões no decorrer da Conferência, a maior parte diz
influenciar de forma mediana (65,2%).
Gráfico 28: A Conferência conseguiu abarcar as prioriedades para a política nacional de Segurança Pública?
Fonte: Pesquisa empírica autora
115
Gráfico 29: Como o (a) Sr. (a) avalia seu poder de influenciar as decisões?
Fonte: Pesquisa empírica autora
Para melhor situar as respostas expostas no gráfico 29, o questionário abarcou
também uma pergunta aberta para que os delegados pudessem discorrer sobre a mesma
questão. Estas respostas foram muito interessantes e foram organizadas em quatro categorias
principais com o intuito de facilitar a análise. As primeiras respostas apontam limites quanto à
participação por aspectos diferentes, seja por temas “pré julgados”, pela diversidade de atores
envolvidos ou mesmo pela dificuldade de ter acesso ao caderno de princípios e diretrizes
eleitas. Os quatro quadros a seguir agregam estas respostas de acordo com o segmento dos
participantes.
116
1. Limites quanto à participação Sociedade Civil, representante de ONG Porque acredito que alguns temas já
estavam pré julgados. Espaços muito pequenos para grupos muito grandes.
Sociedade Civil, Secretário Municipal de Defesa do Cidadão
Discussões poderiam ter fluido melhor se tivéssemos tido acesso ao caderno com todos os princípios e diretrizes votados nas demais etapas da CONSEG. Mesmo assim valeu. Creio que demos um grande passo para o fortalecimento de uma sociedade mais cidadão, mais justa e com maior equilíbrio social. Ainda há muito o que se fazer, mas o primeiro passo foi dado. Democracia é o caminho.
Trabalhador, PRF Somos muitas vozes, com tons e sons diferentes, todos com um objetivo, porém com reservas e vaidades diferentes.
Sociedade civil, representante de Conseg
Poderia ser melhor, porém os representantes de partidos políticos e de alguns segmentos profissionais estavam bem mais afinados e puderam contemplar melhor seus anseios, pela união e direcionamento das falas e participações.
Já as respostas categorizadas na sequência, fazem apontamentos a questões
corporativas, destacando aspectos como a articulação entre grupos para aprovar princípios e
diretrizes, como apontou um Guarda Municipal e um representante de Conseg. Outro
entrevistado considerou que ocorreu também “articulação antecipada de algumas
instituições”. Os demais entrevistados apontaram limites para a participação, por se tratarem
de “várias categorias profissionais e segmentos que pensam de forma divergente”. Um Oficial
apontou, ainda, que muitos participantes teriam uma “posição radical” ao seu segmento.
2. Corporativismo Trabalhador, Guarda Municipal Mediante grande articulação com os demais
participantes conseguimos colocar entre os princípios e diretrizes mais votadas todos os assuntos que tratam do segmento ao qual faço parte.
Sociedade civil, representante da Conseg Até por estar no Conseg, conseguir conversar com as pessoas. Nós as apoiamos em algumas diretrizes e elas também nos apoiaram.
117
Trabalhador, Oficial da PM Infelizmente grande parte dos participantes da Conferência tinham posição radical em relação aos Oficiais das Polícias.
Sociedade civil, representante de ONG Por ter influenciado, por meio de argumentos, os grupos de trabalho, por ter ajudado a levar propostas de diretrizes e princípios à conseg nacional e por ter influenciado a aprovação de muitas destas diretrizes e princípios.
Trabalhador, Polícia Civil O processo de participação tem seus limites, afinal são várias categorias profissionais e segmentos que pensam de forma divergente e com interesses próprios.
Sociedade Civil, Representante de ONG e Conseg
Tendo em vista a articulação antecipada de algumas instituições, para a aprovação da redação dos princípios e diretrizes.
O grau de envolvimento na Conferência e a respectiva experiência profissional na área
de segurança pública estão contemplados na terceira categorização. Neste quesito, destacam-
se os trabalhadores que fazem refência a sua trajetória na área como um ponto positivo da sua
participação, como “pela experiência de 27 anos” ou por atuar “há mais de trinta anos”. Esta
experiência estaria aliada em algumas respostas ao estudo especializado.
3. Grau de envolvimento na Conferência e experiência na área
Trabalhador, Polícia Civil Por acompanhar desde o início as discussões, por ser profissional de segurança pública, pai de família e ciente dos atuais problemas sociais e criminosos.
Sociedade civil, representante da Conseg Por considerar muitos aspectos envolvidos na temática a ser discutida.
Trabalhador, Agente prisional Porque possuo conhecimento no eixo em que atuei e trabalho diretamente no sistema penitenciário, colocando para os demais as necessidades do dia-a-dia.
Gestor, Oficial da PM Pela experiência de 27 anos nesta área e estudo especializado.
Trabalhador, Oficial da PM Por atuar na Segurança Pública há mais de trinta anos, bem como por estar preparado para os debates com argumentos técnico-científicos convincentes.
Trabalhador, Oficial da PM Me preparei para o evento e soube ouvir e aceitar as opiniões diferentes.
Sociedade civil, Policial Militar aposentado, integrante da APRASC
Porque estávamos ali, na Conferência, de corpo e alma, desarmados de interesses pessoais, objetivávamos o melhor para a
118
sociedade, consequentemente, o melhor para os operadores de segurança pública.
Algumas respostas teceram elogios à inicitativa de participação. Neste sentido,
aponto as considerações de um representante de movimento social que avaliou a Conferência
enquanto “um processo de construção coletiva e não de embates e disputas”. Outros
eleogiaram o nível de argumentação dos debates e que souberam aproveitar o “espaço da vez
e voz”.
4. Elogios à participação
Sociedade civil, representante de movimento social
Foi respeitando o debate, participando com argumentações coerentes e sérias, que de uma forma ou de outra pude perceber que não tenho a pretensão de poder manipular as decisões, nesse sentido, tivemos resultados de um processo de construção coletiva e não de embates e disputas.
Sociedade civil, Policial Civil Os representes na Conferência tinham excelente formação política para os debates, bem como nível de argumentação também foi muito bom.
Sociedade civil, professora e representante de ONG
Nas três etapas que participei, falei do meu anseio e trouxe as necessidades da sociedade civil. Aproveitei o espaço da vez e voz.
119
Considerações Finais
O processo de construção da 1a Conseg revela a complexa engenharia institucional
que envolveu toda a concepção e realização da Conferência. Este processo abrangeu o
financiamento de diversas pesquisas, parcerias internacionais com o PNUD e empresas de
mobilização. Uma preocupação que marcou a realização da Conferência foi o receio de que
esta caísse no corporativismo. Por isso, o Ministério da Justiça apostou em uma concepção de
Projeto Metodológico avaliado nas dimensões política, técnica e pedagógica. Neste sentido, a
dimensão pedagógica visou fomentar a participação e a articulação de redes sociais.
Na atuação do mobilizador no decorrer da Conferência Municipal, emerge também o
discurso da “dimensão pedagógica” da 1a Conseg. Ou seja, esta é entendida como um
processo de articulação entre segmentos que até então não compartilhavam soluções, isto é,
como um aprendizado, mais do que ser capaz de solucionar todos os impasses da área. Na
Conferência Municipal de Florianópolis, a presença do mobilizador foi apontada como uma
“peça-chave” para a própria Comissão Organizadora Estadual. Assim sendo, pela proposta do
Ministério da Justiça e dos mobilizadores destaca-se a dimensão pedagógica, de aprendizado
político.
No que tange de forma mais específica o desenho institucional, dois aspectos merecem
ser destacados. Primeiramente, a Conferência teve preocupação em seu desenho institucional
de possibilitar a representação de gênero, o que culminou na eleição de 22 delegadas de um
total de 61. Mais da metade das delegadas (14) eleitas são da sociedade civil. Nesta
perspectiva, é possível destacar que a Conferência oportunizou a inclusão de gênero em um
campo marcado pela presença masculina e aqui se destaca a participação da sociedade civil.
Entretanto, a organização da Conferência em sete eixos temáticos dificultou uma
maior interação no aprofundamento dos debates entre os três segmentos. Com efeito, a análise
da composição dos eixos temáticos deixou clara a dicotomia entre repressão e prevenção no
desenho institucional da Conferência, bem como o respectivo interesse por parte dos gestores
e da sociedade civil em demandas diferenciadas.
A contribuição analítica da abordagem dos recursos questiona, em certa medida, as
características atribuídas como principais do processo deliberativo. Neste sentido, a análise
dos recursos individuais e coletivos dos delegados da Conferência Estadual e as observações
do próprio momento decisório fornecem elementos interessantes para compreender sobre
como os recursos são mobilizados. Embora um estudo mais aprofundado dos recursos não
tenha sido possível pela dificuldade encontrada na aplicação dos questionários, os dados
120
identificados apontam para o perfil elitizado dos participantes e a presença marcante de
associações e sindicatos. Aqui os recursos estão relacionados também com as características e
valores fundantes das próprias instituições que compõem a segurança pública, manifestando-
se de diferentes formas, ou seja, o item corporação adquire relevância.
Ao tratar da elitização da participação, a escolaridade adquiriu centralidade enquanto
recurso individual e coletivo. É importante contextualizar que na pesquisa realizada por
Soares, Rolim e Ramos (2009), a escolaridade que predominou é o nível superior completo e
incompleto (53,6%), seguido pelo nível médio (42,2%). Já nos dados aqui analisados, a maior
concentração ocorreu no nível de pós-graduação, o que reforçou a ideia de que na Conferência
participaram com mais intensidade os trabalhadores de maior escolaridade.
A Conferência deve ser compreendida enquanto espaço de exposição dos conflitos,
dilemas de cada estado e do próprio campo da Segurança Pública. Neste sentido, as
contribuições de Sapori são interessantes, pois o autor considerou que os interesses
corporativos e a fragilidade propositiva dos movimentos sociais são “sintomas do status quo
do campo da segurança pública na sociedade brasileira”. Entretanto, acredito que são
necessárias reflexões mais aprofundadas sobre os movimentos sociais no campo da segurança
pública. De forma conclusiva, Sapori analisa a I Conseg como responsável por desnudar uma
“Torre de Babel”:
A I Conseg apenas desnudou a verdadeira “Torre de Babel” que caracteriza um campo simbólico, nos termos de Pierre Bourdieu, bastante incipiente, caracterizado por crenças que o sustentam ainda muito díspares, o que torna o jogo de linguagens que nele se joga e as coisas materiais e simbólicas que nele se geram manifestações relativamente caóticas. Estamos apenas iniciando a construção do campo da segurança pública na sociedade brasileira (SAPORI, 2010:165).
A realização de Conferências Nacionais está claramente relacionada com o projeto
político participativo do PT no Governo Federal. Entretanto, nos níveis estaduais e
municipais, a vontade política do poder executivo também importa para compreender
questões referentes à organização da Conferência e até mesmo certos descasos, a exemplo das
muitas lacunas encontradas no relatório da etapa estadual catarinense. Assim, a indagação que
emerge das análises realizadas diz respeito a seguinte indagação: em que medida as
Conferências circunscrevem-se ao projeto político do PT ou serão incorporadas enquanto um
projeto de Estado, com continuidade nos próximos governos? Além disto, quais serão os
desdobramentos do momento Pós-Conseg na implementação de políticas públicas?
121
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124
Anexos
125
Questionário
1) Qual é a sua idade?_______________ 2) Qual é o seu sexo? ( ) 1. Masculino ( ) 2. Feminino 3) Qual é o seu município de residência?_______________________
4) Qual é o seu nível de escolaridade?
( ) 1. Ensino Fundamental incompleto ( ) 2. Ensino Fundamental completo ( ) 3. Ensino Médio incompleto ( ) 4. Ensino Médio completo ( ) 5. Ensino Superior incompleto ( ) 6. Ensino Superior completo ( ) 7. Pós-graduação incompleta ( ) 8. Pós-graduação completa
4.1) Se fez curso de graduação, qual foi a área?______________________________ 4.2) Se fez algum tipo de pós-graduação, qual foi a área?______________________ 5) Qual é a sua profissão? ______________________________ 6). Qual é a renda mensal da sua família? ( ) 1. Até 1 salário mínimo ( ) 2. De 1 a 2 salários mínimos ( ) 3. De 2 a 5 salários mínimos ( ) 4. De 5 a 10 salários mínimos ( ) 5. Mais de 10 salários mínimos
7) O(a) Sr. (a) faz parte de alguma dessas organizações a seguir? (Marque X nas respostas) Organização Sim Não Qual? 1. Ong’s 2. Sindicatos 3. Movimentos religiosos 4. Associação de bairro 5. Associação profissional 6. Conselhos gestores de políticas públicas
7. Maçonaria 8. Outros 8) A sua entidade possui algum veículo de comunicação, tal como jornal, boletim, etc...?
126
( ) 1. Sim ( ) 2. Não (Pule para a questão número 10) ( ) 3. Não sabe (Pule para a questão número 10) 9) Se a resposta anterior for “sim”, quais destes veículos de comunicação a sua entidade possui ou não? ( ) 1. Jornal ( ) 2. Boletim ( ) 3. Site ( ) 4. Blog ( ) 5. Outros___________________ 10) A sua entidade já recorreu aos membros das seguintes instituições: Sim Não Não sabe
1. Legislativo 2. Executivo 3. Judiciário 4. Ministério Público
11) O (A) Sr. (a) tem preferência ou simpatia por algum dos partidos políticos listados abaixo? (Marque X nas respostas) ( ) 1. PDT ( ) 2. DEM (ex-PFL) ( ) 3. PMDB ( ) 4. PP ( ) 5. PSB ( ) 6. PSDB
( ) 7. PT ( ) 8. PTB ( ) 9. Outros ( )10. Não tenho preferência por nenhum partido político
12) O Sr(a) é filiado a algum dos partidos políticos listados a seguir? ( ) 1. PDT ( ) 2. DEM (ex-PFL) ( ) 3. PMDB ( ) 4. PP ( ) 5. PSB ( ) 6. PSDB ( ) 7. PT
( ) 8. PTB ( ) 9. Outros ( )10. Não tenho preferência por nenhum partido político ( ) 11. Não sou filiado a nenhum partido político.
13) Qual é o setor que o (a) Sr. (a) representou na Conferência? ( ) 1. gestor ( ) 2. trabalhador ( ) 3. sociedade civil 14) Qual a instituição (secretaria/departamento/setor) que representa?__________ 15) Entre os grupos listados a seguir, quais têm dado apoio à sua entidade?
127 Grupos Apóia Não-apóia
1. Central Sindical 2. Sindicato, Federação
e/ou Confederação
3. Fórum de entidades 4. Igreja/Instituições
Religiosas
5. ONG’s 6. Partido Político 7. Universidade 8. Maçonaria 9. Outros
Atenção: as questões 16 a 18 referem-se a cada segmento.
16) Gestor, em relação aos segmentos listados, o seu segmento tende a ter interesses: (caso seja trabalhador, pule para a questão 17 e caso seja sociedade civil pule para a 18). Idênticos Próximos Distantes Conflitantes Trabalhador Sociedade civil
17) Trabalhador, em relação aos segmentos listados, o seu segmento tende a ter interesses: Idênticos Próximos Distantes Conflitantes Gestor Sociedade civil
18) Sociedade civil, em relação aos segmentos listados, o seu segmento tende a ter interesses: Idênticos Próximos Distantes Conflitantes Gestor Trabalhador 19) Você é a favor da participação paritária dos três segmentos; gestor, trabalhador e sociedade civil? ( ) 1. Sim ( ) 2. Não 20) Por quê?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
21) Das conferências listadas a seguir, o Sr./Sra. participou de quais? ( ) 1. Conferência de Direitos Humanos
128 ( ) 2. Conferência de Educação ( ) 3. Conferência de Assistência Social ( ) 4. Conferência de Saúde ( ) 5. Outras_______________________ ( ) 6. Nenhuma. 22) O Sr./Sra. Participou de quais etapas da 1ª Conseg? ( ) 1. Conferência municipal preparatória ( ) 2. Conferência municipal eletiva ( ) 3. Conferência estadual
( ) 4. Conferência Nacional ( ) 5. Conferências Livres ( ) 6. Seminários Temáticos ( ) 7. Conferências Virtuais
23) Organizou alguma Conferência Livre? ( ) 1. Sim Qual?___________________________ ( ) 2. Não 24). Se participou de Conferências Livres, qual(is) instituições organizaram? ______________________________________________________________________ 25) Participou de qual eixo-temático na Conferência Estadual? ( ) Eixo 1 – “Gestão democrática: controle social e externo, integração e federalismo” ( ) Eixo 2 – “Financiamento e gestão da política pública de segurança” ( ) Eixo 3 – “Valorização profissional e otimização das condições de trabalho” ( ) Eixo 4 – “Repressão qualificada da criminalidade” ( ) Eixo 5 – “Prevenção social do crime e das violências e construção da cultura de paz” ( ) Eixo 6 – “Diretrizes para o sistema penitenciário” ( ) Eixo 7 “Diretrizes para o sistema de prevenção, atendimento emergenciais e acidentes” ( ) Nenhum. 26) Quem apresentou mais assuntos para serem debatidos e decididos no seu eixo-temático em primeiro lugar? (marcar uma alternativa) ( ) 1. Gestores ( ) 2. Psicólogos policiais ( ) 3. Delegados ( ) 4. Policiais militares ( ) 5. Oficiais da polícia militar ( ) 6. Guardas Municipais ( ) 7. Policias Rodoviários Federais ( ) 8. Delegados ( ) 9. Educadores
( ) 10. Entidades de defesa dos direitos humanos ( ) 11. Representantes de ONG’s ( ) 12. Representantes dos Consegs ( ) 13. Pesquisadores da área ( ) 14. Lideranças comunitárias ( ) 15. Políticos ( ) 16. Outros (especificar)
27) Quem apresentou mais assuntos para serem debatidos e decididos no seu eixo-temático em segundo lugar? (marcar uma alternativa) ( ) 1. Gestores ( ) 2. Psicólogos policiais
129 ( ) 3. Delegados ( ) 4. Policiais militares ( ) 5. Oficiais da polícia militar ( ) 6. Guardas Municipais ( ) 7. Policias Rodoviários Federais ( ) 8. Delegados ( ) 9. Educadores
( ) 10. Entidades de defesa dos direitos humanos ( ) 11. Representantes de ONG’s ( ) 12. Representantes dos Consegs ( ) 13. Pesquisadores da área ( ) 14. Lideranças comunitárias ( ) 15. Políticos ( ) 16. Outros (especificar)
28) Na sua opinião, quais foram os três temas mais polêmicos que ocorreram dentro da Conferência? ______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
29) Na sua opinião, a Conferência Estadual conseguiu abarcar as prioridades para a política de segurança pública? ( ) 1. Sim ( ) 2. Não 30) Na sua opinião, qual deve ser a prioridade para a política nacional de segurança pública no Brasil? ______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
31) Com relação à sua participação na Conferência, como o (a) Sr. (a) avalia seu poder de influenciar as decisões? ( ) 1. Nenhum ( ) 2. Pequeno ( ) 3. Médio ( ) 4. Grande
130
32) Por quê?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
131
Apêndice
Diretrizes elaboradas pelo eixo temático 5 na Conferência Estadual de Segurança Pública.
Nº Diretriz 1 Garantir a transversalidade de noções de Segurança Pública e prevenção social desde
a educação infantil até o ensino superior, promovendo a ética, a cultura da paz e a cidadania participativa, à luz dos direitos humanos, entendendo a educação como base da estrutura social.
2 Garantir o acesso, efetivação e a obrigatoriedade de uma rede de serviços públicos de qualidade, nas áreas de saúde, educação, justiça, comunicação, segurança, cultura, esporte, lazer e assistência social, como instrumentos para a prevenção social do crime e das violências, instituindo mecanismos de diálogo, controle social e avaliação permanente.
3 Instituir o planejamento estratégico com a interdisciplinaridade e participação da família na formação do caráter, incluindo valores e discussões éticas.
4 Incentivar a criação de centros integrados de profissionais de segurança pública e demais atores da sociedade civil organizada, promovendo a capacitação dos membros tornando-os multiplicadores de ações, programas e campanhas de prevenção.
5 Fomentar e integrar bases de dados científicos, valorizando-se as pesquisas de vitimização.
6 Agregar a mídia no processo de prevenção social do crime e da violência e de construção da paz.
7 Estimular o aumento de Escolas em Período Integral (EPI), no Ensino Fundamental, como forma de prevenção à violência.
Tabela: Delegados de Santa Catarina por profissão
Advogada 1 Agente Prisional 1 Analista Estatístico 1 Assistente Social 1 Bibliotecária documentalista 1 Bombeiro Militar 1 Deputado 1 Funcionário Público Estadual 1 Guarda Municipal 2 Oficial da Policia Militar 3 Policial 1 Policial Civil 2 Policial Militar Aposentado 1 Professor(a) 2 Psicóloga 2 Publicitária 1
132
Tabela: Delegados de Santa Catarina por áreas de pós-graduação*
Administração 1 Direito 2 Engenharia de Produção e sistemas de informação 1 Especialização nas metodologias (Infantil, Fundamental, Superior)
1
Gestão em Defesa Civil 1 Gestão Empresarial 1 Interdisciplinar 1 Marketing 1 Políticas Públicas 2 Psicoterapia de Grupo 1 Saúde Pública 2 Terapia Familiar 1 Segurança Pública 4 Total 20 *contabilizadas por curso
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