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ACIME | Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas
B Ib o l e t i m i n f o r m a t i v o # 2 8
Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas
acime
PRESIDENTE DA REPÚBLICA VISITA CNAI
INTEGRAÇÃO DOS IMIGRANTES:UMA QUESTÃO NACIONAL
CENTRO NACIONAL DE APOIO AO IMIGRANTE
UM ANO DE ATENDIMENTO
PORTUGAL:
PAÍS XENÓFOBO?
A B R I L
Boletim Informativo Abril 2005Boletim Informativo Abril 2005
A 2 de Abril de 2005, na cidade do Vaticano, morreu o Bispo de Roma, o Papa João Paulo II, chefe
visível da Igreja Católica, com 84 anos de idade e 26 anos de pontificado, no termo de um prolongado
envelhecimento e de uma dolorosa doença.
Polaco de origem e de formação, profundamente empenhado nas alterações político-sociais aconteci-
das no Leste Europeu, viajante universal, o Mundo acompanhou atento o seu envelhecimento e a sua
morte, através da comunicação social.
Era o líder da mais numerosa confissão religiosa à face da Terra, a Igreja Católica, e por isso a sua
morte, quaisquer que fossem as circunstâncias, não poderia deixar de ter um forte impacto na opinião
pública. Mas o que a sua morte veio manifestar, de modo inegável, é que ele era muito mais do que o
simples líder da Igreja Católica. Na verdade, e só pela sua morte o pudemos avaliar, tornou-se o gran-
de líder mundial, a grande referência de valores para a Humanidade inteira. Porquê? De que modo?
João Paulo II foi conduzido pela sua fé cristã, forte, explícita, desassombrada, mas onde é que esta
fé o conduziu?
Ao Homem, podemos resumir numa palavra. Incansável, batalhador, sem desânimos ou desistências,
ele foi, em todas as situações e circunstâncias, o grande defensor do Homem e da dignidade humana,
desde a sua concepção até ao termo da sua vida.
Ricos e pobres, poderosos e débeis, brancos, pretos ou amarelos, todos couberam no seu coração, no
seu amor e no seu serviço.
Diálogo entre Religiões, movimento ecuménico, luta pela liberdade, defesa da paz e da reconciliação,
promoção da justiça e dos direitos do Homem, migrações, diálogo intercultural, tudo isto e muito
mais esteve no horizonte da sua palavra e da sua intervenção, vigorosa, cheia de coragem e de opor-
tunidade.
E tudo isto que João Paulo II disse e fez, utilizando os modernos meios de transporte e de comuni-
cação social, fê-lo com amizade, com proximidade, muitas vezes com humor, privilegiando os jovens
- que são o futuro - e os mais pobres e “desprovidos” - que são os mais desumanizados.
Referência religiosa e ética da humanidade, João Paulo II é também para nós, implicados na nobre
causa da Imigração e das Minorias, uma luz e um exemplo.
Qualquer que seja a nossa origem, ideologia ou opção religiosa, que as sementes que este Papa lançou
frutifiquem no quotidiano da nossa vida, do nosso trabalho e do nosso serviço.
Com ele podemos apreender as condições e os caminhos de uma humanidade mais humana, isto é,
mais justa, digna e fraterna.
P. António Vaz Pinto, s.j.
Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas
(...) Incansável,
batalhador, sem
desânimos ou
desistências, ele
foi, em todas
as situações e
circunstâncias, o
grande defensor
do Homem e da
dignidade humana
(...)
P. António Vaz Pinto, s.j.
EDITORIAL
JOÃO PAULO II
ACIME LANÇA CAMPANHA
PORTUGAL IMIGRANTE.PORTUGAL TOLERANTE. O ACIME vai lançar, no decurso da Primavera, a campanha “Portugal
Imigrante. Portugal Tolerante”, concebida pela agência de publicidade
Uzina. Portugal, como todos os países da União Europeia, é hoje um
destino de imigração. Contudo, ou por preconceito ou sobretudo por
falta de informação, muitos portugueses olham ainda com desconfiança
para os imigrantes, associando a sua presença a fenómenos de violência,
criminalidade e exclusão social e não ao enorme contributo para o desen-
volvimento do país. Assim, o desafio
que se colocou para esta campanha de
comunicação foi alterar a percepção
dos cidadãos portugueses face aos imi-
grantes e minorias étnicas em geral, e
reforçar os aspectos positivos de uma
sociedade aberta e multicultural que
oferece um bom acolhimento e inte-
gração. Para isso, foi desenvolvido um
conceito criativo baseado naquilo que é
desde logo mais facilmente percebido
como o factor mais positivo da presen-
ça de imigrantes no nosso país: o con-
tributo, através do seu trabalho, para
o desenvolvimento económico nacional.
Esse conceito foi desenvolvido atra-
vés de uma campanha de televisão,
imprensa e publicidade exterior onde
imigrantes reais, de diversas origens
e profissões, testemunham com um
sorriso genuíno o nosso e o seu agra-
decimento pelo contributo para um
Portugal melhor.
Boletim Informativo Abril 2005
O Observatório da Imigração promoveu no dia 7 de Março um workshop dedicado ao estudo “A Criminalidade de Estrangeiros em Portugal – um
inquérito científico”, desenvolvido por Hugo Martinez de Seabra e Tiago Santos, do Númena – Centro de Investigação em Ciências Sociais e
Humanas. Segundo este estudo, “há maior probabilidade de estrangeiros, quando confrontados com o sistema judicial, serem condenados a uma
pena de prisão efectiva ou de ter uma prisão preventiva antes da condenação”, afirmou Hugo Martinez de Seabra, um dos
coordenadores do estudo. Este investigador declarou que a conclusão assenta em estatísticas “puras e duras” dos proces-
sos julgados em Portugal entre 1997 e 2003, mas distinguiu, no entanto, estrangeiros e imigrantes, o que é “muitas vezes
confundido”. Por vezes, “existem pessoas em trânsito, como os correios de droga, que nunca tiveram pretensão de imigrar
para o país”, explicou o investigador, referindo também o caso dos “hooligans” na altura do Euro 2004, que também con-
taram para as estatísticas. Este estudo será brevemente publicado no âmbito do Observatório da Imigração.
A Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres defendeu um adiamento do repatriamento dos imigrantes ilegais para permitir
uma investigação mais eficaz das redes internacionais de tráfico humano. “A expulsão e o repatriamento imediato não termina com o fenómeno
das redes cada vez mais organizadas de tráfico de mulheres para fins de exploração sexual, mas apenas o deslocaliza”, frisou um elemento da
Comissão. Nuno Gradim defendeu, em alternativa, a criação de um “período de reflexão”, prévio ao repatriamento do imigrante, para que este
possa colaborar com as autoridades na investigação dos factos. Desta forma, considerou, o trabalho das forças de segurança não se traduzirá
apenas numa transferência do problema da exploração sexual para outros destinos, mas pode contribuir para o efectivo desmantelamento das
redes internacionais que estão na origem deste crime.
Esta estratégia foi defendida no dia 18 de Março no Porto, na apresentação das conclusões da primeira fase de um projecto de Cooperação-Acção-
Investigação-Mundivisão (CAIM) na área da prostituição e do tráfico de mulheres, no âmbito de uma iniciativa comunitária. Para identificar as
“necessidades reais” de Portugal para combater o tráfico de mulheres, a Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres realizou,
durante cinco meses, um levantamento exaustivo junto das entidades que trabalham directamente, tanto na intervenção social, como na investi-
gação criminal. De entre as principais conclusões do estudo, os elementos da comissão frisaram ainda a necessidade de criar uma campanha de
sensibilização “séria”, onde se perceba o alcance do problema que atinge várias mulheres em todo o mundo. Foi defendida ainda a criação de
uma linha de S.O.S de apoio à vítima das redes internacionais de tráfico de mulheres, com tradutores especializados que facilitem a comunicação
“em todas as línguas”.
TRÁFICO DE MULHERES
A INVESTIGAÇÃO É UMA PRIORIDADE
JUSTIÇA
ESTRANGEIROS COM TRATAMENTO DESIGUAL
Um investigador do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), Eduardo Sousa Ferreira, defendeu no dia 8 de Março que os imigrantes
contribuíram com cinco por cento para a riqueza produzida em Portugal entre 1998 e 2001, sendo indispensáveis à economia nacional. Estas
declarações foram proferidas por ocasião do seminário dedicado ao tema “Actividade Sectorial e Regional dos Imigrantes”, que decorreu no
ISEG. O docente adiantou ainda que “Portugal necessita de mão-de-obra estrangeira, caso pretenda produzir mais”. Apesar da taxa de desem-
prego ser elevada em Portugal, a dos imigrantes é “sempre mais baixa”, porque “os estrangeiros vêm para o país fazer aquilo que os cidadãos
nacionais normalmente não querem fazer”. Os imigrantes trabalham no sector secundário, nomeadamente na construção civil, hotelaria, restau-
ração e serviços.
Eduardo Sousa Ferreira apontou a existência de discriminação, em relação aos imigrantes que trabalham no sector secundário. Essa discrimina-
ção passa por “fracas condições de trabalho, baixos salários e por contratos de trabalho precários”, afirmou, acrescentando que os imigrantes
só poderão superar essa discriminação quando estiverem integrados e quando se souberem defender. O investigador considerou igualmente que
“nunca existiu no sector secundário uma formação tão elevada como actualmente”, o que se deve aos imigrantes de leste, defendendo que Portugal
deveria reconhecer a formação profissional destes imigrantes, o que iria contribuir para o desenvolvimento da economia. “Quem é pedreiro deveria
trabalhar como pedreiro. Quem é médico deveria trabalhar como médico”, afirmou.
INVESTIGAÇÃO
IMIGRANTES PRODUZIRAM CINCO POR CENTO DA RIQUEZA PORTUGUESA
A Fundação Gulbenkian desenvolveu um projecto com o objectivo de integrar os imigrantes mais qua-
lificados na sociedade portuguesa. A aposta foi direccionada para a medicina e, depois de dois anos
e meio de trabalho, 85 médicos estão já integrados no Sistema Nacional de Saúde. Em estágio para
a preparação do exame de equivalência estão 25 e dez irão repetir o exame. São, na sua maioria, da
Ucrânia e da Moldávia. Para avançar com o programa, a Fundação estabeleceu parceria com o Serviço
dos Jesuítas aos Refugiados. Em conjunto, abriram vagas para 120 imigrantes licenciados em medicina
que necessitavam de obter equivalência dos cursos para exercer em Portugal. O apoio foi prestado em
termos financeiros e logísticos. “O processo de pedido de equivalência é moroso, implica tradução de
documentos, reconhecimento dessas traduções, envolve consulados e tudo isso exige quantias avultadas
de dinheiro, cerca de 700 a 900 euros”, salientou Luísa Vale. Por outro lado, estes imigrantes não se
poderiam despedir do trabalho que têm para fazer o estágio de seis meses para preparação do exame de
equivalência, pois não teriam meios de subsistência e perderiam o direito do visto de residência, porque
deixariam de ter um contrato de trabalho. Ao abrigo do projecto, que deverá estar concluído no início do Verão, foi possível a esses 120 imigrantes
reiniciar as suas carreiras interrompidas. Dos que já estão a trabalhar, cerca de dois terços está a fazer o internato geral em hospitais de todo o
país e a um terço foi dada autonomia, estando a exercer em centros de Saúde.
GULBENKIAN E SERVIÇO JESUÍTA AOS REFUGIADOS
85 MÉDICOS IMIGRANTES JÁ INTEGRADOS
Rosário Farmhouse, directora do Serviço Jesuítaaos Refugiados
ACIME | Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias ÉtnicasACIME | Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas
VENDA AMBULANTE
ACIME E COMUNIDADE CIGANA ACORDAM DISCIPLINAR ACTIVIDADE
Na sequência dos encontros promovidos pelo ACIME com representantes da comunidade cigana e insti-
tuições vocacionadas para a sua integração, foi assinada a carta de princípios para a venda ambulante,
no início de Março, na sede do ACIME, no Porto.
Esta carta de princípios foi assinada pelo ACIME, autarquias e associações e destina-se a ajudar a
“regularizar” a venda ambulante, que o ACIME reconhece como a actividade económica por excelência
exercida pela comunidade cigana e que tem um papel fundamental na sua integração social, com res-
peito da sua diversidade cultural. O documento estabelece princípios que devem reger esta actividade,
nomeadamente o dever por parte dos vendedores ambulantes de recusar a venda de produtos ilegais ou
contrafeitos, de cumprir as obrigações fiscais, de proteger o consumidor e de respeitar as regras da
concorrência legal. O Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas, Padre António Vaz Pinto,
afirmou que esta assinatura representa um acordo “livre e voluntário entre as partes, que estabelece
princípios e não cria obrigações legais”. Assim, para o Alto Comissário, esta carta de princípios repre-
senta “o momento inicial para um compromisso entre o Estado, autarquias e comunidade cigana, um
passo no sentido da luta contra a discriminação e uma base de trabalho para que possamos fazer um
caminho juntos”.
A Feira Social, realizada em Lisboa e organizada pela Associação Cais, Governo Civil de Lisboa, Câmara Municipal de Lisboa e pelo ACIME,
foi a primeira mostra anual da acção social portuguesa e levou ao Terreiro do Paço, em Lisboa, no mês de Março, música, debates, animação
de rua e exposições. Além das instituições de solidariedade social que se distinguem a nível nacional,
marcaram também presença associações que, segundo os organizadores, “têm desenvolvido grandes
projectos, mas não são tão conhecidas”. Assim, a preocupação em convidar todos os parceiros com
projectos sociais teve especial enfoque junto dos menos conhecidos.
Ao nível da sua estrutura, a Feira Social integrou uma Mostra Social, um Espaço Polivalente, o
palco Night Out, a Tenda Desfiles e Projectos Móveis. Na Mostra Social, as associações e empresas
apresentaram os seus projectos sociais, enquanto que o Espaço Social foi dedicado à realização de
debates e tertúlias, onde se analisaram temas como a imigração em Portugal, o microcrédito e a
saúde. Por seu lado, a Tenda Desfiles foi uma área onde as pessoas portadoras de deficiência mos-
traram as suas capacidades nas áreas da moda, arte e música, enquanto que os projectos móveis se
destinaram à divulgação de projectos de apoio social dispersos pelo país.
Animação de rua, espaços de humor que pretendem alertar para as questões sociais e uma área
dedicada às associações de imigrantes, que convidam os visitantes a uma descoberta interactiva da
cultura dos seus países de origem, foram outros destaques da iniciativa.
FEIRA SOCIAL
PROMOVER A SOLIDARIEDADE
Com o lema “Pela Diversidade. Contra a Discriminação”, o camião azul e amarelo da campanha anti-discriminação da
União Europeia teve a sua primeira paragem no Porto, a 2 de Abril, e no dia 9 esteve no Parque das Nações, em Lisboa. Da
responsabilidade da Comissão Europeia, a digressão do camião informativo destinou-se a apoiar o combate à discriminação
e a promover a diversidade na UE. Os visitantes do camião tiveram a oportunidade de obter informações e esclarecimentos
sobre a diversidade no local de trabalho, participar em jogos e concursos, descobrir iniciativas locais e organizações que ofe-
recem os seus serviços e apoio no combate à discrimi-
nação, assim como de assistir a actuações de grupos
de animação. Além de Portugal, a digressão 2005
do camião informativo decorre até Julho e inclui
21 cidades da Bélgica, Holanda, Espanha, Malta,
Eslovénia, Chipre, Grécia, Alemanha, Lituânia,
Letónia, Estónia, Finlândia e Áustria.
Por ocasião da presença do Camião em Portugal,
foi lançado o folheto da Comissão para a Igualdade
e Contra a Discriminação Racial (CICDR). As prin-
cipais competências deste órgão independente são
recolher informação relativa à prática de actos
discriminatórios e aplicação das respectivas sanções,
recomendar a adopção das medidas legislativas para
prevenir a discriminação, promover a investigação
sobre esta temática, tornar públicos os casos de vio-
lação da lei e elaborar um relatório anual sobre a situação da igualdade e da discrimi-
nação racial em Portugal. Estes folhetos estarão disponíveis nos Centros Nacionais de
Apoio ao Imigrante (CNAI) e nos Centros Locais de Apoio ao Imigrante (CLAI).
CAMIÃO ANTI-DISCRIMINAÇÃO
EM PORTUGAL NO INÍCIO DE ABRIL
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Boletim Informativo Abril 2005Boletim Informativo Abril 2005
PASTORAL DOS CIGANOS
AUTARQUIAS DEVEM CUMPRIR PRINCÍPIOS DE INTEGRAÇÃO
O Conselho da Europa adoptou no final de Fevereiro uma recomendação que prevê a
melhoria das condições de alojamento de ciganos e nómadas, elegendo a habitação
como prioridade para a integração social nos próximos dez anos. A recomendação,
dirigida aos governos dos 46 Estados-membros do Conselho da Europa, propõe soluções
para dar resposta às condições de alojamento “humanamente insustentáveis” que estão
muitas vezes reservadas a estas populações (guetos, problemas sanitários e segurança
das crianças) e para prevenir e combater a discriminação. O documento analisa o pro-
blema na globalidade, assinalando a sua ligação a outros domínios, tais como educação,
saúde, ambiente, emprego, infra-estruturas e direitos cívicos, e engloba todos os tipos de
alojamento - casas, caravanas e auto-caravanas - cobrindo os diversos modos de vida:
sedentário, semi-itinerante e itinerante. O alojamento é uma das quatro prioridades
definidas para a integração social dos ciganos na próxima década, a par da educação,
emprego e saúde.
Os ciganos constituem uma população de cerca de oito a dez milhões de pessoas na
Europa. Estão presentes em quase todos os Estados-membros do Conselho da Europa
e nalguns países da Europa central e de leste representam mais de cinco por cento da
população. Um relatório publicado em finais de 2004 sobre “A situação dos Rom numa
Europa alargada”, que inclui estudos em onze Estados-membros da UE, considerava o
tratamento dos Rom, ciganos e nómadas como “um dos problemas mais prementes com
que a Europa se tem confrontado no plano político, social e dos direitos humanos”.
O relatório encontra-se disponível, em inglês e em francês, em:
http://europa.eu.int/comm/employment_social/fundamental_rights/pdf/pubst/roma04_en.pdf
http://europa.eu.int/comm/employment_social/fundamental_rights/pdf/pubst/roma04_fr.pdf
CONSELHO DA EUROPA
ALOJAMENTO DE CIGANOS É UMA DAS PRIORIDADES
A Obra Nacional da Pastoral dos Ciganos criticou, no final de Fevereiro, a expulsão de famílias ciganas ordenada
por algumas autarquias, “que ofendem princípios básicos de integração”. O director executivo da Pastoral dos
Ciganos, Francisco Monteiro, concorda com a adopção desta recomendação, mas disse que em vários pontos do
país não é esta a posição adoptada pelas autarquias. “A habitação é o primeiro elo de um ciclo vicioso que afecta
os ciganos, a que se segue a educação e o emprego”, sublinhou o responsável da Pastoral, uma organização da
Igreja Católica. Afirmando que 98 por cento dos ciganos portugueses são sedentários, Francisco Monteiro cri-
ticou as condições precárias em que muitos vivem e que têm tido, nalguns casos, respostas negativas por parte
das câmaras locais. Sublinhando que “as autarquias deviam perceber que a coesão social e a diversidade são um
valor”, Francisco Monteiro defendeu ainda uma maior intervenção das instituições governamentais “sobre as
autarquias que ofendem os princípios básicos de integração”.
A Câmara de Coimbra escolheu uma experiência francesa na área da habitação e emprego de nómadas para “preparar o futuro” da comunidade
cigana residente no concelho. A autarquia vai promover um acordo com a cidade de Flers, na Normandia, para aplicar em Coimbra sistemas que
os franceses têm vindo a adoptar no domínio da integração social dos grupos nómadas, no âmbito do projecto “Kalodant”. Além daquele acordo de
cooperação transnacional, um outro, envolvendo o município de Coimbra, uma cidade eslovena e a capital da República Checa, Praga, deverá ser
igualmente formalizado. Na região de Praga residem cerca de vinte mil ciganos,
e é a pensar neles que as autoridades e instituições locais têm desenvolvido nos
últimos anos, com sucesso, um “importante projecto cultural e educativo”, que
inclui a realização de um festival anual.
Nos últimos seis meses, a Câmara Municipal de Coimbra e outros parceiros insti-
tucionais cumpriram o período experimental do projecto “Coimbra, Cidade para
Todos”, centrado em especial no Parque de Nómadas da cidade, criado há um
ano e que alberga 35 residentes de etnia cigana. Este projecto, financiado pelo
programa comunitário Equal, visa intervir nas áreas do emprego e da formação
profissional. A iniciativa envolve ainda a Associação Fernão Mendes Pinto, a
Associação Portuguesa de Paralisia Cerebral, a Direcção Regional de Educação
do Centro (ensino recorrente), o Instituto do Emprego e Formação Profissional, o
Estabelecimento Prisional de Coimbra, a Segurança Social, os empresários locais,
os Serviços de Acção Social da Universidade e a Associação Cigana de Coimbra.
COIMBRA
PROJECTO DE INTEGRAÇÃO DE CIGANOS INSPIRA-SE EM EXPERIÊNCIA FRANCESA
Francisco Monteiro, director da Pastoral dos ciganos
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ACIME | Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias ÉtnicasACIME | Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas
O antigo Comissário Europeu António Vitorino afirmou no início de Março que a maior frustração do
trabalho que desenvolveu em Bruxelas foi não ter conseguido para a Europa uma política comum de imi-
gração. Falando em Lisboa, num seminário sobre tráfico de seres humanos, promovido pela organização
não governamental OIKOS, António Vitorino, que foi responsável pela pasta da Justiça e Assuntos Internos,
criticou os Estados por “resistirem a uma aproximação” nesta matéria. “É um absurdo estas sociedades,
que se sentem frágeis, terem uma reacção de fechar as portas”, afirmou, salientando também a grande liga-
ção que há entre imigração ilegal e tráfico de seres humanos. António Vitorino, que disse que as políticas
restritivas de imigração são muitas vezes erradas, afirmou que a sociedade civil tem de exigir dos Estados
também “estatísticas fiáveis” em matéria de tráfico de seres humanos, porque a luta contra esse tráfico só
se faz com cooperação internacional e intercâmbio de informação. Para além disso, designou o tráfico de
seres humanos como uma “moderna forma de escravatura” e “um dos mais sérios atentados à dignidade
humana, à escala global”. Para combater o tráfico de seres humanos defendeu ainda mais campanhas
de prevenção e apoio às pessoas que foram traficadas, nomeadamente que essas vítimas obtenham uma
autorização de residência no país em que foram exploradas (uma medida já adoptada pela UE), embora
reconheça que tal pode “representar indirectamente um incentivo ao próprio tráfico de seres humanos”.
TRÁFICO DE PESSOAS
ANTÓNIO VITORINO LAMENTA NÃO HAVER POLÍTICA COMUM DE IMIGRAÇÃO
Numa altura em que o governo ainda não decidiu se a aquisição da cidadania será facilitada apenas para a terceira geração de imigrantes, Jorge Miranda, constitucionalista e professor catedrático da Faculdade de Direito de Lisboa, defende a nacionalidade portuguesa para os imigrantes nascidos em Portugal. “Atendendo a uma mais rápida integração da segunda geração e à quebra da natalidade”, diz. Ao mesmo tempo, defende que os filhos dos nossos imigrantes continuem portugueses.
PROFESSOR JORGE MIRANDA
A PÁTRIA QUE OS VIU NASCER
O Provedor de Justiça, Nascimento Rodrigues, defendeu no início de Março que as juntas de freguesia têm o dever de
emitir certidões a todos os imigrantes que as solicitem e alertou a Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE) para a
situação. Entretanto, a ANAFRE enviou uma missiva a todas as juntas de freguesia a apelar ao “rigoroso cumprimento dos
preceitos legais sobre emissão de certidões”. A posição de Nascimento Rodrigues surgiu depois de a Provedoria de Justiça
ter recebido várias queixas de imigrantes a quem foram recusadas as certidões. Num comunicado, a Provedoria de Justiça
esclarece que estão em causa documentos como atestados de residência, de vida ou de situação económica. Algumas juntas
de freguesia recusam emitir os documentos “sob a alegação de os imigrantes não possuírem título válido de permanência
em território português”. Relativamente a esta matéria, o provedor de Justiça esclarece que as certidões se destinam,
“por vezes, à apresentação de pedidos de regularização da permanência e a pedidos de inscrição nos centros de saúde”. A
Provedoria da Justiça alerta ainda que o facto de o imigrante estar em situação legal ou ilegal em Portugal é irrelevante
neste caso. “Da legislação que actualmente regula a emissão, pelas juntas de freguesia, de atestados de residência, não
resulta qualquer dependência da situação jurídica em que os requerentes se encontram”, afirma o comunicado. Deste
modo, as juntas de freguesia não podem recusar emitir as certidões com base no estatuto jurídico do cidadão estrangeiro,
porque estariam assim “a negar-lhe o exercício de direitos fundamentais”. Nascimento Rodrigues lembra ainda que “a
actividade de controlo e autorização de permanência em território nacional compete exclusivamente ao Estado”.
PROVEDOR DE JUSTIÇA
JUNTAS DE FREGUESIA TÊM O DEVER DE EMITIR CERTIDÕES
O programa do Governo prevê “o reconhecimento de um estatuto de cidadania a indivíduos que nasceram em território nacional e que são filhos de pai ou de mãe não nascidos em Portugal”. Qual é a sua opinião?Penso que quem nascer em território português deve ter a nacionali-
dade portuguesa, desde que os pais não se encontrem cá ao serviço do
respectivo Estado. Seria mais simples e permitiria a integração mais
rápida da segunda geração de imigrantes, além de atender à quebra
de natalidade que se verifica. A lei actual não impede a aquisição da
nacionalidade por parte de quem seja filho de estrangeiros mas nascido
em Portugal, embora estabeleça determinados prazos.
Esses prazos mínimos são de residência em território português,com título válido, de seis anos para imigrantes oriundos de paísesde língua portuguesa, e de dez anos para os restantes. Esta desi-gualdade não levanta problemas? Não. A própria Constituição tem artigos, o 7.o e o 15.o, que dife-
renciam os imigrantes. Um cidadão de um país de língua portuguesa
integra-se mais facilmente, pelas afinidades culturais e afectivas que
existem.
Entrevista de Alexandra Correia a Jorge Miranda, publicada na revista “Visão” de 24.03.2005
Os filhos de emigrantes portugueses nascidos noutro país devem ser considerados portugueses, com todos os direitos, mesmo que não mantenham ligações a Portugal? Devem. É do interesse nacional mantê-los com uma ligação ao país.
Isto não significa que possam ter automaticamente direito de voto polí-
tico sem que mantenham uma ligação afectiva a Portugal, na minha
opinião. Uma das questões que devem ser colocadas é a dos círculos da
emigração para a Assembleia da República, em que podem ser eleitos
quatro deputados, que podem determinar uma maioria absoluta. Penso
que os emigrantes deviam antes votar pelo seu distrito de origem. E os
seus filhos votariam pelo círculo dos pais.
A Constituição concede direitos políticos suficientes aos imigran-tes?Sim, até muito mais do que a generalidade das Constituições. Havendo
reciprocidade, podem votar e ser eleitos nas autarquias locais.
Boletim Informativo Abril 2005
O Presidente da República,
acompanhado pelo ministro
da Presidência do Conselho
de Ministros, Pedro Silva
Pereira, e pela secretária
de Estado Adjunta e
da Reabilitação, Idália
Moniz, realizou no dia 16
de Março uma visita ao
Centro Nacional de Apoio ao
Imigrante (CNAI), data em
que esta instituição celebrou
um ano de funcionamento.
No CNAI, afirmou que “a integração dos
imigrantes é uma grande questão nacional”
e apelou a que a imigração faça parte da
agenda política do Governo. No seu discurso
no final da visita, declarou que em Portugal, é
necessário que o Governo e as confederações
patronais e sindicais “se dediquem à
questão da política de imigração, de forma
transversal, para que daí resulte melhor e
mais rápida inclusão” destes cidadãos na
comunidade. “Há situações que julgávamos
não existirem em Portugal”, afirmou
Jorge Sampaio no seu discurso, apelando
a que os portugueses “dêem resposta” às
situações de “intenso sofrimento” de muitos
imigrantes, no seu processo de legalização.
O chefe de Estado deu o exemplo de
“muitos jovens filhos de imigrantes que
não têm nacionalidade”, nem sequer a dos
pais, porque já nasceram em Portugal, e
considerou que a legislação actual “tem hoje
uma falha” ao dificultar a naturalização.
“Os imigrantes representam cinco por cento
da população nacional e nove por cento da
população activa”, sublinhou o Presidente
da República, que agradeceu aos imigrantes
que escolheram Portugal para viver e pediu
desculpa “pelo que tenha corrido menos
bem”. A imigração “é um fenómeno que veio
para ficar e não nos podemos dar ao luxo de
permitir a exclusão”, acrescentou. “Costumo
dizer que não há portugueses dispensáveis, e
agora digo que não há cidadãos dispensáveis,
desde que respeitem o nosso ordenamento
jurídico”.
VISITA DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA AO CNAI
JORGE SAMPAIO DEFENDE INTEGRAÇÃO DOS IMIGRANTES
Os Centros Nacionais de Apoio ao Imigrante
de Lisboa e do Porto (CNAI) atenderam no
primeiro ano de funcionamento perto de 300
mil utentes, na maioria brasileiros e ucrania-
nos. O CNAI de Lisboa, que comemorou um
ano de existência, atendeu 235 mil estrangei-
ros e o CNAI do Porto 40.700 imigrantes. Os
CNAI surgiram há um ano (o de Lisboa foi
inaugurado no dia 16 de Março e o do Porto
no dia 23) para responder aos problemas
que se colocam aos imigrantes que vivem
em Portugal. O CNAI de Lisboa atendeu em
média 20 mil imigrantes por mês e recebeu
durante o primeiro ano cidadãos provenien-
tes de 125 países. Por nacionalidades, perto
de 12 mil brasileiros (26 por cento) e cerca
de nove mil ucranianos (21 por cento) diri-
giram-se ao CNAI de Lisboa, seguindo-se
cerca de cinco mil cabo-verdianos (13 por
cento). As estatísticas do CNAI confirmam
dados já existentes que apontam para um
crescimento nos últimos anos das comunida-
des brasileira e ucraniana.
A maioria dos imigrantes que se deslocou ao
CNAI pretendia ser atendido no Serviço de
Estrangeiros e Fronteiras (SEF), que no pri-
CNAI UM ANO DE ATENDIMENTO AOS IMIGRANTES
CNAI UM TRABALHO QUE APENAS COMEÇOU
Ao fazer precisamente um ano que
este Centro entrou em funcionamento,
queria celebrar o serviço já prestado.
Ao serviço do homem imigrante, do
humanismo, da justiça, da solidariedade
e da cidadania. Têm sido estes os
pilares do nosso trabalho. Estamos
aqui para agradecer, para celebrar e
também para comprometer. Quero com
isto dizer que falta muito para fazer.
Sem falar de tudo o que há para ser
feito, queria recordar a problemática
da nacionalidade, que tem de ser
revista, para evitar a falta de sentido
de identidade de milhares de crianças
e jovens que não pertencem aqui mas
nunca foram à Pátria de onde vieram os
seus pais. É fundamental o progresso
no campo da cidania e a simplificação
burocrática. Queria também chamar
a atenção para a enorme importância,
no campo desta simplificação, da
reunificação e da reunião familiar,
uma condição indispensável para que
possa haver uma imigração estável,
equilibrada, verdadeiramente acolhida
e integrada, na diversidade, mas
também na solidariedade. Quero ainda
dar os parabéns a todos aqueles, que
são tantos, pelo seu esforço e pelo seu
trabalho, e agradecer a presença do
Senhor Presidente da República, do
Senhor Ministro Pedro Silva Pereira,
Ministro da Presidência e da Senhora
Secretária de Estado Idália Moniz,
Secretária de Estado Adjunta e da
Reabilitação, que são para nós garantes
e sinais de que aquilo que se começou
apenas começou.
Padre António Vaz Pinto
Alto Comissário para a Imigração e Minorias
Étnicas
meiro ano recebeu a visita de 59.590 utentes.
Por seu lado, a Segurança Social atendeu
19.536 imigrantes e a Inspecção-Geral do
Trabalho recebeu 18.545 utentes. Os imi-
grantes também procuram ajuda no Gabinete
de Apoio Jurídico, (5.695), no Gabinete de
Apoio ao Reagrupamento Familiar (4.817)
e no Gabinete de atendimento da UNIVA
(2.024). Os dados indicam ainda que 57 por
cento dos 235 mil utentes do CNAI de Lisboa
foram homens e 43 por cento mulheres, situ-
ando-se a idade média dos utentes entre os
25 e os 45 anos.
O CNAI do Porto recebeu a visita de 40.700
imigrantes, dos quais 35 por cento naturais
da Ucrânia, 29 por cento do Brasil e cinco
por cento da China. No CNAI do Porto o ser-
viço que mais utentes recebeu foi também o
SEF (8.774), seguindo-se a Segurança Social
(7.897) e a Inspecção-Geral do Trabalho
(3.475). O CNAI do Porto recebeu mais
homens (69 por cento) do que mulheres (31
por cento) e a maioria dos utentes tinha entre
25 e 45 anos.
O CNAI integra nas suas instalações depen-
dências do SEF, da Segurança Social, da
Inspecção-Geral do Trabalho, do Instituto
de Emprego e Formação Profissional, dos
Ministérios da Saúde e Educação e do Instituto
Nacional de Habitação. Outros serviços dis-
poníveis são o Gabinete de Reconhecimento de
Habilitações e Competências, o Gabinete de
Apoio Técnico às Associações de Imigrantes
e o Instituto de Desenvolvimento e Inspecção
das Condições de Trabalho. O atendimento
nos CNAI pode ser feito em português, criou-
lo de Cabo Verde e em russo, havendo ainda
a possibilidade de tradução para romeno e
moldavo.
Boletim Informativo Abril 2005
Nos últimos dias, tem vindo
a gerar grande discussão
pública o título “Portugueses
mais resistentes aos
imigrantes do que a média
europeia”, que o Jornal
PÚBLICO1 lançou – e que os
restantes meios seguiram –
na sequência de um relatório
do Observatório Europeu
dos Fenómenos Racistas e
Xenófobos2, a partir da leitura
dos dados de dois inquéritos
realizados em 2003 (o
Eurobarómetro e o Inquérito
Social Europeu). Este facto
merece uma leitura mais
aprofundada.
A árvore e a floresta A conclusão para que o título do PÚBLICO
aponta reflecte uma – apenas uma – das
questões que são evidenciadas no referido
Relatório. Aliás, o jornalista autor da peça
alerta, no desenvolvimento da notícia, para
os dados contraditórios decorrentes dos dois
inquéritos. Mas a maioria dos seus leitores
ficou-se pelo título. Se, por exemplo, tives-
sem sido seleccionados e destacados alguns
dos dados do Eurobarómetro 2003, também
disponíveis nesse documento, teria sido possí-
vel evidenciar que Portugal é um dos países
menos resistente a uma sociedade multicul-
tural (9o melhor resultado em 30 países), ou
mais defensor dos direitos civis dos imigran-
tes legais (8o melhor resultado). Por outro
lado, do Inquérito Social Europeu também
se poderia sublinhar que, apesar de ser o 4o
país com maior percentagem de respostas
evidenciando resistência aos imigrantes, era,
por outro lado, um dos que evidenciava menor
apoio a uma distância étnica (7o melhor lugar
em 19 países).
português. Pode ser, por isso, uma simples
resposta de senso comum, sem motivação de
preconceito.
Por outro lado, a esta mesma pergunta,
podem responder “sim” quer os acreditam
num mundo solidário, sem fronteiras, onde
os mais pobres têm o direito de vir procu-
ram junto dos mais ricos o seu sustento,
como aqueles que, motivados pelo lucro fácil,
sabem que quanto mais mão-de-obra houver
disponível, mais barato será o seu preço e
menos margem haverá para a afirmação dos
seus direitos. É, por isso, necessário algum
cuidado nas conclusões que se retiram de
algumas respostas.
Os votos para além dos inquéritosUma outra abordagem do peso relativo da
xenofobia na Europa pode usar como medida
a ascensão de partidos políticos com discursos
xenófobos, situados usualmente à extrema
direita. Como é evidente, a expressão em
votos é muito mais significativa que qualquer
inquérito a partir de uma amostra, por melhor
que seja.
O expoente máximo dessa realidade será pro-
vavelmente a Frente Nacional, de Jean-Marie
Le Pen, que em França, debaixo do slogan
“A França para os Franceses” tem defendido
– com algum sucesso - uma política hostil
em relação aos imigrantes. Este caso típico
de partido de extrema direita tem, desde
1984, vindo a fazer o seu caminho. Tem a sua
implantação junto de eleitorado masculino e
de classe média-baixa, com presença cres-
cente junto dos jovens, dos desempregados
e dos cidadãos com baixa instrução e faz
do ataque à imigração um dos seus eixos
programáticos essenciais, o qual enquadra
num discurso de “lei e
ordem”. O seu melhor
resultado eleitoral teve
lugar nas presidenciais de
2002, com a passagem
de Le Pen à 2a volta, com
cerca de 17% dos votos.
Como é habitual nestes
partidos, verifica-se uma
forte dependência de uma
liderança carismática e,
provavelmente, alguma
dificuldade em sobreviver
ao período pós-fundador.
Esta tendência teve, em
2002, outras expres-
sões na Europa, nomeadamente na Áustria
(Partido da Liberdade, de Joerg Haider)
com 10% de votos, em Itália (Liga do Norte,
de Umberto Bossi e Aliança Nacional, de
Gianfranco Fini) com 16%, na Holanda (com
a Lista de Pim Fortuyn) com 17% e ainda na
Uma leitura ponderada de todas as respostas
dos dois inquéritos dá, cremos, uma imagem
muito mais próxima e equilibrada da realida-
de. Se lhe acrescentarmos o contexto, dado
que o momento da sua realização correspon-
deu à conclusão de um ciclo (2001/2003) em
que Portugal duplicou o n.o de imigrantes
legais, então talvez se possa fazer outra leitura
destes dados. A este propósito, o Comissário
Europeu para os Direitos Humanos, Senhor
Gil Robles, dizia no seu relatório de 2003
sobre Portugal: “(...) o aumento do número
de estrangeiros em Portugal, seja da Europa
de Leste, seja dos países de língua portuguesa
foi absorvido sem crescimento de tensões
sociais ou raciais. Isto é seguramente um
testemunho da abertura geral e da tolerância
da sociedade portuguesa e um exemplo para
outros países da Europa.”3 .
Sendo que o combate à xenofobia e ao racis-
mo não vive de rankings e, mais importante
ainda, o não estarmos tão mal quanto outros
não nos consola, importa, no entanto, sermos
rigorosos para podermos ser eficazes. E
olhando toda a “floresta” e não só a “árvo-
re”, Portugal está longe de ser, no plano
europeu, um mau exemplo.
O que pode querer dizer a resposta “Não” à pergunta “devem entrar mais imigrantes em Portugal?”?Uma outra dimensão interessante para uma
reflexão sobre as leituras feitas a partir destes
e de outros inquéritos, decorre da interpreta-
ção do significado de algumas das respostas.
Por exemplo, à pergunta “Devem entrar mais
imigrantes em Portugal?” a resposta “não”
é entendida, genericamente, como sinónimo
de xenofobia. Mas essa
interpretação só par-
cialmente corresponde à
realidade. Haverá alguns
cidadãos que respondem
dessa forma, recusan-
do verdadeiramente o
imigrante, em qualquer
circunstância. Mas, por
exemplo, quando, em con-
versas informais, se colo-
ca esta mesma questão a
imigrantes que vivem em
Portugal e se obtém uma
taxa de resposta “não”
muito alta, obviamente que não estamos
perante um fenómeno xenófobo. De igual
forma, quando um cidadão nacional responde
“não”, porque tem a percepção da reduzida
oferta de emprego decorrente da crise eco-
nómico e não vê como poderá um novo imi-
grante encontrar trabalho digno no mercado
PORTUGAL: PAÍS XENÓFOBO?
“Portugal é um dos paísesmenos resistente a uma
sociedade multicultural (9ºmelhor resultado em 30
países), ou mais defensor dos direitos civis dos imigrantes
legais (8º melhor resultado).”
Por: António Vaz Pinto* e Rui Marques**
ACIME | Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas
Dinamarca (Partido Dinamarquês do Povo) ou
em Inglaterra (Partido Nacional).
Jupp4 elaborou um interessante estudo sobre
partidos europeus com discursos anti-imigra-
ção e resultados eleitorais e tornou evidente a
influência crescente que estas forças políticas
iam tendo na Europa, à data:
Em Portugal, nunca uma expressão políti-
ca-partidária verdadeiramente xenófoba se
chegou a afirmar, com um eleitorado signifi-
cativo. O Partido Renovador Nacional (PRN),
expressão nacional mais próxima da Frente
Nacional de Le Pen, com a assinatura “Os
Portugueses primeiro” teve, nas últimas elei-
ções nacionais, uns escassos 0,16% corres-
pondendo a 9323 votos. Já o Partido Popular,
se bem que evidencie uma visão securitária
sobre a imigração, está muito longe de ser
um partido xenófobo. Por isso, a expressão
xenófoba nessa grande sondagem que são
as eleições tem em Portugal uma expressão
residual em comparação com muitos outros
países da Europa.
Mas não subestimemos os riscos que estão no
horizonte.
A conjuntura presente em muitos países euro-
peus de um crescente peso social e político
dos discursos anti-imigração condiciona as
forças políticas moderadas e humanistas, do
grande centro político, a assumirem algu-
mas posturas relativamente surpreendentes.
O exemplo mais recente é o de Tony Blair. Em
resposta às críticas dos conservadores, veio
anunciar, no início de 2005, importantes res-
trições à entrada de novos
imigrantes ou asilados no
Reino Unido, anunciando
que “todos os candidatos
a entrarem no país terão
de passar em exames de
selecção, que ponham à
prova as suas competên-
cias profissionais, bem
como o nível do uso da
língua inglesa. No segui-
mento desta política, os
vistos de trabalho serão
concedidos de acordo com
um sistema de pontos onde são registadas
as aptidões dos imigrantes, à semelhança do
modelo australiano”.
O debate político sobre imigração é, por tudo
isto, um território muito delicado para as
democracias ocidentais.
Para uma sociedade de verdadeiro acolhimentoÉ certo que para sociedades com histórico de
emigração, como a portuguesa, a memória da
nossa dívida perante os que nos acolheram e
a obrigação moral de agora acolher outros
que nos procuram ajudará políticas abertas
e tolerantes. Mas não é suficiente viver da
memória.
Uma abordagem sensata e pragmática do
discurso político não pode ignorar esta sen-
sibilidade da opinião pública ao aumento da
imigração e deve coarctar preventivamente
as possibilidades de crescimento e instalação
de correntes xenófobas relevantes. Esta opção
exige capacidade de gestão dos fluxos migra-
tórios, mas sobretudo uma forte aposta numa
boa integração social.
Esta pressupõe sentido de
equilíbrio no discurso dos
direitos dos imigrantes,
que para ser credível tem
que ser feito em simul-
tâneo com a afirmação
dos deveres, num qua-
dro do respeito pleno do
princípio da igualdade
entre cidadãos nacio-
nais e cidadãos imigran-
tes. Há que afirmar, no
quadro da coesão social,
que portugueses e imigrantes devem saber
estar juntos, nos bons e nos maus momen-
tos, enfrentando solidariamente dificuldades
e oportunidades. E isso só pode acontecer
quando fizermos verdadeiro acolhimento do
“outro”, incluindo-o plenamente num “nós”
diversificado e intercultural. Este é o desafio
que queremos vencer.
*Alto Comissário para a Imigração e Minorias
Étnicas
**Alto Comissário Adjunto para a Imigração e
Minorias Étnicas
1. Público de 16 de Março de 20052. Disponível integralmente em www.eumc.eu.int3. do Relatório da visita a Portugal, em Maio de 2003, do Senhor Gil Robles, Comissário para os Direitos Humnaos do Conselho da Europa, disponível em:http://www.fd.uc.pt/hrc/enciclopedia/temas_dh/direitos_prisao/comis-saire.doc4. Jupp (2003):7
“Em Portugal, nunca uma expressão política-partidáriaverdadeiramente xenófoba
se chegou a afirmar, com um eleitorado significativo.”
Boletim Informativo Abril 2005
matriculados no início do ano consoante o
horário escolar e é aí que, para além das
horas de informática, funciona o apoio esco-
lar. Para além disso, fazemos um trabalho
com as duas escolas que ficam mesmo em
frente a este pólo, no qual que os nossos
monitores servem de ponte, estabelecendo o
triângulo entre a escola, a família e a comu-
nidade. Visitam a escola, visitam os direc-
tores de turma, e tentam saber a situação
do aluno. Sabemos que muitos pais não têm
tempo para ir à escola, e é o nosso monitor
que faz o trabalho com os pais. Portanto,
tem que haver uma coordenação, porque não
adianta acompanharmos um miúdo isolado se
não acompanharmos a família. E mesmo que
os miúdos não tenham o sucesso escolar que
os pais desejam, é preciso que esses miúdos
tenham sucesso educativo. Não nascemos
todos para ser doutores ou engenheiros, mas
temos de cumprir o nosso papel na socieda-
de, e é para isso que nós trabalhamos. É um
trabalho muito lento e difícil, mas no qual
acreditamos.
Qual é o trabalho fundamental num bairro “problemático”?A Bela Vista é um bairro problemático, mas
também temos a noção de que se tornou
mais problemático depois de haver tantas
ajudas. Antes das ajudas da União Europeia,
não me lembro de haver tantos problemas.
Portanto, por vezes as ajudas dão um sabor
amargo no fim. As pessoas começam a desin-
teressar-se e, como as ajudas chegam mais
facilmente, deixam de lutar. Costumo dizer
que o nome Bela Vista
foi passaporte para a
angariação de muitos
fundos europeus, e não
é por acaso que nós
temos tantas institui-
ções sediadas dentro do
Bairro. Ainda há pouco
tempo eram trinta e
tal ou quarenta. A sen-
sação de muita gente
aqui é que se gastaram
rios de dinheiro sem
os resultados corres-
pondentes. Das pessoas que frequentaram os
cursos de formação, quem está no mercado
de trabalho, quem conseguiu fazer o seu
percurso de vida graças àquela formação? O
problema é que não há um acompanhamento
continuado.
A Associação Caboverdiana de Setúbal, sediada no bairro
da Bela Vista, desenvolve um trabalho multifacetado, que
vai desde o apoio consular ao acompanhamento escolar e à
procura de trabalho para quem dele precisa. Na opinião da
Presidente desta associação, Felismina Rosa Mendes, trata-
se de um trabalho de persistência, que nem sempre é visível,
mas que não deixa por isso de ser essencial.
Desde quando existe a AssociaçãoCaboverdiana de Setúbal?A Associação Caboverdiana de Setúbal deu
os primeiros passos em 93 e foi constituída
em 97. Mas ela vem desde 83, a altura dos
realojamentos nos bairros sociais, quando
foi criada uma comissão de caboverdianos
que funcionava com apoios da Caritas e das
comunidades caboverdianas no exterior. A
partir de 1993, as necessidades eram outras
e começaram a dar-se os passos para a
transformação em associação. Houve uma
comissão que ficou à frente da Associação até
ao ano passado, quando se realizaram as pri-
meiras eleições da Associação Caboverdiana
de Setúbal, elegendo uma nova direcção de
que faço parte como presidente.
Como é um dia “típico” no trabalho da Associação?Às vezes, num dia, pode não acontecer nada,
mas o dia seguinte pode ser muito agitado.
Num bairro como este, há programas calen-
darizados e eventos, mas há também um quo-
tidiano ao qual temos de estar muito atentos.
À medida que as situações vão surgindo,
vamos articulando esforços com as institui-
ções e pessoas que possam fazer as pontes
necessárias, encaminhando para o centro de
emprego, para os cursos de formação, para
outras instituições que possam dar resposta
aos problemas. Muitas vezes não temos
as respostas, mas ajudamos a procurá-las.
Somos um “ombro amigo” de que as pessoas
precisam, porque por vezes os problemas das
famílias não são financeiros ou de emprego,
mas de planeamento e orientação de um per-
curso de vida. É por isso que, frequentemen-
te, o nosso trabalho não se vê. É um trabalho
“miudinho”, casa a casa, que dificilmente
tem visibilidade. Estamos sempre à procura
de saídas para as pessoas, procurando tirá-
las de um certo marasmo que sentem quan-
do ficam paradas e desempregadas durante
muito tempo. Procuramos fazer com que
acreditem que vale a pena lutar, mesmo que
seja por pouco, desde que vivam com dignida-
de e participem na sociedade em que vivem.
Por isso, é difícil descrever um dia.
Neste momento, quais são as actividades regulares? Existe um protocolo com a Embaixada de
Cabo Verde que desde Julho do ano passado
permitiu estabelecer um Gabinete de Apoio
Consular à comunidade caboverdiana em
Setúbal. Temos uma parceria com o Centro
de Formação de Setúbal, que nos apoia no
financiamento de um curso de formação
profissional que decorre neste momento,
o Curso de Agentes
de Desenvolvimento
Comunitário. É um
modelo piloto em
Portugal, que existe em
França, na Holanda e
em Inglaterra, frequen-
tado por treze jovens,
que representam a
multiculturalidade do
Bairro da Bela Vista
– uma timorense, duas
portuguesas, jovens
luso-caboverdianos e
caboverdianos. Temos a funcionar dentro do
bairro uma sala de informática, no pólo da
biblioteca da Bela Vista, por onde passam
por dia cerca de trinta adolescentes e três
monitores de informática qualificados para
dar esse tipo de apoio aos jovens. Estes são
FELISMINA ROSA MENDES
“PROCURAMOS QUE AS PESSOAS ACREDITEM QUE VALE A PENA LUTAR”
“Por vezes os problemas das famílias não são financeiros ou
de emprego, mas de planeamento e orientação de um percurso de
vida.”
ENTREVISTA
ACIME | Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas
A solução é ajuda com acompanhamento?É preciso ajudar com acompanhamento e não
formar por formar, pois a pessoa acaba por
ficar especialista da formação e não conse-
gue sair disso. As unidades que dão formação
devem ter o cuidado de procurar saídas para
essas pessoas, porque se não o fizerem, elas
por si próprias não conseguem. Sabemos que
o facto de as pessoas morarem na Bela Vista
já as prejudica. Segundo os relatos dos jovens
que me chegam, quando dizem que moram
na Bela Vista não conseguem trabalho nem
numa hamburgueria, e têm de dar uma outra
morada para conseguir trabalho. Setúbal é
um meio muito fechado em termos de aceita-
ção de negros nos locais de trabalho. Há que
mudar, e é preciso que a mudança venha de
cima. Os jovens não se revêem nesta socie-
dade e não acreditam que o esforço valha a
pena. E assim, as pessoas dos bairros auto-
excluem-se, porque pensam que não vale a
pena lutar, que esforçar-se é o mesmo que
remar contra a maré.
A Associação tem uma relaçãoprivilegiada com várias instituições:a Embaixada, a Câmara Municipal de Setúbal, onde funciona um gabinete de apoio ao imigrante... A Câmara tem um gabinete de apoio ao
imigrante no género dos CLAI (Centros
Locais de Apoio ao Imigrante) do ACIME,
que é o SEI (Setúbal Etnias e Imigração).
Foi um gabinete pensado desde o início com
o apoio da Associação
Caboverdiana. Quando
este executivo entrou
em funções, sugerimos
que a Câmara deveria
prestar mais apoio às
comunidades imigran-
tes e referimos experi-
ências de outros muni-
cípios onde já existiam
gabinetes de apoio ao
imigrante. Pesou-se
os prós e os contras,
analisámos as falhas de
outras experiências e concluímos que estas
tinham acontecido por não incluírem pessoas
da comunidade, pois a relação de proximida-
de que temos com as pessoas da nossa comu-
nidade ajuda muito. Sugerimos ao Presidente
da Câmara que pensasse nesse assunto, ele
aceitou muito bem, pôs mãos à obra e abriu
o gabinete. Eu sou uma das interlocutoras
do SEI, que funciona desde Junho passado.
A minha função é representar a comunidade
africana do Concelho de Setúbal e temos
mais duas interlocutoras, uma russa e uma
brasileira.
Como funciona o protocolo com a Embaixada de Cabo Verde? Na primeira legalização que o SEF realizou,
colaborámos na elaboração dos processos
para as pessoas entregarem, para que não
houvesse aquelas filas enormes e os processos
não andassem para trás e para a frente. Essa
experiência correu muito bem. Houve depois
uma segunda colaboração, e começámos
a ganhar o gosto por ajudar as pessoas na
elaboração e na constituição dos processos.
Então, começámos a
pensar numa colabora-
ção com a Embaixada,
porque sempre que um
caboverdiano tinha de
ir a Lisboa para obter
um documento, perdia
o dia inteiro de traba-
lho. Passou muita água
debaixo da ponte até
isso estar assente, mas
acabou por se acordar
que a Associação tinha
todas as condições
para ter um gabinete deste tipo. É um gabi-
nete de responsabilidade, porque nós lidamos
com documentação de pessoas, e assumimos
esse compromisso.
Como decorreu o processo de reconhecimento da AssociaçãoCaboverdiana de Setúbal pelo ACIME? Apesar de existirmos há muitos anos, nunca
chegámos a ser reconhecidos pelo anterior
Alto Comissário. Não foi no meu tempo e não
sei qual o motivo, visto que até tivemos algu-
mas ajudas pontuais. Quando entrei para a
Associação, achei que era fundamental obter
o reconhecimento do ACIME. Investiguei,
verifiquei que não havia nenhum processo
a nosso respeito, candidatámo-nos ao reco-
nhecimento e obtivemos resposta positiva.
Apesar de no passado não termos sido direc-
“É preciso ajudar com acompanhamento e não formar por formar, pois a pessoa acaba
por ficar especialista da formaçãoe não consegue sair disso.”
tamente apoiados pelo ACIME – vamos
sê-lo agora – reconhecemos o que o Alto
Comissariado tem feito e os apoios que tem
dado. Só com essas ajudas é que algumas
associações conseguem sobreviver.
Como se poderá tornar a relaçãodo ACIME com as Associações mais eficaz?O trabalho do ACIME tem sido uma mais-
valia para os imigrantes. Desburocratizou
muita coisa e é uma aposta que se deve man-
ter. Mas penso que o nível de exigência para
a comparticipação de actividades é muito
alto e limita a actuação das associações mais
pequenas. Nós, por exemplo, somos volun-
tários, não temos quaisquer meios financei-
ros directos, mas temos uma boa relação
com a Câmara Municipal, com o Centro de
Formação de Setúbal, com a junta de fre-
guesia de S. Sebastião e, de uma maneira ou
outra, embora não havendo dinheiro líquido,
encontramos alguma forma de conseguir
apoios. Mas a maior parte das associações
pequenas não tem esses recursos. Penso que
isso deveria ser revisto, porque estas são
as que mais precisam de ser ajudadas. E,
por vezes, são essas associações que fazem
grandes trabalhos, que não têm visibilidade,
junto da comunidade. As associações de imi-
grantes, mais do que em termos de projectos
ou de programas, trabalham em função das
pessoas, dos seres humanos, e isso é por vezes
difícil de avaliar.
Boletim Informativo Abril 2005Boletim Informativo Abril 2005
OS IMIGRANTES E A POPULAÇÃO PORTUGUESA
IMAGENS RECÍPROCAS
De acordo com os resultados preliminares deste estudo, a investigação,
realizada entre 2002 e 2004, indica mesmo “um acréscimo muito sig-
nificativo na percentagem das pessoas que reconhecem os imigrantes
como fundamentais para a vida económica do país”. Assim, quatro em
cada cinco portugueses inquiridos admitem que “os imigrantes fazem
o trabalho que os portugueses não querem”. Aos olhos da população
portuguesa, “os imigrantes de Leste são os que mais trabalham”,
tendo 70% dos inquiridos considerado que essa população tem qualifi-
cações a mais para o trabalho que desempenha em Portugal. O estudo
revela ainda que os portugueses têm presente que, perante o mesmo
trabalho, os imigrantes recebem menos salário. Por outro lado, os
números divulgados indicam que 85% dos portugueses têm uma “pre-
ferência pelos brasileiros”. Quando confrontados com indicadores de
racismo, a maior parte dos inquiridos revelou atitudes de aceitação dos
estrangeiros, apesar de um terço
ter indicado que “não aceitaria
ter como chefe um imigrante e não
colocaria os seus filhos numa escola
com muitos imigrantes”. Do mesmo
modo, um em cada cinco afirmou
“abertamente” que não aceitava
ser vizinho de imigrantes, enquanto
um em cada três inquiridos admitiu
sentir-se “de alguma forma incomo-
dado no caso de um familiar directo
casar com um imigrante de Leste,
brasileiro ou africano”.
No geral, a interacção entre portugueses e imigrantes é elevada, um
dado que parece ser confirmado pela forte percentagem de imigran-
tes que afirmaram ter amigos portugueses (87%). Os imigrantes dos
PALOP são os que mais referem esta situação (89%), seguidos pelos
cidadãos originários da Europa de Leste (87,7%) e pelos brasileiros
(87%). Estas relações de amizade com portugueses surgem como
importantes para 31,7% dos brasileiros, 18,5% dos imigrantes dos
PALOP e 11,8% dos nacionais da Europa de Leste. Os diferentes
grupos atribuem um significado variável às condições de integração.
Os imigrantes da Europa de Leste consideram como mais importante
o desenvolvimento das suas competências linguísticas (62,9%). Para
todos os grupos, uma condição essencial à integração é o exercício de
uma actividade profissional. A família surge como condição fundamen-
tal de integração, sobretudo para os imigrantes dos PALOP (42,9%)
e do Brasil (36,6%). Finalmente, para os imigrantes da Europa de
Leste, a família é a terceira condição relevante para a sua integração
(28,7%).
SEMINÁRIO DO OBSERVATÓRIO DA IMIGRAÇÃO
APRESENTAÇÃO DE QUATRO ESTUDOS
FILHOS DE IMIGRANTES
MONITORIZAÇÃO DO SEU ACESSO ÀSOCIEDADE DE CONHECIMENTO
De acordo com este estudo, as escolas portuguesas deveriam promo-
ver a aprendizagem da língua materna dos alunos imigrantes. Neste
sentido, Portugal deve “reconhecer e valorizar a especificidade étnica
e cultural dos vários grupos linguísticos”, através da “promoção da
língua materna em contexto escolar”. Os resultados obtidos apon-
tam para uma boa socialização dos filhos de imigrantes no universo
escolar. Contudo, no que respeita à utilização e ao domínio das novas
tecnologias de informação, a posse de equipamentos adequados é
fundamental, e a escola não parece estar a conseguir ter sucesso na
criação de oportunidades iguais para os que não têm esses equipamen-
tos nas suas casas. Deste modo, aqueles que se encontram há menos
tempo no país são os que mais privações registam relativamente às
novas tecnologias.
Este estudo sugere um
conjunto de boas práticas
que deverão no futuro ser
implementadas. Assim,
a diversidade linguística
que caracteriza a popu-
lação escolar actual deve
ser perspectivada como
uma riqueza a estimular,
reconhecendo-se e valo-
rizando-se a especifici-
dade étnica/cultural dos
vários grupos linguísticos.
Deverá ainda realizar-se um investimento nos currículos e vias de
ensino alternativas, de forma a prevenir o abandono escolar e apro-
ximar os alunos com menor nível de envolvimento, assim como um
investimento nos projectos de empregabilidade, à semelhança daqueles
que já existem, com sucesso, associados a alguns cursos de formação
profissional. Por outro lado, a formação ao longo da vida será também
um investimento fundamental para a adaptação contínua destes jovens
ao mercado de trabalho e à sociedade de informação. O estudo conclui
que o domínio das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) é
essencial, tornando-se ainda fundamental diminuir o fosso existente
entre a escola e a família que se regista entre os jovens de origem
imigrante.
No dia 22 de Março realizou-se no Palácio Foz, em Lisboa, por iniciativa conjunta do ACIME e da Fundação para a Ciência e Tecnologia, um Seminário do Observatório da Imigração com a presença do P. António Vaz Pinto, Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas, Conceição Peleteiro, vice-presidente da FCT e Roberto Carneiro, coordenador do Observatório da Imigração. O seminário foi ocasião para a apresentação e discussão de quatro projectos: “Os imigrantes e a população portuguesa: imagens recíprocas”, por Mário Ferreira Lages, “Filhos de imigrantes: monitorização do seu acesso à sociedade de conhecimento”, por Maria Margarida Marques, “O tráfico de migrantes em Portugal: perspectivas sociológicas, jurídicas e políticas”, por João Peixoto, e “Filhos diferentes de deuses diferentes. Manejos da religião e inserção social diferenciada num contexto inter-étnico”, por Susana Pereira Bastos. De cada um destes estudos, a serem publicados futuramente pelo Observatório da Imigração, destacam-se aqui alguns dos aspectos mais relevantes.
“(...) Quando confrontados com indicadores de racismo, a maior parte dos inquiridos revelou atitudes de aceitação dos estrangeiros (...)”
“(...) as escolas portuguesas deveriam promover a aprendizagem da língua materna dos alunos imigrantes. (...)”
ACIME | Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias ÉtnicasACIME | Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas
O TRÁFICO DE MIGRANTES EM PORTUGAL
PERSPECTIVAS SOCIOLÓGICAS, JURÍDICAS E POLÍTICAS
No plano teórico, este estudo enfatizou a diferença entre as noções de
trafficking (ou “tráfico”, em sentido estrito) e smuggling (“contra-
bando” de imigrantes ou auxílio à imigração ilegal, que pode assumir
formas menos violentas). Dado o carácter ilegal do fenómeno e as
dificuldades de investigação, privilegiou-se a recolha de informação
em tribunais, estudando casos julgados ou em julgamento, realizando-
se ainda entrevistas a representantes de instituições governamentais e
não governamentais relacionadas com a imigração. No que respeita ao
tipo de movimentos, foi especialmente estudado o tráfico de mão-de-
obra, sobretudo relacionado com as vagas mais recentes de imigração
económica para Portugal que se viram envolvidas em situações desse
tipo. Foi o caso do fluxo de imigrantes de Leste que chegou a Portugal
a partir dos finais dos anos 90 e, em menor grau, o dos brasileiros
inseridos na “segunda
vaga” desta imigração.
Comparando as caracte-
rísticas das redes de tráfi-
co ligadas à imigração de
Leste e à brasileira, veri-
ficou-se a existência de
grandes diferenças, tanto
em número como no tipo
de operação. As redes
da Europa de Leste são
geralmente mais organi-
zadas, com níveis hierár-
quicos formais e divisão de tarefas entre os seus membros. Para além
do auxílio à imigração ilegal, elas procuram muitas vezes a exploração
e recorrem à prática de coacção e violência. Por seu lado, as redes
brasileiras são habitualmente menos organizadas, com estruturas
informais e um número de membros mais reduzido. Actuam sobretudo
no auxílio à imigração ilegal, não recorrendo a uma exploração conti-
nuada nem à prática de violência. São típicas redes de “contrabando”
de migrantes.
Este estudo investigou igualmente o tráfico de mulheres destinadas
a exploração sexual, do Brasil e, em menor grau, do Leste europeu.
Ambos os fluxos aumentaram a partir do final dos anos 90, mas os
números absolutos das mulheres envolvidas são desconhecidos. No
caso brasileiro, o estudo conclui que a estrutura das redes de tráfico
parece ser bastante flexível. No que respeita à Europa de Leste, a
investigação realizada sugere que o tráfico de mulheres seja sobretudo
um subproduto de outras formas de tráfico.
FILHOS DIFERENTES DE DEUSES DIFERENTES
MANEJOS DA RELIGIÃO E INSERÇÃOSOCIAL DIFERENCIADA NUM CONTEXTO INTER-ÉTNICO
Este estudo propôs-se investigar o papel desempenhado quer pela reli-
giosidade não organizada, quer pela adesão a diferentes religiões e sei-
tas, comunitariamente organizadas, no desenvolvimento e/ou bloqueio
de percursos de inserção social em grupos e segmentos de minorias
étnicas residentes em Portugal. Após um inquérito a quatro grupos de
origem indiana (incluindo hindus, ismailis e sunitas), a dois de ciganos
(um dos quais pertencente à igreja Filadélfia), a quatro de cabo-ver-
dianos (de várias crenças) e à minoria sikh (com religião própria), os
investigadores concluíram que a religião tem influência nos compor-
tamentos e nas relações das minorias étnicas com o próximo, minimi-
zando os riscos de marginalidade e permitindo mesmo “uma maior
abertura aos portugueses e, consecutivamente, atitudes menos racis-
tas”. Segundo os autores
do estudo, a segmenta-
ção de alguns grupos em
análise, através da sua
posição face à religião,
permitiu colocar a hipó-
tese de que a conversão
religiosa constitua uma
estratégia de “construção
da exemplaridade”, o que
permite a construção de
“vanguardas civilizacio-
nais, éticas ou políticas”
que reforçam a identidade. Contudo, no contexto português actual, as
religiões arrastam também consigo conotações derivadas de conflitos
históricos, civilizacionais ou coloniais, não representando apenas
modos de aproximação ao divino. Para seleccionar os grupos analisa-
dos, os autores utilizaram seis critérios comparativos: grupos ou seg-
mentos definidos pelos media e pelos cientistas sociais como “proble-
máticos” versus grupos não problemáticos; grupos migrantes recentes
versus grupos migrantes com presença centenária; grupos lusófonos
versus novas migrações não-lusófonas; grupos ou segmentos etno-reli-
giosos com uma organização congregacional versus segmentos com
religiosidade não-organizada e comparação entre os grupos lusófonos
e comparação entre grupos diferentes com a mesma religião.
“(...) foi especialmente estudado o tráfico de mão-de-obra, sobretudo relacionado com as vagas mais recentes de imigraçãoeconómica para Portugal (...)”
“(...) Este estudo propôs-seinvestigar o papel desempenhado quer pela religiosidade nãoorganizada, quer pela adesão a diferentes religiões e seitas (...)”
Boletim Informativo Abril 2005Boletim Informativo Abril 2005
Para uma escola curricularmente
inteligente
Autor: Carlinda Leite
Edição: Edições Asa, 2003
Com a expressão “escola curricular-
mente inteligente”, pretende desig-
nar-se uma instituição que, em vez
de se limitar a administrar e a dis-
tribuir conhecimentos na lógica de
um pensamento linear e convergente,
promova práticas onde se desenvol-
vam a criatividade e competências
de ordem cognitiva, afectiva e social.
Este livro, uma síntese da reflexão
realizada através de vários anos de
participação em conferências e semi-
nários, defende que a escola não deve
depender exclusivamente de uma ges-
tão que lhe é exterior. Pelo contrário,
deve integrar processos de decisão
participados pelo colectivo escolar,
que estruturem o ensino e a aprendi-
zagem num espírito de comunicação
real, envolvendo professores, alunos
e toda a comunidade.
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Somos diferentes!
Autores: Rosário Alçada Araújo e
Catarina França (ilustrações)
Edição: Impala, 2005
Falar em parábolas, apesar de ser
normalmente mais longo do que usar
a linguagem corrente, tem um poder
de comunicação superior e a fixa-
ção, pelo ouvinte leitor, fica gravada
de outra forma. Neste pequeno conto
– uma parábola – o tema, que se vai
tornando evidente, é tão importan-
te como actual. Compatibilizar a
diversidade com a unidade, subli-
nhar a riqueza da pluralidade, é
tarefa essencial num mundo onde é
fundamental apostar nos valores da
tolerância e da interculturalidade.
Esta é uma história simples e ima-
ginativa, que nos faz pensar e nos
convida a viver num outro estilo de
conduta e atitude.
Olhares Lusos e Brasileiros
Autores: Maria Beatriz Rocha-
Trindade e Maria Christina Siqueira
de Souza
Edição: Usina do Livro, 2003 (São
Paulo)
“Olhares Lusos e Brasileiros” é o
resultado de uma parceria entre o
Centro de Estudos das Migrações e
das Relações Interculturais (CEMRI)
da Universidade Aberta e o Centro
de Estudos Rurais e Urbanos da
Universidade de São Paulo, no Brasil.
Tendo como tema a emigração portu-
guesa para o Brasil, retratam-se três
fases: as condições que precederam a
emigração, a instalação e permanência
no país de acolhimento e os efeitos do
seu regresso a Portugal. Recorrendo a
entrevistas a gerações sucessivas, este
livro mergulha na aventura que foi
emigrar para um país que, apesar de
ter a mesma língua, é distante, desco-
nhecido e onde se verificaram sucessos,
mas também insucessos.
L’ Organisation Internationale pour
les Migrations
Edição: OIM, 2003 (em francês ou
inglês)
Disponível em: https://unp.un.org/
Após levar a cabo operações no mundo
inteiro ao longo de meio século, a
OIM tornou-se a principal organiza-
ção internacional a trabalhar com os
imigrantes e os governos na procura de
soluções humanas para as questões da
imigração. Fundada em 1951 com um
estatuto de organização inter-governa-
mental tendo a missão de assegurar a
reinstalação dos refugiados, dos imi-
grantes e de outras pessoas deslocadas
na Europa, a OIM tem actualmente
uma outra dimensão, reflectindo a
diversidade de actividades que realiza
no mundo inteiro para gerir os fluxos
migratórios. Esta obra publicada em
2003 dá um panorama histórico dos
trabalhos da Organização nas questões
complexas em que se empenha.
Lettres d’émigrés
Autores: Manuel Charpy, Souley
Hassan
Edição: Nicolas Philipe, 2004
Preço: 19 Euros (disponível em
www.amazon.fr)
Qual é a relação entre Salifou, esti-
vador no porto de Marselha, Sala,
vendedor ambulante nas ruas de
Washington, e Anthelme, pintor da
construção civil em Yamoussoukro?
Os três são originários do Benin ou
do Níger. Como muitos outros, emi-
graram para os países da Europa,
da América ou da África, a partir
de onde se corresponderam com os
seus parentes e amigos. Ao longo
de anos, as cartas, fotografias e
cassetes gravadas mantiveram uma
ligação com o seu país. Neste livro,
editado em 2004, são os “mudos da
história” que falam. São as espe-
ranças e as dúvidas de imigrantes
num cruzamento de culturas, em
palavras que evocam a precariedade
e a solidão do exílio.
Programa NósRTP 2: Domingo às 10h00Repetições:RTP1 - 2a a 6a às 6h30RTP Internacional2a a 6a às 8h00 - 3a às 04h30RTP África2a a 6a às 17h30 - 6a às 05h00
Um magazine semanal de uma hora
(com blocos diários de 20 minutos),
dinâmico, alegre e comprometido
com a integração e o acolhimento das
comunidades que escolheram Portugal
como país de acolhimento, privile-
giando o enquadramento da riqueza
cultural e social que as distintas comu-
nidades trazem ao nosso país, atra-
vés de histórias de vida, gastronomia,
desporto, cultura... O “NÓS” procura
criar uma ponte de informação através
da apresentação de entrevistas e deba-
tes sobre temas actuais, informação
sobre os direitos e deveres dos cidadãos
imigrantes, ligação com as suas asso-
ciações e serviços disponibilizados pela
sociedade civil e pelo Estado.
ACIMEAlto Comissariado para
a Imigração e Minorias Étnicas
O ACIME encontra-se na dependência
da Presidência do Conselho de Ministros, regulado pelo
D.L. nº251/2002, 22 de Novembro.
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website:
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BOLETIM INFORMATIVODirecçãoP. António Vaz Pinto,S.J.Alto Comissário para a Imigração e Minorias ÉtnicasCoordenação da ediçãoMiguel Justino AlvesRedacçãoJoão Van Zeller(joao.zeller@acime.gov.pt)DesignJorge Vicente(druida@mac.com)Colaboraram nesta ediçãoAndré Costa Jorge Bernardo Sousa Elisa LuísFlávio BignonMaria Helena Torres Marta Mendes Fotografias da capaJorge FirminoPré-impressão e ImpressãoEuro-ScannerTiragem5.000 exemplaresDepósito legal23.456/99
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