catalogo asas 2009
Post on 05-Dec-2014
1.382 Views
Preview:
DESCRIPTION
TRANSCRIPT
Natacha Rena | Juliana Pontes (orgs.)
ARTESANATO SOLIDÁRIO NO AGLOMERADO DA SERRA
ARTESANATO SOLIDÁRIO NO AGLOMERADO DA SERRA
ARTESANATO SOLIDÁRIO NO AGLOMERADO DA SERRA
Natacha Rena | Juliana Pontes (orgs.)ASAS . Artesanato Solidário no Aglomerado da Serra
ARTESANATO SOLIDÁRIO NO AGLOMERADO DA SERRA - ASAS
Professora CoordenadoraNatacha Silva de Araújo Rena
Professora ParticipanteJuliana Pontes Ribeiro
Técnicos Dimas Pereira Guimarães Éder Jorge de AlmeidaÉder Peixoto Maria Crisóstomo Ramos
Psicóloga VoluntáriaÉrica Silva do Espírito Santo
Estudantes BolsistasAna Luisa Ferreira . Bruno Elias Gomes de Oliveira . Cristiane Pereira Araújo SilvaDaniel Patrick Cordeiro Pimentel . Eduardo Goulart de Macedo . Felipe Sales Melo FrancoJoanna Sanglard Bernardes . Pedro Duarte Sena de Oliveira . Pedro Ivo . Rafael Miranda Barbosa Rodrigo FrancoMattar
Estudantes ColaboradoresDisciplina Artesanato e Design 2007/2008André Machado . Carolina Furtado . Cinira Morais . Daniela Coelho . Daniele TondatoDébora Maffia . Fernanda Pereira . Guilherme Deriz . Guilherme Santos . Ivana de AlmeidaLara Pinheiro . Leliane Peixoto . Letícia Grissi Lucas Diniz . Luiza Mascarenhas . Matheus Rocha . Pablo Codeglia . Rafaela Valadão Tiara Brito
Estudantes Voluntários Alisson dos Prazeres . Andressa Furtado Calixto Diego Silva . Fernando Vasconcelos . Guilherme Bonsato Deriz . Ingrid Sander . Karina de Oliveira Leite . Leonardo Monte Alto Pacheco . Priscila Soares da Silva . Rachel Grandinetti . Reinaldo Rocha . Tatiana Lemos
Artesãos CapacitadosCleuza Maria Pires Dias . Ellen Cristina Pires Dias Elzy Nunes de Oliveira Ferreira . Etelvina Xavier de Almeida . Gabriella Estefane Santos de Souza Gonçalo Nascimento Santos . Joana Rodrigues de Souza . Loslane Pasos de Oliveira . Maria do Carmo da Rocha . Peterson Linker S. Rodrigues Shirley Maria Araújo . Suzana Marília dos Anjos Oliveira . Yasmin T. Gonçalves
AGRADECIMENTOS
Anderson Matos . Cleonice Bráz da Silva . Débora Gonçalves de Oliveira . Igor Rios . Jaqueline Dias Juliana Myhra Karina Leite . Patrícia Aun . Pedro Moraes . Tânia Porto Thiago Bones . Vinícius Glico Patricia de Aguiar Paes . Meninas da cozinha: Eliane Magalhães (Lili), Iva e Marta. Parceria: Cassius Silva Pereira (Raiz da Terra)
ReitorProf. Antonio Tomé Loures
Vice-reitoraProf.ª Maria da Conceição Rocha
Pró-reitor de Ensino, Pesquisa e ExtensãoProf. Eduardo Martins de Lima
Pró-reitora de Planejamento e AdministraçãoProf.ª Valéria Cunha Figueiredo
Coordenador Geral de PesquisaProf.ª Rúbia Carneiro Neves
Coordenador Geral de ExtensãoProf. Osvaldo Manoel Corrêa
Coordenadora do setor de relações internacionais | Prof.ª Astréia Soares Batista
Assessoria de Ensino de GraduaçãoProf. Luiz Antônio Melgaço Nunes Branco
Diretoria de Desenvolvimento SustentávelMaria Luiza Pinto e Paiva
Superintendência de Ação SocialLaura Oltramare
Coordenação da área de projetos sociaisAndréa Regina
Coordenação do Concurso Banco RealUniversidade SolidáriaEloisa Martins
FACULDADE DE ENGENHARIA E ARQUITETURA - FEA
Diretor GeralProf. Luiz de Lacerda Júnior
Diretor de EnsinoProf. Lúcio Flávio Nunes Moreira
Diretor Administrativo-FinanceiroProf. Fernando Antônio Lopes Reis
Coordenadora Geral do Curso de DesignProfª Ângela Souza Lima Coordenadores por Habilitação D. Gráfico | Prof. Guilherme Guazzi Rodrigues D. Interiores | Profª. Maria Fernanda Loureiro D. Produto | Prof. Eliseu de Rezende Santos D. Moda | Profª Gabriela Maria Torres
PROJETO CATÁLOGO ASAS
CoordenaçãoProf.ª Juliana Pontes Ribeiro
Direção de arteProf.ª Juliana Pontes e Natacha Rena
Design / Projeto GráficoCris Araújo
FotografiasCris AraújoEduardo GoulartJuliana Pontes Joanna SanglardNatacha RenaSérgio Amzalak . Tatarana Imagem
Revisão de textosRachel Murta
Gerência de ProjetosDaniela Lemos
Consultores voluntários e sócios-fundadoresProf. Dr. Waldenor Barros Moraes FilhoProf. Dr. Luiz Fernando Coelho de Souza
A798
Asas: Artesanato Solidário no Aglomerado da Serra Organizadoras Juliana Pontes Ribeiro e Natacha Rena. Belo Horizonte: Editora Faculdade de Engenharia e Arquitetura FEA - Universidade FUMEC, 2009.
136 p.: il. (possui fotografias).Vários autores.
ISBN 978-85-61258-05-4.
1. Design. 2. Artesanato. 3. Economia solidária. 4. Almofadas. 5. Estampas. I. Ribeiro, Juliana Pontes II. Rena, Natacha. III. Título.
CDD: 745.098151CDU: 745(815.1)
Informação bibliográfica conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT):
RIBEIRO, Juliana Pontes; RENA, Natacha (Org.). Asas: Artesanato Solidário no Aglomerado da Serra. Belo Horizonte: Editora Faculdade de Engenharia e Arquitetura FEA-Universidade FUMEC, 2009. 136 p. ISBN 978-85-61258-05-4.
instituições parceiras. índice
design social02
Projeto ASAS: autonomia e empodera-mento por meio do artesanato solidário
Identidade: processo construtivo
A estamparia como capacitação profissional
Psicologia e a estruturação de grupo
Depoimentos: alunos bolsistas
018
Fumec
UniSol . Banco Real - Grupo Santander
Escola Municipal Padre Guilherme Peters
008
paralelas03
Eco-Bags
Parceria Raiz da Terra
Concurso Almofadas
Muros Estampados
Oficina Pinhole
Exposição Aglomeradas
Oficina de Texto
070
registro das criações04
102
portfolio asas05
120
12 13
instituiçõesparceiras
01
14
fumecconstruindo o conhecimento
15
16
Prof. Antônio Tomé LouresReitor da Universidade Fumec
A troca de saberes constitui a base de projetos como
o ASAS – Artesanato Solidário no Aglomerado da
Serra, consistindo em princípio fundador da ação
comprometida com o aprendizado e a necessária
mudança social. Fundamentalmente integradora,
a proposta realiza a missão social da Universidade
FUMEC, incentivando a produção e a efetiva socia-
lização do conhecimento.
Aprendemos, com a atividade artesanal, a sabedoria
da partilha construída em torno da experiência co-
municada; a arte da escuta, do silêncio e da narrativa
comprometida com a vida que perdura. Essa é a
postura de quem acredita na invenção de um futuro
em que o conhecimento se constrói, pacientemente,
na ação criadora; em forma de valores que conferem
sentido ao mundo compartilhado.
Formar profissionais comprometidos com a justiça
e a ética é desafio permanente da Universidade
FUMEC. O projeto ASAS exerce essa missão de forma
particular, convertendo-a em processo renovador,
em que a criação coletiva potencializa saberes e
valoriza o artesanato como fonte de aprendizado
permanente.
Assim, apresentar este catálogo à sociedade é mo-
tivo de grande satisfação para todos nós. Com a con-
clusão da proposta, comemoramos esta importante
conquista junto às comunidades da Universidade
FUMEC e do Aglomerado da Serra.
“No processo de aprendizagem, só aprende verdadeiramente aquele que se apropria do apren-
dido, transformando-o em apreendido, com o que pode, por isso mesmo, reinventá-lo; aquele que
é capaz de aplicar o aprendido-apreendido a situações existenciais concretas” - Paulo Freire
17
Foi assim que tudo teve o seu início, com uma Tática
de Sobrevivência envolvendo os moradores da Vila
Ponta Porá, comunidade pertencente à região cen-
tral de Belo Horizonte – MG, onde como resultados
“as pesquisadoras realizaram um vasto levantamento
de inventos - objetos e produtos do cotidiano - que
revelaram um enorme potencial do cidadão comum
(moradores expostos a situação de precariedade
econômica)”.
Sempre Savassi Design e Cultura é como o fio de
Ariadne que permitiu a saída da pesquisa para dar à
luz na extensão. Envolvendo parcerias com o CDL-
BH e o SEBRAE, esse projeto desenvolveu diversas
comunidades de artesãos, resultou na produção de
um texto e um catálogo; o primeiro, finalista em con-
curso, e o segundo produziu frutos como exposição
e menção honrosa.
No catálogo da Coleção 9+1, uma coleção temática
de nove almofadas quadradas e uma redonda
revelando temas ligados à história de vida de cada
artesã, registra-se a ação de extensão Artesanato
Solidário no Barreiro. Nesse projeto, novas parcerias
foram possíveis com a Associação da Terceira Idade e
Idosos do Barreiro (ASTIB) e a UNITEC – Nova Zelân-
dia com o seu suporte metodológico para ações de
responsabilidade social.
Esse constante aprender permitiu que as experiên-
cias adquiridas fossem aplicadas em Assis Brasil (AC)
e Jequitaí (MG) em incursões do Projeto Rondon. A
capacitação em artesanato e design de produtos e
mobiliários de bambu foram oficinas desenvolvidas
em Assis Brasil. Em Jequitaí uma nova coleção de
almofadas revelou em sua estamparia a história da
cidade em seu rio, no garimpo, na pesca, no trabalho
das lavadeiras, na religiosidade e outros temas.
A criação do grupo de pesquisa com o tema
Diferenças: Arte, Design, Arquitetura e Artesanto, no
CNPq, e a exposição no INHOTIM de uma coleção de
produtos com características iconográficas reco-
lhidas no próprio museu pareciam ser o fim dessa
jornada. Mas enquanto essas atividades estavam
em andamento, um novo edital em nível nacional
estava aberto, e o acumular de anos de experiências
se transformou no projeto Artesanato Solidário no
Aglomerado da Serra.
Os primeiros passos dessa nova caminhada estão
no Catálogo ASAS, que deve ser apreciado com o
olhar de admiração nos permitindo ver mais além
dos muitos focos de violência, tráfico de drogas e
desemprego instaurados nessa comunidade. É ver
com pasmo a capacidade de empoderamento que
a metodologia de criação a partir do conceito de
Artesanato Solidário teve no período de doze meses
para capacitar um grupo de multiplicadores que tem
por missão, em 2009, passar para novas gerações de
jovens e adolescentes o seu aprendizado, fazendo
funcionar a oficina de serigrafia.
Por fim, o agradecimento da Universidade FUMEC à
UNISOL (Banco Real), pela parceria que tornou pos-
sível este projeto, e pela sua renovação para o biênio
2009/2010.
Prof. Osvaldo Manoel CorrêaCoordenador do setor de extensão
“Conceituar é preciso, viver e tecer a trama da existência é preciso e registrar é mais que preciso”.
18
unisol banco real . grupo santander
1919
Em uma comunidade, as atividades de cada indi-
víduo estão sempre interligadas de alguma maneira.
Quando um se beneficia, é muito provável que o
próximo seja atingido. Assim, os projetos sociais
que se baseiam em parceria de benefícios mútuos
podem conseguir multiplicadores e ser auto-susten-
táveis.
Acreditando nisso, o UniSol e o Banco Real - Grupo
Santander Brasil - apóiam, desde 2007, o projeto
ASAS - Artesanato Solidário no Aglomerado da Serra
- vencedor do 11º Concurso Banco Real Universidade
Solidária. Executado pela FUMEC/MG é um exemplo
de iniciativas que estimulam a participação ativa
da comunidade, e o envolvimento de professores,
estudantes, escola, prefeituras e ONGs na construção
de alternativas para problemas de ordem social,
econômica e ambiental da região.
Criado em 1996, o concurso Banco Real e Uni-
versidade Solidária estimula o engajamento de
estudantes e professores universitários na implemen-
tação de ações que promovam o desenvolvimento
social de comunidades de todo o País.
Essa parceria proporciona a implementação de proje-
tos sociais com a participação de Instituições de Ensi-
no Superior (IES) brasileiras, por meio de seu corpo
docente e discente em comunidades, trabalhando
na construção de soluções locais de desenvolvimen-
to sustentável e comunitário, e disseminado valores
de cidadania e de responsabilidade social aos jovens
universitários - futuros profissionais do país.
Em treze anos de atuação, o concurso já mobilizou
94 IES, 1.340 estudantes, 178 professores e benefi-
ciou direta e indiretamente mais de 4 mil pessoas em
todo Brasil, a partir da interação entre o conheci-
mento acadêmico e o popular.
20
escola municipal padre guilherme peters
2121
Márcia LibânioDiretora
Desde agosto de 2007 os alunos, funcionários e
pessoas da comunidade do Aglomerado da Serra
tem freqüentado as oficinas de capacitação que
acontecem na Universidade FUMEC.
O grupo ASAS (Artesanato Solidário no Aglomerado
da Serra) formado a partir da parceria entre a Univer-
sidade FUMEC, o Unisol/Banco Real e a Prefeitura de
Belo Horizonte tem realizado bons benefícios para
esta comunidade.
Duas vezes por semana o grupo se reuniu ao longo
do ano nas dependências da Universidade FUMEC.
Esses encontros, que propiciaram o contato com
alunos e professores universitários, fornecem ao
grupo o desenvolvimento das relações de trabalho
em espaços que eles poderiam ter dificuldades em
freqüentar.
Os alunos do grupo ASAS têm tido acesso a espaços
culturais da cidade, apresentando suas criações e
conhecendo artistas locais e de contexto nacional.
A montagem da cooperativa no espaço escolar
beneficiará tanto a comunidade quanto os alunos
da escola . Essa cooperativa será um exemplo a ser
seguido por eles. Aqueles alunos da escola que
tiverem interesse em fazer parte da cooperativa
poderão desenvolver as técnicas a partir do grupo
ASAS (futuros multiplicadores).
A Escola Municipal Padre Guilherme Peters se sente
honrada em fazer parte dessa parceria que trará mais
dignidade à comunidade. Hoje a cooperativa já não
é só um sonho distante. Ela já se tornou realidade!
Ao avaliarmos a parceria firmada nesse curto prazo
de tempo, só podemos ressaltar a importância do
compromisso social, principalmente em comu-
nidades carentes como a em que a escola está
inserida.
22 23
design social02
projeto asas: autonomia e empoderamento por meio do artesanato solidário
Designer, Mestre em Comunicação Social, professora do curso de graduação em Design Gráfico e pós-graduação na Universidade FUMEC e orientadora, junto com a profa. Natacha Rena, do projeto ASAS-UNISOL/Banco Real - Grupo Santander.
juliana pontes
Arquiteta, designer, professora dos cursos de Arquitetura e Design de Interiores na Universidade FUMEC; mestre em Arquitetura pela UFMG, doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC São Paulo e coordenadora do projeto ASAS-UNISOL/Banco Real - Grupo Santander.
natacha rena
longo do trabalho. Com ênfase nos processos
criativos que aconteçam de forma colaborativa
e na criação de uma metodologia específica
- que garanta sustentabilidade das ações
implementadas -, este projeto também objetivou
a criação de um mix de produtos com alto
valor agregado (acompanhados de catálogo
e exposição) que possa ser comercializado
em locais onde o público consumidor valorize
produtos realizados com responsabilidade
socioambiental. Outro objetivo já realizado
foi a montagem de uma oficina de criação e
produção em serigrafia na Escola Pe. Guilherme
Peters.
A comunidade específica escolhida para o
desenvolvimento do projeto aqui proposto é a
Escola Municipal Padre Guilherme Peters situada
dentro do conjunto de vilas e favelas de Belo
Horizonte denominado Aglomerado da Serra.
Essa escola pertencente à Vila Novo São Lucas
tem procurado parcerias para que seus alunos
possam se apropriar de novos conhecimentos
e novas tecnologias que os ajudem a enfrentar
novos ambientes educacionais e novos
ambientes de trabalho. A escola vai da Educação
Infantil até a oitava série do Ensino Fundamental,
e tem também no turno noturno a Educação de
Jovens e Adultos. Novas parcerias têm aberto
novos horizontes para esses jovens, que em sua
O Projeto ASAS (Artesanato
Solidário do Aglomerado da
Serra) teve a intenção de capacitar
um grupo de moradores do
Aglomerado da Serra para o
desenvolvimento de uma coleção
de produtos com características
singulares. O objetivo central
foi estabelecer um processo
sustentável de geração de renda
no Aglomerado da Serra (conjunto
de vilas e favelas da cidade de Belo
Horizonte) a partir do conceito de
autonomia criativa e produtiva
com foco no empoderamento
da comunidade. Dentro de um
conceito amplo de artesanato
solidário, desenvolveu-se uma
metodologia específica de criação
em artesanato e design com o
intuito de capacitar grupos de
artesãos para o desenvolvimento
de objetos inventivos e com
características singulares.
A idéia central dos projetos de
extensão que realizamos na
Universidade FUMEC é capacitar
grupos como multiplicadores
do conhecimento adquirido ao
¹ Rua Coronel Jorge Dário S/número . Bairro Novo São Lucas. Belo Horizonte . CEP 30.240-560
apresentação
26
maioria estão muito distantes da oportunidade do primeiro emprego ou
de exercer uma atividade econômica lucrativa e promissora por falta de
capacitação específica. O Aglomerado está localizado na chamada região
sul da cidade, setor residencial de alto poder aquisitivo (onde se encontra a
Universidade FUMEC).
Atualmente a prefeitura de Belo Horizonte está executando uma grande
obra de urbanização do Aglomerado (considerado um dos maiores
projetos de urbanização de favelas do País no momento), que inclui a
construção de uma via asfaltada de mão dupla que atravessará o conjunto
de vilas, ligando diretamente duas regiões da cidade. Há um investimento
real na melhoria das condições de vida da população local e na sua
inserção definitiva no contexto urbano, o que implica a educação e a
capacitação dessas pessoas para uma nova condição de trabalho e relação
social. O que acontece no caso específico da Escola Municipal Padre
Guilherme Peters é que a sua localização não é próxima das margens da
grande via a ser construída, o que resultou em um menor investimento
dos projetos citados acima nesta escola. Essa situação poderá produzir
um futuro desnível de oportunidades dentro do próprio Aglomerado,
acentuando ainda mais as questões ligadas ao desemprego à violência e à
exclusão social.
O Aglomerado da Serra possui uma grande dimensão populacional, com
muitos focos de violência e disputa de grupos ligados ao tráfico de drogas,
o que dificulta ações eficazes em todo o seu território. O foco nas escolas
municipais, começando com um projeto piloto em uma escola específica,
limita a ação a um campo fértil, que é o dos jovens em formação, pois
estes são as maiores vítimas do aliciamento para a atividade do tráfico e
da violência gerada por esta economia ilegal. A falta de infra-estrutura,
Possuía em 1999 uma população total por volta de 37.641 habitantes segundo dados da URBEL, mas segundo a Secretaria de Desenvolvimento Social, 45.920 pessoas e, segundo a imprensa Estado de Minas, 160.000 habitantes.
27
29
recursos materiais e capital humano
nas escolas municipais é ainda um
grande empecilho para que essas
unidades sustentem projetos de
inserção econômica e capacitação
profissional adequadas à nossa
realidade social e às demandas do
mercado de consumo e serviços
hoje.
As escolas também podem ser
pontos de apoio permanentes
para que iniciativas como
essas se desenvolvam com
acompanhamento adequado e
previsão de continuidade, pois sem
esse tipo de suporte muitas boas
idéias, ações e projetos se perdem
por falta de investimentos em
longo prazo, gerenciamento das
atividades de formação, estruturas
de equipe para captar novos
recursos e orientar novas investidas
educacionais. Nesses espaços a
parceria entre o ensino tradicional
e o grupo de artesãos, por um lado,
complementa o ensino tradicional
e, por outro, amplia os horizontes
de atuação dos seus alunos e
professores.
28
31
O Aglomerado da Serra possui
uma população com poder
aquisitivo baixíssimo, mas inserida
em uma das regiões com índice
socioeconômico mais alto da
cidade. Ao mesmo tempo a
Universidade FUMEC tem optado
estrategicamente por desenvolver
projetos de natureza social
nessa região, já que é vizinha
da Universidade e delimita um
campo de atuação solidária. Na
última pesquisa para a Prova
Brasil o índice socioeconômico
no Aglomerado foi de 1.1 numa
escala de 1 a 5. E aqui também há
uma justificativa concreta para a
escolha da Escola Municipal Padre
Guilherme Peters que, entre as
cinco escolas municipais existentes
no Aglomerado, conforme
comprovado pelo Prova Brasil,
é uma das duas escolas de mais
baixo índice socioeconômico da
cidade e com uma necessidade
imensa de melhorar a sua infra-
estrutura e estabelecer parcerias
externas que complementem o
processo educativo e respondam a
demandas a que a escola não pode
atender sozinha.
30
funciona aos sábados e domingos e oferece
oficinas de artesanato, de percussão, de
capoeira, informática e possivelmente a de
estamparia também poderá funcionar aos finais
de semana.
Outro fator essencial ao projeto é que a
prefeitura de Belo Horizonte ofereceu como
contrapartida a construção de um espaço
onde será instalada a oficina de estamparia,
cujos equipamentos e materiais de uso foram
financiados pelo Prêmio UNISOL/BANCO REAL.
A primeira turma formada poderá montar uma
associação que se auto-sustentará e que formará
novos trabalhadores ao capacitar os jovens,
dando-lhes também a oportunidade do primeiro
emprego e uma atitude empreendedora. A
escola funciona em horário integral e esses
futuros artesãos podem começar a aprender
tecnologias que em curto prazo poderão servir
para melhores condições de trabalho e de
vida. A idéia é que esta comunidade, com a
implementação de projetos como este, possa
iniciar a criação de uma rede de sustentabilidade
e economia solidária, melhorando sua condição
econômica, sua inserção social, diminuindo os
índices de violência local e aumentado a sua
auto-estima.
A oportunidade da parceria
com a Universidade FUMEC
tem proporcionado a um
grupo de alunos dessa escola
pertencente ao Aglomerado o
conhecimento de um ambiente
de estudo completo, de nível
superior, além do aprendizado
de técnicas inovadoras no design
de estamparia. Isso aconteceu
em uma primeira etapa, com
oficinas e aulas realizadas na
própria Universidade, utilizando
suas salas de aula, equipamentos
didáticos e o ateliê de estamparia.
Além disso, pode-se criar para a
comunidade, a partir da primeira
turma a freqüentar esse programa
de capacitação, a figura dos
multiplicadores, que serão pessoas
que participarão do projeto e
irão repassar o conhecimento
dando continuidade ao trabalho,
formando novos empreendedores
e até uma cooperativa para
trabalhar com confecções da
cidade e/ou do estado. Esses
multiplicadores poderão iniciar
outras pessoas da comunidade
inclusive na Escola Aberta, que
alteração da situação enfrentada e expectativas do projeto
32
O principal objetivo deste projeto foi
fomentar o artesanato como setor econômico
sustentável que valoriza a subjetividade
coletiva promovendo a melhoria da qualidade
de vida e a geração de renda. A intenção foi
propiciar a criação de produtos manufaturados
com possibilidade de comercialização em
mercados consumidores proeminentes como
feiras nacionais e eventos, além dos locais com
possibilidades de venda de produtos com alto
valor agregado. O projeto tem proporcionado
um cruzamento de ações de capacitação, tais
como orientação com metodologia específica
para trabalhar um reposicionamento subjetivo e
criativo do artesão de baixíssima renda perante
um novo mercado consumidor mais exigente
através: da formação de repertório estético geral
e histórico, além de incentivar a atualização
cultural (incluindo tendências na moda, no
design e na decoração). Após o lançamento
dos produtos, a idéia é que através de parcerias
estes sejam comercializados em pontos de
venda onde sejam valorizados como resultado e
processo de projetos de artesanato e design que
promovam inclusão social e geração de renda
em comunidades carentes.
Todo o trabalho proposto neste projeto objetiva
uma ampliação efetiva do repertório cultural
dos participantes do grupo através de aulas
teóricas sobre arte, cultura, design, arquitetura,
antropologia, ecologia e sustentabilidade. Passeios
culturais e visitas a exposições de arte também se
enquadram nessas ações, além da participação
do grupo em oficinas que possam envolver
outros grupos culturais já organizados na própria
comunidade. Esse tipo de artesanato abarca
produtos que atingem altos preços no mercado
nacional e também costumam ser os prediletos no
mercado de exportação.
Pretendeu-se neste projeto desenvolver a técnica
de estamparia para aplicação em produtos
variados. Percebemos que essa técnica, além
de valorizar o produto, também dá agilidade à
produção por conseguir uma reprodução em série
mesmo que por processos artesanais. Neste projeto
essa técnica engendrou uma enorme eficácia, já
que faz parte do universo estético contemporâneo
a idéia de aplicação de imagens colhidas pelos
artesãos como forma de revelar as relações entre a
identidade pessoal e o lugar.
Também são objetivos do projeto: ampliar as
oportunidades de trabalho e renda da população
envolvida em situação de risco pessoal e social
num projeto de inclusão social; promover o acesso
a tecnologias adequadas para o desenvolvimento
objetivo geral objetivos específicos
33
35
artesanal produtivo; utilizar
a inovação e a identidade
cultural como um dos fatores de
diferenciação do produto; educar
o olhar do grupo para perceber
soluções inventivas e sensíveis às
demandas objetivas e subjetivas
do homem urbano no seu próprio
cotidiano; promover a cultura da
cooperação estimulando a criação
e o fortalecimento de associações
e cooperativas; resgatar a cultura
urbana e jovem como fator de
agregação de valor ao artesanato;
disponibilizar informações sobre
a utilização racional dos recursos
naturais, segundo os postulados
da legislação ambiental; socializar
o acesso às informações e ao
conhecimento no âmbito do
setor artesanal; articular parcerias
para aumentar a participação
do artesanato na produção
nacional e para o conseqüente
fortalecimento do setor; melhorar
a auto-estima e a qualidade de
vida da população; desenvolver a
capacidade de criação e produção
coletiva.
34
global, como diz Octavio Ianni , “muitas
coisas desenraizam-se, parecendo flutuar
pelos espaços e tempos do presente”, ou seja,
mais do que tradições buscamos um diálogo
com a contemporaneidade. Desenvolvemos
procedimentos de pesquisa, de criação e de
produção que advenham da identidade a partir
da relação entre a cultura urbana e a cultura da
favela, para que seja possível construir um forte
laço identitário entre os artesãos e os produtos
criados. Ministramos um grande leque de
oficinas e aulas teóricas que possam dialogar
diretamente com o cotidiano deles.
primeiro momento
A primeira atividade da capacitação foi a
realização de um diagnóstico das qualidades
espaciais e estéticas do território cotidiano do
grupo a partir da experiência subjetiva de cada
um. A idéia foi fazer com que os participantes
descobrissem características cotidianas nunca
observadas, agora com um olhar estético que
revelasse o valor cultural das favelas e em
especial do território específico a que eles
pertencem. Esse diagnóstico foi elaborado
a partir de mapas subjetivos (produção de
imagens fotográficas e inúmeros desenhos,
mapas, colagens e anotações) construídos
coletivamente pelo grupo. A coleta dessas
Uma metodologia eficaz
para o desenvolvimento de
capacitação em artesanato que
tenha sustentabilidade surge
do entendimento de que só é
possível induzir grupos a criar
o novo quando se constrói um
vasto repertório (informações,
conceitos e instrumentalização),
através do qual os participantes
possam compreender a situação
atual da arte, do design e da
cultura contemporânea e que
sejam capazes de, a partir daí,
desenvolver futuras coleções de
produtos sem a dependência da
instrução de designers e artistas.
Nitidamente com um caráter
de inclusão social, este projeto
apresenta uma metodologia
específica para desenvolver
coleções de produtos artesanais
que se relacionem culturalmente
de forma direta com o universo
do Aglomerado da Serra. Ao
mesmo tempo que reforçamos
o contexto local do projeto nos
temas escolhidos para as estampas,
a concepção da linha de produtos
está ligada a um pensamento
metodologia de projeto
IANNI, Octavio. A Sociedade Global. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1997.
36
informações tornou-se referência iconográfica
e conceitual para a criação dos produtos numa
etapa posterior.
segundo momento
Num segundo momento uma ação importante
para a capacitação foi a apresentação de
aulas teóricas (fundamentos de arte e design)
acompanhadas de exercícios práticos que
reforçaram o conhecimento adquirido de forma
empírica. Também foram ministradas aulas sobre:
elementos visuais e composição gráfica; o olhar
como forma diferenciada de percepção; história
da arte - do cubismo à arte contemporânea;
teoria da cor; tendências no design; design do
cotidiano e vernacular; arte popular e artesanato,
street art, etc. Essas aulas teóricas foram sempre
ilustradas com apresentações de imagens
dos conteúdos dados para gerar essa nova
bagagem de cultura visual, tão necessária para
a compreensão da estética e dos processos
criativos contemporâneos. Também foram
exibidos vídeos e filmes, entre documentários
e longa-metragens, que abordam questões da
arte e da cultura do século XX, peças de design
e artesanato contemporâneos. Além de aulas
expositivas, mas em momentos intercalados a
elas, produzimos oficinas práticas para oferecer
novos instrumentais (tanto para criação -
desenhos, pinturas, maquetes, colagens - quanto
para o desenvolvimento do protótipo - mistura de
muitas técnicas) através de procedimentos técnicos
híbridos. Portanto, esse trabalho de capacitação
em design e artesanato inclui uma série de ações
fundamentais para a construção do ambiente
criativo necessário.
terceiro momento
Numa etapa final do plano de capacitação, que
teve início em agosto de 2008, iniciamos as
oficinas de criação, nas quais foram efetivamente
trabalhados os produtos específicos para a coleção
final.
Acredita-se que somente com a consolidação do
conhecimento ao longo de oficinas, seminários,
visitas de estudo e com a produção de peças
com qualidade estética, cultural e eficácia
mercadológica é que um processo sustentável
pode ser iniciado nessa escola pública, já que
iremos construir e efetivar uma oficina de
estamparia para que futuramente não somente
alunos, mas também egressos possam continuar
gerando renda e se incluindo socialmente com
dignidade. Todo trabalho aconteceu com um
acompanhamento intensivo de todo o processo
criativo e da finalização dos produtos. A principal
idéia dessa metodologia é dotar os alunos de uma
nítida capacidade para gerar novos produtos a
partir de um processo criativo baseado na pesquisa
37
39
e na inovação. Mais do que
gerar produtos finais com forte
interferência do designer, esse
processo de capacitação deverá
estimular metodologias de criação
e desenvolvimento de produto.
A metodologia incluiu também
workshops para o desenvolvimento
de trabalhos em grupo e
identificação de lideranças.
Também fizeram parte dessa
etapa final: montagem da oficina
de criação e produção artesanal;
registro de todo o processo
através de fotografias e filmagens;
planejamento do catálogo, que
inclui a reunião de todas as
informações desde o processo
até o resultado final da coleção
e da oficina em funcionamento;
planejamento da exposição;
avaliação de todo o processo e do
resultado final; estabelecimento de
planos de continuidade do projeto
na escola específica e já início
do plano de ação para a próxima
escola do Aglomerado.
38
41
qualidade que foi comercializado pelas artesãs
individualmente.
Como desdobramento das atividades
acadêmicas envolvendo o projeto tivemos a
pintura dos muros da escola Padre Guilherme
Peters pelo alunos da disciplina Núcleo de
Projeto 2, do curso de Design Gráfico. As
imagens estampadas nas paredes da escola
foram resultado de oficinas realizadas com as
crianças e os adolescentes do Aglomerado,
focando em experiências de vida positivas
de cada um. A pintura foi encerrada com um
evento na própria escola, no qual a aluna
de Design de Moda Karina Leite apresentou
sua coleção de final de curso, toda feita com
estampas criadas pelas artesãs especialmente
para as suas peças. O desfile envolveu alunos
e familiares da comunidade, pois as modelos
também foram escolhidas no próprio
Aglomerado.
Outras atividades paralelas à criação da coleção
também foram desenvolvidas como um
estímulo criativo e oportunidade de integração
do grupo. Um exemplo foi a exposição
Aglomeradas, resultante de uma oficina de
pinhole realizada na FUMEC pelo Prof. Alexandre
Lopes. Cada artesã fotografou com uma caixa
de fósforo o seu cotidiano e essas imagens
foram ampliadas em acetato e montadas em
Além de o projeto ser
resultado da Premiação Nacional
no Concurso Unisol/Banco Real, ao
longo do trabalho conseguimos
uma parceria com a empresa Raiz
da Terra, que desenvolve e produz
camisetas ecológicas. A parceria
consistiu no desenvolvimento de
estampas exclusivas pelas artesãs
com o tema fauna e flora do
Aglomerado da Serra. A empresa,
além de produzir os modelos
de estampas criados por elas,
apresentou a coleção em Paris, em
um evento de moda ética. Esse
trabalho serviu para abrir portas
comerciais para o grupo, além de
consolidar e divulgar a marca do
ASAS.
As parcerias oficiais aconteceram
ao mesmo tempo que as
próprias artesãs começaram a
comercializar as suas ecobags,
que foram o primeiro produto
desenvolvido pelo grupo como
exercício. A atividade, de início, foi
encarada como uma prática para
o exercício da técnica e acabou
formando mais um produto de
desdobramentos
40
caixas de luz na cor preta, iluminadas por leds
eletrônicos na parte interna. A exposição foi
muito bem-sucedida e, além da repercussão na
mídia, fez as caixinhas de luz se tornarem mais
um produto comercializável para o grupo.
Enfim, projetos como este ressaltam a
importância da participação da Universidade
FUMEC em projetos de responsabilidade
social com uma atuação que abarque também
a pesquisa que tem o papel de consolidar
as questões acadêmicas, metodológicas
e conceituais para que os projetos de
extensão produzidos na própria universidade
relacionados ao tema (no caso o artesanato
urbano) tenham embasamento teórico e
projeção científica. Criam também um ambiente
coeso entre pesquisa e extensão em torno
da idéia de um Artesanato Solidário para que
possamos atuar ativamente junto aos órgãos
nacionais (e internacionais) de discussões
fundamentais para o desenvolvimento
econômico sustentável no País.
42 43
44
identidade: processoconstrutivo
Técnica em Comunicação Visual pelo Instituto de Arte e Projeto - INAP, cursando 7º período em design gráfico pela Universidade FUMEC.
cris araújo
A identidade visual ASAS foi desenvolvida a partir
da observação de fotografias
do Aglomerado da Serra.
Primeiramente foi realizado
um estudo das estruturas dos
barracões para, assim, podermos
retirar características para compor
as letras da identidade. Após esses
estudos iniciou-se um processo
de geração de alternativas para
adequação de letra/desenho.
Através das pesquisas locais
pôde-se perceber as seguintes
características passíveis de serem
transformadas em elementos
visuais: estruturas sobrepostas,
arranjos, diversidade de materiais,
becos e vielas, cores opacas, o
laranja constante dos tijolos e o
céu azul compondo a paisagem.
A partir desses elementos
iniciamos a construção da
identidade. A identidade teve
como característica blocos não
alinhados, espaços entre letras
fazendo alusão aos becos e vielas e
a estrutura grotesta que remete à
improvisação e à desuniformização
das casas aglomeradas.
46 47
cores:
LARANJA | cor da comunicação, simbolizando o projeto como agente comunicacional na comunidade e também por ser a cor mais predominate no Aglomerado, presente nos tijolos dos barracões.
AZUL ACINZENTADO | cor que remete a segurança e estabilidade, fazendo alusão à estruturação sólida do projeto proposto na comunidade e também por ser a junção do azul do céu ao cinza do asfalto bem visíveis no Aglomerado.
ARTESANATO SOLIDÁRIO NO AGLOMERADO DA SERRA
ARTESANATO SOLIDÁRIO NO AGLOMERADO DA SERRA
ARTESANATO SOLIDÁRIO NO AGLOMERADO DA SERRA
becos e vielas
base estrutural: tijolos
letras “blocos” desuniformes remetendo à estrutura dos barracões
49
v
psicologia e a estruturação do grupo
Psicóloga, graduada pela Universidade Federal de Minas Gerais, em agosto de 2005.
érica do espírito santo
Meu nome é Érica Silva do
Espírito Santo, sou psicóloga,
graduada pela Universidade Federal
de Minas Gerais em agosto de
2005. Desde que me formei venho
procurando formas de aprimorar
meus conhecimentos técnicos e
teóricos dentro de alguns campos
da vasta área de abrangência
da Psicologia. Uma área em
que comecei a trabalhar foi na
psicanálise, tanto individual quanto
com grupos.
Fui convidada a participar do
projeto ASAS para atender a
uma demanda de trabalho com
adolescentes. A princípio foi o que
me chamou atenção para o projeto,
pelo fato de eu já ter experiência
em trabalhos anteriores com
adolescentes do Aglomerado da
Serra. Meu primeiro encontro com
o grupo foi no dia 22 de março de
2009, e logo foi esclarecido que o
projeto havia sido pensado para
jovens, mas que tinha mudado de
foco. Acho importante tocar nesse
ponto, pois percebi logo que era
um incômodo do grupo que estava
lá, sete mulheres adultas e quatro
jovens, pois as mulheres mais velhas eram quem
estava “tocando” o grupo e o projeto era focado
para os jovens. Então este foi o primeiro ponto a
ser trabalhado com o grupo: definir quem era o
grupo e qual seria seu papel.
Por parte da equipe da FUMEC foi feita a
demanda para o trabalho com o grupo no
sentido de ajudá-lo a se fortalecer, para que ao
final do projeto tivesse autonomia para se manter
sozinho, já que o objetivo é que elas sejam
responsáveis por uma oficina de estamparia que
será montada dentro do Aglomerado.
Ficou estabelecido que meu horário de trabalho
com o grupo seria todas as terças-feiras, às 14h,
horário combinado com o grupo para que não
houvesse atrasos. No início muitas se atrasavam.
Aos poucos fomos criando um espaço de
trabalho em que foram aparecendo as questões
a serem trabalhadas e os incômodos. Fizemos
oficinas de agrupabilidade, com a intenção de
unir mais o grupo que ali se encontrava partindo
da idéia de que o grupo eram aquelas pessoas
que estavam ali, mesmo que isto contrariasse
a proposta inicial do projeto. Acredito que à
medida que os participantes foram percebendo
que eles eram o grupo, foram se apropriando
dele, foram assumindo papéis sem tanto receio
de que esse lugar fosse tomado mais tarde pelos
jovens.
52
O desenvolvimento do grupo parece ter sido modificado. Logo que cheguei, nos primeiros encontros, na fase
de observação, percebi que o grupo estava ainda imaturo, esperando respostas dos professores e dos bolsistas,
como alunos que recebem o conhecimento que foram ali, na universidade, buscar. Agora estamos em agosto
e já percebo que foi assumido um papel pelo grupo, um pouco mais de iniciativa, de organização, ou seja,
um pouco mais de autonomia. As oito mulheres que são o que chamo de “coração” do grupo já fizeram suas
primeiras reuniões entre si, independentemente das professoras e dos bolsistas e parecem já participar mais
ativamente desse trabalho que no futuro será o trabalho delas.
O que percebo claramente é que houve uma mudança de um estado de dependência absoluta do grupo
em relação ao corpo de professores e alunos da FUMEC para um estado de dependência relativa, fazendo um
paralelo com as fases de desenvolvimento do indivíduo. E o objetivo deste trabalho é que este grupo continue
caminhando no sentido de chegar a uma independência, para que possa caminhar pelas próprias pernas.
Acho importante destacar também a importância que percebo deste projeto para a auto-estima dessas
mulheres, moradoras do aglomerado, que não tiveram oportunidade de cursar uma faculdade e, cada dia
mais, se sentem capazes de, além de buscar novas possibilidades para suas vidas, passar o conhecimento que
acumularam ao longo de suas vidas. Todas trazem uma bagagem que vão compartilhando aos poucos, vão se
sentindo importantes dentro do que é valorizado no projeto, vão percebendo que elas são o valor deste projeto
e se sentindo mais convictas para seguir adiante.
Há dificuldades de horário, de tempo, de dinheiro para ir e vir, de aceitar as diferenças, de estabelecer regras –
situações normais que acontecem com qualquer grupo que se proponha a trabalhar junto.
Esse grupo tem traços fortes de união e de identidade entre si, por se tratar de mulheres maduras, em sua
maioria, habitantes da mesma região, que procuram no trabalho uma saída para o futuro.
Cada grupo tem uma estrutura e uma dinâmica. A estrutura é a forma de organização do grupo a partir da
identificação de seus membros. Dinâmicas são as forças de coesão e dispersão do grupo, e que fazem com que
se transforme, o que inclui: formação de normas, comunicação, cooperação, divisão de tarefas e distribuição
de poder e liderança. Pretendemos fortalecer ainda mais os laços já estabelecidos dentro do grupo até o
final do projeto. E, para o segundo semestre, foram programadas atividades que facilitassem a divisão de
papéis, que já está sendo esboçada pelas participantes em suas reuniões; atividades que esclareçam as regras
53
e normas estabelecidas pelo
grupo; atividades de facilitação
da comunicação tanto dentro do
grupo quanto de dentro para fora
do grupo, ou seja, a comunicação
do grupo com o mundo; atividades
de clarifiquem as lideranças ainda
mais e que promovam uma divisão
destas e do poder, a fim de que
não haja impressão de injustiça
ou privilégio. O intuito é fazer com
que cada integrante participe de
cada etapa e se sinta responsável
pelas escolhas que forem feitas.
É muito importante pra mim ver
que esse grupo já cresceu nesse
período e ainda crescerá muito
mais. Obviamente, tudo não se
deve ao trabalho psicológico que
vem sendo feito, mas ao trabalho
de toda a equipe e do próprio
grupo.
Para mim é importante participar
desse projeto pelo desafio, por
se tratar de um trabalho com
pessoas de outras áreas, com as
expectativas, com meus limites.
Ao longo do trabalho venho
procurando enriquecer meu
arcabouço teórico a fim de procurar respostas
para as perguntas que surgem a cada dia, para
expandir meu repertório de atividades e oficinas,
busca de novos livros, textos. Gostaria de enfatizar
também a importância da liberdade para trabalhar
desde o início, o grande acolhimento do grupo
da FUMEC, a compreensão quanto ao trabalho
que muitas vezes não deixa claro seus objetivos, e,
principalmente, a troca de conhecimento. Pois o
campo da psicologia é aberto para tudo que vem
de enriquecimento em relação ao ser humano
e acho que essa experiência proporciona esse
crescimento para todos os envolvidos.
54 55
56 57
58
a estamparia como capacitação profissional
Serígrafo e técnico da estamparia da Universidade FUMEC.
éder jorge de almeida
Meu nome é Éder Jorge
de Almeida, sou serígrafo e
desenvolvo trabalhos para
estamparia têxtil, com técnicas
que vão desde a pintura artesanal,
passando pela serigrafia plana
manual, até os processos
automatizados como carrosséis,
planas e cilindros, além de
comunicação visual e gravuras.
Como educador, atuo em projetos
de inclusão social (Sol da Serra),
capacitação profissional (Talentos
do Brasil), qualificação profissional
(Mulheres Criativas) e figurino
(Corpo Cidadão).
Quando comecei a desenvolver
o processo de estamparia dentro
do projeto Artesanato Solidário
no Aglomerado da Serra “ASAS”,
encontrei um grupo numeroso
que em princípio me assustou,
pois era um número muito acima
da capacidade do ateliê onde a
técnica seria desenvolvida, mas as
aulas teóricas que antecederam o
processo foram de fundamental
importância e grande aliadas na seleção natural
dos que realmente têm compromisso com o
trabalho em equipe.
Foi uma grande e decepcionante surpresa ver
que os mais jovens desistiram do projeto por
não poder “esperar”, mas sei que a culpa não é
deles. O projeto conjuga ações de educação e
profissionalização objetivando um conseqüente
crescimento econômico e distribuição de
renda, porém em longo prazo, e os mais jovens
infelizmente não podem esperar, uma vez que
a realidade social é cruel e os obriga a traçar
os próprios caminhos e, com certeza, só irão
perceber o quanto perderam quando for muito
tarde.
No decorrer das atividades tive medo
também de que o grupo ficasse eternamente
dependente dos colaboradores e não
conseguisse a autonomia suficiente para entrar
no mercado e enfrentar a concorrência em pé de
igualdade, mas esse medo passou depois de ver
que os remanescentes conseguiram superar os
conflitos internos e compreenderam que juntos
terão chances reais de se tornarem autônomos.
A autonomia do grupo (Etelvina, Elzy, Maria
do Carmo, Schirley, Susana, Joana e Gabriela)
60
ainda não foi conseguida, mas todos os exemplos de superação dados até o momento mostram que, com
o devido acompanhamento, em breve será conseguida. Vale lembrar que esse grupo, conseguiu absorver o
conhecimento transmitido pelos colaboradores do “ASAS” com o devido suporte, conseguiu desenvolver seus
produtos e está pronto para enfrentar uma banca.
Para aqueles que resistiram até agora, só tenho a agradecer pela tolerância e pelo carinho que sempre
demonstraram mesmo nos piores e mais difíceis dias de nossa parceria que só está começando. Para os que
desistiram, espero que se encontrem e reconheçam a importância de somar as forças em prol da melhoria da
qualidade de vida e do desenvolvimento.
61
62 63
64
depoimentos: alunos bolsistas da universidade fumec
Ana Luíza Ferreira . Bruno Oliveira . Cris Araújo Daniel Patrick . Eduardo Goulart . Felipe Franco Joana Sanglard . Rafael Barbosa . Rodrigo Mattar
66 67
ana luiza ferreira . design de moda
O Projeto ASAS coordenado pelas
professoras Natacha Rena e Juliana
Pontes foi uma oportunidade maravi-
lhosa em minha vida, tanto profis-
sional quando pessoal. Aprendi muito
com todo o grupo e especialmente
com as artesãs. Acredito que como
profissional me tornei uma pessoa
melhor e mais humana e amiga.
Como já existia em mim a vontade de
ajudar pessoas, acabei descobrindo
como me ajudar. E só tem agradecer
a todo o grupo.
bruno oliveira . ciência da computação
A oportunidade de participar do
ASAS surgiu em um momento de
questionamento de diversos aspectos
do design, suas metodologias, con-
textos e objetivos. Assim que entrei
para o projeto fui apresentado a um
universo de referências que não es-
perava: Hardt e Antonio Negri, Paola
Berestein Jacques, Michel Foucault,
Gilles Deleuze, Felix Guattar, entre
outros. Mais do que um aglomerado
de técnicas e materiais, o artesanato-
design se mostrou ser uma área de
desenvolvimento de habilidades e conceitos
cada vez mais inovadores. Quando percebi, o
projeto, que havia se tornado um real desafio,
colocando em xeque diversos posicionamentos
políticos, sociais, culturais, estéticos, havia tam-
bém influenciado atitudes tanto na minha vida
pessoal quanto na acadêmica. Novos materiais,
possibilidades, experimentações e conhecimen-
tos foram descobertos com o desenvolvimento
do projeto, e estes novos contextos foram (e
serão) definitivos para as minhas (futuras) de-
cisões profissionais: escolhas mais diferenciadas,
sustentáveis e conscientes.
cris araújo . design gráfico
O projeto Asas me proporcionou uma visão mais
crítica e ampla sobre projetos sociais sua eficá-
cia, seus objetivos, metodologias e até mesmo a
recepção desse tipo de ação nas comunidades
em que se desenvolvem. Além de aduzir alguns
conceitos a serem desenvolvidos na minha área
de formação: O Design Gráfico. O empenho do
grupo foi tão grande, que discussões teóricas
sobre o modo mais efetivo de capacitação,
conceitos, condução do projeto, processos
criativos e principalmente prática de ensino se
tornaram cada vez mais presentes em corre-
dores da universidade e essa troca de vivências e
daniel patrick . design gráfico
experiências têm acrescentado muito
na minha formação e vejo como
aprendizagem para toda a vida. Esse
projeto abriu ainda mais a minha
visão profissional para possibilidades
de atuação no mercado de trabalho
além de ratificar a minha vontade de
seguir carreira acadêmica, levando-
me a pensar conceitos para colaborar
com a área do Design/Artesanato, e
também de aprofundar as discussões
sobre metodologia de criação, ensino
e identidade cultural.
Participar do ASAS me proporcionou um grande
crescimento pessoal e acadêmico, possibilitando
um pensamento crítico em relação a minha
opção profissional e a inserção social. Confron-
tar minha formação acadêmica com a prática
através do choque de realidades tão distintas
trouxe um aprendizado único, levando-me a de-
senvolver metodologias específicas de trabalho
e a compreender a articulação entre o ensino,
pesquisa e extensão. Descobertas de um novo
olhar, questionamentos do que é belo, do que
é horrendo o que é conceitual, o que é grupo
e como se trabalha com ele, foram questões
constantes em nossos encontros;
questões essas que se aperfeiçoaram
a cada dia estimulando-nos a con-
tinuar na medida em que observáva-
mos a absorção do conteúdo, tudo
isso fez-me acreditar ainda mais no
design aliado ao artesanato como
forma de transformação do sujeito,
fazendo-o um agente cultural ativo,
transformador e confiante de suas
possibilidades criativas.
68
eduardo goulart . design gráfico
A alguns períodos acadêmicos atrás,
em meados de 2007 quando, então,
fui apresentado às coordenadoras
do projeto ASAS - as professoras da
Universidade FUMEC Natacha Rena,
primeiramente, e posteriormente
Juliana Pontes - eu, sim, deliberada-
mente sabia e imaginava que esta
seria uma ótima oportunidade, tanto
de desenvolvimento acadêmico,
quanto profissional.
Porém, não concebia a tamanha
distância que estava prestes a percor-
rer, em caminhos e experiências,
intrincados, dentro deste projeto de
extensão.
Cansativos e recompensadores -
em vistas de um aprimoramento
pessoal, no âmbito sócio-cultural,
aliado ao meu já citado almejado
avanço profissional, em novas bases
de aplicações teóricas e articulações
práticas, nunca antes por mim prova-
das, até então. Como Fotojornalista
deste longo e multidisciplinar projeto
de extensão da Universidade FUMEC,
em parceria com o Banco Real e a
ONG UNISOL, pude desempenhar
meu papel, em simultâneo tempo ao que,
pelas mesmas vias, aprimorei e desenvolvi
parâmetros de composição pessoais, como
criador imagético, lapidando e atravessando
níveis de evolução em meu trabalho, em
minha função de Fotógrafo, que venho a
algum tempo desempenhando e desenvol-
vendo, na Vida.
Tendo a Universidade FUMEC e o projeto ASAS
como plataformas de ações e articulações,
minha trajetória acadêmica e profissional ficou
positivamente marcada entre antes e depois
deste intenso ano, onde muitas dificuldades
construtivas marcaram minha presença no
grupo de trabalho, que envolveu e envolve
alunos bolsistas, coordenadores, professores,
voluntários e, especialmente, um grupo pe-
culiar de alunas e alunos, todos provenientes
do Aglomerado da Serra, em Belo Horizonte,
MG, que representaram o início de novos
horizontes, no campo que diz respeito ao
entendimento sociológico que tanto gosto de
explorar, e aplico no que desenvolvo, profis-
sionalmente, dentro do que venho criando e
intuindo em minhas visões do que costumo
chamar ‘fotojornalismo poético’.
Conversas, amizades formadas. Experiências
trocadas e co-vividas. Momentos solidificados
como potencializadores de meu currículo,
enquanto aluno de Design Gráfico nesta aca-
demia de ensino - são todos estes fatores que
marcaram minha experiência neste projeto
social, político, cultural e conceitual.
De forma pragmática (coisa que o ASAS me
ajudou substancialmente a desenvolver),
posso solidamente aqui testemunhar, quando
atesto que minhas habilidades foram noto-
riamente melhoradas, tanto tecnicamente,
quanto qualitativamente, como a pouco
pontuei:
• uma maior desenvoltura na capacidade de
realizar registros fotojornalísticos foi alcançada
por mim, como resultado desta experiência
com o projeto, com o aprimoramento de
habilidades composicionais e técnicas, assim
como as do cunho “relação corpo a corpo”,
com os objetos fotografados, uma vez que,
intensamente, semana a semana por mais
de um ano - a fio - e in-loco, estive clicando e
editando imagens de todo o processo desen-
volvido pelo grupo;
• um desenvolvimento de relações e contatos
de trabalho mais sólidos, mais articulados, e
conseqüente enriquecimento de meu cur-
rículo, como profissional da Imagética e de
Design Gráfico ;
• evoluções no campo das inter-
relações humanas, neste quesito que,
por efeito cascata, me dá repertório
de ação, quando perante novos
desafios e rumos profissionais, dentro
de meu caminho pessoal e de forma-
ção acadêmica e intelectual.
Eu honestamente agradeço a todos
os envolvidos neste projeto - sem
excessões: desde meus colegas de
trabalho e também alunos da Univer-
sidade FUMEC, passando pelas co-
ordenadoras Natacha Rena e Juliana
Pontes, parceiros e profissionais de
diversas áreas envolvidas voluntários,
patrocinadores e responsáveis afins,
até, finalmente, à razão de tudo que
aqui é apresentado : este grupo de
alunos e alunas que muito trouxe-
ram para nós todos, não somente
levando para si um valioso empode-
ramento de vida e profissional, mas
deixando, em contrapartida, extenso
terreno de atuação e experiências
práticas e vivenciais, enriquecedores
para qualquer um de nós, emer-
gentes profissionais, em vias de
solidificação conceitual, cultural e
humana, em nossas áreas de atuação
individuais. Certamente assim o foi, e
continua a ser, para mim.
69
70
felipe sales melo franco . design de produto
joanna sanglard . design de produto
Fazer parte do projeto ASAS é para
mim uma experiência a que nada
é comparável. Primeiramente a
estranheza e ao mesmo tempo a
curiosidade de poder transformar
uma realidade que é tão diferente
da minha, e através deste processo
de transformação vir a me conhecer
cada dia melhor. Acredito que a
vivência dessa alteridade entre mun-
dos tão diversos possibilitou definir
minha linha de atuação no mercado
como designer. É muito bom poder
utilizar minha profissão, todos esses anos de fac-
uldade para ajudar pessoas menos favorecidas,
pois ajudando os outros eu ajudo a mim mesma,
uma vez que estamos todos interconectados.
Nas primeiras visitas ao Aglomerado me intriga-
va pensar em como aquele império é construído
dia a dia, retalho a retalho, com seus constantes
puxados e achados das ruas. Outra experiên-
cia significativa foi o vice-e-versa, quando as
pessoas do Aglomerado vieram a primeira vez
à universidade conhecer o meu então “mundo
formal”. Percorremos laboratórios, salas de aula,
No período de um ano só aprendi.
Não foi fácil como pensei, o que é
muito bom! Aprendi a respeitar o
próximo, a ver realidades e mundos
distintos no mesmo lugar. Aprendi a
pintar, fazer contas, criar, sorrir, dizer
não. Aprendi que, por mais tarde que
seja, conseguimos mudar, aprender,
ter esperança. Aprendi a planejar,
executar, trabalhar em equipe.
Aprendi a ajudar, ser ouvido e ouvir.
oficinas, biblioteca, cantina, etc, fazendo
analogias com os percursos da favela; os dois
contextos (favela e universidade) possuem
seus atalhos, caminhos peculiares, traçados e
percursos, becos e trajetos sem saída.
E como será viver na favela onde todo mundo
é igual e “alguns não existem”, segundo relato
de uma moradora sobre os constantes “gatos
de luz” feitos: “sabe como eu descobri que o lugar
em que eu moro não existe no mapa? A CEMIG
cortou a luz, fizemos gato, daí levaram embora, e
fizemos gato de novo, falaram que o Beco Gomes
não existe no mapa, será que eu não existo?”.
Portanto são muitas as lucubrações sobre as
inconstâncias da favela, é terra de ninguém,
logo, de todos.
Do individual ao coletivo, metodologias
começam a ser propostas por eles mesmos,
um sinal de que enxergam que o ponto gera-
dor (e inspirador) de todo esse processo é nada
mais que seu contexto e suas possibilidades. É
interessante ver como mergulham no mundo
em que sempre viveram, mas de uma forma
diferente agora.
A cada dia dessa vivência surgem novos
questionamentos, caminhos e possibilidades,
dando a oportunidade a nós, estudantes, de
atuarmos na realidade que está debaixo dos
nossos olhos e aos moradores da
comunidade, de exaltar o que há de
bom na favela, trazendo novas pos-
sibilidades de renda e trabalho.
Outro ponto fundamental é a
multidisciplinaridade que existe no
projeto, proporcionando um apren-
dizado mútuo pela união de diversos
conceitos e preceitos, e também a
eficácia da ação, contribuindo para
uma melhoria efetiva da comuni-
dade do Aglomerado.
inserir foto
71
72 73
rafael barbosa . design gráfico
Comecei a participar oficialmente do
projeto de extensão ASAS no dia 4 de
março de 2008, participei do projeto
até o fim do mês de junho e retornei ao
grupo em outubro. Analisando minha
experiência, percebo que o projeto
tem ótimas perspectivas. O grupo de
trabalho constituído pelos alunos da
FUMEC é bem dividido e as tarefas são
delegadas de acordo com o perfil e a
habilidade de cada voluntário. Posso
relatar que durante os quatro meses
em que fiquei fora o grupo evoluiu
muito, a associação “Aglomeradas” está
mais consolidada e o papel de cada integrante
está sendo bem determinado pelas moradoras
do Aglomerado da Serra. Tenho o objetivo de
contribuir não só na área de design gráfico, da
qual fui encarregado, mas também nas relações
entre os alunos da universidade e os moradores
do Aglomerado da Serra, pois percebo que o
trabalho em grupo e o convívio entre pessoas
de realidades sociais tão diferentes é um desafio
diário. Tenho ótimas perspectivas para esse
trabalho e acredito que, se o empenho de cada
envolvido for desenvolvido em conjunto com o
grupo, realizaremos as metas do projeto ASAS
com excelência.
rodrigo franco mattar . design de produto
Vejo esse projeto social como uma
excelente oportunidade de colocar
em prática muitos conhecimentos
adquiridos no meio acadêmico,
podendo ser usados de uma forma
profissional, já que o ASAS funciona
como uma pequena empresa, com
projetos, produtos, prazos, público-
alvo e profissionais com cargos e fun-
ções distintas. O desafio de preparar
as aglomeradas para um mercado
consumidor que é cada vez mais
exigente faz com que os bolsistas se
dediquem ao máximo, tendo que
pesquisar materias, tendências e funcionalidade
para os produtos desenvolvidos. Paralelamente
ao objetivo de fazer com que as aglomeradas,
após o projeto, possam continuar desenvol-
vendo um trabalho inovador e de uma forte
identidade de pessoas que vivem o dia-a-dia de
uma periferia, acredito que o sucesso futuro será
de todos os envolvidos, pois o convívio e a troca
de experiências não só colaboram para a estru-
turação de uma comunidade como também
enriquecem o conhecimento dos estudantes e
mestres, que colherão os frutos dessa vivência,
adquirindo uma visão muito mais ampla e um
repertório mais consistente.
74 75
paralelas atividades complementares
03
77
eco-bags
joana sanglard | Graduada em design de produto pela Universidade FUMEC
pelo caminho peças, retalhos e superfícies que
possam ocasionar uma proteção quando unidas,
as eco-bags são fruto da hibridização de diversas
técnicas, conceitos, histórias e memórias.
Entre vielas e becos, arranjos e acasos, a vida de
quem mora na favela está entregue ao acaso,
não importa o fim, vive-se da incompletude.
Essa fragmentação e o senso de incompletude
estão fortemente presentes nos produtos
desenvolvidos. Desenhos inacabados, costuras
enviesadas, borrões, sobreposições de bordados,
colagens e estêncil.
A partir de cada uma das oficinas trabalhadas
coletivamente (pontos, linhas, rabiscos, cores,
texturas, colagens, observação, modelagem,
apliques, estampas e bordados) as bolsas criadas
por cada uma das aglomeradas tomaram formas
únicas, apresentando tanto uma expressividade
singular, quanto um produto contaminado
pelas trocas resultantes das orientações dos
professores, dos alunos da disciplina, dos colegas
da favela e dos alunos bolsistas do projeto ASAS.
O primeiro produto desenvolvido pela equipe
do grupo ASAS foi uma coleção de eco-bags,
acompanhando uma tendência ecológica e política
mundial contra o uso das sacolas plásticas para
compras de supermercados. A produção dessas
bolsas fez parte da disciplina optativa dos cursos de
design Artesanato e Design. Alunos da disciplina
construíram workshops semanais numa seqüência
lógica que auxiliasse na criação e confecção das
bolsas.
A elaboração conceitual presente na construção
dessas bolsas se assemelha à forma de surgimento e
desenvolvimento das favelas através da “bricolagem”,
explicada por Paola Berenstein no livro “Estética da
Ginga”;
“O acaso é parte integrante da idéia de bricolagem; é o
incidente, ou seja, o pequeno acontecimento imprevisto,
o “micro-evento”, que está na origem do movimento.
Bricolar é, então, ricochetear, enviesar, zigue-zaguear,
contornar.” (JACQUES, apud BERENSTEIN, 2003, p.24)
Assim como os barracos nas favelas são construídos
aos poucos e à medida que as pessoas encontram
76
A marca Raiz da Terra Brazilian Nature Wear tem
como proposta o desenvolvimento de produtos de
moda de forma ética, apostando, desenvolvendo e
apoiando projetos sociais e ambientais.
No início de 2008 tivemos a oportunidade de
conhecer o Projeto ASAS, e a partir daí iniciamos essa
parceria que já começa a render frutos. Traçamos
como objetivo o desenvolvimento de uma coleção
de camisetas cujo tema escolhido foi “a natureza na
favela”, que foi lançada no Paris Ethical Fashion Show
2008 no mês de outubro.
As expectativas foram superadas pelo poder
criativo mostrado pelos integrantes do projeto no
desenvolvimento das estampas, pelo resultado
atingido nas peças piloto e no retorno já iminente
por parte do mercado. A marca já planeja novos
trabalhos em parceria com o Projeto ASAS,
apostando cada vez mais nesse imenso potencial
criativo, no desenvolvimento de um mix de
produtos com alto valor agregado que possam ser
comercializados pela Raiz da Terra BNW em suas
coleções.
parceria raiz da terra Coleção Natureza na Favela
cassius silva | Gestor de Comércio, Comunicação e MKT da marca Raiz da Terra Brazilian Nature Wear
78 79
concurso almofadas
dos tratores que estavam passando por cima
das estruturas do “morro”. Após mais pesquisas
(envolvendo inclusive frotagens das rodas dos
tratores da obra), desenvolvemos o conceito
das almofadas, cartelas de cores, materiais e
acabamentos... Só havia um problema: já era
sexta-feira e a data limite para o envio dos
documentos para o concurso era na segunda-
feira. Não tínhamos telas gravadas, nem mesmo
esticadas, o tecido não estava cortado, enfim,
não tínhamos nada pronto. Após uma conversa
sincera com as alunas do projeto, que estavam
bastante animadas com a idéia de começar a
fazer produtos, estabelecemos um cronograma
intenso para estamparia e bordado, que se
estenderia por sexta-feira, sábado e domingo
inteiros. Foi então que pude perceber que,
apesar de todos os problemas de processos
em grupo, as alunas do ASAS iriam dar conta
do recado. Após uma intensa sexta-feira de
gravação de telas e preparação de tintas e
modelagens, passamos o sábado estampando as
almofadas e iniciando a costura. Já no domingo,
com a Universidade fechada, nos encontramos
O projeto das almofadas surgiu com a proposta
do 1º Prêmio do Objeto Brasileiro. As alunas do
projeto já haviam criado uma série de eco-bags
(com bordados, apliques e pinturas com êstencil),
mas estávamos pensando em enviar um projeto
criado e desenvolvido pelas alunas com as
técnicas de estamparia que estavam aprendendo.
Começamos a discutir os conceitos relacionados
ao Aglomerado e às obras que a prefeitura estava
fazendo na região. Esse projeto, o “Vila Viva”, envolvia
a modificação da malha viária e a construção de
conjuntos habitacionais e iria movimentar, segundo
dados da URBEL (Companhia Urbanizadora de Belo
Horizonte), cerca de 50 mil pessoas. As opiniões
acerca de tal projeto eram as mais diversas no
grupo: havia aquelas que acreditavam que o fim
dos becos iria trazer mais segurança, além de
tornar melhor o sistema de moradia e a oferta de
lazer e cultura, e havia aquelas que acreditavam
que a mudança para “favelas verticais” seria uma
forma de controle da população e que iria apenas
piorar a situação. Após duas semanas de discussão
e pesquisas sobre o assuntos, durante uma aula
de desenho, surgiu a idéia desenvolver a imagem
bruno oliveira | Cursando 8º período de Ciência da Computação na Universidade FUMEC e 1º período de Artes Plásticas na Guignard
80
na casa de uma das alunas para bordar (e só então aprendi a técnica!). As aglomeradas abraçaram o projeto
de tal forma que me surpreendeu. Na segunda-feira nos encontramos novamente na Universidade FUMEC,
fotografamos as almofadas (fruto da noite em claro de algumas delas) e enviamos o material para o concurso.
Apesar de as almofadas não terem sido selecionadas para o concurso (acreditamos que o conceito das
mesmas estava demasiadamente polêmico para tal), o processo foi essencial para a compreensão das relações
dentro do grupo e das próprias práticas e metodologias do artesanato-design.
81
A atividade de pintura e colagem de imagens nos muros da Escola Municipal Padre Guilherme Peters foi mais
um desdobramento acadêmico do projeto ASAS UNISOL-BANCO REAL. A proposta surgiu na disciplina Núcleo
de Projeto II, do curso de Design Gráfico, que tinha o foco no design de superfícies e editorial. A princípio,
o tema seria a escola municipal e o Aglomerado. Porém, durante a nossa primeira visita de campo, tivemos
a idéia de realizar uma oficina com as crianças e os adolescentes da escola municipal para coletar material
iconográfico e textual para servir de fonte de criação para os projetos acadêmicos. As oficinas aconteceram no
Aglomerado, onde dividimos os jovens por grupos de idades e afinidades temáticas. Os assuntos trabalhados
giravam em torno do próprio cotidiano dessas crianças e desses adolescentes, como, por exemplo, o tema
“aconteceu comigo e foi legal”, ligado a memórias lúdicas e familiares. Outros temas surgiram, porém ligados
à atividade de estamparia e ao design, como pictogramas, estampas modulares, colagem e grafite. As oficinas
foram extremamente produtivas, gerando oportunidade de aprendizado de novos conteúdos para os jovens
da comunidade e uma vivência inédita para os estudantes da Universidade.
O envolvimento dos alunos da escola municipal no processo criativo das imagens teve a finalidade de
despertar o respeito pela estrutura física da escola, pois esta é sempre alvo de depredações, sujeiras e furtos.
A intenção principal era expor nas paredes internas e nos muros do ambiente escolar a própria narrativa
dessas crianças, fazendo com que elas tenham orgulho das imagens por representarem sua história de vida.
Essas imagens também reforçam a auto-estima do grupo, apresentando de forma gráfica, atual e viva as
suas memórias e fantasias. Outro fator responsável por gerar maior respeito pelo resultado do trabalho foi a
participação ativa das crianças e dos adolescentes do Aglomerado na pintura dos muros e fixação dos lambe-
lambes. O envolvimento dos jovens na montagem do projeto tornou-os conscientes do trabalho necessário
para se realizar tal atividade e do valor desse tipo de intervenção.
muros estampadosjuliana pontes | Professora da disciplina Núcleo de Projeto II da Universidade FUMEC
82
A ação teve ampla repercussão na mídia impressa local,
o que estimulou e valorizou muito a comunidade em
questão e os próprios estudantes da Universidade. A
realização do projeto contou com o desfile da coleção
“Arte Favela” da aluna de moda da Universidade criada
com estampas produzidas pelas artesãs do projeto
ASAS e apresentada por jovens modelos do próprio
Aglomerado. Essa atividade serviu como encerramento
do dia de pintura dos muros, e teve a presença dos
pais dos alunos da Escola Padre Guilherme Peters,
reforçando o vínculo entre a comunidade e a escola.
Enfim, a parceria foi um marco como resultado e como
experiência acadêmica e atividade extensionista. A
amplitude da ação na Universidade teve repercussão
também no Diretório Acadêmico (D.A.), que financiou a
compra dos materiais necessários e os seus integrantes
participaram ativamente da produção no Aglomerado.
Os muros deixaram de separar para tornarem-se espaços
de proximidade e interação.
83
Estar no Aglomerado durante os dias de realização do projeto e,
anteriormente, nas visitas guiadas foi uma experiência bastante
enriquecedora. Até então era nebuloso para mim a maneira como
o design poderia trazer mudanças significativas para a vida das
pessoas, a ponto de tomar uma dimensão social. Conviver com os
alunos da escola Padre Peters e a comunidade, além de enriquecer
minha metodologia de projeto, deixou evidente o tamanho da
nossa responsabilidade, como designers, na construção e no
desenvolvimento da sociedade à nossa volta.
A troca foi mútua. Enquanto nós, estudantes de Design Gráfico da
Universidade FUMEC, ensinávamos noções básicas de design para
os alunos, como composição e teoria das cores, aprendíamos de
maneira mais eficaz com o nosso público, pois estávamos inseridos
naquele meio. Mas, acima de tudo, trocávamos vivências e novos
conceitos.
Levamos nossa formação acadêmica como uma referência positiva.
No futuro, podemos ter designers derivados do Aglomerado,
pelo fato de termos atraído a atenção das pequenas mentes para
essa atividade. Também nesse período de inserção, por receber
mais informações sobre todo o contexto de vida do Aglomerado,
pudemos quebrar idéias clichês e nos livrar de qualquer preconceito
que estivesse relacionado com elas.
Poder sentir a emoção das crianças durante o processo do projeto, do
qual as mesmas participaram ativamente, é algo muito gratificante.
Mais gratificante ainda é aumentar nosso repertório cultural com essa
comunidade detentora de tanta riqueza que para nós era, até então,
oculta por trás do morro.
| depoimento | alisson dos prazeres
84 85
87
A oportunidade que tive ao desenvolver esse projeto para
a escola, um ambiente tão importante na criação de uma,
e de muitas pessoas, foi muito empolgante, despertou em
mim uma vontade de misturar a capacidade de impacto
das intervenções urbanas, do grafite e da estética e as
mensagens lúdicas de desenhos coloridos e “alegres”.
A abordagem, os materiais, a idéia e a localização foram
tarefas relativamente tranqüilas, mas quando fui realmente
grafitar e colar as imagens nos muros, foi uma novidade
enorme para mim, que nunca tinha realmente feito um
grafite com apoio de tantas pessoas, com empolgação e
descontração, e uma determinação de saber estar fazendo
algo que vai comunicar tanta coisa.
Quando recebi elogios e a aprovação das pessoas que
vivenciam a escola, de pessoas que trabalharam comigo
nos muros, e dos alunos que tanto se empolgaram, foi uma
recompensa enorme, eu nao queria parar mais. Queria ficar
ali o dia todo pintando muros, colocando em tinta uma
mensagem positiva para quem quisesse e pudesse enxergar,
colocando o conceito em forma e cor, dando vida ao
projeto desenvolvido na faculdade.
Foi uma experiencia que me abriu um horizonte novo,
de novas idéias e caminhos a seguir. Faria tudo de novo
se pudesse, e passaria adiante toda a experiencia a quem
interessar. Agradeço principalmente à professora Juliana por
acreditar em mim e me motivar quando achava que não
conseguiria.
| depoimento | fernando vasconcelos
86
A vista era maravilhosa!
O projeto de núcleo com a Juliana nos levou para o topo do
mundo, essa era a impressão que dava lá de cima. Os sorrisos
das crianças foram as maiores recompensas, e logo depois os
lanches e a satisfação de um trabalho tão bonito.
Foi muito marcante pra mim porque ver o trabalho sair da
faculdade e atingir de maneira tão carinhosa as crianças
do colégio Peters do Aglomerado ensina que é difícil ter
oportunidade de aprender, que nossas atitudes podem
realmente influenciar outras pessoas. E, quando eu falo de
atingir as pessoas com nossas ações, não falo só das crianças,
mas do exemplo que me foi dado pelo pessoal do projeto.
O desenho no muro é só uma marca de uma atenção muito
especial que o projeto do Sol mostrou.
Por isso aplaudo de pé todos que participaram e agradeço
pela oportunidade com saudades de lá de cima.
| depoimento | reinaldo rocha
88 89
90
DESFILE COLEÇÃO ARTE FAVELA NA ESCOLA PADRE GUILHERME PETERS
A coleção Arte Favela foi desenvolvida como projeto de Trabalho Final de
Graduação para a conclusão do curso de Design de Moda da Universidade
FUMEC. Para a coleção foram criados 15 looks inspirados no street wear com
aplicações de serigrafias a partir de estampas desenhadas pelos alunos do Projeto
ASAS que mostravam a identidade de cada participante.
Depois da coleção pronta, foi feito um desfile na Escola Padre Guilherme Peters.
Para o desfile convidamos como modelos as meninas moradoras do Aglomerado
da Serra, que ficaram super animadas com o convite.
Durante o dia da apresentação, na preparação do desfile senti que as meninas
ficaram super interessadas pelo assunto, por toda a organização de um desfile,
pois muitas delas nunca nem tinham presenciado algum. Nos ensaios tentavam
da melhor forma possível aprender a desfilar da maneira correta para que na hora
da apresentação para todos fizessem certo.
Achei muito legal o interesse que as meninas mostraram e a forma como se
comportaram. Com essa oportunidade que demos para as meninas vimos até
alguns talentos na favela, algumas meninas lindas que com a oportunidade certa
poderiam revelar um grande talento.
Agradeço muito a Juliana e Natacha pela oportunidade de mostrar meu trabalho
para todos aqueles que participaram do meu projeto e a forma como repercutiu
esse desfile em jornais de grande circulação.
Agradeço muito também pelo aprendizado maior que tive com todos do Projeto
ASAS, que com certeza vou levar sempre comigo.
Muito obrigada!
| depoimento | karina leite
91
Consta que o significado do verbo aglomerar é amontoar, acumular,
empilhar, reunir, apinhar. Acredito que esse projeto resultou num
aglomerado: muitas crianças, muitas mãozinhas inexperientes, muitas
cores e emoções variadas sobre a aventura de pintar um muro, um
muro que todos vão ver! Um muro-referência para essas mesmas
crianças, que provavelmente nunca tiveram muita experiência no que se
refere à expressão de arte. Fui levada a esse projeto, como membro do
Diretório Acadêmico dos estudantes de Design, da FUMEC, mas minha
participação não ficou restrita ao registro fotográfico ou à colaboração na
tarefa da pintura. Aprendi a apreciar os traços trêmulos, os escorridos e as
falhas como parte integrante e importante de um trabalho que se propôs
a ser coerente: foi um trabalho para as crianças e das crianças e, por isso,
ele merece ser respeitado.
| Rachel Grandinetti |
Foi um encontro gratificante, de realidades distintas.
é impressionante a alegria que uma coisa tão simples, como
a pintura de um muro, pôde proporcionar àquelas crianças.
Para nós foram algumas horas do dia; para eles uma
inspiração para uma vida melhor, mais colorida, um sopro
de confiança e esperança. Esperança real, tão tátil quanto
as mãos sujas de tinta e os pincéis que deram vida ao dito
muro, que os acompanha diariamente; esperamos, assim,
que todas as coisas boas que “colocamos” nele possam
também acompanhar as crianças no dia-a-dia.
| Ingrid Sander e Diego Silva |
| depoimentos | D.A.
92 93
Um exercício do olhar: é assim que determino essa oficina cuja função principal, além de esclarecer a
formação da imagem produzida pela condução da luz através de um pequeno orifício transformando
em imagem visível, é também exercitar o olhar. Aprender a ver o mundo por outros pontos de vista
que não sejam tão gratuitos e passivos só porque estamos de olhos bem abertos. Pela função técnica o
esclarecimento remonta a antigos meios de produção/comunicação. Só esses já dão muito que discutir em
sala de aula, mas nosso objetivo também é produzir imagens, imagens com objetos muito variados e de fácil
reconhecimento. Nesse caso escolhemos uma pequena caixa de fósforos e outra pequena embalagem: a do
próprio filme fotográfico.
Nesses dois objetos de uso cotidiano transformamos em pequenas caixas escuras com um orifício feito
por agulha e dentro desses colocamos materiais sensíveis: filmes e papel fotográfico. Com uma pequena
passagem com metodologia audiovisual os alunos podem perceber que o domínio dessa técnica é
milenar, porém o uso dos materiais sensíveis remonta de algumas décadas a partir dos meados do sec. XIX.
Concluímos então que essa experiência não é tão nova assim, mas para quase a totalidade esse exercício
aconteceu pela primeira vez e diante dos próprios olhos com a execução dessa oficina.
O que de novo então vemos nisso? Novamente me remeto ao olhar. O olhar curioso, duvidoso, fantasioso,
angustiado, satisfeito ou talvez apenas emocionado das pessoas que participam do projeto e que agregam
qualquer informação bem-vinda. É, sem dúvida, uma experiência única. Parece que é tão complicado se
produzir imagem, seja ela fotográfica, cinematográfica, videografica, analógica ou digital. As mídias podem
variar, mas a base para se fazer imagem é a mesma desde o princípio dos tempos. Basta ter as condições
ideais. São elas: ter de um lado um ambiente com pouca luminosidade, seja ele uma grande sala de aula ou
oficina pinhole
alexandre lopes | Fotógrafo, com especialização em Pesquisa e Ensino no Campo das Artes Plásticas pela Escola Guignard, professor
dos cursos de Graduação em Design de Moda e Design Gráfico e do curso de Pós-Graduação em Design de Moda da Universidade
FUMEC. Professor Colaborador do projeto ASAS-UNISOL/Banco Real.
| Outras maneiras de ver as coisas |
94
uma caixinha de fósforo e, em contrapartida, do lado
externo desses ambientes ter muita luminosidade. Com
outros pequenos detalhes conseguimos exemplificar
o ato físico da formação da imagem, gerando assim,
sem dúvida, um mínimo de sensibilidade e emoção aos
participantes.
Uma vez esclarecidos tais princípios, os alunos desejam
praticar, e dentro da proposta está a construção da
câmera, seguindo os princípios da técnica de fotografia
de Pinhole, conhecida mundialmente como uma
espécie de fotografia artesanal, rústica, que necessita
de pouquíssimos recursos para obtenção da imagem.
Nesse momento nota-se um envolvimento fantástico
por conta dos mais empolgados e daqueles que
desejam obter uma foto com tais recursos. Mesmo assim
as dúvidas não cessam por completo e a enxurrada de
perguntas é inevitável. Em meio à descontração pela
construção de tal objeto, a imaginação aflora e questões
corriqueiras se tornam grandes mistérios desvendados.
Estão todos prontos para fotografar.
Passam-se uns quinze minutos e a turma retorna à
sala de aula com as devidas embalagens de filmes,
transformadas em câmeras pinhole, fotografadas
e prontas para mais uma incursão, dessa vez no
laboratório de fotografia, onde os papéis
fotográficos que ora estavam nas pequenas
embalagens de filmes, já fotografados, estão
prontos para o processamento fotoquímico.
E é nessa hora que a mágica acontece. Tanto
para os que estão experimentando pela
primeira vez, como para quem já a conhece de
tempos esse caminho e como para as pessoas
presentes: a novidade e o reconhecimento e a
aprendizagem de um processo de construção
de imagem à moda antiga (fotoquímico).
Mais uma vez remeto ao olhar este pequeno
resumo, pois é nele que encontramos
mais uma vez a tradução da emoção pelo
reconhecimento de algo que está bem perto
de nós e que a maioria desconhece. É nesse
redescobrimento que fazemos com que outros
possam ter acesso. E é com este prazer que sigo
fotografando e agora multiplicando tais idéias e
conhecimentos. Agradeço pela oportunidade.
95
passo-a-passoconfecção de pinhole em caixa de fóforos
01 02
06 07 08
12 13 14
18 19 20
262524
96
03 04 05
111009
15
21 22 23
292827
16 17
97
A exposição Aglomeradas traz as vilas do Aglomerado da Serra como território de referências. Esse repertório
comum aparece representado por instantâneos da vida cotidiana, registrados pela técnica de pinhole
em caixas de fósforo. As imagens, para um olhar desatento, não passam de cenas fugazes da vida diária,
nada que mereça ser observado mais tempo do que pede a sua aparente banalidade. No entanto, para
um observador atento essas trivialidades compõem perfis humanos e sociais, expõem questões de ordem
individual, mas também condições coletivas. Um grupo, questões compartilhadas, processos coletivos,
são esses os grandes motivadores dessas caixinhas de luz que formam a exposição. O grupo, nesse caso,
pertence ao projeto ASAS - Artesanato Solidário no Aglomerado da Serra – que está em processo de
capacitação em design e artesanato pela parceria da Universidade FUMEC e Universidade Solidária (UNISOL),
com patrocínio do Banco Real.
Ao trabalhar com projetos sociais utilizando o design e o artesanato, percebo cada vez mais o quanto
essas duas áreas podem percorrer caminhos muito próximos. Estou me referindo agora não só ao artesão
despreendendo–se das suas regras e de modelos para explorar mais a inventividade e a autonomia criativa.
A minha reflexão se volta também para o aprendiz do design, que ainda não está totalmente contaminado
pelas crenças tradicionais da área profissional, mantendo-se livre e aberto para as diversas formas em que
o pensamento do design pode se manifestar. Aqui se encontra o verdadeiro entendimento da palavra
design: intenção, projeto e desenho. Em outras palvras, fazer design envolve o entendimento a priori do
que se pretende; a antecipação da ação e a execução técnica. Atender a essa lógica aparentemente simples
singnifica produzir design, mesmo que essa definição a princípio pareça muito ampla.
| Imagens fotográficas em objetos de luz |aglomeradas
juliana pontes | Autora do artigo abaixo publicado no “Letras”, informativo do Café com Letras
98
Em relação à intenção, a exposição Aglomeradas foi
pensada com um propósito muito claro: revelar às
próprias artesãs, autoras das imagens, como o seu
universo particular pode se tornar uma experiência
estética compartilhada de forma coletiva. Quando
se trabalha a formação de um grupo lida-se com
conhecimento, mas também com subjetividades,
com a dimensão humana latente. Não se pode
multiplicar o conhecimento sem tocar a experiência.
A experiência nos diz algo da natureza sensível do
aprendiz, inclui o ato de incorporar pensamentos
na ação. Por outro lado, toda ação traz uma carga
afetiva ligada à intenção. Nesse emaranhado
surgem, de forma inesperada, imagens fantásticas
da serra, descobertas justamente pela intenção do
olhar, ou melhor, pela invenção do olhar.
A antecipação do processo criativo e produtivo,
característica específica da atividade de projetação
do design, surgiu nesse projeto pelo envolvimento
dos estudantes de design da Universidade
FUMEC, bolsistas do ASAS, com um ‘fazer à mão’.
A descoberta do produto de design ‘artesanal’
despertou esses alunos para a possibilidade
do exclusivo. Eles apostaram no diferencial das
luzes aplicadas uma a uma, de acordo com o
que a interação com a imagem proporcionava;
nos tamanhos variáveis; no exercício dos
acabamentos perfeitos, mesmo feitos por
mãos humanas; e na pesquisa como chave
para soluções inventivas. Aqui o processo
de capacitação em design e artesanato nos
apresentou o seu caminho inverso: a observação
do artesanato reaproximou o design da
experência única de se produzir fora do padrão.
Padrão nesse caso se refere a linguagem e
fomas, mas também à repetição produtiva.
A intervenção do designer no ato produtivo,
nesse caso, foi determinante para o diferencial
estético e funcional dos produtos, assim
como foi fundamental para elevar o seu valor
simbólico. Uma carga de significados foi gerada
pela condição de objeto único, que carrega
uma imagem criada através de um processo
99
101
extremamente particular e funciona como uma
luminária, ou melhor, como um objeto de luz. O
utilitário carrega vestígios, signos e se veste de
interpretações, modificando diretamente a relação
entre usuário e objeto.
Quanto à execução técnica, as imagens iluminadas
a que me refiro são fotografias realizadas com
a técnica pinhole. Em outros termos, são fotos
feitas em caixinhas de fósforo perfuradas e com
um negativo no seu interior. Cada ‘aglomerada’
montou sua caixinha e apontou para a sua
própria realidade. A precariedade da tecnologia
atende à necessidade de despojamento do olhar
e à condição de aprendiz. Os resultados são
gaiolas que surgem como cenários, gatos que
são personagens, vultos como paisagem, flores,
telhados, cores, manchas, pedaços de ruas, céu,
chão, fragmentos de casas, sombras. Cada parte
isolada é ao mesmo tempo pessoal e universal.
Os temas se aglomeram não por sentido ou
continuidade, mas por uma mesma origem, o
território em comum. Metáfora do morro, surgem
misturas de pessoas amontoadas, seus objetos,
suas marcas, seus barracos empilhados. A surpresa
do resultado inspirou a beleza da montagem: caixas
pretas, simulacros do mecanismo fotográfico, onde
uma superfície se torna sensível pela luz. Pontos de
luz remodelando a imagem da realidade. Leds, fios,
transparências, formas iluminadas e somente uma
luz azul. Um ponto único de luz azul, como um jogo,
mas do acaso. Essas preciosidades nos convidam
à reflexão, provocada também pela disposição
desses objetos de luz em meio ao burburinho do
Café, saltando na penumbra da cada ambiente,
redesenhando a noite no morro, a noite na cidade.
100
102 103
“Vim pelo caminho difícil,
a linha que nunca termina
a linha bate na pedra,
a palavra quebra uma esquina,
mínima linha vazia,
a linha, uma vida inteira,
palavra, palavra minha”. (Paulo Leminski)
A idéia de cotidiano foi central em todas as etapas do
processo criativo desenvolvido no projeto ASAS UNISOL.
Por isso, as artesãs envolvidas, todas elas moradoras de
favelas, organizaram suas criações a partir de situações,
imagens e memórias situadas nas especificidades desses
espaços.
Nesse sentido, trata-se de um projeto que propõe
um olhar para a favela no que ela tem de singular,
indicando, assim, uma abordagem que se opõe à idéia
de pensá-la em suas ausências. No entanto, explorar
as idiossincrasias desses territórios não implica pensar
na lógica equivocada e ingênua do modelo de “cidade
partida”. Sabemos que a cidade é uma tessitura, uma
malha urbana. A favela é “o avesso do cartão-postal” e
oficina de texto | Palavras do Cotidiano |
revela a dinâmica própria do nosso modo de
produção, ou seja, a desigualdade social inerente
ao capitalismo.
Do ponto de vista artístico, a favela sempre
inspirou produções nas mais diferentes
linguagens expressivas e foi representada de
maneira diferente ao longo de sua história:
nostálgica como nos versos de Noel Rosa,
cheia de dignidade como no Favelário Nacional
de Drummond e violenta como na prosa de
Paulo Lins. A favela é multifacetada, por isso o
importante é pensá-la para além dos clichês das
páginas policiais. Nada mais oportuno, então, do
que representações produzidas por gente que
vive seu cotidiano entre becos e tetos de zinco.
Nessa lógica, as artesãs participantes do
UNISOL tiveram a oportunidade de traduzir, de
modo criativo, cenas da favela. Nos produtos,
destacaram-se, muitas vezes, a dimensão poética
e o potencial inventivo.
tailze melo | Mestre em Literaturas de Língua Portuguesa pela PUC Minas. Coordenadora, em parceria com Renata Alencar, do curso
de pós-graduação lato sensu “Processos Criativos em Palavra e Imagem” no instituto de Educação Continuada da PUC Minas. Professora
da Faculdade Estácio de Sá de Belo Horizonte.
104
Na oficina Costuras do cotidiano: palavra é vida, buscamos refletir a palavra em todo o seu potencial semântico
e estético. Na primeira etapa da oficina, sem utilizar uma terminologia lingüística/semiótica, conversamos com
as artesãs sobre a noção de signo verbal, metáforas, polissemias e redes semânticas. Utilizamos exemplos do
cotidiano e ficou evidente a importância da palavra no mundo simbólico que tangencia a nossa existência. Na
segunda etapa da oficina, propusemos uma atividade orientada cujo objetivo foi organizar uma rede semântica
com palavras relacionadas aos conceitos de cada produto criativo. A intenção foi apontar possibilidades
criativas com palavras e identificar em quais projetos era coerente se valer dessa matéria expressiva. No último
momento do encontro, fizemos uma roda para a apresentação dos textos confeccionados durante a oficina.
Foram apresentadas diferentes construções textuais: “palavras biográficas” que revelaram um léxico próprio,
o olhar único de cada artesã para sua história. Cartografias subjetivas, mas todas elas costuradas pelo mesmo
signo: favela.
105
106 107
registro das criações04
109
ELZY
111110
Sou a 8ª filha de 14 filhos. Morei na roça
até os 13 anos de idade. Fiz da 1ª à 4ª
série do primário, trabalhei com meus
pais, ajudando a plantar feijão, milho,
arroz, quiabo e jiló, adorava nadar e
brincar no rio, era uma criança muito
espoleta. Aos 23 anos me aventurei com
um rapaz e tive uma gravidez inesperada,
mas depois de nove meses nasceu uma
linda menina, Daniela, que cuidei com
muito amor e carinho. Hoje ela tem 27
anos e me presenteou com dois lindos
netos, um de 12 e outro de cinco anos.
Sou uma pessoa que não espera para
as coisas acontecerem. Gosto de ajudar
sem medir esforços e tenho disposição
para fazer qualquer coisa. Sou honesta e
decidida. Sou cuidadora de idosos, faço
faxinas e estou muito feliz com meus
produtos desenvolvidos no ASAS.
Durante esse curso eu fiquei muito feliz de participar
do curso de serigrafia, não tinha noção de como
era. Foi importante para mim participar. Aprendi a
conviver com outras pessoas. O mais interessante
foi saber que o nosso produto iria para uma feira na
França. E falamos do local onde moramos, que é o
Aglomerado da Serra. Momento triste foi quando
houve uma votação para escolher um representante
para ir a São Paulo. Fui a escolhida, mas quando
chegou perto da viagem as professoras mudaram
de idéia. Tem componente que quando está na
FUMEC é uma pessoa, e fora é outra. Agradeço por
ter participado do curso. Foi muito gratificante para
mim.
ETELVINA XAVIER DE ALMEIDA
SOBRE O PROJETO
112 113
Sou Gabriela Estefane e tenho 16 anos.
Já fiz artesanato, moro no Bairro Serra,
na Primeira Água. Eu estudo, estou na
8ª série e sou vereadora mirim da Escola
Municipal Padre Guilherme Peters. Já
fiz vários cursos. Agora que eu entrei
no curso da FUMEC eu já sei fazer
várias coisas, já sei pintar, desenhar, e
fazer várias coisas, coisas que antes eu
não sabia fazer. Já fiz dois cursos de
artesanato, um junto com a Schirley, de
biscuit, e com a Suzaninha, de bijuteria.
Estou me empenhando muito para
acabar essa reta do curso para sair daqui
sabendo todas as informações. Agora
estou aprendendo a fazer lenços. Lenços
de cabeça, de braço etc.
Esse projeto foi ótimo na minha vida,
igual eu já falei, esse curso me ensinou
várias coisas, eu nunca imaginei que eu
ia ter uma oportunidade dessas, mas
agora eu sei como é bom esse curso. Nós
já fizemos várias coisas, fizemos bolsas,
fronhas e agora estamos fazendo uma
coleção, não é ótimo? Esse curso caiu
do céu. O nosso projeto tem um nome:
ASAS. Nós do projeto, conversamos,
fazemos reuniões, tentamos nos
entender. Quando o curso acabar vamos
abrir oficinas na escola, vamos ensinar
aos alunos tudo que nós aprendemos. Eu
não aprendi muita coisa, mas vou fazer
o possível para passar pra eles o que
aprendi.
GABRIELA ESTEFANE
SOBRE O PROJETO
114 115
Meu nome é Joana Rodrigues Sousa,
tenho 51 anos, duas filhas e uma neta.
Moro no Bairro Mantiqueira em Venda
Nova. Adoro ensinar. Gosto de dar
cursos de pintura, bordado, tricô, crochê
e vagonite. Trabalho com costura em
geral e adoro o que faço. Queria ter a
oportunidade de ter um emprego com
carteira assinada e ensinar a pessoas o
que sei.
O curso para mim foi tudo de bom que
eu pude encontrar na minha vida. Graças
ao meu bom Deus, quando pensei que
estava só no mundo encontrei uma
família que me acolheu com bastante
amor e paciência. Agora não me sinto
mais sozinha. Vou ser grata o resto da
minha vida de ter encontrado alguém
que pudesse me ajudar tanto assim. Vou
guardar tudo que aprendi no fundo do
meu coração. Nunca vou esquecer cada
desenho rabiscado que eu aprendi a fazer
durante o curso, principalmente aqueles
que eu achava feios e as professoras
falavam que estava bonito, isso só ia me
incentivando cada vez mais a fazer mais
desenhos. Para sempre obrigada, com
muito amor de verdade.
JOANA RODRIGUES SOUZA
SOBRE O PROJETO
116 117
Eu sou Maria do Carmo, 58 anos, casada
e mãe de dois filhos e avó de dois
netos. Sou artesã, dou aulas de pintura
em tecido e tapete de retalhos, faço
enfeites para pet shop: gravatas, lacinhos
e laçarotes para cachorros. Bordo, faço
crochê, gosto muito de desenhar. Já fui
oficineira da Escola Aberta na Escola
Municipal Maria das Neves e também na
obra social do Bairro São Lucas.
Durante o curso tive momentos felizes e
tristes. O triste foi a perda do meu tapete,
mas fiquei feliz com o reconhecimento
das professoras e estou muito satisfeita
com a máquina de costura, e fui
recompensada também com a notícia do
Cássio de que ia levar nossos produtos
para a França junto com os seus. O que
mais me marcou foram as caixinhas
pinhole com a exposição. No começo
achei que não ia dar em nada, por ser
simples a caixinha de fósforos. Ao revelar
as fotos saíram aquelas imagens borradas
e que no final deu um resultado de um
tamanho que todos ficamos surpresos.
Mas, se não fosse o esforço e ajuda do
Bruno, com certeza tudo isso não teria
acontecido. Estou muito feliz porque
aborrecimento foi um, felicidades foram
novecentas e noventa e nove.
MARIA DO CARMO ROCHA
SOBRE O PROJETO
118 119
Sou Schirley Maria Araújo, tenho 41
anos, solteira, natural de Aimorés/MG,
atualmente moradora do Aglomerado da
Serra. Sou artesã, artista plástica e atuo no
Projeto Escola Aberta como educadora
fazendo trabalhos artesanais como
biscuit, decoupage e reaproveitamento de
materiais. Sou umas das coordenadoras
do Coletivo Criarte, na área de produção
e cenário. Faço parte do Projeto
[RedeMuim] de Arte e cultura, 3ª edição
com apoio da lei de incentivo à cultura,
como auxiliar de produção e cenografia;
voluntária no Projeto Voe, (educação
Oral). Participo do Projeto Arena da
Cultura na iniciação de artes plásticas.
Projetos em andamento: voluntária
no centro de Saúde Nossa Senhora da
Conceição com atividades de tapeçaria
para terceira idade e a comunidade;
projeto na Igreja Nossa Senhora da
Conceição com artesanato.
O curso me trouxe um novo olhar dentro da perspectiva do design artesanal, ou seja, o artesanato que faço hoje tem outro conceito. Tornei-me uma pessoa mais ponderada e confiante. O mais interessante foi mesclar minhas atividades do Coletivo Criarte com o ASAS. Assim meus trabalhos foram tendo uma forma mais prática e objetiva. As diversidades da FUMEC e da Favela ajudaram muito no relacionamento do projeto ASAS. Quebrou um pouco essa questão de sanguessugas. Eles também perceberam que temos coragem e opinião, que poucos sabem o que querem e como querem. Esses desafios me fizeram perder o medo de mostrar quem sou eu. E surgiu a vontade de voltar a estudar. A moda é aprender trocar experiências, formar e fortalecer redes. Tenho muito que aprender, o que aprendi vou multiplicar com muito zelo. Somos um jogo de panelas: panela de pressão que fica cozinhando a ponto de explodir, frigideira que só fica fritando as informações, caçarolas que fazem cada revirado, caldeirão que fica fervendo caldos. Temos até uma chaleira, na sua calmaria, fervendo seu chá. Bom, sei que temos que ser o mais natural possível, assim seremos originais.
SCHIRLEY MARIA ARAÚJO
SOBRE O PROJETO
121
Eu, Suzana, saí da minha casa com 14 anos
de idade em busca de uma vida melhor,
passei muitas dificuldades e barreiras,
mas graças a Deus hoje eu olho para
trás e vejo que meus obstáculos, lutas e
dificuldades todas ficaram para trás. Mas
hoje estou no ponto certo e agradeço
a Deus por ter conseguido os meus
objetivos. Sou formada em magistério,
manicure e também sei um pouco de
artesanato, bijuteria e costura. Gosto de
trabalhar no meu serviço porque estou
fazendo o que sonhei fazer um dia, de
ser uma professora. E fico na sala de
mimeografia onde passo o dia. Mais uma
vez agradeço a Deus por me dar essa
oportunidade de estar participando deste
curso porque aprendi novas idéias e tive
grande experiência porque Deus está no
controle e me dá força para ir até o fim.
No decorrer do curso posso dizer que
aprendi muitas coisas, como relacionar
com outras pessoas que possuem outras
visões de mundo. Quando comecei a
desenvolver muita criatividade, como foi
gostoso eu entender que de um simples
risco sairia muitas coisas bonitas, mas
foram com as várias pesquisas que eu
cheguei nesse objetivo.
SUZANA MARÍLIA DOS ANJOS OLIVEIRA
SOBRE O PROJETO
120
122 123
124 125
portfolio asas05
Todos os lugares precisam de luz e essa pode vir
de um imenso céu durante o dia ou até da mais
simples luminária durante a noite. Este produto
representa a importância da luz na vida de cada um.
No Aglomerado quem não possui luz faz o possível
e o impossível para consegui-la. Muitas vezes não
sabemos ao certo de onde vem a energia da nossa
luz, só sabemos que precisamos dela, mais do que
qualquer outra coisa.
autora | elzy nunes de oliveira lima
produto: lumináriamaterial: tricolinetécnicas: costura e serigrafia
. gatos de luz .
126 127
A temática explorada para meu produto foi o ganso
no asfalto, procurei trabalhar com algo que não tinha
no mercado. Onde moro encontro gansos que ficam
na rua, o que me chama a atenção é o fato de esses
animais viverem em um lugar onde não tem água
para nadar. Em minhas pesquisas descobri que na
Roma Antiga um exército foi salvo graças ao grasnar
de dezenas dessas aves, revelando-os como verda-
deiros seguranças.
autora | etelvina xavier
produtos: jogo americano e porta-coposmateriais: brimtécnicas: costura e serigrafia
. ganso no asfalto .
128 129
O título do meu trabalho foi o coco babão, que é um
coco comestível. A fruta amadurece quando o coco
está seco. A castanha é mais gostosa do que o caldo
do coco maduro. Escolhi falar sobre o coco babão,
pois é uma fruta pouco conhecida e muito presente
no Aglomerado. Outro motivo é o modo com que
as pessoas o retiram do pé, é interessante perceber
quando todo mundo se reúne com um pedaço
grande de madeira e começa a cutucar os coquinhos
no pé, todos unidos pelo mesmo objetivo.
autora | joana rodrigues de souza
produtos: avental, luvas e pegadormaterial: brimtécnicas: costura e serigrafia
. coco babão .
130 131
Este produto representa os lares de quem vive,
mora e sobrevive na favela. As casas se misturam às
árvores, as árvores se misturam às janelas e essas por
sua vez se misturam às folhas. A realidade é que no
morro tudo se mistura e se transforma em Aglo-
merado.
autora | maria do carmo da rocha
produtos: almofadasmateriais: brimtécnicas: costura e serigrafia
. natureza na favela .
132 133
Este produto representa o dia-a-dia dos becos e
vielas do Aglomerado da Serra e a convivência do
beco onde moro. Através da toy-art, representei a
realidade e a fragilidade de cada personalidade. As
letras surgiram da pesquisa feita no livro “Tipografia
e elemento do Cotidiano da Favela”. Nessa procura
encontrei conceitos como: casas, escadas, gatos de
luz, praças, espaços abertos e ruas de terra e asfalto.
Toy-art é uma forma de representar os tipos de
violência entre os becos e as vielas do Aglomerado
da Serra. Não há necessidade de expressar com
palavras, basta observar o toy com a mesma sutileza
de sua criação.
autora | suzana marília dos anjos oliveira
produtos: almofadasmateriais: feltrotécnicas: costura e serigrafia
. toy-beco .
134 135
136
Este tema representa um pouco da minha vida.
Fui cercada de muito zelo pelos meus pais. Por ter
uma aparência frágil, mantive esses muros e cercas
em minha vida durante muito tempo. Hoje em um
mundo diferente, misto e rico de diversidade, uso
esses muros e cercas para expressar a minha arte.
Muros e cercas são mantidos para organizar uma
sociedade, mas muitas vezes parecem desorga-
nizar o espaço público. Um aglomerado de lixo se
transforma em cerca e muros, expressão artística que
quebra todas as fronteiras e diz para o mundo: “Vista
sua alma todos os dias”.
autora | shirley maria araújo
produto: cadernos, bloquinhos, envelopesmaterial: papel calandrado, artesanal e reci-clato, fio enceradotécnicas: encadernação e serigrafia
. muros e cercas .
137
138 139
Este catálogo foi composto em Myriad Pro.O miolo é impresso em Reciclato 90g.
A capa em papel kraft 300g com aplicação
de relevo seco. Impressão e acabamento
por Artes Gráficas Formato. Belo Horizonte,
Minas Gerais, em junho de 2009
top related