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XVIII PRÊMIO TESOURO NACIONAL– 2013 Tema 1- Política Fiscal e Dívida Pública
Inscrição: 67
CLASSIFICAÇÃO: MENÇÃO HONROSA Título da Monografia:
eversão Cíclica da Política Fiscal Brasileira e a Lei de Responsabilidade Fiscal. R
Fernand rreia (representante) o Motta Co(36 anos)
Curitiba - PR
Doutor em Desenvolvimento Econômico – UFPR.
Professor Adjunto - Universidade Federal do Paraná.
Coautor: Victor Rodrigues de Oliveira - Mestrando em Desenvolvimento
Econômico - UFPR
1
Reversão Ciclica da Política Fiscal Brasileira e a Lei de Responsabilidade Fiscal
TEMA I POLÍTICA FISCAL E DÍVIDA PÚBLICA
2
RESUMO: O objetivo do trabalho é apresentar evidências empíricas sobre os efeitos da
política fiscal no Brasil a partir do uso de Vetores Auto regressivos Estruturais (SVAR),
incorporando as regras fiscal e monetária que caracterizaram a política econômica
brasileira no início dos anos 2000. Com base no uso de Vetores Auto Regressivos
Estruturais, os resultados empíricos mostraram que a influência da Lei de
Responsabilidade Fiscal realmente aponta para uma reversão do caráter cíclico da
política fiscal brasileira.
Palavras-chave: Política Fiscal; LRF; Brasil.
3
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO........................................................................................................ 4
2 POLÍTICA FISCAL: O DEBATE RECENTE E AS LIMITAÇÕES EMPÍRICAS....... 6
3 METODOLOGIA E DADOS.................................................................................... 10
3.1 Vetor Auto regressivo Estrutural............................................................................. 10
3.2 Dados...................................................................................................................... 13
4 RESULTADOS........................................................................................................ 19
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................... 25
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 27
4
1 INTRODUÇÃO
O debate recente em torno do uso de instrumentos fiscais estão sempre sendo
questionados na literatura, haja vista as ações discricionárias e os chamados
estabilizadores automáticos sob a perspectiva da estabilização econômica. Uma vez que
os estabilizadores automáticos não compensam integralmente os choques
macroeconômicos, medidas discricionárias podem auxiliar a potencializar o efeito
estabilizador. No entanto, as ações de estabilização discricionárias podem sofrer
defasagens, de modo a parecerem inoportunas e pró-cíclicas.
Cabe destacar que quanto maior a ausência de regras fiscais, maior a ambiguidade
dos resultados tendo em vista o teor discricionário da política fiscal associado aos efeitos
dos estabilizadores automáticos.
Os estudos que buscam entender os mecanismos de transmissão fiscal, muitas
vezes não incorporam em suas análises aspectos institucionais que auxiliam no
aprimoramento da política fiscal quando da observação dos seus efeitos convencionais e
não convencionais.
É importante destacar que os efeitos fiscais resultam a partir da defasagem entre a
efetiva percepção da crise por parte das autoridades e a implementação da medida fiscal,
que depende essencialmente do processo de decisão política. O governo tem de elaborar
um projeto de lei orçamentária que por sua vez tem de ser apresentada ao parlamento
que aprova, modifica ou rejeita o projeto de lei. Quando finalmente for votada, a medida
poderá atingir a atividade econômica somente após a recuperação da mesma, não
apresentando o efeito esperado. Assim, um ajuste ex ante visando uma política
discricionária anti-cíclica poderia se tornar pró-cíclica ex post.
Em função do caráter discricionário que caracteriza a política fiscal, a importância
de se estabelecer uma regra (ou várias) é buscar vincular ao governo um comportamento
responsável e um nível de comprometimento que nem sempre podem ser de seu
interesse em curto prazo. As regras têm como propósito resolver o problema da
"inconsistência temporal" e suavizar o teor discricionário envolvido no gerenciamento da
política fiscal, sobretudo no lado dos gastos públicos, de maneira que as escolhas
preferidas de ação por parte de um governo estejam voltadas para o longo prazo. Dito de
outra maneira, as regras fiscais devem incentivar os governos a se aterem aos seus
planos originais de tributação e de gastos, elevando o custo político com que arcarão
5
caso quebrem os compromissos estabelecidos, ou até mesmo tornando-se uma exigência
legal com a aplicação de sanções devido ao seu não cumprimento.
Há muitos exemplos de regras fiscais em operação no mundo, aplicadas em todos
os níveis de governo a partir das autoridades locais até aos estados nacionais. Tais
regras procuram, comumente, controlar o nível anual ou corrigido das variações cíclicas
dos empréstimos do governo, ou seja, o montante total da dívida ou o saldo das
despesas. O método de execução também varia bastante, desde uma restrição ao
empréstimo por parte de conselhos locais até uma exigência legal para se trazer os níveis
globais da dívida para baixo sobre um extenso período de tempo, como é o caso da Lei
de Responsabilidade Fiscal (LRF) implantada no Brasil desde 2000 (LC n. 101, de
4/5/2000).
A literatura empírica busca dividir os efeitos cíclicos da política fiscal em dois
grupos de países: desenvolvidos e em desenvolvimento. No caso dos primeiros a política
fiscal teria efeitos anticíclicos e no caso dos países em desenvolvimento efeitos pró-
cíclicos. Os estudos para o Brasil são escassos e seus resultados ambíguos e não
incorporam os avanços institucionais da política fiscal, como a criação da LRF.
O objetivo deste estudo é apresentar evidências empíricas sobre os efeitos da
política fiscal no Brasil a partir do uso de Vetores Auto regressivos Estruturais,
incorporando as regras fiscais e monetárias que caracterizaram a política econômica
brasileira no início dos anos 2000.
Para alcançar o objetivo proposto, o trabalho encontra-se dividido em quatro
capítulos, além desta introdução. O capítulo seguinte apresenta o estado da arte no
debate empírico acerca da política fiscal bem como a escassez de trabalhos para o caso
brasileiro e suas limitações quanto à incorporação da LRF nas análises empíricas. No
capítulo três é apresentado à metodologia e os dados da pesquisa, de maneira a expor
como foi utilizada a metodologia dos Vetores Auto regressivos Estruturais, bem como as
séries temporais e suas fontes. Na sequencia, o capítulo quatro traz os resultados
empíricos e por fim, o capítulo cinco as considerações finais.
6
2 POLÍTICA FISCAL: O DEBATE RECENTE E AS LIMITAÇÕES EMPÍRICAS
O interesse em encontrar estímulos fiscais mais eficientes na recuperação de
economias que enfrentam períodos de crise tem aumentado à medida que a política
monetária expansionista, promovida pela maioria dos Bancos Centrais, não tem gerado o
aumento esperado do consumo e dos investimentos privados. Mesmo representando a
solução keynesiana para a recuperação de economias afetadas por crises, a expansão
fiscal promovida durante períodos de recessão não tem gerado, necessariamente em
algumas economias os efeitos esperados (elevação do consumo, diminuição do
desemprego, aumento dos rendimentos na economia), uma vez que estes estão
condicionados à reação dos agentes econômicos privados.
A política fiscal discricionária empreendida pelo governo dos EUA, como o
American Recovery and Reinvestment Act of 2009, reacendeu o debate sobre os efeitos
macroeconômicos da política fiscal. Durante uma recessão, a magnitude da resposta do
produto às despesas públicas e aos choques fiscais diretos têm implicações políticas
(SWISHER, 2010). Nas últimas décadas, a literatura macroeconômica tem questionado a
diferença na condução da política fiscal entre os países desenvolvidos e os em
desenvolvimento. De forma geral, essa apresenta um caráter contra cíclico nos primeiros,
enquanto é pró-cíclica nos outros (Gavin & Perotti (1997), Talvi & Végh (2005)) 1.
Contemporaneamente, há duas interpretações sobre os efeitos de uma política
fiscal expansionista sobre a economia: i) a visão Novo-Keynesiana (NK) e ii) Real
Business Cycle (RBC). O primeiro modelo considera a rigidez de preços, onde os
choques dos gastos do governo aumentam a demanda de trabalho, os salários reais, o
consumo privado e o PIB. Devereux et al (1996) introduziu modelos com retornos
crescentes de escala e concorrência imperfeita para mostrar que choques positivos
advindos do gasto governamental aumentam o salário real. Ravn et al (2006), por sua
vez, considera a persistência dos hábitos dos indivíduos na função utilidade. Nesta linha,
Galí et al (2007) introduziu consumidores não-ricardianos e mostrou que o aumento dos
salários reais é devido às políticas anticíclicas.
1 Outras referências incluem Mailhos e Sosa (2000), Braun (2001), Sanchez de Cima (2003), Lane (2003), Kaminsky, Reinhart e Végh (2004), Alesina e Tabellini (2005), Manasse (2006), Sturzenegger e Wernek (2006), Ilzetzki (2007), Strawczynski e Zeira (2007).
7
Por outro lado, no modelo neoclássico tal como o RBC com retornos constantes
de escala, preferências padrão e mercados competitivos, um aumento não esperado do
gasto do governo tem um impacto positivo sobre o PIB e negativo sobre o consumo
privado em razão do efeito renda negativo, devido à expectativa das famílias de impostos
mais altos no futuro ou por causa de efeitos de substituição intertemporal, devido à taxa
de juros alta temporariamente.
Blanchard e Perotti (2002) foram os primeiros a utilizar a metodologia SVAR para
estudar os efeitos de choques fiscais. Os autores consideram que os choques fiscais são
identificados por meio de decisões defasadas no ano de formulação das políticas fiscais.
Formulando um modelo SVAR com três variáveis, que inclui o PIB, os gastos do governo
e os impostos líquidos, os resultados para os EUA sugerem que os choques positivos de
gastos do governo têm um efeito positivo sobre PIB e choques tributários positivos têm
um efeito negativo sobre o PIB.
A modelagem SVAR pode identificar as relações contemporâneas entre as
variáveis a partir de informações a priori oriundas da teoria econômica ou de informações
narrativas – início de uma guerra, mudanças no sistema tributário, decisões políticas ou
eleições, entre outros. Este estudo adotará a primeira técnica de identificação. Cabe
ressaltar que a metodologia SVAR é mais adequada para estudar a política fiscal do que
a política monetária, porque há choques fiscais exógenos e atrasos de implementação
que implicam em poucas respostas discricionárias de política fiscal para mudanças
contemporâneas inesperadas em outras variáveis (BLANCHARD & PEROTTI, 2002).
O estudo de Gavin e Perotti (1997) foi o primeiro a discutir a possibilidade da
política fiscal na América Latina ser pró-cíclica. Os resultados indicaram que enquanto a
política fiscal é contra cíclica nos países desenvolvidos, em períodos de baixo
crescimento econômico ela é pró-cíclica na América Latina. Talvi e Végh (2005), por sua
vez, demonstram que o fenômeno observado nos países latino-americanos constitui a
regra que guia a política fiscal nos países em desenvolvimento. A partir de um modelo de
política fiscal ótima e um painel de 56 países, os autores demonstraram que a política
fiscal nos países do G7 parece ser acíclica (a correlação entre o gasto do governo e o PIB
é zero) enquanto nos países em desenvolvimento é pró-cíclica.
A partir disto, muitas evidências apontam na direção destes resultados, de tal
forma, que este comportamento tem se tornado parte da visão convencional. Ilzetzki e
Végh (2008) mostram que a evidência mais convincente de que essa ideia realmente se
tornou parte desta visão é o número crescente de modelos teóricos que tentam explicar
esse puzzle. Conforme os autores, dois motivos explicam porque os países em
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desenvolvimento adotam uma política fiscal pró-cíclica que poderia intensificar a
volatilidade do ciclo de negócios: i) as imperfeições no mercado de crédito internacional
que impedem os países em desenvolvimento de contrair empréstimos em tempos ruins; e
ii) as explicações de economia política baseadas na idéia de que bons tempos incentivam
prodigalidade fiscal e/ou atividades de rent-seeking.
Apesar de a literatura assumir, implicitamente, que a causalidade vai do ciclo de
negócios para a política fiscal, uma correlação positiva entre o consumo do governo e o
PIB certamente não dá nenhuma indicação de causalidade. De acordo com Ilzetzki e
Végh (2008), a estrutura de choques nos países em desenvolvimento e desenvolvidos
apresenta uma configuração que é mais provável que a causalidade reversa explique os
padrões observados nos dados (ou seja, a política fiscal “guia” o produto). A partir de
dados trimestrais para 49 países, no período de 1960 a 2006, e considerando um
conjunto de estimações econométricas – variáveis instrumentais, equações simultâneas,
método dos momentos generalizados e VAR – os resultados indicaram que (i) a política
fiscal é pró-cíclica em países em desenvolvimento e (ii) também é expansionista, dando
suporte empírico para o chamado efeito “it rains, it pours”.
Arellano (2006) e Strawczynski e Zeira (2007) destacam a relevância da
condução da política fiscal para a política econômica. Segundo os autores, a capacidade
de transição de uma política fiscal pró-cíclica para uma acíclica ou uma contra cíclica
representa um sinal de credibilidade macroeconômica dos países emergentes. Conforme
Kaminsky, Reinhart e Végh (2004), a política fiscal pró-cíclica representaria uma situação
sub-ótima porque agravaria o ciclo de negócios. Observe que este argumento só é válido
quando não se trata de causalidade reversa. Neste caso, claramente esta maneira de
pensar seria completamente infundada.
Os estudos para o Brasil são escassos e seus resultados ambíguos. Mendonça,
Medrano e Sachsida (2009) investigam os efeitos do impacto de choques no consumo
corrente do governo e da receita pública líquida sobre o PIB e a taxa de inflação no
período de 1995 a 2007. Os resultados sugerem que em resposta a um aumento
inesperado do gasto do governo: i) o consumo privado aumenta; ii) com uma
probabilidade de 77,1%, o PIB se reduz; e iii) a taxa de juros aumenta. Isso pode indicar a
ocorrência de efeito crowding out entre investimento público e privado. Por fim,
considerando o efeito de um choque de ciclo de negócio, observa-se que o efeito sobre o
gasto público é positivo, o que pode indicar uma política fiscal pró-cíclica.
Peres (2009), por sua vez, baseado em Blanchard e Perrotti (2002), encontra
efeitos keynesianos, isto é, elevações inesperadas nos gastos públicos estão
9
positivamente relacionadas com o produto e elevações na carga tributária líquida estão
negativamente relacionadas com o produto. Entretanto, estes estudos não consideram o
papel da dívida pública na determinação da política fiscal, de tal forma que as estimativas
dos impactos de choques fiscais são viesadas (FAVERO & GIAVAZZI, 2007).
Cavalcanti e Silva (2010) consideram explicitamente o papel da dívida pública na
evolução da política fiscal brasileira. A partir de uma análise VAR para o período de 1995
a 2008, os resultados indicaram que faz diferença na estimação dos efeitos dinâmicos a
inclusão da dívida pública: i) o efeito do choque de gasto sobre o PIB é significativamente
negativo (a 10%) a partir do 7º ou 8º período após o choque; e ii) o efeito do choque de
receita tributária sobre o PIB é positivo. Entretanto, os autores destacam três limitações
do estudo, entre as quais, o reduzido tamanho da amostra que pode fragilizar os
resultados obtidos.
A despeito disto, os estudos para o caso brasileiro não consideram as reformas
ocorridas no Estado que afetam a condução da política fiscal. Entendendo-se por
reformas as mudanças na economia brasileira, em um contexto de crise do Estado, e sua
incapacidade de continuar exercendo o papel desempenhado até então de indutor do
crescimento econômico, estas estariam em curso desde o final dos anos 19802. Desta
forma, em 2000 foi promulgada a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF)3 com o objetivo
de definir princípios norteadores de gestão fiscal, estabelecendo limites para o
endividamento público e para a despesa de caráter continuado, e apresenta mecanismos
prévios para assegurar o cumprimento de metas fiscais, com o objetivo de alcançar o
equilíbrio orçamentário entre receita e despesa. Ao fixar conceitos básicos, estabelecer
limites para endividamento e operações de crédito, a LRF criou regras para a recondução
da dívida aos limites de endividamento que afetam direta ou indiretamente a gestão da
dívida pública.
2 Exemplos deste processo incluem o Programa Nacional de Desburocratização adotado em 1979, o Programa de Desestatização a partir de 1981, o Programa de Privatizações iniciado no governo Sarney, a descentralização fiscal e o redesenho do papel dos municípios ocorridos a partir da Constituição Federal de 1988, a criação da Advocacia Geral da União e do Conselho Administrativo de Defesa Econômica ambos no governo Itamar Franco, as reformas da ordem econômica, previdenciária e da administração pública no governo FHC, entre outras. 3 A LRF sofreu influência do Código de Boas Práticas para a Transparência Fiscal do FMI. Especificamente, herdou as regras de rigidez fiscal dos Estados Unidos, a possibilidade de abranger todos os entes da Federação a exemplo da Comunidade Econômica Europeia e as regras de transparência da Nova Zelândia.
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3 METODOLOGIA E DADOS
3.1 Vetor Auto regressivo Estrutural
Os modelos econômicos são expressos em geral por meio de diversas variáveis
e, portanto, a utilização de modelos univariados é limitada. O vetor auto regressivo
permite que se expressem modelos econômicos completos e que se estimem seus
parâmetros. O estudo das restrições e seu uso para identificar os parâmetros estruturais
do VAR constitui um dos principais objetivos da metodologia.
Um modelo auto regressivo de ordem com variáveis endógenas, , que
estão conectadas entre si por meio de uma matriz , pode ser expresso por:
onde é uma matriz que define as restrições contemporâneas entre as variáveis
que constituem o vetor , ; é um vetor de constantes ; são matrizes
; é uma matriz diagonal de desvios-padrão; é um vetor de
perturbações aleatórias não correlacionadas entre si contemporânea ou temporalmente,
isto é, .
A equação (1) expressa as relações entre as variáveis endógenas, decorrentes de
um modelo econômico teoricamente estruturado, e por isso chama-se forma estrutural. Os
choques estruturais são considerados independentes entre si porque as inter-relações
entre um choque e outro são captados indiretamente pela matriz . Em decorrência da
endogeneidade das variáveis, esse modelo é normalmente estimado em sua forma
reduzida como segue:
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onde , e . Na equação (2), e
. Assim, a matriz pode ser escrita como
.
Em um modelo bivariado as estimativas não podem ser obtidas diretamente
porque as variáveis contemporâneas são individualmente correlacionadas com os seus
termos de erro. Isso ocorre porque cada uma dessas variáveis depende
contemporaneamente da outra – efeito feedback. O objetivo do VAR é evitar esse
problema, encontrando a trajetória da variável de interesse ante um choque nesses erros.
Assim, a equação (2) define um VAR( ), isto é, na forma reduzida; a equação (1) define
um SVAR.
Em um modelo SVAR os erros estruturais, , são ruídos brancos e os
coeficientes da matriz para , são coeficientes estruturais que diferem, em
geral, de sua contraparte na forma reduzida. Um modelo SVAR pode ser usado para
identificar os choques, empregando impulse response functions (IRF) e/ou por meio da
imposição de restrições forecast error variance decompositions (FEVD) sobre as matrizes
e/ou . Funções de impulso resposta mostram os efeitos de choques sobre a trajetória
de ajustamento das variáveis. Decomposições de variância de erro de previsão medem a
contribuição de cada tipo de choque para a variância do erro de previsão. Ambos os
cálculos são úteis para avaliar como os choques nas variáveis econômicas se propagam
através de um sistema.
Depois de imporem-se as restrições, os parâmetros são estimados pela
minimização da função de log-verossimilhança concentrada, uma vez que nem todos os
parâmetros são de interesse por serem conhecidos (parâmetros de perturbação –
nuisance).
Serão estimados três tipos de SVAR: i) um modelo SVAR com quatro variáveis
endógenas: o logaritmo do PIB, a razão gasto público/PIB, a Selic e o IPCA; ii) dois
modelos que incluem, além das variáveis mencionadas anteriormente, a razão dívida
pública PIB, e que diferem nas restrições impostas a matriz de variância-covariância. Para
testar a robustez dos resultados, serão estimados seis modelos ao todo, dos quais três
consideram uma dummy para capturar o efeito da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e
os demais não. Além disso, todos os modelos incluem dummies para as quebras
estruturais (abruptas) obtidas endogenamente pelo teste de Clemente-Montañés-Reyes.
As relações entre as formas reduzidas ( ) e os choques estruturais ( ) podem
ser escritas como segue:
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Modelo SVAR(4)
(3)
Modelo SVAR(5) com Regra Fiscal (4)
Modelo SVAR(5) com Regra Monetária (5)
onde os sobrescritos , , , e representam o log do produto, a razão gasto
público/PIB, a taxa de juros, a taxa de inflação e a razão dívida pública/PIB,
respectivamente.
Inicialmente, cabe notar que, para o modelo SVAR(4), pela própria definição das
Contas Nacionais, os gastos públicos devem afetar contemporaneamente o produto. De
forma semelhante, o crescimento do gasto público depende do comportamento do
produto, que determinará a receita do governo. Com relação à taxa de juros, estabeleceu-
se que ela segue uma Regra de Taylor e também depende contemporaneamente da
fração gasto público/PIB. A taxa de inflação depende contemporaneamente do produto,
da razão gasto público/PIB e da taxa de juros.
O primeiro modelo SVAR(5) estabelece que os gastos públicos devam afetar
contemporaneamente o produto. Os gastos públicos dependem do produto e da condução
da razão dívida pública/PIB, pois esta última representa uma condição de solvência da
administração pública. Ou seja, o endividamento público é um instrumento fundamental
para a distribuição intertemporal ótima das políticas públicas, de modo que a provisão dos
bens públicos pode ser temporalmente dissociada da arrecadação dos recursos para lhe
fazer face. Para que este instrumento possa cumprir de forma adequada seu papel, a
política fiscal tem de ser sustentável. Outra importante variável macroeconômica no
modelo é a taxa de inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
É a partir desta que o Conselho Monetário Nacional (CMN) baliza o sistema de metas de
inflação adotado em junho de 1999, além de ser um dos principais indexadores da dívida
mobiliária brasileira. Por conseguinte, dependendo de sua variação, o governo tem a
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necessidade de se esforçar mais ou menos para gerar resultados primários mais elevados
capazes de honrar seus compromissos.
Com relação à razão dívida pública/PIB considerou-se que ela depende do
crescimento do PIB, pois este entra em seu cômputo; do gasto público que determina a
necessidade de financiamento do setor público através de endividamento; da taxa de
juros que representa uma medida de incerteza, ou seja, uma unidade de poder de compra
que tem um valor diferente dependendo do estado em que a economia se encontra, de tal
modo que em períodos de desaceleração ou recessão econômica, por exemplo, a
necessidade de financiamento pode ser maior, e dado o risco envolvido, a taxa de juros
será maior; e da taxa de inflação em função do diferencial de juros.
O segundo modelo SVAR(5) difere do primeiro nas equações dois e três do
sistema. Agora, o gasto do governo depende somente do produto e a taxa de juros
depende da razão dívida pública/PIB. Esta alteração na terceira equação apresenta o
seguinte raciocínio: quando o Bacen define uma alta taxa de juros, o resultado é um
aumento na razão dívida/PIB no tempo e, por conseguinte, um maior risco-país. Desta
forma, estabelece-se uma causalidade entre taxa de juros doméstica e o prêmio de risco-
país. Sendo assim, ao estipular a taxa de juros básica da economia, o Bacen leva em
consideração não só o hiato do produto e o desvio da inflação em relação à meta mas,
também, o nível e a composição da dívida pública do País.
3.2 Dados
O período de análise deste estudo estende de janeiro de 1995 a outubro de 2012,
com periodicidade mensal. Os dados de Produto Interno Bruto (PIB) e a relação gasto
público/PIB são obtidos junto ao IBGE; o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e
a dívida pública como proporção do PIB foram obtidos do IpeaData. A série da taxa de
juros nominal de curto prazo (SELIC) foi obtida do Banco Central do Brasil (Bacen).
Antes de realizar a análise das variáveis, verificou-se a estacionariedade dessas.
Conforme ressaltado por Lutkepohl (2004), mesmo na presença de processos integrados
as funções de resposta a impulso de modelos VAR podem ser calculadas e interpretadas
da forma usual, por isso não há preocupação explícita em testar a presença de raízes
unitárias nos processos geradores das séries analisadas.
Existe grande variedade de testes de raiz unitária na literatura econômica, tais
como o teste de Dickey-Fuller Aumentado (ADF), Dickey-Fuller-GLS (DF-GLS), Ng-Perron
e Phillips-Perron (PP). Porém, estes são frágeis na presença de quebras estruturais,
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aceitando com maior frequência a hipótese de não estacionariedade. Ou seja, uma série
pode ser estacionária em torno da quebra estrutural, mas os testes a classificarão como
não estacionária. Perron (1989) desenvolveu um procedimento para testar a raiz unitária
permitindo a incorporação de uma quebra estrutural exógena. Isto é, a quebra estrutural é
conhecida. Por outro lado, há uma vasta literatura sobre quebras endógenas no qual a
data da quebra é determinada seguindo algum critério de identificação através do uso de
algum tipo de outlier. Assim, testou-se a presença de raiz unitária com quebras estruturais
para reforçar as conclusões obtidas e para obterem-se os pontos de ruptura da série e
incorporá-los aos modelos estimados.
O teste de Clemente-Montañés-Reyes (1998) considera dois tipos de modelo: i) o
modelo outlier aditivo (OA) que captura mudanças abruptas e ii) o modelo outlier
inovacional (OI) que captura mudanças graduais na série. Para tanto, considere a
seguinte estrutura:
onde para e 0 caso contrário, para . Os resíduos da equação
(6), , são utilizados como variável dependente do modelo OA, como segue:
onde para e 0 caso contrário, para . Esta regressão é
então estimada sobre os possíveis pares de e , em busca do valor mínimo da razão
para a hipótese nula de que . Ou seja, a hipótese nula é que a série tem uma raiz
unitária com uma ou duas quebras estruturais contra a hipótese alternativa de que ela é
estacionária com quebras. O valor mínimo desta razão é comparado com os valores
críticos fornecidos por Perron e Vogelsang (1992).
O modelo OI expressa os choques na série (os efeitos de e , da equação
(6)) da seguinte forma:
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Este modelo apresenta a mesma hipótese nula que o modelo anterior. Ambos os
modelos consideram que as quebras estruturais e a ordem de defasagem são
desconhecidas. Os pontos de quebra são localizados por uma busca bidimensional para o
valor máximo (mais negativo) da estatística para a hipótese de raiz unitária ( ),
enquanto que é determinada por uma série de testes sequenciais. Como observado
na Tabela 1, as quebras estruturais sugeridas pelo teste de raiz unitária de Clemente-
Montañés-Reyes são significativas ao nível de 5%.
TABELA 1 Resultados do teste de Clemente-Montañés-Reyes
1ª quebra 2ª quebra Variável k* Tipo de
outlier Coeficiente T Ponto da quebra Coeficiente t Ponto da
quebra OA 0,7257** 22,187 (2002:12) 0,5346** 14,607 (2007:12)Log do PIB 12 OI 0,0211 2,387 (2002:01) 0,0074 0,932 (2009:01)OA 0,0834** 15,829 (1998:09) 0,0298** 6,798 (2005:08)
Gasto público/PIB 11 OI 0,0715** 5,559 (1998:10) 0,0228 3,753 (2005:05)OA -0,0091** -11,083 (1999:01) -0,0063** -8,774 (2006:03)
Selic 8 OI -0,0016 -3,369 (1999:02) -0,0008 -2,275 (2006:07)OA 1,0586** 6,449 (2002:08) -1,3026** -6,632 (2003:02)
IPCA 12 OI 0,6293 3,864 (2002:08) -0,7127 -4,268 (2003:02)OA 13,3314** 16,831 (1999:03) 0,2556 0,374 (2002:07)
Dívida pública/PIB 1 OI 1,0612 3,413 (1997:07) -0,4354 -2,857 (2007:11)
Fonte: Elaboração dos autores. Nota: ** significativo a 5%; ponto de ruptura entre parênteses.
A Figura 1 apresenta a evolução das variáveis utilizadas nos modelos com suas
respectivas quebras estruturais, que serão incluídas como variáveis exógenas nos
modelos. Com relação ao produto observam-se duas rupturas: a primeira em 2002/12 que
coincide com o início de um novo período de crescimento econômico, que tem na
ampliação das exportações líquidas o novo estímulo dinamizador da economia. Como
discutido por Amitrano (2011, p. 74), a partir de 2006 há o início de uma nova fase de
crescimento econômico, fazendo com que a inércia institucional provocada pelo tripé de
política econômica – metas de inflação, câmbio flutuante e superávit fiscal – fosse
parcialmente rompida. Esta ruptura, dando origem a uma reorientação do papel do Estado
na economia, se fez por meio de uma mudança na composição do gasto público, da
intensificação de políticas de transferência direta de renda e da implementação de
políticas de desenvolvimento de corte vertical, voltadas, sobretudo, para a expansão dos
investimentos e para o aumento das inovações e da competitividade externa da economia
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brasileira. Estes fatores são determinantes da segunda mudança na trajetória de
crescimento econômico.
O gasto público como proporção do PIB, por sua vez, apresenta a primeira quebra
em 1998/09 antecipando um ajustamento fiscal primário ocorrido em 1999 e a segunda
em 2005/08 quando há um aumento significativo nas transferências para estados e
municípios e no gasto com pessoal (GIAMBIAGI, 2006; DOS SANTOS & RIBEIRO, 2008).
1011
1213
1995m1 2000m1 2005m1 2010m1
PIB (em ln)
.1.2
.3.4
1995m1 2000m1 2005m1 2010m1
Gasto público (em % do PIB)
11.
011.
021.
031.
041995m1 2000m1 2005m1 2010m1
Selic (em %)
01
23
1995m1 2000m1 2005m1 2010m1
IPCA (em %)
1020
403030
1995m1 2000m1 2005m1 2010m1
Dívida pública (em % do PIB)
As alterações no comportamento do IPCA refletem os períodos de véspera da
eleição para presidente e o inicio do Governo Lula, respectivamente. A implantação do
regime de metas de inflação é a responsável pela ruptura da trajetória da Selic em
1999/01 e a trajetória descendente da parcela da dívida pública federal com remuneração
baseada nesta (46,5% em 2003 para 33,4% em 2006) explica a segunda quebra ocorrida
em 2006/03.
A quebra da dívida pública em 1999 está associada ao aumento da percepção de
risco de refinanciamento decorrente da não recuperação dos papéis prefixados na
FIGURA 1 Evolução das séries analisadas – 1995/2012
Fonte: Elaborado pelos autores. Nota: as linhas vermelhas representam as quebras estruturais.
17
participação da dívida, de forma que o prazo médio desta teve de ser aumentado para
não prejudicar a percepção do mercado quanto à sustentabilidade da dívida pública. Este
processo foi ajudado pela mudança no regime cambial em 1999, que, ao reduzir a
volatilidade das taxas de juros, fez com que o risco de mercado da dívida pública, sob a
ótica do governo, fosse também reduzido.
Após avaliar a estacionariedade das variáveis envolvidas na estimação do modelo
SVAR, avaliou-se a existência de uma relação de longo prazo entre elas. O teste de
cointegração de Johansen4 é baseado num sistema de equações do tipo VAR e por isso
tem capacidade de captar efeitos de feedback entre as variáveis. O teste de Johansen é
superior ao teste de Engle-Granger que possui baixa potência e rejeita com mais
facilidade relações de cointegração, quando na verdade elas existem (ENDERS, 2004). A
Tabela 2 indica que o modelo SVAR(4), apresenta dois vetores cointegrantes
significativos a 1%, considerando três especificações para o teste de Johansen. Para o
modelo que inclui cinco variáveis endógenas, SVAR (5), há pelo menos um vetor
cointegrante. Assim, esses resultados indicam que existe um equilíbrio de longo prazo
entre as variáveis estudadas.
TABELA 2 Teste de cointegração de Johansen
Drift Constante Nenhum Rank
máximo Autovalor Estatística do traço Autovalor Estatística do traço Autovalor Estatística do traço
Modelo SVAR (4) 0 - 84,26 - 74,47 - 125,7 1 0,202 38,99 0,151 41,64 0,357 36,78 2 0,137 9,37* 0,134 12,65* 0,115 12,34* 3 0,038 1,52 0,050 2,44 0,053 1,36 4 0,008 - 0,012 - 0,007 -
Modelo SVAR (5) 0 - 99,31 - 99,32 - 146,70 1 0,226 47,85* 0,210 51,84* 0,369 54,18 2 0,134 18,94 0,130 23,92** 0,140 23,85* 3 0,045 9,672 0,073 8,612 0,071 8,99 4 0,036 2,348 0,034 1,734 0,042 0,336 5 0,012 - 0,009 - 0,002 - Fonte: Elaborado pelos autores. Nota: ** significativo a 5%; * significativo a 1%.
O SVAR, com quatro e cinco variáveis endógenas, é estruturado com doze
defasagens em conformidade com o Critério de Informação de Akaike (AIC), o teste de 4 Johansen, Mosconi e Nielsen (2000) demonstram que a metodologia econométrica de cointegração continuaria sendo válida na presença de quebras estruturais.
18
razão de verossimilhança (LR) e o final prediction error (FPE). A partir disso, a próxima
seção apresenta o resultado dos modelos estimados.
19
4 RESULTADOS
A Figura 2 apresenta a resposta dos gastos públicos a um choque de 1% no PIB
para o SVAR(4) que inclui a dívida como variável exógena. O gráfico também inclui os
intervalos de confiança (linhas tracejadas) calculados por bootstrap para as FRI, a partir
de 1000 reamostragens dos resíduos do VAR. Observa-se, na Figura 2(a), que o efeito de
um aumento do PIB sobre os gastos públicos é diferente do modelo que exclui a dummy
para capturar o efeito da LRF. Em particular, no SVAR que inclui a LRF o gasto público é
inicialmente pró-cíclico e posteriormente contra cíclico até o 6° período – sendo tal efeito
estatisticamente significativo a 5% –, enquanto que, no SVAR que não inclui a dummy,
Figura 2(b), a resposta do gasto público apresenta mais períodos com efeito positivo.
Além disso, observa-se que a resposta do gasto público sem considerar a LRF encontra-
se fora do intervalo de confiança para o gasto público com LRF a partir do 5° período. Há,
portanto, evidências de que a inclusão da LRF no SVAR realmente faz diferença na
estimação da resposta do gasto público a um choque do produto. Contudo, esta diferença
é muito pequena, pois o modelo não considera a dívida pública como endógena e,
portanto, não se captura a restrição imposta pela LRF sobre a condução da dívida
pública.
Quando se observam as Figuras 2(c) e 2(d) nota-se que a recuperação do
produto ao seu nível inicial é mais rápida quando se considera o efeito da LRF. Contudo,
os modelos estimados não capturam adequadamente a resposta da política fiscal a um
choque inicial do produto, uma vez que os modelos não consideram a dívida pública como
endógena. Em particular, caso não se leve em consideração o efeito adverso de um
choque dos gastos públicos sobre o produto, Figura (3), a estimativa deste efeito de um
choque pode estar viesado. O aumento do gasto público pode ter um impacto direto sobre
a razão dívida/PIB, associado ao aumento do déficit primário e, portanto, pode estar
associado a um maior risco de insolvência da dívida percebido pelos agentes privados.
Portanto, é necessário considerar o papel da razão dívida/PIB sobre a dinâmica das
variáveis analisadas e vice-versa.
20
-.01
0
.01
.02
0 5 10
(a) Resposta dos Gastos Públicos com LRF
-.01
0
.01
.02
0 5 10
(b) Resposta dos Gastos Públicos sem LRF
-.01
0
.01
.02
0 5 10
(c) Resposta do Produto LRF
-.01
0
.01
.02
0 5 10
(d) Resposta do Produto sem LRF
-.01
0
.01
.02
.03
0 5 10
(a) Resposta do Produto com LRF
-.01
0
.01
.02
.03
0 5 10
(b) Resposta do Produto sem LRF
FIGURA 2 Respostas a um choque de 1% no PIB
Fonte: Elaborado pelos autores.
FIGURA 3 Respostas a um choque de 1% nos Gastos Públicos
Fonte: Elaborado pelos autores.
21
A Figura 4 apresenta um conjunto de funções de resposta ao impulso no modelo
que considera o diferencial da razão dívida/PIB em relação a uma meta para a mesma
como um argumento para a formação da taxa de juros, ou seja, uma Regra de Taylor
modificada que contém, além do produto e da taxa de inflação, um indicador de solvência
fiscal. Esta modificação tem por base o perfil da dívida pública e a estratégia
implementada pelo Tesouro Nacional de alongamento do prazo médio da mesma. As
Figuras 4(a) e 4(e) representam a resposta dos gastos públicos a um choque de um 1%
no produto, considerando a ausência e a presença do efeito da LRF, respectivamente.
Quando se avalia a duração da propagação do efeito diante do choque no modelo em que
há o efeito explícito da LRF, Figura 4(e), o efeito é inicialmente positivo e depois é
negativo durante quatro períodos, enquanto no outro modelo a recuperação é mais
rápida. Desta forma, o estabelecimento de limites para o endividamento público e para a
despesa de caráter continuado representa uma diferença significativa na condução da
política fiscal.
Uma explicação para essa diferença pode ser obtida analisando-se o efeito direto
dos gastos públicos sobre a razão dívida/PIB – superávit ou déficit primário – e o efeito
indireto através da taxa de juros. O primeiro efeito, Figuras 4(c) e 4(g), revela o
comprometimento do governo com uma política fiscal baseada em equilíbrio orçamentário
equilibrado. Este resultado é ratificado ao notar-se a resposta da taxa de juros aos gastos
públicos, Figuras 4(b) e 4(f), que garantiu a manutenção da solvência fiscal. O estudo de
Cavalcanti e Silva (2010) superestima o efeito dos gastos públicos sobre a razão
dívida/PIB ao não considerar o efeito indireto da taxa de juros. A tendência consistente de
queda da taxa de juros e da razão dívida/PIB reduziu o risco de insolvência da dívida
percebido pelos agentes privados, como notado nas Figuras 4(d) e 4(h), que apresentam
a resposta do juro a um choque de 1% na razão dívida/PIB. Este resultado reflete a
estratégia do Tesouro Nacional de ampliar a participação dos títulos prefixados na
composição da Dívida Pública e reduzir a participação daqueles indexados à taxas
flutuantes (Selic).
Todavia, este modelo não considera o impacto contemporâneo da razão
dívida/PIB sobre os gastos públicos. Sendo assim, a Figura (5) mostra um conjunto de
funções de resposta ao impulso. As Figuras 5(a) e 5(e) representam a resposta dos
gastos públicos a um choque de um 1% no produto, considerando a ausência e a
presença do efeito da LRF, respectivamente. Nota-se que neste modelo, a dinâmica dos
gastos públicos como resposta a um choque do produto difere significativamente do
anterior – as estimativas são significativas a 5%.
22
-.01
0
.01
.02
.03
0 5 10
(a) Resposta do Gasto Público ao Produto
-.0005
0
.0005
0 5 10
(b) Resposta do Juro ao Gasto Público
-.4
-.2
0
0 5 10
(c) Resposta da Dívida ao Gasto Público
-.0005
0
.0005
.001
.0015
0 5 10
(d) Resposta do Juro à Dívida
-.01
0
.01
.02
.03
0 5 10
(e) Resposta do Gasto Público ao Produto
-.0005
0
.0005
0 5 10
(f) Resposta do Juro ao Gasto Público
-.4
-.3
-.2
-.1
0
0 5 10
(g) Resposta da Dívida ao Gasto Público
-.0005
0
.0005
.001
.0015
0 5 10
(h) Resposta do Juro à Dívida
FIGURA 4 Funções de Resposta ao Impulso no Modelo VAR(5) com Efeito Monetário
Fonte: Elaborado pelos autores.
23
-.01
-.005
0
.005
.01
0 5 10
(a) Resposta do Gasto Público ao Produto
-.0005
0
.0005
0 5 10
(b) Resposta do Juro ao Gasto Público
-.4
-.3
-.2
-.1
0
0 5 10
(c) Resposta da Dívida ao Gasto Público
-.0005
0
.0005
0 5 10
(d) Resposta do Juro à Dívida
-.01
-.005
0
.005
.01
0 5 10
(e) Resposta do Gasto Público ao Produto
-.0005
0
.0005
0 5 10
(f) Resposta do Juro ao Gasto Público
-.4
-.3
-.2
-.1
0
0 5 10
(g) Resposta da Dívida ao Gasto Público
-.0005
0
.0005
0 5 10
(h) Resposta do Juro à Dívida
FIGURA 5 Funções de Resposta ao Impulso no Modelo VAR(5) com Efeito Fiscal
Fonte: Elaborado pelos autores.
24
Observa-se, por um lado, que no modelo que considera a influência da LRF,
Figura 5(e), a resposta dos gastos públicos a um choque do PIB é inicialmente negativa e
a partir do 6° período retorna ao seu nível pré-choque. Uma explicação para este fato
reside no marco institucional imposto pela LRF, que, ao objetivar o equilíbrio orçamentário
entre receita e despesa, traduziu-se como um sinal de que o governo pretende manter o
déficit público sob controle. Por outro, quando não se considera o impacto da LRF este
choque parece tornar-se negativo no longo prazo. Desta forma, a política fiscal parece ser
mais contra cíclica no primeiro caso. Esta evidência aponta para a transição da economia
brasileira, de uma situação pró-cíclica para uma contra cíclica, o que representa um sinal
de credibilidade macroeconômica (ARELLANO, 2006; STRAWCZYNSKI & ZEIRA, 2007).
Finalmente, neste modelo, onde há uma regra de política fiscal definida, a
resposta da taxa de juros a um choque de 1% na razão dívida/PIB – Figuras 5(d) e 5(h) –
é positiva no início e negativa posteriormente. A partir destes resultados, é possível
perceber que as alterações no perfil da dívida pública – a organização dos vencimentos
dos títulos em meses específicos para aumentar a liquidez e melhorar a precificação dos
mesmos e a troca de títulos de curto prazo por prazos mais longos, por exemplo –
permitiram um maior raio de “manobra” da taxa de juros e, consequentemente, a
manutenção da condição de solvência fiscal da economia brasileira.
25
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo do trabalho foi apresentar evidências empíricas sobre os efeitos da
política fiscal no Brasil a partir do uso de Vetores Auto regressivos Estruturais,
incorporando as regras fiscais e monetárias que caracterizaram a política econômica
brasileira no início dos anos 2000.
A discricionariedade fiscal pode estabelecer efeitos indesejados no que concerne
ao papel do orçamento público de suavizar os ciclos. A importância de se estabelecer
uma regra (ou várias) é buscar vincular ao governo um comportamento responsável e um
nível de comprometimento que nem sempre podem ser de seu interesse em curto prazo.
As regras têm como propósito resolver o problema da "inconsistência temporal" e suavizar
o teor discricionário envolvido no gerenciamento da política fiscal, sobretudo no lado dos
gastos públicos, de maneira que as escolhas preferidas de ação por parte de um governo
estejam voltadas para o longo prazo. Dito de outra maneira, as regras fiscais devem
incentivar os governos a se aterem aos seus planos originais de tributação e de gastos,
elevando o custo político com que arcarão caso quebrem os compromissos estabelecidos,
ou até mesmo tornando-se uma exigência legal com a aplicação de sanções devido ao
seu não cumprimento.
As mudanças ocorridas na trajetória do produto, dos gastos públicos, do IPCA, da
Selic e da razão dívida/PIB alteraram a trajetória da política fiscal brasileira. Por
conseguinte, essas quebras estruturais foram incorporadas ao modelo, assim como uma
dummy para capturar o efeito da LRF sobre os gastos públicos e a gestão da dívida
pública. Conforme observado no estado da arte sobre o tema, há uma escassa literatura
sobre política fiscal que considere esses efeitos.
Os resultados mostraram que a influência da LRF realmente aponta para uma
reversão do caráter cíclico da política fiscal brasileira. A resposta dos gastos públicos a
um choque do PIB é inicialmente negativa, retornando ao seu nível pré-choque após um
semestre. Uma explicação para este fato reside no marco institucional imposto pela LRF,
que, ao objetivar o equilíbrio orçamentário entre receita e despesa, traduziu-se como um
sinal de que o governo pretende manter o déficit público sob controle. Quando não se
considera o impacto da LRF este choque parece tornar-se negativo no longo prazo. Desta
forma, a política fiscal parece ser mais contra cíclica no primeiro caso.
Esta evidência aponta para a transição da economia brasileira, de uma situação
pró-cíclica para uma contra cíclica, o que representa um sinal de credibilidade
26
macroeconômica. Tais resultados indicam a importância quando da imposição de regras
fiscais que possam minimizar o teor discricionário do orçamento público.
27
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