coleta seletiva de resíduos sólidos no município de ... · revista expansão acadêmica. ano 1,...
Post on 09-Nov-2018
220 Views
Preview:
TRANSCRIPT
Revista Expansão Acadêmica. Ano 1, n. 1, jul./dez. 2015
10
Coleta seletiva de resíduos sólidos no município de Juazeiro da Bahia:
identificação do perfil dos catadores de material reciclável com a educação
e cultura do semiárido Nordestino
José Adelson Gonçalves de Almeida 1
Resumo
Os movimentos produtivos de bens e serviços no Brasil após a urbanização e o crescimento
econômico exercem um papel extremamente positivo para a economia de mercado. Contudo,
a inovação tecnológica, força motriz do capitalismo, reduz o tempo da utilidade dos bens
produzidos, “lei dos rendimentos decrescentes” e, institui, por conseguinte aumento do
consumo e dos resíduos advindos deste. Este artigo mostra a coleta seletiva de resíduos
sólidos no município de Juazeiro-BA. Apresenta a casta da sociedade brasileira que busca a
sobrevivência na coleta de lixo. Procura identificar e traçar o perfil dos catadores de material
reciclável, com a educação e cultura estatizada no semiárido nordestino. A pesquisa
caracteriza-se como bibliográfica, quantitativa, descritiva, exploratória, e estudo de caso,
realizada no referido município que tem, atualmente, 216 mil habitantes. Colaboraram com o
trabalho de forma voluntária, 18 (dezoito) catadores de material reciclável de uma cooperativa
local, que atuam nas ruas da cidade. As informações foram coletadas através de questionários
que identificam as condições sociodemográficas dos catadores. O resultado deste artigo pode
induzir os gestores públicos a reflexões e ações sobre a projeção desses trabalhadores para a
sustentabilidade ambiental, e humanização de suas condições de trabalho.
Palavras-chave: Coleta de resíduos; Catadores; Educação e cultura.
Abstract
The productive movements of goods and services in Brazil after the urbanization and
economic growth play a very positive role to the market economy. However, technological
innovation, driving force of capitalism, reduces the usefulness of the goods produced, "law of
diminishing returns" and establishes, therefore increased consumption and waste from this.
This article shows the selective collection of solid waste in the municipality of Juazeiro-BA.
Presents the variety of Brazilian society that seeks survival in garbage collection. Attempts to
identify and trace the profile of the collectors of recyclable material, with State-controlled
education and culture in the semi-arid Northeast. The research is characterized as quantitative,
descriptive, bibliographical, exploratory, and case study, held in that city that has, currently,
216 thousand inhabitants. Collaborated with the work on a voluntary basis, 18 (eighteen)
collectors of recyclable material of a cooperative, that operate on city streets. The information
was collected through questionnaires that identify socio-demographic conditions of
scavengers. The result of this article can induce public managers to reflections and actions
1 1. José Adelson Gonçalves de Almeida: Economista graduado pela Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais
de Petrolina – FACAPE, Especialista em Gestão de RH pela Universidade de Pernambuco – UPE. Professor da
Faculdade São Francisco de Juazeiro – FASJ. Presidente da Comissão Própria de Avaliação – CPA/FASJ.
adelson_economia@hotmail.com.
Revista Expansão Acadêmica. Ano 1, n. 1, jul./dez. 2015
11
about the projection of these workers for environmental sustainability, and humanization of
their working conditions.
Key words: waste collection; Scavengers; Education and culture.
Introdução
O crescimento da produção de bens e serviços, congregado ao aumento demográfico e
urbanização desordenada compõem uma conjuntura, que inseri o Brasil em uma grande crise
socioambiental. A relação produto, consumo cria na economia de mercado uma competição
globalizada, que além de aumentar o uso dos recursos da natureza, favorece o acréscimo da
geração de resíduos sólidos. Segundo (ABRELPE, 2013, p.41), “no Brasil, cada pessoa gera em
média: 1,04 Kg. de resíduos sólidos por dia”. Mesmo com a sanção da Lei Federal 12.305/2010,
que entre outras providencias, prever a redução na geração de resíduos sólidos, a média
produzida em 2013 foi superior ao crescimento da população no mesmo período.
Simultaneamente, cresceu o número de catadores envolvidos com a coleta dos materiais que
podem ser reciclados, principalmente na atividade informal, que representa para o Brasil um
desafio de natureza socioeconômica, pelo considerado numero de trabalhadores excluídos do
mercado de trabalho formal.
Segundo (CONCEIÇÃO, 2003, p.191) “provocada pelo próprio sistema capitalista, a
exclusão social em que se encontram milhões de seres humanos, tem levado à formação, em
todo mundo, de um exercito de pessoas que trabalham e vivem dos recursos provenientes dos
resíduos urbanos”.
A coleta de material reciclável realizada na informalidade expõe os catadores a
extremos riscos para a saúde no exercício laboral, trabalham sem equipamentos de segurança
e dividem os espaços dos lixões com animais, insetos, gases, fumaça, além do mau cheiro.
Atividade que, segundo (CACCIAMALI, 2000, p.153) “Tem a marca transparente da
precarização, pois são vulneráveis, possuem incertezas de renda e de perspectivas futuras”.
Em Juazeiro, após a fundação da Cooperativa de Catadores de Materiais Recicláveis
de Juazeiro – COOPERFITZ, os catadores associados, não mais realizam as coletas em lixões,
entretanto as condições de trabalho ainda são precárias: níveis de escolaridade insuficientes,
para gerar possibilidades de acesso ao mercado de trabalho formal, ausência de apoio mais
efetivo da sociedade e do poder público, carência de equipamentos de proteção individual,
entre outras necessidades. Os resultados da pesquisa de campo realizada através de entrevistas
Revista Expansão Acadêmica. Ano 1, n. 1, jul./dez. 2015
12
com os catadores da COOPERFITZ mostra também, externalidades positivas, já que, não há
presença de crianças envolvidas com a coleta de resíduos sólidos entre os cooperados.
Este trabalho procurou avaliar através das entrevistas, os recursos escolares utilizados
na educação dos catadores de material reciclável, com a finalidade de comparar a partir dos
saberes escolares adquiridos, os motivos que os levaram à exclusão do mercado de trabalho
formal e, a relação destes, com a educação e cultura estatizada no semiárido nordestino.
Resíduos Sólidos Urbanos (RSU): definição e classificação.
O termo “sólido” é bem mais abrangente do que a própria expressão sugere, uma vez
que, apesar de fazer uma referência à palavra “sólidos” os resíduos podem estar nos estados
sólido, liquido e em estado gasoso desde que esteja contido em algum recipiente.
A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) no Art. 3º Inciso XVI
define resíduos sólidos como: material, substância, objeto ou bem
resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final
se procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos
estados sólido ou semissólido, bem como gases contidos em recipientes
e líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento na
rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam para isso
soluções técnicas ou economicamente inviáveis em face da melhor
tecnologia disponível. (Lei Federal 12.305/2010).
A classificação oficial dos resíduos sólidos no Brasil se dá através da mesma Lei
12.305/2010 no seu artigo 13°.
Resíduos sólidos urbanos acumulam: resíduos domiciliares, originários de atividades
domésticas em residências urbanas; resíduos de limpeza urbana, oriundos da varrição, limpeza
de logradouros e vias públicas e outros serviços de limpeza urbana; resíduos de
estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços, procedentes das atividades de limpeza
urbana: resíduos dos serviços públicos de saneamento básico; resíduos de serviços de saúde;
resíduos da construção civil: os gerados nas construções, reformas, reparos e demolições de
obras de construção civil, incluídos os resultantes da preparação e escavação de terrenos para
obras civis; resíduos de serviços de transportes: os provenientes de portos, aeroportos,
terminais alfandegários, rodoviários e ferroviários e passagens de fronteira; resíduos
industriais: vindos dos processos produtivos e instalações industriais; resíduos de mineração:
os gerados na atividade de pesquisa, extração ou beneficiamento de minérios.
Gráfico 1 – Participação dos principais materiais no total de RSU
coletados no Brasil em 2012.
Revista Expansão Acadêmica. Ano 1, n. 1, jul./dez. 2015
13
Fonte: ABRELPE 2013.
Geração e coleta dos resíduos sólidos urbanos no Brasil, no Nordeste, na Bahia e no
Município de Juazeiro.
Segundo (IBGE¹ e ABRELPE², 2013, p.28), a geração total de resíduos sólidos
urbanos em 2013 no Brasil foi de 76.387.200 toneladas. Representa um aumento de 4,1%,
índice superior ao crescimento populacional no mesmo período, que foi de 3,7%. Nesse estudo
o IBGE mostra que, entre as quantidades de resíduo sólidos geradas e coletadas, deixaram de
ser recolhidas diariamente mais de 20.000 toneladas no país. A região Nordeste gerou no
período 53.465 toneladas por dia: 22,1% dos resíduos sólidos urbanos produzidos no Brasil
ficou atrás apenas da Região Sudeste com 52,4%. De acordo com a tabela 1, a Bahia apresenta
um percentual significativo da geração de resíduos sólidos urbanos no Nordeste.
Tabela 1 – Geração e coleta de resíduo sólidos urbanos no Estado da Bahia
Resíduos Sólidos Urbanos Coletados
População (Kg/hab./dia) (t/dia/coletada) RSU Gerado (t/dia)
2012 2013 2012 2013 2012 2013 2012 2013
14.175.341 15.044.137 0,759 0,765 10.754 11.506 13.620 14.235
NE 0,958 42,772 53.465
Bahia - 20,1% 26,6%
Fontes: Pesquisa ABRELPE e IBGE 2013.
Nota: Os índices por habitante referentes a 2012 e 2013 foram calculados com base na população total dos
municípios.
A tabela acima mostra que a participação da Bahia na geração de resíduos sólidos
urbanos em 2013 foi de 14.235 toneladas/dia, 26,6% do total produzido no Nordeste. Mesmo
com a maior produção de lixo urbano entre os Estados do Nordeste, a Bahia gera por
habitante / dia apenas 0,765 Kg. 20,1% abaixo da média da Região Nordeste.
Tabela 2 – Geração e coleta de resíduo sólidos urbanos no Município de Juazeiro-BA.
Resíduos Sólidos Urbanos Coletados
51,4%
16,2% 13,5% 13,1%
2,9% 2,9%
0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
Matéria
orgânica
Outros Plástico Papel,
papelão e
tetra park
Metais Vidro
Revista Expansão Acadêmica. Ano 1, n. 1, jul./dez. 2015
14
População (Kg/hab./dia) (t/dia/coletada) RSU Gerado (t/dia)
2013 2014 2013 2014 2013 2014 2013 2014
214.748 216.588 0,601 0,600 126 128 129 130
Bahia 11.506 14.235
Juazeiro 1,09% 0,91%
Fontes: Pesquisa ABRELPE e IBGE 2013. Pesquisa de campo SESP 2015.
Nota: Os índices por habitante referentes a 2013 e 2014 foram calculados com base na população total do
Município de Juazeiro-BA.
¹ IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. ² ABRELPE - Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais.
A tabela 2 mostra que os resíduos sólidos urbanos gerados no Município de Juazeiro
em 2013, consoantes à pesquisa, foram de 129 toneladas/dia, porquanto a produção de RSU foi
de 47.085 toneladas no período. Na Bahia no mesmo tempo, o somatório do RSU alcançou:
5.195.775 toneladas, assim sendo, a geração de RSU em Juazeiro comparada com o Estado é
de: 0,91%. A pesquisa mostra que, em Juazeiro a geração de RSU (Kg./hab./dia) é inferior a do
Estado do Maranhão: 0,611 Kg./hab./dia, que é a menor média entre os Estados da Região
Nordeste, externalidades ambientalmente positivas.
Coleta seletiva e destinação final de Resíduos Sólidos Urbanos.
A coleta seletiva de resíduos sólidos urbano nos municípios do Brasil em 2013, ainda é
muito tímida. Segundo pesquisa do (ABRELPE, 2013, p.43) apenas nos municípios das
regiões sudeste e sul, houve um significativo acréscimo das ações direcionadas a coleta
seletiva de RSU. A pesquisa mostra que as iniciativas atingiram: 82,6% e 81,9%
respectivamente nos municípios dessas regiões. A região centro oeste apresenta o pior índice
com apenas 33,8% dos municípios com alguma atividade direcionada a coleta seletiva de RSU,
seguida da região nordeste com 40,4% e região norte com 49,5%. Na média nacional 62,1% dos
municípios brasileiros movimentam-se, em torno da implantação da coleta seletiva.
Tabela 3 – Municípios com iniciativas de coleta seletiva de resíduos sólidos urbanos
Região Norte Nordeste Centro-Oeste Sudeste Sul Brasil
2012 2013 2012 2013 2012 2013 2012 2013 2012 2013 2012 2013
Sim 113 223 678 725 148 158 1.342 1.378 945 975 3.326 3.459
Não 326 227 1.116 1.069 318 309 326 290 243 216 2.239 2.111
Total 450 1.794 467 1.668 1.191 5.570
Fontes: Pesquisa ABRELPE e IBGE 2013.
Revista Expansão Acadêmica. Ano 1, n. 1, jul./dez. 2015
15
A destinação final dos RSU coletados no Brasil. Em 2012, apenas 57,98% dos RSU
apresentaram destinação final adequada, enquanto 42,02% tiveram como destino final, os
lixões e/ou aterros controlados. Em 2013, 58,26% e 41,74% respectivamente. Os dados
mostram que a destinação final dos RSU em aterros sanitários cresceu apenas 0,483%, quando
comparado com o crescimento populacional 3,7% no mesmo período os resultados são
negativos.
Na Bahia, as 5.195.775 toneladas de RSU produzidas em 2013, tiveram como
destinação final: 1.589.907 aterros sanitários, 1.870.479 aterros controlados, destas 47.085
Produzidas no Município de Juazeiro. Para os lixões baianos foram destinadas 1.735.389
Toneladas de RSU no período.
Tabela 4 – Quantidade de Municípios por tipo de destinação adotada – 2013
Destinação final Norte Nordeste Centro-Oeste Sudeste Sul Brasil
Aterro sanitário 92 463 161 817 703 2.226
Aterro controlado 111 504 148 645 367 1.775
Lixão 247 837 158 206 121 1.569
Brasil 450 1.794 467 1.668 1.191 5.570
Fontes: Pesquisa ABRELPE e IBGE 2013.
Empregos diretos gerados na coleta de RSU e no setor de limpeza Urbana – Município
de Juazeiro, Regiões e Brasil.
Segundo a (ABRELPE, 2013, p.32), os empregos gerados na coleta de RSU, incluídos
os serviços de limpeza pública no Brasil em 2013 superou os 332 mil empregos diretos. No
Nordeste foram gerados 86.314 empregos diretos, crescimento em relação a 2012 de 2,93%. O
mercado de limpeza urbana, que sempre movimentou considerável volume de recursos, em
2013 novamente exibiu a sua importância no cenário econômico brasileiro, ultrapassou os 24
bilhões de reais, aumento superior a 6,5% em relação ao período anterior.
Segundo a gerência da coleta de RSU da Secretaria de Serviços Públicos de Juazeiro –
SESP, o Município conta com uma equipe de (86) colaboradores que trabalham na coleta de
RSU e na varrição, limpeza de logradouros e vias públicas, ainda utilizam (08) caminhões
compactadores, que atendem de acordo com o calendário de coleta de RSU, a sede e o interior
do Município. O custo total admitido é: 407.500 reais mensais.
A sobrevivência na coleta de lixo
O mercado de limpeza urbana, segundo as estatísticas mencionadas neste artigo
configura um cenário positivo na geração de emprego e renda, haja vista que o montante gasto
Revista Expansão Acadêmica. Ano 1, n. 1, jul./dez. 2015
16
nesse mercado ficou muito próximo de todas as transferências efetivadas para os beneficiários
do “bolsa família” no ano de 2013: 24,5 bilhões de reais. Entretanto faz-se necessário
encontrar explicações, para as distorções que existe entre, este mercado e a atividade informal
dos catadores de RSU. Os catadores agem como agentes ambientais e fazem um trabalho de
utilidade pública, desobstruindo os espaços públicos das cidades, através da coleta de material
reciclável que são descartados, e poderiam ocupar mais espaços nos aterros sanitários, aterros
controlados ou lixões. Esses materiais são coletados, transportados, separados e vendidos
para a indústria de reciclagem, fazendo “logística reversa” exigida de outros agentes da cadeia
produtiva, pelo Programa Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS.
Segundo (BENVINDO, 2010, p. 71) “os catadores, por meio de sua atividade cotidiana,
transformam o lixo (algo considerado inútil a princípio) em mercadoria outra vez (algo útil,
dotado de valor de uso e de valor de troca)”. Essa atividade promove externalidades positivas
reduz o uso dos recursos naturais exauríveis, além de gerar renda para essas famílias.
Entretanto, esses catadores trabalham na informalidade, expostos a riscos e afastados da
inclusão social, haja vista, que não se trata como excluídos, os que nunca foram incluídos.
Os catadores ocupam uma posição marginal na sociedade, com poucas ofertas de
trabalho formal, ancorada a falta de formação escolar, sofrem preconceitos por trabalhar com
lixo, mas, por necessidade adotam à atividade de coleta como oportunidade de trabalho e
garantia de sobrevivência. Mesmo com todos estes entraves, os catadores de materiais
recicláveis vêm procurando se articular coletivamente, com base em diversos modelos
organizacionais a exemplo do cooperativismo. De acordo com estimativa do (IPEA, 2010),
“com base em relatos de gestores públicos e das próprias organizações de catadores, o
percentual de trabalhadores ligados a cooperativas e associações nesse setor está em torno de
apenas 10%.”
O quadro abaixo mostra os caminhos percorridos para a efetivação da logística reversa.
Quadro – 1 Procedimento da logística reversa
Fonte: LEITE, 2012. Elaboração, Autor.
Matéria
prima
Indústria
Centro
distribuidor
Varejo
Consumidor
Pós-venda
Consumidor
Coleta
Consolidação
Retorno
Mercado original
Mercado secund.
Matéria
prima
Desmanche
reciclagem Componentes
secundários
s
Revista Expansão Acadêmica. Ano 1, n. 1, jul./dez. 2015
17
A responsabilidade compartilhada pelo ciclo do produto e a logística reversa são os
pontos de partida para o PNRS atribuir responsabilidades a todos participantes da cadeia
produtiva, o fabricante, os importadores, distribuidores, comerciantes, consumidores e o poder
público responsável pelos serviços de limpeza pública.
O perfil dos catadores de material reciclável, com a educação e cultura estatizada no
semiárido nordestino.
A Cooperativa de Catadores de Materiais Recicláveis de Juazeiro – COOPERFITZ, fundada
em 2012, funcionou inicialmente num galpão no bairro Piranga, imóvel de propriedade da
DIOCESE de Juazeiro. No segundo semestre de 2014 passou a funcionar em um galpão com
100m² cedido pela Secretaria de Serviços Públicos de Juazeiro – SESP, Localizado no Distrito
Industrial, espaço adequado para a separação dos resíduos sólidos recicláveis. A partir da
fundação da cooperativa, os catadores de material reciclável passaram a exercer suas coletas
de maneira organizada, e mais humana. Antes, a coleta era exercida no antigo lixão da cidade,
ambiente inadequado para qualquer atividade laboral.
A pesquisa de campo foi realizada com a finalidade de conhecer o perfil dos catadores
de material reciclável, e mensurar a relação desta atividade com a herança da educação e
cultura estatizada no semiárido nordestino.
Análise dos dados
As variáveis sociodemográficas dos associados da COOPERFITZ foram analisadas
com o objetivo de compreender o perfil dos catadores da cooperativa, a partir de uma relação
entre tópicos mensurados.
Tabela 5 - Principal motivo que levou os entrevistados a trabalhar como catadores
segundo dados sociodemográficos pesquisados na COOPERFITZ - 2015:
Motivo de ser catador
Dados sociodemográficos Necessidade Desempregado Única Outro Total
sem qualificação oportunidade
n (%) n (%) n (%) n (%) n (%)
Gênero Feminino 1 (5,56) -- -- 2 (11,11) -- -- 3 (16,67)
N=18 Masculino 5 (27,77) 3 (16,67) 6 (33,33) 1 (5,56) 15 (83,33)
Cursou Apenas alfabetiz. 5 (27,78) -- -- -- -- -- -- 5 (27,77)
N=18 Fund. Incompleto -- -- 3 (16,67) -- -- -- -- 3 (16,67)
Fund. Completo -- -- -- -- 1 (5,56) 1 (5,56) 2 (11,11)
Médio incompleto 1 (5,56) 1 (5,56) -- -- 1 (5,56) 3 (16,67)
Médio completo -- -- 1 (5,56) -- -- 1 (5,56) 2 (11,11)
Não alfabetizado 2 (11,11) -- -- 1 (5,56) -- -- 3 (16,67)
Idade 19 I--- 35 1 (5,56) 1 (5,56) -- -- 1 (5,56) 3 (16,67)
Revista Expansão Acadêmica. Ano 1, n. 1, jul./dez. 2015
18
36 I--- 45 2 (11,11) 1 (5,56) 2 (11,11) -- -- 5 (27,77)
46 ou mais 3 (16,67) 3 (16,67) 1 (5,56) 3 (16,67) 10 (55,56)
Moradia Própria 2 (11,11) -- -- -- -- 2 (11,11) 4 (22,22)
N=18 Alugada 4 (44,44) 1 (5,56) 1 (5,56) 2 (11,11) 8 (44,44) Outros 3 (16,67) 2 (11,11) 1 (5,56) -- -- 6 (33,34)
Tempo de atuação na coleta
(anos) 0 I--- 3 1 (5,56) 1 (5,56) 2 (11,11) 1 (5,56) 5 (27,77)
N=18 10 ou mais 6 (33,34) 3 (16,67) 1 (5,56) 3 (16,67) 13 (72,23)
Fonte: Pesquisa de campo, 2015. Elaboração, Autor.
O primeiro item da tabela, que identificou o motivo de ser catador mostra que o
percentual de homens associados à COOPERFITZ: 83,3% é bem superior ao das mulheres. A
presença de homens que trabalham com a coleta de resíduos é superior em todo Brasil. As
mulheres representam 31,1% de brasileiros que declararam ao (IBGE, 2013) que são
catadores de resíduos recicláveis, esse percentual oscila muito entre os Estados. No Rio
grande do Norte o percentual chega a apenas 15%, seguido de Roraima com 17%. O Estado
com maior participação percentual de mulheres na coleta é o Amazonas com 40%. Conforme
o resultado da pesquisa na COOPERFITZ a participação das mulheres na coleta em Juazeiro é
de 16,7%.
No quesito escolaridade os dados da pesquisa mostrou um somatório de 44,44% entre
apenas alfabetizados e não alfabetizados, 27,77 e 16,67 respectivamente, ocorrência frequente
no associativismo relacionado às cooperativas de catadores, com maior incidência nos
Estados do Nordeste 34%. A pesquisa revela ainda, que 16,67% tem ensino fundamental
incompleto, 11,11% fundamental completo, apresenta para o ensino médio incompleto e
completo, percentuais idênticos aos do ensino fundamental 16,67% e 11,11% respectivamente.
Segundo (IBGE, 2013) “no Brasil 20,5% dos catadores se declararam analfabetos. Ou seja, são
aqueles que não sabem escrever sequer o próprio nome”. A região Sudeste apresentou o
menor índice de analfabetismo entre os catadores, 13,4%.
Os entrevistados da COOPERFITZ declararam que 55,56% têm 46 anos ou mais de
idade, o fato que chama a atenção nesse item é a relação com a escolaridade, pois 33,34%
destes declararam que foram motivados a trabalhar na coleta de lixo por necessidade, e,
estiveram desempregados graças à falta de qualificação.
Quando se avaliou a situação de moradia, os catadores afirmaram que 77,78% não
possuem casa própria e dentre este 72,23% estão entre os catadores de maior faixa etária e
com maior tempo na atividade da coleta de material reciclável.
Tabela 6 – Resultados econômicos das Atividades da COOPERFITZ:
Revista Expansão Acadêmica. Ano 1, n. 1, jul./dez. 2015
19
Resíduos Sólidos Urbanos Papelão Papel Alumínio Sacolas Metais Vidro Pet
RSU mais coletados 5 ton. 31 ton. 0,038 ton. 0,38 ton. - - 0,013 ton.
RSU mais vendidos 13,68% 84,82% 0,10% 1,04%
Onde são coletados residência 50% comércio 50% indústria 0% outros 0%
Frequência da venda uma vez por mês
Peso do material coletado em Kg 5 ton. 31 ton. 0,038 ton. 0,38 ton. - - 0,013 ton.
Horas de trabalho por dia 10 horas por dia: segunda a sábado
Valor recebido por Kg. em R$ 0,20 0,16 3,00 1,20 10,00 7,50 0,50
Nº de pessoas q. vive da renda 1 a 2 - 50% 3 a 4 - 20% 5 a 6 - 20% mais – 0%
Valor recebido RSU R$ 1.000,00 4.960,00 114,00 456,00 - - 65,00
É suficiente para o sustento da família sim 0% insuficiente 16,7% é pouco 83,3%
Renda média mensal por cooperado R$ 366,39
Fonte: Pesquisa de campo, 2015. Elaboração, Autor.
Os resultados econômicos das atividades dos catadores da COOPERFITZ mostram
que a coleta de material reciclável: 0,94% , ainda é muito tímida diante do quantitativo de
resíduos gerados no município de Juazeiro da Bahia. De acordo com os entrevistados todo
material reciclável é coletado em condomínios residenciais e no comércio da cidade, e
vendido no final de cada mês. Os valores pagos aos cooperados da COOPERFITZ são
inferiores aos pagos pela indústria de reciclagem, pois entre a cooperativa e a indústria
existem os atravessadores que compra dos cooperados e repassam para a indústria.
A renda média dos cooperados e de pouco mais de trezentos e sessenta reais por mês,
valores que os mesmos declaram: 83,3% que é insuficiente, e 16,7% que é pouco para manter
o sustento da sua família.
Considerações finais
Segundo (KRUGMAN; WELLS, 2007, p.477), “o crescimento econômico de longo
prazo é fundamental para muitas das questões econômicas mais urgentes de hoje. Em
particular o crescimento de longo prazo percapita”. Dessa forma as intenções do crescimento
mantido no produto agregado por trabalhador, constituem melhores condições para gerar
maiores salários e mais qualidade de vida. Contudo algumas regiões e países, não crescem
economicamente, permanecem estagnados. Destarte aparecem os entraves que interferem no
crescimento econômico, criam diferenças e impedem o desenvolvimento e prosperidade social
nesses países ou regiões. Porquanto se torna importante mensurar as causas que sancionam
essas desigualdades.
Os catadores de material reciclável, atores envolvidos nesse estudo, representam
nitidamente essas diferenças, e permitiu mostrar nesse artigo, o cenário que trás aspecto
significativo do crescimento econômico desordenado, que prioriza o aumento da produção e
descarta os interesses das castas menos favorecidas, contribuindo para a ampliação do
Revista Expansão Acadêmica. Ano 1, n. 1, jul./dez. 2015
20
exército de trabalhadores de reserva. Entretanto, as dificuldades não se resumem nas ações
capitalistas, haja vista, que outras variáveis legitimam e intervêm diretamente para a redução
da inclusão social. Os resultados da pesquisa efetivada na COOPERFITZ identificam a
necessidade de criar uma relação intrínseca entre as variáveis: educação, cultura, qualificação
profissional e tecnologia, conjuntura que possibilita avaliar: o emprego, a renda, as causas e
fragilidades do fator trabalho. Nesse contexto, a prática educacional deve produzir os saberes
necessários, para a inserção do trabalhador no mercado formal de produção. No Brasil, a Lei
de Diretrizes e Bases da Educação “prevê que a educação básica precisa dar condições de o
cidadão progredir no trabalho (Lei n. 9.394, 1996)”, entretanto, não existe sincronia
curricular, num contexto regional, entre: o setor produtivo globalizado e a qualificação da
mão de obra, adequada para cada região do país demandada pelas empresas.
A educação oferecida no Brasil não ocorre de forma contextualizada para formar
trabalhadores capacitados para o mercado de trabalho, que representem a força motriz para o
crescimento e consequente desenvolvimento econômico. Segundo (MARTINS, 2006), “a
contextualização é antes de tudo um problema de descolonização”. Para ele no processo
educativo vigente o currículo se alberga nas ideias preconceituosas baseadas na cultura
europeia capitalista. (MARTINS, 2006, P. 45) “pontua que contextualizar não significa isolar
os conhecimentos e saberes, reduzir a abordagem, nem fixar-se apenas ao local, à sala de aula
etc. Ao contrário, é incluir, ampliar”. Portanto contextualizar, não compreende a educação e a
capacitação profissional num currículo padronizado, para todas as regiões brasileiras, e sim
multidisciplinaridade entre os conhecimentos e saberes.
De acordo com (LIMA, 2006, p.39), “os conhecimentos não podem ser construídos
isolados de outras relações que o sujeito faz em seu mundo”. Nesse sentido os conhecimentos
e saberes devem ser contextualizados multiplicando as possibilidades de adequação a regiões
e costumes distintos, proporcionando livre escolha da atividade laboral.
Por fim, os problemas com a sustentabilidade ambiental, trás na sua conjuntura
soluções pragmáticas, haja vista, que os resíduos sólidos podem ser reciclados e reutilizados
na indústria de transformação, sendo assim, reduz o uso de recursos da natureza, gera renda
para as famílias envolvidas e podem custear os projetos de intervenções necessárias para
manter o equilíbrio ambiental. Para tanto se faz necessário à prática legal que concerne o
Plano Nacional de Resíduos Sólidos - PNRS.
REFERENCIAS:
Revista Expansão Acadêmica. Ano 1, n. 1, jul./dez. 2015
21
BENVINDO, Aldo Z. A nomeação no processo de construção do catador como ator
econômico e social. 2010. Dissertação (Mestrado) – Universidade de Brasília, Brasília, 2010.
CACCIAMALI, Maria Cristina. Globalização e processo de informalidade, Economia e
sociedade. Campinas: Unicamp. I.E. Jun. p. 153. n.4, 2000. Disponível em
https://scholar.google.com.br, Acesso em 07 de agosto 2015.
CONCEIÇÃO, Márcio M. Os empresários do lixo: um paradoxo da modernidade: uma
análise interdisciplinar da questão das cooperativas de reciclagem de lixo. Campinas, São
Paulo, Átomo e alínea, 2003.
IBGE. Pesquisa Nacional de Saneamento Básico 2008. Manejo de Resíduos Sólidos. 2008.
2010. 2013. Disponível em: < http://www.ibge. gov.br/home/estatistica/populacao/condicao
devida /pnsb2008/ defaulttabpdf_man_res_sol.shtm>. Acesso em: 15 de julho. 2015.
IPEA – INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Pesquisa sobre pagamento
por serviços ambientais urbanos para gestão de resíduos sólidos. Brasília: IPEA, 2010.
Disponível em: http://www.ipea.gov.br. Acesso em 1º de julho de 2015.
KRUGMAN, P.; WELLS, R. Introdução à economia. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.
LEITE, P. R. Logística reversa na atualidade. In: JARDIM, Arnaldo; YOSHIDA,
Consuelo; FILHO, José Valverde Machado. Política Nacional, Gestão e Gerenciamento de
Resíduos Sólidos. Barueri: Editora Manolo, 2012.
Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (1996). Estabelece as diretrizes e bases da educação
nacional. Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília. Disponível em
http://portal.mec.gov.br/seed/arquivos/pdf/tvescola/leis/lein9394.pdf. A cesso em 07 de
agosto de 2015.
LIMA, E. S. Educação contextualizada no semiárido: reconstruindo saberes, tecendo
sonhos. In: RESAB. Educação e convivência no campo: analisando saídas e propondo
direções. Juazeiro: Selo Editorial RESAB, 2006. p. 35-48. https://www.google.com.br/
periodicos.uem.br/ojs/index.php/ActaSciHumanSocSci/article/.../5436. Acesso em 16 de julho
de 2015.
MARTINS, J. Anotações em torno do conceito de educação para a convivência com o
semiárido. In: RESAB. Educação para a convivência com o semiárido: reflexões teórico-
práticas. Juazeiro: Selo Editorial RESAB, 2006. p. 37-66. https://www.google.com.br/
periodicos.uem.br/ojs/index.php/ActaSciHumanSocSci/article/.../5436. Acesso em 16 de julho
de 2015.
O Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2013, 11ª edição do relatório anual da
ABRELPE – Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais,
lançado em 04 de agosto de 2014. http://www.abrelpe.org.br/. Acesso: 18 de junho 2015.
Plano Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS. Versão preliminar para consulta pública,
lançado em setembro de 2011. www.mma.gov.be/estruturas/.../253_publicao020220120417
57.pdf. Acesso: 18 de junho 2015.
Revista Expansão Acadêmica. Ano 1, n. 1, jul./dez. 2015
22
top related