correio appoa 199 miolosegunda-feira, 20h30min, mensal. início: 28 de março. estudo do seminário...
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rial.
O verbo con
jugad
o com o carn
aval já foi, não p
or acaso, o brincar.
No p
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cava-se carnaval”, em
um
a alusão d
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til eà fan
tasia. “Mam
ãe, eu qu
ero mam
ar” entoava a m
úsica tam
bém rem
e-
morativa d
a infân
cia.O
carnaval ch
egou ao B
rasil por volta d
o século X
VII, sob in
fluên
cia
das festas carn
avalescas da E
urop
a. Na Itália e Fran
ça, a festa consistia
em d
esfiles urban
os, nos qu
ais os carnavalescos u
savam m
áscaras e
fantasias. Person
agens com
o a Colom
bina, o P
ierrô e o Rei M
omo tam
-bém
foram in
corporad
os ao carnaval brasileiro, em
bora sejam d
e ori-
gem eu
ropéia.
No B
rasil, no fin
al do sécu
lo XIX
, começam
a aparecer os p
rimeiros
blocos carnavalescos, cord
ões e os corsos. Nestes ú
ltimos, a brin
cadeira
consistia n
o desfile d
e carruagen
s enfeitad
as – e, posteriorm
ente, d
e au-
tomóveis sem
capota –, rep
letos de foliões. A
o se cruzarem
, os grup
osfan
tasiados, ocu
pan
tes dos veícu
los, lançavam
un
s nos ou
tros, confetes,
serpen
tinas e esgu
ichos d
e lança-p
erfum
e. Os corsos d
eram origem
aoscarros alegóricos, típ
icos das escolas d
e samba atu
ais.
No sécu
lo XX
, o carnaval foi se torn
and
o cada vez m
ais pop
ular n
o
Brasil. A
s march
inh
as carnavalescas aju
daram
no en
grand
ecimen
to da
festa, deixan
do-a cad
a vez mais an
imad
a.
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ias.
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2.
edito
ria
l.
Freud
, no artigo d
e 1908 “O criad
or literário e a fantasia”, já estabe-
lecera a relação entre a brin
cadeira e a fan
tasia, ao referir o brincar da
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o a prim
eira man
ifestação da fan
tasia, precu
rsora da ativi-
dad
e imagin
ativa.
“Fantasia é u
m troço qu
e o cara tira no carn
aval” diz João B
osco,
brincan
do com
os conceitos.
Pois na A
PP
OA
, mesm
o dep
ois do carn
aval, não aban
don
aremos a
fantasia, ao con
trário, a temática d
o infan
til e do fan
tasma n
orteará o
trabalho d
o prim
eiro semestre d
o ano.
A Jorn
ada d
e Abertu
ra sobre o infan
til na Psican
álise iniciará o d
e-
bate, na p
erspectiva qu
e o infan
til não se atem
à cronologia d
o início d
a
vida, e sim
se estend
e à estrutu
ra psíqu
ica do su
jeito que, m
esmo qu
e
constitu
ída n
a infân
cia, perm
anece vigen
te também
no ad
ulto. E
xiste,
assim, u
m in
fantil n
o psiqu
ismo qu
e não se d
issolve com a in
fância,
embora ela seja su
a matriz.
O “R
elend
o Freud
”, em m
aio, dará con
tinu
idad
e à discu
ssão atráves
do texto d
e 1919, “Um
a criança é esp
ancad
a”, ou n
a tradu
ção mais ju
sta:
“Bate-se n
um
a criança”. N
este, Freud
dá en
sejo a ind
agações plu
rais, como
por exem
plo: qu
al a origem d
a perversão? Q
uais as im
plicações en
tre dor,
prazer, gozo e am
or? Em
que m
edid
a a fantasia d
e espan
camen
to é
constitu
tiva do su
jeito? Qu
al a fun
ção do p
ai no fan
tasiar? Qu
ais as dife-
renças en
tre as fantasias fem
inin
as e as mascu
linas? Q
uais os estatu
tos
do bater: am
or, pu
nição, gozo ou
fun
ção patern
a? Trata-se d
e sadism
o ou
masoqu
ismo?
Até d
epois d
o carnaval, m
as aind
a sobre a fantasia e o in
fantil.
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til na
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ális
e
O in
fantil está n
o cerne d
a psican
álise, ond
e se instala m
uito além
da
cronologia d
o início d
a vida, esten
den
do-se à estru
tura p
síquica d
o sujei-
to que, m
esmo con
stituíd
a na in
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erman
ece vigente n
o adu
lto.
Existe, assim
, um
infan
til no p
siquism
o que n
ão se restringe n
em se d
is-
solve com a in
fância, em
bora encon
tre nesta su
a matriz.
Com
o um
mín
imo en
redo p
rét-à-p
orter, o su
jeito porta con
sigo um
a
matriz com
a qual in
terpreta os even
tos da vid
a, sejam eles cotid
ianos
e desp
retensiosos, ou
pon
tualm
ente cru
ciais. Com
a psican
álise, expe-
rienciam
os a possibilid
ade d
e abrir e desarticu
lar as vicissitud
es dessa
matriz en
gend
rada n
a repetição.
A Jorn
ada d
e Abertu
ra da A
PP
OA
em 2011 p
retend
e ind
agar a infân
-
cia como fu
nd
adora d
o sujeito e d
as marcas qu
e constitu
em su
a erótica e
seu sofrim
ento, qu
e perm
anecem
para além
desse p
rimeiro tem
po. Para
isso, é fun
dam
ental abord
ar a infân
cia prop
riamen
te dita a p
artir de qu
es-
tões presen
tes na clín
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a voz, desd
e o grito e a fúria até o ron
ronad
o cari-
nh
oso, incid
e na m
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o sujeito? Q
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do u
ma crian
ça, um
adolescen
te, ou u
m ad
ulto está em
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ais os infan
tis em jogo além
do d
ele próp
rio: o dos p
ais, o do an
alista? Com
o eles se enlaçam
per-
mitin
do e oferecen
do resistên
cia à análise? Q
uais são as con
dições p
ara o
fim d
e análise com
crianças? Q
ual o lu
gar das p
ulsões n
a travessia da
fantasia e d
a cura? Fan
tasiar é privilégio d
o infan
til? A fan
tasia é marca
da in
fância n
a vida ad
ulta? Q
uais efeitos d
o fantasiar n
a neu
rose? O qu
e
as relações de violên
cia nos d
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fantil d
a atualid
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a fantasia” – D
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15h – “In
fantil eu
?” Maria Lu
cia Mu
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– Mem
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Intervalo
“Violên
cia e agressividad
e na in
fância” – A
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iões quin
zenais, gratu
itas e abertas aos inte-
ressados.
As p
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niões terão com
o leitura o texto d
e Freud
“Um
a criança
é espan
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tribuição ao estu
do d
a origem d
as perversões
sexuais (1919), d
o volum
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reciso cantar
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reciso cantar e alegrar a cid
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ltimo carn
aval. Mas n
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portou
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a infân
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zas nas ru
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de esvoaçavam
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ojos de serp
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po ou
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a ano, m
esmo d
e fantasia ren
ovada, a
aposta d
e reviver os anteriores, n
um
a inesgotável rep
etição.
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aval: quatro d
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esmo jeito,
pois só é p
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a quarta-feira d
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o a lógica da “sabed
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acrinh
a”: “só acaba quan
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po in
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cia, quan
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aval: eterna p
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l.
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de as batu
cadas d
o samba-en
redo, d
o forró,
do frevo e d
os maracatu
s não ch
eguem
. Ir para u
ma p
raia deserta (qu
ase-
raridad
e) ou p
ara o “exterior”1 torn
am-se as m
elhores op
ções – embora
estrangeiro algu
m con
siga acreditar qu
e um
brasileiro faça tal movim
en-
to nessa d
ata em qu
e o país tran
spira felicid
ade.
Mas h
á, talvez em n
úm
ero maior, os ap
aixonad
os que en
contram
semp
re um
jeito de cair n
a farra. Algu
ns d
esfilam tod
o o ano n
a Sap
ucaí
e afirmam
que é u
ma exp
eriência in
esquecível. N
ão du
vido, d
eve ser mes-
mo. O
Rio virou
também
sinôn
imo d
os melh
ores blocos de carn
aval de
rua, d
esbancan
do a festa qu
e era livre em S
alvador. E
agora, altamen
te
organizad
a, se transform
ou em
um
a disp
uta p
elos abadás.
Há carn
aval em tod
a a terra, para tod
os os gostos, jeitos e mem
órias.
De m
inh
a infân
cia, lembro d
os inesqu
ecíveis bailes infan
tis da SA
T,
em qu
e íamos p
intad
os de cola p
lástica colorida (p
lasticor) com os m
ais
variados d
esenh
os que fazíam
os – com a em
polgação n
atural d
e min
ha
mãe, em
nossos corp
os infan
tis. Fantasia e corp
o se mistu
ravam n
a mais
íntim
a ilusão. N
a infân
cia, o Eu
porta, ain
da sem
i-vestido, o frescor d
o
véu im
aginário, fazen
do soar p
osteriormen
te com m
ais ginga o d
up
lo sen-
tido d
a palavra fan
tasia, também
como rou
pa (qu
içá um
a ‘segun
da p
ele’”?).
“Ch
iquita bacan
a lá da M
artinica,
se veste com u
ma casca d
e banan
a-nan
ica.
Não u
sa vestido, n
ão usa calção…
”
(Versin
ho d
ifícil de en
tend
er na in
fância: n
ão sabia ao certo se a
Ch
iquita era n
anica ou
era um
a macaca m
esmo – sen
do a m
acaca Ch
ita,
do Tarzan
, seu n
ickn
am
e!)
Se con
siderarm
os as relações hu
man
as essencialm
ente p
ertencen
tes
ao camp
o da fan
tasia ou d
o delírio, n
ada m
elhor qu
e um
a festa anu
al
marcad
a de an
temão, in
stituin
do qu
atro dias d
e reconh
ecimen
to no “m
un
-
do real” d
aquilo qu
e passam
os o ano son
han
do. S
onh
o, fantasia, d
eva-
neio ou
delírio tom
am as ru
as sem d
istinção e livres d
as exigências su
per-
egóicas que n
os amarram
o cotidian
o. Trata-se m
esmo, com
o diz R
oberto
DaM
atta, de u
ma “viagem
da rotin
a para o extraord
inário”.
O term
o “fantasia” d
esigna, p
ara Freud
, a vigência d
o prin
cípio d
o
prazer. C
onsid
era que o ato d
e fantasiar, assim
como o d
elírio e o deva-
neio, d
esemp
enh
a no p
siquism
o a mesm
a fun
ção, ou seja, d
e satisfação
de d
esejos. Freud
ianam
ente, a fan
tasia é um
a constru
ção imagin
ária que
perm
ite a satisfação de u
m d
esejo recalcado ao en
laçar pu
lsão e incon
s-
ciente em
um
a costura cu
jo pan
o de fu
nd
o está o sexual. Freu
d tam
bém
aproxim
a a fantasia ao brin
car infan
til, quan
do é p
ossível fazer laço entre
o mu
nd
o da im
aginação e o m
un
do d
as coisas visíveis e tangíveis.
1Morais M
oreira e Abel Silva compuseram
uma m
úsica em referência a São João (tam
bém um
a festa popular), chamada
“Festa do interior”. A letra joga com a polissem
ia da palavra interior: “Ardia aquela fogueira Que me esquentava A vida
inteira Eterna noite Festa do interior”
ma
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11
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OA
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11
24.
tem
átic
a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
Se, “n
o lado A
da vid
a”, do brin
car ao fantasiar exige d
o sujeito u
ma
operação d
e perd
a de objetos reais, p
odem
os pen
sar o carnaval com
o o
lado B
, ond
e seria possível fazerm
os a operação in
versa, livres da d
imen
-
são da p
erda qu
e imp
lica o acesso à realidad
e (freud
iana) e m
ergulh
ados
em u
m gozo m
ítico. Nesse sen
tido, a exp
ressão “brincar o carn
aval” faz a
pon
te alud
ida.
Ou
tra expressão in
teressante qu
e refaz novam
ente esse laço é “en
trar
na folia”. Folia e lou
cura, n
a língu
a francesa, têm
origem sem
ântica co-
mu
m e ap
arecem m
esmo com
o sinôn
imos. Foliões, p
assistas, carnavales-
cos: todos se con
fun
dem
na aven
ida. N
ovamen
te aí encon
tramos rela-
ções meton
ímicas en
tre delírio, fan
tasia e devan
eio.
O retorn
o à infân
cia – infân
cia no sen
tido qu
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álise prop
õe,
mais u
ma vez retu
mba aos qu
atro ventos n
esses dias d
e festa. Nas
march
inh
as de C
arnaval, o tem
a da sexu
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e encon
tra-se em ch
eio
referido ao in
fantil. A
s letras – jocosas, inocen
tes ou m
aliciosas, jogam
com d
up
los sentid
os e com o n
on
-sense, p
rovocand
o nos p
assistas o gozo
de u
m can
tar-quase-balbu
ciante:
“Mam
ãe eu qu
ero,
Mam
ãe eu qu
ero,
mam
ãe eu qu
ero mam
ar”
March
inh
a entoad
a na p
rimeira p
essoa do sin
gular, p
resente em
todo o baile qu
e se preze!
Mesm
o sabend
o que o extraord
inário d
eve termin
ar (faz parte d
e seu
conceito), h
á um
mom
ento em
que se in
icia o retorno à vid
a comu
m. E
isso no carn
aval até nom
e tem (êta orgia organ
izada!): qu
arta-feira de
cinzas. D
ia em qu
e o trabalho com
eça na m
etade, d
ia meio com
cara de
feriado, m
eio com cara d
e descan
so, meio sem
cara de n
ada. D
ia difícil d
e
se encarar!
O qu
e sabemos é qu
e quan
do se ap
aga a últim
a estrela da m
adru
-
gada d
a quarta-feira, qu
and
o a ressaca se mistu
ra a um
a tristeza-quase-
natu
ral, se apagam
também
os dias d
e folia… N
as ruas m
ortas, o retorno
ao cotidian
o, ao ordin
ário. O trân
sito contorn
a os garis, ocup
ados em
recolher a serp
entin
a desm
ontad
a, o lança-p
erfum
e vazio, as latinh
as de
cerveja, camisin
has-d
e-Vên
us…
restos de fan
tasias para gu
ardarm
os
entre as lem
branças m
ais urgen
tes. Em
meio a bu
zinas d
e carros e pes-
soas camin
han
do ap
ressadas, é p
ossível ouvir ain
da, m
eio fora do tom
–
e quem
sabe, acomp
anh
ada d
e um
a tímid
a batucad
a em u
ma caixin
ha
de fósforos, u
ma can
ção de C
aetano V
eloso:
“Vamos viver
Vamos ver
Vamos ter
Vamos ser
Vamos d
esenten
der
Do qu
e não
Carn
avalizar a vida, coração!”
Re
ferê
nc
ias b
iblio
grá
fica
s
DAMATTA, Roberto A.. “O que faz o brasil, Brasil?”. Rio de Janeiro: Rocco, 1984.
FREUD, S. “El Poeta e los Sueños Diurnos.” Obras Completas, vol. II. Editorial Biblioteca Nueva. M
adrid, 1981.
LISPECTOR, Clarice. Restos do Carnaval. In: Felicidade Clandestina. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.
ma
rço
20
11
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temátic
a.
Ca
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Pa
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Luís A
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Já devo ter d
ito aqui, m
as não im
porta: a gen
te vai dem
orar mu
ito até
avaliar a imp
ortância d
e ser contem
porân
eo de C
aetano V
eloso (e de C
hico
Bu
arque e ou
tros). O tam
anh
o, a extensão e a p
rofun
did
ade, o alcan
ce
enfim
da obra d
o baiano é qu
alquer coisa d
e extraordin
ário.
Não, n
ão estou qu
erend
o dizer qu
e ele é o melh
or, que só ele é qu
e é,
que su
a obra é toda m
aravilhosa. E
stamos falan
do d
e outra d
imen
são da
coisa: sua obra, d
e alto a baixo, com m
uito m
ais altos que baixos, é u
m
detalh
ado e com
ovente com
entário sobre a cu
ltura brasileira, com
pre-
end
ida esta em
seu sen
tido m
ais geral e mais rigoroso – d
esde a cu
ltura
pop
ular m
esmo, aqu
ela de can
ção de n
inar, d
e reza e de m
odo d
e arar a
1 Originalmente escrito para o jornal ABCDom
ingo, em 24 de janeiro de 1999. Publicado no livro Contra o esquecim
ento.Porto Alegre: Artes e Ofícios, 2001.
ma
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11
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11
28.
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átic
a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
terra, até a cultu
ra mais sofisticad
a, aquela qu
e vai de M
achad
o a João
Cabral, d
e Aleijad
inh
o a Brasília, d
o samba origin
al a João Gilberto.
Caetan
o realiza, em carn
e e osso, mais isto qu
e aquilo, real e m
etafo-
ricamen
te, o ideal d
o artista-crítico, que n
ão apen
as prod
uz su
a obra,
mas tam
bém a faz d
obrar-se sobre a matéria p
rima d
e que se serve, p
ara
analisá-la, p
ara examin
á-la, para torn
á-la objeto de estran
ham
ento e d
e-
pois objeto d
e nova fam
iliaridad
e. É u
m caso acabad
o do artista m
oder-
no, d
o artista do sécu
lo 20, por sin
al que já em
seus estertores.
Tive ocasião d
e experim
entar essa sen
sação há p
ouco tem
po. S
end
o
contem
porân
eo de su
a carreira (nasci em
58, Caetan
o em 42; qu
and
o ele
apareceu
na televisão eu
era um
a criança d
e 10 anos qu
e não en
tend
ia
nad
a daqu
ela cabeleira enlou
quecid
a que d
izia coisas incom
preen
síveis
e sensatas, altern
ada ou
simu
ltaneam
ente), vivi sem
pre m
inh
a experiên
-
cia cultu
ral sob o signo d
e sua obra, com
o quase tod
o mu
nd
o no p
aís na
min
ha geração. M
as há p
ouco, ao d
ar um
curso sobre m
úsica p
opu
lar
brasileira em R
osário, Argen
tina, m
e caiu a fich
a (gíria esta que, p
or sinal,
está perd
end
o vigência, d
epois d
a inven
ção do cartão m
agnético p
ara
usar telefon
e pú
blico). Caetan
o tem com
o assun
to toda a trad
ição, nu
m
nível m
ais radical qu
e Ch
ico, Paulin
ho d
a Viola e ou
tros men
os interes-
santes. (G
il é bem ou
tro caso: é um
a usin
a de can
ções corretas, que se
debru
çam sobre os tem
as da vid
a real e com ela p
rodu
zem m
etáforas de
bom n
ível, mas sem
o conteú
do essen
cialmen
te crítico, radicalm
ente
comen
tarista-da-cu
ltura d
e Caetan
o.)
Bem
. Dito isso, p
recisamos p
assar para u
m caso con
creto. Podería-
mos tom
ar o livro de C
aetano, V
erdad
e tropical, e a p
artir dele d
emon
s-
trar a excelência d
o autor – d
e novo, n
ão estamos falan
do qu
e no livro
Caetan
o só diga gen
ialidad
es, nem
mesm
o que acerte sem
pre; m
as é ine-
gável que se trata d
e um
dep
oimen
to med
itado e in
formad
o, feito por
alguém
que esteve e está n
o centro d
os acontecim
entos d
a cultu
ra bra-
sileira há 30 an
os, e parece qu
e daí n
ão sai antes d
e morrer. Pen
sa um
pou
co: de qu
e outro artista, d
e qualqu
er área, temos u
ma m
editação
assim tão p
retensiosa e tão exigen
te? Me d
iz o nom
e, já nem
digo d
e
um
cancion
ista, mas d
e um
escritor, de u
m cin
easta, que ten
ha feito o
mesm
o. Tem? N
elson R
odrigu
es, talvez Gláu
ber Roch
a, e quase n
in-
guém
mais.
Mas vam
os ficar com u
m caso m
ais singelo: a can
ção que abre seu
mais recen
te disco, tiran
do o P
rend
a M
inh
a, qu
e é meia-boca, d
isco
provocativam
ente ch
amad
o Livro, lançad
o, olha só, ju
nto com
seu livro,
que arrem
eda o n
ome d
e um
a canção an
tiga. Brin
cadeira p
or brincad
ei-
ra, Caetan
o é mestre em
baralhar p
osições, nu
m p
rocedim
ento qu
e a
cada n
ova obra nos obriga a rever p
osições. Pode fazer a exp
eriência: a
cada n
ovo disco, C
aetano su
cessivamen
te nos d
esagrada e n
os encan
ta.
Nu
nca faz o qu
e já estava previsto, n
un
ca repisa o terren
o já conqu
istado.
Na d
ialética novid
ade versu
s redu
nd
ância, C
aetano sem
pre op
ta pelo
prim
eiro termo, im
pon
do ao ou
vinte o d
esconforto p
edagogicam
ente
essencial p
ara o conh
ecimen
to: a gente ou
ve, estranh
a, recusa, ou
ve de
novo e se m
aravilha, já ten
do en
tend
ido, já n
a outra m
argem d
o rio da
inteligên
cia.
A p
rimeira can
ção do d
isco se cham
a Os p
assistas e diz assim
:
“Vem
,
Eu
vou p
ousar a m
ão no teu
quad
ril
Mu
ltiplicar-te os p
és por m
uitos m
il
Fita o céu,
Rod
a:
A d
or
Defin
e nossa vid
a toda
Mas estes p
assos lançam
mod
a
E d
irão ao mu
nd
o por on
de ir
Às vezes tu
te voltas para m
im
Na d
ança, sem
te dares con
ta enfim
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30.
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a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
Qu
e também
Am
as
Mas, ah
!
Som
os apen
as dois m
ulatos
Fazend
o poses n
os retratos
Qu
e a luz d
a vida im
prim
iu d
e nós
Se d
esbotássemos, ou
tros revelar-nos-íam
os no C
arnaval
Rou
bemo-n
os ao deu
s Temp
o e nos d
emos d
e graça a beleza total, vem
Nós,
Cartão-p
ostal com tou
ros em M
adri,
O C
orcovado e o R
eden
tor daqu
i,
Salvad
or,
Rom
a
Am
or,
On
de qu
er que estejam
os jun
tos
Mu
ltiplicar-se-ão assu
ntos d
e mãos e p
és
E d
esvãos do ser”
O tem
a declarad
o da can
ção é os passistas. Q
uem
são eles? São aqu
e-
las figuras en
cantad
oras e fugazes, qu
e executam
sua arte com
o um
balé
de ru
a, imp
rovisado e sem
pre ren
ovado, sen
do n
o entan
to previsíveis:
um
sorriso, um
trejeito de om
bro, um
deslocar d
e pern
as e quad
ris, o
tronco n
o mais d
as vezes ereto, emp
ertigado até, u
m m
alabarismo, u
m
passo m
iúd
o que p
arece não caber n
o temp
o do ritm
o e no esp
aço da
avenid
a. São aqu
elas figuras qu
e, no an
o civil, fazem o qu
e todos fazem
–
trabalham
, ganh
am p
ouco, se irritam
, amam
, sofrem, se satisfazem
, pa-
gam os carn
ês Deu
s sabe como. M
as no ep
isódio d
o carnaval, p
or sua
vez recorrente e esp
erado, d
omin
am a cen
a. Dom
inam
a cena visu
al, e
não m
ais que isso: são m
enos im
portan
tes que os ritm
istas, são men
os
imp
ortantes p
ara o enred
o que os qu
e carregam fan
tasias temáticas, são
men
os imp
ortantes qu
e os que p
ortam as ban
deiras. C
om tod
a essa
desim
portân
cia, é para eles qu
e nosso olh
ar é cham
ado.
É d
e anotar qu
e passistas costu
mam
se destacar n
o samba d
e and
a-
men
to rápid
o, no sam
ba-enred
o. Cu
riosamen
te, a canção já in
screve
um
a tensão en
tre o tema, os p
assistas, e seu an
dam
ento, m
ais próxim
o
do sam
ba-canção, m
ais lento, qu
e no en
tanto vem
na gravação m
arcado
por u
ma p
ercussão m
ais que evid
ente, com
um
a caixa fazend
o um
acom-
pan
ham
ento m
arcante, o qu
e contraria a n
atureza m
elancólica e reco-
lhid
a do sam
ba-canção típ
ico.
A voz qu
e fala o texto faz a figura d
e um
passista, certam
ente h
o-
mem
, que con
vida su
a parceira p
ara o bailado: vem
, eu vou
botar a mão
no teu
quad
ril, mu
ltiplicar-te os p
és por m
uitos m
il. E d
iz mais, p
ede
que ela olh
e para o céu
(lembran
ça associada: o sam
ba-canção C
oisas do
mu
nd
o, min
ha n
ega, obra genial d
o Paulin
ho d
a Viola, qu
e lá pelas tan
tas
confessa p
ara sua in
terlocutora, su
a amad
a, que d
eseja arden
temen
te
chegar p
erto dela, d
epois d
e um
dia d
e agruras, n
a expectativa d
e estreitá-
la em seu
s braços e ver de p
erto aquele sorriso qu
e ela entrega p
ara os
céus n
esta hora). A
passista está, p
ortanto, con
vocada p
ara a atuação:
entregar-se ao com
and
o do p
assista, que a con
du
zirá, fazend
o seus p
és
serem m
ilhares in
contáveis, e en
tregar para a arqu
ibancad
a – pois qu
e é
disso qu
e se trata no C
arnaval – o rosto d
eslum
brante e d
eslum
brado.
Nesta h
ora, para cu
lmin
ância, d
iz o passista p
ara sua p
arceira: roda.
Ela d
eve fazer o movim
ento qu
e a passista faz, qu
e a porta-ban
deira faz,
que a baian
a faz. Mas esse com
and
o, “roda”, vem
na m
elodia n
um
pon
to
dos m
ais altos da escala m
usical, n
um
a espécie d
e ápice d
a canção, qu
e
coincid
e com o áp
ice do m
ovimen
to descrito. E
la roda? S
im, ela rod
a, a
passista, e assim
também
as letras da p
alavra “roda”: n
o verso seguin
te,
o passista d
escobre o palín
drom
o que se escon
dia n
a palavra “rod
a” –
“a dor”, qu
e será o sujeito d
a afirmativa segu
inte, a d
or defin
e nossa
vida tod
a. Para comp
ensar esse p
equen
o horror, aqu
eles passos lan
çam
ma
rço
20
11
l co
rre
io A
PP
OA
.33
co
rre
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PP
OA
l ma
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20
11
32.
tem
átic
a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
moda e d
ão o rum
o nad
a men
os que p
ara o mu
nd
o, nu
ma p
retensão
que m
istura soberba d
esmed
ida e con
sciência m
edid
a – pois n
ão é ver-
dad
e, afinal, verd
ade trop
ical, que vivem
os no m
un
do d
o espetácu
lo, e
que o B
rasil é o paraíso, se visto d
e fora especificam
ente n
a cultu
ra do
carnaval?
Se a m
elodia até a p
alavra “roda” estava n
um
and
amen
to ascend
en-
te, do m
ais grave para o m
ais agud
o, dep
ois dela a m
elodia d
esliza para
baixo, nu
m m
ovimen
to de relaxam
ento, d
a canção e d
o movim
ento d
a
passista. N
as du
as outras estrofes, acon
tece o mesm
o pico, o m
esmo
movim
ento d
e ascensão em
direção a u
ma p
alavra nod
al, que será su
ce-
did
a de ou
tra palavra-an
agrama (am
as/mas ah
) ou d
e outro p
alínd
romo
(Rom
a/amor), d
epois d
a qual a can
ção volta ao repou
so, que p
or sua vez é
tenso ao fin
al, com u
ma su
bida em
direção à região agu
da, em
disson
ân-
cia contid
a.
Na segu
nd
a estrofe, dep
ois de u
m com
entário am
bíguo (tu
te voltas
para m
im), qu
e se refere aind
a ao movim
ento d
o corpo m
as também
ao
do esp
írito – a passista tam
bém am
a, ama o qu
e faz, ama o estar d
ançan
-
do, am
a o estar send
o vista –, o passista observa qu
e ambos são “ap
enas”
dois m
ulatos, d
ois tipos h
íbridos, d
ois represen
tantes d
a etnia p
redo-
min
ante n
o país, d
ois elemen
tos cruzad
os, que d
e resto se cruzam
na
coreografia. Mais qu
e isso: embora sejam
esplen
dorosos, em
bora até
amem
, o que fazem
os dois é ap
enas p
oses nos retratos qu
e não u
m fotó-
grafo, mas a vid
a mesm
a faz deles. R
etratos: poses p
ara contem
plação.
Afin
al, pod
eríamos p
ergun
tar: o que fazem
os passistas é viver ou
“ape-
nas” rep
resentar? A
quilo tu
do é a verd
ade ou
não p
assa de u
m in
tervalo,
de u
ma en
cenação p
ara o turista?
Propõe en
tão o passista u
ma h
ipótese: se eles d
esbotassem (“d
esbo-
tar” é perd
er a cor, que já n
ão é tão nítid
a assim n
os mu
latos, mas tam
bém
contém
um
a idéia d
e desfazer o ato d
e botar, quem
sabe o deixar d
e botar
banca, p
or exemp
lo), no C
arnaval seriam
outros. Q
ue ou
tros? Men
os pas-
sistas, men
os fotografáveis, men
os brasileiros? É d
e notar, en
tre parên
-
teses, que a voz d
a letra da can
ção, send
o a de u
m p
assista típico, ce-
rtamen
te usaria, n
a vida real, n
ão “tu”, m
as “você”, com con
cordân
cia
em terceira p
essoa; no en
tanto, tod
a a fala do p
assista para a p
assista
vem em
segun
da p
essoa, e mais qu
e isso, em segu
nd
a pessoa can
ônica,
com a flexão d
o verbo em registro cu
lto, e mais ain
da, com
os pron
omes
usad
os conservad
oramen
te (mu
ltiplicar-te, revelar-n
os-íamos, m
ultip
li-
car-se-ão), nu
m m
ovimen
to de lin
guagem
perfeitam
ente d
issonan
te em
relação ao tema, carn
aval, e aos person
agens, p
opu
lares por su
posto. E
isso cria mais efeito d
e tensão qu
e pod
eria ser jocoso, mas n
ão é: a do-
çura d
a canção e d
a interp
retação imp
ede qu
e ouçam
os essa ortodoxia
na colocação d
os pron
omes com
o paród
ia – tud
o é dito a sério. Forçan
do
um
pou
co a observação: a ênclise e a m
esóclise, que h
oje em d
ia só exis-
tem n
a gramática, são o su
pra-su
mo d
a veleidad
e culta, d
a lingu
agem
rui-barbosa, d
o jurid
iquês; m
as não d
estoam, n
o contexto d
este samba-
canção qu
e é ao mesm
o temp
o um
a med
itação sobre o ser do sam
ba e da
cultu
ra, porqu
e de algu
ma m
aneira são, tam
bém elas, u
ma p
ose para
retrato, um
a pose cu
riosa, de en
cantar tu
rista, de em
basbacar a arqui-
bancad
a.
Por fim, n
a terceira estrofe, se desfaz em
parte a p
ossibilidad
e de
um
a leitura tão literal com
o a que fizem
os até agora. Ele e ela, u
nid
os, já
são um
“nós”, u
ma ou
tra entid
ade, com
pósita, qu
e circula m
eio deliran
-
temen
te por ou
tros cenários, on
de n
ão há carn
aval, ond
e não h
á lugar
para m
ulatos brilh
arem n
a passarela – M
adri e R
oma, qu
e por ou
tra parte
são cidad
es latinas, em
bora sem m
ulatos, sem
samba, m
as que têm
, ambas,
a tradição d
o espetácu
lo, em M
adri a tou
rada, em
Rom
a a arena d
os leões
e o circo. Tourear p
or tourear, assim
acontece n
a passarela d
o samba,
entre o e a p
assista, como tam
bém en
tre touro e tou
reiro, entre leão e
cristão, com d
esfechos d
iversos e bailado sem
elhan
te. Porque agora, n
es-
te desfech
o, se trata de m
etáfora aberta: se tud
o é pose p
ara os retratos
que a vid
a faz, então tu
do é p
ose mesm
o, e em tod
os os casos, no B
rasil ou
na E
urop
a latina, o d
iálogo/encon
tro entre os d
ois – ou p
assistas singelos,
ma
rço
20
11
l co
rre
io A
PP
OA
.35
temátic
a.
co
rre
io A
PP
OA
l ma
rço
20
11
34.
tem
átic
a.
Ca
rna
va
l Ta
í
Ivan C
orre
a1
Qu
and
o criança, n
os anos 30, ou
vi a seguin
te canção carn
avalesca:
“Carn
aval tá aí, vamos vad
iar...” A h
omon
ímia p
rovocada p
elo “está aí” e
a corrup
tela tá’í me fez ou
vir Taí, como se Taí fosse o n
ome d
o Carn
aval e
o Carn
aval fosse um
person
agem.
Esta lem
brança d
a infân
cia me ch
ama a aten
ção para a estru
tura d
a
equivocid
ade d
a lingu
agem. Tod
o o charm
e do C
arnaval joga sobre o equ
í-
voco. Desd
e as máscaras, p
assand
o pelos d
iversos person
agens com
o rei
e rainh
a do M
aracatú, os Pap
angú
s, os Caretas e assim
por d
iante.
Sem
a equivocid
ade d
a lingu
agem, d
e fato, não p
ode h
aver poesia
nem
literatura, n
em os en
cantos d
o Carn
aval, que fazem
as pessoas se
sentirem
felizes com os m
omen
tos de ilu
são. Ilusão com
o fonte d
e feli-
ou an
imal e h
omem
, ou qu
alquer d
up
la de am
antes – m
ultip
licará assun
-
tos de m
ãos e pés, n
o camp
o dos assu
ntos físicos, ou
de d
esvãos do ser, n
o
dos m
etafísicos.
O qu
e está em jogo, en
tão? Do tem
a singu
lar, o convite d
o passista
para su
a comp
anh
eira, o cham
amen
to para a ação ou
para a sim
ulação
do en
lace amoroso, p
assamos p
ara o tema geral, o con
vite para o am
or,
que é en
contro e é p
ose, que é ação e é retrato, qu
e é verdad
e factual e
fabulação, sim
ultân
ea ou altern
adam
ente. E
atire a prim
eira ped
ra, iaiá,
aquele qu
e descon
hece esta d
ança.
1 Psicanalista do Centro de Estudos Freudianos do Recife.
ma
rço
20
11
l co
rre
io A
PP
OA
.37
co
rre
io A
PP
OA
l ma
rço
20
11
36.
tem
átic
a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
cidade, como já ap
ontava G
oethe n
os Sofrim
entos d
e Werth
er: “... em
meu
coração guard
ei esta verdad
e: devem
os fazer com as crian
ças como
Deu
s faz conosco, qu
e nos torn
a felizes deixan
do-n
os vaguear en
voltos
em am
oráveis ilusões.”
Podem
os acrescentar qu
e é graças aos equívocos d
a lingu
agem qu
e
pod
e haver Psican
álise, pois o In
conscien
te se man
ifesta através de su
as
formações, qu
e têm a ver com
os tropeços, os lap
sos, ou, sim
plesm
ente,
com a p
olissemia d
as palavras.
São os “trop
os” literários que p
ermitem
os desvios p
oéticos e retóri-
cos para bem
-dizer, com
arte, elegância e beleza.
Segu
nd
o Platão, em
seu C
rátilos, a lingu
agem n
ão é feita para a
comu
nicação, m
as para o en
gano, já qu
e foi inven
tada p
or um
deu
s
engan
ador. C
rátilos havia feito a observação qu
e o nom
e de H
ermógen
es
era tronch
o, Herm
ógenes n
ão era “bem n
omead
o” como os ou
tros ho-
men
s e as coisas.
Herm
ógenes p
rocura en
tão Sócrates p
ara subm
eter a ele o enigm
a do
seu n
ome. S
ócrates faz um
a coup
ure, u
m corte – an
tecipan
do o estilo
lacanian
o – e lhe resp
ond
e prop
ond
o encon
trar em seu
nom
e Herm
es, o
deu
s engan
ador qu
e inven
tou a lin
guagem
.
Herm
es, com efeito, filh
o de Z
eus e M
aia, no m
esmo d
ia de seu
nas-
cimen
to – na m
itologia grega –, deixou
o seu berço e in
ventou
a lira,
matan
do u
ma tartaru
ga que en
contrara e u
sand
o a carcaça para fazer
este instru
men
to mu
sical.
No m
esmo d
ia, roubou
cinqü
enta vacas p
ertencen
tes a Ap
olo, fa-
zend
o-as march
arem p
ara trás para evitar qu
e seus rastros p
ud
essem
ser seguid
os. Qu
and
o Ap
olo apareceu
, encolerizad
o, Herm
es o deixou
tão alegre oferecend
o-lhe a lira d
e presen
te, que A
polo lh
e deu
em troca
as vacas roubad
as, além d
e vários pod
eres divin
os.
Herm
ógenes é “m
al nom
eado”, d
iz Sócrates, p
orque n
ão enten
de
nad
a sobre a palavra, sobre o logos.
A p
olissemia d
o logos grego ilustra o en
gano e a equ
ivocidad
e da
lingu
agem, p
ois pod
e ser palavra, m
as também
termo, sen
tença, p
rovér-
bio, narração, d
iscurso, p
roposição, argu
men
to, ou a razão com
o faculd
a-
de, o ju
lgamen
to, o juízo, o fu
nd
amen
to racional. N
o camp
o matem
ático,
é a “razão” como a relação en
tre du
as grand
ezas sem valor n
um
érico que
guard
am certa p
roporção, a razão en
tre A e B
, por exem
plo. A
iguald
ade
entre d
uas razões é u
ma p
roporção ou
“analogia”. E
sta relação entre d
uas
grand
ezas, este logos, é a próp
ria gênese d
o pen
samen
to: In p
rincip
io erat
verbum
. É p
or aí, segun
do os gregos, qu
e se começa a p
ensar.
O m
esmo ocorre com
a mágica p
alavra africana U
BU
NT
U, com
um
a vários idiom
as daqu
ele contin
ente. U
bun
tu, h
um
anid
ade, é tam
bém
amizad
e, solidaried
ade, com
un
idad
e, ajud
a mú
tua, afeto, com
preen
são,
felicidad
e, convivên
cia e tud
o de bom
que p
ode existir en
tre os seres
falantes.
São esses “n
ós” polissêm
icos da lin
guagem
que su
stentam
a retórica,
que p
ermitem
a expressão p
oética, mas tam
bém levam
aos tropeços, aos
equívocos e ao su
rgimen
to do S
ujeito d
o Incon
sciente, com
seus d
esejos
descon
hecid
os por terem
sido recalcad
os. O qu
e equivale a d
izer que é
um
fenôm
eno qu
e apresen
ta semp
re a du
plicid
ade, o equ
ívoco essencial
do S
ignifican
te e do S
ignificad
o. Em
termos d
e Incon
sciente, a relação d
o
sujeito ao sim
bólico é fun
dam
ental.
No qu
e se põe em
palavras, h
á semp
re um
a elaboração imp
rópria e
semp
re fatalmen
te distorcid
a do qu
e seria um
a realidad
e irredu
tível. Há
semp
re, fatalmen
te, um
tropos, u
m d
esvio. A relação d
o significan
te ao
significad
o, não é, d
e forma algu
ma, u
ma relação biu
nívoca n
o sentid
o
matem
ático.
A sign
ificação é o discu
rso hu
man
o, enqu
anto en
via semp
re a outra
significação. H
á algo de arbitrário n
o corte de u
ma frase en
tre os diversos
elemen
tos. Há as u
nid
ades qu
e são as palavras. M
as quan
do se olh
a de
perto, n
ão são tão un
itárias assim... A
todo in
stante o sistem
a em evolu
-
ma
rço
20
11
l co
rre
io A
PP
OA
.39
co
rre
io A
PP
OA
l ma
rço
20
11
38.
tem
átic
a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
ção das sign
ificações hu
man
as se desloca e m
odifica o con
teúd
o dos
significan
tes, isto é, o significan
te toma em
pregos d
iferentes.
Esses d
eslizamen
tos de sign
ificação mostram
que n
ão há corres-
pon
dên
cia biun
ívoca entre os d
ois sistemas, sign
ificante/sign
ificado. D
e
acordo com
as leis do in
conscien
te formu
ladas p
or Freud
, um
qu
i pro
qu
o, um
calem
bo
ur, u
m v
au
dev
ille, pod
em ser o p
ivô essencial qu
e sus-
tenta u
m sin
toma.
Os E
stóicos distin
guiam
três coisas, que se en
contram
conectad
as
ao lekto
n:
. o Sign
ificado – S
ema
ino
men
on
. o Sign
ificante – S
ema
ino
ne
. o Objeto ou
Acon
tecimen
to – Tugka
non
O S
ignifican
te é a voz. O qu
e é significad
o é a coisa, tornad
a eviden
te
pela voz e qu
e apreen
dem
os como existen
te ao mesm
o temp
o em qu
e a
voz, graças à nossa in
teligência ou
ao lekto
n. O
s “bárbaros” – os que n
ão
sabem grego – m
esmo qu
e ouçam
a voz e vejam o objeto, n
ão pod
em
comp
reend
er.
Du
as destas coisas são corp
óreas: o som d
a voz e o objeto – Sem
ain
on
e Tugka
non
. A ou
tra é incorp
órea: o significad
o – Sem
ain
om
eno
n.
O L
ekto
n n
ão é nem
a palavra, n
em o objeto, n
em o con
ceito, mas o
laço estabelecido en
tre o un
iverso exterior e nós m
esmos, em
virtud
e da
presen
ça do logos em
nós. E
le ocup
a um
lugar excep
cional n
a filosofia
estóica. Esta su
stenta, d
e fato, que tu
do é corp
o, até mesm
o a alma.
Não se d
eve confu
nd
ir o lekto
n com
a coisa – pragm
a – nem
com o
acontecim
ento – tu
gkan
on
– a que ele se refere, m
as também
o que é m
ais
sutil – com
a represen
tação no esp
írito, ou o ato d
e pen
samen
to pelo qu
al
o acontecim
ento é ap
reend
ido, p
ois estas operações m
entais p
ertencem
também
, como tais, ao m
un
do d
os corpos, ou
dos fatos, ou
simp
lesmen
te
ao mu
nd
o.
O lek
ton
não é u
m p
ensam
ento n
o sentid
o de u
m p
ensam
ento p
en-
sado, e n
ão no sen
tido d
e um
pen
samen
to pen
sante. V
em d
o verbo legein
– dizer ou
“querer d
izer”, significar. É
esta coisa incorp
órea e extra-mu
n-
dan
a que é o sen
tido d
e um
a expressão.
O sign
ificante é a lin
guagem
, som d
e voz ou secu
nd
ariamen
te a
escrita, que p
ertence ao m
un
do d
os corpos e qu
e percebem
os pelos sen
-
tidos. Perten
cem igu
almen
te a este mu
nd
o as coisas e os acontecim
entos.
Tud
o isto é diretam
ente acessível àqu
eles que ign
oram a lín
gua, m
esmo
aos “bárbaros” e aos anim
ais.
En
quan
to que o sign
ificado é ap
reend
ido ap
enas p
or aqueles qu
e
comp
reend
em a lín
gua, escap
a totalmen
te aos outros.
G. Frege em
seus G
run
dla
gen
der A
rithm
etik refere-se à trilogia:
Zeich
en, sign
o; Sin
n, sen
tido; e B
edeu
tun
g, significação. O
sentid
o são as
formas d
e apresen
tação de u
m objeto. A
estrela Ven
us se ap
resenta n
o fim
da tard
e como estrela vesp
ertina, e d
e mad
rugad
a como estrela m
atutin
a.
São d
uas ap
resentações, d
ois sentid
os, de u
ma ú
nica estrela, u
ma ú
nica
significação.
C. S
. Peirce (1983) consid
era três signos d
iversos: o Ícone (rep
resenta
diretam
ente o objeto), o in
dício (o objeto é d
edu
zido p
or um
nexo en
tre a
represen
tação e o objeto), e o símbolo (a con
exão é conven
cional e arbi-
trária).
A lin
guagem
começa p
ela oposição – com
o lembram
os lingü
istas – e
por isso está su
jeita aos “tropos” literários, ao jogo retórico. E
sse caráter
do S
ignifican
te marca d
e man
eira essencial tu
do qu
e é da ord
em d
o Su
-
jeito do In
conscien
te.
Ch
arles Bau
delaire (1981), n
o Meu
Coração D
esnu
dad
o, assim se
expressa: “O
mu
nd
o não m
archa sen
ão pelo m
al-enten
did
o. É p
elo
mal-en
tend
ido u
niversal qu
e o mu
nd
o inteiro se en
tend
e. Pois, se por
desgraça, os h
omen
s se comp
reend
essem, n
ão pod
eriam jam
ais se
enten
der”.
ma
rço
20
11
l co
rre
io A
PP
OA
.41
co
rre
io A
PP
OA
l ma
rço
20
11
40.
tem
átic
a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
Ch
arles Bau
delaire (ibid
) repete as resson
âncias d
e Heráclito d
e
Ëfeso qu
and
o critica Hom
ero por ter m
anifestad
o o seguin
te voto: “Oxalá
cesse a discórd
ia entre os d
euses e os h
omen
s!”
Heráclito (1991) glosa: “S
e cessasse a discórd
ia entre os d
euses e os
hom
ens, tu
do iria p
erecer...” Para ele, portan
to, é a Pólem
os, a Polêmica, o
Con
traditório, qu
e perm
ite o avanço d
as idéias. S
ugestão ou
metod
ologia
que os E
scolásticos, na Id
ade M
édia, n
o ensin
o de A
ristóteles, desen
vol-
veram através d
as did
áticas Disp
utation
es.
Heráclito é au
tor do verso n
o qual in
trodu
z o parad
oxo, a polêm
ica, a
contrad
ição: To to
tzo
on
om
a b
íos,/E
rga d
é tán
ato
s – O arco tem
o nom
e de
vida, m
as a sua ação é a m
orte.
Ele joga com
a equivocid
ade d
o significan
te bíos. Bíos é a vid
a. Mas
Biós, é o arco, a flech
a que leva à m
orte. Heráclito ressalta esse im
bri-
camen
to entre a vid
a e a morte qu
e a próp
ria palavra revela e ocu
lta ao
mesm
o temp
o. “Ser au
têntico”, já d
izia Sartre n
o seu L’être et L
e néa
nt, “é
se referir a seu n
ão-ser”.
Qu
and
o Ep
imên
ides en
un
cia sua con
fissão de au
tenticid
ade: “Tod
o
cretense é m
entiroso”, torn
a-se imp
ossível separar a verd
ade d
a men
tira.
Pois se todo creten
se é men
tiroso, ele send
o cretense está d
izend
o um
a
men
tira. En
tão é men
tira que tod
o cretense seja m
entiroso. E
le não sen
do
men
tiroso, está dizen
do a verd
ade qu
and
o diz qu
e todo creten
se é men
-
tiroso. Perman
ecemos n
um
verdad
eiro “circulo vicioso”, n
a imp
ossibi-
lidad
e de sep
arar a verdad
e da m
entira.
Se a p
roposição d
e Ep
imên
ides é m
arcada p
ela comp
letud
e, envol-
vend
o todos os creten
ses, ela se torna in
consisten
te. Ela só será con
sis-
tente, sen
do d
escomp
letada, torn
and
o Ep
imên
ides u
ma exceção en
tre os
cretenses. É
a incom
pletu
de qu
e assegura a con
sistência lógica.
À im
utabilid
ade d
o ser, proclam
ada p
or Parmên
ides ou
Zen
ão, o
Eleata, já en
controu
em H
eráclito um
opositor qu
e com o seu
pan
ta rei,
tud
o flui, d
emoliu
esta consagrad
a imu
tabilidad
e. À im
utabilid
ade d
o
ser de Parm
ênid
es, Heráclito op
ôs a imp
ossibilidad
e do ser p
erman
e-
cer idên
tico a si mesm
o, tal qual o sign
ificante, sen
do sem
pre ou
tro,
portan
to, marcad
o pela au
to-diferen
ça. Tratan
do exatam
ente d
a gênese
do p
ensam
ento, Freu
d observa n
a “Den
egação”, que o su
jeito se apresen
ta
sob a forma d
e “ser o que n
ão é”, e de “n
ão ser o que é”. E
isto em virtu
de
da p
rópria form
a como se estru
tura o seu
pen
sar. Em
virtud
e, portan
to,
de su
a próp
ria estrutu
ra de su
jeito constitu
ído p
ela equivocid
ade d
o
significan
te, pela equ
ivocidad
e da lin
guagem
.
Hegel (1975) con
sidera o “ser-igu
al-a-si-mesm
o” como u
m p
rocesso
de cisão: esta igu
aldad
e consigo m
esmo é ju
stamen
te diferen
ça iman
ente
ou in
terior. O igu
al-a-si-mesm
o se cind
e. Isto significa qu
e ele se sup
rime
como ser ou
tro, Es h
ebt sich
als a
nd
ersein a
uf. A
s diferen
ças da cisão e d
o
tornar-se igu
al-a-si-mesm
o são apen
as este movim
ento d
e se sup
ra-assu-
mirem
, pois qu
e o igual-a-si-m
esmo qu
e deve an
tes se cind
ir ou torn
ar-se
seu p
róprio con
trário, é um
a abstração ou é já ele m
esmo algo d
e cind
ido.
A cisão é, en
tão, o movim
ento d
e sup
ra-assum
ir o que ele é, B
ewegu
ng
dês sich
-au
fheb
ens e, p
ortanto, o m
ovimen
to de su
pra-assu
mir seu
ser
cind
ido, A
ufh
eben
seines E
ntz
weitsein
es.
O torn
ar-se igual-a-si-m
esmo é u
m p
rocesso de cisão. Pois, o qu
e se
torna igu
al-a-si-mesm
o se coloca de fato em
face da cisão, isto é, torn
a-se
um
cind
ido. E
sta essência igu
al-a-si-mesm
o não se refere som
ente a si
mesm
o, está aí Ou
tro sobre o qual a relação se d
irige; e este “se dirigir a si
mesm
o” é antes o ato d
a cisão e esta iguald
ade con
sigo mesm
o é justa-
men
te diferen
ça iman
ente ou
interior... “C
ada u
m é n
ele mesm
o o contrá-
rio de si.” (H
egel, 1975, p. 132-133 e 136).
Tud
o que p
ertence à exp
eriência an
alítica tem estru
tura d
e lingu
a-
gem: “É
estrutu
rado com
o um
a lingu
agem” é o bord
ão lacanian
o. Todo
fenôm
eno an
alítico, tud
o que p
articipa d
o camp
o analítico, d
a descober-
ta freud
iana, d
o que lid
amos n
o sintom
a, é estrutu
rado com
o lingu
agem,
sujeito à equ
ivocidad
e. O qu
e equivale a d
izer que é u
m fen
ômen
o que
apresen
ta semp
re a du
plicid
ade, o equ
ívoco essencial d
o significan
te e
do sign
ificado.
ma
rço
20
11
l co
rre
io A
PP
OA
.43
temátic
a.
co
rre
io A
PP
OA
l ma
rço
20
11
42.
tem
átic
a.
É este caráter d
a equivocid
ade d
as palavras qu
e perm
ite a interp
reta-
ção analítica, m
as também
a metáfora p
oética e o chiste. In
terpretar é
também
sup
or que o n
ão falado se ocu
lta na p
alavra, e que a exu
berância
do sign
ificante faz falar o qu
e não está exp
licitamen
te significad
o. Esta
du
pla fu
nção d
a interp
retação faz emergir o in
finito p
otencial p
or natu
-
reza destin
ado à su
a não atu
alização, mas qu
e nad
a pod
e limitar. A
atua-
lização do in
finito p
otencial o d
estrói na su
a próp
ria essência qu
e é ser
poten
cial. Há sem
pre sign
ificados qu
e perm
anecem
e que en
viam a u
ma
assintotia p
erman
ente.
Sobre a in
terpretação d
os sonh
os, Freud
referind
o-se a esta estrutu
ra
evoca a metáfora d
o um
bigo: “o um
bigo dos son
hos”, Tra
um
sna
bel.
O p
eríodo carn
avalesco seria o um
bigo do son
ho d
e felicidad
e?
Re
ferê
nc
ias b
iblio
grá
fica
s
BAUDELAIRE, C. Meu Coração Desnudado. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1981.
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Viv
a o
Ca
rna
va
l na
Sa
pu
ca
í 1
Co
nta
rdo
Callig
aris
A S
apu
caí tem u
m lad
o cruel. N
a avenid
a não h
á nin
guém
para
editar p
iedosam
ente as im
agens.
Imp
ossível não ver o ap
oio de d
estaque e h
armon
ia ou os em
pu
r-
radores atrás d
os carros alegóricos. Os d
iretores de ala p
uxam
, emp
ur-
ram, m
and
am p
arar ou correr. H
á fantasias qu
e se desfazem
antes d
a hora.
Aqu
ele lá perd
eu u
m sap
ato. Ou
tro foi para a aven
ida com
um
tênis p
reto
que d
estoa e brilha n
o meio d
as sand
álias dou
radas. A
í há d
ois que, em
vez de sam
bar, não p
aram d
e conversar.
As m
ulh
eres e os hom
ens m
ais bonitos, n
us, ou
quase, n
o destaqu
e,
ench
em a tela d
a televisão. O telesp
ectador p
ode im
aginar qu
e os corpos
de tod
os sejam form
osos e apetecíveis. M
as, na S
apu
caí, de p
erto, entre
1 Publicado originalmente no Jornal Folha de São Paulo, 9 de m
arço de 2000.
ma
rço
20
11
l co
rre
io A
PP
OA
.45
co
rre
io A
PP
OA
l ma
rço
20
11
44.
tem
átic
a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
as lantejou
las, aparecem
mu
itas carnes bran
cas e trêmu
las, um
pou
co
enjoativas.
Em
sum
a, pod
e surgir u
ma d
úvid
a: não era m
elhor n
a TV, tu
do bon
i-
to, tud
o aparen
temen
te espon
tâneo, u
m m
ilagre de alegria, sem
falhas e
sem erros?
Há qu
em ach
e isso mesm
o. Tarde, n
a noite d
e dom
ingo, n
um
cama-
rote, há três h
omen
s (turistas) e três m
enin
as. En
quan
to as men
inas sam
-
bam, u
m d
os hom
ens, bêbad
o, deitad
o no ch
ão, contem
pla n
a TV
a ver-
são Globo d
o desfile qu
e está passan
do logo atrás d
ele. Os d
ois restantes
preferem
fazer sua p
rópria ed
ição. Um
olha p
ara a avenid
a pela telin
ha
de su
a videocâm
ara. Ele p
repara a versão u
so família: n
ud
ez perm
itida,
mas sem
provocações. O
outro p
repara a versão d
ura: só fotografa as
mu
lheres qu
e respon
dem
obscenam
ente às su
as tentativas (eficazes, ali-
ás) de ch
amar a aten
ção.
Afin
al, eles estão vivend
o um
bom m
omen
to, quem
sabe um
sonh
o.
Por que n
ão editá-lo n
a hora? N
a mesm
a linh
a, não m
e estranh
aria que,
um
dia d
estes, um
prefeito d
o Rio colocasse telões gigan
tes no sam
bódro-
mo p
ara que p
ossamos, estan
do n
a Sap
ucaí, ver n
ossa alegria já editad
a
e, portan
to (dirão), m
ais perfeita.
Na fila p
ara comp
rar os ingressos p
ara o baile do S
cala, um
jovem
quer o baile d
e sábado, qu
e é o bom. C
inqu
enta reais é m
uito, ele d
iz, mas
desta vez ele vai, seja qu
al for o preço. C
onfessa: “N
ão aguen
to mais ver
isto só na televisão”.
Ele n
ão vai se decep
cionar. A
final, está já com
a experiên
cia editad
a
por an
os de S
cala na T
V. Su
a lembran
ça será igual a seu
sonh
o televisual
acum
ulad
o, mais a certeza d
e que ele esteve lá d
e verdad
e.
Mas voltem
os à Sap
ucaí. O
milagre é qu
e a avenid
a ganh
a da T
V.
Gosto d
as imp
erfeições, dos ven
tres moles, d
os sambas d
e pato bêbad
o e
das fan
tasias quebrad
as. É isso qu
e me com
ove. Recon
heço-m
e no esfor-
ço de tod
os, justam
ente p
orque é u
m esforço h
eróico, obstinad
o e fra-
cassado.
Mas d
e qual esforço estou
faland
o?
Sábad
o à noite, d
esfiland
o na aven
ida, às vezes a h
armon
ia enfra-
quece, a m
ágica parece estar p
restes a se desfazer. A
pren
do logo qu
e o
reméd
io é levantar os braços e os olh
os para a arqu
ibancad
a ou os cam
a-
rotes, ped
ind
o um
retorno: d
ancem
, se mexam
, se emp
olguem
conosco.
Nas n
oites seguin
tes, como esp
ectador, verifico qu
e é difícil recu
sar
este apelo. U
ma vez en
contrad
o um
olhar lá em
baixo, fica imp
ossível não
sacud
ir e acomp
anh
ar. O sam
ba é de tod
os, porqu
e é de tod
os o esforço
de se ver felizes. É
para isso qu
e serve o desfile: a arqu
ibancad
a se vê na
escola e a escola se vê na arqu
ibancad
a. Jun
tas se confirm
am n
a vontad
e
de alegria.
Afin
al, todos p
recisamos n
os ver de algu
ma form
a. Isso ped
e inven
-
ção e man
uten
ção. O C
arnaval é com
o a malh
ação anu
al coletiva neces-
sária para m
anter a im
agem, o “lo
ok” qu
e a gente qu
er. E a im
agem aqu
i
na S
apu
caí é hon
esta: não é alegria televisiva ou
babaca. Ao con
trário, é a
próp
ria imagem
do esforço qu
e custa p
assar pela vid
a man
tend
o o sorriso
e o samba n
o pé.
Nin
guém
aqui con
fun
de a fan
tasia com a rou
pa d
e cada d
ia e todos
sabem qu
e a fantasia é im
perfeita e em
baraçosa.
Há ou
tras man
eiras de ver, certam
ente. A
s mais p
atéticas são as que
tentam
passar p
or outra coisa qu
e não fan
tasias.
Por exemp
lo, algun
s anos atrás, u
m p
sicanalista fran
cês passou
o
Carn
aval no R
io. De volta à Fran
ça, declarou
a um
a assembléia ad
mirativa
que o C
arnaval carioca era, com
o ele se expressou
, “um
a experiên
cia de
gozo especu
lar”. Até aí tu
do bem
.
Mas era óbvio, n
a fala, um
desp
rezo para os ín
dios qu
e gostam d
e ser
alegres e de se olh
ar nesta alegria. N
a verdad
e o desp
rezo era pelo sim
-
ples fato d
e os índ
ios gostarem d
e se olhar - p
onto. S
uben
tend
ido: “A
gente aqu
i em Paris n
ão brinca com
espelh
inh
os; a gente n
em p
recisa se
ver; a gente, aliás, p
refere ser do qu
e se ver”. O en
graçado é qu
e ele falava
nu
ma situ
ação absolutam
ente p
arecida com
a Sap
ucaí: ele falava e su
a
co
rre
io A
PP
OA
l ma
rço
20
11
46.
tem
átic
a.
ma
rço
20
11
l co
rre
io A
PP
OA
.47
temátic
a.
arquiban
cada só qu
eria se espelh
ar nele. A
ún
ica diferen
ça é que, n
aque-
le caso, todos qu
eriam se ver n
ão alegres e felizes, mas m
etidos a besta.
Con
seguiam
mu
ito bem.
Breves:
Por que a ban
deira estam
pad
a em cam
iseta ou su
tiã pod
e, mas d
ese-
nh
ada n
o corpo n
ão pod
e?
Ad
orei Roberta C
lose como sím
bolo da liberd
ade d
e escolha. S
ão as
verdad
eiras “Diretas Já”.
As im
pressões d
e Carn
aval são como u
m bloco qu
e deveria se ch
a-
mar A
Cad
a An
o Sai D
iferente.
Ma
ch
ad
o e
Ca
rtola
– Ac
ad
em
ia e
Esc
ola
1
Ro
bso
n d
e F
reita
s Pere
ira
Elaborad
o como esboço d
e mod
esta hom
enagem
aos centen
ários:
morte e n
ascimen
to de d
ois “pais d
a pátria” – n
o que esta d
enom
inação
pod
e ter de valor sim
bólico no seu
mais am
plo sen
tido2. S
imu
ltaneam
en-
te, prop
or um
a consid
eração sobre o ato de fu
nd
ação institu
cional e seu
s
efeitos para u
ma com
un
idad
e.
Um
Joaquim
Maria n
asceu p
obre, mu
lato (inven
ção brasileira para
os mestiços. V
er “O trato d
os viventes”, d
e Luís Felip
e Alen
castro), filho
de p
ai mu
lato e mãe p
ortugu
esa, ambos p
obres – classe méd
ia baixa em
lingu
agem d
e hoje. D
esceu o m
orro e morreu
branco, segu
nd
o seu atesta-
do d
e óbito.
1 Versão modificada de trabalho apresentado na Ciranda de Psicanálise, “Psicanálise e Literatura: um
a leitura de Machado de
Assis”, Rio de Janeiro, setembro de 2008. Um
a versão resumida deste tam
bém foi apresentada em
Santa Maria, por ocasião
do Seminário Psicanálise e Literatura, realizado em
outubro de 2009.
2"Minha pátria é m
inha língua”, dizia Fernando Pessoa, apropriado por Caetano Veloso na canção “Língua”.
ma
rço
20
11
l co
rre
io A
PP
OA
.49
co
rre
io A
PP
OA
l ma
rço
20
11
48.
tem
átic
a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
Ou
tro, An
genor, n
asceu p
reto pobre, m
orou qu
ase toda su
a vida n
o
morro e n
os subú
rbios do R
io de Jan
eiro. O recon
hecim
ento, a gravação
do p
rimeiro d
isco solo, veio dep
ois dos sessen
ta anos d
e idad
e. Am
bos,
pou
co saíram d
e sua cid
ade n
atal (Rio d
e Janeiro), n
ão foram m
uito lon
ge
geograficamen
te, mas, em
termos d
e criação artística, expan
diram
nos-
sas fronteiras, con
solidaram
a inven
ção do B
rasil.
Du
as vertentes d
e criação diferen
tes e próxim
as. Um
pela escrita, n
o
texto escrito, notabilizad
o pelo en
saio e pela ficção (em
bora também
te-
nh
a escrito poesias e textos d
e dram
aturgia). O
utro, com
o genial com
po-
sitor de can
ções, esta forma d
e articular letra e m
úsica qu
e no B
rasil to-
mou
um
lugar sin
gular e origin
al em n
ossa cultu
ra. O sam
ba, de m
arginal
e expressão d
os excluíd
os, dos d
escend
entes d
os escravos, transform
ou-
se em referên
cia, traço iden
tificatório. “O m
ínim
o que se p
ode d
izer é que
a canção é u
m d
os meios através d
os quais o p
aís vem in
ventar e en
ten-
der si m
esmo” (N
estrovski, 2007).
Cu
rioso e surp
reend
ente, m
ais um
a vez, trabalho d
a letra. Letra do
texto, letra de m
úsica. Letra veicu
lada p
ela voz que m
arca o corpo, se
inscreven
do e escreven
do o in
conscien
te.
Neste texto, vam
os ressaltar a inscrição d
e um
a forma in
stitucion
al:
Mach
ado d
e Assis fu
nd
a a AB
L – Acad
emia B
rasileira de Letras. A
ngen
or
de O
liveira – Cartola – organ
iza com seu
s pares, am
antes d
o samba e d
o
carnaval, a E
stação Prim
eira de M
angu
eira, iniciativa qu
e reun
iu os blo-
cos existentes n
o morro. R
eorganizan
do a form
a de com
emorar o carn
a-
val, deu
outro estatu
to para u
ma com
un
idad
e.
Acad
emia
Discu
rso de M
achad
o de A
ssis, na abertu
ra da p
rimeira sessão.
20 de ju
lho d
e 1897
Sen
hores,
Investin
do-m
e no cargo d
e presid
ente, qu
isestes começar a A
cade-
mia B
rasileira de Letras p
ela consagração d
a idad
e. Se n
ão sou o m
ais
velho d
os nossos colegas, estou
entre os m
ais velhos. É
símbolo d
a parte
de u
ma in
stituição qu
e conta viver, con
fiar da id
ade fu
nções qu
e mais d
e
um
espírito em
inen
te exerceria melh
or. Agora qu
e vos agradeço a esco-
lha, d
igo-vos que bu
scarei na m
edid
a do p
ossível correspon
der à vossa
confian
ça.
Não é p
reciso defin
ir esta institu
ição, iniciad
a por u
m m
oço, aceita e
comp
letada p
or moços, a A
cadem
ia nasce com
a alma n
ova, natu
ralmen
-
te ambiciosa. O
vosso desejo é con
servar, no m
eio da fed
eração política, a
un
idad
e literária. Tal obra exige, não só a com
preen
são pú
blica, mas ain
-
da e p
rincip
almen
te a vossa constân
cia. A A
cadem
ia Francesa, p
ela qual
esta se mod
elou, sobrevive aos acon
tecimen
tos de tod
a casta, às escolas
literárias e às transform
ações civis. A vossa h
á de qu
erer ter as mesm
as
feições de estabilid
ade e p
rogresso. Já o batismo d
as suas cad
eiras com os
nom
es preclaros e sau
dosos d
a ficção, da lírica, d
a crítica e da eloqü
ência
nacion
ais é ind
ício de qu
e a tradição é o seu
prim
eiro voto. Cabe-vos
fazer com qu
e ele perd
ure. Passai aos vossos su
cessores o pen
samen
to e a
vontad
e iniciais, p
ara que eles o tran
smitam
aos seus, e a vossa obra seja
contad
a entre as sólid
as e brilhan
tes págin
as da n
ossa vida brasileira.
Está aberta a sessão.
Mach
ado d
e Assis faleceu
em 29 d
e setembro d
e 1908.
Escola
Cartola – A
ngen
or de O
liveira.
Com
positor, can
tor, instru
men
tista.
Nasceu
no R
io de Jan
eiro, 11/10/1908, e faleceu n
a mesm
a cidad
e em
30/11/1980.
Estação P
rimeira d
e Man
gueira fu
nd
ada p
or ele e um
grup
o de am
i-
gos em 28 d
e abril de 1928 (h
á oitenta e três an
os).
Trech
o de d
epoim
ento sobre a fu
nd
ação, ao Mu
seu d
a Imagem
e
do S
om3:
3 Endereço para consultas: ww
w.m
is.rj.gov.br/acervo.
ma
rço
20
11
l co
rre
io A
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OA
.51
co
rre
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OA
l ma
rço
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11
50.
tem
átic
a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
A sed
e foi in
stala
da n
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vessa
Saiã
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ato
, 7, n
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co Q
uen
te.
A d
ireto
ria, p
or su
a v
ez, tin
ha o
s segu
inte
s no
mes: p
resid
en
te,
Satu
rnin
o G
on
çalv
es; vice-p
residen
te, An
gen
or d
e Castro
; prim
ei-
ro secretá
rio, Jo
rge P
ereira d
a S
ilva; seg
un
do
secretário
, Ped
ro d
os
San
tos; teso
ureiro
, Fra
ncisco
Rib
eiro; d
iretor d
e harm
on
ia: A
ngen
or
de O
liveira
(Carto
la); co
missã
o d
e frente, M
an
uel Jo
aq
uim
, Cam
ilo
e Narciso
; com
issão
de b
ateria
, Gra
dim
, Maciste, M
artin
s, Ismar e
Lú
cio.
Em
um
a entrevista a José C
arlos Rego, C
artola lembrou
que, n
o pri-
meiro carn
aval dep
ois da fu
nd
ação, a escola chegou
à Praça O
nze reu
-
nin
do cerca d
e 60 pessoas, com
um
grand
e nú
mero d
e mu
lheres, u
mas
vestidas d
e hom
em e ou
tras com fan
tasias feitas de p
apel crep
om. D
isse
ele: “A im
portân
cia da E
stação Prim
eira foi a de p
romover a u
nião d
os
diversos blocos d
o morro. Passou
a ser de tod
os. An
tes, cada bloco tin
ha o
seu d
ono.”
Esta d
eclaração nos au
xilia a trabalhar n
as possíveis resp
ostas a um
a
interrogação sobre a im
portân
cia de qu
e um
a escola seja fun
dad
a, e mes-
mo u
ma acad
emia. Por ora, vam
os deixar d
e lado a d
iscussão sobre su
as
diferen
ças e aproxim
ações. Nos d
ois exemp
los citados, os p
ersonagen
s
de n
ossa história estão sep
arados n
o temp
o e no esp
aço. Só p
ara
exemp
lificar; quan
do a A
cadem
ia Brasileira d
e Letras é fun
dad
a, Mach
a-
do d
e Assis era u
m escritor con
sagrado, seu
s pares eram
a elite das letras
nacion
ais. Cartola n
asceu n
o mesm
o ano d
a morte d
e Mach
ado (com
um
mês d
e diferen
ça) e a fun
dação d
a Escola acon
tece nu
m m
omen
to em qu
e
sua carreira com
o comp
ositor aind
a não está con
solidad
a. Lutava com
dificu
ldad
es para su
stentar-se (Fisch
er, 2008) e estamos ain
da p
róximos
de u
ma fase d
e sua vid
a em qu
e vend
ia comp
osições (prática u
sual n
a-
quela ép
oca ond
e quem
fazia o samba recebia u
ns trocad
os e, no m
áximo,
um
a parceria com
o reconh
ecimen
to) que se torn
aram su
cesso na voz d
e
cantores d
e rádio – com
o Francisco A
lves, Mario R
eis e Silvio C
aldas,
para citar algu
ns d
os mais im
portan
tes. A d
iferença será feita qu
and
o
exigir seu n
ome n
os créditos com
o comp
ositor e vend
er apen
as os direi-
tos de gravação.
O qu
e interessa ao p
sicanalista esta fu
nd
ação? Um
ato de in
staura-
ção, de in
scrição na cu
ltura. U
ma in
scrição que m
arca tanto o su
jeito,
quan
to seu tem
po e lu
gar, sua com
un
idad
e. Estes atos reú
nem
, agregam
um
grup
o de p
essoas institu
ind
o um
a comu
nid
ade – fazen
do fren
te à
disp
ersão dos m
oradores d
o morro e d
os escritores, mesm
o que as d
ife-
renças econ
ômico/cu
lturais sejam
eviden
tes. A elite n
a academ
ia e os
morad
ores do m
orro na escola. H
á um
a nova m
oldu
ra que faz com
que a
escrita e a mú
sica possam
sair de u
m lu
gar margin
al; pois, gu
ardad
as as
devid
as prop
orções, a ficção aind
a luta p
ara garantir u
m lu
gar de valor
na n
ossa cultu
ra. Em
outras p
alavras, passan
do d
e simp
les entreten
imen
to
para u
ma recep
ção de in
terpretação e in
venção d
e um
temp
o. Tarefa a
qual a literatu
ra brasileira se ded
icou d
esde seu
s prim
órdios; vid
e “O cor-
tiço”, “Mem
órias de u
m sargen
to de m
ilícia” e outros qu
e buscaram
dar
visibilidad
e e voz a um
mu
nd
o excluíd
o do recon
hecim
ento cu
ltural.
O sam
ba também
enfren
tou tod
a sorte de p
reconceitos e talvez te-
nh
amos qu
e reconh
ecer que esta valorização n
ão está feita de u
ma vez
por tod
as. Em
sua origem
, são inú
meros os relatos d
e persegu
ição poli-
cial, ond
e um
lugar “d
e samba” era sin
ônim
o de ban
did
agem e p
rosti-
tuição. H
oje, aind
a encon
tramos, n
a comp
lexidad
e de n
ossa cultu
ra,
bolsões de con
servadorism
o que ju
stificam os versos d
e Nelson
Sargen
to;
“o samba agon
iza mas n
ão morre”. O
u seja, a p
ersistência é n
ecessária.
A relação com
um
a origem m
arginal d
ireta (caso do sam
ba), ou com
um
estatuto n
ão hegem
ônico d
e reconh
ecimen
to (caso da escrita d
e fic-
ção) interessa sobrem
aneira aos p
sicanalistas. A
final, arte e p
sicanálise
escrevem e se in
screvem n
as margen
s. Ou
melh
or, perfazem
as margen
s
do litoral on
de d
ecidim
os nossa vid
a. Nas m
argens d
a vida, a literatu
ra
inscreveu
a terceira margem
do rio d
e nossa existên
cia. Este ato, a p
sica-
nálise recon
hece com
o um
a referência qu
e articula sim
bólico e imagin
á-
rio para p
rodu
zir mold
uras ao real. N
estes temp
os de referên
cias tão
esparsas e frágeis a d
ificuld
ade d
e se lidar com
a comp
lexidad
e pod
e
co
rre
io A
PP
OA
l ma
rço
20
11
52.
tem
átic
a.
ma
rço
20
11
l co
rre
io A
PP
OA
.53
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
levar a um
apelo ao sau
dosism
o de u
ma au
toridad
e ou m
esmo ao
triun
falismo egóico. N
ão é isto o que se esp
era de u
ma an
álise.
O ato d
e fun
dação ren
ova aposta n
a solidaried
ade e n
a comu
nid
ade,
além d
e lançar u
ma p
ossibilidad
e de tran
smissão. Lacan
um
dia afirm
ou
que a elaboração d
e um
saber dep
end
e mais d
a comu
nid
ade d
o que d
o
coletivo (fazend
o esta diferen
ça, talvez pu
déssem
os estar advertid
os para
os efeitos de gru
po).
Um
a das con
siderações p
ossíveis pod
e levar em con
ta os efeitos de
transm
issão, o desejo d
e transm
itir algo às gerações futu
ras e reconh
ecer
que ou
tros pod
em levar ad
iante o qu
e foi institu
ído. Tom
and
o a tradição
e reinterp
retand
o-a. Nas p
alavras do com
positor, u
ma sín
tese poética d
o
ideal d
e um
a institu
ição e da p
ossibilidad
e de tran
smitir:
“Todo o tem
po qu
e eu viver/S
ó me fascin
a você, Man
gueira
Gu
erreei na ju
ventu
de, /Fiz p
or você o que p
ud
e
Man
gueira.
Con
tinu
am n
ossas lutas
Podam
-se os galhos, colh
em-se as fru
tas
E ou
tra vez se semeia/E
no fim
deste labor
Su
rge outro com
positor
Com
o mesm
o sangu
e na veia.
Son
hava d
esde m
enin
o, /Tin
ha u
m d
esejo felino
De con
tar toda tu
a história
Um
dia a lira em
pu
nh
ei /Este son
ho realizei
E can
tei todas tu
as glórias
Perdoa-m
e a comp
aração, /Mas fiz u
ma tran
sfusão
Eis qu
e Jesus m
e prem
eia
Su
rge outro com
positor/Jovem
de gran
de valor
Com
o mesm
o sangu
e na veia.”
4
Mu
itas são as associações, um
a delas refere-se à tran
smissão d
e um
lugar, ou
às possibilid
ades d
e transm
itir-se um
saber. Sob qu
e cond
ições
isto se torna p
ossível? Certam
ente p
or um
desejo, veicu
lado com
o ato de
amor ao sign
ificante. Q
ualqu
er psican
alista sabe que o en
gano am
oroso
da tran
sferência é o qu
e perm
ite desd
obrar a experiên
cia da an
álise. Assim
como a n
omin
ação do sin
toma e, se tiver sorte, a id
entificação com
um
sinth
omem
, um
sintom
a do h
omem
e de su
a articulação com
o mu
nd
o.
Em
nosso caso com
o grand
e Ou
tro, barrado, p
ara que p
ossamos in
sistir
na d
escoberta, ou m
esmo in
venção d
e um
significan
te de su
a falta. Sem
-
pre a abertu
ra. Sem
pre? Talvez a ú
nica p
ossibilidad
e de p
erman
ência seja
o reconh
ecimen
to desta falta. E
sta que p
ermite d
esejar, a partir d
a irrup
-
ção de u
ma ord
em irred
utível. N
ão o imp
erativo do gozo, ao qu
al estamos
subm
etidos e qu
e, para evitá-lo, red
uzi-lo, con
torná-lo, fazer m
argens a
ele buscam
os formas d
e socialização. Cu
rioso parad
oxo, um
a vez que es-
tar com os ou
tros, sup
ortar as diferen
ças, é um
exercício de castração.
Nos d
ois exemp
los citados, n
as du
as hom
enagen
s, estes gênios,
“anten
as da raça”, fizeram
frente à barbárie com
sua obra e com
seu ato
de fu
nd
ação de u
ma in
stituição. U
ma acad
emia, n
os mold
es da acad
e-
mia fran
cesa, seguin
do os d
itames d
a cultu
ra do sécu
lo XIX
. Ou
tro, um
a
escola: que organ
iza os grup
os carnavalescos e, com
este ato, transcen
de
a simp
les organização d
a folia mom
esca. Vid
e a dim
ensão qu
e hoje têm
as escolas de sam
ba, prin
cipalm
ente d
o Rio, on
de m
últip
las atividad
es
edu
cacionais e d
e trabalho são levad
as ao longo d
o ano. Pois; organ
izou-
se um
a escola de sam
ba que p
assou a ser referên
cia de valor p
ara um
a
cultu
ra. “Projeto in
sistente d
e um
a sociabilidad
e generosa e d
espren
did
a,
em qu
e os prazeres d
o convívio e d
a mú
sica valiam m
ais do qu
e os louros
da glória.” (K
ehl, 2007).
A c
ultu
ra c
om
o u
m v
alo
rM
achad
o com escrita, C
artola com a can
ção. Am
bas referidas à letra.
Letra da ficção e d
o ensaio (vid
e coda, logo abaixo). Letra d
a mú
sica que
se torna can
ção; um
a das origin
alidad
es brasileiras. A qu
estão é como
4 “Todo o tempo que eu viver”, cantada em
dueto Cartola/Paulinho da Viola, registro inédito no CD Viva Cartola! 100 anos, Ed.Biscoito Fino
ma
rço
20
11
l co
rre
io A
PP
OA
.55
co
rre
io A
PP
OA
l ma
rço
20
11
54.
tem
átic
a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
estas criações transcen
dem
o ind
ividu
al e tornam
-se referencia p
ara um
traço de id
entificação d
o social.
Há ap
roximações e d
iferenças en
tre a ficção e a canção. Porém
, no
Brasil, am
bas consegu
iram su
perar o an
tigo estatuto qu
e fazia diferen
ça
qualitativa en
tre arte pop
ular e eru
dita. E
ntre arte en
gajada e d
e pu
ro
entreten
imen
to. Elas con
seguiram
interp
retar sua realid
ade; fazen
do a
análise d
a conju
ntu
ra de seu
temp
o e espaço, critican
do os p
roblemas d
e
estrutu
ra e formação. Porém
, simu
ltaneam
ente, tiveram
a grand
eza de
ultrap
assar os limites d
e seu tem
po h
istórico, estabelecend
o um
valor
que se tran
smite, além
do con
tingen
cial. Além
do valor d
e mercad
o ou d
o
fetiche in
erente aos n
ossos temp
os mod
ernos e p
ós qualqu
er coisa. Pois
aprop
riar-se das p
rodu
ções cultu
rais, incorp
orá-los como u
m bem
que
transcen
da a lógica estritam
ente u
tilitarista, ou p
ragmática n
o seu sen
-
tido m
ais estreito imp
lica um
a respon
sabilidad
e com o p
atrimôn
io cul-
tural. R
espon
sabilidad
e que é assu
mid
a a desp
eito das vicissitu
des d
o
corpo e d
a história p
essoal, ou m
elhor, saben
do fazer algo in
teressante
com estas form
ações. Para os psican
alistas, ou p
ara quem
passou
pela
experiên
cia de an
álise, há u
m recon
hecim
ento d
e que o in
conscien
te é
um
dos n
ossos patrim
ônios d
e saber e que ele tam
bém se realiza n
as
inven
ções de M
achad
o e Cartola.
Co
daEn
saios: a nova geração e os fu
nd
adores
Bu
scamos reler três d
os ensaios d
e Mach
ado, d
e diferen
tes épocas,
ond
e o crítico man
ifesta sua p
osição, tanto com
relação à fun
ção que a
crítica literária deveria ter n
um
a cultu
ra como a n
ossa, quan
to um
pain
el
sobre a literatura e, o p
apel d
esemp
enh
ado p
or um
a nova geração d
e po-
etas. Neste ú
ltimo, escrito n
o mesm
o ano em
que “M
emórias p
óstum
as”
começou
a ser gestado, m
anifesta-se ali n
ão somen
te a análise crítica d
eu
ma p
lêiade d
e novos p
oetas, mas tam
bém u
ma con
sideração sobre a
fun
ção simbólica qu
e estes teriam(e viriam
a ter) no con
texto das letras
brasileiras.
São eles: “ O
ideal d
o crítico”, de ou
tubro d
e 1865; “Notícia d
a atual
literatura brasileira – in
stinto d
e nacion
alidad
e”, de m
arço de 1873 e fi-
nalm
ente, “A
nova geração”, d
e dezem
bro de 1879.
5
Segu
em algu
ns ap
ontam
entos:
“O id
eal do crítico”, 1865.
A crítica n
ão é somen
te querer falar à m
ultid
ão. Diferen
temen
te da
opin
ião, que m
uitas vezes d
enu
ncia o exercício d
os incom
peten
tes, críti-
ca é análise feita com
ciência e con
sciência, u
m d
ever de d
izer a verdad
e.
Assim
, ao analisar a literatu
ra, ela deve con
den
ar o ódio, a cam
aradagem
e a ind
iferença e estabelecer a sin
ceridad
e, solicitud
e e justiça. A
ind
a nas
palavras d
e Mach
ado, a m
oderação e u
rbanid
ade n
a expressão d
everiam
ser equivalen
tes na d
elicadeza d
as man
eiras.
O texto é escrito com
o um
voto, um
projeto d
e literatura e su
a crítica,
ond
e o escritor desejava o crescim
ento d
e nossa literatu
ra, susten
tado
por u
ma excelên
cia da crítica.
“Notícia da atual literatura brasileira – instinto de nacionalidade”, 1873.
Mach
ado in
icia fazend
o um
a descrição d
e nosso p
rojeto de literatu
ra
“engajad
a”, até então. N
este projeto, “vestir-se com
as cores do p
aís” de-
notava este in
stinto d
e nacion
alidad
e que bem
pod
eria ser sintom
a de
vitalidad
e e abono d
e futu
ro; pois d
aria fisionom
ia próp
ria ao pen
samen
-
to nacion
al.
En
tretanto, m
esmo recon
hecen
do este esforço, M
achad
o alerta que
“o que se d
eve exigir do escritor, an
tes de tu
do, é certo sen
timen
to íntim
o,
que o torn
e hom
em d
o seu tem
po e d
o seu p
aís, aind
a quan
do trate d
e
assun
tos remotos n
o temp
o e no esp
aço”. Utiliza-se d
e vários exemp
los
de clássicos d
a literatura com
o Sh
akespeare, p
ara mostrar qu
e mesm
o
5 Utiizamos a edição das Obras Com
pletas de M. de Assis, vol. III, ed. Nova Aguilar, de 1997, onde estes textos podem
serencontrados nas páginas 798, 801 e 809.
ma
rço
20
11
l co
rre
io A
PP
OA
.57
co
rre
io A
PP
OA
l ma
rço
20
11
56.
tem
átic
a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
que m
uitos d
e seus p
ersonagen
s não sejam
ingleses, vid
e Ham
let, Rom
eu
e Julieta, O
thelo, n
ingu
ém d
uvid
a que ele- o bard
o, é autor in
glês.
A p
artir desta tese vai fazer exten
sa análise d
o roman
ce, da p
oesia e
da lín
gua n
o Brasil. A
pon
taremos ap
enas, algu
ns tóp
icos: O rom
ance bu
sca
semp
re a cor local. A su
bstância, n
ão men
os que os acessórios, rep
rodu
-
zem geralm
ente a vid
a brasileira em seu
s diferen
tes aspectos e situ
ações.
Estas características se am
enizam
no cen
ário urban
o; assim a p
referência
pelos costu
mes d
o interior evid
encia o fato d
e que eles con
servam m
e-
lhor a trad
ição nacion
al. Ao fazer esta an
álise descritiva, M
achad
o faz
alusão a d
iversos autores qu
e não m
encion
amos aqu
i. Em
sua an
álise da
poesia o crítico é m
ais du
ro com os p
oetas. Pede m
ais simp
licidad
e e
senso d
e oportu
nid
ade; p
ois o “sublim
e é simp
les”, não n
ecessita dos ex-
cessos do p
arnaso e d
o roman
tismo.
Qu
anto ao teatro ele é rad
ical: “não h
á atualm
ente teatro brasileiro.
Só trad
uções, can
cã, mágicas, can
tigas burlescas ou
obscenas” qu
e não
chegam
a caracterizar um
teatro brasileiro. Na an
álise da lín
gua p
osiciona-
se contra o fran
cofonism
o na escrita! E
le que acom
pan
hava a trad
ição
intelectu
al francesa afirm
a que os galicistas p
or opção são os p
iores escri-
tores. Acon
selha en
tão a que se leiam
os clássicos – brasileiros mesm
o –
não p
ara escrever como eles, m
as para “extrair d
eles mil riqu
ezas, que, á
força de velh
as se fazem n
ovas”.
“Nem
tud
o tinh
am os an
tigos, nem
tud
o tem os m
odern
os”. Frase que
nos p
arece lapid
ar para n
ortear os prin
cípio d
e fun
dação d
a AB
L em 1897.
“A n
ova geração”, 1879.
Este n
os parece ser o qu
e mais con
tribui d
iretamen
te/explicitam
ente
para n
ortear a fun
dação d
a Acad
emia. E
scrito na m
aturid
ade, aos qu
a-
renta an
os, no m
esmo an
o em qu
e suas teses com
o crítico encon
tram o
estilo como escritor; é o an
o de in
ício de “M
emórias p
óstum
as de B
rás
Cu
bas” (que com
eçou a circu
lar em cap
ítulos n
a Rev
ista Brasileira
du
rante 1880).
Neste en
saio Mach
ado se in
terroga: haverá p
oesia nova? “ N
ão pod
e-
mos n
egar que h
á um
a tentativa, p
ois não é o fu
turo, n
ão é já o passad
o”.
Recon
hece qu
e “esta geração não qu
er prolon
gar o ocaso de u
m d
ia que
verdad
eiramen
te acabou”. O
roman
tismo acabou
, afirma M
achad
o neste
períod
o de su
a virada p
rodu
tiva. Faz um
a análise d
os fatores que estão
influ
encian
do a m
ud
ança. A
ciência n
aturalista através d
a seleção natu
-
ral de D
arwin
, a política rep
ublican
a e o ideal d
e Justiça são can
tados n
os
versos. Justiça é u
m id
eal social.
Mesm
o com estes elem
entos, M
achad
o posicion
a-se contra o realis-
mo; p
ois para ele é a corren
te literária mais fraca, a qu
e men
os resistirá e
atrairá os jovens. A
pon
ta os perigos d
a simp
les mim
etização, den
un
cian-
do os p
oetas que sim
plesm
ente im
itam V
itor Hu
go ou B
eaud
elaire e pas-
sa ao exame d
a obra de joven
s poetas.
Nas obras exam
inad
as, combate assim
ilação fácil da id
eologia políti-
ca aos versos. Exige qu
alidad
e. Recon
hece os p
oetas fortes, sem d
eixar de
apon
tar os defeitos d
eles. E in
centiva os talen
tosos.
Não vam
os nos d
eter na exten
sa análise feita. A
pen
as fomos verificar
quais d
os poetas an
alisados n
este artigo foram con
vidad
os a integrar a
AB
L quase vin
te anos m
ais tarde.
Assim
, pod
emos verificar qu
e entre os citad
os, vieram a com
por a
fun
dação d
a Acad
emia: V
alentim
Magalh
ães, Lucio d
e Men
don
ça, Afon
-
so Celso Ju
nior, A
lberto de O
liveira e Artu
r Azeved
o. Sem
falar de S
ilvio
Rom
ero que ap
esar de ter sid
o criticado com
o não ten
do veia p
oética e,
mais tard
e ter escrito um
a crítica no m
ínim
o pou
co formal d
e Mach
ado –
pois com
parava seu
estilo a seus sin
tomas clín
icos epiléticos – veio a ser
convid
ado a fazer p
arte da fu
nd
ação. O qu
e só comp
rova a capacid
ade
política agregad
ora de M
achad
o, eviden
ciada aqu
i, mas d
enotad
a desd
e
a juven
tud
e.
En
tre os clássicos citados n
o ensaio p
odem
os ver que algu
ns p
assa-
ram a figu
rar como Patron
os das cad
eiras que com
pu
seram a acad
emia:
Teófilo Dias; C
astro Alves; Tobias B
arreto; Gon
çalves Dias; José B
asílio da
ma
rço
20
11
l co
rre
io A
PP
OA
.59
co
rre
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PP
OA
l ma
rço
20
11
58.
tem
átic
a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
Gam
a; Tomas A
nton
io Gon
zaga e Alvarez d
e Azeved
o foram h
omen
a-
geados com
o patron
os de su
as cadeiras (A
lista comp
leta de fu
nd
adores e
patron
os pod
e ser buscad
a no site d
a Acad
emia B
rasileira de Letras).
Podem
os saber o que d
iz Mach
ado sobre cad
a um
deles, em
seu en
saio.
Não é o caso d
e reprod
uzir n
estes apon
tamen
tos. Estam
os interessad
os na
constitu
ição institu
cional. A
ssim, vam
os nos lim
itar a algun
s detalh
es.
Ao fin
al faz algum
as recomen
dações e con
siderações: “N
ão é pos-
sível determ
inar a exten
são, nem
a persistên
cia do atu
al movim
ento
poético. C
ircun
stâncias extern
as pod
em acelerá-lo e d
efini-lo; ele p
ode
também
acabar ou tran
sformar-se. C
reio, aind
a assim, qu
e algun
s poetas
sairão deste m
ovimen
to e contin
uarão p
elo temp
o adian
te a obra dos p
ri-
meiros d
ias... Se tal fato se d
er, entre os m
oços atuais, ap
rend
erão os que
prossegu
irem n
a obra, qual a som
a e natu
reza de esforços qu
e ela custa;
verão jun
tar-se as dificu
ldad
es morais às literárias.”
E recom
end
a: nova geração freqü
enta os escritores d
a ciência... D
e-
vem, tod
avia, acautelar-se d
e um
mal: o p
edan
tismo... D
igo aos moços
que a verd
adeira ciên
cia não é a qu
e se incru
sta por orn
ato, mas a qu
e se
assimila p
ara nu
trição... Fujam
também
a outro p
erigo: o espírito d
e seita,
mais p
róprio d
as gerações feitas e das in
stituições p
etrificadas. O
espírito
de seita tem
fatal march
a do od
ioso ao ridícu
lo.”
“Finalm
ente, a geração atu
al tem n
as mãos o fu
turo, con
tanto qu
e lhe
não afrou
xe o entu
siasmo... E
stas palavras d
e um
crítico que tam
bém foi
poeta, rep
ete-as agora alguém
que, n
a crítica e na p
oesia desp
end
eu al-
gun
s anos d
e trabalho, n
ão fecun
do n
em gran
de m
as assídu
o e sincero;
alguém
que p
ara os recém-ch
egados h
á de ter sem
pre a ad
vertência am
i-
ga e o aplau
so oportu
no.”
Re
ferê
nc
ias b
iblio
grá
fica
s
FISCHER, Luís Augusto. Machado e Borges e outros ensaios sobre M
achado de Assis. Porto Alegre: Arquipélago Editorial,2008.
KEHL, Maria Rita. Sala de recepção. In: NESTROVSKI, Arthur (org). Lendo m
úsica: 10 ensaios sobre 10 canções. São Paulo:Publifolha, 2007.
NESTROVSKI, Arthur (org). Lendo música: 10 ensaios sobre 10 canções. São Paulo: Publifolha, 2007.
SILVA, Marília Barboza da; OLIVEIRA FILHO, Arthur. Cartola os tem
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ww
.academia.org.br
Escola de samba M
angueira: ww
w.m
angueira.com.br
Centro Cultural Cartola: ww
w.cartola.org.br
Filme:
“CARTOLA – música para os olhos”, direção Lírio Ferreira e Hilton Lacerda, DVD Europa Film
es, 2007.
Nestes en
dereços relacion
ados acim
a pod
em ser en
contrad
os todos
os roman
ces de M
achad
o disp
oníveis p
ara leitura e arm
azenam
ento. N
o
Cen
tro Cu
ltural C
artola além d
a história d
o comp
ositor e dos objetivos d
o
Cen
tro Cu
ltural, m
úsicas p
odem
ser escutad
as e baixadas.
No
tas p
ara
um
a s
eq
uê
nc
ia d
e tra
ba
lho
1. Os d
ois exemp
los tomad
os aqui p
odem
eviden
ciar um
a ind
icação
para os p
sicanalistas; u
ma form
a de tom
ar os atos e prod
uções d
a cultu
ra
como sign
ificantes p
ara a próp
ria psican
álise. Não p
ara fazer um
a emu
-
lação, mas p
ara apren
der com
sua d
iferença e efeitos. A
institu
ição psica-
nalítica tem
um
a história qu
e começa com
Freud
com a fu
nd
ação da A
s-
sociação Psicanalítica In
ternacion
al (AP
I), em 1910 e se m
odifica com
Lacan. T
ransform
ação radical, p
elo men
os em algu
ns p
rincíp
ios prop
os-
tos, ao observarmos os textos d
e fun
dação d
a Escola Freu
dian
a de Paris
(EFP
), em 1964 e as p
roposições d
ecorrentes, m
ormen
te a de 1967, sobre
o psican
alista da escola.
Dad
a a extensa gam
a de in
terrogações contid
as neste tem
a, vamos
por ora, retom
ar du
as ind
icações, frases que se torn
aram qu
ase axiomas
lacanian
os: “o psican
alista se autoriza d
e si mesm
o” e, um
a outra frase
que ap
onta u
ma d
as fun
ções da in
stituição p
sicanalítica: “O
que sei é qu
e
o discu
rso analítico n
ão pod
e ser susten
tado p
or um
só. Tenh
o a sorte de
haver qu
em m
e siga. O d
iscurso, p
ortanto, tem
aí sua ch
ance” (Televisão,
in: O
utro
s Escrito
s, p. 530, ed
. Zah
ar. Em
francês, p
. 532). Dois en
un
cia-
ma
rço
20
11
l co
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PP
OA
.61
temátic
a.
co
rre
io A
PP
OA
l ma
rço
20
11
60.
tem
átic
a.
dos in
dicativos d
a man
eira de lid
ar com o p
aradoxo d
a posição d
o psi-
canalista qu
e está assujeitad
o a solidão d
o seu ato e, sim
ultan
eamen
te
necessita d
os pares p
ara que u
ma tran
smissão seja recon
hecid
a.
Podem
os acrescentar tam
bém qu
e a próp
ria experiên
cia institu
cio-
nal p
sicanalítica é u
ma “obra aberta”. N
em p
oderia ser d
iferente, sob
pen
a de p
erderem
-se os efeitos do d
iscurso p
sicanalítico n
a cristalização
institu
cional. A
ssim, faz-se n
ecessário que as d
iversas inven
ções de cad
a
institu
ição sejam com
partilh
adas, con
frontad
as com exp
eriências, for-
mações e tran
sferências d
iferentes.
2. A resp
eito da fu
nção d
o sinth
oma n
a transm
issão. Sin
thom
a de
cada u
m, com
o a institu
ição é sinth
oma d
o psican
alista? Qu
estões para
ser desen
volvidas qu
e ficam em
aberto. De qu
alquer form
a, há m
uito
trabalho p
ela frente p
ara desd
obrar estas afirmações d
e Lacan d
e que a
psican
álise é sintom
a do m
al-estar na cu
ltura e o p
sicanalista o sin
thom
a
da p
sicanálise.
3. Relacion
ado com
o item an
terior: Qu
al diferen
ça entre sin
thom
a
e sublim
ação? O qu
e fizeram Jam
es Joyce, E. C
lapton
, Cartola e M
achad
o
pod
e ser consid
erado u
ma form
a de su
blimação e/ou
também
caracte-
rizar-se como u
m sin
thom
a, este quarto en
lace que p
ermite o fu
ncio-
nam
ento d
a prop
riedad
e borromean
a. Isto serviria para os artistas reco-
nh
ecidos e, p
or decorren
cia lógica, para o recon
hecim
ento d
e um
savo
ir-faire p
assível de ser exercid
o por qu
alquer u
m.
Ca
rna
va
l: Trie
b, tre
ibe
n, trib
os
Lucia
no
Elia
1
An
tes de tu
do, d
evo descu
lpar-m
e jun
to aos leitores deste bom
e ágil
Correio d
a AP
PO
A, sobretu
do os qu
e o frequen
tam com
a devid
a assidu
i-
dad
e dos bon
s leitores, por retom
ar aqui algu
mas id
éias que já m
e presta-
ram gen
erosa ajud
a em u
m escrito m
eu an
terior, pu
blicado n
o nú
mero
191 deste C
orreio, de ju
nh
o de 2010, com
o tema L
inh
as d
e pa
sse – o
inco
nscien
te em ca
mp
o2. C
omo os m
eus am
igos gaúch
os (de n
ascimen
to
e adoção
3) têm o im
pru
den
te hábito d
e me con
vidarem
a particip
ar de
suas p
ublicações, sem
pre an
tenad
as com os m
ovimen
tos e com os m
o-
men
tos da cu
ltura e d
e seu tem
po, bem
na d
ireção que n
os recomen
da
1 Psicanalista, mem
bro do Laço Analítico Escola de Psicanálise, instituição mem
bro de Convergencia, Movim
ento Lacanianopara a Psicanálise Freudiana.
2 O meu texto nesse núm
ero foi “Futebol, paixão e falo, mas tudo pelo m
eio”.
3 Refiro-me, com
o “gaúcho de adoção”, a Robson de Freitas Pereira, carioca como eu, m
as que tornou-se gaúcho porescolha.
ma
rço
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11
l co
rre
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OA
.63
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rre
io A
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62.
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átic
a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
Lacan, o qu
e mu
ito me h
onra e alegra, terão qu
e sup
ortar, digam
os, al-
gum
efeito de rep
etição, coisa aliás com a qu
al os analistas já estão acos-
tum
ados. M
as tenh
o a meu
favor três argum
entos im
batíveis: o prim
eiro
é que a Pu
lsão (tema recorren
te) prod
uz rep
etição no sign
ificante e é m
ais
forte que eu
(risos): não p
osso fazer nad
a a não ser m
e respon
sabilizar
pelo
qu
e eu a
ind
a n
ão
sei, como p
ropõe Lacan
4; o segun
do argu
men
to é
que, qu
and
o escrevemos d
e no
vo
, como estou
fazend
o e anu
ncian
do d
es-
de o in
ício, escrevamos sem
pre d
o n
ovo, e D
eleuze já o ap
ontara in
filtrand
o
a diferen
ça na rep
etição, mas talvez sem
perceber qu
e isso é, em si m
es-
mo, u
m cu
riosíssimo efeito d
a próp
ria Pulsão, d
a qual estam
os faland
o de
no
vo, n
a arden
te torcida – sem
garantia algu
ma a
prio
ri – de qu
e consiga-
mos d
izer algo de n
ovo; e o terceiro argum
ento é o d
e que a rep
etição em
questão aqu
i não é reed
ição: escrevi este texto especialm
ente p
ara este
nú
mero d
o Correio d
a AP
PO
A, sobre o C
arnaval.
Pois bem, en
tão vamos lá. C
omo eu
já dizia sobre o fu
tebol, ele evoca
a pu
lsão. O carn
aval, conven
ham
os, mais ain
da. C
omeço rep
etind
o um
pou
co do qu
e já havia d
ito sobre o termo Pu
lsão, mas, p
artind
o do alem
ão
Trieb. S
emp
re me in
trigou qu
e Freud
tenh
a usad
o este termo p
ara desig-
nar o m
ais insu
rreto de seu
s conceitos, aqu
ele que n
ão se dobra à lógica
conceitu
al cartesiano-kan
tiana: n
ão é um
a idéia clara e d
istinta, n
em p
ar-
ticipa d
as doze categorias a
prio
ri da R
azão.
Trieb é u
ma p
alavra que evoca força, im
pelên
cia, movim
ento, e p
or-
tanto, n
o limite, en
ergia, mas qu
e não cabe d
e mod
o algum
em n
enh
um
sistema coeren
te de p
ensam
ento qu
e tenh
a a energia com
o eixo: seria
um
a energia física, biológica? S
eria psíqu
ica? Bem
, mas o qu
e é um
a ener-
gia psíqu
ica senão u
ma n
ebulosa, con
fusa e im
precisa, beiran
do o m
ito?
Seria ela esp
iritual, e n
este caso beiramos, ou
melh
or, mergu
lham
os, no
místico? “Trieb
é um
pássaro? U
m avião? N
ãaaaao! É o su
per-h
omem
.”
Ou
: Is it a b
ird? Is it a
pla
ne? N
oo
oo
o, it’s a
twister? Yea
aa
h! S
e a pu
lsão
não é u
m p
ássaro nem
um
avião, ela pod
e assum
ir a forma d
e um
sup
er-
hom
em – o qu
e determ
ina o h
omem
– e o que o faz tw
ist. Mas n
ada tem
de
mística.
Twister ou
sup
er-hom
em – am
bos perfeitam
ente ad
equad
os ao senti-
do p
sicanalítico d
a pu
lsão, pois qu
e sacode e faz voar – o Trieb é u
m
conceito lim
ítrofe entre o som
ático e o psíqu
ico. Certo d
ia, intrigad
o com
essa formu
lação de Freu
d, d
ecidi tratar d
ela a sério, e chegu
ei à seguin
te
conclu
são5: lim
ite, na form
ulação freu
dian
a, não é p
ara ser enten
did
o
como fron
teira intra-orgân
ica, pon
to em qu
e o somático “esbarra” com
o
psíqu
ico, idéia d
elirante e alu
cinatória com
a qual m
uitos an
alistas co-
mu
ngam
, como fazem
, aliás, com tan
tas outras. O
limite d
a frase deve ser
tomad
o em sen
tido m
atemático d
e limite aberto d
e um
a fun
ção, desig-
nan
do u
m p
onto qu
e não h
á em su
as coorden
adas, u
m p
onto au
sente
entre d
uas séries con
tínu
as, introd
uzin
do u
ma d
escontin
uid
ade en
tre elas.
Essas séries sen
do o som
ático e o psíqu
ico, o limite com
o rup
tura faz com
que n
ão haja m
ais nem
somático n
em p
síquico n
o pon
to de im
pacto d
a
pu
lsão. Ela n
ão é nem
somática n
em p
síquica, e se in
screve em u
m n
ovo
camp
o, inéd
ito, criado a p
artir de seu
imp
acto, cham
ado cam
po d
o in-
conscien
te (e do su
jeito) – que n
ão deve ser con
siderad
o psíq
uico, através
de seu
s dign
os represen
tantes, o rep
resentan
te simbólico, lin
guageiro, a
Vo
rstellun
g – ou
aind
a, o significan
te, e a quota d
e afeto, irredu
tível ao
significan
te, a Affek
tbetra
g, base do qu
e será o gozo.
Pois bem, feita essa breve record
ação conceitu
al – e esta interp
reta-
ção que fiz d
a frase de Freu
d – lem
bremos ain
da o qu
e Freud
diz m
ais de
20 anos d
epois d
e ter introd
uzid
o a categoria de Trieb
em su
a obra: “as
pu
lsões são seres grand
iosos, míticos em
sua in
determ
inação”. O
ra, como
querer qu
e um
ser assim caiba em
algum
sistemazin
ho con
ceitual trivial?
4 Lacan, J. – O Seminário, Livro XV – O Ato psicanalítico (1967/68), Lição III, de 29 de novem
bro de 1967, inédito, documento
de trabalho. A frase de Lacan é: “Só podemos nos responsabilizar pelo que ainda não sabem
os responder”.
5 Ver, a este respeito, meu trabalho: O conceito de pulsão com
o explosão da unidade psicofísica – objeto da psicologia – nadeterm
inação do inconsciente como cam
po da psicanálise (1991), (Cadernos do Centro de Estudos Freudianos do Recife,1991) e tam
bém em
Elia, L. Corpo e sexualidade em Freud e Lacan, Rio de Janeiro, Uapê Editora, 1995, p. 49-53.
ma
rço
20
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l co
rre
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PP
OA
.65
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l ma
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20
11
64.
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átic
a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
Com
o redu
zi-la a um
a energia, cu
jo estatuto restaria p
ara semp
re inso-
lúvel?Pen
so que só algo com
o a lingu
agem, tom
ada com
o camp
o e não
como fu
nção (com
o faz Lacan) seria cap
az de op
erar um
tal imp
acto de
rup
tura en
tre somático e p
síquico, qu
ebrand
o a un
idad
e psicofísica
ind
ividu
al dos p
sicólogos (e dos p
siquiatras, e d
e todos os p
ensad
ores do
fun
cionalism
o interacion
ista entre corp
o e men
te, que su
bdivid
em a m
ente
em várias fu
nções: sen
so-percep
ção, consciên
cia, atenção, p
ensam
ento,
mem
ória, hu
mor, afetivid
ade, sexu
alidad
e, socialidad
e, lingu
agem).
Imagin
em isso à lu
z da lógica n
ão-fun
cionalista d
a psican
álise: tomar
sexualid
ade e lin
guagem
como m
eras fun
ções psicofísicas en
tre outras,
quan
do são ju
stamen
te as categorias que Freu
d e Lacan
, respectivam
ente,
extraem d
o estatuto d
e fun
ções nesse p
ensam
ento oitocen
tista para al-
çar à categoria de cam
pos! O
interacion
ismo corp
o/men
te se reprod
uz
em ou
tro: ind
ivídu
o/ambien
te (Inn
enw
elt/Um
welt) – eixo m
etodológico
com o qu
al a psican
álise também
romp
e, toman
do o su
jeito como efeito
do sign
ificante, ele p
róprio com
o um
a fun
ção deste cam
po – e n
ão como
um
ind
ivídu
o conten
do fu
nções d
entro d
e si, e o represen
tand
o topo-
logicamen
te como u
ma ban
da u
nilátera, in
terno-extern
a, sem d
entro e
fora.O qu
e Freud
exprim
e em term
os de ru
ptu
ra (conceito-lim
ítrofe), Lacan
interp
retará em term
os de lin
guagem
, e a pu
lsão será o efeito da lin
gua-
gem sobre o corp
o: “as pu
lsões são o eco no corp
o do fato d
e que h
á um
dizer” (Lacan
, J. O S
inth
om
a, p. 18). N
o corpo, n
ão no organ
ismo, com
o
qual ela n
ada tem
a ver, o que n
ão significa qu
e não se ap
óie nele, com
o
um
trem n
o trilho (com
o qual o trem
, eviden
temen
te, nad
a tem a ver – o
trilho n
ão é parte com
pon
ente n
em d
etermin
ante d
o trem), o qu
e se ex-
pressa m
agnificam
ente n
a noção freu
dian
a de A
nleh
un
g – ap
oio, anáclise,
étaya
ge, pelo qu
al Freud
nos d
iz claramen
te que a p
ulsão está sim
ples-
men
te apoiad
a no in
stinto, com
o trem n
o trilho. O
corpo p
ulsion
al está
apoiad
o no organ
ismo, n
ada d
evend
o a ele em su
a constitu
ição (equívoco
de m
uitos, ao con
fun
direm
apoio com
co-determ
inação, e p
ensarem
que
é preciso con
siderar os fatores orgân
icos, em algu
m grau
, na d
etermin
a-
ção do su
jeito. Este equ
ívoco é notavelm
ente observad
o nas p
esquisas
psican
alíticas sobre os fenôm
enos p
sicossomáticos).
Bem
, mas voltem
os à palavra Trieb. E
la não cabe n
o sistema teórico
de en
ergia, é um
“ser mítico, gran
dioso em
sua in
determ
inação”
6. Mas
afinal d
e contas, o qu
e significa Trieb em
alemão? N
ão dá p
ara respon
der
que Trieb sign
ifica pu
lsão, porqu
e, além d
e serem term
os de lín
guas d
ife-
rentes e trad
ução n
ão ser significação, con
tinu
aríamos sem
nad
a saber
tanto o qu
e é Trieb qu
anto o qu
e é pu
lsão, pois qu
e é justam
ente este
termo, aqu
i usad
o para resp
ond
er pela sign
ificação de Trieb
, que requ
er
significação, e a con
tinu
aria requeren
do. Portan
to retomem
os a pergu
nta:
o que sign
ifica Trieb? Su
bstantivo d
o verbo treiben
, que qu
er dizer: m
ovi-
men
tar-se, dirigir-se a algo, ser im
pelid
o a algo. Mas o term
o tem su
as
armad
ilhas: esse m
ovimen
to imp
elente, coercitivo, ap
resenta d
ois aspec-
tos que bagu
nçam
todo o coreto d
e quem
esperava en
contrar n
ele um
claro sentid
o instin
tual ou
motivacion
al: 1º) o movim
ento n
ão tem u
m
alvo, meta ou
norte claros, n
ão se sabe mu
ito bem p
ara ond
e se está ind
o,
há u
ma esp
écie de en
trega, de m
ovimen
to às cegas em relação à con
s-
ciência d
o sujeito, d
iríamos n
ós, já disp
ond
o da n
oção de in
conscien
te.
Isso introd
uz n
o conceito d
e Trieb um
aspecto bastan
te interessan
te, do
lado d
a vida, e d
o lado p
oético, se quiserm
os, que é o d
e an
da
r a esm
o,
va
gab
un
dea
r, ir po
r aí, lev
ad
o p
or u
ma
força
qu
e no
s mo
ve m
as q
ue n
ão
no
s diz
on
de n
os lev
a. 2º) a cau
sa do m
ovimen
to é externa ao su
jeito, vem
de fora, e esse asp
ecto é explicitam
ente tratad
o por Lu
iz Han
ns, n
osso
emin
ente esp
ecialista no alem
ão de Freu
d, qu
and
o diz:
6 Alusão à famosa frase de Freud: A teoria das pulsões é a nossa m
itologia: as pulsões são seres míticos, grandiosos em
suaindeterm
inação”, da Conferência XXXII (“Angústia e vida pulsional”) das Novas Conferências Introdutórias sobre Psicanálise(1932), in Edição Standard Brasileira, op. cit. Vol. XXII, 1969, p. 119.
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66.
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Crô
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de
Ca
rna
va
l.
Diz
-se em a
lemão
Vie
h tre
iben
para
“toca
r o g
ad
o”[...] [o
qu
e] é su-
po
stam
ente p
ercebid
o p
elo g
ad
o co
mo
“oriu
nd
a d
e alg
um
loca
l
ind
etermin
ad
o” (p
elas co
stas, o
u d
o a
lto); a
lém d
isso, a
açã
o v
em
com
o “o
rdem
” (som
) ou
tatilm
ente (u
ma v
ara
, agu
ilhão
, chico
te) –
po
rtan
to, a
lgo
“forte”, q
ue “im
pele”, m
as q
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via
do
de a
lhu
-
res”: é
div
erso
da
sen
saçã
o d
e a
lgo q
ue b
rota
a p
artir d
o su
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,
trata
-se d
e u
m a
guilh
oa
r qu
e fa
z c
om
qu
e o
mo
vim
en
to b
rote
no
suje
ito [g
rifos n
osso
s, com
exceçã
o d
o itá
lico n
as p
repo
sições d
o e
no
sujeito
, qu
e são
do
au
tor].
7
Con
sideram
os magistral essa colocação d
e Han
ns, p
ois deixa claro
que a força d
o Trieb é exterior ao sujeito, vem
de fora, é exp
erimen
tada
como vin
da d
e “alhu
res” e brota no su
jeito, mais d
o que vem
dele, o qu
e
dem
arca com clareza a d
iferença p
ara com o in
stinto, im
ped
ind
o qual-
quer con
fusão. M
as a referência ao gad
o tem, a m
eu ver, ou
tra virtud
e: a
de d
istingu
ir pu
lsão de in
stinto sem
recorrer à famigerad
a “hu
man
ida-
de”, com
o se a pu
lsão fosse o que é, só p
orque é coisa d
e ser hu
man
o, em
estilo bem la
pla
nch
ean
o. Para gado ou
hom
em, é assim
, e a referência ao
gado n
ão ocasiona n
enh
um
a possibilid
ade d
e confu
são com o p
lano bio-
lógico: o gado tam
bém sofre a ação d
o treiben
– V
ieh treib
en –
do qu
e lhe
chega d
e fora, como o agu
ilhão, a voz d
o peão ou
o chicote, com
o nós,
que falam
os, recebemos o efeito d
e forças que n
os chegam
de fora e qu
e,
nesse sen
tido, n
os faz de ga
do
. O gad
o é aqui m
etáfora de u
m su
jeito-
objeto, e não d
e um
sujeito em
suas fron
teiras biológicas com o m
un
do
anim
al.
Mas, p
odem
os aproxim
ar este sentid
o do cam
po d
a sexualid
ade. O
treiben
, o and
ar por aí, a esm
o, movid
o por u
ma força qu
e nos ch
ega de
fora e que n
os imp
ele, envolve u
ma d
imen
são de p
razer. O qu
e se faz por
força do treib
en n
ão é anód
ino qu
anto ao cam
po d
o prazer e d
o gozo.
Aliás, é p
or sermos im
pelid
os pelo Trieb qu
e gozamos, in
defectivelm
ente,
haja ou
não m
escla desse gozo com
a experiên
cia do p
razer, e é essa a
prin
cipal m
ola do salto d
a prim
eira para a segu
nd
a tópica freu
dian
as.
O verbo treib
en p
ode, assim
, referir-se a fazer sexo, e aqui, m
ais um
a
vez, não é exclu
sivamen
te aplicável aos seres h
um
anos, sem
que p
or isso
tenh
a qualqu
er relação com a vid
a biológica. Se d
izemos qu
e um
cachor-
ro and
a por aí, vad
iand
o e cruzan
do com
cadelas n
a rua, treib
an
do
, isso
não tem
qualqu
er relação com su
a vida in
stintiva, com
a reprod
ução d
a
espécie d
e cachorros, n
em com
os ciclos do cio d
a cadela. Pod
emos d
izer
o mesm
o de u
m ser h
um
ano qu
e, do p
onto d
e vista da p
ulsão, é u
m ca-
chorro, sem
nen
hu
ma red
ução d
e seu estatu
to hu
man
o ao de an
imal n
o
sentid
o aním
ico ou vitalista, m
as precisam
ente vagabu
nd
o, e pergu
ntar-
lhe: o qu
e você and
a fazend
o por aí, o qu
e and
a treiba
nd
o? O Trieb
, por-
tanto, é u
m su
bstantivo (qu
e virou con
ceito, virou B
egriff, e um
conceito
fun
dam
ental em
Freud
, um
Gru
nd
begriff) e qu
e quer d
izer o móbil, o m
ote
de tod
a ação direcion
ada, m
as não p
reviamen
te determ
inad
a em seu
alvo
e envolven
do u
ma d
imen
são de satisfação (B
efriedigu
ng)..
Em
inglês existe o term
o driv
e – que p
arece ser do m
esmo tron
co
etimológico an
glo-germân
ico de Trieb, o qu
e se verifica pela form
a sono-
ra – e que se torn
ou u
m con
ceito da p
sicologia motivacion
al (direção d
a
ação motivad
a, motivo). E
u tin
ha falad
o em m
ote, do qu
al motivo d
eriva
(Ih!, caí n
a armad
ilha d
a lingu
agem qu
e aqui veicu
lo: deriv
a evoca
translin
güísticam
ente d
rive, e o p
róprio Lacan
prop
õe o termo fran
cês
dériv
e para Trieb em
dad
o mom
ento, o qu
e significa qu
e estamos em
um
camp
o semân
tico convergen
te). Mas p
or ter caído n
o camp
o meram
ente
motivacion
al da p
sicologia, do in
divíd
uo d
e atos conscien
tes, este termo
– como aliás acon
tece com os term
os da lín
gua in
glesa, que p
or um
a es-
tranh
a razão prod
uzem
um
efeito de oxid
ação imed
iata nos con
ceitos
psican
alíticos – não serve m
ais para d
esignar u
m con
ceito fun
dam
ental
da p
sicanálise en
volvend
o a dim
ensão in
conscien
te.7 Hanns, Luiz – Dicionário com
entado do alemão de Freud, Rio de Janeiro, Im
ago Editora, 1996, verbere sobre pulsão, p. 339.
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68.
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a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
Com
o se sabe, o carnaval é u
ma festa m
uito an
tiga, existe desd
e a
antigu
idad
e e tinh
a, desd
e a sua origem
, cun
ho religioso e d
urava vários
dias. Posteriorm
ente, o carn
aval foi ganh
and
o um
progressivo sen
tido
pagão, e cu
riosamen
te é de form
a paralela a esse p
rocesso de m
un
da-
nização qu
e ele passa in
tegrar o calend
ário religioso da Igreja C
atólica.
Na Id
ade M
édia, m
ais exatamen
te em torn
o do sécu
lo XI, com
a insti-
tuição d
a Sem
ana S
anta, a festa d
o carnaval p
assou a ter su
a data m
eti-
culosam
ente m
arcada em
anteced
ência p
recisa com relação à P
áscoa.
Com
o a Páscoa ocorre n
o prim
eiro dom
ingo ap
ós a prim
eira lua ch
eia
que se verificar a p
artir do equ
inócio d
a prim
avera (no h
emisfério n
orte)
ou d
o equin
ócio do ou
tono (n
o hem
isfério sul), e a sexta-feira d
a Paixão é
a que an
tecede o D
omin
go de P
áscoa, então a terça-feira d
e Carn
aval ocorre
47 dias an
tes da P
áscoa.
O term
o carnaval d
eriva da exp
ressão latina ca
rne v
ale, com
posição
do acu
sativo carn
en, d
erivado d
e caro
, que sign
ifica carn
e, com a p
ala-
vra va
le, do verbo v
alere, qu
e significa b
em esta
r, pra
zer, d
ond
e: prazeres
da carn
e, sentid
o desd
e semp
re associado a carn
aval.
Os qu
arenta d
ias que an
tecedem
a Páscoa recebem
o nom
e de qu
a-
resma, e, segu
nd
o a Igreja, devem
ser marcad
os por fortes p
rivações e
jejum
de p
razeres da carn
e. Dad
o que a qu
aresma se in
icia na qu
arta-feira
dita d
e cinza
s, os dias qu
e anteced
em esta qu
arta-feira são marcad
os pela
inten
sificação dos an
seios por fru
ir os prazeres d
a carne n
o mais alto
grau. Particu
larmen
te, o dia qu
e a anteced
e, um
a terça-feira, portan
to, é
cham
ada d
e terça-feira
gord
a (m
ard
i-gras, em
francês) rep
resenta o áp
i-
ce, o clímax e – p
or que n
ão dizer, o orgasm
o desse p
eríodo d
e um
prazer
comp
rimid
o pela an
tecipação d
as privações qu
e o suced
erão? Dep
ois do
gozo máxim
o, as cinzas d
o gozo, e o início d
e um
temp
o de jeju
m – qu
a-
resma – até a R
essurreição.
Retom
and
o a nossa Trieb p
ara casá-la com o carn
aval, na con
clusão
deste breve escrito, d
iremos qu
e os vales da carn
e que valem
, prevalecem
nos d
ias de carn
aval, são um
a estrond
osa expressão cu
ltural d
a pu
lsão.
As tribos d
a cultu
ra hu
man
a se encon
tram n
os quatro d
ias de carn
aval
para se d
eixarem tocar p
elo aguilh
ão que as toca (tom
em esta p
alavra –
toca – em tod
as as assonân
cias e ressonân
cias de sen
tido qu
e quiserem
)
como gad
o, rebanh
o de corp
os que se m
ovem p
elas ruas, bailes e p
assare-
las de sam
ba, ind
o em fren
te, para on
de a força im
pelir, sem
pre em
busca
e no exercício d
o prazer.
Festa coletiva, de tribos, m
as na qu
al a busca d
e prazer é d
e cada u
m.
O Trieb é assim
: coletivo, transin
divid
ual, m
as com efeitos em
cada u
m,
irredu
tíveis e incom
paráveis com
os efeitos prod
uzid
os em ou
trem. V
ieh
treiben
, tocar o gado, n
os dizia Lu
iz Han
ns a resp
eito do sen
tido d
a pu
lsão,
para in
dicar a exteriorid
ade d
e sua fon
te em relação ao su
jeito. A alu
são
ao gado, con
tud
o, não d
eve ser aqui tom
ada n
o sentid
o dep
reciativo. Nad
a
contra o gad
o: são as nossas tribos. E
m vez qu
e tomarm
os os anim
ais
como m
odelo, é o h
um
ano m
esmo, em
um
a acentu
ação de su
a cond
ição
de objeto, con
dição à qu
al só ele tem acesso, com
o sujeito, p
ela via da
lingu
agem, qu
e se imp
õe aqui ao bich
o, que lh
e presta a ú
nica fu
nção d
e
metaforizar este objeto assim
coletivizado em
tribos no carn
aval. Qu
em
comp
arece mais u
ma vez aqu
i é a nossa boa e velh
a pu
lsão como aqu
ilo
que in
cide n
o sujeito e faz d
ele objeto, o toca como gad
o.
Um
a palavra m
e vem ao esp
írito para d
ar o pon
to final ao texto:
sassa
rico. Carn
aval é o mom
ento d
e sassaricar – e o que é sassaricar? É
sair por aí, d
ançan
do, rebolan
do, can
tand
o e saracoteand
o o corpo8. T
reibar
é sassaricar. Su
bstituin
do a p
alavra gado n
a expressão alem
ã Vieh
treiben
,
temos trib
o treib
en –
tracionar, p
ulsion
ar, imp
elir as tribos em su
a mar-
cha sassarican
te, de d
estino in
certo, mas d
e direção certeira ru
mo ao p
ra-
zer da carn
e.
8 Dicionário Houaiss da língua portuguesa, Instituto Antônio Houaiss, Rio de Janeiro, Editora Objetiva, 2001, 1ª edição, p.2523.
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io A
PP
OA
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A e
sc
ola
da
folie
Merc
ês G
hazzi e
Silvio
Cap
ave
rde1
An
os 70. O H
ino n
acional, can
tado em
filas bem ord
enad
as, marca
nossa en
trada n
o mu
nd
o da escola. O
s un
iformes bran
cos não escon
dem
a desacom
odação fren
te a esse novo am
biente. A
brigávamos em
nossas
fantasias a id
éia de qu
e esse regramen
to nos garan
tiria o ingresso n
a ave-
nid
a que con
du
ziria a descobertas e saberes ain
da n
ão sabidos. Q
ualqu
er
susp
iro mal colocad
o, e o olhar d
a professora se voltaria em
nossa d
ire-
ção. Novid
ade: p
ara termos acesso aos n
ossos sonh
os era preciso regrar
nossos corp
os, nossos h
orários, nossos d
esejos. Con
frontar-m
o-nos com
novas relações, p
autad
as por u
ma d
iversidad
e até então d
esconh
ecida.
Um
novo ritm
o vai nos en
volvend
o e se inserin
do em
nós.
Janeiro d
e 2008. Rein
gresso na escola. U
ma ou
tra escola. No lu
gar do
hin
o, um
samba en
redo. A
o invés d
a fila, a ala. O u
niform
e branco ced
e
1 Historiador. Diretor da Escola Municipal de Ensino Fundam
ental Lauro Rodrigues - Porto Alegre.
Re
ferê
nc
ias b
iblio
grá
fica
s
LACAN, J. – O Seminário, Livro XV – O Ato psicanalítico (1967/68), Lição III, de 29 de novem
bro de 1967, inédito, documento
de trabalho.
LACAN, J. – O seminário, livro XXIII, O sin thom
a, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 2007, p. 18.
FREUD, S. – Para introduzir o narcisismo [1914], in Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Com
pletas de Sigmund
Freud, Rio de Janeiro, Imago Editora, Vol. XIV, 1969.
HANNS, Luiz – Dicionário comentado do alem
ão de Freud, Rio de Janeiro, Imago Editora, 1996, verbere sobre pulsão, p. 339.
Dicionário Houaiss da língua portuguesa, Instituto Antônio Houaiss, Rio de Janeiro, Editora Objetiva, 2001, 1ª edição, p. 2523.
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átic
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Crô
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Ca
rna
va
l.
En
tretanto, u
ma coisa é d
esfilar na escola, ou
tra, bem d
istinta, é
ser seu in
tegrante. O
perten
cimen
to a essa agremiação, sem
elhan
te ao
que acon
tece no u
niverso d
o futebol, está, m
uitas vezes, in
scrito desd
e
antes d
o nascim
ento. A
Escola d
e Sam
ba oferta um
a série de traços id
en-
tificatórios. Inscrições qu
e marcam
aqueles qu
e comp
artilham
destes
significan
tes, represen
tativos de cad
a um
a delas.
No carn
aval de 2009, ap
ós a quebra d
e um
carro alegórico, no in
ício
de u
m d
esfile, um
a gestante, p
or volta do sétim
o mês, é d
escida p
ela
grua, acaban
do, p
recocemen
te, sua p
assagem n
a avenid
a. Cen
as como
essa revelam o qu
anto o tem
po d
e um
integran
te da escola já está d
ado n
o
viés discu
rsivo que cerca su
a família, su
a comu
nid
ade. S
ou p
assista,
antes d
e passar, com
min
has p
róprias p
ernas, p
ela avenid
a. É claro, exis-
tem casos d
e troca de escola p
or diferen
tes questões, assim
como acon
te-
ce no m
eio futebolístico. Tam
bém h
á aqueles qu
e defen
dem
mais d
e um
estand
arte. Assim
, por m
ais que ten
ham
os a marca id
entificatória d
e um
a
escola, faremos com
ela, pela vid
a, o que p
ud
ermos.
Vale lembrar o “esqu
enta”
2 da Im
perad
ores do S
amba, qu
e diz: “E
eeu
souu
uu
u... S
ou Im
perad
or até morreeer...”.
Em
nossa ap
roximação n
os pergu
ntam
os: Qu
ais relações pau
tam es-
sas comu
nid
ades carn
avalescas? Qu
e solidaried
ades estão ali p
resentes?
Com
o escola, oferece quais ap
rend
izagens? Q
ual é seu
currícu
lo? Resp
os-
tas aind
a por con
struir...
Fica-nos, p
orém, u
ma sen
sação de qu
e essa é um
a escola inclu
siva.
Ela m
anifesta u
ma p
reocup
ação em ad
equar cad
a sujeito a u
ma fu
nção
coletiva, comp
atível com su
as habilid
ades. N
ão existe, na E
scola de S
am-
ba, “aquele qu
e nad
a sabe”. O p
atrimôn
io das exp
eriências in
divid
uais é
semp
re consid
erado (tod
o mu
nd
o é capaz d
e algo relevante... n
em qu
e
seja emp
urrar a alegoria...). Q
uem
teve a oportu
nid
ade d
e frequen
tar a
seu lu
gar à fantasia carn
avalesca. Mas a fan
tasia sobre a Escola segu
e...
Naqu
ele espaço, som
os como as p
equen
as crianças qu
e ensaiam
seus
prim
eiros passos d
e samba n
o chão n
a quad
ra. Tal qual o cen
ário da esco-
la formal ali rep
risávamos n
ossa cond
ição de qu
em “está fora d
o lugar”,
mas p
edin
do p
assagem.
Folia e desord
em são reorgan
izadas a p
artir do sign
ificante escola.
Agora, E
scola de S
amba.
Nad
a pod
e estar mais p
róximo e m
ais distan
te da fo
lie que o carn
a-
val de E
scola. A eu
foria do carn
aval – aquele qu
e nos rem
ete à liberação
pu
lsional, con
den
sada em
quatro d
ias anu
ais – se aproxim
a de n
ós na
quad
ra, nos en
saios seman
ais, mom
ento p
reparatório em
que a alegria
emerge e se tran
smu
ta em id
entificação ao en
redo d
e cada an
o. Porém, a
avenid
a requer ou
tra ordem
. Por trás do m
omen
to de êxtase d
os qui-
nh
entos ou
mil m
etros de su
ado d
esfile, encon
tramos o sign
ificante E
s-
cola, aquele qu
e nos m
arcou d
esde a in
fância, e qu
e agora nos rem
ete a
um
a plu
ralidad
e de sign
ificações: saber, cultu
ra, transm
issão, regramen
to,
mestria e, p
orque n
ão dizer, com
un
idad
e.
O sam
ba de escola n
ão é nosso ú
nico carn
aval. Aliás, C
arnaval rem
e-
te à plu
ralidad
e: não existe C
arnaval. E
xistem carn
avais. O d
esfile das
Escolas d
e Sam
ba do R
io de Jan
eiro, o Circu
ito Barra-O
nd
ina em
Salva-
dor, o frevo d
as ruas d
e Olin
da e as T
ribos do C
arnaval d
e Porto Alegre,
decid
idam
ente n
ão são a mesm
a coisa. Tomam
os, então, escola com
o nosso
abre-alas na p
assarela do tem
a carnavalesco.
Nos ú
ltimos três an
os, temos frequ
entad
o um
a das escolas d
e samba
de Porto A
legre, de in
ício um
pou
co timid
amen
te: afinal o qu
e fazíamos
por lá, isso aqu
i não é R
io de Jan
eiro nem
nad
a, e Porto Alegre n
ão tem
nen
hu
ma trad
ição de sam
ba no p
é (!!!). A exp
eriência d
e conviver n
esse
território vem n
os prop
orcionan
do u
m rico cam
po d
e interações. N
essa
grand
e forma d
e congraçam
ento, a p
rimeira coisa a referir é a recep
tivi-
dad
e que caracteriza os an
fitriões. Mesm
o sem sam
ba no p
é, não h
á hos-
tilidad
e ao estrangeiro, ao bu
rguês, ao d
iferente.
2 Esquenta é o nome genericam
ente atribuído ao grito de chamada para o desfile da escola. São reiteradam
ente utilizadosnos ensaios de quadra com
o forma de em
polgar e assegurar a pertença e a identificação dos integrantes à escola.
ma
rço
20
11
l co
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PP
OA
.75
co
rre
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OA
l ma
rço
20
11
74.
tem
átic
a.
Crô
nic
as
de
Ca
rna
va
l.
apren
da d
e acordo com
suas cap
acidad
es e desejos. O
resultad
o é o espe-
táculo tran
smitid
o, anu
almen
te, para cen
tenas d
e países. O
xalá a escola
formal p
rodu
zisse a possibilid
ade id
entificatória qu
e vemos acon
tecer
na E
scola de S
amba.
Qu
em é qu
e aind
a não se p
ergun
tou: p
or que n
ão emp
regar o mesm
o
emp
enh
o, o mesm
o rigor, ded
icação e criatividad
e dos barracões p
ara
constru
ir um
a nação m
enos d
esigual?
Frequen
tar um
a quad
ra de escola – lu
gar de con
strução d
e um
saber
diferen
te da escola form
al, lugar em
que u
ma p
luralid
ade d
e saberes con-
vive, dom
and
o a “folie” p
ara transform
á-la em beleza – p
oderia, qu
em
sabe, trazer algum
a luz a estas qu
estões.
casa do fu
nd
ador d
e um
a das alas, terá visto u
ma fam
ília inteira en
volvi-
da em
todos os d
etalhes qu
e prep
aram a gran
de n
oite do d
esfile. Terá
também
notad
o o quan
to, ali, está presen
te um
sentim
ento d
e perten
ça a
um
lugar, a u
ma m
arca. Com
o em u
ma in
stituição form
al de en
sino, os
pap
éis estão bem d
emarcad
os e tud
o gira em torn
o de u
m id
eal maior a
ser apresen
tado n
a avenid
a.
Há, n
a Escola d
e Sam
ba, espaços p
ara apren
der o qu
e não se sabe:
na bateria, tocar u
m n
ovo instru
men
to; nas alas, d
omin
ar um
a nova
coreografia; no can
to do sam
ba enred
o, acrescentar firu
las rítmicas e
harm
ônicas.
A id
éia de u
m “Pu
xador d
e Sam
ba”, desp
rezada p
elo mestre Jam
elão
da M
angu
eira (para qu
em “p
uxad
or” é de fu
mo... E
le se autod
enom
ina-
va, cantor) rem
ete-nos à im
agem d
aquele a qu
em com
pete can
alizar na
avenid
a a energia coletiva d
as alas que can
tam em
un
íssono, “sem
atra-
vessar”3. Já o M
estre-Sala, in
corpora o saber an
cestral da escola e o
apresen
ta aos espectad
ores do d
esfile. Com
o não com
pará-los, com
o
não en
contrar n
eles a figura id
ealizada d
o professor d
a escola formal?
Avan
ça o desfile d
e person
agens: a Porta B
and
eira defen
de com
afinco o p
avilhão d
a escola. Osten
ta com orgu
lho o sím
bolo da in
sti-
tuição. T
raz aí a garra daqu
elas figuras p
ercebidas com
o mais su
bal-
ternas n
os estabelecimen
tos de en
sino: as m
erend
eiras, as coorden
a-
doras d
e discip
lina, as orien
tadoras, qu
e beijam seu
escud
o, mesm
o
sem receber os ap
lausos d
a assistência d
edicad
os à Porta Ban
deira d
a
escola de sam
ba.
O recon
hecim
ento in
ternacion
al que o d
esfile das escolas d
e samba
do B
rasil recebe, só nos m
ostra a capacid
ade d
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ução cole-
tiva que caracteriza estas com
un
idad
es. Rep
resenta, com
o nas an
tigas
man
ufatu
ras, a possibilid
ade d
e que cad
a um
contribu
a a seu m
odo e
3 Num desfile de escola de sam
ba, atravessar significa que as alas não estão cantando a mesm
a parte do samba enredo. Na
avaliação dos jurados isso pode representar perda de pontos no quesito harmonia.
ma
rço
20
11
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io A
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OA
.77
ensaio.
Cria
çã
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o
Maria
Âng
ela
Bulh
ões
A origem
é semp
re mítica, u
ma h
ipótese, p
ura in
terrogação. Com
o
nu
m livro, as p
rimeiras p
áginas, os p
rimeiros cap
ítulos d
e nossas vid
as
vão send
o escritos pelas m
ãos de qu
em n
os cuid
ou. E
sses vão escrever
sobre o mom
ento d
e nossa ch
egada. A
palavra vid
a deve tom
ar sentid
os
mú
ltiplos e p
arecer algo especial. O
u foi isso qu
e me fizeram
acreditar!
No com
eço o temp
o não tem
a verdad
eira existência, é ap
enas u
m
contín
uo d
e sensações. A
pós as p
rimeiras p
áginas, qu
e com u
m p
ouco d
e
sorte foram bem
redigid
as, escritas com tod
o cuid
ado, en
tramos n
o capí-
tulo d
o sonh
o. Ah
, a infân
cia! Essa tem
gosto de p
retérito perfeito. É
lá
que en
contram
os tal qual n
um
filme, n
osso sonh
o inven
tado. A
ind
a hoje
me im
pression
a a forma sim
ples e in
tensa d
essas vivências. D
o choro ao
riso foram-se n
ão mais qu
e instan
tes. Tud
o isso de form
a mágica, absolu
-
ta, deixa im
pressões p
rofun
das. A
idéia d
esse filme-m
emória carrega o
tom d
a incerteza. Foi verd
ade m
esmo? A
s imagen
s pod
em ser tão irreais e
ma
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11
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Crô
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as
de
Ca
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11
78.
ensaio
.
ao mesm
o temp
o acomp
anh
adas d
o mais p
uro sen
timen
to de verd
ade. A
irrealidad
e repleta d
e verdad
e, assim m
e toma o cin
ema, assim
me tom
a
min
ha in
fância.
O tem
po n
aquela ép
oca era mais d
emorad
o, levava anos p
ara um
a
tarde p
assar. O tem
po d
e min
ha verd
adeira existên
cia tardava ch
egar.
Qu
and
o o temp
o chega? O
presen
te é esse temp
o inap
reensível qu
e quan
-
do você vai tom
á-lo já se foi, escorregou.
Tud
o recomeça n
o mesm
o instan
te que term
ina, tal qu
al o movim
en-
to das m
arés. A id
éia do tem
po sem
pre m
e imp
ressionou
. Com
o que o
mesm
o temp
o do relógio p
ode cau
sar imp
ressões tão diversas? O
temp
o
presen
te é esse que p
or estar perto d
emais n
un
ca lhe d
amos seu
devid
o
valor. Deveríam
os confiar m
ais no p
resente, ele n
ão falta jamais, su
a pre-
sença é sem
pre garan
tida. E
le, ao contrário d
o pretérito p
erfeito, se imp
õe
nu
ma realid
ade p
or vezes maçan
te, presen
te na alegria e n
a tristeza.
Talvez aind
a falte o verdad
eiro reconh
ecimen
to a esse verdad
eiro
temp
o. Sin
to que com
eço a me afeiçoar ao p
resente. Pen
a! Ele n
em m
e
escutou
e já se foi.
Com
o estou d
edican
do esse escrito ao tem
po, p
reciso falar dele, qu
e
nu
nca ch
ega, senta e joga con
versa fora, mas com
o bom am
igo é semp
re
esperad
o com águ
a no fogo. O
futu
ro tem o p
oder d
e nos d
ar esperan
ças
ao mesm
o temp
o em qu
e nos d
eixa comp
letamen
te apreen
sivos. Todos
querem
saber dele p
ara dorm
ir tranqü
ilos.
Afin
al, ele bem p
ode estar ap
rontan
do algu
ma travessu
ra! Precisa-
mos d
efinitivam
ente saber o qu
e está maqu
inan
do! E
ntretan
to, ele sabe
que seu
charm
e e seu p
oder estão n
o mistério. N
ão se faz de rogad
o e não
man
da n
otícias. Faz questão d
e nos d
eixar assim, p
erdid
os nas in
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do fu
turo. A
h! E
sse adorável m
aland
ro!
Existe o tem
po! O
relógio, esse, contin
ua sem
o men
or remorso m
ar-
cand
o cada segu
nd
o, cada m
inu
to com su
a precisão m
atemática, qu
ase
irritante. C
omo o relógio n
ão comp
reend
e que às vezes p
recisamos d
e
mais tem
po? N
un
ca vi tanta in
transigên
cia mascarad
a de p
erfeição. O
temp
o passa p
ara todos e p
ara tud
o, pelo m
enos n
isso há u
m p
ouco d
e
iguald
ade. C
laro, certamen
te isso não garan
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as o temp
o não
tem esse tip
o de com
prom
isso.
No fin
al, que ain
da n
ão chegou
, pois d
epois n
ão pod
erei escrever
(armad
ilhas d
o temp
o!) imagin
o assim. U
ma ilu
stre descon
hecid
a bate
em m
inh
a porta e n
o aguard
o de m
inh
a pessoa n
ão dem
onstra a m
enor
pressa. Q
uan
do fin
almen
te dou
o ar de m
inh
a graça, com u
ma in
timid
a-
de qu
e não lem
bro ter lhe d
ado, m
e faz sinal p
ara segui-la. M
eio atordoa-
da, ten
to argum
entar qu
e preciso d
e mais tem
po. E
la me olh
a com o olh
ar
firme d
e quem
não aceita ser qu
estionad
a e, com a au
toridad
e que só a
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spira, m
e leva. Saio olh
and
o para trás,d
esacreditan
do em
tud
o
que se p
assa, com olh
ar perd
ido d
e pretérito im
perfeito.
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, 17
, 24
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essidad
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, au
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ítulo
(se for o
caso
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ad
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(se for o
caso
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5) as asp
as serão u
tilizadas p
ara iden
tificar citações d
iretas;
6) c
itações d
iretas c
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mais d
e 3 lin
has d
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o
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, com
recuo d
e 4 cm
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7) o
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e não seja
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e uso
corren
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título
s de liv
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8) n
ão u
tilizar n
egrito
(bold
) ou
sublin
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erline);
9) a
data
máxim
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e matéria
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s ou
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dia
05, p
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ação n
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Com
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se reserva o
direito
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sária
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e matéria
s está su
jeita à
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issão d
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Correio
e à d
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e de esp
aço p
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ação.
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