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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURS CURSO DE DIREITO
DAS FUNÇÕES DAS MATAS CILIARES E SUA RELAÇÃO COM O REGIME JURÍDICO DOS RECURSOS HÍDRICOS
CRISTIANE SCHEWINSKI
Itajaí/SC, maio/2007
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURS CURSO DE DIREITO
DAS FUNÇÕES DAS MATAS CILIARES E SUA RELAÇÃO COM O REGIME JURÍDICO DOS RECURSOS HÍDRICOS
CRISTIANE SCHEWINSKI
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Professor Doutor Ricardo Stanziola Vieira
Itajaí/SC, maio/2007
AGRADECIMENTO
À Deus pelo dom da vida, pelas forças espirituais e físicas que me conduziram por toda a jornada acadêmica e hão de estar presentes por toda a minha existência.
Aos meus pais, Deonísio e Cecília Schewinski, exemplos de caráter, honestidade, dignidade, virtudes estas que herdei e vão me acompanhar nesta brilhante profissão.
Devo muito também, a minha querida irmã Adriane, que dividiu comigo momentos angustiantes que somente nós sabemos, e de extrema felicidade, quando passei no vestibular e fui alcançando méritos na jornada acadêmica.
Sou grata aos meus amigos de sala de aula, de forma especial Rodrigo, Walter, Mário, João Luís, Fernanda e Rosângela, os quais contribuíram com sua amizade e companheirismo nos momentos alegres, de confraternização, de desespero e preocupação com os prazos e responsabilidades a serem cumpridos.
Tenho muito a agradecer ao ilustre professor Dr. Ricardo Stanziola Vieira, pela colaboração e incentivo sem o qual não seria possível o desenvolvimento deste trabalho.
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho ao meu pai, Deonísio Schewinski, cuja coragem, determinação, dedicação ao trabalho e honestidade construíram o exemplo que procuro seguir em todos os dias de minha vida. Dedico também à minha mãe, Cecília Schewinski, a quem tudo devo, por seu sacrifício, compreensão e afeto, os quais jamais conseguirei retribuir com a mesma intensidade.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí/SC, maio/2007
Cristiane Schewinski Graduanda
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Cristiane Schewinski, sob o título
Áreas de Preservação Permanente - mata Ciliar foi submetida em 26 de junho de
2007 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: Dr. Ricardo
Stanziola Vieira; Dra. Fernanda de Salles Cavedon e Msc. Francelise Pantoja
Diehl e aprovada com a nota 7,00 (sete).
Itajaí/SC, 26 de junho de 2007.
Professor Dr. Ricardo Stanziola Vieira Orientador e Presidente da Banca
Professor Msc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002
PNMA Política Nacional do Meio Ambiente
SISNAMA Sistema Nacional do Meio Ambiente
CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente
APP Área de Preservação Permanente
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Meio Ambiente – é o conjunto de condições, leis, influências, alterações e
interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida
em todas as suas formas.1
Ecossistema – conjunto de interações desenvolvidas pelos componentes vivos
(animais, vegetais) não vivos (água, gases atmosféricos, sais minerais e a
radiação solar) de um determinado ambiente.2
Floresta – “é a forma de vegetação, natural ou plantada, constituída por uma
grande número de árvores, com o mínimo espaçamento entre si” .3
Poluição Ambiental – perturbações provocadas por atividades antrogênicas as
quais produzem alterações nas características físico-químicas da água e
modificam as características biológicas dos sistemas aquáticos. 4
Direito Ambiental – é a ciência jurídica que estuda, analisa e discute as questões
e os problemas ambientais e sua relação com o ser humano, tendo por finalidade
a proteção do meio ambiente e a melhoria das condições de vida no planeta. 5
Área de preservação permanente - consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas: a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima seja: 1 - de 30 m (trinta metros) para os cursos d'água de menos de 10 m (dez metros) de largura;
1 Art. 3º, I da Lei nº 6.938/81 2 RIBAS, Luis César. A problemática ambiental. São Paulo: LED, 1999, p. 111 3 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais,
p.477 4 SMITH, W.S. et al. Comunidade de peixes como indicadora de poluição ambiental. Revista
Brasileira de Ecologia, São Paulo, a 1. n. 1, 1997, p. 67-71. 5 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual do direito ambiental. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 23.
2 - de 50 m (cinqüenta metros) para os cursos d'água que tenham de 10 (dez) a 50 m (cinqüenta metros) de largura; 3 - de 100 m (cem metros) para os cursos d'água que tenham de 50 (cinqüenta) a 200 m (duzentos metros) de largura; 4 - de 200 m (duzentos metros) para os cursos d'água que tenham de 200 (duzentos) a 600 m (seiscentos metros) de largura; 5 - de 500 m (quinhentos metros) para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 m (seiscentos metros). b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d'água naturais ou artificiais; c) nas nascentes, ainda que intermitentes e nos chamados "olhos d'água", qualquer que seja a sua situação topográfica, num raio mínimo de 50 m (cinqüenta metros) de largura; d) no topo de morros, montes, montanhas e serras; e) nas encostas ou partes destas, com declividade superior a 45 , equivalente a 100% na linha de maior declive; f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues; g) nas bordas dos tabuleiros ou chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 m (cem metros) em projeções horizontais; h) em altitude superior a 1.800 m (mil e oitocentos metros), qualquer que seja a vegetação. i) nas áreas metropolitanas definidas em lei.6
Mata ciliar – vegetação que se desenvolve ao longo dos rios e com influência
direta dos mesmos, ocorrendo nas áreas de inundação.7
Planos de recursos hídricos - São planos diretores que visam a fundamentar e orientar a implementação da Política Nacional dos Recursos Hídricos.8
6 Art. 2º da Lei nº 4.771/65 – Código Florestal 7RIBAS, Luis César. A problemática ambiental. p. 112. 8 Art. 6º da Lei 9.433/97 – Política Nacional dos Recursos Hídricos
Zona Costeira – espaço geográfico de interação do ar, do mar e da terra, incluindo seus recursos renováveis ou não, abrangendo uma faixa marítima e outra terrestre, que serão definidas pelo Plano.9
9 Art. 2º, § único da Lei 7.661/88 – Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro
SUMÁRIO
RESUMO.......................................................................................... 10
INTRODUÇÃO ................................................................................. 11
CAPÍTULO 1 .................................................................................... 13
OS DIREITOS FUNDAMENTAIS E OS NOVOS DIREITOS............. 13 1.1 A EVOLUÇÃO DOS DIREITOS E OS NOVOS DIREITOS ............................13 1.2 DA RELAÇÃO ECOLOGIA X MEIO AMBIENTE ...........................................17 1.3 DA PROTEÇÃO CONTRA A POLUIÇÃO......................................................18 1.4 DAS SANÇÔES PREVISTAS NO ORDENAMENTO JURÍDICO...................24 1.5 DA POLÍTICA E SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE .....................26 1.6 DEFINIÇÕES LEGAIS DE CONCEITOS PERTINENTES AO MEIO AMBIENTE ...........................................................................................................27 1.7 DA ASSEMBLÉIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS .....................................29
CAPÍTULO 2 .................................................................................... 33
DA PROTEÇÃO DOS ESPAÇOS AMBIENTAIS ............................. 33 2.1 DOS ESPAÇOS AMBIENTAIS PROTEGIDOS..............................................33 2.2 DAS ÁREAS DE PROTEÇÃO PERMANENTE..............................................34 2.3 DA SUPRESSÃO DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE.........39 2.4 DA RESERVA FLORESTAL LEGAL .............................................................39 2.5 DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO..........................................................42 2.6 DAS LIMITAÇÕES DO DIREITO DE PROPRIEDADE...................................44
CAPÍTULO 3 .................................................................................... 51
DAS FUNÇÕES DAS MATAS CILIARES E SUA RELAÇÃO COM O REGIME JURÍDICO DOS RECURSOS HÍDRICOS.......................... 51 3.1 ASPECTOS DA POLÍTICA NACIONAL DOS RECURSOS HÍDRICOS ........51 3.2 DO SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS.............................................................................................................53 3.3 DAS ZONAS COSTEIRAS .............................................................................54 3.4 DAS MATAS CILIARES .................................................................................56 3.5 DAS FUNÇÕES DAS MATAS CILIARES ......................................................58
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................. 62
REFERÊNCIAS DAS FONTES CITADAS........................................ 65
RESUMO
A presente monografia inicia-se com alguns conceitos
pertinentes ao meio ambiente bem como um breve histórico acerca da evolução
dos direitos fundamentais até o surgimento dos direitos difusos, os quais estão
enquadrados os direitos ambientais. Na seqüência, o segundo capítulo trata dos
espaços ambientais especialmente protegidos, apresentando-se os conceitos e as
legislações que regem as áreas de preservação permanente, as reservas legais e
as unidades de conservação. Finalmente no terceiro capítulo, traz-se à baila
alguns aspectos da Política Nacional dos Recursos Hídricos, destacando-se sua
relação com as funções das matas ciliares. Há um destaque especial também
para a importância e riscos advindos com a supressão desta vegetação ribeirinha
(mata ciliar), ressalte-se que a influência desta vegetação influi deste as
condições climáticas da região, os recursos hídricos até a qualidade do solo,
dentre outros aspectos relevantes e elucidados no decorrer do trabalho.
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto o estudo do regime
jurídico das matas ciliares e sua relação com os recursos hídricos e a zona
costeira.
O seu objetivo é identificar as áreas especialmente
protegidas bem como os riscos de poluição/degradação destes espaços e como
esse fator pode afetar a coletividade
Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando-se da
evolução dos direitos fundamentais e a criação dos novos direitos, originando-se
os direitos ambientais. Faz-se necessária a relação da ecologia com o meio
ambiente, já que ambos estão interligados. Outrossim, importante destacar os
principais conceitos relativos ao meio ambiente, os dispositivos da Constituição da
República Federativa do Brasil aplicáveis à matéria, as leis esparsas e os
princípios norteadores, sendo estes criados a partir de uma Conferência
Internacional, realizada em Estocolmo, reconhecidos internacionalmente e
inspiradores de todos os povos do mundo na preservação e fortalecimento do
meio ambiente.
No Capítulo 2, tratando dos espaços ambientais
especialmente protegidos, encontramos as áreas de preservação permanente, a
reserva legal e as unidades de conservação, fazendo-se um apanhado da
legislação que protege e regula estas áreas. Como complemento, conveniente
destacar os limites do direito de propriedade, que deve atender a função social e
ambiental da propriedade, no caso em tela, principalmente quando esta
propriedade confrontar com áreas especialmente protegidas. Outro tópico
apresentado neste capítulo diz respeito às hipóteses de supressão das áreas de
preservação permanente.
No Capítulo 3, foram expostos aspectos da Política Nacional
dos Recursos Hídricos, do Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos
Hídricos bem como da zona costeira. Após a explanação dos conceitos
13
pertinentes ao meio ambiente e imprescindíveis para a compreensão do foco
primordial deste trabalho, passou-se a dispor sobre a mata ciliar, as funções,
danos e riscos que poderão advir com o mau uso destes espaços, além de sua
importância frente ao meio ambiente.
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre ocupação indevida em áreas de preservação permanente.
Para a presente monografia foram levantadas as seguintes
hipóteses:
��O que é mata ciliar?
��Qual a função e importância da mata ciliar?
��Quais os riscos advindos com a supressão ou redução das matas ciliares?
��Quais as soluções para resolver o problema e evitar maiores danos ambientais?
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase
de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados
o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente
Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as
Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa
Bibliográfica.
14
CAPÍTULO 1
OS DIREITOS E OS NOVOS DIREITOS
1.1 A EVOLUÇÃO DOS DIREITOS E OS NOVOS DIREITOS
A evolução dos fatos sociais deve corresponder à evolução
dos direitos, pois na medida que a sociedade progride aumenta a complexidade
do regramento da conveniência humana, o que requer também a evolução no
reconhecimento dos direitos e nos instrumentos de proteção e defesa.
Pode-se dizer que “os direitos do homem por mais
fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas
circunstâncias, caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades contra
velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de
uma vez por todas” 10
Verifica-se que “as mudanças sociais e políticas, as novas
carências, a valoração de bens antes não percebidos pela Sociedade ocasionam
uma evolução dos direitos através do surgimento de novos direitos e da
reformulação dos direitos já existentes”11
Desta maneira, há necessidade de adequação dos direitos
já existentes à nova ordem jurídica, por meio da positivação de novos direitos.
No entanto, não há apenas a criação de novos direitos, mas
também a readequação, ou seja renovação dos direitos já existentes em
conformidade com os anseios da sociedade.
10 BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos, p. 5 11 CAVEDON, Fernanda de Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. Florianópolis:
Visualbooks, 2003, p. 58
15
Neste sentido, importante a observação acerca dos direitos
renovados:
(...) é necessário ter em mente que os novos direitos não são
apenas jogados no ordenamento, à medida que vão sendo
positivados. Para o bem da logicidade do sistema, há um
rearranjo do ordenamento jurídico. Os direitos preexistentes são
adaptados aos novos anseios da sociedade objetos da
positivação. Por isso, deve-se falar tanto sobre novos direitos
quanto sobre direitos renovados.12
A inovação de novos direitos aos cidadãos e a redifinição de
outros direitos já existentes, como resultado da evolução da sociedade, ocorreu
através de lutas e conquistas da sociedade civil organizada.
Ihering destaca que o direito constitui conquistas, ao longo
da trajetória da civilização, decorrentes da luta dos povos e classes:
“Todo o direito do mundo foi assim conquistado, todo o
ordenamento jurídico que se lhe contrapôs teve de ser eliminado
e todo direito, assim como o direito de um povo ou de um
indivíduo, teve de ser conquistado com luta”13
Essa evolução dos direitos pode ser compreendida sob três
etapas ou gerações que se sucedem e se sobrepõem, ou seja existem os direitos
de primeira, segunda e terceira gerações.
Os direitos de primeira geração, marcados pela exaltação da
liberdade e autonomia do indivíduo em detrimento do Estado, cuja esfera de
atuação e interferência é restringida14.
12 BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. A função Ambiental da Propriedade Rural. São Paulo:
LTr, 1999, p. 36 13 IHERING, Rudolf Von. A luta pelo direito. Trad. J. Cretella Jr. E Agnes Cretella. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1998, p. 27 14 CAVEDON (2003, p. 58)
16
Os direitos de segunda geração, chamados direitos sociais,
que exigem uma atitude positiva do Estado, uma prestação do Estado em favor
do indivíduo15.
Já os direitos de terceira geração, chamados difusos e
coletivos, marcados pela solidariedade e pela noção de poder-dever. O sujeito de
direitos passa do indivíduo enquanto membro de um grupo social, inserido na
sociedade, até o sujeito transindividual e indeterminável.16
Ainda sobre direitos de terceira geração, “ são direitos de
solidariedade, que impõem aos Estados, e também a outras entidades coletivas
das sociedades, o respeito a interesses individuais, bem como coletivos e difusos,
à fruição de bens insusceptíveis de apropriação individual, quando integrarem, por
exemplo, o patrimônio histórico, cultural e natural comum.” 17
Neste prisma de direitos, divididos em gerações, deduz-se
que a preservação do meio ambiente está enquadrado dentre os direitos de
terceira geração conforme assegura denota-se:
“As transformações econômicas e sociais, os avanços
tecnológicos ocorridos nas últimas décadas e os impactos
causados sobre o Meio Ambiente fizeram despertar uma nova
consciência global quanto a relação homem/ natureza. Passou-se
a analisar criticamente o Paradigma individualista, liberal e
desenvolvimentista dominante, propondo-se sua transposição e a
adoção de novos valores de ordem social e ambiental.” 18
Corroborando, o meio ambiente é entendido pelo direito como
um bem jurídico de terceira geração:
15 CAVEDON (2003, p. 58 16 CAVEDON (2003, p. 58 17 GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo Constitucional e Direitos Fundamentais. São Paulo:
Celso Bastos Editor: Instituto Brasileiro de Direito Constitucional, 1999. p. 112 18 CAVEDON. P. 59
17
“A natureza jurídica do meio ambiente se estruturou como
relação jurídica na doutrina como interesses difusos.
Dizendo respeito à proteção de interesses plurindividuais
que superam as noções tradicionais de interesses
individuais ou coletivos, dado que concernem a bens
indivisíveis e individualizáveis, que interessam a todos. Sua
nota essencial é o conceito de difuso, ou seja, aquilo que há
difusão, propagação, divulgação, espalhamento. O Código
de Defesa do Consumidor conceitua interesses ou direitos
difusos como os transindividuais, de natureza indivisível, de
que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por
circunstâncias de fato e interesses ou direitos coletivos
como os transindividuais de natureza indivisível de que seja
titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si
ou com a parte contrária por uma relação jurídica base. O
interesse difuso é o interesse que cada indivíduo possui
pelo fato de pertencer a pluralidade de sujeitos a que se
refere a norma. Tampouco é o interesse próprio de uma
comunidade organizada, constituída pela soma dos
interesses (ou de alguns deles) dos indivíduos concretos
que a compõem e, portanto exclusivo.” 19
No mesmo diapasão, o contexto social propiciou o
surgimento de novos direitos e a evolução dos direitos já existentes, que
passaram de individuais a coletivos e difusos, em cuja categoria inserem-se os
direitos relativos ao meio ambiente.
Os direitos difusos são originados a partir de novas
exigências surgidas na sociedade moderna, que surgem a partir de novos
19 MUKAI, Toshio. Direito Ambiental Sistematizado. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária,
1994.
18
carecimentos, conforme destaca BOBBIO20 “ essas exigências nascem somente
quando nascem determinados carecimentos. Novos carecimentos nascem em
função da mudança das condições sociais e quando o desenvolvimento técnico
permite satisfazê-los”.
1.2 DA RELAÇÃO ECOLOGIA X MEIO AMBIENTE
Quando se fala em meio ambiente vem-nos à mente, de
imediato, a palavra ecologia. No dizer de LAGO e PÁDUA encontramos:
“ Em 1866, o biólogo alemão HERNEST HAECKEL, em sua obra
Morfologia Geral os Organismos, propôs a criação de uma nova e
modesta disciplina científica, ligada ao campo da biologia, que
teria por função estudar as relações entre as espécies animais e
o seu ambiente orgânico e inorgânico. Para denominá-la, ele
utilizou a palavra grega oikos (casa) e cunhou o termo “ecologia”
(ciência da casa)21
Pelo entendimento de LEWINSOHN, a ecologia “aparece,
portanto, como um campo da Biologia, interligando-se com vários outros campos
desta ciência que a antecedem historicamente; mas, em função da diversidade de
fatores abióticos que se integram nesta abordagem, desde sua origem a Ecologia
envolve-se intimamente com outras ciências, notadamente a Geologia, Pedologia
(estudo dos solos), Climatologia e Geografia.”22
Em virtude da preocupação com a ecologia, os partidos
políticos, os grupos ambientalistas e até os empresários passaram a defender o
meio ambiente, conscientes de sua importância e estudam formas para conciliar o
desenvolvimento e o equilíbrio ecológico.
20 BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos, p 6-7. 21 LAGO, Antonio Pádua & Augusto, José. O que é ecologia. 7.ed. São Paulo: Brasiliense, 1988, p.
07. 22 LEWINSOHN, TM. Ecologia: questões ambientais e normas. Justitia. São Paulo, v. 113, abr./jun.
1981, p. 97.
19
Diante do binômio desenvolvimento x equilíbrio ecológico é
preciso encontrar um meio termo, ou seja, o equilíbrio. São adequadas as
palavras do ambientalista português PESSOA, quando afirma:
“Ser ecologista, não é apenas ser contra aquilo a que se chama
Progresso, não é apenas ser anti-qualquer coisa ou anti-tudo ou
porque está na moda, não é apenas ser por certas manifestações
com o seu quê de folclore (que também é, aliás, importante); ser
ecologista é sobretudo acreditar que a vida pode ser melhor se as
mentalidades mudarem e tiverem em consideração os
ensinamentos que a velha Terra e o ainda velho Universo não
cessa de nos transmitir.”23
Então pode-se dizer que é preciso encontrar um equilíbrio
entre o homem e a natureza, num mundo de recursos limitados.
Feitas as observações iniciais sobre a Ecologia, cuja
matéria é foco central do estudo do meio ambiente, vejamos como este é
analisado sob o ponto de vista técnico-jurídico.
1.3 DA PROTEÇÃO CONTRA A POLUIÇÃO
O Ordenamento Jurídico Brasileiro recepcionou os direitos de
terceira geração, que também dispõe da proteção ambiental expressos de
maneira geral, no artigo 225 da Constituição da República Federativa do Brasil de
198824 que assegura:
“Todos têm direito ao Meio Ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade
23 PESSOA, F. Ecologia e território. Porto: Afrontamento, 1985. P. 73 24 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, Centro
Gráfico, 1988
20
o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras
gerações.”
Para melhor interpretação do acima disposto o equilíbrio
ecológico “ é o estado de equilíbrio entre os diversos fatores que formam um
ecossistema ou habitat, suas cadeias tróficas, vegetação, clima,
microorganismos, solo, ar, água, que pode ser desestabilizado pela ação humana,
seja por poluição ambiental, por eliminação ou introdução de espécies animais e
vegetais”25
Acerca dos sujeitos do direito ao meio ambiente equilibrado
preleciona Amirante:
“é de cada um, como pessoa humana, independentemente de
sua nacionalidade, raça, sexo, idade, estado de saúde, profissão,
renda ou residência, desta maneira o uso do pronome indefinido
– todos – alarga a abrangência da norma jurídica, pois não está
se particularizando quem tem direito ao meio ambiente, evitando-
se que se exclua quem quer que seja, e ao mesmo tempo que o
direito ao meio ambiente protegido é de cada um, é de todos ao
mesmo tempo.”26
No mesmo sentido, Guilherme e Figueiredo, afirmam que “
o uso do pronome indefinido – todos – alarga a abrangência da norma
jurídica, pois, não particularizando quem tem direito ao meio ambiente, evita
que se exclua quem quer que seja”.27
25 GIOVANETTI, Gilberto; LACERDA, Madalena. Melhoramentos dicionário de geografia. São
Paulo: Melhoramentos, 1996, p. 70
26 AMIRANTE. Domenico. “Ambiente e princípi costituzionali nel diritto comparato” in Direito
ambientale e Constituzione. A cura di Domenico Amirante. Milano: Franco Angeli, 2000, p. 15
27 GUILHERME, José e FIGUEIREDO, Purvin de. Direito ambiental em debate> vol. 1. Rio de
Janeiro: Esplanada, 2004, p. 224
21
Assim “o meio ambiente é um bem coletivo de desfrute
individual e geral ao mesmo tempo”28, pois o singular é detentor de deveres e a
coletividade também.
O direito ao meio ambiente é de cada pessoa, mas não só
dela, sendo ao mesmo tempo “transindividual”29.
Desta maneira o direito ao meio ambiente entra na
categoria de interesse difuso, não se esgotando numa só pessoa, mas se
espalhando para uma coletividade indeterminada.
Enquadra-se o direito ao meio ambiente na “problemática
dos novos direitos, sobretudo a sua característica de direito de maior dimensão,
que contém seja uma dimensão subjetiva, seja coletiva, que tem relação com um
conjunto de utilidades” , assevera o professor Domenico Amirante30.
Com a vigência da CRFB de 198831, não se pode mais
pensar em tutela ambiental restrita a um único bem, já que o meio ambiente é o
habitat dos seres vivos:
Esse “habitat (meio físico) interage com os seres vivos
(meio biótico), formando um conjunto harmonioso de condições essenciais para a
existência da vida como um todo”32
28 CANOSA USERA, Raul. “ Aspectos constitucionales del Derecho Ambiental” in Revista de
Estúdios Políticos. Madrid: Centro de Estúdios Constitucionales. V. 94, 1996, p. 79 29 “ Um meio ambiente sadio e ecologicamnte equilibrado representa um bem e interesse
transindividual, garantido constitucionalmnete a todos, estando acima de interesses privados”. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação em Ação Civil Pública 1998.04.01.009684-2 – SC – 4ª Turma. Rel. Juiz Federal Joel Ilan Paciornik. DJU 16.04.2003. In Interesse Público. Vol. 19, p.288, 2003.
30 AMIRANTE, Domenico. “ Ambiente e Principe constituzionali nel diritto comparato” in Diritto ambientale e Constituzione. A cura di Domenico Amirante. Milano: Franco Angeli, 2000, p.15
31 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, Centro Gráfico, 1988
32 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 24
22
Assim é porque o bem jurídico ambiente é complexo,
“sendo uma totalidade e somente assim pode ser estudado e compreendido,
conforme as palavras de Paulo de Bessa Antunes33
Corroborando o exposto, faz-se imprescindível trazer a
aclamada doutrina de Paulo de Bessa Antunes:
No regime constitucional brasileiro, o próprio caput do artigo 225 da Constituição Federal impõe a conclusão de que o Direito Ambiental é um dos direitos humanos fundamentais. Assim é porque o meio ambiente é considerado um bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida. Isto faz com que o meio ambiente e os bens ambientais integrem-se à categoria jurídica da res omnium. Daí decorre que os bens ambientais – estejam submetidos ao domínio público ou privado – são considerados interesse comum. Observe-se que a função social da propriedade passa a ter como um de seus condicionantes o respeito aos valores ambientais. Propriedade que não é utilizada de maneira ambientalmente sadia não cumpre a sua função social.34
O preceito constitucional protege a sadia qualidade de vida
do homem que vive neste mundo. Essa qualidade de vida está relacionada ao
meio ambiente urbano e rural. Procura-se protegê-lo das agressões e
degradações praticadas pelo próprio homem. Entende-se por degradação da
qualidade ambiental “ a alteração adversa das características do meio ambiente”
(art. 3º, II, da Lei nº 6.938/81.
Ainda desmestificando o dispositivo constitucional acima
citado, MORATO LEITE35 explica, trazendo uma nova visão antropocêntrica,
chamado pelo autor de antropocentrismo alargado, que busca aproximar o ser
humano da natureza, colocando o homem como integrante da comunidade biota,
além de impor uma verdadeira comunhão de interesses entre o homem e a
natureza.
33 ANTUNES. Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 4ª. ed., Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2000, p. 46. 34 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 6. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002, p. 23. 35 MORATO LEITE, José Rubens. Dano Ambiental: do Individual ao Extrapatrimonial, p.
23
Desta maneira, resta “superada a visão antropocêntrica
clássica, pela qual o homem era naturalmente destinado a dominar e modificar o
seu meio, visando fins utilitaristas, sem, contudo, cair-se num biocentrismo
exagerado”36.
Desse dispositivo constitucional decorrem dois
pressupostos: o direito de todo cidadão de pleitear o respeito e a proteção do seu
direito ao Meio Ambiente preservado, e o dever conjunto do Estado e da
Sociedade de promover a defesa e a proteção do Meio Ambiente.
Os pressupostos citados caracterizam uma Função
Ambiental. É defendida a idéia de que o Estado, bem como todos os cidadãos,
possuem uma Função Social, caracterizada como um dever-poder, esclarecendo
que:
“ao contrário da grande maioria das funções legalmente
estabelecidas, a função ambiental não é exclusivamente pública.
Ou seja, o exercício é outorgado a outros sujeitos além do
Estado. Por conseguinte, o múnus ambiental (ou ofício ambiental)
manifesta-se pelo comportamento do Estado e/ou do cidadão,
agindo este coletiva (associações ambientais, por exemplo) ou
isoladamente.” 37
Para tanto, a inclusão da proteção ao meio ambiente na
CRFB/88, não foi diferente, ou seja, foi marcada pela soberania popular e impõe
ao legislador infraconstitucional e aos operadores do direito o dever de concretizá-
lo, conforme explica Medeiros:
“ A Carta Federal de 1988, em seu art. 225, por meio do
mandamento expresso pela soberania popular, impôs ao
36 CAVEDON, p. 60 37 BENJAMIN, Antônio Herman V. Função Ambiental, in Dano Ambiental: Prevenção, Reparação e
Repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. pp. 50-51.
24
legislador e, principalmente, ao aplicador do Direito (...) a dar
concretude ao disciplinado pela norma”38
Ressalte-se que a CRFB/88 foi a primeira Constituição a
versar sobre a proteção do meio ambiente, referindo-se em seu Capítulo VI, Título
VIII, relativo à Ordem Social.
Quanto à inclusão da proteção jurídica do meio ambiente na
CRFB/88, escreve Milaré apud Moraes, que essa previsão atual é um:
“(...) marco histórico de inegável valor, dado que as Constituições
que precederam a de 1988 jamais se preocuparam da proteção do meio ambiente de
forma específica e global. Nelas sequer uma vez foi empregada a expressão “meio
ambiente”, a revelar total despreocupação com o próprio espaço em que vivemos” 39
Cumpre destacar que o meio ambiente possui status de
direito fundamental na medida que constitui a principal forma de concretização da
dignidade da pessoa humana, sua existência e qualidade de vida.
Nesse contexto, ensina Luño que: “ a imediata incidência do
ambiente na existência humana, sua transcendência para seu desenrolar e sua
mesma possibilidade, é o que justifica sua inclusão no estatuto dos direitos
fundamentais.”40
As conquistas mais importantes, nos tempos atuais,
referem-se aos direitos fundamentais, muitos deles alcançados, inclusive, por
intermédio ou contra o próprio Estado, sendo este o principal responsável pela
sua efetivação. No campo dos direitos fundamentais, um dos mais importantes diz
respeito ao meio ambiente.
38 MEDEIROS. Fernanda Luiza Fontoura de. A proteção ambiental diante da necessária formação
de uma nova concepção de um Estado Democraticamente Ambiental. p.199 39 MORAES, Alexandre de> Direito Constitucional. p. 702 40 Texto original de Pérez Luño “ La inmediata incidencia del ambiente em la existência humana,
su transcendencia para su desrrollo y su misma possibilidar, es lo que justifica su inclusion em el estatuto de los derechos fundamentales”. P. 485
25
No tocante ao poluidor, DIAS (1996, p. 41) afirma: “ A Lei
6.938/81 considera poluidor a pessoa física ou jurídica, de direito público ou
privado, responsável, direta ou indiretamente por atividade causadora de
degradação ambiental.”
De acordo com o texto legal acima citado, pode-se deduzir
que tanto por ação, quanto por omissão as pessoas físicas no caso de omissão,
quem tem o dever de agir de ofício) ou jurídicas podem ser obrigadas, com fulcro
no art. 14, § 1º da Lei nº 6.938/81, independentemente de culpa, a indenizar ou
reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros.
Em consonância, MUKAI (1994, p. 73) ensina: “Quando o
acidente decorre de ação ou omissão do exercício do poder de polícia da
Administração, o Estado responde solidária e objetivamente, cabendo o direito de
regresso contra os atos dos seus agentes.”41
Pelo acima elencado, vislumbra-se que Direito Ambiental
utiliza da responsabilidade objetiva, na qual o poluidor, é obrigado a reparar os
danos causados, independentemente da existência de culpa, conforme artigo 14,
§ 1º da Lei nº 6.938/81.
1.4 DAS SANÇÔES PREVISTAS NO ORDENAMENTO JURÍDICO
Qualquer poluição e/ou prejuízo ocasionado ao meio
ambiente, faz com que surja a necessidade, até para se buscar a efetividade da
Constituição, ou seja, a aplicabilidade em concreto das normas constitucionais, o
acionamento dos órgãos ambientais e dos poluidores, inclusive perante o Poder
Judiciário, para a aplicação do direito em concreto.
E a Constituição Federal/88 não deixou de prever em seu
artigo 225, parágrafo terceiro que: 41 MUKAI,
26
“As condutas e as atividades consideradas lesivas ao meio
ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a
sanções penais e administrativas, independentemente da
obrigação de reparar os danos causados.”
E, na mesma esteira, o artigo 14, parágrafo primeiro, da Lei
6.938/81, fez constar que:
“ Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo,
é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa,
a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a
terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da
União e dos Estados terá legitimidade para propor a ação de
responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio
ambiente.”
Tais preceitos normativos fazem surgir em nosso
ordenamento jurídico pátrio o princípio do poluidor pagador e da culpa objetiva,
citada no artigo acima.
A saber, o Princípio 16 (poluidor pagador), da Declaração
do Rio sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, 1992 42 assim versa:
“ Tendo em vista que o poluidor deve, em princípio, arcar com o
custo decorrente da poluição, as autoridades nacionais devem
promover a internalização dos custos ambientais e o uso de
instrumentos econômicos, levando na devida conta o interesse
público, sem distorcer o comércio e os investimentos
internacionais.”
42 Tradução Não Oficial, conforme publicada como anexo, apud Ministério das Relações
Exteriores, divisão do Meio Ambiente, Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, Relatório da Delegação Brasileira, 1992, Brasília, fundação Alexandre de Gusmão, FUNAG, Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, IPRI. Coleção Relações Internacionais nº 16. (Com apresentação de Celso Lafer).
27
Quer dizer, que o responsável pelo dano ao meio ambiente,
independentemente de culpa, deverá recuperá-lo, bastando, tão-somente, o nexo
causal entre o ato lesivo ao meio ambiente e a conseqüência que veio a sofrer.
Neste sentido Milaré43 destaca, com efeito, que o
conceito de dano ambiental, assim como o de meio ambiente, é aberto, ou seja,
sujeito a ser preenchido casuisticamente, de acordo com cada realidade concreta
que se apresente ao intérprete.
1.5 DA POLÍTICA E SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE
A política e o sistema nacional do meio ambiente
encontram-se disciplinados na Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Essa Lei
dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA) e institui o Sistema
Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), seus fins e mecanismos de formação e
aplicação, e dá outras providências.
Trata-se da lei ambiental mais importante depois da
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, nela está traçada toda a
sistemática necessária para a aplicação da polític ambiental (conceiots básicos,
objeto, princípios, objetivos, diretrizes, instrumentos, órgãos, responsabilidade
objetiva etc)
Referida lei foi recepcionada pela nova ordem constitucional
e, desde então, tem sido o referencial mais importante na proteção do meio
ambiente.
Assim, a política nacional do meio ambiente visa dar
efetividade ao princípio matriz contido no art. 225, caput, da CRFB, garantindo a
todos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Explicando, a Política Nacional do Meio Ambiente “ deve ser
43 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. Doutrina – prática – jurisprudência – glossário. 2001.
28
compreendida como o conjunto dos instrumentos legais, técnicos, científicos,
políticos e econômicos destinados à promoção do desenvolvimento sustentado da
sociedade e economias brasileiras” 44
Acerca do objeto da Política Nacional do Meio Ambiente,
em suma representa “ a preservação, a melhoria e recuperação da qualidade ambiental
propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento
socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida
humana” (art. 2º da Lei 6.938/81).
1.6 DEFINIÇÕES LEGAIS DE CONCEITOS PERTINENTES AO MEIO
AMBIENTE
Para melhor entendimento da Política Nacional do Meio
Ambiente, faz-se necessária a transcrição de algumas definições legais contidas
na referida Lei nº 6.938/81:
Art. 3º, inciso I – meio ambiente: “ o conjunto de condições, leis,
influências e interações de ordem física, química e biológica, que
permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.”
Art. 3º, inciso II – degradação ambiental: alteração adversa das
características do meio ambiente;
Art. 3º, inciso III – poluição: degradação da qualidade ambiental
resultante de atividades que direta ou indiretamente:
a) prejudiquem a saúde, segurança e o bem-estar da população;
b) criem condições adversas às atividades sociais e
econômicas;
c) afetem desfavoravelmente a biota;
d) afetem condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;
e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões
44 Paulo de Bessa Antunes, Direito ambiental, cit., p. 65
29
ambientais estabelecidos.
Art. 3º, inciso IV – poluidor: pessoa física ou jurídica, de direito
público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por
atividade causadora de degradação ambiental.
Art. 3º, inciso V – recursos ambientais: a atmosfera, as águas
interiores, superficiais ou subterrâneas,os estuários, o mar
territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a
flora.
Considera-se de relevante importância a citação dos
conceitos acima identificados a fim de possibilitar ao leitor uma melhor
compreensão do tema genérico deste trabalho.
Para interpretação do conceito de poluição,nos valemos dos
ensinamentos do Prof. Dr. Paulo Affonso Leme Machado, o qual consigna que:
“ No conceito são protegidos o homem e sua comunidade, o
patrimônio público e privado, o lazer e o desenvolvimento
econômico através das diferentes atividades (alínea b), a flora e a
fauna (biota), a paisagem e os monumentos naturais, inclusive,
os arredores naturais desses monumentos – o que encontram
também proteção constitucional – arts. 216 e 225 da Constituição
Federal de 1988 (...).”45
Sobre o assunto de autorização e controle da poluição,
colha-se, mais uma vez, os dizeres do renomado Prof. Paulo Affonso Leme
Machado:
“ O Poder Público deve exigir o emprego de tecnologia disponível
– pelo menos no mercado brasileiro – para prevenir a poluição.
Esse dever está inserido na Constituição Federal em dois artigos
fundamentalmente: no art. 225, caput, quando é afirmado que
45 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. São Paulo: Malheiros, 7ª ed.,
1999 pp. 419 e 420.
30
“todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”
e no art. 170, caput, quando diz: “ a ordem econômica... tem por
fim assegurar a todos a existência digna... observados os
seguintes princípios: VI – a defesa do meio ambiente”
(...)
“Deixando o Poder Público de cumprir seu dever (art. 225, V da
CF: “ controlar a produção, a comercialização e o emprego de
técnicas, métodos e substâncias que comportem risco de vida,
para a qualidade de vida e o meio ambiente, cabe a propositura
de ação popular para anular a autorização e/ou licença outorgada
ou interposição de ação civil pública, visando ao cumprimento da
obrigação de fazer, isto é, de instalar e operar equipamentos
contra a poluição”.46
Segundo os dizeres acima, não está se incentivando a
estagnação econômica através do controle de novas tecnologias, mas sim
visando garantir à coletividade o direito de um meio ambiente ecologicamente
equilibrado.
1.7 DA ASSEMBLÉIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS
Havendo a necessidade de um panorama comum e de
princípios comuns que inspirem e guiem os povos do mundo na prevenção e
fortalecimento do meio ambiente humano, após a histórica Assembléia Geral das
Nações Unidas, em Estocolmo, em 197247, houve a proclamação da Declaração
dos Princípios, sendo estes norteadores da questão ambiental em sua totalidade.
Na epigrafada Assembléia se estabeleceu como primeiro
princípio que “o homem tem o direito fundamental à liberdade, igualdade e
46 MACHADO, Paulo Affonso Leme, 1999, p.51 47 Tradução Não Oficial, conforme publicada como anexo, apud Ministério das Relações
Exteriores, divisão do Meio Ambiente, Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, Relatório da Delegação Brasileira, 1992, Brasília, fundação Alexandre de Gusmão, FUNAG, Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, IPRI. Coleção Relações Internacionais nº 16. (Com apresentação de Celso Lafer).
31
adequadas condições de vida, num meio ambiente cuja qualidade de vida de
dignidade e bem estar, e tem a solene responsabilidade de proteger e melhorar o
meio ambiente, para a presente e as futuras gerações(...)”
A referida Assembléia Geral das Nações Unidas celebrou a
Declaração dos Princípios que asseguram a proteção dos direitos ambientais,
conceituando, no segundo princípio “ os recursos naturais da terra, incluindo o ar,
água, terra, flora e fauna e, especialmente as amostras representativas de
ecossistemas naturais, devem ser preservadas para o benefício da presente e
futuras gerações, através de um planejamento ou gestão cuidadosos, quando for
o caso.”
A mesma Declaração dos Princípios assevera acerca do
desenvolvimento humano:
Princípio 11. “ As políticas ambientais de todos os Estados
deverão enfatizar e não causar efeitos prejudiciais ao
desenvolvimento potencial presente ou futuro dos países em vias
de desenvolvimento, nem impedir atingirem-se melhores
condições de vida para todos, e providências apropriadas
deverão ser tomadas pelos Estados e organizações
internacionais, com vistas a conseguirem-se um acordo sobre
como lidar-se com as possíveis conseqüências nacionais e
internacionais, resultantes da aplicação de medidas ambientais.”
Como subsídio complementar, a Declaração do Rio sobre
o Meio Ambiente e Desenvolvimento, 199248 proclamou 27 (vinte e sete)
princípios instituindo a proteção ambiental, destaque-se o primeiro princípio “ os
seres humanos serão o centro das preocupações com o desenvolvimento
sustentável. Têm direito a uma vida saudável e produtiva, em harmonia com a
48 Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, Relatório da
Delegação Brasileira, 1992, Brasília, Fundação Alexandre de Gusmão, FUNAG, Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, IPRI. Coleção Relações internacionais nº 16. (Com apresentação de Ceso Lafer).
32
natureza.”
O compromisso com desenvolvimento sustentável foi
referenciado na Declaração de Joanesburgo sobre o Desenvolvimento
Sustentável 49, que alertou a população:
Item 8. “ Trinta anos atrás, em Estocolmo, concordamos na
necessidade urgente de reagir ao problema da deterioração
ambiental. Dez anos atrás, durante a Conferência das Nações
Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no
Rio de Janeiro, concordamos em que a proteção do meio
ambiente e o desenvolvimento social e econômico são
fundamentais para o desenvolvimento sustentável, com base nos
Princípio do Rio. Para alcançar tal desenvolvimento, adotamos o
programa global Agenda 21 e a Declaração do Rio, as quais
reafirmamos nosso compromisso. A Cúpula do Rio foi um marco
significativo, que estabeleceu uma nova agenda para o
desenvolvimento sustentável.”
A destacada Declaração, em seu Item 13 dispõe “O meio
ambiente global continua sofrendo. A perda da biodiversidade prossegue,
estoques pesqueiros continuam a ser exauridos, a desertificação toma mais e
mais terras férteis, os efeitos adversos da mudança do clima já são evidentes e
desastres naturais são mais freqüentes e mais devastadores; países em
desenvolvimento são mais vulneráveis e a população do ar, da água e do mar
segue privando milhões de pessoas de uma vida digna.”
Por assim dizer, a CRFB/88 e as leis esparsas (destacando-
se os princípios mencionados) quiseram, na verdade, repensar o mero
crescimento econômico, buscando alternativas viáveis, não se pode olvidar o
disposto no Princípio 4 da Declaração do Rio de Janeiro de 1992, que estabelece:
49 Os representantes dos povos do mundo reuniram-se na Cúpula mundial sobre o
desenvolvimento Sustentável em Joanesburgo, África do Sul, entre os dias 2 e 4 de setembro de 2002.
33
“Para alcançar o desenvolvimento sustentável, a proteção ambiental constituirá
parte integrante do processo de desenvolvimento e não pode ser considerada
isoladamente deste”.
Outrossim, como já colocado, o princípio do
Desenvolvimento Sustentável tem como fundamento a manutenção do bem
ambiental para as presentes e futuras gerações. Nesta linha, colaciona-se o
pensamento do professor Celso Antônio Pacheco Fiorillo:
Dessa forma, o princípio do desenvolvimento sustentável tem por conteúdo a manutenção das bases vitais da produção e reprodução do homem e de suas atividades, garantindo igualmente uma relação satisfatória entre os homens e destes com o seu ambiente, para que as futuras gerações também tenham oportunidade de desfrutar os mesmos recursos que temos hoje à nossa disposição.50 (g.n.)
Com efeito, não há como negar a imensa dificuldade de se
implementar efetivamente o referido Princípio na atual sociedade capitalista, onde
vigoram de forma intensa outros princípios de ordem macro e microeconômica. O
desenvolvimento à moda contemporânea, hoje medida em números, despreza
inexoravelmente a preservação ambiental que, à luz da verdade, retrata a
verdadeira identidade do homem.
50 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 5. ed. São Paulo:
Saraiva, 2004, p. 25.
34
CAPÍTULO 2
DA PROTEÇÃO DOS ESPAÇOS AMBIENTAIS
2.1 DOS ESPAÇOS AMBIENTAIS PROTEGIDOS.
Devido ao intenso processo de urbanização - segundo o
último censo, cerca de 80% da população vive em ambiente urbano - as cidades
brasileiras passaram a apresentar grandes problemas sociais, decorrentes da
falta de preparo das cidades para abarcar modificações tão consideráveis, como a
favelização e, principalmente, a ocupação irregular de áreas de preservação
ambiental.
Cabe salientar que não somente o desfavorecido ocupa
referidas áreas, mas podemos, também, perceber a implementação de
condomínios e mansões. A diferença é que para uma classe há escolha, para
outra não.
Como salienta Helita Barreira Custódio51, o Código Florestal
classifica as florestas e a flora em geral em: a)Florestas de preservação
permanente definidas pelo art. 2º; b) Florestas de preservação permanente
definidas por ato do poder público; c) Parques nacionais, estaduais e municipais
criados pelo poder público; d) Florestas nacionais, estaduais e municipais criadas
pelo poder público com fins econômicos, técnicos ou sociais; e) Florestas de
propriedade particular gravadas com o fim de perpetuidade; f) Florestas plantadas
51 Verbete: Natureza (direito ecológico). Enciclopédia Saraiva do Direito, v. 54, p. 86 e s.
35
não consideradas de preservação permanente; g) Florestas-reservas; h)
Reservas biológicas/ i) Reservas indígenas.
Para melhor entendimento, elencou-se no item seguinte, um
esplanado acerca destas áreas especialmente protegidas.
2.2 DAS ÁREAS DE PROTEÇÃO PERMANENTE
Alguns espaços territoriais e seus componentes foram
assinalados na expressiva maioria dos Estados brasileiros, como “áreas de
preservação permanente” (APP), que são espaços, tanto de domínio público
quanto de domínio privado, que limitam constitucionalmente o direito de
propriedade, levando-se em conta, sempre, a função ambiental da propriedade.
(Art. 170, VI da CRFB/88).
As Constituições Estaduais protegem esses espaços por
elas delineados, com a garantia de que somente mediante lei, eles poderão ser
alterados ou suprimidos.(art. 225, § 1º, III da CRFB/88).
Já a Resolução CONAMA 302 de 20/03/2002 estabeleceu
que a APP:
“tem a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a
paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo
gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem estar
das populações humanas”.
A APP é constituída pela flora- florestas e demais formas
de vegetação (Art. 2º caput e 3º caput do Código Florestal )- fauna, solo, ar e
águas.(Lei 4.771/1965 e 7.803/1989 e ainda Resolução CONAMA 303 de
20/03/2002).
36
Além da proteção genérica, estabelecida no texto constitucional
(art. 225), algumas áreas possuem ainda, peculiaridades que lhes asseguram
proteção pela legislação ordinária. Essa proposição é comprovada pelo texto do
Código Florestal, Lei nº 4.771 de 15 de setembro de 1965, pois, no seu artigo 2º
dispõe:
“Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta
Lei, as Florestas e demais formas de vegetação natural situadas:
a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água desde o seu
nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será (de 30
a 500 metros dependendo da largura dos cursos d’àgua); b) ao
redor das lagoas, lagos ou reservatórios d’àgua naturais ou
artificiais; c) nas nascentes, ainda que intermitentes e nos
chamados “olhos d’água”, qualquer que seja a sua situação
topográfica, num raio mínimo de 50 metros de largura; d) no topo
dos morros, montes, montanhas e serras; e) nas encostas ou
parte destas, com declividade superior a 45º, equivalente a 100%
na linha de maior declive; f) nas restingas, como fixadoras de
dunas ou estabilizadoras de mangues; g) nas bordas dos
tabuleiros ou chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo, em
faixa nunca inferior a 100 metros em projeções horizontais; h) em
altitude superior a 1.800 metros, qualquer que seja a vegetação”
Diz, ainda, o parágrafo único:
“ No caso de áreas urbanas, assim entendidas as compreendidas
nos perímetros urbanos definidos por lei municipal, e nas regiões
metropolitanas e aglomerações urbanas, em todo o território
abrangido, observar-se-á o disposto nos respectivos planos
diretores e leis de uso do solo, respeitados os princípios e limites
a que se refere este artigo.”
Quanto a proteção da cobertura florestal, no seu art. 3º do
Código Florestal encontra-se o seguinte dispositivo: “Consideram-se, ainda, de
37
preservação permanente, quando assim declaradas por ato do Poder Público, as
florestas e demais formas de vegetação natural destinadas: a) a atenuar a erosão
das terras”.
Diante de tal assertiva, pode-se afirmar que existem limites
específicos para a ocupação destas áreas, tendo em vista o perigo de erosão,
enchentes e desmoronamentos de terra e rochas.
O Código Florestal, Lei nº 4.771/65, segundo os dizeres do
renomado mestre Toshio Mukai52, ao dispor sobre florestas existentes no território
nacional e as demais formas de vegetação, reconhecidas de utilidade às terras
que revestem, extravasou a competência da União para legislar tão-somente
quanto a florestas.
E floresta, no conceito oferecido por Hely Lopes Meirelles53
“é a forma de vegetação, natural ou plantada, constituída por uma grande número
de árvores, com o mínimo espaçamento entre si” .
Portanto, onde o Código dispõe sobre as “demais formas de
vegetação” veja-se a manifestação do simples poder de polícia da União,
concorrente e não prevalente sobre as legislações congêneres dos Estados e dos
Municípios.
No mesmo diapasão, o Código Florestal define as
chamadas áreas de preservação permanente 'ope legis' e salienta que os limites
estabelecidos devem ser respeitados, no âmbito urbano pelas leis municipais.
Conforme Sirvinskas54, “a tutela das áreas de preservação
52 MUKAI, Toshio. Direito urbano-ambiental brasileiro. 2ª ed. São Paulo: Dialética, p. 189 53 (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais,
p.477)
54 SIRVINSKAS, Luís Paulo: 2002, cit. p. 173
38
permanente é de extrema importância para a perpetuação do homem no planeta
Terra. Observa-se através da mídia, as constantes e contínuas agressões ao
meio ambiente”.
Acerca das agressões ao meio ambiente, denota-se que
estas são de todas as espécies, dentre elas, “o desmatamento, as queimadas, a
exploração econômica inadequada. Preocupado com a devastação da flora, o
Poder Público, por seus órgãos competentes, vem tentando tomar as medidas
necessárias para evitar essa degradação do meio ambiente ( ar, solo, água, flora,
fauna, etc)”55.
Para assegurar a proteção às áreas de preservação
permanente o Poder Público vem estabelecendo:
“(...) normas protetivas das áreas de preservação permanente,
visando a conservação, preservação e regeneração do meio
ambiente. O termo conservar “é resguardar, manter e continuar a
ter a flora. Conservar é permitir a exploração econômica dos
recursos naturais ali existentes, realizando o manejo adequado e
racional. Já o verbo preservar, “ é defender, proteger a flora e os
recursos naturais ali existentes. Nesse caso, não se permite a
sua exploração econômica.Semanticamente, as expressões
preservar e conservar possuem o mesmo sentido. Contudo, a
preservação é mais rígida do que a conservação. Por outro lado,
regenerar “ é recompor no estado anterior a área degradada.”56
Assim, as Áreas de Preservação Permanente (APPs) são
aquelas tuteladas amplamente pelo Poder Público, protegendo-se tanto a flora
como a fauna.
Cabe mencionar que a flora “é o conjunto de plantas de
uma região, de um país ou de um continente. A flora não vive isoladamente, mas 55 SIRVINSKAS, Luís Paulo: 2002, cit. p. 174 56 SIRVINSKAS, Luís Paulo: 2002, cit. p. 174
39
depende da interação constante entre outros seres vivos, assim como
microorganismos e outros animais. Trata-se do denominado ecossistema
sustentado.”57
Já a flora pode assim ser definida:
“é o conjunto de animais estabelecidos em determinada região.
Quando se fala em fauna, deve-se pensar imediatamente em seu
habitat, que por sua vez, é o local onde vive o animal, incluindo aí
os ninhos, criadouros naturais, etc., integrando assim o
ecossistema. Ecossistema é o conjunto de vegetais e animais
que interagem entre si ou com outros elementos do ambiente,
dando sustentação à diversidade biológica”58
A diversidade biológica ou biodiversidade, conforme o artigo
1º, III, da Lei nº 9.985/2000 é caracterizado pela:
“variabilidade de organismos vivos de todas as origens,
compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres,
marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos
ecológicos de que fazem parte; compreendendo ainda a
diversidade dentro de espécies, entre espécies e de
ecossistema.”
Não há como dissociar o conceito de flora e de fauna:
“ambas estão intimamente ligadas, uma depende da outra e uma
não pode viver sem a outra, denominado-se ecossistema
sustentado, constituído pela interação constante e contínua entre
a flora e a fauna, abrangendo esta última, todos os animais
(desde microorganismos até animais de grande porte) e a
57 SIRVINSKAS, Luís Paulo: 2002, cit. p. 175 58 SIRVINSKAS, Luís Paulo: 2002, cit. p. 191
40
primeira abrange as florestas e quaisquer tipos de vegetação”.59
Pode-se afirmar, então que dentre outras funções das áreas
de preservação permanente, estão a proteção da fauna e da flora que estão
intimamente ligadas, formando um ecossistema.
2.3 DA SUPRESSÃO DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE
O Código Florestal proibiu a supressão de florestas e
demais formas de vegetação e a limitou a exploração econômica nos lugares
referidos no art. 2º da Lei 4.771/65, acima citado.
Destaque-se que as áreas de proteção permanente
somente poderão ser suprimidas mediante autorização do Poder Executivo
Federal, segundo o art. 3º, parágrafo 1º “a supressão total ou parcial das florestas
de preservação permanente só será admitida com prévia autorização do Poder
Executivo Federal, quando for necessária à execução de obras, planos, atividades
ou projetos de utilidade pública ou interesse social.”
Tendo em vista a grande importância das áreas de
preservação permanente, não é um procedimento fácil a supressão destas áreas,
que somente poderá ocorrer com autorização do Poder Executivo Federal e haver
comprovação acerca da utilidade pública ou interesse social destas áreas.
2.4 DA RESERVA FLORESTAL LEGAL
Segundo Sirvinskas60, “a reserva florestal legal é a
59 SIRVINSKAS, Luís Paulo: 2002, cit. p. 176 60 SIRVINSKAS, Luís Paulo: 2002, cit. p. 186-187.
41
preservação de parte de uma área maior de determinada propriedade particular
com o objetivo da preservação da vegetação ali existente. Delimitada a reserva
legal, a exploração da área restante passa a ser permitida, mediante autorização
e fiscalização do IBAMA, sob o regime de utilização limitada.”
Conforme o art. 1º, § 2º, III da Medida Provisória nº 2.166-
67, de 24/08/201 entende-se por reserva legal: “ área localizada no interior de
uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente,
necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação
dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e
proteção da fauna e flora nativas”.
Ainda, dispõe o artigo 16, § 2º do Código Florestal:
“ A reserva legal, assim entendida a área de, no mínimo, 20 %
(vinte por cento) de cada propriedade, não é permitido o corte
raso, deverá ser averbada à margem da inscrição de matrícula do
imóvel, no registro de imóveis competente, sendo vedada, a
alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a
qualquer título, ou de desmembramento da área. (Parágrafo
acrescentado pela Lei nº 7.803 de 18.07.1989)”.
Da mesma forma que as florestas e demais formas de
preservação permanente a Reserva Florestal Legal decorre de normas legais que
limitam o direito de propriedade.
A diferença entre elas diz respeito ao que concerne a
dominialidade, pois que a Reserva Florestal Legal dos arts. 16 e 44 do Código
Florestal incide somente sobre o domínio privado ao passo que as Áreas de
Preservação Permanente incidem sobre o domínio privado e público. (Lei
4.771/65 e Lei 5.197/67).
42
Corroborando com as explicitações acerca das diferenças
entre áreas de preservação permanente e reserva florestal legal, temos o
entendimento de Sirvinskas:
“Vê-se, pois, que a reserva florestal legal incide somente sobre a
propriedade privada. Já as áreas de preservação permanente
incidem sobre a propriedade privada ou pública. A reserva
florestal legal é uma limitação ao direito de propriedade
consistente em preservar um dos elementos essenciais ao meio
ambiente, que é a flora (art. 225, caput da CRFB/88).” 61
Acerca da constituição das reservas florestais legais,
observação importante é feita por Hely Lopes Meirelles62:
“ As reservas florestais podem ser constituídas por qualquer das
entidades estatais, em suas próprias terras, ou nas particulares
mediante desapropriação, pois que importando em interdição
total do uso da propriedade para qualquer exploração econômica
exige indenização do poder Público. Tais reservas ou parques
florestais não se confundem com as simples limitações
administrativas de desmatamento de determinadas áreas, como
são as faixas marginais dos curso d’água, as coberturas das
encostas, o contorno das nascentes e outras que o Código
Florestal já considera naturalmente de preservação permanente
(art. 2º), além das que, por ato governamental, sejam incluídas
nessa categoria (art. 3º).”
Outra consideração importante é feita por Sérgio de Andréa
Ferreira63:
“Poder-se-ia cogitar das repercussões constitucionais do conceito
de floresta, que é o termo que tem sido empregado pelas
61 SIRVINSKAS, Luís Paulo: 2002, cit. p. 187 62 Direito Administrativo Brasileiro, cit., p. 478 63 O Direito de Propriedade e as Limitações e Ingerências Administrativas, são Paulo: RT, 1980, p.
99.
43
Constituições. A legislação ordinária se tem, porém, estendido às
outras formações florísticas, às outras formas de vegetação,
reconhecidas de utilidade às terras que revestem, sem que se
tenha levantado a inconstitucionalidade das disposições
ampliativas”.
A Reserva Florestal Legal é espaço territorialmente
protegido, conforme o art. 225, § 1º, III da CR/88. Para assegurar o direito ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado, como bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida, incumbe ao Poder Público definir, em todas
as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem
especialmente protegidos, sendo a alteração e supressão permitidas somente
através de lei.
Assim a Reserva Florestal Legal, não só é protegida pela lei
ordinária como pela própria Constituição da República. Portanto, a não ser por
consentimento expresso da lei federal, nem o proprietário privado nem o Poder
Executivo (quaisquer órgãos da Administração Pública) podem consentir na
diminuição e na supressão da Reserva Florestal Legal (art. 225, § 1º, III da
CR/88).
2.5 DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO
O Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza – SNUC foi criado em 2.000, pela Lei 9.985 e é constituído pelo
conjunto das unidades de conservação federais, estaduais e municipais.
São entendidas como sendo “o espaço territorial e seus
recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características
naturais relevantes, legalmente instituídas pelo Poder Público, com objetivos de
conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se
aplicam garantias adequadas de proteção”, conforme o art. 2º, I da Lei
9.985/2000.
44
Em outras palavras, unidades de conservação “são espaços
territoriais especialmente protegidos, sob domínio atual ou iminente do Poder
Público, cujo escopo é de proteger e preservar os ecossistemas em seus estados
naturais e primitivos ou recuperá-los, sendo os recursos naturais passíveis de uso
indireto, sem o qual implique em consumo.”64
Conforme o art. 7º da Lei 9.985/2000, as unidades de
conservação dividem-se em dois grupos, com características específicas:
Unidades de Proteção Integral e Unidades de Uso Sustentável.
O mesmo art. 7º da Lei 9.985/2000, em seu § 1º esclarece “
o objetivo básico das Unidades de Proteção Integral é preservar a natureza,
sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais, com exceção
dos casos previstos nesta Lei.
Já o § 2º informa “o objetivo básico da Unidades de Uso
Sustentável é compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de
parcela dos seus recursos naturais”.
Ainda, pelo disposto no art. 8º da mesma Lei, o grupo das
Unidades de Proteção Integral é composto pelas seguintes categorias de
unidades de conservação: I – Estação Ecológica; II – Reserva Biológica; III –
Parque Nacional; IV- Monumento Natural; e V- Refúgio de Vida Silvestre.
Em complemento, o art. 14 da mesma Lei, elenca as
seguintes categorias de unidades de conservação constituídos pelo Grupo das
Unidades de Uso Sustentável: I- Área de Proteção Ambiental; II – área de
Relevante Interesse Ecológico; III – Floresta Nacional; IV – Reserva Extrativista; V
64 SOUZA, Montauri Ciocchetti. Das unidades de conservação criadas pelo poder público:
conceito, classificação e possibilidade de cessão de uso a órgão público ou particular, RDA. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1:89, jan./mar.1996.
45
– Reserva de Fauna; VI- Reserva de Desenvolvimento Sustentável; e VII –
Reserva Particular do Patrimônio Natural.
O artigo 22 da Lei 9.985/2000 estatui que “as unidades de
conservação são criadas por ato do Poder Público”. Nada impede, contudo, que
se utilize à lei, como instrumento para sua criação.
2.6 DAS LIMITAÇÕES DO DIREITO DE PROPRIEDADE
Tendo em vista que o Código Florestal declara, em seu art.
1º, que as florestas e demais formas de vegetação existentes no território nacional
são bens de uso comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos
de propriedade com as limitações previstas em lei, importante trazer a baila essas
restrições.
Com a evolução histórica do direito de propriedade, “
aumentam-se as exigências sociais da propriedade, a qual passa a ser limitada
não apenas pela vontade humana mas principalmente por normas de direito
público as quais objetivam conciliar os interesses do proprietário particular com os
interesses da sociedade.” 65
Neste diapasão, a lei pode pôr e de fato põe limitações ao
absolutismo do domínio, que apenas abstratamente se pode conceber ilimitado.
Quanto mais avança o conceito de solidariedade social, tanto maiores são as
restrições e os vínculos a que, no interesse geral e para a utilização social da
riqueza a propriedade está sujeita.
65 DE RUGGIERO (1999, P. 461)
46
As limitações do direito de propriedade “podem decorrer da
vontade do proprietário (voluntárias), da lei (legais), ou dos princípios gerais do
direito (jurídicas)”. 66
As limitações voluntárias decorrem da vontade do
proprietário o qual, no uso de suas faculdades, pode instituir direitos reais
(usufruto, servidão, superfície, hipoteca, dentre outros) sobre o bem ou também
pode estabelecer cláusula de inalienabilidade.67
As limitações legais ao direito de propriedade decorrem a lei
e podem acontecer em vários ramos do direito, como por exemplo, no Direito Ci -
vil: (ex. regras de vizinhança) ,Direito Administrativo (ex: proteção do patrimônio
histórico), Direito Constitucional: (ex.: desapropriação, utilização temporária de
bens), etc.68
Na primeira geração dos direitos, O Direito de Propriedade
é marcado pelo cunho individualista, é um direito inviolável, absoluto e, até
mesmo, sagrado. Nesta geração, característica do Direito Moderno, não se
concebia a possibilidade de limitação da Propriedade visando interesses sociais e
difusos, nem a visão do proprietário como sujeito a obrigações decorrentes de seu
direito. As necessidades e carências da época eram por liberdade e maior
autonomia do indivíduo.
Essa concepção individualista da Propriedade prevaleceu até
a incorporação, pelo Ordenamento jurídico, dos direitos sociais, difusos e
coletivos, respectivamente de segunda e terceira geração.
66 BODNAR, Zenildo. p.29 67 Trata-se de cláusula especial aposta nos contratos de compra e venda ou doação, que retira a
faculdade de disposição do bem do proprietário enquanto perdurar. Pode ser vitalícia ou temporária e gera também a impenhorabilidade e a incomunicabilidade do bem nos termos do art. 1.911 do Código Civil.
68 BODNAR, Zenildo. Curso objetivo de direito de propriedade. 2004, p. 29
47
A Propriedade Privada, absoluta e ilimitada, não é
compatível com a nova configuração dos direitos, que passam a tutelar interesses
Públicos, dentre os quais a preservação ambiental. Assim, o Direito de
Propriedade adquire nova configuração, e passa a estar vinculado ao
cumprimento de uma Função Social e Ambiental. É limitado no interesse da
coletividade e a fim de adequar-se às novas demandas de ordem ambiental.
Dessa forma, é que a caracterização jurídica da
Propriedade não permaneceu inerte; dinamizou-se para se adequar aos novos
direitos emergentes e, assim, manter a coerência do Ordenamento Jurídico. Os
direitos tradicionais passam a ser entendidos sob a visão dos novos direitos.
Nesse contexto, o Direito de Propriedade passa de
individualista e ilimitado (primeira geração) à Propriedade vinculada a uma
Função Social (segunda geração), incorporando os valores ambientais,
integrando o seu conteúdo também uma Função Ambiental.
As funções social e ambiental são elementos inerentes à
propriedade, refletindo a iminência do interesse público sobre o privado, segundo
a nova concepção trazida pela atual Constituição Federal. O legislador
infraconstitucional não pode deixar de observar tais preceitos, a fim de evitar
conflitos entre o direito de propriedade no meio urbano e a proteção ao meio
ambiente.
Considerando que as gerações podem ser chamadas de
dimensões, expõe GUERRA FILHO acerca do surgimento de novos direitos:“ (...)
o direito individual de propriedade, num contexto em que se reconhece a segunda
dimensão dos Direitos Fundamentais, só pode ser exercido observando-se sua
função social, e com o aparecimento da terceira dimensão, observando-se
igualmente sua função ambiental.” 69
69 GUERRA FILHO, Wilis Santiago. Processo Constitucional e Direitos Fundamentais. P. 40
48
Acerca dos direitos e deveres individuais e coletivos, dispõe
a CRFB/88, em seu art. 5º:
“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantido-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
a igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:(...) XXII – É garantido o direito de propriedade;
XXIII – a propriedade atenderá a sua função social ;
Não se pode ignorar a discussão referente à incorporação e
efetivação da Propriedade de cunho social e ambiental na prática jurídica, pois o
direito de propriedade passa a ter limites, ou seja o dever de cumprir sua função
social e ambiental.
Conforme Diniz (2003, p. 106) o conceito de direito de
propriedade “é o direito que a pessoa física ou jurídica tem, dentro dos limites da
norma legal, de usar, gozar e dispor de um bem, corpóreo ou incorpóreo, bem
como de reivindicá-lo de quem quer que injustamente o possua ou detenha.”70
Já Wald (2002, p. 105) assevera: é “ a senhoria de um
sujeito de direito sobre determinada coisa garantida pela exclusão da ingerência
alheia.”
O doutrinador Gomes (1995, p. 85) conceitua a propriedade
à luz de três critérios: a) sintético: submissão de uma coisa, em todas as suas
relações a uma pessoa; b) analítico: direito de usar, fruir e dispor de um bem, e de
reavê-lo de quem injustamente o possua; c) descritivo: direito complexo, absoluto,
perpétuo e exclusivo, pelo qual uma coisa fica submetida à vontade de uma
pessoa, com as limitações da lei.
70 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Direito das coisas. 17. ed. 4. v. São Paulo:
Saraiva, 2003. p. 106
49
Para De Plácido e Silva (2001, p.650), a “propriedade é a
pertinência exclusiva da coisa atribuída a uma pessoa. È o direito exclusivo ou o
poder absoluto que, em caráter permanente, se tem sobre a coisa que nos
pertence”
Com a evolução histórica do direito de propriedade,
aumentam-se as exigências sociais da propriedade, a qual passa a ser limitada
não apenas pela vontade humana mas principalmente por normas de direito
público as quais objetivam conciliar os interesses do proprietário com os
interesses da coletividade.” 71
O autor DE RUGGIERO (p. 461) destaca que: “ a lei pode
pôr e de fato põe limitações ao absolutismo do domínio, que apenas
abstratamente se pode conceber ilimitado. Quanto mais avança o conceito de
solidariedade social, tanto maiores são as restrições e os vínculos a que, no
interesse geral e para a utilização social da riqueza a propriedade está sujeita”
Então o fundamento dessas medidas é sujeitar o interesse
do proprietário ao interesse coletivo, harmonizando outrossim os direitos dos
diversos proprietários”
Já Rodrigues (2003, p. 85) destaca o crescimento das
limitações ao direito de propriedade nos dias atuais e que parte delas decorre da
própria natureza do direito.
(...) explicam-se através do recurso à noção de abuso de direito.
O proprietário, no uso de seu direito, não pode ultrapassar
determinados lindes, pois, se deles exorbita, estará abusando, e
seu ato deixa de ser lícito, porque os direitos são concedidos ao
homem para serem utilizados dentro de sua finalidade. Assim, se
71 RUGGIERO, Roberto de. Instituições de direito civil. Campinas (SP): Bookseler, 1999, p. 461
50
tal utilização é abusiva, o comportamento excessivo do
proprietário não alcança proteção no ordenamento jurídico, que,
ao contrário, impõe-lhe o ônus de reparar o prejuízo causado.
Portanto, o exercício do direito encontra uma limitação em sua
própria finalidade.
Os conceitos de propriedade plena, não encontram guarida
atualmente, vez que se mostram incompatíveis os direitos absolutos de usar,
gozar e dispor da propriedade, como se constatava pelo art. 524 e 525 do antigo
Código Civil:
“Art. 524. A lei assegura ao proprietário o direito de usar, gozar e
dispor de seus bens, e de reavê-los do poder de quem quer que
injustamente os possua.[...]
Art. 525. É plena a propriedade, quando todos os seus direitos
elementares se acham reunidos no do proprietário; limitada,
quando tem ônus real, ou é resolúvel.”
O Código Civil de 2002, em que pese não modificar
substancialmente o antigo dispositivo, acrescentou, pertinentemente, que o direito
de propriedade deve ser exercido em consonância com sua função econômica,
social e ambiental:
“Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor
da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que
injustamente a possua ou detenha.
§ 1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância
com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que
sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei
especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio
ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a
poluição do ar e das águas.”
51
Destarte, deve a propriedade ser cumpridora da função
social, não se configurando, esta, como um limite à propriedade, pois a função
social não compõe obrigação imposta ao proprietário, vez que limites e obrigação
são elementos externos a qualquer instituto do direito, ou seja, são elementos que
incidem sobre o sujeito ou objeto do direito.
O conceito de propriedade encerra em si a função social e o
direito de propriedade é, por conseqüência, só e legítimo na medida em que a
função social estiver sendo cumprida. A função social também não se confunde
com os limites impostos à propriedade por força do poder de polícia do Estado ou
das disposições civis do direito de vizinhança – esses são elementos externos à
propriedade.72
Observa-se que o proprietário pode usar, gozar, dispor de
seu bem no entanto há que ser respeitado os limites desta vontade, ou seja
deverá ser respeitada sua função social e ambiental.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,
ao qualificar a propriedade como portadora de uma Função Ambiental, visa à
solução dos conflitos entre interesse individual do proprietário e os interesses da
coletividade. Dentre estes, destaca-se o interesse em gozar de um ambiente
saudável, e alcançar as finalidades sociais que almeja a sociedade brasileira,
como o desenvolvimento econômico individual que traga, concomitantemente,
vantagens para a coletividade.
72 REIS, Miguel; LISO, Carlos Henrique. A concessão de direito real de uso na regularização
fundiária. Direito Urbanístico. Edésio Fernandes (org.). Belo Horizonte: Del Rey. 1998. p. 124/125.
52
CAPÍTULO 3
DA IMPORTÂNCIA DAS MATAS CILIARES
3.1 ASPECTOS DA POLÍTICA NACIONAL DOS RECURSOS HÍDRICOS
A Lei nº 9.433, de 08 de janeiro de 1997, instituiu a Política
Nacional dos Recursos Hídricos.
Como política autônoma, definiu a lei objetivos próprios,
sendo eles:
Art. 2º. I – assegurar à atual e às gerações futuras a necessária
disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados
aos respectivos usos;
II - a utilização racional e integrada dos recursos hídricos,
incluindo o transporte aquaviário, com vistas ao desenvolvimento
sustentável;
III – a prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos
de origem natural ou decorrentes do uso inadequado dos
recursos naturais.
A Constituição Federal Brasileira de 1988, em seu art. 225,
caput, oportunamente já inserira a obrigação de se instaurar o desenvolvimento
sustentável.
De acordo com MACHADO73, a Lei 9.433/97 demarca
concretamente a sustentabilidade dos recursos hídricos em três aspectos:
disponibilidade de água, utilização racional e utilização integrada.
73 MACHADO. Paulo Affonso Leme. Recursos hídricos. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 39
53
Acerca da disponibilidade da água de boa qualidade,
explica MACHADO74, isto é, não poluída – para as presentes e futuras gerações.
Essa a finalidade prioritária, através de uma utilização racional e integrada.
Disponibilidade eqüitativa de água, que facilite o acesso de todos a este bem,
ainda que em quantidade diferente. Os institutos jurídicos hão de ser aplicados no
sentido de evitar o monopólio das águas, se já por órgãos públicos, seja por
particulares.
Quanto à racionalidade dessa utilização, MACHADO75,
afirma que deverá ser constatada nos atos de outorga dos recursos de uso e nos
Planos de Recursos Hídricos. A utilização integrada dos recursos hídricos será
reiterada no sistema de gestão constante das diretrizes gerais de ação do art. 3º.
A proteção aos recursos hídricos, segundo LEITE 76 “se
deve, fundamentalmente, pela revisão da qualidade dominial dos recursos
hídricos, agora definidos como o bem de domínio público, limitado e dotado de
valor econômico”.
Como diretrizes gerais de ação da Lei 9.433/97, em seu o
art. 3º podemos ver:
(...)
III – a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão
ambiental; IV - a articulação do planejamento de recursos
hídricos com o dos setores usuários e com planejamento
regional, estadual e nacional.(...);VI – a integração da gestão das
bacias hidrográficas com a dos sistemas estuarinos e zonas
costeiras.
74 MACHADO. Paulo Affonso Leme, p. 39 75 MACHADO. Paulo Affonso Leme, p. 39 76 LEITE, José Rubens Morato. Direito ambiental na sociedade de risco. 2ª ed. Rio de janeiro:
Forense Universitária, 2004, p.172
54
Deverão, além disso, a União e os Estados articular-se com
vista ao gerenciamento dos recursos hídricos de interesse comum, conforme art.
4º da Lei 9.433/97.
3.2 DO SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS
HÍDRICOS
De acordo com SIRVINSKAS77, o Sistema Nacional de
Gerenciamento dos Recursos Hídricos é constituído por um conjunto de órgãos e
instituições que atuam na gestão dos recursos hídricos na esfera federal, estadual
e municipal.
No tocante a gestão integrada e participativa percebe-
se “um conteúdo democrático que encontra sua máxima realização quando
admite, na composição do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos
Hídricos, a participação de entidades associativas de proteção dos recursos
hídricos compondo o Conselho Nacional de Recursos Hídricos e os Comitês de
Bacia Hidrográfica.” (LEITE, p. 172)
O Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos
Hídricos é integrado pelos seguintes órgãos, conforme o art. 33:
I – o Conselho Nacional de Recursos Hídricos;
I-A – A Agência Nacional de Águas;
II – Os Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito
Federal;
III – Os Comitês de Bacia Hidrográfica;
IV – os órgãos dos poderes públicos federal, estaduais, do
Distrito Federal e municipais cujas competências se relacionem
com a gestão dos recursos hídricos;
V – As Agências de Água. 77 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 137 p.
55
No artigo 32 da Lei 9.433/97, encontramos as seguintes
atribuições do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos:
I – coordenar a gestão integrada das águas;
II - arbitrar administrativamente os conflitos relacionados com os
recursos hídricos;
III – implementar a Política Nacional dos Recurso Hídricos;
IV – planejar, regular e controlar o uso, a preservação e a
recuperação dos recursos hídricos;
V – promover a cobrança pelo uso dos recursos hídricos.
O Papel do Sistema Nacional de Gerenciamento de
Recursos Hídricos, bem como da Política Nacional dos recursos Hídricos é de
suma importância para o controle de qualidade dos recursos hídricos.
3.3 DAS ZONAS COSTEIRAS
A zona costeira é protegida pela constituição Federal e foi
elevada a condição de patrimônio nacional brasileiro. O artigo 225, § 4ºda
CRFB/88, reza que:
“ A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do
Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são
patrimônio nacional, e sua utilização far-se-à, na forma da lei,
dentro de condições que assegurem a preservação do meio
ambiente, inclusive quanto ao uso de recursos naturais.”
Esse dispositivo constitucional foi regulamentado pela Lei
nº 7.661, de 16 de maio de 1988, que instituiu o Plano Nacional de
Gerenciamento Costeiro, como parte integrante da Política Nacional do Meio
Ambiente.
56
O conceito de zona costeira é encontrado no artigo 2º,
parágrafo único da nº 7.661/88, como sendo “ espaço geográfico de interação do
ar, do mar e da terra, incluindo seus recursos renováveis ou não, abrangendo
uma faixa marítima e outra terrestre, que serão definidas pelo Plano”.
Conforme Sirvinskas78, “ a zona costeira é constituída pela
junção de faixa marítima, da faixa continental e do ar, possuindo grande
variedade biológica. Há, nessa zona, restingas, bancos de areia, lagunas,
manguezais, etc”.
O artigo 6º da Lei nº 7.661/88 dita as regras gerais para o
licenciamento de parcelamento do solo o seu remembramento, assim como para
o licenciamento de atividades que tragam alterações das características naturais
da zona costeira. O artigo 6º assim prescreve:
“O licenciamento para parcelamento e remembramento do solo,
construção, instalação, funcionamento e ampliação de atividades,
com alteração das características naturais da zona costeira,
devera observar, além do disposto nesta Lei, as demais normas
especificas, federais, estaduais e municipais, respeitando as
diretrizes dos Planos de Gerenciamento Costeiro.
§1º .A falta ou descumprimento, mesmo parcial das condições do
licenciamento previsto neste artigo serão sancionados com
interdição, embargo ou demolição, sem prejuízo de cominação de
outras penalidades previstas em lei.
§2º . Para o licenciamento, o órgão competente solicitará ao
responsável pela atividade a elaboração do Estudo de Impacto
Ambiental e a apresentação do Respectivo Relatório de Impacto
Ambiental – RIMA, devidamente aprovado, na forma da lei.”
A legislação acima mencionada veio a confirmar as
determinações legais vigentes, preceituando ainda que as atividades a serem
licenciadas na zona costeira, além das normas específicas constantes da 78 SIRVINSKAS, Luís Paulo. 2002, p. 175
57
legislação federal, estadual e municipal, deve-se também, observar as
determinações constantes dos Planos Federal e Estadual de gerenciamento
costeiro.
Portanto, não há como ignorar os ditames da legislação
vigente, principalmente, quanto ao aspecto de preservação florestal, para permitir
o uso do solo, nessas áreas, que antes de tudo, devem ser preservadas.
3.4 DAS MATAS CILIARES
As matas ciliares estão contidas nas Áreas de Preservação
Permanente, iniciaremos este capítu79lo com o conceito de mata ciliar.
Conforme o GLOSSÁRIO ECOLÓGICO80, a mata ciliar é a
vegetação arbórea que se desenvolve ao longo das margens dos rios e ao redor
das nascentes, lagos, lagoas e reservatórios, beneficiando-se da umidade ali
existente, sendo também conhecida como mata aluvial, de galeria, ripária ou
marginal.
Segundo Falcão, a origem do termo mata ciliar advêm:
“A expressão mata ciliar surgiu por causa da semelhança entre a
função dessa vegetação e a dos cílios humanos, pois da mesma
maneira que os cílios protegem os olhos das impurezas do ar, a
mata ciliar serve para depurar a água por meio da eliminação de
agrotóxicos, pesticidas, resíduos químicos e outros tipos de
sujeira despejadas nos rios e em outros reservatórios de água.”
79 FALCÃO. Roberta Borges de Medeiros. Tribuna do Norte. Natal/RN, 06 de setembro de 2002.
p.2. 80 GLOSSÁRIO, Ecológico. Companhia Pernambucana de Meio Ambiente e Recursos Hídricos.
Disponível em: http: //www.cprh,pe.gov.br. Acesso em 20.mar.2007
58
A mata ciliar é uma vegetação formada por um conjunto de
árvores, arbustos, cipós, raízes e flores que é encontrada às margens dos cursos
de água dos rios, lagos, lagoas e nascentes, perenes ou não, se localizando
exatamente nos limites delimitados pelas alíneas a, b e c do art. 2º do Código
Florestal, vejamos:
“a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água desde o seu
nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será (de 30
a 500 metros dependendo da largura dos cursos d’àgua); b) ao
redor das lagoas, lagos ou reservatórios d’àgua naturais ou
artificiais; c) nas nascentes, ainda que intermitentes e nos
chamados “olhos d’água”, qualquer que seja a situação
topográfica, num raio mínimo de 50 (cinqüenta) metros de largura
(...)”
Acerca da variação dos tipos de solo ocasionada pela
presença da mata ciliar preleciona Rodrigues:
“ sob florestas ciliares ocorre uma significativa variação de solos,
cujos reflexos aparecem nos diversos tipos de formações
florestais, variando desde as de terrenos mais encharcados
(floresta pantanosa ou mata de brejo) até os mais secos, onde as
florestas apresentam características florísticas e fisionomia
distintas, de acordo com o gradiente de umidade e influência
fluvial no solo, até o extremo onde as formações de interflúvio
chegam até as margens dos cursos d’água, onde o rio e o lençol
freático não exercem influência direta.”81
Diante do panorama de eliminação das florestas e
degradação ambiental nas áreas especialmente protegidas, as matas ciliares não
escaparam da destruição; pelo contrário, foram alvo de todo o tipo de
degradação.
81 RODRIGUES, Ricardo Ribeiro et al. Matas ciliares – conservação e recuperação. São Paulo:
Editora da Universidade de São Paulo: Fapesp, 2000, p. 31
59
3.5 DAS FUNÇÕES DAS MATAS CILIARES E SUA RELAÇÃO COM O
REGIME JURÍDICO DOS RECURSOS HÍDRICOS
As matas ciliares tem importante função para aos solos, que
podem alterar suas características naturais.
Segundo Como82, estabelece-se que “os solos de áreas
sem cobertura vegetal, do tipo florestal ou não, sofrem redução em sua
capacidade de captação de água.”
A função da mata ciliar é auxiliar na fixação do solo por meio
de suas inúmeras raízes, diminuindo o impacto das chuvas e fazendo com que
rios, lagos, lagoas e nascentes fiquem protegidos das inundações.
Acerca da função da mata ciliar em captar a água e evitar
inundações, explica Ribas:
“ Assim, a água da chuva ou de irrigação, em vez de infiltrar-se
no solo, escorre pela superfície, formando enxurradas, deixando
de abastecer os lençóis freáticos, provocando diminuição no nível
de água armazenada, a erosão do solo, o assoreamento dos
cursos de água, dentre outros problemas ambientais
(caracterizando-se, igualmente, uma situação de
poluição/degradação ambiental)”83
Ou seja, essa vegetação direciona a água diretamente para
o solo e não para o curso ou o leito da água, evitando os desmoronamentos em
época de chuva que anualmente acontecem.
82 COMO reflorestar margens dos rios. Suplemento Agrícola. Jornal O Estado de São Paulo.
25/09/1996. G-2 83 RIBAS. Luiz César. 1999, p. 117
60
Ressalte-se que a mata ciliar como integrante das Áreas de
Preservação Permanente como um todo resolveria a problemática ambiental das
águas pluviais “em tempos de fenômenos climáticos anormais, seria melhor
administrada sob o ponto de vista ambiental quanto a enchentes, enxurradas,
inundações, prejuízos econômicos, danos morais/materiais, saúde pública,
higiene, etc.”84
Novamente COMO85 afirma que “a manutenção das matas
ciliares auxiliaria na proteção de nossos mananciais , garantindo maior
estabilidade, inclusive, das margens dos rios”.
Além do mais, a mata ciliar também contribui para a
sobrevivência e manutenção do fluxo gênico entre espécies animais e vegetais
que habitam as faixas ciliares, ou mesmo fragmentos florestais maiores por elas
conectados.
Acerca do fluxo gênico entre as espécies, comenta COSTA
et al: “afirmam que substâncias húmicas ou húmus provavelmente constituam-se
no produto natural mais largamente distribuído na superfície da terra, ocorrendo
em solos, rios, lagos e oceanos.”86
Desta maneira, denota-se que “a importância da mata ciliar
para o equilíbrio ambiental é imensa, já que ela contribui para a manutenção e
qualidade dos recursos hídricos e funciona como um corredor úmido entre as
áreas agrícolas, auxiliando a vida silvestre”87
84 RIBAS. Luiz César. 1999, p. 123 85 COMO reflorestar margens dos rios. Suplemento Agrícola. Jornal O Estado de São Paulo.
25/09/1996. G-2 86 COSTA, A. C. C. et al. Estudo da presença de substâncias húmicas (SH) em amostras (água
bruta, água tratada e lodo) coletadas na ETA – Belém – PA. Revista Brasileira de Ecologia. Sociedade de Ecologia do Brasil. Ano 1. Número 1. Rio Claro. São Paulo. 1997. p 57-59.
87 ABREU, Alexandre Herculano; OLIVEIRA, Rodrigo de> Ministério Público do Estado de Santa Catarina. Regime Jurídico das Matas Ciliares. Disponível em: http://www.mp.sc,gov,br, acesso em 13/03/2007
61
É também objetivo da Política Nacional dos Recursos
Hídricos “ a prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos de origem
natural ou decorrentes do uso inadequado dos recursos naturais, conforme artigo
2º, III da Lei nº 9.433/97.
Conforme ensina MACHADO88, as enchentes e inundações
ou cheias dos cursos de água na maioria das vezes não constituem fatos
oriundos de força maior. São previsíveis e inevitáveis, desde que se afastem suas
causas. As ausências de vegetação protetora das margens dos cursos de água e
o assoreamento dos leitos desses cursos estão entre as principais causas desses
eventos hidrológicos críticos.
Em Hidrologia emprega-se a locução “cheia máxima
possível”, que é a “máxima cheia a ser esperada, no caso de completa
coincidência de todos os fatores capazes de produzir maior precipitação e o
escoamento máximo”. Conceituam-se como “prevenção contra cheias” as
“técnicas para evitar os danos das inundações às estruturas e aos edifícios
situados em áreas expostas às cheias”.89
Segundo MACHADO90, devemos apontar duas “diretrizes
gerais de ação, contidas no artigo 3º da Lei nº 9.433/97, como auxiliares da
consecução do objetivo de prevenir e defender a população contra as inundações:
articulação dos planejamentos dos recursos hídricos e, especialmente, da área
regional e integração com a gestão do uso e do solo”.
Frise-se que ainda no artigo 3º, VI, da Lei nº 9.433/97 está
prevista como outra diretriz de ação da Política Nacional de Recursos Hídricos “ a
integração da gestão das bacias hidrográficas com a dos sistemas estuarinos91 e
88 MACHADO,. Paulo Affonso Leme. Recursos hídricos. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 39 89 Glossário de Termos Hidrológicos. Brasília. DNAEE, Divisão de Controle de Recursos Hídricos,
1983. 90 MACHADO,. Paulo Affonso Leme. Recursos hídricos. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 40 91 Conforme Dicionário Aurélio, 3ª ed.Rio de Janeiro: nova fronteira, 1993, p. 234 – estuário “ tipo
de foz em que o curso d’àgua se abre mais ou menos largamente.”
62
zonas costeiras”, motivo pelo qual foi explanado um subtítulo acerca das zonas
costeiras.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O desenvolvimento deste trabalho foi de suma importância
para a compreensão acerca do surgimento de novos direitos, entre eles o direito
ambiental, que nasceu com as novas carências da sociedade e a necessidade de
se assegurar a garantia de um meio ambiente ecologicamente equilibrado para as
presentes e futuras gerações.
Uma das maiores dificuldades encontradas com o
desenvolvimento deste trabalho foi a localização das leis esparsas e princípios
que norteiam o direito ambiental, seria de uma facilidade tremenda se, assim,
como nos outros ramos do direito, existisse um código contendo todos os
norteadores do direito Ambiental.
Diante da pesquisa realizada, pode-se compreender que
entre os espaços ambientalmente protegidos, estão as áreas de preservação
permanente, recepcionadas pelo Código Florestal, especificamente em seu artigo
2º, e como parte integrante, as matas ciliares.
O mencionado dispositivo menciona as limitações desta
proteção, dependendo da largura dos cursos d’água que variam de 30 (trinta) a
500 (qüinhentos) metros, ainda são protegidas, as áreas ao redor das lagoas,
lagos, reservatórios d’água naturais ou artificiais e as nascentes.
Verificou-se que nestas áreas citadas no parágrafo acima,
há formação de uma vegetação, denominada mata ciliar, que é composta por um
conjunto de árvores, arbustos, cipós, raízes e flores.
A mata ciliar é de extrema importância para o equilíbrio
ambiental e possui uma afinidade de funções, dentre elas: a retenção dos
resíduos agroquímicos evitando a poluição dos cursos d’água, a proteção contra o
assoreamento e enchentes, a conservação do solo, o equilíbrio do clima, o auxílio
e habitat da vida silvestre, equilíbrio climático, entre outras funções.
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Diante de tal assertiva, pode-se afirmar que existem limites
específicos para a ocupação destas áreas, tendo em vista o perigo de erosão,
enchentes e desmoronamentos de terra e rochas.
Este processo de degradação das formações ciliares, além
de desrespeitar a legislação, que torna obrigatória a preservação das mesmas,
resulta em vários problemas ambientais. As matas ciliares funcionam como filtros,
retendo defensivos agrícolas, poluentes e sedimentos que seriam transportados
para os cursos d'água, afetando diretamente a quantidade e a qualidade da água
e conseqüentemente a fauna aquática e a população humana.
Apesar da reconhecida importância ecológica, ainda mais
evidente nesta virada de século e de milênio, em que a água vem sendo
considerada o recurso natural mais importante para a humanidade, as florestas
ciliares continuam sendo eliminadas cedendo lugar para a especulação
imobiliária, para a agricultura e a pecuária.
São importantes também como corredores ecológicos,
ligando fragmentos florestais e, portanto, facilitando o deslocamento da fauna
entre as populações de espécies animais e vegetais. Em regiões com topografia
acidentada, exercem a proteção do solo contra os processos erosivos.
É necessário que as autoridades responsáveis pela
conservação ambiental adotem uma postura rígida no sentido de preservarem as
florestas ciliares que ainda restam, e que a população em geral seja
conscientizada sobre a importância da conservação desta vegetação.
Assim, é igualmente essencial que os meios de
comunicação de massa evitem contribuir para a deterioração do meio ambiente,
mas ao contrário, disseminem informações de natureza educativa sobre a
necessidade de proteger e de melhorar o meio ambiente, a fim de tornar o homem
capaz de desenvolver-se em todos os aspectos.
Pelo estudo apresentado, obteve-se êxito quanto as
respostas para todas as hipóteses apresentadas no preâmbulo deste trabalho.
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