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DEPARTAMENTO DE DIREITO
MESTRADO EM DIREITO
A SUCESSÃO HOMOAFETIVA
UMA NOVA PERSPECTIVA NO DIREITO LUSO-BRASILEIRO
Dissertação para a obtenção do grau de Mestre em Direito,
Especialidade em Ciências Jurídicas.
Autor: Shirlei Castro Menezes Mota
Orientadora: Professora Doutora Stela Marcos de Almeida Neves Barbas
Lisboa
Julho de 2016
2
DEDICATÓRIA
Em memória de minha mãe, Lourdes, e de meu marido,
Celso Mota, sempre tão presentes.
3
AGRADECIMENTOS
A Deus, o Grande Mestre do Universo!
À minha mentora e orientadora, Professora Doutora Stela Barbas, que além da questão da
orientação, adequação e revisão deste trabalho, com observações sempre construtivas, estimo
todo o meu carinho, posto que fonte de aprendizado e inspiração. Afinal, “Não sou nada.
Nunca serei nada. Não posso querer ser nada. À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do
mundo.” 1
. E, para alcançar as estrelas, não há de ser fácil, mas tenho a certeza de que, se
necessário, terei em minha mestra alguém disposta a me ensinar a descobrir o melhor
caminho. Porque ninguém escolhe ser professor, mas alguns nascem com essa nobre missão:
a de estimular nos corações e mentes dos alunos todos os sonhos do mundo, e isto a nobre
professora o faz de maneira ímpar.
À coordenação, em especial Dra. Noémi Nóbrega.
Ao Professor Doutor Affonso Pernet Junior, Ordem dos Advogados do Brasil - Rio de Janeiro
– ESA – Escola Superior de Advocacia - Barra da Tijuca. Para mim, uma fonte inenarrável de
conhecimento.
Aos amigos que mudaram para melhor minha história profissional, em especial à Marselha De
Luca.
Ao Professor Mestre Manoel Pereira dos Santos Neto, por toda atenção dispensada no
processo de estruturação e revisão deste trabalho.
À Professora Flávia Vianna Martins Moura.
E à minha sobrinha Vanessa Menezes, pela formatação.
1 Primeira estrofe do poema Tabacaria, de Álvaro de Campos, heterônomo do poeta português Fernando
Pessoa.
4
RESUMO
Este trabalho tem a intenção de atualizar a comunidade jurídica e a sociedade luso-brasileira
sobre o andamento da aceitação do relacionamento homoafetivo entre pessoas do mesmo sexo
e seus direitos, em especial o sucessório. Trazendo uma visão atual do que, historicamente,
vem sendo modificado ao longo dos anos; as vitórias e também alguns retrocessos que a
sociedade mundial, e principalmente, luso-brasileira, tem conquistado e/ou sofrido. A ideia
principal é a de expor a situação vivenciada pela comunidade LGBT em suas uniões através
dos anos e reiterar que seus indivíduos não merecem menos respeito ou direitos que todos os
outros, inclusive quando do falecimento de um dos companheiros. A situação atual no mundo
indica uma abertura maior das pessoas no caminho de respeitar as diferenças e entender que
essas uniões sempre existiram, mas não tinham seus direitos garantidos, por isso eram
escondidas, não tinham visibilidade. Isso é o que está mudando. A sucessão dos parceiros
homoafetivos está, consequentemente, também mais justa e mais próxima da que se tem nas
uniões heterossexuais, mas ainda há um longo caminho a percorrer.
Palavras Chaves: Sucessão; Relação Homoafetiva; Companheiro; Direito Sucessório.
5
ABSTRACT
This work intends to update the Luso-Brazilian legal community and its society about the
progress of the acceptance of homoafetivo relationship between persons of the same sex and
their rights, in particular the succession duty. Bringing a current view of what historically has
been modified over the years; the victories and also some setbacks that the world society, and
mainly Portuguese-Brazilian, has conquered and/or suffered. The main idea is to expose the
situation experienced by the LGBT community in their marriages over the years and reiterate
that their people deserve no less respect or rights as all others, even when the death of one
partner. The current situation in the world indicates a greater openness of the people in the
way to respect differences and understand that these unions have always existed, but did not
have their rights guaranteed, so were hidden, they had no visibility. That is what is changing.
The succession of homosexual partners is thus also more fair and closer than it has in
heterosexual relationships, but there is still a long way to go.
Key words: Succession; Homosexual Relationship; Life partner; Succession Right.
6
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO................................................................................................................. 10
PRIMEIRO CAPÍTULO................................................................................................. 12
CAPÍTULO 1 – OS EFEITOS JURÍDICOS DA UNIÃO HOMOAFETIVA NO
DIREITO PORTUGUÊS, EM ESPECIAL OS SUCESSÓRIOS.................................
14
1.1 A UNIÃO DE FACTO.....................................................................,............................ 14
1.1.1 Impedimentos para atribuição de efeitos jurídicos às uniões de facto....................... 15
1.1.2 Mudanças na legislação.............................................................................................. 18
1.1.3 Efeitos da união de facto............................................................................................ 20
1.1.3.1 Efeitos pessoais....................................................................................................... 20
1.1.3.2 Efeitos patrimoniais................................................................................................. 21
1.2 OS EFEITOS JURÍDICOS DAS UNIÕES HOMOAFETIVAS EM PORTUGAL..... 26
1.2.1 Lei 135/1999, de 28 de Agosto............................................................................. 27
1.2.2 União de facto (Lei 7/2001, de 11 de Maio).............................................................. 28
1.2.3 Casamento na união homoafetiva (Lei 9/2010, de 31 de Maio)................................ 28
1.2.4 Os direitos e deveres do casal homoafetivo............................................................... 32
1.2.5 Adoção por casal homoafetivo (Lei 2/2016, de 29 de agosto)................................... 33
1.2.6 Reprodução assistida.................................................................................................. 36
1.3 SUCESSÃO NA RELAÇÃO HOMOAFETIVA.......................................................... 37
SEGUNDO CAPÍTULO................................................................................................... 40
CAPÍTULO 2 – OS EFEITOS JURÍDICOS DA UNIÃO HOMOAFETIVA NO
DIREITO BRASILEIRO, EM ESPECIAL OS SUCESSÓRIOS.................................
42
2.1 UNIÃO ESTÁVEL..................................................................................................... 42
2.1.1 União estável na Constituição Federal....................................................................... 47
2.2 OS EFEITOS JURÍDICOS DAS UNIÕES HOMOAFETIVAS NO BRASIL............ 51
2.2.1 Adoção........................................................................................................................ 55
2.2.2 Reprodução assistida.................................................................................................. 56
2.2.3 Relações homoafetivas e o Direito Previdenciário..................................................... 56
2.3 SUCESSÃO NA RELAÇÃO HOMOAFETIVA.......................................................... 60
2.3.1 Constitucionalidade da sucessão do companheiro supérstite..................................... 64
7
2.3.2 Sucessão do companheiro supérstite no Código Civil Brasileiro de 2002................. 65
2.3.2.1 Concorrência do companheiro supérstite com filhos comuns................................. 68
2.3.2.2 Concorrência do companheiro supérstite com filiação híbrida............................... 70
2.3.2.3 Concorrência do companheiro supérstite com descendentes do autor da herança.. 71
2.3.2.4 Concorrência do companheiro supérstite com outros parentes sucessíveis do
autor da herança...................................................................................................................
72
2.3.2.5 Direito do companheiro supérstite à totalidade da herança quando não há
parentes sucessíveis do autor da herança............................................................................
73
2.3.2.6 Meação.................................................................................................................... 74
2.3.2.7 Direito real de habitação do companheiro supérstite.............................................. 75
TERCEIRO CAPÍTULO................................................................................................. 80
CAPÍTULO 3 – OS EFEITOS JURÍDICOS DA UNIÃO HOMOAFETIVA EM
ORDENAMENTOS DIVERSOS DO LUSO-BRASILEIRO........................................
82
3.1 CASAMENTO HOMOAFETIVO: EVOLUÇÃO AO LONGO DO TEMPO............. 85
3.2 PAÍSES QUE TENHAM LEIS DE UNIÃO HOMOAFETIVA DIFERENTES DO
CASAMENTO....................................................................................................................
87
3.3 PAÍSES ONDE HOMOSSEXUALIDADE É PROIBIDA E PUNIDA....................... 89
3.4 A ADOÇÃO POR CASAIS HOMOSSEXUAIS NO MUNDO................................... 91
CONCLUSÃO.................................................................................................................... 92
REFERÊNCIAS................................................................................................................ 96
ANEXOS............................................................................................................................ 105
ANEXO A – Leis de proteção em 2016: orientação sexual............................................... 106
ANEXO B – Apoio à união homoafetiva até 2015............................................................. 107
ANEXO C – Crescem casamentos homoafetivos............................................................... 108
ANEXO D – Casamento e união homoafetiva de 2012 a 2015, no mundo........................ 109
ANEXO E – Países que proíbem homossexualismo.......................................................... 111
ANEXO F – Adoção por casais homoafetivos................................................................... 112
8
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
Ac. da Rel. de Évora – Acórdão da relação de Évora
ACS - Acórdãos
ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade
ADN - Ácido Desoxirribonucléico
ADPF – Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental
ADSE - Assistência na Doença aos Servidores do Estado
ARP – Assembléia da República Portuguesa
ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar
CID – Catálogo Internacional de Doenças
CC – Código Civil
CCP – Código Civil Português
CF – Constituição Federal
CFB – Constituição Federal Brasileira
CGJ – Corregedoria Geral de Justiça
CID – Cadastro Internacional de Doenças
CNJ – Conselho Nacional de Justiça
CRP – Constituição da República Portuguesa
CP – Código Penal Brasileiro
DL – Decreto-lei
DNV – Declaração de Nascido Vivo
ECA – Estatuto da Criança de do Adolescente
IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família
ILGA - Associação Internacional de Homossexuais
INSS – Instituto Nacional do Seguro Social
IRS - Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares
LGBT – Lésbicas, Gays, Bissexuais, e Transgênicos
LINDB - Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro
LPMA – Lei de Procriação Medicamente Assistida
9
MP - Ministério Público
OAB – Ordem dos Advogados do Brasil
OMS – Organização Mundial de Saúde
ONG – Organização Não governamental
ONU – Organização das Nações Unidas
PACS - Pacte Civil de Solidarité
PL – Projeto de Lei
PMA – Procriação Medicamente Assistida
PROHABITA - Programa de Financiamento para Acesso à Habitação
RPPS - Regime Próprio de Previdência Social
STF – Supremo Tribunal Federal
STJ – Superior Tribunal de Justiça
TJ – Tribunal de Justiça
UF – Unidade Federativa
10
INTRODUÇÃO
Até que ponto se pode pensar a liberdade de forma literalmente livre? A ideia
conservadora insiste em atar as “asas” da liberdade na tentativa de impedir que seu conceito
se mova e se modifique, mesmo quando tudo ao redor não deixa de se movimentar. E,
consequentemente, de se alterar. Essa atitude foge a toda e qualquer fidelidade que essa
palavra possa ter em seu significado.
A força da liberdade para o indivíduo e para a sociedade é tamanha, que é considerada
em muitos ordenamentos jurídicos, como um direito fundamental, inalienável.
No entanto, os indivíduos homossexuais são, constantemente, privados de seus direitos
fundamentais de liberdade, de constituir família, de se expressar livremente sobre sua
sexualidade e felicidade e, inclusive, de ter seus direitos à parentalidade, à ajuda financeira, à
herança e a possíveis pensões.
Ao longo dos anos, a situação de preconceito em que essa - não pequena – parcela da
população e seus dependentes se encontravam, foi sendo enfrentada aos olhos da sociedade,
dos costumes e, finalmente, do Direito.
A luta para o reconhecimento dos direitos da população homossexual e suas relações
teve um ponto de partida tímido, mas, com o passar dos anos, foi se fortalecendo de forma
contínua. Principalmente após grande parte da população se identificar ou identificar a
situação de um ente querido que, por conviver dessa maneira, sabiam-se merecedores da
proteção do Estado, tanto quanto a dada a todos os outros indivíduos.
A população começou a olhar para essa realidade com outros olhos e a verificar,
através de inúmeros casos que vieram à tona, que a orientação sexual não definia o caráter de
uma pessoa. E, através de diversos exames e testes, comprovaram também que a
homossexualidade não era uma doença. Nesta época, a Organização Mundial de Saúde -
11
OMS2 a retirou do rol do Catálogo Internacional de Doenças - CID e a palavra
homossexualismo perdeu o sufixo “ismo” e passou a usar o prefixo “ade”, homossexualidade.
A batalha pelos direitos dos casais homoafetivos é uma constante e ainda precisa
vencer muitos obstáculos ao redor do mundo. Porém, o principal inimigo é a forma como
estes pares são vistos pela sociedade que, muitas vezes, obedece às leis sem entendê-las, e
sem incutir nos indivíduos o respeito às diferenças.
Neste trabalho, a intenção é a de trazer as ultimas conquistas da comunidade LGBT
(Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros) na luta por seus direitos,
em especial os de sucessão, além de apresentar como eram vistos e tratados em um passado
não tão distante, e como se deu a trajetória que culminou com 23 países nos quais o
casamento homoafetivo é permitido. Sem, no entanto, deixar de apresentar, por outro lado, os
países onde a prática homossexual é punida muitas vezes com pena de morte. Em suma, fazer
uma análise do quanto o caminho para essa comunidade ter seus direitos juridicamente
reconhecidos ainda precisa ser percorrido no cenário mundial.
Notoriamente, houve um grande avanço nas leis de Portugal e do Brasil, que , dentre
outros, atualmente permitem o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, inclusive com
possibilidade de existir prole, sendo esta família, felizmente, reconhecida, o que era
impensável há alguns anos.
Hoje, há sob nossos olhos e sob nossos códigos, normas e decisões jurisprudenciais, a
família homoafetiva. Isso, entretanto, não pode nos deixar esquecer que a luta, a discussão, a
argumentação e a busca por legitimidade social não deve cair no comodismo do que já foi
conquistado até agora.
2 A OMS (Organização Mundial da Saúde) foi fundada em 7 de abril de 1948, como uma agência especializada
da ONU (Organização das Nações Unidas). Atualmente, tem 191 países-membros e mantém contato com 180
ONGs (Organizações Não-Governamentais), e mais de 1.200 agentes de saúde.
12
PRIMEIRO CAPÍTULO
Neste capítulo foi abordada a visão do direito português, não apenas sobre o tema da
sucessão de casais de mesmo sexo, mas também acerca de como a amplitude de direitos e
deveres da união homoafetiva é vista pela sociedade. Com destaque que para a mudança que
está ocorrendo no entendimento das pessoas, faz com que, em razão dela, há uma
transformação na visão da sociedade, logo se movimentam, consequentemente, novas linhas
de raciocínio e de interpretação, novas possibilidades de entendimento da realidade, novos
costumes, e novas jurisprudências e normas jurídicas.
13
“[...] É necessário que, a nível de toda e qualquer comunidade, esteja
regulada a substituição por outro do falecido proprietário de uma
determinada unidade econômica. E, precisamente, para resolver este
importante problema no mundo jurídico, têm sido seguidas,
historicamente, três tendências fundamentais, a saber: Tendência
Individualista; Tendência Familiar e Tendência Socialista.”
(José Antônio de França Pitão)3.
3 PITÃO, José Antônio de França, A posição do cônjuge sobrevivo no atual direito sucessório português. 4.
ed. Coimbra: Almedina, 2005, p.13.
14
CAPÍTULO 1 – OS EFEITOS JURÍDICOS DA UNIÃO HOMOAFETIVA NO
DIREITO PORTUGUÊS, EM ESPECIAL OS SUCESSÓRIOS
1.1 A UNIÃO DE FACTO
A expressão união de facto foi utilizada pela primeira vez na reforma de 1977, na
epigrafe do art. 2020º do Código Civil Português - CCP, para definir a situação de pessoas
que não eram casadas, mas viviam em matrimonio. Já no CC Português de 19664, falava-se
em “comunhão duradoura de vida em condições análogas às dos cônjuges”.
Na prática, a união de facto tem início assim que as partes passam a viver em
coabitação, mas o decorrer dos dois anos faz supor que a convivência em comum já adquiriu
alguma estabilidade, satisfazendo, portanto, as exigências da segurança jurídica.
Chamada de “união de facto”, a união estável era vista com reservas em Portugal e até
o ano de 1999 não existia nenhuma sistematização jurídica, apenas normas em diplomas
avulsos, que davam uns poucos direitos e muitas restrições aos casais em condições análogas
às dos cônjuges.
A Lei n.º 135/19995, de 28 de Agosto, introduziu a primeira regulamentação sistêmica
da matéria no direito português, caracterizando como união de facto a relação de pessoas de
sexo diferente, que viviam como marido e mulher, na mesma residência, compartilhando a
mesa e o leito por pelo menos dois anos, sem haver laço matrimonial. Posteriormente, a
Assembleia da República Portuguesa - ARP, no dia 15 de março de 2001, através do voto,
conseguiu ampliar a proteção a casais homoafetivos (exceto para adoção).
A Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, de proteção às uniões de facto, foi publicada no
Diário da República. Esta lei, atualmente em vigor, e suas alterações - leis 23/20106 e 2/2016
7
- equipararam os direitos na união de pessoas do mesmo sexo a pessoas de sexo diferente, e
reconheceram os direitos e deveres inerentes a esse regime.
4 Cf.: http://revistas.ufpr.br/direito/article/viewFile/7154/5105.
5 Lei n.º 135/1999, de 28 de Agosto. Este diploma foi expressamente revogado pela Lei n.º 7/2001, de 11 de
Maio. 6 Cf.: http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=1262&tabela=leis.
7 Cf: http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=2515&tabela=leis&nversao=.
15
Uma pessoa só pode viver em uma união de facto com uma única pessoa e, apesar
disso, como no casamento, a união não deixa de existir automaticamente caso um dos sujeitos
não seja fiel. A lei de união de facto (7/2001) hoje é definida em seu art. 1º, nº 2, como: “[...]a
situação jurídica de duas pessoas que, independentemente do sexo, vivam em condições
análogas às dos cônjuges há mais de dois anos”. Sendo que o art. 2º dessa lei foi modificado e
passou a ter a seguinte redação: “Na falta de disposição legal ou regulamentar que exija
prova documental específica, a união de faço prova-se por qualquer meio legalmente
admissível.” Em 2008, Mônica Isabel Ferreira Sequeira Lima destacava que:
“A Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, que revogou a Lei n.º 135/1999, e que adoptou
medidas de protecção das uniões de facto, não só, desta feita, para uniões entre
heterossexuais, mas também entre homossexuais, nos termos do seu art. 1: (...)
Art.1º n.º 1, ao regular a situação jurídica de duas pessoas, independentemente do
sexo, que vivam em união de facto há mais de dois anos. (...) Ao mesmo tempo,
surge um novo diploma que vem regular a protecção de pessoas que vivam em
economia comum há mais de dois anos, pela Lei 6/2001 de 11 de Maio.”8
Alguns doutrinadores ainda defendem que a união de facto deve ser entre casal de
sexo diferente, tendo em vista a intenção deste instituto em se assemelhar ao casamento e, até
mesmo, utilizar algum estatuto deste. Em contrapartida, e mais atualizada à realidade global,
uma parte da doutrina, mais precisamente, dos professores Gomes Canotilho e Vital Moreira,
defendem que o art. 36º n.º 1 da CRP prevê a união de facto. Os autores entendem que o
direito de constituir família provém de uma abertura constitucional que dá ênfase à união de
facto e partilham da opinião de que a união de facto é uma relação familiar, porém,
directamente, a Constituição Portuguesa não a aborda9.
1.1.1 Impedimentos para atribuição de efeitos jurídicos às uniões de facto
Através dessa pesquisa, se pôde notar que, no que concerne à atribuição de efeitos às
uniões de facto, os impedimentos não foram alterados. A Lei n.º 135/1999, de 28 de Agosto
(revogada) e a Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, inicialmente mantiveram seus impeditivos.
Posteriormente, a Lei 7/2001 sofreu algumas poucas alterações através das leis 23/2010 de 30
de Agosto, e 2/2016, de 29 de fevereiro, já citadas.
8 LIMA, Mônica Isabel Ferreira Sequeira. Evolução Histórica da União de Facto: da Sociedade Babilônica ao
Direito Português Contemporâneo. Trabalho apresentado à Universidade Autônoma de Lisboa. 2008. 9 CANOTILHO, J.J Gomes; MOREIRA, Vital. Constituição da República Portuguesa Anotada. 4. ed. revista,
vol. I. Coimbra: Coimbra, 2007, pp. 559-568.
16
Os impeditivos da produção de efeitos jurídicos previstos nestas leis continuam sendo
a idade (originalmente para menores de 16 anos, e atualmente, alterada pela Lei 23/2010, de
30 de Agosto, para menores de 18 anos); nos termos do art. 2 º, a saber:
“Impedem a atribuição de direitos ou benefícios, em vida ou por morte, fundados na
união de facto:
a) Idade inferior a 18 anos à data do reconhecimento da união de facto;
b) Demência notória, mesmo com intervalos lúcidos, e a interdição ou inabilitação
por anomalia psíquica, salvo se a demência se manifestar ou a anomalia se verificar
em momento posterior ao do início da união de facto;
c) Casamento não dissolvido, salvo se tiver sido decretada a separação de pessoas e
bens;
d) Parentesco na linha reta ou no 2.° grau da linha colateral ou afinidade na Lina
reta;
e) Condenação anterior de uma das pessoas como autor ou cúmplice por homicídio
doloso ainda que não consumado contra o cônjuge do outro.” 10
O art. 2° da lei de união de facto, trata de relações entre pessoas. Quando as pessoas
elencadas no art. 2º, na prática, resolvem se unir, não há como, legalmente, separá-las de
forma factual, porém essa união não está abrangida pelos direitos estipulados nesta lei. Os
seus sujeitos, mesmo vivendo há mais de 2 (dois) anos em união, não têm os direitos previstos
nos arts. 3º e 7º e na lei geral por remissão do art. 1º, n.º 2, todos constantes da Lei n.º7/2001,
de 11 de Maio e suas atualizações.
É importante lembrar que o art. 2º deve ser sujeito a uma interpretação restritiva. Seria
indesculpável tornar os unidos de facto isentos das responsabilidades e deveres decorrentes
dessa união, apesar de ser aceito que os direitos previstos na lei não sejam atribuídos.
Logo, aplica-se a Lei n.º 6/200111
, em seus arts. 1º, n.º 1 e n.º 3, de 11 de Maio, a todas
as uniões de fato não acolhidas pelo art. 2º da Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio. No mais, são
aqui dipostos alguns pontos referentes aos impedimentos da (Lei n.º 7/2001):
1. Na versão original, a idade mínima era de 16, mas ao notar a união dos arts. 2º,
alínea a, e n.º 1 do art. 1º (há mais de dois anos) da Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio,
é possível entender que o ordenamento jurídico reconhece direitos a uniões de
facto que se tenham iniciado com membros de 14 ou 15 anos, violando normas
imperativas da legislação e contrastando com o Código Penal, que aflige este tipo
de relações sexuais com pena de prisão. Com esta controvérsia, houve a
10
Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, com substituição pela Lei 23/2010, de 30 de Agosto. 11
Cf.: http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=900&tabela=leis.
17
necessidade da alteração da idade mínima para 18 anos (feita pela Lei n.º 23/2010,
de 30 de Agosto - Artigo 2.º a).
2. Com relação à demência notória, mesmo nos intervalos lúcidos, encontramos
doutrinas que acreditam ser desnecessária esta referência, visto que para a união
de facto produzir efeitos a manifestação da vontade terá de ser contínua por mais
de dois anos e não há, como no casamento, um momento específico para haver
esse intervalo lúcido e o unido de facto possa manifestar a sua vontade de viver
em união.
Questão interessante é saber: quando um dos unidos se tornar demente interdito ou
inabilitado por anomalia psíquica seu companheiro goza dos direitos adquiridos, ou a união
deixa de produzir efeitos?
O Doutor França Pitão12
entende que a demência de um dos unidos não impede que a
união produza efeitos jurídicos, se estiverem assegurados os requisitos legais previstos no art.
1º, n.º 2, da Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio. Isto é, a convivência em união de facto há mais de
dois anos.
Confirmando esse posicionamento, a Lei 23/2010, modificando a Lei 7/2001, vem
especificar que: “Art. 2º b – Demência notória, mesmo com intervalos lúcidos, e a interdição
ou inabilitação por anomalia psíquica, salvo se a demência se manifestar ou a anomalia se
verificar em momento posterior ao do início da união de facto.”.
3. Não dissolução de um possível casamento anterior, exceto em caso de uma
separação de bens e pessoas já decretada. O objectivo deste impedimento é o de
que o cônjuge separado de facto e que viva em união de facto regularize a
situação, através de um divórcio, ou por meio de separação judicial de pessoas e
patrimônios, com o intuito de evitar futuros conflitos de interesses como pensões.
4. O impedimento do parentesco de primeiro grau (ainda que por afinidade) ou,
em linha colateral, até segundo grau. As razões são notórias. Algumas de ordem
eugênica, outras de ordem moral ou social.
12
PITÃO. Op. cit.
18
No caso do grau de parentesco, o impedimento é para evitar o nascimento de crianças
com malformações e, também, porque a sociedade condena este gênero de relação. Na
afinidade, não há o motivo do risco de malformação de crianças, mas subsiste a questão
moral e social.
Neste item, o legislador não impediu os efeitos jurídicos da união de facto entre
adoptante e adoptados, mas as razões de ordem moral e sociais, acima referidas, existem
também nos casos de adopção.
5. O último dos impedimentos previstos é a condenação anterior de uma das
pessoas em união de facto, caso um dos envolvidos tenha sido anteriormente
condenado como autor ou cúmplice pelo homicídio doloso, ou mesmo pela
tentativa, do cônjuge do atual parceiro. A lei prevê o impedimento apenas se, no
momento em que as pessoas se unem de facto, existir uma condenação. A união
de facto iniciada após o trânsito em julgado da condenação é que cria o
impedimento.
O unido de facto deve ser condenado como autor ou cúmplice e terá de haver dolo
directo, necessário ou eventual (negligência não produz impedimento). Se a tentativa é
punível, não se exige a consumação do crime para que se figure o impedimento.
1.1.2 Mudanças na legislação
Ao longo das duas ultimas décadas, a união de facto está bem mais protegida, porém a
possibilidade de ser institucionalizada em um diploma legal, que regulamente seus requisitos
e efeitos, ainda é questão controversa.
Em Portugal, a união de facto foi, de certo modo, institucionalizada na Lei n.º
135/1999, de 28 de Agosto. Mais adiante, esta norma foi revogada pela Lei n.º 7/2001, de 11
de Maio, com atualizações (Leis 23/2010, de 30 de Agosto e Lei 2/2016, de 29 de fevereiro),
visando proteger, através de novas medidas, a união de facto. Embora na maioria dos países
não haja lei sobre esse tipo de relação, existem normas de proteção em algumas legislações
específicas, um grande equívoco que vem sendo mudado ao longo dos anos.
19
A lei traz à tona discussões que estavam necessitadas de uma nova análise e
enquadramento na situação real da sociedade atual, como em caso de morte do membro da
união de facto que seja o proprietário da casa de morada do casal. Sobre isso, a Lei n° 7/2001,
de 11 de Maio, concedeu ao membro sobrevivo direito real de habitação sobre a casa por
cinco anos e direito de uso do recheio. E, ao fim dos cinco anos, o companheiro sobrevivente
pode pleitear sua permanência no imóvel na condição de arrendatário.
A disposição dos n.º 3 e 4 do art. 4.º, não apenas confirmaram o decidido nos
Acórdãos ou ACS do Tribunal Constitucional n º 359/9113
e 1221/9614
como ainda ampliaram
tais decisões, permitindo que as soluções ali previstas possam valer, mesmo que não haja
filhos do casal. Por último, em matéria fiscal da Lei n º 7/2001, de facto, o regime do Imposto
sobre o Rendimento das Pessoas Singulares - IRS permite condições iguais aos dos sujeitos
que ainda estão casados e não possuem uma separação de pessoas e bens.
Conforme o art. 14.º do código do IRS publicado em anexo ao Decreto-lei n.º
1908/2001 de Julho, as pessoas que vivem em União de facto e preencham os requisitos da
respectiva lei podem optar pelo regime de tributação dos sujeitos passivos casados e não
separados de pessoas e bens que tiverem o mesmo domicílio fiscal durante o período
legalmente exigido.
Como visto, apesar de existirem algumas inovações, a mais significante é a permissão
da adopção conjunta de menores, independente de se tratar de casais heterossexuais ou
homossexuais, às pessoas que vivam em união de facto, nos termos da Lei n.° 2/2016, de 29
de Fevereiro, já referida.
Não podemos deixar de mencionar a conquista do casamento civil entre pessoas do
mesmo sexo, sobre o qual se tratará mais adiante, regulado pela Lei n.° 9/2010 de 31 de
Maio15
, um marco na luta contra a discriminação por orientação sexual, e que proibia aos
13
JURISPRUDÊNCIA: Declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do assento do Supremo
Tribunal de Justiça de 23 de Abril de 1987, publicado no Diário da República, 1.ª série, de 28 de Maio de
1987, e não tem por verificada a inconstitucionalidade por omissão suscitada pelo requerente. (Corpo
emitente: Tribunal Constitucional. Fonte: Diário da República n.º 237/1991, Série I-A de 1991-10-15.
Data: 1991-10-15). Disponível em: http://publicos.pt/documento/id288649/acordao-359/91 14
JURISPRUDÊNCIA: Acórdão nº 1221/96. Cônjuges e o interesse dos filhos do casal. (Processo nº 278/94. 1ª
Secção Rel. Cons. Tavares da Costa. Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional). Disponível em:
http://www.pgdlisboa.pt/jurel/cst_busca_palavras.php?buscajur=ac%F3rd%E3o&ficha=9823&pagina=392&ex
acta=&nid=4968. 15
Cf.: http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=1249&tabela=leis.
20
casais homossexuais o direito constitucional a que se refere o art. 36º da Constituição da
República Portuguesa - CRP16
.
1.1.3 Efeitos da união de facto
1.1.3.1 Efeitos pessoais
É notório que da união de facto nascem efeitos pessoais e que esta é ou será, por regra
e pela sua própria natureza, uma relação entre pessoas que querem construir um futuro e viver
um presente de afetos. Esta relação vai gerar efeitos pessoais, que devem ser protegidos
juridicamente, consagrando-se assim num conjunto de direitos, garantidos por lei. O direito,
portanto, não pode desconhecer a relação pessoal que liga os membros da união de facto um
ao outro.
A Lei n.° 37/198117
permite a aquisição da nacionalidade portuguesa a estrangeiro que
viva em união de facto com português há mais de três anos. Tal exigência não suscita
qualquer incongruência com o requisito de dois anos para o reconhecimento legal da união de
facto. Isto é, o prazo exigido pela Lei da Nacionalidade é o mesmo que se exige para o
casamento, equiparando-se os dois institutos18
.
Há ainda a possibilidade de quem vive em união de facto de ter a opção de marcar
férias em conjunto (art. 241°, n.° 7 do Código do Trabalho19
) e de se recusar a testemunhar
no caso de julgamento do(a) companheiro(a), segundo o art. 497° do Novo Código do
Processo Civil Português20
. Ou, quando a união de facto se constitui entre pessoas de sexo
16
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA. 2. ed. Coimbra: Almedina, 2014. 17
Cf.: http://www.dgpj.mj.pt/sections/citius/livro-vii-leis-da/pdf2827/l-37-
1981/downloadFile/file/L_37_1981.pdf?nocache=1182328045.88. 18
O art. 3.°, n.° 3 da Lei da Nacionalidade ou Lei n.° 37/1981, de 3 Outubro, na redação dada ao art. 1.° da Lei
Orgânica n.° 2/2006 17 de abril e art. 14 n.°, 2, 4 e 5, e do Regulamento da nacionalidade, pelo Decreto-Lei
n.°, 237/2006, de 14 de Dezembro, tratam dessa equiparação. 19
Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro – Código do Trabalho. Subsecção: X Férias. 20
Cf.: Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho – Novo Código de Processo Civil Português de 2013. Antigo artigo art.
618.° n.° 1.° al. d, sofreu alterações para o actual artigo 497.° NCPC
21
diferente, podem recorrer aos métodos de concepção assistida, ou à possibilidade de adotar
crianças (art. 6.°, n.° 1 da Lei n.° 17/2016- Procriação Medicamente Assistida21
).
1.1.3.2 Efeitos patrimoniais
Pitão22
comenta que “no código Civil de 1867, entendia-se que o regime de comunhão
geral de bens era o que melhor correspondia à essência do casamento, fazendo coincidir a
união de patrimônios com a união de pessoas”.
Os efeitos patrimoniais advindos da união de facto durante a vida da relação são
elencados no art. 3º da Lei n.° 7/2001, de 11 de Maio. Abaixo são explicadas e expostas as
questões, origens e os princípios que os rodeiam e os tornam necessários.
A) O "regime de bens do casamento" – Trata relações patrimoniais entre cônjuges
e entre estes e terceiros - previstas no código civil português na união de facto. Os
membros da União de facto, são vistos, em princípio, como estranhos um ao
outro, ficando suas relações patrimoniais sujeitas ao regime geral das relações
obrigacionais e reais. Segundo as regras do direito comum, cada um pode vender
bens móveis ou imóveis dar ou tomar de arrendamento, e também contrair
dívidas. Podem ainda os dois contratar um com outro; fazer contrato de compra e
venda de trabalho; locação; depósito; comodato e mútuo etc. O art. 1714° do
Código Civil –CC Português, que proíbe determinados contratos entre cônjuges,
não se aplica à união de facto.
A vida em economia comum, conhecida como "comunhão de mesa" é um dos aspectos
nos quais se baseia a união de facto, que pode durar muitos anos, durante os quais as pessoas
contraem dívidas, adquirem bens, movimentam contas bancárias, tudo com interferências nos
respectivos patrimônios. E, a partir disso, questiona-se se os membros da união de facto
poderão regular os aspectos patrimoniais da relação estabelecida em instrumento notorial,
inventariando os bens do casal, atribuindo presunções sobre a propriedade dos móveis e dos
valores depositados em contas bancárias, definindo a participação de cada um para as
despesas da casa, o pagamento das contas, por exemplo.
21
Cf.: Lei n.° 17/2016, de 20 de Junho- Procriação Medicamente Assistida- PMA (Versão Actualizada) da Lei
n.° 32/2006, de 26 de Julho). 22
PITÃO. Op. cit., p. 15.
22
Segundo as regras do direito comum, são válidas todas as cláusulas que podem ser
estipuladas por quaisquer pessoas nos seus contratos: um pacto de preferência, uma
convenção de indivisão pelo prazo fixado no art. 1412°, n.° 2, CC Português, um mandato,
uma prestação de garantia. O "contrato de coabitação" só pode regular os efeitos patrimoniais
da união de facto, não os efeitos pessoais. No entanto, a circunstância de vários atos jurídicos,
lícitos estarem reunidos em um só instrumento não invalida o "contrato de coabitação", mas é
impositivo que não exceda os limites da autonomia privada, violando disposições imperativas
da lei.
Desta forma, a cláusula em que os membros da união de facto se impõem obrigações
como a de fidelidade, prevista pelo art.1672° do CC, ou a que lhes proibem ruptura da união
de facto, sob pena de sanção, obviamente não seriam válidas. Dessa maneira não seria a
cláusula que, por morte de um dos companheiros da união de facto, atribuísse os seus bens ao
outro, como um pacto sucessório, proibida por lei (art. 2028°,n.°2 do CC).
Como visto, o "contrato de coabitação" não se confunde com a união de facto. O
"contrato de coabitação" é um contrato, ou melhor, uma união de contratos em que os
membros da união de facto reúnem, durante a vida da relação, e após a extinção desta, várias
espécies contratuais em vista da organização convencional nas suas relações patrimoniais.
B) As relações patrimoniais na união de facto se regem pelo direito comum das
relações obrigacionais e reais, podendo seus membros contratar com terceiros ou
entre si. Porém, o princípio geral comporta a excepção prevista na art. 953.° do
CC Português, que manda aplicar às doações, devidamente adaptado, o disposto
no art. 2196.° CC Português.
Uma das elucidações a fazer relaciona-se à falta de previsão da circunstância em que à
data da morte do doador o casamento já esteja dissolvido; a hipótese de ter sido decretada a
separação de pessoas e bens; ou até mesmo os cônjuges estarem separados de fato há mais de
seis anos.
Se válida, a doação produz imediatamente os seus efeitos como doação intervivos.
Porém, sendo nula, não pode ser validada por posterior ao divórcio ou à separação. Em face
ao disposto na al. a, do n.° 2 do art. 2196.° CC Português, notamos que o caso de dissolução
pode ser equiparado ao de anulação do casamento ou declaração de nulidade. Portanto, não
parece justa a exigência dos 6 (seis) anos de separação de facto, visto que a lei, atualmente, se
23
contenta com 3 (três) anos para poder ser pedido o divórcio litigioso (segundo a nova
redacção que lhe deu a Lei n.° 47/1998, de 10 de Agosto)23
.
Concluindo: É nula a doação à pessoa com quem o doador casado "cometeu
adultério".
Com a missão de proteger o cônjuge do doador, para que a doação seja nula, é
necessário ser o adultério anterior. Neste caso, a doação já feita e aceita pelo donatário antes
do adultério é plenamente válida. Entretanto, menos claro é saber quando o doador "cometeu
adultério". Tomada a disposição legal à letra, bastaria um acto isolado de adultério ou uma
relação acidental e esporádica para tornar nula a doação de um cônjuge adúltero ao seu
cúmplice, mas parece justificar-se uma interpretação restritiva do preceito, que só quer
abranger situações de união de facto ou concubinato duradouro.
Nota-se por último que o art. 953° do CC Português só fere de nulidade a doação
quando o doador for casado. Se for solteiro, viúvo ou divorciado, a doação feita é válida, não
podendo ser invalidada como "ofensiva dos bons costumes" nos termos do art. 280°, n.° 2 do
CC Português. Só não será assim, se a doação se destinar a pagar o estabelecimento de
relações sexuais, constituindo os bens ou valores doados, verdadeiramente, o prentium stupri.
Em certas circunstâncias, por exemplo, se a atribuição patrimonial for efetuada no termo de
uma longa vida em comum, em que o atribuído beneficiou largamente o atribuinte na sua vida
pessoal e profissional, a atribuição pode até configurar o cumprimento de uma obrigação
natural, quando, embora não inicialmente exigível, corresponda a um dever de Justiça (art.
402.° do CC). Tal qualificação terá relevância, não só para efeitos fiscais, mas também
porque, não se tratando de doação, a atribuição não poderá ser revogada por ingratidão do
donatário (art. 970° do CC) ou inoficiosidade (art. 2168° do CC) nem terá de ser restituída à
massa da herança para efeito de cálculo da legítima (art. 2162.° do CC).
A distinção já era feita pelo Doutor Manuel de Andrade24
, segundo quem, se a
liberdade foi destinada a criar ou a manter a relação concubinária e assim ficou entendido ou
acordado entre as partes, não se tratará verdadeiramente de uma doação, mas de um "contrato
bilateral inominado do tipo do ut facias", nulo por ilicitude da causa, dada a imoralidade do
23
Divórcio por mútuo consentimento e divórcio litigioso. Art. 17810
. Ruptura da vida em comum. São ainda
fundamento do divórcio litigioso: a) A separação de facto por três anos consecutivos. Cf.:
http://pglisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=804&tabele=leis. 24
ANDRADE, Manuel A. de Domingues. Teoria geral da relação jurídica. Volume II. Coimbra: Almedina,
1960.
24
compromisso tomado pela pseudo-donataria, que constitui a causa da obrigação da outra parte
ou da transferência de bens que ela pretendeu realizar.25
C) Os membros da união de facto vivem em comunhão de leito mesa e habitação
como se fossem casados, o que cria uma aparência de vida matrimonial capaz de
suscitar a confiança de terceiros que contratem com os membros de relação, ou
com um deles.
Parece razoável estender à união de facto o art. 1691°, al. b, do CC Português,
entendendo que os sujeitos da relação são solidariamente responsáveis (art. 1695°, n.° 1) pelas
dívidas contraídas por qualquer deles para ocorrer aos encargos normais de uma vida em
comum.
D) Outra questão é saber se a pessoa que vive em união de facto com outra pode
exigir alimentos ao ex-cônjuge de quem se divorciou, se tiver necessidade, e tendo
o ex-cônjuge possibilidade de prestar-lhes; se a pessoa que estava a receber uma
pensão de sobrevivência por morte do cônjuge, ou uma pensão de alimentos do
ex-cônjuge de quem se divorciara, perde direito à pensão se passar a viver em
união de facto; ou se a pessoa que recebia pensão de alimentos da herança do
falecido, nos termos do art. 2020.° CC Português perde o direito à pensão se
passar a viver em outra união de facto (nos termos do art. 2019.°).
A questão aqui consiste em saber se a união de facto, por si só, impede a constituição
de um direito a alimentos, ou extingue a pensão ou direito existente.
No que se refere à obrigação alimentar entre os cônjuges ou ex-cônjuges, o art. 2019°
do CC Português dispõe que o direito a alimentos cessa se o beneficiário deixar de ser digno
do benefício por alguma atitude imoral ou amoral. Segundo o art. 47°, n.° 1, al, e) do Estatuto
das pensões de sobrevivência (Decreto-Lei n.° 142/1973, de 31 de março), com relação à
pensão de sobrevivência do funcionalismo público, a condição de pensionista extingue-se
"pela indignidade do pensionista resultante do seu comportamento moral, declarada por
sentença judicial em ação intentada por qualquer dos herdeiros hábeis", e o art. 41.°, al. b)
do Decreto-Lei n.° 322/1990, de 18 Outubro, remete para o art. 10° do mesmo diploma, que
extingue o direito à pensão de sobrevivência pelo “reconhecimento judicial de que o
pensionista se encontra nas situações previstas no art. 2034.° do CC Português ou necessita
25
ANDRADE (1960). Op. cit., p. 347.
25
de capacidade sucessória em razão de deserdação nos termos do art. 2166.° CC Português,
considerando-se autor da sucessão o beneficiário falecido”.
Na “indignidade” ou na “indignidade resultante do comportamento moral”, caberão,
por exempo, a prática da prostituição ou a exploração de uma casa de passe. Porém, a união
de facto não cabe, absolutamente, em quaisquer das formulações referidas. Viver em união de
facto não é uma indignidade. É a manifestação do direito ao livre desenvolvimento da
personalidade, ainda que o direito estabeleça diferenças entre casamento e união de facto,
dada à diversidade das situações. Devemos lembrar, entretanto, que, deste modo, a união de
facto é favorecida em relação ao casamento, o qual faz cessar o direito do credor de alimentos
ou o do pensionista, nos termos das referidas exposições.
O Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, em 25 de Outubro de 2011 – processo
127/10.0 TBLSA.C126
- decidiu que a pessoa que vive em união de facto com outra, desde
que apresentados os requisitos legais para essa comprovação, pode reclamar pensão de
sobrevivência pela morte de seu atual companheiro, ainda que exista um ex-cônjuge anterior à
essa união de facto.
E) O art. 3°, al. d) da Lei n.° 7/2001, de 11 de Maio, torna aplicável aos membros
da união de facto o regime do imposto sobre o IRS (Rendimento das Pessoas
Singulares) em condições iguais às dos sujeitos casados e ainda não separados de
bens e pessoas.
F) De posse dos documentos requeridos para a prova da união de facto, que são:
documento feito pela Junta de Freguesia, onde se oficializa que uma das partes
mora com o titular beneficiário há mais de dois anos, apresentando documentação
declaratória dos envolvidos, parceiros da união de facto, que confirmam a união
há mais de dois anos.
Ou seja, o parceiro unido de facto com o beneficiário titular pode inscrever-se na
Assistência na Doença aos Servidores do Estado (ADSE) como beneficiário familiar, nos
26
JURISPRUDÊNCIA: JTRC. SÍLVIA PIRES. UNIÃO DE FACTO. PRESTAÇÃO SOCIAL. PENSÃO DE
SOBREVIVÊNCIA. REGIME APLICÁVEL. 25/10/2011. UNANIMIDADE. TRIBUNAL JUDICIAL DA
LOUSÃ. APELAÇÃO REVOGADA. DECRETO-LEI Nº 322/90, DE 18 DE OUTUBRO; DECRETO
REGULAMENTAR Nº 1/94, DE 18 DE JANEIRO; ALÍNEA E) DO ARTº 3, EX VI ARTº 6º, DA LEI Nº
7/2001, DE 11 DE MAIO; LEI N.º 23/2010, DE 30 DE AGOSTO. (Acórdão. Relação de Coimbra, 25-10-
2011, proc. n.° 127/10.0 TBLSA.C1). Disponível em:
http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/e3a31adee5b6d8f580257950003c03a8?Ope
nDocument.
26
termos do art. 7°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 118/1983, de 25 de fevereiro, na redação que lhe
deu o art. 1.° do Decreto-Lei n.° 234/2005, de 30 de Dezembro, e da portaria n.° 701/2006, de
13 de Julho. Note-se que o art. 8.°, n.° 3 , do Decreto-Lei n.° 118/1983 permite ainda, nos
termos previstos no n.° 2.° daquela Portaria, que o companheiro seja inscrito como
beneficiário familiar do beneficiário titular falecido.
1.2 OS EFEITOS JURIDICOS DAS UNIÕES HOMOAFETIVAS EM PORTUGAL
A Constituição da República Portuguesa em seu art. 13º, nº 2, veda a discriminação
por orientação sexual e, em seu art. 36º, consagra o direito fundamental de contrair
casamento. Com base nesse dispositivo, a questão já tinha o fundamento necessário para a
discussão e para os dispositivos do Código Civil Português serem considerados
inconstitucionais. Ocorre que essa sempre foi uma posição minoritária dos doutrinadores
portugueses.
Portugal vem avançando no âmbito do reconhecimento jurídico dos direitos da
homoafetividade nos últimos anos, porém ainda tem a sua legislação aquém do esperado e,
por diversas vezes, em contradição ao disposto na Constituição da República Portuguesa,
principalmente se comparado a países como Espanha, França e Bélgica.
A CR Portuguesa no art. 13°, n° 2 proíbe a discriminação por orientação sexual ao
vetar, de modo expresso, posturas discriminatórias e, dessa forma, sendo mais abrangente que
a legislação brasileira, que não tem tal referência explícita27
.
As relações e, consequentemente, a união de pessoas do mesmo sexo existe desde os
tempos mais remotos. As relações entre iguais começaram a se tornar alvo do preconceito
social a partir da sacralização do conceito de família pelas Religiões Ocidentais, o que
conferiu às relações sexuais uma finalidade exclusivamente procriativa. A completa falta de
visibilidade em que se encontram e/ou encontravam os vínculos afetivos - que têm como
único diferencial a homoafetividade - é a mais cruel consequência da exclusão no âmbito
jurídico.
27
CHAVES, Marianna; DIAS, Maria Berenice. [Em Linha] Porto Alegre, 2011. As Famílias Homoafetivas no
Brasil e em Portugal. [Consult. 27 Out. 2015]. Disponível em www.mariaberenice.com.br..
27
Para acompanhar os novos modelos de família, as lutas pelos direitos humanos e a
laicização dos Estados estão construindo novas sociedades no mudo atual, reconhecendo que
há uma necessidade urgente de reconhecer uniões entre pessoas como união de sentimentos,
que devem ser caracterizadas assim, mesmo entre as pessoas do mesmo sexo, por isso a
utilização da expressão homoafetividade. Assim, o estudo e o reconhecimento das uniões
homoafetivas e seus direitos decorrentes passaram a constar na pauta jurídica do mundo
ocidental.
Os efeitos da união estável são reduzidos, mormente no que tange o direito da
proteção da morada de família que, no caso do falecido ser dono do imóvel, dá o direito real
de habitação ao companheiro sobrevivente durante cinco anos. Passado esse prazo, é
concedida ao sobrevivente a faculdade de comprar o bem, a menos que exista disposição
testamentária em sentido contrário. Ressaltamos que esse direito não é reconhecido caso o
falecido tenha descendentes com menos de um ano, ou se o descendente tiver convivido por
mais de um ano com o genitor.
Homossexualidade nada mais é que afeto. Os sujeitos de Direito não podem ser a
origem ou a ferramenta de grandes injustiças. Enquanto a lei não acompanha a evolução do
conceito de moralidade da sociedade e a mudança de mentalidade, não temos o direito de
fechar os olhos e/ou assumir postura discriminatória, porque não queremos enxergar essa
nova realidade. É preciso que haja novas discussões e que os princípios e preconceitos sejam
sanados. Esta realidade demanda dos homens da lei uma proximidade maior à realidade
prática. Não nos cabe confundir questões jurídicas com as questões morais e religiosas.
1.2.1 Lei 135/1999, de 28 de Agosto
A lei em questão (posteriormente revogada pela Lei 7/2001, de 11 de Maio) não define
união de facto, limitando-se a delimitar o objecto que pretende regulamentar. Os efeitos
jurídicos da união de facto dependiam, assim, da verificação de dois requisitos:
heterossexualidade e um prazo mínimo de duração de dois anos. Pressupondo que essas
pessoas viviam em condições análogas às dos cônjuges. Este diploma limitou-se a
regulamentar os casos em que a legislação vigente era omissa ou de aplicação duvidosa.
28
1.2.2 União de facto (Lei 7/2001, de 11 de Maio)
A Lei 7/2001, de 11 de Maio, alterou substancialmente a lei anterior, embora o
legislador tenha continuado sem definir o que deve entender-se por união de facto. O art. 1.º
discorre que a união estável se trata da situação de duas pessoas que vivam juntas, em
comunhão de cama, mesa e habitação, independentemente da diversidade de sexo entre elas.
Mantém-se o requisito da exigência de durabilidade mínima de dois anos.
A primeira questão, a saber, é como se faz prova de que a relação existe de facto, e a
partir de quando podemos dizer estar a mesma constituída. A Lei 135/1999, de 28 de Agosto,
não definia as exigências formais para a comprovação ou para a cessação da união de facto.
Portanto, entendeu-se cabível a prova testemunhal e declaratória. No entanto, a Lei 23/2010
aditou o art. 2º-A à Lei 7/2001, que legisla sobre o tema e define que, salvo disposição legal
específica, se aceita como método comprobatório, qualquer meio legalmente admissível.
A Lei 7/2001 sofreu duas atualizações: A primeira em 30 de Agosto de 2010, com a
Lei 23/2010, e a segunda em 29 de fevereiro, com a Lei 2/2016.
1.2.3 Casamento na união homoafetiva (Lei 9/2010 de 31 de Maio)
A antiga redação do CC Português defendia no Art. 1577º “que o casamento é
contrato celebrado entre duas pessoas de sexo diferente que pretendem constituir família
mediante uma plena comunhão de vida”28
.
E, na intenção de extinguir qualquer possibilidade, o CC Português determinava: “Art.
1628º, al. “e”, que o casamento contraído por duas pessoas do mesmo sexo deveria ser tido
como inexistente”29
.
Esta questão que restringia o acesso ao casamento às pessoas de sexo distinto, já havia
sido trazida à tona algumas vezes na tentativa de alterar a legislação. Dois projetos de lei
foram derrubados na votação. Em 2010, foi aprovado pela Assembleia da República
Portuguesa, o Decreto que garantiu aos homossexuais o acesso ao instituto do casamento
civil, pela Lei nº 9/2010, de 31 de Maio.
28
CC Português. 29
Id.
29
A nova lei alterou os arts. 1577º do CC Português - Noção de casamento, 1591º -
Ineficácia da promessa de casamento, e 1690º- Legitimidade dos cônjuges para contrair
dívidas, e revogou a alínea “e” do art. 1628º que caracterizava o casamento entre pessoas do
mesmo sexo como inexistente. A partir de então, a única barreira a ser ultrapassada era o art.
3º do CC Português, que continuava proibindo a adoção por casais homossexuais.
Felizmente, essa discriminação foi eliminada na Lei n.° 2/2016, de 29 de Fevereiro,
que, com o seguinte texto do seu art. 1º, corrobora com mais uma suada vitória do amor entre
as pessoas como requisito de maior importância na formação de uma família: “A presente lei
elimina as discriminações no acesso à adoção, apadrinhamento civil e demais relações
jurídicas familiares (...)”.
A partir da liberação legal do casamento civil homoafetivo (Lei n.° 9/2010, de 31 de
Maio), é preciso acender as luzes em determinados tópicos e ressaltar que, a partir de então,
os contratos de casamentos entre pessoas do mesmo sexo terão que ter o mesmo olhar e
cuidado que os entre heterossexuais, inclusive com relação ao regime. Sobre isso, Miguel
Reis cita o art. 1594º 1 do CC Português, acerca da promessa de casamento, que diz:
“[...] se algum dos contraentes romper a promessa sem justo motivo ou, por culpa
sua, der lugar a que outro se retrate, deve indemnizar o esposado inocente, bem
como os pais deste ou terceiros que tenham agido em nome dos pais, quer das
despesas feitas, quer das obrigações contraídas na previsão do casamento.”30
É o caso de levarmos em consideração que alguém, apenas por brincadeira,
curiosidade ou com a intenção de submeter o outro a situação embaraçosa, promete, sem
nenhuma intenção de cumprir, casar com uma pessoa do mesmo sexo, e que, após atingir seu
objetivo, anuncia o rompimento.
Visto isso, não podemos também, deixar de discorrer sobre o regime de bens.
Como todo casamento, o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo também tem
um regime matrimonial de bens. O regime de bens é, na prática, um conjunto de normas -
algumas negociáveis e outras impostas pela lei - que regulam a as relações carácter
patrimonial que tem relação com a vida familiar. O Art. 1698º estipula: “os esposos podem
30
REIS, Miguel. Guia prático do casamento entre pessoas do mesmo sexo em Portugal. [Em linha]. São
Paulo, agosto de 2010. [Consult. 27 Fev. 2016]. Disponível na Internet em: <URL
http://www.mreis.pt/resources/GUIA%20PR%C3%81TICO_resumo.pdf>.
30
fixar livremente, em convenção antenupcial, o regime de bens do casamento, quer escolhendo
um dos regimes previstos neste código quer estipulando o que a esse respeito lhes aprouver,
dentro dos limites da lei”.
De forma concreta e geral, o CC Português nos apresenta três tipos de regime:
1) Comunhão de adquiridos
De acordo com o CC Português, temos as seguintes orientações: “Art. 1717º - na falta
de convenção antenupcial, ou no caso de caducidade, invalidade ou ineficácia da convenção,
o casamento considera-se celebrado sob o regime da comunhão de adquiridos”.31
Os nubentes podem, assim, estipular, em convenção antenupcial, o regime de
comunhão de adquiridos, de acordo com o CC Português, sendo essa uma possibilidade desde
1966, como regime supletivo. Essa determinação decorreu da instabilidade verificada nas
uniões a partir desta década, ofertando uma solução mais adequada em momentos de crise32
.
Não havendo essa convenção, prevalece, no entanto, o determinado pelo art. 1717º deste
diploma, nas condições acima referidas de invalidade, caducidade ou ineficácia da convenção
prévia.
Dito isso, os arts. 1721 e seguintes do CC Português, regulamentam o regime e
apresentam, por exemplo, o rol de bens que são considerados como bens próprios de cada
cônjuge.
“Art. 1722º, 1 - são considerados bens próprios dos cônjuges: a) Os bens que cada
um deles tiver ao tempo da celebração do casamento; b) Os bens que lhes advierem
depois do casamento por sucessão ou doação; c) Os bens adquiridos na constância
do matrimonio por virtude de direito próprio anterior.” 33
Considerando ainda como bens adquiridos durante o matrimônio em direito próprio
anterior, temos os seguintes exemplos:
“Art. 1722º, 2 - a) Os bens adquiridos em consequência de direitos anteriores ao
casamento sobre patrimónios ilíquidos partilhados depois dele; b) Os bens
adquiridos por usucapião fundada em posse que tenha o seu início antes do
casamento; c) Os bens comprados antes do casamento com reserva de propriedade;
d) Os bens adquiridos no exercício de direito de preferência fundado em situação já
existente à data do casamento.” 34
31
CC Português. Op. cit. 32
CAMPOS, Diogo Leite de. Lições de Direitos da Família e das Sucessões. Coimbra: Almedina, 2013. 33
CC Português. Op. cit. 34
Id.
31
Segundo o CC Português, integram a comunhão, sendo por isso bens comuns, como
prevê o Art. 1724º: “a) O produto do trabalho dos cônjuges; b) Os bens adquiridos pelos
cônjuges na constância do matrimónio, que não sejam excetuados por lei”35
.
Na tentativa de diminuir ao máximo a dificuldade em diferenciar os bens próprios dos
bens comuns, o 1725º do CC Português deixa claro quais os bens comuns caso haja alguma
dúvida sobre a comunicabilidade dos bens móveis.
2) Comunhão de bens
No CC Português é explicado o regime da comunhão geral, que no Art. 1732º, advoga:
“patrimônio comum é constituído por todos os bens presentes e futuros dos cônjuges, que não
sejam excetuados por lei”36
.
O art. 1733º do CC Português, 1 define que são bens incomunicáveis os seguintes:
“a) Os bens doados ou deixados, ainda que por conta da legítima, com a cláusula de
incomunicabilidade; b) Os bens doados ou deixados com a cláusula de reversão ou
fideicomissária, a não ser que a cláusula tenha caducado; c) O usufruto, o uso ou
habitação, e demais direitos estritamente pessoais; d) As indemnizações devidas por
factos verificados contra a pessoa de cada um dos cônjuges ou contra os seus bens
próprios; e) Os seguros vencidos em favor da pessoa de cada um dos cônjuges ou
para cobertura de riscos sofridos por bens próprios; f) Os vestidos, roupas e outros
objetos de uso pessoal e exclusivo de cada um dos cônjuges, bem como os seus
diplomas e a sua correspondência; g) As recordações de família de diminuto valor
econômico.”37
Em seu número 2, o art. 1733° do CC Português deixa claro que a incomunicabilidade
dos bens não atua sobre os frutos nem o valor das benfeitorias úteis.
3) Separação de bens
Regulamentando o regime de separação de bens, o CC Português diz no Art. 1735º
que: “se o regime de bens imposto por lei ou adotado pelos esposados for o da separação,
cada um deles conserva o domínio e fruição de todos os seus bens presentes e futuros,
podendo dispor deles livremente”.
Os esposados estipulam, na convenção antenupcial, cláusulas de presunção sobre a
propriedade dos móveis. A eficácia desta presunção é extensiva a terceiros, mas não pode
35
CC Português. Op. cit. 36
Id. 37
Id.
32
prejudicar o contraditório. Se houver dúvidas sobre a quem pertence o bem, os bens móveis
serão de ambos os cônjuges.
No regime imperativo da separação de bens, fugindo à regra geral de liberdade, temos
os casos das alíneas a) e b) do nº1 do art.1720º do CC Português, referentes às uniões
celebradas sem precedência do processo preliminar de casamento e por quem tenha
completado 60 anos de idade. Nestes casos, a lei impõe aos nubentes o regime de separação
bens.
1.2.4 Os direitos e deveres do casal homoafetivo
A Lei 7/200138
, que teve como dito anteriormente, versão atualizada em 2016, tem aqui
destacados os pontos referentes a direitos e deveres do casal em relação homoafetiva,
conforme elencados:
“A) Caso cesse a união de facto, com a morte de um dos companheiros, o outro tem
direito de proteção da casa de moradia da família.
B) Os mesmos direitos dos cônjuges no que tange aos benefícios do regime
e licenças, faltas, férias e colocação prioritária os funcionários da Administração
Pública.
C) IRS equivalente aos cônjuges.
D) Aplicação do regime geral da segurança social e da lei em caso de falecimento do
titular.
E) Garantia de prestação quando houver morte por acidente de trabalho ou por
doença ligada à profissão.
F) Pensões em caso de prestação serviços excepcionais ao país.
G) IRS conjunta (desde 2002), que poderá servir como prova de união caso não haja
registro.
H) Direito a ADSE (Direcção Geral de Protecção Social aos Funcionários e Agentes
da Administração Pública).
I) A partir de 2006, iniciou-se a possibilidade dos funcionários do estado registrarem
seus companheiros (as) com equivalência aos cônjuges.
J) Nacionalidade portuguesa – Quando a união estável com um português durar mais
de 3 anos vivendo em território nacional.” 39
Algumas situações, além das retro descritas, são aplicáveis aos unidos de facto:
“A) Possibilidade de acesso ao perfil de ADN da pessoa com quem se vive em união
de facto (Lei n.º 5/2008 de 12 de Fevereiro);
B) Transmissão de Arrendamento Rural na Região Autónoma dos Açores (Decreto
Legislativo Regional n.º 29/2008/A);
C) Protecção nos encargos familiares como Abonos de Família e Subsídio de
Funeral (Decreto-Lei n.º 176/2003 de 2 de Agosto);
38
Lei 7/2001, de 11 de Maio. Protecção das uniões de facto (versão actualizada). Cf.:
<http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=901&tabela=leis&so_miolo=> 39
Id.
33
D) Reconhecimento ao Direito ao Complemento Solidário para Idosos (Decreto
Regulamentar n.º 14/2007);
E) Usufruto das Casas de Função Atribuídas a Funcionários Públicos (Decreto-Lei
n.º 280/2007 de 7 de Agosto);
F)Concessão de visto para acompanhamento familiar (Decreto Regulamentar n.º
84/2007 de 5 de Novembro);
G) Aplicação do programa de apoio financeiro Porta 65 — Arrendamento por
Jovens (Decreto-Lei n.º 308/2007 de 3 de Setembro);
H)Aplicação do Programa de Financiamento para Acesso à Habitação
(PROHABITA) (Decreto-Lei n.o 54/2007 de 12 de Março).” 40
1.2.5 Adoção por casal homoafetivo (Lei 2/2016, de 29 de fevereiro)
A adoção é um instituto com um forte viés de ficção jurídica, que cria um vínculo
paterno/materno filial, que não corresponde à realidade biológica. É, portanto, a adoção uma
filiação fundamentalmente jurídica, sustentada no pressuposto de um liame não genético ou
biológico, mas afetivo41
.
Em Portugal, a adoção singular, individual ou monoparental, emergiu com a Reforma
de 1977 do CC Português e, com sua difusão, passou a ser a modalidade mais procurada por
pessoas solteiras, nutridas por um desejo, até então proibido, de exercer o seu direito à
parentalidade. Como também, pelas que, em vista da situação de facto vivida, desejavam
adotar o filho do cônjuge ou companheiro.
Houve a abertura para a adoção unilateral por um homossexual, pois foi facultado esse
tipo de adoção plena unilateral às pessoas com mais de 25 ou mais de 30 anos, nos casos em
que o adotando fosse filho do cônjuge do adotante. Porém, de acordo com o art. 1973º, nº 2 do
CC Português, devia existir um inquérito sobre a idoneidade do adotante para educar e criar o
adotando, assim como acerca da situação econômica e familiar antes de a sentença ser
proferida.
Para derrubar a pretensão de adoção por casais homossexuais, o art. 3º foi bem claro
ao dispor que, as alterações introduzidas pela Lei n° 9/2010, de 31 de Maio, não implicavam a
admissibilidade legal da adoção por pessoas que pertencessem ao mesmo sexo, em qualquer
das suas modalidades, ainda que unidas pelo vínculo matrimonial.
40
Lei 7/2001, de 11 de Maio. Op. cit. 41
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito de Famílias. 10. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2015, p.484.
34
É imperioso aqui afirmar que as vedações encontradas pelos companheiros ou
cônjuges homossexuais estavam maculadas por inconstitucionalidade na análise do casamento
civil, em virtude do disposto no n. 2 do art. 13º da Constituição da República Portuguesa42
.
Um dos fortes argumentos utilizados contra a adoção homoafetiva era a de que a
criança necessita, invariavelmente, de referências de pai e de mãe. Argumento facilmente
derrubável com a simples indicação de que, ao agarrar-se a essa lógica, indo de encontro à
norma legal43
, uma vez que, em assim sendo, estaríamos considerando as famílias
monoparentais como entidades familiares que também não poderiam ser abrangidas pela
norma legal.
Essa proibição ao pleito do casal homossexual fez com que um enorme número de
crianças perdesse o direito de sair da institucionalização, privando-as de experimentar o amor.
Fez, ainda, com que os casais deixassem de exercer o seu direito à parentalidade. Tudo em
nome de discriminações infundadas, atentatórias ao próprio conteúdo da Constituição da
República Portuguesa.
Felizmente, na contramão dessa privação de direitos infundada, a Assembleia da
República portuguesa aprovou, à época, por meio do Projeto de Lei nº 278/XII44
, a coadoção
por homossexuais. Dessa forma, o cônjuge, ou o membro de união de facto homoafetiva, está
autorizado a adotar a prole do seu par.
É importante relembrar que a adoção trata-se de uma situação de vida, de uma escolha,
uma opção, um ato de amor, mais do que uma questão meramente jurídica, prevalecendo a
necessidade de compreender o desejo puro de quem decide adotar uma criança e a
necessidade latente de quem espera ansiosamente a possibilidade de ser integrado a uma
família. Tais fatos e circunstâncias não dependem, em absoluto, da orientação sexual de todos
os envolvidos. Maria Berenice Dias postula:
“A homoafetividade vem adquirindo transparência e aos poucos obtendo aceitação
social. Cada vez mais gays e lésbicas estão assumindo sua orientação sexual e
buscando a realização do sonho de estruturar uma família com a presença de filhos.
Vã é a tentativa de negar ao par, o direito à convivência familiar ou deixar de
reconhecer a possibilidade de crianças viverem em lares homossexuais.”45
42
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA. Op. cit. 43
Lei n.º 7/2001, de 11 de maio. Op. cit. 44
Cf.: https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=37202. 45
DIAS, Maria Berenice. União Homoafetiva. [Em linha]. Revista dos tribunais, [Consult. 03 Mar. 2016].
Disponível em http://www.mariaberenice.com.br.
35
Após árduas batalhas e manifestações, a adopção por casais do mesmo sexo foi
aprovada na especialidade no Parlamento pela Comissão de assuntos constitucionais, direitos,
liberdades e garantias, em 18 de Dezembro de 2015, mas sofreu o veto do presidente Aníbal
Cavaco Silva em 25 de janeiro de 2016 .46
Em nova análise, o parlamento aprovou com 137
votos a favor e 73 contra, o Decreto vetado pelo presidente. Decisão que, finalmente, deu
origem à Lei 2/2016, de 29 de Fevereiro.
O novo texto para a Lei 7/2001, de 11 de Maio, e da Lei 9/2010, 31de Maio, incluiu o
fim da discriminação dos casais de homossexuais ou lésbicas na adopção e também uma
medida proveniente de um projecto de lei que pede a alteração do Código do Registo Civil
"tendo em conta a adopção, a procriação medicamente assistida e o apadrinhamento civil
por casais do mesmo sexo".
A alteração feita pelo art. 3º da Lei 2/2016, de 29 de fevereiro, no art. 3º da Lei
9/2010, de 31 de maio, estabelece: “O regime introduzido pela presente lei implica a
admissibilidade legal de adoção, em qualquer das suas modalidades, por pessoas casadas
com cônjuge do mesmo sexo”.
A ausência de pais dos dois sexos não influencia o desenvolvimento da identidade
sexual e psicológica da prole. O modelo de identidade de referências femininas e masculinas
não resta prejudicado, tendo em vista poder ser exercitado pela presença de outros adultos na
vida do infante, como avós, tios, professores, amigos dos pais/mães. Até porque se assim não
fosse não existiriam homossexuais em famílias heterossexuais. Ou seja, a pessoa ser
homossexual independe da orientação sexual de seus pais. Neste mesmo sentido se manifesta
Maria Berenice Dias referindo-se à União homoafetiva47
.
1.2.6 Reprodução assistida
“O aspecto biológico é necessário, mas não é suficiente para criar a relação humana
autêntica; e a paternidade não deve corresponder a uma operação puramente fecundativa.
46
SILVA, Aníbal Cavaco. Veta adoção por casais do mesmo sexo e alterações à lei do aborto. [Em linha].
[Consult. 20 Out. 2015]. Disponível em http://www.dn.pt/portugal/interior/cavaco-silva-devolveu-ao-
parlamento-diploma-da-adocao-por-casais-do-mesmo-sexo-4997912.html. 47
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito de Famílias. 10ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2015, pp. 168-169.
36
Não é a proveta sozinha que pode distribuir a paternidade em plenitude”, como argumenta
Stela Barbas. 48
Inicialmente, entretanto, o art. 6º da Lei n.° 32/2006, de 26 de Julho49
, definia
tacitamente quem poderia se beneficiar das técnicas de reprodução assistida: “pessoas
Maiores de idade, capazes, casadas, que não se encontrem separadas judicialmente de
pessoas e bens ou separadas de facto ou as que, sendo de sexo diferente, vivam em condições
análogas às dos cônjuges há, pelo menos, dois anos.”
E ainda apresentava as técnicas como “um método subsidiário e não alternativo de
procriação” e decidia que “a utilização de técnicas de PMA só pode verificar-se mediante
diagnóstico de infertilidade ou ainda, sendo caso disso, para tratamento de doença grave ou
do risco de transmissão de doenças de origem genética, infecciosa ou outras”50
.
Todas essas restrições não retratavam a necessidade real de grande parte da
população, principalmente depois que a Lei 9/2010, de 31 de Maio, liberou o casamento civil
homoafetivo.
Situações como as de casais homossexuais e de pessoas que queriam a parentalidade,
mas não buscavam um relacionamento afetivo-sexual, estavam totalmente fora do âmbito de
aplicação da norma reguladora das técnicas de PMA. Diante desses casos práticos, algumas
situações foram trazidas à discussão.
Casais de lésbicas, casais homossexuais e pessoas solteiras não faziam parte do
grupo restrito que tinham direito de acesso à PMA, apesar de formar uma grande parte da
população que queria e precisava dela, mas até então tinha que recorrer à autoinseminação, ou
à reprodução assistida em outros países.
A lei vedava a gravidez por substituição (art. 8º, n.° 1 da LPMA): "são nulos os
negócios jurídicos, gratuitos ou onerosos, de maternidade de substituição". Portanto, os
casais homoafetivos tinham maior dificuldade em alcançar seus objetivos, ainda que casados,
como exigia a lei, porém os casais de lésbicas, casadas no civil, poderiam ter uma
48
BARBAS, Stela Marcos de Almeida Neves. Direito ao Património Genético. Reimpressão da Edição de
1998. Coimbra: Almedina, 2006, p. 166. 49
Cf: Lei n.º 32/2006, de 26 de Julho. Procriação medicamente assistida. Disponivel em:
<http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=903&tabela=lei_velhas&nversao=1&so_miolo=
>. 50
Lei n.º 32/2006, de 26 de Julho. Op. cit.
37
interpretação diferente, visto se tratar de casal unido pelo matrimônio, porém infértil,
exatamente como descrevia a Lei n.° 32/2006.
As possíveis interpretações, obviamente, eram controversas e geravam decisões com
fundamentações muito divergentes.
Em 13 de Maio de 2016, a Assembleia da República aprovou, dez anos após a
criação da Lei n.° 32/2006, de 26 de Julho, as alterações na Lei de Procriação Medicamente
Assistida (PMA)51
, permitindo que as mulheres pudessem utilizar das técnicas de reprodução
assistida para engravidar, independentemente de estarem casadas, unidas de facto, solteiras ou
em um relacionamento homoafetivo.
Com relação à gestação de substituição, a mudança foi mais branda. A partir de
agora, para solucionar problemas relacionados à saúde, as mulheres que não têm útero ou que
não podem ter filhos, podem recorrer a uma “barriga de aluguel” como uma substituição, mas
não como uma liberdade de escolha. Desta forma a situação das lésbicas e das mulheres
solteiras encontrou uma proteção legal, mas ainda não é o caso dos casais homossexuais e
homens solteiros.
1.3 SUCESSÃO NA RELAÇÃO HOMOAFETIVA
Nos itens e subitens anteriores deste capítulo foram sendo delineadas as situações no
ordenamento jurídico português que afetam os casais homoafetivos. Desde a possibilidade de
se unirem de facto, passando pelo casamento, adopção e, também, pelos direitos sucessórios
que lhes são aplicáveis. Porém, em razão do objetivo deste trabalho, achou-se por bem
destacar mais alguns pontos jurídicos que dizem respeito à sucessão entre casais homoafetivos
no Direito Português, o que será feito agora.
Atualmente, o legislador divide a sucessão na união de facto em três situações:
“A. Casa de moradia
[...] Com o falecimento do companheiro a quem pertence a casa, e a união durar
mais de 5 anos, o outro tem preferência na compra ou continuação do arrendamento
durante cinco anos ou período superior;
51
Lei n.º 17/2016, de 20/06. Procriação medicamente assistida (versão actualizada). Cf: <
http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=903&tabela=leis&so_miolo=>.
38
[...] No caso de ruptura da união de facto, se a casa de morada de família é
arrendada, ambos podem requerer o imóvel, ainda que apenas um tenha arrendado;
Se a propriedade já for de uma dos companheiros, ela poderá ser atribuída ao outro,
desde que dentro dos moldes do art. 1793º do CC Português;
B. Alimentos
Entende-se por alimentos, segundo o CC Português, “art. 2003, nº1 tudo aquilo que
é indispensável ao sustento, habitação e vestuário”. O art. 2020º estabelece, de
forma residual, que apenas na falta ou na impossibilidade dos parentes “cônjuge, ex-
cônjuge, descententes, ascendentes ou irmãos” a pessoas que coabite, como casal,
com o falecido durante período superior a dois anos, tem o direito a requerer
alimentos da herança do falecido.
C. Capacidade testamentária
Os casos de indisponibilidades relativas a que se referem os arts. 2192º e seguintes
do CC Português, não discorrem sobre verdadeiras incapacidades e sim sobre a
proteção da vontade do testador e afastar qualquer suspeita sobre a espontaneidade
da declaração do mesmo.” 52
De acordo com o art.° 2196º n.º1 do CC Português “é nula a disposição a favor da
pessoa com que o testador casado cometeu adultério”. Porém, no n.º 2 do mesmo artigo há
algumas exceções para esta norma:
“.Se o casamento já estava dissolvido, ou os cônjuges estavam separados
judicialmente ou de facto há mais de três anos quando da abertura da sucessão –
Facto que obviamente asseguraria um estado civil de divorciado ou viúvo, visto que
o casamento pode se dissolver por morte de um dos cônjuges ou por divórcio,
portanto os testados já não seriam casados, como exige o nº1.
.Se a disposição se limitar a assegurar alimentos ao beneficiário.”
Já no casamento civil, são evidenciadas, segundo Inocêncio Galvão Telles53
, pelos
arts. 2132º, 2133º e 2157º do CC Português, a diferença entre a redacção de 1966, em que o
cônjuge ocupava a quarta posição nas classes sucessíveis, e a de 1977, onde o cônjuge é
herdeiro legítimo e legitimado, ocupando o posto cimeiro, à frente de todos os colaterais.
Atualmente, após a Lei 7/2001, de 11 de Maio (e sua atualização pela lei 23/2010), as
uniões de facto são protegidas juridicamente; a Lei 9/2010, de 31 de Maio, autoriza o
casamento civil homoafetivo; o PL 278/XII, instituiu a coadoção por casais do mesmo sexo;
52
União de Facto. Portugal: Atualizada em 28 de Julho de 2016. [Em linha]. [Consult. 27 Out. 2015]. Disponível
em: http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=901&tabela=leis. 53
TELLES, Inocêncio Galvão. Sucessão Legítima e Sucessão Legitimária. Coimbra: Coimbra, 2004.
39
e, por fim, a Lei 2/2016, de 29 de Fevereiro, que permite a adoção por casais homossexuais.
Esse arcabouço legal alterou significativamente a situação anterior.
Com isso procura-se equiparar os deveres e direitos dos casais homossexuais aos dos
casais heterossexuais, para refletir de forma mais justa a realidade da sociedade, não apenas a
portuguesa, mas, cada vez mais, da sociedade mundial. São dados aos casais, independente de
sexo, e aos filhos, naturais ou adotados, os mesmos e devidos direitos. Assume-se que assim
também deva acontecer na questão da sucessão sem, obviamente, ferir os requisitos legais
exigidos, independente de serem casais de mesmo sexo ou de sexos diferentes.
Encerrado o capítulo que trata do Direito Português com relação à sucessão de casais
homoafetivos, no próximo capítulo tratar-se-á dessa mesma relação do ponto de vista do
Direito Brasileiro.
40
SEGUNDO CAPÍTULO
Neste segundo capítulo, nos aproximamos da realidade do tema no cenário brasileiro.
Trata-se da mudança na legislação da união estável e do direito homoafetivo, a partir do
Código Civil Brasileiro de 2002 e do polêmico art. 1790. A intenção foi a de trazer à baila o
intuito do legislador, visando entender as controvérsias criadas a partir do referido artigo e,
também, lançar uma luz para verificar como essa realidade jurídica afeta as relações
homoafetivas e seus efeitos na sucessão do(a) companheiro(a) supérstite.
41
“A existência de outras entidades familiares e a faculdade de
reconhecer filhos havidos fora do casamento operaram verdadeira
transformação na própria família. Assim, na busca do conceito de
entidade familiar, é necessário ter uma visão pluralista, que albergue
os mais diversos arranjos vivenciais. Era preciso achar o elemento que
autorizasse reconhecer a origem do relacionamento das pessoas. (...)
Como a lei não acompanhou as mudanças por que passou a família,
acabou nas mãos da doutrina e da jurisprudência a responsabilidade de
construir toda uma nova base doutrinária que atendesse aos reclamos
de uma sociedade sempre em ebulição. (...) O afeto foi reconhecido
como o ponto de identificação das estruturas de família. (...) É o
sentimento de amor, o elo afetivo que funde almas e confunde
patrimônios, fazendo gerar responsabilidades e comprometimentos
mútuos.”
(Maria Berenice Dias54
).
54
DIAS (2015). Op. cit., p. 35.
42
CAPÍTULO 2 - OS EFEITOS JURÍDICOS DA UNIÃO HOMOAFETIVA NO
DIREITO BRASILEIRO, EM ESPECIAL OS SUCESSÓRIOS
2.1 UNIÃO ESTÁVEL
Viver isolado nunca foi da natureza humana e, por isso, a união das pessoas é anterior
ao casamento. A família surge naturalmente, em defesa da subsistência e são constituídas, a
princípio, pelo instinto sexual e pela conservação da prole. Com o tempo, surge a evolução
dos modelos de convívio e de interação das sociedades afetivas, até o advento do matrimônio
ao lado da união informal.
No Direito Romano, o matrimônio não era permitido entre patrícios e plebeus. As
uniões entre cidadãos e escravos não eram consideradas, pois seriam de classe inferior ao
casamento. Madaleno55
esclarece:
“De acordo com a Adahy e Lourenço Dias, o concubinato foi proibido no Oriente,
onde praticamente foi extinto, enquanto no Ocidente era permitido e tolerado pela
igreja, e diversos Papas, como Leão III e Alexandre VI, dentre bispos, padres e
leigos, eram acusados de manterem concubinas.”
No final do Século XV, surgem as medidas destinadas a preservar e fortalecer o poder
da Igreja. O Concílio de Trento, firmado em 1563, estabeleceu a obrigatoriedade da
celebração do matrimônio perante o pároco, em cerimônia pública, com testemunhas e criou
os registros paroquiais/casamentos controlados pelas autoridades eclesiásticas, proibindo o
casamento presumido.
Embora a jurisprudência tenha constituído ao longo dos anos, mecanismos de defesa
das relações de afeto, na França, o Código de Napoleão ignorou o concubinato, gerando forte
influência sobre as legislações dos países que o adotaram.
As dificuldades que vieram à tona durante a Primeira Guerra Mundial (1914- 1918)
envolvendo as relações entre soldados e suas companheiras foram um pontapé inicial para a
sanção de diversas leis no intuito de solucionar problemas cotidianos que essas relações
apresentavam ao serem desfeitas, ou no caso de morte de um dos conviventes.
55
MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015.
43
Até a Constituição Federal de 198856
, o concubinato e a união estável eram
considerados sinônimos. De acordo com a antiga qualificação dos filhos, a prole advinda do
casamento tinha presumida a paternidade em razão do matrimônio e eram chamados
legítimos. De forma diferente, estavam os filhos oriundos de uniões livres, não incidindo essa
mesma presunção de paternidade na união estável. O que caracterizou um retrocesso no
tratamento nem tão igualitário da filiação.
A legislação brasileira também se apresentou em oposição ao concubinato, com
diversos dispositivos que sempre tiveram em mira a concubina de homem casado, em defesa
da família matrimonial, única expressão que era considerada, no Brasil, como legítima e
exclusiva de exteriorização de entidade familiar.
Como exemplo disto, o Código Civil Brasileiro de 191657
proíbia doações do cônjuge
adúltero ao seu cúmplice e outorgava à mulher casada a legitimidade processual para
reivindicar os bens comuns, doados ou transferidos pelo marido à concubina, assim como
impedia a instituição da concubina como beneficiária do contrato de seguro de vida.
O ordenamento legal de 1916 não aceitava as relações extramatrimoniais e, por
conseguinte, resolveu puni-las, ao vedar doações e a instituição de seguro de vida em favor da
concubina, que também não podia ser beneficiada por testamento. Tudo isto sob o discurso de
proteger a família constituída pelos sagrados laços do matrimônio. Sobre tal, destaca-se que a
dignidade da pessoa humana, elevada a fundamento da República, no art. 1º, inciso III, da
atual Carta Magna, conferiu conteúdo à proteção atribuída pelo Estado para a família, que:
“[...] é a pessoa humana, o desenvolvimento de sua personalidade, o elemento
finalístico da proteção estatal, para cuja realização devem convergir todas as normas
do direito positivo, em particular aquelas que disciplinam o direito de família,
regulando as relações mais íntimas e intensas do indivíduo no social.”58
Com o tempo, foram editadas leis concedendo tímidos direitos às companheiras
viúvas. O Decreto-Lei n.° 2.681, de 07 de Dezembro de 191259
, regulava a responsabilidade
civil nas estradas de ferro e reconhecia direitos à concubina na indenização decorrente da
56
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil . 35. ed. – Brasília: Câmara dos Deputados,
Edições Câmara, 2012. 57
Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916. Código Civil (1916). Disponível na Internet em: <URL
http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1910-1919/lei-3071-1-janeiro-1916-397989-publicacaooriginal-1-
pl.html>. 58
TEPEDINO; BARBOZA; MORAES apud NEVARES, Ana Luiza Maia. Os direitos Sucessórios do Cônjuge
e do Companheiro. Revista Brasileira de Direito de Família, n. 36, Ano VIII, (Jun/Julho) 2006, p. 157. 59
Cf.: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2681_1912.htm.
44
morte do companheiro em acidente ferroviários, estabelecendo, em seu art. 22, que no caso de
morte, a estrada de ferro responderia por todas as despesas e indenizaria, ao arbítrio do juiz,
todos aqueles aos quais a morte do viajante privasse de alimento, auxílio ou educação60
.
O Decreto-Lei n.° 4.737, de 24 de Setembro de 194261
, dispõs sobre o reconhecimento
de filhos naturais, mas só após o desquite do ascendente casado; sendo mais tarde estendidas
as hipóteses de reconhecimento de filhos extraconjugais, embora em primeiro estágio o
reconhecimento fosse somente para fins alimentares, quando o investigado era casado.62
Gradativamente, a lei começou a se modificar para atender a uma sociedade que vivia
na prática, situação de relações maritais mesmo sem o instituto do casamento, pois, ainda
assim, a situação dessas pessoas, merecia uma proteção legal63
. Citam-se aqui:
1944 - Decreto-Lei n.° 7.036. Alterou a lei de Acidentes do Trabalho.
1945 – Decreto-Lei n.° 18.809. Aprovou o regulamento para incluir a companheira da
vítima acidente do trabalho como beneficiária da indenização de vida por sua morte.
1963 - Lei n.° 4.297. Sobre aposentadoria e pensões de Institutos ou Caixas de
Aposentadoria e Pensões para Ex-combatentes e seus dependentes, incluiu a
companheira, desde que a convivência em comum ocorresse por prazo não inferior a 5
(cinco) anos e até a data do óbito do segurado
1965 - Lei n.° 4.862. Alterou a legislação do imposto de renda, admitindo como
dependente do contribuinte, pessoa com quem vivesse por 5 anos, no mínimo.
1967 - Lei n.° 5.316. Integrou o seguro de acidente do trabalho na Previdência Social.
1973 - Lei n.° 5.890. Alterou a Lei n° 3.807 de 1960, que dispõe sobre a Lei Orgânica
da Previdência Social, admitindo que o segurado designasse a companheira que vive
sob sua responsabilidade econômica, ainda que não fosse uma companheira exclusiva,
sob a condição de que a vida em comum ultrapassasse cinco anos de convivência,
devidamente comprovados. Atualmente, o Regime Geral da Previdência Social está
regulado pelo art. 201 da Constituição Federal, disciplinado pela Lei n.° 8.121/1991 do
60
MADALENO. Op. cit. 61
Cf.: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/1937-1946/Del4737.htm. 62
MADALENO. Op. cit. 63
Id.
45
plano de custeio64
– e Lei n.° 8.213/1991 do plano de benefícios65
, sendo ambas as leis
regulamentadas pelo Decreto-Lei n.° 3.048/ 199966
. Ainda em 1973, a Lei n.° 6.015 ou
Lei dos Registros Públicos permitiu o uso do patrimônio do companheiro pela
concubina, contando já vivessem maritalmente pelo menos há 5 (cinco) anos ou antes,
caso o relacionamento houvesse gerado filhos e o casamento não fosse legalmente
impedido.
1974 - Lei n.° 6.195. Atribuiu ao Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural –
Funrural, a concessão de prestações por acidente de trabalho.
1975 – Decreto-lei n.° 76.022. Aprovou o regulamento de seguro de acidentes do
trabalho rural, que incluiu como beneficiária do seguro de acidente do trabalho rural, a
companheira mantida a mais de cinco anos.67
1977 - Lei n.° 6.515. Lei do divórcio. Permitiu o reconhecimento de filho fora do
casamento através de testamento cerrado e, desta forma irrevogável, alterando o art. 1°
da Lei n.° 883, dia 21 de Outubro de 1949.68
Até 1977, no Brasil não existia divórcio. O desquite, única modalidade de separação,
não dissolvia a sociedade conjugal e não permitia novo casamento. Mesmo com tantos
empecilhos, o surgimento de relações afetivas acontecia, ainda que sem amparo legal, como
necessidade inerente ao ser humano na busca por um companheiro, o que se sobrepunha ao
ordenamento jurídico existente.69
As uniões, surgidas fora do casamento, eram rotuladas como concubinato. Quando a
relação terminava, pela separação ou morte de um dos companheiros, as questões acerca dos
direitos dos envolvidos começaram a ser levantadas e, consequentemente, demandas
começaram a chegar ao judiciário. As primeiras decisões regravam apenas os efeitos
patrimoniais do relacionamento.70
64
Lei nº 8.212, de 24 de Julho de 1991. Dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui Plano de
Custeio, e dá outras providências. 65
Lei nº 8.213, de 24 de Julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras
providências. 66
Decreto nº 3.048, de 6 de Maio de 1999. Aprova o Regulamento da Previdência Social, e dá outras
providências. 67
MADALENO. Op. cit. 68
Id. 69
DIAS (2015). Op. cit. 70
Id.
46
Quando a mulher não tinha outra fonte de renda e não exercia atividade remunerada, o
Poder Judiciário Brasileiro passou a conceder alimentos com o nome de indenização por
serviços domésticos. O homem que se aproveitava do trabalho e da dedicação de uma mulher
não podia abandoná-la sem indenização, nem seus herdeiros podiam receber herança sem
desconto do que corresponderia ao ressarcimento, sob pena de ser considerado
enriquecimento ilícito. Talvez uma espécie de medida compensatória de serviços de cama e
mesa por ela prestados.71
Posteriormente, a justiça passou a reconhecer a existência de uma sociedade de fato,
onde os companheiros eram considerados sócios. O “lucro” era dividido no intuito de evitar
que o patrimônio construído durante a “sociedade” ficasse somente com uma das partes
envolvidas. Para que essa divisão ocorresse, havia necessidade da comprovação da real
contribuição financeira de cada um na constituição do patrimônio; evitando-se, com isso, o
enriquecimento injustificado de um dos companheiros, normalmente, da mulher. Porém, nada
mais era concedido - nem alimentos, nem direitos sucessórios.72
Com o passar do tempo e a aceitação maior da sociedade em relação às uniões
extramatrimoniais, alargou-se o conceito de família e a Constituição introduziu o termo
“entidade familiar”, o que fez com que relacionamentos extramatrimoniais passassem a
merecer um olhar mais cuidadoso do Estado. Assim, o concubinato deixou de ser
marginalizado pela lei. As uniões de fato entre um homem e uma mulher receberam o nome
de união estável e assim como os veículos monoparentais - formados por um dos pais com
seus filhos - foram reconhecidas como entidade familiar.73
A jurisprudência brasileira crescia e se fortificava em defesa das relações
extramatrimoniais que, depois de convertidas em união estável, ia tendo acolhidos seus
pedidos para não mais desamparar a companheira da união livre ou extramatrimonial.
Apesar desse avanço, há de se destacar que a organização judiciária pouco avançou no
trato dessas questões, vez que a união estável permaneceu no âmbito do direito das obrigações
e as demandas judiciais permaneceram nas varas cíveis. Nenhum avanço houve na concessão
71
DIAS (2015). Op. cit. 72
Id. 73
Id.
47
de direitos, além do que já vinha sendo deferido. A Súmula 38074
do Supremo Tribunal
Federal - STF (trata da partilha do patrimônio adquirido pelo esforço em comum na sociedade
de fato) continuou a ser invocada. Também em matéria sucessória não houve nenhuma
evolução. Persistiu a vedação de conceder herança ao companheiro sobrevivente e a negativa
de assegurar direito real de habitação ou usufruto de parte dos bens.75
Em 2013, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução n.° 17576
, que versa
sobre habitação, casamento civil e conversão de união estável em casamento entre pessoas do
mesmo homoafetivas, o que determinou um verdadeiro salto de avanço no trato dessas
questões.77
2.1.1 União estável na Constituição Federal Brasileira
A Constituição citou algumas entidades familiares ao garantir especial proteção à
família, ocorrendo a equiparação entre elas. Ainda que a união estável não se confunda com o
casamento, as entidades familiares são merecedoras da mesma proteção. A Constituição não
revela qualquer preferência ou escala de prioridade, apenas limita-se a elencá-las, dentre elas
as uniões constituídas pelo vínculo de afetividade, classificada como uma entidade familiar.
Silvana Maria Carbonera concluiu que “o afeto ingressou no mundo jurídico, lá demarcando o
seu território”.78
Segundo o Doutor Paulo Lôbo79, o terceiro parágrafo do art. 226 da CF não permite a
exclusão, desde que preenchidos os requisitos de estabilidade, ostensibilidade e afetividade,
da proteção do Estado aos homens e mulheres unidos de facto. As interpretações restritivas do
texto constitucional vindas dos conservadores desigualam a união estável do casamento,
apesar das críticas.
74
“Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a
partilha do patrimônio dquirido pelo esfôrço comum”. Fonte: DJ de 08/05/1964, p. 1237; DJ de 11/05/1964, p.
1253; DJ de 12/05/1964, p. 1277. 75
DIAS (2015). Op. cit. 76
Cf.: http://www.cnj.jus.br/images/imprensa/resolu%C3%A7%C3%A3o_n_175.pdf. 77
MADALENO. Op. cit. 78
CARBONERA, Silvana Maria apud DIAS (2015). Op. cit., p. 240. 79
LÔBO, Paulo apud DIAS (2015). Op. cit.
48
Na contramão do conservadorismo, o matrimônio deixou de ser o único modo legítimo
de constituir família e a união estável e a família monoparental adquiriram o status de
entidade familiar.
Os paradigmas socioculturais brasileiros são alterados ao identificar o concubinato
como uma entidade familiar denominada como união estável, assemelhada ao casamento, e
retirá-lo do status de uma relação aventureira. Ao deixar de acolher com exclusividade apenas
a família instituída pelo casamento, amplia-se a proteção estatal para união estável
independente de orientação sexual da mesma, quer seja hétero ou homossexual.
De acordo com o Doutor Eduardo de Oliveira Leite: “nada autoriza equiparar a
união estável ao casamento, pois quando a Constituição refere em convertê-la em
matrimônio, é porque trata de institutos diferentes, pois, se fossem iguais, seria desnecessária
e inconcebível sua conversão” 80
.
A Constituição Federal definia a união estável como uma relação entre um homem e
uma mulher, o que restringiu bastante os direitos das uniões homoafetivas, que também eram,
na prática, entidades familiares e a quem foi negado, durante muito tempo, a proteção do
Estado, até que o Supremo Tribunal Federal proclamasse a existência dos mesmos direitos e
deveres às uniões heteroafetivas e homoafetivas.
Diversos tribunais brasileiros não admitiam a competência das varas de família para as
divergências surgidas das uniões estáveis, os processos deveriam ser distribuídos às Varas
Cíveis sendo reservados aos juízes familistas as soluções dos conflitos oriundos do
casamento. Até que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul fez editar a Súmula n.° 14,
para atribuir às Varas de Família, onde houvesse, a competência para as ações decorrentes da
união estável.
Surgiram, então, vários posicionamentos no sentido de proibir tratamento
discriminatório da união estável entre casais heterossexuais ou entre pessoas do mesmo sexo,
por se tratar de uma legítima entidade familiar, cujos direitos e obrigações devem ser
encontradas no Direito de Família.
80
LEITE, Eduardo de Oliveira apud MADALENO. Op. cit, p. 1151.
49
O Doutor Sérgio Gischkow Pereira81
foi um dos primeiros doutrinadores a defender a
união estável como entidade familiar e uma forma legítima de constituir família, Era então,
função do Estado-Juiz proteger a estável convivência, independente da lacuna legal que
durava quase seis anos, mesmo após a promulgação da Constituição Federal de 1988.
A Lei n.° 8.971/199482
, primeira destinada a regulamentar a união estável, assegurou o
direito a alimentos e a sucessão, mas só reconheceu como estáveis as relações existentes há
mais de 5 anos ou das quais houvesse nascido prole; assegurou ao companheiro vivo o
usufruto de alguns bens deixados pelo de cujus e em caso de não haver filhos ou ascendentes,
o companheiro é incluído na ordem de vocação hereditária como herdeiro legítimo, assim
como cônjuge sobrevivente.
Os tribunais brasileiros foram entendendo a união estável como entidade familiar.
Segundo Dias:
“Mesmo com o advento da norma constitucional, que reconheceu a união estável
como entidade familiar (CF 226§3º), a jurisprudência resistiu em conceder direito
sucessório aos companheiros. (...) Foi somente com o advento da legislação que
regulou a norma constitucional que a união estável foi admitida como família, com
direitos sucessórios iguais ao casamento (Lei n.° 8971/1994 e 9278/1996).” 83
A Lei n.° 8.971/1994 foi inspirada no Projeto de Lei n.° 37, de 1992, atendendo aos
que clamavam pela necessidade de edição de lei infraconstitucional para regulamentar a união
estável, e reconhecê-la como uma entidade familiar sujeita de direitos similares ao instituto do
matrimônio. Entretanto, sua ambigüidade e incompletude geraram mais controvérsias
doutrinárias e jurisprudenciais, ao excluir as uniões de pessoas separadas de fato da sua
atuação e ao firmar um tempo mínimo de 5 anos de convivência para a efetiva configuração
da união estável. Até porque a estabilidade do relacionamento não é contada pelos dias e
noites de coabitação e sim pela qualidade e pela intensidade da relação.
A Lei n.° 8.971/1994 permitiu que os tribunais divergissem acerca dos efeitos
materiais da união informal em caso de dissolução judicial. Para a consequência lógica da
isonomia entre a união estável e o casamento, uma corrente de juristas apoiava a aplicação
imediata de um regime legal de comunhão de bens à união estável por equiparação ao regime
de bens do casamento. Nessa direção, todos os bens adquiridos durante a constância da união
81
PEREIRA, Sérgio Gischkow apud MADALENO. Op. cit. 82
Lei 8.971/1994 (lei ordinária) 29/12/1994. 83
DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. 3. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 65.
50
estável deveriam ser partilhados em partes iguais pelos companheiros - a menos que houvesse
convenção distinta por contrato escrito - partindo do pressuposto de que a mulher, mesmo não
colaborando financeiramente para a formação do patrimônio do casal, contribuiu com seu
trabalho doméstico, administração do lar, educação e formação dos filhos e na estabilidade e
tranquilidade necessária para aquisição dos bens.84
A Lei n.° 9.278/1996, de 10 de Maio, veio com o objetivo de regulamentar o § 3° do
art. 226 da Constituição Federal85
. Não corrigiu todas as falhas da lei anterior, mas
reconheceu a existência da união estável, mesmo quando há anterior separação de fato de
convivente casado, pois há, desta forma, o desaparecimento do impedimento do casamento
pela separação de fato. A lei não qualificou prazo de convivência e admitiu as relações entre
pessoas separadas de fato. Além de fixar a competência das varas de família para o
julgamento dos litígios, reconheceu o direito real de habitação e a comunhão dos aquestos
para o casamento informal.86
O Projeto de Lei n.° 2.686/199687
, de iniciativa do Ministério da Justiça, pretendia
uniformizar um prazo mínimo de cinco anos de convivência como requisito da união estável,
existindo filhos ficava reduzido para 2 (dois) anos de convivência. Outro requisito era o da
coabitação sobre o mesmo teto, mas, apropriadamente, o Projeto de Lei n.° 2.686/1996 foi
vencido pela edição e a vigência do atual Código Civil (CC) Brasileiro.88
89
O CC Brasileiro (art.1.723) limitou-se a reproduzir a legislação que existia,
reconhecendo como estável a convivência de um homem e de uma mulher - com o objetivo de
constituição de família - duradoura, pública e continua. O legislador dá ideia de família para
os efeitos jurídicos à união estável, mas o tratamento não é igual ao do casamento. Há direitos
deferidos somente aos cônjuges, como o direito dos conviventes à adoção, condicionado à
aprovação da estabilidade da família (ECA art. 42 § 2.° e 197-A III), exigência que não é feita
aos casados.
Segundo o Doutor Zeno Veloso:
84
MADALENO. Op. cit. 85
Cf.: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9278.htm. 86
MADALENO. Op. cit. 87
Cf: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm. 88
Cf.: Código Civil - Lei 10406/2002, de 10 de janeiro. 89
MADALENO. Op. cit.
51
“Com o advento da Constituição de 1988, entrou em vigor o art. 226, § 3º (...) o
Estado reconhece a união estável heterossexual como família, devendo a lei facilitar
sua conversão em casamento (...). Em nível infraconstitucional, regulando e
explicitando o estatuído na Carta Magna, vigoraram no país duas leis: Lei nº 8971,
de 29 de Dezembro de 1994, e Lei nº 9278, de 10 de Maio de 1996. A primeira
tratou da sucessão entre companheiros; a segunda, em complemento, previu o direito
real de habitação.” 90
Aquém do nível constitucional, existiam duas leis que regulavam o que foi definido na
Carta Magna: Lei nº 8971/1994, de 29 de Dezembro, que tratou da sucessão entre
companheiros; e Lei nº 9278/1996, de 10 de Maio, que previa o direito real de habitação.
O casamento e união estável são merecedores da mesma especial tutela do Estado,
pois não existe hierarquia entre eles, ambos são fonte geradora de família de mesmo valor
jurídico.
2.2 OS EFEITOS JURÍDICOS DAS UNIÕES HOMOAFETIVAS NO BRASIL
A sexualidade é parte do âmbito privado da pessoa humana e seu desenvolvimento
sexual é parte do livre desenvolvimento da personalidade, que é uma manifestação de
liberdade garantida pela Constituição.
Historicamente a homossexualidade ocorre na humanidade desde as remotas épocas.
Na Grécia antiga, por exemplo, as relações sexuais entre homens, normalmente entre mais
velhos e mais jovens, eram aceitas como parte de um estágio em que o homem mais velho era
visto como fonte de ensinamento, vivência e modelo de bravura, e o homem jovem como seu
discípulo. Essa cultura grega foi ressaltada também na mitologia, mas com a ascensão do
cristianismo e a queda do império romano, as relações homossexuais foram condenadas.
Desde então, a comunidade homossexual vem sofrendo perseguições e sendo discriminada
por sua orientação sexual.91
Após essa fase inicial, a igreja iniciou um movimento, entre seus membros que
integravam o clã da medicina, que afirmava ser a homossexualidade – então conhecida como
homossexualismo - uma doença mental, uma perversão. Apenas em 1992, a OMS retirou esse
rótulo da homossexualidade e passou a não mais constar no CID.92
90
VELOSO, Zeno apud DIAS (2015). Op. cit., p. 236. 91
MADALENO. Op. cit. 92
Id.
52
Até hoje, a resistência às relações entre pessoas do mesmo sexo é baseada na
contrariedade à natureza, que segundo conservadores e religiosos, só admite relações entre
homens e mulheres.93
Legalmente, antes do posicionamento do STF, para haver uma união estável era
necessário haver a heterossexualidade; porém essa realidade mudou com o reconhecimento da
união estável homoafetiva como uma entidade familiar. Essa perseguição começou a diminuir
no campo jurídico, principalmente diante do efeito erga omnes da decisão do Supremo
Tribunal Federal. Para Guilherme Gama:
“A Constituição Federal de 1988 expressamente introduziu, ao reconhecer a ‘união
estável' como entidade familiar, o requisito objetivo de que somente a união entre
homem e a mulher pode configurar uma união fundada no companheirismo,
excluindo, portanto, a possibilidade de se reconhecer as uniões entre homossexuais,
mesmo que desimpedidos, convivendo com o lapso de tempo razoável, com o
objetivo de Constituição de família.” 94
Resumidamente, no Brasil teve o CC Brasileiro de 1916, no qual o casamento era
indissolúvel e não reconhecia nenhum direito aos que mantinham uma relação fora do
matrimônio. O PL 1.151/199595
admitia a União Civil entre pessoas do mesmo sexo, após ter
ficado muitos anos parado no Congresso Nacional, de modo que os direitos pretendidos se
tornaram obsoletos, e não correspondiam mais à realidade da necessidade da comunidade
homoafetiva, resultando em arquivamento96
. A isso, seguiram-se:
Lei Maria de Penha - Define a família como “uma relação íntima de afeto,
independente de orientação sexual”97
.
Estatuto da Juventude - Dá aos jovens garantia ao direito “à diversidade e à
igualdade e a não discriminação por motivos de orientação sexual”98
.
2002 – Código Civil Brasileiro: Regulamenta a união estável (art. 1723 e
seguintes) e a sucessão do companheiro (art.1790).
2004 - CGJ/RS – Regulamenta o registro civil de uniões entre pessoas do mesmo
sexo.
93
DIAS, Maria Berenice. Homoafetividade e os direitos LGBTI. 6.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014,
p. 168. 94
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito Civil: Família. São Paulo: Atlas, 2008, p. 155. 95
Cf.: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=16329. 96
DIAS (2014). Op. cit. 97
Id 98
Id.
53
2011 - ADPF 132/RJ e ADI 4277/DF - Decisão do STF: Por unanimidade, as
relações homoafetivas passaram a ser reconhecidas como entidade familiar e os
companheiros passaram a ter os mesmos direitos e deveres das uniões estáveis
heterossexuais. Efeito erga omnes.
Segundo o ex-Ministro do STF Ayres Brito, “A preferência sexual de cada indivíduo
não pode ser utilizada como argumento para se aplicar leis e direitos referentes aos
cidadãos”99
, quando falou sobre o art. 1.723 do CC Brasileiro.
A partir das decisões anteriores, outras grandes decisões ajudaram a compor o quadro
de enormes melhorias nos direitos das relações homoafetivas no Brasil. No RS, através da
Quarta Turma do STJ, ao habilitar o casamento civil de duas mulheres; em São Paulo, na
comarca de Jacareí, em Junho de 2011, ao converter a união estável de dois homens em
casamento; em Brasília/DF, 4ª Vara de Família, também em Junho de 2011, ao converter a
união estável de mulheres em casamento.
Em 2012, o TJ/SP reafirmou o direito ao casamento homoafetivo dando autorização ao
prosseguimento da conversão da união estável em casamento de pessoas do mesmo sexo.100
Já o ano de 2013, foi profícuo em decisões, às quais são aqui realçadas:
Resolução 175 CNJ: Proíbe qualquer autoridade competente de se recusar a habilitar
ou celebrar o casamento civil ou a conversão da união estável em casamento entre
casais de pessoas do mesmo sexo.
Projeto de Decreto Legislativo n.º 106/2013: Tem a finalidade de sustar a resolução
do CNJ n.º 175/2013. A autoria é do Senador Magno Malta. Há uma discussão sobre
competência onde o relator acredita que o CNJ “extrapolou os limites do Poder de
regulamentar e esclarecer a lei” e o Congresso Nacional, de acordo com o art. 49°
inciso V CF, é o responsável por sustar os atos que violem a separação dos Poderes,
por outro lado, o CNJ tem competência prevista para propor a ação direta de
inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade no art. 103 – B
Constituição Nacional.
99
AYRES BRITO apud MADALENO. Op. cit., p. 1166. 100
MADALENO. Op. cit.
54
PL do Senado n.º 470/2013: Dispõe sobre o Estatuto da Família que contempla a
família homoafetiva. Em tramitação. O PL teve voto favorável do Senador João
Capiberibe e pedido de vistas em 01/07/2015 pelo Senador Magno Malta, o mesmo
que está tentando, através do Projeto de Decreto Legislativo nº 106/2013, derrubar a
resolução do CNJ n.º 175/2013 e que requereu audiências públicas convidando, além
de vários representantes das igrejas evangélicas, o Pastor Silas Malafaia e como
psicóloga, a Doutora Elisete Malafaia, membros da bancada evangélica, que estão
lutando ferrenhamente para que todo e qualquer direito homoafetivo seja vetado.101
PL da Câmara n.º 6583/2013: Dispõe sobre o Estatuto da Família que exclui a
família homoafetiva. Em tramitação. Relator: Deputado Anderson Ferreira. Após, se
aprovado na Câmara dos Deputados, deverá ser votado no Senado Federal.
Na convivência, as relações homossexuais não têm nada de diferente das relações
heterossexuais, portanto não faz sentido serem tratadas de formas distintas. As relações
afetivas de nenhum tipo merecem estar fora da proteção constitucional a que têm direito e
pela CF 102
tem-se:
“Art.3º, inciso IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, cor,
idade e quaisquer outras formas de discriminação.”
“Art.5º, inciso XLI - sendo punida qualquer manifestação de discriminação
atentatória dos direitos e liberdades fundamentais.”
Mesmo após a Constituição dar proteção às uniões estáveis, a dificuldade em aceitá-
las como entidade familiar permaneceu por anos.
Segundo o Doutor José Antonio Souto Paz:
“[...] existe uma mentalidade que tende a considerar o matrimônio como uma
comunidade de vida entre um homem e uma mulher, que merece proteção jurídica,
social e econômica mesmo quando desvinculado da existência de prole, portanto,
por analogia, semelhante proteção deve ser atribuída às uniões homossexuais, pois
se uma comunidade de vida heterossexual sem filhos merece a proteção jurídica, o
que efetivamente justifica que uma comunidade de convivência homossexual não
mereça Idêntica proteção?” 103
101
MADALENO. Op. cit. 102
Constituição da República Federativa do Brasil. Op. cit. 103
PAZ, José Antonio Souto apud MADALENO. Op. cit., p. 1168.
55
Com a atualização também do novo Código de Processo Civil, de 16 de Março
2015104, a situação do companheiro está felizmente tipificada, considerando que o casal
homoafetivo já foi equiparado em direitos e deveres aos casais heterossexuais em união
estável. Este é um avanço lento, mas contínuo em direção à representatividade da sociedade
moderna e que está em constante modificação.
2.2.1 Adoção
Como atenta Berenice Dias:
“[...] adoção vem a ser o ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos
legais, alguém estabelece, independentemente de qualquer relação de parentesco
consangüíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para sua família, na
condição de filho, pessoa que, geralmente, lhe é estranha.”105
Nosso ordenamento jurídico não nos contempla com leis sobre adoção por casais do
mesmo sexo. Mas apesar dessa lacuna, o direito à adoção por casais homoafetivos vem sendo
assegurado pela justiça. Em que pese o assunto ainda ser polêmico e de existirem muitas
opiniões divididas, juridicamente não existe obstáculo para que ocorra a adoção, visto ser
permitida a adoção monoparental.
Há muito, casais homoafetivos se candidatavam individualmente para adoção, e não
existia nenhum questionamento sobre o tipo de relacionamento que mantinham, pois esse
nunca foi um empecilho real para o instituto da adoção. Porém, desta forma, também não
existia uma análise social com o companheiro, para assegurar que são as melhores pessoas
para criarem aquela criança. Com isso, a habilitação se tornava deficiente e incompleta, não
atendendo aos interesses do adotando.
Dentro dessa logística, onde no papel o menor tinha apenas um pai ou uma mãe, mas
no cotidiano, tinha dois e sua situação documental não condizia com sua realidade, o principal
prejudicado era a criança, que era obrigada a ter uma ligação jurídica com apenas um, e ficava
sem nenhum amparo com relação ao outro, apesar de também manter um convívio de pai ou
mãe, mas que acabava por não ter os deveres que demanda uma entidade familiar.
104
Lei n.° 13105/2015, de 16 de Março – Novo Código do Processo Civil. 105
DIAS (2015). Op. cit, p. 484.
56
Pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA: “Art. 43 - A adoção será deferida
quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos.”106
.
Essas são as exigências para que ocorra a adoção. São realmente as mais importantes e que
nada têm a ver com a orientação sexual dos possíveis pais ou mães.
Assim, após o STF reconhecer a união estável homoafetiva, foi concedida a adoção
aos casais homoafetivos. Admitindo, desde então, inúmeras decisões de dupla parentalidade
homoafetiva.107
2.2.2 Reprodução assistida
Em 15 de março de 2016, o Conselho Nacional de Justiça, através do Provimento n.º
52/2016108
, regulamentou o registro de certidão de nascimento de filhos advindos de
reprodução assistida. Entende-se por reprodução assistida a fertilização in vitro e a gestação
por substituição.
Sendo os pais casados ou vivendo em união estável, o registro pode ser feito apenas
por um deles, independente de ser um casal heterossexual ou homossexual. Neste último caso,
a certidão deverá ser adequada à realidade do casal e da criança, não havendo distinção de
ascendência materna ou paterna. Neste novo cenário, conhecer a ascendência biológica não
significa que haverá vínculo de parentesco entre ambos.
Caso a criança seja fruto de uma gestação por substituição, não será mais o nome da
gestante que constará na Declaração de Nascido Vivo - DNV. O provimento, inclusive, proíbe
as autoridades responsáveis de se negar a formalizar o registro das crianças, sob pena de
responder processo disciplinar.
2.2.3 Relações homoafetivas e o Direito Previdenciário
106
MENEZES, Alex Pereira. Adoção e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). [Em linha].
Teresina, ano 19, n. 3976, 21 Maio 2014: Revista Jus Navigandi. [Consult. 03 Mar. 2016]. Disponível
em: <https://jus.com.br/artigos/28262>. 107
DIAS (2015). Op. cit., p. 502. 108
Cf.: https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=317508.
57
A sociedade homoafetiva e suas relações são decorrentes da vida em sociedade. São o
resultado de um fato social e gera um núcleo familiar já reconhecido socialmente e
juridicamente, portanto, seus direitos e sua proteção em caráter previdenciário precisa estar de
acordo com a sua atual e justa condição de entidade familiar.
No que tange à previdência pública, podemos trazer à baila a premissa constitucional
do princípio da dignidade da pessoa humana e o princípio da não discriminação. Nos direitos
sociais podemos nos fazer valer do direito à melhoria da condição social humana por meio da
aposentadoria e a proteção do Estado à família.
No contexto histórico, a legislação previdenciária foi modificada ao longo do tempo
na intenção de acompanhar a evolução dos fatos sociais em constante modificação, mas não
obteve êxito e, por isso, atualmente cabe aos nossos tribunais aplicar as normas sobre a
contextualização dos direitos fundamentais da sociedade homoafetiva.
1937 - O Decreto-Lei 1918 regulamentou o Instituto de aposentadoria e
pensões dos industriários, o qual informava que, na falta dos beneficiários,
qualquer pessoa especialmente designada poderia receber o benefício, abrindo
importante oportunidade para concessão de benefícios previdenciários.
1960 - Cria-se a possibilidade de o associado identificar qualquer pessoa como
beneficiário, a partir de uma relação de dependência Econômica, pois o Art 11,
§1.°, pontua: “o segurado poderá designar, para fins de percepção de prestações,
uma pessoa que vive sob sua dependência Econômica, Inclusive a filha ou irmã
Maior, solteira, viúva ou desquitada”. Porém, ressalta-se que o extinto Tribunal
Federal de recursos já previa possibilidade de instituir pensão por morte, mesmo
sem declaração de dependência.
1966 - Decreto-Lei n.° 66 - Não sendo o segurado civilmente casado,
considera-se tacitamente designada a pessoa com quem se tenha casado segundo o
rito religioso.
1973 - Lei n.° 5.890 - O legislador reconhece a companheira, que se
materializou, futuramente, nas relações estáveis, ao colocar: “Art. 11.
Considerando-se dependentes do segurado, para efeitos desta lei: I – a esposa, o
marido inválido, a companheira, mantida a mais de 5 anos, os filhos de qualquer
58
condição, menores de (...)”; “Art. 23. § 5.° A companheira designada concorrerá
com os filhos menores havido em comum com o segurado, salvo se houver
expressa manifestação em contrário.”
1991 - A Lei n.° 8.213 - Sobre o plano de benefício da Previdência Social, tem
previsão de benefício pago a dependente companheiro, sem qualquer menção
excludente a qualquer forma de união afetiva.
Pela ausência de específica previsão em lei, a comunidade homoafetiva está mais
necessitada do imperativo constitucional de proteção do Estado às entidades familiares contra
a exclusão dos benefícios previdenciários em razão de discriminação por orientação sexual.
As noções de casamento e amor vêm evoluindo ao longo da história, assumindo
formas de manifestação múltiplas que estão em movimento de mutação constante, o gênero já
não mais define com que você tem que se relacionar e constituir família, mas as puras trocas
afetivas e sexuais, além de distintas formas de identificação pessoal é o que estão e vão guiar
as relações. A situação das uniões homossexuais é um fenômeno mundial, que foi alargando o
conceito de família com a notificação do ordenamento jurídico, e de forma a abraçar
legalmente a união afetiva entre pessoas do mesmo sexo.
Uma vez reconhecida pela interpretação constitucional, a união entre homossexuais
como entidade familiar, a relação da previdência para com os casais do mesmo sexo deve
decorrer nos mesmos moldes das uniões estáveis entre heterossexuais. Ambos devem
apresentar as mesmas comprovações do vínculo afetivo e de dependência financeira
presumida entre os casais para o processamento dos pedidos de pensão por morte e auxílio-
reclusão. Para Dias:
“[...]Delineia a conduta homicida, mas não consegue impedir um sentimento de
Vingança. Determina visitas de um filho a seu pai separado, mas não consegue
impor o amor de um para o outro. O amor tem seu próprio caminho e a busca da
felicidade é seu incansável objetivo. O direito deve se alinhar a esta busca,
formatando, com o núcleo do sistema jurídico, a perspectiva de garantir Liberdade, e
não de impor limitações.”109
A falta de clareza sobre a norma previdenciária, ainda que não exclusiva, manteve a
sociedade homoafetiva na escuridão por praticamente uma década. Porém, o direito social
109
DIAS, Maria Berenice. Diversidade Sexual e Direito Homoafetivo. São Paulo: Editora Revista dos
tribunais, 2014, p. 518.
59
previdenciário, público e privado, deve incidir sobre todos que se coloquem sobre seu manto
protetor, não perdendo seu caráter social.
Dito isto, salientamos que os planos complementares privados de previdência estão
subordinados às regras genéricas do plano básico do Estado, que são desdobramentos do
sistema de Seguridade Social. Esses planos de previdência privada podem ser ampliados, mas
não restringir rol de beneficiários a serem designados pelos participantes.
2000 - Instrução Normativa INSS/DC 25/2000 (IN 25) - O Ministério Público
Federal do Rio Grande do Sul ingressou com ação civil pública para determinar
ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS pagar benefícios previdenciários
relacionados a relações homoafetivas e aos companheiros e companheiras de
beneficiários.
2001 - Lei n.° 3.334 - Disciplina o Regimento Próprio de Previdência e
Assistência dos Servidores Públicos do Município do Rio de Janeiro, e da outras
providências.
“(...)Art. 2º. Fica garantida aos servidores públicos estaduais para fins de benefícios
previdenciários averbação da condição de parceiros do mesmo sexo, junto à
autoridade competente com o objetivo de assegurar os direitos, evitar o desamparo e
a discriminação em virtude da orientação sexual já proibidos e penalizados pela Lei
n° 3406/2000.
(...)
§ 2.° considera-se igualmente dependente para efeito do disposto nesta lei, a pessoa
que mantenha união estável com outra pessoa do mesmo sexo, que seja Servidor ou
servidora do município.”
(grifos nossos)
2002 - Lei n.° 3.786 - art. 1º, fica acrescentado o §7º ao art. 29 da Lei n.°
285/1979, com o seguinte teor.
“(...) §7º. Equipara-se à condição de companheiro de que trata o inciso 1 deste art.,
os parceiros do mesmo sexo, que mantém relacionamento de união estável,
aplicando-se para configuração da união estável, no que couber, os preceitos legais
incidentes sobre a união estável entre parceiros de diferentes sexos.”
(grifos nossos)
2012-STF/STJ – O Estado brasileiro de Sergipe inadmite a coexistência de
duas unidades familiares com características de publicidade, continuidade e
durabilidade, objetivando o pagamento de pensão por morte.
60
Apesar da total falta de previsão normativa privada que cuidasse dos direitos básicos
da comunidade homoafetiva, diversos órgãos administrativos demonstravam interesse em
criar uma possibilidade de estabelecer ao menos alguns parâmetros previdenciários para as
pessoas em uniões estáveis homoafetivas.
2013 – CNPB 2013.0003-83 - Dos servidores públicos civis federais do Poder
Executivo. Faz menção aos beneficiários do novo regime, mas não prevê
expressamente as relações entre pessoas do mesmo sexo, apesar de não excluí-la.
“Art. 7º. São beneficiários do plano, os dependentes do participante para fins de
recebimento dos benefícios previstos neste regulamento, desde que sejam
reconhecidos como dependentes no RPPS ou, caso o participante não mais esteja
vinculado ao RPPS, atendam as condições de reconhecimento como dependentes no
RPPS.”
2013 - Resolução n.° 175, do Conselho Nacional de Justiça110
– Proíbe que as
autoridades competentes se recusem a habilitar ou celebrar o casamento civil
homoafetivo, inclusive a conversão de união estável em casamento (art. 1º).
2014 - Provimento n.° 37, do Conselho Nacional de Justiça - Faculta o registro
da união estável prevista nos arts. 1.723 a 1727 do Código Civil Brasileiro,
mantida entre o homem e a mulher, ou entre duas pessoas do mesmo sexo, no
Livro “E”.
2015 - REsp. n° 1.302.467/SP111
- Relatório do Ministro Luis Felipe Salomão,
em que a Quarta Turma do STJ reconhece o direito a alimentos do companheiro
do mesmo sexo que restou em situação financeira precária.
2.3 SUCESSÃO NA RELAÇÃO HOMOAFETIVA
A lei brasileira se omite completamente quanto à sucessão do companheiro
homoafetivo, mas o silêncio do legislador não significa inexistência de direito, apesar de que
essa omissão tem um efeito perverso e, na realidade, uma motivação preconceituosa, pois
devido a esta lacuna, alguns juízes optam por interpretar que a intenção do Estado é não
110
CNJ – Conselho Nacional de Justiça. 111
STJ – Superior Tribunal de Justiça. Cf.: http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/178708456/recurso-especial-
resp-1302467-sp-2012-0002671-4.
61
conceder direitos a essas relações e, dessa forma, deslancharam-se inumeras decisões
contraditórias e conflitantes ditadas pelos tribunais.
De fato, o judiciário resistiu muito em admitir as uniões homoafetivas como uma
família. As ações tramitavam nas varas cíveis sob a ótica do direito das obrigações e sob o
véu de uma “sociedade de fato”, que se definia por um negócio jurídico em que sócios têm a
intenção de gerar lucro que será partilhado entre eles. Como se pode perceber, a utilização da
conotação de “sociedade de fato” é notoriamente preconceituosa e incabível para definir uma
relação com componentes sexual e afetivo e intuito de formar família para dividir não apenas
o trabalho ou os lucros, mas a vida.
Sócios não são parentes, não tem direito à herança, portanto, além desses casais
lutarem diariamente para enfrentar o preconceito social ainda existente, para serem
reconhecidos e aceitos pelo que são, ainda terão que, em caso de morte de um deles, abrir mão
de quase tudo que construíram em prol de outras pessoas que, na maioria das vezes, os
discriminaram e os hostilizaram, apenas porque o “Estado” acredita que aquele determinado
tipo de família não tem direitos.
Segundo o Doutor Flávio Gonçalves Louzada:
“Não é cabível uma proteção diferenciada no que tange à partilha de bens, nos casos
de relações hetero e homoafetivas, uma vez que tratar as relações entre pessoas do
mesmo sexo como ‘sócias’, sem qualquer inferência à afetividade e ao amor, é
transformar o nosso mundo em um mundo cruel, injusto e desumano.” 112
A Súmula 380 do STF exige a comprovação da efetiva participação do parceiro
sobrevivente para deferir parte do patrimônio amealhado durante o período de convívio, como
se sócio fosse do falecido. Ainda assim, o direito à meação não se confunde com direito
hereditário, e reconhecer direito a metade dos bens comuns não é conferir ao companheiro
homossexual status de companheiro, e sim de sócio, mais uma vez maculando e diminuindo a
relação que existiu entre esses conviventes.
Para piorar a injustiça, quando o falecido não deixar parentes sucessíveis, os bens são
considerados herança vacante e vira bem público, o que faz com que parceiro sobrevivente, se
não conseguir comprovar participação econômica na construção do patrimônio, mesmo
depois de anos de convívio, fica sem nada.
112
LOUZADA, Flávio Gonçalves apud INÁCIO, Amanda Rodrigues. Direito Sucessório Decorrente da União
Estável Homoafetiva, 2012. Disponível em http://www.oab-sc.org.br/art.s/direito-sucessorio-decorrente-
uniao-estavel-homoafetiva/641.
62
A injustiça começou a ser reparada quando os vínculos homossexuais passaram a ser
de competência das varas da família. Em seguida, a legislação que regula a união estável
passou a ser usada nas relações homossexuais, assim como já era nas relações heterossexuais.
O que fez com que duas pessoas ligadas por um vínculo afetivo, que mantivessem relação
duradoura, pública e contínua, como se casados fossem, formassem o núcleo familiar à
semelhança do casamento, independente do sexo a que pertencem.
Mesmo sob o rótulo de “sociedade de fato”, essas relações afetivas tiveram alguns
direitos sucessórios, principalmente os de natureza previdenciária, reconhecidos pelos
tribunais, apesar de, tecnicamente, sócios não terem direitos hereditários.
Mais a frente, o STF, em decisão pioneira, garantiu a pensão por morte perante o INSS
ao parceiro homossexual e assegurou o direito de ser inscrito como dependente em plano de
assistência médica e a integrar o rol dos dependentes preferenciais dos segurados, no regime
geral e no regime complementar da previdência.
Em sede administrativa, o INSS, através de instrução normativa, concede auxílio por
morte; a superintendência de seguros privados defere ao parceiro o seguro por morte em
acidente rodoviário; e a Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS reconhece o
companheiro homossexual como dependente do titular de plano privado de assistência à
saúde.
Mas foi em 5 de Maio 2011, que o STF113
, por unanimidade, reconheceu as uniões
homoafetivas como entidades familiares, ao decidir acolher duas ações declaratórias de
inconstitucionalidade, e deu à elas os mesmos direitos e deveres das uniões estáveis. A
decisão foi histórica e sua desobediência dá ensejo a pedido de reclamação diretamente no
STF.
Gradativamente, a jurisprudência começou a deferir a conversão da união homoafetiva
em casamento, até que o STJ admitiu a habilitação direta para o casamento. Segundo a
Doutora Maria Berenice Dias: “A decisão do STJ retirou a homoafetividade do direito das
obrigações, em que era visto como simples negócio, como se o relacionamento tivesse
exclusivo objeto comercial e fins meramente lucrativos”.114
113
STF. 114
DIAS apud INÁCIO (2012). Op. cit,.
63
A Ordem dos Advogados do Brasil criou a comissão de diversidade sexual junto ao
conselho federal e em inúmeras seccionais estaduais e subseções, com a finalidade de
capacitar os advogados para atuarem nas demandas envolvendo os direitos da população
homoafetiva e elaborar um projeto de estatuto de diversidade sexual. Esse estatuto assegurará
o reconhecimento das uniões homoafetivas no âmbito do direito das famílias e sucessório.
Neste sentido, a OAB também elaborou a proposta de alteração de dispositivos que
deram origem a três propostas de emenda constitucional, pois:
“[...] haja vista o dever de proteção à família, incumbida ao Estado nos termos do
art. 226 da Constituição Federal, destaca-se a importância de atribuir os estáveis
efeitos sucessórios à união estável homossexual, de forma igualitária às uniões
homossexuais, tendo em vista a equiparação de ambas como entidade familiar.” 115
O posicionamento do STJ116
foi favorável aos efeitos jurídicos decorrentes da união
homoafetiva através dos dizeres da relatora do Superior Tribunal de Justiça, Ministra Nancy
Andrighi: “a ausência de previsão legal jamais pode servir de pretexto para decisões
omissas, ou ainda, calcadas em raciocínios preconceituosos, evitando, assim, que seja
negado o direito à felicidade”.
O companheiro sobrevivente tem legitimidade para requerer abertura do inventário,
assumir administração provisória e ser nomeado inventariante, mas para assegurar tais direitos
de forma mais fácil é melhor que o casal tenha casado, o que torna tais direitos
inquestionáveis. Porém, o reconhecimento da existência da união, por meio de contrato ou
escrituras públicas também assegura a concessão dos direitos, cabendo invocar o art. 1725 do
CC Brasileiro, para decidir sobre questões patrimoniais por meio de contrato escrito.
Ainda que os companheiros não tenham feito uma convenção escrita da união, se a
relação for reconhecida pelos parentes, não é necessário demanda declaratória da união
homoafetiva. É, então, cabível deferir ao companheiro sobrevivente a meação dos bens
adquiridos durante o período de convívio, mesmo sem ter prova de ter contribuído para sua
aquisição, além de também ter direitos sucessórios, que pode ser o direito de concorrência ou,
na inexistência de sucessores, a integralidade do patrimônio.
Caso a relação não seja reconhecida pelos parentes, e esses venham a contestá-la, a
controvérsia deve ser resolvida nas vias ordinárias e é possível a reserva de bens, se houver
115
INÁCIO. Op. cit. 116
STJ – SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, 2011.
64
concorrência com herdeiros necessários, ainda que o inventário esteja em andamento. Mas se
o parceiro se apresenta como único herdeiro e busca a integralidade dos bens, o inventário é
suspenso.
2.3.1 Constitucionalidade da sucessão do companheiro supérstite
Para Berenice Dias é claro que:
“A união estável é reconhecida como entidade familiar pela Constituição Federal
(CF 226§ 3º), que não concedeu tratamento diferenciado a qualquer das formas de
constituição da família. Conforme Zeno Veloso, o art. 1790 merece censura e crítica
severa porque é deficiente e falho, em substancia. Significa um retrocesso evidente,
representa um verdadeiro equívoco.” 117
Em 2014, o STJ, em Corte Especial, iniciou a discussão sobre a forma de sucessão ou
herança nos casos de união estável e o Ministério Público arguiu a inconstitucionalidade do
art. 1.790 do CC Brasileiro de 2002, sobre as regras de direito sucessório na união estável,
visto que atualmente, o companheiro herda menos do que o cônjuge e essa condição estaria
ferindo a isonomia defendida na Constituição Federal. Ao compararmos as regras de sucessão
aplicadas ao casamento, podemos verificar claramente o tratamento arbitrário quando se trata
de sucessão na união estável.
Ocorre que apenas o STJ – Superior Tribunal de Justiça pode declarar que um
dispositivo legal é inconstitucional, por isso a Quarta Turma remeteu o recurso do Ministério
Publico à Corte Especial118.
A Doutora Giselda Hironaka, do IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de
Família)119
, acredita que o art. 1.790 do CC Brasileiro carrega inúmeros problemas,
começando por só ter sido incluído no texto do CC Brasileiro através da Emenda n.º 358, que
deixa o companheiro fora da Sucessão Legítima, com sua escolha errônea do âmbito
legislativo para a sua inserção.
O IBDFAM também se põe favorável à necessidade da declaração de
inconstitucionalidade e consequente exclusão do art. 1790 do CC Brasileiro, ao regulamentar
117
DIAS (2013). Op. cit., p. 66. 118
INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO DE FAMILIA - STJ Inicia Discussão sobre a
Constitucionalidade da Sucessão em casos de União Estável. [Em linha]. 2014, IBDFAM. 22 de Set. 2014 . 119
Id.
65
os direitos sucessórios do companheiro, e que este tema seja redirecionado para seu espaço de
direito dentro do Código Civil, que é o da sucessão da legítima, e que o companheiro passe a
fazer parte da vocação hereditária, ao lado de parentes do falecido e do cônjuge sobrevivo. De
acordo com a Doutora Giselda Hironaka, é neste espaço que deveria estar a sucessão do
companheiro sobrevivente. 120
2.3.2 Sucessão do companheiro supérstite no Código Civil Brasileiro de 2002
O CC Brasileiro de 2002 regulou a sucessão dos companheiros, estabelecendo a
participação nos bens adquiridos a título oneroso, na constância da união estável, na sucessão
do falecido. Gama diz:
“A maior crítica que deve ser feita ao referido art. 1829 é a de não ter incluído o
companheiro na ordem da vocação hereditária, deixando que a matéria fosse
disciplinada no art. 1790 do texto codificado, ou seja, em parte completamente
distinta daquela que envolve a ordem de chamamento dos herdeiros legítimos.”121
Seguindo a Lei n.° 9278/1996, que reconhece e regula a união estável como entidade
familiar, em seu art. 5º, afirma que os bens adquiridos por quaisquer dos companheiros
durante a união estável são considerados fruto do trabalho e pertencem a ambos, em partes
iguais, salvo contrato escrito em contrário.
Dito isto, antes de analisarmos a sucessão, é preciso saber qual o regime de bens
escolhido pelos conviventes e, dessa forma, fazer a divisão, primeiramente, da meação,
quando este for o caso: Regime de Comunhão Parcial de Bens e Regime de Comunhão
Universal de Bens. E, havendo meação, fazer a partilha dos bens entre os herdeiros,
necessários (legítima) e/ou não (quota disponível), dependendo de cada caso.
Na hipótese dos conviventes optarem por um regime de separação total de bens, no
falecimento de um deles não haverá meação. Os bens particulares (anteriores ao casamento)
serão herdados apenas pelos descendentes ou, se for o caso, ascendentes. Eles não se
comunicam com o companheiro sobrevivo, porém, o companheiro que sobreviveu é herdeiro
necessário na partilha dos bens comuns e receberá de acordo com o estipulado no art.1790 do
CC Brasileiro.
120
IBDFAM, 2014, op. cit. 121
GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Concorrência sucessória à luz dos princípios norteadores do
Código Civil de 2002. Direito de Família, ano 7, n.° 29, abr./Maio 2005. p. 22.
66
Caso o regime escolhido tiver sido o de comunhão universal de bens, da totalidade dos
bens dos conviventes - particulares ou comuns – 50% será entregue ao companheiro
sobrevivo e os outros 50%, que seriam do de cujus, será partilhado entre os herdeiros
necessários, conforme estipulado no art. 1790 do CC Brasileiro.
Porém, se o regime de bens é o de comunhão parcial de bens (ou se não houver
nenhum regime especificado), há duas possibilidades:
Não há bens particulares - O companheiro sobrevivo é meeiro e os 50%, que seriam do
de cujus, será partilhado entre os descendentes.
Há bens particulares - O companheiro sobrevivo é meeiro dos bens comuns, os 50%,
que seriam do de cujus será partilhado entre os descendentes e os bens particulares
será partilhado segundo o art. 1790 do CC Brasileiro, entre os herdeiros necessários.
Dias esclarece que:
“O Código Civil, ao tratar do direito sucessório na união estável, ao menos em cinco
aspectos, trouxe inegável prejuízo ao companheiro sobrevivente: (a) não o
reconheceu como herdeiro necessário; (b) não lhe assegurou quota mínima; (c) o
inseriu no quarto lugar na ordem de vocação hereditária, depois dos colaterais; (d)
limitou o direito concorrente aos bens adquiridos onerosamente durante a união; e
(e) não lhe conferiu direito real de habitação.” 122
De acordo com o Código Civil Brasileiro:
“Art. 1.790 a participação do companheiro na sucessão do outro quanto aos bens
adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:
I – Concorrendo com filhos comuns - uma quota equivalente à que por lei for
atribuída ao filho;
II – Concorrendo com filhos só de cujos - metade do que couber a cada um
daqueles;
III - Concorrendo com demais parentes sucessíveis - um terço da herança;
IV – Caso não haja parentes sucessíveis - totalidade da herança.” 123
É de suma importância lembrar que o contrato regulando a divisão do patrimônio não
tem força para excluir o companheiro sobrevivente de participar como herdeiro dos aquestos,
o que só poderá ser feito através de ato de disposição de última vontade.
No início do ano de 2003, iniciou-se a necessidade de enfrentar e resolver os
problemas resultantes da sucessão do companheiro estável. Desde então, as imperfeições do
art. 1.790 do CC Brasileiro passaram a ser ressaltadas124
:
122
DIAS (2013). Op. cit., p. 65. 123
CC Brasileiro, de 2002.
67
Péssima redação: A redação do único dispositivo que regula a sucessão do
companheiro estável é imprecisa e lacunosa;
Erro no aspecto topológico (equívoco quanto ao local em que está situada a norma): A
inserção da norma no capítulo atinente às disposições gerais do Direito das Sucessões,
e não no capítulo da ordem de vocação hereditária;
Lacuna em relação a situações extremamente previsíveis (comprometendo o princípio
da operabilidade da lei), como, por exemplo, a concorrência do companheiro com a
filiação híbrida, a condição de herdeiro necessário ou facultativo e o direito real de
habitação.
Incisos ultrapassando os limites estipulados pelo caput:
Inciso I, fazendo referência a filhos;
Inciso II, fazendo referência a descendentes, e ampliando o rol de possibilidades e
alterando de forma descabida o fechamento da questão;
Inciso III, que faz referência a uma quota de um terço "da herança" em favor do
companheiro sobrevivente: ou se confere preponderância à restrição colocada pelo
caput. Lendo esse inciso, percebe-se a limitação quanto aos bens sobre os quais haverá
a concorrência do companheiro, pois ou se interpreta o inciso em tela de acordo com
seus expressos termos, ou se dá ênfase à palavra "herança", o que obviamente significa
todo o patrimônio do morto, independentemente de como foi adquirido;
Inciso IV, escapa dos limites impostos pelo caput e goza inclusive de amparo legal,
pois o art. 1.844 do CC Brasileiro estabelece que a herança só será devolvida ao Poder
Público quando não sobreviver "cônjuge, ou companheiro, nem parente algum
sucessível, ou tendo eles renunciado a herança ".Isto é, havendo companheiro estável
vivo que aceite receber o patrimônio hereditário, nada passará ao domínio estatal.
Além disso, prevalece diferença substancial do tratamento conferido ao companheiro
sobrevivente (art. 1790 CC Brasileiro) se comparado ao cônjuge (art. 1829 CC Brasileiro)125
.
Na contramão da intenção, por mais controvertida que essa seja, de atingir a maior
isonomia possível entre as entidades familiares, a sucessão do cônjuge e do companheiro
perdeu a coerência quando a lei estipulou que o cônjuge tem direito sucessório sobre o
124
BOECKEL,Fabricio Dani De & ROSA, Karin Regina Rick Rosa. Direito Sucessório em Perspectiva
Interdisciplinar. São Paulo: Elsevier Acadêmico, 2011. 125
Id.
68
patrimônio particular do morto ao concorrer com descendentes, pois o cônjuge é tratado como
herdeiro necessário pelo art. 1.845 do CC Brasileiro e o companheiro, que não foi incluído no
rol de herdeiros necessários, não terá direito a parte da herança dos bens particulares,
concorrerá com os descendentes apenas na metade do que pertencia ao de cujus em relação
aos bens comuns.
Ocorre que tanto no casamento quanto na união estável, ou entendemos que é justa a
participação do supérstite sobre os bens particulares adquiridos pelo falecido, ou então se
estabelece que o adequado seja a concorrência apenas sobre os bens comuns.
Enfim, é notória a divergência de tratamento que o CC Brasileiro de 2002 traz no que
tange a sucessão do companheiro e a do cônjuge.
Outra colocação que trouxe muita discussão no art. 1.790 do CC Brasileiro é aquela
que emana dos incisos I e II, ao definir a participação sucessória do companheiro com base
nas origens dos descendentes com quem concorre. Mesmo não nos aprofundando no mérito
da distinção. É evidente que o critério legal escolhido complica e dificulta o entendimento da
norma e, consequentemente, reduz sua aplicabilidade de forma correta. Sem contar que o art.
não menciona a possibilidade de existirem filhos comuns e exclusivos na concorrência com o
companheiro.126
Por fim, outra lacuna do art. 1.790 do CC Brasileiro está na total falta de
regulamentação sobre o real direito de habitação vitalício do parceiro, caso não constitua nova
união ou casamento, em relação ao imóvel da família, que mesmo já tendo sido reconhecido
pela Lei n.° 9.278/1996, de 10 de Maio, foi totalmente esquecido pelo CC Brasileiro.
2.3.2.1 Concorrência do companheiro com filhos comuns
“Art. 1.790 CC (...) I - concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota
equivalente à que por lei for atribuída ao filho”. 127
Observando que o caput do artigo deixa clara a restrição do companheiro aos bens
comuns, a concorrência com os filhos comuns será apenas com relação a esses bens e o
126
GOMES, Orlando. Sucessões. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015. 127
CC Brasileiro.
69
companheiro terá direito a uma quota equivalente à do filho comum, nos bens adquiridos
onerosamente durante a união estável.128
Comparando essa regra com a norma concernente à concorrência do cônjuge com os
descendentes comuns, nota-se que não houve a reserva da quarta parte da herança ao
companheiro sobrevivo.
O legislador cometeu um erro notório ao empregar a palavra “filho” e não
“descendentes”, apesar de saber que a finalidade da norma é a de regular a concorrência do
companheiro com os “descendentes”, como visto no inciso II, onde foi corretamente
empregada.
Existem duas correntes129
que tentam solucionar a questão, uma delas acredita não ter
motivo lógico para a diferença no tratamento dispensado aos descendentes comuns, e por isso
defende que o inciso I do art. 1. 790 do CC Brasileiro abranja, através de uma interpretação
lógica, todos os descendentes comuns, competindo na sucessão com o companheiro
sobrevivente e não apenas os filhos. Durante a III Jornada de Direito Civil, promovida pelo
Conselho da Justiça Federal, foi aprovado o seguinte enunciado: “Aplica-se o inciso I do art.
1.790 do CC Brasileiro também na hipótese de concorrência do companheiro sobrevivente
com outros descendentes comuns e não apenas na concorrência com filhos comuns” 130
.
A segunda corrente defende que os descendentes comuns (que não são filhos) devem
concorrer com a companheira conforme o inciso III do art. 1.790 do CC Brasileiro, o que se
configura por reconhecê-los como “outros parentes sucessíveis”. Esta corrente preconiza que
se o legislador quis restringir o inciso I apenas aos filhos comuns, não podemos ampliar seu
alcance pela interpretação.
Enquanto as leis que disciplinaram a união estável caminham no sentido de igualar os
direitos do companheiro aos do cônjuge, o CC Brasileiro de 2002 tomou direção oposta ao
não incluir o companheiro como herdeiro necessário, ao lado dos descendentes, ascendentes e
cônjuge, e fazendo com que, caso não haja bens comuns, apenas particulares, o convivente
128
GOMES. Op. cit. 129
NOGUEIRA, Claudia de Almeida. Direito das Sucessões. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012, p. 197. 130
Id. Os enunciados resultantes dessa jornada foram divulgados pelo STJ em dezembro de 2004.
70
sobrevivo não tenha direito a fazer parte da partilha, pois os bens particulares, na união
estável, são divididos apenas entre os descendentes131
.
2.3.2.2 Concorrência do companheiro supérstite com filiação hibrida
Como a lei não prevê solução para a hipótese em que os filhos têm origem híbrida, a
omissão dá ensejo à discussão, na qual se entrechocam três correntes:
A primeira vislumbra a possibilidade de partilhamento da herança considerando
todos os filhos como se fossem comuns, para atribuir ao companheiro quota igual
à que for destinada a cada filho – prevalência do inciso I do art. 1.790 do CC
Brasileiro.
A segunda restringe a quota do companheiro à metade do que aos filhos couber e
trata todos como filhos exclusivos – prevalência do inciso II do art. 1.790 do CC
Brasileiro.
A terceira propõe a realização de um cálculo proporcional do que caberia ao
companheiro, considerando a quota igualitária com relação aos filhos havidos em
comum e só metade do que coubesse aos demais - composição dos incisos I e II.
Segundo o Doutor Márcio Luiz Delgado Régis: “O privilégio assegurado aos
descendentes do companheiro falecido, de receberem o dobro do quinhão que couber ao
companheiro sobrevivente, só é assegurado, quando inexistirem descendentes comuns, sob
pena de se infringir o princípio constitucional da igualdade”132 .
O melhor e mais prático entendimento parece ser de acordo com o inciso I do art.
1.790 do CC Brasileiro, pois o inciso II exige que os descendentes sejam só do autor da
herança, exclusividade não imposta pelo inciso I.
131
NOGUEIRA. Op. cit., p. 198. 132
RÉGIS apud GONÇALVES. Op. cit., p. 169.
71
2.3.2.3 Concorrência do companheiro supérstite com descendente do autor da herança
Segundo o inciso II do art. 1.790 do CC Brasileiro, o companheiro sobrevivente herda
a metade do quinhão dos descendentes exclusivos do autor da herança quanto aos bens
comprados durante a união estável (bens comuns). Os demais bens (particulares) são
partilhados entre os descendentes. O companheiro sobrevivente não tem direito à
concorrência.133
O inciso repete a inoportuna distinção entre descendentes exclusivos e descendentes
comuns, tal qual previsto para o cônjuge no art. 1.832 do CC Brasileiro, mas piora a condição
do companheiro sobrevivente.
Não há previsão para o caso de concorrer o companheiro com descendentes comuns e
descendentes só do autor da herança. Não se pode aplicar a solução de cada situação para os
respectivos descendentes, pois haveria desigualdade de quinhões hereditários entre os filhos,
o que fere a regra constitucional.
Na prática, temos a seguinte hipótese para a situação do companheiro sobrevivente:
durante a união estável, o casal comprou uma casa onde a família sempre morou e ele herdou
uma loja. O marido tem 3 (três) filhos anteriores. A primeira metade da casa constitui a
meação da companheira. A outra metade da casa integra o espólio junto com a totalidade da
loja. A segunda metade da casa será dividida atribuindo-se duas partes para cada filho
exclusivo do morto e uma parte para a companheira. Dos bens comprados durante a união
estável, cabe à companheira metade do que couber a cada um deles.
Como havia apenas um único imóvel de natureza residencial e a família morava no
bem à época do óbito, a companheira tem direito real de habitação, conforme parágrafo único
do art. 7 da Lei n.° 9.278/1996, de 10 de Maio, apesar desse direito real de habitação gerar
divergência entre os doutrinadores, pois mesmo estando garantido na lei específica, o Código
Civil não o contempla.134
133
NOGUEIRA. Op. cit., p. 208. 134
GOMES. Op. cit.
72
Sabendo-se que herança é bem particular e, por isso, não se comunica no regime de
bens em questão, apenas os três filhos irão ter direito à loja, em igualdade de condições.135
2.3.2.4 Concorrência do companheiro supérstite com outros parentes sucessíveis do autor da
herança
O companheiro herda um terço dos bens e os colaterais os dois terços restantes quando
concorre com outros herdeiros sucessíveis. É um retrocesso inexplicável o imposto pelo art.
1.790 do CC Brasileiro, no qual os companheiros passam a concorrer com os colaterais até
quarto grau do falecido. Pelas leis especiais de união estável, os companheiros ficavam no
mesmo patamar da sucessão do cônjuge, mas com esse dispositivo, somente na falta destes
parentes, o companheiro irá suceder sozinho.
No tocante ao concurso com os ascendentes a regra não se mostra tão absurda, já que
destina ao companheiro quota igual à atribuída a cada um dos pais do de cujus, se ambos
forem sobrevivos. Sendo premorto um dos ascendentes, o sobrevivo terá a vantagem de ficar
com os dois terços da herança, cabendo ao companheiro sempre o mesmo terço restante.
Se ambos os genitores já forem falecidos, serão convocadas para a sucessão os avós
maternos e os avós paternos. Na hipótese de os quatro avós ainda estarem vivos, terão que
dividir entre eles os dois terços do acervo, uma vez que o inciso III do art. 1.790 do CC
Brasileiro, continua a determinar que o companheiro sobrevivente herde apenas a quantia fixa
de um terço do acervo sucessível.
Porém, se houver apenas um dos avós em uma das linhas e ambos os avós na outra
linha, cada uma das linhas receberá um terço do acervo hereditário, tocando a outra terça parte
ao companheiro sobrevivente.
Para o Doutor Zeno Veloso não há justificativa para:
“[...] colocar-se o companheiro sobrevivente numa posição tão acanhada e bisonha
na sucessão da pessoa com quem viveu pública, contínua e duradouramente,
constituindo uma família, que merece tanto reconhecimento e apreço, e que é tão
digna quanto a família fundada no casamento.”136
135
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro – Direito das Sucessões. 7 ed. São Paulo: Saraiva,
2012, p. 168. 136
VELOSO apud GONÇALVES. Op. cit., p. 200.
73
Se não houver bens comuns, mas apenas bens particulares, na ausência de outros
parentes sucessíveis, os bens serão devolvidos ao Estado, conforme o disposto no art. 1.844
do Código Civil Brasileiro.
2.3.2.5 Direito do companheiro supérstite à totalidade da herança quando não há parentes
sucessíveis do autor da herança
Após as uniões estáveis serem elevadas ao patamar de entidade familiar através da
Constituição Federal de 1988, foram igualadas ao casamento, assim como a família
monoparental, que é constituída por um dos genitores, mas os direitos sucessórios dos
companheiros pendiam de legislação ordinária.
Em 1994, a Lei n.° 8.971, deu aos conviventes, a partir daquela data, o
reconhecimento do direito à sucessão da propriedade dos bens do falecido, quando não
houvesse herdeiros necessários (descendentes ou ascendentes).
Aos companheiros somente era dado o direito de pleitear, em sede processual própria,
o reconhecimento da sociedade de fato, visando à obtenção de parcela do patrimônio
adquirido onerosamente durante a união estável, na proporção do esforço de cada um.
Essa necessidade de comprovação do esforço em comum para aquisição do patrimônio
foi objeto da Súmula 380 do STF, que aqui se repete “comprovada existência de sociedade de
fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, como a partilha do patrimônio
adquirido pelo esforço comum”. 137
Separada a parte proporcional do sobrevivo, o patrimônio do morto era partilhado
entre os herdeiros necessários, em ordem. Na falta desses e de testamento válido beneficiando
o companheiro, considerava-se a herança jacente.
Através da Lei n.° 8.971/1994, de 29 de Dezembro, os conviventes passaram a ter
direito à sucessão legítima, em terceiro lugar e recebendo a totalidade dos bens, na falta de
herdeiros necessários e de testamento válido e eficaz beneficiando terceiro.
137
STF - Súmula 380, op. cit.
74
Quando em concurso com herdeiros necessários ou mesmo sozinho, o companheiro
tem que preencher certos requisitos.
a) Viver em união estável a época do óbito;
b) Falecimento de um deles;
c) Aquisição a título oneroso de bens durante a união estável;
d) comprovação em juízo da sua qualidade de companheiro do
sobrevivente;
O art. 1.790 do CC Brasileiro, em seu caput, restringe o direito do companheiro
apenas aos bens adquiridos a título oneroso durante união estável, mas seu inciso IV prevê
que não havendo herdeiros sucessíveis, o companheiro sobrevivente herda a totalidade dos
bens havidos a qualquer título, durante a união estável ou não. Segundo o disposto no art.
1.844 do CC Brasileiro, a herança somente é devolvida ao Estado se não houver cônjuge,
companheiro, nem parente algum sucessível.
Em comparação com a situação do cônjuge, o companheiro foi deixado de lado mais
uma vez pelo legislador, que, após esse dispositivo, retrocedeu muito na direção da isonomia
entre o casamento e a união estável o que muitas vezes deixa o companheiro em situação de
indubitável injustiça, visto que para que ele seja herdeiro do patrimônio que ajudou a
construir, tenha que, primeiramente, ceder o que deveria ser “o seu lugar” aos possíveis
parentes do de cujus até o colateral em 4º grau.
Não tendo sido o companheiro erigido à categoria de herdeiro necessário, pode o
testador excluí-lo da sucessão, se desejar por disposição de última vontade (art. 1.845 do CC
Brasileiro).
2.3.2.6 Meação
Sobre essa questão, cabe a colocação de Dias, que faz um breve resumo da situação ao
dizer que:
“Quando do falecimento de um deles, o outro tem direito à meação dos bens
comuns, chamados de aquestos. Ainda que a meação não integre o acervo
75
hereditário, necessariamente acaba arrolada no inventário, pois a separação dos bens
do parceiro sobrevivente ocorre quando da partilha (CPC 1023 II). Quando se pensa
na divisão da herança, é necessário antes excluir a meação do companheiro
sobrevivente, que se constitui da metade dos bens adquiridos onerosamente no
período de convivência. A outra metade é o acervo hereditário, integrado pela
meação do falecido, seus bens particulares e os recebidos por doação ou herança.
Aos herdeiros necessários é reservada a legítima, que corresponde à metade deste
patrimônio. A outra metade é a parte disponível que seu titular pode dispor por meio
de testamento. Como o companheiro não é herdeiro necessário – por
injustificadamente não ter sido inserido na ordem de vocação hereditária -, não tem
direito à legítima.”138
Os bens particulares que cada um tinha antes do início do relacionamento e os
recebidos por doação ou herança, pertencem ao seu titular; porém o acervo construído durante
a vida em comum é de ambos os companheiros, de forma igualitária. Ao falecer um deles, o
outro tem direito à meação dos aquestos, que apesar de não ser herança, acaba arrolada no
inventário, já que é no momento da partilha que é feita a separação dos bens do companheiro
sobrevivo, de acordo com o art. 651 como consta o Novo Código de Processo Civil Brasileiro,
de 16 de Março 2015139
.
O direito a meação, preexiste à morte do autor da herança, direito este assegurado aos
conviventes em união estável pelo art. 1.725 do CC Brasileiro, ao determinar que se aplique a
união estável o regime de comunhão parcial de bens, salvo estipulação contrária em contrato
escrito.
Ao pensar na divisão da herança, precisamos, antes de tudo excluir a meação do
companheiro sobrevivente dos bens comuns. A outra metade, junto com os bens particulares,
forma a herança. Desta herança, a metade, chamada de legítima, é reservada aos herdeiros
necessários e a outra metade é a quota disponível, que caso fosse a vontade do autor, poderia
disponibilizá-la a terceiros através de testamento. Como o companheiro não foi inserido como
herdeiro necessário, não tem direito à legítima.
O tipo de regime de bens pode impedir a meação, mas não o direito sucessório e ainda
que haja direito à meação, esta não invalida o direito sucessório do companheiro. O regime de
separação convencional de bens é, a princípio, o único que não há direito à meação, pois
inexiste a comunicação patrimonial, mas ainda assim a jurisprudência vem admitindo o
direito a partilha mediante prova de contribuição na construção do acervo patrimonial.
138
DIAS (2013). Op. cit., p. 68. 139
Lei n.° 13105/2015, de 16 de Março – Novo Código do Processo Civil.
76
Para reconhecer o direito à meação, não é necessário que a união estável permaneça
até o falecimento, basta ter existido e, durante sua constância, ter sido adquirido bem ou bens.
Isso ocorre porque a meação não é herança, pois se fosse teria extinguido com a separação de
fato, assim como todo o direito sucessório.
2.3.2.7 Direito real de habitação do companheiro supérstite
Direito real de habitação significa que é garantido ao cônjuge ou companheiro, o
direito de habitar a casa que serve como moradia para o casal após a morte do convivente que
é oficialmente dono do imóvel. Esse direito é previsto no art. 6, caput, da Constituição
Federal.
A Lei n.° 9.278/1996, de 10 de Maio, garantiu ao companheiro o direito real de
habitação, assim como já era garantido ao cônjuge, porém o Código Civil de 2002 se absteve
desse assunto ao regulamentar a sucessão do companheiro, ao mesmo tempo em que em seu
art. 1.831 do CC Brasileiro concede apenas ao cônjuge sobrevivente o direito real de
habitação140
:
“Art. 1.831: ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será
segurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de
habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja
o único daquela natureza a inventariar.”
“ [...] o direito real de habitação deve ser estendido ao companheiro, seja por não ter
sido revogado, precisão da Lei n.º 9278/1996, seja em razão da interpretação
analógica do art. 1.831, informado pelo art. 6º, caput, da CF/1988.”141
Levando em conta que o princípio de vedação ao retrocesso é uma espinha dorsal do
direito de família, a atribuição do direito real de habitação ao companheiro sobrevivente é
uma questão de absoluta lógica e justiça, já que esse direito tinha sido assegurado a estes pela
Lei n.° 9.278/1996, de 10 de Maio.
Visto que, na prática, cônjuges e companheiros exercem a mesma função e têm a
mesma importância na construção da convivência, na superação das dificuldades, na
constituição da família e na vida em comum, os mesmos direitos devem ser conferidos a
ambos, fazendo com que as diferenças seja apenas a forma social com que aquela família opta
140
GOMES. Op. cit. 141
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Sucessões. v. 6. São Paulo: Saraiva,
2007, p. 148.
77
por se apresentar, o que não deve influenciar sobremaneira em seus direitos, pois são uma
entidade familiar.
Neste sentido decidiu o STJ142:
“Direito das sucessões. Recurso especial. Sucessão aberta na vigência do CC/2002.
Companheira sobrevivente. Direito real de habitação. art. 1831 do CC Brasileiro
2002.
1 - O novo Código Civil regulou inteiramente a sucessão do companheiro, ab-
rogando as leis da união estável, nos termos do art. 2. § 1.°, da Lei de Introdução às
Normas do Direito Brasileiro – LINDB.
2 – É bem verdade que o art. 1790 do CC Brasileiro de 2002, norma que inovou o
regime sucessório dos conviventes em união estável, não previu o direito real de
habitação aos companheiros. Tampouco a redação do art. 1831 do CC Brasileiro
2002 traz previsão expressa de direito real de habitação à companheira. Ocorre que a
interpretação literal das normas conduziria à conclusão de que o cônjuge estaria em
situação privilegiada em relação ao companheiro, o que deve ser rechaçado pelo
ordenamento jurídico.
3 – A parte final do § 3.° do art. 226 da Constituição Federal Brasileira consiste, em
verdade, tão somente em uma fórmula de facilitação da conversão da união estável
em casamento. Aquela não rende ensejo a um estado civil de passagem, como um
degrau inferior que, em menos ou mais tempo, cederá vez a este.
4 – No caso concreto, o fato de haver outros bens residenciais no espólio, um
utilizado pela esposa como domicílio, outro pela companheira, não resulta
automática exclusão do direito real de habitação desta, relativo ao imóvel da
Avenida Borges de Medeiros, Porto Alegre-RS, que lá residia desde 1991
juntamente com o companheiro Jorge Augusto Leveridge Patterson, hoje falecido.
5 – O direito real de habitação concede ao consorte supérstite a utilização do imóvel
que servia de residência ao casal com o fim de moradia, independentemente de
filhos exclusivos do de cujus, como é o caso.
6 - Recurso Especial não provido.”
(STJ, REsp 1.329.993/RS, 2010/0222236-3,j. 26/11/2013, rel. Luis Felipe Salomão).
“Direito civil. Sucessão. Direito real de habitação. Companheiro sobrevivente.
Possibilidade. Vigência do art. 7 da Lei n.° 9.278/1996. Recurso improvido.
1 – Direito real de habitação. Aplicação ao companheiro sobrevivente. Ausência de
disciplina no Código Civil. Silêncio não eloquente. Princípio da especialidade.
Vigência do art. 7. da Lei n.° 9.278/1996. Precedente: REsp 1.220.838/PR, 3.° T., j.
19/06/2012, rel.Min. Sidnei Beneti, DJe 27.06.2012.
2 – O Instituto de direito real de habitação possui por escopo garantir o direito
fundamental à moradia constitucionalmente protegido (art. 6, caput, da CFB).
Observância, ademais, ao postulado da dignidade da pessoa humana (art. 1, III, da
CFB).
3 – A disciplina geral promovida pelo Código Civil acerca do regime sucessório dos
companheiros não revogou as disposições constantes da Lei n.° 9.278/1996 nas
questões em que verificada a compatibilidade. A legislação especial, ao conferir
direito real de habitação ao companheiro sobrevivente, subsiste diante da omissão do
Código Civil Brasileiro em disciplinar tal direito àqueles que convivem em união
estável. Prevalência do princípio da especialidade.
4 – Recurso improvido ”
(STJ, REsp 1.156.744/MG, 2009/0175897-8, j. 09.10.2012, rel. Marco Buzzi).
142
DIAS (2014). Op.cit., pp. 477-479.
78
“Direito Civil. Sucessões. Direito real de habitação do cônjuge supérstite. Evolução
Legislativa. Situação jurídica mais vantajosa para o companheiro que para o
cônjuge. Equiparação da união estável.
1 - O Código Civil Brasileiro de 1916, com a redação que lhe foi dada pelo Estatuto
da Mulher Casada, conferia ao cônjuge sobrevivente direito real de habitação sobre
o imóvel, desde que casados sob o regime de comunhão universal de bens.
2 – A Lei n.° 9.278/1996, de 10 de Maio, conferiu direito equivalente aos
companheiros e o Código Civil Brasileiro de 2002 abandonou a postura restritiva do
anterior, estendendo o benefício a todos os cônjuges sobreviventes,
independentemente do regime de bens do casamento.
3 – A CFB (art. 226, § 3.°) ao incumbir o legislador de criar uma moldura normativa
isonômica entre união estável e casamento, conduz também o intérprete da norma a
concluir pela derrogação parcial do § 2. do art. 1611 do CC/1916, de modo a
equiparar a situação do cônjuge e do Companheiro no que respeita o direito real de
habitação, em antecipação ao que foi finalmente reconhecido pelo código civil de
2002.
4 – Recurso Especial improvido.”
(STJ, REsp 821.660/DF, 2006/0038097-2,j. 14.06.2011, rel. Sidnei Beneti).
Com relação à grande importância do direito real de habitação e sua natureza
sucessória, assim se pronunciou recentemente o STJ:
“(...)
1 - O Código Civil de 2002 regulou inteiramente a sucessão do companheiro, ab-
rogando, assim, as leis da união estável, nos termos do art. 2, § 1.° da lei de
introdução às normas do direito brasileiro – LINDB. Portanto, é descabido
considerar que houve exceção apenas quanto há um parágrafo.
2 - É bem verdade que o art. 1790 do Código Civil de 2002, norma que inovou o
regime sucessório dos conviventes em união estável, não previu o direito real de
habitação aos companheiros. Tampouco a redação do art. 1831 do CC/2002 traz
previsão expressa de direito real de habitação à companheira. Ocorre que a
interpretação literal das normas conduziria à conclusão de que o cônjuge estaria em
situação privilegiada em relação ao companheiro, o que não parece verdadeiro pela
regra da Constituição.
3 – A parte final do § 3.° do art. 226 da CF consiste, em verdade, tão somente em
uma fórmula de facilitação da conversão da união estável em casamento. Aquela não
rende ensejo a um estado civil de passagem, como um degrau inferior que, em
menos ou mais tempo, cederá vez a este.
4 – No caso concreto, o fato de a companheira ter adquirido outro imóvel residencial
com dinheiro recebido pelo seguro de vida do falecido não resulta exclusão de seu
direito real de habitação referente ao imóvel em que residia com o companheiro, ao
tempo da abertura da sucessão.
5 – Ademais, o imóvel em questão adquirido pela ora recorrente não faz parte dos
bens a inventariar.
6 – Recurso Especial provido.”
(STJ, REsp 1.249.227/SC, 2011/0084991-2,j. 26.11.2013, rel. Luis Felipe Salomão).
Com isso, não pairam dúvidas que, se estiverem em condições exigidas por lei –
como, por exemplo, tratar-se de imóvel único destinado à residência da família - o
companheiro homossexual sobrevivo também possui direito real de habitação. O direito real
de habitação recai em prédio residencial, contanto que seja um único imóvel inventariado.
Basta que se destinem a residência, donde se segue que, se nele não está morando, o gravame
não se institui.
79
Se a família reside em casa própria, mas o falecido era proprietário de outros bens
imóveis, o direito real não se constitui. GOMES coloca:
“Deve-se entender o requisito de exclusividade no sentido de inexistência de outros
imóveis residenciais, a isso autorizando a finalidade da Lei, que é, evidentemente,
impedir que a passagem do bem em plena propriedade à um herdeiro possa
determinar o deslocamento da família, ou simplesmente do outro cônjuge.”143
Atualmente, o imóvel é gravado sob direito real de habitação enquanto o cônjuge ou
companheiro sobreviver e não como anteriormente, quando o legislador definia que caso o
cônjuge constituísse nova união ou casamento perderia o direito.
Com isso, terminaram, neste trabalho, as abordagens, do ponto de vista do Direito
Português, no Primeiro Capítulo, e do ponto de vista do Direito Brasileiro, neste Segundo
Capítulo, quanto à situação jurídica da sucessão do casal homoafetivo nestes dois
ordenamentos. Neste tocante, observa-se, de plano, a diferenciação nos dois ordenamentos: no
ordenamento jurídico português, o tema aqui tratado já tem um manto legal muito maior; e no
ordenamento jurídico brasileiro, ainda é bem dependente do alvedrio de decisões
jurispridenciais de seus tribunais, em razão de existência de lacuna legal. No próximo
capítulo, abordar-se-á a situação do relacionamento homoafetivo perante outras legislações.
143
GOMES. Op. cit., p. 68.
80
TERCEIRO CAPÍTULO
No terceiro capítulo, procurar-se-á buscar entender a situação jurídica do
relacionamento homoafetivo, sua aceitação e evolução ao longo dos anos, perante os
ordenamentos jurídicos diversos do luso-brasileiro. A ideia central foi a de apresentar um
panorama do caminho trilhado e ajudar na busca incessante de situações mais justas e
condizentes com a realidade, não apenas de alguns poucos países e sim mundial, como será
visto por meio de mapas, quadros e gráficos, que consolidam o entendimento.
81
“Ninguém deve ser submetido à discriminação ou violência por causa
da orientação sexual. Esta resolução não busca impor certos valores
aos países, e sim iniciar o diálogo.”
(Jerry Matthews Matjila)144
.
“Cuida-se, enfim, a meu juízo, de uma entidade familiar que, embora
não esteja expressamente prevista no art. 226, precisa ter a sua
existência reconhecida pelo Direito, tendo em conta a existência de
uma lacuna legal que impede que o Estado, exercendo o indeclinável
papel de protetor dos grupos minoritários, coloque sob seu amparo as
relações afetivas públicas e duradouras que se formam entre pessoas
do mesmo sexo.”
(Ricardo Lewandowski)145
.
“A pessoa homossexual deve ser respeitada em sua dignidade e
acolhida com respeito, com o objetivo de evitar qualquer marca de
injusta discriminação e, particularmente, toda forma de agressão e
violência.”
(Papa Francisco)
“As palavras pronunciadas pelo Papa são muito importantes do ponto de
vista do estilo, porque, depois de tantos anos de insultos lançados pela
Igreja Católica, se reconhece que não devem discriminar ou marginalizar
essas pessoas.”
(Aurelio Mancuso)146
.
144
Representante da África do Sul na resolução apresentada na ONU. 145
Ministro do Supremo Tribunal Federal. -STF. 146
Presidente do Equality Italia, católico e representante do movimento homossexual italiano.
82
CAPÍTULO 3 – OS EFEITOS JURÍDICOS DA UNIÃO HOMOAFETIVA EM
ORDENAMENTOS DIVERSOS DO LUSO-BRASILEIRO
O sistema comparativo, no Direito, possibilita maior campo de visão para análise de
prováveis e improváveis consequências, diferentes formas e ideias para solucionar as questões
advindas dessas controvérsias ou dúvidas. E, inclusive, um maior número de casos que
favoreça, também, a análise social de como a questão é vista pela população mundial e o
acompanhamento da mudança da opinião pública quando esta existir. Sempre levando em
consideração o maior número de variáveis possíveis para que tenhamos um panorama mais
completo.
Para que esta intenção venha a se tornar realidade, não se pode restringir o estudo
apenas a países com características morais, econômicas e sociais parecidas, pois se corre o
risco de ter uma noção direcionada a um ou outro grupo de interesse. A união de diversas
culturas, povos, realidades sociais e econômicas nos traz uma visão mais próxima da
realidade, mesmo que não seja a mais conveniente.
A partir desta visão global e despida de qualquer conveniência, pode-se, então, fazer
comparações entre esses países e suas características em comum, de forma, talvez, a traçar um
subtópico dentro deste estudo. Uma possível linha estabelecendo entre eles uma explicação
comportamental ou moral que os una.
As leis de proteção às uniões e casamentos homossexuais vêm se espalhando pelo
mundo como consequência de novos pensamentos, nova visão e entendimento da situação
prática desses casais, como pode ser comprovado atualmente (Anexo A).
A falta de legislação não estava fazendo com que esse inicial “incômodo” social
diminuísse. As pessoas não deixaram de procurar sua felicidade, elas apenas estavam fora de
uma proteção estatal que deveria ser garantia fundamental a qualquer ser humano.
Neste entendimento, a população LGBT foi aumentando e se conscientizando de que
deveriam lutar para que seus direitos fossem garantidos e respeitados. Ao redor do mundo
comunidades inteiras, cada uma respeitando seu tempo de entendimento e de aceitação, foram
sendo orientadas ao respeito pelo que é diferente, ainda que esse não fosse entendido por
todos.
83
A realidade já existia, estava nas ruas, nas cidades, nos países e precisava ser
considerada e vista. Todos os desdobramentos oriundos das relações homoafetivas
precisavam ser protegidos e, principalmente, precisavam de uma organização, de protocolos,
tais quais os que existiam para organizar e regular as relações heterossexuais e suas
consequências.
As discussões se tornaram comuns, infindáveis e muitas vezes, divergentes. Tudo que
é novo e abala as estruturas conservadoras da sociedade enfrenta uma resistência enorme e
difícil que, em sua maioria, só é abrandada com muita discussão para esclarecimento das
várias nuances.
Tem-se, como exemplo dessas nuances, os filhos oriundos destas uniões, seus registros
civis, a situação do companheiro homossexual como herdeiro, a família com sua proteção
estatal, etc. Eram várias as dúvidas que, ao longo do tempo, foram sendo discutidas e sanadas.
A preocupação com os direitos humanos universais, a saúde mental dos envolvidos, o
direito de constituir família e principalmente a discriminação por orientação sexual, que é
vetada na grande maioria dos países atualmente, leva-se ao entendimento de que negar aos
casais do mesmo sexo o direito ao casamento e aos seus benefícios legais conexos representa
um retrocesso e uma afronta à evolução da sociedade e do respeito às diferenças, além de
estigmatizar e excluir esses casais.
De acordo com estudos e pesquisas telefônicas, eletrônicas e pessoais, feitas
periodicamente, desde o início da década de 90 até o ano de 2015, a aceitação popular ao
casamento homoafetivo vem crescendo de 10% para 60% proporcionalmente, e o
posicionamento contrário vem caindo. Mais de 70% de pessoas eram contrárias em 1990,
sendo que em 2015 tínhamos um percentual de menos de 40%, o que comprova uma
crescente humanização da sociedade em relação aos homossexuais e suas relações,
anteriormente não protegidas ou sequer reconhecidas. (Anexo B).
Após a aprovação do casamento entre pessoas do mesmo sexo em vários países, a
justiça, a facilidade e a formalidade ganharam força através de inúmeros casos de casamentos
efetivamente celebrados. (Anexo C).
A procura pelo direito de contraír matrimônio e pelo cumprimento das novas regras
que garantiam à comunidade LGBT vários direitos e reconhecimentos até então negados,
84
comprovam que o que os deixavava à margem era o preconceito social e a falta de legislação
que os incluísse. E não era, sob nenhuma hipótese, o caráter ‘furtivo, marginal e pervertido’
dos indivíduos dessa comunidade, como acreditava e difundiam os conservadores e
intolerantes, ideia que infelizmente ainda persiste nos dias de hoje, apesar de panoramas que
ilustram uma realidade diversa. (Anexo D).
Atualmente, 23 países permitem que pessoas do mesmo sexo se casem, como reporta
Aragão147
:
Holanda (2001) – Permite a adoção, o tratamento de fertilidade, participação na
herança, direito à pensão e o uso do sobrenome.
Bélgica (2003) - Permite a adoção, o tratamento de fertilidade, participação na
herança, direito à pensão e o uso do sobrenome.
Canadá (2005) - Permite a adoção, o tratamento de fertilidade, participação na
herança, direito à pensão e o uso do sobrenome.
Espanha (2005) - Permite a adoção, o tratamento de fertilidade, participação na
herança, direito à pensão e o uso do sobrenome.
África do Sul (2006) - Permite a adoção, o tratamento de fertilidade, participação na
herança, direito à pensão e o uso do sobrenome.
Noruega (2009) - Permite a adoção, o tratamento de fertilidade, participação na
herança, direito à pensão e o uso do sobrenome.
Suécia (2009) - Permite a adoção, o tratamento de fertilidade, participação na herança,
direito à pensão e o uso do sobrenome.
Argentina (2010) - Permite a adoção, o tratamento de fertilidade, participação na
herança, direito à pensão e o uso do sobrenome.
Islândia (2010) - Permite a adoção, o tratamento de fertilidade, participação na
herança, direito à pensão e o uso do sobrenome.
Portugal (2010) - Permite a adoção, o tratamento de fertilidade (exceto gestação por
substituição), participação na herança, direito à pensão e o uso do sobrenome.
Dinamarca (2012) - Permite a adoção, o tratamento de fertilidade, participação na
herança, direito à pensão e o uso do sobrenome.
Brasil (2013) - Permite a adoção, o tratamento de fertilidade, participação na herança,
direito à pensão e o uso do sobrenome.
147
ARAGÃO, Chico. União civil e casamento homoafetivo no mundo atual. [Em linha] 10 de Maio de 2011.
85
França (2013) – Não permite a adoção, não permite o tratamento de fertilidade,
permite participação na herança, permite o direito à pensão e não permite o uso do
sobrenome.
Nova Zelândia (2013) – Não permite a adoção, permite o tratamento de fertilidade, a
participação na herança, o direito à pensão e o uso do sobrenome.
Uruguai (2013) - Permite a adoção, participação na herança, direito à pensão e o uso
do sobrenome.
Escócia (2014) - Permite a adoção, o tratamento de fertilidade, participação na
herança, direito à pensão e o uso do sobrenome.
Inglaterra (2014) - Permite a adoção, o tratamento de fertilidade, participação na
herança, direito à pensão e o uso do sobrenome.
Luxemburgo (2014) - Não permite a adoção, não permite o tratamento de fertilidade,
permite participação na herança, permite o direito à pensão e não permite o uso do
sobrenome.
País de Gales (2014) - Permite a adoção, o tratamento de fertilidade, participação na
herança, direito à pensão e o uso do sobrenome.
Irlanda (2015) - Permite a adoção, o tratamento de fertilidade, participação na herança,
direito à pensão e não permite o uso do sobrenome.
Finlândia (2015) - Permite o tratamento de fertilidade, participação na herança, direito
à pensão e o uso do sobrenome.
Estados Unidos (2015) - Permite a adoção dependendo do estado, o tratamento de
fertilidade, participação na herança, direito à pensão e o uso do sobrenome.
Colômbia (2016) - Permite a adoção, o tratamento de fertilidade, participação na
herança, direito à pensão e o uso do sobrenome.148
3.1 CASAMENTO HOMOAFETIVO: EVOLUÇÃO AO LONGO DO TEMPO
Alguns países, mesmo antes de permitir o casamento civil entre pessoas do mesmo
sexo, já possuíam uma forma de regulamentar essas uniões e assegurar, minimamente, alguns
direitos aos indivíduos que conviviam em uma união homoafetiva. A seguir, pode-se verificar
alguns exemplos.
148
ARAGÃO (2011). Op. cit.
86
Holanda: Antes da liberação do casamento homossexual (2001), havia a lei de
parceria registrada, que poderia ser utilizada por todos os casais que não pudessem ou não
quisessem contrair matrimônio (casais de mesmo sexo ou de sexo diferentes). À época,
quando um dos companheiros homoafetivos tivesse um filho (natural ou adotivo), o outro
poderia adotá-lo e, então, seria responsável por alimentos caso o adotando necessitasse e este
seria herdeiro daquele em caso de falecimento, pois a lei de parceria não admitia a adoção
pelos casais homossexuais.
Noruega: A parceria registrada era aceita desde 1993 quando um dos parceiros era
norueguês, residente no país. Garantia, de forma geral, os mesmo direitos do matrimônio,
incluindo benefícios de segurança social, disposições fiscais, assistência mútua, herança e
pensão em caso de morte.
Suécia: Desde 1994 existe a Lei da Parceria Registrada não aberta para casais
heterossexuais. As obrigações e direitos são os mesmos do matrimônio.
Argentina: Antes de 2010, as uniões civis entre parceiros do mesmo sexo eram
reconhecidas anteriormente, em Buenos Aires, Província de Rio Negro e em Villa Carlos Paz
(Córdoba).
Islândia: A Lei de Parceria Registrada entrou em vigor em 1996. Para essa parceria,
exigia-se que pelo menos um dos companheiros possuísse cidadania islandesa e fosse
residente, ou que ambos morassem no país há mais de dois anos. O casal era obrigado ao
registro para convalidar a parceria e suas consequências se assemelhavam muito à lei
islandesa do casamento, em suas obrigações e direitos legais.
Dinamarca: Em 1989, o país foi pioneiro com a Danish Registered Partnership Act
for same-sex couples, regulada por vários instrumentos normativos dinamarqueses. Apesar de
vetar a adoção ou guarda conjunta e também o direito de casamento em igreja estatal, no
mais, a lei garantia os mesmos direitos do casamento e exigia as mesmas obrigações.
França: A união era feita através da PACS – Pacte Civil de Solidarité, desde 1999,
que exigia um registro e uma declaração e a escolha de um regime de bens, podendo ser
desfeita por uma declaração conjunta ou unilateral, porém com a ciência do parceiro.
Nova Zelândia: O país teve quatro propostas de lei para regularização de casais
homoafetivos em 2002. A 1ª garantia o mesmo regime de casais casados com relação à
87
propriedade, em caso de separação; a 2ª e a 3ª garantiam o direito sucessório análogo aos dos
cônjuges, se não houvesse testamento e a possibilidade de reclamar a herança do parceiro; e a
4ª assegurava alimentos em caso de separação.
Uruguai: A lei que regulamenta a união livre ou o concubinato homoafetivo existe
desde 2008 para casais do mesmo sexo que convivam há mais de 5 (cinco) anos. A lei versa,
em sua maior parte, sobre direitos previdenciários.
Luxemburgo: Homologou a Lei de Parcerias Civis Registradas, a partir de 2004. Os
direitos e deveres eram os mesmos dos casais unidos pelo casamento.
Reino Unido (Escócia, Inglaterra, País de Gales): Desde 2004 se guia pelo Civil
Partnership Act. Assegura quase todos os mesmos direitos do casamento, sem, no entanto,
equiparar-se a este: direitos de propriedade, seguridade social, visitas em hospital, isenção de
impostos sobre herança, pensões, etc.
Estados Unidos da América: A aceitação de uniões entre pessoas do mesmo sexo
eram feitas de acordo com a regulamentação de cada estado americano, como Califórnia,
Colorado, Distrito de Columbia, Illinois, Maine, Nova Jersey, Nevada, Oregon, Vermont,
Washington e Wisconsin.
3.2 PAÍSES QUE TENHAM LEIS DE UNIÃO HOMOAFETIVA DIFERENTES DO
CASAMENTO
Quadro 1 - Normas nos países que aceitam a união homossexual.
País Lei Ano Exige
registro?
Alguns detalhes sobre os
ordenamentos
Assegura Não Assegura
Alemanha Parceria de
Vida
2000/
2001
* Adotar sobrenome
do parceiro;
* Não tem
responsabilidade
parental
compartilhada;
* escolher o regime
de bens;
* Não tem dto a
adoção
conjunta;
* Separação do
casal;
* Não tem
acesso às
técnicas de
88
PMA;
*Suporte financeiro
mútuo;
*Não tem
benefícios
tributários
análogos aos do
matrimônio
* Alguns direitos
relacionados à
guarda e cuidados de
crianças dos
parceiros
Andorra Unió estable de
parella 2005 Sim.
* Os mesmos
direitos que os
cônjuges para efeitos
da lei,
responsabilidades
para com o outro,
alimentos,
separação, segurança
social e trabalhista,
Colômbia
2007/
2009
* Os mesmos
direitos que os casais
não casados.
Croácia
2003
* Os mesmos
direitos que os casais
não casados. (ex:
suporte mútuo, Dto à
propriedade conjunta
e Dto à herança)
Eslovênia Lei de parceria
registrada
2005/
2006 Sim
* Relações
patrimoniais entre os
parceiros;
* Alimentos após
ruptura, caso
necessário;
* Alguns direitos
sucessórios
* Não tem dtos
de Segurança
Social (pensões)
* Não tem dto
como
dependente em
seguros saúde;
* Não tem
qualificação
como parente
mais próximo
Finlândia Parcerias Civis 2001/
2002
Groelândia Lei de parceria
registrada 1994 Sim
* Lei de parceria
registrada da
Dinamarca foi
estendida à
Groelândia.
89
Hungria Lei de parceria
registrada 2009 Sim
* Relações
patrimoniais entre os
parceiros (as
mesmas do
casamento);
* Direitos
sucessórios iguais
aos do cônjuge;
* Regime de bens de
comunhão universal
– como no
matrimônio
*Não podem
utilizar o
sobrenome do
parceiro;
*Não têm
direito à adoção
conjunta;
*Não podem
adotar o filho do
parceiro.
Israel Reputed
Spouses Sim
* Relações
patrimoniais entre os
parceiros (as
mesmas do
casamento);
* Direitos
sucessórios iguais
aos do cônjuge;
* Regime de bens de
comunhão universal
– como no
matrimônio
*Questões de
casamento e divórcio
são de competência
do tribunal religioso,
que não reconhecem
uniões entre iguais.
*Não podem
utilizar o
sobrenome do
parceiro;
*Não têm
direito à adoção
conjunta;
*Não podem
adotar o filho do
parceiro.
*Não têm
direito de
registrar
parceria.
Luxemburgo Parcerias Civis
registradas 2004 Sim
* Direito análogos
aos do casamento
República
Tcheca
Lei de parceria
registrada 2006 Sim
* Direito análogos
aos do casamento,
como: Alimentos,
herança, visitação
em hospital.
Suíça
Lei de parceria
registrada
(LPart)
2007 Sim * Direito análogos
aos do casamento
Fonte: Elaborado pela autora (2016).
3.3 PAÍSES ONDE A HOMOSSEXUALIDADE É PROIBIDA E PUNIDA
Da mesma maneira que se pode ver a evolução incessante no sentido de tornar as
relações homoafetivas mais aceitas, compreendidas e respeitadas socialmente, aproximando-
se cada vez mais do ideal de não haver discriminação entre as relações homo e heterossexuais,
90
também há um rol de países com visão retrógrada, desrespeitosa e, pior, extremista no que
tange a homossexualidade. Caso dos Estados a seguir que, de alguma forma, punem os
indivíduos membros desta comunidade e suas relações. (Anexo E).
Atualmente são 15 os países mais intolerantes com os casais homossexuais, onde os
direitos são inexistentes e sua prática é punida:
Maldivas: Para os homens, as penas variam de 10 a 30 chicotadas até o exílio, que
pode durar de 9 (nove) meses a um ano; e para as mulheres, a pena é de prisão
domiciliar de 9 meses a 1 ano.
Tanzânia: Detenção de 30 anos à prisão perpétua para homens, e multa ou detenção
por 5 (cinco) anos para mulheres.
Qatar: Até 7 (sete) anos de detenção para homens que não sejam muçulmanos. Para
muçulmanos, execução.
São Cristóvão e Neves: Até 10 anos de trabalhos forçados.
Ilha Nauru: Até 14 anos de trabalhos forçados.
Nigéria: Pena de morte para homens, e chibatadas e/ou detenção para mulheres em 12
estados. No resto do país, até 14 anos de prisão.
Sudão: Chibatadas e prisão; caso reincida, prisão perpétua ou execução.
Serra Leoa: Prisão perpétua.
Emirados Árabes Unidos: Prisão, multas e/ou pena de morte.
Irã: Pena de morte para homens, e chibatadas para mulheres.
Somália: Morte por apedrejamento ao sul e até 3 anos de prisão no resto do país.
Mauritânia: Morte por apedrejamento para homens.
Arábia Saudita: Exílio, chibatadas ou morte por apedrejamento.
Iêmen: Até 7 anos de prisão, 100 chibatadas e/ou morte por apedrejamento.
91
Uganda: Prisão perpétua, tortura e execução.
3.4 A ADOÇÃO POR CASAIS HOMOSSEXUAIS NO MUNDO
Os países que consideram legal a adoção bilateral por casais homoafetivos são: Países
Baixos/Holanda, Suécia, Espanha, Andorra, Bélgica, França, a Nova Zelândia, Luxemburgo,
Malta, a Irlanda, Eslovênia, Islândia, a Noruega, a Dinamarca, a Inglaterra, o Reino Unido
(Inglaterra e País de Gales, Escócia e Irlanda do Norte), África do Sul, Israel, Uruguai,
Argentina, Colômbia, Brasil e Portugal. Estados Unidos, Canadá, México e Austrália
costumam analisar por região. (Anexo F).
Com este último capítulo, entende-se por terminado o estudo, onde se pretendeu
mostrar, do ponto de vista jurídico, os efeitos do instituto da sucessão nos ordenamentos
jurídicos luso-brasileiro (nos dois primeiros capítulos), assim como tentar traçar um panorama
mundial a respeito da situação legal dos relacionamentos homoafetivos (neste terceiro
capítulo).
92
CONCLUSÃO
A contínua batalha para aceitar, respeitar, reconhecer e legalizar a situação das
relações homoafetivas e suas consequências nos âmbitos jurídico, burocráticos e inclusive no
cotidiano dos sujeitos que compõem esta comunidade, teve inúmeros avanços.
Por isso mesmo, não se pode diminuir passos que demoraram décadas para serem
alcançados. Mesmo que a situação atual ainda não seja a ideal ou a almejada pelos casais
homossexuais, as vitórias foram reais e são motivo de orgulho e comemoração sem, no
entanto, ser possível deixar de lado o reconhecimento do que é justo e sua concretude nos
diplomas legais.
Como se viu no terceiro capítulo deste trabalho, há países que sempre comungaram de
um senso mais humano e justo na forma de encarar a união homoafetiva - seja como união
estável ou casamento civil – e seus desdobramentos e esperadas consequências jurídicas.
Como, por exemplo, o reconhecimento social dessa forma de família, a possibilidade e as
opções de se ter uma prole própria do casal, biológica ou adotada, ou mesmo a situação dessa
família em caso de falecimento de um dos companheiros ou cônjuge.
Essas questões não são apenas subitens que podem ser discutidos “em um outro
momento no futuro”; são a realidade diária de milhões de pessoas que precisam se preocupar
com sua dignidade humana e direitos básicos, como o direito à vida e identidade, dentre
outras coisas, para garantir sua existência social, familiar e legal.
Maria Berenice Dias149
divide os países, com base no tratamento e direitos concedidos
aos casais homoafetivos, em três grupos: o grupo de extrema repressão (proíbem e/ou
penalizam de alguma forma, até mesmo com a morte); grupo intermediário (não proíbem e/ou
concedem direitos relativos e/ou tratam de uma forma mais respeitosa, porém não igualitária
aos casais heterossexuais); e o grupo expandido (tratam da mesma forma que os casais
heterossexuais).
Felizmente, mais países estão deixando o grupo intermediário e passando para o
expandido. Porém, da mesma forma, existe o grupo dos países que exercem tremenda
repressão à prática homossexual e, consequentemente, não reconhece nenhum de seus
149
DIAS, Maria Berenice. União homossexual Aspectos sociais e jurídicos. [Em linha]. [Consult. 03 Mar.
2016]. Disponível em http://www.mariaberenice.com.br.
93
direitos, impondo penalizações, com prisão perpétua, chibatadas e até morte para pessoas que
pratiquem ou façam apologia ao homossexualismo.
Colocando em foco os países do grupo intermediário e do grupo expandido, percebe-
se a possibilidade atual de o processo de sucessão do companheiro homoafetivo ser muito
próximo, ou mesmo igual, ao dos cônjuges heterossexuais. Podendo dessa forma, em caso de
sucessão, o companheiro vir a concorrer com os filhos do parceiro, com os filhos em comum
ou com os ascendentes, dependendo do caso e dependendo do regime de bens adotado pelo
casal.
Os casais homoafetivos não requerem nada além do que os casais heterossexuais já
possuem desde antes do início da sociedade organizada: a liberdade de casar com a pessoa
que ama e constituir família.
Em Portugal, por exemplo, houve um avanço muito pertinente em relação ao
casamento homossexual, mas, por outro lado, a proibição da adoção e o silêncio sobre o
acesso aos métodos de reprodução assistida eram até pouco tempo um retrocesso
desnecessário e descabido que afastava ainda mais o país do princípio da Igualdade.
Deixar as crianças prioritariamente em orfanatos, muitas vezes longe de qualquer
noção de lar, de afeto, não parecia, nem de longe, ser a atitude mais benéfica àquelas crianças.
Nesse foco, o estudo e a análise não devem priorizar a orientação sexual dos pais, mas as
possibilidades abertas à criança em ter um lar e pais, independente de sua orientação sexual,
entre outros incontáveis benefícios.
Na continuidade de sua esperada evolução, pode-se dizer, afinal, que Portugal
consertou esses dois equívocos no ano de 2016, ao aprovar o instituto da adoção por casais do
mesmo sexo e também dar acesso aos métodos de reprodução assistida aos mesmos,
mantendo a restrição apenas ao tratar da gravidez por substituição. Essa deve ser feita apenas
nos casos em que haja um empecilho médico para que ocorra.
No Brasil, a questão dos relacionamentos homoafetivos e a constituição de família têm
sido resolvidas através de decisões judiciais as quais reconheceram a legalidade da adoção por
casais homoafetivos, dando-lhe legitimidade jurídica, antes mesmo de reconhecer o direito ao
casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.
94
E, nessa linha, as decisões judiciais brasileiras, atualmente, têm seguido o caminho dos
países do grupo dos expandidos, ao unir o direito à adoção ao direito legítimo do casamento,
que ainda é tão importante para a configuração e aceitação como família na sociedade.
No que diz respeito aos direitos sucessórios dos casais homoafetivos, mais
especificamente, pode-se afirmar que o ordenamento jurídico português estaria à frente do
ordenamento jurídico brasileiro do ponto de vista da segurança jurídica, uma vez que existe
legislação própria que trata da questão sucessória para os casais homoafetivos, equiparando-
os aos casais heterossexuais. No Brasil, a legislação que trata de sucessão tem problemas de
redação e de interpretação até mesmo entre casais heterossexuais que estejam sob a legislação
que trata de união estável (ou união de facto como nominada em Portugal); tal situação, ao ser
aplicada, através de decisões jurisprudenciais, aos casais homossexuais, mesmo aos casados
civilmente (também por decisões jurisprudenciais), termina por mostrar sérias lacunas e
desigualdades em face dos casais heterossexuais, fazendo com que o companheiro
homoafetivo supérstite ainda não tenha seus direitos equiparados aos do companheiro
heterossexual supérstite.
Mas, de maneira geral, no mundo, há um movimento cada vez mais forte, mais intenso
e mais insistente na conquista dos direitos homossexuais, rompendo barreiras geográficas,
temporais, sociais e principalmente barreiras na consciência individual do cidadão, matéria
prima para a construção da consciência social como um todo.
Pode-se então finalizar este trabalho afirmando que se todos os seres humanos têm os
mesmos direitos, no mundo jurídico, por ter a pacificação social como base e justificativa para
a existência do Direito, não se pode aceitar o tratamento discriminatório em razão tão somente
da sexualidade da maioria ou de preconceito para com os casais homoafetivos. Veja que “O
reconhecimento da dignidade intrínseca e dos direitos iguais e inalienáveis de todos os
membros da família humana é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz do mundo”150
.
Logo, isso, nada mais é do que o reconhecimento da igualdade tão prefalada nos “Direitos do
Homem e do Cidadão” da Revolução Francesa, cujo ideário foi abraçado e desenvolvido na
Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU151
:
“Artigo 1.º
150
DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS. [Em linha]. Brasil.[Consult. 03 Abr. 2016]
Disponível em http://www.dudh.org.br/declaracao/ 151
Id.
95
Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados
de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de
fraternidade.
Artigo 2.º
Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na
presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, cor, sexo,
língua, religião, opinião política ou outra, origem nacional ou social, fortuna,
nascimento ou outro estatuto.
Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico
ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou
território independente, sob tutela, autónomo ou sujeito a alguma limitação de
soberania.
Artigo 3.º
Todas as pessoas têm direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.
(...)
Artigo 6.º
Todos os indivíduos têm direito ao reconhecimento como pessoa perante a lei.
Artigo 7.º
Todos são iguais perante a lei e, sem qualquer discriminação, têm direito a igual
proteção da lei. Todos têm direito a proteção igual contra qualquer discriminação
que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.”
96
REFERÊNCIAS
FONTES LEGISLATIVAS
ONU
Declaração Universal dos Direitos Humanos
Portugal
Constituição da República Portuguesa
Lei n° 37/1981, de 3 Outubro
Lei n° 47/1998, de 10 de Agosto
Lei nº 135/1999, de 28 de agosto
Lei nº 6/2001
Lei nº 7/2001, de 11 de Maio
Lei Orgânica n.° 2/2006, de 17 de abril
Li nº 32/2006, de 26 de julho
Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro - Código do Trabalho
Lei nº 23/2010, de 30 de Agosto
Lei nº 41/2013, de 26 de Junho – Novo Código de Processo Civil Português
Lei nº 2/2016, de 29 de Fevereiro
Lei n° 17/2016, de 20 de Junho- Procriação Medicamente Assistida- PMA
97
Decreto-Lei nº 47.344/1966, de 25 de novembro – Código Civil Português
Decreto-Lei n° 142/1973, de 31 de março
Decreto-Lei n° 322/1990, de 18 Outubro
Decreto-Lei nº 1908/2001
Decreto-Lei n°, 237/2006
Projeto de Lei nº 278/XII, de 2011
BRASIL
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
Decreto-Lei n.° 2.681/1912, de 07 de Dezembro
Decreto-Lei n.° 4.737/1942, de 24 de Setembro
Decreto nº 3.048/1999, de 6 de Maio
Lei nº 3.071/1916, de 1º de janeiro - Código Civil (1916)
Lei nº 8.212/1991, de 24 de Julho
Lei nº 8.213/1991, de 24 de Julho
Lei nº 8.971/1994, de 29 de Dezembro
Lei n° 9.278/1996, de 10 de Maio
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Provimento n.º 52/2016
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105
ANEXOS
106
ANEXO A – Leis de proteção em 2016: orientação sexual
Figura 1: Leis de proteção à orientação sexual no mundo.
Fonte: ILGA (2016). Disponível em: < http://www.ilga-portugal.pt/ilga/index.php
107
ANEXO B - Apoio a união homoafetiva até 2015
Gráfico 1 – Tendência de apoio ao casamento homoafetivo.
Fonte: Mercado Poppular (2015).
Disponível em: <http://mercadopopular.org/2015/06/por-que-tantas-empresas-estao-manifestando-apoio-ao-
casamento-gay/.>
108
ANEXO C – Crescem casamentos homoafetivos
Gráfico 2 – Taxa de crescimento do casamento homoafetivo.
Fonte: Jornal GGN
Disponível em: http://jornalggn.com.br/blog/gunter-zibell-sp/casamento-gay-uniao-homoafetiva-pequena-
retrospectiva.
109
ANEXO D – Casamento e união homoafetiva de 2012 a 2015, no mundo
Figura 2 – Situação do casamento e união homoafetiva no mundo em 2012.
Fonte: Opiinião&Notícia (2012).
Disponível em: <http://opiniaoenoticia.com.br/internacional/mundo-caminha-para-a-aceitacao-do-casamento-
gay/.
Figura 3 – Situação do casamento e união homoafetiva no mundo em 2013.
Fonte: CENBrasil (2013).
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110
Figura 4– Situação do casamento e união homoafetiva no mundo em 2014.
Casamento homoafetivo legalizado União do mesmo sexo Uniões reconhecidas
Uniões não reconhecidas ou criminalizadas Homossexualidade criminalizada
Pena de morte
Fonte: Map Interactive
Disponível em: http://createhtml5map.com/interactive-map-blog/tag/same-sex-marriage/
Figura 5 – Situação do casamento e união homoafetiva no mundo em 2015.
Fonte: TheJounal.ie
Disponível em:http://www.thejournal.ie/gay-rights/news/.
111
ANEXO E – Países que proibem o homossexualismo
Figura 8 – Países onde é proibido ser homossexual.
Fonte: ILGA (2016).
Disponível em: http://www.ilga-portugal.pt/ilga/index.php
112
ANEXO F - Adoção por casais homoafetivos
Figura 9 - Adoção por casais homoafetivos no mundo.
Fonte: Âmbito Jurírico/ILGA (2014).
http://ambito- uridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=15914
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