direito penal econômico

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DIREITO PENAL Parte geralDireito Penal Econômico   Prof. Paulo Ricardo Suliani Especialista em Direito Penal e Processo Penal (Uniritter)Mestre em Ciências Criminais (PUCRS)pauloricardo@suliani.com.br

1

• Introdução ao Direito Penal e à Criminalidade Econômica• Sonegação Fiscal• Crimes contra a Ordem Tributária• Evasão de Divisas• Lavagem de Dinheiro• Lei anticorrupção

• Doutrina, Jurisprudência, Debate crítico

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FUNDAMENTOS, PRINCÍPIOS E FINALIDADES DE DIREITO PENAL

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A liberdade

• Com a liberdade ocorre o mesmo que com a verdade. (Hassemer).

• Isso quer dizer que, no mundo das experiências, existem inúmeras possibilidades de interpretações, porque o pressuposto óbvio para essa possibilidade de interpretação é a liberdade.

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• A liberdade não é absoluta, todavia, porque a relação entre os seres humanos implica a sua aproximação e consequente tensão. No Direito Penal, com base em princípios que o tornem racional, deve-se discutir sobre como podem ser produzidas as aproximações à liberdade.

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Objetivos do Direito Penal

• O Direito Penal possui objetivos declarados, identificados pelo discurso da teoria da pena, e objetivos reais, ou latentes, identificados pelo discurso crítico. O discurso oficial é a proteção de bens jurídicos, valores relevantes para a vida humana individual ou coletiva, sob a ameaça da pena (a vida, a integridade e saúde corporais, a honra, a liberdade individual, o patrimônio etc.)

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• Contudo, a proteção de bens jurídicos realizada pelo Direito Penal é de natureza subsidiária e fragmentária, ou seja, o Direito Penal é a ultima ratio. Aqui se fala do princípio da proporcionalidade, pelo qual não se pune criminalmente bens jurídicos de mínimo desvalor, tampouco se pode punir de forma que a pena seja desproporcional à lesão perpetrada ao bem jurídico.

• Verificar, todavia, os objetivos reais do Direito Penal implica em verificar a ideologia reinante quando da produção da norma incriminadora. As relações de produção, a cultura vigente, a política dominante etc.

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Princípios de Direito Penal

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A culpabilidade

• Não há crime, tampouco pena, sem culpabilidade.

• Nullum crimen sine culpa e nulla poena sine culpa.

• A sua função, pois, é a de ser fundante do próprio poder punitivo, postulando que a retribuição ao crime seja proporcional à reprovabilidade do mal cometido, de acordo com a liberdade do autor de assim ter agido. A natureza da culpabilidade, por sua vez, se deixa caracterizar com mais acerto com a palavra reprovabilidade.

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• É de Bettiol o conceito de que “culpa é um juízo de reprovação pessoal pela perpetração de um fato lesivo de um interesse penalmente protegido”.

• Já conforme Welzel, é aquela qualidade da ação antijurídica que possibilita se faça uma reprovação ao autor; e, na ordem jurídica, está presente no que se chama de reprovação de culpabilidade e a culpabilidade como juízo de culpabilidade.

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• O autor deve ter conhecido o injusto da sua ação realizada, ou, no mínimo, deve ter podido conhecer e poder determinar-se de acordo com esse entendimento (real ou possível). A reprovabilidade é constituída, portanto, tanto pela capacidade de culpa quanto pelos elementos intelectuais de vontade. (Welzel)

• Somente ali onde o Direito Penal pode esperar que um fim penal preventivo (a ressocialização do autor, a intimidação do potencial autor, a estabilização da consciência normativa da população) é que pode ser razoável reprovar ao autor o seu desvio de um poder geral de agir de outro modo: de pronunciar um juízo de culpabilidade. (Hassemer) 11

Princípio da Legalidade

• O único princípio que nos outorga verdadeira garantia e nos leva a evitar que possamos ser sancionados pelo que já fizemos e a estabelecer que somente possamos ser castigados pelas ações que estão descritas, circunscritas e da forma mais precisa definidas em lei penal; e a punição, é claro, deverá ser somente a já prevista na lei.

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• Trata-se de direito fundamental, sendo que, o principio da reserva legal possui fulcro constitucional encontrando-se previsão legal no artigo 5º, XXXIX, da Carta Magna.

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• Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)

• XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;

• (...)

14

• Portanto, não há crime sem Lei Ordinária ou Complementar.

• MP, LO, RESOLUÇÃO, PORTARIAS NÃO PODEM CRIAR CRIMES NEM COMINAR PENAS.

• Há casos porém, em que a MP é favorável ao réu.• Exemplo: MP que extingue a punibilidade por pagamento de

tributo.

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• O Princípio da reserva Legal, encontra-se também, previsto no artigo 1º do CP.

• Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

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• O artigo 62 da Constituição Federal veda Medida Provisória acerca de matéria penal.

• Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001).

• §1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)

• I - relativa a: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001) a) nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001) b) direito penal, processual penal e processual civil; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)

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Postulados do princípio da legalidade• a) Lex Praevia• Refere-se ao princípio da anterioridade. É a necessidade de lei

anterior ao fato que se quer punir, vale tanto para o crime quanto para a pena. Tem-se como exemplo o artigo 47, V do CP.

• Historicamente, a cola eletrônica, por ausência de previsão legal era denunciada como crime de estelionato ou falsidade ideológica. O STF já se manifestou afirmando que a cola eletrônica não é falsidade ideológica nem estelionato. Assim até 14.12.2011 a cola eletrônica era considerada um fato atípico.

• Porém, atualmente, a cola eletrônica está enquadrada no artigo 311-A do CP.

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• Não se trata de estelionato porque o estelionato é um crime patrimonial e não um crime contra a incolumidade pública. Não é falsidade ideológica porque o sujeito está inserindo algo que é verdadeiro.

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• b) Lex Stricta• Veda-se no direito penal a analogia in malam partem. Durante

muitos anos vigeu a Súmula 174 do STJ (Cancelada - RESP 213.054-SP - 24/10/2001.)

“Roubo - Arma de Brinquedo - No crime de roubo, a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento de pena.”

• Esta súmula consagrava a analogia in malam partem. Em razão deste fundamento a súmula foi cancelada. Dessa forma, o Direito Penal só admite a analogia in bonan partem.

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• c) Lex Scripta• Não se admite o costume incriminador em direito penal.

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• d) Lex Certa• É o princípio da taxatividade, no sentido de que o tipo penal

deve ser claro, preciso, certo e determinado, assim, se não for claro, poderá ser complementado pelo juiz.

• Tem-se como exemplo a Lei 7170/87, que aplica-se aos Black blocs.

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• LEI Nº 7.170, DE 14 DE DEZEMBRO DE 1983.

• Art. 20 - Devastar, saquear, extorquir, roubar, seqüestrar, manter em cárcere privado, incendiar, depredar, provocar explosão, praticar atentado pessoal ou atos de terrorismo, por inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas.

• Pena: reclusão, de 3 a 10 anos. Parágrafo único - Se do fato resulta lesão corporal grave, a pena aumenta-se até o dobro; se resulta morte, aumenta-se até o triplo

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• nullun crimen, nulla poena sine lege• nullum crime sine lege certa• nullum crimen sine lege praevia• nullum crimen sine lege scripta• nullum crimen sine lege stricta• nullum crimen nulla poena sine lege necessariae.

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• O legislador nacional-socialista, em 1935, opôs ao princípio “não há crime sem lei; não há pena sem crime” (nullum crimen sine lege, nulla poena sine crimine: nulla poena sine lege) o princípio autoritário “não há crime sem pena” e tenha formulado em sua legislação penal que:

“será punido quem comete um ato que a lei declara como punível ou que merece pena de acordo com a ideia fundamental da lei penal e de acordo com o são sentimento do povo”.

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Princípio da Proporcionalidade

• No caso da utilização do princípio da proporcionalidade como proibição de excesso, entende-se como a apreciação da necessidade e da adequação da providência legislativa. Por tal motivo, uma lei será inconstitucional por infringir esse princípio se possível for identificar a existência de outras medidas menos lesivas.

• A proporção adequada torna-se, assim, condição de legalidade

e, portanto, a pena, além de proporcional ao crime, deve ser adequada, legítima e, obrigatoriamente, não excessiva.

• A pena criminal é a mais adequada? É necessária?

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• Necessidade, adequação e proporcionalidade são “parcelas” do princípio da proporcionalidade, pois necessidade implica dizer se um princípio tem mais ou menos peso em certa situação conforme as circunstâncias da situação tornem o valor que ele tutela ou promove mais ou menos necessário; adequação significa dizer que um princípio deve ser aplicado a uma situação quando é adequado para ela; e proporcionalidade em sentido estrito, onde “os ganhos devem superar as perdas”.

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• “O princípio da exigibilidade, também conhecido como o princípio da necessidade ou da menor ingerência possível coloca a tônica na ideia de que o cidadão tem o direito à menor desvantagem possível. Assim exigir-se-ia sempre a prova de que, para a obtenção de determinados fins, não era possível adoptar outro meio menos oneroso para o cidadão” (José Canotilho)

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• Toda pena que não derive da necessidade absoluta, é tirânica. (Montesquieu)

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Princípio da lesividade

• Proíbe a cominação, a aplicação e a execução de penas em hipóteses de lesões irrelevantes, tanto quanto à natureza do bem jurídico quanto à extensão dessa lesão.

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• O Princípio da Lesividade ou da Ofensividade (nullum crimen sine iniuria) no Direito Penal exige que do fato praticado ocorra lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado .

• Daí decorre que, no direito brasileiro, não se pune quem pratica a autolesão, como o sobrevivente da tentativa de suicídio.

• E o consumo de drogas?

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Parte da doutrina afirma que há exceções:

• Os crimes autônomos, como os crimes de posse de petrechos para falsificação de moeda e de associação criminosa, pois haveria a consumação do tipo penal com um mero ato preparatório, e o conluio de agentes visando futura prática de crime, o qual não foi ainda executado.

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Princípio da responsabilidade penal pessoal

• Limita a responsabilização aos autores e partícipes do fato punível, seres humanos de “carne e osso”.

• Vinculado ao princípio da legalidade e da culpabilidade.

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• Tal princípio está previsto no art. 5º, XLV da CF. Também denominado princípio da intranscendência ou da pessoalidade ou, ainda, personalidade da pena, preconiza que somente o condenado, e mais ninguém, poderá responder pelo fato praticado, pois a pena não pode passar da pessoa do condenado.

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Princípio da insignificância• Também conhecido como princípio da bagatela.• Natureza jurídica: trata-se de causa de exclusão da tipicidade

material, uma vez que o comportamento do agente não ofende o bem tutelado que justifique a intervenção do direito penal.

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Requisitos Objetivos (cf. STF e STJ)• A) Mínima Ofensividade da Conduta do Agente• B) Nenhuma Periculosidade Social da Ação• C) Reduzido Grau de Reprovabilidade do Comportamento• D) Inexpressividade da Lesão Jurídica Provocada

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A caracterização da infração penal como insignificante não abarca considerações de ordem subjetiva: ou o ato apontado como delituoso é insignificante, ou não é. E sendo, torna-se atípico impondo-se o trancamento da ação penal por falta de justa causa. (STF, AG 559.904/RS).

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O fato do valor de R$ 40,00 (quarenta reais) que o paciente subtraiu ser inferior ao valor do salário mínimo, por si só, não autoriza a aplicação do princípio da insignificância, eis que não se pode confundir o pequeno valor do objeto material do delito com a irrelevância da conduta do agente. No caso em tela, a lesão se revelou significante não obstante o bem subtraído ser inferior ao valor do salário mínimo. Vale ressaltar, que há informação nos autos de que o valor ‘subtraído representava todo o valor encontrado no caixa, sendo fruto do trabalho do lesado que, passada a meia-noite, ainda mantinha o trailer aberto para garantir uma sobrevivência honesta’. Portanto, de acordo com a conclusão objetiva do caso concreto, entendo que não houve inexpressividade da lesão jurídica provocada. (STF, RHC n. 96.813/RJ)

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• A aplicação do princípio da insignificância também não é possível considerada a contumácia do paciente na prática do crime de furto. Em que pese a ausência de decisões condenatórias transitadas em julgado, sua folha de antecedentes criminais é expressiva de prática reiterada desses delitos. (STF, RHC n. 96.813/RJ)

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• Pode-se conceder o benefício se o réu for reincidente?

• Há 2 entendimentos:• 1) O STF, de forma majoritária, não concede o benefício ao

reincidente.• 2) O STJ apresenta decisões divergentes, uma vez que a 5ª

Câmara, que é a mais rigorosa, NEGA provimento enquanto a 6ª Câmara, mais flexível, CONCEDE.

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• Além das 4 condições objetivas é necessário algum requisito subjetivo?

• Divergência.

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• Não incide: STF, HC 115869, j. 09/04/2013.• EMENTA Habeas corpus. Processual Penal. Descaminho (CP, art. 334, §

1º, d). Trancamento da ação penal. Pretensão à aplicação do princípio da insignificância. Contumácia na conduta. Não cabimento. Ausência de constrangimento ilegal. Ordem denegada. 1. Embora seja reduzida a expressividade financeira do tributo omitido ou sonegado pelo paciente, não é possível acatar a tese de irrelevância material da conduta por ele praticada, tendo em vista ser ela uma prática habitual na sua vida pregressa, o que demonstra ser ele um infrator contumaz e com personalidade voltada à prática delitiva, ainda que, formalmente, não se possa reconhecer, na espécie, a existência da reincidência. 2. Conforme a jurisprudência da Corte, “o reconhecimento da insignificância material da conduta increpada ao paciente serviria muito mais como um deletério incentivo ao cometimento de novos delitos do que propriamente uma injustificada mobilização do Poder Judiciário” (HC nº 96.202/RS, Primeira Turma, Relator o Ministro Ayres Britto, DJe de 28/5/10). 3. Ordem denegada. (HC 115869, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 09/04/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-084 DIVULG 06-05-2013 PUBLIC 07-05-2013)

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• Incide: STJ, 6ª Turma, AgRg no AREsp 310580, j. 28/05/2013.

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. REINCIDÊNCIA. POSSIBILIDADE. 1. A existência de condições pessoais desfavoráveis, tais como maus antecedentes, reincidência ou ações penais em curso, não impedem a aplicação do princípio da insignificância. 2. Não trazendo o agravante tese jurídica capaz de modificar o posicionamento anteriormente firmado, é de se manter a decisão agravada na íntegra, por seus próprios fundamentos. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.

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• Crimes que NÃO aceitam a aplicação do princípio da insignificância:

• 1) Crimes praticados com violência ou grave ameaça à pessoa.• 2) Moeda falsa (como tutela-se fé pública e não patrimônio

não admite o princípio da insignificância).• 3) Tráfico de drogas. O tráfico não admite a aplicação do

principio da insignificância, mesmo que o seja apreendido com uma quantidade pequena de droga.

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• ATENÇÃO: O crime de contrabando NÃO admite aplicação do princípio da insignificância, SOMENTE em caso de DESCAMINHO.

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• Em relação à Sonegação Fiscal, a Lei 10.522/2002, recentemente, em março de 2014, o STJ decidiu que não haverá sonegação fiscal para valores até R$ 10.000,00 por considerar esse valor insignificante.

• Considerando-se que o direito penal é a ultima ratio, e que a prima ratio (direito administrativo) não tem interesse de executar, o direito penal não poderá atuar no sentido de punir o crime de descaminho com sonegação do valor de até R$ 10.000,00.

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• A Portaria do Ministério da Fazenda, através do Ministro Guido Mantega, nº 75/2012, no artigo 1º, inciso II, aumentou o valor para R$ 20.000,00. Os TRFs aplicam a portaria.

• Mas o STJ não encampa a tese dos TRFs, afirmando que uma portaria não pode revogar uma lei, assim, deixa de aplicar o patamar de R$ 20.000,00, mantendo a aplicação do princípio da insignificância para o crime de descaminho com valor até R$ 10.000,00.

• Dessa forma, a fazenda NÃO vai executar o crédito se o valor sonegado não superar R$ 20.000,00, mas há crime se superior a R$ 10.000,00.

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• Suspensa decisão que afastou valor para insignificância em crime tributário. O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar no Habeas Corpus (HC) 121655 para suspender decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que determinou o prosseguimento de ação penal na qual o réu foi acusado da prática do crime de descaminho. Ao julgar recurso, o STJ cassou decisão da Justiça Federal do Parará que absolveu o acusado com base no princípio de insignificância, em razão do valor de tributo não recolhido aos cofres públicos ser inferior a R$ 20 mil. (...) A decisão do STJ entendeu que se aplica como valor máximo para a declaração de insignificância aquele fixado no artigo 20 da Lei 10.522/2002, de R$ 10 mil. A decisão da primeira instância, mantida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), utilizou como parâmetro o valor de R$ 20 mil, fixado pela Portaria 75/2012 do Ministério da Fazenda, como limite mínimo para o ajuizamento de execuções fiscais. Em sua decisão, o ministro Luiz Fux faz uma ressalva à utilização de critérios objetivos para o reconhecimento da insignificância, a fim de que se evite a impunidade e se estimule a criminalidade. “A aplicação do princípio da insignificância deve ser precedida de criteriosa análise de cada caso, a fim de se evitar que sua adoção indiscriminada constitua verdadeiro incentivo à prática de pequenos delitos patrimoniais”, afirmou. Ao conceder a liminar requerida pela Defensoria Pública da União, o ministro menciona precedentes do STF que consideraram como limite para avaliação da insignificância o valor de R$ 20 mil, citando decisões da Primeira Turma (HC 120617) e da Segunda Turma (HC 118000) do STF. STF, HC 120617 – 04/02/2014

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• AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DESCAMINHO. HABITUALIDADE NA PRÁTICA DA CONDUTA CRIMINOSA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. PRECEDENTES. LEI N. 10.522/02. VALOR ELIDIDO SUPERIOR A R$10.000,00 (DEZ MIL REAIS). PORTARIA N. 75/2012, DO MINISTÉRIO DA FAZENDA. DESCABIMENTO. I. Inaplicável o princípio da insignificância quando configurada a habitualidade na conduta criminosa. Precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal. II. A Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, apreciando a questão da aplicação do princípio da insignificância ao crime de descaminho, no julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia n. 1.112.748/TO, sedimentou o entendimento segundo o qual somente é cabível o reconhecimento do delito de bagatela aos débitos tributários que não ultrapassem o teto de R$ 10.000,00 (dez mil reais), em conformidade com o art. 20 da Lei n. 10.522/02. III. A Portaria n. 75, de 22 de março de 2012, do Ministério da Fazenda, não conduz à conclusão diversa. STJ, AgRg no AREsp 323486/RS

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Teoria do fato punível

• Composto pela ação, tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade

• Culpabilidade é composta pela capacidade penal, conhecimento da antijuridicidade (real ou potencial) e exigibilidade de conduta diversa)

• Crime é, pois, uma ação típica, antijurídica e culpável.

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• Antes da reforma penal de 1984 prevalecia a teoria CAUSALISTA mas, atualmente, prepondera a teoria FINALISTA.

• TEORIA CAUSALISTA = O DOLO E A CULPA ESTÃO NA CULPABILIDADE

• TEORIA FINALISTA = O DOLO E A CULPA MIGRAM PARA DENTRO DO TIPO

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• O modelo de ação finalista, proposto por Welzel, na primeira metade do século XX, revolucionou o conceito de crime: a ação é o conceito central do fato punível, a psicologia demonstra a estrutura final da ação humana e a lei penal não pode desconhecer a existência de estruturas ontológicas independentes do direito.

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• A ação humana, pois, é exercício de atividade final, a realização de um propósito. Esse conceito de ação final introduziu o dolo no tipo subjetivo dos delitos, separou dolo como vontade de realização do fato e a consciência da antijuridicidade como elementos central da culpabilidade, além de disciplinar o erro (erro de tipo por ausência de dolo, erro de proibição, que exclui ou diminui a culpabilidade). Também trouxe à culpabilidade como uma reprovação a um sujeito capaz de culpabilidade, com consciência da antijuridicidade, e em situação de inexigibilidade de conduta diversa. Essa teoria foi adotada na maioria das legislações atuais, inclusive a brasileira.

55

Teoria do Tipo

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• CONDUTA• RESULTADO• NEXO CAUSAL• TIPICIDADE

• OU

• CONDUTA• NEXO CAUSAL• TIPICIDADE

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• DOLO - está previsto no artigo 18, I do CP.

• Art. 18 - Diz-se o crime:I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

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• ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO

Alguns crimes exigem 2 dolos:

Causalistas - dolo específicoFinalistas - elemento subjetivo do tipo

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ELEMENTOS DO TIPO CULPOSO• Cumpre destacar que a Teoria Finalista, que surgiu após a

reforma penal de 1984, NÃO explica de forma satisfatória os elementos do tipo culposo.

• a) CONDUTA INICIAL VOLUNTÁRIASegundo o FINALISMO, nos crimes culposos, o elemento do tipo está na conduta inicial e não no resultado.• b) VIOLAÇÃO DO DEVER DE CUIDADO OBJETIVO

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• IMPRUDÊNCIA - AGIR CULPOSAMENTE• NEGLIGÊNCIA - OMITIR-SE CULPOSAMENTE (OMISSÃO)• IMPERÍCIA - CULPA PROFISSIONAL - Ex.: Arquitetos,

engenheiros, médicos.

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PRINCÍPIO DA EXCEPCIONALIDADE (artigo 18 § único) – • DOLO É A REGRA e a CULPA É A EXCEÇÃO. Aqueles que

admitem devem trazer expressamente essa previsão.

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Tipos de resultado e de simples atividade

• Os de resultado compreendem uma separação entre ação e resultado, ligados por uma relação de causalidade, como o homicídio, o furto, o estelionato.

• Os de simples atividade se completam com a realização da ação, sem qualquer resultado independente, como a violação de domicílio, o falso testemunho.

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Tipos de lesão e de perigo

• Os de lesão se caracterizam pela lesão real do objeto da ação, como o homicídio, a lesão corporal.

• Os de perigo descrevem somente a produção de um perigo para o objeto de proteção, distinguindo-se em tipos de perigo abstrato e concreto.

• Nos de perigo concreto, a realização do tipo pressupõe a efetiva produção de perigo, como perigo de contágio venéreo, perigo para a vida ou a saúde, o incêndio, a explosão.

• Nos de perigo abstrato a presunção de perigo da ação é suficiente para sua penalização, como abandono de incapaz, difusão de doença ou praga.

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O tipo doloso de ação

• Dolo é a vontade consciente de realizar o tipo objetivo de um crime, é o saber e o querer em relação às circunstância de fato do tipo legal. Há um elemento intelectual e outro volitivo.

• O dolo especial aparece sob a forma de um intenção ou tendência especial, de atitudes pessoais necessárias para precisar a imagem do crime ou para qualificar ou privilegiar certas formas básicas de comportamento criminoso. Não há, portanto, furto na subtração de coisa alheia móvel sem a intenção de apropriação, não há crime sexual se a ação típica não aparece impregnada de libido.

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Atipicidade por adequação social

• Teoria desenvolvida por Welzel exprime a ideia de que ações realizadas no contexto da ordem social histórica da vida são ações socialmente adequadas e, portanto atípicas, ainda que correspondam à descrição do tipo legal.

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Antijuridicidade e justificação

• Legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal, exercício regular de um direito, consentimento do titular do bem jurídico.

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• Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato:

I - em estado de necessidade; II - em legítima defesa;III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.

(Código Penal)

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Legítima defesa

• Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem

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ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL

• EX.: Policial, Oficial de Justiça.

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Exercício regular de direito• HIPOTESES: ATIVIDADE MÉDICA (médico que me opera),

OFENDÍCULOS (meios predispostos para defender propriedade, cerca em lança, esportes violentos.

• Conforme a teoria da tipicidade conglobante de Zaffaroni, o exercício regular de um direito exclui a tipicidade.

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Culpabilidade• Capacidade de culpabilidade: maiores de 18 anos e sanidade

psíquica.• Conhecimento da antijuridicidade (do injusto): o autor sabe o

que faz mas pensa, erroneamente, que é permitido, ou por crença positiva na permissão do fato, ou por falta de representação da valoração jurídica do fato.

• Exigibilidade de conduta diversa: avalia as condições, as circunstância da realização do tipo, por um sujeito capaz de culpabilidade e com conhecimento da antijuridicidade. O instinto de conservação, pressões psíquicas excepcionais.

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• 1)IMPUTABILIDADE;• 2)POTENCIAL CONSCIENCIA DA ILICITUDE E DE ERRO

PROIBIDO EXCUSÁVEL;• 3)EXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA - ART. 22 COAÇAO

IRRESISTÍVEL E OBEDIÊNCIA HIERÁRQUICA.

• Assim, para que o sujeito seja IMPUTÁVEL, ele DEVERÁ compreender que o caráter ilícito é CONTROLÁVEL e, deve portanto, conseguir controlar.

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Inimputáveis• Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou

desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

• Embriaguez acidental completa

• Cabe ressaltar que as CAUSAS DIRIMENTES excluem a CULPABILIDADE, enquanto a CAUSA DE JUSTIFICAÇÃO EXCLUI A ILICITUDE.

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Potencial consciência da ilicitude• Holandesa que vem para o Brasil para fazer aborto;• Fuma maconha que trouxe consigo, tratando-se de erro de

proibição; • Faz chá de maconha ou de folhas de coca, tendo uma visão

equivocada, distorcida da realidade.

76

• O que exclui a potencial consciência da ilicitude é o erro de proibição escusável ou inevitável, sendo este uma causa de isenção de pena. Lembrem quando nosso legislador fala é “será isento de pena”, ele está excluindo culpabilidade e quando fala “não há crime”, ele está excluindo a ilicitude.

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• EXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA:• Causas legais de exclusão - as que estão na lei:

Art. 22 CP - Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem.

78

• A mãe tem que trabalhar, pois a criança tem que comer, sem pai, sem creche a mãe de uma criança de três anos a deixa sozinha, por não ter com quem deixa-la. A criança morre ao pular do 10º andar, após ficar sozinho pela mãe ter ido trabalhar e como garantidora teria o dever de cuidado.

79

• SÚMULA 68 TRF4: A prova de dificuldades financeiras, e consequente inexigibilidade de outra conduta, nos crimes de omissão no recolhimento de contribuições previdenciárias, pode ser feita através de documentos, sendo desnecessária a realização de perícia.

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Autoria e participação

• A) Pluralidade de conduta e de condutas:Duas condutas principais (autor mais autor), ou uma conduta principal e uma acessória (autor mais partícipe).

• B) Relevância causal de cada uma das ações:Todas as condutas devem contribuir para um resultado comum.

• C) Liame subjetivo entre os agentes:Todos devem ter ciência que estão contribuindo para o resultado comum.

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AUTORIA• A) TEORIA OBJETIVO FORMA OU FORMAL OBJETIVA:Autor é quem pratica verbo nuclear do tipo. Partícipe é quem concorre para o crime sem praticar o verbo do tipo. Exemplo: quem puxa o gatilho é o autor, quem empresta a arma seria partícipe.• B) TEORIA OBJETIVO SUBJETIVA OU TEORIA OBJETIVO FINAL

OU TEORIA DO DOMÍNIO DO FATO:Surge a figura do “autor funcional”.Conceito funcional de autor: em uma ação conjunta , é o autor quem pratica um fato relevante na execução do plano delitivo global – execução (e não nos atos preparatórios). É quem organiza as tarefas. 82

A teoria do domínio do fato

• O autor domina a realização do fato típico, controlando a continuidade ou paralisação da ação típica; o partícipe não domina a realização do fato típico, não tem controle sobre a continuidade ou paralisação da ação típica.

• A teoria do domínio do fato foi criada por Hans Welzel em 1939 para julgar os crimes ocorridos na Alemanha Nazista para a aplicação da pena ao mandante de um crime, mas como autor e não como partícipe do crime. Posteriormente, recorreu-se à teoria para os sentinelas do muro de Berlim.

• Na Argentina, a teoria foi utilizada para julgar a Junta Militar. Também foi utilizada pela Suprema Corte do Peru ao culpar Alberto Fujimori.

• No Brasil, foi usada para julgar o mensalão e vem sendo utilizada em crimes econômicos. Foi utilizada para oferecimento de denúncia no caso Bernardo.

• O Código Penal possibilita o uso dessa teoria.83

PARTICIPAÇÃO

Moral:• Induzimento: é fazer nascer a ideia “na cabeça do agente” -

plantar a ideia.• Instigação: é reforçar uma ideia que já existe.Material• Auxílio: é qualquer ajuda efetiva fornecendo meios materiais.

Ex.: Aquele que fornece arma, dá a carona, fica vigiando.

• Prevalece no Brasil que não cabe participação em crimes culposos

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Responsabilidade penal da pessoa jurídica• O tema mais controvertido em política criminal atualmente.• A common law admite tranquilamente. Os países codificados

rejeitam, em razão de sua dogmática.• A CF determina ao legislador ordinário instituir a

responsabilidade da pessoa jurídica por atos com a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.

• Art. 173. § 5º - A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.

• Todavia, o conceito jurídico de punição não é exclusivo do direito penal e a atribuição de responsabilidade não implica necessariamente responsabilidade penal.

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• Diferente é o caso do art. 225, § 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

• Questões dogmáticas: a teoria da ação, o princípio da legalidade, o conceito de tipo legal, a previsão nulla poena sine lege, o princípio da culpabilidade, o princípio da personalidade da pena, princípio da punibilidade...

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Crimes materiais e crimes formais

• Crimes materiais são aqueles onde há, além da lesão ao bem jurídico, também um resultado naturalístico, uma modificação no mundo exterior perceptível pelos sentidos.

• Crimes formais são aqueles onde há apenas um resultado jurídico

• STJ Súmula nº 96 - 03/03/1994 - DJ 10.03.1994Extorsão - Vantagem Indevida - Dependência – Consumação. O crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem indevida. 87

Finalidades das Penas

• À sombra dos problemas dos fins das penas, é no fundo toda a teoria penal que se discute e, com particular incidência, as questões fulcrais da legitimação, fundamentação e função da intervenção penal estatal. Neste sentido pode-se dizer que a questão dos fins das penas constitui a questão do destino do Direito Penal e do seu paradigma.

• As respostas dadas ao longo de muitos séculos ao problema dos fins da pena reconduzem-se a duas linhas teóricas fundamentais: as teorias absolutas, de um lado, ligadas essencialmente às doutrinas da retribuição ou da expiação; as teorias relativas, de outro lado (prevenção geral e prevenção especial ou individual) 88

Retribuição e expiação

• A essência da pena criminal, para os teóricos dessa linha, reside na retribuição, expiação, reparação ou compensação do mal do crime – e nesta essência se esgota. Se, apesar de ser assim, a pena pode assumir efeitos reflexos ou laterais socialmente relevantes (de intimidação da generalidade das pessoas, de neutralização dos delinquentes, de ressocialização), nenhum deles contende com a sua essência e natureza nem se revela suscetível de a modificar: uma tal essência e natureza é função exclusiva do fato que se cometeu, é a justa paga do mal que com o crime se realizou, é o justo equivalente do dano do fato e da culpa do agente.

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Prevenção geral e especial

• Contrariamente às ideias que concebem a finalidade absoluta das penas, as relativas (do latim referire: referir-se a) são, com plena propriedade, teorias de fins. Também elas reconhecem que a pena se traduz num mal, mas, como instrumento político-criminal destinado a atuar no mundo, não pode a pena bastar-se com essa característica, em si mesma destituída de sentido; para como tal se justificar tem de usar desse mal par alcançar a finalidade precípua de toda a política criminal: a prevenção do crime. (Jorge de Figueiredo Dias)

• A crítica mais comum é a de que, aplicando as penas a seres humanos em nome de fins utilitários ou pragmáticos que pretendem alcançar no contexto social, elas transformariam a pessoa humana em objeto e violariam a sua eminente dignidade.

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• A pena é usada como instrumento político-criminal destinado a atuar (psiquicamente) sobre a generalidade dos membros da comunidade, afastando-os da prática de crimes através da ameaça penal estatuída pela lei, da realidade da sua aplicação e da efetividade da sua execução.

• Já com a prevenção especial se pretende conseguir evitar o delito mediante uma influência sobre o apenado. Falham quanto tentam interpretar a pena, porque se baseiam na periculosidade do autor e não na medida da gravidade da culpa, conduzindo a resultados injustos e em parte impossíveis. (Welzel)

• Além disso, não se chegou e inclusive não se pode chegar a um acordo, em um tempo previsível, sobre o conteúdo do fim de “socialização” ou “ressocialização”. Também é preciso ver que o interesse no tratamento apodera-se não apenas do corpo do apenado, mas também da sua alma. (Hassemer)

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O Direito Penal na Era da Globalização• O Estado Democrático de Direito surgiu na dinâmica das revoluções

burguesas do século XVIII, e os problemas relativos a este padrão começaram a apresentar dificuldades operacionais com a expansão das lutas sindicais na passagem do século XIX para o século XX. Com a crise estrutural do sistema financeiro do capitalismo concorrencial na década de vinte do século passado, e a decrescente capacidade autorreguladora do mercado deflagrou um comportamento autoritário do Executivo.

• O Executivo terminou exercendo um papel simultaneamente controlador, diretivo, coordenador, indutor e planejador. Ou seja: de simples provedor de serviços básicos, no século XIX, ele passou até mesmo a atuar como produtor direto de bens e serviços. Neste momento encontramos a transfiguração do Estado Liberal em Estado- Providência, cujas funções básicas eram, por um lado, promover o crescimento econômico; e, por outro, assegurar a proteção dos cidadãos mais desfavorecidos. Nota-se que o Executivo se converteu em instrumento de consecução de objetivos concretos. (Faria Costa)

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• Desse modo, o Estado deixou de ser aquela associação ‘ordenadora’ típica do Estado de Direito clássico, que tinha a legitimidade do uso da coação jurídica, renunciando, em contrapartida, a intervir no campo econômico e social; e se tornou uma associação eminentemente ‘reguladora’, na perspectiva de um Estado Social de Direito.

• Alguns outros fatores contribuíram para este quadro durante os anos setenta do século passado. Entre eles, estão as flutuações das taxas de câmbio que antes eram fixas, o que fez com que a moeda se subordinasse à lei da oferta e da procura. A crise do petróleo ocasionou um aumento elevado do preço, por consequência, acúmulos fantásticos de dinheiro por parte dos países exportadores, que entregaram suas riquezas a bancos europeus e americanos e que, após, foram transferidos a título de empréstimo para os países da América Latina

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Globalização

• 1 - mundialização da economia, mediante a internacionalização dos mercados de insumo, consumo e financeiro, rompendo com as fronteiras geográficas clássicas e limitando crescentemente a execução das políticas cambial, monetária e tributária dos Estados nacionais;

• 2 - desconcentração do aparelho estatal, mediante a descentralização de suas obrigações, a desformalização de suas responsabilidades, a privatização de empresas públicas e a ‘deslegalização’ da legislação social;

• 3 – internacionalização do Estado, mediante o advento dos processos de integração formalizados pelos blocos regionais e pelos tratados de livre comércio e a subsequente revogação dos protecionismos tarifários, das reservas de mercado e dos mecanismos de incentivos e subsídios fiscais;

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• 4 – desterritorialização e reorganização do espaço da produção, mediante a substituição das plantas industriais rígidas surgidas no começo do século XX, de caráter ‘fordista’, pelas plantas industriais ‘flexíveis’, de natureza ‘toyotista’, substituição essa acompanhada pela desregulamentação da legislação trabalhista e pela subsequente ‘flexibilização’ das relações contratuais;

• 5 – fragmentação das atividades produtivas nos diferentes territórios e continentes, o que permite aos conglomerados multinacionais praticar o comércio interempresa, acatando seletivamente as distinções legislativas nacionais e concentrando seus investimentos nos países onde elas são mais favoráveis;

• 6 – expansão de um direito paralelo ao dos Estados, de natureza mercatória (‘lex mercatoria’), como decorrência da proliferação dos foros de negociações descentralizados estabelecidos pelos grandes grupos empresariais.

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• Desta maneira, percebe-se que a globalização propicia em seu rastro, não somente a produção de danos individualizados, mas ao contrário, a produção de danos supra-individuais e até supra-nacionais, evidenciados por situações sociais de perigo.

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• A globalização se refere àqueles processos, atuantes numa escala global, que atravessam fronteiras nacionais, integrando e conectando comunidades e organizações em novas combinações de espaço-tempo, tornando o mundo, em realidade e em experiência, mais interconectado. A globalização implica um movimento de distanciamento da ideia sociológica clássica da ‘sociedade’ como um sistema bem delimitado e sua substituição por uma perspectiva que se concentra na forma como a vida social está ordenada ao longo do tempo e do espaço. (Giddens)

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• Para alguns, ‘globalização’ é o que devemos fazer se quisermos ser felizes; para outros, é a causa da nossa infelicidade. Para todos, porém, ‘globalização’ é o destino irremediável do mundo, um processo irreversível; é também um processo que nos afeta a todos na mesma medida e da mesma maneira. Estamos todos sendo ‘globalizados’ – isso significa basicamente o mesmo para todos. (BAUMAN, Zigmunt)

• Aquilo que habitualmente designamos por globalização são, de facto, conjuntos diferenciados de relações sociais; diferentes conjuntos de relações sociais dão origem a diferentes fenômenos de globalização; existem, em vez disso, globalizações; em rigor, este termo só deveria ser usado no plural. Qualquer conceito mais abrangente deve ser tipo processual e não substantivo. (Boaventura de Souza Santos) 99

Dinheiro• A economia’ – o capital, que significa dinheiro e outros

recursos necessários para fazer as coisas, para fazer mais dinheiro e mais coisas – move-se rápido; rápido o bastante para se manter permanentemente um passo adiante de qualquer Estado (territorial, como sempre) que possa tentar conter e redirecionar suas viagens. Neste caso, pelo menos, a redução de tempo de viagem a zero produz uma nova qualidade: uma total aniquilação das restrições espaciais, ou melhor, a total ‘superação da gravidade’. O que quer que se mova a uma velocidade aproximada à do sinal eletrônico é praticamente livre de restrições relacionadas ao território de onde partiu, ao qual se dirige ou atravessa. (Zygmunt Baumann) 100

• O papel do dinheiro na constituição da liberdade especificamente moderna fica de todo evidente quando pensamos, ainda no contexto feudal, na substituição progressiva e paulatina das obrigações pessoais em espécie por contraprestações monetárias. A monetarização da relação Senhor e Servo, nesse contexto, implica não só a despersonalização da relação de dominação em si, mas também a possibilidade de libertação da personalidade do servo enquanto tal da relação de obrigação (Souza e Öelze)

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• Como a maior parte das pessoas passa a vida inteira na busca do dinheiro, cria-se a ilusão de que sua posse produz a satisfação definitiva e a felicidade. Nesse contexto, adquire todo o sentido a fórmula simmeliana do dinheiro como Deus moderno. Toda a paz e a segurança do crente encontrariam explicação nesse fato. O dinheiro apresenta uma extraordinária afinidade psicológica com essa ideia, porquanto produz a expressão e a equivalência de todos os valores, unindo os contrários e os estranhos. É precisamente a busca apaixonada pelo dinheiro que produz o ritmo nervoso e o estresse da vida moderna. A perseguição ao dinheiro exige, certamente, o cálculo, o que pede uma ‘paixão fria’ sem impulsividade. (SOUZA, Jessé e ÖELZE, Berthold. Simmel e a Modernidade.)

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Crime globalizado• A economia é global em todos os sentidos: ao mesmo tempo

em que é formada por transações e negócios lícitos, apresenta padrões de atividade ilegal. Em um mundo cada vez mais integrado, que dispõe de avançados meios de comunicação e de tecnologias de ponta, empresários, criminosos, multinacionais, políticos, funcionários do Estado, consumidores, grupos de rebeldes e de terroristas estão intensamente interrelacionados. (FRIMAN, H. Richard; ANDREAS, Peter. International Relations and the Illicit Global Economy. In: The Illicit Global Economy & State Power)

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• No âmbito penal, a crescente intervenção jurídico-penal no campo econômico, destaca-se como elemento multiplicador, tendo como marco a globalização e a tentativa de repressão à delinquência econômica. Como tentativa – frustrada – de frear esta criminalidade, são lançadas as leis que possuem em seu corpo a penalização das mais variadas condutas, sem definição clara dos objetos de tutela penal, violando os princípios da subsidiariedade e lesividade e lançando mão do direito penal como a prima ratio, objetivando a satisfação da regulação econômica e financeira.

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• En primer lugar, el delito económico no solo se dirige contra intereses individuales sino también contra intereses social-supraindividuales (colectivos) de la vida económica, es decir, se lesionan bienes jurídicos colectivos o social-supraindividuales de la economía. Bien protegido no es, por tanto, en primer término el interés individual de los agentes económicos sino el orden económico estatal en su conjunto, el desarrollo de la organización de la economía, en pocas palabras, la economía política con sus ramas específicas (sistema financiero, sistema crediticio, etc...). Por este motivo el fraude fiscal y la obtención fraudulenta de subvenciones son ya delitos económicos. (TIEDEMANN, Klaus)

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Direito Penal Econômico• Daí que se sustente, quase desde o início do aparecimento do

direito penal econômico, que o estudo sistemático das incriminações no âmbito do direito fiscal, do direito financeiro, do direito da segurança social, etc., deva ser levado a cabo sob o beneplácito do direito penal econômico (Faria Costa)

• Ao conceituar-se Direito Penal Econômico pode-se partir da definição ofertada por Hans Jescheck que sustenta ser ele um setor do Direito Penal que dirige sua intervenção sobre as condutas que atentam contra o conjunto total da economia.

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• - Lei 8137, de 1990: Delitos contra a ordem econômica (arts. 4º a 6º): BEM JURÍDICO: livre concorrência e livre iniciativa, fundamentos basilares da ordem econômica.

• - Lei 8137, de 1990: Delitos contra as relações de consumo (art. 7º): BEM JURIDICO: nos incisos I a IX, os interesses econômicos ou sociais do consumidor (indiretamente, a vida, a saúde, o patrimônio e o mercado);

• - Lei 8137, de 1990: Delitos contra a ordem tributária (arts. 1º a 3º): BEM JURIDICO: erário público, como bem supraindividual, de cunho institucional; proteção da política socioeconômica do Estado.

• - Lei 8176, de 1991: Trata de delitos contra a ordem econômica. BEM JURÍDICO: fontes energéticas.

• - Lei 8078, de 1990: Trata dos crimes contra as relações de consumo – Código de Defesa do Consumidor; BEM JURÍDICO: relações de consumo, relação jurídica de consumo.

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• - Lei 7492, de 1986: Trata dos crimes contra o sistema financeiro nacional; BEM JURÍDICO: proteção pública aos valores mobiliários (públicos e das empresas privadas que atuam nesse setor) e o patrimônio de terceiros (investidores); a higidez da gestão das instituições financeiras; a fé pública; fé pública de documentos; veracidade dos demonstrativos contábeis das instituições; regular funcionamento do sistema financeiro; reservas cambiais;

• - Código Penal Brasileiro, de 1940: nos artigos 359-A a 359-H, trata dos crimes contra as finanças públicas; BEM JURIDICO: finanças públicas;

• - Código Penal Brasileiro, de 1940: nos artigos 168-A e 337-A, trata dos crimes contra o sistema previdenciário; BEM JURÍDICO: interesse patrimonial da previdência social;

• - Código Penal Brasileiro, de 1940: artigo 334; BEM JURÍDICO: prestígio da administração pública e o interesse econômico do Estado;

• - Lei 9613, de 1998: Lavagem ou ocultação de bens. BEM JURÍDICO: administração da justiça e a ordem socioeconômica (ordem econômico-financeira);

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Dificuldades• Vê-se como dificuldade, todavia, a inexistência de um Estado

mundial ou de organismos internacionais suficientemente fortes que disponham do ius puniendi e que possam, portanto, emitir normas penais de caráter supranacional, a carência de órgãos com legitimação para o exercício do ius persequendi e a falta de concretização de tribunais penais internacionais agravam ainda mais as dificuldades do enfrentamento dessa criminalidade gerada pela globalização. (Alberto Silva Franco)

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Crimes do colarinho branco• Os economistas estão bastante familiarizados com os métodos

utilizados no âmbito dos negócios, porém não estão acostumados a considerá-los desde o ponto de vista de um delito. Muitos sociólogos, por sua parte, estão familiarizados com o mundo do delito, porém não estão habituados a considerá-lo como uma das manifestações dos negócios. Esta conferência visa integrar ambas as dimensões do conhecimento ou, para dizê-lo de forma mais exata, visa estabelecer uma comparação entre o delito da classe alta – delito do colarinho branco – composto por pessoas respeitáveis ou, em último termo, respeitados homens de negócios e profissionais, e os delitos da classe baixa composta por pessoas de baixo status socioeconômico (Shuterland, 1925)

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• White collar crime may be defined approximately as a crime commited by a person of respectability and high social status in the course of his occupation (Sutherland)

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• 1. O comportamento criminal se aprende.• 2. O comportamento criminal se aprende em contato com outras pessoas

mediante um processo de comunicação.• 3. O comportamento criminal se aprende sobretudo, no interior de um

grupo restrito de relações pessoais.• 4. Quando se adquire o perfil criminal, este compreende: a) o ensino de

técnicas para cometer infrações que são algumas vezes muito complexas e outras vezes muito simples; b) a orientação dos motivos e das tendências impulsivas, de razões e de atitudes.

• 5. A orientação dos motivos e das tendências impulsivas está em consonância com a interpretação favorável ou desfavorável das disposições legais.

• 6. Um indivíduo converte-se em delinquente quando as interpretações desfavoráveis relativas a lei prevalecem sobre as interpretações favoráveis.

• 7. As associações diferenciais poderão se distinguir no que tange a frequência, a duração, a anterioridade e a intensidade. (Sutherland)

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Flexibilização do Direito Penal• Então, enquanto no âmbito dos direitos basicamente sociais e

econômicos se vive hoje um período de reflexo e flexibilização, no direito penal se tem uma situação diametralmente oposta: veloz e intensa definição de novos tipos penais; crescente jurisdicização e criminalização de várias atividades em inúmeros setores na vida social; enfraquecimento dos princípios da legalidade e da tipicidade, por meio do recurso a normas com textura aberta (isto é, regras porosas, sem conceitos precisos); ampliação do rigor de penas já cominadas e de severidade das sanções; encurtamento das fases de investigação criminal e instrução processual, inversão do ônus da prova, passando-se a considerar culpado quem, uma vez acusado, não provar a sua inocência. (Alberto Silva Franco) 115

Tendências• Meu prognóstico é que, de fato, o Direito Penal da

globalização econômica e da integração supranacional será um Direito já crescentemente unificado, mas também menos garantista, no qual se flexibilizarão as regras de imputação e se relativizarão as garantias político-criminais, substantivas e processuais. Nesse ponto, destarte, o Direito Penal da globalização não fará mais que acentuar a tendência que já se percebe nas legislações nacionais, de modo especial nas últimas leis em matéria de luta contra criminalidade econômica, a criminalidade organizada e a corrupção (Silva Sánchez)

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• A) Observa-se, com muita frequência no âmbito do Direito Penal Econômica a presença de tipos penais abertos, ou seja, há tendência na utilização de cláusulas gerais na definição da norma incriminadora – do tipo penal – de modo a criar-se, nesse ambiente, instabilidade perigosa, além de adotar-se uma técnica que viola a função de garantia do tipo penal.

• Lei 8137/90, art. 4º, inciso I, constitui crime contra a ordem econômica abusar do poder econômico, dominando o mercado ou eliminando total ou parcialmente a concorrência

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• B) Outro aspecto relevante a ser anotado no Direito Penal Econômica está na tipicidade omissiva

• Na lei 8078/90 – Código de Defesa do Consumidor – ao definir os crimes contra as relações de consumo, o legislador previu 12 hipóteses típicas. Destas, 50% delas, ou seja, seis crimes, são omissivos próprios. Ou seja, se perfazem com a simples omissão.

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• C) A tipicidade para os crimes de perigo é outra questão enfrentada pelo Direito Penal Econômico

• A questão é tormentosa, e divide opiniões na doutrina e na jurisprudência. Para alguns a aceitação dos tipos penais de perigo é condição imperiosa para a responsabilidade por delitos econômicos, porque as consequências da criminalidade econômica nem sempre são apreciáveis imediatamente.

• Um exemplo bem característico de crime de perigo abstrato na macro criminalidade é a gestão fraudulenta e a gestão temerária, crimes contra o sistema financeiro, previstos no artigo 4º, caput e parágrafo único da Lei 7492/86. Esses crimes se consumam com a gestão, fraudulenta ou temerária, independentemente de qualquer resultado, haja vista se constituírem em crimes de perigo abstrato e de mera atividade.

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• D) Outro aspecto bastante comum, na criminalidade econômica, é a da prevalência de crimes formais.

• Veja-se, por exemplo, que a Lei 8137, ao prever os crimes contra a ordem econômica, estatuiu, em seu artigo 5º, inciso IV, o comportamento delitivo de quem se recusa a prestar informação, sem justa causa, sobre o custo de produção ou preço de venda da mercadoria ou serviço. Nessa hipótese, estamos diante de um crime formal, eis que não se exige, nele, nenhum resultado material, sendo suficiente, para a responsabilização, apenas a sua prática, ou seja, a recusa.

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• E) Por fim, ainda se pode anotar um grande número de normas penais em branco, em se tratando da criminalidade econômica.

• Veja-se, por exemplo, a hipótese do artigo 6º da Lei 8137, regulando a ordem econômica, no qual se incrimina a conduta de quem vende ou oferece à venda mercadoria, ou contrata ou oferece serviço, por preço superior ao oficialmente tabelado, ao fixado por órgão ou entidade governamental, e ao estabelecido em regime legal de controle.

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