ensino de português pela abordagem comunicativa
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OSVALDO SOWEK
ENSINO DE INGLS PELA ABORDAGEM COMUNICATIVA NO I o E NO 2- GRAU
Dissertao para obteno do Grau de Mestre apresentada Coordenao do Curso de Ps-Grduao, rea de Concen-trao Lngua Inglesa, do Setor de Cincias Humanas, Letras e rtes da Universidade Federal do Paran.
CURITIBA
1 9 8 7
-
PROFESSOR ORIENTADOR
Dra. CECLIA INS ERTHAL, PhD em Lingstica.
-
minha esposa Luiza e a meus filhos Luciene, Liz Elaine e Jnior, as causas de todos os meu? esforos.
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R E V O L U T I O N S M A Y B E F O L L O W E D
B Y C O U N T E R - R E V O L U T I O N S ; B U T
T H E R E C A N B E N O S I M P L E
R E S T O R A T I O N O F T H E P A S T .
J O H N L Y O N S .
-
SUMRIO
RESUMO viii
ABSTRACT x
1 INTRODUO 1
1 PARTE - AS BASES TERICAS DA ABORDAGEM COMUNICATIVA
2 AS PREMISSAS ESTRUTURALISTAS E O ENSINO DE LN-GUAS ESTRANGEIRAS 6
2.1 A Lingstica como Fonte de Inspirao 7 2.2 Prenuncios de Uma Nova Proposta 14
3 ABORDAGEM COMUNICATIVA 19 3.1 Fontes Tericas da Abordagem Comunicativa .. 20 3.2 Comunicao: Conceitos 22 3.3 Competncia Lingstica X Competncia Comu-
nicativa na Viso de Hymes 23 3.4 Viso de Outros Autores 26
4 IMPLICAES DA ABORDAGEM COMUNICATIVA 30 4.1 Componentes da Competncia Comunicativa .... 33 4.1.1 Competncia Gramatical 33 4.1.2 Competncia Sociolingstica 34 4.1.3 Competncia Discursiva 35 4.1.4 Competncia Estratgica 36
5 O CURR^-ULO: EVOLUO 3 8 5.1 Currculo Gramatical 40 5.2 Currculo Situacional 43 5.3 Currculo Nocional 45 5.4 Restries ao Currculo Nocional 49
V
-
6 O DISCURSO 55 6.1 Texto e Discurso 59
II PARTE - APRESENTAO A ESCOLA DA ABORDAGEM COMUNI-CATIVA
7 O ENSINO DE INGLS NO BRASIL 67 7.1 Anlise da Situao 67 7.2 Proposta de Ensino Comunicativo 70
8 ESPECIFICAO DO CURRCULO 7 8 8.1 As Premissas da Organizao do Currculo ... 81 8.2 Observaes Prticas 85
9 METDOLOGIA COMUNICATIVA 9.1 O Conceito de Informao no Processo Comuni-
cativo 89 9.2 Principios Bsicos da Metodologia Comunica-
tiva 92 9.3 Processo e Produto em Comunicao 95 9.4 Contextualizao 97 9.5 Tipos de Exerccios Orais 98 9.6 Exerccios Comunicativos 100 9.7 Desvantagens da Metodologia Estruturalista . 101
10 O PAPEL DA LEITURA NO PROCESSO COMUNICATIVO .. 106 10.1 Definio do Conceito de Leitura 107 10.2 Aplicaes Pedaggicas 111 10.3 Texto e Discurso na Leitura 113 10.3.1 Texto 114 10.3.2 Coeso Textual 116 10.3.3 Discurso 117 10.4 Aplicaes Prticas 121
vi
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11 "ENGLISH FOR SPECIFIC PURPOSES - ESP" 123 11.1 Ingles para Ciencia e Tecnologia (EST) 125 11.2 A Abordagem do Texto Cientfico 126 11.3 Fatores de Influncia sobre ESP 131 11.4 Observaes Prticas 1 3 4
CONCLUSO 136
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 140
vii BIBUOrrCA CENTRAL
Universidade Federal do Paran
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RESUMO
O presente trabalho uma pesquisa bibliogrfica que analisa a abordagem comunicativa, mostrando sua evoluo histrica a partir da crtica ao estruturalismo no ensino de lnguas estrangeiras, chegando a sugestes de aplicao pr-tica no ensino de ingls no Brasil.
So aqui apresentados os autores que contriburam mais significativamente para o movimento comunicativo. Entre eles, Hymes e Canale, que estabeleceram as caractersticas da competncia comunicativa, vindo a completar o conceito chomskiano de competncia lingstica, insuficiente no que se refere ao ensino de lnguas por no levar em considera-o lngua em uso; Wilkins, com seus subsdios para elabo-rao de currculo nocional; Widdowson, no campo da anlise de discurso, sobretudo no ensino de ingls para fins espec-ficos; Savignon, Finocchiaro, Brumfit e Johnson, que con-triburam decisivamente na aplicao prtica da abordagem comunicativa.
0 objetivo deste trabalho fornecer subsdios para um curso de reciclagem para professores de ingls de 1Q e de 2 grau das escolas brasileiras, que os colocaria a par des-sas novas conquistas da lingstica aplicada e de seu em-prego na sala de aula.
viii
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So analisados os principais temas relacionados com a
abordagem comunicativa, tais como: especificao do currcu-
lo, metodologia comunicativa, leitura na abordagem comunica-
tiva e ensino de ingls para fins especficos.
Tem-se em mira incentivar os professores a uma mudana
de atitude quando se questiona o ensino de ingls com carac-
tersticas gramaticais de fundo estruturalista, para a adoo
de uma atitude oposta em que a lngua seja vista como instru-
mento de comunicao.
Por esse prisma, a elaborao do currculo ser con-
siderada no somente em termos de estruturas lingsticas,
como tambm em relao s funes da lngua.
Finalmente, com a apresentao dessa nova abordagem no
ensino de lngua estrangeira, tenta-se modificar uma mentali-
dade arraigada, atualizando o processo de ensino-aprendizagem
de modo a dar resultados mais prticos em termos de lngua
estrangeira que venham responder aos anseios da sociedade que
raciocina em termos de aplicao imediata de seus esforos.
-
ABSTRACT
This dissertation is a bibliographical research which
analyzes the communicative approach from its starting point
as an opposition to structuralism on the teaching of foreign
languages to its application on the teaching of English in
Brazil.
The authors who mainly have contributed to the
settlement of the communicative approach are here discussed.
Among them, Hymes and Canale who have set the characteristics
of communicative competence, considered insufficient for what
language teaching is concerned for not taking into account
language in use; Wilkins and his contribution for notional
syllabus design; Widdowson's contribution in the analyses
of discourse and above all on the teaching of English for
specific purposes; Savignon, Finocchiaro, Brumfit and
Johnson who have decisively contributed for the practical
application of the communicative approach.
The aim of this research is the preparation of a
recycling course for Brazilian high-school teachers which
..ill give them the insights of this new approach and its
application in the classroom.
The main subjects concerning the communicative approach
analyzed, such as: the syllabus design, communicative
X
-
methodology, reading in communicative language teaching and
the teaching of English for specific purposes.
Teachers are encouraged to change their attitudes
concerning English teaching based on structuralism for an
opposed point of view in which language is seen as a means
of communication.
From this point of view, syllabus design will
concentrate not only on a set of linguistic structures, but
also on the functions of language.
At last, by presenting this new approach the author
is trying to change an old concept of English language
teaching in Brazil, recycling the process of teaching-learning
so that better results can be achieved in order to correspond
immediate desires of the Brazilian society.
xi
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1 INTRODUO
At a dcada de 60, o estruturalismo serviu de inspi-
rao para o ensino de lnguas estrangeiras e toda a metodo-
logia esteve voltada para a aprendizagem da lngua como uma
simples aquisio de hbito.
A tarefa da projeo do currculo na abordagem estru-
turalista consistia na seleo de estruturas e sua gradao
numa ordem universal fixa para o ensino, cuja estratgia
funcionava mais ou menos assim: apresentava-se a estrutura,
drills para memorizao, prtica em contexto. Aos poucos o aluno dominaria todas as estruturas que lhe possibilitariam o
uso correto da lngua.
Erros deveriam ser evitados a qualquer custo, da a
nfase no estudo do cdigo lingstico da variedade conside-
rada padro.
O domnio do uso da lngua, que seria o complemento
do estudo da forma, era totalmente negligenciado.
Essa postura estava apoiada na prpria tendncia da
lingstica que buscava, quase exclusivamente, o estudo da
estrutura lingstica; da forma, em vez do ignificado.
O questionamento dessa abordagem comea a surgir com
a publicao de Syntactic Structures de Chomsky na segunda metade da dcada de 50, obra que introduz a gramtica
-
2
gerativo-transformacional. A simples descrio das estru-
turas da lngua j no mais considerada adequada, da a
apresentao de regras que do conta das estruturas, em vez
de apenas enumer-las.
Apesar de a teoria de Chomsky ter exercido pouca in-
fluncia no ensino de lnguas propriamente dito, ela propor-
cionou, todavia, uma nova maneira de ver a lngua; como
conseqncia, sua aprendizagem sofreria, nos anos seguintes,
novos ajustes.
Com efeito, logo se passa a ver a lngua no como um
conjunto de estruturas, mas como um instrumento de comunica-
o. 0 significado, mais do que a forma, assume destaque.
Essa nova viso de lngua vai-se concretizando nas
teorias de uso da lngua, no s do seu conhecimento, que
abrangem o conceito de competncia comunicativa apresentado
por Hymes, mais abrangente que o conceito de competncia
lingstica de Chomsky, pois v a lngua em uso no contexto
social.
A abordagem comunicativa que intenta desenvolver
competncia comunicativa no aprendiz assenta-se sobretudo
na sociolingstica, na filosofia e na lingstica. A obra
de Hymes apresenta-se como a principal intrprete da socio-
lingstica, cuja caracterstica o estudo da lngua em
relao a seus usos. Austin e Searle influenciam o ensino
comunicativo de lnguas com suas pesquisas sobre os atos da
fala atos realizados quando se usa a lngua. J a lin-
gstica contribui com relevante pesquisa na rea da anlise
de discurso. Halliday, Crystal e Davy analisam textos nas
-
3
suas caractersticas gramaticais e lexicais, enquanto
Sinclair, Coulthard e Widdowson propem a anlise em termos
funcionais.
Na dcada de setenta, Wilkins sugere a elaborao do
currculo de ensino de lngua em termos de noes que o
aprendiz quer comunicar, dando origem denominao currcu-
lo nocional que outros pesquisadores posteriormente passam a
denominar de funcional/nocional.
Se a princpio a abordagem comunicativa (funcional/
nocional) referia-se apenas ao projeto de currculo, hoje j
existem propostas para uma metodologia comunicativa baseada
nas necessidades dos alunos tendo todas as atividades cen-
tradas neles.
0 impasse criado entre os que propem a eliminao
do ensino formal da gramtica e os que defendem sua manuten-
o resolvido pela proposta de Canale e Swain (1980), es-
clarecida por Canale (1981), que compreende competncia co-
municativa como a somatria da competncia gramatical, com-
petncia sociolingstica, competncia estratgica e compe-
tncia discursiva.
O ensino de ingls no Brasil tem seguido uma linha
universal da escola estruturalista operacionalizada no mto-
do audiolingual.
Prope-se nesta pesquisa bibliogrfica a adoo do
ensino comunicativo, preocupado na interao ao invs da
aquisio do cdigo, com nfase na fluncia sobre a correo.
A inteno do trabalho levar aos professores de in-
gls de 19 e de 2Q grau, num curso de reciclagem, o conheci-
-
4
ment das teorias sobre as quais se fundamenta a abordagem
comunicativa, tentando demonstrar suas vantagens no que se
refere ao uso da lngua oral e escrita em relao a um ensi-
no tradicional voltado para o domnio do cdigo lingstico,
de fundo eminentemente estruturalista.
A obra est dividida em duas partes: a primeira con-
tm o embasamento terico da abordagem comunicativa e a se-
gunda composta de captulos inter-relacionados, mas inde-
pendentes, que se constituiro nos temas principais do curso
de reciclagem. Os captulos da segunda parte esto baseados,
de modo mais prtico, nas teorias apresentadas na primeira
parte e seus pontos mais crticos podero ser discutidos e
esclarecidos em seminrios que obrigatoriamente fazem parte
desses tipos de curso.
-
I PARTE AS BASES TEORICAS DA ABORDAGEM COMUNICATIVA
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2 AS PREMISSAS ESTRUTURALISTAS E O ENSINO DE LNGUAS ESTRANGEIRAS
Quando se analisa a bibliografia sobre ensino de ln-
guas estrangeiras, possvel concluir que novas teorias sem-
pre surgem como reao s antigas; reao, principalmente,
quilo que de mais falho as ltimas apresentaram.
O ensino comunicativo de lnguas objeto deste tra-balho no poderia tambm fugir regra. Este conjunto de
idias que se constitui numa nova abordagem para o ensino de
lnguas surge na esteira de uma reao a uma caracterstica
especfica que orientava o trabalho de ensino e aprendizagem
de lnguas at a dcada de 50: a nfase no ensino da estru-
tura da lngua.
Tanto o professor trabalhando em sala de aula como o
autor do livro-texto reconheciam que, se o objetivo do tra-
balho fosse levar o aluno proficincia na lngua-alvo, ele
deveria dominar o mecanismo que faz com que uma lngua fun-cione. Ele deveria aprender o sistema da lngua.
Todo o trabalho efetuado na sala de aula visava a
promover o conhecimento desse sistema, isto , desenvolver a
competncia do estudante por meio de uma performance contro-
lada .
-
7
Nas palavras de Widdowson (in Brumfit e Johnson 1979:
117):* "A base que est atrs desta abordagem parece ser a
de que aprender uma lngua uma questo de associao dos
elementos formais do sistema da lngua com sua realizao
fsica, tanto como sons no ar como marcas no papel. Essen-
cialmente, o que ensinado atravs desta abordagem a ha-
bilidade de compor oraes corretas". (0 grifo nosso.)
Keith Johnson (1982) tenta englobar as caractersti-
cas da nfase na estrutura lingstica na palavra sistmica,
quando diz que "uma abordagem que enfatiza o ensino do sis-
tema da lngua uma abordagem sistmica". A principal meta
desta abordagem levar os alunos a manipularem o sistema da
lngua com proficincia, isto , transmitir-lhes o que ele
chama de "competncia sistmica".
Toda a atividade dos estudantes visa a familiariz-
los com o mecanismo da lngua, mostrando-lhes como funcionam
as partes e exercitando o uso destas partes atravs de uma
manipulao controlada at se conseguir o automatismo.
2 . 1 A L I N G S T I C A C O M O F O N T E D E I N S P I R A O
Johnson (1982:18) fornece uma razo histrica parti-cular para explicar a nfase na abordagem sistmica no ensi-no de lngua nas ltimas dcadas: a prpria nfase dada au
*As citaes transcritas neste trabalho esto originalmente em ingles. A responsabilidade pela traduo do prprio autor do traba-lho.
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8
estudo estrutural pela lingstica. Afinal, segundo ele, a
lingstica sempre foi considerada pelos professores como a
disciplina-me e, portanto, seria mais que normal seguir
suas orientaes. A preocuao central dos lingistas se-
guidores de Bloomfield nos anos que antecederam a dcada de
50 foi a anlise da estrutura lingstica. A lingstica X
estrutural, como passou a ser denominada a nova corrente, procurou desenvolver um sistema de identificao e classifi-
cao das estruturas possveis numa determinada lngua. Pou-
ca ateno era dada forma como essas estruturas eram usa-
das .
Essas idias desenvolvidas pela lingstica tiveram
influncia decisiva no ensino de lnguas durante vrias d-
cadas e possvel ver at hoje essa influncia, sobretudo
nos pases menos desenvolvidos.
Mas no foi apenas a lingstica que traou os rumos
do ensino estruturalista da lngua estrangeira; tambm a
psicologia trouxe forte contribuio para a criao de novos
mtodos que foram revolucionrios para a poca.
A necessidade da criao de cursos rpidos de lngua
estrangeira (necessidades de guerra) favoreceu o aparecimento
de mtodos que aproveitavam idias vigentes na psicologia.
Assim, o behaviorismo de Skinner influenciou fortemente o
estruturalismo no ensino de lnguas, sobretudo atravs dos
lingistas Bloc:, "ield e Fries.
Por influncia do behaviorismo, o estruturalismo as-I sentava-se, sobretudo, na formao do hbito. Finocchiaro (1983:6) resume essas idias: "O aspecto da obra de Skinner
-
9
que mais fortemente se associou com esta abordagem (estru-
tural) foi a viso da aprendizagem de lngua como formao
de hbito. Est aceito que as estruturas padres da lngua, conforme definidas pelos lingistas estruturalistas, preci-
savam ser exaustivamente aprendidas pelos estudantes, de
forma que fossem produzidas por fora de hbito inconsciente.
Conseqentemente, a repetio mecnica de formas corretas
era considerada valiosa".
Brunfit e Johnson (1979:3) tambm chamam a ateno
nfase dada ao estudo da estrutura gramatical no ensino de
lnguas. Segundo eles, a tarefa do organizador do currculo
seria, principalmente, a de selecionar estruturas gramaticais
e gradu-las numa ordem adequada para posteriormente serem
ensinadas. H, inclusive, uma estratgia universal pela
qual as estruturas so apresentadas e que funcionam da se-
guinte forma:
APRESENTAR DRILL
PRATICAR EM CONTEXTO
Para se ver a importncia que se dava estrutura lingstica, basta ver o modo de organizao do curso como um todo. A anlise do currculo* mostra que ele se compunha
*Currculo nesta dissertao refere-se ao termo syllabus em ingles.
-
10
de uma lista de estruturas, agrupadas e graduadas de forma a
facilitar a aprendizagem tanto quanto possvel. Cada unida-
de trabalhava com uma estrutura e o curso visava a cobrir as
principais estruturas da lngua-alvo. Deste modo, gradual-
mente, construa-se sintticamente (para usar a terminologia de Wilkins, 1976) o arcabouo de itens estruturais que os
estudantes poderiam eventualmente manusear.
O sucesso ou o fracasso na aprendizagem da lngua
julgado, neste caso, em termos da habilidade de manipular as
estruturas da lngua.
No final da dcada de 50, Chomsky publicou Syntactic Structures (1957) , obra que abriu as portas para a chegada da gramtica gerativo-transformacional. A classificao ta-
xonmica das estruturas gramaticais deixa de ser o centro
das atenes e dali por diante os lingistas passam a preo-cupar-se em desenvolver um sistema de regras que desse conta
das possibilidades estruturais da lngua, em ver de meramente
descrev-las por meio de listas. A nfase, contudo, continua
sendo colocada no estudo das estruturas.
Esse o motivo por que as idias de Chomsky, to re-
volucionrias na lingstica, tenham tido to pouco efeito no
ensino de lnguas. "Afinal", de acordo com uma opinio de
Brumfit (1979:3), "o mximo que oferecido so estratgias
alternativas para o ensino da gramtica, novas maneiras de se
ensinar a mesma coisa".
bom que se diga que o domnio do uso da lngua, mes-mo dentro da abordagem estruturalista, no era totalmente
neglicenciado. A apresentao de significados com funes
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especficas recebia uma certa ateno. Desta forma, quando
se usava a lngua para saudaes, pedidos, prestao de in-formaes, comando de ordens e outras funes, estava-se usando a lngua com fins comunicativos, no obstante o obje-
tivo principal ser o de transmitir o domnio das estruturas
gramaticais da lngua. "Certamente, representar o ensino de
lnguas no passado como tendo acontecido numa espcie de v-
cuo comunicativo no qual as estruturas so aprendidas como
frmulas matemticas, seria uma simplificao muito grande",
arrematam Brumfit e Johnson (1979:2). Mesmo assim, a preo-
cupao com a forma, mais do que com o significado dominou o ensino de lnguas estrangeiras trs dcadas atrs.
Alguns autores de renome que tm pesquisado na rea
da lingstica aplicada ao ensino de lnguas expressam opinies
que nos parecem muito vlidas na anlise da influncia do es-
truturalismo e que achamos conveniente aqui comentar.
Leonard Newmark (in Brumfit e Johnson, 1979:161) fala
a respeito do ensino estruturalista: "Quando lingistas e
programadores falam sobre o planejamento de seus livros-
textos, eles abordam o problema como se tivessem que decidir
que caractersticas estruturais cada lio deveria estar
tentando ensinar. 0 programa global ensinar a soma de suas
partes: o estudante saber esta estrutura, e aquela uma, e
outra e outra ...".
Pela linha estruturalista, Newmawrk conclui que a ta-
refa de aprender uma nova lngua seria essencialmente a tro-
ca de um conjunto de estruturas (lngua materna) por um novo
(a nova lngua). Diz ele a respeito disso (op.cit): "A n-
-
12
fase no ensino de lngua pela lingstica aplicada tem sido
colocada cada vez mais nos exerccios estruturais baseados
em anlises contrastivas da estrutura da lngua do aprendiz,
e da lngua estudada: o peso dado ao ensino de itens varia-
dos determinado no por sua importncia ao usurio da ln-
gua, mas pelo grau de diferena que o analista pensa possa
existir nas caractersticas correspondentes da lngua nati-
va".
Por essa perspectiva, a anlise contrastiva das es-
truturas de duas lnguas assume prestgio entre os lingis-
tas com conseqncias para o processo de ensino.
Wilkins (1976:3-6) analisa o estruturalismo e diz que
seus defensores postulam a apresentao de partes da lngua
ao estudante de acordo com as categorias apresentadas pre-
viamente numa descrio da mesma lngua. Uma nova estrutura
gramatical pode ser apresentada na forma de uma regra expl-
cita, como paradigma; pode estar inserida num dilogo; pode
ocorrer numa srie de oraes anlogas que tentam promover a
aprendizagem indutiva.
Sem levar em considerao essas tcnicas, Wilkins de-
nomina de sinttica a abordagem onde o contedo de ensino em primeiro lugar uma limitao e uma ordenao dos compo-
nentes do sistema lingstico.
Justificando a grande importncia da gramtica no en-
sino de lnguas pela linha estruturalista, ele diz: "Histo-
ricamente, discusses intensivas de seleo e gradao gra-
matical um desenvolvimento mais recente, mas a maioria dos
escritores e metodologistas concordariam que o componente
-
13
gramatical central na aprendizagem de lngua estrangeira e
na abordagem sinttica a organizao do contedo gramati-
cal que fornece a estrutura essencial para cursos e currcu-
los" .
Cada unidade do programa geralmente focaliza algum as-
pecto particular da estrutura gramatical e os prprios pro-
fessores identificam uma determinada unidade por meio de um
ttulo gramatical.
Acrescente-se que o objetivo final de um curso geral
ser o de ensinar virtualmente todo o sistema gramatical.
Os critrios lingsticos mais citados em relao ao
contedo gramatical ensinado so: simplicidade, regularida-
de, freqncia e dificuldade contrastiva. Para Wilkins, o
currculo que resulta da aplicao desses critrios o
currculo gramatical. Neste contexto, o contedo lxico de importncia secundria e raramente fornece a base estru-
tural de um curso.
Justifica-se o enfoque se se partir do pressuposto de
que o ensino de lngua no se interessava pela lngua em uso,
mas pela lngua como sistema. Pretendia-se que o aluno pro-
duzisse oraes gramaticalmente corretas de uma variante su-
postamente padro, segundo os moldes antigos do ensino de
lnguas mortas, como o latim e o grego.
Wilkins no nega que um curso cujo currculo seja gra-
matical tenha seu devido valor. 0 que ele quer dizer que
o currculo no deve ser necessariamente de contedo grama-
tical j que o domnio completo da gramtica de uma lngua e
a memorizao do seu lxico no garante ao estudante o uso
-
IA
eficiente desta mesma lngua. O perigo maior, segundo ele,
de se basear um curso no domnio gramatical da lngua a
tentao de ensinar as formas gramaticais porque elas esto
l e no porque sejam teis a um aproveitamento imediato.
Newmark (in Brumfit e Johnson, 1979:162) faz sria
restrio nfase dada nos livros-textos aos exerccios
gramaticais nos quais partes da lngua so isoladas de seu
contexto social e lingstico e, portanto, sem significado
nem utilidade para o estudante.
Quando se comparam livros-textos de lngua oral elabo-
rados pelos lingistas durante a Segunda Guerra com alguns
dos mais recentes, nota-se imediatamente a mudana de nfa-
se do dilogo ligado a uma situao para exerccios estrutu-
rais totalmente isolados.
Newmark diz que "tal isolamento e abstrao do estu-
dante dos contextos nos quais a lngua usada constitui s-
ria interferncia com o processo de aprendizagem da lngua".
Fica claro para ele que os tipos de regras lingsti-
cas caracterizadas at o momento (sintticas, fonolgicas e
semnticas) trazem implcita a boa formao de oraes, no
a questo de propriedade de uso.
2 . 2 P R E N U N C I O S D E UMA N O V A P R O P O S T A
Widdowson (1978:2-20) encara o ensino de lnguas pela
abordagem gramatical de uma forma bastante interessante.
-
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Comecemos por um exemplo citado por ele:
(A aproxima-se de B, um estranho, na rua.)
A: "Could you tell me the way to the railway station,
please?" B: "The rain destroyed the crops".
Como diz Widdowson, a orao proferida por B est ab-
solutamente correta, mas hesitaramos em dizer que B tem um
bom conhecimento de ingls. Diramos at que ele no sabe
ingls. Afinal, ningum de bom senso daria esta resposta pa-
ra a pergunta feita por A. Mas por que no?
"A resposta", esclarece Widdowson, " que quando ns
adquirimos uma lngua, no apenas aprendemos como compor e comprender oraes corretas como unidades lingsticas isola-
das de ocorrncia desordenada, ns tambm aprendemos como
usar oraes apropriadamente para adquirir um propsito co-
municativo. No somos apenas gramticos ambulantes". (0 gri-fo nosso.)
Ele considera que aprender uma lngua envolve no s a
habilidade de entender que oraes so apropriadas em um de-
terminado contexto.
Outra distino interessante que Widdowson faz entre
usage e use,cuja anlise parece caber muito bem ao nosso pro-psito .
Quando produzimos oraes isoladas do tipo
-
16
A chuva destruiu as plantaes.
O pobre Joo saiu correndo.
Joo ama Maria.
Meu alfaiate rico.
sem referncia a um contexto, estamos manifestando nosso co-
nhecimento da lngua. Essas oraes seriam exemplos claros
de usage.
Sabemos, no entanto, que no isso que fazemos na
vida diria. Produzimos oraes com um propsito comunica-
tivo em mente, isto , produzimos exemplos de use. O pr-prio Widdowson admite esta distino entre usage e use estar intimamente relacionada com a distino feita por Chomsky
entre competncia e performance, e por Saussure entre lngua e fala. Existe, no entanto, uma colocao diferente. Veja-mos o que ele diz a esse respeito:
A noo de competncia tem a ver com o conhecimento que o usurio da lngua tem de regras lingisticas abstratas. Este conhecimento tem que ser revelado atravs da performance. Quando ele colocado em efeito atravs da citao de oraoes para ilustrar estas regras, como acontece nas gramticas, ento a performance reproduz exemplos de "usage": o conhecimento abstrato se manifesta. Quando professores de lngua selecionam estruturas e vocabu-lrio para seus cursos, eles selecionam aqueles itens de "usage" que julgam ser os mais efetivos para ensinar as regras subjacentes do sistema da lngua. "Usage", portanto, um aspecto da performance, aquele aspecto que torna evidente a extenso de conhecimento de regras lingsticas que o usurio da lngua demonstra. "Use" um outro aspecto da performance: aquele que torna
-
17
evidente a extenso da habilidade de uso de conhecimento de regras lingsticas para efetiva comunicao que o usurio da lngua demonstra.
Donde se conclui que tanto usage como use fazem parte do conceito chomskyano de performance, mas com a distino
que acabamos de ver.
Um iniciante em lngua estangeira pode adquirir per-
feita capacidade de proferir oraes na nova lngua (usage),
mas ter dificuldade em coloc-las a servio de um fim comu-
nicativo (use) que implica outros fatores, como veremos
adiante.
Analisando esses fatos todos, chegamos a um impasse.
Nossos professores de ingls esto cientes da dificuldade
que tm para dar resposta ao seguinte problema: o estudante
torna-se gramaticalmente competente, mas incapaz de comu-
nicar-se com propriedade.
Como Newmark (in Brumfit e Johnson, 1979:161) expres-
sa, o estudante pode saber as estruturas que o professor en-
sina, contudo pode no saber o modo de pedir fsforo a um
estranho para acender seu cigarro. Qual dessas estruturas
ele usaria: "Do you have a light?" ou "Got a match? ou uma
dessas oraes igualmente bem formadas, mas artificiais do
ponto de vista do uso: "Do you have illuminations?" ou "Are
you a match's owner?"? Para ele, ser gramaticalmente correto
diferente de ser apropriado.
A afirmao de Hymes (1971) de que "h regras de uso
sem as quais as regras de gramtica seriam inteis" abre
perspectivas muito amplas para uma nova proposta de ensino de
-
18
lnguas. Ensino este que, como vimos, sempre andou lado a
lado com as evolues da lingstica, seguindo suas orienta-
es, como aconteceu com a nfase dada s estruturas gramati-
cais. No entanto, uma reao aconteceu. Segundo Brumfit e
Johnson, 1979:3), " uma reao contra a viso da lngua co-
mo um conjunto de estruturas; uma reao para uma viso da
lngua como comunicao, uma viso na qual o significado e
os usos para os quais a lngua colocada exerce papel cen-
tral" .
Esta reao no ensino de lnguas cristalizou-se na
abordagem comunicativa.
-
3 ABORDAGEM COMUNICATIVA
A abordagem comunicativa tem uma viso diferente de
lngua e de seu ensino e como tal constitui-se numa reao
ao artificialismo no ensino e ao domnio exclusivo do estru-
turalismo gramatical na metodologia de ensino. 0 artificia-
lismo manifestava-se pela prpria maneira de se ver a lngua:
apenas um sistema e no um instrumento de comunicao.
Embora possa parecer paradoxal no se ver uma lngua
como instrumento de comunicao, esta viso no despertou o
interesse dos lingistas seno recentemente. Basta um exame
superficial nos livros-textos para ver o artificialismo da
linguagem ali usada no que concerne comunicao real. Os
exemplos usados so representao de uma lngua supostamente
correta, mas sem relao com o contexto social.
No entanto, mais recentemente as presses de mercado,
da poltica e da sociedade exigem uma mudana, uma redefini-
o no conceito de lngua e, conseqentemente, de seu ensino.
Segundo Keith Johnson (1982-11), o estudo da lngua
simplesmente como um sistema foi pela primeira vez desafiado
quando se comeou a estudar com maior profundidade a aquisi-
o da lngua materna pela criana. Citando as pesquisas de
Campbell e Wales (1970), ele diz que se se quiser compreender
melhor a aquisio da linguagem, no suficiente descobrir
-
20
como a criana aprende o sistema gramatical e fonolgico
competncia sistmica , mas devem-se considerar outros
aspectos mais profundos, principalmente como ela aprende a
comunicar-se. Nota-se, assim, uma viso da lngua no como um sis-
tema composto de estruturas, mas como um instrumento no qual
o significado e o fim para que ele usado passa a ter
prioridade.
No se pretende hoje eliminar sumariamente a viso
estrutural da lngua e substitu-la por sua viso funcional.
O que a pesquisa tem demonstrado que o estudo isolado do
sistema estrutural da lngua no responde s interrogaes
de como a lngua usada como meio de comunicao.
Para exemplificar, imaginemos uma orao do tipo "por
que voc no levanta logo?". Se olhssemos esta orao com
olhos estruturalistas diramos que uma interrogativa. Sob
o aspecto gramatical, ningum diria que uma declarativa ou
imperativa. No entanto, funcionalmente existe a uma clara
ambigidade. Pode tanto tratar-se de uma ordem, como de uma
simples pergunta e, ainda, ser interpretada como um pedido,
uma sugesto ou uma queixa.
0 problema bastante complexo.
3 . 1 F O N T E S T E R I C A S D A A B O R D A G E M C O M U N I C A T I V A
Trs reas cientficas de modo especial exercem in-
fluncia no ensino de lnguas como instrumento de comunica-
o: a sociologia, a filosofia e a lingstica. De acordo
-
2 1
com Brumfit e Johnson (1979:24), muito importante o enfo-
que dado ao estudo da lngua em relao a seu uso pelos tra-
balhos mais recentes nestas trs reas.
Na sociologia, destacam-se Hymes, Guperz, Goffman e
outros, que pesquisaram nos campos da etnografia da fala, na
etnometodologia e na antrologia.
Os filsofos Austin e Searle tiveram influncia indi-
reta no ensino comunicativo de lnguas com seus estudos so-
bre speech act os atos da fala que so executados quan-
do algum usa a lngua.
No campo da lingstica, a teoria comunicativa uma
reao s teorias de Chomsky, que se centravam totalmente na
sintaxe. Nesta rea, um grupo de lingistas, entre eles Ross,
Fillmore e Lakoff, desenvolveu uma semntica gerativa, onde, como o ttulo sugere, a semntica ocupa lugar de destaque.
Eles influenciaram diretamente o trabalho da lingstica
aplicada que teve em Wilkins um dos seus melhores represen-
tantes, j que foi ele que por primeiro planejou o currculo
em termos semnticos em substituio ao currculo em bases
de estruturas gramaticais.
Mais recentemente, o estudo do discurso ganha destaque
no ensino de lnguas pela abordagem comunicativa. Na dcada
de 60, Crystal e Davy analisavam textos baseados nos modelos
de Halliday. Estas anlises selecionavam e classificavam re-
gistros da lngua inglesa segundo caractersticas lxicas e
gramaticais. Na anlise de discurso que seguia a linha de
Sinclair e Coulthard j na dcada de 70 levam-se em
conta as funes que a lngua exerce.
-
22
Para apresentar sua teoria de anlise de discurso,
Sinclair e Coulthard fazem uma pesquisa sobre a interao
comunicativa em sala de aula e, atravs deste estudo, definem
discurso e suas caractersticas. Assim, a pergunta "como
interao em sala de aula?" respondida em termos de cate-
gorias rotuladas como iniciao, resposta, avaliao, comen-trios e outras.
3 . 2 C O M U N I C A O : C O N C E I T O S
A definio de Riley (1985:1) de que comunicao "
um processo pelo qual ns criamos, negociamos e interpreta-
mos significados pessoais" traa as premissas para o estabe-
lecimento do movimento comunicativo.
Seguindo Breen e Candlin (1980), Morrow (1977) e
Widdowson (1978), Canale (1983) resume o conceito de comuni-
cao com as seguintes caractersticas.
(a) uma forma de interaao social, e consequentemente adquirida e usada normal-mente em interaao social; (b) envolve um alto grau de imprevisibili-dade e criatividade na forma e mensagem; (c) tem lugar no discurso e contexto socio-culturais que fornecem restries no uso apropriado da lngua e tambm pistas quanto s interpretaes corretas de enunciados; (d) acontece sob limitadas corHioes psico-lgicas e de outros tipos, tais como res-tries de memria, fadiga e distraes; (e) tem sempre um propsito (por exemplo, estabelecer relaes sociais, persuadir, ou prometer);
-
23
(f) envolve linguagem autentica em oposio linguagem elaborada do livro-texto. (g) julgada bem sucedida ou nao na base do resultado real. (Por exemplo, a comunicao poderia ser julgada bem sucedida no caso de um falante no nativo de ingls que estivesse tentando achar a estao ferroviria em Toronto e enunciasse "How to go train" a um transeunte, e lhe fosse fornecida a direo para a estao.)
Pesquisadores de diversas reas, de modo especial al-
guns socilogos, acharam inadequadas as anlises lingsticas
que se baseavam estritamente no funcionamento interno do c-
digo verbal fonologa, morfologa e sintaxe sem que se
considerassem as circunstncias nas quais o cdigo usado.
Conseqentemente, amplia-se o campo de pesquisa para
incluir tambm o funcionamento externo do cdigo verbal, is-
to , o que as pessoas fazem com as palavras. Riley (1985:1)
comenta a esse respeito: "A nfase nesta abordagem move-se
da estrutura e da gramtica para a funo e a competncia
comunicativa; da reunio de oraes para a execuo de atos
com enunciados, da orao isolada para o enunciado em con-
texto" .
Isso envolve comunicao genuna.
3 . 3 C O M P E T N C I A L I N G S T I C A X C O M P E T N C I A C O M U N I C A T I V A N A V I S O D E H Y M E S
0 termo competncia comunicativa foi usado por Hymes
para opor ao termo competncia lingstica de Chomsky. O
conceito chomskyano de competncia lingstica refere-se ao
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24
conhecimento tcito, subjacente, abstrato da estrutura da
lngua, isto , conhecimento que geralmente no est cons-
ciente ou disponvel para um relato espontneo, mas necessa-
riamente implcito naquilo que o falante-ouvinte pode dizer.
Graas a esse conhecimento, uma pessoa pode produzir
e compreender um conjunto infinito de oraes e tambm gra-
as a ele que se pode dizer ser a lngua criativa. Esta teoria de competncia, assim como sua aquisio,
independente de caractersticas socioculturais, i.e.,
qualquer criana em qualquer ambiente tem capacidade inata
de aprender qualquer lngua.
Hymes (in Brumfit e Johnson, 1979:5-26) postula a ma-
nifestao desta capacidade abstrata de criar lingsticamente
como sendo de domnio da performance lingstica e se relacio-
na com os termos codificao e decodificao.
sabido que Chomsky no se ateve muito performance
lingstica de seu falante ideal, j que esta performance
traria consigo a conotao de manifestao imperfeita do
sistema subjacente.
J quando fala em competncia, Chomsky quer dizer
simplesmente conhecimento do sistema da lngua, isto , co-nhecimento gramatical. Mas, se levarmos em considerao
tanto o conhecimento subjacente como a habilidade para o uso
que o falante possui, temos que aceitar que isto envolve al-
go mais que gramaticalidade, pois "h regras de uso sem as
quais as regras de gramtica seriam inteis", repetindo
Hyme s.
-
25
De fato, consideraramos insano algum que numa inte-
rao comunicativa produzisse oraes dissociadas do contex-
to, embora estivessem gramaticalmente corretas. Por essa
razo que Hymes exige que competncia inclua, alm do conhe-
cimento do sistema lingstico, conceitos de propriedade e
aceitabilidade. a essa capacidade de discernimento que
chama de competncia comunicativa.
Existem ocasies, esclarece Hymes, que para se usar
linguagem apropriada preciso ser agramatical no sentido
norma padro.
Ele explica o fato de que a criana quando aprende a
lngua adquire o conhecimento de oraes no somente como
sendo gramaticais segundo a norma padro, mas tambm como
sendo apropriadas a determinado contexto. Ela adquire a ne-
cessria competncia quanto a aspectos fundamentais no uso da
lngua: quando falar, quando no falar, o que falar com quem,
onde e de que maneira. Diz ele (in Brumfit e Johnson, 1979:
15): "uma criana adquire a capacidade de executar uma gama
de atos da fala, tomar parte em eventos da fala e avaliar
seus resultados sobre os demais". Esta competncia integra-
se com atitudes, valores e motivaes concernentes lngua,
suas caractersticas e usos.
Outra observao importante de Hymes de que a aqui-
sio desta competncia comunicativa alimentada pela expe-
rincia social, necessidades e motivos.
Desta forma, quebra-se o modelo que restringe o pro-
jeto de lngua como uma face dirigida ao significado refe-
rencial, outra dirigida ao som e que define a organizao da
-
26
lngua como consistindo de regras para ligar as duas. Tal
modelo aceita implicitamente dar nome s coisas como sendo o
nico uso da fala, isto se as lnguas no fossem organizadas
para lamentar, alegrar-se, admoestar, persuadir, convidar,
dirigir, simbolizar.
Hymes arremata: "Um modelo de lngua deve ser proje-
tado com uma face voltada para a conduta comunicativa e a
vida social" tambm.
Resumindo, competncia para o uso passa a ser parte
do mesmo desenvolvimento da competncia para a gramtica.
Com efeito, a criana adquire gradualmente uma teoria
de uso da lngua apropriada aos valores da comunidade a que
pertence partindo de experincias finitas de atos da fala,
da mesma forma que se adequa a outras formas de comporta-
mento cultural ditadas pela comunidade.
Ela adquire, aos poucos, formas apropriadas de se di-
rigir aos companheiros, aos adultos prximos e estranhos;
aprende o uso da ironia, domina, enfim, a pragmtica da
lngua.
3 . 4 V I S O D E O U T R O S A U T O R E S
Na sua introduo a Communicative Syllabus Design (1978:1-26), Munby tambm relata a mudana de rumo ocorrida no ensino de lngua na ultime, dcada. O interesse passa a repousar no contedo semntico ao invs da preocupao com a metodologia, o que ensinar e no, como ensinar. Ele cita dois fatores marcantes no movimento comunicativo: o trabalho
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27
de Trim e seus companheiros, especialmente Wilkins, no Pro-grama do Conselho da Europa para um sistema de crditos uni-trios na aprendizagem de lnguas por adultos; e, mais re-
centemente, os trabalhos de anlise de discurso (escrito e
oral) levados a cabo por Widdowson, Sinclair, Coulthard,
Candlin e outros.
Munby aceita a rejeio de Chomsky ao modelo behavio-
rista de Skinner j que ele no responde complexidade da
linguagem humana e criatividade do falante-ouvinte.
No entanto, faz duas restries: a primeira seria de
que o modelo behaviorista de estmulo-resposta consegue ex-
plicar alguns dos fatos do comportamento lingstico e, se-gundo, que a equao da criatividade com a habilidade de pro-
duzir e compreender um nmero infinito de novas oraes no
esclarece o problema de que na maioria dos casos esta origi-
nalidade insere-se no na gramtica, lxico ou na fonologa,
mas em uma nova concatenao de componentes semnticos j
conhecidos.
Na reviso de trabalhos de vrios lingistas bem co-
nhecidos, Munby rene as opinies convergentes das crticas
feitas sobre a idia de competncia e performance de Chomsky.
Conclui-se atravs deste estudo que competncia na viso
chomskyana no abre espaos para a lngua em uso e isto no
conseguido sequer pela categoria de performance.
Se existem regras de uso sem as quais as regras gra-
maticais seriam inteis, ento a noo de competncia deve
ampliar-se para incluir adequaao contextual.
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28
Quando comenta as idias de Habernas (1970), Munby
(op.cit.:ll) destaca a opinio de que "para participar no
discurso normal, o falante deve possuir alm de sua com-
petncia lingstica qualificaes bsicas de fala e de
interao simblica a seu dispor, s quais podemos chamar de
competncia comunicativa. Desta forma, competncia comunica-?
tiva significaria o domnio de uma situao ideal de fala".
Cooper (in Munby 1978:16) tem ponto de vista seme-
lhante ao de Hymes quanto competncia comunicativa: "Para
comunicar efetivamente, um falante deve saber, no somente
como produzir qualquer e todos os enunciados de uma lngua,
mas tambm como us-los apropriadamente. O falante deve sa-
ber o que dizer, com quem, quando e onde". Widdowson (1978:17-18) inclui na competncia do fa-
lante a capacidade de reconhecer e usar oraes para reali-
zar o que ele chama de atos retricos, v.g., definir, clas-
sificar, prometer, avisar etc.
Widdowson tende a fundamentar toda sua teoria na des-
crio retrica: "parece no haver razo", diz ele, "por que
a retrica como descrio da competncia comunicativa no
deva adquirir padres de preciso semelhantes aos que a gra-
mtica tem na descrio da competncia gramatical". E arre-
mata: "Em minha opinio, a melhor maneira talvez a nica
maneira de caracterizar diferentes registros lingsticos
descobrir que atos retricos so comumente realizados ne-
les, como eles combinam para formar unidades comunicativas
compostas (v.g. relatrio cientfico) e quais os recursos
lingsticos que so utilizados para indic-los".
-
29
Desta afirmao pode-se deduzir a importncia dada ao
discurso com as regras e caractersticas prprias de suas
unidades na competncia comunicativa pela viso de Widdowson
que, segundo veremos, traou novos caminhos no ensino de
lnguas.
-
4 IMPLICAES DA ABORDAGEM COMUNICATIVA
A viso da lngua sempre ligada a um contexto, de
lngua como interao e de lngua como negociao foi o pon-
to de partida da revoluo silenciosa que no incio da dca-
da de 70 comeava a dar os primeiros passos e que posterior-
mente daria corpo ao ensino comunicativo de lnguas.
A teoria comunicativa baseia-se, sobretudo, na obser-
vao das necessidades individuais do falante da lngua. Em
vez de perguntar: "qual a gramtica da lngua?", pergun-
ta-se: "o que o usurio precisa fazer com a lngua?" ou "que
significados ele precisa expressar atravs da lngua?".
Toda vez que fazemos uma pergunta porque precisamos
de uma resposta; se falamos ou escrevemos porque temos
algo de novo para dizer; e quando ouvimos ou lemos estamos
procurando informaes ou idias. Em outras palavras, existe
sempre uma necessidade e um propsito de comunicao e algo
a ser comunicado.
Esta necessidade, este propsito que do origem a
nossa competncia comunicativa.
A abordagem con.u icativa nasceu com a preocupao de
que h muitos fatores envolvidos na interao entre falante
e ouvinte, escritor e leitor e que o simples domnio de for-
mas gramaticais e estruturais que vinha direcionando o
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31
ensino de lnguas estrangeiras no preparou os alunos
adequadamente para usar a lngua que eles estavam aprendendo.
Esclarendo, competncia lingstica no leva necessariamente
competncia comunicativa.
Richard Allwright (in Brumfit e Johnson, 1979:167)
pe em dvida que comunicao tenha sido a meta permanente
dos que se tm dedicado ao ensino de lnguas, conforme foi
muitas vezes alardeado. Diz ele que basta um exame rpido
nos livros-textos para se concluir que a anlise da lngua
tem prioridade evidente sobre a habilidade de comunicar. Em
sua crtica ele destaca que embora sempre tenha havido uma
aparente preocupao com comunicao, a posio da comunica-
o foi apenas componente essencial e destacado do produto de ensino de lnguas, mas no, componente essencial do pro-cesso do ensino de lnguas.
A questo colocada por ele da seguinte maneira:
estamos ensinando lngua (para comunicao)?
ou
estamos ensinando comunicao (via lngua)?
Colocar comunicao como produto da aprendizagem foi o objetivo do ensino estruturalista de lnguas e que por ser produto atingvel a longo prazo acabava sendo negligenciado.
0 movimento comunicativo, por outro lado, enfatiza a lngua como instrumento de comunicao j no prprio processo de aprendizagem com caractersticas bem marcadas que o dis-tingue do prprio estruturalismo.
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32
Sandra Savignon (1983:23-24) enumera alguns postula-
dos que, segundo ela, seriam os pilares na aplicao de pro-
cedimentos comunicativos no ensino de lnguas:
1. 0 uso da lngua criativo. Os estu-dantes usam qualquer conhecimento que eles possuem de um sistema de lngua para expressar seus significados numa infinita variedade de modos. 2. 0 uso da lngua consiste de muitas habilidades num amplo esquema comunicativo. A natureza de habilidades particulares necessrias depende do papel dos partici-pantes, da situao e do objetivo da interao. 3. A aprendizagem da segunda lngua, como da lngua materna, comea com as necessidades e interesse dos estudantes. 4. Uma anlise das necessidades e interesses do estudante proporciona a base mais efetiva para o desenvolvimento de materiais. 5. A unidade bsica de prtica deve ser sempre um texto ou uma quantidade substanciosa de amostras de discurso. A produo deve comear com a transmisso de significado. Nao se deve esperar nem exigir correo formal nos primeiros estgios. 6. 0 professor assume uma variedade de papis para permitir ao estudante participao em uma ampla rea de situaes comunicativas.
Ela tambm cita uma srie de conceitos que vem sendo
constantamente empregados com referncia ao ensino comunica-
tivo de lnguas: "necessidades do estudante, aproximao,
funes, habilidades, discurso, interpretao, interao,
negociao, contexto e adequao".
-
33
4 . 1 C O M P O N E N T E S D A C O M P E T E N C I A C O M U N I C A T I V A
Quando tivemos a oportunidade de fornecer os concei-
tos de competncia lingstica e competncia comunicativa na
viso de alguns estudiosos, fizemo-lo colocando estes concei-
tos em clara oposio. Dois pesquisadores canadenses, Canale
e Swain, desenvolveram um quadro terico no qual eles propem
a colocao da competncia lingstica como componente da
competncia comunicativa.
Canale (1983:6-14) identifica quatro componentes que
comporiam a competncia comunicativa: competncia gramati-
cal, competncia sociolingstica, competncia discursiva e
competncia estratgica. Esses quatro componentes da compe-
tncia comunicativa servem de base para o projeto curricular
e prtica a nvel de sala de aula.
4 . 1 , 1 C O M P E T N C I A G R A M A T I C A L
A competncia gramatical a prpria competncia lin-
gstica no sentido restrito do termo como foi usado por
Chomsky e outros lingistas. Constitui-se naquela parte da
lngua com a qual estamos mais familiarizados, isto , a
busca da correo gramatical que tem direcionado o ensino de
lnguas durante sculos. a busca do domnio do cdigo
lingstico propriamente dito. Canale (op.cit.) inclui n ->-
te estudo da lngua seu vocabulrio, formao de palavras,
formao de oraes, pronncia, escrita e semntica.
-
34
A competencia gramatical supe conhecimento e habili-
dade para compreender e expressar com correo o significado
literal dos enunciados. Como tal, Canale afirma ser a com-
petncia gramatical um fator importante no aprendizado da
lngua estrangeira.
Convm observar que uma pessoa demonstra competncia
gramatical quando usa uma regra, no quando cita a regra.
4 . 1 . 2 C O M P E T N C I A S O C I O L I N G S T I C A
Canale (op.cit.:7) diz que competncia sociolings-
tica refere-se especificamente propriedade de uso dos enun-ciados pelo falante conforme os diferentes contextos socio-
lingsticos, dependendo de fatores tais como status dos participantes, propsitos da interao, alm de normas ou
convenes da interao. Esta propriedade dos enunciados
refere-se tanto ao significado quanto forma.
Julgamentos de propriedade envolvem conhecimento do
que dizer numa situao e como diz-lo. Savignon (1983:37) inclui na competncia sociolingstica tambm a capacidade
de saber quando ficar em silncio, ou, como ele esclarece,
quando parecer incompetente. A ttulo de esclarecimento, ela
cita um exemplo de sua juventude, quando as meninas no de-
veriam falar muito na _-la de aula, no "se mostrar" aos ra-
pazes, e eram aconselhadas a agir como tolas em determinadas
ocasies para dar aos homens em suas vidas uma sensao de
superioridade. A aparncia de incompetncia neste exemplo
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35
era considerada apropriada e, portanto, sinal de competncia
sociolingstica.
Propriedade de forma refere-se ao uso do cdigo verbal
num determinado contexto sociolingstico. Por exemplo, um
garom demonstraria incompetncia sociolingstica se se di-
rigisse ao fregus em termos mais ou menos como estes: "Oi,
cara, qual o rango que vai hoje?".
Canale faz uma observao importante de que existe uma
tendncia errnea em muitos programas de ensino de lnguas es-
trangeiras de considerar a competncia sociolingstica menos
importante que a competncia gramatical. A importncia da
competncia sociolingstica pode ser deduzida do prprio
status que ela detm no ensino da lngua materna, tanto no lar como na escola, onde as crianas so orientadas continua-
mente quanto linguagem a ser usada nos diversos contextos
sociais.
4 , 1 . 3 C O M P E T N C I A D I S C U R S I V A
Este tipo de competncia definido por Canale (op.
cit.) como referindo-se ao domnio que o usurio da lngua
deve possuir de como combinar formas gramaticais e signifi-
cados para conseguir um texto escrito ou falado unificado.
A unidade pode ser alcanada atravs da coeso na forma e da
coerncia no significado. A coeso conseguida atravs de
dispositivos tais como pronomes, sinnimos, elipse, conjuno
-
36
e substituio que no s uniro estruturalmente o texto como
facilitaro sua interpretao.
A coerncia a relao de todas as oraes ou enun-
ciados num texto,que levar a uma proposio global nica.
Savignon (1983:40) resume competncia discursiva
como "a habilidade de interpretar uma srie de oraes ou
enunciados a fim de formar um todo significativo e para con-
seguir textos coerentes que sejam relevantes em determinado
contexto. O sucesso em ambos os casos depende do conhecimento
comum que escritor/falante, leitor/ouvinte possuem conhe-
cimento do mundo real, conhecimento do cdigo lingstico,
conhecimento da estrutura do discurso e conhecimento das
convenes sociais".
4 . 1 , 4 C O M P E T N C I A E S T R A T G I C A
Quando inclui competncia estratgica entre os compo-
nentes da competncia comunicativa, Canale refere-se a um
fator de enorme utilidade para o falante da segunda lngua
que saiba usar inteligentemente dos recursos a seu dispor.
A competncia estratgica manifesta-se para compensar
o conhecimento imperfeito de regras gramaticais, ou imper-
feies de memria para lembrar uma idia ou um determinado
vocbulo.
Quando algum no consegue lembrar-se de determinada
forma gramatical, poder estrategicamente usar uma parfrase.
Assim, se o estudante no se lembrar do termo train station,
-
37
poder parafrasear para the place where trains go ou the place for trains.
Savignon (1983:40) inclui tambm nesta competncia
estratgica a circunlocuo, a repetio, a hesitao, a
adivinhao, bem como mudana de registro e estilo. Ela re-
lata que muitas vezes a competncia estratgica leva o falan-
te a evitar certas palavras, estruturas ou tpicos com os
quais no est familiarizado, o que, portanto, comprometeria
a comunicao.
Desta forma, a competncia estratgica componente
essencial num quadro descritivo de competncia comunicativa.
-
5 O CURRCULO: EVOLUO
A abordagem comunicativa de lnguas tambm fre-
qentemente referida como abordagem funcional, ou nocional,
ou, ainda, funcional-nocional, conceitos estes que buscam
interpretar uma oposio ao ensino puramente gramatical da
lngua, visando exclusiva competncia lingstica.
Canale (1983) esclarece, como j vimos, que a aborda-
gem comunicativa no visa eliminao da competncia lin-
gstica, mas colocao desta competncia entre outros
itens que compem a competncia comunicativa. A forma gra-
matical ensinada no como um fim em sim, mas como um meio
de facilitar a comunicao.
Mary Finocchiaro (1983:13) diz que "uma abordagem
funcional/nocional no ensino de lngua coloca grande nfase
no propsito comunicativo do ato da fala. 0 foco passa para
o que as pessoas querem fazer ou o que elas querem realizar
atravs da fala".
Isto quer dizer que a lngua ser apresentada para
coincidir com as funes comunicativas ou usos para os quais
ela ser colocada (v g. pedir informaes, expressar opinies,
fornecer direes etc.).
A ordem de apresentao destas funes depender de um fator essencial na abordagem comunicativa e que era ne-
-
39
gligenciado na abordagem estrutural: as necessidades do es-
tudante, isto , o que eles precisaro FAZER com a lngua.
Uma vez que se tenha em mo uma listagem destas necessidades,
passa-se a escolher as formas que sero usadas para expres-
sar cada funo.
A seleo destas funes, sua ordem de apresentao
leva-nos especificao do currculo. E foi justamente na
especificao do currculo que a abordagem funcional teve
sua maior influncia, j que no considerada um mtodo
propriamente dito.
David Wilkins (in Brunfit e Johnson, 1979:82-90)
apresentou em 1972 um relatrio intitulado "Currculos Gra-
maticais, Situacionais e Nocionais", na Terceira Conferncia
de Lingstica Aplicada, em Copenhagen.
Ali ele refere-se ao currculo gramatical como sendo
aquele em que esto listados os itens do sistema da lngua
sem que se leve em conta a utilidade desses itens para uso
prtico dos estudantes.
O currculo situacional (que no deve ser confundido
com mtodo situacional que usa contextos para apresentar es-
truturas gramaticais) leva em considerao o contexto social
e baseia-se em possveis situaes nas quais o aprendiz da
lngua provavelmente vai operar atravs dela.
Wilkins distingue o currculo situacional do gramati-
cal no sentido de que o primeiro baseado no material en-
quanto que o segundo baseia-se no aprendiz, j que " poss-
-
40
vel para as pessoas concentrar o ensino nas formas da lngua
que so mais apropriadas para suas necessidades".
Currculo nocional, que foi objeto de uma publicao
especial de Wilkins em 1974, refere-se ao currculo no qual
noes (idias) so expressas atravs de funes comunicati-
vas, bem como categorias "semntico-gramaticais" que incluem
maneiras de expressar conceitos de tempo, espao, localidade
etc.
De uma forma geral, Wilkins relaciona o currculo
gramatical a como as coisas so ditas, o situacional a quando
e onde as coisas so ditas e o currculo nocional a que no-
es (significados) o aprendiz quer comunicar.
A especificao detalhada de cada currculo com as
bases tericas que os embasavam mostrar-nos-o a evoluo do
prprio ensino de lnguas at o momento presente. As idias
aqui apresentadas foram extradas de Notional Syllabuses
(Wilkins, 1976).
5 . 1 C U R R C U L O G R A M A T I C A L
Sem levar em considerao o mtodo, as unidades de ensino seriam necessariamente definidas em termos gramati-cais, embora a seqncia em que elas ocorressem fossem in-fluenciadas por consideraes pedaggicas. A explicao que se dava para a adoo dessa abordagem era de que havia moti-vos psicolgicos apoiando a diviso da lngua em partes, de-terminadas por categorias gramaticais. Supunha-se que a ta-
-
Al
refa de ensinar ficaria muito mais fcil se se apresentasse
uma parte da gramtica de cada vez. Os mtodos de gramtica
e traduo, audiolingual e estrutural so todos exemplos da
aplicao destes princpios.
Uma das principais crticas de Wilkins a essa aborda-
gem que os professores eram levados a ensinar todo o sis-
tema, embora muitas partes fossem desnecessrias; as formas
gramaticais seriam ensinadas porque elas esto l e no pelo
valor que possam ter para o aprendiz.
No currculo gramatical, o contedo vocabular de
importncia secundria e nunca proporciona as bases estrutu-
rais de um curso.
Wilkins no nega que aquilo que aprendido atravs
de um currculo gramatical seja de valor para o aprendiz.
Ele apenas sugere que esta no seria necessariamente a me-
lhor maneira de se projetar um curso e que, acima de tudo, a
aprendizagem no est completa quando o contedo gramatical
estiver totalmente assimilado.
Uma forte razo para o questionamento de valor do
currculo gramatical que as oraes no possuem uso restri-
to e exclusivo sugerido pelo rtulo gramatical que a elas
damos, isto , no h correspondncia exata entre forma e
funo, uma mesma forma podendo ter vrias funes.
Widdowson (1871:38-39) explica isto da seguinte ma-
neira :
Imagine-se, por exemplo, que o modo imperativo seja um indicador inequvoco de um ato de coman-do. Mas considere estes exemplos de imperativo: "Asse a torta em fogo brando", "Venha para o
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jantar amanh", Aceite a oferta dele", "Perdoai nossas ofensas". Uma instruo, um convite, um conselho e uma prece so todos atos diferentes; contudo, o impera-tivo serve a todos eles e pode no servir a nenhum deles: "Voc deve assar a torta em fogo brando", "Por que voc nao vem para o jantar amanh?", "Eu aceitaria a oferta dele", "Ns rogamos que perdoeis nossas ofensas". Pode-se supor, contudo, que embora haja dife-rentes tipos de atos que podem ser executados pelo imperativo, quando uma ordem para ser dada sempre o imperativo que usado. Mas este, claro, tambm no o caso. Assim como uma forma lingstica pode exercer uma variedade de funes retricas, da mesma forma uma funo retrica pode ser exercida por uma variedade de formas lingsticas.
Alguns exemplos de Labov (1969:54-56) para mostrar as
diferentes maneiras que um professor pode usar para dar uma
ordem:
a) Isto deveria ser feito de novo. b) Voc ter que fazer isto de novo. c) Voc pode fazer melhor do que isto. d) minha obrigao exigir que voc faa melhor
do que isto.
Podemos observar que essas oraes no so sinnimas e que nenhuma delas est no modo imperativo. No entanto, pelas prprias relaes de professor com seus alunos, todas essas oraes sero consideradas ordens.
Esse raciocnio levou Wilkins a concluir que as pes-soas que falam a mesma lngua possuem no s uma competncia lingstica como uma competncia comunicativa. Em relao a lnguas estrangeiras, isto significa que preciso aprender regras de comunicao alm de regras de gramtica, j que as
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convenes que relacionam a forma lingstica com seu efeito
comunicativo no so universais.
0 que permitido numa determinada lngua pode no ser
em outra.
5 , 2 C U R R C U L O S I T U A C I O N A L
Wilkins (op.cit:16-17) relata que a insatisfao com
o currculo gramatical e o ensino dele derivado, no compa-
tvel com as situaes em que o falante da lngua usar a
lngua, levou escolha alternativa das necessidades situa-
cionais como ponto de partida para se construir um currculo
situacional que substitusse o currculo gramatical.
Os argumentos a favor do currculo situacional so
muito fortes.
Embora as lnguas sejam entendidas como sistemas ge-
rais, elas so sempre usadas em contextos sociais e no po-
dem ser entendidas fora destes contextos. Escolhemos as
formas lingsticas de acordo com as situaes sociais e,
assim, seria melhor orientar a aprendizagem para o estudante
e suas necessidades sociais em vez de orient-lo para o con-
tedo lingstico.
As situaes em que o aprendiz provavelmente usar a
lngua podem ser perfeitamente previstas e, conseqentemente,
ensinar-lhe-emos a lngua necessria para ser usada nessas
situaes.
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44
As unidades geralmente recebem um ttulo situacional,
por exemplo, "No Supermercado" ou "No Salo de Beleza" e
quase todas as oraes no dilogo relacionam-se com o tema ou
aquele centro de interesse. Os dilogos, no entanto, so es-
critos para ilustrar uma forma gramatical e quase nunca so
representaes de uma linguagem natural que as pessoas real-
mente usam nessas situaes.
Wilkins (op.cit.) considera a abordagem situacional um
avano em relao abordagem gramatical, pois o ensino pas-
sa a ser orientado para o estudante e suas necessidades, ao
invs da matria em si e seu contedo.
Ele pondera, contudo, que a primeira dificuldade se-
ria a clara definio do que seria uma situao. Com os exemplos que demos "No Supermercado", "No
Salo de Beleza" no haveria muita dificuldade. Afinal,
com um pouco de criatividade podem-se construir dilogos
bastante semelhantes aos que seriam usados por falantes
reais em situaes idnticas. Contudo no se pode esperar
que o falante esteja lingsticamente merc de uma situao
fsica em que ele se encontre. "O que o indivduo diz o
que ele decide dizer. assunto de suas intenes e prop-
sitos", arremata Wilkins (op.cit.: 17) .
Ele, a seguir, fala de um caso em que a linguagem
usada no est restrita situao, como seria de esperar
nurn . ro-texto de ingls.
Uma pessoa pode ir ao correio no para comprar selos
ou enviar uma carta, mas para reclamar do no recebimento de
um pacote ou, at mesmo, perguntar a um amigo que trabalha
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no balco se ele gostaria de ir ao jogo de futebol no domin-
go tarde.
Donde se conclui que certas funes da lngua como
a de informar-se, convidar, concordar, discordar podem
acontecer em qualquer situao, sem restrio alguma, embora
as possibilidades indiquem que em determinadas situaes
determinada comunicao acontecer.
Wilkins tributa uma certa validade ao currculo situa-
cional que pode atender a necessidades muito restritas de um
turista, por exemplo, ou de um garom. Fora desses contextos,
no entanto, essas pessoas no teriam condies de usar a ln-
gua ordinariamente.
5 , 3 C U R R C U L O N O C I O N A L
Uma vez que considera o currculo gramatical e o si-tuacional inadequados para um projeto de aprendizagem de uma lngua estrangeira para uso imediato em comunicao, Wilkins (op.cit: 18-2 0) sugere uma terceira alternativa: o currculo nocional.
"Quando se projeta um currculo nocional, em vez de perguntar como os falantes da lngua se expressam ou quando e onde eles usam a lngua, ns perguntamos o que que eles comunicam atravs da lngua. Estamos preparados, ento, pa-ra organizar o ensino de lngua em termos de contedo, em vez de forma da lngua", diz Wilkins, definindo, assim, gene-ricamente, o currculo nocional.
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Nocional deve ser entendido como baseado no signifi-cado, no que o falante faz com a lngua.
Este enfoque tem sua razo de ser, porque, de acordo
com Wilkins, o aprendizado de lnguas tem-se concentrado mais
no uso da lngua para relatar e descrever do que no de fazer
coisas atravs dele. Ele cita um exemplo (op.cit.: 41): uma
pessoa que diz "o gerente mandou o bbado sair do restaurante" est relatando o que aconteceu (uma ordem que foi dada). A
pessoa que diz "Saia daqui" ou "Est na hora de sair" est transmitindo uma ordem. Assim, saber relatar no significa
necessariamente saber fazer algo.
Wilkins (op.cit.:19) enumera algumas vantagens do
currculo nocional que seriam basicamente as seguintes:
leva em considerao os fatos comunicativos da
lngua desde o comeo, sem perder de vista fatos
gramaticais e situacionais;
potencialmente superior ao currculo gramatical
porque produzir competncia comunicativa e porque
sua preocupao com o uso da lngua sustentar a
motivao dos alunos;
superior ao currculo situacional porque pode as-
segurar que as mais importantes formas gramaticais
sejam includas e porque pode cobrir todos os tipos
de funes da lnyL-a, no somente aquelas que ocor-
ram tipicamente em certas situaes.
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47
Ele admite que o material derivado de um currculo
nocional ser lingsticamente heterogneo, isto , no se-
guir uma determinada ordem de gradao, como acontece com o
currculo gramatical. Os fatos gramaticais aparecero na
medida em que forem necessrios sem que se leve em conside-
rao qualquer ordem do tipo: primeiro o presente, depois o passado, antes o regular, depois o irregular.
J afirmamos que a abordagem comunicativa tem em mente,
sobretudo, as necessidades individuais do aluno, isto , ser
selecionado para fins de ensino aquilo que for mais til em
termos comunicativos. Quando esclarece o conceito de curr-
culo nocional, Wilkins (op.cit.:19) enfatiza essa necessidade
individual do aluno: "estratgia de ensino de lngua que
deriva o contexto da aprendizagem de uma anlise inicial das
necessidades do aluno em expressar significados".
Apenas quando isto estiver decidido que as formas
mais apropriadas para cada tipo de comunicao devem ser se-
lecionadas. Wilkins sugere que os ttulos das unidades se-
jam em termos semnticos, sem que haja razo para desprezar
a estrutura da lngua.
A preocupao de um curso dirigido para a especiali-
zao ser a de limitar o contedo para atender as necessi-
dades que o aluno tem para se expressar e no no nmero de
estruturas que ele precisa saber.
Neste ponto seria importante esclarecer que alguns
autores Savignon (1983), Finocchiaro e Brumfit (1983),
entre outros , que tm escrito sobre abordagem comunicativa
mais recentemente, vm preferindo usar o termo funcional/
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nocional quando se referem ao currculo em bases semnticas, enquanto Wilkins prefere o termo nocional sozinho para refe-rir-se tanto aos conceitos gerais quanto s funes da lin-
guagem.
Conceitos gerais referem-se s categorias gramaticais
e semntica, enquanto que as funes referem-se s inten-
es do falante.
Parece que o termo funcional/nocional tem recebido maior aceitao de vez que traduz uma melhor especificao
dos conceitos de funo e noo que Savignon (1983:141) descreve da seguinte forma: em um currculo funcional/no-
cional o contedo da lngua organizado por categorias fun-
cionais. Inicialmente so especificadas as necessidades co-
municativas do aprendiz: descrio das situaes nas quais
ele usar a nova lngua e das atividades nas quais ele se engajar. Essas especificaes proporcionaro as bases para
estabelecer as categorias de funes comunicativas, ou sim-
plesmente funes, para as quais o aprendiz deve estar pre-
parado: aconselhar, cumprimentar, relatar informaes so
alguns exemplos. Essas funes so consideradas em termos
de conceitos semnticos, ou noes definidas como conceitos gerais de significado, tais como tempo, freqncia, durao,
dimenso, relacionamento, locao etc.
Finocchiaro (1983:32) subdivide noes em suas sub-
categorias: gerais, que se referem a fenmenos lingsticos universais, tais como tempo, espao, quantidade, movimento,
matria, caso e deixis aos quais Wilkins (1976) denomina de categorias semntico-gramaticais ou especficos, isto
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, os itens de estrutura e vocabulrio que seriam encontra-dos dentro das categorias gerais e que so necessrios para
completar ou esclarecer expresses funcionais da lngua.
(Por exemplo, ns lamentamos alguma coisa, discordamos de algum ou de alguma opinio, cumprimentamos algum por alguma conquista).
Savignon (op.cit.: 141) diz que "uma considerao de
noes em relao a vrias funes da lngua conduz por seu
turno a uma identificao de formas necessrias ou teis pa-ra a lngua alvo, isto , gramtica e vocabulrio".
Poder-se-ia dizer, portanto, que o currculo funcio-
nal/nocional seria uma listagem de formas da lngua seme-
lhantemente ao currculo estrutural. Contudo Savignon dis-
tingue o currculo funcional/nocional de estrutural na ma-
neira como essas formas so escolhidas. Quando se baseia
nas necessidades comunicativas do aluno, a abordagem funcio-
nal/nocional destaca os usos para os quais a lngua colo-
da, ao passo que as categorias gramaticais so usadas para
descrev-la.
5 . 4 R E S T R I E S A O C U R R C U L O N O C I O N A L
Sem dvida alguma, a organizao do currculo em ba-ses nocionais representa um avano considervel no ensino de lnguas com sentido claramente comunicativo.
No entanto, o caminho a ser andado at sua consolida-o em termos prticos de uso em sala de aula longo e bas-
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50
tante confuso, j que ele requer, da parte dos professores
pelo menos no Brasil conhecimentos novos em termos de
funes da lngua que eles parecem no possuir.
Widdowson (1979:246-254) faz uma interessante crtica
sobre o currculo nocional onde ele procura mostrar suas
vantagens e desvantagens e cujas idias bsicas tentaremos
transcrever a seguir.
Sabe-se que o currculo nocional apresentado como
alternativa ao currculo estrutural. A diferena bsica dos -
dois est na maneira como o contedo lingstico apresen-
tado. Enquanto no currculo estrutural o contedo definido
em termos formais itens lxicos e gramaticais represen-tando o sistema da lngua no currculo nocional o conte-
do apresentado em termos semnticos.
bom destacar que ambos tm em comum o objetivo de
listar unidades lingsticas isoladas e em abstrao. No
currculo estrutural esses itens so apresentados de forma
graduada, o que no acontece no currculo nocional. O pri-
meiro refere-se descrio da lngua; o segundo, s neces-
sidades prticas do estudante.
As duas abordagens seguem correntes lingsticas que
do suporte terico s suas manifestaes. Assim, enquanto o
currculo estrutural desenvolve-se numa poca em que os lin-
gistas predominantemente concebiam a lngua em termos de
propriedades de formas de superfcie, o currculo nocional
surge quando o interesse dos lingistas dirige-se para as
propriedades comunicativas da lngua, quando o significado
passa a ocupar o centro das atenes atravs dos atos da fala,
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51
pressuposies, categorias de casos, implicaes de conversa-o e outros conceitos.
E se as necessidades dos estudantes forem levadas em
considerao, que tipo de conhecimento ele deveria possuir ao
final de seu curso?
Os proponentes do currculo estrutural defendero o
argumento de que o estudante precisa de um conhecimento bsi-
co do sistema da lngua, de suas formas lxicas e gramaticais
que lhe proporcionem uma competncia lingstica que se trans-
formar, com o correr do tempo e na medida em que as necessida-
des surgirem, em competncia comunicativa. 0 importante a
aquisio do conhecimento do sistema da lngua; comunicao
assunto que o estudante deve adquirir por seus prprios meios.
Esta proposta no aceita pelos proponentes do currcu-
lo nocional, que argumentam ser essencial que o estudante V
aprenda formas apropriadas de comunicao j no prprio pro-
cesso de aprendizagem da lngua, tendo em vista que ser muito
difcil sua aquisio posterior baseada apenas em conhecimentos
lingsticos. 0 postulado bsico de que a competncia comu-
nicativa deva ser expressamente ensinada.
Pode-se deduzir desses argumentos que, embora as duas
abordagens tenham em mira a habilidade comunicativa do estu-
dante, elas diferem quanto maneira que esta habilidade ser
adquirida.
0 currculo nocional se apresenta vantajoso, j que
objetiva fornecer competncia comunicativa dentro de seu pr-
prio projeto de elaborao. Sua falha, no entanto, que apre-
senta a lngua como um inventrio de itens, da mesma forma que
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52'
o currculo estrutural se prope fazer. verdade que so
itens nocionais e no estruturais, mas so isolados da mesma
forma e aqui que parece residir sua maior fraqueza.
A grande falha de um currculo nocional, no entanto,
a no apresentao da lngua como discurso e, como conse-
qncia, no levar o aluno competncia comunicativa j
que competncia comunicativa no se restringe memorizao
de itens, mas engloba um conjunto de estratgias ou procedi-
mentos criativos que levem compreenso do valor dos elemen-
tos lingsticos em contextos de uso e habilidosa partici-
pao no discurso falado ou escrito, graas a um conhecimento
em comum de fontes de cdigos e regras de uso da lngua.
0 currculo nocional, em suma, lida com os componen-
tes do discurso e no com o discurso propriamente dito.
Widdowson pe em dvida a capacidade de abrangncia
de um inventrio de noes do tipo proposto por Wilkins
(1976), entre outros, quanto aos fatos comunicativos da
lngua. Ele argumenta que um tal inventrio, por sua pr-
pria natureza, no leva em considerao a possibilidade de
que a comunicao no acontece atravs da interpretao lin-
gstica de conceitos e funes como unidades de significado
contidos em si mesmos, mas sim atravs do discurso, onde os
significados, ao contrrio, so negociados atravs da inte-
rao .
Diz ele textualmente:
o que o inventrio nocional nos apresenta uma coleo de elementos idealizados dos quais o discurso composto. Idealizados
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53'
porque, listados como esto isoladamente de um contexto, so exemplificados de forma a tornar seus significados conceituais e funcionais lingsticamente explcitos. No discurso, tais significados nao sao assina-lados com to conveniente clareza: seria freqentemente danoso para uma comunicao efetiva se eles assim fossem, j que depen-dncia contextual uma condio necessria para o desenvolvimento do discurso. No discurso s vezes necessrio descobrir penosamente que conceitos ou proposies esto sendo expressos e a que funes ou ilocues eles pertencem.
Apesar de Widdowson reconhecer que o currculo nocio-
nal se constitui era um avano considervel, ele coloca srias
limitaes ao entusiasmo inicial que surgiu com as idias de
Wilkins (1976). Sua opinio de que Wilkins oferece apenas
"uma descrio parcial e imprecisa de certas regras pragm-
ticas e semnticas que so usadas quando as pessoas intera- -
gem". Nada dito quanto aos procedimentos que so usados
na aplicao destas regras na atividade comunicativa.
Em resumo, a principal falha do currculo nocional
seria, na viso de Widdowson, a sua no preocupao com a
lngua em contexto, mas somente com conceitos e funes em
isolamento idealizado.
Uma nova proposta apresentada e viria responder s
necessidades comunicativas daqueles que estudam lngua es-
trangeira no como um fim em si, mas como instrumento de
realizao, acadmica e profissional.
Se considerarmos que a mudana de foco da estrutura
para a noo seja um avano, ainda assim teremos um longo
caminho pela frente. Teremos que enfrentar o caminho com-
plexo da comunicao, o caminho no qual as noes se reali-
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54'
zam no discurso. Se quisermos adotar uma abordagem de ensi-
no que tenha por objetivo principal o desenvolvimento da ha-
bilidade de fazer coisas com a lngua, o discurso dever
ocupar o centro de nosso interesse.
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6 O DISCURSO
J em 1973, Widdowson chamava a ateno dos envolvi-
dos no ensino de ingls para o fato de que deveriam desviar
sua preocupao com a orao para as combinaes de oraes
que formam trechos de discurso conexo.
Esta advertncia, segundo ele, tinha sua razo de ser
de vez que o ensino da orao como unidade do ensino da ln-
gua do modo como era feito pelo estruturalismo no le-
varia o estudante ao domnio da lngua como objeto de comuni
cao. Se o objetivo do ensino de ingls, por exemplo, tem
como finalidade propiciar meios para uma futura educao es-
pecializada, o estudo desta lngua tem que, necessariamente,
ser visto como processo de comunicao. Sendo assim, no
seria mais possvel pensar no seu ensino em termos de ora-
es isoladas, mas em termos de discurso, um dos componentes
essenciais da competncia comunicativa.
Widdowson (in Brumfit e Johnson, 1979:50) define dis-
curso como "o uso de oraes em combinao". Para chegar a
esta definio ele apresenta o seguinte raciocnio: existem
duas maneiras complementares de ver a lngua num plano alm
da orao: uma seria a segunda parte da definio "ora-
es em combinao"; a outra seria a primeira parte da de-
finio "o uso de oraes". Comentaremos esses conceitos
com maiores detalhes no decorrer do captulo.
-
56'
Philip Riley (1985:1-2) comenta a historia do ensino
de lnguas nos ltimos quinze anos e a mudana de foco dos
pesquisadores do fundamento interno do cdigo verbal fo-
nologa, morfologa e sintaxe para o funcionamento exter-
no tambm, a fim de incluir as funes da lngua, isto , o
que as pessoas fazem com as palavras num determinado contex-to. Diz ele:
a nfase em tal abordagem foge da estrutura e gramtica para a funo e competncia comunicativa, de oraoes conexas para fazer coisas com enunciados, da oraao isolada para o enunciado em contexto. Isto domnio de anlise do discurso a descrio do processo onde criamos, relacionamos, organizamos e compreendemos o significado.
Quando Riley afirma que anlise de discurso anlise
de significado, ele ressalva que significado neste caso no deveria ser visto do ponto de vista da semntica tradicional,
com o sentido de conceitos isolados, mas significado oriundo
tanto de um indivduo colaborando com um ou mais indivduos
na criao do discurso unificado (que ele denomina discurso de mltipla fonte) quanto de um indivduo que interpreta um texto produzido por outro indivduo,para o qual ele no con-
tribui (aqui denominado discurso de nica fonte). H. Holec (in Riley, 1985:22) distingue trs diferentes
abordagens para o termo discurso que, no seu modo de ver,
estariam baseados na ambigidade do termo:
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57'
a) discurso usado como termo equivalente ao conceito saussureano de parole quando se refere a todas as realizaes do conceito subjacente langue; por este ponto de vista, to-dos os enunciados que o falante pode produzir seriam consi-
derados em termos de seus relacionamentos com langue (rela-cionamentos entre langue e o discurso oral, ou os relaciona-mentos entre langue e o discurso escrito);
b) discurso tambm usado para referir-se anlise do que os lingistas americanos e ingleses chamam de lingsti-ca supra-sentencial, e neste sentido seria interpretado como uma srie de enunciados, no apenas justapostos, mas forman-
do parte de uma estrutura maior ligada por coeso semntica
(coeso que pode ser conseguida gramaticalmente, lxicamente,
no-verbalmente etc.);
c) finalmente discurso seria usado com uma interpre-tao muito mais ampla com o sentido de analisar as funes
da lngua; aqui o termo empregado para referir-se tanto
ao texto quanto s circunstncias nas quais o texto produ-
zido e interpretado. Holec usa o seguinte exemplo para ex-
plicar esta ltima interpretao de discurso: um aviso di-
zendo Proibido Fumar na parede de um teatro um exemplo de discurso, mas a mesma mensagem, colocada numa gaveta, se-
ria meramente um texto. Deste ponto de vista, portanto, o
objeto de anlise o texto-em-stuao (ou a mensagem em
contexto e situao) e o objetivo da anlise seria, por
exemplo, identificar e descrever as relaes entre um texto e
as circunstncias nas quais ele produzido ou definir as
estruturas de textos contendo diversas mensagens.
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58'
Esta interpretao tambm leva em considerao par-
metros extratextuais, j que o texto considerado como pro-
duto de convenes sociais e psicolgicas que o influenciam
numa determinada situao.
Widdowson, Sinclair e Coulthard foram os autores que
pesquisaram com maior profundidade a abordagem do discurso
que leva em considerao o texto e as circunstncias, o tex-
to verbal e o no verbal usados por um autor para se comuni-
car .
Widdowson (1978:117) explica que seu objetivo no es-
tudo do discurso o seu uso comunicativo. Neste sentido,
discurso no trata da descrio exata de regras gramaticais,
mas de suas potencialidades comunicativas, ao mesmo tempo que
observa como os usurios da lngua colocam o conhecimento de
tais regras a servio da comunicao, isto , como eles com-
binam significados uns com os outros e como estruturam uma
interao.
A negociao de significados a base fundamental para
o estudo do discurso, esua funo seria, assim, a da criao
de um significado comum quando os participantes trocam in-
formaes. Como diz Widdowson (1980) em Riley (1985:7):
Comunicaao existe quando o usuario da lngua reconhece uma situaao que requer a transmissao de informaao para estabelecer uma convergncia de conhecimento, dc 'irm que esta situaao possa ser mudada. Essa transaao requer a negociao de significado atravs da interaao. Refiro-me a esta negociao como discurso. 0 termo, por conseguinte, refere-se a interao que teve lugar para estabelecer o valor significativo
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de enunciados e para compreender a sua eficincia como indicadores de propsito ilocutrios. Esta interatividade I condio necessria para a criao de qualquer discurso.
6 , 1 T E X T O E D I S C U R S O
Alguns autores, Widdowson principalmente, fazem uma
clara distino entre texto e discurso, que passamos a ana-
lisar.
Considerando anlise de discurso do ponto de vista de
sua evoluo histrica, Widdowson (in Brumfit e Johnson,
1979:50-53) relata as investigaes feitas por Harris (1952)
quanto aos diverso
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