ética na comunicação

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3.2.5 ÉTICA NA COMUNICAÇÃO

1. Contextualização: Ética e

Ética na Comunicação

2. Princípios da Ética na

Comunicação

1.Contextualização: Ética e Ética

na Comunicação

4

ÉTICA

“… concerne ao estudo da moral e à aplicação

da razão para elucidar regras e princípios

específicos que determinam o certo e o errado

numa dada situação. Estas regras e princípios

chamam-se teorias éticas.” (Crane & Matten, 2010)

5

“… está relacionada com o carácter

individual e as regras morais que governam

e limitam a nossa conduta. Investiga

questões acerca do que é certo e errado,

dever e obrigação, e responsabilidade

moral.” (Shaw, 2011)

6

“… esse saber viver, ou arte de viver.” (Savater, 1991)

7

“ A ética tem origem

na vida quotidiana.” (Popkin & Stroll, 1956)

Nos dilemas morais que surgem

em situações concretas da vida

dos indivíduos e apelam à sua

consciência e necessidade de

tomar uma decisão8

9

“Um dilema moral é uma situação que requer uma

escolha em relação a um possível curso de acção

que, apesar de potencialmente poder beneficiar o

indivíduo ou a organização ou ambos pode ser

considerado não-ético. É muitas vezes uma

situação em que uma acção tem de ser realizada

mas para a qual não existe consenso acerca do

que é correcto ou incorrecto”. (Schermerhorn, 2002)

A reflexão ética do quotidiano transforma-se

numa reflexão de cariz filosófico quando

transcende as questões concretas que

surgem na vida dos indivíduos e desenvolve

uma abordagem geral e abstracta acerca

delas.

10

Perspectiva Contexto

Particular

Devo mentir-lhe ou dizer-lhe a verdadesobre onde estive ontem à noite?

Poderei ter este bebé nestascircunstâncias?

Este favor é-me especialmente vantajosoface às minhas ambições políticas. Devoaceitá-lo?

Quotidiano

Geral

Haverá circunstâncias em que a mentira émoralmente defensável?

É o aborto moralmente admissível?

Subornar e ser subornado são duas facesda mesma moeda: o uso de quaisquermeios para atingir os fins. Todos os meiosda acção são moralmente legítimos?

Filosofia

11

ÉTICA NA COMUNICAÇÃO

Reflexão filosófica sobre a conduta correcta e

incorrecta aplicada aos contextos da

comunicação interpessoal, mais concretamente,

da comunicação organizacional em geral, por

um lado, e do exercício das actividades

profissionais ligadas aos meios de comunicação,

por outro.

“…the fundamental to responsible thinking,

decision making, and the development of

relationships and communities within and

across contexts, cultures, channels, and

media.” (National Communication Association)

Porquê a interrogação ética na

comunicação?

Factores macro-ambientais

Globalização das

comunicações

Globalização das

comunicações

Poder de influência dos meios de comunicação

de massas na percepção da realidade

Poder de influência dos meios de comunicação

de massas na percepção da realidade

Consumidores informados, exigentes e conectados

Consumidores informados, exigentes e conectados

Razões para a crescente importância da ética na comunicação

� Crescente conectividade entre consumidores,

consumidores e organizações, organizações

� Os escândalos envolvendo empresas de todos os

sectores de actividade e também os profissionais e

empresas de comunicação continuam a ocorrer,

instalando-se a desconfiança dos consumidores e

públicos

� A crise de valores do mundo contemporâneo

(indiferença ética, gratificação imediata,

predomínio do visual e estético sobre o ético, dos

interesses pessoais sobre os colectivos…)

compromete a qualidade dos conteúdos

comunicacionais, a confiança dos públicos, assim

como o sistema de valores das organizações em

geral e dos profissionais da comunicação em

particular

� Ainda não está generalizada uma educação

formal e compreensiva da ética junto de

empresários de todas as áreas e profissionais da

comunicação, para além da resultante dos códigos

deontológicos das diferentes áreas de actividade

(jornalistas, relações públicas, publicitários…)

� Uma atitude ética contribui para a melhoria da

imagem e reputação das organizações e

profissionais

� As tecnologias digitais (web technologies)

generalizaram o acesso dos consumidores a todos

os tipos de conteúdos comunicacionais

(informativos e educativos, lúdicos, comerciais,

sociais…) e afectaram a capacidade individual de

controlar a informação que é tornada pública

� … criaram novos e mais complexos espaços de

networking e comunidades sociais

� … estimularam o relaxamento de condutas

moralmente questionáveis (exposição pública,

disseminação de práticas linguísticas pouco

elaboradas ou cuidadas, preguiça intelectual…)

mas também

� a interrogação sobre a natureza e alcance da

privacidade, e o reforço do escrutínio público a

respeito do comportamento das empresas e dos

profissionais da comunicação

… em suma, geraram novas

manifestações de tradicionais

questões éticas…

A Ética para além da Deontologia Profissional

A Deontologia Profissional designa o conjunto

de princípios de conduta e deveres de uma

profissão, estabelecendo, por conseguinte, os

limites de actuação dos profissionais, o quadro

de referência do comportamento correcto e

incorrecto.

Ainda que assente em alguns valores morais

fundantes das sociedades e acção colectiva

(e.g. vida humana, justiça…), compreende

também um conjunto de acções, direitos,

deveres e princípios de interesse e aplicação

exclusivos numa área profissional

Em regra, a deontologia profissional

encontra-se condensada num designado

CÓDIGO DE ÉTICA

ou

Código Deontológico

Códigos de Ética

Grupo Profissional

Advogados EngenheirosTécnicos

Oficiais de

Contas

Grupo Empresarial

PT EP EDP …

Códigos Deontológicos das Principais Actividades Profissionais na Área da

Comunicação

• CÓDIGO DEONTOLÓGICO DO JORNALISTA, aprovado em 4 de maio de

1993, em Assembleia Geral do Sindicato dos Jornalistas

• CÓDIGO DE CONDUTA DO GESTOR DE COMUNICAÇÃO

ORGANIZACIONAL E RELAÇÕES PÚBLICAS, aprovado em 31 de Março de

2009 Assembleia Geral APCE.

• CÓDIGO DE CONDUTA DO ICAP EM MATÉRIA DE PUBLICIDADE,

aprovado em 31 de Março de 2010

• STATEMENT OF ETHICS da AMA (American Marketing Association)

Assim, a Ética diferencia-se da mera acção

incorrecta e violadora da deontologia

profissional e em relação à qual não há

dúvidas quanto ao juízo moral.

“Os valores pessoais e profissionais que defendemos

não são mutuamente exclusivos. Quer dizer, a nossa

decisão em relação a defender um valor não significa

que tenhamos de abandonar outro. É antes uma

questão de estabelecermos prioridades sobre valores

que sustentamos simultaneamente.”

(Plaisance, 2009)

2. Princípios da Ética na

Comunicação

Os princípios éticos da comunicação atestam que

todos os actos comunicacionais possuem

uma dimensão moral, na qual inscrevemos um

conjunto de valores. Vários têm sido identificados

como estando envolvidos numa prática

comunicacional, por académicos e investigadores

oriundos das mais diversas áreas disciplinares,

como a psicologia, a sociologia, a filosofia, a

teoria política, entre outras.

TRANSPARÊNCIATRANSPARÊNCIA

DANODANO

AUTONOMIAAUTONOMIA

COMUNIDADECOMUNIDADE

PRIVACIDADEPRIVACIDADE

JUSTIÇAJUSTIÇA

Os Princípios transparência, dano, autonomia e

justiça entendem-se, consensualmente, como

orientadores da conduta e intrínsecos à prática

ética (o que significa agir com responsabilidade

moral no âmbito da comunicação). Privacidade e

comunidade, por seu turno, não existem

incorporados na conduta e na prática

profissionais, embora sejam preocupações

objectivas relativamente aos sujeitos-alvo da

comunicação.

TRANSPARÊNCIA

“… conduta que presume uma abertura

(openness) na comunicação e responde à

expectativa razoável de uma troca franca

(forthright exchange) quando as partes têm

um interesse legítimo (legitimate stake) nas

consequências que se seguem ao envio ou

recepção de uma mensagem.” (Plaisance, 2009)

Transparência é deixar claras as nossas

motivações, aspirações e intenções aos outros,

para que assim possam, como seres racionais

que são, avaliar as nossas acções. Todo o agir

ético deve assumir o homem não como um meio,

mas como um fim em si mesmo. E ao

(so)negarmos informação relevante negamos, a

fortiori, a capacidade racional do outro, portanto,

a sua liberdade de julgamento.Vide: Ética Kantiana e Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes(1785)

Transparência(Transparency)

Confiança(Trust)

As novas TIC são vistas como adjuvantes da transparência

pessoal, organizacional e social e, assim, da confiança e

responsabilização

Respeito(Respect)

A transparência, ao limitar o engano, a fraude ou a informação errónea, contribui para tratar a Humanidade

com respeito (i.e. atender à sua racionalidade e liberdade)

Questões

� O que significa mostrar respeito por alguém

quando comunicamos?

� Quais são as minhas razões para afirmar o que

afirmo?

� Estou a ser honesto ou há alguma coisa que não

revelo?

� Quais os limites da minha comunicação pública?

DANO

Fundamentalmente, definido pela

negativa: ‘non-maleficence’ ou ‘não

prejudicar os outros’ ou, ainda,

‘evitar fazer mal aos outros’.

Considerado um dever prima facie.

Dano é um conceito culturalmente definido e

muitas vezes identificado com ‘ofender o outro’

ou ‘violar os seus direitos’. Muito assente nos

valores ocidentais de autonomia e individualismo,

a noção de causar dano a outrem apoia-se ainda

na ideia de que decorre de uma tomada de

decisão que não considerou a necessidade de

solicitar o consentimento de quem é afectado por

ela.Vide: Éticas Consequencialistas e Stuart-Mill, Utilitarismo (1861); ÉticasDeontológicas e W. D. Ross, Foundations of Ethics (1939)

Dano(Harm)

Integridade e Dignidade Pessoal(Personal Integrity

and Dignity)

Sob este ponto de vista, o dano é visto

essencialmente na sua perspectiva moral,

independentemente de outras dimensões

poderem estar implicadas (como a

integridade e dignidade físicas, por exemplo)

Interesse(Interest)

Causar dano prejudica a possibilidade de

outrem realizar os seus interesses próprios e projecto pessoal de

vida

Consentimento(Consent)

O consentimento envolve atender

ao direito à integridade do

indivíduo e, assim, a questão

do dano moral não se coloca.

Dano pode significar coisas diferentes em diferentes

contextos comunicacionais:

� Comprometer uma possibilidade de negócio de um

cliente ou prejudicar a sua imagem pública

� Comprometer a credibilidade profissional própria no

longo prazo

� Comprometer o interesse público

� Comprometer o direito à privacidade …

Questões

� Quem, exactamente, pode ser prejudicado por uma decisão

em particular?

� Em que baseamos esta noção de dano potencial?

� Poderá o dano provocado a um indivíduo poupar o dano a um

grupo e será isso eticamente justificável?

� Quem decide sobre o que é ou não dano?

� Podem os responsáveis pela comunicação com os diferentes

públicos decidir unilateralmente sobre o que lhes é prejudicial

sem serem paternalistas ou condescendentes?

AUTONOMIA

“A verdadeira autonomia moral tem

pouco a ver com a liberdade e muito

mais com aderirmos consciente e

livremente a certos valores e a fazer

«o que é correcto».” (Plaisance, 2009)

AUTONOMIA (liberdade positiva)

(designa não apenas o que podemos fazer mas também o que devemos fazer; a

autonomia moral refere a nossa capacidade para controlar as razões das nossas acções,

mostrando entendimento das nossas obrigações como seres morais)Liberdade (liberdade negativa)

(estado de ser caracterizado pela ausência razoável de forças exteriores e que nos

permite procurar realizar os nossos interesses e visões de felicidade)

No Ocidente, a autonomia é um conceito fundador do

pensamento iluminista e, posteriormente, das

sociedades que caminharam para regimes

democráticos. À autonomia tem sido associada a

ideia de progresso social, assente, por sua vez, na de

progresso individual. A autonomia, na medida em que

é libertadora da criatividade, conduz ao ‘mercado das

ideias’ e só este permite o avanço civilizacional.

Vide: Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes (1785), Dworkin,The Theory and Practice of Autonomy (1988), Berlin, Four Essays onLiberty (1969)

AUTONOMIAAUTONOMIA

Auto-determinação

Auto-determinação

Vontade Livre

Vontade Livre

Responsabilidade Responsabilidade

Independência Independência

REDE CONCEPTUAL

Questões

� Até que ponto nos reconhecemos como agentes autónomos na

generalidade das situações de vida?

� Em que medida podem os deveres profissionais comprometer

a autonomia do indivíduo?

� Será a autonomia um valor ‘sobrevalorizado’ nas sociedades

ocidentais/ocidentalizadas, conducente a um exagero

individualístico e comprometedor da dimensão comunitária da

vida humana?

COMUNIDADE

“… refere-se à rede de indivíduos em

relações sociais uns com os outros

que nos ajuda a definir quem somos,

ao mesmo tempo que constitui a base

de acção e expressão de valores e

objectivos partilhados.” (Plaisance, 2009)

DIMENSÕES DA COMUNIDADE

COMUNIDADECOMUNIDADE

Familiar ou

social

Familiar ou

social

Política Política

Moral Moral

Cultural Cultural

A noção de comunidade assenta na ideia de que

tudo o que nos define como indivíduos decorre da

assumpção de papeis sociais gerados na

comunidade e, assim, que não podemos furtar-nos

à nossa natureza essencialmente relacional: todos

os papeis que desempenhamos são por si mesmos

relacionais e, por isso, a identidade é grandemente

determinada pelos grupos a que pertencemos.

Vide: Aristóteles, Ética Nicomaqueia e Política; J. Dewey, The Public andits Problems (1927)

Questões

� A noção de desenvolvimento pessoal é incompatível com uma

valorização da comunidade?

� Em que medida a visão comunitária estimula a democracia

participativa e como?

� Qual o papel da educação e da comunicação no progresso

moral da comunidade?

� Pode o progresso social excluir o progresso individual?

PRIVACIDADE

“…é a capacidade para realizar coisas na

nossa vida sem o escrutínio público” (Plaisance,

2009), convertendo-se assim no direito a

‘sermos deixados em paz’ (to be left alone)

Distância necessária à interacção social

Realização dos objectivos morais

Limitação dos contextos de conflito e caos interpessoal

Autorização de um espaço de

retaguarda informal

Reconhecimento da autonomia moral

FUNÇÕES DA PRIVACIDADE

“No lado mais restrito do espectro, a privacidade

relaciona-se exclusivamente com a informação

pessoal e descreve até que ponto os outros têm

acesso a esta informação.” No seu sentido mais lato,

refere-se à medida da extensão em que um

indivíduo é autorizado a um espaço social e legal

para desenvolver os poderes emocionais, cognitivos,

espirituais e morais de um agente autónomo

(Schoeman, 1992).

Vide: F. D Schoeman. Privacy and Social Freedom (1992)

Questões

� Porque é a privacidade considerada importante?

� Como deve ser interpretada e aplicada na prática profissional?

� Como conciliar a ideia de privacidade de consumidores,

produtores e profissionais da comunicação?

� Que conflitos emanam dos interesses da ‘esfera pública’ e da

‘esfera privada’?

JUSTIÇA

“… engloba um conjunto de ideias e teorias, incluindo as pretensões de que temos certos direitos, que estes direitos legais se baseiam numa concepção e obrigações morais, que

de alguma forma a noção de justiça se relaciona com ideias acerca da equidade, igualdade, imparcialidade e bem social.”

(Plaisance, 2009)

A Justiça é a fundação da nossa ideia do que

constitui “uma sociedade de sucesso e funcional”

(Plaisance, 2009). (…) A nossa expectativa de uma

sociedade justa vai bem para além da de que a

justiça começa e acaba numa sala de tribunal. Numa

perspectiva moral da justiça, ela implica a

participação responsável dos grupos sociais e

instituições, inclusive dos meios de comunicação.

Vide: J. Rawls, A Theory of Justice (1971)

“A justiça é a primeira virtude das

instituições sociais, tal como a

verdade o é dos sistemas de

pensamento” (J. Rawls)

Receber o devido

Due

EquidadeFairness

IgualdadeEquality

JUSTIÇA

Questões

� O que deve a justiça valorizar e como deve

funcionar?

� Que papel deve desempenhar o objectivo de

justiça social nas decisões comunicacionais?

� Em que medida a justiça condiciona o nosso

juízo acerca da validade da comunicação?

Referências Bibliográficas

Crane, A., Matten, D. Crane (2010) Business Ethics: Managing Corporate

Citizenship and Sustainability in the Age of Globalization, Oxford

University Press

Plaisance, P. L. (2009) Media Ethics, Key Principles for Responsible

Practice, Sage, London

Popkin, R., Stroll, A. (1956) Philosophy Made Simple, Garden City Dou-

bleday

Savater, F. (1991) Ética Para um Jovem, D. Quixote, Alfragide

Schermerhorn, J. R. (2002) Management, Wiley

Shaw, W. H. (2010) Business Ethics: A Textbook With Cases, Cengage

Learning

Ana Cláudia Campos (acalves@ualg.pt)

11/2013

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