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Elaine Andrade da Silva
o DESTINO: UMA LEITURA COMPARATIVA ENTRE EDIPO REI E
HAMLET.
Trabalho de Conclusao de Curso apresentado aoCurso de Letras - Portugues/lngles - daFaculdade de Ciencias Humanas, Letras e Artesda Universidade Tuiuti do Parana, como requisitoparcial para a obten~o do grau de Ucenciado emLetras PortuguesJlngles e respeclivas literaturas.Orientadora: Prof. a Dra.Crisliane Busata Smith.
CURITIBA
2009
SUMARIO
1 INTRODU9AO 8
2 TRAGEDIA: CONCEITO ARISTOTELICO 12
3 0 DESTINO EM EDIPO REI 15
3.1 DESTINO NA EPOCA CLASSICA GREGA 15
3.2 EDIPO REI: UMA TRAGEDIA DE DESTINO? 24
4 0 DESTINO EM HAMLET 38
4.1 A EPOCA RENASCENTISTA 38
4.2 HAMLET: VINGAN<;A OU DESTINO? 44
5 CONCLUSAO E ANALISE FINAL 56
6 REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 62
RESUMO
o objetivo deste trabalho e a analise da questao do destino nas obras Edipo Rei eHamlet. Para tal tim, contextualiza a problematica do destino e do livre arbitrio nassociedades grega antiga (Edipo ReI) e elisabetana (Hamiel). Ap6s acontextualiZ898o socia-cultural de ambas as obras, faz-s9 uma pesquisa e revisaobibliogri3fica referente as teorias acerca do destino nas duas obras, Com a analiseda questao do destino na obra Edipo Rei, contrapondo-o com a visao encontrada emHamlet, 0 trabalho tern 0 intuito de buscar uma rela9ao possivel que se podeestabelecer no que tange 0 destino em Edipo Rei e Hamlet. Analisa tambem, a luzda bibliografia que fundamenta 0 estudo, S8 ha ou nao a qU8stao da interferemcia dolivre arbitrio nas vis6es encontradas nestas duas obras. Pretende-S8 mostrar acomplexidade e a dificuldade de defini<;ao de urn tema que e tao amplo e que foge acompreensao humana. 0 estudo S8 torna relevante a medida que analisa duasobras universais, e que expressam a complexidade do tema escolhido para 0
trabalho.
Palavras-chave: Edipo Rei; Hamlet; destin~; livre arbitrio.
INTRODU<;:AO
NaG 56 no mundo da literatura, mas tambem na vida, muitas pessoas S8
question am aeerca da questao da forga do destino em suas vidas. Muitos te6ricos
trabalharam este assunto atraves das peg8s tragicas nas quais este tema estava
envolvido.
Para ilustrar essa questao, deveriam entao ser encontradas peg8s que
expressassem a complexidade do tema. Tanto a tragedia Edipo Rei, escrita par
S6focies, quanta Hamlet, escrita par William Shakespeare, mostram a angustia dos
protagonistas frente a urn futuro que pareee estar S8 esvaindo de suas maos.
Essas duas obras sao tao complexas, que acabam ultrapassando 0 limite do
individual e S8 expandem para 0 ambito do universal, par tratarem de temas ligados
a natureza humana em si, Segundo Knox.
As vezes acontece de um grande poeta criar um personagem no qual aessencia de uma era e destilada, uma figura representativa [...J. Paraseculos posteriores, este personagem se toma um ponto de referenciacentral para a compreensao da epoca de seu criador [...J. Uma dessasfiguras e Hamlet, principe da Dinamarca. a Dutra e Edipo, rei de Tebas.(KNOX, 2002, p. XVII).
Uma das grandes duvidas que pode pairar no pensamento do leitor dessas
obras e se teriam esses personagens tao emblematicos e complexos da literatura
algum cant role sobre os seus destinos.
Para Barbara Heliodora, uma das maiores criticas shakespearianas no Brasil,
essa questao deve ser tratada com cuidado, pois "0 mundo gregG e 0 elisabetano, e
indispensavel lembrar, sao separados por concepc;oes radicalmente diversas do
universo e do deslino do homem." (HELIODORA, 2004, p. 121).
Dito isto, este trabalho tentara contextualizar historicamente a questao do
destino e analisa-Ia mais profunda mente nessas duas pe~as classicas da literatura,
contrapondo as vis6es sobre 0 tema encontradas nas duas pec;as. A pesquisa sera
realizada a partir dos textos base que trazem a tona argumentos em rela9ao ao
destino nas duas pe9as escolhidas. Este estudo, portanto, ira analisar a queslao do
destin~ em Edipo Rei e Hamlet a partir da discussao de teoricos como Bernard
Knox, Barbara Heliodora, Lucio Esper, Mariano Parziale, Sonia Viegas Andrade,
Trajano Vieira, Harold Bloom, A.C. Bradley, entre outros.
No primeiro capitulo, faremos uma breve reflexao acerca do conceito
aristotelico de tragedia, ambientando assim as pe<;as dentro do genera literario em
que se encontram inseridas.
No segundo capitulo, estudaremos a tragedia Edipo Rei, ap6s situa-Ia no
contexto s6cio-cultural da Grecia antiga. A seguir faremos uma reviseo bibilografica
da pe9a, nos alenlando a aspeclos como a participa9§o de Edipo (livre arbitrio) e
das divindades gregas na construr;:ao do destino tragico deste personagem, que
ainda hoje e muito estudado, principalmente na area da psicologia.
No terceiro capitulo, estudaremos entao a tragedia Hamlet. A exemplo do
segundo capitulo, faremos uma breve contextualizar;:ao socia-cultural da sociedade
elisabetana, onde se encontravam as pensamentos humanitarios renascentistas.
Prosseguiremos com a realizac;ao da revisao bibliografica da pe<;a Hamlet,
enfocando em aspectos similares aos pesquisados em Edipo, ou seja, a existencia
ou nao do livre arbitrio ou de uma forc;a externa que maida 0 destino do pratagonista
desta pe9a de Shakespeare.
Ao analisar a questao do destino na obra Edipo Rei, contrapondo-o com a
visao encontrada em Hamlet, buscaremos uma relac;ao passive I que se pode
estabelecer no que tange a destino em Edipo Rei e Hamlet. Analisaremos tambem,
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a luz das obras que fundamentam 0 estudo, S8 ha ou nao a questao da interferencia
do livre arbitrio nas vis6es encontradas nestas duas obras.
Ao fazermos uma primeira leitura das obras, uma das hip6teses que podem
ser levantadas, primeiramente, e a de que a obra de S6focles refiete 0 pensamento
grego da spaca classica de que os deuses eram 5uperiores aos homens, e estes
tinham suas vidas governadas pDr aqueles. Edipo teve seu destino afetado pelo erro
de seu pai, e esla hamartia (erro I"'gico) afelou a vida de loda sua familia. Apesar
de serem as a~6es do protagonista que a levarn a descobrir que a profecia havia ha
muito S8 concretizado, e assim tambem a sua verdadeira idenlidade, ha par tn3s de
toda a trama a influencia de uma divindade, a qual profetizou 0 destino tragico de
Edipo. Edipo enfim nao conseguiu escapar dos designios divinos.
Ja em Hamlet, a questao do destin~ nos e apresentada de uma forma mais
relativizada, influenciada pelo pensamento do livre arbitrio que ecoava os
pensamentos humanitarios renascentistas na sociedade elisabetana. Diferentemente
da obra grega, esla obra de Shakespeare nao nos moslra urn prolagonisla lenlando
fugir de um destino vaticinado pelos deuses, mas sim um heroi tragico que se
question a sobre 0 seu destino, sabre sua condi<;:ao humana. Shakespeare muitas
vezes durante a obra nos coloca a refletir sobre e5sa questao atraves dos soliloquios
de Hamlet, no qual este se pergunta sabre a vida, a morte e 0 destin~.
Ao final do estudo, buscaremos analisar se estas hipoteses sao validas au
nao, e se ha real mente uma resposta fixa para 0 que se entende por destino.
Cabe aqui dizer, de antemao, que juntamente com a apresentac;ao das teorias
que fundamentam este trabalho, ja serao inseridas algumas reflex6es acerca do
proprio conteudo dos textos, trazendo assim alguns trechos das obras em questao
11
que parecem relevantes e que vao aD encontro do pensamento te6rico que esta
sendo pesquisado e mapeado.
Para come9armos 0 trabalho, faz-s8 importante trazer algumas acepc;6es
iniciais do vocabulo destine. Tratam-se de significados mais populares e modernos
do terma, que, porem, nao abarcam toda a complexidade de urn tema como 0
destino. Nos dicionarios encontramos
Destino: S. m. 1. Sucessao de fatos que podem ou nao ocorrer, e queconstituem a vida do homem. considerados como resultantes de causasindependentes de sua vontade; sorte, fado, fortuna. 2. P. ext. Aquilo queacontecera a alguem; futuro. 3. Fim ou objeto para que 5e reserva audesigna a\guma coisa; aplicayao, emprego. 4. Lugar aonde 5e dirige alguemou algo; dire1;Bo (FERREIRA. In: Diciomirio Aurelio basico da linguaporluguesa. Sao Paulo: Nova Fronteira e Folha de Sao Paulo, 1995, p.217.Verbete).
Destino: sm 1 Sucessao de fatos, supostamente fatais. 2 Fatalidade. 3Sorte, sina. 4 Vida. (ROCHA. In: Minidicionario Ruth Rocha. Sao Paulo:Scipione, 1995, p.207. Verbete).
Com 0 decurso do trabalho, pretendemos mostrar como qualquer definil'ao,
qualquer pensamento que se tenha sabre a destino acaba sendo, de certa forma,
insuficiente. Afinal, falar em destino e falar de alga que esta al8m da compreensao
humana, alga metafisico. Pretendemos tambsm que se percebam as diferenc;as e
semelhanc;as sabre as acepgoes que as gregos e as ingleses da renascenga tinham
sabre a destino. Pode se fazer tambsm um paralelo entre as dais pensamentas
apresentadas durante a trabalha com a pensamento atual, demanstrado aqui
atravss dos verbetes dos dicionarios.
12
2 TRAGEDIA: CONCEITO ARISTOTELICO
Antes de tudo, S8 faz importante trazer a ton a a conceito do fil6sofo grego
Arist6teles com rela9ao a tragedia. Afinal, as dUBs obras faco da pesquisa (Hamlet,
de William Shakespeare, e Edipo Rei, de S6focles) sao classificadas dentro deste
genero literario. Alem da obra a Poetica de Arist6teles, Qutras obras auxiliarao nas
reflex6es sobre a tragedia, como a de Barbara Heliodora (2004, p.121-146), Lucio
Esper (2009, p.154) e Jean-Pierre Vernant (2001).
Comecemos com Arist6teles, que em seu livro Poetica (2004, p. 37-75), trata
de temas relacionados a literatura, dentfe eles a conceito de tragedia. Para
Arist6teles, a tragedia seria a mimese (imit8gao) de ac;6es elevadas, caracterfsticas
de individuos nobres, com psique forte. Ou seja,
A tragedia e a representac;ao de uma aeaD elevada, de alguma extensao ecompleta, em linguagem adornada, distribuidos os adomos por todas aspartes, com atores atuando e nao narrando; e que, despertando a piedade etemor, tem par resultado a catarse dessas emofYoes.[...J segue-se que saoduas as causas naturals das a(}oes: id(Ha e car.1ter. E dessas agoes seorigina a boa e ma fortuna das pessoas. (ARISTOTELES, 2004, p.43)
A finalidade da tragedia, seria, portanto, carrigir pela dar, fazenda assim com
que a indivfduo tenha uma catarse (Iiyao de vida, liberac;::aa de suas emoyoes). 0
her6i desse tipo de genera confrontava-se entre a ethos (earater) e a daimon
(destino). Arist6teles define a her6i tragico como "urn hornem importante, mas nao
primardialmente virtuoso e justo, que par algum erro de julgamento e naa par vieio e
depravayiio, passa da felicidade a infelicidade" (ARISTOTELES apud HELIODORA,
2004, P 121)
Com relac;::ao ao her6i tragieo, ressalta Benedito Nunes que
o hero; e, de certo modo, objeto de um sacrificio. Mas nao haveria sacrificiose 0 infortunio da vitima nao fosse a expiar;;:aode uma falta perante apotencia superior de deus com qual colide [...J Sejam semi-homens, comoPrometeu, ou apenas humanos, como Edipo, 0 conflito ou a colisao, cujo
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desenlace leva a queda (katastrophe) do heroi, colocado no ~topo da rodada Fortuna, a meio caminho entre a sociedade humana na terra e algomaior no ceu", opoe-nos ao plano antagonico da divindade julgadora. S8messa oposicao, que separa 0 humane do divino, nao poderia haver tragedi8.Porem a intercorrencia, na 89130 tragica, dos dais pianos - 0 do divino,sancionando a faita, e 0 do humano respondendo por ela - nao se efetuarasempre da mesma fOnTIa. Variando de acordo com as alteracoes daexperiencia religiosa e moral, 0 connito recai no cicio dos motivDs miticos,teogonicos e cosmogonicos {... j. (NUNES, 2009, p.154)
Como fora dito par Mariano Parziale (1984, p.248), a tragedia grega, para
alcanc;ar as objetivos de despertar no espectador a emogao necessaria para a
catarse, se vale nao de elementos do cotidiano, mas da tradic;aa mital6gica difundida
principal mente de forma oral entre os gregos. Ou seja, se apoiava na moral religiosa
que pregava a forga do destino e no prindpia de que tado crime deveria ser vingado,
a partir do sofrimento de quem a cometera, podendo ser expand ida para os seus
descendentes.
Para 0 autor, 0 teatro grego e um teatro de conflitos, que surgem do
pensamento filos6fico a respeito do mundo e da existencia humana. Parziale elenca
alguns conflitos que aparecem no teatro grego, dentre eles a
fe inabalavel nos mitos e crencas estabelecidas e 0 da culpa contrastandocom a possibilidade de regenerac;ao do individuo e sobretudo 0 da liberdadehumana contra a inelutabilidade de uma forc;a ou poder universal superiorque oprime 0 hom em e, as vezes, os pr6prios deuses. [... ] (PARZIALE,(1984, p. 247)
Parziale (1984, p.249-2S0) ainda ressalta que as tragedias de Esquilo sao urn
exemplo do conservadorismo dos mitos, propagando assim, ern suas obras, a ideia
de urn destino inflexfvel, ao qual se devia total obediencia. Ern suas peyas, 0 destino
poderia se apresentar como uma divindade, podendo algumas vezes se manifestar
como urn poder sobrenatural e infalivel.
De acordo com a autor (1984, p.249), contra este conceito, as fil6sofos
sofistas se recusavam a aceitar que 0 destino se insurgia contra 0 ser humano de
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forma cruel e desenfreada, transferindo a peso nao 56 das culpas presentes, mas
passadas carnetidas pelos antepassados.
Com a advento desta nova linha de pensamento positivista, as pessoas foram
levadas a S8 indagar sabre as mitos e sobre as explicac;6es para a existencia
humana, as quais eram voltadas normal mente para a teologia, para a religiosidade.
As crenyas religiosas iam assim, pouco a pouco, perdendo espac;o para a razao.
Para Parziale (1984, p.250), portanto, como e uma questao complexa
levantada ja pelos traQicos gregos, a problematica do destino permanece 50mbria
ate as dias atuais. Nao seria de S8 admirar que S6focles nao fornecesse res pastas
prontas, deixando de lado aspectos morais e filos6ficos, preferindo dar vazao e
destaque a pessoa humana. Nao obstante a liberdade de aC;80 de seus
personagens, S6focles nao soube como os libertar de seus destinos imutaveis. Os
personagens de S6focles, muitas vezes, ao tentarem fugir de seus destinos agindo
livremente, acabam cumprindo-o.
Jean-Pierre Vernant (2001, p. 68), par sua vez, assevera que a tragedia e um
documento excepcional para se estudar a relaC;80 estreita que ha entre a vida
politica, a organiza~o civica e a pr6pria organiza~o da tragedia. Ou seja, pode-se
dizer que era um reflexo do pensamento, do homem grego do seculo V a.C. Alem
disto, a tragedia e urn instrumento que auxilia a entender a influencia que a literatura
pode ter no sujeito.
Ap6s este breve panorama sobre a tragedia, que visou apenas situar este
genera literario, passaremos agora entao a nos debruc;ar sobre 0 destino em Edipo
Rei, e, em urn segundo momento, em Hamlet.
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3 0 DESTINO EM EDIPO REI
3.1 DESTINO NA EPOCA CLASSICA GREGA
Como dito anteriormente, Vernant (2001) diz que a tragedia grega era um
reflexo do pensamento, do homem gregG do seculo V a.C. Portanto, antes de
fazermos uma reflexao sobre 0 tema do destino inserido na obra, realizaremos uma
breve contextualiza~o da Grecia antiga, para ambientarmos a peya em seu
contexto hist6rico e social.
A pe9a Edipo Rei, escrita no seculo V a.C., e ambientada em uma epoca em
que imperava 0 modo pre-cristao de conceber 0 mundo. A perspectiva grega admitia
que 0 livre-arbitrio e a presci€mcia divina coexistissem no mundo, apesar de
parecem fatares total mente excludentes.
Antes de falarmos urn pouco sabre a spaca em que a obra foi escrita, faz-s8
importante discorrer sabre 0 conceito de moira para as 9re905. Anatole Bailly, em
seu dicionario grego-frances, citado par Luiz Astorga, conceitua 0 termo como "urn
destine personificado, imperioso, inflexivel e que dirige todas as coisas a seus fins"
(BAILLY apud ASTORGA, 2006, p.111). Alem disso, segundo Luiz Augusto Astorga
(2006, p.116), a moira deve ser pensada nao apenas como uma "serie determinada
de fatos", mas como "vida, quinhao rnerecido".
Feita esta breve conceitua~ao, passaremos agora a comentar sabre a epoca
em que viveu S6focles. Sobre 0 tema, Parziale (1984, p. 248) comenta que 0 povo
grega era profundamente espiritualizado, e com uma grande tradi~ao oral. Nos
seculos VIII ate V a.C., com 0 surgimento da polis, os cidadaos come~ram a
participar da vida politica e cultural da cidade, fazenda assim com que se
afastassem cada vez mais dos la,os que as uniam a tradic;ao mitol6gica. Com 0
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advento da filosofia sOfista, 0 individuo comec;ou a ser 0 cerne das discussoes,
trazendo a tona a questao da racionalidade.
Parziale (1984, p.249) assevera que foi contra a necessidade de se obedecer
a urn destino certa e inflexivel que as sofistas S8 insurgiam. Afinal, 0 espirito humana
dos gre905 estava em constanta confiito, e S8 recusava a aceitar a destino como
algo inexoravel e cruel.
Dutro te6rico que comenta sobre a religiosidade e a racionalidade no mundo
grego e Jean-Pierre Vernant (1990, p.16-17). Para a autor, a advento das cidades
gregas, 0 direito e a filosofia alteraram no decurso do tempo 0 pensamento do
homem grego. Ja na epoca de S6focles as sofistas traziam a tona quest6es como a
pensamento racional, mais voltado para a ciencia e 0 positivismo. Foram tambem
criados noves tipos de arte, modos de expressao. Neste cenario, surge a poesia
Ifrica, 0 teatro tragico, par exemplo. Ou seja, gradativamente a pensamento mitico foi
desaparecendo, dando espago ao pensamento mais racional. Pode-se notar ai a
construc;ao progressiva e ininterrupta do homem.
Ha de se ter em mente, poram, que a razao grega e bem distinta da qual
concebemos atualmente. Pois, os gregos inventaram uma razao, Iigada ao contexto
hist6rico em que estavam inseridos.
A razao grega apareceu-me assim como solidana de !oda uma especie detransformal/oes sociais e menlais ligadas ao adven!o da polis. Ela surgiu emum contexto em que podiam se desenvolver a ret6rica, a sofistiea [...J umarazao imanente a linguagem, a traea verbal, e que visa agir sabre ashomens, a convence-Ios ou persuadi-Ios mais do que transformar anatureza. Dentra desses limiles, assim como em suas inoval/oes, a razaogrega e de fato filha da cidade grega. (VERNANT, 2001, p.41)
o nascimento da filosofia, portanto, aparece para reforc;ar a tese de um
pensamento positivo, que rejeita toda a forma de sobrenatural e a assimilac;ao
implicita estabelecida pelo mito entre os fen6menos fisicos e agentes divinos.
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Como diz Vernant (2001, p.55 e 1990, p.17), apesar de ser uma cren~a
potiteista, ou seja, varios deuses eram cultuados, desde a epoca classica grega ja
S8 encontravam alguns trac;os do homem maderna. Pais, desde a Gracia antiga, S8
pode observar a genese do pensamento criticD, fazendo assim com que S8 desse
inicio da passagem gradativa do mito para a pensamento radonaL
Vernant (2001, p. 173-174) tambem comenta sobre a rela9iio do homem
grego com 0 divino. A concepc;ao de deus onipotente nao S8 enquadra na visao
grega sabre a divino. Para uma crenc;a politeista como a grega, os deuses nao
criaram a universa, sao suscetiveis de erros, e fazem parte do mesmo cosmos que
as seres humanos. Cada divindade seria, nesta visao, urn espelho de alguns
poderes, capacidades, virtudes que as hom ens 56 poderiam dispor de forma
efemera, fugaz. Apesar desta proximidade maior com 0 campo divino, as 9re90s
tin ham consciemcia que nao poderiam, em momento algum, serem equiparados com
os de uses. A morte, os deuses, a existencia humana, enfim, ainda era, e continua a
ser ate os dias de hoje, uma incOgnita, algo indecifravel. Jocasta percebe esta
fragilidade humana, dizendo que 0 homem nada sabe sobre 0 futuro. 0 melhor
entao seria se entregar ao destin~ (S6FOCLES, 2008, p. 59). Os deuses eram
imortais, e 0 maximo que os seres humanos poderiam se aproximar desta
imortalidade era atraves da alma.
Nao obstante a toda esta distancia, 0 divino e 0 humano se entrela9C3m na
medida em que a vida humana nao tem fim em si mesma, nao basta por si s6. Hi!
uma subserviencia em relatyfio aos deuses. Nascer, para a grego, ja significaria alga
que esta alem dele mesmo. Para pagar esta divida com as deuses, deveriam ser
feitos ritos, homenagens de adorayao a eles. Sem a consentimento da divindade,
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nada se realiza no mundo de ca, diz Vernant (2001, p.175). 0 divino faz parte da
constrw;ao do mundo e do individuo.
"Conhece-te a ti mesma", para 0 oraculo, seria a tradUC;8o de toda esta
relagao entre humano e divino. 0 homem deve ter consciemcia que nao podera S8
igualar aos deuses, deve saber que sua vida terrena e passageira, e que e mortal,
como explica Vernant.
o mundo dos deuses esta longe 0 bastante para que 0 dos homensmantenha, em relac;ao a ele, sua autonomia; sua distancia, contudo, nao etamanha que 0 homem se sinta, frente a infinitude do divino, impotente,esmagado, reduzido a nada. [... ] Em todos as campos das coisas humanas,e responsabilidade de cada urn empreender e perseverar para abtersucesso. (VERNANT, 2001, p. 176).
o crer nos deuses nao S8 situava em urn plano doutrinario, ficando assim livre
aos homens refletirem sobre suas cren9as, sem necessaria mente ter que atingir uma
verdade definitiva, ter que se posicionar sabre alga. A duvida, a incredulidade em
rela9aO aos deuses, aos cultos, nao significa necessariamente recusar toda a
tradig80 religiosa da epoca, diz Jean-Pierre Vernant (2001, p.177).
Para Scheffer, citado por Andre Haggstron (2007, p.2), em artigo sobre a
mantica em Edipa Tirana, os gregos na epoca antiga repousavam suas vidas no
campo religioso. Os gregos acreditavam que suas vidas eram guiadas pelos deuses
que, assim como poderiam trazer coisas boas para suas vidas, poderiam trazer a
desgra9a e a tragedia.
Diz Haggstron (2007, p. 2- 16) que 0 processo divinatorio era algo corriqueiro
para os greg os. Para saber sabre seus destinos, as gregos recorriam para os
sacerdotes, para as oraculos. Era obrigac;ao do adivinho predizer 0 futuro, e Edipo
relata isso em uma de suas falas durante a pe9a: "e sen do assim 0 destino, seria tua
obrigayao predizEHo" (SOFOCLES, 2008, p. 39).
19
A fe nesse processo 56 comegou a ser abalada quando surgiram pessoas de
ma-fe, que faziam previs6es equivocadas a fim de obter alguma vantagem. 0
proprio Edipo questiona Tiresias, argumentando que este, mesmo S8 dizendo
adivinho, conhecedor de todas as eoisas, provou naD ser capaz de interpretar os
passares e os deuses, sendo que a resolury8odo enigma da esfinge ficou nas maos
do pr6prio Edipo, que solucionou 0 caso com a razao. (SOFOCLES, 2008, p. 41).
Para que entaD S8 atribuir tanta importancia ao oracula, S8 questiona Edipo.
(SOFOCLES, 2008, p. 59).
De acordo com Haggstron (2007, p.3), ate 0 final da Antiguidade, as cidades
gregas eram povoadas par adivinhos, profetas de todos os tipos. Nao era preciso urn
lugar especlfico para que os de uses interviessem na vida humana. Os oraculos
podiam S8 localizar em diferentes espagos, como cavernas, templos em lugares
longinquos, e assim por diante. Em uma visao mais superficial do pensamento
grego, a primeira coisa que se pensa sobre os oraculos e que estes eram fontes
inquestionaveis da verdade, e aquele individuo que fosse contra as profecias deveria
sofrer as consequencias de seus atos.
Haveria uma referencia aos oraculos ja no deus escolhido por S6focles.
Apolo, deus que aparece em Edipo Rei, e considerado a deus oracular, que
transmite a vontade de Zeus. Seu templo era a ilha de Delfos.
Para Haggstron (2007, p3-4), a arte de predizer 0 futuro podia se manifestar
de variadas form as. Poderia ser atrav8s de inspirag80 direta, na qual a divindade se
comunica diretamente para passar seu recado; podia ser tambem par forma indutiva,
au seja, haveria a necessidade de uma interpreta<;8o da revelag80 par parte do
recebedor da profecia. Os fen6menos naturais eram indicadores desta profecia, e
poderiam ser analisados de acordo com alguns aspectos particulares que
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apresentassem. 0 vao das aves, par exemplo, dependendo do angulo, do local de
partida e chegada da ave, poderia indicar algo diferente.
Bernard Knox (2002, p.25) salienta que 0 vocabulo utilizado atualmente em
portugues para designar destino nao da conta da multiplicidade de interpretagoes
que as greg05 atribuiam a orientary8o divina e sua interferencia na vida humana. No
sEkulo V a.C, epoca de S6focles, havia uma grande complexidade em relac;ao a
questao do destino e da profecia, do poder divino. As interpretary6es eram variadas,
porem, a linha que separava umas das outras era muito tenue.
Para exemplificar esta afirmayao, Knox (2002, p. 26-32) traz alguns exemplos
de como 0 destino poderia ser entendido. Em uma primeira analise, a vontade divina
pode ser apresentada como causa do comportamento humano. Ou seja, seria
determinante na vida do indivfduo. Os seres humanos agiriam conforme os
designios divinos. Pode ser que a interferemcia nao precise ser direta, pois 0
resultado ja estaria pre-determinado. Os deuses s6 deveriam esperar ate que suas
vontades fossem concretizadas pelos mortais. Ha, em outros casos, a necessidade
de interferencia da divindade, afim de que a agao seja realizada de modo adequado
as suas vontades.
Fora isto, pode ser feita apenas uma profecia, a qual pode afetar as agoes e
decisoes do individuo. Ha que se notar que, desta maneira, 0 individuo nao fica
total mente preso a divindade, fazendo com que esteja mais livre para agir, para
interpretar as predigoes como bem entender. Portanto, uma profecia pode ser
compreendida de diferentes formas, afinal, cada pessoa possui uma forma diferente
de conceber 0 mundo. Esta profecia pode vir de uma expressao oracular, de um
pressagio ou sonho. Pode ser explicita ou apenas apresentar alternativas, ficando a
responsabilidade nas maDS do ser humano envoi vi do.
21
Devida a essa variedade de formas, as profecias que dependem de
interpreta9ao pod em ser consideradas cumpridas, de modo direte ou indireto, como
par exemplo, atraves de fatos simb61icos que possam passar a ideia de que a
predi9ao esta finda. Edipo chega a acreditar que a profecia sobre seu futuro havia se
concretizado com a morte de seu pretenso pai, Polibio. Param, essa presunC;8o
estava total mente errada. Edipo chega a dizer que os oraculos nao tinham mais
importimcia, afinal seu pai estava morto, bern como a propria profecia e os oraculos.
(SOFOCLES, 2008, p. 59). Desta forma, de acordo com Knox, as circunstancias que
levaram 0 heroi a sugerir isso nao eram as verdadeiras.
A predi~o nao 56 assume muilas foonas e produz uma diversidade derea~oes nos seres human os, ela tamMm varia intensamente na sua relacaocom a vontade divina. Apolo pode profetizar algo imposto a ele pelo destinocontra sua vontade [... ] Em geral, a relayao da profecia com a vontadedivina pennanece indefinida; e urn mislerio que s6 pode ser conjecturado apartir das circunstancias particulares de sua liberacao e realizac;:ao (KNOX,2002. p. 29).
Oito isto, vale dizer entao que a forma de predicyaoescolhida pelo autor vai
refletir na representacyaoque 0 destino assume denlro da obra.
Segundo Knox, a obra de S6focles e, em uma analise mais simples,
Uma reafinnac;:ao da visao religiosa de um universe ordenado divinamente,que depende do conceito de onisciencia divina, representado na ac;ao pel aprofecia de Apolo. [... ) Realmente 0 progresso inteleclual de Edipo e Jocastana pel;B e uma especie de hist6ria simbolica do radonalismo do seculo V.(KNOX, 2002, p. 38-39)
Apesar disto, em uma analise um pouco mais aprofundada, percebe-se que,
se no inicio Edipo se mostrava favoravel e credulo a profecia, no decorrer da per;:a,
tanto ele como Jocasta comeyam a atacar e duvidar de Tiresias, desdenhando
assim a profecia. Percebe-se, desta maneira, que principalmente Jocasta se
aproxima do pensamento sofistico.
Uma das passagens da peya que ilustra bem este pensamento e 0
questionamenta feito tanto par Edipo como Jocasta em rela980 a Tiresias, 0
22
adivinho. Jocasta chega a dizer que "nenhum mortat pode perscrutar 0 futuro"
(SOFOCLES, 2008, p. 51), tentando provar sua teoria de que a profecia feita a Laio
naO poderia S8 concretizar, pois haviam pedido a urn estranho que dessem cabo da
vida do unico filho que haviam tido. Nesta mesma tala, Jocasta desmerece 0 poder
dos adivinhos, dizendo que "se urn deus tiver algo importante a dizer, ele 0 revelara
pessoalmente!" (SOFOCLES, 2008, p. 51).
Edipo tambem questiona Tiresias, perguntando quando ele havia provado ser
clarividente. (SOFOCLES, 2008, pAO). Apos Tiresias dizer, por enigmas, que Edipo
era 0 assassino de Laia, Edipo chama 0 adivinho de ~adivinho venal, urn impostor".
(SOFOCLES, 2008, p.51).
Ao passo que temos este questionamento, no final da pe<;a,nota-se que 0
que prevalece e a presenc;a de uma tanya maior. Afinal, a cren.y8 religiosa era algo
hi! muito tempo arraigado na sociedade grega, e poucos estavam real mente
dispostos a abdicar de tudo 0 que sabiam e conheciam ate ali. 0 que estava em jogo
era a validade da propria cren<;agrega, como afirma Knox (2002, p.36). 0 proprio
cora durante a pe98 chega a dizer que "insinua-se agora que sao vas as prefecias, e
serao desprezadas; Apolo nao mais tera ser culto, e fenecera nossa religiao!"
(SOFOCLES, 2008, p56-57).
Em outras palavras, a constante indecisao dos persona gens em relaC;ao a
acreditarem ou nao nos oraculos mostra a angustia de um povo que estava
abandonando aos poucos algumas creng:as, mas que ainda se deparava com a
inteligibilidade do futuro humano.
( ... J a verdade da profecia divina era uma pressuposiyao fundamental paraaquela combinayao de culto ritual e literatura her6ica que selVia de religiaopara os gregos. Qualquer ataque a este selor da cren~ religiosa era umaof ens iva contra toda frente (...J A queslao que estava em debate nao eraapenas a verdade OU a falsidade da profecia, mas a validade de toda umaconcepryaoreligiosa tradicional. (KNOX, 2002, p.36)
23
Nao obstante as oraculos estarem sendo criticados, teoricos, como Trajano
Vieira (2001), argumentam que S6focles buscava manter alguns pilares da tradi9ao
religios8. Alem dista, diz que para os gre905 da epoca de S6focles, 0 destino nao ejamais algo "pre-determinado, mas uma expressao espontanea da patencia
demoniaca, mesmo quando vern pre-dito e S8 cumpre num ordenamento imanente
ao curso do mundo." (VIEIRA, 2001, p.166).
Oeste modo, nao S8 paderia dizer que ha na pSg8 0 destaque para a luta
entre a liberdade e 0 destin~, mas, entre a aparencia e ser. Seria a luta de Edipo
para S8 auto-afirmar, S8 descobrir enquanta pessoa. Afinal, aparentava ser uma
pessoa que, no fim, era Dutra.
De todas estas teorias e vertentes, podemos dizer, como assevera Luiz
Augusto Astorga (2006, p.112), que, se podemos pensar que os gregos aceitavam a
coexistencia do livre arbitrio, a liberdade de escolha, com uma forga que ordenava
todas as coisas, pode-se pensar entao que estavam cada vez se aproximando do
que 0 pensamento cristao concebe sobre a autodeterminagao e responsabilidade
sobre as escolhas. Obviamente, deve-se sempre ter em mente que 0 conceito de
destino, racionalidade, liberdade de escolha e livre arbftrio sao distintos para esses
mundos separados por tantos sEkulos de existencia.
Feito este breve ambientamento hist6rico, cultural e social da peC;8 de
S6focles, passaremos agora a fazer um levantamento de algumas teorias sobre 0
destino em Edipo. Como sera visto a seguir, nos embasaremos em te6ricos como
Bernard Knox (2002), Sonia Maria Viegas de Andrade (1984), Mariano Parziale
(1984), Trajano Vieira (2001), e Albin Lesky (1996), os quais nos fornecem um novo
entendimento da questao do destino em Edipo Rei enos trazem novos
24
questionamentos. 0 pensamento desses te6ricos nos auxiliara a tarnar nossas
indagac;oes sobre a nosso objeto de estudo mais abrangentes e complexas.
3.2 EDIPO REI: UMA TRAGEDIA DE DESTINO?
Vernant argumenta que a tragedia grega em geral nao poderia conceber a ato
humane como total mente autonomo. A tragedia nao exporia 0 individuo em sua
interioridade, fora de sues relac;:6es socia is. Para 0 auter
A noc;:aolao fortemente marcada, depots de Kant, de que 0 homem sedefine par sua boa vontade, sua capacidade de escolher. sua liberdade(Descal1e) - tudo isso torna 0 tragico dificil de conceber na medida em que,entre as gregos, nao existe, na Iragedia, um homem pensavel comovontade deliberada, assim como naD existe urn destine que 5e faria par si.I ... ] Edipo, lal como foi definido, faz parte do cosmos, e as fon;:as em ac;:aono cosmos explicam Edipo. (VERNANT, 2001, p. 168)
Atraves da pesquisa bibliografica leita para 0 trabalho, nos chamou aten,ao 0
fata de que muitas crfticas relativizam a afirmagao de que Edipo Rei seja uma
"tragedia de destin~" Ou seja, muitos rebatem as ideias contidas na citagao de
Vernant de que em Edipo nao ha um "homem pensavel como vontade deliberada".
Varios autores ja concebem que nesta tragedia grega ja aparece a questao do livre
arbftrio do her6i, mesmo que ainda em um plano diferente do que se concebe
atualmente. Como e algo que se apresenta cada vez mais recorrente na hteratura
critiea, sera esta visao mais moderna do mito de Edipo que apresentaremos a
seguir.
Comecemos pelo crftico Bernard Knox, que problematiza a questao do
destino em Edipo. Para 0 autor, este equivoco ocorre devido a uma visao deturpada
sobre a relagao entre 0 destino vaticinado do her6i e 0 modo como 0 protagonista
age durante a pe,a. Nao se pode negar que esta classificac;iio e bem aceita, afinal
o proprio Aristoteles ciassifica esta obra como sendo um exemplo ciassico de
"tragedia de destino". Como Barbara Heliodora (2004, p.121) ressalta, a concepc;iio
25
de destino era diversa da que encontramos no mundo mademo. Portanto, ha de S8
lembrar sempre que a tragedia de Edipo fai escrita em uma apaca ands imperava 0
conceito pre-cristao de destino.
Pode-s8 dizer, entao, que sempre que S8 pensa em tragedia antiga remete-s8
a uma tragedia na qual a vontade do her6i e limitada, envoi vida pelo destin~. Nao S8
concebia nesta apaca 0 pensamento mademo de livre arbitrio individual.
Segundo Knox (2002, p.1), isto poderia significar que a tragedia antiga possui
urn potencial dramatico menor do que a tragedia madema, pais seria limitada pelo
fata da vontade do her6i nao ser livre. Vale dizer que ista nao ocorre na pratica da
leitura, afinal, a dramaticidade da pe9Cl e tao grande que nos faz refletir de quem
seria realmente a responsabilidade pelas situayoes que ocorrem na obra.
Freud concebe a peya segundo esta interpretac;c3o, a qual, segundo Knox,
merece ser discutida. Para Freud
Oedipus Rex e uma tragedia de destino: seu efeito tragico depende doconflito entre a vontade todo-poderosa dos deuses e os esforc;os vaos deseres humanos ameac;ados pelo desastre; a resignac;ao a vontade divina ea percep930 da impotencia pessoal e a lieao que 0 espectadorprofundamente comovido deve aprender da tragedia. [ ... ] Se Oedipus Rex ecapaz de emocionar 0 leitor ou 0 espectador modemo tanto quantacomoveu as greg05, a (mica explicac;ao passivel e que 0 efeito da naturezatragica nao depende do conflito entre destina e a vantade human a [ ... ]. Deveexistir dentro de nos uma voz pronta para reconhecer a fa rca convincentedo destino em Oedipus [... ]. (FREUD apud KNOX, 2002, p. 2)
Para Knox (2002), esta afirmac;ao de Freud vai contra a universalidade do
tema da tragedia. Alem disto, nenhuma peya teria apelo dramatico se nao possuisse
"pre-requisitos essenciais de livre arbftrio e responsabilidade humanos" (KNOX,
2002, p.3). Assim sendo, a vontade do her6i de S6focles e inteiramente livre, sendo,
portanto Edipo responsavel pelas catastrofes que acontecem com ele mesmo e com
seu povo. 0 heroi e, deste modo, responsavel pelo proprio enredo. S6focies, de
acordo com esta 6tica, reduz ou ate exclui da ayao da tragedia 0 fator externo na
26
vida de Edipo. A tragedia nao e resultante dos designios divin~s, mas e a
descoberta que a profecia havia par fim S8 concretizado.
Oeste modo, 0 destino exerceria urn papsl secunda rio na pe~, segundo Knox
(2002, p.3-7). Ha a ideia de que a flagelo impel ida aos cidadaos de Tebas teria sido
mandado par Apolo, ou seja, urna forga externa, obra do destin~. Porem, S6focles
nao teria colocado Apolo como inimigo, mas sim como aliado. Ou seja, naG haveria
nenhuma relagao da interferencia de Apolo na peste que atingiu a cidade de Edipo.
Portanto, e Edipo que realiza as agees que iraQ leva-Io a catastrofe final.
"Nada que faz e forgado pelo destino, em nenhum dos multiplos sentidos desta
palavra tao ambigua [... J 0 heroi e inclusive totalmente responsavel pelos eventos
que formam 0 enredo" (KNOX, 2002, p.9). Sao as decisees do heroi que constroem
o enredo, expressando assim 0 carater de Edipo. NaG ha hesitac;ao em sua
personalidade. E urn personagem versatil, e que S8 adapta as situ890es que VaG
ocorrendo ao seu redor. Par ser urn governante ideal, uma pessoa inteligente,
criativa, autoconfiante, Edipo e sagaz 0 suficiente para juntar as peQas do quebra-
cabe9a e descobrir sua propria identidade,
Continuando sua refiexao, Knox (2002, p.22-23) afirma que a relagao entre a
personalidade do heroi e 0 enredo rnostra que as a90es de Edipo que VaG resultar
na tragedia sao oriundas da pr6pria natureza, e nao de urn erro (hamartia). Ou seja,
esta rela9aO nao tern uma atuac;ao condizente com a formula aristotelica. Deve-se
notar, porem, que se relativizarmos esta questao pode-se pensar que a sua natureza
pode ser a propria hamartia.
o proprio Edipo chega a dizer que e par seu interesse que pretende punir 0
assassino de Laio, servindo assim nao s6 a causa do povo, mas a sua propria
causa. (SOFOCLES, 2008, p.33). Alem disto, afirma que mesmo que a purificagao
27
da cidade nao houvesse side profetizada par Apolo, ao culpado ainda deveria ser
imposto um castigo, pois 0 falecido era um nobre homem. (SOFOCLES, 2008, p.
36). Ao final da pel'<', 0 arauto, ao ver Edipo vazar seus proprios olhos diz que
"novas desgra~as, voluntilrias, e nile impostas" (SOFOCLES, 2008, p. 69) haviam
acontecido com 0 rei de Tebas.
Nao obstante, ha que S8 lembrar que algumas das ac;6es de Edipo foram, de
fata, vaticinadas. Ao final da pey8, 0 her6i nao 56 descobre sua verdadeira
identidade, mas percebe tambem que a profecia havia jil se concretizado. 0 destino
vai agir na pec;a como urn "problema fundamental proposto pel a vida de Edipo como
um todo. Na sua solu~ilo deve estar 0 significado trilgico da pe~a." (KNOX, 2002,
p.25).
Para naG incorrer em erro, deve-s8 tsr em mente que as 8g6es de Edipo
foram apenas profetizadas, mas nao impostas, determinadas par urna divindade. A
vontade divina aparece somente na profecia. Esta profecia naD teria, portanto,
exclufdo as ag5es de Edipo. Pelo contrario, dependia da independencia do
protagonista para tamar forma. Seria urn combinado entre vontade livre do receptor
da profecia e a vontade divina. As profecias nao seriam as unicas causas da
catastrofe principal, dependem tambem que 0 carater do her6i, seu modo de agir,
atuem junta mente para que haja a consecuc;ao da tragedia. Ou seja, nao haveria
uma rela<;ao de causa e efeito entre a profecia e a a<;ao do her6i. Sao duas for<;as
que atuam independentes, e que se igualam em determinado momento na vida de
Edipo
Assim, as profecias nao conslituem uma causa suficiente das ar;.:6esde Edipo; paraisso elas necessitam que seu caraler as complemente. Desempenham, entretanto,uma parte vital no longo processo que atinge 0 climax na sua automutilar;.:ao. E issonos conduz ao problema da rela~o entre profecia e a vontade divina, que S6foclesnao explicou. E um misterio. Nao obstante, e neste misteno que reside 0 significadoda a980 e do sofrimento de Edipo. (KNOX, 2002, p.32)
28
Knox (2002, p.31), porem, admite que as profecias dos deuses de fato
refletiram no sofrimento e no comportamento de Edipo. A predi9ao, feita
primeiramente a seu pail, faz com que Edipo resolva fugir de Corinto para Tebas. E
notavel durante toda a obra a angustia e 0 medo de Edipo frente 80 que poderia
acontecer no futuro. Ele carrega este sentimento consigo, pais desde pequeno, ao
ser abandonado nas montanhas, sofria as efeitos do vaticinio.
Isto, porem, S8 faz necessaria para que 0 processo tragico S8 desenvolva.
Mas, serao as ac;6es e a can~ter do her6i que 0 aproximarao cada vez mais daquilo
que estava tentando fugir. E sle 0 respons8vel pela ascensao e decHnio de seu
destino.
Como diz Knox (2002, p.33), vale dizer que, nao obstante as a90es de Edipo,
a profecia possui um papel fundamental. Alinal, e ela que torna suportavel a
revelac;ao da verdade. E a predic;:ao que traz 0 impacto tragico de que a obra
precisa. "A grandeza do homem ativa uma ac;aa contrari8 a demonstragao da
grandeza do divino na pe9a" (KNOX, 2002, pA1).
Ao final da pega, Edipo tendo entao consciemcia do seu verdadeiro "eu",
aceita 0 dominic do acaso. Nao se pode dizer, porem, que 0 acaso seria absoluto.
Concebe-se que a destino nao invalida a a9iio humana. Como Knox (2002, p.160)
1 Andre Haggslron (2007, p.7-9) nos traz a questaa da macula familiar. A predryaa far feriapnmerramente a Laia (pai biologica de Edipo), pais terra srdo ele 0 responsavel par macular toda suafamilia, a gu~nas (pessoas ligadas por la~s de sangue) dos Labdacias. Laio tena se apaixonado parum rapaz, tentando algumas vezes forear uma relaeao erotica com Crisipo. Este se suicida, par estarindignado com a situaCao.0 pai do rapaz lanca entao uma maldiCao, pedindo que a guenos de Laiona~ se perpetuasse. Laio vai ao oraculo de Delfos e acaba sabendo que na~ paderia ter mhos, pOisse "Iiveres um mho, ele Ie malara e se deilara com a mae". Ou seja, ao conceber Edipo, Laio estavaindo contra a prafecia. Os pais de Edipo ate lentam fugir da prediC;aodo araculo, entregando 0 filho amorte, mas este acaba vivendo e cumprindo 0 que havia sido profetizado. 0 pai de Edipo entaocometeu urn eITo,e todo erro, hamartia, crime, deveria ser vingado. Uma maldic;aofamiliar deste tipoiria recair enlao sobre 0 guenas inteiro, ou seja, sobre lodos os parenles e descendenles da familia.Ou seja, 0 destin~ de Edipo lambem esta de certa forma ligado com esta maldicao familiar quecarrega consigo, mesmo nao tendo sido ele que cometeu 0 crime, a falta. Esta passagem da vida deEdipo naa e explorada em Edipo Rei. Par esta razaa, esta questao nao sera abordada neste trabalho.Serve apenas para ensejar futuros lrabalhos sabre a questaa do destina e da maldic;aofamiliar.
29
salienta, a sorte seria uma deusa, a qual contrala a universa, mas que para isso teve
de contar com a al'ao do proprio Edipo. Portanto, ha a presenya do "acaso divino".
Este seria, pais, a expressao da presenc;a divina, a forma da realiza~o do oracula
de Apolo.
Fica bern clara esta afirmaC;8o de que as a¢es de Edipo concorrem para a
concretizac;:ao da profecia na fala de Tinesias, quando S8 va obrigado par Edipo a
revelar a verdade. Nao era intuito do adivinho revelar 0 que sabia, mas aeaba sendo
constrangido pelo rei, contra sua vontade, a talar a dura realidade dos fatos.
(SOFOCLES, 2008, p. 39).
A linguagem dos personagens nos remete a uma existemcia que esta 816m do
humano, urn padrao a partir do qual Edipo e medido. Apesar de ser a al'ao de Edipo
urn elemento essencial na construc;:ao de seu destin~, nao S8 pode refutar que ha a
presenc;a de algo que esta aeirna de nossa com preen sao, nossa vontade. 0 homem
nao e a medida de todas as coisas no final das contas, mas sim uma divindade, ou
divindades, que guiam nossas vidas, seja para 0 mal ou para 0 bem. Dai entra a
crenga de cada cultura, de casa pessoa. Ha varias representagoes deste udeus",
dessa forc;a maior.
Sonia Maria Viegas de Andrade (1984, p.129-138), corroborando a tese de
Bernard Knox, tambem argumenta sabre a questao da liberdade e do destino na
tragedia grega. Edipo, segundo Viegas, assume uma atitude ativa com relayao ao
seu destin~. Para ela, "Edipo e apenas 0 tributario de uma sequencia de injungoes
fatalisticas que determinam de cima e de maneira inumana a diregao de sua
existencia" (ANDRADE, 1984, p. 130).
Sonia Andrade insere tambem a questao moral na pec;a. Segundo a autora
(1984, p. 130), com suas ayaes frente ao destin~, Edipo vai estabelecendo uma
30
ordem moral, que estaria aeirna do curso cega da falalidade. Ou seja, ha a presenC;8
de uma dimensao moral no conceito de destine em Edipo Rei. 0 personagem,
segundo Sonia, estaria sujeito a uma juStig8 c6smica, aeirna de nossa compreensao.
o confiito da pe9a se constitui na medida em que a liberdade humana pode
entrar em desarmonia com a "totalidade c6smica" H,3, portanto, a ideia de que 0 ser
humano e livre para cometer as transgressoes que quiser, porem estara sujeito a ser
julgado par esta ordem cosmica, que rege 0 universD. A fatalidade seria a
"instrumento de regula980 de urn destine que S8 encontra perdido na sua propria
liberdade" (ANDRADE, 1984, p. 131).
A tragedia serviria para questionar todo ests pensamento, tentando mostrar
que "0 destino humano, enquanto concretiz8c;ao de possibilidades exclusivamente
humanas, exige do homem, a cada pas so de sua eXistencia, a instauragao de seu
proprio sentido". (ANDRADE, 1984, p.131) 0 homem e respons8vel par suas
atitudes, porem deve estar ciente que nao deve fazer nada que desestabilize a
ordem universal que regia 0 cosmos.
No que tange a obra de S6focles, ha urn confronto do her6; tragico com 0
destino. A despeito disto, se faz mais importante 0 embate que este trava com sua
pr6pria consciemcia moral. Em vista disto, ha nao s6 a questao do destino, mas
tambem a questao do auto-reconhecimento.
S6focles pretendeu deixar ambfgua a questao do destino, segundo Sonia
Andrade (1984, p.132). Haveria entao duas leituras que se poderia fazer acerca
desta questao. Pode-se entender a obra como reprodutora do mito de Edipo, dando
ao destin~ uma concepg80 mais fatalistica. Porem, pode-se levar em considerag80
que a pe9a e centrada na revela9aO da verdadeira identidade do protagonista,
31
tornandO-8 mais emblematica na medida em que apresenta os conflitos humanos
em relagao a consciencia moral, 0 seu lugar no mundo.
Para Sonia Andrade (1984, p.134-135), a atividade de Edipo frente a seu
futuro reside exatamente nas atitudes, no processo que 0 leva 80 conhecimento de
seu proprio eu. 0 desvendamento de sua identidade chega ao fim, como
fechamento de um cicto do destino, pel as meos do pr6prio Edipo. E a vontade dete,
sua iniciativa que 0 comanda 80 seu desfecho tnfigico. Havia muitos sinais de quem
era a verdadeiro assassino de Laic, porem Edipo estava absorto em seus
pensamentos, em sua impulsividade, que S8 aproximava cada vez mais daquilo que
estava tentando fugir. A liberdade almejada atraves do escapismo S8 mostrou falica.
Afinal provando que a prediyao divina S8 tornou concreta. Predi9ao esla que leve
como intuito 0 remeter ao seu proprio ser, fazendo com que Edipo se confrontasse
com questionamentos acerca da vida humana, retomando assim sobre si pr6prio.
Outro teorico que argumenta sobre a problematica da liberdade do homem
grego e os questionamentos sobre 0 poder de autodetermina980 humano e Mariano
Parziale (1984). Este autor afirma que "Edipo e ao mesmo tempo uma metafora e
uma realidade daquilo que e 0 drama universal do homem: liberdade ou submiss80
a uma forya externa e superior?,' (PARZtALE, 1984, p. 250).
Ja a te6rico Trajano Vieira (2001, p. 17-21), ressalta a importancia da obra
Edipo Rei para Arist6teles. Fil6sofo este que elogiou a estrutura formal da pel"',
como por exemplo, a coincidencia entre a reviravolta da a980 e 0 reconhecimento da
verdade.
Deve-se lembrar que S6focles alterou as versoes que existiam do mito de
Edipo. Para Vieira (2001, p.18-19), a questeo do reconhecimento de Edipo, sua
tomada de consciencia de nao ser quem imagin8v8 ser e 0 poder de for98s
32
desconhecidas na constrUl;ao do destino vao ocupar 0 espago que a maldigao
familiar possuia nos mitos antecedentes.
Interessante notar tambem que 0 oracula na versao de S6focles adquire urn
tom diverso de outras vers6es. Em Esquilo, par exemplo, 0 vaticinio e feito em tom
de ameaya, de advertencia. Com S6focles a questao central do oracula passa a ser
sua previsibilidade inescapavel.
Vieira (2001, p.19) ainda afirma que apesar de S6focles nos apresentar em
tres momentos as previs6es oraculares, nao S8 deve imaginar que Edipo era figura
passiva na construc;ao de seu destin~. A sua tragedia foi causada justa mente pela
limita<;ao humana de nao ser capaz de conhecer e dominar os elementos que
constituem seu destino.
A questiio da liberdade de Edipo versus a ordem ja pre-fixada pode ser
entendida de maneiras diversas, segundo Vieira (2001, p.20), Ha as te6ricos que
salientam que a liberdade de agao de Edipo e fator preponderante para a final
tragico do personagem, e ha os que valorizam a atua9ao das divindades no destino
do her6i. Para os primeiros, nao ha na pet;a uma influencia direta dos deuses na
a9aO de Edipo, ja para os segundos a tragedia s6 acontece no momenta em que
Edipo reconhece nao poder dominar seu destino, suas ac;6es.
Ainda de acordo com Vieira (2001, p.21), S6focles teria imprimido a sua obra
uma visao na qual ha em destaque 0 poder eterno e estavel do conhecimento divino,
conhecimento este que nao era influenciado pelo poder do acaso. Ou seja, S6focles
valorizou 0 conhecimento previo que as deuses possuiam.
Para Vieira (2001, p.22), a atuac;iio divina e bem mais efetiva do que afirma
Knox. Com a concretiza9aO da profecia, a frase de Protagoras que diz que "0
homem e a medida de todas as coisas", acaba adquirindo novos ares e temos a
33
impressao de que a medida de todas as coisas e a divindade, e deus. (VIEIRA,
2001, p.28).
Para adotarmos ests pensamento, he que S8 lembrar que he. forte a presen<;a
da ideia de daimon2, que "indica 0 controle limitado de Edipo sabre 0 seu proprio
destino, gra9as ao can,ler enigmatico da a9ao divina" (VIEIRA, 2001, p.28).
Para Vieira (2001, p. 33-36), S6focles, ao construir seu her6i tragico, coloca-o
frente a frente com duas fon;as: a razao e 0 daiman. Ao enfrentar seu destin~, Edipo
S8 torna cada vez mais ativa, agente de seu pr6prio destino. Ocorre que, ao mesmo
tempo, sle tambem S8 configura como passiv~, 0 qual acaba S8 submetendo as
fon;:as complexas que estao aeirna do entendimento humano. Ou seja, ha uma aurea
ambigua no que concerne a problema do destino. Nao S8 pode negar que he a
presen98 do conhecimento previa que os deuses tern da vida de Edipo, mas sao
suas a90es, sua impetuosidade, sua voluntariedade, sua empreitada em descobrir a
verdade sobre 0 assassino de Laio que faz com que se fique mais perto de ser 0
Edipo que nao imaginava ser. Quanto mais se ve perto de seu final catastrofico,
mais percebe que possui facetas que jamais pensava ter. Ha urn misterio em nos sa
vida, ha tragos indecifraveis que fogem de nossas maos.
Para 0 autor, desta forma, a descoberta da identidade por Edipo "permite
registrar a pre-cognigao divina, nao afetada pelas contingencias da experiencia
humana, e a ocorrencia, na dinamica existencial, de urn elemento de dificil
defini9iio." (VIEIRA, 2001, p.36). Com iSso, as a90es de Edipo ganham nova
: 0 sentido deste termo para Trajano Vieira (2001, p.28-29) e de dificil defini<;:ao.Podemos pensar em"divinon,mas tambem "uma marca individual~ Heraclito chegou a dizer que ~carater e para 0 homemdalmon" Kirkwood associa este termo a fado, contrapondo a ideia de fjkhe (acaso). Ou seja, haveriacerta qualidade pessoal inserida tambem no sentido do tenno. E uma forva ativa, condulora, quedirige 0 homem em seu curso. Dafmon seria 0 agente Que insere 0 inesperado no destine doprotagonista.
34
fungao, servindo para corroborarem a ideia da fragilidade humana frente aimprevisibilidade de sua existencia.
"Edipo Rei apresenta a degrada,ao de um homem notavel e prospera par
causa dos deuses [ .. J OS deuses exibem seu poder porque assim 0 desejam. Mas,
urna vez que 0 exibem, 0 homem pode aspirar urna lig80 salutar"
(VIEIRA,2001,p.164).
A natureza dos acontecimentos S8 torna muito mais tragica na medida em
que nao pode ser alterada. 0 que previa mente havia side profetizado vai tomando
corpo durante a pega, atraves das 8goes humanas de Edipo.
Assim como Knox, Vieira (2001, p.166-167), concebe que a a,ao da pe,a e
motivada pelo livre arbitrio de Edipo. Nao era vontade dos de uses a derrocada de
Edipo, apenas a predisseram. A (mica fon;a divina seria a pr6pria vontade de Edipo.
o elemento misterioso nao seria 0 fado, a vontade dos deuses, mas a pr6pria
existencia humana.
Ao saber de tudo, a publico fica de ante mao sabendo que as ay6es dos
personagens nao foram de modo algum calculadas, foram acontecendo no decurso
do tempo. S6 quem esta de fora tem a ciencia de que a que se passa no plano
humano e falho, falso, pais ate as mais experientes constantemente relembram que
ha uma grande disparidade entre e realidade e a que a ser humano pode
compreender del a. S6 a plano divino tem essa capacidade de conhecer a verdade
simples par tras da tragedia.
Segundo Vieira (2001, p.173-174), na pe,a, Apolo exerce uma fun,ao vital na
medida em que de certo modo, e um agente dentro da narrativa, porem atua de
modo mais profunda. Sua ayao se mostra derradeira a partir do momenta em que
Edipo descobre a si mesmo.
35
Ainda segundo Vieira (2001, p. 178), disto decorre a ideia de que, Edipo vai
agindo, mas ao mesma tempo S8 encaixando em toda a trama que ja havia muito
tempo sido prevista pelos deuses. Portanto, ao final da pe9a prova-se 0
conhecimento divino, que envolve 0 mundo e 0 compreende. E uma inteligencia que
esta aeirna do entendimento humano.
Morrer no nascimento talvez fosse urn sofrimento menor para Edipo. 0 cora
chega a indagar "qual deus maligno exacerbou teu destin~ sinistro?" (SOFOCLES,
2008, p.71). Edipo culpa Apolo por toda a desgra9a, mas na~ se exime da culpa de
ter par si proprio escolhido ficar cega. Diz que "nao fai mao estranha que arrancou
meus olhos, senao a minha!" (SOFOCLES, 2008, p. 72). 0 que mais impressiona e
esta fala ter vindo de urn homem que pouco tempo antes S8 considerava protegido,
filho da fortuna.
Albin Lesky (1996) tambem faz algumas considera90es sobre 0 destino na
pe98 Edipo Rei. 0 autor nos diz que podemos reconhecer nesta obra sofocliana a
antftese vontade humana versus as disposiy6es do destin~. Ainda, segundo 0 autor,
o sentido da pe9a se torna "quase tao falho quando se afirma que nela 0
protagonista e 0 destino [... J 0 protagonista e 0 homem que enfrenta esse destin~"
(LESKY, 1996, p.165). Lesky afirma tambem que a verdadeira lragedia surge do
embate entre estas for<;as, a vontade do homem de lutar contra as incontrolaveis
"for<;as obscuras" Para 0 autor, portanto, com bater ° destino ate ° fim parece ser 0
imperativo da existencia humana. Ou seja
o mundo dos que se resignam, dos que se esquivam a escolha decidida,constitui 0 fundo diante do qual se ergue 0 her6i tragico, que opoe suavontade inquebrantavel a prepotencia do todo, e, inclusive na morte,conserva integra a dignidade da grandeza humana. (LESKY, 1996, p.165).
36
Feite este mapeamento sabre algumas das principais teorias acerca do
destino em Edipo Rei, podemos notar entao que ha semelhan<;as entre as vertentes
aqui expostas. Afinal, todas trazem uma visao mais modema da obra sofocliana,
admilindo a participac;ao, mesmo que em niveis diferentes, de Edipo em seu proprio
destin~.
Enquanto Freud afirma que Edipo e uma "tragedia de destino", onde 0 efeito
tragico e dado pelo conflito entre a vontade todo-poderosa dos de uses e as esforC;Qs
VElDS dos seres humanos contra 0 desastre, Knox, Sonia Andrade, Vieira, entre
alguns outros te6ricos apresentados sucintamente, admitem a presenc;a do livre
arbilrio na pec;a.
Vieira comenta que Edipo, ao enfrentar seu destino, era cada vez mais agente
em seu futuro, mas ao mesma mais passiv~, pois ao final S8 submete as foryas
complexas. Haveria sim uma voluntariedade nas a96es de Edipo, mas estas a90es
serviriam para corroborar a ideia da fragilidade humana frente a irnprevisibilidade da
existencia humana. Ja Sonia Andrade insere 0 aspecto moral nas ac;6es do heroi
tragico, dizendo que as a90es de Edipo VaG estabelecendo uma moral, que estaria
acirna do curso cego da fatalidade. 0 ser humano, para a autora, seria livre, mas
deveria agir de acordo com a obediencia a uma "totalidade cosmica". 0 ser humano
deveria saber que poderia transgredir a ordem da maneira que quisesse, mas
estaria assim se lan9ando a uma ordem cosmica, que iria julga-Io se a transgressao
ocorresse. A atividade de Edipo se da na medida em que a pe9a mostra a sua
caminhada para 0 auto-conhecimento. As predi90es entao atuariam na pe9a
remetendo 0 protagonista a seu proprio ser.
Knox, no entanto, vai um passo adiante ao sugerir que Edipo e inteiramente
livre, e por isto responsavel por sua tragedia. A tragedia nao e deste modo resultante
37
dos designios divin~s, mas das decisoes de Edipo, de seu carater. As 8<;oes foram
sim vaticinadas, mas 0 mais importante e a auto-descoberta do her6i. A profecia nao
excluiria de modo algum as 8c;oes de Edipo, pOis estes dais elementos atuariam
juntos, mesmo sendo fon;as independentes, para a derrocada tragic8. 0 can~ter
entao complementaria a predi<;8o oracular.
Ap6s mapearmos as principais vertentes de analise em rela<;8o ao destin~ na
peg8 Edipo Rei, prosseguiremos agora com 0 mapeamento sabre teorias acerca do
mesma tema do destino na Pe<;:a Hamlet. Para tal, nos basearemos em te6ricos
como Barbara Heliodora (com reflex6es referentes a tres obras diferentes da
autora), A.C. Bradley (1965) e Lucio Esper (2009)
38
4 0 DESTINO EM HAMLET
4.1 A EPOCA RENASCENTISTA
Nos mesmas mol des do item anterior, realizaremos uma breve
contextualiz8gao s6cio-hist6rica em relagao a spaca em que foi escrita a obra de
Shakespeare (Hamlet e uma obra que data de 1600). Alinal, a contexto em que vivia
o dramaturgo S8 faz importante na medida em que nos possibilita urn melhor
entendimento sabre algumas questoes chave em suas obras.
Barbara Heliodora salienta que William Shakespeare foi produto da sociedade
em que viveu. Produto de urn mundo que equilibrava resquicias do pensamento
medieval e da Antiguidade, e onde se surgia tambem a pensamento cientifico, e que
tinha a questao religiosa ainda muito complexa, com a perplexidade da Reforma e
Contra-Reforma. (HELIODORA, 1998, p.3-7). Claro, que ao se fazer esta afirma980,
como a propria autora ressalta, deve-s8 lembrar que 0 individuo nao e unica e
exclusivamente fruto da epoca em que viva, havendo varios Qutros fatores que
concorrem para a sua forma gao.
Vale dizer tambem que Shakespeare conseguiu com Hamlet deixar uma
memoravel hist6ria de vingan<;a, e faze-Ia com que ressoasse os temas e problemas
da renascenga inglesa.
No que diz respeito a epoca renascentista inglesa, na qual se insere
Shakespeare, as seculos XVI E XVII, segundo Barbara Heliodora (2009, p.17-22),
representaram uma epoca resultante da grande reviravolta cultural da era
elisabetana. (entenda-se era elisabetana as anos entre 1580 e 1642). Era um tempo
de transiyao e de confluencia entre a Idade Media e 0 renascimento ingles. Ou seja,
39
havia ainda presentes cheques de principias, valores entre estes dois mundos
paractoxalmente e historicamente diferentes.
Uma das correntes que S8 perpetuava na spaca era a humanismo3, fazendo
assim com que cada vez mais 0 universo teocentrico do medievo desse lugar a
centralidade no ser humano. (HELIODORA, 1998, p.99). Surge entaD 0 homem que
naD tern mais urn lugar definido, cheia de duvidas, e que S8 va obrigado cada vez
mais a responder par seu destino. E, como continua a autora, e na Renasceny8
entao que 0 homem assume de vez 0 livre arbitrio que 0 cristianismo 0 imputara. E
neste individuo que vai S8 buscar a inspira<;ao para as her6is tragicos do teatro
elisabetano.
Sobre 0 teatro renascentista ingles, Heliodora (2009, p.17-18) salienta que
este marcou a transi<;ao do religioso para 0 secular. Os dramaturgos come<;aram a
dar mais destaque a comedia humana, au seja, davam mais enfase aos aspectos,
aos questionamentos da essencia humana. A referencia, desta maneira, passou a
ser a ser humano, a individuo. Neste perfodo ainda, comeg:aram a aparecer
vestfgios do capitalismo, e com isso a questao da imobilidade social, refon;ada pel a
grande corrente dos seres, onde todos sabiam seu lugar na sociedade, foi perdendo
espayo. 0 homem enfim percebe que poderia alcang:ar muito mais do que ja havia
alcanyado. Estava livre da rigidez feudal, e com a educa9ao 0 mundo se abre como
uma nova porta, repleta de novas possibilidades.
:> Segundo Carlo Btisso/a (p.19-20), 0 hurnanismo e urn fen6meno tipicamenle europeu, ocorridoaproximadamenle entre os anos de 1400 e 1590. Houve neste periodo uma ~redescoberta· dosvalores da razao e do senlimento humano. A razao humana ganha destaque na medida em quepermitia Que 0 homem se tomasse cada vez mais independente. a homem da Renascenc;a, a partirdesta corrente filosofica, descobre que com 0 trabalho, a pesquisa, a ciencia, 0 dinheiro, tambempode almejar 0 poder. Surge enUio um novo modo de pensar, que traz consigo a ideia de poder, auto-afillTlac;aoe independencia humana. Valoriza-se a ciencia empirica, experimental.
40
Neste periodo da Renascenga, os escritores S8 voltavam para as 8utores
romanos, principalmente a Seneca, sendo influenciados assim pela ideia de S8 ter
urn grande protagonista na obra. Urna razao para a grande aceitac;:ao do fil6sofo
estoico na Renasceng8 inglesa e que este pregava a insistencia sabre a
inconstancia da fortuna e a necessidade de enfrenta-Ia com equanimidade, cementa
Heliodora (2004, p.123).
Alem dista, ao contrario do teatro grego, as 8c;6es deveriam S8 desenvolver
no proprio palco, e nao fora dele. E, segundo Vigotski, a obra inteira de Hamlet nao
e construida a partir desta no9ilo, pois a maiaria das 8c;6es principais da peg8 nos eapresenta a partir das narrac;:oes, sendo assim estas 8c;oes ocorridas fora do palco.
Nao era mais suficiente a tragedia mostrar a passagem repentina da
felicidade para a infelicidade, diz Heliodora. A tragedia shakespeariana necessitava
ter ao final a morte do her6i tragico.
A historia que as tragedias contam, ou seja, sua trama conduz a e inclui amorte do heroi. Nenhuma peya ao final da qual 0 protagonista esteja vivo,sera no sentido shakespeariano, uma tragedia. Por outro lado, a trama temde retratar a parte perturbada da vida do heroi que precede e conduz a suamorte, pois nenhuma morte repentina au acidental em meio a prosperidadeseria suficiente para 0 genera. A tragedia e, essencialmente, um relato desofrimento e calamidade que conduz a morte. Tal sofrimento e essacalamidade, alem do mais, recaem sobre uma pessoa de certa importancia.[...]0 sofrimento e a calamidade excepcionais que acontecem com 0 heroi,devemos acrescentar, estendem-se para alem dele [...] (HELlODORA,2004, p.126)
Henrique VIII, ao romper com a Igreja Catolica e estabelecer sua propria
Igreja, faz com que 0 teatro possua mais liberdade de criagao. Mesmo com esta
abertura, foi com a filha dele, Elisabete I, que 0 teatro ingles conheceu seu apogeu.
Heliodora, ao falar sobre 0 florescimento do teatro ingles, enfatiza que foi com a
rainha Elisabete I que as obras teatrais se tornam mais acessiveis e populares
Importante notar que "Elisabete [...J tornou-se 0 proprio simbolo das lutas
religiosas da Inglaterra". (HELIODORA, 2009, p.20). Com a instituiyao da Igreja
41
Anglicana par Henrique Vill, as lutas religiosas S8 tornaram constantes, e sua filha
que mais tarde subiu ao trona ingles S8 tornau, aos olhos cat6licos, ilegitima e ao
mesmo tempo era aclamada pelos protestantes como a libertadora da igreja inglesa.
Com toda esta efervescencia cultural, e principal mente do teatro, a lingua
inglesa fai cada vez mais S8 desenvolvendo e ficava cada vez mais flexfvel, sendo
assim urna grande arma na construgEio da imagina<;ao. "0 surgimento de
Shakespeare 56 fai passivel gra<;as as condi96es e circunstancias sociais, culturais,
intelectuais e esteticas que S8 forma ram a partir de dais mundos: a Idade Media e 0
Renascimento" (HELIODORA, 2009, P 22).
A procrastinayao por parte de Hamlet em se vingar do assassino do pai, de
acordo com Lucio Esper (2009, p.147), pode ser explicada pelo lato de estarem a
obra e 0 propria protagonista imersas nesta epaca de transigao, cnde ainda S8
encontravam vestigios da mentalidade medieval supersticiosa e mistica, mas cnde
tambem ja S8 encontravam indicios da mentalidade moderna mais catica, critica e
racional.
o que no mundo medieval era irretocavei, com diz Heliodora (1998, p.73-74),
como a ideia do homem ser um "centro predestinado de um universo criado por
Deus e sustentado por Elen, passa a ser relativizado no mundo elisabetano. Neste
mundo, "A natureza era um vigario de Deus que governava urn conjunto de
hierarquias, por assim dizer, de tres reinos: 0 cosmologico, 0 natural e 0 humano"
(HELIODORA, 1998, p.74).
Para a autora, todo este contexto fez com que 0 teatro gregG e 0 teatro
elisabetano se distanciassem, e isso refiete na maneira como a predestinayao se
apresentava nas obras
o conceito de predestinac;:ao,par exemplo, aceita na Grecia dos primeirosgrandes classicos, de certa forma isentava 0 seu her6i tragico de ao menosuma parcela de sua responsabilidade: estava predeterminado que Edipo
42
malaria seu pai e se casaria com sua mae, e, oa verdade, 0 que a traQediade S6focles nos conta e exatamente 0 processo da inutil tentativa de Edipoescapar ao seu destin~ [... ] No mundo elisabetano, par Dutro lado, estamosem um universe essencialmente cristao, no qual 0 principia do livre arbitrioe de suma importancia, pois, segundo ele, cada homem e responsavel portodas as suas a~oes. (HELIODORA, 2004. p.121-122)
Ou seja, para a autora, ha um grande distanciamento entre a tragedia grega e
a tragedia de Shakespeare, afinal 0 contexte s6cia-politico e cultural sao
divergentes, e ainda ha a questao de que as teorias Aristotelicas sabre a tragedia
naO eram conhecidas pelos ingleses da epoca elisabetana.
Gerd Bornhein, em prefacio escrito para a obra de Barbara Heliodora Fa/ando
de Shakespeare (1998, p.XIII), argumenta sobre e ruptura que Shakespeare e outros
dramaturgos ingleses da epoca realizaram no ambito teatral. Shakespeare, diz 0
autor, foi urn dos responsaveis pelo surgimento do teatro como nos ainda hoje 0
concebemos. Bornhein argumenta que
Essa ruptura, tao fortemente presente em Shakespeare, concentra-se todaem um ponto bem preciso: 0 abandono da fe. da fe entendida como 0elemento de base que representava a pr6pria raz30 de ser do teatropreterito. Compreenda-se bem: nem interessa tanto saber se a homemShakespeare era ateu au nao 1... 1 ja nao se verificam atos que tendam aomistico ou ao orientamenlo a partir do mundo sobrenatural; e preciso catar,e bern, para topar com algum resquicio, aJgum detalhe, aJgum reflexo deuma ordem divina que se dessacralizava na epoca com uma rapidezespanlosa.E que nosso autor ja e a expressao do espirita novo da epocamoderna. I...)(BORNHEIN in HELIODORA, 1998, p.XII).
Para 0 autor, entao, no teatro de Shakespeare as temas religiosos, se
existentes, acabavam sendo deixado em segundo plano, urn tema como outro
qualquer. Ainda, sabre 0 her6i tragi co, diz que a com Hamlet que se "tem inlcio a
lenta e inexoravel crise da figura do heroi no teatro moderno" (BORNHEIN in
HELIODORA, 1998, p.XIV).
o autor tambam argumenta que Shakespeare desestabiliza 0 que ate entao
se entendia par teatro, e faz com que a geografia e a hist6ria passem a ser as fontes
43
da ac;ao dramatic8. 0 homem passa a ser, entao, urn simples mundano, esforc;:ando-
se para conseguir se estabelecer na Terra. (BORNHEIN in HELIODORA, 1998,
p.XV).
Outro ponto interessante no que S8 refere a sociedade elisabetana e a
questao da aparencia e da realidade, como diz Heliodora (1998, p.101). 0 publico da
epoca real mente acreditav8, segundo a autora, que a pr6prio diabo poderia ser 0
Fantasma do pai de Hamlet, tendo 0 objetivo de engana-Io e roubar sua alma. Na
spaca talv8Z, 0 publico nao tivesse achado que Hamlet demorou em sua vinganc;a,
pais acreditavam que fantasmas poderiam ser manifestac;:6es diab6licas.
Horacia teme quando 0 fantasma chama Hamlet para conversar, pais diz que
o fantasma pode arrastar Hamlet para uma armadilha, assumindo outra forma mais
horrivel (SHAKESPEARE, 2007, p.34). Em outra passagem, Hamlet hesita, e pensa
em fazer uma peg8 de teatro para descobrir S8 era verdade 0 que a fantasma 0
falara, pais "0 espirito que eu vi pode ser ° demonio. E, aproveitando minha
fraqueza e melancolia, - tem extremo poder sobre almas assim - talvez me tente
para me perder. Preciso de provas mais firmes que uma visao." (SHAKESPEARE,
2007, p.64).
Dito isto, deve-se considerar que alE§mde se pensar sobre ° contexto s6cio-
historico por qual passava a Inglaterra, nao devemos perder de vista tambem que
esta se trabalhando com uma tragedia de Shakespeare. Ou seja, um autor que
rompeu alguns paradigmas, um genio que conseguiu mostrar muito bem °comportamento humano e seus conflitos internos e externos.
Ap6s este breve ambientamento da apoca em que viveu e escreveu °dramaturgo ingles, continuaremos agora abordando algumas vertentes teoricas,
44
como a de Lucio Esper (2009), que nos proporcionam a possibilidade de
questionarmos e refletirmos acerca do destino em Hamlet.
4.2 HAMLET: VINGANCA OU DESTINO?
Ao se falar nesta obra complexa e madura de Shakespeare uma das
primeiras problematicas que S8 vern a mente e a vinganc;a. A maieria dos autores a
classifica como sendo uma "tragedia de vinganC;8", aonde a protagonista tern a
necessidade de vingar a marte de seu pai, rei da Dinamarca, que fora assassino em
circunstancias suspeitas. Diferentemente de Edipo, an de 0 destino do heroi e urn
elemento essencial na pe<;8, Hamlet nao tern como centralidade 0 destino do
protagonista.
Dista, paraee, decorre a dificuldade de S8 encontrar literatura critica
consistente que teorize sobre a questao do destino de Hamlet, 0 principe da
Dinamarca. Urn dos poucos autores encontrados que entra urn pouco mais a fundo
na questao e Lucio Esper. Em oulros texlos pesquisados foram encontrados apenas
fragmentos abordando 0 tema. E nitida a diferen~ade material critico que se pode
encontrarteorizandosobre a predestinagaode Edipo.
Apesar do pouco material, 0 destin~ em Hamlet parece ganhar novas
dimensoes, fazendo com que a vi sao apresentada sobre 0 tema tenha semelhan<;as
e divergencias em relac;ao a visao apresentada em Edipo Rei. Shakespeare, em sua
obra, relativiza 0 destino atraves das falas densas de Hamlet, ande constantemente
ha 0 questionamenlo sobre a vida humana, sobre 0 pader das fon;as divinas sobre a
existencia do ser humano.
Comecemos falando sobre 0 entendimenlo de Lucio Esper sabre 0 tema, que
inicia seu artigo sobre os aspectos tragicos em Hamiel dizendo que esta pe~a
45
poderia ser considerada uma tragedia verdadeiramente madura de Shakespeare.
Pois, nesta obra a dramaturgo ingles teri8 conseguido construir urn personagem que
sintetiza a maxima de que "carater e destin~" (ESPER, 2009, P 145). Com isso 0
autor quer dizer que
Sao certes aspectos de sua personalidade que acentuam e potencializam aconfigurac;;aotragica de uma sina que por SI 56 ja seria 5uficientementecruer: a necessidade de vingar 0 pai assassinado e restabelecer a ordempalitica. (ESPER, 2009, 147).
Ou seja, a natureza da tragicidade reside na conflituosa relacyao entre 0
carcHer do heroi e 0 destine contra 0 qual precisa lutar, e 80 qual S8 submetera
enfim. Para Esper, este elemento contradit6rio perpassa tanto a tragedia antiga
como a tragedia maderna, sendo assim uma caracteristica que as aproxima de certa
maneira. Ainda sabre esta questao, porem, a autor faz uma ressalva que a
disparidade entre a tragedia e moderna esta no fato da forc;a que desencadeia 0
inicio da tragedia "provir do "exterior" do individua, na forma do destino, da potencia
divina, dos Iiames familiares, na tragedia antiga, e do Uinterior", na forma do carater,
do temperamento, de sua idiossincrasia, na tragedia moderna" (ESPER, 2009,
p.145).
Citado por Esper, Arnold Hauser entende a tragedia moderna como "tragedia
de destino" I e a tragedia moderna como Utragedia de carater"
A tragedia modern a do carater distingue-se em geral da tragedia antiga dodestino, e 0 destino, que no drama gregG era transcendente. no dramamodemo e tido como imanente, ou seja, esta implicito no carcHerdo heroi enao depende dos deuses au dos poderes acima dos deuses. 0 heroi vai aodesastre por causa de seu carnler desregrado, suas paixoes desenfreadas,as excessos de sua natureza; de fato, seu carater e que e sua ruina. A fonyapropulsora da aeao nao e um poder extemo, mas um conflito interno [".J.(HAUSSER apud ESPER, 2009, p. 146).
Para Esper (2009, p.146), Shakespeare conseguiu imprimir em Hamlet uma
dinamicidade no espectro tragico. Como filho do rei da Dinamarca, Hamlet estava
46
preSQ na trama que seu tic criou para usurpar a trono, a fim de alcangar 0 tao
desejado poder. Entretanto, Hamlet tambem e um homem de boa indole e grande
inteligencia, e seu comportamento tambem faz parte da construgEio dramatica da
pega. Portanto, nao S8 pode infligir a Hamlet a culpa par alterar as fon;as que
harmonizam e equilibram 0 cosmos, paiS de certa maneira ele nao vai contra esta
ordem, mas sim tenta restaura-Ia.
Fazendo uma analise dos argumentos de Walter Benjamin, Esper (2009,
p.148) concorda que h8 entao uma dualidade, uma ambiguidade em Hamlet. Este
era urn principe, cuja existencia, apesar da autoridade investida neste cargo, e
regulada e inexoravelmente, intrinsecamente ligada ao destino de todo a reino. Ou
seja, sua individualidade era limitada a partir do momento em que da sua vida, das
suas atitudes dependia a vida do pavo de seu rei no.
Isto mostra que os lagos familiares e de sangue, assim como em Edipo, sao
essenciais no que se refere ao destino dos personagens envolvidos, diz Esper. Sua
tragedia estava ligada ao dever filial e de principe, deveres estes impostos pel a
propria condigao em que se situava.
Esta ideia de imposiC;ao do destin~ por parte das circunstancias pode ser
observada nas falas de Hamlet, quando diz que "maldita a sina que me fez nascer
um dia pra conserta-Io" (SHAKESPEARE,2007, p.41) e de Laertes, que diz que 0
principe "e um vassalo de seu nascimento. Nao pode, como as pessoas sem
importancia, escolher a quem deseja, pois disto depende a seguranc;a e 0 bem-estar
do Estado [... J a escolha dele esta subordinada [... ],,(SHAKESPEARE, 2007, p.28)
Desta maneira, entao, Hamlet se distancia de Edipo, 0 qual foi responsavel
por sua derrocada tragica. Hamlet, portanto, nao se encaixaria na vi sao classica de
heroi tragico.
47
Ainda de acordo com 0 auter, haveria na obra a associa<;8o da ideia de
providemcia divina e da revelayao inevitavel da verdade. "Como podemos notar, elas
estao unidas justamente pela imagem da queda do pardal que reaparece nas
palavras de Hamlet a Horacio, instantes antes do duelo final" (ESPER, 2009, p.155).
As palavras proferidas par Hamlet antes de sua morte ressaltam urn tom profetico,
intuitivD do her6i. Hamlet de certa forma pressente 0 que esta par vir, e que tude
sera revelado na hera certa.
Ha tambem, de acordo com a autor, Dutro elemento que pode ser inserido no
destino de Hamlet: a IOUGUr8. Esta faria entaD parte do desenvolvimento e
funcionamento desconhecido, porem necessario do destino.
Aqui ela se confunde com a ideia do entusiasmo ("1erurndeus dentro de si")au da intuiyao que nos alerta au nos pennite aehar caminhos para situac;oesextremas, como no caso do epis6dio da carta trocada, quando Hamlet sesalva por instinto da morte que Ihe sena imposta ao desembarcar naInglaterra. (ESPER, 2009, p.150~151)
A laucura persegue Hamlet, e este se encantra no final da pec;a dente de que
estava fadado a um final sem qualquer espa90 para a reden~ao.
Para Esper (2009, p.155-156), entao, ha presente tambem na obra a questao
sacrificial de Hamlet, a qual aceita definitivamente a carater sacrificial de sua sina,
se declaranda entao pronto para realizar a tarefa que Ihe fOI delegada. Para 0 autor,
haveria entao, par parte de Hamlet, 0 reconhecimento da inexorabilidade das leis
que regem os destinos humanos. Ao final da pec;a, ele aceita seu papel, mesmo
sabenda que para se vingar da morte de seu pai teria que abdicar de sua propria
vida, de si mesma.
o protagonista da pe~a de Shakespeare, estando ciente desde a comel'o da
pe9a da trama envoi vida no assassinato do pai, sabe que esta destinada a cumprir a
48
vinganc;a, e que esta envoi vida em uma trama tragica, que pode ter conseqOencias
desastrosas no futuro.
Hamlet diz que 0 destino 0 chama (SHAKESPEARE, 2007, p.34). Ao final da
peC;a, antes do combate com Laertes, Hamlet pareee cada vez mais envoi vida e
disposto a cumprir sua tarefa. Para 0 her6i tragico "existe uma previdencia divina
especial ate na queda de urn passaro. Se e agora, nao vai ser depois; S8 nao for
depois, sera agora; S8 nao for agora, sera a qualquer hara. Estar preparado e tudo,"
(SHAKESPEARE, 2007, p. 134). Nesta fala pode-se observar tambem que Hamlet
admite que haja alguma forc;a maior que esta aeirna da nossa 8xistencia.
Hamlet, ao pedir que fassem reescritas partes da peva que a trupe deveria
encenar para 0 rei, pade ser vista como 0 dramaturgo de sua pr6pria vida, pais desta
maneira ele tambem estava "escrevendo passo a passo a trama real a qual ele
proprio foi destinado" (ESPER, 2009, p. 156).
Apesar da hesita«iio, do adiamento da vingan~a, nota-se um processo de
amadurecimento de Hamlet, que no final nao se mostra s6 um rapaz estudado e
inexperiente, mas urn homem que tern maturidade suficiente para aceitar e executar
estrategicamente 0 seu dever de filho.
Como nao se pode deixar de citar Barbara Heliodora quando se fala em
literatura critica sabre Shakespeare, prosseguirernos a teoria abordando algumas
das considerac;6es feitas pel a autora sabre Hamlet e a questao do destino dentro da
pe~a.
Primeiramente, importante lembrar que, para a autora (1998, p.100), este
pe~a poderia ser analisada pela otica de ser uma representa~ao da propria vida. Ou
seja, a urn hornem foi imposta urna tarefa, a qual ele naa buscou, da qual, contudo
49
deve S8 desincumbir. Na per;a, desta maneira, vemos a processo de urn homem
tentando alcan9ar algum sentido, uma validac;iio da tarefa que Ihe foi proposta.
Dito ista, avanc;aremos agora fazendo urn breve apanhado do que diz
Heliodora acerca da teoria sabre a tragedia shakespeariana. Para a autora, deve-s8
conhecer 0 que diz A. C. Bradley sabre ests tema. Em dais de seus livros
pesquisados, Heliodora nos remete a este autor, que concebe a tragedia
shakespearian a como uma
hist6ria de exceptional calamidade, que conduz a morte de um homem emalta condicao. Entretanto, as calamidades da tragedia nao acontecem,simplesmente; nem sao, par Qutro lado, arbitrariamente mandadas parpoderes absolutos: elas nascern primordialmente de al;oe5, ar;oes dedeterminados homens. 0 que estes fazem e que cons!i!ui 0 fatorpredominante. (BRADLEY apud HEllO DORA, 1998, p.94).
A partir deste autor, Barbara Heliodora teee alguns comentarios sobre 0
destino na tragedia de Shakespeare, dizendo que nas obras do dramaturgo nao se
tern 0 dominio do sobrenatural nas ac;6es dos personagens. Ou seja, a tragicidade
nao e enviada, mas slm e ocasionada pel as ac;6es humanas.
Dito isto, a autora concebe que na tragedia de Shakespeare "nada do que
aeonteee pode pareeer emanar de qualquer poder sobrenatural, seja este justo ou
maligno. A ealamidade nao aconteee, nao e enviada: ela se origina de ac;6es
executadas por seres humanos" (HELIODORA, 2004, p.127) Ao passe que temos
esta afirmac;ao, a autora faz uma ressalva dizendo que
Temos que admitir que ha circunsUincias que pesam sabre esses seres, 0que acaba par sugerir uma cadeia aparentemente inevitcivel deacontecimentos: mesmo que as al;oes crucias sejam de responsabilidadedo her6i, elas desencadeiam consequimcias e forl;as que conduzeminevilavelmenle a calaslrofe final [...) Bradley insisle no falo de que, muitoembora nao haja interferencia do sohrenatural, transparece a sensacao deque atgum lipo de ordem universal nao e tatalmente indiferenle ao destinodo homem. (HELIODORA, 2004, p.127)
Muito em bora possamos sentir esta sensa9ao descrita por Bradley, nas
tragedias shakespearianas 0 enfoque parece ser 0 aprendizado e a possibilidade de
50
ter uma visao mais equilibrada da realidade par parte do protagonista. Ao lerrnos
uma tragedia desta natureza nota mas a forte preseng8 dos questionamentos sabre a
condigao humana.
Harold Bloom, par sua vez, comenta sobre a questao do sobrenatural na
peg8, comenta a fala de Hamlet "[ ... ] ha uma divindade dando forma final aos nossos
mais toscos projetos" (SHAKESPEARE, 2007, p. 127). Para 0 autor, esta divindade
nao paraee pertencer a nenhuma religiao. A nossa interpretac;ao ira depender de
como entendemos sabre "final". Esta divindade pode ser a propria "natureza divina
do homem, perdida, prostrada em urn mundo de paixao e sana, agora manifestada
na condic;ao do genic pessoal, mais refinada do que a vontade humana" (BLOOM,
2004, p.83-84)
Uma das passagens mais famosas da pe<;a, user au naa ser - eis a questao.
Sera mais nabre sofrer na alma pedradas e flechadas do destino feroz au pegar em
armas contra 0 mar de angustias [ ... ] morrer; dormir; s6 isso" (SHAKESPEARE,
2007, p. 67), representa este questianamenta sabre a ser humana, sabre sua
miss8o, sabre a morte.
Ainda tecenda camentarios sabre as tragedias de Shakespeare, Barbara
Heliadara (2009) faz algumas reflex6es sabre a rela<;8o do her6i tragico com a
tragedia em si e seu potencial de suscitar uma catarse no espectador. Para
Heliodora
Uma das emocoes mais significantes da tragedia e a do desperdicio; umconsideravel potencial de vida e perdido com a morte do heroi, mas poroutro lado, ao mesmo tempo em que temos a sensacao de 0 hero; ser umhomem condenado, de os acontecimentos conspirarem para conduzi-Io aseu fim, sentimos igualmente que ele e, em medida mais que consideravel,o responsavel par sua propria destruic;:ao.(HELIODORA, 2009, p.160).
Outro ponto que deve ser lembrado quando se fala do destino de Hamlet e a
questiio da loucura. Heliodora (1998, p. 102) tambem aborda este tema, dizendo
51
que esta laucura, assim como para Esper, esta de certa modo conectada com a
questao do que S8 entedia par destino na epoca da renascenya. Para a autora, a
laucura pode ser contestada, pois, 0 her6i tragico deveria ser responsavel par seus
atos e seu destin~, deste modo naD poderia apresentar sinais de insanidade. Ou
seja, pode-se questionar se Hamlet estava realmente louco.
Referindo-se a questao sobre de quem seria da responsabilidade dos atos
que culminaram no desfecho tragico, Helen Gardner (1967, p.218-221), em artigos
publicados e reunidos par Leonard Dean, par sua vez, assevera que a essencia da
tragedia de vinganya e 0 fato do her6i naD ter criado a situ8c;ao em que encontra. Ou
seja, ele nao e a maior responsavel pel a sua tragedia. A autera diz que Hamlet
morre como uma vitima da constancia de seus propositos, os quais 0 fizeram "seguir
inteiramente 0 desejo do Rei". Ou seja, para Gardner, Hamlet s6 tem seu final
tragico, pois aceita todos os desafios que Ihe foram propostos. Hamlet aceita a
necessidade de obedecer aos comandos do fantasma de seu pai.
Para a autora (1967, p.224-22S), a tragedia de Hamlet nao se baseia na
incapacidade do her6i em cumprir sua tarefa, ou em alguma falha fatal. A tragedia
de vingan9a, e em consequ€lncia a tragedia de Hamlet, se basearia entao na
natureza da tarefa que 0 her6i deve concretizar. E neste momenta que 0 heroi tem a
possibilidade de contemplar 0 mundo, de perceber a responsabilidade que tem para
com este mundo.
W. H. Clemen (1967, p. 232), na mesma reuniao de artigos, ao comentar
sobre as imagens de Hamlet, afirma que a rela~o entre 0 pensamento e a9ao
aparece nao como urna oposigao entre dois principios abstratos, entre os quais e
posslvel uma livre escolha, mas e uma inevitavel condigao humana.
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Ja Maynard Mack (1967, p.2S4-2SS), na mesma reuniao de artigos feita por
Dean, sugere que a perra de Shakespeare enfatiza a fraqueza humana, a
instabilidade do proposito humano, 0 dominic da fortuna sabre a humanidad8. A
sujeic;ao dos objetivos humanos a fortuna e tema recorrente em Hamlet. Para 0
aulor, 0 problema nessa obra shakespeariana nao e a vontade e a razaD, nem urn
problema individual. E uma ucondic;ao pela qual 0 individuo e aparentemente naD
responsavel" Indo de encontra com as ideias de Gardner, Mack nos diz que Hamlet
e uma obra que nos remete ao misterio da vida, e ests e urn lembrete de que Hamlet
naD e 0 principal responsc3vel par sua situac;ao. Ele a herdou, nasceu para aeertar 0
que estava errado.
Para Mack (1967, p.2S8), portanto, Hamlet nunca pretendeu se "sujar" com a
questao da vinganc;ae da corrupc;aodo reina, mas a partir do momento em que 0
fantasma de seu pai 0 desafia, a "sujeira"foi inevitavel. E a condiyao de viver em um
mundo como 0 que se vivia na apoca de Shakespeare.
Ja citado anteriormente, outro te6rico em que podemos nos fundamentar
quando falamos das tragedias shakespearianas e A. C. Bradley. Ao falar da
substancia da tragedia de Shakespeare, 0 que se entenderia por natureza tragica,
Bradley (1965, p.1S-16) assevera que ha sempre uma representagao de algum
aspecto da vida humana nas obras do dramaturgo ingles. Ou seja, as tragedias
shakespearianas representam algum aspecto tragico da vida. E esta substancia e a
estrutura da tragedia de Shakespeare que a distingue das tragedias gregas.
Ha tambam sempre uma parte problematica da vida do her6i que precede e 0
leva ate sua morte. A tragadia shakespeariana, desta maneira, seria uma narrativa
de sofrimento e calamidade conduzindo ate a morte do her6i. Alem disto, este
sofrimento e calamidade VaGse estender para muito alem dele. (BRADLEY, p.17-18)
53
o destino do her6i tragico atinge 0 bern de toda uma nac;ao ou Imperio, afinal,
como Hamlet, as protagonistas sao em sua maioria pessoas importantes, como reis
e principes. A queda de Hamlet, assim como a de Qutros protagonistas, produz urn
sensa de contraste entre a falta de poder do homem e a onipotemcia, talvez a
capricho, da Fortuna ou do destino, diz Bradley (1965, p.19).
Alem disto, para a autor (1965, p.20), as calamidades da tragedia nao
acontecem simplesmente, naD sao mandadas. Elas sao produto principal mente das
8r;oes humanas. Acontecem entao uma sarie de atas que S8 interconectam entre si,
formando assim uma seqOencia que inevitavelmente culmina na catastrofe final.
Este efeito nos faz pensar, entaD, que a catastrofe naD e apenas algo que aconteee
com a pessoa envoi vida, mas e tambem causada par ela.
Ou seja, para este te6rico, a homem seria a agente principal, "eles mesmos
sao as autores de suas pr6prias desgrayas" (BRADLEY, p.20). Nao significa dizer
que este seja a unico elemento que vai permear a tragedia, mas a a<;ao humana e a
fator predominante.
Bradley (1965, p.22) ainda assevera que Shakespeare introduziu a
sabre natural em algumas de suas tragedias. Estes elementos, como a fantasma,
nao podem ser, em muitos casas, explicados sem se talar na ilusao e na mente de
urn dos personagens da obra. Alem disto, estes elementos contribuem, segundo a
autor, para a a<;ao, e e em mais de uma instancia uma parte indispensavel desta
8<;aO. Desta maneira, seria errado descrever a carater humano como sendo sempre
a unica for<;a motora nesta a<;ao.
Para Bradley, a fantasma seria entao importante para a pe<;a na medida em
que representa nao apenas um rei marta que pretende cumprir seus pr6prios
54
propositos, mas urn representante deste poder escondido, 0 mensageiro de uma
jUStiC;:8 divina.
Dito isto, Bradley (1965, p.145) ressalva que as a90es que acontecem em
Hamlet parecem nos fazer apreender algum poder maior, vasto. Nao definimos este
poder, nem 0 nomeamos, mas a imaginayao do leitor e assombrada par este
senti menta. Apesar dos caminhos tortUQSOS, ha a impresseo de que algo esta
puxando Hamlet silenciosamente, passo a passo, para que acabe atingindo seu final
tr<3gico.Ele deve morrer, cumprinda assim a demanda do destin~.
Segundo 0 autor (1965, p.145-146), Hamlet apresenta 0 sentimento de urn
poder supremo ou destino marcado de modo peculiar. Porem, assevera que nao
imaginamos este poder supremo como urn ser divino que deseja vingan9Ci, ou a
providEmcia que interfere de mane ira sobrenatural.
Shakespeare teria introduzido de certa forma a ideia de Hamlet estar nas
maos da Providencia. A for9Ci da resolu980 de Hamlet e tao grande, segundo 0 8utor
(1965, p.146), que sentimos que, vinda do proprio Hamlet, sendo sua vontade ou
nao, sua tarefa de vinganCY8 seria concretizada de qualquer maneira. Pais, seria 0
prop6sito de urn poder contra 0 qual ele e 0 seu inimigo sao impotentes, tornanda-os
assim instrumento da vontade deste poder.
Podemos notar, portanto, que Hamlet nao criou a SitU8C;80 em que S8
encontra, mas e sim de certa forma responsavel par sua tragedia.
Heliodora nos traz a ideia de Hamlet nao buscou a tarefa que tinha que
cumprir, mas no momento em que esta Ihe e proposta pelo fantasma de seu pai, e
quando descobre serem verdadeiras suas suspeitas, sle sucumbiu a tarefa,
validando-a. Deve-s8 dizer tambem que para a autora a tragedia foi ocasionada
pelas acroes humanas. E que, apesar destas 8c;oes naD parecerem obra do
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sobrenatural, he a sens8yao de urna ordem universal que nao e indiferente a alas e
80 destino humano. Ou seja, para Heliodora parece que as acontecimentos VaG
levando Hamlet a seu fim, mas ele e 0 maior respons8vel par sua destruigao.
Esper va; urn passo adiante ao afirmar que esta responsabilidade advem do
carc3ter de Hamlet. Haveria entao 0 conflito entre 0 carater do heroi tragico e seu
destino. A for<;a que mold a a tragedia moderna viria entaD do interior do heroi, de
seu carater, e nao mais do exterior como nas tragedias gregas. Portanto, Hamlet
nao S8 encaixaria na classificayao de heroi tragico classica, pais nao foi responsavel
par sua derrocada tragica. Ele apenas reconhece ao final, com suas atitudes e seu
carater, que as leis que regem 0 destino humane sao inexoraveis.
Alem disto, diz que Hamlet nao vai contra a forc;a que equilibra 0 cosmos,
mas sim tenta restaura-Ia. Ainda ha de se levar em conta que a individualidade de
Hamlet, para 0 aulor, era limitada na medida em que suas atitudes refietiam na vida
do reino inteiro. Ou seja, ele tinha um dever filial e de principe.
Para concluir a parte teorica, gostariames de sugerir, apos estas breves
refiexoes, que tanto Edipo Rei como Hamlet sao pec;as importantes, pois nao so
como 0 exemplo do destino humano, problematizam questoes fundamentais para a
existencia humana. Ou seja, ha um rico material humano, psicologico, que nos
levam a refletir sabre a condi~a do ser humano, qual sua missao em vida, para
onde vai, de ende veio. Ou seja, sao pec;as de grande complexidade par nos abrirem
as portas para questionamentes mais metaffsicos, existenciais.
56
5 CONCLUSAOE ANALISE FINAL
Ap6s faita esta breve apresenta98.0 sabre as teorias do destine nas pet;:as de
S6focles e Shakespeare, podemos notar que a ideia de que a obra de S6focles
reflete a pensamento grego da epoca classica (seculo V a.C.) e aceita pela maioria
dos teoricos. Bern como 0 pensamento de que a obra de Shakespeare aqui
analisada tambem reflete alguns aspectos da renascen~a inglesa. Afinal, a literatura,
S8 nao e urn espelho literal do que aconteee na sociedade. e sim influenciada e
reflete 0 contexte socio-cultural e hist6rico da apoea em que e escrita. A lingua,
como diria Saussure, e algo construido socialmente. Como a literatura S8 utiliz8
deste recurso, e como geralmente escrevemos e falamos daquilo que conhecemos
au pensamos, a literatura pode ser urn born ponto, nao 0 unico, para S8 entender urn
contexto de uma sociedade. A historia, a literatura, as documentos, entre Qutras
areas, deverao concorrer junta mente para 0 entendimento mais detalhado de um
contexto s6cio-hist6rico.
Se essa hip6tese formulada no inicio do trabalho se mostrou valida, podemos
problematizar e argumentar sobre outras hip6teses. Par exemplo, a ideia de que
Edipo teve seu destino afetado pelo erro de seu pai, e esta hamartia (erro) afetou a
vida de toda sua familia. E que, apesar de serem as ac;oes do protagonista que 0
levam a descobrir que a profecia havia ha muito se concretizado, e assim tambem a
sua verdadeira identidade, ha par tras de toda a trama a influencia de uma
divindade, a qual profetizou a destino tragico de Edipo, pode ser problematizada,
como mostrado aqui nos pensamentos te6ricos, especial mente ° de Bernard Knox.
NBo se pode refutar que a profecia nBo tenha destaque em Edipo Rei, porem,
ha sim ja incutida neste destino a ideia de livre arbitrio. Ideia essa que se recusa ao
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chamar a peg8 de "tragedia de destino~ Afinal, as 8c;oes do hero; tn3gico sao sim
cruciais para que a profecia S8 concretize. Os oraculos, os adivinhos, a divindade
apenas previram 0 futuro tragico do protagonista, porem a derradeira finaliza<;8o do
seu futuro sombrio foi dependente de suas 89D8S, seu carater, de sua busca pel a
verdade.
Este pareee ser urn ponto semelhante entre as duas pec;as, no que diz
respeito a questeo do destino. Ambas apresentam, em maior ou menor nfvel de
acordo com a epoea em que foi escrita, a questeo do livre arbitrio versus urn destino
pre-definido. Alem disso, 0 can:1tter dos protagonistas tambem vai exercer urn papel
importante para a concretiza~o de seus destinos tragicos.
Ao S8 dizer isto, naD podemos perder de vista que a sociedade grega, mesmo
que em processo de mudanr;:a, ainda tinha arraigado alguns preceitos em rela~o as
suas crenc;as. Uma mudanc;a cultural nao ocorre rapidamente, 0 que nos leva a
pensar que, se os gregos estavam questionando os deuses, estes ainda tinham
grande importancia na epoca. Questionar algum preceito nao quer significar que se
deva abandona-Io.
Hoi tambem que se lembrar que quando falamos em racionalidade e em
destin~, devemos levar em conta tode 0 contexte social apresentando aqui
sucintamente.
Em Hamiel a questao do destino de fato nos e apresentada de uma forma
mais relativizada, influenciada pelo pensamento do livre arbitrio que ecoava os
pensamentos humanitarios renascentistas na sociedade elisabetana. E, tanto em
Hamlet cemo em Edipo Rei, podemos observar que ha varios questionamentos
sobre a condiyao humana, que podem nos levar a refletir sobre a vida, a morte e
destino.
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Como Dutro ponto que S8 pode estabelecer uma relaC;Elo entre as pec;as,
podemos citar que diferentemente da obra grega, Hamlet nao nos mostra urn
protagonista tentando fugir de urn destino vaticinado pelos deuses, mas sim urn
heroi traQico que S8 questiona sabre 0 seu destin~, sobre sua condiyao humana.
Este questionamento pode ser observado nas duas peyas. Hamlet nao foge, como
Edipo fez quando fugiu de Corinto para Tebas, de urn destino vaticinado.
Primeiramente, 0 vaticinio 56 ocorre para Edipo. Em Hamlet nao e urn deus que
profetiza seu destin~, mas sim 0 fantasma de seu pai, 0 qual na visao da epoca
poderia ate ser 0 proprio demonio, que aparece para Ihe dizer que seu assassinato
deveria ser vingado.
Em segundo lugar, ao se deparar com 0 processo de vingan9a, Hamlet,
apesar de relutar no inicio e nao querer aceitar seu fardo, se julga na obriga9ao de
cumpri-Io, pela sua condic;ao de filho e principe, na medida em que descobre ser
verdade suas suspeitas contra a tio.
Se em Edipo Rei 0 fater externo ao seu destino pareee ser uma divindade,
urn deus, em Hamlet pareeem ser as eireunstaneias tanto de seu nascimento como a
morte de seu pai. Edipo tambem exercia um alto cargo, era Rei de Tebas. Seu
nascimento e sua fun~o na sociedade tambem exereem um importante papel
dentro da pe<;a, principal mente quando Edipo, na condi\'iio de Rei e habitante da
eidade, vai atras do assassino de Laio par conla pr6pria. Porem, pareee-nos que
esla questao nao fica lao em evidencia quanta em Hamlet. Na pe98 de S6foeles, ao
eontrario da pe9a de Shakespeare, as ac;6es do personagem e a profeeia em
conjunto formam a fatar externo. A questao do alto cargo pode ser relativizada, afinal
Hamlet era principe em decorrencia de seu nascimento, e Edipa se lornou rei ap6s
eonseguir decifrar 0 enigma da esfinge.
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Pode-S8 dizer tambem que urn aspecto que aproxima as duas obras e a
questao do destino dos dois protagonistas estar de certa forma atrelada a uma
justi9a. Em Edipo, seu destino esta ligado a uma justi9B divina, e tambem a justi9a
da cidade. Justic;a divina, pais ja havia sido profetizado que 58 Laic tivesse urn fitho,
fosse contra 0 que os deuses falaram, tada sua familia iria sofrer as conseqCu§ncias.
Ja justic;a da cidade, pais, como Rei e como individuo justa que era, deveria punir 0
assassino de Laio. Ja em Hamlet, 0 destino esta ligado com a busca da justi9a de
Hamlet ao tentar punir 0 assassino de seu paL Esta ligado tambern com a justi9a do
reino, como em Edipo. Pois, sendo principe naG poderia e naG aceitaria que seu
reino fosse gave mad a par pessoas como seu tiD. Antes de morrer, Hamlet ainda
"profetiza que a elei9iio recaira em Fortinbras. Ele tern meu voto agonizante. Diz-Ihe
isso e fala de todas as ocorrencias [...]". (SHAKESPEARE, 2007, p.139). Ou seja,
seu ultimo ata antes de falecer foi S8 preocupar com 0 que aconteceria com 0 reino
e seus habitantes daquele momenta em diante.
Nota-se, desta maneira, que as duas obras se relacionam na medida em que
questionam a eonstrucyao do destino humano. Nao se eonsegue nenhuma resposta
fixa em rela9iio do destino. Ao final das duas pe9as, os dois protagonistas se vern
frente a frente com uma for~ maior, que pareee moldar a destino dos dois. POrt9m,
nao se pode comprovar realmente qual seria esla for~, principalmente em Hamlet.
Edipo chega a atribuir sua derrocada tragica a Apolo, atribuindo aos deuses seu
destino. Fala que "Foi Apolol Foi 0 deus Apolo [...1 que me imp6s tamanha
amargura" (SOFOCLES, 2008, p. 72). Ja Hamlet diz que em seu cora9iio "havia uma
especie de luta que me impedia de dormir [...]. ha uma divindade dando forma final
aos nossos rnais toscos projetos" (SHAKESPEARE, 2007, p. 127). Ou seja, 0 inicio,
as a90es podem ate ser nossas, porem a conelusao do ato fica ria par conta de uma
60
forya externa, maior do que 0 proprio ser humano. Na traduyilo de Ana Amelia
Carneiro MendonC;8, citada pela professora Cristiane Busato Smith (2004, p.1) em
artigo publicado pela revista E-Letras da Universidade Tuiuti do Parana, "he. urn deus
guiando nosso fim, seja nosso embora 0 inicio".
Hamlet anteve seu tim, e apresenta urna resignay8.o frente a ele, dizendo que
"Se e agora, nao vai ser depois; S8 naD for depois, sera agora; S8 naG for agora,
sera a qualquer hora. Estar preparado e tudo. Se ninguem e dono do nada do que
deixa, que importa a hora de deixa-Io?" (SHAKESPEARE, 2007, p. 134). Edipo
tambem S8 resigna ao final da pec;a, que pede que 0 seu destino siga seu curso
(SOFOCLES, 2008, p. 75). Ou seja, notamos nos dois protagonistas de alguma
forma a ideia da inexorabilidade da condiryao humana.
Os dais protagonistas parecem que estao sendo levados par algo inevitaveL
As 8c;oes VaG acontecendo, e cada ato que praticam as levarn a Dutro. Ha sempre
urn paradoxa sabre de quem seria a responsabilidade das acy6es e da construgao
dos destinos. Como nota mas tanto em Edipo como em Hamlet alguma nocyao de
livre arbitrio, segundo as teorias aqui apresentadas, podemos dizer entao que nas
duas pecyas as autores nos colocam a refletir e a nos questionarmos sabre 0 destino.
Afinal, somas responsaveis pelas nossas acy6es, mas nao sabemos se somos de
todo donas do nosso proprio destino.
A unica coisa certa em nossa vida e a morte. Este parece ser a destino que
une nao s6 as dois her6is tragicos, apesar de Edipo nao morrer na peya Edipo Rei,
mas tambem a destino de todos as seres humanos. Eventualmente,
inexoravelmente, independente de quem somas, acabamos todos tendo a mesmo
final. Nilo precisamos da morte de Edipo na peya para saber, que mais cedo ou
mais tarde, ira ter a mesmo fim de Hamlet. E como diz a rainha em Hamlet: "sabes
61
que e sorte comum - tudo 0 que vive morre, atravessando a vida para a eternidade"
(SHAKESPEARE, 2007, p.21). E como diz 0 coro ao final de Edipo Rei "nao
tenhamos por feliz homem algum, ate que tenha alcanyado, sem conhecer doloroso
destino, 0 ultimo de seus dias' (SOFOCLES, 2008, p.77).
Com este estudo, nota-s8 entaD que naD S8 consegue respostas fechadas no
que S8 refere a questeo do destin~. Ainda hoje nos questionamos sobre a nossa
participa980 na construyao do nosso futuro. Quando S8 tenta definir 0 destino como
conceito, percebemos a complexidade deste tema, que e tao filos6fico e metafisico.
Retornando aos verbetes apresentados na introdu~ao (p. 11) deste trabalho,
podemos entao notar a dificuldade de S8 conceitualizar esta palavra, na medida em
que 0 destino e uma fatalidade, algo inerente a vida humana. Sao fatos
considerados como independentes da nossa vontade. Param, ha a ideia tambem
que as eoisas naD acontecem natural mente, temas que ir atras do que queremos.
Como diz Ruth Rocha em seu verbete, destino e a propria vida, entao como defini-Io,
S8 a vida e algo que escapa de nossa compreensao humana. Se ha ou nao alguma
for9a superior moldando 0 destino humano, se nao temos controle sabre 0 nosso
futuro, talvez nunca obtenhamos uma resposta satisfatoria. 0 que pretendemos aqui
nao foi fornecer respostas prontas, mas sim abrir caminho para que estas
indagat;oes possam ser cada vez mais aprofundadas e relativizadas, nao so nas
obras aqui citadas, mas em outras obras que tambem abordem este tema do eterno
confronto entre 0 destino e 0 livre arbftrio.
62
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