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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Programa de Pós-Graduação em Letras
Josimar Carvalho Porto
DISCURSO MIDIÁTICO: análise interdiscursivo-argumentativa do gênero pub licitário
Belo Horizonte 2011
Josimar Carvalho Porto
DISCURSO MIDIÁTICO: análise interdiscursivo-argumentativa do gênero pub licitário
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Letras da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Linguística e Língua Portuguesa.
Orientador: Hugo Mari.
Belo Horizonte
2011
FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Porto, Josimar Carvalho P839d Discurso midiático: análise interdiscursivo-argumentativa do gênero
publicitário. / Josimar Carvalho Porto. Belo Horizonte, 2011. 137f. : il. Orientador: Hugo Mari Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Letras. 1. Análise do discurso. 2. Publicidade. I. Mari, Hugo. II. Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Letras. III. Título.
CDU: 800.852
Josimar Carvalho Porto
DISCURSO MIDIÁTICO:
análise interdiscursivo-argumentativa do gênero pub licitário
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Letras da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Linguística e Língua Portuguesa.
_______________________________________________________ Hugo Mari (Orientador) - PUC Minas
____________________________________________ Patrícia Rodrigues Tanuri Baptista - Faculdade Novos Horizontes
_______________________________________________ Paulo Henrique de Aguiar Mendes - UFOP
Belo Horizonte, 13 de dezembro 2011.
A Deus, sempre presente e fiel.
Aos meus pais, irmãos e filhas meus eternos
amigos.
Aos meus avós (Antônio Fernandes e Maria
Carvalho), exemplos de vida e sabedoria.
À Aldenira Jurique, minha esposa.
AGRADECIMENTOS
A todos que contribuíram para a realização deste trabalho, fica expressa aqui
a minha gratidão, especialmente:
Ao querido amigo professor Hugo Mari, por me orientar e me incentivar de
forma tão plausível e por ser o grande cooperador para que eu pudesse realizar e
defender esta pesquisa.
Agradeço a todo o corpo docente, os professores Drs. Paulo Henrique de
Aguiar Mendes, Marco Antônio de Oliveira, Milton do Nascimento, Jane Quintiliano,
Maria Ângela Paulino, Arabie Bezri Hermont, Juliana Alves de Assis e Ângela Vaz
Leão. Obrigado a todos pelo conhecimento ofertado e por terem me guiado nesse
universo tão fascinante chamado linguagem.
Agradeço, também, às secretárias do Programa de Pós-graduação em Letras
da PUC-Minas, Maria Berenice e Vera pela paciência e dedicação no atendimento.
Às Secretarias Municipal (Bacabal) e Estadual de Educação do Maranhão que,
com sua política de valorização e aperfeiçoamento de professores, concedeu-me
licença para fazer o Mestrado e elaborar minha Dissertação.
À Faculdade de Educação de Bacabal pelo incentivo e apoio durante todo
o Curso.
Ao Programa de Pós-graduação em Letras da PUC-Minas.
A todos que, de alguma forma, contribuíram para esta construção.
A orientação dialógica é naturalmente um fenômeno próprio a todo discurso. Trata-se da orientação natural de qualquer discurso vivo. Em todos os seus caminhos até o objeto, em todas as direções, o discurso se encontra com o discurso de outrem e não pode deixar de participar, com ele de uma interação viva e intensa.
(M. Bakhtin, 1992)
RESUMO
Esta Dissertação visa construir um entendimento dialógico da linguagem, com
enfoque sobre interdiscursividade e intertextualidade, a partir da argumentação
presente no gênero publicitário. Sendo assim, retratará os recursos que compõem o
universo de definição desse discurso, reconhecendo a sua historicidade e
determinando a sua condição de signo ideológico, portadora de uma discursividade
dialógica e persuasiva. Logo, o intuito desta pesquisa é compreender como essas
narrativas se configuram em termos discursivos e, como, dialogicamente, esse
gênero toma forma na Teoria da Argumentação. A partir da análise de categorias do
tipo “interdiscurso”, “interação”, “dialogismo”, “função discursiva” e “argumentação”,
almeja-se dar um tratamento consistente a esta questão, considerando o estudo do
discurso midiático, como fator interdiscursivo e intertextual na construção
argumentativa. A fim de realizar tal pesquisa, e, consequentemente, atingir os
objetivos propostos, inicialmente, tratou-se de pressupostos gerais e teóricos e da
justificativa pela opção por este objeto de estudo. Em seguida, ressaltaram-se as
Teorias da Análise do Discurso, com algumas considerações sobre o discurso
midiático, ação e interação e Teoria da Argumentação. Na sequência, realizou-se a
análise dos enunciados selecionados para o corpus da pesquisa, por meio do
dialogismo e intertextualidade de Mikhail Bakhtin e os pressupostos teóricos da
Análise do Discurso em Maingueneau e Charaudeau, além da referência à Teoria da
Argumentação de Perelman. Focaliza-se a língua como ação e interação verbal, as
cenas enunciativas e o ethos presentes no texto publicitário. Dá atenção especial à
publicidade alvo de análise para identificação dos discursos e textos que nela
perpassam, constituindo a interdiscursividade e a intertextualidade. Mostra ainda a
ideologia que enriquece a publicidade, com o discurso argumentativo de possíveis
vantagens que o consumidor pode ter. Dessa forma, a pesquisa possibilitou
compreender melhor o funcionamento interdiscursivo-argumentativo do gênero
publicitário e detectar como o discurso se submete, simultaneamente, a condições
enunciativas, sócio-históricas, intencionais e persuasivas.
Palavras-chave: Discurso. Interdiscursividade. Argumentação. Publicidade.
ABSTRACT
This dissertation aims to build a dialogical understanding of language, focusing on
interdiscursivity and intertextuality, in the arguments present within the advertisement
genre. Thus, it will portray features that are part of the universal definition of speech,
acknowledging its historical background and determining its ideological sign
condition, bearer of a dialogical and persuasive discursiveness. Therefore, the
purpose of this research is to understand how these narratives are configured in
discursive terms and how, dialogically, this genre gets shaped within the Theory of
Argumentation. With the analysis of categories such as "interdiscourse," "interaction,"
"dialogism," "discursive function" and "argument", it is aimed to give a consistent
approach to this issue, considering the study of media discourse, as a interdiscursive
and intertextuality factor in the argumentative construction. In order to carry out such
research, and thus achieve the proposed goals, at first, it was dealt with the general
assumptions and theoretical justification for the choice of this study object. Then, it
was highlighted the Theories of Discourse Analysis, with some considerations on the
media discourse, action and interaction and Argumentation Theory. As a result, there
was the analysis of utterances selected for the corpus of research, through the
intertextuality and dialogism of Mikhail Bakhtin and the theoretical assumptions of
discourse analysis in Maingueneau Charaudeau as well as with the reference to
Perelman's Theory of Argumentation. It is focused on language as action and verbal
interaction, the enunciative scenes and the ethos present in the advertisement texts.
It is given special attention to advertisement being analyzed in order to identify the
discourses and texts that underlie it, constituting the interdiscursivity and
intertextuality. It also shows the ideology that enriches the advertisement, with the
possible advantages of argumentative discourse that the consumer may have.
Therefore, the results allow us to better understand the workings of gender-
argumentative interdiscursive advertising and how to detect the way speech
undergoes simultaneously the enunciative conditions, socio-historical, intentional and
pervasive.
Keywords: Speech. Interdiscursivity. Argument. Advertisment.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Campanha publicitária Amelie Poulain 27
Figura 2 – Campanha publicitária da TAM 94
Figura 3 – Campanha publicitária da Minissérie Amaz ônia 95
Figura 4 – Campanha publicitária da Mulher Tupperwa re 96
Figura 5 – Campanha publicitária sobre o Carnaval e a Semana Santa 99
Figura 6 – Campanha publicitária do Audi 4 102
Figura 7 – Campanha publicitária do Space Fox 104
Figura 8 – Campanha publicitária Novo Chronos 107
Figura 9 – Campanha publicitária Oi conta total 110
Figura 10 – Campanha publicitária Articulado 24h 111
Figura 11 – Campanha Branca de Neve e Chapeuzinho V ermelho 113
Figura 12 – Campanha publicitária Dia dos Namorados Marisa 115
Figura 13 – Campanha publicitária obra prima 116
Figura 14 – Campanha publicitária Furacão 118
Figura 15 – Campanha publicitária baixinho 119
Figura 16 – Campanha publicitária Bom Bill 121
Figura 17 – Campanha publicitária compra bom bril, tia 122
Figura 18 – Campanha publicitária Mulher do Padre 123
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Síntese da instância da peça 99
Quadro 2 – Síntese da análise da publicidade das Va ntagens OI. 111
SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................23 2 ASPECTOS PRELIMINARES DE ANÁLISE .........................................................24 2.1 Formulação do objeto de estudo .....................................................................27 2.2 Justificativa ........................................................................................................35 2.3 Objeto de estudo e objetivos ...........................................................................35 2.4 Metodologia .......................................................................................................36 2.4.1 Corpus .............................................................................................................36 2.4.2 Procedimentos ...............................................................................................36 3 ANÁLISE DO DISCURSO – ESBOÇO HISTÓRICO .............................................38 3.1 Condições de produção do discurso ..............................................................39 3.2 Conceito de ideologia .......................................................................................40 3.3 Formações discursivas e formações ideológicas ..........................................42 3.4 Subjetividade na linguagem .............................................................................45 3.5 Dialogismo e polifonia ......................................................................................46 3.6 As cenas enunciativas ......................................................................................48 3.7 Os gêneros discursivos ....................................................................................49 3.8 Interdiscursividade e intertextualidade ...........................................................59 4 DISCURSO MIDIÁTICO: PUBLICIDADE ..............................................................63 4.1 Os Posicionamentos da publicidade no Brasil ...............................................64 4.2 Publicidade e discurso .....................................................................................67 5 ELEMENTOS DA ARGUMENTAÇÃO PARA ANÁLISE DA PUBLICI DADE .......70 5.1 A retórica clássica e a nova retórica ...............................................................71 5.2 Razão e autoridade ...........................................................................................77 5.3 A eficácia: do ethos argumentativo ao ethos ins titucional ...........................78 5.4 Ethos e Doxa – eficácia do discurso na autorida de do locutor ....................82 5.5 Ethos e boa fé dos quadros sociais da argumenta ção ..................................85 6 ANÁLISE INTERDISCURSIVO-ARGUMENTATIVA DO GÊNERO
PUBLICIDADE ...................................................................................................93 6.1 Aspectos argumentativos .................................................................................94 6.1.1 Análises da peça publicitária da TAM ..........................................................94 6.1.2 Análises da peça publicitária da MINISSÉRIA A MAZÔNIA .........................95 6.1.3 Análises da peça publicitária da TUPPERWARE .........................................96 6.1.4 Análises da peça publicitária do Governo do C eará ...................................99 6.1.5 Análises da peça publicitária da VOLKSWAGEN-A UDI A4 .......................102 6.1.6 Análises da peça publicitária da VOLKSWAGEN-S PACE FOX ................104 6.1.7 Análises da peça publicitária da NATURA .................................................107 6.1.8 Análises da peça publicitária da OI ............................................................109 6.1.9 Análises da peça publicitária da FERRACINI .............................................111 6.2 Padrões de interdiscursividade .....................................................................113 6.2.1 Análise da peça publicitária do BOTICÁRIO E D A MARISA .....................113 6.2.2 Análises da peça publicitária da BOM BRIL – O BRA PRIMA ...................116 6.2.3 Análises da peça publicitária da BOM BRIL –FU RACÃO ..........................118 6.2.4 Análises da peça publicitária da BOM BRIL – B AIXINHO .........................119
6.2.5 Análises da peça publicitária da BOM BRIL – B OM BILL ........................... 122 6.2.6 Análises da peça publicitária da BOM BRIL - T IA......................................123 6.2.7 Análises da peça publicitária da BOM BRIL – M ULHER DO PADRE .......124 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................127
REFERÊNCIAS ..................................................................................................130
23
1 INTRODUÇÃO
Esta pesquisa procurará desenvolver uma abordagem no âmbito da Análise
do Discurso, com enfoque no discurso midiático, em que o desenvolvimento teórico
contemplará uma análise interdiscursivo-argumentativo de campanhas publicitárias.
A pesquisa está organizada em cinco capítulos, conforme descrição abaixo.
Na parte inicial da pesquisa - Capítulo 2 -, desenvolveu-se o tópico Aspectos
Preliminares de Análise, que representa uma abordagem dos elementos que
caracterizam a justificativa, o objeto de estudo, os objetivos, a metodologia, o corpus
e procedimentos de análise que nortearam toda nossa discussão.
Na segunda parte da pesquisa - Capítulo 3 -, discorremos sobre uma
abordagem teórica em relação à Análise do Discurso, com enfoque em tópicos como
Condições de Produção do Discurso, Formações Discursivas e Formações
Ideológicas, Conceito de Ideologia, Dialogismo e Polifonia, Subjetividade na
Linguagem, Cenas Enunciativas, Gêneros Discursivos, Interdiscursividade e
Intertextualidade, que serviram de suporte teórico para o desenvolvimento da análise
do corpus desta pesquisa.
Na terceira parte da pesquisa - Capítulo 4 -, realizou-se um estudo sobre o
Discurso Midiático, destacando os Posicionamentos da Publicidade no Brasil, além
de uma relação entre a Publicidade e a Retórica, assim como Publicidade e Signos.
Dessa forma, esse tópico serviu também de embasamento teórico, com o intuito de
fortalecer as análises do corpus.
Na quarta parte da pesquisa - Capítulo 5 -, desenvolveu-se uma abordagem
teórica sobre os Elementos da Argumentação, em que se destacaram a Retórica
Clássica e a Nova Retórica, em que foram realizadas discussões sobre Razão,
Autoridade, Doxa, enfatizando aspectos relativos ao Ethos, Pathos e Logos.
Na parte final da análise – Capítulo 6 -, desenvolveu-se um estudo de
campanhas publicitárias, em que se abordou uma análise interdiscursivo-
argumentativa, na qual se procurou fazer uma correlação entre os aspectos teóricos
levantados no âmbito desta pesquisa e as publicidades selecionadas para o corpus
deste trabalho. A seguir, nas Considerações Finais, realizamos uma síntese daquilo
que foi abordado no conjunto dessa pesquisa, esperando ter contribuído, de forma
positiva, para o meio acadêmico com a proposta deste trabalho.
24
2 ASPECTOS PRELIMINARES DE ANÁLISE
Os textos que circulam na mídia têm sido objetos de inúmeras descrições nos
últimos vinte anos, com uma grande diversidade de enfoques em função do
instrumental teórico adotado. Os estudiosos e/ou pesquisadores que se
interessaram em estudar os fenômenos linguísticos, especialmente aqueles que os
analisam enquanto prática discursiva, passaram a estudar os textos com o objetivo
de formar leitores críticos dos mais diversos textos que permeiam o universo social.
Dentro dessa diversidade textual, temos os discursos midiáticos que serão
analisados nesta pesquisa, sobretudo, na perspectiva teórica da Análise do
Discurso, estruturados por Michel Pêcheux, Foucault e outros autores
contemporâneos, cuja reflexão se situa sobre a relação entre a língua e a história.
Sob esse prisma, a Análise do Discurso entende o discurso como manifestação da
linguagem em funcionamento, considerando-o como o lugar em que se pode
observar a relação entre língua e história, compreendendo-se como a língua produz
sentido por/para sujeitos (ORLANDI, 1999, p. 17). Assim, a Análise do Discurso
defende a tese de que a linguagem possui uma relação com a exterioridade, e que
não deve ser entendida como algo que está fora da linguagem, todavia como
condições de produção do discurso. Além disso, vê-se que um campo discursivo é o
midiático, o qual é constituído por gêneros do discurso em vamos destacar:
publicidade e propaganda. Nesse caso, qual a diferença entre publicidade e
propaganda? Não são as mesmas coisas?1 Podemos dizer que não são iguais.
Sendo assim, a Propaganda pode ser conceituada como atividade que tende a
influenciar o homem, como o discurso religioso, político ou cívico. Propaganda,
portanto, é a propagação de ideias, todavia, sem finalidade comercial. Dessa forma,
a propaganda é um conjunto de técnicas de ação coletiva, utilizadas no sentido de
promover a adesão a um dado sistema político (social, ideológico ou econômico).
Por outro lado, a publicidade, que é uma decorrência do conceito de propaganda, é
também persuasiva, no entanto, com o objetivo comercial bem caracterizado. Logo,
aquela é definida como arte de despertar no público o desejo de compra, levando-o
à ação. Assim, a Publicidade é um conjunto de técnicas de ação coletiva, utilizadas
1 Embora façamos uma distinção entre publicidade e propaganda, a tendência, de acordo com os estudos contemporâneos no âmbito do campo discursivo midiático, é abandonar essa distinção.
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no sentido de promover o lucro de uma atividade comercial, conquistando,
aumentando ou mantendo clientes. Portanto, a publicidade é mais abrangente que
propaganda e engloba todas as formas de comunicação: merchandising, marketing
Direto, novos meios etc. Nesse sentido, nossa pesquisa estará voltada para o
discurso midiático com enfoque na publicidade. Sendo assim, a atividade publicitária
é tão complexa e rica em dimensões humanas e tecnológicas que frequentemente
os seus profissionais desviam-se do objetivo de mercado. A mídia trabalha com arte,
criatividade, raciocínio, moda, cultura, psicologia, tecnologia, enfim, um complicado
composto de valores e manifestações da capacidade humana. Observa-se, também,
que a mensagem publicitária é um conjunto de ideias transmitidas ao receptor
através de um conjunto de mídias. O texto publicitário mostra que há uma interação
entre aquele que argumenta e o outro, pois a convicção do primeiro objetiva
modificar ou reforçar as ideias do segundo, mostra ainda que a ideologia enriquece
a publicidade, com o discurso argumentativo de possíveis vantagens que o
consumidor pode ter. Nesse sentido, para fazer uma análise do discurso publicitário
em relação à sociedade, podemos recorrer a Fairclough (1997). Esse autor destaca
que os vários discursos refletem algo moderno nas situações em que transitam.
O discurso legitima a dominação das elites e a publicidade constitui um exemplo
claro, visto que apresenta à população bens de consumo, servindo de elo entre
ambos, assumindo o papel de incentivador. Dessa maneira, um dos fundamentos
para o estudo do gênero publicitário é mostrar que as estratégias de produção desse
tipo de texto estão amparadas nos recursos retóricos de persuasão. De acordo com
a Nova Retórica, Perelman (2005) mostra que a teoria da argumentação consiste na
retomada da Arte Retórica aristotélica, com vistas a estabelecer uma contraposição
entre demonstração (lógica/formal) e argumentação (persuasiva/informal). Vejamos
o que ele propõe:
A argumentação é essencialmente comunicação, diálogo, discussão. Enquanto a demonstração é independente de qualquer sujeito, até mesmo do orador, uma vez que um cálculo pode ser efetuado por uma máquina, a argumentação por sua vez necessita que se estabeleça um contato entre orador que deseja convencer e o auditório disposto a escutar. Enquanto um sistema dedutivo se apresenta como isolado de qualquer contexto, uma argumentação é necessariamente situada (PERELMAN, 2005, p. 234).
Outro ponto relevante neste trabalho é que se deve esclarecer, antes de tudo,
que o princípio dialógico permeia a concepção de Bakhtin na linguagem e, quem
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sabe, de mundo, de vida. O autor acredita que o monologismo não rege a cultura
ideológica dos tempos modernos e a ele opõe o dialogismo, característica essencial
da linguagem e constitutivo, muitas vezes mascarado, de todo discurso.
O dialogismo é a condição do sentido do discurso.
Assim, Bakhtin (1992, p. 28) concebe o dialogismo como o princípio
constitutivo da linguagem e a condição para sentido do discurso. Examina-se, em
primeiro lugar, o dialogismo discursivo, desdobrando em dois aspectos: o da
interação verbal entre o enunciador e o enunciatário do texto, o da intertextualidade
no interior do discurso. Além disso, vale ressaltar a importância sobre a concepção
midiática, fator esse que serve de alicerce para nossa pesquisa. Nesse sentido,
vejamos o que destaca Charaudeau (2007, p. 18) sobre o objetivo das mídias:
As mídias manipulam tanto quanto manipulam a si mesma. Para manipular, é preciso um agente da manipulação que tenha um projeto e uma tática, mas é preciso também um manipulado. Como o manipulador não tem interesse em declarar sua intenção, é somente através da vítima do engodo que se pode concluir que existe uma manipulação. A questão, então, é saber quem é o manipulado, fato que, para as mídias, remete à questão de saber quem é alvo da informação (CHARAUDEAU, 2007, p. 18).
Portanto, este trabalho visa a desenvolver um debate acadêmico no âmbito
do discurso midiático – em especial, o publicitário -, destacando os fatores dialógicos
e subjetivos presentes na linguagem publicitária com enfoque na análise
interdiscursivo-argumentativa. Dessa forma, de acordo com todo o corpo teórico
levantado, demonstrarei, ao longo desta pesquisa e de acordo com a análise
proposta, como, em algumas publicidades, há uma inversão de valores entre o
consumidor e o produto, com ênfase na visão dialógica da linguagem. Sendo assim,
procurou-se abordar aspectos que envolvem a publicidade, tais como campanha
publicitária, o mercado consumidor, a qualidade e dimensões do produto, a
ideologia, o público alvo, os valores que desejam passar aos consumidores. Enfim,
compreender a dialogia na publicidade, que geralmente, é feita com a linguagem
persuasiva, convincente, indo ao encontro dos desejos do público a que se destina,
existindo essa interação entre consumidor e produto. Assim, há uma pretensão a
induzir o consumidor a comprar determinado produto ou serviço e, para que isso
ocorra, são necessários alguns recursos discursivos de que o gênero publicitário se
vale. Vejamos a formulação do objeto de estudo a seguir, a fim de entender a nossa
proposta de trabalho.
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2.1 Formulação do objeto de estudo
A formulação desse objeto de estudo visa a desenvolver uma avaliação do
discurso midiático, por meio da análise interdiscursivo-argumentativa no gênero
publicitário. Dessa forma, vejamos o texto sincrético a seguir:
De acordo com a Linguística Textual, tanto a produção quanto a recepção de
um dado texto envolvem ações que, como usuários de uma língua, fazemos o tempo
todo, que é a de produzir sentido, sempre relacionando três elementos - o
linguístico, o social e o cognitivo. Nesse caso, além de buscar esses elementos, o
objetivo da pesquisa visa a enfatizar a análise interdiscursivo-argumentativa, como
pressupostos teóricos para essa compreensão.
Esse texto acima é composto de uma linguagem sincrética, visto que contém
uma disposição visual e uma disposição verbal. Essa publicidade foi criada com o
propósito de atingir uma determinada classe social. A princípio, pensaríamos: a
classe social tem um alto poder aquisitivo, já que se trata de um perfume francês.
Figura 1 – Campanha publicitária Amelie Poulain
Fonte: RIOS, 2011
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No entanto, veremos que se trata de um produto para uma classe intermediária, nem
alta, nem baixa, e isso é comprovado pela análise semiológica das cores. Para a
publicidade, a classe A, considerada de alto poder aquisitivo, gosta de cores
neutras, mais claras, pois as cores com um tom mais escuro sugerem certo tom de
vulgaridade.2
Com isso, a publicidade faz uma referência ao filme francês “Amelie Poulain”,
filme esse que retrata que, após deixar a vida de subúrbio que levava com a família,
a inocente Amelie muda-se para o bairro parisiense de Montmartre, onde começa a
trabalhar como garçonete. Certo dia, encontra uma caixa escondida no banheiro de
sua casa e, pensando que pertencesse ao antigo morador, decide procurá-lo e é
assim que encontra Dominique. Ao ver que ele chora de alegria ao reaver o seu
objeto, a moça fica impressionada e adquire uma nova visão do mundo.
Então, a partir de pequenos gestos, ela passa a ajudar as pessoas que a
rodeiam, vendo nisto um novo sentido para sua existência. Contudo, ainda sente
falta de um grande amor. Nesse caso, se pode fazer uma relação do filme com esse
produto, uma vez que, de acordo com a análise semiolinguística, a disposição das
imagens reflete essa relação. O formato das letras, o design do perfume sugerem o
corpo feminino. As cores escuras e o contraste com a cor rosa, a névoa, a mulher
sem roupa, sem nome tudo isso com a finalidade de sugerir o tom de mistério, de
encantar e de sensualidade da mulher moderna “o poder de encantar”, “uma
fragrância totalmente ousada que explora a beleza e a sensualidade natural de cada
mulher”. Além disso, podemos analisar esse texto de acordo com a Teoria da
Argumentação.
Para Aristóteles, o discurso argumentativo é fundado na criação do orador.
Esse discurso é dividido em três espécies: a fundada no orador (ethos); no auditório
(pathos) e no discurso (logos). Isto quer dizer que um discurso consegue persuadir o
público de três formas: por meio do caráter do orador (ethos), pelas inclinações
despertadas no público (pathos) e pelo próprio discurso, ou seja, pelo o que ele
próprio evidencia (logos).
Nessa publicidade, o poder de persuasão é bem nítido. Cria-se um ethos da
mulher moderna: magra, alta, sensual, misteriosa, encantadora. O logos com suas
2 De acordo com as aulas ministradas, no Curso de Publicidade da PUC Minas, pela Professora Maura Eustáquia, essa parece ser uma afirmação padrão, no campo da publicidade, em termos de aceitação de cores, assim como a sugestão do design das letras.
29
disposições gráficas foram criados com a intenção de a mulher (consumidora) se
identificar com o produto, ou seja, para essa consumidora se tornar uma mulher
moderna, elegante, ela deverá usar esse perfume.
Além disso, percebe-se que esse texto destaca três finalidades discursivas: a
primeira seria a de fazer sentir - a mulher, ao usar o perfume, sente-se bela,
sensual, valorizada e moderna; a segunda a de fazer crer - nesse caso, o ato de
persuasão é bem nítido, se ela usar o produto adquirirá todo um ethos de uma
mulher moderna, igual à mulher da publicidade; e a terceira finalidade seria fazer
fazer, ou seja, o grande objetivo do texto publicitário que é levar o consumidor a
adquirir o produto, o ato da compra em si.
Vê-se, portanto, que esse texto publicitário é direcionado ao público feminino,
considerado um público mais consumista do que o masculino.
Além disso, nesse texto, vale ressaltar a busca de alienação do consumidor,
de acordo com a visão Marxista. As duas teorias, reificação e fetichismo, aparecem
nessa busca de interação entre consumidor e produto. Veja-se que é como se o
produto ganhasse vida, ele é personificado e o consumidor torna-se objeto (coisa).
Nesse prisma, a representação do produto começa a agir sobre o
consumidor, agora, guiado pela força persuasiva que essa representação exerce
sobre ele, isso na filosófica Marxista é intitulada de fetichismo, a coisa torna-se viva.
Por outro lado, o que era ser vivo torna-se coisa, a teoria da reificação.
Ainda de acordo, com Marx (1980), é possível que, a partir da Teoria da
Ilusão, se possa afirmar que a mulher que comprar esse produto poderá se tornar
uma mulher igual a da publicidade (magra, alta, sensual, elegante, moderna), ou
seja, engano ou autoengano.
Dessa forma, a interação entre os sujeitos do discurso fica bem evidenciada o
tempo todo.
A publicidade procura sempre essa interação entre o consumidor e o produto
a ser adquirido. Quanto maior for a identificação entre consumidor e produto, maior a
probabilidade de se haver uma interação, ou persuasão.
A fim de ratificar o nosso objetivo da pesquisa, vejamos o próximo texto que
nos ajuda a entender ainda melhor essa temática.
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Eu, etiqueta Em minha calça está grudado um nome
Que não é meu de batismo ou de cartório
Um nome... estranho
Meu blusão traz lembrete de bebida
Que jamais pus na boca, nessa vida,
Em minha camiseta, a marca de cigarro
Que não fumo, até hoje não fumei.
Minhas meias falam de produtos
Que nunca experimentei
Mas são comunicados a meus pés.
Meu tênis é proclama colorido
De alguma coisa não provada
Por este provador de longa idade.
Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,
Minha gravata e cinto e escova e pente,
Meu copo, minha xícara,
Minha toalha de banho e sabonete,
Meu isso, meu aquilo.
Desde a cabeça ao bico dos sapatos,
São mensagens,
Letras falantes,
Gritos visuais,
Ordens de uso, abuso, reincidências.
Costume, hábito, premência,
Indispensabilidade,
E fazem de mim homem-anúncio itinerante,
Escravo da matéria anunciada.
Estou, estou na moda.
É duro andar na moda, ainda que a moda
Seja negar minha identidade,
Trocá-lo por mil, açambarcando
Todas as marcas registradas,
Todos os logotipos do mercado.
Com que inocência demito-me de ser
Eu que antes era e me sabia
Tão diverso de outros, tão mim mesmo,
Ser pensante sentinte e solitário
Com outros seres diversos e conscientes
De sua humana, invencível condição.
Agora sou anúncio
Ora vulgar ora bizarro.
Em língua nacional ou em qualquer língua
(Qualquer, principalmente.)
E nisto me comprazo, tiro glória
De minha anulação.
Não sou - vê lá - anúncio contratado.
Eu é que mimosamente pago
Para anunciar, para vender
Em bares festas praias pérgulas piscina,
E bem à vista exibo esta etiqueta
Global no corpo que desiste
De ser veste e sandália de uma essência
Tão viva, independente,
Que moda ou suborno algum a compromete.
Onde terei jogado fora
Meu gosto e capacidade de escolher,
Minhas idiossincrasias tão pessoais,
Tão minhas que no rosto se espelhavam
E cada gesto, cada olhar,
Cada vinco da roupa
Sou gravado de forma universal,
Saio da estamparia, não de casa,
Da vitrine me tiram, recolocam,
Objeto pulsante, mas objeto
Que se oferece como signo de outros
Objetos estáticos, tarifados.
Por me ostentar assim, tão orgulhoso
De ser não eu, mar artigo industrial,
Peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem.
Meu nome novo é Coisa.
Eu sou a Coisa, coisamente (ANDRADE,
1971).
31
Esse poema foi escolhido para esta análise, por causa de sua proximidade
aos estudos de Bakhtin, visto que o pensador russo para realizar um estudo
concreto sobre a linguagem apontava a necessidade de se observar “o papel
produtivo e a natureza social da enunciação” (BAKHTIN, 1992, p. 27), portanto, o
ponto de partida será a questão da enunciação. Assim:
A enunciação enquanto tal é um puro produto da interação social, quer se trate de um ato de fala determinado pela situação imediata ou pelo contexto mais amplo que constitui o conjunto das condições de vida de uma determinada comunidade linguística (BAKHTIN, 1992, p. 121).
Veja, a palavra é descrita por Bakhtin em Marxismo e Filosofia da Linguagem
como neutra, não comportando nenhuma significação ou valor semiótico, pois
quando a palavra absorve valor ou significado, já não é mais uma palavra e sim um
enunciado. Em Estética da Criação Verbal, o autor vai mostrar que existem
enunciados concretos e únicos, primários e secundários, e que “cada esfera de
utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo
isso que denominamos gêneros do discurso.” (BAKHTIN, 2000, p. 279). O fato que
diferencia um enunciado (gênero de discurso) primário de um secundário, além de
um ser simples e o outro complexo, é que os enunciados secundários aparecem em
decorrência da comunicação cultural, na forma de romance, de discurso científico
e/ou ideológico e etc., enquanto os primários podem ser vistos como o diálogo
cotidiano, a conversa simples sobre os fatos corriqueiros do dia-a-dia. Para fixar
melhor:
Em cada época de seu desenvolvimento, a língua escrita é marcada pelos gêneros do discurso e não só pelos gêneros secundários (literários, científicos, ideológicos), mas também pelos gêneros primários (os tipos do diálogo oral: linguagem das reuniões sociais, dos círculos, linguagem familiar, cotidiana, linguagem sociopolítica, filosófica, etc.) (BAKHTIN, 2000, p. 285).
Os gêneros primários (enunciados) quando entram no quadro dos
secundários, perdem sua característica particular, pois não pertencem mais à
realidade da qual foram originados, agora eles pertencem à realidade dos
“enunciados alheios”, ou seja, no ato de comunicação social, um enunciado se
transforma em outros enunciados (primários ou secundários).
Nessa interação, há duas particularidades do enunciado, uma, o seu
acabamento específico, e a outra, a alternância dos sujeitos falantes. Essas
32
particularidades, vistas como critérios de acabamento do enunciado, propiciam a
possibilidade de resposta. Veja, “o primeiro e mais importante dos critérios de
acabamento do enunciado é a possibilidade de responder” (BAKHTIN, 2000, p. 299).
A possibilidade de resposta está ligada ao enunciado em três fatores essenciais, que
são eles: a- “o tratamento exaustivo do objeto do sentido”; b- “o intuito, o querer-
dizer do locutor”; c- “as formas típicas de estruturação do gênero do acabamento.”.
Esses fatores, todos interligados no todo do enunciado, vão determinar as
especificidades de cada esfera da comunicação verbal.
A especificidade do poema Eu, Etiqueta mostra que ele é um enunciado e que
é complexo e secundário. E como enunciado, está voltado e dirigido para alguém – o
leitor. Todo ato de comunicação social está voltado para um propósito. Assim, pode-
se admitir:
O enunciado está voltado não só para o seu objeto, mas também para o discurso do outro acerca desse objeto. A mais leve alusão ao enunciado do outro confere à fala um aspecto dialógico que nenhum tema constituído puramente pelo objeto poderia conferir-lhe (BAKHTIN, 2000, p. 320).
Toda relação dialógica transporta certas ideologias, pois todo enunciado ao
conter signos é um agente ideológico. Portanto, “tudo que é ideológico possui um
significado e remete a algo situado fora de si mesmo. Em outros termos, tudo que é
ideológico é um signo. Sem signos não existe ideologia.” (BAKHTIN, 1992, p. 31).
Esse poema, além de relatar questões ideológicas de dominação, também reflete as
questões ideológicas de dominados. Não há somente ideologia a favor de quem
domina, mas também há ideologia de quem é dominado.
Dessa forma, todo produto de consumo pode ser transformado em signo, e
todo signo é criado para atender uma função ideológica. Como função ideológica se
entenderá: a política, a científica, a religiosa, e outras do mesmo suporte. Mas, há a
comunicação na vida cotidiana, que Bakhtin atribuía um grande valor, segundo ele
“ela está diretamente vinculada aos processos de produção e, por outro lado, diz
respeito às esferas das diversas ideologias especializadas e formalizadas.”
(BAKHTIN, 1992, p. 37). Assim, nota-se que as funções ideológicas3 transitam entre
as classes sociais.
3 Uma abordagem mais específica da ideologia será discutida no item formações ideológicas e formações discursivas.
33
Dessa forma, pode-se salientar que a linguagem desse poema, utilizado na
publicidade midiática como um meio pelo qual o ser humano pode entrar em contato
com um universo totalmente abstrato e idealizado, capaz de convencer e nortear os
seus desejos mais recônditos e suas artimanhas encantadoras de persuasão, não
pode deixar de ser analisada sob o ponto de vista crítico e ideológico. Referindo-se a
esse tipo de linguagem, a publicidade elabora um discurso, uma linguagem que
sustenta uma argumentação icônico-linguística com fins de convencimento
consciente ou inconsciente do público-alvo.
Podemos dizer que o discurso publicitário se caracteriza como um promotor
de pesquisas e de avanços científicos. Ele sempre esteve presente em todos os
níveis de entendimento humano e a serviço de interesses revelados ou não
revelados. Ele cumpre com muita eficiência os seus objetivos propostos, é utilizado
para testar ideias e produtos ou provocar ações, e tem se tornado um poderoso
mecanismo de dominação desde as mais remotas origens da humanidade.
Afirmamos que o mesmo funciona como um estímulo motivador para
sensibilizar e condicionar psicologicamente os desejos do indivíduo, criando uma
necessidade, através da repetição e da visualização, principalmente no campo dos
conceitos e das imagens, interferindo no comportamento individual e coletivo,
porque possui uma finalidade utilitarista que o aliena plenamente.
O discurso publicitário se torna algo natural e simples, presente na vida social
e individual dos sujeitos, por meio de uma linguagem simbólica carregada de força e
de poder. Dessa maneira, as respostas provocadas pela linguagem simbólica no
ser humano podem induzir a diferentes sentidos, observados em todas as culturas e
comunidades, desde grupos mais primitivos até as sociedades mais complexas.
A linguagem visual ou escrita de acordo com o gênero sempre provocará uma ação
e uma reação. Contudo, há um acordo tácito, um contrato entre produtores e
consumidores. E nesse sentido, a linguagem significa uma aproximação entre a
realidade e uma “liberdade” mesmo que fictícia e ilusória.
As mudanças, em textos midiáticos, objetivam a atrair e/ou atender exigências
de audiências seletivas que, muitas vezes não suportam o “novo”, com sabor de
ineditismo, mas também não suportam o “velho”, totalmente velho, sem maquilagens
ou nova roupagem. Essa exigência conecta-se, com certeza, ao fato de os discursos
midiáticos serem barômetros sensíveis às trocas culturais que manifestam na sua
heterogeneidade a desordem da natureza das trocas.
34
Sendo assim, de acordo com esse poema, pode-se dizer que conhecer os
aspectos que dizem respeito aos discursos publicitários, os quais são “apreciação
valorativa do agente produtor a respeito do tema dos destinatários, das relações
sociais, institucionais e interpessoais da parceria locutor-interlocutor na instância
social” proporciona aos sujeitos estarem aptos a discutir sobre os problemas sociais
diversos, através de exposições e argumentações ampliando os seus saberes, não
se alienando ou se deixando manipular pelos mais diferentes meios de
comunicação, traduzindo os mais diferentes objetos para que haja uma interação
social do sujeito com o seu meio a fim de transformá-lo.
Com isso, ao se Levar em consideração tudo que foi abordado até aqui,
constata-se que Drummond nos mostra a perda de identidade do consumidor
“Em minha calça está grudado um nome que não é meu de batismo, ou de cartório”,
identidade essa que o discurso publicitário faz questão de alterar, pois o produto
passa a ter mais valor do que o próprio consumidor. Observa-se ainda que a marca
tem uma força persuasiva. Ela faz com que o consumidor se torne um “homem-
anúncio itinerante”, uma vez que todos os objetos pessoais trazem a etiqueta de
alguma marca, seja bebida, cigarro, tênis, meia, sapato, relógio ou chaveiro. O autor
ainda enfatiza a personificação da publicidade “são mensagens, letras falantes,
gritos visuais, ordens de uso, abuso, reincidências”. Dessa forma, esse texto
corrobora a visão posta pela Teoria Marxista da Alienação do produto sobre o
consumidor.
O consumidor, além de perder sua identidade, torna-se escravo desse
produto. Além disso, esse consumidor ainda ressalta que é duro andar na moda, já
que para isso tem de negar sua identidade, “É duro anda na moda, ainda que a
moda seja negar minha identidade, trocá-la por mil [...] todas as marcas registradas,
todos os logotipos do mercado”. O autor mostra também um paralelo temporal do
que era antes e do que é agora, a presença do dêitico “agora” retrata esse paralelo.
O personagem diz ainda que não é “anúncio contratado”, pois é ele quem
paga para anunciar e para vender.
Existe outro ponto a se destacar nesse texto em relação a sua construção
argumentativa, pois o autor constrói um ethos do consumidor em questão.
Esse consumidor é alguém que perdeu sua identidade, seus valores
pessoais, passando agora a ser uma publicidade itinerante devido ao uso de
produto, que põe em evidência não os seus valores pessoais, mas a marca do
35
produto, o valor das etiquetas. Assim, esse consumidor demonstra um ethos de um
consumismo obsessivo, capaz de perder todos os seus valores, em prol de uma
marca, de uma etiqueta. No entanto, ele tem a noção dessa negação de identidade,
pois chega a solicitar a mudança de seu nome, e agora sente orgulho, não de ser
ele mesmo, mas agora de ser um “artigo industrial”, “Eu sou a Coisa, coisamente”.
Verifica-se, portanto, que, a partir de uma integração desses pressupostos, e
de outros que se fizerem necessários na elaboração do quadro de referência teórico-
metodológica a ser utilizado na condução da pesquisa aqui sugerida, almejamos
trilhar na verificação da seguinte hipótese:
É possível identificar fatores interdiscursivo-argu mentativos
responsáveis pela linguagem persuasiva da publicida de, através de uma
análise interdiscursivo-argumentativa em peças publ icitárias.
Portanto, este trabalho visa a desenvolver, no discurso midiático, os fatores
dialógicos, linguísticos e subjetivos presentes na linguagem publicitária.
2.2 Justificativa
O estudo do discurso midiático é de grande relevância para o
desenvolvimento dos estudos discursivos, visto que essa prática dialógica está
fundamentada na construção da argumentação e essas discussões são essenciais
nos debates acadêmicos e no cotidiano da sala de aula.
A proposta de trabalho apresenta relevância científica, considerando essa
visão dialógica da linguagem, como recurso interdiscursivo e intertextual em que se
realiza uma análise interdiscursivo-argumentativa do gênero publicidade,
destacando os fatores de argumentação responsáveis pela interação e persuasão.
Sendo assim, esta pesquisa almeja colaborar com esse aspecto,
realizando uma análise interdiscursivo-argumentativa da linguagem publicitária.
2.3 Objeto de estudo e objetivos
O objeto de estudo apresenta uma análise interdiscursivo-argumentativa do
gênero publicidade, a observar a Enunciação e os processos discursivos entendidos
como uma modalidade da linguagem iconográfica, que se caracteriza como uma
prática discursiva e ideológica.
36
Além disso, esta pesquisa apresenta os principais aspectos que compõem o
universo de definição do discurso midiático, reconhecendo a sua historicidade e
determinando a sua condição de signo ideológico, portadora de uma discursividade
persuasiva.
Portanto, situando minha investigação no cenário teórico até aqui delineado,
pretendo:
a. revisitar categorias conceituais construtivas dos discursos sociais nas
obras de Bakhtin, Maingueneau e Charaudeau, bem como de outros
autores contemporâneos;
b. estabelecer uma correlação entre parâmetros da argumentação clássica e
da Nova Retórica, bem como de conceitos derivados dessas duas
abordagens;
c. identificar e explicitar, a partir de texto do corpus, a presença da
interdiscursividade e da argumentação no gênero publicidade;
d. analisar peças do discurso publicitário à luz desse quadro teórico e da
hipótese de trabalho adotado.
2.4 Metodologia
A presente investigação busca a compreensão do discurso midiático, nesse
caso, o publicitário, como recurso dialógico, para uma análise interdiscursivo-
argumentativa.
2.4.1 Corpus
O corpus desta pesquisa é constituído por textos verbais e não-verbais,
oriundos do campo de atividade humana da publicidade.
2.4.2 Procedimentos
A análise textual será realizada a partir das abordagens da Análise do
Discurso, com ênfase na Teoria na Argumentação e na Interdiscursividade, com o
intuito de detectar esses fatores na linguagem publicitária. Para realizar essa
análise, adotamos os seguintes procedimentos:
37
a) revisão da bibliografia pertinente à proposta de análise e o recorte de
categorias mais relevantes;
b) montagem de quadro teórico reunindo as categorias de análise
selecionadas;
c) montagem de um corpus reunindo publicidades que evidenciassem
fenômenos discursivos nos planos da argumentação e da
interdiscursividade;
d) análise das peças publicitárias em função de categorias do quadro teórico;
e) seleção de peças analisadas para compor a dissertação.
38
3 ANÁLISE DO DISCURSO – ESBOÇO HISTÓRICO
A corrente estruturalista, abordagem baseada no estudo da estrutura da
língua, foi predominante nas primeiras décadas do século XX. Nesse período,
grandes escritores como Leonard Bloomfield, Saussure tinham como objeto de
estudo não a fala no seu conceito histórico, mas a língua – a gramática como
verdadeira fonte de estudo. Nesse ínterim, surgem os Círculos Linguísticos (Moscou,
Praga, Copenhague e Viena) cada um com os seus objetos de estudo definidos.
Assim, em razão de objeções ao conceito de linguagem do Estruturalismo,
surgem as ideias de Chomsky com a implantação do Gerativismo, um conjunto
infinito de sentenças e um falante ideal; descrever a competência do falante. Para o
gerativista, a gramática é ao mesmo tempo um modelo psicológico da atividade do
falante e uma máquina que produz frases. Dessa forma, os avanços do
conhecimento linguístico propiciaram o desenvolvimento de abordagens pragmáticas
mais específicas, a linguagem como ação e interatividade. Nesse caso, existe um
estudo das relações entre os signos e seus usuários. Além disso, a Pragmática pode
ser de valor referencial e de relação de interlocução com outro usuário em uma
situação de comunicação, ou diálogo. Pode-se, por essa razão, salientar que essa
linha de estudo está contemplada pela Análise Conversacional (o significado existe
em função da intenção do locutor e do reconhecimento dessa intenção); pelos Atos
de Fala (a linguagem não é usada para informar, mas para realizar vários tipos de
ação) e pela Teoria da Enunciação em Bakhtin (relação de interlocução que está o
fundamento linguístico da subjetividade). O território da língua é lugar de disputa e
conflitos, da relação entre o sujeito e a sociedade. Por fim, surge a Análise do
Discurso, esta disciplina surgiu como meta não mais o estudo da língua isolada,
mas, a fala no seu contexto social, a linguagem em funcionamento. “Atrás da
fachada visível do sistema, supomos a rica incerteza da desordem” (FOUCAULT,
2003, p. 85). Foi nesse contexto, que a Análise do Discurso ganhou força em suas
pesquisas, a linguagem não deve se basear simplesmente na gramática, em fatos
isolados, mas na totalidade de seus enunciados. No ano de 1960, Michel Pêcheux
lança o livro Análise automática do Discurso, o livro relata os estudos em evidência
no momento. “Pela primeira vez na história, a totalidade dos enunciados de uma
sociedade, apreendida na multiplicidade de seus gêneros, é convocada a se tornar
objeto de estudo” (CHARAUDEAU, 2004, p. 46).
39
É com essa visão, fundamentada nessas teorias, de acordo com alguns
autores, que a Análise do Discurso passará a ter suas ramificações. Sendo assim,
Benveniste, ao falar sobre abordagens discursivas, mostra, de certa forma, uma
oposição com a teoria de Bakhtin, o autor afirma, sem desconsiderar as ideias
estruturalistas, que tais abordagens têm como objeto de estudo não o texto, a
linguagem, mas o sujeito em si. É no sujeito e pelo sujeito que vamos encontrar a
marca de exterioridade nos enunciados, é esse sujeito personagem dito como
secundário na perspectiva saussuriana que vai possuir as características de
subjetividade. Assim, fundamenta-se uma das abordagens mais relevantes de
Benveniste, que é intitulada a Subjetividade Discursiva.
Dessa maneira, para Bakhtin a ideia de subjetividade não está centrada no
sujeito, mas no texto, é no texto que vamos encontrar a marca de subjetividade, é
nele que o entrecruzar de vozes se encontra, evidenciando, assim, o seu contexto,
sociocultural.
Inicialmente, podemos afirmar que discurso, tomado como objeto da Análise do Discurso, não é a língua, nem texto, nem a fala, mas que necessita de elementos linguísticos para ter uma existência material. Com isso, dizemos que discurso implica uma exterioridade à língua, encontra-se no social e envolve questões de natureza não estritamente linguística. Referimo-nos a aspectos sociais e ideológicos impregnados nas palavras quando elas são pronunciadas (FERNANDES, 2005, p. 20).
É interessante notar que o referido autor descreve o discurso como algo não
limitado à fala e à língua, todavia o discurso se caracteriza pelo seu conteúdo
extralinguístico, sendo formado por todo um conjunto de aspetos sociais e
ideológicos. Todo esse processo está centralizado na enunciação, como forma de
sua concretização. Em razão desses fatos, vamos apresentar alguns conceitos que
julgamos fundamentais para a compreensão do discurso.
3.1 Condições de produção do discurso
Ao analisar as abordagens teóricas do discurso, notar-se-á que existem várias
teorias que se correlacionam em relação ao fator sociolinguístico, às variações
sociológicas, ao lugar social do emissor, ao destinatário, e à situação de
comunicação, o que importa não é o que já foi dito ou pronunciado, mas o que está
40
sendo escrito ou falado no momento do discurso. Nesse caso, vejamos o que afirma
Pêcheux sobre essa discussão:
Ele contribui no fato de ver nos protagonistas do discurso não a presença física de organismos humanos individuais, mas a representação de lugares determinados na estrutura de uma formação social, lugares cujo feixe de traços objetivos característicos pode ser descritos pela sociologia (PÊCHEUX apud BRANDÃO, 1998, p. 44).
Assim para Pêcheux (1990), o discurso é um feixe de traços imaginários que
se estabelecem e se concretizam através do emissor, é a imagem que ele faz de si e
do outro. Entretanto, para Courtine a teoria esboçada pelo autor, não exclui a
questão psicossociológica, a caracterização do processo da enunciação não é
formada pelo o todo, mas pelas partes que formam esse todo em determinado grupo
social. O discurso é algo individual, o contexto histórico não se aplica a determinada
situação.
Coutrine propõe uma definição de CP que não seja atraída por essa operação psicologizante das determinações históricas do discurso, fazendo-as transformar em simples circunstância em que interagem os sujeitos do discurso, que passam a constituir a fonte de relação discursiva das quais, na verdade, não são, senão o portador ou o efeito (COUTRINE apud BRANDÃO, 1998, p.44).
Portanto, nesta pesquisa, defender-se-á uma postura enunciativo-interacional
do uso da linguagem, demonstrando uma aproximação entre a visão subjetiva dos
processos enunciativos e sob uma perspectiva interacional. Isso ocorre devido a
considerarmos que a enunciação se complementa com o fenômeno da interação dos
sujeitos que realizam um ato de linguagem.
3.2 Conceito de ideologia
Partindo do princípio do conceito de Marx e Engels, a ideologia consiste na
formação de ideias de determinado grupo no seu respectivo contexto social. Essas
ideias formadas por determinado grupo não significa dizer a realidade vivida desta
mesma sociedade. O que vai representar na verdade, é o modo como essa
realidade lhes parece na experiência imediata. Vejamos o que diz Chauí (1985):
41
A ideologia resulta de uma prática social, ela nasce da atividade social dos homens no momento em que estes procuram representar essa atividade para si mesma. A ideologia se apresenta de forma invertida, se considerar que cada classe social deveria apresentar o seu próprio modo de existência de acordo com as experiências vividas no interior das relações sociais de produção (CHAUÍ, 1985, p. 89).
Marx (1980, p. 103) afirma ainda que a classe dominante de uma época,
portanto historicamente definida, faz de suas ideias as ideias de toda a sociedade.
A ideologia, nesse sentido, passa a ser o processo pelo qual as ideias da classe
dominante tornam-se as ideias de toda a sociedade, de todas as classes sociais,
enfim se tornam as ideias dominantes.
As ideias da classe dominante são, em cada época, as ideias dominantes, isto é, a classe que é a força material dominante da sociedade é, ao mesmo tempo, sua força espiritual. (...) Na medida em que dominam como classe e determinam todo o âmbito de uma época histórica, é evidentemente que o façam em toda a sua extensão e, consequentemente, entre outras coisas, dominem também como pensadores, como produtores de ideias; que regulem a produção e distribuição de ideias de seu tempo e que suas ideias sejam por isso mesmo, as ideias dominantes da época (MARX & ENGELS, 1980, p. 14).
Ao se reconhecer, então, que a ideologia é a expressão das ideias de uma
determinada classe, o discurso midiático, nesse contexto, é entendido como uma
dessas práticas discursivas e ganha força como revelador de ideias e expressão
ideológica de determinada posição. E, nesse sentido, esse discurso cumpre uma
função social de mobilização do leitor para o conhecimento de um fato ou situação
de interesse coletivo, numa perspectiva ideológica, de tal modo que se torna uma
eficiente estratégica persuasiva.
Sendo assim, pode-se dizer que quem desenvolve essa questão com grande
propriedade é Mikhail Bakhtin. Para ele, todo signo é ideológico, caracterizado como
uma realidade ideológica, que tem sua materialidade e que se constrói no ambiente
social da comunicação, pela interação verbal. O discurso midiático como a
publicidade especifica bem tudo isso. Cada publicidade tem o seu diferencial e
objetivo. Esse objetivo é dito como o alvo, a causa para toda discussão.
Por exemplo, a publicidade eleitoral busca a obtenção de votos através de uma boa
imagem do candidato, a publicidade de um produto tem como meta buscar o
crescimento de vendas e posteriormente a compra do produto. A publicidade
ideológica busca o cruzamento ou qualquer outra interligação, através da religião,
política, economia e social, em função de conquistar adeptos influenciando, assim, o
42
pensamento desse espectador. A maneira utilizada para alcançar os objetivos é a
constituição de um fato real. Porém, a forma como é transmitido esse fato é que
induz o espectador a ser adepto à ideologia dessa publicidade. Esse entendimento
sobre ideologia será um dos pontos relevantes em nossa pesquisa no capítulo
destinado às análises discursivas dialógicas na construção da argumentação.
3.3 Formações discursivas e formações ideológicas
Podemos afirmar que existe uma ligação entre a linguagem e a ideologia.
Nesse caso, a formação ideológica deve ser entendida como a visão de mundo de
uma determinada classe social, isto é, o conjunto de representações e ideias que
uma determinada classe tem do mundo. Essa visão de mundo não existe
desvinculada da linguagem, já que nesta estruturamos o conhecimento do mundo.
Assim, valemo-nos da linguagem para ordenar nossos pensamentos. É com ela que
organizamos nosso agir sobre o mundo.
De acordo com Pêcheux (1997), a formação discursiva está, a princípio,
intimamente relacionada com a noção de formação ideológica. Para esse autor,
A formação discursiva é aquilo que, em uma formação ideológica dada, isto é, a partir de uma posição dada em uma conjuntura dada, determinada pelo estado da luta de classes, determina "o que pode e o que deve ser dito" (articulado sob a forma de uma alocução, de um sermão, de um panfleto, de uma exposição, de um programa, etc.) (PÊCHEUX, 1997a, p. 160).
Sendo assim, Pêcheux sugere que a ideologia é materializada por meio dos
discursos e articulada por sujeitos. Isso pode ser corroborado com a seguinte
passagem: "Só há ideologia pelo sujeito e para sujeitos". (PÊCHEUX, 1997a.
p. 149). Nesse sentido é que o autor pôde formular a ideia de que o sujeito é
interpelado pela ideologia que o constitui, ou seja, o assujeitamento; mostrando que,
ao enunciar, todo sujeito fala a partir de uma formação discursiva e, assim, marca
uma posição de sujeito. Dessa maneira, esse posicionamento acaba por constituir
no sujeito uma identidade enunciativa. Logo, não se deve compreender essa
identidade que o sujeito mantém com a formação discursiva de maneira estável,
cristalizada. Nesse caso, isso fica evidente quando Pêcheux, ao rever a trajetória da
Análise do Discurso, observa que no seu segundo momento, ou seja, a Análise do
Discurso dois, uma formação discursiva não é um espaço estrutural fechado, uma
43
vez que é constitutivamente "invadida" por elementos que vêm de outro lugar que se
repetem nela, fornecendo-lhe suas evidências discursivas fundamentais.
Portanto, é nesse aporte que se instaura a noção de interdiscurso; é ele que
possibilita ao sujeito concretizar o seu discurso; marca a exterioridade, o lugar
anterior determinante do próprio discurso. Assim, essa reflexão traz a ideia de que o
sujeito não somente materializa a ideologia como também é aquele responsável por
agenciar os sentidos. No entanto, esse agenciamento não decorre da pura
transparência da linguagem. O que ocorre é que a ideologia cria a ilusão no sujeito
de que ele é a fonte do seu dizer, origem do sentido.
Logo, Pêcheux afirma:
[...] o sentido de uma palavra, de uma expressão, de uma proposição, etc., não existe "em si mesmo" [...] mas, ao contrário, é determinado pelas posições ideológicas que estão em jogo no processo sócio-histórico no qual as palavras, expressões e proposições são produzidas (isto é, reproduzidas) (PÊCHEUX, 1997a, p. 160).
Nesse caso, há muitos discursos socialmente engajados que estão inseridos
nessa reflexão, mas existem outras dimensões para significação linguística que
representam um caráter menos determinado pelas posições ideológicas, como é o
caso de conversas cotidianas.
Já a noção de formação discursiva em Michel Foucault é um pouco distinta
daquela proposta por Pêcheux. Aquele apresenta seu conceito em "Archéologie des
Sciences", nos "Cahiers pour l" “Analyse" nº 9, em 1968, como resposta às críticas
do Círculo Epistemológicas feitas em relação aos conceitos e métodos utilizados por
Foucault em suas obras anteriores. Mais tarde, em 1969, ele abordará a formação
discursiva em "A Arqueologia do Saber". Para Foucault, existe uma a relação entre
enunciados, ou seja, os enunciados, diferentes em sua forma, dispersos no tempo,
formam um conjunto quando se referem a um único e mesmo objeto. Sendo assim,
essa ideia está vinculada aos conceitos de dispersão e descontinuidade
apresentada por Foucault já no início de "A Arqueologia do Saber". Significa dizer
que os objetos de análise, as temáticas estão dispersas no tempo e no espaço.
Decorre daí o desconforto que este filósofo causou na História
tradicionalmente contada, visto que esta está pautada na linearidade dos fatos, na
tentativa de estudá-los com a objetividade dos pensadores positivistas. Por isso,
Foucault argumenta, “A questão é saber se a unidade de um discurso é feita pelo
44
espaço onde diversos objetos se perfilam e continuamente se transformam, e não
pela permanência e singularidade de um objeto”. (FOUCAULT, 2004, p. 37).
O autor ainda se refere à forma e ao tipo de encadeamento entre enunciados.
Nesse sentido, Foucault encontra o estilo como um caráter permanente da
enunciação. Ele cita a Medicina como exemplo, observando que ela possui um
"corpus de conhecimentos que supunha uma mesma visão das coisas" (Op. cit.,
p. 38) e que, no entanto, suas descrições não param de se deslocar. Isso faz com
que, segundo Foucault, a posição de sujeito observante muda as relações com o
paciente a partir de técnicas laboratoriais, as análises e instrumentos que estão em
constante transformação. Segue assim a noção de dispersão e regularidade, seria
preciso caracterizar e individualizar a coexistência desses enunciados dispersos e
heterogêneos, o sistema que rege sua repartição, como se apoiam uns nos outros, a
maneira pela qual se supõem ou se excluem, a transformação que sofre, o jogo de
seu revezamento, de sua posição e de sua substituição.
Nesse sentido, procurando descrever sistemas de dispersão que Foucault
apresenta o seu conceito de formação discursiva:
Num caso em que se puder descrever, entre certo número de enunciados, semelhante sistema de dispersão, e no caso em que entre os objetos, os tipos de enunciação, os conceitos, as escolhas temáticas, se puder definir uma regularidade (uma ordem, correlações, posições e funcionamentos, transformações), diremos, por convenção, que se trata de uma formação discursiva [...] (FOUCAULT, 2004, p. 43).
Diante dessas considerações, pode-se vincular o conceito de formação
discursiva às instâncias do poder. Essa ideia será desenvolvida por Foucault em
"A Ordem do Discurso" (2003). Para tanto, segue-se a ideia do filósofo,
A formação regular do discurso pode integrar, sob certas condições e até certo ponto, os procedimentos do controle (é o que se passa, por exemplo, quando uma disciplina toma forma e estatuto de discurso científico) e, inversamente, as figuras do controle podem tomar corpo no interior de uma formação discursiva (FOUCAULT, 2003, p. 66).
Ao percorrer a trajetória de M. Pêcheux e M. Foucault no que diz respeito às
formações discursivas e ideológicas, pôde-se perceber alguns pontos de divergência
e de aproximação no conceito de ambos. Uma primeira sugestão é ver que a noção
foucaultiana afasta-se da ideologia pecheutiana. Observa-se que Foucault procura
fundamentar a sua formação discursiva como o campo das "regularidades
45
discursivas"; ele quer descrever as relações entre enunciados, além de questionar
como estes podem fazer parte da mesma "ordem de discurso".
Outra ideia que parece pertinente é perceber uma convergência na ideia de
interdiscurso. Enquanto Pêcheux argumenta que uma formação discursiva pode ser
atravessada por elementos que vêm de outras formações discursivas - o que
significa dizer que ela é constituída por "discursos transversos" -, Foucault assevera
que os enunciados estão dispersos no tempo e no espaço e que é preciso, por meio
da análise, estabelecer os nexos entre eles. Assim, a formação discursiva, nos
termos foucaultianos, procura descrever "sistemas de dispersão". Paradoxalmente,
ele trabalha com a ideia de unidade e dispersão.
3.4 Subjetividade na linguagem
Segundo Benveniste, a subjetividade é entendida como “a capacidade do
locutor para se propor como sujeito”. (BENVENISTE, 2006, p. 288). Essa proposição
do locutor como sujeito tem como condição a linguagem.
Benveniste destaca que “[...] é na linguagem e pela linguagem que o homem
se constitui como sujeito; porque só a linguagem fundamenta na realidade, na sua
realidade que é a do ser”. (BENVENISTE, 2006, p. 289). Assim sendo, essa
propriedade da subjetividade é determinada pela pessoa e o seu status linguístico.
Além disso, para o referido autor, a subjetividade é encontrada também
através de pronomes e verbos no discurso, em que são definidas as pessoas do
próprio discurso.
Os pronomes pessoais constituem o primeiro ponto de apoio na relação de
subjetividade da linguagem – eu e tu – são protagonistas da enunciação, eu é
pessoa subjetiva tu pessoa não subjetiva, o ego é visto como o centro desse
discurso.
Portanto, é notório afirmar que o conceito de Benveniste tem sido bastante
criticado, porque o princípio dele vale para qualquer fala no que diz respeito à
questão da subjetividade. Já que para ele a subjetividade é um ato de um sujeito
assumir a fala. No âmbito desse trabalho o que interessa é uma subjetividade que
evidencia o trabalho do falante.
Dessa forma, a subjetividade é inerente a toda linguagem e sua constituição
se dá mesmo quando não se enuncia o eu. Nesse tipo de enunciação o sujeito se
46
enuncia de outro lugar, em outra perspectiva, anulando a sua responsabilidade.
Essa forma de mascaramento é característica da subjetividade.
Outro ponto que notamos em Benveniste é a contradição quando se coloca a
distinção entre dois modos de enunciação: a discursiva (marcas de subjetividade) e
a histórica (não subjetiva). Para ele, a enunciação discursiva tem as marcas de
subjetividade enquanto que a enunciação histórica não, como se não houvesse um
locutor, nesta, abole-se tudo que é estranho à narrativa dos acontecimentos que são
apresentados como se narrassem a si mesmo.
Portanto, pode-se dizer que, na concepção da Teoria da Enunciação, “cada
enunciação é um ato que serve o propósito direto de unir o ouvinte ao locutor por
algum laço de sentimento social ou de outro tipo”. (BENVENISTE, 2006, p.90).
Com isso, observamos que para esse contexto teórico, a linguagem é entendida
como um modo de ação e como recurso de agir sobre o outro na forma de
enunciação.
3.5 Dialogismo e polifonia
De acordo com o conceito abaixo, o diálogo pode ser resultante do
entrecruzar de várias vozes, elas podem ser evidenciadas dentro do texto como
podem ser mascaradas por apenas uma única voz. É nesse sentido que se abordará
a análise desses entrecruzares de vozes dentro do texto publicitário, que terá
características de textos polifônicos. Segundo Barros e Fiorin:
Os textos são dialógicos porque resultam do embate de muitas vozes sociais, podem, no entanto, produzir efeitos de polifonia, quando essas vozes ou algumas delas deixam-se escutar, ou de monofonia, quando o diálogo é mascarado e uma voz, apenas, faz-se ouvir (BARROS & FIORIN, 2003, p. 06).
Visto dessa maneira, notaremos também que o sentido polifônico (ostensivo
ou não) faz parte da para a formação de texto, sendo ele construído de acordo com
a posição sócio-histórica do sujeito enunciador e que os discursos se efetivam a
partir da relação que o texto mantém com quem o produz com quem lê e com outros
discursos possíveis. Com isso, pode-se analisar esse fenômeno polifônico, nos
textos publicitários no espaço entre o dito e o não-dito discursivamente, permitindo
através de uma memória histórico-discursiva construir outros sentidos no texto.
47
Nesse momento, entra-se em contato com uma das ideias fundamentais do
pensamento de Bakhtin (1992) que é a “dialogia”. Para Bakhtin, qualquer texto
verbal e não-verbal exposto por determinado autor só pode ser compreendido se
entendermos o seu conceito histórico social. Todo discurso vai consistir em um
diálogo, uma vez que não existem textos escritos isoladamente, o que existe é uma
cadeia intercalando-os. Esse diálogo não consiste em um diálogo estático,
indiferente às diferenças, mas consiste nas diversas formas como duas ou mais
vozes se inter-relacionam.
Logo, dois enunciadores, aparentemente diferentes, emitidos em tempo e
espaço diferenciado, quando confrontados em relação ao seu sentido, podem
revelar uma relação dialógica distinta. Nessa perspectiva, o texto publicitário,
constitui-se o elo pelo qual perpassam as vozes presentes no discurso de outros
textos.
Portanto, alguns autores como Maingueneau (2001) e Ducrot (2001) apud
Sandman (2001) atribuem a sua fidelidade a Bakhtin quando se refere à questão dos
textos polifônicos e ao dialogismo, que se constituem como princípio da linguagem e
do sentido dos enunciados.
Entretanto, para Ducrot sua fidelidade é menos forte quando se referem ao
inter-relacionamento do texto com a questão histórica. Ducrot contesta também, em
sua obra, a tese da unicidade do sujeito falante de Benveniste.
Para sua teoria da polifonia, o sujeito que produz o enunciado, aquele que diz
eu ou o que origina os atos ilocutórios não é obrigatoriamente o mesmo. Distingue,
além do falante empírico, locutores e enunciadores e afirma que um texto pode
contar com mais de um locutor ou com vários locutores (polifonia fraca) no discurso
indireto livre, na negação polêmica ou na ironia, variam os enunciadores. Nesse
caso, a polifonia atinge sua plenitude: as vozes que dialogam e polemizam trocam
de posições sociais. Esse conceito será de grande relevância para definirmos o
dialogismo que se delineia em nosso corpus.
Além disso, é imprescindível ressaltar ainda que, ao descrever e explicar as
estratégias linguísticas utilizadas pelo ser humano a fim de interagir socialmente,
Koch (2009) destaca algumas concepções de linguagem.
A primeira concepção, embora seja uma das mais antigas, ainda possui
defensores na atualidade. Esta defende que o homem representa para si o mundo
por meio da linguagem e, nessa ótica, a função da língua é representar, ou seja,
48
refletir seu pensamento e conhecimento de mundo. A língua vista como um código
por meio do qual um emissor comunica a um receptor determinadas mensagens,
constituía a essência da segunda concepção.
Nesse caso, a principal função refere-se à transmissão de informação.
Na terceira concepção, a linguagem é concebida como atividade, forma de ação
interindividual com finalidade orientada.
Isso significa que o lugar de interação propicia aos membros de uma
sociedade a prática de atos variados que, certamente, irão exigir reações e/ou
comportamentos firmados através de vínculos e compromissos até então
inexistentes.
Assim, a interação se processa de forma diversificada conforme a modalidade
de uso da língua. Por exemplo, na língua escrita, o emissor não fica em intercâmbio
direto com o receptor e, por essa razão, a explicitação dos elementos envolvidos é
de fundamental importância para o entendimento da mensagem e o contexto
situacional e os dados dominados por falante e ouvinte possibilitam a seleção das
informações subentendidas.
No entanto, para que a mensagem seja entendida, necessário se faz que o
interlocutor encontre-se ligado na situação, a fim de decodificar possíveis gestos e
expressões faciais daquele(s) que fala(m).
Alguns textos exigem inferências por parte de quem ouve ou lê, uma vez que
o seu conteúdo ultrapassa a esfera da simples significação das palavras, exigindo
uma contextualização mais ampla e com dados de conhecimento restrito a um grupo
social, a uma comunidade específica e momento histórico.
Portanto, para se fazer as inferências indispensáveis, é preciso o domínio das
referências culturais, contextuais ou situacionais dos textos.
Ressalta-se, dessa forma, que nossa pesquisa visa a trabalhar com essa
terceira concepção, enfatizando toda a ação e interação que a linguagem publicitária
contém.
3.6 As Cenas enunciativas
Um texto, quando associado a suas condições enunciativas, apresenta várias
características que evidenciam suas intenções e interlocutores.
49
Segundo Maingueneau (2001), qualquer discurso, por sua própria natureza,
tem o objetivo de convencer, e o faz instituindo a cena de enunciação que o torna
legítimo e que são integrados por três cenas as quais ele classifica de cena
englobante que corresponde ao campo discursivo (publicitário, religioso, político,
ecológico, etc.); cena genérica, que diz respeito aos gêneros ou subgêneros do
discurso (o sermão, o editorial etc.); e cenografia, que é a enunciação construída
pelo próprio texto.
Essa cenografia, segundo ele, ao mesmo tempo em que é fonte do discurso é
aquilo que ele engendra.
Com isso, a cenografia de um texto caracteriza-se por definir as condições de
um enunciador, de um coenunciador, a topografia e a cronografia. Esse enunciador
e coenunciador correspondem ao eu e ao tu, determinados no texto e identificados
pelas representações textuais.
Assim, da mesma forma que o enunciador e o coenunciador são
representações edificadas pela enunciação, a topografia e a cronografia também
são representações de um espaço e de um tempo validados pelo texto.
Mais à frente, ao realizarmos as análises interdiscursivo-argumentativas das
peças publicitárias, retomaremos essa discursão.
3.7 Os Gêneros discursivos
A noção de gênero envolve muita complexidade, e tem sido objeto de análise
desde a época da Grécia Antiga até os dias atuais, gerando, ao longo do tempo,
diferentes abordagens, advindas de diferentes perspectivas teóricas, na tentativa de
desvendar esse fenômeno tão fundamental para os estudos da linguagem.
Para desenvolver essas propostas de classificação, uma multiplicidade de
critérios-textuais, pragmáticos, linguísticos etc. foi estabelecida. No entanto, esses
critérios não dão conta das particularidades dos gêneros, gerando divergências até
mesmo no diz respeito à terminologia, o que podemos constatar pelo uso das
seguintes denominações para esse mesmo fenômeno linguístico: gêneros
discursivos.
Durante um longo período, os gêneros foram caracterizados a partir de suas
regularidades textuais de forma e conteúdo. Tal categorizacão esteve fundamentada
50
em critérios rigorosos de base linguística, em que se considerava, apenas, como
objeto de análise, textos materializados na sua forma composicional escrita.
Machado (2005, p. 151) apresenta uma síntese dessa base teórica clássica,
que ainda hoje direciona os estudos “de tudo o que se entende como gênero”,
focalizando a contribuição de Aristóteles:
Para a clássica teoria dos gêneros, a definição das formas poéticas se manifestava em termos de classificação. A obra de Aristóteles é muito clara nesse sentido. Em sua Poética, classifica os gêneros como obras da voz tomando como critério o modo de representação mimética. Poesia de primeira voz é representação da lírica; a poesia de segunda voz, da épica, e a poesia de terceira voz, do drama. Trata-se de uma classificação paradigmática e hierárquica, facilitada pela observação das formas no interior de um único meio: a voz (MACHADO, 2005, p. 151).
A proposta aristotélica de classificação dos gêneros se constituiu no campo
da Poética e da Retórica, e consagrou-se na literatura; isso comprova o fato de que
a teoria dos gêneros tornou-se a base dos estudos literários, desenvolvidos através
da cultura letrada. No entanto, a classificação de Aristóteles fundamentou-se em
outra proposta apresentada anteriormente por Platão. Sobre tal classificação,
Machado (2005, p. 152) explica que:
Antes de Aristóteles, Platão havia proposto uma classificação binária, cujas esferas eram domínios precisos de obras representativas de juízos de valor. Ao gênero sério pertencia a epopeia e a tragédia; ao burlesco, a comédia e a sátira. Já em A República, Platão elabora a tríade advinda das relações entre realidade e representação. Ao gênero mimético ou dramático pertencem a tragédia e a comédia; ao expositivo ou narrativo, o ditirambo, o nomo e poesia lírica; ao misto, a epopeia. A classificação triádica fundada na mimese é a base para a Poética de Aristóteles, em que a tragédia é tida como paradigma para o que ele chama de poesia (MACHADO, 2005, p. 152).
Com o decorrer do tempo, surgem outras tendências para investigar a
linguagem, e essas questões passam, enfim, a ser refletidas a partir de um prisma
mais abrangente, e a noção de gênero extrapola os liames literários e passa a
englobar as demais produções de texto.
Nesse contexto, é necessário destacar o estudo de Bakhtin (2000), que se
opondo radicalmente à categorização tradicional, centrada em princípios puramente
linguísticos (herança da Poética de Aristóteles), desenvolve uma proposta inovadora
para essa problemática: uma abordagem em que se considera o caráter
sociointeracionista dos fatos da linguagem. Tal abordagem enfoca a dimensão da
51
natureza do enunciado e a sua relação com as especificidades dos gêneros, que
são determinados pelas várias esferas de utilização da língua na sociedade. Essa
noção fica mais clara, quando Bakhtin (2000, p. 282) ressalta que:
Ignorar a natureza do enunciado e as particularidades de gênero que assinalam a variedade do discurso em qualquer área do estudo linguístico leva ao formalismo e à abstração, desvirtua a historicidade do estudo, enfraquece o vínculo existente entre a língua e a vida. A língua penetra na vida através dos enunciados concretos que a realizam, e é também através dos enunciados concretos que a vida penetra na língua (BAKHTIN, 2000, p. 282).
Embora inicialmente tenha partido da análise de obras literárias, Bakhtin
(2000), ao apresentar a sua Teoria dos Gêneros, defende a tese de que possuímos
um rico repertório de gêneros (portanto, não somente se constituem no espaço
literário), e destaca a sua extrema importância social. Conforme esse autor, seria
praticamente impossível haver comunicação verbal entre os homens, caso não
existissem os gêneros uma vez que “todas as esferas da atividade humana, por
mais variadas que sejam, estão sempre relacionadas com a utilização da língua”
(BAKHTIN, 2000, p. 302). E essa utilização é efetuada em forma de enunciados
(orais e escritos) que refletem as condições específicas e as finalidades da esfera
social à que pertencem (BAKHTIN, 2000, p. 279). Esta, por sua vez, elabora seus
tipos relativamente estáveis de enunciados, denominados de gêneros do discurso, e
por acontecerem em situações reais de comunicação, “podemos ignorar totalmente
a sua existência teórica, mas na prática, usamo-los com segurança e destreza”
(BAKHTIN, 2000, p. 301).
Convém ressaltar que de acordo com essa perspectiva, em razão da
variedade funcional das inúmeras atividades humanas, no âmbito social, os gêneros
apresentam-se infinitos e heterogêneos, oscilando desde a situação verbal cotidiana
(o diálogo) até a tese científica. Para Bakhtin (2000, p. 380), essa “extrema
heterogeneidade” dos gêneros acentua a dificuldade que encontramos em tratar do
caráter genérico do enunciado, e isso o leva a questionar:
Ficamos tentados a pensar que a diversidade dos gêneros do discurso é tamanha que não há e não poderia haver um terreno comum ao seu estudo: com efeito, como colocar no mesmo terreno de estudo fenômenos tão díspares como a réplica cotidiana (que pode reduzir-se a uma palavra) e o romance (em vários tomos a ordem padronizada que é imperativa já por sua entonação e a obra lírica profundamente individual?) (BAKHTIN, 2000, p. 380).
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Seguindo, pois, uma esfera social específica, os gêneros apresentam
características temáticas, composicionais e estilísticas próprias que se fundem
indissoluvelmente no todo do enunciado, e refletem as condições e finalidades
particulares de cada uma dessas esferas de comunicação. Portanto, na visão de
Bakhtin (2000, p. 279),
O enunciado reflete as condições específicas e as finalidades de cada uma das esferas, não só por seu conteúdo (temático) e por seu estilo verbal, ou seja, pela seleção operada dos recursos da língua – recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais –, mas, também, e, sobretudo por sua construção composicional (BAKHTIN, 2000, p. 279).
Outro ponto importante destacado pela abordagem Bakhtiniana é que,
embora os gêneros discursivos estejam sempre em mudança - uns desaparecem,
outros (re) surgem adaptados às necessidades sociais -, eles não deixam de
estabelecer um valor “normativo”, uma certa estrutura que, por sua vez, é
reconhecida intuitivamente pelos usuários da língua. Sendo assim, esses usuários
regulam os seus dizeres seguindo as formas do gênero escolhido para uso, mas
eles não criam o gênero, os gêneros lhes são dados socialmente, isto é, os gêneros
surgem a partir das mais diversificadas e rotineiras práticas sociais.
Sobre a heterogeneidade dos gêneros, Bakhtin (2000, p. 279-280) diz:
A riqueza e a variedade dos gêneros do discurso são infinitas, pois a variedade virtual da atividade humana é inesgotável, e cada esfera dessa atividade comporta um repertório de gêneros do discurso que vai diferenciando-se e ampliando-se à medida que a própria esfera se desenvolve e fica mais complexa (BAKHTIN, 2000, p. 279-280).
É determinante ainda tomar como parâmetro, segundo Bakhtin (2000, p. 281),
uma diferença fundamental existente entre os gêneros, qual seja a de que eles se
dividem em primários (simples) e secundários (complexos). Estes últimos ocorrem
em circunstâncias de uma comunicação cultural, mais complexa e relativamente
mais evoluída, principalmente escrita: artística, científica, sociopolítica (ou
ideológica), e já os primeiros constituem-se em circunstâncias de uma comunicação
verbal espontânea, e se tornam componentes dos gêneros secundários, isto é,
transformam-se dentro destes e adquirem uma característica particular, gerando
uma diversidade de gêneros de enunciados, heterogêneos entre si. Isto pode ser
explicado através do seguinte fragmento, extraído desse autor (2000, p. 281):
53
Durante o processo de sua formação, esses gêneros secundários absorvem e transmutam os gêneros primários (simples) de todas as espécies, que se constituíram em circunstâncias de uma comunicação verbal espontânea. Os gêneros primários, ao se tornarem componentes dos gêneros secundários, transformam-se dentro destes e adquirem uma característica particular: perdem a sua relação imediata com a realidade existente e com a realidade dos enunciados alheios (BAKHTIN, 2000, p. 281).
Nesse sentido, conforme Bakhtin, a natureza do enunciado, e, sobretudo, a
problemática da “correlação entre língua, ideologias e visões do mundo”, são
“esclarecidas” a partir de dois pontos cruciais: a inter-relação entre os gêneros
primários e secundários e o processo histórico de formação dos gêneros
secundários.
De fato, esses estudos de vezo bakhtiniano, que se respaldam em critérios de
ordem enunciativa, redirecionaram e redimensionaram a pesquisa sobre gêneros,
consolidando-se, nos dias atuais, como uma profícua referência teórica. Partindo,
então, do princípio de que nos expressamos linguisticamente através de gêneros em
formas de texto, posto que eles organizam a nossa linguagem nas nossas atividades
sociais mais cotidianas, nesta pesquisa, utilizaremos a nomenclatura “gênero
discursivo”, na tentativa de evitar possíveis ambiguidades terminológicas, e também
o concebemos como um evento comunicativo, caracterizado, muito mais, por suas
funções sóciocomunicativas do que por suas peculiaridades linguísticas e estruturais
(aspectos formais).
Feitas essas considerações sobre os estudos dedicados ao gênero, cabe
agora tratar de outra noção que representa, de forma substancial, o eixo do
pensamento bakhtiniano. Em toda a sua obra, Bakhtin compreende o fenômeno da
linguagem como uma atividade de criação coletiva, constituída a partir do diálogo
entre o “eu” e o “outro”. Ele (2000, p.123), registra esse pensamento, dizendo assim:
A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A interação verbal constitui assim a realidade fundamental da língua (BAKHTIN, 2000, p. 123).
Nessa perspectiva, a linguagem consiste em um fenômeno social de natureza
dialógica, por isso, quando esse autor reflete sobre a constituição e o funcionamento
dos gêneros, ele postula que a comunicação verbal real e viva é o diálogo. Nessa
54
forma de expressão verbal, devido a sua clareza e simplicidade, percebe-se,
nitidamente, a interação dos sujeitos participantes.
Assim, quando dialogamos com alguém, esperamos sempre a compreensão
do que enunciamos e essa compreensão concretiza-se pela resposta dada, pelo
parceiro, ao enunciado que proferimos.
Embora esta seja uma característica do gênero primário, conforme nos ensina
Bakhtin, é possível verificar essa alternância de sujeitos em variações dos gêneros
secundários do discurso. Apesar de não existir de fato um diálogo, uma relação real
entre sujeitos falantes, em que ocorre a troca de turno e a manutenção do fluxo
conversacional, nos gêneros complexos (ou secundários), é possível estabelecer
uma espécie de demarcação virtual da presença do outro, na superfície do
enunciado. De acordo com a visão bakhtiniana (2000, p. 295), a simulação de uma
comunicação verbal oral acontece, sobretudo, nos gêneros retóricos:
Observa-se de fato que, nos limites de um enunciado, o locutor (ou o escritor) formula perguntas, responde-as, opõe objeções que ele mesmo refuta, etc. Porém esses fenômenos não são mais que a simulação convencional da comunicação verbal e dos gêneros primários do discurso. É um jogo característico dos gêneros retóricos (que incluem certos modos de vulgarização científica); aliás, todos os gêneros secundários (nas artes e nas ciências) incorporam diversamente os gêneros primários do discurso na construção do enunciado, assim como a relação existente entre estes (os quais se transformam, em maior ou menor grau, devido à ausência de uma alternância dos sujeitos falantes) (BAKHTIN, 2000, p. 295).
Todo enunciado, seja oral ou escrito, irá sempre se estruturar conforme o
gênero a que se integra, e esse gênero, por sua vez, atuará como instrumento
mediador dos objetivos do enunciador. No caso específico do enunciado escrito,
para poder recuperar o processo ativo pergunta/resposta de uma situação natural de
fala, é necessário o uso de estratégias linguísticas que expressem uma suposta
comunicação. Dependendo, então, da tipologia do enunciado, haverá uma maior ou
menor preocupação quanto a esse aspecto. Na modalidade escrita da língua, torna-
se imprescindível uma elaboração cuidadosa do “querer dizer” do enunciador, uma
vez que esse “intuito discursivo” conduz o fio argumentativo do enunciado, a sua
amplitude, as suas fronteiras. A natureza da enunciação é retratada por Bakhtin
(2000, p. 98), desta forma:
Toda enunciação, mesmo na forma padronizada da escrita, é uma resposta a alguma coisa e é construída como tal. (...) Toda inscrição prolonga aquelas que a precederam, trava uma polêmica com elas, conta com as
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reações ativas da compreensão, antecipa-as. Cada inscrição constitui uma parte inalienável da ciência ou da literatura ou da vida política. Uma inscrição, como toda enunciação monológica, é produzida para ser compreendida, é orientada para uma leitura no contexto da vida científica ou da realidade literária do momento, isto é, no contexto do processo ideológico do qual é parte integrante (BAKHTIN, 2000, p. 98).
Para Bakhtin (2000, p. 290), é lamentável persistir, no âmbito da linguística,
funções tais como o “ouvinte” e o “receptor” (os parceiros do locutor), pois “tais
funções dão uma imagem totalmente distorcida do processo complexo da
comunicação verbal”, já que não correspondem “aos protagonistas reais da
comunicação verbal”. Na sua visão, a função primordial da atividade verbal é a
interação entre os parceiros, esse fato leva o autor a afirmar que os estudos mais
arcaicos sobre funções da linguagem “resumem-se à expressão do universo
individual do locutor (...), e quando o papel do outro é levado em consideração, é
como um destinatário passivo que se limita a compreender o locutor”, e não um
interlocutor ativo, participante atuante da comunicação verbal (2000, p. 289).
Considerando, pois, o caráter interlocutivo da linguagem, a essência
fundamentalmente dialógica da comunicação verbal, cuja presença do “outro” torna-
se um elemento intrínseco, é que ele teoriza a noção de “destinatário”. Na sua visão,
o índice substancial do enunciado é o fato de dirigir-se a alguém, de estar voltado
para o destinatário. Observe, na íntegra, as suas próprias palavras:
Ter um destinatário, dirigir-se a alguém, é uma particularidade constitutiva do enunciado, sem a qual não há, e não poderia haver, enunciado. As diversas formas típicas de dirigir-se a alguém e as diversas concepções típicas do destinatário são as particularidades constitutivas que determinam a diversidade dos gêneros do discurso (BAKHTIN, 2000, p. 325).
Parece claro que a natureza do gênero interfere, decisivamente, na relação
dialógica enunciador/destinatário (e na influência deste último sobre o que se
enuncia). Contudo, é imprescindível considerar que o dialogismo se configura como
algo essencial a todos os tipos de gêneros discursivos:
Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro. Através da palavra, defino-me em relação ao outro, isto é, em última análise, em relação à coletividade. A palavra é uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros. Se ela se apoia sobre mim numa
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extremidade, na outra se apoia sobre o meu interlocutor. A palavra é o território comum do locutor e do interlocutor (BAKHTIN, 2000, p. 113).
Ao considerar outros aspectos do funcionamento da linguagem, como por
exemplo, que existe um vínculo social entre a atividade linguística e o sentido, e que
a linguagem não guarda em si mesma todos os sentidos, essa abordagem dialógica
possibilitou novas diretrizes para os estudos linguísticos. Por essas vias, os sujeitos
e os sentidos passam a ser analisados sob outro prisma, e é nesse quadro, portanto,
que se consolida a dimensão sócio-histórica das concepções de linguagem e de
discurso que interessam a pesquisa.
No tocante às contribuições efetivadas por Bakhtin, destacamos pelo menos
três pontos de fundamental importância para os estudos da linguagem, cuja ênfase
se dá nos aspectos sociocomunicativos e funcionais em detrimento dos aspectos
formais (estruturais e linguísticos) na análise dos gêneros, e por extensão, na
análise dos fatos da linguagem:
a) o conceito de linguagem como interação verbal: a linguagem se situa no
interior das relações sociais.
b) o princípio dialógico, que “condiciona” a presença do destinatário
(do “outro”), no exercício efetivo da linguagem: o dialogismo é a condição
básica dos sentidos do discurso.
c) a noção de gênero, concebido como expressão do uso da linguagem nas
várias esferas das atividades humanas: a comunicação humana é realizada
através dos gêneros discursivos.
Embora Bakhtin não tenha presenciado alguns progressos do nosso tempo,
tais como, a criação de tecnologias digitais e da rede mundial de computadores, que
impulsionaram novas formas de comunicação e textualidades, é inquestionável
reconhecer que suas reflexões continuam sendo válidas, e podem ser adaptadas na
análise de questões linguísticas da atualidade. Seguindo essa linha de pensamento,
entendemos que os estudos bakhtinianos podem colaborar para uma maior
compreensão das peculiaridades dos gêneros discursivos surgidos (ou melhor,
ressurgidos) nessa nova esfera de uso da linguagem.
Nos dias atuais, devido à rápida e contínua evolução da tecnologia
computadorizada, inaugura-se uma nova esfera social de comunicação: a digital.
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As particularidades dos gêneros discursivos que se incorporam no âmbito da
tecnologia digital, embora não sejam totalmente inéditas, são capazes de provocar
mudanças significativas na linguagem e na estruturação de uma sociedade.
Para Marcuschi (2000), esse fato se concretiza porque o ambiente virtual é
extremamente versátil e hoje compete, em importância, nas atividades
comunicativas, ao lado do papel e do som. Poderíamos ainda complementar essa
asserção afirmando que é inconcebível conceber o mundo atual sem esses recursos
computacionais, pela sua praticidade e seu dinamismo configurados no nosso
cotidiano.
O contexto digital, por se tratar de um espaço híbrido, utiliza simultaneamente
recursos perceptíveis tanto pela audição quanto pela visão. No âmbito da natureza
enunciativa dos gêneros que povoam esse espaço virtual, percebemos que se
empregam mais semioses do que usualmente observamos em outros, tendo em
vista a sedução imediata tanto ocasionada pelos aspectos audiovisuais, como
também pelos elementos linguísticos.
Assim, monitorado por muita criatividade, os gêneros híbridos do meio virtual
caracterizam-se pelo uso de imagens em movimento (animações, fotos, ícones,
símbolos etc.), de uma infinidade de tipos de fontes, de cores e de sons (músicas,
vozes, ruídos etc.).
Tais recursos audiovisuais tornam legítima uma fonte dinâmica e fascinante e
comunicação, sendo possível identificar uma variedade de gêneros discursivos, tais
como o e-mail, o chat, o ICQ, o blog, a aula virtual, o Orkut, o scrap entre outros
mais. No entanto, entre esses gêneros que povoam o universo digital destacamos,
sobretudo, a publicidade no contexto da mídia virtual, pois acreditamos que os
aspectos estruturais, formais e funcionais desse tipo específico de publicidade
habilitam um espaço inovador de análise da língua.
Para Marcuschi (2000), essa forma de linguagem utilizada no espaço virtual
torna-se cada vez mais plástica, assemelhando-se a uma coreografia e, no caso das
publicidades, por exemplo, nota-se uma tendência a servirem-se de maneira
sistemática dos formatos de gêneros prévios para objetivos novos.
Assim, quando “visitamos” um site e nos deparamos com um universo de
significação; vislumbramos, simultaneamente, num só espaço, várias formas de
expressão. No ambiente virtual, a linguagem escrita interage, harmonicamente, com
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uma infinidade de elementos semiológicos; são imagens, cores, formas, músicas,
sons e vozes reunidas que encadeiam a sedução.
É relevante destacar ainda que, na ânsia da sedução, a publicidade eletrônica
não só privilegia os aspectos semiológicos, a versatilidade e o fascínio desses
recursos audiovisuais, que, à primeira vista, são os que mais impressionam o
usuário, mas também não desmerece o trabalho linguístico elaborado pelo
anunciante para interagir com o seu interlocutor virtual.
Nessa perspectiva, a noção de sentido literal é descartada e passa-se a
considerar inúmeros sentidos possíveis, muitas vezes implícitos linguisticamente,
determinados pela situação comunicativa da mídia digital: a net mídia.
Ao abordar a identidade dos gêneros híbridos e a sua relação com o uso da
linguagem, Marcuschi (2000) afirma que esse hibridismo desafia as relações entre
oralidade e escrita e inviabiliza de forma definitiva a velha visão dicotômica ainda
presente em muitos manuais de ensino de língua. Como essa relação se dá de
forma bastante particular no meio digital, onde se constata um hibridismo, é preciso
tecer alguns comentários a esse respeito.
Durante muito tempo, o estudo da língua falada e da língua escrita baseou-se
em um quadro restrito em que predominava o paradigma teórico da análise
imanente ao código linguístico. Essa abordagem contrastante apresenta um modelo
rigoroso em que se considera a fala como algo completamente informal e a escrita
como completamente formal. Isso se dá porque a língua falada é incorporada, de
maneira espontânea, em situações corriqueiras; já a língua escrita caracteriza-se por
ser apreendida via contextos mais formais, como a escola.
Nessa perspectiva, a função clássica da língua falada se restringe aos
contatos orais da sociedade; por sua vez, a língua escrita limita-se aos registros de
informações: a fala é um artefato natural e a escrita, um fato histórico.
A escrita torna-se, então, através de sua forma padrão (reconhecida como um
modelo) um bem cultural indispensável à sociedade, e, em função disto, há uma
supervalorização desta em detrimento do oral, privilegiando os falantes
escolarizados, ditos “letrados”, em relação àqueles que não têm acesso à educação
institucionalizada.
Posteriormente a essa perspectiva dicotômica, houve um avanço nos estudos
linguísticos que provocou uma revisão nesta distinção língua falada versus língua
59
escrita. Nos últimos anos, as pesquisas têm demonstrado que essas modalidades
não se constituem em polos antagônicos, elas não se opõem intrinsecamente.
Alguns estudiosos como Marcuschi (2000) procuram analisar as influências
da fala sobre a escrita e vice e versa, defendendo que é possível ocorrer, nos
eventos comunicativos, uma variação no uso das ações linguísticas (na modalidade
oral e escrita), e que o critério básico para a análise dessa relação deve estar
fundamentado em um continuum dos gêneros, evitando um quadro dicotômico
comparativo:
O contínuo dos gêneros textuais distingue e correlaciona os textos de cada modalidade (fala e escrita) quanto às estratégias de formulação que determinam o contínuo das características que produzem as variações das estruturas textuais-discursivas, seleções lexicais, estilo, grau de formalidade etc., que se dão num contínuo de variações, surgindo daí semelhanças e diferenças ao longo de contínuos sobrepostos (MARCUSCHI, 2000, p. 42).
Portanto, esse autor ilustra a noção esquemática dessa postura dialógica, em
que se focaliza a relação contínua entre a fala e a escrita em uma diversidade de
gêneros discursivos existentes na sociedade.
3.8 Interdiscursividade e intertextualidade
A concepção de linguagem para Bakhtin é dialógica. Segundo Bakhtin (2000),
a essência da linguagem comunicativa é a enunciação. Por isso ela ocupa um lugar
especial em suas formulações teóricas. Para ele, a enunciação é de natureza social
e para compreendê-la é necessário ter em mente que ela acontece sempre numa
interação verbal. E uma das formas mais importantes da interação verbal é o
diálogo. Este podendo ser entendido como ato de fala entre duas ou mais pessoas
e/ou como qualquer espécie de comunicação verbal oral ou escrita.
Todavia o dialogismo, princípio unificador que permeia toda a produção
teórica Bakhtiniana, se revela em uma bivocalidade, contendo também a ideia de
relatividade entre autoria individual e autoria coletiva, ou seja, produção de ideias e
textos, que se entrecruzam e se interpenetram um no outro.
O diálogo entre interlocutores é o meio necessário indispensável para o
entendimento do dialogismo bakhtiniano, uma vez que o dialogismo, princípio
constitutivo da linguagem, é a condição do sentido do discurso, pois a construção do
60
sentido se amplia, inevitavelmente, em troca, em intercâmbio e diálogo, isto é,
compreensão e apreensão do discurso do outro.
Partindo daí, Bakhtin (2000), fundamenta sua segunda concepção de
dialogismo: a de diálogo entre discursos, ferramenta indispensável para uma outra
consciência, a de que o discurso não é individual. Em relação com outros discursos,
expõe o caráter dialógico do texto, posto que carregue consigo não só o material
linguístico, mas o cultural, o histórico e, acima de tudo, o ideológico, visto que, para
Bakhtin, o texto é um tecido de muitas vozes, ou de muitos textos ou discursos, que
se entrecruzam, se completam, respondem uns aos outros ou polemizam entre si no
interior do texto. Desse modo, a noção de linguagem em Bakhtin é a de que ela é
sempre dialógica. Este é o princípio constitutivo da linguagem e a condição do
sentido do discurso. As palavras do enunciador estão sempre e inevitavelmente
atravessadas pelas palavras do outro: o discurso de um enunciador se constitui
também no discurso do outro que o atravessa, condicionando o discurso do eu. Isso
significa dizer que a alteridade marca o ser humano, visto que o outro é
imprescindível para a sua constituição.
Assim, na tentativa de lograr o entendimento do dialogismo bakhtiniano,
busca-se compreender o diálogo entre textos e o diálogo entre discursos que deram
origem à intertextualidade e interdiscursividade.
Partindo dos conceitos de dialogismo e polifonia, a semioticista Kristeva
(1974), no âmbito da teoria literária, cria o termo intertextualidade para designar o
fenômeno da relação dialógica entre textos efetivamente produzidos. Ela diz que
todo texto se constrói como um mosaico de citações, todo texto é absorção e
transformação de outro texto (KRISTEVA, 1974, p. 64). Então, a intertextualidade
não é uma simples adição de textos em outro, mas um trabalho de absorção e
transformação de outros textos com vistas a determinados objetivos. O ato de
deslocar um texto de referência de seu contexto original e aplicá-lo, como um
intertexto, num outro, possibilita uma nova leitura deste texto e a percepção do
diálogo entre diferentes autores, obras e contextos socioculturais. A escolha do
intertexto já significa uma postura ideológica. A seleção de uma citação já
transforma o recorte na qual é inserida as supressões que poderão ser operadas no
seu interior, o modo como é tomada no comentário podem revelar a confirmação ou
a negação do outro texto.
61
Vale ressaltar, no entanto, que a escolha de uma citação para um
determinado texto não é um recurso livre. Ela encontra-se sujeita às determinações
que a formação discursiva impõe. Segundo Foucault (2003, p. 136), formação
discursiva é um conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas no
tempo e no espaço, que definiram em uma dada época e para uma determinada
área social, econômica, geográfica ou linguística, as condições de exercício da
função enunciativa.
Segundo Maingueneau (1997), a citação refere-se tanto às regras, às
operações, quanto aos enunciados citados, devendo-se, pois distinguir o intertexto e
a intertextualidade. Por intertexto de uma formação discursiva, o autor entende
“o conjunto dos fragmentos que ele efetivamente cita e, por intertextualidade, o tipo
de citação (a intenção ou sentido) que essa formação discursiva define como
legítima através de sua própria prática”. (MAINGUENEAU, 1997, p. 86).
Já a interdiscursividade diz respeito ao processo discursivo, considerando que
um discurso se estabelece sempre em relação a outro discurso já existente, de
forma consciente ou inconsciente. Formamos nosso discurso servindo-nos de outros
discursos aos quais respondemos, ratificando, acrescentando ou negando os
sentidos que eles encerram.
Sobre a relação interdiscursiva, Maingueneau proclama o primado do
interdiscurso sobre o discurso. Para ele a unidade da análise pertinente não é o
discurso, mas o espaço de trocas entre vários discursos convenientemente
escolhidos.
Para explicar o que é o interdiscurso, Maingueneau distingue outros três
termos:
a) universo discursivo: é constituído pelo conjunto de
formações discursivas de todos os tipos que coexistem e interagem em um
contexto histórico-social;
b) campo discursivo: é o conjunto de formações discursivas,
que se encontra em relação de concorrência e se delimitam por uma
posição enunciativa em uma determinada região do universo discursivo.
Tem-se, então o campo publicitário, político, filosófico, pedagógico, etc.
como esses campos são amplos, eles podem conter subcampos: no
discurso político, por exemplo, pode haver relação de confronto ou de
62
aliança ou de neutralidade entre diversos discursos para promover a sua
legitimação discursiva;
c) espaço discursivo: entendido como o subconjunto do campo
que apresenta formações discursivas ligadas entre si. Supõe-se que essas
regiões mantenham relações privilegiadas, fundamentais para a
compreensão dos discursos considerados (MAINGUENEAU, 1997, p. 116-
117).
Assim, diferentes discursos, como o ecológico, o publicitário, o literário, o
político, etc., podem figurar no espaço discursivo do texto. Isso nos leva a afirmar
que todo texto se constitui a partir de outro(s) texto(s), no processo da
intertextualidade, assim como o discurso resulta de outro(s) discurso(s), no processo
da interdiscursividade.
Esses processos que se apresentam na superfície discursiva do texto, que
vão das formas marcadas mais implícitas às mais explícitas, é o que Authier-Revuz
(1990) chama de heterogeneidade discursiva. Para ela, essa heterogeneidade se dá
de dois modos diversos: a heterogeneidade marcada, que é o princípio segundo o
qual todo discurso define sua identidade em função dos outros, indicando, no corpo
do enunciado, as marcas dessa definição e a heterogeneidade constitutiva, que diz
respeito ao fato de, em si mesmo, independente da heterogeneidade marcada todo
discurso ter o outro como marca de sua própria existência, ou seja, a
heterogeneidade constitutiva é concebida no nível do interdiscurso e do
inconsciente. Mas isso não significa dizer que um processo mantém relação de
oposição com o outro, trata-se de dois processos diferentes e um pode conter o
outro.
Sendo assim, para Fiorin (2002, p.181), se há distinção entre discurso e texto,
há, consequentemente, distinção entre interdiscursividade e intertextualidade. Dessa
forma, o termo intertextualidade fica reservado apenas para os casos em que a
relação discursiva é materializada em textos. Isso significa que a intertextualidade
pressupõe sempre uma interdiscursividade, mas o contrário não é verdadeiro.
Portanto, segundo o autor pode haver relações entre textos (intertextuais) quando
um texto se relaciona dialogicamente com outro texto já constituído.
63
4 DISCURSO MIDIÁTICO: PUBLICIDADE
De acordo com o corpo teórico levantado, detectou-se que há muitos anos a
publicidade originou-se da Igreja Católica que buscava uma forma para expandir sua
doutrina. Foi através desse ato que se originou o termo publicidade. No Brasil, ela
surgiu por volta de 1808 quando nasceu o primeiro jornal, Gazeta do Rio de Janeiro,
publicando tempos depois o primeiro anúncio. O anuncio consistia em um texto
simples, sem nenhuma marca de expressividade, nenhuma característica que
chamasse atenção do leitor. “Quem quiser comprar uma morada de casas de
sobrado com frente para Santa Rita, fale com Joaquina da Silva, que mora nas
mesmas casas...”, Tempos depois por volta de 1860 começaram a surgir os
primeiros panfletos, painéis de ruas entre outros. Contudo, a publicidade conseguiu
grandes êxitos e hoje considerada como texto persuasivo, é fonte de estudo para
diversos autores.
Sendo assim, a publicidade pode ser conceituada como “o conjunto de
técnicas, atividades de informação e persuasão destinadas a influenciar, num
determinado sentido, as opiniões, os sentimentos a as atividades – do público
receptor”. (SANDMAN, 2001, p. 11). No discurso midiático moderno, ela está
presente em todos os setores da vida: econômico, social, político e religioso. Dentre
eles, podem-se destacar: a publicidade política, a eleitoral, a governamental, e
ideológica (fonte de nossas pesquisas). Ela também se destaca pelas diversas
formas de exposição como, outdoors, panfletos, em código não verbal através de
carros de anúncio, nos canais de TV entre outros mais.
Esse gênero discursivo trabalha com arte, criatividade, raciocínio, moda,
cultura, psicologia, tecnologia, enfim, tudo que a faz ter determinado poder de
persuasão. O seu objetivo é uma tarefa específica de comunicação a ser realizado a
um público alvo específico durante um determinado período e pode ser classificado
por propósitos básicos, informar, persuadir ou uma interação que viabiliza uma
inversão de papéis na dialogização publicitária.
Portanto, a publicidade é considerada como o meio de persuasão que tem
alcançado grandes êxitos em estudos através da análise do discurso. Um meio de
comunicação que envolve uma visão crítica e analítica por seus estudiosos é tido
como uma verdadeira fonte de matéria prima para pesquisas nesta área. É devido a
essas informações que nosso trabalho tem como meta mostrar, através de Teorias
64
de alguns escritores como Michael Pêcheux, Bakhtin e outros, cuja reflexão se situa
sobre a relação entre a língua e a história, que essa visão crítica pode ser formada
através de textos publicitários.
É nesse sentido que analisaremos a publicidade, assim como todo texto
verbal e não-verbal, ela é marcada por diversas características, que são as formas
estilísticas que façam com que o ouvinte preste atenção ao seu texto e que o defina
em determinado período histórico marcando sua própria personalidade. Para
Sandman, “a linguagem da publicidade enfrenta o maior dos desafios: prender,
como primeira tarefa, a atenção deste destinatário”. (SANDMAN, 2001, p. 12).
Tendo conseguido que o comunitário se ocupe com determinado texto, convencê-lo
ou levá-lo em consequência à ação possivelmente são tarefas ou desafios menores.
Logo, é com esse propósito que focaremos nossos trabalhos, para as causas e
possíveis consequências que leva a determinado texto, pela sua criatividade, ter
formas persuasivas, recursos expressivos, símbolos, contexto histórico e marcas
ideológicas de uma época. Por conseguinte, são essas características e esses
princípios que focalizaremos em nossa pesquisa, identificando quais fatores a
caracterizam como tal.
4.1 Os Posicionamentos da publicidade no Brasil
Quando enunciamos algo fazemo-lo por meio de gêneros de discurso. Assim
também os destinatários se esforçam para identificar a qual gênero essa enunciação
pertence. Segundo Maingueneau (2001), o fato de um enunciador escolher um
gênero para enunciar significa que ele está adotando um posicionamento, ou seja,
adotando diferentes maneiras de construir a representação de uma determinada
prática social. Ele está, então, se inscrevendo numa ‘escola’, numa ‘doutrina’, num
“movimento”, está, enfim, assumindo uma posição frente a determinadas ideias.
Falar de posicionamento da publicidade é falar em propaganda, marketing e
venda:
Sem a livre iniciativa e a concorrência comercial não haveria publicidade. Sem a publicidade não existiriam tantos veículos de comunicação de massa que recebem, da propaganda comercial, o suporte necessário para chegar a todos os segmentos da população, independentemente do seu nível econômico. Sem a publicidade seria difícil lançar produtos, ampliar suas vendas, promover a concorrência e gerar as economias de escala que resultam em qualidade melhor e preços menores. Seria ainda mais
65
problemático sustentar a multiplicidade dos meios de informação, que divulgam ideias, investigam mazelas e estimulam o debate político. Seria, acima de tudo, virtualmente impossível sustentar uma imprensa livre, vigorosa e independente. Alicerce – como sabem todos os ditadores – do primado da lei e da democracia. [...] (SANDMAN, 2001, p. 14).
Isso nos leva ao que Maingueneau (1997) chama de comunidade discursiva e
que Costa (2001) explica da seguinte forma: grupos “que dividem um conjunto de
ritos e normas, não só de autores, mas de uma série de papéis sóciodiscursivos (...)
que produzem, reproduzem, consomem, fazem circular os textos”. (MAINGUENEAU,
1997, p. 72). Adequando esse conceito para a publicidade, comunidades discursivas
que produzem, reproduzem e fazem circular os anúncios ou propagandas.
No mundo globalizado, produtos ou serviços passam a ser personalizados.
Publicidade, marketing e vendas têm papel fundamental, unindo-se em torno de um
objetivo comum. Esse objetivo é ajudar clientes a evoluir como seres humanos
nunca se esquecendo de que todo ser humano é um cliente e vice-versa,
colaborando para que eles se descubram e se realizem como seres completos.
Assim, para seduzir o público, investe-se em propaganda; para seduzir o
mercado, investe-se em marketing. Publicidade e marketing andam juntos,
englobando-se mutuamente. Quando se faz publicidade de um produto, o público
fica sabendo que existe e quais são os principais benefícios que ele oferece – o
suficiente para qualificá-lo e despertar o interesse e/ou desejo de posse. É isso que
na visão Marxista é visto como alienação do produto.
Dessa maneira, o resultado de um processo de escolhas socialmente
determinadas, escolhas que, na publicidade brasileira e mundial, podem se dar
diferentemente de uma publicidade para outra, que resultam nas inúmeras
mensagens publicitárias que a todo instante recebemos em casa, na rua, pelo rádio
ou pela TV. É, pois, com bastante criatividade que as publicidades são criadas e
apresentadas ao consumidor, através dos diversos meios de comunicação. Muitas
vezes gostamos delas, e não é à toa que a publicidade brasileira é considerada uma
das cinco grandes expressões mais criativas da publicidade mundial.
No mundo da publicidade e dos negócios, a aplicação dos avanços
tecnológicos tornou-se tão importante quanto a produtiva, equiparando-se à
agricultura e à própria indústria. O uso das tecnologias na publicidade, que é feita
sobre um produto, é um dos aspectos tão importantes quanto a qualidade deste.
Logo, uma publicidade bem feita atrai e cria nas pessoas necessidades que
66
normalmente não as têm, faz desejar esses artigos ou simplesmente deliciar-se com
a qualidade da peça publicitária. É esse poder de sedução da publicidade que
Andrade (1971, p. 02) se expressa da seguinte forma:
[...]. Confesso que um dos meus prazeres é saborear os bons anúncios jornalísticos de coisas que não pretendo, não preciso ou não posso comprar, mas que atraem pela novidade de concepção utilizando macetes psicológicos sutis e muito refinamento de arte. É admirável a criatividade presente nestas obras de consumo rápido, logo substituídas por outras. São anúncios que muitas vezes nos prestam serviços, pela imaginação ou pelo bom humor que contém. E se nos vendem pelo menos um sorriso, ajudaram a construir um dia saudável de trabalho (ANDRADE, 1971, p. 02).
Assim, a linguagem publicitária faz com que inteligentes, criativas e diversas
mensagens sejam inseridas na publicidade, a fim de persuadir o consumidor, por
meio dos vários artifícios linguísticos, dependendo do tipo de anúncio a que se
propõe, por exemplo, se comercial, ecológico ou político.
Nessa perspectiva, pode-se dizer que o texto publicitário escrito apresenta
algumas características:
a) quase sempre é constituído por imagem e texto;
b) linguagem persuasiva, direta e clara;
c) estrutura variável, mas geralmente composta por:
� título, que chama a atenção sobre o produto;
� texto, que amplia o argumento do título;
� assinatura, logotipo ou marca do anunciante;
d) nível de linguagem de acordo com o público que se pretende atingir;
e) verbos geralmente no modo imperativo ou no presente do indicativo;
f) uso de recursos como: figuras de linguagem, ambiguidade, jogos de
palavras, provérbios dentre outros.
Vejamos o que o publicitário Jairo Lima, em entrevista, comenta sobre os
recursos da linguagem publicitária:
A campanha pode ser pensada em termos de hipérbole, pleonasmo, metonímia ou metáfora. Após a escolha, sigo o caminho traçado: o do exagero ou da repetição, ou da parte pelo todo, ou da simbologia. Quanto à escolha do vocabulário, em nível dos signos, deve ser sempre simples, com termos conhecidos e corriqueiros. O que vai valorizá-los e ampliá-los serão as relações que se estabelecem: a polissemia, a oposição, o duplo sentido
67
ou, às vezes, um novo sentido para um termo bastante conhecido (CARVALHO, 1996, p. 29).
Portanto, sendo uma modalidade do texto argumentativo, o discurso
publicitário apresenta argumentos para persuadir o interlocutor. Esses argumentos,
direta ou indiretamente, estão relacionados a eventuais vantagens, que o
consumidor teria comprando o produto. Essas vantagens podem ser de ordem
quantitativa (“economize”, “rende mais”, “é mais barato”, etc.), qualitativa (“é o
melhor”, “o mais saboroso”, “o mais nutritivo”, etc.) ou ideológica, quando se acena
com valores (“o mais moderno e arrojado”, “com exclusividade e classe”, etc.).
4.2 Publicidade e discurso
O discurso persuasivo é a técnica de conduzir o interlocutor através de
estratégias comunicacionais para um fim desejado. (SANDMAN, 2001, p. 10).
Classicamente, o discurso no qual se aplica a persuasão é o publicitário, seja na
forma oral ou escrita. Entretanto, pode-se afirmar que há persuasão na música, na
pintura e obviamente em outras formas de manifestação que visem alcançar o
público receptor. Observam-se com prioridade, nos verbetes sobre a linguagem
publicitária, que os princípios da retórica, e por extensão da persuasão, têm nela,
hoje, seu principal campo de aplicação e revivescimento. De acordo com Sandman,
“entendendo-se o discurso retórico como a arte de persuadir, de convencer e de
levar à ação por meio da palavra, é fácil ver que esse é também o papel da
linguagem da publicidade”. (SANDMAN, 2001, p. 12). Além disso, o discursivo
publicitário é desenvolvido, reproduzido e transformado nas práticas sociais da
mídia.
Ele teoriza acerca do papel dos sujeitos em todos os aspectos da vida social
e cultural da modernidade. Dessa forma, é preciso conhecer os instrumentos de
trabalho e os objetivos da mídia, para a compreensão adequada da enorme
influência da publicidade nos contextos institucionais e organizacionais da vida
social contemporânea e principalmente na formação das identidades dos sujeitos
que compõem o tecido social. Assim, é por meio da doutrinação, do controle cultural
e das construções ideológicas da percepção que o discurso publicitário alcança seu
objetivo, seduzindo os consumidores em potencial. A percepção que se tem da
realidade objetiva é produto de um condicionamento sócio-político-econômico.
68
As pessoas mais vulneráveis à doutrinação são as que vivem em sociedades
tecnológicas manipuladas pela mídia. Observa-se que interlocutores a quem se
destinam os discursos publicitários podem perder a capacidade de distinção entre a
realidade objetiva e as fantasias perceptivas da realidade. Dessa forma, os
produtores dos discursos publicitários moldam as identidades dos interlocutores
mediante as percepções da realidade que são comuns entre ambos; apenas o que
valoriza a autoidentidade do interlocutor e da interlocutora é considerado.
Consequentemente, os discursos publicitários, em busca de consumidores em
potencial, direcionam os valores e a própria imagem do ‘eu’ e do ‘outro’, provocando
alterações nas relações entre as identidades de gênero.
Além do discurso persuasivo na publicidade, é válido também ressaltar a
importância do signo para a compreensão da publicidade, para isso é preciso
considerar palavras e imagens juntas. Nesse caso, há uma recomendação de que
palavras e imagens sejam analisadas como signos. Isso significa dizer que elas são
‘formas físicas’ (significantes) com significados. Alguns aspectos semióticos que são
destacados: layout, ancoragem, destaque. O layout distribui os elementos
semióticos do anúncio: a foto ocupa geralmente a maior parte da página e a divisão
superior/inferior sugere a divisão ideal/real; a marca ocupa o canto direito inferior.
A foto restringe as escolhas possíveis dos diversos significados que podem ser
atribuídos às palavras, dando ancoragem ao texto escrito. O destaque pode ser
dado pela exploração das cores de uma foto, em contraste com o fundo, alternando
entre graus da modalidade, exatamente como nos textos verbais. De acordo com
Peirce, citado por Epstein (1986, p. 15), “um signo é signo quando há alguém que
possa interpretá-lo como signo de algo. O significado é então a interpretação desse
signo, que, por sua vez, indica o objeto, o significado é a “outra coisa” pela qual está
o ‘algo’”.
Dessa maneira, as semióticas de influência peirceana preferem empregar três
termos como correlatos da função sígnica. A representação gráfica usual dessas
tríades é feito pelo conhecimento do triângulo semiótico.
O objeto ou referente é o elemento constante no significado, visto que, a
objetividade do referente não é suficiente para determinar o significado de um
símbolo. Podemos notar no conceito a seguir em que se relata a amplitude do
significado. Para Epstein, “o significado pode variar, mesmo quando tanto o símbolo
como o referente permanece inalterado (até mesmo quando apontamos e dizemos
69
“esta casa” o significado pode variar)”. (EPSTEIN, 1986, p. 23). Essas variações são
explicadas pelo fato de o referente, em geral, ter mais de um atributo ou
característica. Portanto, os objetos não são levados em consideração por Saussure,
e no quadro teórico de Peirce, só entram em conta quando se discutem tipos
particulares de signos como os índices e os ícones. Sendo assim, de acordo com
Sandmann:
Dependendo do modo como se estabelece a relação entre signo e referentes têm três tipos de signos: Se a ponte da relação é arbitrária ou convencional, temos o símbolo; se a relação tem base na experiência ou na história, na coocorrência ou na contiguidade, temos o índice; se a relação tem fundamento na semelhança, temos o signo chamado símile ou ícone (SANDMANN, 2001, p. 15).
Portanto, esse processo se dá, em muitas circunstâncias, em razão da
escolha de certos signos, da sua manipulação, do seu destaque em determinadas
peças, como poderemos detectar no capítulo destinado à análise interdiscursivo-
argumentativa da publicidade, a fim de esclarecer nossa proposta de trabalho.
70
5 ELEMENTOS DA ARGUMENTAÇÃO PARA ANÁLISE DA PUBLICI DADE
Este capítulo tem como objetivo refletir sobre o funcionamento da eficácia dos
elementos da argumentação, o ethos e o pathos, em textos publicitários, a fim de
observar recursos interdiscursivos presentes nas formações discursivas.
Nesse sentido, podemos ressaltar que Aristóteles ensinou que o caráter
projetado pelo discurso expõe um ethos discursivo, e, acrescentemos, capaz de
formar imagem identitárias.
O ethos é uma das três provas utilizadas para auxiliar a construção da
persuasão e do convencimento. Outras duas provas estão, uma, no logos, isto é,
nos objetos do discurso, pelo que ele demonstra ou parece demonstrar e, a outra, no
pathos, nas paixões, nos efeitos que o locutor procura suscitar no interlocutor.
São estes elementos, as projeções ethoicas de empresas e governos, que
buscaremos enfatizar nas análises a serem empreendidas sobre elementos
argumentativos de persuasão nas campanhas publicitárias para atrair leitores.
Ainda segundo a retórica aristotélica, as qualidades éticas necessárias para a
obtenção da persuasão e da eficácia discursivas são a prudência (phrónesis), a
virtude (areté) e a benevolência (eúnoia). E veremos que em alguns casos, a leitura
é tida por virtudes como evasão, informação, cultura, formação, e que nessa busca
de identificação é também fator que soma para a eficácia da mensagem.
Se para a tradição filosófica, incensa-se a crença na eficácia das formas do
discurso, Pierre Bourdieu (2006) relativiza essa confiança na linguagem e na razão
que a comanda, ao buscar afirmar a eficácia da ação comunicativa na/pela força
institucional do ethos. Isto é, na autoridade instituída capaz de ordenar o
desempenho necessário à comunicação. Se ainda considerasse a força das
emoções, como elemento de difícil contenção, seja pela autoridade seja pelo
discurso, no entanto, Bourdieu (2006) vê as coisas como são pelo prisma da análise
das instituições, bem ao gosto francês, como Durkheim, Mauss, Foucault,
especialmente este último.
Ainda assim, se deva considerar Bourdieu por muitas outras razões,
especialmente, no que o aproxima de Chartier (2006), aqui para os efeitos deste
trabalho, bem se pode admitir a importância da sociologia dos campos, que valoriza
e desenvolve em profundidade as questões relacionadas ao papel simbólico, ao
71
capital simbólico, mas, minimiza o papel do discurso e a confiança na racionalidade
para confiar na investigação do poder simbólico do papel institucional do sujeito.
É um raciocínio forte para a análise, uma vez que as instituições que
sustentam a publicidade para leitura são editoras, instituições de ensino, órgãos
governamentais. Certamente, que este trabalho não conseguiria definir os seres, no
sentido ontológico, a que os textos não dão acesso completo nunca, assim, com a
análise, apenas se chega à imagem dos autores construída no discurso.
Todavia, sempre há que lembrar que se trata de empresas e de órgãos
governamentais e que não é aconselhável esquecermo-nos das velhas teorias da
conspiração, em que eles estão sempre pensando em obter vantagens sobre o
cidadão livre. Para Aristóteles, é muito importante avaliar a quem interessa o
imbróglio e quem pensa em obter vantagens com ele.
Assim a proposta fundamental deste capítulo, então, é explorar, de um lado a
perspectiva linguística da análise da argumentação, na maneira como se coloca a
questão do ethos oratório como componente da eficácia na persuasão.
Talvez se conclua que em torno da ideia de que a credibilidade do orador, o
seu poder de persuasão seja o efeito de seu ethos manifestado no discurso, no caso
deste pequeno estudo, nas metáforas expostas no logos enunciativo, e mais
especificamente, na interdependência das três qualidades para que o discurso seja
persuasivo e eficaz.
Para seguir adiante com a reflexão, procura-se operar com alguns passos de
esclarecimento sobre:
a) definição e desdobramento do ethos;
b) o ethos na concepção de Aristóteles;
c) ethos: uma construção puramente linguageira ou uma posição institucional?
d) o ethos visto como componente da eficácia da persuasão.
5.1 A Retórica clássica e a nova retórica
Observa-se que a argumentação vem sendo objeto de estudo desde a
Antiguidade. Assim, essas investigações originaram-se na Grécia, entre os séc. V e
IV a. C. 180, a partir da retórica. O termo retórica significa eloquência; oratória;
estudo do uso persuasivo da linguagem, em especial, para oradores. (AURÉLIO,
72
2004). Dessa forma, a retórica consiste no uso persuasivo da palavra/discurso,
concretizado através de operações argumentativas, e a sua gênese está
intimamente relacionada aos acontecimentos históricos, nesse caso, encontra-se
vinculada à organização política do mundo grego.
Dessa maneira, naquela época, os cidadãos costumavam participar
ativamente das decisões políticas. Assim, no que diz respeito a esses
acontecimentos históricos, Pacheco afirma que:
Todos os cidadãos atenienses participavam diretamente nas assembleias populares, que possuíam funções legislativas, executivas e judiciárias. Assim, todos os assuntos eram submetidos ao voto popular – a organização do estado, a fixação de impostos, a declaração de guerra e até mesmo a morte de um cidadão, tudo isso era submetido à apreciação dos tribunais de justiça. Nenhum cidadão podia escapar à sua cota de responsabilidade, que muitas vezes incluía a justificativa de sua opinião perante uma plateia (PACHECO, 1997, p. 29).
Sendo assim, surge a figura dos sofistas, cujo prestígio social era
notadamente expressivo. Esses mestres, considerados sábios, eram responsáveis
pelos ensinamentos de técnicas argumentativas, contribuindo, efetivamente, para o
exercício da democracia, visto que o domínio dessas técnicas consistia em um
atributo essencial aos cidadãos da época.
Pode-se dizer que o termo "sofista" e seus cognatos, como sofisma, por
exemplo, adquiriram conotação depreciativa, e isso se deve em grande parte às
críticas proferidas por Platão à retórica. Uma vez que a doutrina platônica primava
pela ética na retórica, na visão desse filósofo, muitos sofistas utilizavam suas
habilidades para fins ilícitos, ao utilizar artifícios enganadores para corromper a
verdade.
Habitualmente, os sofistas e os ilustres oradores daquele tempo redigiam
pequenos textos, com o objetivo de discorrer sobre técnicas retóricas. Todavia,
somente a partir de Aristóteles, os estudos referentes à organização textual com fins
persuasivos intensificam-se. Esse autor propõe uma base teórica para os estudos da
argumentação na sua clássica obra Arte Retórica, concebendo a retórica como uma
técnica, que habilita a estruturação e a exposição de argumentos. De acordo com
Zoppi-Fontana (2006), essa obra simboliza uma das maiores referências sobre
retórica, e pode ser considerada como a primeira reflexão sistemática, teórica e
73
prática, desenvolvida sobre a arte oratória e as técnicas de persuasão. Sobre a
organização da Retórica de Aristóteles, essa autora (idem, ibidem) ressalta que:
Esta obra consta de três livros: o primeiro trata do raciocínio; o segundo apresenta uma teoria das emoções e o terceiro se ocupa principalmente do estilo e das figuras. A esta obra devemos acrescentar outras duas, as Tópicas e as Refutações sofísticas, que justamente com a Retórica apresentam os fundamentos de uma teoria completa da argumentação (ZOPPI-FONTANA, 2006, p. 186).
Sendo assim, para Aristóteles, o discurso retórico configura-se a partir de três
gêneros, a saber: o gênero deliberativo, gênero judiciário e o gênero epidítico. Essa
classificação baseou-se em aspectos comuns a esses gêneros: o caráter público
dos espaços institucionais e o auditório coletivo. Com isso, ao utilizar como
parâmetro as reflexões desse filósofo, Zoppi-Fontana demonstra as especificidades
desses três gêneros retóricos, mostrando que:
O gênero deliberativo estava relacionado com o espaço da Assembleia do povo, e o objetivo do(s) orador (es) era persuadir o auditório da pertinência e validade de determinada tese referente à vida política da cidade. O gênero epidítico estava relacionado com as grandes reuniões comemorativas (como os jogos em Olímpia) e o objetivo do orador era reforçar ou enfraquecer determinados valores compartilhados pelo auditório. O gênero judiciário se referia ao espaço do Tribunal e o objetivo do orador era inclinar os membros do Júri a favor de determinado julgamento em relação a infrações cometidas contras às leis da cidade (ZOPPI-FONTANA, 2006, p. 191).
De acordo com Citelli (1997), a retórica aristotélica teoriza que a estrutura do
discurso persuasivo deve comportar quatro instâncias correlacionadas: o exórdio, a
narração, as provas e a peroração, e, de forma geral, essa proposta ainda serve de
parâmetro na contemporaneidade. Assim, o exórdio pode ser entendido como a
introdução, o início do discurso; a narração é a fase do discurso em que os fatos são
arrolados, é a própria argumentação; já as provas são os elementos sustentadores
da argumentação, e a peroração trata da conclusão, do epílogo, que consiste na
última oportunidade para atingir o receptor.
Em relação aos meios de prova utilizados para fundamentar um discurso
persuasivo, estes podem ser “não-artísticos” ou “artísticos”. Os meios de prova não-
artísticos correspondem às provas concretas, evidentes, tais como testemunhas ou
documentos. Todavia, as provas artísticas são os argumentos criados pelo orador e
podem ser classificados, segundo Pacheco, em três tipos: “aqueles derivados do
74
caráter do próprio orador, que empresta sua credibilidade à causa (ethos); aqueles
em que o orador procura lidar com as emoções do auditório (pathos); e aqueles
derivados da razão (logos)”. (PACHECO, 1997, p. 36).
Além disso, pode-se ressaltar uma noção fundamental para a retórica
aristotélica é o entimema, ou silogismo lógico, que consiste em um tipo de
argumento no qual se subentende uma premissa ou uma conclusão. Silogismo, na
concepção do Aurélio (2004), origina-se do grego syllogismós, argumento, e significa
uma dedução formal tal que, postas duas proposições, chamadas premissas, delas,
por inferência, se tira uma terceira, chamada conclusão. Eis um famoso esquema de
um silogismo: Todo A é B; C é A; então C é B. Pelas análises estruturais dos
discursos do seu tempo, e consequentemente, pelos encaminhamentos
direcionados aos estudos retóricos, muitos autores, como, por exemplo, Citelli
(1997), consideram Aristóteles, um dos primeiros sistematizadores da teoria do
discurso.
A retórica, ao longo dos séculos, principalmente no final do século XIX, foi
afastando-se de sua função original, que consistia no estudo de técnicas
organizacionais do discurso e da persuasão, e passou a estar relacionada com
aspectos estilísticos, assumindo uma função meramente ornamental do discurso.
Sendo assim, na elaboração do discurso foram privilegiados os recursos de
expressão, tais como figuras de linguagem, em detrimento das técnicas de
argumentação. Para Citelli (1997), essa atitude delimita a visão negativa da retórica
como sinônimo de enfeite do estilo e vazio das ideias, que ainda persiste na
atualidade, por exemplo, encontramos as seguintes acepções para a palavra retórica
em Aurélio (2004) - adornos empolados ou pomposos de um discurso; discurso de
forma primorosa, porém vazio de conteúdo - conotações bastante difundidas pela
opinião pública do nosso tempo.
Assim, os estudos, no final da década de 50, do século XX, sobre a
argumentação (“a arte de persuadir e convencer”) retornam com vigor ao cenário
intelectual, sobretudo, a partir da publicação simultânea das obras The uses of
argument, de Toulmin (1958), e Traité de l'argumentation: la nouvelle rhétorique, de
Chaïm Perelman e Olbrechts-Tyteca (1958). Fundamentando-se nas ideias de
Aristóteles, esse último livro apresenta uma Nova Retórica ou Teoria da
Argumentação, definida nos seguintes termos pelo seu fundador, Perelman:
75
A teoria da argumentação concebida como uma nova retórica (ou uma nova dialética) cobre todo o campo do discurso que visa convencer ou persuadir, seja qual for o auditório a que se dirige e a matéria a que se refere (PERELMAN, 2005, p. 24).
De acordo com Gimeno (1986), que reflete sobre os objetivos da teoria
proposta por Perelman, afirma que esse autor não só retoma os princípios retóricos
de Aristóteles, mas também os amplia. Com isso, a autora salienta que:
A teoria da argumentação não tem como finalidade o estudo único e exclusivo de técnicas discursivas, mas sim e também o das condições que possibilitam o desenvolvimento da argumentação. A persuasão assim concebida recobre um campo muito mais vasto que o da retórica antiga. Para que haja argumentação não é necessária a presença do orador diante de um auditório. O que é imprescindível é a existência de argumentos destinados a convencer e a persuadir (GIMENO, 1986, p. 60).
Pode-se dizer que em muitas situações, empregamos as palavras
“convencer” e “persuadir” como sinônimos, no entanto, a distinção entre elas é
crucial para os princípios da nova retórica. Partindo da noção de auditório, Perelman
as distingue, explicando que o ato de persuadir se dirige a um ouvinte particular ou a
si mesmo, e o ato de convencer se dirige a um auditório universal. Parafraseando,
pois, as ideias de Perelman, no que se refere a essa caracterização, Gimeno (1986)
diz que para aquele que se preocupa com o resultado, persuadir é mais do que
convencer, e para aquele que se preocupa com o caráter racional da adesão,
convencer é mais que persuadir. Dessa forma, a autora ainda acrescenta que essa
distinção, proposta por Perelman, revela, indiretamente, a ligação que se estabelece
frequentemente, embora de maneira confusa, entre persuasão e ação, de um lado, e
convicção e inteligência de outro.
Além disso, pode-se mostrar que outra concepção fundamental para a teoria
da argumentação é a de auditório. Essa noção já existia na retórica de Aristóteles,
mas, nessa antiga perspectiva, o orador tinha obrigação de adaptar-se ao auditório.
Assim, Perelman (2005), ao contrário, defende que a regra básica para o orador é a
adaptação do seu discurso ao auditório, por isso, esse autor define auditório como o
conjunto daqueles que o orador quer influenciar pela sua argumentação. Em outras
palavras, a adesão do auditório pode ser considerada como um elemento
desencadeador da argumentação, e essa argumentação pode dirigir-se a auditórios
variados, não se limita, como a vertente tradicional grega apregoa, ao estudo de
técnicas do discurso público dirigidas a uma multidão não especializada.
76
Assim, a Nova Retórica rejeita a tradição cartesiano-positivista (ou Positivismo
Lógico), que se utiliza de um paradigma lógico na análise dos raciocínios cotidianos.
Perelman indica o uso de um paradigma de racionalidade para a sua teoria da
argumentação, assim, na visão de Zoppi-Fontana, esse filósofo:
(…) parte da distinção aristotélica entre demonstração e argumentação, restringindo o alcance do termo demonstração ao espaço dos raciocínios analíticos, isto é, aqueles desenvolvidos pela lógica formal e a matemática. A argumentação abarcaria todas as modalidades possíveis de persuasão e estaria relacionada com a aceitabilidade e verossimilhança das conclusões defendidas. O autor afirma: O objetivo da argumentação, não é, como na demonstração, provar a verdade da conclusão a partir da verdade das premissas, mas é o de transferir para a conclusão a adesão acordada [pelo auditório] às premissas (ZOPPI-FONTANA, 2006, p. 193).
Pode-se dizer que, dessa maneira, a vertente positivista renega uma solução
racional para questões que envolvam o juízo de valor, defendendo que a veracidade
de alguns fatos ou de proposições lógicas matemáticas sempre pode ser
demonstrada racionalmente, mas jamais se pode comprovar a verdade de fatos
respaldando-se em juízos de valor. Nessa perspectiva, é possível provar,
racionalmente, a veracidade de uma operação matemática do tipo 5 + 5 = 10, mas
não se prova que uma determinada atitude humana é mais justa do que outra,
porque essa comprovação depende de um juízo de valor, de uma apreciação
subjetiva do que se enuncia. Assim, para Pacheco (1997), o positivismo limita,
assim, o papel da lógica, do método científico e da razão à solução de problemas de
fundo meramente teórico, e abandona a solução dos problemas humanos à emoção,
aos interesses e à violência, proposta abominada com veemência pelo fundador da
nova retórica, uma vez que na visão de Perelman, ao argumentar, realizamos atos
de linguagem.
Assim, no discurso demonstrativo-analítico, para expor os argumentos, as
provas devem ser aceitas universalmente. Nesse discurso, emprega-se um tipo de
linguagem científica, matemática, que autoriza unicamente ideias claras, distintas e,
portanto, incontestáveis. No entanto, no discurso retórico, a adesão do auditório é
crucial para o sucesso da argumentação; nesse discurso, utiliza-se a linguagem
natural, que carrega, intrinsecamente, ambiguidades, equívocos, e,
consequentemente, múltiplos sentidos. Nessa acepção, a linguagem tem a função
primordial de incitar a ação e, para obter sucesso na argumentação, o orador deve
provocar uma forte adesão, que seja capaz de neutralizar forças contrárias à sua
intenção argumentativa.
77
Portanto, de acordo com todas essas contribuições, desde o resgate da
integridade da Retórica, que esteve relegada a um segundo plano por tanto tempo
na história, como também pelo valioso trabalho dedicado às técnicas e esquemas
argumentativos, Perelman é reverenciado como um dos mais importantes teóricos
da Retórica no século XX, seja no âmbito dos estudos linguísticos, seja nos estudos
jurídicos.
5.2 Razão e autoridade
Assim, parte integrante do discurso, o ethos propõe-se como condição
mesma intrínseca da menor ou maior eficácia dos efeitos decorrentes do
pronunciamento discursivo.
Firma-se bem como um dos recursos mais poderosos para a obtenção da
adesão do ouvinte.
Aristóteles (1959) explora cada um dos três componentes de eficácia na
argumentação, ou seja, o logos, o ethos e o pathos como fatores que tanto afetam a
razão quanto a sensibilidade e as paixões.
É do saber aristotélico a definição do ethos como “imagem de si” construída
no discurso. Se para o estagirita a ponderação, a simplicidade, a sinceridade seriam
predicados capazes de obter a confiança, para o século XXI, todavia, seria tolice
afirmar-se que a eficácia da palavra resulta apenas de elementos puramente
exteriores – institucionais –, seria mais atual propor que boa parte do sentido dos
discursos advém de sua ordem externa.
Contudo, especialmente, não se pode ignorar que em tempos ciberculturas e
redes que muito dos sentidos são fortemente constituídos também de sua ordem
interna – linguageira – donde a impossibilidade da dissociação, para nós por
enquanto, do ethos discursivo, seja no que se relaciona com a posição institucional
do locutor, seja no que diz respeito à interação social. Segundo Bourdieu (2006):
A especificidade do discurso da autoridade reside no fato de que essa compreensão não é suficiente e de que a efetivação de seu efeito depende de ele ser reconhecido como tal. Esse reconhecimento – acompanhado ou não de compreensão – só acontece sob certas condições – as que definem o uso legítimo (BOURDIEU, 2006, p. 107).
78
Tem-se em conta o fato de haver uma série de mediações na passagem do
sujeito falante como “ser no mundo” para o sujeito comunicante (projeção de si) e
para o locutor (grande parte, projeção de pesquisas exaustivas como no caso da
publicidade) como instância do discurso.
Provavelmente, por trabalhar com estereótipos, isto é, com esquemas
coletivos, como veremos, assim como com representações sociais, o ethos se torna
sócio-histórico – fato do qual se pode deduzir da sua constituição uma sintonia
harmoniosa entre uma construção linguageira e uma posição institucional.
Essa sintonia é tão regulada e tão sutil e habitual, que nos damos conta dela
quando ela rompida como em casos de discursos de humor como a interferência de
séries no discurso, normalmente causa grande estranhamento, isto, se deve
provavelmente a que os seres humanos apreciam muito para rir de situações em
que o discurso se dissocia do seu sujeito, como por exemplo, quando a serviçal imita
o discurso da patroa, ou quando o jogador de futebol aparece falando um português
de academia. Dessa maneira, o sujeito age colado ao seu ethos e os discursos
sinalizam essa indissociação, porque se o sujeito é carne e sangue do discurso, o
discurso é a sua pele, pode-se maquiar a vontade, o que não tem é como não expor.
Diante de obviedade, justifica-se a projeção do ethos no discurso para maior eficácia
à interpretação, à compreensão e à adesão.
Muito do que veremos nas análises parecem sinalizar que as representações
de leitura, de leitor e de práticas e modos de ler devem estar sinalizados das formas
mais diversas nos discursos veiculados pelas campanhas por leituras, uma vez que
elas emergem do ethos de esferas distintas de atividades e de condições de
produção. Assim, assumiremos que a eficácia de sentidos das metáforas no
discurso é tributária, em grande parte, da autoridade de que gozam os locutores,
mas é muito mais, como discursos lançados na orgia panfletária e cartazista que
reafirmam verdades, reforçam imaginários, projetam identidades que merecem ser
lembradas, para serem repetidas e reforçadas como hábitos, como modos e como
práticas engastadas em situações circunstanciadas e no discurso adequado.
5.3 A eficácia: do ethos argumentativo ao ethos ins titucional
Dessa forma, a atividade de prática de leitura orientada para análises dos
elementos do ethos, e cuja percepção podem ser, supostamente, melhor acessadas,
79
compreendidas e interpretadas com o auxílio da análise baseada em alguns
elementos da análise argumentativa (ethos, pathos, logos, inventio e dispositio)
proposta por Aristóteles (1959) e revisitada por Perelman (2005), Amossy (2011) e
Ducrot (1989). Segundo Menezes (2001) citando Plantin, os criadores da retórica,
Córax e Tísias ensinavam que a eficácia dos argumentos, diziam, repousa sobre o
verossímil – o que é aceito pela opinião – e, definiram a retórica como a criadora da
persuasão.
A verossimilhança se entendida como aquilo que se apresenta como na vida
real. Diálogos e personagens, por exemplo, precisam cuidar do modo de falar tal
qual as pessoas o fazem para a obtenção de credibilidade, fundamental para a
katarsis. E com base no que se chamaria hoje, de estudos de caso, produziam
simulacros de situações e possíveis inferências sobre as resoluções possíveis de
encenações discursivas para encenar as mais diversas possibilidades de construir
um discurso “capaz de produzir persuasão”, convencimento, convicção segura de
imagens mentais e linguísticas para produzir efeitos de verossimilhança sobre as
crenças, os valores, sobre a comoção, sobre as vontades e os desejos que movem
as pessoas a fazerem algo por alguma coisa. No caso das campanhas publicitárias,
o desejo de adquiri um dado produto, certamente que para muitos gêneros, o
jurídico, o economês, por exemplo, a ideia de verdade identificava-se com o êxito.
Sendo assim, uma grande contribuição está no fato de se buscar agir
comunicativamente para mudar convicções e afirmar outras no lugar, mais ou menos
como as empresas de produção de tabaco e álcool, por exemplo, que buscam firmar
novas marcas, novos nomes para os mesmos produtos. Talvez, pareça absurdo
comparar tais esferas econômicas o da venda de livros, que supostamente está
sempre do lado do bem e da humanidade, com outras vendas de produtos
maléficos.
É claro que, além de refletir sobre as dificuldades, é preciso também construir
pontes, ligações, despertar as paixões necessárias à adesão ao projeto, uma vez
que, a própria eficácia argumentativa relaciona-se à capacidade de discernir esses
auditórios, possibilitando aumentar a intensidade da adesão e desencadeamento de
uma ação (positiva ou abstenção) ou disposição para agir.
Assim, para a análise de discurso, um aspecto de uma ação linguística que
objetiva a comoção, a mobilização, a motivação criadora de uma imagem positiva de
si, do terceiro e do outro e que pese os elementos da vontade de poder para fundar,
80
instalar, ou seja, para ser aceita de boa fé ou boa vontade e criar a convicção
necessária para agi-lo.
Para Menezes (2001) quem faz a ação comunicativa precisa buscar conhecer
bem as características do auditório para ser capaz de construir dele uma imagem
que lhe permita presumir o pathos que o constitui. É uma construção idealizada com
maior ou menor grau de precisão, dependendo sempre da quantidade e da
qualidade do conhecimento e das informações que o locutor dispõe sobre o
interlocutor.
Nesse ponto, há que se convir que se existe um gênero em que esse outro é
pesquisado, entrevistado, segmentado em suas feições psicológicas, sociológicas, é
no gênero publicitário. Gastam-se milhões no mundo inteiro com publicidade, não se
elege nem um mesmo um presidente popular sem um talentoso marketeiro.
Ou seja, de certa forma, aquilo que é posto e dito em campanhas publicitárias
é fruto de imaginários pré-pesquisados, e só fazem reforçar o que já está no
imaginário das pessoas e que refletem suas práticas, seus modos de ler, suas
concepções de leitura. Ainda bem que nesse mundo denominado mercado,
inventaram a concorrência, e cada uma delas deverá ser diferenciada em suas
idiossincrasias, em suas missões e em suas visões. Se for fácil conhecer esse outro
nessas esferas da atuação humana em que imperam as regras do consumo de
felicidade, por exemplo, para entupir estantes e ouvidos com Literatura de
autoajuda, que é o que mais vende no Brasil e no mundo, por exemplo. Então,
poderá ser verdade para fins mais nobres e humanos.
É claro que não podemos esquecer-nos de outros fatores que auxiliam a
construção da eficácia na argumentação é que levam o locutor à pesquisa por
conhecimentos de elementos como o pathos, também capazes de comover e,
assim, ativar o querer e o fazer do interlocutor. E esta eficácia é em grande parte,
oriunda do conhecimento que locutor é capaz de agenciar para as energias, os
esforços e as crenças do interlocutor.
Todavia, há no campo dos estudos da argumentação, uma linha de estudos, a
Argumentação na Língua, Argumentation Dans La Langue, formulada por Oswald
Ducrot (1999), e que chama atenção para os aspectos, digamos, “mais internos” à
língua e que podem influenciar, em termos dos parâmetros deste trabalho, a
pesquisa por princípios de eficácia e a eficiência que colaboram para a emergência
dos sentidos pretendidos pelo autor com o discurso.
81
De acordo com Menezes (2001) citando Maingueneau, se se sabe de
antemão que os conectores linguísticos explicitam ligações lógicas, uma vez que
ligam proposições a enunciados (...) enunciações a proposições (...) enunciados a
elementos da situação extralinguística ou a reações não ditas que o locutor atribui a
si mesmo ou ao destinatário. Se se confirma isso, certamente, que a análise precisa
considerar também esse olhar, essa visada que busca focar a análise na presença
dos conectores lógicos.
Implicitados ou explicitados no discurso, os conectores podem ser usados
como “estratégias para agir sobre o outro”. Certa experiência nos diz que o uso
explícito dos conectores colabora mais para eficácia, e certamente que a
implicitação pode ser utilizada como recurso, mas é também certo que a ausência
de marcação explicita transfere o eixo da atividade de sua característica
referenciadora, parte da responsabilidade do locutor para a perspectiva de leitura do
interlocutor, ou seja, abre-se o sentido para todo tipo de atividade inferencial.
E mais, a análise do discurso auxilia a pensar alguns limites para a leitura
quando valoriza a língua em outras dimensões ao dizer que “nem toda interpretação
é possível, pois as palavras da língua possuem um conteúdo semântico definido”.
Por outro lado, a impossibilidade de alguma interpretação não decorre
necessariamente do fato de se ter conteúdo semântico definido, ou seja, as leituras
podem redefinir o conteúdo semântico em alguma extensão.
Assim, pela análise do discurso da língua, o interesse investigativo da análise
descola-se da análise retórica em grande parte, visto que a presença do ethos e do
pathos, agora veio caracterizar-se no logos, especialmente nos conectores e nos
operadores de argumentação que servem como indicadores do potencial
argumentativo da frase.
Com essa visada percebe-se a importância da argumentação na língua para
os estudos propostos, pois de acordo com Menezes (2001) se trata de formulações
linguísticas que não são orientadas pelo pensamento ou pela realidade, todavia por
sequências ideais do discurso. A palavra utilizada fornece uma orientação
argumentativa e o alocutário percebe no enunciado. E mais, pode-se postular que há
uma equivalência entre sentido e a intenção linguística do enunciado.
Busca-se localizar orientações semânticas argumentativas em aspectos
lexicais (dos adjetivos, por exemplo, e sua capacidade qualificadora), da frase e dos
encadeamentos semânticos inerentes a esses elementos. Interessante é que parece
82
lógico demais, mas porque pensaríamos a língua em termos de classes de palavras
e a cada uma atribui-se capacidade semântica própria?
Certamente, é mais que isso o que está jogo, se se considerar que para
Menezes (2001) a argumentação constitui-se no traço fundamental da linguagem.
Eles, os elementos ligadores, não podem ser empregados sem que se pretenda
orientar o interlocutor, pelo simples fato de que a língua em si possui uma orientação
argumentativa.
Certamente que se a argumentação em que se explicitam bem as ligações
pela presença dos marcadores argumentativos, como os conectores, por exemplo,
produzirá maior eficácia para os textos ordinários e provavelmente produzirá o
mesmo efeito para a maioria dos casos dos textos extraordinários.
Além da preocupação com a análise dessas marcações, análise da teoria da
argumentação da língua amplia sua visão desses objetos argumentativos, e propõe
considerar também as contribuições das teorias dos “topoï”. De acordo com
Menezes (2001) citando Anscombre, estes representam os trajetos (argumentativos)
que devem ser obrigatoriamente percorridos para alcançar uma conclusão
determinada, a partir da ocorrência da frase “concordam que se encontram ligadas
aos lugares comuns” aquilo (crenças, valores, hábitos, atitudes) que a comunidade
linguística autoriza.
Entretanto, de um ponto de vista puramente linguístico, o logos manifestado
pelos encadeamentos discursivos argumentativos não são completados por fatores
outros como o pathos e o ethos.
5.4 Ethos e Doxa – eficácia do discurso na autorida de do locutor
O fato é que a eficácia dos parâmetros de construção do ethos só pode ser
medida em função das reações do auditório, que é em última análise o alvo de
qualquer discurso persuasivo, o que implica dizer que a construção do ethos do
enunciador deve estar dialeticamente associada a uma projeção discursiva de
disposições afetivas relacionadas ao pathos do auditório, de modo a se estabelecer
uma relação de empatia numa dada situação de interação.
Ruth Amossy (2011) citando Bourdieu em que este critica Austin em “O que
falar quer dizer”, nos lembra das críticas. À noção de uma força ilocucionária que
83
deriva dos performativos4 ou, de maneira geral, dos atos de linguagem, o sociólogo
opunha um poder exterior ao verbo, ancorado nos quadros institucionais e nos
rituais sociais.
Assim, Bourdieu (2006) argumenta que o poder da argumentação não está
nas palavras5, a autoridade destas não depende da imagem de si que o autor produz
em seu discurso, mas de sua posição social de autoridade legítima que participa de
uma troca social. Uma troca social sem dúvida não pode ser reduzida a ações
comunicativas.
Na verdade o poder das palavras deriva da adequação entre a função social do locutor e seu discurso: o discurso não pode ter autoridade se não for pronunciado pela pessoa legitimada a pronunciá-lo em uma situação legítima, portanto, diante dos receptores legítimos (AMOSSY, 2011, p. 120).
Essa autora propõe uma solução de conciliação entre as propostas da análise
pragmática que analisa o locutor e o modo como ele se engaja na interlocução
construindo uma imagem de si.
Se nos tempos antigos, bastava a projeção que o locutor fazia de seu ethos
para assegurar a eficácia, nos estudos atuais a eficácia é percebida dentro dos
“quadros sociais da argumentação” que conduzem a doxas comuns constituídas de
crenças, valores no nível profundo dos textos, mas na superfície da consciência para
poder aceito profundamente.
Assim, funciona a lógica de constituição de doxas comuns, e, assim, o ethos é
condicionado pela cena da enunciação ou do contrato de comunicação. Para Ruth
Amossy (2011) citando Bourdieu:
(...) a ação exercida pelo orador sobre seu auditório não é de ordem linguageira, mas social; sua autoridade não depende da imagem de si que ele produz em seu discurso, mas de sua posição social de suas “possibilidades de acesso à palavra oficial ortodoxa, legítima” (BOURDIEU apud AMOSSY, 2011, p. 119).
O fato é que, como disse Maquiavel, para quem propõe a ocupar o lugar no
poder, para manter-se nesse lugar de poder, precisa justificar-se, fazer-se ver a
4 Embora Bourdieu tenha apontado esse fato como uma crítica a Austin, entendemos que o próprio Austin mostrou a necessidade de desvincular força ilocucionária da presença de performativos. 5 Também essa não parece ser uma crítica que possa ser reconhecida no texto de Austin: a existência de um ato não depende apenas das palavras que compõem uma proposição, mas de condições que são impostas aos interlocutores e as condições enunciativas.
84
exercer o poder, gerar opinião, decidir-se por fatos que auxiliem a realizar as
promessas das campanhas.
Dessa forma, talvez se deva pensar num modo de análise que integre as
pretensões da retórica pela focalização da eficácia da palavra projetada pelo ethos e
as condições pré-discursivas que legitimam a tomada de palavra por um agente para
realizar uma ação e uma designação. A “autoridade exterior” de que se vale o
emissor e o faz surgir como pessoa “autorizada” para construir o discurso eficiente e
eficaz a que se propôs representar. Mas, é visão ainda mais distante das pretensões
de Bourdieu, pois para o sociólogo a fala é “concentradora de capital simbólico” do
qual o locutor se faz como mandatário da comunidade que representa. Para
Bourdieu (2006) a “eficácia simbólica das palavras” está na instituição do
reconhecimento pelo receptor.
Se por um lado, reforçam-se as ideias de Michel Foucault (2003) em que este
explica como as sociedades desenvolvem seus mecanismos de exclusão de
discursos: a proibição, a interdição e vontade de verdade. Pela proibição, ficam
bastante claras as vinculações que as instituições procuram desenvolver para
controlar o fluxo de alguns discursos e a repressão a outros. A proibição é
desmembrada em três corolários bem contundentes:
a) não se tem o direito de dizer tudo;
b) não se pode falar de tudo em qualquer circunstância;
c) qualquer um não pode falar de qualquer coisa.
Procurando conciliar essas visões, concorde-se que a eficácia da palavra
depende de quem a enuncia, daquilo que ela enuncia e do valor conferido a ambos
pelos participantes da situação comunicativa. Ruth Amossy (2011) propõe que
tomemos o discurso em dupla visada. De um lado a eficácia discursiva depende de
uma dimensão “interacional” e só podendo ser compreendida dentro da troca em
que os participantes se envolvem. E de outro lado, pode-se pensar a eficácia da
mensagem por realizar também uma dimensão institucional em que as trocas se
apresentam indissociáveis “das posições ocupadas pelos participantes”.
Sendo assim, uma visada pragmática, segundo Amossy (2011) se interessa
pelos dispositivos da enunciação e não por considerar os rituais sociais envolvidos
na prática linguageira. Para a autora, é possível conciliar os dois pontos de vista
85
teóricos, se tomados de forma a se complementarem, a partir da perspectiva da
“nova retórica” de Perelman (2005). Assim, o ethos é definido como um fenômeno
discursivo que não deve ser confundido com o status do sujeito empírico, diferente
do “ser do mundo”. Portanto, a noção de ethos associa-se a noção de “ser de
discurso”, é desse ponto de vista que o ethos se apresenta condicionado pela cena
da enunciação, por uma cenografia.
5.5 Ethos e boa fé dos quadros sociais da argumenta ção
O que faz com que pedestres atravessem a rua com calma e tranquilidade,
enquanto os automóveis se detêm diante do sinal? Ele crê que permanecerão
parados até que se faça o sinal verde para eles? O que faz com que ríamos das
graças do humorista, que sorriamos das ironias dos poetas? E não façamos nada
disso diante das intenções e objetivos de um texto de comunicação empresarial?
O que faz com que cidadãos aguardem com civilidade e paciência que a justiça um
dia seja eficiente, e ninguém se transforma em bandido ou em agente da lei dada a
ausência da justiça no Brasil?
Será isso que faz com a eficácia esteja no fato de que o discurso deve ser
produzido e desenvolvido para um público especifico, como na publicidade, no
marketing político e não um público ideal (como na ciência ou nas artes), visto que a
argumentação precisa se desenvolver em “função do auditório” ao qual o locutor
deve procurar se adaptar, operando com aquilo que é reconhecido como
“necessário, verdadeiro, como normal, verossímil ou como válido”, relevante ou bom
para aquele público escolhido, filtrado, medido e testado. Aquilo que a teoria da
argumentação formula como capaz de elucidar o conjunto de valores, de evidências
e de crenças, ou seja, “uma doxa”.
Sendo assim, outro elemento importante da análise do discurso pelos
parâmetros da argumentação está na preocupação com a construção da “doxa”, em
que esta emerge como um dos elementos apontados como de grande eficácia na
argumentação: a capacidade de o locutor construir, apontar, designar uma doxa que
o aproxime do interlocutor. Dessa forma, os polos da conversa são sutilmente
invertidos, pois agora a argumentação que busca levar o auditório a aceitar as
conclusões das premissas, apoiando-se em topoï, isto é, no senso comum, no bom
86
senso em resumo, na boa fé do auditório em suas pregnâncias, latências e
saliências.
Desse ponto de vista, o auditório é uma criação do locutor na proporção em
que este constrói a sua própria imagem em função da imagem que projeta para si do
seu auditório. E a doxa é da visada da boa fé, em que se movem representações de
um orador com autoridade para construir sua imagem de credível e confiável para
um interlocutor mais inteligente que ele e que também elabora imagens dele com
base em representações que têm sobre o orador.
Assim, de um lado, se são as projeções do ethos discursivo que garantem
grande parte da eficácia da argumentação, deve-se ter clara a necessidade de se
elencar um conjunto de características constituintes da pessoa, do orador e da
situação em que os traços possíveis de uma doxa de manifestem e permitam
construir a imagem eficiente para o efeito pretendido.
Assim, como diz Amossy (2011) sobre a doxa e a imagem que ela projeta, e
que é preciso ver nessa imagem alguma singularidade, é necessário ver que a
reconstrução se efetua com a ajuda de modelos culturais que facilitam a integração
dos dados em um esquema preexistente.
Certamente, que em muitos casos, a eficácia de um ethos discursivo se
apresenta complementando e estabelecendo relações de reciprocidade para
sustentar e ser sustentado por um status institucional correspondente, uma vez que
a coerência e a relevância são itens mais testados para conferir veracidade ou
verdade a uma argumentação. É evidente que não dá para separar de forma
simples, uma vez que atuam no humano e agem em conjunto. Mas também não dá
para não perceber que se trata de elementos distintos.
Só o discurso propicia oportunidade para redefinir o ethos pré-discursivo, por
exemplo, quando é relevante para melhorar, confirmar, esclarecer posicionamentos
durante a negociação, porque o discurso é usado para elaborar a imagem de si que
o locutor precisa que seja aceita pelo interlocutor. Assim, a relação ethos, imagem
de si, e imagem institucional, projetada sobre si, pelo meio social, grupo, tribo,
comunidade é uma relação a ser bem pensada sempre que se tem em vista a
eficácia.
Amossy (2011) nos convida a pensar uma ancoragem social do dispositivo
enunciativo que ilumina a análise interna do discurso, se levarmos em conta que
para perceber-se o efeito da eficácia do ethos está na passagem entre o que ele
87
propicia perceber no locutor enquanto construção discursiva e a presença do sujeito
enquanto um ser no mundo e que detentor de um capital simbólico do qual é
socialmente investido.
Há imagens que conferem autoridade, como quando a fala de si precisa estar
legitimada para tomar a palavra em situações legitimas convenientes com o gênero
da intervenção planejada para ser entendida pelo público que confere e reconhece
essa legitimidade. A eficácia se ancora no status institucional do ser no mundo que
legitimamente lança mão de uma construção verbal do locutor como ser do discurso,
posições que se complementam e se reforçam mutuamente.
Todavia, Amossy (2011) nos propõe pensar a complementação uma vez que
a eficácia da palavra não é nem puramente exterior (institucional) nem puramente
interna (linguageira). Ela acontece simultaneamente em diferentes níveis. Nesse
caso, não há como separar o ethos discursivo da posição institucional do locutor,
nem dissociar totalmente a interlocução da interação social como troca simbólica.
O que intermedeia a passagem do ethos discursivo ao sujeito comunicante,
instância real no mundo, são uma série de conexões: a posição institucional, a
legitimidade conferida que possibilita suposições prévias que constituem o ethos
pré-discursivo e que está no repertório de elementos dóxicos culturais dos
interlocutores. Dessa forma, fica claro que pelo menos como início, algumas
garantias de eficácia são fornecidas pela doxa quando compartilhada por locutor e
interlocutor.
Assim, entre a percepção de maiores pregnâncias, saliências ou latências
desse ethos institucional em relação ao discurso, a autoridade do locutor é legitima e
é legitimada pela produção discursiva na troca verbal. Esse ethos prévio atua para
ser confirmado ou para ser modificado (ou ainda para ser denegado) e ele se
manifesta no interior da cena genérica, na qual o locutor projeta uma imagem de si,
relativa e condicionada à distribuição de papeis preexistentes e se funda nos lugares
comuns do auditório ou, ao menos, nos que o locutor lhe atribui.
Esse, por assim dizer, nos termos da autora, estereótipo se deixa apreender
tanto no nível da enunciação (um modo de dizer) quanto no enunciado (conteúdos e
temas). Essa imagem de si, veiculada pelo discurso é constitutiva da interação
verbal e determina, em grande parte, a capacidade de o locutor agir sobre seus
alocutários. Mais uma vez, é de Amossy, um comentário por uma análise integradora
quando diz que:
88
Uma construção discursiva em um quadro interacional se articula, ao mesmo tempo, com a pragmática e com a reflexão sociológica. A primeira permite-lhe trabalhar a materialidade do discurso e analisar a construção do ethos em termos de enunciação e de gênero de discurso. A segunda permite-lhe não somente destacar a dimensão social do ethos discursivo, mas também sua relação com posições institucionais exteriores. Um continuum se estabelece, com as rupturas de níveis que se impõem entre o locutor no discurso, a imagem prévia do locutor como ser no mundo. A construção discursiva, o imaginário social e a autoridade institucional contribuem, portanto, para estabelecer o ethos e a troca verbal do qual ele é parte integrante (AMOSSY, 2011, p. 137).
No caso dos cartazes de campanha em análise, há uma aproximação entre o
ethos discursivo e o ethos institucional, pois se é certo observar que a fala dos
sujeitos é tomada de dentro do contrato de comunicação social, e daí, a posição dos
sujeitos no campo é que indicaria a delimitação no aspecto verbal.
O que os sociólogos veem como anterior à fala é a presença da autoridade
que a fala “manifesta e simboliza”. É provável que o status dos interlocutores seja
levado em conta na hora de sintonizar a mensagem, e certamente que o status
delimita a autoridade do locutor, mas pode delimitar em muitas circunstâncias sua
tomada de palavra. Visto que a autoridade do locutor provém tanto de seus status
exterior e das modalidades da troca simbólica da qual ele participa. Ela é também
produzida pelo discurso em uma troca verbal que visa produzir e a fazer reconhecer
sua legitimidade.
Por isso é preciso considerar as estratégias de posicionamento dos autores
em seus textos e discursos em relação aos campos em que eles atuam e se
projetam, e ao se projetar, projetam também força e autoridade, elementos
indissociáveis da luta pela autoridade no sentido de que fala Amossy (2011) citando
Bourdieu. Na mesma linha de pensar, agregue-se Amossy (2011) citando o Michel
Foucault, para quem a eficácia da palavra está ligada ao personagem
estatutariamente definido que tem o direito de articulá-la.
Amossy (2011), ao citar Maingueneau, lembra que as tomadas de posição se
efetuam por meio da escolha de um gênero e da instauração de uma cena de
enunciação (a cenografia) e esta última permite a articulação entre o campo literário
(o mundo) e o discurso (a obra). Assim, a cenografia, para Maingueneau, mais que
um procedimento textual é um dispositivo que permite articular a obra àquilo de que
ela provém: a vida do escritor, a sociedade.
89
Na busca por integrar imagem discursiva e imagem institucional, há que se
considerar a apreciação que Amossy (2011) faz da contribuição da sociopoética de
Viala, segundo a qual, o locutor ao partir de um gênero, determina no discurso
atitudes ou maneira de ocupar uma posição.
Amossy (2011), também citando Viala, nos lembra de que pode haver
elementos no texto (notícias, por exemplo) que instauram estratégias textuais que
constroem uma imagem do escritor. Dessa forma, locutores podem apresentar
elementos como simpatia por esta ou aquela causa ou ideia que denunciam a
adesão, a intencionalidade e os objetivos, ou mesmo por oposição. O que de fato
importa é que o ethos do locutor pode ser sugerido por atitudes, maneiras de ser,
hábitos, reflexos culturais incorporados, adquiridos.
Assim, avança-se um pouco mais na formulação da eficácia relacionada aos
cuidados com o ethos (nas suas três instâncias de pré-discursivo, projetado e
comentado) para nos fazer pensar que nesse instante não se trata mais de uma
imagem de si no discurso, mas do conjunto das atitudes mostradas tanto no discurso
quanto nos posicionamentos do ser empírico. A construção discursiva a partir de
elementos da obra e também da trajetória de biografia profissional e intelectual, que
pertence tanto ao verbal quanto ao institucional.
Sendo assim, processos de “persuasão”, como quer a análise argumentativa,
conduzem a processos de “adesão”, o que produz um deslocamento importante na
noção de eficácia discursiva, uma vez que, a persuasão cede espaço para a adesão,
por ser esta definida como:
A certeza partilhada por um grupo de sua maneira de ver é a única válida. Nesse momento o ethos se torna um instrumento de adesão na medida em que propõe uma imagem de si que se confunde com um hábitus: ele apresenta maneiras de falar e de pensar, um modo de ser que permite o reconhecimento e a integração no grupo onde se assegura a dominação (AMOSSY, 2011, p.89).
É claro que não se encontra a eficácia absolutamente isolada no discurso,
nem no outro lado somente na autoridade do locutor, mas no ponto em que se
complementam e se distribuem, pois, para termos sentido humano, nos
necessitamos de um cérebro humano operando em um corpo humano vivo
interagindo continuamente com um ambiente humano que é, ao mesmo tempo,
físico, social, e cultural.
90
Sendo assim, se os dois fenômenos e também conceitos, adesão e
persuasão, podem ser vistos de formas distintas, também podem sinalizar diferenças
para se pensar em termos de eficácia e eficiência. É claro que como quer
Maquiavel, sujeitos assumem posições nas esferas e campos sociais em que atuam
e na luta, não só para alcançar status próprio, mas também para manterem-se e,
para manterem-se as condições do poder pelo qual competem, necessitam fazer
escolhas discursivas.
Mas é claro, também, que nesse jogo social em que campos de força se
opõem e competem, o ethos não vai ser qualquer exercício de fala, mas de falas
significativas, e nem vai ser visto como um jogo que se joga fora da linguagem.
No fundo, tudo favas soltas no caminho seco e pedregoso, nada, discurso
nenhum, da lei à moral, do religioso ao científico, nada é capaz de deter as insânias
da economia política e das guerras, nem o absurdo do consumismo ou, os da
política nas esferas superiores da vida na república. O que também preocupa é que
não parece haver discurso ou resquício de racionalidade capaz de apagar a vaidade
e o egoísmo nas esferas internas psicológicas e do desejo humano. Os discursos
autoritários da vaidade e da competição não conhecem nem reconhecem limites ao
exercício do poder discricionário. Seja no exercício global, seja nas ações locais,
seja no nível individual, seja entre grupos, sociedades, enfim, em todos os níveis da
interlocução não há discursos capazes de deterem tais loucuras que só ajudam a
empurrar o mundo para situações adversas.
Fato é que nenhum dos grandes discursos é capaz de atuar contra o
militarismo, a burocracia e o liberalismo. Contra estes nada revela poder, nem os
discursos religiosos, nem os de autoajuda, nem os pacifistas, nem os ambientalistas.
Em tudo, há como propõe Michel Foucault (2003) quando nos explica que as
sociedades instituem suas formas de excluir, impedir e fazer valer a vontade de
verdade para realizar a exclusão social.
Assim, espera se combinar uma análise sociológica que não anule a análise
do discurso, porque se a primeira desvela a leitura de um suposto real que age por
trás das palavras, ou até mesmo sem elas; a segunda, baseada na teoria da
argumentação, procura aliar-se às correntes mais antigas do pensamento ocidental
e que pressupõe a quimera da ideia de “livre arbítrio”, de uma possível livre escolha
constituída por normas de racionalidade e, por isso, valoriza a “eficácia da palavra”.
E por extensão, tratou-se de situações em que um “dizer” se torna um “fazer” à
91
medida que realmente demonstra sua força, isto é, a capacidade de agir sobre o
auditório, fazendo com que aceite as teses do locutor e, também, a necessária
mudança de comportamento.
Para as teorias, entretanto, há que se que admitir que locutores influenciam a
opinião se , no momento oportuno, produzirem no discurso imagens adequadas de
si que sejam capazes de fazer os interlocutores traduzirem em atos as operações
pretendidas, visto que a construção discursiva de uma imagem de si pode conferir
ao orador a sua autoridade, isto é, o poder de influir nas opiniões e de modelar
atitudes. Outras teorias linguísticas, como as de abordagem pragmática, também
consideram a importância de um poder presente na linguagem que produz efeitos
sobre o interlocutor na instância enunciativa da troca verbal. Assim, o discurso
realiza e revela sua constituição e seu caráter de representar, comunicar e propiciar
a interação social.
Dessa forma, para realizar a análise de algumas campanhas publicitárias
cujos objetivos são fisgar a atenção dos leitores consumidores e para isso lançam
mão de estratégias discursivas calcadas em identidades de leitor e de leitura. Assim,
propõe-se uma tentativa de integrar as análises das imagens discursivas e do status
institucional, estabelecendo as bases de uma reflexão que proponha um trabalho
fundado, por um lado, nos estudos da enunciação que considera que a instância do
locutor compreende:
a) posições implícitas assumidas pelo “ser empírico” no enunciado;
b) imagens pré-discursivas do locutor;
c) imagens construídas no discurso de si e do outro”.
E, por outro lado, uma leitura de estereótipos, esquemas coletivos e
representações sociais e culturais que a teoria sociológica estuda como aspectos
sociais e históricos derivados de usos do senso comum, da opinião, das crenças e
dos valores sociais, cimento naturalizado da sociedade.
Análise do discurso e elementos da análise sociológica, ambos buscam pela
noção de eficácia dos discursos ou dos papéis sociais.
E, desse quadro de análise que busca integrar alguns elementos da análise
sociológica e alguns outros da análise argumentativa para, no gênero publicidade,
demonstrar as interações verbais que articulam dimensões discursivas e
92
institucionais do ethos ao mesmo tempo verbal, psicológico e social instalados em
seres humanos, dotados de cérebros humanos que operam em corpos humanos
que interagem em ambientes humanos capazes de sentido físicos, sociais e
culturais.
Após essas colocações, e se ainda estivermos ao lado de Aristóteles, no que
ele acusa a sofística de praticar a “arte da enganação e dominação”, já que enfatiza
aspectos acessórios e exteriores à arte/técnica em detrimento do conhecimento de
seus fundamentos que são as provas, dependentes e independentes do discurso, e,
ainda, por utilizar esquemas argumentativos falaciosos, sustentados em premissas
e/ou conclusões falsas.
Como o ethos institucional e o ethos discursivo se cruzam na análise para
produzir o efeito de eficácia, traduzindo em eficácia do ethos da mensagem e em
eficiência do ethos discursivo na mensagem, o que pode auxiliar a perceber as
armadilhas dos sistemas - estatal e empresarial - e assim nos fazer perceber a
necessidade de desenvolver um olhar para localizar representações de ações de
leitura, de visões de leitor e de discurso; e de práticas que se traduzem em modos
de ler.
Na vida acadêmica, disciplinas delimitam campos, modos de ver os objetos e
os seres (como quer a filosofia), ou como diz Michel Foucault (2003), recortam
campos e impõem os recortes para se afirmarem como instrumento de exclusão
social. Mas, produz também, corpus recortados o quais dificilmente se poderia
recompor integral, total e unitariamente.
Ademais, não nos esqueçamos de que os campos que as disciplinas recortam
e protegem são também conduzidos e estruturados por seres humanos vaidosos e
dotados de vontade de poder.
Assim como no casamento, mesmo sendo impossível de manter, também
não se sabe bem a capacidade humana de superar tais desafios ditos impossíveis,
como áreas do conhecimento se entenderem e se desentenderem com extrema
facilidade e sangue frio.
Todavia, é preciso tentar o impossível sempre, podemos talvez aceitar, o
que é comum entre as teorias, que campos de estudos definem práticas, ou as
esferas, disciplinas de onde emanam e por onde circulam os sentidos.
93
6 ANÁLISE INTERDISCURSIVO-ARGUMENTATIVA DO GÊNERO PUBLICIDADE
O texto publicitário se caracteriza como um feixe de traços ambíguos que se
evidencia dentro do contexto; é notório afirmar que este campo, cada vez mais, se
destaca por sua abrangência, por sua aplicação como forma de estudo, pesquisa e
aprendizagem.
As publicidades que circulam na mídia, em outdoors ou em outros meio de
comunicação, são carregadas de figuras de linguagem, sentidos diferenciados e
acima de tudo são vistas como formas de persuasão ao leitor.
Podemos perceber que a publicidade ao mesmo tempo em que mostra o seu
produto, também procura fascinar o seu possível consumidor.
A publicidade o torna cúmplice de seu próprio objetivo que é a compra do
objeto, ou a ação de determinado ato, entretanto, a fonte de nossas pesquisas está
centrada nas causas e consequências que isso pode ocasionar o que leva tal
publicidade a ter determinada característica, analisando-a e comparando-a com os
diversos pontos de vistas expostos pelos autores já citados aqui em nossos estudos.
Constata-se também a ideia de que um dos elementos que contribuem para a
produção de sentidos e construção da publicidade, é essencialmente heterogênea,
histórica e ideológica, e se finda como um interessante campo de estudo para a
Análise do Discurso.
Levando em consideração todo o corpo teórico discutido até aqui,
passaremos às análises interdiscursivo-argumentativas das publicidades
selecionadas para esta pesquisa, com o intuito de mostrar as abordagens teóricas
discutidas anteriormente.
Nesse sentido, destacaremos como a linguagem publicitária, verbal ou não-
verbal, possui um cunho político e social, em sua maioria, carregada de criticidade
em que essa linguagem é reflexo de suas condições de produção.
Assim, as publicidades têm características dentro de um contexto sócio-
histórico-ideológico reveladas pela linguagem concebida como forma de ação sobre
o mundo, dotada de intencionalidade, vinculadora de ideologia e respaldada pelo
poder de interdiscursividade.
Vejamos as análises das peças publicitárias selecionas para o
desenvolvimento desta pesquisa.
94
6.1 Aspectos argumentativos
6.1.1 Análises da peça publicitária da TAM
Ao iniciar a análise do corpus desta pesquisa, vale lembrar que esta análise
será dividida em duas partes: a primeira enfatiza campanhas publicitárias que
abordam aspectos argumentativos; já a segunda refere-se às campanhas
publicitárias com enfoque em padrões de interdiscursividade. Dessa forma, as duas
partes da análise desse corpus ressaltarão não só a temática, mas também recursos
linguísticos que compõem a argumentação, assim como a força ideológica e os
recursos de interdiscursividade que estão presentes em cada uma delas.
Sendo assim, é natural observarmos, ao longo do tempo, que, no dia-a-dia,
fazemos leitura com base nas experiências vividas; associamos fatos não por sua
semelhança, mas por sua contiguidade no tempo e no espaço. Os sintomas das
doenças são signos indicativos para os médicos. Trajes e objetos de uso – terno,
saia, sombrinha, chapéu e bengala – são índices na entrada de instalações
sanitárias. Aliás, na entrada de instalações sanitárias é comum estarem combinados
ou alternarem-se símbolos (Damas, Senhores, Cavalheiros, Senhoras) com o índice
(chapéu, bengala, leque sombrinha, etc...) ou ícones: imagem de homem ou mulher
e até estátuas. Combinações, assim, encontramos também com certa frequência em
textos de publicidades. Vejamos:
Figura 2 - Campanha publicitária da TAM
Esse texto enfatiza uma das temáticas levantadas desde o início de nossa
pesquisa – a interdiscursividade. Percebe-se que o jogo de imagens mostra o
Fonte: AZEVEDO, 2007
95
diálogo entre os textos. Numa análise indutiva, encontramos a figura do leque,
contendo outras imagens que sugerem significados expressivos. A imagem do leque
dá uma relevância à cultura espanhola, que é ratificada com a presença das
pessoas dançando ao fundo, uma forma de representação dessa cultura. Outro
ponto a se destacar dessa interdiscursividade é a presença das cores que mostra
certa relação entre a cultura espanhola e a empresa aérea as quais possuem as
mesmas cores. Quanto aos elementos argumentativos, esse texto ressalta a
presença de um ethos de uma empresa aérea que além de valorizar a cultura “Arte,
história, beleza e tradição num só destino” facilita aos seus usuários o acesso a
esta, ressaltando a finalidade do cliente “você nasceu para voar”. Com isso, também
é construído um pathos do cliente, pessoa livre, independente “nasceu para voar”.
Dessa forma, a formação dessa publicidade foi desenvolvida, através de
elementos que dialogam entre si, com o propósito de ressaltar tanto a cultura de um
determinado povo, como as facilidades que essa empresa aérea proporciona aos
seus clientes. Assim, percebemos que essa publicidade procura persuadir o cliente,
através de uma representação social de valorização da cultura espanhola, com um
jogo ideológico de elementos icônicos. Portanto, esse texto corrobora com as
questões levantadas por Bakhtin no âmbito da interdiscursividade, em que
percebemos um entrecruzar de discursos presentes na publicidade acima.
6.1.2 Análises da peça publicitária da MINISSÉRIA A MAZÔNIA
Figura 3 - Campanha publicitária da Minissérie Amaz ônia
Retomando as categorias levantadas na publicidade anterior, vemos que
existe certo diálogo entre ambas, visto que elas têm uma formação discursiva de
Fonte: PEIXOTO, 2005
96
valorização de uma determinada cultura, além de ambas procurarem uma interação
com o seu interlocutor. A segunda publicidade ressalta os povos que habitavam a
Amazônia no início da colonização do Brasil. Assim, pode-se dizer que há uma
relação interdiscursiva entre essas duas campanhas publicitárias. Observa-se
novamente a presença dos elementos icônicos: a imagem da floresta, a priori,
camufla a imagem dos personagens, uma forma de interação entre a Amazônia e os
seus habitantes e, de certa forma, uma maneira de despertar a curiosidade dos
interlocutores desta publicidade. Além disso, pode-se salientar que o uso do verbo
“esconder” é uma forma de diálogo com a figura da floresta em que esta camufla
tanto os seus habitantes como suas riquezas naturais.
Portanto, os elementos discursivos desta publicidade destacam uma
intencionalidade de construir um ethos de que a Amazônia é misteriosa, guarda
grandes riquezas e histórias e, com isso, faz uso de um ato de fala diretivo, ou seja,
de convite ao interlocutor, para que este venha a descobrir as histórias que existem
na floresta.
Assim, observou-se que esta publicidade, assim como a anterior, utilizou um
jogo de elementos icônicos e linguísticos com o intuito de estabelecer uma relação
de interação com o seu interlocutor, ou seja, usou esses elementos como forma de
argumentação, em que sua formação ideológica consiste em persuadir o consumidor
(cliente ou telespectador).
6.1.3 Análises da peça publicitária da TUPPERWARE
Observa-se no texto abaixo, alguns elementos linguísticos que estabelecem a
cena enunciativa. Trata-se de um anúncio dos produtos da Tupperware.
Figura 4 – Campanha publicitária da Mulher Tupperwa re
A primeira e englobante cena que se estabelece é a do discurso publicitário; a
segunda, é a cena desse gênero discursivo numa relação de aliança com o discurso
Mulher Tupperware. [Da sabedoria popular] s.f. A que tem orgulho de ser mulher, Que é ousada e audaciosa. Contemporânea. Vencedora. Que tem objetivos de vida e luta por eles. Sintonizada com o seu tempo. Que rejeita imitações. Que aprecia o belo e o prático. De todas as raças. De todas as cores.
Fonte: CUNHA, 2009
97
feminista em que o anunciante se/ dirige ao(s) seu(s) interlocutor (es), cena
genérica; a terceira é a cenografia expressa no texto com o enunciado semelhante a
um verbete de dicionário colocado ao lado da imagem do anúncio organizado em
torno da expressão “Mulher Tupperware”. Na cenografia, o texto apresenta a
intenção principal do anunciante, que é promover os produtos de sua marca e o
tempo da enunciação, através dos dêiticos.
Na publicidade acima, o enunciado verbal que define o que é uma mulher
tupperware (coenunciador) não a personaliza, o que permite a qualquer ouvinte ou
leitor do anúncio do sexo feminino assumir esse lugar enunciativo e se sentir
motivada a comprar os produtos dessa marca. No campo da publicidade, existe a
tendência em considerar que a publicidade tem um efeito de sedução de produtos
direcionados ao público feminino para tentar seduzi-lo com um discurso de
valorização e de autoestima. Certamente são implicações que devem ser
condicionadas à natureza do produto.
Os dêiticos temporais “contemporâneos” mostra que a mulher que usa esses
produtos poderá estar sintonizada com o seu tempo, comprovam que a enunciação
é presente, realizada num momento em que a mulher busca se colocar de forma
livre, independente.
As expressões “a que tem orgulho de ser mulher”. “Que é ousada e
audaciosa, Vencedora”. “Que tem objetivos de vida e luta por eles” coloca o
coenunciador no mesmo espaço discursivo do enunciador, o que faz a gente
perceber o reconhecimento da mulher na luta em conquistar o seu espaço em todos
os campos. É como se o enunciador estivesse fazendo uma homenagem à mulher.
O anunciante utiliza um discurso argumentativo, com a pretensão publicitária
de convencer as mulheres a consumir os produtos, com a ideologia de que se a
leitora comprar os produtos dessa marca poderá se tornar uma mulher moderna e
vencedora, dando a entender que esses produtos foram produzidos à mulher que
trabalha, que é independente, como comprovam palavras e expressões do texto:
“ousada e audaciosa”, “vencedora”, sintonizada com o seu tempo”, “que luta por
seus objetivos”.
Os diálogos presentes nessa publicidade, através da presença dos verbetes
de dicionários, podem ser observados quando o anunciante faz uma mistura entre o
que é a mulher tupperware e os produtos dessa marca por meio dos conceitos:
sintonizada com o seu tempo (a mulher). Que rejeita imitação (produtos e mulher).
98
Que aprecia o belo e o prático (mulher); De todas as raças (mulher); De todas as
cores (produtos). Nesta configuração, o anunciante, o anunciado, o(s) destinatário(s)
são agentes reais do enunciado. O(s) enunciador (es) são agentes da cenografia
construída pelo texto.
Embora um texto pretenda constituir uma cena enunciativa que o torne
legítimo, é conveniente ressaltar que todo texto parte de um “enunciador encarnado”
e se estende a um coenunciador, que é necessário mobilizar para fazê-lo aderir
fisicamente a certo universo de sentido.
Portanto, o texto deve investir no que caracteriza o seu ethos, a sua relação
com uma vocalidade fundamental que se dá por meio de uma voz, de um tom que
endossa o que é dito conforme a cenografia construída: o enunciador não só dá a
entender, mas mostra o que pretende ser através da forma que enuncia.
A instância que assume o tom de uma enunciação evidentemente não
coincide com o autor efetivo da Obra. Trata-se, de fato, dessa representação do
enunciador que o coenunciador deve construir a partir de índice de várias ordens
fornecidas pelo texto. Essa representação desempenha o papel de um fiador que se
encarrega da responsabilidade do enunciado.
Assim, essa publicidade acima mostra que o ethos instaurado se dá no
reconhecimento do enunciador para com a mulher moderna com a conceituação de
Mulher Tupperware e também a necessidade que ele cria nesse tipo de mulher em
adquirir o produto. Portanto, percebeu-se que há um duplo movimento do texto: o de
se apoiar em cenas validadas (a valorização da mulher e o reconhecimento dela na
sociedade, a criação de produtos voltados para a mulher, a presença de
personagens que parecem representar agentes do contexto enunciativo) e ao
mesmo tempo valida cenas do contexto enunciativo, ou seja, o que é dito é
legitimado pela maneira, pelo tom de como foi dito.
As ideias ou impressões que o texto nos passa se apresentam pelo modo de
dizer remetendo a um jeito de definir a mulher. Sendo assim, vejamos este esquema
para sintetizar a análise em questão.
99
Quadro 1 – Síntese da instância da peça.
CENA 1 CENA 2 CENA 3
Cena englobante que se estabelece como a do anúncio publicitário.
Cena genérica estabelece uma relação de aliança com uma formação discursiva do feminista em que o anunciante se/ dirige ao(s) seu(s) interlocutor (es), a.
A cenografia expressa no texto com o enunciado semelhante a um verbete de dicionário colocado ao lado da imagem do anúncio organizado em torno da expressão “Mulher Tupperware”.
OBJETIVO DA PEÇA O texto apresenta a intenção principal do anunciante, que é promover os
produtos de sua marca e o tempo da enunciação, através dos dêiticos instaurados em formatos de verbetes de dicionários.
6.1.4 Análises da peça publicitária do Governo do C eará
Figura 5 – Campanha publicitária sobre o Carnaval e a Semana Santa
Fonte: CARDOSO, 2009
Fonte: Elaborado pelo autor.
100
Na análise a seguir, discutiremos a utilização de recursos linguísticos,
principalmente da polissemia, responsáveis pela construção argumentativa dessas
duas publicidades referidas acima.
Na primeira publicidade, percebe-se a utilização das palavras “mangueira”,
“beija-flor” e do verbo “desfilar” em que foram usados argumentatativamente em
sentido polissêmico.
A princípio, consideramos que o anúncio foi vinculado na época do Carnaval e
por isso as palavras escolhidas estão todas relacionadas a elementos
carnavalescos: “mangueira” - nome de uma Escola de samba do Rio de Janeiro -,
mas na publicidade refere-se à árvore frutífera da manga, dadas as condições
enunciativas empregadas nesse texto: uma praia.
Além disso, ressalta-se a palavra “beija-flor” - também um nome de Escola de
Samba do Rio de Janeiro -, mas aqui se referindo ao colibri, que se alimenta do
néctar de plantas e também pode ser encontrado em campos, praias, enfim, na
natureza, conforme comprovam novamente as cenas enunciativas na publicidade
em análise.
Em seguida, destaca-se o uso do verbo “desfilar” - muito comum no léxico
carnavalesco, referindo-se ao ato de apresentar-se em público, geralmente
dançando.
Na publicidade o verbo está se referindo ao fato de os turistas aproveitarem a
viagem no Ceará, “desfilando” pelas praias.
Logo, ressalta-se a importância das cenas enunciativas, a fim de que se
possa compreender a significação das palavras dentro desse contexto, desfazendo,
dessa forma, possíveis interpretações ambíguas.
Na segunda publicidade, vale ressaltar novamente a presença de uma
palavra sendo utilizada num sentido polissêmico: “comunhão”.
Assim como no anúncio anterior, devemos considerar as cenas enunciativas
para que possamos compreender todo o processo discursivo formulado no sentido
polissêmico das palavras: trata-se de um anúncio que foi publicado na Semana
Santa, portanto, “estar em comunhão”, refere-se, ao sentido religioso, ao
sacramento da eucaristia, mas aqui foi utilizada no sentido de estar “em harmonia”
com a natureza.
101
Dessa forma, observa-se que ambas as publicidades da Secretaria de
Turismo do Ceará utilizam palavras polissêmicas sempre relacionadas a cenas
enunciativas que envolvem datas comemorativas, com o intuito de convidar
os turistas a irem visitar o Ceará, desfrutando as suas belezas naturais (praia, sol,
mar).
Essas campanhas publicitárias apresentam aspectos linguísticos muito
relevantes para que a interação entre os interlocutores possa se concretizar.
Desse modo, vimos que a polissemia contribui para que o texto se torne
ambíguo, permitindo variadas leituras.
Porém, para que a ambiguidade se desfaça, pode-se recorrer a elementos
discursivos como as condições de produção e as cenas enunciativas, em que esses
recursos fazem parte do processo construtivo da argumentatividade.
As publicidades destacaram a importância do sujeito (leitor/consumidor) na
interação com o texto: o conhecimento de mundo, bem como sua relação com a
linguagem e os mecanismos discursivos, fundamentais para que um anúncio cumpra
sua finalidade criativa.
Temos, portanto, a relação do sujeito com a língua, com a história e os
sentidos.
Vale ressaltar, que a interpretação de um discurso, de acordo com o que se
observa nas publicidades, envolve dois aspectos: a memória institucionalizada
(processos que possibilitam a recomposição de uma rede de fatos experienciados
pelo interlocutor) e a interdiscursividade (sua experiência com outros textos, com
outros fazeres textuais) para que, dessa forma, possamos estabelecer os sentidos
presentes em cada discurso analisado.
Daí a importância do sujeito na relação com a língua e a história, para que o
discurso possa produzir sentidos.
Sendo assim, constata-se que os textos publicitários também não
apresentam toda a informação acabada – como de resto grande parte dos textos -,
pois há sempre elementos implícitos, os quais os leitores precisam recuperar, devido
à ocasião em que foram produzidos e, dessa maneira, uma multiplicidade de
sentidos surgirá de um texto aparentemente simples.
102
6.1.5 Análises da peça publicitária da VOLKSWAGEN-A UDI A4
Figura 6 - Campanha publicitária do Audi 4
Nesse discurso publicitário do Audi A4, observa-se que os fatores
argumentativos relacionam-se com a liderança da marca. Assim, os elementos
verbais que o compõem trazem explícita a conquista do carro como líder na sua
categoria mais uma vez, o que agrega maior credibilidade pelo fato de indicar que o
produto já é destaque pela sua alta qualidade.
Dessa maneira, a personalidade da marca, que se apresenta como
solidificada no mercado, também é apresentada no discurso demonstrando que o
que ela oferece é seguro, não constituindo qualquer ameaça às convicções do
público, o que causa uma excelente impressão. Com isso, a persuasão nasce de
uma construção de confiança por parte do orador, em função das expectativas do
seu auditório, dessa forma, uma mensagem transmitida com segurança e
veracidade atrelada ao desejo de consumo do público, acarretará um efeito positivo.
Além disso, não se pode esquecer de que qualquer argumentação se desenvolve
em função do auditório.
De acordo com essa campanha publicitária, a utilização de recursos do
discurso persuasivo como afirmação e repetição enfatiza a verdade em uma
mensagem. A afirmação representa a certeza e a repetição representa a
possibilidade de aceitação pela constância reiterativa.
Fonte: COSTA, 2010
103
Percebe-se que o anúncio analisado se apropriou desses recursos, em que a
afirmação pode ser encontrada em “O melhor carro do Brasil na sua categoria” e a
repetição, logo em seguida no texto explicativo, na parte inferior, quando a frase
aparece mais uma vez no corpo do anúncio. “Mais uma vez a Audi é destaque no
concurso melhor carro do Brasil. Agora o Audi A4 Avant foi eleito o melhor carro na
sua categoria...”.
Podemos dizer, então, que os elementos que compõem essa publicidade
fazem um apelo às emoções do público-alvo persuadindo pelas paixões. Paixão
pode ser definida como “desejo ardente, sôfrego”. Assim, ressalta-se que estudos
semióticos ampliaram essa definição, dando uma visão mais complexa da relação
entre o indivíduo e o objeto.
Dessa forma, a paixão pode ser entendida como efeito de sentido de
qualificações modais que modificam o sujeito do estado. Como paixões plásticas e
visuais do anúncio, podemos destacar as cores frias que foram utilizadas
intencionalmente na cor da estrada em tons grafites, harmonizando com a cor prata
do automóvel remetendo à luxuosidade, estabilidade e elegância.
Além disso, o clima de outono fortalece o conceito de glamour, e a imagem da
estrada deserta passa a ideia de velocidade, trazendo um reforço ao apelo pela
paixão verbal da peça “veja como dá para passar na frente de todos com elegância”,
trazendo implícita no seu discurso a valorização do público no que se refere ao
desejo de inserção social, relacionado à necessidade de pertencer à classe dos
consumidores de Audi A4. Enfim, toda a composição do anúncio publicitário tem o
objetivo de gerar uma identificação do enunciatário em relação ao enunciador.
Portanto, os argumentos lógicos inseridos no discurso da publicidade do carro
A4 se apresentam na descrição das características do carro, em que são
evidenciadas todas as suas funções, potencialidades, força e liderança da marca.
Apesar de não mostrar as características do produto, deixa bem claro que está
oferecendo um produto de qualidade, luxuoso, design arrojado, que são marcas
evidentes dos produtos.
Além disso, essa publicidade foi construída baseada na hegemonia na marca
e houve uma preocupação em reafirmar seu valor. Para tanto, percebemos uma
produção adequada ao perfil do público.
Analisando todos os elementos que a compõem, percebe-se a intenção de
causar impacto, persuadindo pela autoridade e liderança dessa marca.
104
6.1.6 Análises da peça publicitária da VOLKSWAGEN-S PACE FOX
Figura 7 – Campanha publicitária do Space Fox
Ao iniciar a análise dessa publicidade, vale ressaltar que o carro Space Fox
surgiu como uma extensão do Fox, carro lançado anteriormente no mercado, cujo
conceito era “compacto por fora e gigante por dentro”.
A ideia passada pelo Fox foi realimentada no lançamento do Space Fox, com
o fator beleza agregado à ideia de espaço, com “lindo pra quem vê, gigante pra
quem anda”. Dessa forma, é possível perceber a presença da conformação, que
consiste em uma marca da persuasão e do convencimento. Seu papel no discurso
implica confirmar, executar tarefa de manutenção de comportamento já existente,
com o objetivo de gerar resposta ou ação da parte dos enunciatários.
Na sua premissa principal: “lindo pra quem vê gigante pra quem anda” fica
evidente que o Space Fox tem design especial além de espaço físico interno,
oferecendo o mix de beleza e conforto. Internamente o Space Fox oferece um
aumento no volume do porta-malas que não compromete o conforto dos passageiros
traseiros.
Anúncio para solteiro Anúncio para casado Anúncio explicativo Fonte: SILVA, 2010
105
É um carro atraente e esportivo, e ao mesmo tempo, extremamente
confortável adequado tanto para casados “anúncio para casado”, para família
“anúncio explicativo”, como para solteiros “anúncio para solteiros”.
Assim, o ethos do produto é identificado na marca Volkswagen, podendo ser
aceito ou desconsiderado, a depender de quem seja o consumidor do produto.
Caso o público seja o alocutário, o ethos será aceito, pois haverá uma
credibilidade por conta da marca Volkswagen e o modelo do carro - Space Fox.
Caso o público seja não alocutário, o ethos será desconsiderado, pelo fato de
não haver interesse por parte desse consumidor na marca. É possível que essa
situação possa ser alterada, se considerarmos o alocutário apenas como um
consumidor da publicidade.
Dessa maneira, para que a argumentação se desenvolva de forma
apropriada, é preciso que aqueles a quem a mensagem se destine manifeste o seu
interesse seja pelo produto, seja pelo texto, condição indispensável para o
andamento de qualquer argumentação.
Com isso, o argumento persuasivo da publicidade do Space Fox é pautado
pelo argumento de muito espaço interno, design moderno e beleza “lindo pra quem
vê, gigante pra quem anda”. Isso mostra que há uma preocupação com o cliente em
lhe proporcionar conforto, beleza e, acima de tudo, espaço em um só produto.
Além disso, reforça o caráter inovador da marca, que, apesar de ter pouco
tempo no mercado, é provável que tenha ganhado credibilidade e preferência do
público.
Nessa publicidade, percebe-se ainda a utilização da paixão como uma forte
ferramenta para a construção da relação entre a pessoa e o objeto desejado, que
nesse caso é o Space Fox, em que o objetivo é fazer com que o receptor idealize o
carro como algo que irá completar as suas necessidades e desejos, como se vê em
“anúncio para casado”, “anúncio para solteiro”.
Enfatiza-se ainda que os pontos fortes do lançamento, espaço e beleza “lindo
pra quem vê, gigante pra quem anda” são enfatizados na peça em diversos
momentos, em que é apresentada uma variedade de opções em que o carro se
ajustará perfeitamente ao cotidiano do indivíduo, uma vez que a publicidade é
direcionada para solteiros, casados e família “anúncio para casado”, “anúncio para
solteiro”.
106
Sendo assim, ressalta-se que na primeira peça, o foco passa a ser os
solteiros, em que surge do bolo uma mulher, mudando o conceito da peça com tom
de humor.
Já na segunda publicidade da sequência das peças é direcionada para o
público casado, em que é usada a simbologia do bolo de casamento.
Pode-se inferir que as pessoas que fazem parte do grupo dos casados
poderão se sentir inseridas nesse perfil, podendo despertar interesse em adquirir o
produto.
Dessa maneira, a composição das peças em tons avermelhados denota a
ideia de modernidade, inovação, investindo principalmente na sensação de estímulo
que causará no receptor através da sedução. O tom dourado do anúncio
contrastando com a cor da pele bronzeada da modelo, na peça direcionada para
“solteiros” denota a ideia de diversão e liberdade, representando o público que faz
parte desse grupo. Logo, vale salientar que os argumentos lógicos usados para
convencer o espectador são: espaço, beleza, design e sucesso de vendas.
Ao enfatizar o espaço como uma das características principais, essa
publicidade tem a intenção de mostrar que o Space Fox é direcionado para todo o
tipo de público sendo ele casado, solteiro ou famíliar.
Outro elemento ressaltado é a beleza do carro, além de possuir conforto a
beleza é predominante. O design é atraente e esportivo, agregando valor ao veículo
e o último elemento ressaltado no anúncio é o sucesso de vendas que o carro
alcançou. Portanto, vale inferir que a utilização desses argumentos lógicos valida um
discurso, visto que servem como uma espécie de provas concretas a respeito do
que está sendo demonstrado.
Assim, percebe-se, com essa publicidade, que o objetivo do anunciante é
seduzir pelo lado emocional, evidenciando as características principais do carro
como espaço e beleza e, principalmente, por retratar dois perfis de clientes, solteiros
e casados, sugerindo possibilidades para utilização do produto.
107
6.1.7 Análises da peça publicitária da NATURA
Figura 8 – Campanha publicitária Novo Chronos
Na publicidade do produto Chronos da natura, o anunciante usa palavras
marcantes e expressivas, como revolução, antissinais, microtensões, etc.
O anunciante foi bem criativo nesse anúncio, em mostrar o processo pelo qual passa
o produto até chegar a forma de creme spilol, transmitindo ao consumidor confiança
no seu produto. E confirma tudo que diz com a imagem feliz e de expressividade da
mulher de 38 anos, ressaltando ainda a posição social de professora universitária,
dando a entender que é uma pessoa esclarecida que não se deixa manipular por
falsas publicidades ou promessas enganosas.
Fonte: NORONHA, 2005
108
Embora os homens estejam ultimamente cuidando do seu bem estar físico, o
discurso empregado é direcionado para a mulher, visto que ela sempre se
preocupou, e hoje mais do que nunca tem procurado cuidar de sua aparência,
principalmente, no que diz respeito a disfarçar ou tardar as marcas do tempo, como
rugas, pés-de-galinha, etc., que aparecem a partir dos trinta anos de idade. É nesse
contexto de bem estar físico, que nos últimos anos têm entrado no mercado vários
tipos de cosméticos que prometem ajudar a manter e/ou melhorar a beleza estética
da mulher.
Nesse anúncio, é com um jogo de imagens que podemos encontrar bem
acentuada a interdiscursividade através dos discursos que se inter-relacionam numa
relação de aliança para dar embasamento ao produto anunciado.
O texto mostra-se constituído pelos discursos ambiental, científico,
tecnológico e publicitário, os quais implicam movimentos de leituras diversas:
a) o primeiro movimento refere-se à questão da publicidade do produto
Chronos spilol desenvolvido para o tratamento das rugas de expressão do
rosto como segue:
Novo Chronos Spilol. Menos rugas, mais expressão, m ais vida.
Uma revolução no tratamento antissinais, que descontrai as microtensões da
pele, combatendo as rugas de expressão sem alterar a expressão natural do rosto.
b) o segundo movimento de leitura diz respeito ao discurso científico a
começar pelo próprio nome científico da planta “Spilanthes oleracea” em
união com o discurso laboratorial:
Para obter o spilol, nossos laboratórios desenvolveram um sofisticado
processo de purificação, capaz de concentrar em 1.000 vezes o princípio ativo da
Spilanthes oleracea [...].
c) o terceiro movimento de leitura destina-se ao discurso ecológico.
O texto aproveita este discurso para fazer referência à biodiversidade
brasileira, a fim de mostrar a potencialidade produtiva e econômica ainda existente,
sobretudo, na Amazônia capaz desenvolver os melhores e variados produtos em
todos os setores econômicos como podemos identificar no anúncio:
Chronos Spilol. Um avançado tratamento de rugas de expressão, criado
a partir da biodiversidade brasileira.
109
A partir da Spilanthes oleracea, planta brasileira também conhecida como
jambu […].
d) o quarto movimento de leitura diz respeito ao discurso tecnológico,
enfatizando o uso da tecnologia tão necessária e utilizada em todos os
experimentos científicos, é o que se confirma com o enunciado:
(...) a Natura desenvolveu a mais alta tecnologia de combate às rugas de
expressão. Chronos Spilol é obtido através de um processo tecnológico de
purificação, que concentra o princípio ativo cerca de 1.000 vezes em relação à sua
forma original.
e) finalmente o quinto movimento de leitura se destina aos resultados e
satisfação após o uso do produto, o anúncio diz que Chronos Spilol tem
produtos adequados para cada etapa da vida da mulher a partir de 30+,
45+ e 65+ anos.
Observemos então os resultados em percentual em voluntárias acima de 45
anos que notaram melhoras em apenas sete dias de uso.
6.1.8 Análises da peça publicitária da OI
Antes de iniciar o processo de análise da próxima publicidade, é relevante
frisar que Althusser (1970), com o propósito de investigar as condições de
reprodução social, parte do pressuposto de que as ideologias têm existência
material, ou seja, que devem ser estudadas como um conjunto de práticas materiais
que reproduzem as relações de produção. E dá ênfase ao materialismo histórico que
embasa a materialidade da existência, objeto de estudo.
Toda ideologia tem por função constituir indivíduos concretos em sujeitos.
Nesse processo de constituição, a interpelação e o (re) conhecimento exercem
papel importante no funcionamento de toda ideologia. É através desses mecanismos
que a ideologia, funcionando nos rituais materiais da vida cotidiana, opera a
transformação dos indivíduos em sujeitos. O reconhecimento se dá no momento em
que sujeito se insere, a si mesmo e a suas ações, em práticas reguladas pelos
aparelhos ideológicos.
No entanto, o termo ideologia é, ainda hoje, uma noção confusa e
controversa, pois estudiosos têm vários pontos de vista sobre a mesma. Mas Chauí
(1980), segundo a concepção marxista, a concebe como um instrumento de
110
dominação de classe, porque a classe dominante faz com que suas ideias passem a
ser as ideias de todos.
Pode-se dizer, orientando-se por aspectos dessa visão, que profissionais de
marketing elaboram a mensagem publicitária de modo a levar as pessoas a
identificarem-se com um produto ou serviço a partir da ideologia empregada através
das imagens e sons, em combinações dinâmicas, fazendo com que anseios e
desejos associados ao produto aflorem na mente do consumidor.
Agora, observemos nas próximas duas análises, como a ideologia se
apresenta na publicidade:
Figura 9 – Campanha publicitária Oi conta total
Tendo em vista que falar ao telefone e usar a internet são meios de
comunicação que custam caro, a Oi utiliza em seu discurso publicitário, para vender
seus serviços, como prestadora de telefonia e aparelho de celular, a ideologia da
facilidade para ter acesso a esses meios de comunicação, que facilitam a vida das
pessoas, como podemos observar no nosso quadro a seguir que elaboramos com o
intuito de sintetizar a nossa análise:
Fonte: CARVALHO, 20 06
111
Quadro 2 – Síntese da análise da publicidade das Va ntagens OI. VANTAGENS DA Oi
CONTA TOTAL
Facilidades:
� Acesso à internet;
� Ligações ilimitadas;
� Minutos DDD para fixo ou celular Oi;
� Assinatura grátis de linha telefônica
fixa;
� Bônus de R$ 250,00 reais para
compra de aparelho.
Vantagens que outras prestadoras de serviços de telefonia não oferecem
Observemos também a imagem do ator Lázaro Ramos, uma pessoa bastante
conhecida através de outro meio de comunicação da mídia, a televisão, para mostrar
que ele usa Oi.
Nesse caso, podemos supor que, nesse momento, exista uma adesão
simbólica às teses da empresa que podem se concretizar quando as pessoas, por
afinidade ou não com o ator, vão querer usar também os produtos dessa marca
pelas características que foram descritas no anúncio publicitário.
6.1.9 Análises da peça publicitária da FERRACINI
Figura 10 – Campanha publicitária Articulado 24h
Fonte: AZEVEDO, 2006
Fonte: Elaborado pelo autor.
112
Observa-se que nessa publicidade o discurso argumentativo é construído em
cima da ideologia do conforto que os calçados da marca FERRACINE retratam “24h
– é diferente”.
Assim, ao saber que existem calçados que causam transtornos pelo
desconforto, além de não haver uma preocupação em oferecer qualidade de produto
e bem-estar pessoal do consumidor, a FERRACINE tem uma pretensão publicitária
argumentativa de mostrar a qualidade de seu produto.
Esse efeito argumentativo é assegurado, através de uma referência icônica
da sola do calçado, assegurando “canais de flexão”, “articulação da sola”, tudo isso
para assegurar aos pés “mais conforto e maior liberdade de movimento”.
Dessa forma, a logomarca a seguir procura ratificar essa argumentação:
Com esses textos, percebe-se que a ideologia nos anúncios publicitários se
estabelece a partir da necessidade que os anunciantes imaginam ter os
consumidores, com isso, pode-se dizer que a partir dessa inferência dos
anunciantes surge a formação discursiva dessa publicidade, em que o discurso
persuasivo é constituído pelo conforto que o produto vai dar ao possível consumidor.
Dessa forma, a publicidade pretende manter uma interação entre o produto e
o seu possível consumidor. Portanto, na análise dessas publicidades, observou-se
que hoje o profissional de marketing não precisa mais ficar elogiando um produto ou
serviço, ele procura interagir com a mente do consumidor em potencial.
Com isso, vê-se que as publicidades sobre a marca FERRACINE trouxeram
em sua ideologia essa relação imaginária entre o produto e o consumidor,
enfatizando o conforto que os calçados têm, como recurso primordial para
implantação da persuasão do consumidor.
113
6.2 Padrões de interdiscursividade
6.2.1 Análises da peça publicitária do BOTICÁRIO E DA MARISA
Figura 11 – Campanha Branca de Neve e Chapeuzinho V ermelho
De acordo com essas duas publicidades acima, identifica-se a ocorrência de
um recurso discursivo de intertextualidade, tanto nos componentes linguísticos,
quanto nos visuais.
Dessa forma, vê-se que a primeira publicidade traz a ilustração de uma
mulher branca com os cabelos pretos, a quem é oferecida uma maçã.
Além disso, ressalta-se esta frase: “Era uma vez uma garota branca como a
neve. Que causava muita inveja. Não por ter conhecido sete anões. Mas vários
morenos de 1,80.”
Na segunda publicidade, há uma mulher de capuz vermelho e o texto:
“A história sempre se repete. Todo Chapeuzinho que se preze, um belo dia, coloca o
lobo mau na coleira”.
Assim, podemos dizer que existe uma intertextualidade verbal nas duas
publicidades, quando o autor usa expressões linguísticas que resgatam a lembrança
do texto original, como se pode identificar nas correlações a seguir: “Era uma vez
Fonte: OLIVEIRA, 2005
114
uma garota chamada Branca de Neve...” - “Era uma vez uma garota branca como a
neve” e “Chapeuzinho Vermelho” – “Todo chapeuzinho que se presa...”.
Logo, as expressões verbais da publicidade, de certa forma, nos lembram das
histórias dos contos de fadas infantis e isso faz com que possamos dizer que exista
uma intertextualidade verbal entre elas.
Já em relação à intertextualidade icônica, percebemos na primeira publicidade
a mão de uma pessoa contendo uma maçã, oferecendo-a a uma pessoa branca,
possivelmente, a Branca de Neve; no segundo quadro, a intertextualidade icônica é
feita por uma moça jovem vestida com roupas vermelhas e usando um capuz
vermelho, fato esse que faz recordar a garota do conto de fadas Chapeuzinho
Vermelho.
Sendo assim, podemos ressaltar que esses fatores tanto linguísticos quanto
imagéticos demonstram a intertextualidade entre essas publicidades e os contos de
fadas (Branca de Neve e Chapeuzinho Vermelho).
Assim, podemos detectar que o processo de construção do anúncio está na
reinterpretação dos contos de fada, contados no referido texto não como historinhas
infantis propriamente, mas com uma conotação jovem ou adulta “Era uma vez uma
garota branca como a neve. Que causava muita inveja. Não por ter conhecido sete
anões. Mas vários morenos de 1,80.” e “A história sempre se repete. Todo
Chapeuzinho que se preze, um belo dia, coloca o lobo mau na coleira”. Além disso,
vale lembrar que esses são casos de citação em que não se mantém o sentido
original do conto citado.
Percebe-se ainda nesta publicidade uma estilização, já que se reproduz o
estilo composicional próprio dos contos infantis.
Dessa maneira, tanto a imagem, quanto as palavras realizam o processo de
citação, o que se configura na maçã, como signo visual determinante, assim como
no capuz vermelho e na caracterização de ambas as figuras femininas.
Preservando ainda esse processo interdiscursivo, vejamos a publicidade a
seguir:
115
Figura 12 – Campanha publicitária Dia dos Namora dos Marisa
Pode-se ressaltar que há nessa publicidade uma alusão. O anúncio
publicitário de Marisa para o Dia dos Namorados possui a imagem de um homem e
uma mulher nus apenas cobertos por uma folha, situados em um cenário verde,
caracterizados como Adão e Eva, sendo que a mulher segura uma maçã, e o
seguinte texto: “Não resista à tentação”. Essa é uma alusão ao texto bíblico do
pecado original, em que, novamente, textos verbais e imagéticos se complementam
e realizam a intertextualidade.
Além disso, existe outro ponto a se destacar nessas publicidades, a
estilização, que é a reprodução do conjunto dos procedimentos do discurso de
outrem, isto é, do estilo de outrem. Pode manter ou confrontar-se com o sentido do
outro texto. Observa-se estilização na forma composicional dos dois primeiros
anúncios (BOTICÁRIO), que, conforme mencionado anteriormente, reproduzem o
estilo dos contos infantis, o que está marcado no texto verbal pela expressão “Era
uma vez...”.
Outro processo intertextual é a paródia. Fávero (2003) explica que, por ser
semelhante, a paródia é colocada por Bakhtin lado a lado com a estilização, pois
segundo a autora, ambas permitem reconhecer explicitamente a semelhança com
aquilo que negam, a palavra tem um duplo sentido, voltando-se para o discurso de
um outro e para o objeto do discurso como palavra (FÁVERO, 2003, p.53).
Fonte: SOUSA, 2005
116
Passaremos a seguir a uma análise de algumas publicidades da BOMBRIL, a
fim de que possamos explorar ainda mais esses fatores de interdiscursividade e
intertextualidade.
6.2.2 Análises da peça publicitária da BOM BRIL – O BRA PRIMA
Figura 13 – Campanha publicitária obra prima
Nessa publicidade, observa-se que o texto é construído com dois tipos de
linguagem, verbal e visual, de modo que uma serve de apoio à outra. Lendo apenas
a frase situada na parte inferior do anúncio “MON BIJU DEIXA SUA ROUPA UMA
PERFEITA OBRA–PRIMA” o sentido da frase é sugerir que Mon Bijou deixa sua
roupa uma perfeita obra–prima, o texto verbal pode ser visto de duas formas: no
primeiro instante, podemos notar que a frase em si dá uma ideia de que suas roupas
com os produtos da Mon Bijou podem ficar tão perfeitas ao ponto de se tornarem
uma verdadeira obra-prima como o quadro de Mona Lisa.
No segundo conceito, podemos verificar que Mon Bijou limpa, perfuma e dá
maciez às suas roupas como todo produto da Bombril.
Assim, na figura central do anúncio, a roupa, os cabelos, o meio sorriso da
pessoa fotografada e o cenário e todo esse conjunto de elementos, nota-se que se
trata de um anúncio comum, pois há nele marca ou a voz de outro texto bastante
conhecido, que é o famoso quadro Mona Lisa, de Leonardo da Vinci. Ao fazer um
cruzamento entre a parte verbal e a visual do texto, verifica-se que há entre as duas
linguagens um ponto em comum, que as aproxima e amplia o sentido de cada uma,
Fonte: CASTRO, 1998
117
é a expressão “obra-prima” que na parte verbal (significando perfeita) remete ao
quadro de Da Vinci, considerado uma obra-prima.
Ao lançar mão da polifonia discursiva como meio de promover seu produto, o
anunciante pode correr alguns riscos, uma vez que o leitor pode não conhecer a
obra-prima de Leonardo da Vinci.
No entanto, esses riscos são desfeitos, levando em conta que o produto
anunciado é um amaciante de roupas (algo refinado que nem todos utilizam) e que o
anúncio foi publicado numa revista de público predominantemente feminino e de
classe média, assim é possível que a maior parte dos leitores perceba a polifonia no
texto, devido ao seu nível social, tenham informações sobre Da Vinci e conheçam o
quadro Mona Lisa.
Quanto aos leitores que não conhecem Da Vinci, eles podem, mesmo assim,
ser atingidos pelo apelo do anúncio, de modo que seu objetivo principal – promover
o produto - fosse alcançado, visto que a parte verbal garante.
Da parte visual, o leitor poderia ao menos achar engraçado. Se comparar um
anúncio tradicional desse produto (“Compre...”, “use...”, “experimente...”) e o anúncio
lido acima, percebe-se que há vantagens para o anunciante, em criar um anúncio
com esse tipo de inovação.
Esse tipo de anúncio costuma ser mais bem recebido pelo público, pois
explora o humor. No anúncio em análise, a referência a uma obra-prima da pintura
indiretamente valoriza não só o produto, mas também o público que percebe a
intertextualidade e/ou polifonia discursiva.
Logo, o anunciante, explícita e intencionalmente, cita o quadro de Da Vinci ao
manter vários elementos linguísticos que remetem a ele. É então, nessa relação
entre dois textos em que um cita o outro que se estabelece a intertextualidade.
Nos textos acima analisados, foram estabelecidas as marcas intertextuais, os
interdiscursos e as referências presentes na publicidade, bem como os sentidos que
elas dão ao novo texto.
Portanto, a intertextualidade proporciona uma nova leitura para o texto,
mostrando o dialogismo dentro e com outros textos e constituindo-se na e pela
interação com outros textos e discursos.
Dessa forma, a interação do locutor e interlocutor se faz pela necessidade da
venda do produto, bem como pelos interesses de seus consumidores, através do
uso efetivo do gênero publicitário, numa situação comunicativa bastante presente
118
em nossa sociedade, ou seja, o jogo persuasivo toma forma ao destacarmos a
mulher dentro da publicidade, a mistura de Mona Lisa com o apresentador chama a
atenção do seu público alvo que são as mulheres, elas são as principais
consumidoras do produto e são elas que as empresas pretendem alcançar,
principalmente a dona de casa por ser sua maior consumidora.
Por figura de linguagem encontramos a metáfora, que a substituição do
significado de uma palavra por outra, disso resulta a acumulação de dois
significados. De acordo com Sandmann (2001, p. 85).
De maneira geral pode-se dizer que as figuras de linguagem são formas de expressão que foge da linguagem comum, emprestando à mensagem vivacidade, vigor e criatividade, dependendo esta última qualidade naturalmente da maior ou menor originalidade (SANDMANN, 2001, p. 85).
Portanto, nos textos publicitários é normal termos essas figuras de linguagem,
as que se destacam dentro das publicidades pela sua frequência são a metáforas, a
metonímia e a personificação. No texto acima, a palavra obra-prima pode ter dois
significados, a de uma verdadeira obra de arte como o quadro de Mona Lisa, e o
sentido de limpeza, maciez e brilho, em se tratando de roupas.
6.2.3 Análises da peça publicitária da BOM BRIL –FU RACÃO
Essa publicidade recorreu à minissérie Hilda Furação, do escritor Roberto
Drummond, que fazia “furor” na Rede Globo de Televisão. Enquanto isso, essa
Fonte: ARRAES, 1998
Figura 14 – Campanha publicitária Furacão
119
publicidade fazia “furor” nas revistas. A intertextualidade parodística proposta por
Maingueneau (1997) no referencial teórico desta pesquisa pode ser percebida na
interpretação do ator Carlos Moreno ao parodiar a personagem Hilda Furacão e o
Frei Malthus. Dessa forma, não é difícil conceber a interdiscursividade, pois, no
período em que a publicidade Bom Bril foi veiculada, o país presenciava a minissérie
Hilda Furacão, a qual causava grandes polêmicas em torno da personagem
protagonista, uma mulher sedutora, ao se envolver com um frei.
Sendo assim, a minissérie acabou por levantar polêmica em torno do discurso
religioso da Igreja Católica, que não permite o envolvimento sexual de padres ou
freiras. Assim, a publicidade se aproveita dessa situação polêmica para dizer que
“É um pecado deixar o furacão Bom Bril fora da cozinha”. Assim como Hilda Furacão
é capaz de fazer qualquer homem “pecar” pelo seu poder de sedução e beleza.
É também um pecado você, consumidor (a), deixar faltar Bom Bril na cozinha. Dessa
forma, pode-se detectar que a publicidade demonstra um certo tom de erotismo, que
é retratado pela sensualidade, pela beleza, pela força sedutora de uma mulher
jovem e muito ousada que era retratada pela atriz Ana Paula Arósio, no papel como
personagem Hilda Furacão. Contudo, é interessante observarmos que a publicidade
é um espelho da cultura em que se insere, ao mesmo tempo em que refrata os
valores sociais e ideais do momento histórico em que foi produzida e inscrita.
6.2.4 Análises da peça publicitária da BOM BRIL – B AIXINHO
Figura 15 – Campanha publicitária baixinho
120
Pode-se afirmar que atualmente a publicidade adquire uma dimensão
simbólica, visto que ela trabalha os imaginários de uma dada sociedade conferindo-
lhes uma significação e atualizando os seus sentidos.
Por isso, a publicidade pode ser considerada um suporte das representações
sociais.
Partindo do pressuposto de que a publicidade é um suporte das
representações sociais nada melhor do que a propaganda impressa da Bom Bril
representar os oito meses de gravidez de Xuxa, considerada a rainha dos
baixinhos.
Esse nome se deve ao fato de Xuxa possuir grande carisma com o público
infantil e até mesmo com os adultos que têm grande admiração pela “rainha”.
Nesse caso, torna-se interessante perceber como a intertextualidade
pressupõe um universo cultural muito amplo e complexo, pois implica a identificação,
o reconhecimento de remissões a obras, a textos mais ou menos conhecidos, além
de exigir do interlocutor a capacidade de interpretar a função daquela citação ou
alusão em questão.
E foi justamente o que aconteceu com essa publicidade acima. A W/BRASIL a
fim de originar uma nova publicidade impressa retoma a figura de Xuxa no papel
Fonte: VELOSO, 1998
121
desempenhado por Carlos Moreno “Garoto Bom Bril”, com o intuito de produzir um
novo texto, buscou a intertextualidade parodística a “Rainha dos Baixinhos”.
Outro ponto relevante nessa publicidade é a presença da interdiscursividade,
que é a conversa entre esses discursos, onde um age como resposta, ou se refere a
outro, como é percebido nessa publicidade, ou seja, os discursos dialogam entre si.
Assim, na época dessa publicação, o público brasileiro, fiel ao programa da
apresentadora, acompanhava os oito meses de gravidez da personagem.
Portanto, a Bom Bril lança o seguinte anúncio: “Bom Bril. Toda mãe gosta
deste baixinho". Como Xuxa é a “Rainha dos Baixinhos”; Bom Bril por ser uma
Esponja de Lã de Aço que vem em uma embalagem pequena, é o baixinho das
mamães. E toda mãe que supostamente é dona de casa, gosta de baixinho, ou seja,
da Esponja de Lã de Aço Bom Bril. Logo, o jogo linguístico é construído em torno da
expressão “deste baixinho”.
122
6.2.5 Análises da peça publicitária da BOM BRIL – B OM BILL
Ao analisar a publicidade acima, observa-se que ela remete a um fato que
ocorreu dia sete de janeiro de 1998, Mônica Lewinsky negou o romance com o então
presidente norte-americano Bill Clinton. Dia 12 de janeiro surge a primeira prova do
romance, uma fita.
O caso se alastra pelos jornais até o dia 30 de junho, quando Mônica
Lewinsky entrega um vestido com manchas de esperma para o promotor Stan.
No dia 06 de agosto, Mônica presta depoimento ao grande júri e confessa ter
mantido relações sexuais “incompletas” por várias vezes com o então presidente.
Nesse momento, percebemos que Bom Bril não podia mais se abster de discutir tal
assunto tão relevante.
Na imagem da publicidade, temos dois personagens que são interpretados
por Carlos Moreno, que parodia Bill Clinton e Mônica Lewinsky. Observamos a figura
estática do presidente na publicidade tentando esconder o fato ocorrido, bem como
a suposta figura de Mônica Lewinsky rindo da situação ocorrida e nas mãos traz o
pacote de Esponja de lã de Aço da Bom Bril. Para tanto, o autor, ao fazer o jogo
linguístico entre as expressões “Bom Bril” e “Bom Bill”, o realiza de forma intencional,
com o objetivo de introduzir múltiplas vozes em seu discurso.
Tais como a voz feminina que ecoa por liberdade sexual, ou pela eficácia de
um produto de limpeza. Além disso, vale ressaltar que esse jogo linguístico
concentra todo o processo de formação discursiva da publicidade, pois a
Fonte: CORDEIRO, 1998
Figura 16 – Campanha publicitária Bom Bill
123
interpretação desse texto, a carga ideológica e até mesmo a interdiscursividade
entre a publicidade da Bom Bril e o fato social retratado estão diretamente
envolvidos nesse jogo linguístico “Bom Bril” e “Bom Bill”.
Dessa maneira, a publicidade consiste, então, na convocação de vozes
exteriores ao fio discursivo, que flutuam na esfera discursiva, quer fazendo parte de
sistemas de linguagem correlacionados às práticas sociais (formações discursivas,
segundo Pêcheux e Foucault), quer como vozes ou enunciações encenadas,
implícitas ou mascaradas.
Assim, na época em que foi veiculada essa publicidade impressa, o mundo
assistia ao escândalo do presidente norte-americano Bill Clinton com Mônica
Lewinsky ao público os “escândalos da política” principalmente vindos de um país
considerado uma potência mundial.
Portanto, encontramos uma relação de interdiscursividade entre o momento
em que a campanha foi veiculada, o discurso da mídia impressa e a publicidade
analisada.
6.2.6 Análises da peça publicitária da BOM BRIL - T IA
Essa publicidade retrata o ex-estagiário da W/BRASIL Luciano Huck que cria
em seu antigo programa H, na Rede Bandeirante, a personagem Tiazinha.
A população se deliciava a ver a Tiazinha depilando os “machões”. Para as
Fonte: SOARES, 1998
Figura 17 – Campanha publicitária compra bom bril, tia
124
mulheres, isso era uma espécie de vingança aos homens, uma forma de eles
sentirem na pele o pouquinho do que as mulheres sofrem para ficarem belas.
Por outro lado, o público masculino também gostava de ver a Tiazinha na TV
principalmente vestida com um lingerie sexy e um chicote nas mãos mostrando-se
dominadora. O que fazia a “galera” masculina delirar. Sendo assim, a pretensão
publicitária do “Garoto Bom Bril” era também fazer com que as donas de casa
delirassem com os produtos da Bom Bril ao parodiar a Tiazinha, fazendo pose sexy
e com o chicote na boca. O discurso publicitário utilizado para convencer as donas
de casa foi empregado na forma verbal no imperativo “Compra Bom Bril, Tia,
compra” o que remete a um ato de fala diretivo, em que esse ato pode ser
interpretado tanto como um ato de ordenar, fazer um pedido, ou até mesmo uma
súplica para que seu interlocutor adquira os produtos da Bom Bril. Além disso, o uso
do vocativo “TIA” contempla o processo interdiscursivo da publicidade: primeiro, a
expressão “TIA” remete à dona de casa, através de um discurso infantil, para que
esta compre a Esponja de Lã de Aço Bom Bril; segundo, “TIA” remete à personagem
TIAZINHA do Programa H do apresentador Luciano Huck.
6.2.7 Análises da peça publicitária da BOM BRIL – M ULHER DO PADRE
Essa publicidade incorpora o ditado popular “O último que chegar é a mulher
do padre”, ditado esse que é conhecido como uma brincadeira que geralmente é
feita com pessoas, a fim de se obter rapidamente um resultado. Esse ditado se
Fonte: SANTOS, 1998
Figura 18 – Campanha publicitária Mulher do Padre
125
refere a mulheres que estão à procura de homens em lugares onde têm menos
homens do que mulheres e um dos homens é um Padre, ou seja, ele não pode
casar.
Então, à medida que as mulheres forem chegando vão arrumando seus
pares. A última mulher que chegar só encontrará o Padre disponível, isto é, ela
ficará sem par, uma vez que o Padre não pode casar. Nesse momento, a
publicidade instaura o recurso da interdiscursividade: para o ditado popular, ninguém
quer ser o último, porque ninguém deseja ficar solteiro (a) pela vida inteira; já para a
publicidade da Bom Bril, se você for o último, não terá a Esponja de Lã da Bom Bril
disponível, metaforicamente, você será a mulher do padre. Além disso, do ponto de
vista formal, trata-se de um enunciado que tem um ritmo marcado que favorece uma
fácil memorização e capta a atenção do leitor. Nesse caso, a publicidade estabelece
uma interdiscursividade com o conjunto de saberes que faz parte do próprio tecido
social. Assim, os ditados populares são tidos como a sabedoria de um povo.
Sempre dependendo do conhecimento partilhado entre os interlocutores, os
ditados populares representam o exemplo de heterogeneidade na publicidade,
sendo que sua forma favorece a identificação no slogan. É a articulação entre o
interesse privado da empresa anunciante e o conhecimento socialmente partilhado
por um grupo social.
Sendo assim, o enunciado de forma fixa (ditado popular) em qualquer texto
tem seu reconhecimento facilitado por essa estrutura já conhecida, mesmo que ele
seja objeto de um trabalho paródico. Sua presença pode ser reconhecida pela
similaridade que mantém com a versão original. Outro fato relevante nessa
publicidade foi a paródia do “Garoto Bom Bril” ao Padre Marcelo Rossi o qual é um
padre de grande destaque na mídia pelo seu carisma com o povo, pela fé
demonstrada e pelas belas músicas. Pode-se dizer que esse foi um recurso
linguístico intencionalmente elaborado com o objetivo de a publicidade da Bom Bril
poder atingir todo esse público que tem um carinho especial ao padre.
De acordo com as abordagens desenvolvidas sobre essas publicidades,
pode-se ressaltar que, a partir do quadro teórico-analítico da Análise do Discurso,
procuramos, nesta pesquisa, refletir sobre as formas marcadas e não-marcadas da
heterogeneidade discursiva.
Levando em consideração que todo discurso estabelece relações de
interdiscursividade com outros domínios discursivos, propusemo-nos a analisar os
126
anúncios publicitários veiculados na mídia brasileira, a fim de verificar as relações
que o discurso publicitário estabelece com outros domínios de saber, as categorias
discursivas que estão em jogo e os efeitos de sentido que são produzidos quando
elementos-outros são interiorizados no discurso publicitário.
Nesse sentido, essa análise frisou também a formação discursiva, sendo que
esta não deve ser considerada como um objeto estático, de fronteiras rígidas e
impermeáveis. Segue que o discurso, ao ser organizado por uma formação
discursiva, também se abre incessantemente a um exterior discursivo, passível de
promover a migração de saberes de um lugar para outro.
É nesses termos que falamos de um discurso publicitário: um conjunto de
enunciados provenientes da mesma formação discursiva − a formação discursiva
publicitária −, isto é, um espaço de dizer marcadamente heterogêneo, que
estabelece continuamente relações com o interdiscurso, ora importando saberes de
outros domínios, ora exportando seus próprios saberes.
Dessa forma, as condições de produção do discurso da publicidade, por seu
turno, são responsáveis por certas relações de força que se criam no interior do
discurso, delimitando a produção do sentido. Todo enunciado obedece a certas
condições de produção e, como não poderia deixar de ser, o mesmo ocorre com os
enunciados que circulam numa formação discursiva publicitária.
Portanto, nossa análise procurou identificar os saberes discursivos que se
entrelaçam com o discurso publicitário. No entanto, longe de procurar demarcar a
univocidade do discurso da publicidade ao apontar a existência de discursos-outros,
esta pesquisa partiu do conceito de interdiscursividade que caracteriza quaisquer
discursos.
127
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer desta pesquisa, buscamos focalizar a relevância de se considerar
uma postura mais abrangente, quando se propõe estudar os fenômenos da
linguagem. De fato, o estudo da natureza linguística só tem sentido quando se
interessa por vias de estudos que concebem a linguagem como manifestação de
processos interlocutivos, concretizados nas diversas atividades da práxis humana.
Valorizar a língua sob essa ótica nos permite integrar, concomitantemente, aspectos
linguísticos e pragmáticos, entendendo que através da língua não apenas se diz,
mas, sobretudo, se age: a interação verbal constitui-se pela/na enunciação ou
enunciações.
Sendo assim, esta pesquisa possibilitou constatar, através de Teorias de
autores como Bakhtin, Charaudeau, Foucault, Benveniste, Pêcheux, Maingueneau
entre outros, através da Análise do Discurso, que a publicidade, na sua dimensão
verbal e não-verbal, pode ser vista como uma fonte de recursos para análises
interdiscursivas. As peculiaridades de um texto publicitário são tão diversas e
disseminadas que nos possibilitam avaliá-lo como uma prática discursiva importante
na sociedade. Nesse caso, a publicidade apresenta características variadas, pois
pertence a um contexto histórico da época, podendo ser vista tanto do ponto de vista
ideológico como dialógico através de suas formas persuasivas de expressão.
Além da abordagem interdiscursiva da publicidade, esta pesquisa também se
baseou em outro aspecto determinante para a análise dos fenômenos linguístico-
discursivos investigados, qual seja a essência eminentemente argumentativa da
língua. Com a Teoria da Argumentação, fundamentada em Aristóteles, em
Perelman, em Amossy e seguidores, entendemos o valor intencional de nossas
ações ao usar a língua.
Dessa forma, ao analisarmos o texto publicitário, estivemos também
estudando as diversas teorias que marcam nosso trabalho, como o jogo de vozes
entrecruzadas que é responsável pela construção de sentidos, que se movimenta
entre o dizer e o não-dizer, pelo humor, pela crítica que se esconde, revelando a
polifonia, ideologismo e a interdiscursividade como a essência desse movimento de
sentidos. E é nesse dialogismo constante que os sentidos tornam-se outros e são
esses vários modos de existir dos sentidos que constituem a significação do
discurso publicitário.
128
Ressalta-se, ainda, que o presente trabalho pretendeu mostrar também os
diversos mecanismos que colaboram para a construção do sentido de um texto: as
cenas enunciativas que ele apresenta e que, ao mesmo tempo, fazem parte do seu
contexto enunciativo, a interdiscursividade e a intertextualidade, que dizem respeito
às relações entre discursos e textos, respectivamente, contribuindo para o
estabelecimento de novos sentidos e compreensão dos textos de anúncios
publicitários. Esses mecanismos nos fazem perceber com mais clareza que o texto
não é uma estrutura fechada sobre si mesmo, mas relaciona-se com um exterior que
lhe dá sentido próprio no seu contexto enunciativo.
Podemos ressaltar que a análise desta pesquisa constituiu-se de Aspectos
Preliminares de Análise no capítulo dois, em que foram destacados recursos
interdiscursivo-argumentativos em dois textos: “Amelie Poulain” e “Eu, Etiqueta”,
com o intuito de mostrar preliminarmente o âmbito de nossa pesquisa, bem como a
justificativa da escolha da proposta de nosso trabalho.
Além disso, a pesquisa foi divida em duas partes: a primeira enfatiza
campanhas publicitárias que abordam aspectos argumentativos; já a segunda
refere-se às campanhas publicitárias que focalizam padrões de interdiscursividade.
Dessa forma, as duas partes da análise desse corpus ressaltaram não só a
temática, mas também recursos linguísticos que compõem a argumentação, assim
como a força ideológica e os recursos de interdiscursividade que estão presentes
em cada uma delas. Assim, a primeira parte constituiu-se de uma análise que
procurou contemplar como foco mais relevante os aspectos argumentativos e isso
pode ser constatado nestas publicidades I- TAM, II- MINISSÉRIE AMAZÔNIA, III –
TUPPERWARE, IV – GOVERNO DO CEARÁ, V – VOLKSWAGEN-AUDI 4, VI –
VOLKSWAGEN-SPACE FOX, VII – NATURA, VIII – OI, IX – FERRACINI. Já a
segunda parte da análise do corpus contemplou os padrões de interdiscursividade
como recurso mais enfatizado, como se pode detectar nas campanhas publicitárias
X – BOTICÁRIO E MARISA, e nas publicidades sobre a BOM BRIL que vão desde a
XII a XVI.
Assim, nesta pesquisa focalizamos o discurso publicitário, sua constituição à
heterogeneidade pós-moderna, os aspectos argumentativos, assim como, a
presença da interdiscursividade em peças publicitárias. O resultado deste estudo
aponta um hibridismo identitário produzido pelo campo discursivo publicitário.
A análise, conforme a abordagem do discurso, sugere que a heterogeneidade nas
129
identidades de gênero é produto da manipulação ideológica que alimenta a voragem
capitalista para criar novos mercados, constituindo as intimidades de acordo com a
rearticulação das práticas sociais.
Espera-se, portanto, com base nessas reflexões linguísticas e nas
abordagens acerca da linguagem, que este estudo possa contribuir para o
enriquecimento da linguagem como fenômeno interdiscursivo, como uso e interação
social, que se apresenta em constante processo de investigação e aperfeiçoamento,
a fim de que possamos usá-la cada vez melhor, de forma a compreender e fazer-nos
compreendidos em todas as situações de uso. Logo, as reflexões encadeadas,
nesta pesquisa, pretenderam mostrar o profícuo campo de investigação que o
gênero discursivo da publicidade possibilita.
130
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