lavagem de capitais - 2012
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LAVAGEM DE CAPITAIS: Lei 9.613/98
1. 1. Histórico da Lei 9.613/98:
A comunidade internacional chegou à conclusão de que o combate a
determinados tipos de criminalidade, como o tráfico de drogas e o crime
organizado, somente pode ser feito de forma eficaz se houver medidas
estatais que persigam o lucro decorrente desses crimes.
Desse modo, a criminalização da lavagem de dinheiro está diretamente
relacionada com o combate ao tráfico de drogas, ao crime organizado, aos
crimes contra a ordem tributária, aos crimes contra o sistema financeiro,
aos crimes contra a administração pública e a outros delitos que geram
para seus autores lucros financeiros.
O objetivo, portanto, é o privar as pessoas dedicadas a certos crimes do
produto de suas atividades criminosas e, assim, eliminar o principal
incentivo a essa atividade.
Nesse contexto, o Brasil assinou um tratado internacional no qual se
comprometeu a reprimir a lavagem de capitais. Trata-se da chamada
Convenção de Viena:
Convenção contra o tráfico ilícito de entorpecentes e substância
psicotrópicas (Convenção de Viena)
Assinada em Viena, em 20 de dezembro de 1988.
Promulgada pelo Brasil por meio do Decreto 154/1991.
Estabeleceu que os países signatários deveriam adotar medidas para
tipificar como crime a lavagem ou ocultação de bens oriundos do tráfico
de drogas.
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1.2. A expressão “Lavagem de capitais”:
O termo “lavagem de dinheiro” surge nos EUA, sendo lá chamada de “money
laundering”.
A origem do termo remonta a cidade de Chicago, na década de 20, quando
vários líderes do crime organizado abriram lavanderias de fachada nas
quais superfaturavam os lucros a fim de justificar seus ganhos ilícitos e
seu padrão de vida. Os criminosos, portanto, lavavam pouca roupa, mas
muito dinheiro.
Outras terminologias adotadas no mundo:
Em alguns países da Europa o crime de “lavagem de dinheiro” é conhecido
como “branqueamento de capitais”, o que não é uma terminologia adequada
considerando que poderia gerar discussões sobre eventual concepção
racional preconceituosa.
1.3. Conceito de Lavagem de capitais:
Por meio da lavagem de capitais, bens, direitos e valores obtidos com a
prática de crimes são integrados ao sistema econômico-financeiro, com a
aparência de terem sido obtidos de maneira lícita.
Ou seja, determinados crimes geram vultuosas quantias para os criminosos,
e eles precisam de alguma forma mascarar a origem desses valores. Ai é
que surge a lavagem de capitais. Ex.: locadora de filmes ou cinema que
sejam usados para lavagem de capitais (é muito difícil verificar qual a
quantia de dinheiro que um estabelecimento desses movimentou por mês).
Pergunta: para se falar em lavagem de capitais, é preciso que tenha sido
movimentado uma quantia vultuosa, ou um simples cheque já pode configurar
o crime? O depósito de um único cheque pode configurar o crime?
São poucos os casos desse tipo que chegam aos Tribunais Superiores, mas o
STF já entendeu que não é necessária a complexidade das operações, nem
tampouco um vulto assustador das quantias envolvidas. Um simples depósito
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de cheque já é suficiente para caracterizar o delito de lavagem de
capitais.
Lavagem de dinheiro é:
- a conduta segundo a qual a pessoa;
- oculta ou dissimula;
- a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou
propriedade;
- de bens, direitos ou valores;
- provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal;
- com o intuito de parecer que se trata de dinheiro de origem lícita.
Em palavras mais simples, lavar é transformar o dinheiro “sujo” (porque
oriundo de um crime) em dinheiro aparentemente lícito.
1.4. Gerações de leis de lavagem de capitais:
A lavagem de capitais surgiu, como vimos, na Convenção das Nações Unidas.
Quando a lavagem de capitais surgiu, ela estava ligada ao tráfico de
drogas. Com o passar dos anos, percebeu-se que era interessante expandir
a lavagem de capitais para outros delitos. Foi assim que surgiram as
gerações de leis de lavagem de capitais.
a) A 1ª geração de leis trazia a idéia de que o único crime antecedente
do qual resultaram bens, direitos e valores era o tráfico de drogas.
b) Nas leis de 2ª geração houve uma ampliação do rol de crimes
antecedentes, porém, permanece um rol taxativo. Nessas leis o tráfico já
não é o único crime antecedente. Existem outros delitos, mas em numerus
clausus.
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c) As legislações de 3ª geração, por sua vez, consideram que qualquer
crime grave pode figurar como delito antecedente do crime de lavagem de
capitais.
A Lei nº 12.683/2012 alterou a Lei n.º 9.613/98 para tornar mais
eficiente a persecução penal dos crimes de lavagem de dinheiro. Agora, o
artigo primeiro da Lei nº 9.613/98 como crime antecedente qualquer
infração penal, abarcando, agora, crimes e contravenções.
Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização,
disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores
provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal.
Antes: a lei brasileira listava um rol de crimes antecedentes para a
lavagem de dinheiro fazendo com que o Brasil, segundo a doutrina
majoritária, estivesse enquadrado nas legislações de segunda geração.
Agora: qualquer infração penal pode ser antecedente da lavagem de
dinheiro. A legislação brasileira passa a ser a terceira geração.
“A eliminação do rol apresenta vantagens e desvantagens. Por um lado
facilita a criminalização e a persecução penal de lavadores
profissionais, ou seja, de pessoas que se dedicam profissionalmente à
lavagem de dinheiro. Por outro lado, a eliminação do rol gera certo risco
de vulgarização do crime de lavagem, o que pode ter duas consequências
negativas. A primeira, um apenamento por crime de lavagem superior à
sanção prevista para o crime antecedente, o que é, de certa forma,
incoerente. A segunda, impedir que os recursos disponíveis à prevenção e
a persecução penal sejam focados na criminalidade mais grave.
Podemos citar um exemplo esclarecedor sobre o assunto: Se um grupo estáel
de quatro pessoas, formado para a prática de crimes, realizasse, por
exemplo vários estelionatos e, com isso, arrecadasse uma grande quantia
em dinheiro que seria dissimulado por meio de lucro ficto de empresas de
fachada, tal conduta não seria punida como lavagem de capitais.
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Com a alteração trazida pela Lei nº 12.683/12, para os casos posteriores
à sua vigência, não é necessário mais discutir se existe ou não definição
legal de organização criminosa no Brasil considerando que, como visto, o
dinheiro “sujo” obtido com qualquer crime, se for ocultado ou
dissimulado, configurará delito de lavagem de capitais.
Perde, assim, relevância a longa e acirrada discussão se era válida ou
não a definição de organização criminosa estabelecida pelo Decreto
5.015/04, que promulgou a Convenção das Nações Unidas contra os Crimes
Organizado Transnacional – Convenção de Palermo.
Esse debate terá ainda importância nos casos anteriores à Lei nº
12.683/12 que, neste ponto, não é retroativa por ser lei penal mais
gravosa.
1.5. Fases da lavagem de capitais:
Aqui vamos trabalhar com essas fases da lavagem de capitais de acordo com
o chamado GAFI – Grupo de Ação Financeira sobre lavagem de dinheiro.
Trata-se de um grupo que foi criado pelos países mais ricos e que tem
exatamente essa idéia de punir a lavagem de capitais.
Fases:
1ª) Colocação: expressão em inglês “placement” – consiste na introdução
do dinheiro ilícito no sistema financeiro, dificultando a identificação
da procedência dos valores. É uma fase em que o dinheiro é introduzido.
Essa primeira fase, talvez seja a melhor fase para a descoberta do
delito, pois nela o dinheiro ainda está muito próximo de sua origem. Aqui
são utilizadas algumas técnicas, como por ex. a técnica do “smurfing” que
consiste no fracionamento de grandes quantias em pequenos valores.
art. 10, LLC: “Da Identificação dos Clientes e Manutenção de Registros”.
Esta lei tenta combater aquele antigo brocado segundo o qual “dinheiro
não tem cheiro”, dinheiro não tem origem. A lei quer, então, impor uma
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nova metodologia de trabalho ao sistema financeiro. Normalmente pega-se o
dinheiro e não se questiona de onde ele veio. Mas existe sim a obrigação
de se identificar quem são os clientes da instituição financeira.
Uma segunda técnica que é utilizada seria a utilização de
estabelecimentos comerciais que trabalhem com dinheiro em espécie. Como
ex. temos os cinemas, as locadoras de vídeos, as lavanderias, os
doleiros.
2ª) Dissimulação: expressão em inglês “layering” (no sentido de colocar
camadas) – nessa fase é realizada uma série de negócios ou movimentações
financeiras, a fim de impedir o rastreamento e encobrir a origem ilícita
dos valores. Ai é que entra o Sistema bancário. Num primeiro momento,
temos uma determinada quantia, ex.: R$ 500.000,00, que precisam ser
colocados no sistema financeiro. Ele é, então, colocado numa conta. Nessa
dissimulação se começa a fazer uma série de movimentações financeiras,
transferindo o dinheiro de uma conta para outra, para dificultar o
conhecimento da sua origem.
3ª) Integração: expressão em inglês – “integration” – nessa fase, já com
a aparência lícita, os bens são formalmente incorporados ao sistema
econômico, geralmente por meio de investimentos no mercado mobiliário ou
imobiliário. Depois das diversas transferências bancárias, o dinheiro
volta, muitas vezes até mesmo para refinanciar os crimes antecedentes.
Um único depósito de cheque, como vimos, já seria lavagem. O depósito de
cheque está na 1ª fase. Assim, para que o delito de lavagem de capitais
esteja configurado, não é preciso que estejam preenchidas as 3 fases. Não
é necessária a ocorrência dessas 3 fases para que o delito de lavagem
esteja consumado (RHC 80.816).
1.6. Bem jurídico tutelado:
Sobre o bem jurídico tutelado há 4 correntes na doutrina:
I- Uma primeira corrente diz que o bem jurídico tutelado é o mesmo bem
jurídico tutelado pelo crime antecedente. Essa corrente até seria
interessante quando estivéssemos diante das leis de 1ª geração (só o
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tráfico seria o crime antecedente). Agora, porém, já não é mais possível
sustentar essa corrente, diante da diversidade de bens jurídicos
tutelados pelos crimes antecedentes.
II- Uma segunda corrente diz que o bem jurídico tutelado seria a
Administração da Justiça, porque o cometimento da lavagem torna difícil a
recuperação do produto do crime. Esta é a posição do prof. Rodolfo Tigre
Maia, dentre outros.
III- Uma terceira corrente entende que o bem jurídico tutelado é a ordem
econômico-financeira. Essa é a posição que, sem dúvida alguma, prevalece.
IV- A última corrente, por sua vez, entende que a lavagem de capitais
ofende dois bens jurídicos: o sistema econômico-financeiro e o bem
jurídico tutelado pelo crime antecedente. Essa é a posição do prof.
Alberto Silva Franco. Não é, porém, a posição que prevalece.
Tutelada que é a ordem econômico-financeira, vale uma observação
importante: a doutrina entende que é cabível a aplicação do Princípio da
Insignificância que, porém, está condicionado à presença de 4
pressupostos:
a) mínima ofensividade da conduta;
b) ausência de periculosidade social da ação;
c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e
d) inexpressividade da lesão jurídica provocada.
Com relação à União, pacificou-se o entendimento de que a quantia limite
é R$ 20.000,00.
1.7. Crime antecedente:
A lavagem de dinheiro é classificada como um crime acessório ou
parasitário, considerando que se trata de delito que pressupõe a
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ocorrência de uma infração penal anterior. A doutrina chamava essa
infração penal anterior de “crime antecedente”.
A lei alterada afirma que a lavagem de dinheiro depende de uma infração
penal antecedente. Infração penal é um gênero que engloba duas espécies:
crime e contravenção. Logo, a lavagem depende agora de uma “infração
penal antecedente”
Ante: somente havia lavagem de dinheiro se a ocultação ou dissimulação de
bens, direitos ou valores proveniente de um crime antecedente.
Agora: haverá lavagem de dinheiro se a ocultação ou dissimulação for de
bens, direitos ou valores provenientes de um crime ou de uma contravenção
penal. Desse modo, a lavagem de dinheiro continua a ser um crime
derivado, mas agora depende de uma infração penal antecedente, que pode
ser um crime ou uma contravenção penal.
Importância no caso do “jogo do bicho”:
O chamado “jogo do bicho” não é previsto como crime no Brasil, sendo
considerado apenas contravenção penal tipificada no art. 51 do Decreto-
Lei nº 3.688/41. Logo, os chamados “bicheiros” ganhavam muito dinheiro e,
com essa quantia compravam imóveis e carros em nome das esposas, parentes
amigos, que funcionavam como “laranjas” ou então abriam empresas de
fachada apenas para “esquentar” as quantias recebidas com a contravenção
penal. Tal conduta de ocultação ou dissimulação do dinheiro “sujo” passa
agora a ser punida com lavagem, nos termos do novo art. 1º da Lei nº
9.603/98.
Outro exemplo seria o seguinte: para que se possa falar em lavagem, é
preciso visualizar que o dinheiro é resultado de um dos crimes
antecedentes. Ex.: tráfico de drogas.
Temos, basicamente, dois crimes: o tráfico de drogas e a lavagem de
capitais. Pergunta: os dois processos (o de lavagem e o de tráfico)
precisam tramitar juntos? Não. Não é necessária a tramitação conjunta dos
processos. Mas, se ela for possível, tanto melhor.
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Pode acontecer, por ex., que o agente seja absolvido pelo crime
antecedente (tráfico de drogas). Deve ele então ser absolvido pelo crime
de lavagem de capitais? Inicialmente devemos analisar qual foi o
fundamento da absolvição.
Assim: o processo e julgamento do crime de lavagem de capitais não
precisa tramitar obrigatoriamente em um simultaneus processus com o crime
antecedente. Se isso for possível, deverá ocorrer, mas, daí não se pode
concluir que a reunião dos processos seja obrigatória.
- A condenação pelo crime antecedente não é pressuposto para a condenação
pelo crime de lavagem (STJ, HC 36.837).
- A comprovação da ocorrência do crime antecedente figura como uma
questão prejudicial homogênea (do mesmo ramo do direito) do mérito da
ação penal relativa ao crime de lavagem.
Na hora de julgar alguém por lavagem, o juiz precisa, de maneira
incidental, afirmar que o dinheiro que foi lavado seria proveniente do
crime antecedente.
- Para a caracterização do delito de lavagem de capitais, o fato anterior
previsto como crime antecedente deve ser típico e ilícito, não se
exigindo a culpabilidade (Princípio da Acessoriedade Limitada).
- Caso haja a absolvição do autor do crime antecedente, com fundamento na
inexistência do fato, não constituir o fato infração penal ou existir
circunstância que exclua o crime, não será possível a punição do delito
de lavagem de capitais. É preciso, pois, saber o que gerou a absolvição
do crime antecedente.
Art. 386, CPP:
Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte
dispositiva, desde que reconheça:
I - estar provada a inexistência do fato;
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II - não haver prova da existência do fato;
III - não constituir o fato infração penal;
IV – estar provado que o réu não concorreu para a infração
penal; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)
V – não existir prova de ter o réu concorrido para a infração
penal; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)
VI – existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de
pena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 1o do art. 28, todos do Código Penal),
ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência; (Redação dada
pela Lei nº 11.690, de 2008)
VII – não existir prova suficiente para a condenação.
Por outro lado, se o autor do crime antecedente for absolvido com base em
uma causa excludente da culpabilidade, subsiste a possibilidade de
punição pelo crime de lavagem de capitais.
- Presente uma causa extintiva da punibilidade, em relação ao crime
antecedente, nada impede a condenação pelo crime de lavagem de capitais.
Exceções: há duas causas extintivas da punibilidade que impedem que o
agente seja condenado pela lavagem de capitais: a abolitio criminis e a
anistia.
Pergunta: e se o crime antecedente ficar na modalidade tentada, e
possível a condenação pelo crime de lavagem de capitais?
No que toca ao crime antecedente tentado, nada impede a condenação do
agente pelo crime de lavagem, mas desde que tenham sido produzidos bens
aptos a serem lavados (o que, porém, dificilmente ocorre na prática).
Art. 2º O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei:
(...)
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II - independem do processo e julgamento das infrações penais
antecedentes, ainda que praticados em outro país, cabendo ao juiz
competente para os crimes previstos nesta Lei a decisão sobre a unidade
de processo e julgamento;
Para que seja recebida a denúncia pelo crime de lavagem, deve haver, no
mínimo, indícios da prática da infração penal antecedente.
Registre-se que não exige condenação prévia da infração penal antecedente
para que seja iniciada a ação penal pelo delito de lavagem de dinheiro.
Por essa razão, o julgamento da infração antecedente e do crime de
lavagem não precisa ser feito, necessariamente, pelo mesmo juízo.
Exemplo: Jaime, traficante internacional de drogas, envia o lucro
decorrente do comércio ilícito de drogas, por meio de doleiros, para um
paraíso fiscal.
Quantos crimes praticou:
- Tráfico transnacional de drogas (art. 33 c/c art. 40, I da Lei nº
11.343/06)
- Evasão de divisas (art. 22, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86);
- Lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei nº 9.603/98).
Para que seja oferecida a denúncia por lavagem de dinheiro não é
necessário que haja condenação prévia por tráfico ou evasão de divisas
(infrações penais antecedentes), bastando que existam indícios de sua
prática.
Outra pergunta: é necessário que esses três crimes sejam julgados pelo
mesmo juízo? O julgamento das três infrações precisará ser em conjunto?
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Não. O julgamento da lavagem de dinheiro não precisa ser,
necessariamente, feito pelo mesmo juízo que irá julgar a infração penal
antecedente.
A intenção original da Lei nº 9.603/98 era consagrar uma autonomia
absoluta entre o processo e o julgamento do crime de lavagem de dinheiro
e o da infração penal antecedente.
Ocorre que a jurisprudência afirmou que essa autonomia é relativa, ou
seja, é o juiz quem irá analisar se é conveniente ou não a reunião dos
processos, de acordo com as circunstâncias do caso concreto.
A lei nº 12.683/12 ao alterar o inciso II do art. 2º da Lei de lavagem,
deixou claro o que a jurisprudência e a doutrina majoritária já
sustentavam: o julgamento do crime de lavagem de dinheiro e da infração
penal antecedente podem ser reunidos ou separados, conforme se revelar
mais conveniente no caso concreto, cabendo ao juiz competente para os
crimes de lavagem decidir sobre a unidade ou separação dos processos.
Antes: a lei de lavagem afirmava que havia autonomia entre o julgamento
da lavagem e do crime antecedente, não esclarecendo se esta autonomia era
absoluta ou relativa nem o juízo responsável por decidir a unificação ou
separação dos processos.
AGORA: a alteração deixou claro que a autonomia entre o julgamento da
lavagem e da infração penal antecedente é relativa, de modo que a lavagem
e a infração antecedente podem ser julgadas em conjunto ou separadamente,
conforme se revelar mais conveniente no caso concreto, cabendo ao juiz
competente para o crime de lavagem decidir sobre a unidade ou separação
dos processos.
1.7. Sujeitos do crime:
- Sujeito passivo: é o Estado.
- Sujeito ativo: qualquer pessoa; o crime é comum.
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1.7.1. Pergunta: O autor do crime antecedente também responde por
lavagem?
Quanto a isso temos duas correntes:
1ª) não é possível que o autor do crime antecedente responda pelo delito
de lavagem de capitais, da mesma forma que acontece com os crimes de
receptação e favorecimento real. Na verdade, quando praticamos um crime,
a ocultação dos valores seria considerada mero exaurimento da conduta
anterior. Quando se pratica um crime é óbvio que esse dinheiro não ficará
simplesmente guardado e parado. Um outro argumento também interessante é
o de que a punição pelo delito de lavagem de capitais seria a violação do
Princípio que veda a auto-incriminação. Se se punisse o agente pela
lavagem de capitais, é como se ele fosse obrigado a revelar os valores
obtidos com o crime antecedente. Não é a corrente que prevalece.
2ª) nada impede que o autor do crime antecedente também responda pelo
crime de lavagem de capitais. O argumento de que a ocultação seria
exaurimento não é possível. Alguns doutrinadores afirmam que o princípio
da consunção deve analisar bens jurídicos. Não há como falar que a
lavagem seria mero exaurimento, se ela se refere a bem jurídico autônomo.
A partir do momento em que o dinheiro é investido e aplicado no mercado,
há uma conduta autônoma que vai lesar bem jurídico distinto. É a posição
que prevalece. Neste caso, aplica-se a regra do art. 69, CP: responde o
agente pelo delito antecedente e pela lavagem de capitais.
Pergunta: para responder por lavagem de capitais é preciso que o agente
tenha praticado o crime antecedente?
Não. A participação no crime antecedente não é condição sine qua non para
que o agente responda por lavagem de capitais, desde que tenha
conhecimento quanto à origem criminosa dos valores.
STJ, RMS 16.813
A tendência hoje é cada vez mais que ocorra essa terceirização da
lavagem: o próprio traficante não realiza o processo de lavagem, existem
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pessoas que são contratadas especialmente para isso (inclusive
advogados).
1.8. Tipo objetivo:
1.8.1. Conceituação dos dois verbos utilizados:
- Ocultar: significa esconder a coisa, dissimulando a posse. Ocorre
quando alguém pratica algum tipo de conduta objetivando dificultar ou
impedir que alguém encontre uma coisa.
- Dissimular: significa disfarçar; ou seja, o agente visa garantir a
ocultação. Dissimulação significa ocultação com fraude.
Atenção: a partir do momento em que a lei usa o verbo ocultar, temos aqui
um ex. de crime permanente, aquele cuja consumação se prolonga no tempo.
Caso depósitos tenham sido efetuados antes da vigência da lei, responderá
o agente normalmente pelo delito, caso essa ocultação se prolongue no
tempo (04/03/98 – data da vigência da lei).
Súm. 711, STF:
“A lei penal mais grave (neste caso, a lavagem de capital) aplica-se ao
crime continuado ou ao crime permanente se a sua vigência é anterior à
cessação da continuidade ou da permanência”.
Temos neste tipo objetivo dois verbos. Assemelha-se ao crime de tráfico
(só que no tipo objetivo de tráfico temos vários verbos, e não apenas
dois).
Esse tipo de crime em que temos vários verbos denomina-se crime de ação
múltipla ou de conteúdo variado. A relevância desta informação está no
Princípio da alternatividade: nos crimes de ação múltipla ou de conteúdo
variado, responderá por crime único o agente que praticar mais de uma
conduta dentro do mesmo contexto fático.
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A lavagem de capitais é exemplo, de acordo com a doutrina, de um crime
diferido ou remetido (ou acessório), pois depende da prática do crime
antecedente (e remete a este crime antecedente).
→ Natureza do crime de lavagem de capitais: é crime material ou crime
formal?
art. 1º e §1º, da LLC:
Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização,
disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores
provenientes, direta ou indiretamente, de crime: (...)
§ 1º Incorre na mesma pena quem, para ocultar ou dissimular a utilização
de bens, direitos ou valores provenientes de qualquer dos crimes
antecedentes referidos neste artigo:
I - os converte em ativos lícitos;
II - os adquire, recebe, troca, negocia, dá ou recebe em garantia,
guarda, tem em depósito, movimenta ou transfere;
III - importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos
verdadeiros.
O tipo penal fala em “ocultar ou dissimular...”, tanto no caput como no
§1º. Ocorre que o tipo penal do caput é diverso do crime do §1º. As
redações são muito diversas.
Assim, podemos afirmar que no §1º, como a redação traz o termo “para
ocultar ou dissimular”, a intenção (a finalidade) do agente é ocultar ou
dissimular, sem que haja necessidade de que isso ocorra. Há, assim, um
crime formal. Já no caso do caput, a redação diz apenas “ocultar ou
dissimular”, mas não fala em finalidade, mas apenas no verbo, o que quer
dizer que nesse caso é necessária a produção do resultado. Assim, trata-
se de crime material. Esse seria o melhor entendimento.
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Não obstante, a doutrina majoritária entende que ambas as figuras (caput
e §1º) trazem um crime formal.
1.8.2. Pergunta: o crime de lavagem é um crime congruente ou
incongruente?
- Tipo congruente ou congruente simétrico é o tipo em que há uma perfeita
adequação entre os elementos objetivos e subjetivos do tipo penal. No
tipo congruente é como se disséssemos que o tipo objetivo é absolutamente
ao tipo subjetivo. Ex. clássico de tipo congruente: homicídio – a conduta
incriminada pelo art. 121 é matar alguém, e o tipo subjetivo é querer
matar alguém (o chamado animus necandi).
- Tipo incongruente ou congruente assimétrico, por sua vez, é o tipo em
que não há uma perfeita adequação, sendo que o tipo subjetivo é acrescido
de um dolo específico (ou especial fim de agir).
Quando nos deparamos com um tipo incongruente, já não conseguimos fazer o
encaixe. Nele temos um tipo objetivo, mas o tipo subjetivo será acrescido
do chamado dolo específico (ex.: “para o fim de”, “com o fim de”).
Ex. de tipo incongruente: crime de extorsão mediante seqüestro (art. 159,
CP), em que há um especial fim de agir – diferentemente do crime de
seqüestro (art. 158, CP), que é ex. de tipo congruente.
Atenção para esse tema (tipo congruente ou incongruente) na Lei de
Drogas! Muito provável que caia em concursos: o tráfico é ex. de tipo
congruente (não exige nenhuma finalidade específica), enquanto o crime do
art. 28 é ex. de tipo incongruente (exige a finalidade específica “para
uso próprio”).
Atenção: o art. 1º, caput, da LLC é um ex. de crime de tipo congruente,
enquanto que o §1º é ex. de um tipo incongruente.
1.9. Tipo subjetivo:
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No Brasil, o crime de lavagem de capitais somente é punido a título de
dolo. Em alguns países da Europa o crime é punido a título de culpa.
Pergunta: o crime é punido apenas a título de dolo direto ou também é
punido a título de dolo eventual? Alguns doutrinadores dizem que o delito
de lavagem de capitais somente seria punido a título de dolo direto. Mas
sabemos que quando o legislador quer afastar o dolo eventual ele o faz de
maneira expressa. Vejamos alguns exemplos:
Ex.: art. 339, CP – denunciação caluniosa (traz a expressão “de que o
sabe inocente”) – o legislador restringe o tipo à figura do dolo direto;
Outro ex.: art. 180, CP – receptação (traz a expressão “coisa que sabe
ser produto de crime”) – o legislador diz que para ser punido é preciso
saber que aquilo era produto de crime (se o agente apenas assumir o
risco, o fato é atípico).
Voltando para a LLC: somente no §2º é que o legislador restringiu o tipo
ao dolo direto. Todas as condutas do art. 1º são puníveis tanto a título
direto, quanto a título de dolo eventual – salvo no caso do §2º, em que
as condutas somente são puníveis a título de dolo direto:
§ 2º Incorre, ainda, na mesma pena quem:
I - utiliza, na atividade econômica ou financeira, bens, direitos ou
valores que sabe serem provenientes de qualquer dos crimes antecedentes
referidos neste artigo;
II - participa de grupo, associação ou escritório tendo conhecimento de
que sua atividade principal ou secundária é dirigida à prática de crimes
previstos nesta Lei.
Para que o agente responda por lavagem de capitais, não basta que ele
tenha conhecimento de que está ocultando valores, direitos, bens. É
preciso que ele saiba que os valores são provenientes de crime. Ou seja,
é indispensável que o agente tenha conhecimento de que os bens, direitos
ou valores ocultados são provenientes dos crimes antecedentes previstos
no art. 1º.
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Problema: se cada vez mais a lavagem passa por um processo de
terceirização e profissionalização, o que a empresa de lavagem vai querer
saber sobre a origem dos valores? Nada.
Surge ai a chamada “Teoria da Cegueira Deliberada”: tem origem nos EUA e
é também conhecida como “Teoria ou Instruções da Avestruz” (em inglês
fala-se em “Wilfull Blindness” ou “Ostrich instructions”). Ela surgiu
inicialmente no crime de tráfico de drogas, mas passou a ser trazida
também para o crime de lavagem de capitais. Esta teoria traz a idéia de
que a pessoa deliberadamente evita a consciência da origem do dinheiro.
Assim, nos casos de lavagem é cada vez mais comum que o lavador
profissional evite conhecer a origem do dinheiro.
Atenção: quando o agente deliberadamente evita a consciência quanto à
origem ilícita dos bens, assume o risco de produzir o resultado,
respondendo pelo delito de lavagem de capitais a título de dolo eventual.
Ex.: caso do Banco Central de Fortaleza – dois empresários venderam 11
veículos para os autores da subtração, e foi pago tudo em dinheiro. E
eles não procuraram saber a origem dos valores. R$ 164.755.150,00 foram
subtraídos nesse golpe. O crime antecedente aqui foi praticado por uma
organização criminosa.
1.10. Objeto material:
Aqui basta que saibamos que o objeto material não se confunde com o bem
jurídico.
O objeto material do crime de lavagem de capitais são os bens, direitos
ou valores provenientes direta ou indiretamente dos crimes antecedentes
definidos no art. 1º, da LLC.
A doutrina distingue o produto direto de crime (ou producta sceleris) do
produto indireto: o produto direto do crime é o resultado imediato do
delito (ex.: na corrupção passiva, é a vantagem indevida que se recebe);
o produto indireto ou proveito da infração (também conhecido como fructus
19
sceleris) é o resultado mediato do crime, ou seja, é o proveito obtido
pelo criminoso como resultado da utilização do produto direto do delito
(ex.: a compra de um veículo com o dinheiro obtido com o tráfico). Tanto
o produto direto como o produto indireto dos crimes antecedentes é objeto
da lavagem.
1.11. Crimes antecedentes:
A legislação brasileira adota um rol taxativo (numerus clausus).
art. 1º, LLC:
Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização,
disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores
provenientes, direta ou indiretamente, de crime:
I - de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins;
II – de terrorismo e seu financiamento;
III - de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado
à sua produção;
IV - de extorsão mediante seqüestro;
V - contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou
para outrem, direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como condição
ou preço para a prática ou omissão de atos administrativos;
VI - contra o sistema financeiro nacional;
VII - praticado por organização criminosa.
VIII – praticado por particular contra a administração pública
estrangeira (arts. 337-B, 337-C e 337-D do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 – Código Penal).
Pena: reclusão de três a dez anos e multa.
Lendo esse rol, vemos que dele não consta:
20
- contravenções penais (e deveria ter constado pelo menos o jogo do
bicho);
- crimes contra a ordem tributária;
- crimes ambientais.
Análise dos crimes antecedentes:
1.11.1 Tráfico ilícito de drogas:
Pergunta: qual é o crime de tráfico de drogas, e onde ele está previsto?
O art. 33 da Lei de drogas não traz, assim como o CP (ex.: art. 121 –
homicídio), o nome do crime.
Na lei antiga (Lei 6368/76), a jurisprudência sempre considerou como
crime de tráfico o art. 12 e o art. 13 da lei. O art. 14, que à época
trazia a associação para o tráfico, de acordo com a jurisprudência
majoritária, não era equiparado a crime hediondo.
Na lei nova, o art. 33 traz, sem dúvida alguma, a figura do crime de
tráfico de drogas, mas o art. não traz o nome do crime.
Problema: o §2º traz a figura de quem induz, instiga ou auxilia alguém ao
uso indevido de drogas. Essa conduta caracteriza tráfico? Dela não
resulta nenhum bem, direito ou valor a ser lavado.
O art. 44 da Lei de drogas dá uma dica do que seja o crime de tráfico. A
partir do momento em que ele restringe a liberdade provisória, a anistia,
a graça, o indulto e a fiança para alguns crimes, ele indica que tais
crimes sejam crimes de tráfico de drogas. Ocorre que o crime do art. 35
(associação) deve ser excluído desse rol – e da mera associação não
resulta dinheiro, então não é possível que haja lavagem de capitais dela
proveniente.
Assim, o ideal é dizer que os crimes de tráfico são os previstos nos
seguintes dispositivos:
21
- art. 33, caput e §1º;
- arts. 34, 36 e 37.
O art. 36 da lei de drogas é o crime de financiamento para o tráfico.
Esse financiamento pode, então, ser equiparado ao crime de tráfico para
fins de lavagem de capitais.
1.11.2. Terrorismo e seu financiamento:
Pergunta: existe o crime de terrorismo no ordenamento jurídico? A maioria
da doutrina entende que não, que este delito não está definido no
ordenamento jurídico. Alguns doutrinadores, todavia, dentre eles Antonio
Scaranze Fernandes, sustentam que o delito estaria previsto no art. 20 da
Lei 7.170/83 (lei de Segurança Nacional), que traz os chamados crimes
políticos.
Problema: quando esse dispositivo fala em “atos de terrorismo”, esta
expressão funciona como um elemento normativo, que é um elemento
constante do tipo penal, cuja compreensão demanda um juízo de valor.
Ex.: mulher honesta (quando ainda existia no CP).
Atos de terrorismo é, pois, um outro exemplo de elemento normativo. Ou
seja, não é possível saber se é ou não terrorismo, porque não se sabe
quais são os atos de terrorismo.
Essa mesma discussão já existiu antes, no ECA:
art. 233, da Lei 8.069/90 (ECA): submeter criança ou adolescente sob sua
autoridade, guarda ou vigilância, a tortura. Tortura aqui é um elemento
normativo. O que seria essa tortura a que se refere esse art. 233? Uma
coisa pode ser tortura para alguém e não ser para outrem.
A legalidade do art. 233, ECA foi questionada perante o STF, que concluiu
por sua constitucionalidade, sob o argumento de que o conceito de tortura
poderia ser apreendido a partir das convenções internacionais das quais o
Brasil fosse signatário.
22
Esse art., porém, foi revogado pela Lei de Tortura.
O que importa aqui é que esse mesmo argumento do STF pode vir a ser
utilizado pelo STF no caso do crime de terrorismo.
Obs.: dissemos que para a maioria da doutrina o terrorismo não estaria
previsto no ordenamento pátrio. Mas e se o crime for praticado fora do
país e os valores sejam aplicados aqui no Brasil? O crime de lavagem de
capitais pode ser punido aqui no Brasil? Não.
Caso o delito de terrorismo seja praticado em outro país, entende a
doutrina que não será possível a punição pelo delito de lavagem de
capitais praticado em território nacional, sob pena de violação ao
Princípio da dupla incriminação.
1.11.3. Contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à
sua produção:
O legislador não deveria ter utilizado a expressão “contrabando”, seria
melhor que ele tivesse dito apenas tráfico de armas, munições ou material
destinado à sua produção.
O tráfico ou comércio de armas está previsto nos arts. 17 e 18 da Lei
10.826/03 (Estatuto do Desarmamento) e, além disso, a doutrina também
aponta o tráfico de armas no crime do art. 12 da Lei 7.170/86 (Lei de
segurança nacional).
1.11.4. Extorsão mediante seqüestro:
Este crime está previsto no art. 159, CP.
Atenção: o crime de extorsão mediante seqüestro previsto no CPM não é
crime antecedente de lavagem de capitais. O rol não comporta o crime
militar, só se refere ao crime comum.
1.11.5. Crime contra a Administração Pública:
23
O legislador aqui colocou quase que um capítulo inteiro do CP.
A parte final do dispositivo legal é redundante, pois concussão é crime
contra a AP.
Pergunta: o delito de prevaricação pode figurar como crime antecedente do
delito de lavagem de capitais? Prevaricar é retardar ou deixar de
praticar ato de ofício, ou praticá-lo contra expressa previsão legal,
para satisfazer interesse pessoal. Assim, a prevaricação não pode ser
crime antecedente, pois não tem dinheiro, bem ou valor envolvido (se
houver o recebimento de algum valor, não será mais prevaricação, e sim
corrupção passiva).
Assim, aqui entram os crimes contra a AP, mas desde que resulte proveito
econômico a ser lavado.
Os crimes contra a AP estão previstos entre os arts. 312 e 359-H, do CP;
na Lei de Licitações; e, ainda, na Lei dos crimes de Responsabilidade de
Prefeitos e Vereadores (DL 201/67).
Pergunta: e o ato de improbidade administrativa, pode figurar como
antecedente do delito de lavagem de capitais? Não. Ato de improbidade
administrativa não é crime e, se não é crime, não pode figurar como
antecedente da lavagem de capitais. Salvo, obviamente, se o ato de
improbidade também constituir crime.
1.11.6. Crimes contra o sistema financeiro nacional:
Esses crimes estão previstos na Lei 7.492/86 e também na Lei 6.385/76.
1.11.7. Crime praticado por organização criminosa:
Pergunta: Existe conceito legal de organização criminosa no nosso
ordenamento jurídico?
24
Esse problema vai surgir por conta da Lei 9.034/95, que é conhecida como
Lei das Organizações Criminosas. Essa lei disciplina meios de prova e
procedimentos investigatórios relativos a crimes praticados por quadrilha
ou bando, organizações ou associações criminosas.
Quadrilha ou bando são expressões sinônimas. É um crime autônomo,
previsto no art. 288, CP. Quadrilha é a associação estável e permanente
de mais de 3 pessoas com o fim de praticar uma série indeterminada de
crimes. Consuma-se o delito de quadrilha independentemente da prática dos
delitos para os quais os agentes se associaram.
Associações criminosas não se confundem com quadrilha. Elas estão
previstas no art. 35 da Lei de Drogas, por ex. Esse dispositivo exige
duas ou mais pessoas. Existem outras associações, como, por ex. a
associação prevista na lei do genocídio (art. 2º, da Lei 2.889/56).
Também existe delito de associação nos arts. 16 e 24 da Lei 7.170/83 (Lei
de segurança nacional).
Por fim, o conceito de organizações criminosas: este será visto na
próxima aula.
O grande problema sobre Organizações é saber se existe um conceito de
organizações criminosas no ordenamento jurídico brasileiro.
I- Para uma primeira corrente, não existe conceito legal de organizações
criminosas no Brasil. Essa primeira corrente ganha um reforço de uma
análise do próprio CN, onde tramitam pelo menos 3 projetos de lei que
visam definir o que seriam organizações criminosas. Se estão tramitando
no CN projetos de lei para definir o que seja organização criminosa, isso
significaria que não existe ainda o conceito no Brasil. De acordo com o
projeto de lei 7.223, organização criminosa é caracterizada pela presença
de pelo menos 3 das seguintes características:
- hierarquia estrutural;
- planejamento empresarial;
- uso de meios tecnológicos avançados;
25
- recrutamento de pessoas;
- divisão funcional das atividades;
- conexão estrutural ou funcional com o poder público ou com um agente do
poder público;
- oferta de prestações sociais;
- divisão territorial das atividades ilícitas;
- auto-poder de intimidação;
- alta capacitação para a prática de fraude;
- conexão local, regional, nacional ou internacional com outra
organização criminosa.
II- Uma segunda corrente, que também vem ganhando corpo, por sua vez,
afirma que, enquanto a lei brasileira não fornecer um conceito legal de
organizações criminosas, é possível a utilização do conceito dado pela
Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional,
realizada em Palermo (e por isso é conhecida como a Convenção de
Palermo, em 15/12/2000. De acordo com essa Convenção de Palermo,
organização criminosa é o grupo estruturado de 3 ou mais pessoas
existente há algum tempo e atuando concertadamente com o fim de cometer
infrações graves, com a intenção de obter benefício econômico ou moral.
Esta convenção foi ratificada pelo Decreto legislativo nº 231 e pelo
Decreto 5.015/04.
O Capez concorda com essa segunda corrente.
Em verdade, ninguém nega a importância dos Tratados Internacionais de
direitos humanos. O STF, inclusive, dá a eles um status normativo supra-
legal. Mas, daí a entender que um tratado internacional pudesse definir
crimes e estabelecer penas, é outra coisa. Para o prof. LFG, inclusive,
essa definição de crime por um tratado internacional violaria o Princípio
da Legalidade, exatamente em uma de suas garantias (ou facetas), qual
26
seja, a denominada lex popoli: crimes e penas só podem ser estabelecidos
com a participação dos representantes do povo na elaboração e aprovação
do texto final.
Por mais que a convenção internacional passe pela ratificação do CN, o CN
não pode alterar o tratado ao votá-lo, por isso a doutrina faz esta
crítica.
1.11.8. Crime praticado por particular contra a administração pública
estrangeira:
É o último crime do rol.
Aqui vale a pena ficar atento a duas observações:
- Esses crimes foram inseridos no CP pela Lei 10.467/02.
art. 337-B, 337-C e 337-D, CP.
- LLC, art. 1º, VIII, foi incluído pela mesma Lei 10.467/02.
A causa de aumento de pena do art. 1º, §4º: a lei aqui diz que a pena
será aumentada de 1/3 a 2/3 nos casos previsto nos incisos I a VI, se o
crime for cometido de forma habitual ou por intermédio de organização
criminosa. A lei é de 1998 e o inciso VIII foi incluído por lei posterior
(2002) e esqueceram de atualizar o §4º para incluí-lo. Atenção então: se
o crime antecedente for o do inciso VIII, mesmo que seja cometido de
forma habitual, não incide a causa de aumento de pena; ela não incide se
o crime for o do inciso VIII.
1.12. Tentativa:
É possível a tentativa no crime de lavagem de capitais? Sem dúvida que
sim. Afinal de contas, trata-se de crime plurisubsistente.
Porém, atenção: qual será a regra e qual será o benefício do agente no
caso da tentativa?
art. 1º, §3º, LLC:
27
§3º. A tentativa é punida nos termos do parágrafo único do art. 14 do
Código Penal.
Esse dispositivo era absolutamente desnecessário e redundante, em virtude
daquilo que preceitua o art. 12, CP, segundo o qual as regras gerais do
CP aplicam-se aos fatos incriminados por lei especial, se esta não
dispuser de modo diverso.
1.13. Habitualidade:
Essa habitualidade será importante por conta do art. 1º, §4º, LLC, que
fala em crime cometido de forma habitual (caso em que será aumentada a
pena).
O crime de lavagem, portanto, não é um crime habitual, já que vai incidir
uma causa de aumento se ele for habitual.
Diante do art. 1º, §4º, conclui-se, portanto, que a habitualidade não é
uma elementar do crime de lavagem.
Atenção para não confundir crime habitual com a chamada habitualidade
criminosa. São conceitos distintos:
- No crime habitual, a prática de um ato isolado não gera tipicidade, ou
seja, exige-se do agente uma prática reiterada da conduta a fim de restar
caracterizado o delito. Ex.: art. 282, CP (exercício ilegal da medicina,
arte dentária ou farmacêutica). Aqui não basta uma única conduta, é
preciso que a conduta seja praticada de forma reiterada.
- Habitualidade criminosa é sinônimo de reiteração delituosa, ou de
criminoso habitual. Na habitualidade criminosa há pluralidade de crimes,
sendo a habitualidade uma característica do agente, e não da infração
penal. Na habitualidade criminosa, tem-se uma seqüência de atos típicos
que demonstram um estilo de vida do autor. A pessoa faz do crime o seu
estilo de vida, pois pratica muitos crimes.
28
Obs. ainda sobre o §4º: não é necessária uma homogeneidade de
circunstância de tempo, lugar e modus operandi para a incidência da causa
de aumento de pena do art. 1º, §4º (Atenção para não confundir com o
crime continuado, que exige essa homogeneidade)!
STJ, HC 19902.
1.14. Delação premiada:
A delação premiada, também conhecida como “Chamada de co-réu”, consiste
na possibilidade de o participante e/ou associado de infração penal ter
sua pena reduzida, substituída por restritiva de direitos, ou até mesmo
extinta, mediante a denúncia de seus comparsas às autoridades,
possibilitando o desmantelamento do bando ou quadrilha, a descoberta de
toda a trama delituosa, a localização do produto do crime, ou a
facilitação da libertação do seqüestrado, no caso do crime de extorsão
mediante seqüestro cometido em concurso de agentes.
Delação premiada, então, nada mais é do que o reconhecimento por parte do
Estado de que precisa da colaboração do agente.
Delação vem do verbo delatar, que significa apontar comparsas.
LFG entende que colaboração premiada seria o gênero do qual seria espécie
a delação premiada. Ex.: dizer a localização da vítima seria colaboração
e não delação (pois ai não se estaria apontando o comparsa).
1.14.1. Pergunta: quando surgiu a delação premiada e onde ela está
prevista?
Art. 25, §2º, da Lei 7.492/86 (Lei dos crimes contra o sistema financeiro
nacional);
art. 8º, P.U., da Lei 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos);
art. 159, §4º, CP (extorsão mediante seqüestro);
29
art. 16, P.U., da Lei 8.137/90 (Lei que dispõe sobre os crimes contra a
ordem tributária);
art. 6º, da Lei 9.034/95 (Lei das Organizações Criminosas).
Detalhe importante: em todos esses dispositivos legais supra citados a
delação premiada traz como benefício uma diminuição da pena de 1/3 a 2/3.
Outras hipóteses de delação premiada:
Art. 1º, §5º, da Lei 9.613/98 (LLC):
§ 5º A pena será reduzida de um a dois terços e começará a ser cumprida
em regime aberto, podendo o juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la por
pena restritiva de direitos, se o autor, co-autor ou partícipe colaborar
espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que
conduzam à apuração das infrações penais e de sua autoria ou à
localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime.
1.14.2. A delação premiada na Lei de lavagem de Capitais pode trazer para
o acusado 3 benefícios, que vão variar de acordo com o grau de
colaboração:
1) diminuição da pena de 1/3 a 2/3 e fixação de regime inicial aberto;
2) substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de
direitos;
3) perdão judicial como causa extintiva da punibilidade.
Além da lei de lavagem, também vai haver delação premiada nos seguintes
dispositivos legais:
30
arts. 35-B e 35-C, da Lei 8.884/94 (Lei que dispõe sobre crimes contra a
ordem econômica) – ela possibilita o chamado “Acordo de Leniência”,
também conhecido como acordo de brandura ou acordo de doçura. Ele pode
ser inclusive uma causa impeditiva do oferecimento da denúncia e, se
cumprido, extinguirá a punibilidade do agente, conforme se depreende da
redação de tais arts.:
Art. 35-B. A União, por intermédio da SDE, poderá celebrar acordo de
leniência, com a extinção da ação punitiva da administração pública ou a
redução de uma dois terços da penalidade aplicável, nos termos deste
artigo, com pessoas físicas e jurídicas que forem autoas de infração à
ordem econômica, desde que colaborem efetivamente com as investigações e
o processo administrativo e que dessa colaboração resulte:
I- a identificação dos demais co-autores da infração; e
II- a obtenção de informações e documentos que comprovem a infração
noticiada ou sob investigação.(...)
Art. 35-C. Nos crimes contra a ordem econômica, tipificados na Lei 8.137,
de 27 de novembro de 1990, a celebração de acordo de leniência, nos
termos desta Lei, determina a suspensão do curso do prazo prescricional e
impede o oferecimento de denúncia.
Parágrafo Único. Cumprido o acordo de leniência pelo agente, extingue-se
automaticamente a punibilidade dos crimes a que se refere o caput deste
artigo.
Arts. 13 e 14, da Lei 9.807/99 (Lei de proteção às testemunhas).
Para muitos doutrinadores, esta lei ficaria valendo como uma regra geral
de delação premiada, sobretudo para as leis anteriores:
Art. 13. Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, conceder
o perdão judicial e a conseqüente extinção da punibilidade ao acusado
que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a
31
investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha
resultado:
I- a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa;
II- a localização da vítima com a sua integridade física preservada;
III- a recuperação total ou parcial do produto do crime.
Parágrafo Único. A concessão do perdão judicial levará em conta a
personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e
repercussão social do fato criminoso.
Art. 14. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a
investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais
co-autores ou partícipes do crime, na localização da vítima com vida e na
recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação,
terá pena reduzida de um a dois terços.
Art. 41, da Lei 11.343/06 (Lei de Drogas):
Art. 41. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a
investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais
co-autores ou partícipes do crime e na recuperação total ou parcial do
produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um terço a
dois terços.
Momento para a concessão da delação premiada: para a doutrina, a delação
premiada pode ser acordada com o criminoso desde a fase investigatória
até o momento da sentença.
Porém, para alguns doutrinadores, a delação premiada poderia ser feita
mesmo após o trânsito em julgado da sentença condenatória, desde que a
delação fosse objetivamente eficaz. Nesse caso o benefício deverá ser
concedido através de uma revisão criminal, com fundamento no art. 621,
III, CPP:
Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida:
32
I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei
penal ou à evidência dos autos;
II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou
documentos comprovadamente falsos;
III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência
do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição
especial da pena.
Proposta da delação: tanto a autoridade policial quanto o MP devem
alertar indiciados e acusados sobre a possível pena a que estarão
sujeitos em caso de condenação e sobre os benefícios que poderão obter em
virtude de uma efetiva colaboração. Caso haja consenso, poderá ser
lavrado um acordo sigiloso entre acusação e defesa a ser homologado pelo
juiz. Esse acordo não deve constar dos autos, nem se tornar público, nem
mesmo para os advogados dos demais acusados delatados.
HC 90.688 e AP 470
A publicidade do depoimento do delator somente irá ocorrer quando ele for
ouvido formalmente no processo, mas desde que essa oitiva seja
necessária.
Esse acordo de delação premiada tem fundamento nos dispositivos legais
acima citados e também no art. 129, inciso I, da Constituição Federal:
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;
Valor probatório de uma delação premiada: para a jurisprudência, a
delação premiada por si só não pode fundamentar uma condenação, devendo
estar corroborada por outros elementos probatórios. RE 213937
Benefício pessoal: a delação é um benefício pessoal, ou seja, não é
possível que seja aplicada aos demais co-autores ou partícipes do fato
33
delituoso (só poderá ser aplicado ao delator). Não é aplicável a quem não
colaborou.
1.15. Procedimento:
Art. 2º e ss, da LLC (Lei 9.613/98) trata das disposições processuais do
crime de lavagem de capitais.
O art. 2º, I, fala que o procedimento do crime de lavagem vai ser o
procedimento comum dos crimes punidos com reclusão, da competência do
juiz singular:
Art. 2º O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei:
I – obedecem às disposições relativas ao procedimento comum dos crimes
punidos com reclusão, da competência do juiz singular;
A lei aqui nesse dispositivo, então, faz menção a um procedimento: o
procedimento comum dos crimes punidos com reclusão.
Ocorre que esse procedimento, que outrora era definido pelo código de
acordo com a espécie de pena (reclusão ou detenção) sofreu uma alteração
por força da Lei 11.719/08, que alterou os procedimentos. Agora o
procedimento já não é mais determinado por conta da espécie de pena, mas
sim por conta do máximo de pena privativa de liberdade cominada.
Agora nós temos então o chamado procedimento comum ordinário e ele será
aplicável em relação aos delitos cuja pena máxima cominada seja igual ou
superior a 4 anos.
O procedimento sumário, por sua vez, será aplicável aos crimes cuja pena
máxima cominada for inferior a 4 e superior a 2 anos.
Por fim, o procedimento dos Juizados, que seria o procedimento comum
sumaríssimo, será aplicável a todas as contravenções e crimes cuja pena
máxima seja igual ou inferior a 2 anos, cumulada ou não com multa e
submetidos os crimes ou não a procedimento especial.
34
A pena do delito previsto no art. 1º da LLC é de 3 a 10 anos. Assim, se a
pena máxima cominada é superior a 4 anos, podemos concluir que o
procedimento aplicável será mesmo o procedimento comum ordinário (mas não
porque a pena é de reclusão, e sim porque o seu máximo é superior a 4
anos).
Pergunta: E se houver conexão probatória, com a conseqüente reunião dos
processos de lavagem e de tráfico de drogas, qual seria o procedimento?
A reunião desses dois processos não é obrigatória. Se puder acontecer,
tanto melhor, mas não há obrigatoriedade disso. Ocorre que, imaginando
que os processos sejam reunidos, haverá um problema: a lei de drogas tem
um procedimento especial e a LLC tem um procedimento comum. Assim, diante
da duplicidade de procedimentos, qual deles seria aplicável?
É preciso que nos lembremos do que dizia a antiga lei de drogas (Lei
6368/76), que tinha um dispositivo específico sobre o assunto: o art. 28,
que dizia que nos casos de conexão e continência entre os crimes
definidos naquela lei, e outras infrações penais, o procedimento será o
previsto para a infração mais grave, ressalvados os da competência do
júri e das jurisdições especiais.
Se hoje esta regra estivesse em vigor, nesse exemplo de conexão valeria
sempre o procedimento da Lei de Drogas, que traz hoje uma pena de 5 a 15
anos de reclusão. Ocorre que este art. 28 da Lei 6368/76, e a própria lei
foram revogados pela Lei 11.343/06.
Pergunta: a nova lei de drogas trouxe dispositivo semelhante ao antigo
art. 28? Não. A nova lei não trouxe nenhum dispositivo que trate dos
crimes conexos.
Mas então, agora, qual será o procedimento a ser usado nesses casos de
crimes conexos? Em verdade, desde antes, quando ainda estava em vigor o
antigo art. 28, ele já era bastante criticado pela doutrina (ex.: Vicente
Greco Filho) que dizia que não se pode estabelecer o procedimento em
razão da gravidade do delito.
35
É preciso sempre, diante de crimes conexos, buscar o procedimento que
seja mais amplo. E procedimento mais amplo não significa,
necessariamente, procedimento mais demorado. O procedimento mais amplo é
aquele que mais assegure às partes o exercício de suas faculdades
processuais.
Pergunta: diante dessa regra trazida pela doutrina, e diante dos dois
procedimentos em conflito (procedimento comum ordinário da LLC e
procedimento especial da Lei de Drogas), qual deles será o procedimento
mais amplo?
Sem dúvida alguma, para a doutrina, será o procedimento comum ordinário,
porque possibilita um maior nº de testemunhas, além de possibilitar que o
juiz conceda memoriais, que a sentença saia em 10 dias, possibilita
diligências, etc. Na verdade, a única vantagem que a Lei de Drogas tem é
a previsão da chamada “defesa preliminar”, mas, tirando isso, em tudo o
procedimento comum ordinário é mais amplo.
1.15.1. Autonomia do processo:
Essa autonomia do processo que aqui vamos trabalhar, vem citada no art.
2º, II, LLC:
Art. 2º O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei:
I – obedecem às disposições relativas ao procedimento comum dos crimes
punidos com reclusão, da competência do juiz singular;
II - independem do processo e julgamento dos crimes antecedentes
referidos no artigo anterior, ainda que praticados em outro país;
36
Esse dispositivo consagra a autonomia, a independência do processo de
lavagem de capitais, que não precisa tramitar em conjunto com o processo
pelo crime antecedente. O processo pelo crime de lavagem de capitais não
precisa tramitar, obrigatoriamente, com o processo em relação ao crime
antecedente, o que no entanto, não significa dizer que a reunião dos
processos seja proibida.
Tudo vai depender do caso concreto.
STJ, HC 48300 e HC 59663 (este último diz expressamente que não vige nem
a regra da obrigatória reunião e nem a da obrigatória separação).
Mesmo que o crime antecedente seja praticado em outro país, se a lavagem
for cometida no território nacional, o agente responderá aqui pelo crime
de lavagem.
Pergunta: e se ocorrer o contrário, a lavagem sendo praticada fora do
país?
Mesmo que o delito de lavagem de capitais fosse praticado em outro país,
também estaria sujeito à lei brasileira (extraterritorialidade
condicionada da Lei Penal brasileira – art. 7º, II, “a”. CP), na medida
em que tal crime está previsto em tratado ou convenção internacional.
Atenção, no caso do art. 7º, II, “a”, CP será necessário o implemento das
condições do art. 7º, §2º, CP:
Extraterritorialidade
Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no
estrangeiro:
I - os crimes:
a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República;
b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de
Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de
economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público;
c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço;
d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil;
37
II - os crimes:
a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir;
b) praticados por brasileiro;
c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de
propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam
julgados.
§ 1º - Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira,
ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro.
§ 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do
concurso das seguintes condições:
a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato punível também no país em que foi praticado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira
autoriza a extradição;
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido
a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo,
não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável.
1.15.2. Competência criminal:
Quem vai processar e julgar o delito de lavagem de capitais? Justiça
estadual ou Justiça federal?
Devemos ficar atentos ao que nos diz o art. 109, VI, CR:
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
VI - os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados
por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira;
38
Conclusão: crimes contra o sistema financeiro e a ordem econômico-
financeira somente serão de competência da Justiça Federal quando a lei
assim o determinar.
A competência, portanto, para julgar o crime de lavagem de capitais deve
ser retirada da própria LLC (Lei 9.613/98).
art. 2º, III – diz os casos expressos em que os crimes serão da
competência da Justiça Federal. Isso significa que nos demais casos a
competência será da Justiça estadual:
III - são da competência da Justiça Federal:
a) quando praticados contra o sistema financeiro e a ordem econômico-
financeira, ou em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ou
de suas entidades autárquicas ou empresas públicas;
b) quando o crime antecedente for de competência da Justiça Federal.
Atenção para as hipóteses!
Diante do art. 2º, III, conclui-se: em regra, compete à Justiça estadual
o processo e julgamento do crime de lavagem de capitais. A competência
será da Justiça Federal somente nas seguintes hipóteses:
a) quando o crime for praticado contra o sistema financeiro ou em
detrimento e bens, serviços ou interesses da União, suas empresas
públicas ou autarquias (federais);
b) quando o crime antecedente for de competência da Justiça Federal.
39
Atenção: é bem verdade que na prática, na grande maioria dos casos a
competência será mesmo da Justiça Federal, mas não podemos dizer que esta
é a regra.
STJ, CC 96678 e HC 11462.
1.15.3 Criação de Varas Especializadas para o julgamento de crimes de
lavagem de capitais:
Esse tema é bem interessante para cair em uma segunda fase de concurso,
pois é uma das mais intensas discussões em relação ao crime de lavagem de
capitais.
Obs.: 90% da jurisprudência sobre esse crime de lavagem de capitais está
relacionada à essa criação de varas especializadas para julgamento desses
crimes. Muitos advogados afirmam que essa criação de varas violaria o
princípio do juiz natural.
Evolução histórica do tema:
Em 2001, foi feita uma pesquisa com juízes federais, e muitos deles
afirmaram que nunca haviam conduzido em processo ninguém pelo crime de
lavagem de capitais. Concluiu-se que não havia um preparo suficiente dos
julgadores para o processo e julgamento desses crimes.
Em 2003, surge a Resolução 314/03 do Conselho da Justiça Federal, que
determinava que os Tribunais Regionais federais deveriam especializar
varas no combate à lavagem de capitais, e inclusive, dizia que isso
deveria ser feito no prazo de 60 dias (tamanha a preocupação que
existia).
A partir daí então, os TRF´s começaram a especializar varas, por meio de
Resoluções e Provimentos:
Esse assunto provocou tanta polêmica porque alguns desses provimentos
determinaram que os processos em andamento nas demais varas fossem
remetidos (redistribuídos) às Varas Especializadas, salvo se já estivem
com a instrução encerrada.
40
Surgiram então dois questionamentos:
- O Tribunal pode especializar Vara? Há previsão legal para essa
especialização em Varas?
- Essa alteração da competência aos processos penais que já estavam em
andamento não viola o princípio do juiz natural?
Analisemos cada um desses questionamentos:
Existe sim previsão legal para a especialização de Varas federais: art.
12, da Lei 5.010/66 (Lei que organiza a Justiça Federal – é velha, mas
continua em vigor):
Art. 12. Nas Seções Judiciárias em q houver mais de uma Vara, poderá o
Conselho da Justiça Federal fixar-lhes sede em cidade diversa da Capital,
especializar Varas e atribuir competência por natureza de feitos a
determinados juízes.
Além disso, a própria CR assegura ao Poder Judiciário autonomia
administrativa e financeira, podendo proceder à sua auto-organização
administrativa.
Porém, tem um detalhe importante que não pode passar despercebido: quem é
que poderá especializar as varas?
Com a CR/88 o Conselho da justiça federal já não tem mais esta
legitimidade, pois na verdade, ele hoje é um mero órgão de regulamentação
interna, que não tem mais esta atribuição. Assim, apesar de o art. 12
dizer que o Conselho da justiça federal pode especializar varas, diante
da CR/88, tal atribuição passou a ser dos próprios TRF´s.
41
Art. 105, P.U., II, CR, que diz quais são as atribuições do Conselho da
justiça federal (e dentre elas não inclui a especialização de varas).
Quanto à segunda questão: quanto à redistribuição dos processos que
estavam em andamento nas demais varas às varas especializadas, entendeu o
STJ não ser possível a aplicação da regra da perpetuação da jurisdição
prevista no art. 87, CPC, na medida em que teria ocorrido uma alteração
da competência em razão da matéria (e de acordo com a ampla
jurisprudência, o CPC pode ser aplicado sim ao processo penal,
subsidiariamente).
Art. 87. Determina-se a competência no momento em que a ação é proposta.
São irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito
ocorridas posteriormente, salvo quando suprimirem o órgão judiciário ou
alterarem a competência em razão da matéria ou da hierarquia.
Essa regra do art. 87, CPC diz que se o processo começou perante um juiz,
terminará perante este mesmo juiz (é a idéia de perpetuação da
jurisdição), salvo quando houver a extinção do órgão judiciário ou quando
houver a alteração da competência em razão da matéria ou da hierarquia
(nesse ultimo caso – hierarquia – o ex. é o de alguém que está
respondendo por um processo é eleito senador da República).
O STJ entendeu que a partir do momento em que a 2ª e a 6ª Varas de SP se
tornaram Varas Especializadas, é como se tivesse havido uma alteração de
competência em razão da matéria, e, portanto, os processos deveriam ir
para uma ou para outra vara.
Isso é o que aconteceu em SP, com o Provimento 238. Mas existiram
tribunais que não atuaram da mesma maneira que em SP, pois eles criaram
as Varas Especializadas e estas só passaram a valer para os novos
processos que fossem surgindo. Pergunta: isso não teria violado o
entendimento do STJ? Não, porque o art. 87, CPC é aplicável
subsidiariamente, então se o próprio provimento do Tribunal já deu uma
solução, é isso que deve ser aplicado (então não há problema algum em que
42
alguns tribunais tenham mantido os antigos processos em suas Varas
originais, de acordo com regramento próprio).
STJ, CC 57838 e Resp. 628673.
Posição do STF: já se aguardava uma posição do STF sobre isso há algum
tempo. Ele então decidiu, no HC 86660, que a Resolução nº 314 do Conselho
da Justiça Federal seria inconstitucional, pois o Conselho teria
extrapolado suas atribuições ao definir competência de órgãos
jurisdicionais, o que, no entanto, não contaminou as resoluções e
provimentos dos TRF´s.
Para o STF, portanto, o tema organização judiciária não está restrito ao
campo de incidência exclusiva da lei, uma vez que depende da integração
de critérios estabelecidos na Constituição, nas leis e nos Regimentos
Internos dos tribunais.
☺ também STF, HC 85060.
Mas o STF entendeu que essa especialização de varas é perfeitamente
legal, pois, se entendesse de forma contrária, teria que anular os
processos, o que não aconteceu.
1.15.4. Requisitos da denúncia:
Art. 2º, §1º, LLC (Lei 9.613/98):
§1º. A denúncia será instruída com indícios suficientes da existência do
crime antecedente, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei, ainda que
desconhecido ou isento de pena o autor daquele crime.
Justa causa duplicada: deve o MP trazer um lastro probatório não só em
relação à lavagem, como também em relação ao crime antecedente.
Indícios, aqui no §1º, é sinônimo de uma prova semi-plena (e não de prova
indireta, como em geral entendemos – ex.: o gato e o rato entram num
compartimento e só sai o gato, temos o indício ou a prova indireta de que
o gato comeu o rato), ou seja, aquela com uma capacidade persuasiva
43
atenuada. Ou seja, o que basta na hora de se oferecer a denúncia, é que
tenhamos alguns elementos comprovando a origem da lavagem (crime
antecedente).
1.15.5 Suspensão do processo:
Essa suspensão do processo é a suspensão do processo prevista no art.
366, CPP. Ela visa, basicamente, preservar o direito à ampla defesa.
Art. 366. Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir
advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional,
podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas
urgentes e, se for o caso, decretar a prisão preventiva, nos termos do
disposto no art. 312.
Este art. será então aplicado ao cidadão citado por edital quando, em
decorrência dessa citação, o acusado não tenha comparecido e nem tenha
constituído defensor. A conseqüência desses 3 requisitos é a suspensão do
processo e da prescrição.
Isso ocorre em razão da preservação da ampla defesa: a presença do
acusado no processo penal é muito importante, seja para ele mesmo se
defender (auto-defesa), seja para ele ministrar ao seu advogado os
elementos que possam auxiliá-lo em sua defesa.
Pergunta: por quanto tempo a prescrição fica suspensa?
Para o STF (já há alguns julgados caminhando para essa posição), a
prescrição fica suspensa por prazo indeterminado.
Além de suspender o processo e a prescrição, esse mesmo art. 366, CPP
ainda prevê a possibilidade de produção de provas consideradas urgentes
e, se for o caso, da decretação da prisão preventiva (desde que
preenchidos os seus pressupostos).
→ Aplicação do art. 366, CPP na LLC:
44
art. 2º, §2º, LLC: de acordo com esse dispositivo, na lei de lavagem de
capitais não se aplica o art. 366, CPP.
§2º. No processo por crime previsto nesta Lei, não se aplica o disposto
no art. 366 do Código de Processo Penal.
Obs.: para as provas de concurso o que se deve afirmar é que não se
aplica o art. 366, CPP. Porém, cuidado porque apesar do teor deste
dispositivo, há uma segunda corrente que entende que existe uma antinomia
entre o art. 2º, §2º da LLC e o art. 4º, §3º da mesma lei. Ou seja,
existiria um conflito aparente de normas existentes na mesma lei. O art.
4º, §3º diz que é cabível a aplicação do art. 366, CPP. Assim, na dúvida
entre qual dispositivo deve ter prevalência, a doutrina usa o princípio
do favor rei (deve prevalecer, diante da dúvida, a interpretação mais
favorável ao acusado); além disso a doutrina também conjuga aqui o
princípio da ampla defesa, para afirmar que deve prevalecer o disposto no
art. 4º, §3º:
Art. 4º. O juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público, ou
representação da autoridade policial, ouvido o Ministério pÚblico em
vinte e quatro horas, havendo indícios suficientes, poderá decretar, no
curso do inquérito ou da ação penal, a apreensão ou o seqüestro de bens,
direitos ou valores do acusado, ou existentes em seu nome, objeto dos
crimes previstos nesta Lei, procedendo-se na forma dos arts. 125 a 144 do
Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de processo Penal.
Esse art. fala de medidas patrimoniais assecuratórias que são muito
importantes. Hoje no Brasil existe uma política de que o processo só
surte efeito se houver a prisão (em razão do que é veiculado na mídia, as
pessoas acham que o processo só surte efeito se a pessoa estiver presa).
Ocorre que no crime de lavagem interessa muito mais do que a prisão da
pessoa, a identificação, apreensão e seqüestro dos bens objeto da
lavagem, porque ali nesse tipo de organização criminosa, as “peças” são
muito facilmente substituíveis (assim que se prende alguém, esse alguém é
substituído por outro).
§§1º, 2º e 3º, do art. 4º:
45
§1º. As medidas assecuratórias previstas neste artigo serão levantadas se
a ação penal não for iniciada no prazo de cento e vinte dias, contados da
data em que ficar concluída a diligência.
Atenção, esse prazo de 120 dias também já vem sendo relativizado.
§2º. O juiz determinará a liberação dos bens, direitos e valores
apreendidos ou seqüestrados quando comprovada a licitude de sua origem.
§3º. Nenhum pedido de restituição será conhecido sem o comparecimento
pessoal do acusado, podendo o juiz determinar a prática de atos
necessários à conservação de bens, direitos ou valores, nos casos do art.
366, do Código de Processo Penal.
Contradição da lei: um dispositivo diz que não se aplica o art. 366, CPP
e outro diz que se aplica.
Os casos do art. 366, CPP são aqueles em que o acusado é citado por
edital e não comparece e nem constitui advogado. Esse dispositivo (§3º)
diz que eu posso apreender os objetos do indivíduo citado por edital, e
ai ficarei com esses bens, praticando atos necessários à sua conservação
até o dia em que ele comparecer pessoalmente. Comparecendo pessoalmente e
comprovando a licitude dos bens ai sim será possível devolver tais bens.
1.15.6. Liberdade provisória:
Liberdade provisória é uma medida de contra-cautela que substitui a
prisão em flagrante, desde que o indivíduo preencha determinados
requisitos, podendo ou não ficar sujeito ao cumprimento de certas
condições.
É a resposta que o acusado pode conseguir quando preso em flagrante.
Se a prisão for ilegal, o caminho é o relaxamento da prisão, mas se a
prisão for legal, o caminho é a liberdade provisória.
46
Liberdade provisória é só para prisão em flagrante! Não vale para quem
foi preso preventiva ou temporariamente. Prisão preventiva ou temporária
é caso de revogação ou cassação, jamais de liberdade provisória!
Pergunta: cabe liberdade provisória na LLC?
Art. 3º, Lei 9.613/98:
Art. 3º. Os crimes disciplinados nesta Lei são insuscetíveis de fiança e
liberdade provisória e, em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá
fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade.
De acordo com esse art., não seria cabível liberdade provisória com ou
sem fiança no crime de lavagem de capitais.
Pergunta: poderia o legislador vedar o cabimento da liberdade provisória?
O legislador pode, assim de maneira abstrata, dizer que a liberdade
provisória não é cabível em um ou outro crime?
Pela leitura da Constituição, art. 5º, LXVI, que diz “quando a lei
admitir a liberdade provisória” fica parecendo que ao legislador cabe
dizer se cabe ou se não cabe, e se o legislador disse que não cabe, é
porque não cabe e pronto.
pelo STF na ADI 3.112;
- art. 44, da Lei 11.343/06 (Lei de Drogas).
Posição doutrinária (LFG, Eugênio Pacelli): parte da doutrina entende que
não é dado ao legislador vedar de maneira absoluta a concessão da
liberdade provisória. A uma, porque tal vedação violaria o princípio da
presunção de inocência, criando-se hipótese de prisão obrigatória àquele
que foi preso em flagrante. A duas, porque a prisão de qualquer indivíduo
antes do trânsito em julgado de sentença condenatória depende de decisão
fundamentada da autoridade judiciária competente.
Outro ponto importante a ser tratado aqui diz respeito à alteração da Lei
8.072/90 pela Lei 11.464/07: a lei dos crimes hediondos, em seu art. 2º,
II, dizia que crimes hediondos e equiparados são insuscetíveis de
47
liberdade provisória com fiança (e isso é óbvio, pois a própria CR já diz
isso) e também de liberdade provisória sem fiança. Em 2007 entra em vigor
a Lei 11.464 que consolida um entendimento que já era firme na
jurisprudência, apagando a vedação da liberdade provisória sem fiança. Só
vale, então, a vedação da Constituição. Assim, crimes hediondos admitem,
pelo menos em tese, a liberdade provisória sem fiança (aquela do art.
310, P.U. do CPP – quando o juiz verificar a inocorrência de qualquer
hipótese que autorize a prisão preventiva).
Ou seja, agora temos pelo menos a possibilidade de o juiz analisar,
diante do caso concreto, se há ou não motivo para a pessoa ter a prisão
preventiva decretada. Se o juiz verificar que se solta a pessoa seria
presa preventivamente, o juiz indeferirá a LP sem fiança e
automaticamente estará convertendo a prisão em flagrante em preventiva;
se o juiz entender que se a pessoa solta estivesse não teria motivo para
ser presa, então o juiz concederá a ela a LP sem fiança.
Para a doutrina, se é cabível LP sem fiança para crimes hediondos, que é
o mais grave dos delitos, o mesmo raciocínio deve ser aplicado às demais
leis que vedam a LP.
A jurisprudência, porém, não caminha nesse sentido. Para o STF, à exceção
de algumas decisões do Min. Celso de Mello, não seria cabível LP ao crime
de tráfico de drogas sob o seguinte argumento: se a Constituição disse
que tais crimes são inafiançáveis, implicitamente teria vedado a
concessão da LP.
Nesse sentido: STF, HC 93302 e STJ, HC 85682.
1.15.7 Recurso em liberdade:
A LLC, em seu art. 3º, parte final, diz textualmente que o juiz decidirá
se o réu poderá apelar em liberdade.
art. 3º. Os crimes disciplinados nesta Lei são insuscetíveis de fiança e
liberdade provisória e, em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá
fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade.
48
O que temos aqui nesse dispositivo é o que a doutrina chama de
recolhimento à prisão para apelar.
Esse recolhimento à prisão para apelar também estava previsto no art.
594, CPP e durante muitos anos este art. esteve em vigor. Tanto é verdade
que tínhamos a súmula do STJ de nº 09 que dizia “A exigência da prisão
provisória para apelar não ofende a garantia da presunção de inocência”.
Eis que surge o HC 88420, do STF, um julgado histórico, no qual entendeu
o STF que pelo fato de a Convenção Americana de Direitos Humanos
assegurar o direito ao duplo grau de jurisdição, não poderia o legislador
ordinário condicionar o conhecimento da apelação ao recolhimento à
prisão.
Surgiu então uma nova súmula do STJ – Súm. 347:
O conhecimento de recurso de apelação do réu independe de sua prisão.
Atenção para a nova redação dos arts. 413, §3º; 387, P.U.; e 492, I, “e”
do CPP:
Art. 413. § 3o O juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção,
revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade
anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a
necessidade da decretação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas
previstas no Título IX do Livro I deste Código. (Incluído pela Lei nº
11.689, de 2008)
Art. 387. Parágrafo único. O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a
manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra
medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser
interposta. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).
Art. 492. Em seguida, o presidente proferirá sentença que: (Redação dada
pela Lei nº 11.689, de 2008)
I – no caso de condenação: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)
49
e) mandará o acusado recolher-se ou recomendá-lo-á à prisão em que se
encontra, se presentes os requisitos da prisão preventiva; (Incluído pela
Lei nº 11.689, de 2008)
Agora a própria lei, alterada que foi pela Lei 11.719/08, diz que
independentemente do juiz ter decretado a prisão e de o acusado ter sido
recolhido, o seu recurso será conhecido.
Pergunta: será que o art. 3º, LLC permanece válido? É claro que não.
Diante das alterações do entendimento jurisprudencial e das Leis 11.689 e
11.719, conclui-se que não é mais possível condicionar o conhecimento da
apelação ao recolhimento do acusado à prisão.
STF, HC 83868.
1.15.8 Recuperação de ativos e Medidas Cautelares:
Há uma idéia generalizada de que o processo penal somente é eficaz se a
pessoa estiver presa. Associamos sempre o resultado do processo eficaz
com a prisão.
Em se tratando de organizações criminosas, é óbvio que a prisão deve ser
mais rigorosa. Mas, em se tratando de lavagem de capitais, muito mais
importante do que prender a pessoa é a recuperação dos objetos. Até
porque os sujeitos que praticam este crime são regularmente substituídos,
o processo é terceirizado. A pena privativa de prisão não cumprirá o
efeito prático de acabar com o crime.
Um dos principais objetivos da criminalização da lavagem de capitais é o
ataque ao braço financeiro das organizações criminosas, pelos seguintes
motivos:
- o confisco de bens e valores promove a asfixia da organização
criminosa;
- insuficiência e ineficiência das penas privativas de liberdade;
50
- capacidade de controle das organizações criminosas do interior dos
presídios;
- rápida substituição dos administradores das organizações criminosas.
Art. 4º, LLC:
Art. 4º O juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público, ou
representação da autoridade policial, ouvido o Ministério Público em
vinte e quatro horas, havendo indícios suficientes, poderá decretar, no
curso do inquérito ou da ação penal, a apreensão ou o seqüestro de bens,
direitos ou valores do acusado, ou existentes em seu nome, objeto dos
crimes previstos nesta Lei, procedendo-se na forma dos arts. 125 a 144 do
Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal.
§ 1º As medidas assecuratórias previstas neste artigo serão levantadas se
a ação penal não for iniciada no prazo de cento e vinte dias, contados da
data em que ficar concluída a diligência.
§ 2º O juiz determinará a liberação dos bens, direitos e valores
apreendidos ou seqüestrados quando comprovada a licitude de sua origem.
§ 3º Nenhum pedido de restituição será conhecido sem o comparecimento
pessoal do acusado, podendo o juiz determinar a prática de atos
necessários à conservação de bens, direitos ou valores, nos casos do art.
366 do Código de Processo Penal.
§ 4º A ordem de prisão de pessoas ou da apreensão ou seqüestro de bens,
direitos ou valores, poderá ser suspensa pelo juiz, ouvido o Ministério
Público, quando a sua execução imediata possa comprometer as
investigações.
→ Medidas Cautelares importantes:
a) Apreensão: trata-se de medida cautelar decretada com o objetivo de
apreender coisas, objetos e documentos de interesse para a instauração do
processo. Se realizada no interior de um domicílio, precisará de
51
autorização da autoridade judiciária. Se em via pública não, desde que a
autoridade que faz a apreensão tenha algum indício de que o sujeito
esteja portando arma ou qualquer objeto criminoso. ☺art. 240, CPP:
Art. 240. A busca será domiciliar ou pessoal.
§ 1o Proceder-se-á à busca domiciliar, quando fundadas razões a
autorizarem, para:
a) prender criminosos;
b) apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos;
c) apreender instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos
falsificados ou contrafeitos;
d) apreender armas e munições, instrumentos utilizados na prática de
crime ou destinados a fim delituoso;
e) descobrir objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu;
f) apreender cartas, abertas ou não, destinadas ao acusado ou em seu
poder, quando haja suspeita de que o conhecimento do seu conteúdo possa
ser útil à elucidação do fato;
g) apreender pessoas vítimas de crimes;
h) colher qualquer elemento de convicção.
§ 2o Proceder-se-á à busca pessoal quando houver fundada suspeita de que
alguém oculte consigo arma proibida ou objetos mencionados nas letras b a
f e letra h do parágrafo anterior.
- Busca e apreensão em escritórios de advocacia: o escritório de
advocacia, assim como o consultório de um médico ou um estabelecimento
comercial (do balcão para dentro, e não as partes abertas ao público), é
considerado pela Constituição como domicílio. Assim, mesmo as Autoridades
Fazendárias dependem de autorização judicial para ingressar no domicílio.
52
Caso específico do escritório de advocacia: o mandado de busca e
apreensão deve ser específico e pormenorizado, a ser cumprido na presença
de representante da OAB, sendo vedada a utilização de documentos e
objetos pertencentes a clientes do advogado averiguado, salvo se tais
clientes também estiverem sendo investigados como partícipes ou co-
autores pela prática do mesmo crime que deu origem ao mandado de busca e
apreensão (☺art. 7º, do EOAB). É preciso cientificar a OAB que o mandado
será cumprido, e ela então designa um representante de OAB para
acompanhar a diligência. Mas, se a OAB se negar a indicar o
representante, a busca e apreensão não ficará condicionada a isso, o
mandado será cumprido normalmente.
O mandado de busca e apreensão deve ser cumprido durante o dia. Há
doutrinadores que entendem que dia é o período compreendido entre o
nascer e o pôr do sol, já outros doutrinadores entendem que é o período
compreendido entre as 6 e a 18 horas.
Obs.: o mandado deve ter seu início durante o dia, porém, iniciado
durante o período diurno, nada impede que se prolongue durante a noite.
b) Seqüestro de bens e valores: segundo Vicente Greco Filho, é uma medida
assecuratória, fundada no interesse público, e antecipativa do perdimento
de bens como efeito da condenação, no caso de bens que sejam produto do
crime ou adquiridos pelo agente com a prática do fato delituoso.
☺art. 91, II, “b”, CP.
Pode haver seqüestro de bens imóveis e também de bens móveis, se não for
cabível a busca e apreensão.
Art. 125 e art. 132, CPP:
Art. 125. Caberá o seqüestro dos bens imóveis, adquiridos pelo indiciado
com os proventos da infração, ainda que já tenham sido transferidos a
terceiro.
Art. 126. Para a decretação do seqüestro, bastará a existência de
indícios veementes da proveniência ilícita dos bens.
53
Art. 127. O juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou do
ofendido, ou mediante representação da autoridade policial, poderá
ordenar o seqüestro, em qualquer fase do processo ou ainda antes de
oferecida a denúncia ou queixa.
Art. 128. Realizado o seqüestro, o juiz ordenará a sua inscrição no
Registro de Imóveis.
Art. 129. O seqüestro autuar-se-á em apartado e admitirá embargos de
terceiro.
Art. 130. O seqüestro poderá ainda ser embargado:
I - pelo acusado, sob o fundamento de não terem os bens sido adquiridos
com os proventos da infração;
II - pelo terceiro, a quem houverem os bens sido transferidos a título
oneroso, sob o fundamento de tê-los adquirido de boa-fé.
Parágrafo único. Não poderá ser pronunciada decisão nesses embargos
antes de passar em julgado a sentença condenatória.
Art. 131. O seqüestro será levantado:
I - se a ação penal não for intentada no prazo de sessenta dias, contado
da data em que ficar concluída a diligência;
II - se o terceiro, a quem tiverem sido transferidos os bens, prestar
caução que assegure a aplicação do disposto no art. 74, II, b, segunda
parte, do Código Penal;
III - se for julgada extinta a punibilidade ou absolvido o réu, por
sentença transitada em julgado.
54
Art. 132. Proceder-se-á ao seqüestro dos bens móveis se, verificadas as
condições previstas no art. 126, não for cabível a medida regulada no
Capítulo Xl do Título Vll deste Livro.
Uma vez feito o seqüestro, qual é o prazo para o início da ação penal?
Decretada o seqüestro, a ação penal deverá ser iniciada dentro do prazo
de 120 dias.
Art. 4º, §1º, LLC:
§ 1º As medidas assecuratórias previstas neste artigo serão levantadas (=
afastadas) se a ação penal não for iniciada no prazo de cento e vinte
dias, contados da data em que ficar concluída a diligência.
Atenção: No CPP esse prazo não é de 120 dias (como na Lei de Lavagem), e
sim de 60 dias. Mas esse prazo de 60 dias também não tem caráter
absoluto, admitindo a jurisprudência sua prorrogação em virtude do
Princípio da Proporcionalidade.
- Restituição de coisas apreendidas: ☺art. 4º, §2º, LLC:
§ 2º O juiz determinará a liberação dos bens, direitos e valores
apreendidos ou seqüestrados quando comprovada a licitude de sua origem.
Esse dispositivo não estaria invertendo o ônus da prova?
O ônus da prova no processo penal é da acusação. Mas, se o indivíduo
pretender a restituição dos objetos apreendidos ou seqüestrados durante o
curso do processo, não só deverá comparecer pessoalmente, como também
comprovar a licitude de sua origem. Já se ao final do processo o MP não
comprovar a ilicitude da origem dos bens, o acusado deverá ser absolvido,
com a conseqüente restituição dos bens.
c) Arresto: é uma medida assecuratória fundada no interesse privado que
tem por finalidade assegurar a reparação civil do dano causado pelo
delito, em favor do ofendido ou de seus sucessores. O arresto recai sobre
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qualquer bem que integre o patrimônio do acusado, desde que suficiente
para garantir a futura recomposição patrimonial.
Arts. 136 e 144, CPP:
Art. 136. O arresto do imóvel poderá ser decretado de início, revogando-
se, porém, se no prazo de 15 (quinze) dias não for promovido o processo
de inscrição da hipoteca legal. (Redação dada pela Lei nº 11.435, de
2006).
Art. 137. Se o responsável não possuir bens imóveis ou os possuir de
valor insuficiente, poderão ser arrestados bens móveis suscetíveis de
penhora, nos termos em que é facultada a hipoteca legal dos imóveis.
(Redação dada pela Lei nº 11.435, de 2006).
§ 1o Se esses bens forem coisas fungíveis e facilmente deterioráveis,
proceder-se-á na forma do § 5o do art. 120.
§ 2o Das rendas dos bens móveis poderão ser fornecidos recursos arbitrados
pelo juiz, para a manutenção do indiciado e de sua família.
Art. 138. O processo de especialização da hipoteca e do arresto correrão
em auto apartado. (Redação dada pela Lei nº 11.435, de 2006).
Art. 139. O depósito e a administração dos bens arrestados ficarão
sujeitos ao regime do processo civil. (Redação dada pela Lei nº 11.435,
de 2006).
Art. 140. As garantias do ressarcimento do dano alcançarão também as
despesas processuais e as penas pecuniárias, tendo preferência sobre
estas a reparação do dano ao ofendido.
Art. 141. O arresto será levantado ou cancelada a hipoteca, se, por
sentença irrecorrível, o réu for absolvido ou julgada extinta a
punibilidade. (Redação dada pela Lei nº 11.435, de 2006).
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Art. 142. Caberá ao Ministério Público promover as medidas estabelecidas
nos arts. 134 e 137, se houver interesse da Fazenda Pública, ou se o
ofendido for pobre e o requerer.
Art. 143. Passando em julgado a sentença condenatória, serão os autos de
hipoteca ou arresto remetidos ao juiz do cível (art. 63). (Redação dada
pela Lei nº 11.435, de 2006).
Art. 144. Os interessados ou, nos casos do art. 142, o Ministério
Público poderão requerer no juízo cível, contra o responsável civil, as
medidas previstas nos arts. 134, 136 e 137.
Pergunta: É cabível o arresto na Lei de Lavagem de Capitais?
Vimos que a apreensão e o seqüestro são possíveis.
O caput do art. 4º, da LLC diz expressamente:
Art. 4º O juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público, ou
representação da autoridade policial, ouvido o Ministério Público em
vinte e quatro horas, havendo indícios suficientes, poderá decretar, no
curso do inquérito ou da ação penal, a apreensão ou o seqüestro de bens,
direitos ou valores do acusado, ou existentes em seu nome, objeto dos
crimes previstos nesta Lei, procedendo-se na forma dos arts. 125 a 144 do
Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal.
A apreensão não está prevista nos arts. 125 a 144, CPP. Será então que a
lei quis falar em arresto e não em apreensão?
Temos duas interpretações possíveis:
1ª) ao fazer menção no art. 4º, quis o legislador se referir ao arresto,
na medida em que faz menção aos arts 125 a 144, CPP – portanto, é cabível
sim o arresto na LLC, porque ao se referir à apreensão ele quis falar do
arresto. É o entendimento do promotor de justiça William Terra;
2ª) como o art. 4º dispõe que somente podem ser indisponibilizados bens,
direitos ou valores suspeitos de guardar vinculação com a lavagem de
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capitais, seria inviável que essas medidas fossem adotadas em relação a
patrimônio diverso, razão pela qual somente seria cabível o seqüestro e
não o arresto. É o entendimento de Eugênio Pacelli (no inquérito 2.248).
- Alienação antecipada: tem expressa previsão legal na Lei de Drogas.
Consiste na venda antecipada de bens considerados instrumentos da
infração penal, ou daqueles que constituam proveito auferido pelo agente
coma prática do delito, desde que haja risco de perda do valor econômico
pelo decurso do tempo.
Art. 61, Lei 11.343/06:
Art. 61. Não havendo prejuízo para a produção da prova dos fatos e
comprovado o interesse público ou social, ressalvado o disposto no art.
62 desta Lei, mediante autorização do juízo competente, ouvido o
Ministério Público e cientificada a Senad, os bens apreendidos poderão
ser utilizados pelos órgãos ou pelas entidades que atuam na prevenção do
uso indevido, na atenção e reinserção social de usuários e dependentes de
drogas e na repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de
drogas, exclusivamente no interesse dessas atividades.
Parágrafo único. Recaindo a autorização sobre veículos, embarcações ou
aeronaves, o juiz ordenará à autoridade de trânsito ou ao equivalente
órgão de registro e controle a expedição de certificado provisório de
registro e licenciamento, em favor da instituição à qual tenha deferido o
uso, ficando esta livre do pagamento de multas, encargos e tributos
anteriores, até o trânsito em julgado da decisão que decretar o seu
perdimento em favor da União.
É mais um motivo para se decretar medidas cautelares. Não é o mais
correto (não deveria ser uma justificativa para decretá-las), mas em
razão do descaso e da deficiência das Polícias, isso ocorre efetivamente.
Ex.: imaginemos um helicóptero apreendido de um traficante (as
Corporações todas ficam de olho no helicóptero, e a manutenção dele
parado nas dependências do Estado é enorme). Daí então a importância
dessa utilização.
Art. 62, §§ 4º, 5º e 9º, da Lei de Drogas:
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Art. 62. Os veículos, embarcações, aeronaves e quaisquer outros meios de
transporte, os maquinários, utensílios, instrumentos e objetos de
qualquer natureza, utilizados para a prática dos crimes definidos nesta
Lei, após a sua regular apreensão, ficarão sob custódia da autoridade de
polícia judiciária, excetuadas as armas, que serão recolhidas na forma de
legislação específica.
§ 4o Após a instauração da competente ação penal, o Ministério Público,
mediante petição autônoma, requererá ao juízo competente que, em caráter
cautelar, proceda à alienação dos bens apreendidos, excetuados aqueles
que a União, por intermédio da Senad, indicar para serem colocados sob
uso e custódia da autoridade de polícia judiciária, de órgãos de
inteligência ou militares, envolvidos nas ações de prevenção ao uso
indevido de drogas e operações de repressão à produção não autorizada e
ao tráfico ilícito de drogas, exclusivamente no interesse dessas
atividades.
§ 5o Excluídos os bens que se houver indicado para os fins previstos no
§ 4o deste artigo, o requerimento de alienação deverá conter a relação de
todos os demais bens apreendidos, com a descrição e a especificação de
cada um deles, e informações sobre quem os tem sob custódia e o local
onde se encontram.
§ 9o Realizado o leilão, permanecerá depositada em conta judicial a
quantia apurada, até o final da ação penal respectiva, quando será
transferida ao Funad, juntamente com os valores de que trata o § 3o deste
artigo.
Na Lei de drogas, portanto, é perfeitamente possível a alienação
antecipada, pois há previsão legal (art. 62, §4º e ss).
Mas e na Lei de Lavagem de Capitais, é possível?
Há doutrinadores que admitem, como por ex. o prof. José Paulo Baltazar
Jr.
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Mas a LLC não tem dispositivo legal acerca da alienação antecipada. O que
a LLC na verdade prevê, em seus arts. 5º e 6º não é a alienação
antecipada, mas sim a nomeação de um administrador dos bens apreendidos
ou seqüestrados.
Art. 5º Quando as circunstâncias o aconselharem, o juiz, ouvido o
Ministério Público, nomeará pessoa qualificada para a administração dos
bens, direitos ou valores apreendidos ou seqüestrados, mediante termo de
compromisso.
Art. 6º O administrador dos bens:
I - fará jus a uma remuneração, fixada pelo juiz, que será satisfeita com
o produto dos bens objeto da administração;
II - prestará, por determinação judicial, informações periódicas da
situação dos bens sob sua administração, bem como explicações e
detalhamentos sobre investimentos e reinvestimentos realizados.
Parágrafo único. Os atos relativos à administração dos bens apreendidos
ou seqüestrados serão levados ao conhecimento do Ministério Público, que
requererá o que entender cabível.
A LLC prevê que o juiz nomeará um administrador que poderia, a título de
ex., alugar o imóvel seqüestrado, tanto para que o objeto não fosse
deteriorado, bem como para que ele fosse por si só mantido.
Obs.: tramita no CN projeto de lei que visa regulamentar a alienação
antecipada na LLC, e, assim, poderíamos concluir que essa regulamentação
ainda não existe.
Atenção: se o crime antecedente for o crime de tráfico, já caberá a
alienação antecipada, mas não com base na LLC e sim com base na Lei
11.343/06.
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