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Monte Mozinho: A terra sigillata recuperada do sector B
Teresa Pires de Carvalho*
0. Introdução
O presente texto vem na continuidade do estudo por nós publicado sobre a Terra Sigillatade Monte Mozinho (CARVALHO 1998). Decorre, ainda, do ar tigo publicado por T. Soeiro(Portugália, Nova série, Vol. XXI-XXII de 2000/2001, no prelo), sobre o resultado da (re)escava-ção efectuada por aquela autora num sector de Monte Mozinho anteriormente escavado entreas décadas de 40 e 50 do séc. XX. Por este motivo, houve vários remeximentos, sendo raros erestritos os sítios que ainda apresentavam estratigrafia arqueológica e não muito fiável, tendoem atenção as misturas de materiais extraídos, com colagens entre fragmentos provenientesde sítios diferentes. O que agora se publica é a análise da terra sigillata aparecida nessecontexto.
O espólio é basicamente do Alto-Império, com uma maioria de produções entre asépocas de Cláudio e Flávios, sendo muito raras quer as do primeiro terço do séc. I (itálicas)quer as dos finais do séc. I / séc. II. A maioria situa-se mesmo na franja entre os anos 50 e os80/90 nas produções sudgálica e hispânica de boa qualidade. A particularidade deste conjuntoreside na relativa quantidade de fragmentos decorados e sobretudo na possibilidade depertença de alguns deles ao grupo recentemente dado a conhecer do chamado “Atelier dasPalmetas” (ROMERO CARNICERO 1999: 169-208), embora o seu estudo se encontre aindanuma fase embrionária. Da fase de ocupação tardia (Baixo-Império) são quase nulos os
AbstractThe present text analyses the terra sigillata (red slip ware) appeared in a sector of MonteMozinho’s site, from the first century. The particularity of this collection is that many of themare decorated peaces and probably belong to a spanish production from the almost unknown“Las Palmetas Pottery ware” ( ROMERO CARNICERO 1999: 169-208).
* Arqueóloga. Mestre em Arqueologia pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto.
Nova Série, Vol. XXIII, 2002
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vestígios de sigillata, provavelmente devido ao facto de terem sido retirados pela anteriorescavação. Esta, nem sempre foi aos níveis mais fundos, limitando-se a atingir a camada deassentamento dos muros, raramente implantados no saibro. Por essa razão foi ainda possívelencontrar parcos registos ainda intocados.
1. LOCALIZAÇÃO
A escavação incidiu numa zona genericamente denominada Sector B, que se divide emtrês subsectores BA, BB e BC. O espólio agora analisado procede dos subsectores BA e BB,incluindo este último a chamada Avenida. A localização destes espaços pode observar-se naFig. 1a) em que se percebe a sua situação relativamente à totalidade do castro já escavado e aFig. 1b) mostra em pormenor o desenvolvimento dos subsectores BA e BB.
No primeiro, à esquerda da Avenida quem sobe em direcção ao castro, desenvolvem-setrês conjuntos, um inicial (QI) que revela um grande espaço quadrado, separado do segundopor uma calçada (QII). Neste segundo conjunto, existem várias construções, que vamos ler apartir da Avenida: um pátio em L (QIII) com abertura de entrada, seguido de um espaçoquadrado (QIV), a que se segue um outro espaço aparentemente não coberto (QV) cuja paredea sudeste se sobrepôs a um resto de parede curva de uma anterior casa castreja (QVI), queseria do tipo casa-pátio, conforme revelaram as escavações no local (SOEIRO 2000/2001:108-109). Neste conjunto foi então possível percepcionar pelo menos duas fases construtivasde ocupação, uma do séc. I, outra a partir da segunda metade do séc. III / inícios do séc. IV.Este núcleo separa-se de outro por uma calçada (QVII) de época tardia (SOEIRO 2000/2001: 109)com um muro divisório para um quarteirão vizinho, que parece ter sido remodelado de outroanterior, nomeadamente pelo fechar de uma abertura de acesso. Neste terceiro grupo, cujolimite visível é a parede curva de suporte de terras da Avenida, que aqui se encontra a umacota muito mais alta, encontramos um compartimento rectangular (QVIII), com um espaçoaberto (QIX) e vestígios de uma casa castreja (QX) anterior e sua envolvente (QXI). Tambémaqui houve pelo menos dois momentos distintos de ocupação entre os meados / fins do séc. Ie os séc. III / IV (SOEIRO 2000/2001: 110).
O segundo subsector, BB, à direita da Avenida (direcção Nor te / Noroeste), foireescavado em dois quarteirões separados por uma calçada perpendicular à Avenida, quase noseguimento da rua QII do subsector BA. No primeiro quar teirão, mais a sul, foi posto adescoberto um grande rectangulo (1) com abertura para a Avenida e rua perpendicular, que seprolonga para um espaço mais estreito terminando numa construção circular que foiinterpretada como sendo um forno (SOEIRO 2000/2001: 115). Segue-se a rua (2) que separaeste conjunto de outro, mais a nor te, onde foram escavados três compar timentosconsecutivos: um com um possível forno metalúrgico (3) e oficina de trabalho, outro que seriaum espaço aber to (4) e o último, rectangular, com aber tura para a Avenida (SOEIRO2000/2001: 116-117). Todos estes espaços se encontravam muito remexidos, fruto dasanteriores escavações, sendo o seu espólio parco, excepção feita ao compartimento 5 queterá apresentado dois níveis distintos de ocupação em termos de materiais: do séc. I, nosníveis mais profundos e do Baixo Império, relacionados com as construções.
Fica assim relatado genericamente o posicionamento dos vários espaços de ondeemergiu a sigillata que foi objecto do nosso estudo. Na sua apresentação, ela será relacionada
com o local de aparecimento, bem como com a leitura estratigráfica então feita. Toda estarelação pode ainda ser percepcionada no catálogo apresentado no fim do artigo.
2. LINHAS DE INVESTIGAÇÃO
Há dois bons artigos que, de alguma forma, tentam fazer uma aproximação mais restritaà identificação dos centros oleiros, dentro das produções riojanas, que nos interessamparticularmente por serem as mais recentes tentativas de isolar centros de produção.
Num dos artigos (ROMERO CARNICERO 1999, in ROCA ROUMENS; FERNÁNDEZ GARCÍA,p. 169-208) é tentada uma aproximação à identificação de alguns oleiros, com base emcaracterístivcas decorativas – não apenas os punções, que sabemos andarem de mão emmão, mas sobretudo dos esquemas decorativos, numa procura de definição de um possívelestilo. São apontados alguns critérios de identificação, baseados nas organizaçõesdecorativas, no uso reiterado de certos punções de características próprias (como seja o casodas palmetas pedunculadas), até inclusivamente do próprio acabamento – superfícies nãocompletamente lisas, com um engobe vermelho claro quase laranja, brilhante.
No segundo ar tigo (SÁENZ PRECIADO, M.P.; SÁENZ PRECIADO, C. 1999, in ROCAROUMENS; FERNÁNDEZ GARCÍA, p.61-136), a aproximação à diferenciação dos centrosprodutores é feita com base nas marcas de oleiros, que comprovadamente pertencem adeterminadas olarias. Não são atribuídos centros de produção a todos os nomes de oleiros,apenas àqueles cuja proveniência não levanta dúvidas. Par tindo dos grandes centrosconhecidos (Arenzana de Arriba, Bezares, Arenzana de Abajo, Tricio, Comprovín, Manjanés,Bacías del rio Tobías, etc.) já anteriormente identificados, analizam-se as produções das váriasolarias pertencentes a cada um destes grandes centros, procurando isolá-las mediante aatribuição de oleiros.
Quer um quer outro artigo, testemunha o desespero e angústia com que os estudiososdestas produções se confrontam, quando se trata de reconhecer e atribuir produções. Isto,porque, no que toca às produções riojanas, tem sido sempre muito difícil determinar aproveniência exacta das cerâmicas, seja através das marcas, seja das características depasta, decoração ou acabamentos. Exceptuando os estudos feitos a par tir dos fornos eestruturas adjacentes, todas as análises deste material atribuem uma origem bastante vasta –Tritium Magallum – que congrega todos os centros oleiros limítrofes, cujos nomes conhecemosatravés das marcas.
Este problema já fora por nós sentido, aquando da realização do referido estudo, aoanalisarmos a terra sigillata proveniente das escavações de Monte Mozinho. O acervo eraconsiderável, ultrapassando os dois mil fragmentos, dos quais cerca de 60% de produçãohispânica, apesar de uma minoria de marcas de oleiro, em relação à produção sudgálica, comoé habitual. O problema da atribuição da origem destas cerâmicas coloca-se, assim, em doisníveis: por um lado, há poucas marcas, logo dificilmente se anexam as produções a um oleiroconhecido; por outro, há diferenças na produção, visíveis macroscopicamente e confirmadaspelos resultados das análises químicas1.
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1 CARVALHO 1998, p. 239-252 – são expostos os resultados de análises químicas onde se detectam diferentes produçõesde sigillata hispânica, sem que se conseguisse determinar a origem.
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Sendo o castro localizado num limite do Império Romano, o problema da pireferia aindaagudiza mais a questão da atribuição dos vasos aos oleiros: aqui, só se importa, não se produz.
Neste sentido, o estudo que resulta da análise das cerâmicas torna-se sempreincompleto, reduzindo-se a meras hipóteses conjecturais, as possibilidades comerciais queelas poderiam traduzir. As diferentes pastas, acabamentos, decoração e opções formais, ficamassim sem resposta, apenas limitadas à sua constatação. Ligada a esta problemática estátambém a questão da cronologia. Para além das conhecidas grandes linhas da forma comoindicadores cronológicos, onde se poderão achar mais? Serão os estilos decorativoselementos absolutamente fiáveis de determinação cronológica?
É asssim, um alívio, verificar, volvidos meia dúzia de anos, que a pouco e pouco se vaiconseguindo isolar grupos de produção das várias cerâmicas, a que acresce um número maisalargado de investigadores debruçados sobre este tema, quer a par tir de cerâmicasencontradas nos sítios de consumo, quer nos locais de produção. Cruzar todas estasinformações é a tarefa que urge realizar, sendo altura de programar uma mesa redonda paradiscussão e confronto das espécies encontradas nos centros produtores e nos centrosrecebedores, com amostragens do próprio material.
É a partir dos resultados expressos nesses dois artigos abordados, que canalizaremos asintenções deste estudo: procurar, na colecção de Mozinho, encontrar afinidades com ascaracterísticas específicas apontadas para a identificação dos oleiros, avançando, assim, umpouco mais na complexa rede de relações comerciais de que Mozinho representa um dos pontosde chegada, embora já muito decantado, fruto de múltiplas escolhas, quase produto de refugo.
Estas serão as direcções tomadas na definição de um objectivo do estudo das sigillatas.As restantes características fazem parte do objectivo mais alargado que é o de dar a conhecere difundir as produções nos locais de consumo, procurando afinar o mais possível oselementos definidores de cada uma.
No final, haverá um catálogo com as características consideradas mais significativas decada peça analisada. Dado o ainda, apesar de tanto esforço, incipiente conjunto de conclusõessobre as produções riojanas, continuamos a defender uma descrição o mais exaustivapossível, procurando revelar os traços mais singulares para futuros agrupamentos.
A maioria das ilustrações representam fragmentos decorados, cujos punções ouorganizações decorativas permitam algumas conclusões. Os poucos vasos lisos ilustradosprocuram apenas reforçar a imagem de uma certa homogeneidade nas formas aparecidas emMozinho, acompanhada de relativa pouca variedade, que atribuímos ao curto período cronológicoa que respeitam os vasos. Os desenhos servem também para mostrar marcas e grafitos.
3. ANÁLISE DA SIGILLATA.
Foram analisados 358 fragmentos de Terra Sigillata, nos locais do sector denominado B,que se divide em três subsectores: BA (315 fragmentos), BB (33 frag.) e Avenida (10 frag.).Conforme se vê na planta (Fig. 1), o sector está fora da muralha Júlio-Claudiana, num conjuntoconstruído no Baixo Império, sobre arrasamento das construções anteriores. São aliás visíveisas estruturas alto-imperiais que foram aterradas pelas novas construções e que estãoperfeitamente documentadas no referido artigo do número anterior da Portugália.
Quanto às produções, apurámos 210 frag. de TSH de Tricio Magallum, das quais 60 são
decoradas, o que perfaz 28,5% das hispânicas; 103 de produção sudgálica de La Graufesenquee 5 cuja origem nos pareceu de Montans; 10 de difícil atribuição entre sudgálicas e hispânicas.Havia ainda 8 de tipo itálico e 14 hispânicas, de origem indeterminada, que poderão ser deateliers ainda pouco estudados, junto ao vale do Douro: Clunia, Tiermes ou eventualmenteUxama (Vd. LUEZAS PASCUAL; SAENZ PRECIADO 1989: 33, em que se afirma a existência dedois fabricos distintos de TSH, de cronologia altoimperial, mas sem resultados quanto à origemda produção; são esses dois fabricos que se encontram em Mozinho). Das produções tardias,apenas encontrámos 8 fragmentos: 3 africanas D (pratos das formas Hayes 59 e 61A) e 5 dehispânica tardia (forma indeterminada).
Faremos o estudo através de duas abordagens diferentes: a primeira, procurará analisar oconjunto das sigillatas quanto a formas, produções, dando especial relevo, como já se disse, àsformas decoradas; a segunda, procurará estabelecer uma relação entre as formas e produçõessigillatas exumadas, e os locais/estratos onde foram achadas, tentando obter uma visão crono-espacial dos achados. Esta perspectiva tem de ser entendida como um exercício deaproximação à realidade, cujas conclusões não podem ser vinculativas, uma vez que se trata deuma reescavação e, por isso, com todos os riscos de ter havido movimentações de terras.
3.1. Análise das formas e fabricos.
Antes de nos debruçarmos sobre a análise das formas decoradas, gostaríamos de fazeraqui uma breve análise ao conjunto global da sigillata objecto deste estudo, cujos resultadosnão se distanciam muito dos obtidos para a parte alta do povoado, a não ser na menorvariedade de formas e fabricos verificadas neste sector mais baixo, que traduz, à partida umacurta utilização.
Ao iniciarmos o nosso estudo, numa primeira separação por formas e produções,ressaltaram imediatamente algumas constatações que procurámos em seguida confirmar:
1 – A quantidade algo surpreendente de formas decoradas;2 – Constatação da possibilidade de reconhecimento do Atelier de Las Palmetas; 3 – Ambiente semelhante ao do alto do povoado;4 – Continuidade do fabrico hispânico nas cerâmicas decoradas (uma só sudgálica);5 – Curto período de utilização das sigillata, balisadas entre 40/50 e 80/100 anos, com
um limite inferior mais recuado devido à existência de sigillatas itálicas e um períodomais intenso entre 50 e 80.
A sigillata de tipo itálicoA sigillata de tipo itálico está presente de forma vestigial, com apenas oito fragmentos e
nas formas Pucci X, Pucci XXV (n.º 2565) e Pucci XXXIV ou XXXVII (PUCCI 1985), relação dedesequilíbrio com as outras produções, que vem reafirmar a hipótese de podermos estar empresença de testemunhos que revelam uma introdução esporádica e não uma importaçãoregular ao longo de um certo período de tempo. Os modelos revelam uma época basicamentemais centrada no período Tiberiano, embora algumas produções tenham início anteriormente.Com tão parcos fragmentos é descabido fazer qualquer tipo de análise tipológica,exceptuando-se um caso (n.º 2570), que revela uma forma não canónica dentro das variantesda Pucci XXV.
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A sigillata SudgálicaA sigillata Sudgálica aparece maioritariamente proveniente de La Graufesenque (103
frag.), embora haja cinco fragmentos cuja cor da pasta e engobe nos leve a colocar a hipótesede poder ser de Montans, pela semelhança com outros fragmentos encontrados na parte altado povoado.
Quanto às formas, estão reduzidas às quatro mais comuns (Drag. 27 – n.º 2238; 24/25 –n.º 2441; 18/31 – n.º 2271 e 15/17 cf. Fig. 7), continuando a tradição do resto do povoado,acrescida de raros fragmentos de Drag. 36, todos de boa qualidade, com pastas finas, defractura vítrea, poucos vacúolos testemunhando um bom amassamento da pasta, corgenericamente vermelho escura (N25, N47, N35 de CAILLEUX), embora com variantes epequeníssimos desengordurantes. Os engobes apresentam geralmente um brilho irisado, deboa espessura e côr vermelho acastanhada (S19, P35 de CAILLEUX). As formas são canó-nicas, apresentando na sua maioria a canelura interna a marcar o bordo, pés relativamentealtos, perfis bem delineados e uniformizados quanto às dimensões. A forma que aparece emmaior quantidade é a Drag. 27 (16), seguida de perto da Drag. 18/31 (15), sendo de menorquantidade as Drag. 15/17 (7) e as Drag. 24/25 (5), o que pode indiciar uma evoluçãocronológica, com uma maior utilização já depois de meados do século I. A grande novidadeencontra-se na existência, dentro desta produção, do primeiro fragmento decorado por nósdetectado em todo o povoado, e que nos levou à presunção de se tratar de uma escolhacomercial. Embora uma amostra não introduza nada de novo no que toca a relaçõescomerciais, o facto é que quebra a estranheza pela constatação da ausência de materiaisdecorados de origem sudgálica. Trata-se de uma forma Drag. 30 de que infelizmente éimpossível ver a decoração, bastante destruída, mas cuja forma inequivocamente sudgálicabasta para apontar a proveniência (Fig. 7, n.º 2378).
Continua a ser nesta produção que se centram mais as marcas, com três das cincodetectadas. Encontram-se em estado fragmentário, sendo por vezes duvidosa a leitura oupassível de várias interpretações, excepto uma, n.º 2334, do oleiro IVCVNDVS, com uma pastamagnífica. O caixilho é pequeno, extravasando a canelura circular central interna (Fig. 8, n.º 2334). É uma assinatura muito conhecida no mundo de La Graufesenque, atestada emvária bibliografia, como por exemplo em Baelo, com um punção semelhante (BOURGEOIS;MAYET 1991: 190, n.º 78). A cronologia apontada dos vasos de referência situa-se entre 40 e100, embora nos pareça um período excessivo de laboração para um oleiro, tanto mais quenão se detectou nenhum vaso com esta assinatura nos achados mais recentes, até ao ano 79(Caixa de Pompeia, ATKINSON 1914: 27-64;) ou do reinado de Trajano (VERNHET 1981: 25--43). Colette Bémont (BÉMONT 1976: 111) estabelece uma cronologia entre 50 e 80, comalguma margem de incerteza antes e depois, onde nos parece poder incluir o nosso exemplar.
A segunda marca (Fig. 8, n.º 2284) permite algumas leituras, podendo ser o oleiroCENNATVS, que já existia no povoado embora sem a fórmula OF (CARVALHO 93/94: 103), ou ooleiro CELADVS (BÉMONT 1976: 32, n.º 106), entre muitas outras possibilidades. Tem umcaixilho pequeno, com letras bem salientes. No caso do primeiro oleiro, a sua cronologia andaentre os anos 40 e 80; no caso do segundo, o âmbito encurta-se para os anos 40/70.
A terceira marca (Fig. 8, n.º 2317) é de duvidosa interpretação, sobretudo devido ao seuestado incompleto e má conservação do engobe. Pertence ao fundo de um prato Drag. 18/31e apresenta traços da roda no exterior. Pela semelhança do punção, pode ser GALLICANVS (50--80) de La Graufesenque (BÉMONT 1976: 44, n.º 174) ou GALLUS (50-80). Poderá ser ainda de
Montans, se for CALVUS (60 – 100). Há ainda a possibilidade de ser OF CAL (BOURGEOIS;MAYET 1991, cat. analítico das marcas, n.º 22).
Fica assim documentada a produção de marcas sudgálicas, salientando-se a cronologiacomo denominador comum, situada entre os anos 50 e 80 e que deve determminar toda aimportação sudgálica do sector.
A sigillata hispânicaÉ La Rioja a origem do maior número de exemplares, com 210 fragmentos, dos quais 60
são decorados, nas formas mais comuns Hisp. 29 (em maior número, 24), Hisp. 37 (emseguida, numericamente, com 14, sendo duas de bordo em amêndoa), a forma híbrida Hisp.29/37 (5) e Hisp. 30 (2). Há muitos casos de fragmentos que não sabemos a qual formapertencem, podendo derivar de qualquer uma das anteriores (22 frag.).
Quanto às formas lisas, encontramos as habituais Hisp. 15/17 (30 peças), que são delonge a forma mais usada. Há apenas 3 Hisp. 18, contabilizando-se 40 fragmentos de pratos quepodem ser de qualquer das duas formas. As tigelas estão em muito menor número, com 7 Hisp.27, apenas uma 24/25, para além de 18 fragmentos que podem pertencer a qualquer umadelas. Há ainda 7 peças da Hisp. 36, e só duas Hisp. 4, às quais se podem juntar 13 fragmentosapelidados de “taças” por terem o fundo curvo e muito aberto, próprio destes pratos/taças. Dahíbrida Hisp. 35-36 contamos com dois exemplares e inequivocamente Hisp. 35, apenas um.
Esta contabilização serve para se percepcionar a esmagadora maioria das formas depratos, muito mais abundantes, quiçá por constituirem uma novidade, de perfil pouco comumnas produções locais. Já as tigelas seriam por demais conhecidas e usadas, quer nas formasde púcarinhos, como de potinhos ou tacinhas, quer nas produções sudgálicas, em grandequantidade.
Como já anteriormente se referiu, os perfis são muito comuns, claramente ainda nafiliação sudgálica, com as paredes dos pratos verticalizadas, as molduras internas curvas ecurtas, as tigelas de tamanho pequeno e execução formal correcta, com lábio marcado e porvezes caneluras a reforçá-lo.
As pastas são de boa qualidade, com alguns desengordurantes muito pequenos, oshabituais vacúolos redondos, mas minúsculos, a cor vermelho clara ou rosada. Os engobes,relativamente espessos e brilhantes, são vermelhos acastanhados, ou mais claros, quaselaranja forte.
Há, na sequência do que ocorreu na parte alta do povoado, uma produção de pastabastante mais clara, esbranquiçada, com engobe fino vermelho acastanhado escuro. Não seassemelham às produções de La Rioja, são em pequeníssima quantidade (14 fragmentos),mas fazem pensar em ateliers satélites do grande centro de Tricio Magallum, ou talvez do Valedo Douro. Tal como se refere em Varea, onde também há dois fabricos diferentes para o altoimpério “um de pasta avermelhada, com desengordurantes bem decantados, engobe castanhoavermelhado, de excelente qualidade, por vezes com aspecto vítreo e outro de pasta bege, eengobe castanho (…)” (LUEZAS PASCUAL; SAENZ PRECIADO, 1989, p. 33), para além de umterceiro, de cronologia mais tardia, do séc. II/III, de pastas mais alaranjadas, mal elaboradas,com engobe laranja muito diluído.
Passando agora à análise mais detalhada das formas decoradas.Relativamente ao Atelier de Las Palmetas, a autora estabelece como critérios empregues
na eleição das peças, o uso reiterado do punção da palmeta, com pedúnculo, ora ocupando
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frisos estreitos ou rematando fileiras de angulos (…) com características técnicas peculiares:verniz vermelho claro, quase alaranjado, brilhante (…) tendência para completar a decoraçãodas métopas com fileiras de ângulos rematados em elementos vegetais ou em aves depequeno tamanho (…) as formas mais habituais são 4: Hisp. 29, 29/37, 37 e 30 (…)desenvolvimento da decoração numa ampla e única zona (…) sendo a maioria das decoraçõesmetopada (…) casos de vasos carenados com a banda inferior com círculos (tangentes,concêntricos, com rosetas no meio, medalhões com aves, há decorações metopadasintercaladas por medalhões (…) métopas separadas por séries de linhas onduladas muitofinas e numerosas (…) só aves, de pequeno tamanho, que acompanham outros motivos ou sedispõem sobre linhas de angulos, completando a decoração das métopas (ROMEROCARNICERO 1999: 170-172, 175-176, 182). Em seguida, determina 3 grupos decaracterísticas mais apuradas, terminando nos tipos de punções utilizados (ROMEROCARNICERO 1999: 179-191). É com base nestas descrições que procuraremos encontrarparalelos para as produções de Mozinho, sendo certo que, à luz desta caracterização, haverámuitos mais exemplares com possibilidades de atribuição a este atelier na parte mais alta dopovoado, cuja produção já foi publicada (CARVALHO 1998, p. 113, n.º 2 e 161; p. 114, n.º 937; p. 115, n.º 944, 949; p. 116, n.º 964; p. 118, n.º 946 e 947, embora com cavalos; p. 120, n.º 948, 959, 963; p. 121, n.º1023; p. 122, n.º 1731; p. 123, n.º 363; p. 124, n.º367, 999, 1000, 1703; p. 125, n.º 1503; p. 127, n.º 1713, 1725).
Nas produções de Mozinho, dividimos os fragmentos por tipos decorativos. Assim, naFig. 2 encontram-se as decorações com círculos, de variados tipos, quer em friso contínuo(2305, 2218, 2511), quer com elementos de separação de tipo vegetal (2395, 2338 e 2333).Neste conjunto, as semelhanças com o Atelier de Las Palmetas resumem-se à utilização decertos punções, como sejam o 2395, com um elemento vegetal de tipo I e uma roseta de tipoII (ROMERO CARNICERO 1999: 207), bem como a própria utilização de círculos com floresdentro. A forma híbrida Hisp. 29/37 também é um referencial de utilização no dito atelier,remetendo para uma cronologia de inícios do último terço do séc. I; o 2338, apresenta umelemento vegetal de tipo III (ROMERO CARNICERO 1999, fig. 2, n.º 7), numa forma Hisp. 29.
Na Fig. 3 colocámos as decorações que incluem animais exceptuando aves: 2237 –Felino com a cabeça para a esquerda em posição de salto. A decoração é um pouco irregular(Vd. Mayet, PL. CLXXXIII, n.º 1913, 1914). Os exemplares de referência procedem do MuseuArqueológico de Mérida, de uma forma Hisp. 37 e do Museu de Calatayud, vindo de Bilbilis, namesma forma anterior, enquanto o nosso é da forma Hisp. 29. 2216 – Metopada: partetraseira de um animal e linhas divisórias de métopas – uma fila de ângulos central, com vérticepara baixo, ladeada de 3 linhas onduladas ver ticais de cada lado. O traço é fino e bemexecutado. 2217 – Decoração muito delicada. Gamo a saltar com a cabeça para a direita e ospelos bem desenhados (Vd. MAYET 1994, Pl. CLXXXIX, n.º 2125/2128). Os exemplaresreferidos procedem de 3 formas: Hisp. 30, 29 ou 37 e 37b, de Saragossa, Calatayud ouMérida. 2546 – Figura animal: cervo (?) a correr para a direita, com a cabeça virada para aesquerda (MAYET, 84, pl. CLXXXV, n.º 1991, 1996,...). Os exemplares de comparação provêmde Saragossa e Soria, nas formas Hisp. 37b e 37. Não há registos de animais nas decoraçõesdo Atelier de Las Palmetas.
Na Fig. 4, juntámos os fragmentos que apresentam na sua decoração aves, caracterís-tica também usual no referido atelier e que aqui se apresentam com relativa diversidade. Sãotodas figuras metopadas, à excepção da 2541, em que as aves estão envolvidas por círculos
segmentados separados por elementos verticais rematados por pequenos círculos concên-tricos, sugerindo um punção semelhante ao daquele atelier, constituindo o motivo circular IV(ROMERO CARNICERO 1999, fig. 2, n.º 7 e 8 e p. 208). As restantes poder-se-iam incluir noconjunto de Las Palmetas, tendo em conta não apenas os punções, mas as organizaçõesdecorativas. O 2561 parece ter apenas uma zona decorada, com fileiras de angulos a remataras métopas, situação verificada nos fragmentos 2306, 2281. O 2377 associa duascaracterísticas: a roseta tipo I (ROMERO CARNICERO 1999: 207) da qual emanam linhas depontos ou pérolas, e no motivo da banda inferior, aves, com várias linhas onduladas verticais aseparar as métopas, num traço fino, de boa qualidade. Acresce a forma peculiar e híbrida dovaso, com bordo onde são visíveis as típicas caneluras internas, mas sem a carena das Hisp.29, o que remete para uma 29/37, forma eleita do atelier em análise. A decoração do 2407parece-nos paradigmática, com apenas uma banda decorada, aves sobre pequenas pérolasdonde saem fileiras de pontinhos que, juntamente com fileiras de angulos, rematam adecoração das métopas, numa finura e delicadeza de traço, patente também nas linhasdivisórias de métopas. Trata-se de uma Hisp. 30, forma das mais raras dentro das 4 típicasdecoradas. A taça 2417 parece ter também um só zona decorada com uma banda de avessobrepostas, semelhante a outros fragmentos já aparecidos no povoado e, embora não hajanenhuma decoração absolutamente igual no exemplos da referência, o tipo de traço fino edelicado, o acabamento e organização com pequenas aves, assemelha-se.
A Fig. 5 representa as decorações com elementos vegetais que, curiosamente, seassociam quase sempre a círculos. Com punções que recordam Las Palmetas, podemosapontar o 2249, com dois frisos decorativos dispostos em duas bandas: na superior, aspalmetas, muito semelhantes às palmetas II da referência, inseridas em círculos como omotivo circular V de Las Palmetas; no friso inferior, encontramos rosetas tipo I, 2, inseridas emdois círculos concêntricos segmentados como o motivo circular IV (ROMERO CARNICERO 1999:207 e 208). Trata-se de uma forma Hisp. 29 e, mais uma vez, de fino traço decorativo e comengobe relativamente espesso e vermelho claro. Outra sugestão do mesmo atelier, embora setrate de um fragmento minúsculo, é o 2247, com um elemento vegetal tipo II, 2. Os doisexemplares que nos parecem de organização decorativa mais parecida, dentro deste grupo sãoos 2523 e 2345, o primeiro uma provável Hisp. 29, com um friso composto por círculosconcêntricos segmentados (motivo circular IV) envolvendo um elemento vegetal tipo II,separados por pequenas aras, na banda superior (ROMERO CARNICERO 1999: 207 e 208) euma decoração em métopas na banda inferior, sendo esta diferença de decoração entrebandas, uma característica daquele atelier; o segundo vaso, embora pequeno e poucoexplícito, mostra uma organização metopada não canónica, com pequenas rosetas e círculos arematarem inferioremente a métopa da banda superior, e uma figura (águia em esquemaheráldico?) apoiada em linhas onduladas verticais, como complemento da decoração (ROMEROCARNICERO 1999: 182). Os dois fragmentos restantes não permitem nenhuma atribuiçãoàquele atelier, sendo o 2337 bastante sugestivo devido à sua proximidade com as decoraçõessudgálicas, num bom estilo de imitação. Não é uma decoração hispânica canónica: as ovastêm lingueta à direita que termina em 3 pés, sendo semelhante a exemplares de Belo (vd.dardo trífido de Belo: BOURGEOIS; MAYET 1991: 118-119, 180-181), cuja produção ésudgálica. No nosso caso, quer pela pasta quer pelo acabamento, parece-nos hispânica. Porúltimo, referimos o 2486, pequeno fragmento com um motivo vegetal bastante incompleto, tipopalmeta (MAYET 1984, PL. CLVI, n.º 926).
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A Fig. 6 mostra vários exemplos de divisórias de métopas, sendo o 2273, aquele cujadecoração mais se poderia aproximar da de Las Palmetas, pelas várias linhas ver ticaisonduladas finas, seguidas de fileiras de angulos a rematarem a métopa.
Pelo que ficou dito, embora não haja cer tezas absolutas de que algumas destascerâmicas provenham do Atelier de Las Palmetas, cujo estudo e definição das produções aindase encontra em fase embrionária, tentou-se um exercício de aproximação com base nascaracterísticas expressas no artigo mencionado. Quanto à cronologia das produções, nãohaverá grande desfasamento, já que em Mozinho, como se disse, o grosso da sigillata,incluindo a sudgálica, andará entre 40/50 e 80/90, podendo ir um pouco mais além, o quecondiz com a produção de Las Palmetas que atinge o seu auge na época Flávia.
A Fig. 8 reporta-se às marcas e grafitos detectados. Como marca hispânica, há umapouco legível no fundo de uma tigela, 2530. Trata-se de um caixilho comprido, mas baixo,rodeado por uma canelura circular com um diâmetro que marca internamente o pé. A leitura émuito duvidosa. Será uma das formas de VALERIVS PATERNVS ? (MAYET 1984, p. 181-183, n.º 690-694, 710). É uma marca muito conhecida e difundida em Tricio. A outra marca quelemos, está num caixilho de extremidades bífidas, não pertencente ao conjunto do sector B deMozinho, mas sim ao sector D, tendo vindo junto. É O·L· S’, sendo lida como LVCIVSSEMPRONIVS (MAYET 1984, p. 148, n.º 339, 336 ). Sendo também de Tricio vemdocumentada em Conímbriga, Mérida, Tarraco, Volubilis, Lugo, Valência, Castro de Barbantes(Orense), Braga, etc (SÁENZ PRECIADO, M.P.; SÁENZ PRECIADO, C., 1999, p. 108-109).
Quanto aos grafitos, apenas dois apresentam uma leitura, embora incompleta: são o2544 (…NIL…?) e 2346 (…VE…?). Os restantes são símbolos difíceis de decifrar, parecendoos 2288 e 2543, grafitos numerais.
Finalmente, a Fig. 7 ilustra algumas formas lisas, entre produções de tipo itálico (2565),sudgálico, ou hispânico, com o intuito de confirmar a uniformização formal que é apanágiodeste conjunto sigillatico. A única excepção refere-se ao frag. 2378, única peça sudgálicadecorada até agora encontrada.
3.2. Análise por locais de achado.
Os subsectores estudados (BA e BB), apresentam genericamente dois momentosdistintos de ocupação: um, tardo – romano, constituído por muros que foram escavados nosanos 40-50, resultando, na escavação actual, entulhos relativamente recentes. Sob estesaterros, foram detectados em alguns pontos sedimentos mais antigos, outrora não escavados,associados a construções mais antigas. É o outro momento de ocupação, alto -imperial, queforneceu, relativamente, mais espólio.
O subsector BA divide-se em vários conjuntos que se prendem com as unidadesconstruídas que ali existiram. Cada uma representa uma quadrícula (Q) tendo recebido nume-ração romana sequêncial na determinação dos vários espaços, conforme definido em pontoanterior.
Não se tendo encontrado sigillatas em Q I, passamos a Q II – rua lajeada. A estratigrafiadesta rua forneceu basicamente quatro camadas, sendo a primeira constituída pelo entulhodas escavações antigas (1947/54). A sigillata apareceu nas camadas 2 e 3 (terra vegetalantiga e derrube), tendo a segunda fornecido apenas sigillata hispânica (14 frag.) e a terceira,
com menor quantidade (8 frag.), registou fragmentos sudgálicos, nas formas de pratos (Drag.15/17) que, juntamente com a presença de grandes dolia, vasos de asas interiores evoluídos,panelas e potes, poderão indiciar uma ocupação ligeiramente anterior. A sigillata hispânicaapresenta formas cronologicamente situadas entre meados e o fim do séc. I, com maiorincidência no último terço (Hisp. 29, 15/17, 27, 36 e 4, com predominância dos pratos).
A zona Q III denomina um átrio em L, formado por muros tardo-romanos que sesobrepuseram a uma casa – pátio, parte de um quarteirão que seria mais do que uma unidaderesidencial, com rua, calçada, muro de suporte de terras. Entre os estratos 3 e 4 (únicos emque se encontrou sigillata), não há distinção entre as formas hispânicas, mas mais uma vez, asigillata sudgálica só aparece no estrato inferior e em muito menor quantidade. As formashispânicas continuam a apontar para uma cronologia da segunda metade do séc. I, com maiorincidência do último terço, (Hisp. 29/37, 29, 37, 27, 4 e 46), perfeitamente de acordo com oresto de espólio aparecido (SOEIRO 2000/2001). Há um estrato, n.º 5, onde aparece cerâmicade tradição castreja e onde estão ausentes as sigillatas.
O Q IV corresponde a um compartimento quadrangular formado por paredes tardo--romanas com uma pia ao centro. As sigillatas espalham-se indiferentemente pelos estratos 2,3 e 4, em abundante quantidade e distribuídas relativamente entre hispânicas (12) esudgálicas (18 frag.). Não existindo formas hispânicas mais avançadas no tempo, parece-nospoder concluir uma cronologia mais centrada em volta do 3º quartel do séc. I, para estesestratos (formas sudgálicas: Drag. 27, 15/17 e 18/31; formas hispânicas: Hisp. 15/17, 27,29, 29/37 e 37).
O Q V é um compartimento tardio aberto, com acesso para a calçada Q VII, de paredestardo-romanas. Produziu apenas um estrato, fruto de remeximentos anteriores, com poucassigillatas hispânicas (Hisp. 15/17 e 29), que mantêm a cronologia anterior.
O Q VI é uma construção circular onde se detectaram os vários pisos de ocupação quenivelaram o chão e que já não apareceram nos Q III, IV e V. Havia ainda um muro a circundarum núcleo de casa-pátio castreja, mas que foi anulado pela construção do compartimento V. Arua Q VII já existia então. O piso da casa seria em saibro calcado (estrato 4). Os alicercestardios implantaram-se ao nível do piso de saibro e barro (estrato 3). Assim, no estrato maisantigo onde apareceu sigillata, o 5 (derrube do muro antigo), os fragmentos são: um de tipoitálico (prato), 3 sudgálicos (Drag. 15/17 e tigela) e 4 hispânicos ((Hisp. 29 ou 30, 29/37),numa cronologia global que aponta para um aro entre o segundo e terceiro quartel do séc. I. Amaior concentração de material encontra-se no estrato 2 (camada castanha clara com pedraspequenas, sob a terra vegetal), onde é visível alguma variedade entre sigillatas hispânicas(formas Hisp. 29/37, 37b, 15/17, 36 e 35/36), sudgálicas (15/17 e tigela) e itálicas (Pucci Xe XXXIV ou XXXVII), estabelecendo limites cronológicos entre o segundo e último quartel doséc. I. As sigillatas são ainda acompanhadas pelas formas 35 e 36 da produção Bracarense,cerâmicas de pasta branca, cinzenta fina, cerâmica comum romana (jarros trilobados,anforetas, almofarizes, taças com interior de aguada vermelha, etc.), o que apoia a cronologia.
Q VII é uma rua de época tardia, senão no seu traçado, pelo menos no lajeado. Forneceusigillatas em três dos seus estratos. No 1 (terra castanha às bolsas), raros fragmentoshispânicos (forma Hisp. 37); no 2 (terra castanha escura compacta com pedra míuda),continuam os fragmentos hispânicos (Hisp. 37, 29 ou 30, 29/37, 27) a que se associamsudgálicos (Drag. 18/31 e tigela); no 3 (terra negra com manchas amarelas e muitosfragmentos de telha pequenos e rolados – não de destruição, mas para ali atirados – num
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conjunto de bom espólio), abundam os fragmentos hispânicos (Hisp. 37, 29, 29/37, 15/17,27, 35, 35/36, 36), sendo raros os sudgálicos (Drag. 18/31 e tigela). Verifica-se que entre ostrês estratos não há grandes diferenças entre as sigillatas. A predominância é da hispânica,com 46 fragmentos, onde sobressaem as decoradas com 18 peças, contra 13 da formaimediatamente seguinte, que são os pratos. Da sudgálica (9 fragmentos), as formas equivalem--se entre tigelas e pratos. Acompanham as sigillatas cerâmica bracarense das formas deimitação 24/25, 29, 35 e 36, restos de uma falcata em ferro, vasos fechados de pastabranca, púcaros de cinzenta fina polida, ânforas e alguns vasos castrejos que ajudam aapontar uma cronologia entre o terceiro e inícios do quarto quartel do séc. I.
A grande casa rectangular Q VIII mostrou duas fases na sua elaboração, fornecendo umespólio numa área restrita semelhante ao da rua VII, embora com misturas entre os séc. I eIII/V. No que diz respeito às sigillatas, o desequilíbrio numérico é favorável à produçãosudgálica, com 22 fragmentos (dos quais, 8 pratos Drag. 18/31 e 15/17; 12 tigelas Drag. 27e 24/25), enquanto a hispânica revela 14 (Hisp. 29, 29/37, 24/25, 33, pratos e taças) e a detipo itálico, 2 (1 prato). Aparecem indiferentemente entre os estratos 1 (terra castanha escura),2 (terra escura com muitos carvões, semelhante ao estrato 3 de Q VII) e estrato 3. Mais umavez o espólio sigillático se revelou de cronologia muito próxima, com incidência mais forte no3º quartel do séc. I.
Q IX denomina um espaço vazio, provável pátio da casa Q VIII. Foi muito escavadoanteriormente, pelo que forneceu pouco material residual – 2 fragmentos de Hisp. 15/17.
Segue-se o Q X, parte de uma casa circular com piso em saibro. A escavação determinoudois momentos de ocupação da casa: um, no primeiro terço do séc. I e outro no 3º quartel,entre Cláudio e os Flávios. As sigillatas procedem desta última ocupação, estando ausentesformas itálicas. Dos 5 estratos detectados, só nos três primeiros houve sigillata, com algumasdiferenças quantitativas entre os fabricos hispânico e sudgálico, relativamente aos estratos emque apareceram. Assim, no estrato 1 (camada vegetal antiga), para 11 fragmentos dehispânica (Hisp. 15/17, 18/31, 29/37, pratos e tigelas), apareceram 3 sudgálicos (tigela eprato); no estrato 2 (terra castanha com espólio), as formas de hispânica mantêm-sesensivelmente as mesmas, num total de 10 frag. e apenas 1 sudgálico de formaindeterminada; finalmente no estrato 3 (terra cinzenta com muito espólio e restos de habita-ções), o espólio sigillático foi mais abundante, com predomínio do fabrico sudgálico com 21fragmentos (Drag. 18/31, 24/25, 27, 36, com clara vantagem dos pratos) e apenas 9 his-pânicos (nas formas habituais Hisp. 15/17, 29, 29 ou 30, 29/ 37), denotando mais uma vezuma cronologia algo restrita enformada entre o período Cláudio e inícios dos Flávios.
Finalmente, o Q XI, espaço fora da casa redonda, não apresenta diferenças de estratos,forneceu 18 fragmentos de sigillatas hispânicas (Hisp. 15/17, 18/31, 27, pratos e tigelas) e10 sudgálicas (Drag. 18/31, 15/17, 24/25, 27, pratos e tigelas) que reforçam a constataçãode utilização destes materiais num espaço de tempo curto e com alguma pobreza na variedadede formas, sobretudo das lisas, contrastando com as decoradas, mais eloquentes.
O subsector BB também se divide em espaços de funções distintas, denominadossequencialmente. Exceptuando o Q I, todo o espólio de sigillata se refere apenas a um estrato,o primeiro, dando a sensação de ter sido este sítio ainda mais escavado e remexido do que oanteriormente abordado. Esta impressão é ainda reforçada pela pouca quantidade de sigillatasque apareceram num espaço relativamente grande.
O Q I é um compartimento grande que tem a norte uma construção circular que foi
interpretado como um forno. Do ponto de vista cronológico, o estrato 1 revela uma grandemistura de épocas, desde um frag. de sigillata de tipo itálico (Pucci XXV, da época entreAugusto e Tibério) até 2 frag. de sigillata africana D (Hayes 59 e 61a dos séc. IV-V), comfragmentos intermédios de sudgálica (Drag. 27). No estrato 5, já se encontra uma maioruniformidade, tendo aparecido o fabrico sudgálico (5 frag. – Drag. 18/31 e 27) e hisp. (8 frag.– Hisp. 29, 29/ 37, 27, 36e 15/17), apontando uma vez mais para um período entre Cláudio eFlávios.
Em Q II só apareceu sigillata de época tardia (2 frag. de sigillata hispânica tardia, umaforma aberta de taça).
Q V produziu 9 frag. de sigillata hispânica (Hisp. 15/17, 27, 37) associados a 4 moedasde Galieno e Cláudio I (266 – 271).
O último espaço a ser analisado foi a chamada Avenida, calçada lajeada que, vencendoas curvas de nível, traça uma quase recta entre este sector analisado e o interior da muralhaJúlio-Cláudia. No meio de 9 frag. de sigillata hispânica (Hisp. 15/17, 27 e 37), apareceu umfrag. de sigillata de tipo itálico (Pucci XXV).
Este périplo pelos achados de sigillata na sua relação espacial e temporal veio confirmaruma ocupação algo intensa nestes subsectores. Esta ocupação teria tido vários momentos:um, inicial, não em toda a área, de época Júlio-Cláudia, com um número reduzido de sigillatasde tipo itálico e alguns fragmentos de cerâmica de tradição castreja; o momento seguinte,pujante, seria o que vai desde Cláudio até início dos Flávios, com uma forte presença desigillatas sudgálicas e sobretudo hispânicas, estas últimas dos primeiros tempos do seufabrico, quer pelas formas, quer pelas pastas e acabamentos. Verifica-se que estão ausentesas sigillatas hispânicas dos finais do séc. I, 1ª metade do séc. II, com as formas fechadasHisp. 1, 20 e 21, ou os pratos 15/17 e tigelas 27 de boca muito alargada e engobes já maisalaranjados e finos. Também as Hisp. 37 são em menor quantidade em relação às 29 e assuas decorações apontam para estilos que não ultrapassam muito o inicio da dinastia Flávia.
NOTA FINAL
O conjunto de sigillatas aparecidas nos subsectores BA e BB de Monte Mozinho, numaárea reescavada a partir dos vestígios deixados pela escavação dos anos 40-50, que terádeixado intactas algumas bolsas estratigráficas que se encontravam sob o assentamento dosmuros tardo-romanos, revelou-se interessante por representar uma ocupação relativamenterestrita e balizada no tempo. Os exemplares sudgálicos ou hispânios apontam para umacronologia entre Cláudio e Flávios, podendo corresponder o limite posterior ao abandono destaparte do povoado, na época das grandes reformas flávias que se notam na reestruturaçãourbanística da par te alta, com o lajeado da “avenida” e construção de novas unidadeshabitacionais, segundo um plano estabelecido.
Há ainda a salientar o facto de a relação numérica entre as duas produções ser de 1/3,o que reforça a ideia de uma continuidade curta no tempo.
Pelas produções de boa qualidade, tentámos definir semelhanças com um Atelier de LasPalmetas que foi identificado dentro da área de influência de Tricio (que apresenta maisafinidades dos punções que Arenzana de arriba, por exemplo), mas do qual nada se sabe, noque diz respeito a local de produção e relações comerciais quer com locais de consumo, quer
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com a grande superestrutura de Tricio. Como área de difusão é apontada uma zona restrita:Arcóbriga, Numancia, Uxama e Tiermes (extremo oriental da Meseta Norte e Curso Médio doDouro), Cumplutum e Valência (Meseta sul), havendo paralelos em Conímbriga, Mérida eTarragona (ROMERO CARNICERO 1999, p. 192-195). Pretendeu-se, assim, dar um contributo apartir de um centro de consumo longínquo e periférico, mas com boa importação de sigillata,ao conhecimento das relações comerciais que se estabeleceram entre as várias oficinas e comos locais de consumo.
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MONTE MOZINHO: A TERRA SIGILLATA RECUPERADA DO SECTOR B
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MONTE MOZINHO: A TERRA SIGILLATA RECUPERADA DO SECTOR B
141
2328
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larg
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MONTE MOZINHO: A TERRA SIGILLATA RECUPERADA DO SECTOR B
143
2398
2399
2400
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MONTE MOZINHO: A TERRA SIGILLATA RECUPERADA DO SECTOR B
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MONTE MOZINHO: A TERRA SIGILLATA RECUPERADA DO SECTOR B
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MONTE MOZINHO: A TERRA SIGILLATA RECUPERADA DO SECTOR B
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MONTE MOZINHO: A TERRA SIGILLATA RECUPERADA DO SECTOR B
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Figura 1a
Figura 1b
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Figura 2 – Decoração em Círculos Figura 3 – Decoração com Animais
Figura 4 – Decoração com Aves
MONTE MOZINHO: A TERRA SIGILLATA RECUPERADA DO SECTOR B
153
Figura 5 – Decoração com Elementos Vegetais
Figura 6 – Decoração com Elementos Vegetais
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Figura 7 – Formas Lisas e Sudgálica Decorada
Figura 8 – Marcas e Grafitos
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