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A teoria do comércio internacional do mercantilismo é, por um lado, um aspecto fundamental de seu sistema e, por outro, o ponto de partida para o debate teórico nessa disciplina até os dias de hoje. Os temas introduzidos pelo mercantilismo que vão permear os debates futuros são: (i) Qual é a relação entre comércio exterior e riqueza nacional, ou, em uma terminologia moderna, entre comércio internacional e desenvolvimento econômico? (ii) 0 comércio exterior deve ser livre, como o comércio doméstico, ou este deve ser administrado, em benefício dos interesses nacionais? TEORIAS CLÁSSICAS DO COMÉRCIO INTERNACIONAL David Hume No campo da economia internacional David Hume é, sem dúvida, o primeiro economista moderno. Embora a influência de Hume como filósofo tenha ofuscado o brilhantismo de seu trabalho como economista, é de sua autoria uma hipótese que suplantaria os argumentos mercantilistas em defesa do superávit comercial. Essa tese, conhecida pelo seu nome em inglês, specie flow-price hypothesis (hipótese do preço-fluxo de metais preciosos), propõe que um superávit comercial continuado não é possível, nem desejável. Hume, tal como os mercantilistas, acreditava que um superávit comercial levaria necessariamente à transferência de metais preciosos ou moedas metálicas do país deficitário para o país superavitário. Mas, diferentemente deles, acreditava que tal transferência levaria não ao crescimento da riqueza de um país, e sim ao crescimento dos preços dos produtos produzidos domesticamente. Esse aumento do nível doméstico de preço teria como conseqüência fazer com que as exportações desse país ficassem relativamente mais caras no resto do mundo, reduzindo a procura delas no exterior. Da mesma forma, o país deficitário perderia metais preciosos. Isto reduziria o nível de preços doméstico, aumentando a procura de seus produtos no exterior. Desse modo, o país superavitário tenderia a exportar menos e importar mais, e o país deficitário a exportar mais e importar menos, e em ambos os casos a balança comercial tenderia para o equilíbrio. Mas o ponto central do pensamento econômico de Hume é a visão deique fatores reais, e não o aumento do meio circulante, determinavam a prosperidade de uma nação. E que tal prosperidade, e não o acúmulo de metais preciosos, era o único fundamento confiável para a segurança de uma naçào. Por sua vez, o aumento dos mercados que o comércio exterior promove, e o atendimento das necessidades internas que ele possibilita fazem com que o florescimento deste beneficie todas as nações mercantis. Em uma linguagem moderna: o comércio não seria, como pensavam os mercantilistas, um jogo de soma zero, mas sim um jogo de soma positiva. Hume escreveu pouco mais de cem páginas sobre assuntos econômicos. A maior parte desses escritos são panfletos contra as idéias mercantilistas. Mas sua influência sobre o pensamento econômico, em especial na área de economia internacional, não pode ser subestimada. Hume foi o primeiro defensor do livre comércio, como pode ser percebido por uma referência citada com freqüência: Deve-se... considerar que, pelo crescimento da indústria entre as nações vizinhas, o consumo de todas as diversas espécies de mercadorias também crescerá; e embora manufaturas estrangeiras interfiram com elas no mercado, a demanda por esses produtos podem ainda manter-se ou crescer... Nós não precisamos ficar apreensivos, que todos os objetos de nossa indústria irão acabar, ou que nossas manufaturas, enquanto elas se mantiverem no mesmo nível de nossos vizinhos, correrão o risco de ficar ociosas. A emulação pelas nações rivais serve principalmente para manter a indústria viva em todas elas. E todos os
Economia Internacional
povos serão mais felizes se possuirem uma variedade de manufaturas, que se tiverem uma única grande manufatura... Eu devo portanto ousar reconhecer que, não apenas como um homem, mas como um súdito britânico, eu rezo pelo florescimento do comércio da Alemanha, Espanha, Itália e mesmo da França. Eu contudo tenho certeza de que a GrãBretanha, e todas essas nações, prosperarão mais se seus soberanos e ministros adotarem esses amplos e benevolentes sentimentos uns para os outros. À teoria de Hume foi a base do sistema monetário do padrão ouro. Os princípios do livre-cambismo, posteriormente desenvolvidos por Smith e Ricardo, combinaram~se com a hipótese de specie flow-price para a criação de uma nova ordem econômica internacional. Esta ordem pretendia ser liberal, politicamente simétrica, impessoal, com mecanismo de ajuste automático, dependendo apenas da flexibilidade dos preços domésticos e do crescimento da produção internacional de ouro para determinar os níveis domésticos de preço e o equilíbrio nas balanças comerciais de todos os países mercantis. Adam Smith e a teoria das vantagens absolutas Adam Smith, tal como Hume, foi um filósofo na tradição do empirismo inglês. Entretanto, ao contrário de Hume, seus escritos filosóficos, em especial seu interessante tratado Teoria dos Sentimentos Morais, foram ofuscados por seu trabalho como economista.' Sua grande obra econômica foi uma Investigação sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações. Ela é considerada a obra seminal da escola clássica de economia política. Seguindo a tradição de Devid Hume, uma parte importante do trabalho de Smith é de questionamento das idéias mercantilistas? 0 tema comércio internacional é um dos aspectos centrais de seu pensamento. A pergunta que dá nome ao livro, a natureza e as causas da riqueza das nações, que, corno já mencionamos, é uma questão essencial para os mercantilistas, é respondida de uma forma totalmente distinta destes. A riqueza das nações é o resultado do aumento da produtividade do trabalho.` Esta, por sua vez, é conseqüência da divisão do trabalho." A divisão do trabalho, é o resultado da propensão da natureza humana de trocar, negociar e vender um produto em troca de outro.` A divisão do trabalho, no entanto, é limitada pela extensão do mercado.` Uma vez que o comércio internacional aumenta o mercado para os produtos produzidos domesticamente, ele permite o aprofundamento da divisão do trabalho, contribuindo para aumentar a riqueza das nações. Por intermédio do comércio internacional um país exporta as mercadorias que consegue produzir mais barato que os demais, e importa aquelas que produz mais caro, produzindo, desta forma, mais dos produtos que faz com maior eficiência e consumindo mais produtos do que seria capaz na ausência do comércio internacional. Nos livros-textos de economia internacional, Smith costuma ser citado, quase que exclusivamente, como autor da idéia de vantagens absolutas. Isto é, para Smith, o_comércio internacional seria possível tão-somente quando o tempo de trabalho necessário para produzir pelo menos um produto fosse e inferior àquele do exterior." 0 pensamento de Smith, no entanto, é muito mais rico e complexo que isto. Ele, por exemplo, observa que quando o produto de qualquer ramo da indústria excede a demanda interna de um país, o excedente deve ser mandado para o exterior e trocado por alguma coisa que tenha demanda em casa. Para ele, "sem tal exportação uma parte do trabalho produtivo de um país deve cessar, e o valor de sua produção anual diminuir".` (Smith, 1776, p. 161) Ele também argumenta que o excedente do produto importado, pago com o excedente doméstico, pode ser trocado mais uma vez por um produto demandado domesticamente. Smith afirmava que os metais preciosos são um produto como qualquer outro. Portanto, um país grande produtor de metais preciosos seria naturalmente um exportador deste produto, porque o preço dos outros produtos cotados em ouro ou prata, no país com minas, seria mais alto do que no país sem minas. Esta seria a razão pela qual tanto Portugal como Espanha, mesmo com severíssima legislação contra exportação de metais preciosos, eram grandes exportadores desses produtos. A grande oferta doméstica de ouro e prata em Portugal e Espanha teria, então, como único efeito, fazer com que a produção de produtos
agrícolas e manufaturados ficasse desestimulada, sendo que a exportação de metais preciosos, reduzindo o nível de preços doméstico, seria favorável e não perniciosa a esses países. Finalmente, como bom observador de seu tempo, Smith recomendava que a liberalização do comércio exterior, da qual ele era um grande defensor, não fosse feita açodadamente. Para ele: 0 empreendedor de uma grande manufatura, que, em funcão da súbita abertura do mercado doméstico ao exterior, é obrigado a abandonar seu negócio, irá sem dúvida sofrer consideravelmente. A parte de seu capital que era normalmente empregada na compra de materiais e no pagamento dos empregados poderá, sem muita dificuldade, talvez achar outro emprego. Mas aquela parte que está imobilizada em prédios e instrumentos do comércio dificilmente poderá ser abandonada sem considerável perda. Um cuidado justo, portanto, com seu interesse requer que mudanças desse tipo nunca devam ser introduzidas subitamente, mas devagar, gradualmente, e após avisá-lo com muita antecedência. (Smith, 1776, p. 201) Adam Smith é um pensador de grande profundidade teórica e forte fundamento filosófico. Suas idéias são muitas vezes difundidas de forma caricatural, não sendo incomum a referência a elas por pessoas que nunca o leram. Sua contribuição para a teoria do comércio é de grande importância, não apenas em decorrência de sua argumentação sobre os ganhos do comércio, aspecto que seria mais apropriadamente tratado por Ricardo, mas por relacionar o comércio exterior à acumulação de capital, ou, em uma linguagem moderna, ao desenvolvimento econômico. David Ricardo e a teoria das vantagens comparativas A teoria do comércio internacional chega ao apogeu na economia política clássica corri David Ricardo. A principal contribuição desse autor foi sua teoria das vantagens comparativas. A proposição de que as vantagens comparativas são a causa última dos ganhos do comércio é uma idéia poderosa que sobreviveu a todo o debate acadêmico até os dias de hoje. A teoria neoclássica do comércio internacional, que tem no modelo Heckscher-Ohlin-Samuelson sua principal contribuição, é, em última análise, uma elegante discussão sobre os fundamentos do conceito de vantagens comparativas e os ganhos do comercio exterior, dentro do universo conceitual dessa corrente de pensamento. A teoria ricardiana de vantagens comparativas pode ser resumida na seguinte proposição: o comércio bilateral é sempre mais vantajoso que a autarquia para duas economias cujas estruturas de produçao não sejam similares. Isto é, se duas economias, produzindo cada uma dois produtos, por exemplo vinho e tecidos, empregarem na produção desses produtos uma quantidade de trabalho Lv e Lt, no país S, e Lv* e Lt*, no país N, é necessário e suficiente que Lv/Lt <> Lv*/Lt* para que o comércio entre eles sejapossível. Note-se que para Ricardo os salários w no interior de uma economia seriam sempre iguais. Levando-se em conta que o custo de se produzir uma unidade de vinho no país S seria Lv.w e uma unidade de tecidos seria Lt.w, logo os preços relativos no interior dessa economia dependeriam apenas da quantidade de trabalho necessária para produzir cada bem, e não do nível de salário. Em países distintos os salários podem seT diferentes, mas tam~ bém para o país N o custo de produzir uma unidade de vinho seria Lv*w*, e uma unidade de tecido seria Lt*w*, sendo igualmente apenas relevante as quantidades relativas de trabalho para produzir vinho e tecido. Nesse modelo é necessário e suficiente que as quantidades relativas de trabalho para produzir vinho e tecido em cada economia sejam distintas para que o comércio exterior seja vantajoso para ambas. Ricardo apresenta sua teoria usando o exemplo do comércio entre Portugal e Inglaterra, usado originalmente por Smith, para mostrar os ganhos do comércio exterior. Afirma esse autor que se Portugal não tivesse relações com o exterior, em vez de empregar a maior parte de seu capital na produção de vinhos, comprando tecidos para suas necessidades domésticas na Inglaterra, ele teria que dividir seu capital para produzir também estes produtos. Nesse caso ele certamente obteria menos tecidos, e com qualidade inferior, do que se recorresse à importação destes.
A quantidade de vinho que seria dada para a troca por tecidos na Inglaterra não é determinada, segundo o modelo ricardiano, pelas quantidades absolutas de trabalho para produzir os dois produtos em ambos os países. Pelo contrário: dependeria apenas da quantidade relativa destes. Assim, exemplifica Ricardo, suponha-se que na Inglaterra fossem necessários 100 homens por um ano para produzir uma determinada quantidade de tecido; e que fossem necessários 120 homens pelo mesmo tempo para produzir uma determinada quantidade de vinho. Imagine ainda que em Portugal fossem necessários 90 homens para produzir a mesma quantidade de tecido e 80 para produzir a mesma quantidade de vinho que na Inglaterra. Nesse caso seria do interesse da Inglaterra dedicar-se exclusivamente à produção de tecidos e de Portugal exclusivamente à produção de vinho. -Assim, embora a Inglaterra desse em pagamento pelos vinhos, que custaram o trabalho de 80 homens, tecidos que custaram o trabalho de 100, ela poderia obtê-los mais baratos do que se produzisse domesticamente. Nesse caso, a mesma quantidade de vinho iria custar o equivalente ao trabalho de 120 homens por um ano. Por outro lado, Portugal pagou por uma quantidade de tecidos que iria custar o equivalente ao trabalho de 90 homens durante um ano uma quantidade de vinho equivalente ao trabalho de 80 homens durante esse período. Desta forma, ambos lucraram com a operação. 0 modelo ricardiano de comércio internacional implica, portanto, a especialização de cada país na exportação do produto do qual tem vantagens comparativas. Quaisquer dois países lucrarão no comércio bilateral, a não ser na circunstância altamente improvável que a estrutura de custos relativos desses países fosse idêntica." 0 aumento da taxa de lucro da economia não é necessariamente um resultado do comércio exterior. A variação da taxa de lucro ocorre tão somente no caso de variação dos salários reais. A taxa de lucro do comércio exterior será necessariamente igual à taxa de lucro do resto da economia. (Ricardo, 1921 p. 129) Os salários reais, por sua vez, são determinados pelo custo dos produtos de sua cesta de consumo, em especial o custo do trigo. 0 custo do trigo, por sua vez, é determinado, entre outros fatores, pela renda da terra. 0 comércio exterior, ao impedir o uso da terra marginal que acarreta o aumento da renda da terra, permite assim a manutenção da taxa de lucro, ou rio caso de abandono de terras marginais, o aumento desta. Ricardo nem sempre explicitou as premissas de seu modelo. A atençao a essas premissas permite-nos compreender as limitações na aplicação dessa abordagem. O modelo ricardiano pressupõe o comércio de dois países, com dois produtos. Essa premissa, no entanto, é facilmente descartável. A segunda premissa do modelo e que só existe um fator de produção, o trabalho, e que este é perfeitamente móvel no interior de um país, e imóvel internacionalmente. A terceira premissa é que há diferentes tecnologias em diferentes países. Na verdade, o uso de diferentes tecnologias é uma explicação possível para diferentes estruturas de preços relativos em diferentes países. A quarta premissa é que a balança comercial está sempre equilibrada e o custo dos transportes é igual a zero. Finalmente, há rendimentos Constantes de escala. 0 conceito de vantagens comparativas é uma dessas idéias econômicas que ultrapassam em muito o limite do debate acadêmico, com frequência levando a uma confusão entre a teoria e doutrina, isto é, entre um modelo explicativo de como o mundo funciona, e uma recomendação de como o mundo deveria funcionar. 0 conceito de vantagens comparativas pode ser aplicado indistintamente em uma ordem internacional liberal ou em um mundo de economias planificadas. Por exemplo, o comércio exterior entre Cuba e a ex-União Soviética, durante os anos de Guerra Fria, pautava-se pela troca do açúcar cubano pelos manufaturados soviéticos. Esta estrutura de comércio entre esses dois países, que não se pautavam por sinais de mercado, pode ser perfeitamente explicada por vantagens comparativas, isto é, por custos diferenciados para produção de mercadorias distintas. Ou seja, o que podemos concluir do modelo ricardiano é que mais comércio é melhor que menos comércio, o que não implica necessariamente livre mercado. 20 Por fim, o conceito de vantagens comparativas não pode ser aplicado olhandose apenas para um país; este é um conceito relativo e, portanto, só tem sentido considerando-se a estrutura de produção de pelo menos dois países. Nosso desafio é, portanto, compreender o significado desse conceito no momento em que foi formulado, e ainda compreender suas limitações para aplicação ao mundo real. A TEORIA NEOCLÁSSICA DO COMÉRCIO INTERNACIONAL Origens
Os princípios básicos da chamada teoria pura do comércio internacional foram formulados por dois economistas suecos, Eli Heckscher e Bertil Ohlin. Mas foi o economista norte-americano Paul Samuelson que deu o formato analítico, com uso de argumentos baseados em linguagem matemática que, atualmente, caracteriza essa abordagem. Heckscher nasceu em Estocolmo, em 1879, e estudou história e economia na Universidade de Upsalla nos últimos anos do século XIX. Este notável economista sueco especializou-se em história econômica. Entre os 36 livros e 174 artigos em revistas acadêmicas que publicou, a maior parte classifica-se nessa especialidade. Seu livro sobre mercantilismo (Heckscher, 1931) é um dos mais importantes trabalhos de história econômica da literatura mundial, sendo até hoje a principal referência para o estudo do tema. Sua influência foi essencial para o crescimento dessa área na Suécia, sendo que deve-se essencialmente a ele a criação de cursos de pós-graduação em história econômica em várias universidades suecas. Mas foi um pequeno artigo sobre teoria do comércio internacional que o fez famoso na literatura econômica ocidental. Este artigo, publicado originalmente em sueco em 1919, foi traduzido para o inglês sob o título Effects of Foreign Trade on Distribuition of Income ("Efeitos do Comércio Exterior na Distribuição da Renda") .22 Este trabalho, posteriormente desenvolvido por seu ex-aluno Bertil Ohlin, foi a Origem da teoria do comércio internacional centrada nas relações entre as dotações de fatores de produção e padrões de comércio internacional. 0 ponto de partida do pensamento de Ohlin foi a versão de Cassel para o modelo walrasiano de equilíbrio geral. A determinação final das quantidades e preços relativos nesse modelo de equilíbrio geral dependia, em primeiro lugar, da dotação de fatores; em segundo, da tecnologia na forma de coeficientes de insumo-produto, e em terceiro, das preferências dos consumidores. Ohlin modificou esse modelo, inspirando-se em Heckscher, para aplicálo ao estudo do comércio internacional e inter-regional. Dessa forma, partiu de uma economia composta por regiões onde a mobilidade dos fatores era perfeita em seu interior, mas imperfeita ou inexistente entre elas. Essas regiões autárquicas seriam um sistema em miniatura do modelo de Cassel de equilíbrio geral em economias fechadas. 0 preço relativo dos produtos poderia ser diferente entre elas devido ao fato de possuírem distintas dotações de fatores de produção, distintas tecnologias e preferências dos consu~ midores. Ohlin alterou sua abordagem, em uma segunda aproximação, postulando que as regiões diferiam apenas na dotação dos fatores de produção, tendo portanto tecnologia e preferências similares. Esta seria a premissa um centro dinâmico, composto de países industrializados, e uma periferia, formada por países subdesenvolvidos, implicava que os ganhos do comércio exterior fossem desigualmente distribuídos entre esses dois conjuntos de países. Isso ocorreria porque nos países centrais a introdução de progresso tecnico e o respectivo aumento de produtividade em produtos de sua pauta de exportações refletiam-se, sobretudo, no aumento das remunerações do trabalho, e sé) acessoriamente no nível de preços, enquanto na periferia toda inovação significava redução do preço dos produtos exportados, com manutenção dos níveis de salários reais. Isto se daria porque o movimento sindical ativo nos países desenvolvidos obrigava o empresariado a atender parte de suas reivindicações salariais com os ganhos do crescimento da produtividade. Na periferia, no entanto, a existência de um setor tradicional, com imensa reserva de mão-de-obra desempregada ou subempregada, mantinha os salários reais no setor moderno da economia em níveis reduzidos. Esses dois fenômenos combinados levariam à deterioração dos termos de intercâmbio dos países periféricos com os países centrais. A teoria da estabilidade hegemônica foi originalmente formulada por Kindleberger (1970), mas foi desenvolvida e aprofundada por Keohane, 1980. Ela sustenta que estruturas hegemônicas de poder, dominadas por um único pais, são mais propícias ao desenvolvimento de relações econômicas internacionais baseadas em regras estáveis e aceitas, sendo que a decadência da potência hegemônica leva a uma maior instabilidade nas relações econômicas internacionais. Dessa forma, uma economia mundial liberal e aberta implicaria a existência de uma potência econômica claramente dominante. A decadência da Grã-Bretanha, sua relativa fraqueza no período entreguerras e a perda da hegemonia norte-americana no período recente explicariam, portanto, a instabilidade econômica internacional nesses períodos.
A teoria do sistema mundial moderno foi proposta pela primeira vez por Emmanuel Wallersteirt (1974), sendo que recentemente Giovarinni Arrighi (1996) tem sido um de seus principais teóricos. Tal abordagem supõe que a economia mundial contemporânea deve ser vista como um única unidade de divisão de trabalho com múltiplos sistemas culturais. A economia mundial é a unidade de análise relevante, sendo que o mundo moderno deve ser entendido como um sistema onde suas várias partes (os Estados nacionais) estão relacionadas por meio de diversos mecanismos, mas submetidas a uma dinâmica econômica que é fundamentalmente global. Essas três abordagens são apenas algumas das muitas teorias sobre a re]ação entre política e economia internacional. Várias proposiçoes discutidas acima foram testadas pelo estudo de experiências históricas, com maior ou menor grau de aderência à realidade. Entretanto, independente de seu poder explicativo, elas nos permitem concluir com segurança que as relações econômicas internacionais são um fenômeno complexo, e que elas não podem ser entendidas recorrendo-se apenas a alguns poucos modelos formais de análise econômica. A natureza das políticas comerciais estratégicas e suas implicações para a economia internacional podem ser, portanto, melhor compreendidas estudando-se a estrutura do comércio internacional em uma perspectiva histórica. Este será o objetivo da próxima seção. NEGOCIAÇÕES COMERCIAIS MULTILATERAIS, GATT E OMC A ordem econômica internacional do pós-guerra Ao fim da Segunda Guerra Mundial, o grande desafio a ser enfrentado pelos países ocidentais vencedores era a construçao simultânea de uma paz duradoura e de um novo modelo de sociedade capitalista. Esperava-se que essa nova institucionalidade não produzisse uma instabilidade política e econômica que levasse ao avanço do socialismo, então enormemente fortalecido. Para alcançar esses objetivos era preciso construir uma ordem econômica internacional que estabelecesse regras sob as quais as forças de mercado pudessem atuar, permitindo a previsibilidade das estratégias de investimentos empresariais. Por outro lado, era necessário estabelecer salvaguardas para evitar que os países europeus mais afetados pela guerra pudessem ser levados a crises ou à estagnação econômica que colocariam em risco a estabilidade dos países de influência ocidental. As experiências desastrosas de desvalorização competitiva e das políticas protecionistas do período entre guerras geraram uma profunda convicção entre os economistas britânicos e norte-americanos (que mais ativamente participaram do desenho dessa nova ordem econômica) de q ue taxas de câmbio fixas eram fundamentais para a estabilidade dessa nova ordem liberal. Embora houvesse profundas divergências quanto às bases do novo sistema financeiro internacional, isto é, se este deveria ter como pilar uma moeda escritural administrada supranacionalmente ou fundar-se na principal moeda da época (o dólar), havia consenso quanto à necessidade de criar-se um fundo de estabilização, gerido por uma agência supranacional, que fizesse face às crises temporarias de balanço de pagamentos. Este fundo abria um mecanismo de curto prazo para países que, sem esse suporte, só teriam como alternativa as condenadas políticas de desvalorização cambial ou protecionismo alfandegário. 0 FMI foi criado neste contexto para viabilizar um sistema multilateral de comércio e pagamentos que fosse compatível com elevados níveis d e emprego e renda, e, ainda, impedisse as práticas de depreciação competitivas que tinham gerado tanta instabilidade no período entre guerras.' 0 Banco Mundial, como passou a ser conhecido o BIRD (Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento), teria por função contribuir para a reconstrução da economia dos países destruidos pela guerra, incentivando os países beneficiários a desenvolverem políticas de crescirnento de longo prazo. Nesse sentido, a própria criação do BIRD implicava o reconhecimento de vantagens para políticas de planejamento economico e refletia, também, uma preocupação quanto à questão do desemprego, um fantasma ainda não completamente exorcizado depois da tragédia da década de 1930. Procurava-se, portanto, evitar que a desmobilizaçào dos exércitos levasse novamente à mobilizaçào de novos exércitos,
desta vez não de soldados, mas de desempregados - o caldo ideal para a difusão de idéias comunistas, p ara o nacionalismo radical ou qualquer onda de radicalismo. Na época temia-se principalmente a deflação do pré~guerra, sendo que a "inflação rastejante", com crescimento econômico e redução do desemprego, era preferível a um risco de deflação e crise econômica. (Prado,1993) A criação de uma Organização Internacional do Comércio (ITO International Trade Organization) seria, portanto, o terceiro pilar da nova ordem internacional, ao lado do Banco Mundial (BIRD) e do FMI. Seu papel seria construir um sistema de comércio mundial com regras definidas, o que facilitaria o funcionamento das forças de mercado onde as restrições ao comércio fossem progressivamente reduzidas. Esse sistema de comércio internacional teria, ademais, de estar subordinado à preocupação com a estabilidade política e econômica dos Estados nacionais, o que para a época significava a garantia de se relacionar o tema comércio com os temas emprego e desenvolvimento. A Carta de Havana e o GATT Em 1946 o Conselho Econômico e Social da recém-criada Organização das, Nações Unidas, em sua primeira reunião, aprovou uma resolução para realizar uma conferência para preparar os estatutos da ITO. Depois da reunião de um comitê preparatório em outubro de 1946, em Londres, realizou-se uma primeira assembléia em Genebra, entre os meses de abril e novembro de 1947. A reunião em Genebra tinha em sua agenda três grandes temas de negociação: a preparação da Carta da ITO, as negociações do acordo geral de redução multilateral de tarifas e o estabelecimento de regras gerais para as negociações sobre medidas tarifárias. Os Estatutos da ITO foram discutidos e aprovados em uma conferência mundial realizada em Havana, em 1948. Naquela ocasião foi assinada pelos 53 países presentes a Carta de Havana, criando a ITO em março de 1948. 0 documento aprovado estabelecia que a ITO tinha por objetivos: 1. Promover o crescimento da renda real e da demanda efetiva em uma escala mundial. 2. Promover o desenvolvimento economico, particularmente dos países não-industrializados. 3. Garantir acesso em igualdade de termos a produtos e mercados para todos os países, levando-se em conta as necessidades de se promover o desenvolvimento econômico. 4. Promover a redução de tarifas e outras barreiras ao comércio. 5. Impedir ações prejudiciais ao comércio internacional dos Estados nacionais mediante a criação de alternativas, isto é, oportunidades crescentes para o comércio e para o desenvolvimento econômico. 6. Facilitar negociações para problemas no campo do comércio internacional relativos a emprego, desenvolvimento econômico, política comercial, práticas empresariais e política de commodities. A não-ratificação pelo congresso norte-americano da Carta de Havana condenou a ITO à morte prematura. Seria impensáveI uma organização que tratasse de comércio que não tivesse a maior nação mercantil como parte. Nesse sentido, os últimos temas da reunião de Genebra de 1947, que formavam um acordo provisório chamado de GATT -Acordo Geral de Tarifas e Comércio -, cujos princípios tinham origem nas ações norte-americanas para redução negociada de suas elevadas tarifas da década de 1930, tornaram-se por default a base do sistema de comércio internacional por quase cinqüenta anos. Menos elaborado que a Carta de Havana, o GATT não era uma organização internacional, mas um tratado. Isto é, formalmente não deveria ter membros, mas partes contratantes ou países signatários. Este tratado estabelecia em seu artigo XXIX que, quando a Carta de Havana entrasse em vigor, a aplicação de sua parte II, que tratava dos aspectos mais substanciais da gestão do comércio internacional, seria suspensa. Vale a pena comparar alguns artigos do GATT com os artigos da Carta de Havana, para analisar as diferenças. 0 GATT é baseado em dois princípios básicos : (1) o príncipio da não discriminação; (2) o princípio de benefícios mutuos._ 0 primeiro é tratado no artigo I do GATT que estabelece a cláusula de nação mais
favorecida. Ou seja, os países membros comprometem-se a extender às outras partes contratantes qualquer vantagem, favor, imunidade ou privilégio concedido a qualquer outro país. O segundo é tratado no artigo XVIII, onde são estabelecidas as regras de negociações tarifárias que regerão as famosas rodadas do GATT. Neste artigo dois parágrafos são importantes: o que determina que as negociações devem ser efetuadas, principalmente, entre os países cujas trocas representam uma parte substancial de seu comércio exterior, e o que estabelece que a compensação para reduções tarifárias deve ser a concessão de vantagens que afetem um valor igual de fluxo de comércio. Outros artigos relevantes do GATT são:
• 0 artigo XI, que proíbe restrições quantitativas às Importações; note-se, contudo, que o artigo XII estabelece as condições de não-aplicação do artigo XI, justificadas com salvaguardas para o balanço de pagamento.
• 0 artigo XIII, que estabelece que quotas devem ser aplicadas de forma não-discriminatória. • 0 artigo XX111, que estabelece o princípio de nào-redução das concessões e vantagens outorgardas
pelas partes e estabelece regras para a solução de disputas, • 0 artigo XXIV, que estabelece as condições pelas quais a formação de áreas de livre comércio e
união alfandegárias são permitidas. Enquanto na Carta de Havana as questões de natureza tarifária só aparecem a partir do capítulo IV (artigo XVI), depois de capítulos sobre Emprego e Atividade Econômica e sobre Desenvolvimento Econômico e Reconstrução, o GATT é um tratado preocupado quase que exclusivamente com a administração do comercio a partir do interesse das grandes nações mercantis. Somente depois que as Nações Unidas, pressionadas pelos países em desenvolvimento, conseguiram criar uma Conferência sobre Comércio e Desenvolvimento, a UNCTAD, sob a liderança de um dos mais criativos e certamente o mais influente economista latino-americano do pós-guerra, Raul Prebisch, é que o GATT incorporou, relutantemente, a parte IV, intitulada Comércio e Desenvolvimento. Esta, no entanto, nunca alterou de forma substancial o caráter do GATT. 0 GATT e a criação da OMC Em 49 anos de existência o GATT teve oito rodadas de negociações multilaterais de comércio.` A primeira foi em Genebra, em 1947, simultaneamente te com as negociações sobre a assinatura desse acordo. A segunda foi em Annecy, na França, em 1948. A terceira foi em Torquay, nos anos de 1950-51. A quarta foi novamente em Genebra, em 1955-56. As primeiras negociações, depois da Rodada de Genebra de 1947, trataram principalmente da ampliação de membros do tratado. Em 1947, 23 países, entre eles o Brasil, participaram das negociações, quando foram feitas 45 mil concessões tarifárias, cobrindo a metade do comércio mundial. Em 1955-56, na segunda Rodada de Genebra, o número de signatários chegou, com a adesão do Japão, a 33 países. No entanto, as rodadas de Annecy Torquay e Genebra (1955-56) progrediram muito pouco em termos de concessões tarifárias. A quinta foi a Rodada Dillon, em 1961-62, que, embora tenha sido realizada em Genebra, ficou conhecida pelo nome do secretário de Comércio dos EUA na época. Esta foi a primeira rodada depois da criação da Comunidade Econômica Européia (CEE) em 1957, e como conseqüência sua pauta se concentrou nas negociações em torno da tarifa externa comum desse tratado de integração. As concessões da nova comunidade em termos de produtos manufaturados foram reduzidas. Não foram feitas concessões na área de produtos agrícolas, embora essa fosse a mais afetada, em função da política agrícola comum empreendida pela recém-criada CEE. Ainda durante a Rodada Dillon foi negociado um acordo sobre produtos têxteis de algodão, que tratava esses produtos de forma distinta de outros produtos manufaturados. Nesse caso as regras do GATT não se aplicariam, já que esse produto era intensivo em mão-de-obra e relativamente pouco intensivo em tecnologia, permitindo que os países em desenvolvimento logo fossem competitivos nesses produtos. 0 acordo teve de início aplicação limitada, mas foi rapidamente estendido em tempo e abrangência.
A sexta foi a Rodada Kennedy, entre 1964 e 1967, também em Genebra. Este foi um período de rápido crescimento do número de países signatários. No início das negociações o GATT tinha 46 países membros, sendo que ao final da rodada esse número chegou a 74. Esse crescimento se deveu à entrada de grande parte dos novos países africanos, como resultado do processo de descolonização que caracterizou essa década. Na ocasião houve um grande avanço nas negociações tarifárias de produtos manufaturados, com uma redução média de 35% nas tarifas desses produtos nos países da OECD. Essa rodada também foi importante por ter incluído a Parte IV no tratado. Os artigos dessa parte foram negociados após o Grupo dos 77, isto é, o bloco de países em desenvolvimento nas Nações Unidas, ter conseguido criar a UNCTAD (United Nations Conference on Trade and Development) em 1964, pressionando por um tratamento diferenciado que vinculasse comércio internacional e desenvolvimento econômico. A sétima foi a Rodada Tóquio, entre 1973 e 1979. Nesta rodada 99 países, representando cerca de 90% do comércio mundial, participaram das negociações. A tarifa média de importações sobre produtos industrializados dos países desenvolvidos foi reduzida para 6%. Progressos foram feitos com a legalização de tratamento preferencial tarifário e não-tarifário para os países em desenvolvimento. Entretanto, as restrições ao comércio de produtos industrializados e agrícolas desses paises, particularmente no caso de têxteis e produtos alimentares, permaneceram. Também foram negociados nessa ocasião códigos que tratavam de produtos especiais ou de barreiras não-tarifárias. Esses códigos resultaram da objeção dos países em desenvolvimento à ampliação da disciplina do GATT em determinadas áreas. Essa resistência impedia que se alcançasse a maioria de dois terços necessária para emendar os artigos do GATT. Dessa forma, era possível que um conjunto de países chegasse a um acordo sobre um determinado tema, sem a participação de todos os signatários do GATT. A oitava e última foi a Rodada Uruguai, que se realizou entre 1986 e 1994. As negociações desenvolvidas nesse período foram de grande complexidade e abrangência, sendo a mais longa das rodadas. Como resultado dessas negociações, em abril de 1994 foi divulgada na Ata Final da Rodada Uruguai de Negociações Multilaterais a criação de uma Organização Mundial do Comércio (WTO - World Trade Organization). Entre 1947, quando se iniciou a primeira rodada do GATT em Genebra, e 1987, quando os acordos das negociações da Rodada Tóquio foram integralmente aplicados, o, GATT obteve expressivo sucesso na negociação de redução de barreiras tarifárias, sobretudo de produtos manufaturados. Depois do sucesso da Rodada Tóquio o comércio de manufaturados, em especial o comércio intra-industrial, voltou a crescer aceleradamente, após um período de desaquecimento. Isso foi decorrente em parte da estratégia glo~ bal das corporações transnacionais e, em parte, produto da recuperação das economias dos países industriais depois da instabilidade na economia internacional provocada pela "estagflação" nos países desenvolvidos nos anos 70 e a crise da dívida externa dos países em desenvolvimento nos primeiros anos da década de 1980. No entanto, a Rodada Uruguai veio com uma agenda que trazia grandes inovações: entre elas estavam a discussão da liberalização do setor de serviços (o GATS - General Agreement on Trade in Services), a discussão das TRIMs (Trade Related Investment Measures) e a questão da propriedade intelectual' (TRIPs - Trade Related Intelectual Property Rights). Os países em desenvolvimento, no entanto, tinham prioridades distintas nessa negociação. Como já foi dito, quando em 1987 o efeito total das reduções tarifárias da Rodada Tóquio se faziam sentir, a tarifa média dos países desenvolvidos era inferior, para a maior parte dos casos, ao custo do transporte. Entretanto, entre 1980 e 1990 as BNT (barreiras não-tarifárias) cresceram continuamente, sendo que em 1990, 17,5% do comercio mun ial de todas as origens era coberto por medidas nào-tarifárias. Para os países em desenvolvimento essa porcentagem era muito maior, representando cerca de 23% do comércio em 1990 (Tussie, 1994). Essas medidas são ainda fortemente concentradas na exportação de manufaturados intensivos em mãode-obra, o que implica que grandes segmentos do comércio internacional estão excluídos da liberalização ocorrida nesse período. 0 sistema de comércio a partir da Rodada Uruguai caminhou, no entanto, em direção distinta da pretendida pelos principais países em desenvolvimento. A agenda do GATT até a Rodada Tóquio era substancialmente uma agenda negativa, isto é, tratava apenas do que Diana Tussie chamou de "integração superficial" (shallow integration), em oposição a "integração profunda" (deep integration). A partir da Rodada Uruguai caminhou-se na direção de uma agenda positiva que implicava a regulação de políticas domésticas dos governos nacionais que tivessem efeitos sobre o comércio internacional (trade-interfering effects). Tais temas eram de escassa
relevância para países em desenvolvimento e, em alguns deles, eram francamente desfavoráveis. Por exemplo, a questão da harmonização dos direitos de propriedade intelectual, um dos temas mais caros da agenda, funda-se em lógica economica questionável. Foi acordado que os proprietários de patentes têm direitos de monopólio por vinte anos, sem obrigação explícita de produzir a patente localmente. Ainda mais, os proprietários de patentes terão direitos exclusivos de importação, ou seja, os acordos de patentes não contribuem para o livre comércio, mas impedem o livre comércio de produtos que foram resultado de pesquisa e desenvolvimento tecnológico (P&D). Nesse caso tal acordo poderá levar ao aumento do pagamento de royalties para inovadores estrangeiros, redução do potencial de competição e de oportunidades de P&D para os países do Terceiro Mundo e, ainda, a maiores preços para os produtos sob monopólio.` Tudo isso baseado no argumento de que sem tais medidas os investimentos em P&D que beneficiam toda a humanidade seriam reduzidos. Finalmente acordou-se que o resultado final da rodada implicava a adesão a um novo GATT - 1994. Isto é, os resultados da negociação acarretariam a assinatura de um novo tratado com um conjunto de normas aplicado a todos integralmente (single undertaking), evitando-se portanto as implicações legais de reformar-se o GATT - 1947. A criação de uma Organização Mundial do Comércio para supervisionar o GATT, o GATS e os acordos sobre os TRIPs foi proposta pelo Canadá, em 1990, e apoiada pela União Européia. Os Estados Unidos inicialmente se opuseram à idéia, uma vez que, tal como em 1947, o congresso norteamericano era extremamente avesso a tratados que limitavam a soberania desse país em assuntos comerciais. Entretanto, nas negociações sobre a ratificaçào ficava claro que tal organização não era distinta do GATT, rio que se refere aos riscos de prejudicar interesses, desse país (Hoekman & Kostecki, 1995, cap. 2). Por outro lado, uma organização com status similar ao Banco Mundial e ao FMI, com personalidade legal e imunidade diplomática em termos semelhantes às agências da ONU, aumentava a confiabilidade e efetividade da administração do comércio mundial. 0 ato final da Rodada Uruguai e a criação da Organização Mundial do Comércio (OMC) foram assinados pelos ministros dos países membros em 15 de abril de 1994. A nova organização, tal como o GATT, era baseada em dois princípios: reciprocidade e não-discriminação. 0 objetivo da OMC segundo seus estatutos, era ser "o quadro institucional comum para a condução das relações comerciais entre seus membros nos assuntos relacionados com os acordos e instrumentos legais conexos incluídos nos Anexos ao presente Acordo". Esses instrumentos legais conexos eram os Acordos Comerciais multilaterais, firmados sob a égide do GATT, e o GATT de 1994, documento que continha essencialmente as conclusões da Rodada Uruguai (ver Artigo 11 da OMC). A principal instância da OMC é a Conferência Ministerial, que deve ocorrer a cada dois anos. Entre elas a organização é gerida por um Conselho Geral; este é assessorado por um Órgão de Resolução de Controvérsias e por um órgão de Revisão de Políticas Comerciais (ver Figura 2.9). Três conselhos subsidiários e quatro comités operam subordinados ao Conselho Geral. A criação de urna Organização Mundial do Comércio com quase meio século de atraso levanta necessariamente a indagação de em que medida esta é uma reformulaçào do sistema de comércio internacional que de alguma forma possa recuperar algumas das questões da agenda da natimorta ITO, A OMC é um desenvolvimento da estrutura organizacional do GATT de 1947, acrescida das conclusões da Rodada Uruguai e etruturada para tratar de forma mais abrangente e rigorosa as questões relativas ao comércio internacional a partir da agenda proposta pelos países desenvolvidos, que é profundamente distinta dos fundamentos que levaram à assinatura da Carta de Havana, em 1948. 0 GATT criou as bases de um sistema de comércio internacional que pode ser melhor caracterizado como administrado do que liberal. 13 As regras do GATT nunca foram implementadas rigidamente quando os interesses dos países industriais avançados estavam em risco. Entretanto, na década de 1960 e início da
de 1970 conseguiu-se, em alguma medida, o reconhecimento da aceitabilidade, sob determinadas condições, das demandas por uma discriminação positiva dos países em desenvolvimento. A inversão dessa tendência deu-se, particularmente, a partir da segunda metade da década de 1970, com o crescente enfraquecimento dos Estados Unidos como potência hegemônica, o que levou este país a retornar à sua tradição do período anterior à Segunda Guerra Mundial de realizar ações agressivas bilaterais, ou plurilaterais, prioritaria ou paralelamente às discussões multilaterais`. Dois novos conceitos passaram a ser utilizados pelos negociadores norte-americanos a partir da Rodada Tóquio: comércio justo (fair trade), no lugar de livre comércio, e reciprocidade, no lugar de igualdade de oportunidades (Dias, 1996, p. 61). A ênfase, portanto, era em aumentar o grau de interferência no comércio mundial impedindo que mecanismos de mercado prejudicassem interesses concretos de grupos de pressão no interior dos EUA. Nesse contexto, para os países em desenvolvimento a OMC, com todas as suas limitações, parecia um mal menor do que a sujeição as pressões para concessões unilaterais por parte das grandes potências. Vários analistas, no entanto, expressam dúvida quanto à capacidade dessa organização de impedir na prática que os países ou grupos de países industriais utilizem o poder de suas economias e de seus mercados para o não-cumprimento de compromissos multilaterais.` Os argumentos a favor do comércio justo foram discutidos por Paul Krugman (1997) em instigante artigo. A idéia de comércio justo fundamenta-se na visão de que o livre comércio só é interessante se for recíproco, isto é, se os parceiros comerciais procederem de forma similar em sua política de liberalização comercial. Mas, afirma Krugman (1997, p. 113), se esse é o caso, a conclusão óbvia é que esses países devem também ter uma política econômica similar em questões que afetem o comércio no interior de suas fronteiras, não apenas no limite delas, Isto é, por que não exigir padrões internacionais para meio ambiente e relações trabalhistas, ou para política industrial e taxação doméstica?` Krugman critica tal visão argumentando que: (i) países distintos podem ter legitimamente diferentes visões sobre o que é o padrão razoável; e (ii) qualquer que seja a razão para a escolha de padrões diferentes de regulamentação, esta não é uma razão para impedir o comércio internacional, mas, ao contrário, tal como diferenças em gostos ou preferências, é mais uma razão para ganhos de comércio. Krugman recorre a James Mill para argumentar que um defensor do livre comércio não constrói sua doutrina no pressuposto da reciprocidade. 0 livre comércio seria vantajoso mesmo que o outro país não procedesse de forma similar. Isto é, usando-se a metáfora de Mill, o comércio internacional é apenas uma técnica de produção, uma maneira de produzir bens importáveis, produzindo primeiro bens exportáveis e depois trocando-os pelos primeiros. Desta forma, haveria ganhos de comércio, desde que os preços relativos mundiais sejam por qualquer motivos diferentes dos custos de oportunidades domésticos. Portanto, sob o ponto de vista dos ganhos nacionais não importa se os diferentes preços relativos são resultado da diferença de recursos, da diferença de tecnologia, de gostos, de leis trabalhistas ou de padrões de controle ambiental. Tudo o que importa é a existência de diferenças para que haja ganhos de comércio (Krugman, 1997, pp. 115). Krugman, como outros autores, adverte que ações unilaterais ou multi laterais que tentem impor padrões universais para normas ou legislações domésticas dos países membros da OMC podem prejudicar em vez de facilitar a liberalização do comércio mundial.` Entretanto, a tendência até ago~ ra demonstrada nas negociações na OMC, e em outros foros mundiais, é que essa prática vem se impondo no período recente. 0 futuro da OMC A OMC é o produto de cinqüenta anos de um comércio administrado que nunca foi completamente livre nem justo para os países em desenvolvimento. Por outro lado, a OMC poderá ser mais um foro onde as ações protecionistas mais agressivas de alguns países ou grupo de países industriais possam ser questionadas. Viviane Dias (1996) resume este dilema em um texto elegante:
Por um lado, países de desenvolvimento médio, como o Brasil, querem ter a proteção do direito internacional contra o poder arbitrário para definir as regras do jogo internacional exercido unilateralmente, nos últimos anos, pelos Estados Unidos. Mas, por outro lado, a inclusão de políticas nacionais na agenda internacional de comércio não só significa a redução da capacidade do Estado brasileiro para ajustar suas políticas às necessidades do desenvolvimento economico e social, mas também a aceitação de padrões, procedimentos e legislações de países mais avançados, nas áreas acordadas internacionalmente. 0 pior cenário será aquele no qual os países com maior poder não respeitem o cerceamento às suas leis por instituições multilaterais, mas utilizem o seu poder para que outros países cumpram os acordos internacionais. Relida meio século depois, sob a perspectiva de um país em desenvolvimento, a Carta de Havana seria uma melhor opção, como base de uma estruturação do comércio internacional, do que a OMC. Em especial a questão do emprego e a preocupação da relação entre comércio e desenvolvimento, como uma estratégia para associar uma ordem econômica liberal com uma ordem política estável, é mais relevante do que nunca. Por outro lado, este documento refletia um mundo com preocupações mais igualitárias, e em especial, profundamente influenciado por idéias keynesianas. A agenda da OMC, no entanto, trata de um mundo em que as idéias keynesianas expressas ria Carta de Havana parecem estranhas relíquias. Em vez de se buscar um novo pacto social - tal como o pacto social-democrata do pós-guerra - que permita um horizonte estável para que as empresas privadas planejem seus investimentos produtivos, os países desenvolvidos têm procurado culpados para suas próprias políticas econômicas fracassadas.` Por outro lado, a OMC será o fórum onde as questões do comércio internacional serão debatidas e onde será julgada a legalidade das ações unilaterais das grandes potências. Neste contexto, cumpre aos países de desenvolvimento médio, como o Brasil, terem uma diplomacia econômica ativa o bastante para lutar no sentido de que a ordem econômica mundial se aplique igualmente a todos. Nas décadas de 1950 e 1960 estes países lutavam com tenacidade contra a ordem internacional enviesada a favor dos países industriais e lutavam, ainda, por discriminações positivas favoráveis aos países em desenvolvimento. 0 presente contexto internacional é, no entanto, muito diferente; este obriga-nos à articulação de difíceis ações defensivas para evitar que os acordos estabelecidos na Rodada Uruguai sejam aplicados apenas contra os países politica e economicamente mais fracos.
A NOVA ECONOMIA INTERNACIONAL o primeiro período de reconstrução após a Guerra da Coréia (1953-62) baseou-se essencialmente na promoção da substituição de importações. Duas dificuldades foram enfrentadas por essa estratégia coreana. A primeira era a alta propensão a importar da economia, com referência ao crescimento da produção industrial, devido à necessidade da importação de equipamentos e matérias-primas. A segunda era a dimensão relativamente reduzida do mercado interno. As exportações de produtos primários foram sempre reduzidas (menos de 1% do PIB) e, a poupança nacional, negligível. Nessas circunstâncias, fundos para os projetos de reconstrução e de desenvolvimento da infra-estrutura doméstica dependiam essencialmente de ajuda externa. Nesse periodo (1954-59) cerca de 70% de todos os projetos de reconstrução foram financiados por ajuda de outros países, particularmente os EUA (Sang-Mok Suk, p. 9). A principal característica desse período foi, no entanto, a grande ênfase na formação educacional, considerada uma virtude para o confucionismo, a filosofia de Estado da Coréia. A política de promoção de exportações iniciou-se no período 1963-71, sob o governo de Park Chung Hee, na medida em que verificou-se quel nas condições coreanas, essa era a única opção de crescimento. A promoção de exportações foi organizada pelo governo com subsídios diretos para exportação, incentivos fiscais, rebates tarifários, liberalizaçào de restrições creditícias etc. Por outro lado, o governo mantinha forte controle sobre a importação e o investimento estrangeiro, sendo que somente depois de 1967 o
governo muda de uma lista de controle de importações positiva para uma lista negativa. Isto é, somente após essa data o governo passa a publicar a lista dos produtos cuja importação era proibida, ou estritamente controlada, e não uma lista dos produtos cujas importações eram permitidas. No período 1972-79 o governo, por meio do Conselho de Planejamento Econômico, passou a promover fortemente a indústria pesada, enquanto fazia grandes transformações na estrutura socioeconômica doméstica. Para impedir que a disparidade entre as áreas rurais e urbanas aumentasse, o governo iniciou um forte programa de modernização rural, sustentado por política de suporte ao preço dos principais cereais, particularmente o arroz e a aveia, e subsidiando o uso de fertilizantes e a aquisição de maquinarias. Foram desenvolvidos programas como o Saemaul Undong (movimento de novas vilas), que pretendia melhorar as condições de vida no campo melhorando também a produtividade agrícola e a renda. Ao final da década de 1970 a Coréia passou por um processo de estabilização que não foi bem-sucedido em vista da eclosào do segundo choque do petróleo. Em 1980 esse país passou pela sua maior crise, com crescimento negativo de 4,8%. No início da década de 1980 a Coréia iniciou uma reforma estrutural para alcançar três objetivos: (i) estabilidade de preços; (ii) liberalização dos mercados e (iii) crescimento econômico equilibrado. Nas condições de distribuição de renda coreanas, e dado o grau de coordenação da economia, as políticas de preços e rendas foram bem-sucedidas, e esse país conseguiu reduzir as pressões inflacionárias. 0 número de itens que podiam ser importados livremente foi aumentado de forma progressi~ va, reduzindo-se aos poucos as tarifas de importação. Somente nessa época foram iniciadas a liberalização das restrições ao investimento e a proprieda de estrangeira em áreas consideradas de interesse nacional (Sang-mok Suh, 1992, p. 27). As políticas coreanas de substituição de importação, promoção de exportação e liberalização comercial e financeira foram feitas sempre sob o estrito controle do Estado, dentro de estrategias de longo prazo, implementadas por planos qüinqüenais. Nas condições específicas do caso coreano, essa era a única via de industrialização possível. A possibilidade de financiar a substituição de importações com a exportação de commodities não era uma via possível para a Coréia. Esse país, contudo, nunca foi uma economia liberal, e, da mesma forma que a experiência de substituição de importações latino-americana, se insere no modelo de crescimento deriva do da ação do Estado. Menos que o papel do Estado ou a política comercial, as grandes diferenças entre a Coréia do Sul e as economias latino-americanas - particularmente o Brasil, o país mais bem-sucedido durante o processo de substituição de importações - foram a estrutura relativamente equalitária que sempre caracterizou o desenvolvimento coreano e o alto nível de investimento na formação de recursos humanos. Essas duas diferenças são elementos importantes para explicar por que a América Latina tendeu a ampliar sua heterogeneidade estrutural com o crescimento industrial, enquanto a promoção da industrialização da Coréia se deu reduzindo as disparidades regionais e sociais. INTEGRAÇÃO ECONÔMICA E DESENVOLVIMENTO A teoria da integração econômica A integração econômica pode ser definida como o processo de criação de um mercado integrado, a partir da progressiva eliminação de barreiras ao comércio, ao movimento de fatores de produção e da criação de instituições que permitam a coordenação, ou unificação, de políticas econômicas em uma região geográfica contígua ou não. A economia da integração é um tema que vem adquirindo importância crescente nas últimas décadas.- Entretanto, esta não é urna discussão recente, remontando ao período de formação de alguns Estados nacionais, tais como a Alemanha e a Itália, no século XIX. Muitas das questões levantadas nesta discussão foram relevantes em períodos anteriores, em especial entre os séculos XVI e XVIII como conseqüência do fim do feudalismo e da difusão de políticas mercantilista nas economias nacionais européias.
Pode-se observar historicamente as seguintes formas de integração: 1. Área de livre comércio - definida como uma região em que os países membros eliminaram barreiras ao comércio intra-regional, mas mantêm políticas comerciais independentes com relação a países nào-membros. Isto é, uma área de livre comércio tem idealmente tarifa zero entre os países membros, mas com países nào-membros essas barreiras são definidas independentemente, sem considerar interesses ou conveniências dos outros países do bloco. Neste caso é necessário estabelecer os criterios que definem a nacionalidade de um produto para beneficiar-se da política tarifária regional. 0 instrumento que garante este benefício é o Certificado de Origem, com regras acordadas entre os países membros. Exemplos de tratados de livre comércio - NAFTA (Tratado de Livre Comércio Norte-Americano), EFTA (Associação Européia de Livre Comércio), ALALC (Associação Latino Americana de Livre Comércio). 2. União aduaneira - definida como uma área de livre comércio, onde os países membros acordam seguir uma política comercial comum com referência a não-membros. Isto é, adotam uma Tarifa Externa Comum (TEC), ou uma política setorial comum (por exemplo, a Política Agrícola Comum da União Européia), aplicáveis a países fora da região. Neste caso não há necessidade de Certificado de Origem, uma vez que qualquer produto que for importado será submetido às mesmas regras na região. Exemplos de união aduaneira - A união aduaneira formada pelos estados germánicos em torno da Prússia em 1834 (isto é, o Zollverein), O Mercosul, que embora tenha por objetivo construir um mercado comum, pode ser considerado atualmente apenas uma união alfandegária incompletata. 3. Mercado comum – é uma união alfandegária onde há livre circulação de fatores de produção. Insto é, mão-de-obra, capital e empresas podem mover-se livremente entre os países da região sem qualquer restrição a sua circulação. Exemplo de mercado comum - 0 melhor exemplo de mercado comum Comunidade dade Econômica Européia. Desde 1992 esta passou a se chamar União Européia, e estabeleceu um cronograma para a sua transformação em urna união monetária até o fim do século. Entretanto, deve-se ressaltar que a União Européia é, no momento, apenas um mercado comum. 4. União econômica ou monetária - é um mercado comum onde há unificação das políticas monetárias e fiscais. Com o estabelecimento da união económica, a unificação dos mercados é atingida. Com o estabelecimento de autoridades econômicas centrais, os países membros tornam-se efetivamente regiões em um único mercado. Em termos econômicos desaparece, portanto, a soberania de cada nação, que é totalmente transferida para a autoridade central. Além da união econômica há somente a formação de uma união política, ou uma confederação, onde a região transforma~se juridicamente em um unico pais. Deve-se observar que essas formas de integraçào não formam necessariamente estágios de integraçào. Várias dessas formas, tais como a área de livre comércio, ou o mercado comum, podem ser implementadas diretamente, sem que se tenha por objetivo seguir para níveis mais profundos de integração. As políticas de integraçào econômica podem ser positivas ou negativas. Medidas negativas são a remoção de barreiras ao comércio internacional, ou as restrições ao processo de liberalização comercial. Políticas positivas de integração são as modificações dos instrumentos existentes e a criação de instituições para permitir o aprofundamento da unificação dos mercados e seu efetivo funcionamento. A teoria de integraçào econômica tem duas vertentes teóricas: (i) a baseada em conceitos tradicionais da teoria pura do comércio internacional, que funda-se no conceito de vantagens comparativas estáticas e de especialização comercial;` (ii) a inspirada por argumentos protecionistas, tais como o conceito de List (1841) de indústria nascente e por conceitos da teoria do desenvolvimento. Estes incorporam ao debate as idéias de economias crescentes de escala e a preocupação com externalidades - isto é, a integração
econômica entre países em desenvolvimento seria um instrumento para viabilizar escalas mínimas de produção para o aprofundamento do processo de substituição de importações. Jacob Vinner criou as bases da teoria da integração econômica a partir da teoria pura do comércio internacional. A grande contribuição desse autor foi a distinção entre os efeitos de "criação de comércio" e "desvio de comércio" na criação de uma união aduaneira. Em seu modelo teórico, a união aduaneira só seria válida como uma segunda melhor alternativa (second best) na impossibilidade de uma política de redução tarifária multilateral, que seria a melhor alternativa (first best). Define-se criação de comércio como o mecanismo de ampliação das transações comerciais entre os países membros de urna união aduaneira, a partir da unificação dos preços dos produtos na região após a queda das barreiras tarifárias. Isto é, os produtores domésticos menos eficientes em cada país membro são preteridos em favor de produtores mais eficientes em outros países membros. 0 desvio de comércio é definido como o mecanismo de redução do comércio com os países não-membros da união aduaneira, em benefício do aumento do comércio intra-regional. Isto é, produtos importados de fora da região passam a ser preteridos por produtos produzidos na região, em função da estrutura da tarifa externa comum e da liberalização intra-regional. Embora Vinner e Balassa, formuladores da teoria neoclássica de integração economica, sejam os autores mais conhecidos sobre este tema, cabe destacar que, historicamente, os argumentos que motivaram a proposição de projetos de integração têm como matriz teórica a segunda vertente da teoria da integração. Foram argumentos de List, por exemplo, que motivaram a criação do Zollverein no século XIX.` Os primeiros tratados de integração européia foram também inspirados em concepções protecionistas tradicionais, mas foram influenciados pela idéia de que a aplicação na esfera regional de princípios de planejamento econômico prepararia a regiào para o desafio da concorrência com os EUA e o enfrentamento da ameaça soviética. 0 debate teórico sobre a economia do desenvolvimento no pós-guerra teve como principal conseqüência a difusão da idéia de que as vantagens comparativas não eram estáticas, mas dinâmicas. Essas, portanto, seriam construídas por políticas públicas adequadas. As estratégias de industrialização lideradas pela ação do estado viabilizariam, por meio de um crescimento equilibrado (Rosestein-Rodan) ou desequilibrado (Hirschman), a montagem de um setor moderno que, após implantado, seria capaz de competir com economias que se industrializaram em períodos anteriores. Entretanto, estratégias de crescimento liderado pela ação do Estado dependiam da capacidade deste de financiar sua intervenção econômica e, ainda, da dimensão do mercado doméstico para viabilizar uma escala mínima de produção compatível com os objetivos almejados. Mas, para a grande maioria dos países subdesenvolvidos, o mercado doméstico era restrito e, os recursos disponíveis para a ação do Estado, limitados. Nesse contexto, a integração econômica entre países em desenvolvimento seria uma alternativa para viabilizar uma estratégia de desenvolvimento que seria irrealizável nas dimensões de pequenas economias periféricas. Essas razões levaram Prebisch e os economistas da CEPAL a defender a necessidade da integração das economias latino-americanas. Assim, em 1957 o Comitê de Comércio da CEPAL criou um Grupo de Trabalho para o Mercado Regional Latino-Americano. Em 1960 foi assinado o Tratado de Montevidéu, criando a ALALC (Associação Latino-americana de Livre Comércio), ratificado por Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, México, Paraguai, Peru, Urugua; e Venezuela. Ainda na década de 1960 vários outros tratados de integração econômica, de inspiração teórica similar, foram assinados na América Latina e Caribe. Esse período foi um dos mais ativos na tentativa de criar um sistema que viabilizasse a integração regional. Portanto, os projetos de integração propostos nas duas décadas posteriores à Segunda Guerra eram entendidos por seus formuladores como instrumento político para construção de estratégias regionais de desenvolvimento econômico e de construção de suas vantagens competitivas. Embora a criação de
comércio em decorrência de reduções tarifárias fosse o principal objetivo da integração, esta era vista como uma forma de ampliar a escala de produção para viabilizar uma estratégia de desenvolvimento que não era possível de ser implementada no espaço econômico de cada país isoladamente. Este era um projeto político com implicações econômicas, e não um second best para negociações multilaterais. Essa estratégia foi bem-sucedida na Europa e fracassada na América Latina. A integração européia imaginada na década de 1950 era limitada à Europa ocidental, forjando-se no contexto político e econômico da Guerra Fria. Em sua essência havia uma relação ambígua e mal definida da solidariedade Atlântica. A Europa ambicionava tornar~se um parceiro equivalente em poder econômico e político a seu protetor, os EUA. Mas a Europa almejava também reconstruir-se como grande potência, libertando-se da pressão soviética, no oriente, e da tutela norte-americana, no ocidente (Wallace, 1990, p. 2). Desde que o Tratado de Roma entrou em vigor, em 1958, o núcleo original dos seis países aumentou para quinze países. Desde sua criação, o núcleo fundador foi acrescido do Reino Unido, Dinamarca e Irlanda em 1973, de Grécia, Portugal e Espanha na década de 1980. E ainda na década de 1990 a integração européia passa por nova reformulação, com as negociações para entrada de outros países escandinavos, de outros países do EFTA e ainda pela possibilidade de futura adesão de países de economias em transição da Europa central e oriental. Por outro lado, o processo de integraçao européia evoluiu, desde a década de 1960, de preocupações centradas principalmente em questões comerciais para questões de coordenação e integração de políticas públicas e estímulo à formação de redes e outros processos de integração informal (Bressand & Nicolaidis, 1990, p. 28). Isto é, a Comunidade Européia enfrentou com sucesso os desafios da integração comercial, que era a questão tratada pelas teorias tradicionais de integraçao econômica para tentar ir além, em busca de um modelo de integraçao compatível com os desafios enfrentados por essa região. Na América Latina, ao contrário, as tentativas de integração econômica, que se iniciaram aproximadamente na mesma época do processo de integração europeu, foram incapazes, até meados da década de 1980, de criar um modelo estável para a formacão de uma simples área de livre comércio. A liberalização comercial na América Latina não ocorreu após um processo de integração comercial bem-sucedido no continente, mas foi concomitante ou precedeu as recentes experiências de integração sub-regional. Uma explicação para o fracasso dessas políticas é o fato de que os governos latino-americanos viam seus mercados domésticos como um ativo estratégico, e seus vizinhos latino-americanos como concorrentes no fornecimento de produtos primários ou processados para um mercado internacional cuja demanda tinha baixíssima elasticidade -renda. Nesse sentido os mecanismos de Listas Nacionais de Concessões e Listas Comuns, empreendidos pela ALALC, foram muito pouco eficientes, na medida em que os governos dos grandes países relutavam em oferecer vantagens a vizinhos que consideravam mais concorrentes que parceiros. 0 Pacto Andino, que tinha entre as razões de sua criação a insatisfação com o comportamento dos grandes países (Argentina, Brasil e México) na ALALC, também não obteve resultados compatíveis com as expectativas que gerou. As razões de seu fracasso foram mais políticas que econômicas, tal qual a experiência do MCCA, que praticamente ficou estagnado desde a década de 1970. 0 modelo de substituição de importações começou a entrar em crise ainda na década de 1970. As experiências liberais no Cone Sul empreendidas na Argentina, Chile e Uruguai nessa década mostraram-se, entretanto, problemáticas.` Mas as tentativas de se aprofundar o processo de substituiçào de importações no Brasil e no México não impediram seu esgotamento. A moratória mexicana, depois da elevação da taxa de juros norte-americana a níveis estratosféricos no final da década de 1970 e no início da década de 1980, levou à crise econômica vários países latino-americanos, inclusive o Brasil, marcando definitivamente o ocaso desse modelo na América Latina. A partir de meados da década de 1980 vários países latino-americanos iniciaram ou aprofundaram programas de liberalização unilateral. Chile e Argentina, países que tiveram problemas com suas experiências de liberalização na década de 1970, empreenderam novos ciclos de reforma tarifária. Durante a primeira liberalização comercial do Chile, no período 1974-81, permitiu-se uma prolongada apreciação
cambial, vinculada à política crescentemente liberal com referência aos fluxos de capital privados. A segunda reforma chilena no período 1985-1991, no entanto, deu melhores resultados do que a primeira. Esta foi mais pragmatica do que aquela, sendo que a depreciação cambial foi um instrumento usado para estimular o crescimento de exportações não -tradicionais desse país. Pragmaticamente, desde 1989, o Chile vem tentando controlar a apreciação cambial por meio de vários mecanismos de restrição dos fluxos externos de capital de curto prazo que, desde essa época, moveram-se em grande volume para as economias latino-americanas (CEPAL, 1994, pp. 107-109). A Argentina iniciou em 1988 uma segunda experiência de abertura econômica, depois da fracassada experiência liberalizante da década de 1970, sob o ministério de Martinez de Hoz. A partir de outubro de 1988 iniciouse um forte processo de liberalização do regime comercial e a criação de um novo regime tarifário. Desde essa data até as reformas de abril de 1991 as tarifas moveram-se onze vezes para baixo. 0 processo de liberalização comercial e financeira culminou com um pacote que incluía a lei da conversibilidade, a abertura total da conta de capitais e a consolidação da reforma comercial (Cepal, 1994, p. 109). 0 ressurgimento das experiências de integração econômica na América do Sul e, em especial, o Tratado de Assunção, que iniciou o processo de integração do Cone Sul, devem ser analisados dentro do contexto das grandes des reformas econômicas empreendidas pelos países da região. 0 novo regionalismo Ao longo de suas rodadas de negociações o GATT conseguiu reduzir substancialmente as barreiras tarifárias entre os países membros. Esses fatos justificariam a afirmação de que as negociações multilaterais criaram uma economia internacional liberal, sendo irrelevantes discussões -sobre regionalismo ou sobre negociações bilaterai . Entretanto, desde meados da década de 1980, houve um ressurgimento dos debates sobre criação de blocos econômicos e a criação de vários novos tratados de integração: entre eles o do Nafta e o do Mercosul. 1 Esse movimento surge por diversas razões, sendo que duas de particular relevância: (i) a insatisfação com as negociações multilaterais no GATT e (ii) a procura de novas alternativas para dinamizar economias em desenvolvimento afetadas pela crise na década de 1980. A principal razão do sentimento de frustração com as negociações no GATT é que estas pareciam incapazes de impedir a expansão de barreiras não-tarifárias e o tratamento diferenciado para produtos agrícolas ou produtos manufaturados intensivos em mão-de-obra, como têxteis. Na verdade o GATT tinha sido bem-sucedido na redução das barreiras tarifárias de produtos industriais, mas essas eram menos importantes do que um grande número de expedientes para restringir o comércio internacional, tal como as VER (voluntary, export resttictions), OMA (organized marketing arrangement cotas de imposição unilateral etc. A existência dessas áreas cinzas, nem expressamente legais ou ilegais, são diametralmente opostas aos princípios fundamentais do GATT, porém essas persistiram e expandiram-se no período recente (Patterson & Patterson, 1990, p. 8). Por outro lado, um ponto de insatisfação dos EUA com o GATT eram as dificuldades que os chamados novos temas, tais como o comércio de serviços, a proteção aos investimentos (TRIM - Trade Related Investment Measures) e a questão da propriedade intelectual encontravam na Rodada Uruguai no início da década de 1990. 0 sentimento de insatisfação, justificado ou não, com as negociações no GATT por parte dos EUA, foi um dos importantes fatores que explicam a adoção do bilateralismo como alternativa estratégica desse país ao fim da década de 1980.` 0 primeiro acordo bilateral assinado pelos EUA foi de pequena importância estratégica: em 1985 foi assinado um tratado de livre comercio com Israel. A mudança na política comercial norte-americana tem como marco a assinatura do Tratado de Livre Comércio com o Canadá em 1988. As negociações para a criação do NAFTA iniciaram-se formalmente em 1 junho de 1991, um ano depois que George Bush e Carlos Salinas de Gortari declararam pela primeira vez seu apoio a um amplo acordo entre Estados Unidos e México e quatro meses depois que os dois presidentes concordaram em ampliar as conversações para incluir toda a América do Norte.
No Cone Sul, as negociações entre Brasil e Argentina tiveram início com a assinatura do PICE (Programa de Integração e Cooperação Econômica), instituído pela Ata para Integração Argentino-Brasileira, assinada em Buenos Aires em julho de 1986. Este foi seguido em 1988 pelo Tratado de Integração e Cooperação e Desenvolvimento firmado entre Brasil e Argentina e pelo Acordo de Complernentação Econômica N` 14, assinados pelos dois países no âmbito da ALADI, em dezembro de 1990. A motivação dessas negociações foi de início essencialmente política. Os governos de Sarney e Alfonsín eram frutos de um processo de transição democrática e viam tal aproximação como uma forma de aumentar seu poder de barganha em suas relações internacionais. Esses governos contavam, ainda, com prestígio interno e esperavam, por meio de planos de estabilização heterodoxos, reverter o processo de inflação com recessão. Esperava-se obter, com a aproximação comercial de seus países, ganhos de economia de escala e, ainda, beneficiar-se com a comp leme n raridade entre suas economias. Em julho de 1990, Argentina e Brasil decidiram prosseguir com a experiência da integração econômica com a assinatura da Ata de Buenos Aires que fixou em 31/12/1994 a data para a formação de uma união aduaneira entre os dois países. Posteriormente o Paraguai e o Uruguai juntaram-se às negociações, levando à assinatura do Tratado de Assunção em 26/3/1991, já nos governos de Collor e Menem. 0 fracasso das administrações de Sarney e Alfonsín levou a uma mudança na orientação política desses países. Dentro do espírito liberalizante dos novos governos, a integração regional seria um movimento compatível com a formação de blocos no espaço internacional. O Mercosul seria parte de um processo de liberalização mais amplo. Este se configura naquilo que a CEPAL viria a chamar de Regionalismo Aberto (CEPAL, 1994). Mercosul e NAFTA 0 Tratado de Assunção foi abrangente em seus objetivos e ambicioso no tempo para atingi-los. Ele vai além de uma área de livre comércio, visando à construção de um mercado comum que abrange uma tarifa externa comum, a livre circulação de fatores de produção, o estabelecimento de uma política comercial comum em relação a terceiros paises, a coordenação das políticas macroeconômicas e setoriais entre os países e a harmonização de suas legislações. 0 Tratado de Assunção não pode ser comparado com o Tratado de Roma. Este se inspira na Convencão Benelux, complementada pelo protocolo de Haia, que instituiu a união aduaneira entre Bélgica, Luxemburgo e Países Baixos (Almeída, 1992). 0 Mercosul, tal como o Benelux, não tem instituições supranacionais, mas sim intergovernamentais. A Convenção Benelux também objetivava estabelecer uma TEC e aproximar suas políticas econômica e social. No plano institucional ela seria implementada por conferências ministeriais entre os três países, assim como por órgãos mistos econômicos e técnicos, com funcào puramente consultiva. 0 órgão máximo do Mercosul é o Conselho do Mercado Comum, que é uma instituiçao intergovernamental. Os outros organismos do Mercosul têm caráter técnico ou consultivo. Esta é a característica do Conselho do Mercado Comum, da Comissão Parlamentar Conjunta e do Fórum Social e Econômico, estes dois últimos criados na VII Reunião do Conselho do Mercosul em dezembro de 1994, quando foi assinado o Protocolo de Ouro Preto. Embora com objetivos menos abrangentes do que os da União Européia, o Mercosul é muito mais ambicioso que o NAFTA. Este restringe-se a uma área de livre comércio, sem qualquer pretensão de aprofundar a integração além da redução de barreiras tarifárias e do compromisso dos Estados Partes de introduzir algumas legislações de interesse de seu maior membro, os EUA. Dessa forma, são os seguintes os objetivos do NAFTA: (a) eliminar barreiras ao comércio, e facilitar movimentos fronteiriços de bens e serviços entre os territórios das partes; (b) promover condições para uma competiçao Justa na área de livre comércio; (c) crescer substancialmente as oportunidades de investimento nesses territórios, (d) prover adequada e efetiva proteção e implementação dos direitos de propriedade intelectual no território de cada parte, (e) criar procedimentos efetivos para a implementaçào e aplicação deste Acordo, e de sua administração conjunta e solução de disputas; e (f) estabelecer uma estrutura para que cooperações futuras trilaterais, regionais e multilaterais se expandam e ampliem os beneficios desse acordo.
Embora nem sempre explicitado no Tratado do Nafta, a admissão de um país como membro implica a aceitação de regras harmonizadas em setores como investimentos, serviços e propriedade intelectual, áreas às quais a política comercial dos EUA vem recentemente dando grande ênfase. Porenglobar esses temas, que provocaram grandes controvérsias durante a Rodada Uruguai, vários autores consideram o NAFTA mais abrangente do que o Merco sul. 0 NAFTA é, sem qualquer dúvida, um tratado de grande amplitude temática, regulando vários aspectos da relação comercial entre os países membros. Essas regulações são de três ordens: (i) aquelas que atendem às preocupações dos setores sindicais dos EUA, e em menor medida do Canadá, ou seja, as que procuram impedir o que esses setores chamam de dumping social e dumping ecológico; (ii) aquelas que protegem investimentos de setores financeiros e industriais norte-americanos, ou seja, os acordos sobre serviços financeiros e direitos de propriedade intelectual; e (iii) aqueles que protegem setores industriais e agrícolas norte-americanos e canadenses contra a concorrência dos salários mais baixos mexicanos, ou seja, as salvaguardas, as regras de origem e as cotas para exportações agrícolas. A primeira ordem de regulações, que atende às pressões dos movimentos sindicais e organizações defensoras do meio ambiente, implica um argumento incompatível com a teoria pura do comércio internacional. Se os países exportam produtos intensivos no fator de produção com oferta doméstica relativamente abundante, seria natural que o México exportasse produtos intensivos em mão-de-obra. Os acordos nas áreas trabalhistas e de meio ambiente são uma forma de reduzir a vantagem relativa mexicana em setores intensivos em mão-de-obra. Nessa mesma linha, a terceira ordem de regulações, isto é, as regras de origem muito Severas, a perpetuação das cotas para produtos agrícolas e a possibilidade do uso de salvaguardas são artifícios defensivos para temores, fundados ou não, que vários segmentos da sociedade norte-americana têm da destruição de empregos naquele país, como resultado da concorrência dos salários mais baixos mexicanos. A segunda ordem de regulações tem o papel inverso de garantir mercados, e não de protegê-los. Essas regulações eliminam restrições ao comercio de serviços financeiros, estabelecendo que as empresas ou pessoas de um país membro poderão realizar sem restrições em outros países signatários qualquer tipo de operações bancárias, de seguros, compra e venda de valores e outros serviços financeiros que a legislação autorize aos naturais desses países. Os acordos sobre propriedade intelectual implicaram a reprodução da legislação norte-americana sobre o tema para os outros países signatários, sendo nesse sentido mais abrangente do que a aprovada na Ata Final da Rodada Uruguai, que foi posteriormente incorporada à OMC. 0 NAFTA não trata de temas como liberdade de circulação de mão-de-obra, ou de tarifa externa comum, e dificilmente haverá condições políticas de fazê-lo no futuro previsível. Portanto, apesar de esse tratado se restringira uma área de livre comércio, ele trata de um grande número de questões como a coordenação de políticas de investimento, meio ambiente, propriedade intelectual e alguns aspectos limitado da legislação trabalhista. 0 modelo do NAFTA, como área de livre comércio, está fora do debate da teoria de integração econômica tradicional. Como não pretende estabe lecer uma TEC (Tarifa Externa Comum), e a tarifa média norte-americana é baixa, o argumento de Vinner dos efeitos prejudiciais de desvio de comércio não se aplicaria. Portanto, o grande fator de atração do NAFTA e a possibilidade de tratamento diferenciado por parte dos EUA aos países membros quanto à imposição de BNTs (Barreiras Não-Tarifárias). Nesse caso, o trata mento preferencial dos EUA garantiria investimentos de subsidiárias de corporações transnacionais no México e no Canadá. Estas, por sua vez, ampliariam o comércio exterior desses países com os EUA (Weintraub, 1991, p. 49). 0 interesse do México e do Canadá pelo NAFTA seria, então, a disputa desses países por investimentos e por maiores garantias de acesso ao mercado norte-americano com menos restrições não-tarifárias as suas exportações.
Por outro lado, o interesse dos EUA no NAFTA segue uma lógica diferente. Inicialmente há um interesse econômico imediato de uma relação estreita com os países signatários. 0 Canadá é o maior e o México e o terceiro maior parceiro comercial dos EUA. Juntos, esses países absorveram 31% das exportações norte-americanas em 1993. Por outro lado, os EUA são de longe o maior mercado para as exportações mexicanas e canadenses. Assim, uma expansão das exportações desses países para os EUA, gerando crescimento da renda doméstica, reverteria em parte para os EUA por meio da importação de produtos norte-americanos. 0 segundo motivo do interesse norte-americano é de natureza política. 0 NAFTA foi em sua origem também uma sinalização para a União Européia e para o Japão de que os EUA poderiam partir para uma política de desenvolvimento de um mercado regional, implementando uma política mais contundente na defesa de seus interesses comerciais. Por outro lado, a sugestão de ampliação do NAFTA servia como um atrativo para a difusão no continente americano de legislação e politicas internacionais sediadas em Washington. No debate sobre o Cone Sul havia duas visões quanto aos objetivos, amplitude e fundamentos do Mercosul. A primeira, que chamarei de liberal, via a integração regional como um estágio em um processo de liberalização mais amplo, dentro de principios estabelecidos no programa de iniciativas das Américas, cujo modelo seria a ampliação do NAFTA, com a incorporação progressiva das áreas de livre comércio sub-regionais. A segunda abordagem, que chamarei de neodesenvolvimentista, sustentava que o Mercosul devia inserir-se em um projeto de desenvolvimento regional, sendo que a própria criação de um mercado comum implicava o estabelecimento de coordenação das políticas macroeconômicas dos países envolvidos, não apenas em termos de políticas industriais articuladas, com prioridades comuns de promoção de crescimento setorial, mas ainda com intervenções articuladas para a administração dos conflitos causados nas economias nacionais pelo processo de integração. Essas duas visões do Mercosul reproduziam quase literalmente os debates sobre a integração econômica européia, onde as correntes “liberais” e “dirigistas” disputavam quais deviam ser os objetivos desse processo. Essas visões refletiam ainda as dias tradições da teoria da integração econômica anteriormente mencionadas. O Mercosul estruturou-se, no entanto, a partir de uma terceira visão – o regionalismo aberto. Este seria uma tentativa de se implementar uma integração econômica que procurasse produzir apenas o efeito de criação de comércio, reduzindo-se ao máximo os efeitos de desvio de comércio. Esse modelo seria, portanto, menos protecionista que a União Européia e ainda sem coordenaçãoou normatização sepranacional, porém mais profundo e abrangente que o modelo do NAFTA. 0 próprio conceito de regionalismo aberto, tal como definido em documento da CEPAL (1994), é ainda uma idéia controversa. 0 secretário executivo da CEPAL, Gert Rosenthal (1994) vê o conceito de regionalismo aberto como um processo de integração com grande grau de informalidade. Para ele esse -,cria "um processo de crescente interdependència econômica em nível regional, impulsionado tanto por acordos Preferenciais de integração como por outras políticas em um contexto de abertura e desregulamentação, com o objetivo de aumentar a competitividade dos países da região e de constituir, na medida do possível, um estímulo a uma economia internacional mais aberta e transparente”. Segundo essa definição, o regionalismo aberto seria essencialmente forinado pelos Acordos de Complementação Econômica (ACE), permitidos pela ALADI, para flexibilizar as relaçoes econômicas entre seus membros. Esse conceito seria desta forma, quase que sinônimo do que se convencionou chamar de "Acordos de Nova Geração”. 0 documento da CEPAL (1994), no entanto, permite uma interpretação diferente do conceito de regionalismo aberto. Este seria essencialmente uma idéia para contrapor as frustradas experiencias de integração na América Latina até o início da década de 1980, com as novas tentativas de regionalismo que
se iniciaram na segunda metade dessa década e prossegue até hoje. 0 nome regionalismo aberto vinha sendo usado em alguns debates na América Latina sobre essas novas experiências de integração desde o início da década de 1990. Em 1993, Revnolds, Thoumi e Wettmarm publicaram um estudo intitulado "A Case for Open Regionalisim in the Andes". Mas o documento da CEPAL (1994) foi a primeira formulação sistemática do conceito. Este é, ainda, aberto o suficiente para permitir várias interpretações e polêmico bastante para ensejar questionamentos vigorosos. 0 modelo do regionalismo aberto traz ainda como concepção algumas particularidades. Para que a redução tarifária entre os países membros não acarrete desvio de comércio, a TEC deveria ter níveis tarifários baixos, reduzindo-se significativamente a margem de preferência no interior da união aduaneira. Nesse caso, diferentemente das teorias tradicionais de integração econômica, esse processo depende menos dos aspectos comerciais da integração e mais de seus efeitos sobre as decisões de investimento de corporacões trarisnacionais, das grandes empresas nacionais dos países membros e de outros agentes econômicos. Isto é, a dinâmica desse processo para a integração informal. Esse aspecto pouco discutido passa a ser, portanto, um ponto essencial a ser discutido em um tratado de integracão como o Mercosul. 0 ambicioso cronograma de desagravação tarifária do Tratado de Assunção, conhecido como Calendário de Las Lenas foi cumprido em sua maior parte. Apesar de todas as dificuldades para o estabelecimento da TEC, em janeiro de 1995 iniciou-se a operação de uma união aduaneira, embora incompleta, no Cone Sul. 0 Mercosul contribuiu fortemente para a expansão do comercio regional. Na década de 1990 o Brasil foi o principal mercado para os produtos dos seus três parceiros do Tratado.` Por outro lado, a Argentina transformou-se no segundo maior importador dos produ-tos brasileiros. Como bloco, os países da ALADI representam, desde 1992, o segundo maior mercado para as exportações, brasileiras, atrás da União Européia e na frente dos EUA. 0 crescimento do comércio de bens e serviços como resultado de redução de barreiras tarifárias é um processo de "integração superficial" que abre caminho para outras formas de integração. Ou seja, a criacão de sistemas de produção cross border por empresas trarisnacionais (ETS) vem resultando em um processo de aprofundamento da integração, a partir da coordenação de um grande número de atividades em instalações industriais em distintos países.` Esse processo implicaria a difusão de estratégias de integração complexas das ETs e a formação de estruturas de rede. A integraçao econômica no Cone Sul, levando à progressiva integração dos mercados e, portanto, reforçada pelas mudanças recentes na estrategia das ETs. Até a década de 1970 a forma mais comum de estrururação das filiais das ETs era a estratégia multidornéstica. Isto é, as afiliadas operavam no exterior como se fossem empresas independentes, tendo como elo de ligação essencialmente a tecnologia, as marcas comerciais e o controle da administração pela matriz. Desde a década de 1980 cresce o número de ETS que evoluíram para formas de "integração simples", que implica um maior grau de articulação entre as estruturas produtivas das diversas afiliadas, ate a estratégia de integração complexa. Esta última acarreta a selecão em escala mundial ou regional de uma afiliada em um país, ou em um grupo de países, para produzir determinados componentes ou produtos os quais esses países demonstram ter vantagens competitivas (UNCTAD. 1993) Nesse sentido, os problemas do processo de integração no Mercosul situam-se em uma esfera que transcende a redução de barreiras tarifárias.
COMÉRCIO INTERNACIONAL
1. CONCEITOS BÁSICOS
���� Como os países não conseguem produzir todos os produtos de que necessitam, especializam-se
nas atividades produtivas para os quais se encontram mais aptos, permutando os produtos
entre si. Este comércio internacional ou comércio exterior submete os produtores internos a um
maior grau de concorrência, reduzindo seu poder de mercado.
���� Consequentemente, os consumidores internos compram produtos mais baratos, tanto dos
produtores externos quanto dos produtores nacionais que devem manter seus preços em níveis
competitivos.
���� A política de comércio exterior de um país deve estar vinculada à sua política interna, no plano
econômico, social e legal.
���� Pressupostos necessários para que um país possa atingir tais objetivos:
• economia interna baseada na livre iniciativa e liberdade de mercado;
• liberdade política e social no âmbito interno;
• controle do déficit público e da inflação;
• aprimoramento dos recursos humanos disponíveis para a produção;
• especialização e aprendizado das novas tecnologias existentes no mercado externo;
• aproveitamento racional e otimizado dos recursos naturais e de infra-estrutura;
• adoção de política racional para proteção da produção nacional;
• desenvolvimento de uma política de comércio exterior independente e vinculada à
capacidade produtiva do país;
1.1 Mercado e Mercados
Diferenças existentes entre o comércio interno e o comércio internacional são devidas a diversos
fatores, entre os quais:
• variações no grau de mobilidade dos fatores de produção – fator trabalho (mão de obra);
facilidade de deslocamento; oposição, pelos outros países, de diversas restrições à entrada
tanto de trabalhadores quanto de matérias primas e demais produtos;
• natureza do mercado – o mercado interno apresenta maior unidade de idioma, costumes,
gostos, hábitos de comércio, o que facilita a economia de produção em larga escala.
• Existência de barreiras aduaneiras – os impostos cobrados nos outros países refletirão
diretamente nos preços de seus produtos, ocasionando perda de capacidade competitiva;
• Longas distâncias – despesas com transporte, o tempo gasto e os eventuais prejuízos aos
produtos transportados;
• Variações de ordem monetária – alterações das taxas cambiais são fatores de risco;
• Variações de ordem legal – diferenças de ordenamento jurídico em cada país;
Estruturas de Mercado
• Concorrência Perfeita:
• Número elevado de empresas compradoras e vendedoras, agindo independentemente;
• Inexistência de quaisquer diferenças entre os produtos ofertados;
• Perfeita permeabilidade – entram e saem empresas do mercado sem quaisquer tipos de
barreiras;
• Impossibilidade de que atitudes e manobras isoladas venham alterar as condições
vigentes
• Monopólio:
• Existência de apenas uma empresa, dominando inteiramente a oferta do setor
considerado;
• Inexistência de produtos capazes de substituir aqueles produzidos pela empresa
monopolista;
• Inexistência de competidores imediatos – devido às barreiras existentes para o ingresso de
outras empresas;
• Considerável influência sobre os preços e o regime de abastecimento do mercado;
• Dificilmente ocorrem à publicidade;
• Oligopólio:
• Número pequeno de empresas dominando o mercado;
• Produção de bens e serviços padronizados ou diferenciados;
• Controle sobre os preços pode ser amplo – acordos, conluios e práticas conspiratórias são
facilitadas;
• Concorrência extra-preço é considerada como vital - a “guerra de preços” prejudica
todas as empresas do setor;
• Ingresso de novas empresas geralmente é difícil;
• Concorrência Monopolista:
• Um grande número de empresas concorrentes;
• Condições de ingresso são relativamente fáceis;
• Algumas empresas possuem suas próprias patentes, capazes de diferenciação de seu
produto – criam um segmento próprio, dominando-o e mantendo-o para si;
1.3 Marketing e Política Comercial
Marketing ���� é o processo social e gerencial através do qual indivíduos e grupos obtêm aquilo
de que necessitam e desejam por meio de criação e troca de produtos e valores.
• conceitos centrais ���� necessidades, desejos, demandas, produtos, troca, transações e
mercados.
• Significa trabalhar com mercados para conseguir trocas com o propósito de satisfazer
necessidades e desejos.
• Mercado vendedor é aquele em que os vendedores têm mais poder e os compradores
dependem mais do marketing
• Mercado comprador, os compradores têm mais força e os vendedores necessitam utilizar-
se do marketing mais ativamente.
• Antes de decidir vender ou não no exterior, uma empresa deve compreender
completamente o ambiente de marketing internacional: as tarifas adotadas, as barreiras
não-tarifárias, discriminação contra ofertas ou produtos originários de determinados
países;
• O país que adota um política comercial protecionista está na realidade impedindo os
consumidores internos de adquirirem produtos melhores e mais baratos, motivo pelo qual a
política que vem sendo adotada pela maior parte dos países é a mais liberal possível.
• O marketing internacional adotado pelas maiores empresas é realizado por meio de um
completo planejamento estratégico, que possa oferece condições de competitividade para
que tenha possibilidade de atingir o mercado internacional, abrangendo as seguintes etapas:
• Análise e estruturação interna da empresa, objetivando aumentar a
produtividade e reduzir os custos de produção;
• Análise e seleção do mercado externo;
• Oportunidades comerciais oferecidas no comércio exterior , direcionando
suas ações;
• Composto mercadológico – produto, preço, distribuição e promoção que são
decisíveis na busca de competitividade;
• Controle no planejamento.
2. ACORDOS INTERNACIONAIS
GATT e OMC
Assunto tratado no Capítulo V da disciplina RELAÇÕES ECONÔMICAS INTERNACIONAIS
ACORDO SOBRE A IMPLEMENTAÇÃO DO Art. VII DO GATT
Este acordo é tratado no Capítulo X – Valor Aduaneiro
SISTEMA HARMONIZADO DE CLASSIFICAÇÃO DE MERCADORIAS
Este assunto é tratado no Capítulo IV – Classificação Fiscal de Mercadorias
3. AS INSTITUIÇÕES INTERVENIENTES NO COMÉRCIO EXTE RIOR NO BRASIL
3.1. CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL – CMN ���� é o órgão colegiado da estrutura do
Ministério da Fazenda; é o órgão deliberativo máximo do Sistema Financeiro Nacional, competindo-
lhe:
• estabelecer as diretrizes gerais das políticas monetária, cambial e creditícia;
• regular as condições de constituição, funcionamento e fiscalização das
instituições financeiras;
• disciplinar os instrumentos de política monetária e cambial
O CMN é composto pelos seguintes membros:
• Ministro da Fazenda (presidente do Conselho);
• Ministro do Planejamento;
• Presidente do Banco Central do Brasil
Atividades relacionadas com o Comércio Exterior:
• regular o valor externo da moeda e o equilíbrio do balanço de pagamentos;
• fixar as diretrizes e normas da política cambial;
• outorgar ao Banco Central do Brasil o monopólio das operações de câmbio quando ocorrer
grave desequilíbrio no balanço de pagamentos;
• baixar normas que regulem as operações de câmbio;
• regular o exercício da atividade de corretores de câmbio.
3.2. CÂMARA DE COMÉRCIO EXTERIOR – CAMEX ���� faz parte do Conselho de Governo;
é integrada por:
• Ministro do Desenvolvimento e Comércio Exterior (presidente);
• Ministro Chefe da Casa Civil;
• Ministro da Fazenda;
• Ministro do Planejamento;
• Ministro das Relações Exteriores;
• Ministro da Agricultura;
• Presidente do Banco Central do Brasil (convidado especial)
Objetivos da CAMEX ����
• formular as políticas e coordenar as atividades relativas ao comércio exterior de bens e
serviços, bem como avaliar a repercussão das políticas econômicas sobre o comércio
exterior
• serve de instrumento de diálogo e articulação junto ao setor produtivo.
Competência da CAMEX ����
• definir as diretrizes da política de comércio exterior ;
• manifestar-se previamente sobre as normas e legislação sobre o comércio exterior;
• estabelecer as diretrizes para:
• as alterações das alíquotas dos impostos de importação e exportação;
• as investigações relativas à práticas desleais de comércio;
• financiamento e seguro de crédito à exportação;
• desregulamentação do comércio exterior.
• avaliar o impacto das medidas cambiais, monetárias e fiscais sobre comércio exterior;
• fixar as diretrizes para a promoção de bens e serviços brasileiros no exterior;
• indicar os parâmetros para as negociações bilaterais e multilaterais relativas ao
comércio exterior;
• atuar com um canal de comunicação entre o Governo e o setor produtivo.
3.3. SECRETARIA DE COMÉRCIO EXTERIOR – SECEX ���� é órgão da estrutura do Ministério
do Desenvolvimento, Indústria e Comércio.
Competência da SECEX �
• formular propostas de políticas e programas de comércio exterior;
• propor medidas, no âmbito das políticas fiscal e cambial:
• de financiamento;
• de recuperação de créditos à exportação;
• de seguro;
• de transportes e fretes;
• de promoção comercial.
• propor diretrizes que articulem o emprego do instrumento aduaneiro;
• participar das negociações relacionadas com o comércio exterior;
• implementar os mecanismos de defesa comercial;
• apoiar o exportador submetido a investigações de defesa comercial no exterior.
Atribuições � dentre suas atribuições, está a de AUTORIZAR OPERAÇÕES DE
IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO e EMITIR DOCUMENTOS
EXIGIDOS por acordos multilaterais assinados pelo Brasil.
3.4. BANCO CENTRAL DO BRASIL - BACEN ���� é uma autarquia federal, vinculada ao
Ministério da Fazenda, criada para ser o agente da sociedadae brasileira na promoção da
estabilidade do poder de compra da moeda brasileira.
Objetivos ����
• zelar pela adequada liquidez da economia;
• manter as reservas internacionais do País em nível adequado;
• estimular a formação de poupança em níveis adequados;
• zelar pela estabilidade e promover o permanente aperfeiçoamento do Sistema
Financeiro Nacional;
���� A Constituição de 1988 consagra dispositivos importantes para a atuação do BACEN, tais como:
����
• exercício exclusivo da competência da União para emitir moeda;
• necessidade de aprovação prévia pelo Senado dos designados pelo Presidente da República
para os cargos de presidente e diretores;
• vedação na concessão direta ou indireta de empréstimos ao Tesouro Nacional.
Proposição de objetivos nos macroprocessos seguintes:
• formulação e gestão das políticas monetária e cambial;
• regulamentação e supervisão do Sistema Financeiro Nacional;
• prestação de serviços de suporte às transferências financeiras e ao meio circulante.
Funções do BACEN �
• Política Monetária ���� tem por objetivo controlar a expansão da moeda e do crédito e
exercer controle sobre a taxa de juros, utilizando-se dos instrumentos clássicos:
• Operações de mercado aberto – maior versatilidade em acomodar as variações
diárias da liquidez;
• Reservas compulsórias – influenciar a disponibilidade das reservas bancárias e
controlar a expansão dos agregados monetários;
• Assistência financeira de liquidez – determina o custo no não cumprimento dessas
exigibilidades compulsórias, influenciando a atuação dos agentes financeiros.
• Controle das Operações de Crédito ���� atua no contingenciamento do crédito ao setor
público;
• divulga as decisões do CMN ;
• baixa normas complementares;
• executa o controle e a fiscalização a respeito das operações de crédito;
• Política Cambial e de Relações Financeiras com o Exterior ���� Na área internacional,
compete ao BACEN:
• Atuar no sentido de garantir o funcionamento regular do mercado de câmbio, a
estabilidade relativa das taxas de câmbio e o equilíbrio do balanço de
pagamentos;
• Administrar as reservas cambiais do País;
• Promover a contratação de empréstimos e a colocação de títulos no exterior;
• Acompanhar e controlar os movimentos de capitais;
• Negociar com as instituições financeiras e com os organismos financeiros
estrangeiros e internacionais;
• Supervisão do Sistema Financeiro Nacional ���� atua no sentido de aperfeiçoamento das
instituições financeiras, de modo a zelar por sua liquidez e solvência;
• Formular normas aplicáveis ao Sistema Financeiro Nacional
• Conceder autorização para o funcionamento das instituições financeiras;
• Fiscalizar e regular as atividades das instituições financeiras;
• Controle do Meio Circulante ���� destinam-se a satisfazer a demanda de dinheiro
indispensável à atividade econômico-financeira do País. Em conjunto com a Casa da
Moeda do Brasil – CMB (empresa pública), desenvolve projetos de cédulas e moedas
Outras Funções do BACEN �
• regulamentar, autorizar e fiscalizar as atividades dos consórcios, fundos mútuos ou
outras formas associativas;
• normatizar, autorizar e fiscalizar as sociedades de arrendamento mercantil, as sociedades
de crédito imobiliário e as associações de poupança e empréstimos;
• acompanhar as operações de endividamento de estados e municípios;
3.5. SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL – SRF ���� é o órgão central de direção superior,
subordinado ao Ministério da Fazenda, responsável pela administração, arrecadação e fiscalização
dos tributos internos e aduaneiros da União, promovendo o cumprimento voluntário das obrigações
tributárias, arrecadando recursos para o Estado e desencadeando ações de fiscalização e combate à
sonegação.
Administra os seguintes impostos e contribuições: II, IE, IPI, IR, IOF, ITR, COFINS, PIS/PASEP,
CSSL, CPSS – Contribuição para o plano de Seguridade dos Servidores; contribuição para o
FUNDAF e CPMF.
A SRF foi criada com os seguintes objetivos:
• dinamizar a administração tributária;
• apresentar a administração tributária como uma representação única frente ao
contribuinte;
• definir critérios claros e eficientes de descentralização.
Funções da SRF ����
• planejamento;
• controle;
• supervisão;
• avaliação e execução das atividades de: arrecadação, fiscalização, tributação e tecnologia.
Atribuições na área de Comércio Exterior ����
• interpretar e aplicar a legislação fiscal e correlata, baixando os atos normativos e
instruções para a sua fiel execução;
• preparar e julgar , EM PRIMEIRA INSTÂNCIA, os processos administrativos de
exigência de créditos tributários da União;
• preparar e julgar , EM INSTÂNCIA ÚNICA, os processos administrativos de
perdimento de mercadorias, no âmbito da legislação aduaneira;
• dirigir, supervisionar, orientar, coordenar e executar os serviços de administração,
fiscalização e controle aduaneiro, além de controlar o valor aduaneiro de mercadorias
importadas e exportadas;
• reprimir o contrabando, o descaminho e o tráfico de entorpecentes e de drogas afim;
• estimar e quantificar a renúncia de receitas administrativas e avaliar os efeitos da
redução de alíquotas, de isenções tributárias e de incentivos ou estímulos fiscais.
3.6. MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES – ITAMARA TY ���� compete auxiliar o
Presidente da República na formulação da política externa, assegurar sua execução e manter
relações com Estados estrangeiros. O MRE é o executor da política de comércio exterior, no
âmbito externo.
Atividades na área de Comércio Exterior ����
• a organização de feiras, eventos e promoções visando a divulgar as oportunidades
comerciais do Brasil e atrair investidores estrangeiros;
• manutenção do cadastro de exportadores e importadores estrangeiros;
• realização de estudos e pesquisas sobre mercados estrangeiros;
• divulgação de oportunidades comerciais no Brasil;
• assistência a empresários brasileiros em visita ao exterior.
4. A CLASSIFICAÇÃO FISCAL DE MERCADORIAS
Conceito: são sistemas de designação e codificação de mercadorias para uso na formulação das
estatísticas de comércio exterior, nas negociações de preferências tarifárias e para uso
aduaneiro.
TEC ���� é uma enorme relação de tipos diferentes de mercadorias associadas a códigos numéricos. A
cada tipo de mercadoria e correspondente código numérico é indicada a respectiva alíquota do imposto
de importação.
5. A NOMENCLATURA COMUM DO MERCOSUL
NCM - Nomenclatura Comum do Mercosul ���� é a nomenclatura padronizada no âmbito do
MERCOSUL, e abrange todas as operações de comércio exterior; segue critérios bastante rígidos e
definidos, estabelecidos em acordo internacional: o Sistema Harmonizado de Designação e
Codificação de Mercadorias – SH (criado em 1983 para facilitar as operações de comércio exterior, a
qual o Brasil ingressou em 1986), no qual foi baseado e adotado para formulação da Tarifa Externa
Comum (TEC) e da Tabela de Incidência do IPI (TIPI).
• alíquota ad valorem geral ���� é aplicável a todos os produtos da NCM e prevalecerá
sobre a alíquota convencional na hipótese em que, da aplicação das normas gerais,
resultar tributação mais favorável ao contribuinte
Estrutura do Sistema Harmonizado ���� no Sistema Harmonizado, as mercadorias estão
ordenadas de forma progressiva, de acordo com seu
grau de elaboração.
Códigos Numéricos no Sistema Harmonizado ���� os produtos são representados por códigos
numéricos de 6 dígitos.
NBM/SH – Nomenclatura Brasileira de Mercadorias ���� pelo fato do Sistema Harmonizado
ter como idiomas oficiais o inglês e o Francês, foi necessário a criação de um grupo de trabalho
binacional Brasil-Portugal para efetuar sua tradução para o português.
• o Brasil acrescentou mais 4 dígitos aos 6 do SH, que constituem itens e subitens.
NALADI/SH – Nomenclatura da Associação Latino Americana de Integração ���� foi aprovada
como base comum para a realização das negociações previstas no Tratado de
Montevidéu de 1980, bem como para expressar as concessões outorgadas através de
qualquer um de seus mecanismos e a apresentação das estatísticas de comércio
exterior dos países membros.
TSP - Tabela Simplificada de Codificação de Produtos ���� esta tabela pode ser utilizada na
formulação de Declaração Simplificada de Importação – DSI para o despacho
aduaneiro.
6. MODALIDADE DE OPERAÇÃO E FORMAS CONTRATUAIS
Contrato Internacional de Compra e Venda ���� A venda de bens móveis (produtos e mercadorias) é
internacional se a mercadoria vendida for entregue em outro país diverso daquele em que ela se
encontra no momento da conclusão do negócio.
Venda Internacional ���� de acordo com a legislação uniforme (Convenção de Haia, 1964), uma
venda ou compra é internacional sempre que o estabelecimento ou, à
falta deste, a residência habitual das partes se encontrem em
território de diferentes Estados, e que ainda ocorra qualquer uma destas
3 condições:
• que a coisa objeto do contrato esteja situada ou seja transportada entre territórios de
Estados diversos;
• que os atos de oferta e aceitação sejam realizados em território de Estados diferentes;
• que a coisa deva ser entregue no território de um Estado diverso daquele em que se
realizaram a oferta e aceitação.
Fórmulas Contratuais ���� as fórmulas contratuais tem como principal função
DETERMINAR o momento em que o vendedor (exportador)
cumpriu suas obrigações, entregando a mercadoria ao
comprador (importador), dentro dos requisitos legais, obtendo o
direito de receber o valor transacionado.
• as fórmulas contratuais mais utilizadas são:
• Definições Americanas Revisadas para o Comércio Exterior, utilizadas no comércio
exterior dos EUA
• INCOTERMS – International Commercial Terms, que são aplicadas universalmente
nas operações de comércio internacional.
Espécies de Documentos Comerciais ����
• contrato de compra e venda internacional – não necessitam de uma forma padronizada,
mas devem conter todos os dados essenciais da operação, podendo inclusive ser sob a forma
de uma fatura pró-forma (Proforma Invoice); é classificado, juridicamente, como
CONSENSUAL, BILATERAL, ONEROSO, COMUTATIVO e TÍPICO
• Fatura Comercial (Commercial Invoice) – emitida pelo exportador, contendo todas as
informações sobre a operação, escrito na língua do país exportador ou em inglês;
• Saque ou Letra Cambial (Draft) – emitida pelo exportador, é utilizado nos pagamentos a
prazo, quando o importador retira os documentos para desembaraçar as mercadorias
mediante aceite.
• Conhecimento de Embarque – é um documento de transporte internacional emitido pela
companhia responsável pelo transporte internacional; é escrito em inglês;
• Romaneio de Embarque (Packing List) – emitido pelo exportador que descreve todas as
características das mercadorias transportadas;
• Certificados Especiais – geralmente necessários ao comércio de produtos agrícolas,
médicos e perecíveis.
LEASING ���� é um contrato de arrendamento mercantil, cuja operação envolve 3 participantes: o
fabricante, o intermediário e o arrendatário. Desenvolve-se em 5 fases:
• 1 – preparatória – a proposta do arrendatário à empresa de leasing ou vice-versa;
• 2 – essencial – contituída pelo acordo de vontade entre as partes;
• 3 – complementar - a empresa de leasing compra o bem ou equipamento ajustado com
o arrendatário;
• 4 – arrendamento - a empresa de leasing entrega o bem ou equipamento ao
arrendatário;
• 5 – tríplice opção do usuário - ao fim do contrato de arrendamento, o arrendatário
poderá: continuar com o arrendamento; dá-lo por terminado, devolvendo-o; adquirí-
lo, compensando as parcelas pagas.
Leasing Financeiro ���� forma mais comum e o verdadeiro modelo básico de
leasing, pressupondo 3 participantes: o fabricante, o
arrendatário e o intermediário (empresa financeira
especializada neste tipo de operação)
Leasing Operacional ���� operação de arrendamento contratada diretamente com
o fabricante; utilizado para produtos de boa aceitação no
mercado e que tornam-se obsoletos em pouco tempo;
Lease Back ���� quase um leasing financeiro, distinguindo-se pelo fato que
é o próprio arrendatário que vende os bens e
equipamentos, mudando seu título jurídico em relação
a estes bens, passando de proprietário a arrendatário;
Dummy Corporation ���� sociedade entre os investidores e arrendatários, que
emitem debêntures, com as quais obtém numerário para
a aquisição de bens, os quais são dados em locação ao
arrendatário.
FACTORING ���� liga-se à necessidade de reposição do capital de giro nas empresas, geralmente
nas pequenas e médias.
• assemelha-se ao desconto bancário, repousando na sua substância, numa
mobilização de créditos de uma empresa.
• Conventional Factoiring – a empresa negocia seus créditos cedendo-os à
outra, que se incumbirá de cobrá-los, adiantando-lhe o valor desses créditos;
• Maturity Factoring – no caso da empresa que cede seus créditos e recebe o
valor pactuado somente no vencimento;
• Em qualquer caso a empresa que adquiriu os créditos é obrigada a pagá-
los mesmo em caso de inadimplemento do devedor da empresa cedente.
• Factor ���� é a empresa que se incumbe de cobrar os créditos; tem as
seguintes funções:
• Garantia – fica obrigada ao pagamento do crédito devido;
• Gestão de crédito – examina os créditos, providencia sua cobrança e
incumbe-se da contabilidade e do faturamento;
• Financiamento – quando adianta os recursos referentes aos créditos
cedidos;
TIPO DE
CONTRATO CRÉDITOS GARANTIA REMUNERAÇÃO
FACTORING Exclusivos Total Comissão
DESCONTO Não exclusivos Nenhuma Juros
SEGURO Não exclusivos Parcial (estipulada) Prêmio
FRANCHISING ���� atua no campo da distribuição e venda de bens e serviços. É a operação pela
qual um comerciante, titular de um marca, cede seu uso, num setor geográfico
definido, a outro comerciante. O beneficiário da operação (franquiado) assume
integralmente o financiamento de sua atividade e remunera o seu co-contratante
(franqueador) com uma porcentagem calculada sobre o volume dos negócios ou
mediante um valor fixo, pago de uma só vez ou em parcelas.
• repousa na cláusula de exclusividade, garantindo ao beneficiário, em relação
aos concorrentes, o monopólio da atividade
• atua mais como forma de dominação do mercado e inclusive dos
distribuidores, do que como simples técnica nova de venda.
• Características:
• A importância da marca;
• Caráter continuado da operação;
• Independência formal do beneficiário (preso à idéia de
transferência de know-how)
• Contrato bilateral, consensual, oneroso, indeterminado;
• Objeto: cessão do uso da marca;
• Exclusividade ou delimitação territorial
JOINT VENTURES ���� é um contrato que permite associação de capitais de 2 ou mais
empresas com o objetivo de colaboração e aproveitamento dos
recursos, conhecimentos tecnológicos e demais vantagens, tudo isto
sem a necessidade de estabelecimento formal de uma nova sociedade.
• geralmente, ocorre quando da necessidade de empresas que
isoladamente não teriam condições de empreender um grande projeto
e, com a união alcançada podem realizá-lo, sem perder a autonomia,
ou sujeitar-se a outra empresa do mesmo porte ou maior.
• É uma forma de empresas nacionais conseguirem, por meio de
alianças com empresas internacionais, participar do comércio exterior
em condições competitivas;
EXPORTAÇÃO DE SERVIÇOS � é a exportação de serviços em forma de projetos, licenças,
assessorias, know-how, etc. A prestação de assessorias e
consultorias internacionais são regidas e amparadas pelos
Contratos de Exportação de Serviços
CONTRATO DE REPRESENTAÇÃO ���� é o contrato pactuado entre a empresa
exportadora estrangeira e as pessoas físicas ou
jurídicas nos países importadores, que recebem a
denominação de representantes comerciais, que
INTERMEDIARÃO as operações mercantis
internacionais de compra e venda de produtos e
serviços.
• os representantes comerciais podem ser assalariados, recebendo uma
remuneração fixa, mais comissão pelas vendas ou trabalharem por
conta própria, que é o mais usual no país, percebendo somente
comissão sobre as vendas.
• podem assumir os seguintes procedimentos:
• Sole Agent – assumem as obrigações pelas vendas efetuadas;
• Del Credere – assumem as responsabilidades pelas vendas
efetuadas;
• Consignação – só pagarão a mercadoria importada após a
efetiva venda.
7. OS INCOTERMS – versões 1990 e 2000
���� são representados por meio de siglas (3 letras), tratando-se efetivamente de condições de venda,
pois definem os direitos e obrigações (responsabilidades) mínimas do exportador e do
importador quanto a fretes, seguros, movimentação em terminais, liberações em alfândegas e
obtenção de documentos de um contrato internacional de venda de mercadorias.
• refletem a redação sumária do costume internacional em matéria de comércio, com a finalidade
de simplificar e agilizar a elaboração das cláusulas dos contratos de compra e venda. A sua
adoção é FACULTATIVA , mas se adotada configura norma contratual e assume valor
jurídico.
• as atualizações sucessivas do INCOTERMS desde 1936, têm ocorrido por inicativa da CCI –
Câmara de Comércio Internacional
1. EXM – a partir do local de produção = a mercadoria é entregue ao comprador no
estabelecimento do vendedor
• é considerada uma venda no país de exportação.
2. FAZ – livre no costado do navio = o vendedor cumpre sua obrigação de entregar as
mercadorias no porto indicado para embarque
• só pode ser usada no transporte aquaviário (marítimo, fluvial ou lacustre)
3. FOB – Livre a Bordo = o vendedor cumpre sua obrigação de entrega quando as
mercadorias cruzam a amurada do navio, no porto de embarque
designado.
• Só pode ser aplicada para o transporte marítimo ou de cabotagem
4. FCA – transportador livre = o vendedor deve entregar a mercadoria para o transportador
indicado pelo comprador, no local determinado.
• o comprador arca com todas as despesas a partir deste ponto;
5. CFR – custo e frete = o vendedor deve pagar os custos e o frete necessário para levar as
mercadorias até o porto de destino designado, todavia o risco de perda ou
dano às mercadorias são transferidas do vendedor ao comprador no
momento em que a mercadoria é embarcada.
6. CIF – custo, seguro e frete = o vendedor tem obrigação de arcar com todas as despesas,
inclusive seguro marítimo e frete, até a chegada da
mercadoria ao porto de destino.
• os demais encargos correm por conta do vendedor
• a condição CIF não é permitida nas importações brasileiras, uma vez que o seguro de
transporte internacional de mercadorias importadas deve ser realizado através de
seguradoras estabelecidas no Brasil.
7. CPT – transporte pago até ... = é o pagamento do frete pelo transporte das mercadorias até
o destino designado pelo comprador.
• o risco por perda ou dano, bem como quaisquer despesas adicionais que ocorrerem
após as mercadorias serem entregues ao transportador, transferem-se do vendedor
para o comprador.
• Este tipo de transporte pode ser realizado por meio ferroviário, térreo, marítimo,
cabotagem ou por uma combinação destas modalidades, inclusive o multimodal.
• O termo CPT exige que o vendedor proceda ao desembaraço das mercadorias para
exportação.
8. CIP – transporte e seguros pagos até ... = é o pagamento do frete mais o seguro pelo
transporte das mercadorias até o destino
designado pelo comprador.
• é idêntico ao modo CPT, somente que neste modo o seguro também é pago pelo
vendedor;
9. DAF – entregue na fronteira = o vendedor deve entregar a mercadoria no ponto
combinado, mas antes da divisa aduaneira do país
limítrofe.
• a partir deste momento, todas as despesas correm por conta do comprador;
• pode ser aplicado para qualquer modalidade de transporte, embora o transporte
terrestre seja o mais utilizado;
10. DES – entregue a partir do Navio = o vendedor deve colocar a mercadoria à disposição
do comprador a bordo do navio, não
desembaraçada, no porto de destino designado.
• o vendedor é responsável por perdas e danos que porventura a mercadoria vier a
sofrer durante o transporte até o porto de destino
• o desembaraço para importação devem ser providenciados pelo comprador
• esta fórmula deve ser utilizada apenas para transporte marítimo ou de cabotagem;
11. DEQ – entregue a partir do cais = o vendedor deve entregar a mercadoria
desembaraçada ao comprador no cais do porto de
destino
• é de responsabilidade do vendedor todas as despesas (inclusive direitos aduaneiros)
bem assim como os riscos por perdas e danos até a entrega da mercadoria.
• Só utilizado para transporte marítimo ou de cabotagem
12. DDU – entregue direitos não pagos = o vendedor deverá colocar a mercadoria à
disposição do comprador, no ponto designado no
país de importação.
• o vendedor assume todas as despesas e riscos envolvidos até a entrega da
mercadoria.
• O comprador será responsável pelo pagamento de taxas e impostos aduaneiros e
demais encargos oficiais incidentes na importação e dos custos e riscos do
desembaraço
• Este termo pode ser utilizado em qualquer modalidade de transporte;
13. DDP – entregue direitos pagos = o vendedor deverá entregar a mercadoria no país
do comprador, assumindo todas as despesas e
obrigações, incluindo os tributos da operação, em
local designado pelo comprador.
• ao contrário do termo EXM, este termo é o que representa o máximo de obrigações
para o vendedor
• este termo pode ser utilizado em qualquer modalidade de transporte.
• O saldo da Balança comercial de um país expressa a contabilização de suas operações comerciais
em um dado período, e utilizam em seus cálculos OS VALORES FOB DAS EXPORTAÇÕES e
OS VALORES CIF DAS IMPORTAÇÕES
INCO
TERM
S
Responsabilidade do
Vendedor até ... Frete Seguro Desembaraço
Meio de
Transporte
EXM
Mercadoria a disposição
do Comprador junto ao
Vendedor, com todas as
custas p/ o Comprador
Todas as despesas ficam por conta do Comprador.
É considerada uma venda no país de exportação.
À escolha do
Comprador
FAZ
Mercadoria entregue no
porto de embarque
indicado pelo Comprador
Todas as despesas ficam por conta do Comprador. Somente
Aquaviário
FOB
Mercadoria tenha cruzado
a amurada do navio, no
porto de embarque
Fretes e Seguro ficam por conta
do Comprador
Por conta do
Vendedor
Transporte
Marítimo e de
Cabotagem
FCA
Mercadoria entregue na
transportadora indicada
pelo Comprador
Fretes e Seguro ficam por conta
do Comprador
Qualquer
modalidade de
transporte
CFR Mercadoria entregue no
porto de destino
Fretes e Seguro ficam por conta
do Vendedor, exceto custos por
danos e perdas
Por conta do
Vendedor
Transporte
Marítimo e de
Cabotagem
CIF Mercadoria entregue no
porto de destino
Todas as despesas (Frete,
Seguro, Impostos) correm por
conta do Vendedor
Somente
Aquaviário
CPT
Mercadoria com o frete
pago até o local designado
pelo Comprador
Todas as despesas são pagas
pelo vendedor até o momento
da entrega da mercadoria ao
Transportador
Por conta do
Vendedor
Ferrovia,
rodovia, mar,
cabotagem ou
combinação
CIP
Mercadoria com o frete e
o seguro pagos até o local
designado pelo
Comprador
Todas as despesas são pagas
pelo vendedor até o momento
da entrega da mercadoria
p/Transportador, mais o seguro
até o destino
Por conta do
Vendedor
Ferrovia,
rodovia, mar,
cabotagem ou
combinação
DAF
Mercadoria entregue antes
da divisa aduaneira, no
país limítrofe
Todas as despesas são pagas
pelo vendedor até o momento
da entrega da mercadoria na
fronteira.
Ferrovia,
rodovia, mar,
cabotagem ou
combinação
DES
Mercadoria colocada no
navio, no porto de
destino,
não desembaraçada
O vendedor é responsável pelas
despesas até o porto de destino
Por conta do
Comprador
Transporte
Marítimo e de
Cabotagem
INCO
TERM
S
Responsabilidade do
Vendedor até ... Frete Seguro Desembaraço
Meio de
Transporte
DEQ
Mercadoria colocada no
navio, no porto de
destino,
desembaraçada
Todas as despesas (Frete,
Seguro, Impostos) correm por
conta do Vendedor
Por conta do
Vendedor
Transporte
Marítimo e de
Cabotagem
DDU
Mercadoria colocada no
local designado pelo
Comprador, no país
importador
Todas as despesas (Frete,
Seguro, Impostos) correm por
conta do Vendedor
Por conta do
Comprador
Qualquer
modalidade de
transporte
DDP
Mercadoria entregue no
país do Comprador, com
todas as custas para o
Vendedor
Todas as despesas ficam por conta do Vendedor.
Qualquer
modalidade de
transporte
8. TRANSPORTE E SEGURO INTERNACIONAL
���� Criação de Sistema de Transporte Internacional – unificação ou unitização da carga, que é o
agrupamento de pequenos volumes de mercadorias, constituindo unidades maiores e padronizadas,
facilitando o transporte, desde o carregamento até a descarga no local de destino.
• As mercadorias podem ser transportadas nas seguintes modalidades:
MODAL ���� transportadas em um só veículo através de um único meio de
transporte, com apenas 1 contrato;
SEGMENTADO ���� transporte é feito utilizando-se vários veículos, em diferentes
modalidades de transporte; pode haver vários contratos.
SUCESSIVO ���� transporte efetuado por um ou mais veículos, mas dentro da mesma
modalidade de transporte; pode haver mais de 1 contrato;
INTERMODAL ���� transporte efetuado em 2 ou mais modalidades de transporte, mas com
SOMENTE 1 CONTRATO. Exige obrigatoriamente contratos
individuais para cada trecho do transporte e pagamento individualizado a
cada transportador dos diferentes modais..
Unidades de Carga �
Pallet ���� é um estrado sobre cuja superfície são agrupadas as mercadorias;
“Pré-linguada” ���� é uma rede especial destinada à unitização de mercadorias;
Flat-Container ���� é um estrado de aço que serve de apoio lateral p/ as mercadorias;
Container ���� é um recipiente construído de material resistente, que possibilita o
transporte sob condições técnicas e de segurança previstas pela legislação
nacional e internacional; muito usado nos transportes Intermodais.
TRANSPORTE MARÍTIMO ���� contratados por meio dos Contratos ou Apólices de Fretamento
(Charter-party), e o mais comumente usado é o Conhecimento
de Embarque (Bill of landing – BL)
Contratos de Fretamento p/ Transporte Marítimo:
• Fretamento com entrega do navio;
• Por tempo (Time Charter);
• Por viagem (Voyage Charter);
TRANSPORTE AÉREO ���� destina-se ao transporte de cargas leves e urgentes; o contrato é
formalizado no documento denominado Conhecimento Aéreo de
Transporte Aéreo (Airway bill of landing)
TRANSPORTE TERRESTRE ���� pode ser rodoviário ou ferroviário, podendo ser efetuados pelos
próprios exportadores ou por empresas especializadas.
SEGURO ���� de acordo com o estabelecido nos regulamentos aduaneiros, em caso de sinistro à
mercadoria transportada, a responsabilidade é imputada: ao TRANSPORTADOR,
durante o transporte e descarga; ao RESPONSÁVEL, pelo seu armazenamento.
9. IMPORTAÇÃO
REGISTRO DO IMPORTADOR ���� é condição básica para a realização de operações de
importação o registro no REI – Registro de Exportadores
e Importadores
• a pessoa física somente poderá importar mercadorias em quantidade que não
revele prática de comércio.
• Os importadores e exportadores serão inscritos automaticamente quando da 1ª
operação, sem o encaminhamento de quaisquer documentos, os quais poderão ser
solicitados, eventualmente, pelo DECEX, para verificação de rotina.
LICENÇA DE IMPORTAÇÃO ���� para se efetuar uma importação é necessário obter uma
licença administrativa, fornecida pela SECEX, através do
SISCOMEX; é requisito essencial para A
IMPORTAÇÃO que o registro da declaração de
importação seja efetivado;
• Todas as operações estão sujeitas a licenciamento
• Alguns tipos de mercadorias ficam sujeitas à manifestação de outros órgãos, tais como:
• animais vivos, carnes e miudezas comestíveis ficam sujeitas às exigências sanitárias
do Ministério da Agricultura;
• produtos farmacêuticos ficam sujeitos às exigências do Ministério da Saúde;
• armas e munições, suas partes e acessórios, ficam sujeitas à anuência prévia do
Ministério do Exército.
Licenciamento não automático ���� deverá ser providenciado anteriormente ao
embarque da mercadoria no exterior; sujeitam-se
ao licenciamento não automático, as importações
objeto de arrendamento operacional simples sob
regime de admissão temporária a serem utilizados
em atividade econômica,
IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO
SUJEITO PASSIVO ���� sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento
do tributo ou penalidade pecuniária:
Contribuinte – quando tenha relação pessoal e direta com a
situação que constitua o respectivo fato gerador;
Responsável - quando, sem revestir a condição de contribuinte,
sua obrigação decorra de expressa disposição de lei
São Contribuintes do Imposto de Importação:
- Importador - qualquer pessoa que promova a entrada de mercadoria estrangeira no território
nacional;
- Destinatário de remessa postal internacional - indicado pelo respectivo remetente;
- Adquirente de mercadoria entrepostada;
- Consignatário de mercadoria submetida ao entreposto aduaneiro – ao nacionalizar a
mercadoria e promover o despacho aduaneiro para consumo em seu nome
-
Entreposto Aduaneiro ���� é o regime aduaneiro especial que PERMITE, na importação e
exportação, o depósito de mercadorias, em local determinado,
com suspensão do pagamento de tributos e sob controle fiscal.
São Responsáveis pelo Imposto de Importação:
- Transportador - quando transportar mercadoria procedente do exterior ou sob controle aduaneiro,
inclusive em percurso interno;
- Depositário – qualquer pessoa incumbida da custódia de mercadorias de terceiros sob controle
aduaneiro nos armazéns de zona primária ou secundária.
• a responsabilidade pelos tributos apurados em relação a avaria ou extravio
de mercadorias será de quem lhe deu causa;
INCIDÊNCIA ���� o Imposto de Importação, de competência da União, incide sobre a importação
de produto estrangeiro; associa-se ao registro da Declaração de Importação.
• Incide também sobre mercadoria nacional ou nacionalizada exportada que
retornar ao pais, salvo se:
• Enviada em consignação e não vendida no prazo autorizado;
• Devolvida por motivo de defeito;
• Por modificações na sistemática do país importador;
• Por motivo de guerra ou calamidade pública;
• Incide também sobre a mercadoria desnacionalizada que vier a ser
importada e a mercadoria nacional ou nacionalizada que vier a ser
reimportada (quando descumpridas as condições do regime de exportação
temporária do qual tenha sido beneficiada)
NÃO INCIDÊNCIA ���� o IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO não incide sobre:
• mercadoria estrangeira que, corretamente declarada, chegue ao país
por erro manifesto ou comprovado de expedição e que for
redestinada ao exterior;
• mercadoria objeto de troca;
• mercadoria objeto da pena de perdimento;
• mercadoria estrangeira DEVOLVIDA AO EXTERIOR antes do
Registro da Declaração de Importação
FATO GERADOR ���� é a entrada de mercadoria estrangeira no território nacional.
• OCORRE na data do registro da declaração de importação de
mercadoria despachada para consumo, inclusive a:
• ingressada no país em regime suspensivo de tributação;
• contida em remessa postal internacional, quando é aplicado o
regime de importação comum;
• OCORRE no dia do lançamento respectivo, quando se tratar:
• mercadoria em remessa postal internacional;
• bens compreendidos no conceito de bagagem, acompanhadas
ou não;
• mercadoria constante de manifesto ou documento
equivalente, cuja falta ou avaria for apurada pela autoridade
aduaneira;
TAXA DE CÂMBIO P/ EFEITOS FISCAIS ���� para cálculo do Imposto de Importação é necessária
a conversão do valor da mercadoria expresso em
moeda estrangeira para moeda nacional, através da
taxa de câmbio vigente na data em que se
considera ocorrido o fato gerador.
"EX"- TARIFÁRIO: foi criado por Portaria Ministerial, servindo para dar des-
taque a certas mercadorias classificáveis em determinado
código tarifário da TEC. Tem o fim exclusivo de fazer
com que tais mercadorias deixem de sofrer a incidência da
alíquota normal do Imposto de Importação prevista na TEC
para elas. Após a criação do “EX”, as mercadorias classi-
ficáveis no correspondente código tarifário passam a so-
frer a incidência da alíquota reduzida, de acordo com o
estipulado na Portaria.
• Para fazer jus à alíquota mais benéfica do "EX", a mer-
cadoria importada deve se identificar totalmente com
aquela nele descrita.
TRATAMENTO TRIBUTÁRIO DECORRENTE DE ACORDOS INTERNA CIONAIS ����
prevalecerá o tratamento previsto nos acordos firmados pelo Brasil, salvo se da aplicação das normas
gerais resultar tributação mais favorável ao importador, ou seja, a aplicação da alíquota mais baixa
para favorecer o importador.
• a prova da origem da mercadoria, para efeito da aplicação de benefício fiscal decorrente
de acordos internacionais é feita, normalmente, através de Certificado de Origem.
BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO ���� é a quantidade total de mercadoria que está sendo
importada, de acordo com a unidade de medida
(metro, kilo, tonelada, etc) em que o produto está
relacionado na TEC;
• no caso da aplicação da alíquota AD-VALOREM , a base de cálculo será uma quantia em
dinheiro que expresse o valor real de importação do produto, ou seja, será o VALOR
ADUANEIRO das mercadorias, conforme definido no Acordo de Valoração
Aduaneira.
• para se configurar o fato gerador do imposto de importação e o momento de sua
ocorrência, para fins de cálculo do imposto, são condições cumulativas:
• a ENTRADA DA MERCADORIA ESTRANGEIRA NO
TERRITÓRIO ADUANEIRO e o REGISTRO NO SISCOMEX
DA DECLARAÇÃO DE IMPORTAÇÃO PARA CONSUMO .
GATT – Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio � é um acordo internacional do qual
o Brasil faz parte. É administrado pela OMC – Organização Mundial de Comércio.
• para se regulamentar o artigo VII do GATT foi assinado outro tratado
internacional – o Acordo de Valoração Aduaneira, que apresenta 6 métodos
sequenciais para se encontrar o valor aduaneiro. Os métodos devem ser
usados, obrigatoriamente, na ordem estipulada.
• Para se encontrar o VALOR ADUANEIRO :
1. pelo valor da transação;
2. pelo valor da transação da mercadoria importada idêntica à
mercadoria objeto do despacho;
3. pelo valor da transação da mercadoria importada similar à
mercadoria objeto do despacho;
4. pelo valor da revenda da mercadoria importada;
5. pelo valor computado, ou valor calculado da mercadoria
importada;
6. pelo valor obtido por meios razoáveis e compatíveis com o
acordo.
PAGAMENTO � o pagamento dos tributos federais devidos na importação de mercadorias, no ato
de registro, pelo SISCOMEX, da respectiva Declaração de Importação (DI), É
EFETUADO, EXCLUSIVAMENTE, por débito automático em conta bancária
em agência habilitada de banco integrante da rede arrecadadora de receitas
federais, por meio de DARF eletrônico.
IPI VINCULADO À IMPORTAÇÃO
INCIDÊNCIA ���� O IPI , imposto de competência da União, incide tanto sobre produtos
industrializados nacionais quanto sobre os produtos industrializados importados.
O contribuinte do IPI vinculado à importação é o importador.
FATO GERADOR ���� O fato gerador do IPI , na importação, é o desembaraço aduaneiro de
produto de procedência estrangeira.
• não constitui fato gerador desembaraço aduaneiro de mercadorias que retornem
ao País nas seguintes condições:
• enviada em consignação e não vendida no prazo autorizado;
• devolvida por defeito técnico, que exija sua devolução para reparo ou
substituição;
• por motivo de modificações na sistemática de importação por parte
do país importador;
• por motivo de guerra ou calamidade pública;
• por outros fatores alheios à vontade do exportador.
BASE DE CÁLCULO E Alíquotas ���� A base de cálculo é o valor por ocasião do
despacho de importação, somado ao montante
deste tributo e dos encargos cambiais efetivamente
pagos pelo importador ou dele exigíveis.
ISENÇÃO ���� A isenção do IPI na importação não segue necessariamente a isenção do imposto
de importação. Deve estar prevista em dispositivo próprio.
PAGAMENTO ���� é efetuado quando do registro da declaração de importação.
ISENÇÕES E REDUÇÕES ����
RECONHECIMENTO DE BENEFíCIO FISCAL ���� O importador, ao formular a DI, poderá
pleitear benefício fiscal citando a lei ou ato
internacional em que se fundamenta.
• A legislação aduaneira que dispuser sobre a outorga de isenção ou redução
do Imposto de Importação deve ser interpretada literalmente; A isenção
ou redução do imposto somente é reconhecida quando decorrente de lei ou
de ato internacional.
• No caso de mercadorias importadas por via marítima, o reconhecimento do
direito a beneficio está condicionado:
• ao transporte em navio de bandeira brasileira ou em navio
estrangeiro fretado por armador nacional;
• à dispensa de tal obrigatoriedade concedida pelo órgão competente do
Ministério dos Transportes, por meio de documento de liberação de
carga - waiver.
• Não estão sujeitas à esta obrigatoriedade:
• a importação de mercadorias em regime aduaneiro especial de
drawback;
• a importação de bens doados por pessoa física ou jurídica residente
ou sediada no exterior.
• Na hipótese de não ser concedido o benefício fiscal pretendido, será exigido o
crédito tributário correspondente
SIMILARIDADE ���� a isenção ou redução do Imposto de Importação só beneficia produto sem
similar nacional. O órgão competente para a apuração de similaridade é a
SECEX.
ISENÇÃO OU REDUÇÃO VINCULADA À QUALIDADE DO IMPORTA DOR ����
• Quando a isenção ou redução for vinculada à qualidade do importador, a transferência da
propriedade ou o uso dos bens obriga ao prévio pagamento do imposto.
• Esta isenção é concedida às:
• missões diplomáticas e repartições consulares de caráter permanente;
• representações de órgãos internacionais de caráter permanente, de que o Brasil seja
membro.
• Um exemplo de beneficio vinculado à qualidade do importador acontece quando
instituições científicas ou educacionais obtêm o direito de importar equipamentos
necessários ao cumprimento de suas finalidades.
ISENÇÃO OU REDUÇÃO VINCULADA A DESTINAÇÃO DOS BENS ����
• fica condicionada à comprovação posterior do seu efetivo emprego nas finalidades que
motivaram a concessão.
• É exemplo de beneficio vinculado à destinação dos bens, a importação de materiais de
reposição e conserto, com isenção, para uso em embarcações ou aeronaves estrangeiras.
BAGAGEM ���� objetos novos ou usados destinados ao uso ou consumo pessoal do viajante, de
acordo com as circunstâncias de sua viagem, ou os objetos de pequeno valor, a serem oferecidos como
presente.
• Incluem-se entre os bens de uso ou consumo pessoal aqueles destinados à atividade
profissional do viajante, bem como utilidades domésticas.
• Estão excluídos do conceito de bagagem:
• bens cuja quantidade, natureza ou variedade configure importação ou
exportação com fim comercial ou industrial;
• automóveis, motocicletas, motonetas, bicicletas com motor, casas rodantes e
demais veículos automotores terrestres;
• aeronaves;
• embarcações de todo o tipo, motos aquáticas e similares, e motores para
embarcações;
• cigarros e bebidas de fabricação brasileira, destinados a venda
exclusivamente no exterior;
• bebidas alcóolicas, fumo e seus sucedâneos manufaturados, quando se tratar
de viajante menor de dezoito anos;
• bens adquiridos pelo viajante em loja franca, por ocasião de sua chegada ao
País.
• bagagem acompanhada: a que o viajante portar consigo no mesmo meio de
transporte em que viaje, desde que não amparada por conhecimento de carga.
• bagagem desacompanhada: a que chegar ao País, ou dele sair, amparada por
conhecimento de carga ou documento equivalente.
NÃO-INCIDÊNCIA DE IMPOSTOS - Não incidirão impostos sobre os bens compreendidos no
conceito de bagagem:
• de origem nacional;
• de origem estrangeira:
a) comprovadamente saídos do País como bagagem, quando do seu
retorno, ainda que portados por terceiros, independentemente do
prazo de permanência no exterior e das razões de sua saída;
b) remetidos ao exterior, pelo viajante, para conserto, reparo ou
restauração, quando do seu retorno;
c) enviados ao País, em razão de garantia, para substituição de outro
anteriormente trazido pelo viajante.
ISENÇÃO DE CARÁTER GERAL - A isenção aplicável aos bens que constituam bagagem de
viajante procedente do exterior abrange o imposto de
importação e o imposto sobre produtos industrializados.
BAGAGEM ACOMPANHADA: A bagagem acompanhada está isenta relativamente a:
I. livros, folhetos e periódicos;
Il. roupas e outros artigos de vestuário, artigos de higiene e de toucador, e
calçados, para uso próprio do viajante;
III. outros bens, observado o limite de valor global de:
IV.
a) US$ 500.00, quando o viajante ingressar no País por via aérea ou
marítima;
b) US$ 150.00, quando o viajante ingressar no País por via terrestre,
fluvial ou lacustre.
• O direito à isenção geral é pessoal do viajante, de forma que, por ocasião do
despacho aduaneiro, é vedada a transferência, total ou parcial, da quota para outro
viajante, ainda que seja pessoa da mesma família.
• O direito à isenção a que se refere o item III somente poderá ser exercido uma vez a
cada trinta dias.
BAGAGEM DESACOMPANHADA: A bagagem desacompanhada está isenta de impostos
relativamente a:
I. livros, folhetos e periódicos;
II. se usados: roupas e outros artigos de vestuário, artigos de higiene e de touca
dor, e calçados, para uso próprio do viajante, em quantidade e qualidade
compatíveis com a duração e a finalidade da sua permanência no exterior.
ISENÇÃO DE CARÁTER ESPECIAL -
BRASILEIRO OU ESTRANGEIRO QUE RETORNA AO PAÍS EM CA RÁTER
PERMANENTE : O brasileiro e o estrangeiro, portador de Cédula de Identidade de Estrangeiro
expedida pelo Departamento de Polícia Federal, que tiverem permanecido no exterior por período
superior a um ano e retornarem em caráter definitivo, terão direito:
I. à isenção de caráter geral, em relação aos bens integrantes da bagagem
acompanhada;
II . à isenção de impostos para os seguintes bens, usados, trazidos como bagagem
desacompanhada:
a) roupas e outros artigos de vestuário, artigos de higiene e de toucador, e
calçados, para uso próprio do viajante;
b) móveis e outros bens de uso doméstico;
c) ferramentas, máquinas, aparelhos e instrumentos necessários ao
exercício de sua profissão, arte ou ofício;
d) obras por ele produzidas.
FUNCIONÁRIO INTEGRANTE DO SERVIÇO EXTERIOR BRASILEI RO E IMIGRANTE : A
isenção que é concedida a brasileiro ou a estrangeiro que retorna ao País em caráter permanente
também é aplicada a:
I. funcionário brasileiro de carreira integrante do Serviço Exterior Brasileiro ou o
assemelhado à carreira de diplomata, quando removido de ofício para o País;
Il. imigrante, que ingresse no País para nele residir.
DIPLOMATAS, SERVIDORES DE ORGANISMOS INTERNACIONAIS E TÉCNICOS
ESTRANGEIROS: Estão isentos de impostos os bens ingressados no País, inclusive automóveis,
pertencentes a estrangeiros:
I. integrantes de missões diplomáticas e representações consulares de caráter
permanente;
II. funcionários, peritos, técnicos e consultores de representações permanentes de
órgãos internacionais de que o Brasil seja membro, beneficiados com trata
mento aduaneiro idêntico ao outorgado ao corpo diplomático;
III. peritos e técnicos que ingressarem no País para desempenhar atividades em
decorrência de atos internacionais firmados pelo Brasil, nos termos neles
previstos.
• O funcionário consular honorário terá direito, apenas, à isenção de caráter geral para
os bens que trouxer do exterior.
TRIPULANTE: A bagagem de tripulante procedente do exterior está isenta de impostos
relativamente aos bens referidos nos subitens I e II do item "A" do tópico
"ISENÇÃO DE CARÁTER GERAL "
TRIPULANTE DE NAVIO : O tripulante de navio em viagem internacional, residente no País,
que desembarcar definitivamente ou estiver impedido de
prosseguir viagem por motivo devidamente justificado, terá direito
à isenção do item "A" do tópico "ISENÇÃO DE CARÁTER
GERAL" para os bens que trouxer como bagagem acompanhada.
BENS ADQUIRIDOS EM LOJA FRANCA: Os bens adquiridos em loja franca, até o valor de
US$ 500.00, GOZARÃO DE ISENÇÃO, desde que
respeitados os termos, limites e condições que serão
estudados no tópico "Regimes Aduaneiros
Atípicos", no Capitulo que trata dos "Regimes
Aduaneiros".
DESPACHO ADUANEIRO DE IMPORTAÇÃO ����
Conceito: é o procedimento administrativo fiscal mediante o qual se processa o desembaraço
aduaneiro de mercadoria procedente do exterior, seja ela importada a título definitivo
ou não.
• Toda mercadoria procedente do exterior por qualquer via, destinada a consumo ou a
outro regime, sujeita ou não ao pagamento do imposto, deverá ser submetida a despacho
aduaneiro.
PROCESSAMENTO DO DESPACHO - O despacho será processado no SISCOMEX com
base em declaração a ser formulada pelo importador
e apresentada à repartição sob cujo controle estiver
a mercadoria, na zona primária ou na zona
secundária.
INÍCIO DO DESPACHO - Tem-se por começado o despacho de importação na data do registro da
DECLARAÇÃO DE IMPORTAÇÃO . Este registro consiste na
NUMERAÇÃO da declaração, efetuada pelo SISCOMEX. Deverá
começar até 90 dias da descarga, se a mercadoria estiver em recinto
alfandegado de zona primária, ou até 45 dias após esgotar-se o prazo
estabelecido para permanência em recinto alfandegado de zona
secundária.
INTERRUPÇÃO DO DESPACHO - Quando exigível o depósito ou o pagamento de quaisquer
ônus financeiros ou cambiais ou o cumprimento de
obrigações semelhantes, a tramitação do despacho ficará
sujeita à prévia satisfação da exigência.
• Caso o despacho venha a ser interrompido, por ação ou omissão do importador, por
prazo superior a 60 dias, a mercadoria SERÁ CONSIDERADA ABANDONADA e
sofrerá PROCESSO DE PERDIMENTO.
DISPENSA DE DESPACHO - Fica dispensada de despacho de importação a entrada, no País, de
mala diplomática.
DOCUMENTO BASE DO DESPACHO - o documento base do despacho de importação é a
Declaração de Importação.
OUTROS DOCUMENTOS DO DESPACHO
���� instrui o despacho aduaneiro de importação, além da Declaração de Importação
registrada no SISCOMEX, os seguintes documentos:
• conhecimento de carga original;
• a fatura comercial;
• o certificado de origem, quando se tratar de mercadoria que goze de tratamento
favorecido em razão da origem;
• a guia de importação.
• Em regra a declaração é formulada pelo importador no SISCOMEX. Não é permitido
agrupar, numa mesma declaração, mercadoria que proceda diretamente do exterior e
mercadoria que se encontre no País em regime aduaneiro especial ou atípico.
REGISTRO DA DECLARAÇÃO - A declaração é registrada pelo SISCOMEX, por solicitação
do importador. A numeração automática efetuada pelo
sistema é única, seqüencial e nacional, sendo reiniciada a
cada ano.
RECOLHIMENTO DO IMPOSTO - é efetuado EXCLUSIVAMENTE POR débito automático
em conta corrente do importador, em estabelecimento
bancário habilitado, por meio de DARF eletrônico.
EXTRATO DA DECLARAÇÃO - Efetivado o registro da declaração, o Sistema emitirá, a
pedido do importador, o extrato correspondente, em duas
vias.
RETIFICAÇÃO DA DECLARAÇÃO - a retificação de informações prestadas na declaração, ou a
inclusão de outras, será feita em declaração complementar
INSTRUÇÃO DO DESPACHO DE IMPORTAÇÃO – A declaração deve ser instruída com
os seguintes documentos:
CONHECIMENTO DE CARGA - O despacho de importação será instruído com o
CONHECIMENTO DE CARGA ORIGINAL ou
documento equivalente, como prova de posse ou
propriedade da mercadoria.
• a cada conhecimento de carga deverá corresponder um único despacho;
Carta Declaratória: O conhecimento de transporte é documento que exterioriza o contrato de
transporte. É, também, um título de crédito que faz prova de posse ou
propriedade da mercadoria.
• Ocorrendo situação em que determinada mercadoria venha a ser encontrada ao desamparo
de conhecimento de carga, a prova de sua propriedade será feita com a apresentação de carta
declaratória emitida pela empresa que efetuou seu transporte.
MANIFESTO DE CARGA
• a omissão de volume em manifesto de carga, desde que tal volume conste no
conhecimento emitido regularmente, PODERÁ SER SUPRIDA se apresentada a
mercadoria sob declaração escrita do responsável pelo veículo e anteriormente ao
conhecimento da irregularidade pela autoridade aduaneira.
• a não apresentação de manifesto de carga ou de documento equivalente em relação a
qualquer ponto de escala no exterior será considerada DECLARAÇÃO NEGATIVA DE
CARGA, sujeitando-se o responsável pelo veículo aos efeitos daí decorrentes.
• Quando houver divergência, para menos, de peso ou de dimensão do volume em relação
ao declarado no manifesto de carga ou documento equivalente, ou ainda, se for o caso,
aos documentos que instruíram o despacho para trânsito, o TRANSPORTADOR é o
RESPONSÁVEL para efeitos fiscais.
• Se a autoridade aduaneira do local de descarga do veículo transportador constatar
divergência entre os dados constantes do manifesto de carga e os do CONHECIMENTO
CORRESPONDENTE, este terá prevalência, podendo a correção do manifesto ser feita
de ofício.
FATURA COMERCIAL: O despacho de importação será instruído também com FATURA
COMERCIAL, assinada pelo exportador, e que conterá TODOS os
dados referentes à operação. Tem força contratual e possui valor para
fins de tributação.
• Simples enganos ou omissões na emissão da fatura comercial, corrigidos ou corretamente
supridos na Declaração de Importação, não acarretarão a aplicação de penalidades.
• O conhecimento aéreo poderá EQUIPARAR-SE à fatura comercial, se contiver as
indicações de quantidade, espécie e valor das mercadorias que Ihe correspondam;
GUIA DE IMPORTAÇÃO - O importador deverá apresentar, por ocasião do despacho, a Guia
de Importação ou documento equivalente, emitido pelo órgão
competente, quando exigível na forma da legislação em vigor.
• A guia de importação, concedida diretamente no SISCOMEX, é a licença administrativa
para se importar determinada mercadoria.
CERTIFICADO DE ORIGEM - Além do extrato da declaração e dos documentos normalmente
instrutivos do despacho de importação, outros podem ser exigidos
em decorrência das condições da operação de importação ou da
natureza da mercadoria, tendo em vista negociações em acordo
internacionais ou em legislação específica. Merecem destaque
especial:
• o Certificado de Origem;
• O comprovante de pagamento ou de exoneração do ICMS;
Certificado de Origem: É o documento que comprova a origem da mercadoria. Em geral, é
exigido para comprovar que determinada mercadoria é originária de país
com o qual o Brasil celebrou acordo internacional concedendo benefícios
fiscais mútuos.
Comprovante de pagamento
ou de exoneração do ICMS - o fato gerador do ICMS, na importação, considera-se ocorrido no
momento do desembaraço aduaneiro da mercadoria.
CONFERÊNCIA ADUANEIRA - A conferência aduaneira tem por finalidade identificar o
importador, verificar a mercadoria, determinar seu valor e
classificação, e constatar o cumprimento de todas as
obrigações, fiscais e outras, exigíveis em razão da
IMPORTAÇÃO .
• A conferência aduaneira PODERÁ ser realizada na zona primária ou na zona
secundária. Deverá ser feita na presença do importador ou seu representante.
DESEMBARAÇO ADUANEIRO - Concluída a conferência sem exigência fiscal ou outra
dar-se-á o desembaraço aduaneiro da mercadoria.
• Desembaraço aduaneiro é o ato final do despacho aduaneiro em virtude do qual é
autorizada a entrega da mercadoria ao importador.
• Não será desembaraçada a mercadoria sujeita a controles especiais, antes de
cumpridas as exigências pertinentes.
ENTREGA DA MERCADORIA - a mercadoria importada somente pode ser entregue ao
importador após o desembaraço aduaneiro. Contudo, de acordo
com a natureza da mercadoria, da operação de importação, e da
via de transporte utilizada pode a entrega ser autorizada
anteriormente ao desembaraço, destacando-se os casos de
entrega antecipada e de entrega fracionada.
DESPACHO ANTECIPADO - o despacho aduaneiro é iniciado após a chegada da mercadoria
à repartição aduaneira onde será processado. Entretanto, de
acordo com a natureza da mercadoria, a qualidade do importador
ou a via de transporte utilizada, é permitido o registro da
declaração de importação antes da chegada da mercadoria.
ENTREGA ANTECIPADA - é a entrega da mercadoria ao importador antes de totalmente
realizada a conferência aduaneira, em situações de comprovada
impossibilidade de sua armazenagem em local alfandegado ou,
ainda, em outras situações justificadas, em vista da natureza da
mercadoria ou de circunstâncias específicas da operação de
importação.
• Ex.: na importação de produtos químicos ou material explosivo, por questões de
segurança da repartição aduaneira, pode ser autorizada a entrega antecipada dos
produtos.
ENTREGA FRACIONADA - No caso de partida que constitua uma só importação e que não
possa ser transportada num único veículo, será permitido o seu
fracionamento em lotes, devendo cada veículo apresentar seu
próprio manifesto, e o conhecimento de carga do total da
partida.
DESPACHOS SEM REGISTRO NO SISCOMEX - Assim, como exemplos, o despacho aduaneiro
de importação é processado sem registro no SISCOMEX em caso de:
• amostras sem valor comercial, importações sem cobertura cambial, bens de missões
diplomáticas e semelhantes, bagagem desacompanhada, doações a instituições de
assistência social, catálogos, folhetos, manuais e semelhantes;
• remessas expressas;
• remessas postais internacionais;
• medicamentos importados por pessoa física;
• bens para admissão no regime aduaneiro atípico de depósito afiançado - DAF;
• urna funerária contendo o corpo de pessoa falecida no exterior.
COMPROVANTE DE IMPORTAÇÃO - Após o registro do desembaraço aduaneiro no Sistema, será
emitido o comprovante de importação em via única, a ser
entregue ao importador.
• O comprovante de importação não substitui a documentação fiscal exigida nos
termos da legislação específica para efeito de circulação da mercadoria no território
nacional.
REVISÃO ADUANEIRA - é o ato pelo qual a autoridade fiscal, após o desembaraço da
mercadoria, reexamina o despacho aduaneiro, com finalidade de
apurar a regularidade do pagamento do imposto e demais gravames
devidos à Fazenda Nacional ou do benefício fiscal aplicado e da exatidão
das informações prestadas pelo importador.
MERCADORIA ABANDONADA - As mercadorias e bens que ficam na zona primária ou em
recintos alfandegados por prazo acima do permitido na
legislação aduaneira (90 dias), assim como as mercadorias
provenientes de naufrágio ou outros acidentes cujos
interessados não foram localizados, são considerados
abandonados.
• A mercadoria ou bem abandonado sofre processo de perdimento e, após a
aplicação da pena de perdimento, tem uma das destinações previstas na legislação,
como a incorporação à Administração Pública ou a venda em leilão.
VISTORIA ADUANEIRA ���� A vistoria aduaneira destina-se a verificar ocorrência de avaria
ou falta de mercadoria estrangeira entrada no território aduaneiro,
a identificar o responsável e apurar o crédito tributário dele
exigível.
• a vistoria aduaneira não será realizada após a entrega da mercadoria ao
importador , sob hipótese alguma
• assistirão à vistoria, necessariamente, o DEPOSITÁRIO, o IMPORTADOR e o
TRANSPORTADOR; facultativamente, o SEGURADOR ou qualquer pessoa
que comprove legítimo interesse.
10. REGRAS DE ORIGEM
���� Geralmente os países realizam acordos concedendo benefícios recíprocos em suas trocas
comerciais, estabelecendo, usualmente, a concessão de margens de preferência tarifária. Estas
são aplicadas sobre a alíquota normal do imposto de importação fixada nas respectivas tarifas.
���� No MERCOSUL foi adotado o Certificado de Origem (que é exigido em todas as operações
comerciais realizadas no MERCOSUL ), que tem a finalidade de comprovar a origem de
mercadoria constante de acordos comerciais estabelecidos entre os Estados-Parte. Assim, é
indispensável a apresentação do certificado de origem em importação de mercadoria objeto de
acordo comercial, para gozo do benefício acordado.
Regime de Origem do MERCOSUL - é o instrumento que estabelece as regras para a
determinação da nacionalidade dos produtos
intercambiados nas operações intra-zona.
Requisitos Específicos de Origem - Os Estados-Partes poderão estabelecer, de comum acordo,
requisitos específicos de origem, que prevalecerão sobre os
critérios gerais de qualificação.
11. VALOR ADUANEIRO
���� a primeira tarefa para calcular o Imposto de Importação incidente sobre uma mercadoria
consiste em determinar a sua classificação fiscal na Tarifa Externa Comum – TEC - do Mercosul,
através da observância das regras gerais de interpretação e classificação. Obtida a classificação correta,
verifica-se a alíquota aplicável ao item tarifário. A segunda tarefa diz respeito à apuração da base de
cálculo do imposto. Sobre a base de cálculo apurada aplica-se a alíquota prevista, resultando no
quantum de imposto devido.
• Na atualidade, a maioria dos países adota alíquotas ad valorem e daí decorre a necessidade de
se determinar corretamente o valor dos bens importados. Se o valor desses bens não for
adequadamente apurado, o direito aduaneiro a ele aplicado não desempenhará com eficiência a
função tarifária a que se propõe.
• O tributo poderá não ser arrecadado no seu montante correto e a proteção alfandegária
estabelecida poderá ser frustrada.
• O Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio - GATT , celebrado em 1947,
estabeleceu, em seu artigo VII, princípios orientadores da apuração do valor aduaneiro: as
regras deveriam ser equânimes, não discriminatórias e consistentes com as práticas comerciais..
O ACORDO DE VALORAÇÃO ADUANEIRA – AVA / GATT
���� Para os países desenvolvidos, o AVA/GATT entrou em vigor em 1981. No Brasil, em função da
carência prevista, começou a vigorar somente no dia 23 de julho de 1986, quando foi promulga do
pelo Decreto n" 92.930
���� De acordo com as normas do Acordo, o valor aduaneiro deve ser determinado pela aplicação de
um dos seguintes métodos:
Primeiro método: Valor de Transação da mercadoria importada;
Segundo método: Valor de Transação da mercadoria importada idêntica à mercadoria objeto do
despacho;
Terceiro método: Valor de Transação da mercadoria importada similar à mercadoria objeto do
despacho.
Quarto método: Valor de revenda da mercadoria importada
Quinto método: Valor computado da mercadoria importada
Sexto método: Valor baseado em critérios razoáveis, condizentes com os princípios e
disposições gerais do GATT, e em dados disponíveis no País
• Os métodos devem ser obrigatoriamente aplicados na ordem exposta,
utilizando-se o segundo método somente quando o valor aduaneiro não
puder ser determinado pelo primeiro, e assim sucessivamente.
• Para a aplicação de cada método, em regra, há condições e requisitos que se
não satisfeitos, impedem a utilização desse método.
• O AVA / GATT, em regra, deve ser aplicado a todas as importações
brasileiras, efetuadas a qualquer título.
12. PREÇO DE TRANSFERÊNCIA
���� Para fins tributários, Preço de Transferência é a prática de transferir resultados para o
exterior, mediante a manipulação dos preços pactuados nas importações ou exportações de bens,
serviços ou direitos, em operações com pessoas vinculadas, residentes ou domiciliadas no exterior ou
residentes em países de tributação favorecida, quer sejam vinculadas ou não.
PRINCÍPIO DO PREÇO SEM INTERFERÊNCIA ���� "Transfer Pricing" - Este princípio
significa que o ajuste no preço de uma transação só deveria ser efetuado em nível de lucro, com o
objetivo de assegurar que os preços das vendas de bens, serviços e direitos, em transações
internacionais realizadas entre empresas relacionadas sejam, para efeitos fiscais, equivalentes aos que
seriam praticados entre empresas independentes.
MÉTODOS RECOMENDADOS PELA OCDE ���� O primeiro país a disciplinar a matéria foi os
Estados Unidos, em 1928. Depois foi a Bélgica, em 1948. Nessas oportunidades não houve muito
interesse por parte dos outros países. Organismos internacionais como a ONU e a OCDE contribuíram
para que aumentasse a atenção dispensada ao tema.
Preços Independentes Comparados ���� Compara o preço de bens, serviços ou direitos
transferidos em uma transação controlada com o
preço cobrado em uma transação independente
comparável em circunstâncias semelhantes. E a
forma mais direta e confiável para se aplicar o
princípio do preço sem interferência.
Preço de Revenda ���� Compara o preço pelo qual um bem, que foi adquirido de uma empresa
vinculada, é revendido a uma empresa independente.
Método do Custo + Margem de Lucro ���� Com base nos custos incorridos pelo fornecedor da
propriedade do bem ou do serviço em uma
transação controlada, aos quais se soma uma
margem apropriada de lucro.
• A dificuldade de aplicação desse método consiste em aferir os custos diretos e
indiretos imputados pelas diferentes empresas, setores e países, de forma a ajusta e
tratar estas inconsistências contábeis.
A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA ����
���� Foram estipulados métodos específicos para as operações de importação, operações de
exportação e para operações financeiras.
MÉTODOS PARA OPERAÇÕES DE IMPORTAÇÃO
Preços Independentes Comparados – PIC ���� Definido como a média aritmética dos preços de
bens, serviços e direitos, idênticos ou similares, apurado no mercado brasileiro, ou de outros países, em
operações de compra e venda, em condições de pagamento semelhantes.
Preço de Revenda menos Lucro - PRL ���� Definido como a média aritmética preços de
revenda dos bens, serviços ou direitos, diminuídos:
• descontos incondicionais concedidos;
• dos impostos e contribuintes sobre vendas;
• das comissões e corretagens pagas;
• de margem de lucro.
Custo de Produção mais Lucro – CPL ���� Definido como o custo médio de produção de bens,
serviços ou direitos, idênticos ou similares, no país
onde tiverem sido originalmente produzidos,
acrescidos dos impostos e taxas cobrados pelo
referido país, na exportação, e de margem de lucro
de 20%, calculada sobre o custo apurado.
MÉTODOS PARA OPERAÇÕES DE EXPORTAÇÃO
Preço de Venda nas Exportações – PVEX ���� Definido como a média aritmética dos
preços de venda nas exportações efetuadas
pela própria empresa, para outros clientes ou
por outra exportadora nacional de bens,
serviços ou direitos, idênticos ou
semelhantes, durante o mesmo período de
apuração do IR e em condições de
pagamento semelhantes.
Preço de Venda por Atacado no
País de Destino menos Lucro – PVA ���� Definido como a média aritmética do preço de
venda dos bens, idênticos ou similares, praticados
no mercado atacadista do país de destino, em
condições de pagamento semelhantes, diminuídos
dos tributos incluídos no preço, cobrados no
referido país, e de margem de lucro de 15% sobre o
preço de venda no atacado.
Preço de Venda a Varejo no
País de Destino menos o Lucro – PVV ���� Definido como a média aritmética dos preços de
venda de bens, idênticos ou semelhantes, praticados
no mercado varejista do país de destino, em
condições de pagamento semelhante, diminuídos
dos tributos incluídos no preço, cobrados no
referido país, de margem de lucro de 30% sobre o
preço de venda no varejo.
Custo de Aquisição ou de Produção
mais Tributos menos Lucro – CAP ���� Média aritmética dos custos de aquisição ou de produção
dos bens, serviços ou direitos exportados, acrescidos dos
impostos e contribuições cobrados no Brasil e da margem
de lucro de 15% sobre a soma dos custos mais impostos e
contribuições.
MÉTODOS PARA OPERAÇÕES FINANCEIRAS
Juros Passivos ���� Dedutibilidade limitada ao montante que não exceda ao valor calculado com base
na taxa Libor para depósitos em dólares pelo prazo de seis meses, acrescida de 3
% anuais a título de spread.
Juros Ativos ���� Reconhecer como receita financeira, correspondente à operação, no mínimo o
valor apurado com base na taxa Libor, para depósitos em dólares pelo prazo de
seis meses acrescida de três por cento anuais a título de spread.
13. PAGAMENTOS INTERNACIONAIS
A INTERVENÇÃO BANCÁRIA NO MECANISMO DE PAGAMENTO
���� No mercado interno não há problemas quanto aos pagamentos, pois a própria legislação proíbe
que alguém se recuse receber a moeda nacional, além de proibir o uso de moedas estrangeiras
nas operações internas.
���� Todavia, quanto às operações de comércio internacional faz-se necessário o pagamento das
transações comerciais na moeda do país exportador. Os pagamentos feitos em moedas diferentes
dão origem ao procedimento de câmbio, ou seja, a troca de moedas de diversos países. Para que
esta troca se realize é necessário estabelecer uma relação de equivalência, o preço de uma moeda
em termos de outra, o que se denomina taxa cambial.
���� Os bancos mantêm contas de depósitos entre eles, para possibilitar as operações cambiais, quais
sejam:
Nostro Account: "nossas contas junto a outros bancos", ou seja, o banco mantém depósitos em
diferentes moedas junto a outros bancos no exterior, com a finalidade de atender
os pagamentos de diferentes moedas estrangeiras por parte de seus clientes.
Vostro Account: “contas que os bancos correspondentes mantêm junto a nós". Assim, os
bancos estrangeiros manterão contas em moeda nacional e outras moedas
estrangeiras junto aos bancos nacionais, com o mesmo objetivo de atender os
seus clientes quando no Brasil.
Loro Account: conta de um terceiro banco, com o qual os outros dois bancos estejam envolvidos
em alguma transação, podendo ser em moeda nacional ou estrangeira.
• Desse modo, é possível efetuar pagamentos internacionais sem a
movimentação física de dinheiro.
Modalidades de transferência de valores em moeda para o exterior são:
Cheques: são utilizados geralmente para pequenos valores, em virtude do risco de falsificações.
São nominativos e emitidos em moeda conversível (dólar, libras, etc), podendo ser
sacados nos bancos em qualquer país.
Traveller's Checks: assemelham-se aos cheques comuns, mas são feitos em papel especial e
com algumas características próprias com a finalidade de dificultar as
falsificações. São emitidos em valores pré-determinados, geralmente em
dólares americanos, possuindo uma grande aceitação no exterior. São
assinados pelo possuidor quando de sua emissão no país de origem e
quando de seu desconto o portador deve assiná-lo, o que aumenta sua
segurança e por conseguinte sua aceitação.
Ordem de pagamento: (via aérea, telex ou swift): são ordens de pagamento remetidas aos bancos
do exterior da praça do beneficiário. O remetente optará, em função da
relação custo/benefício, pelo meio de transmissão: por via aérea, via telex
ou pela rede Swift (Society for Worldwide Interbank Financial
Telecommunication) que é um serviço de comunicações de dados voltado
especialmente para o setor bancário.
Vale Postal Internacional: serviço de remessa de valores ao exterior prestado pelos correios,
destinado às remessas de pequeno valor, em virtude do custo e do
prazo de remessa.
RISCOS E MODALIDADES DE PAGAMENTOS
���� As operações de comércio exterior apresentam riscos para os exportadores. A modalidade
cobrança não oferece garantia ao exportador, mas são adotadas cautelas, como por exemplo, no
caso da
modalidade de cobrança à vista - os documentos que permitirão a retirada da mercadoria só
serão entregues ao importador após o pagamento da operação. Mesmo assim, em caso de recusa
de pagamento pelo importador, o exportador terá de arcar com prejuízos referentes ao transporte
da mercadoria ou então conceder vantagens ao importador, que muitas vezes age com este intuito.
modalidade de cobrança a prazo - o risco é maior, pois o exportador já terá entregue a
mercadoria ao importador e, em caso de inadimplemento, só restará o uso de medidas legais
(protesto, ação de cobrança) que, pela distância, torna-se impraticável.
As modalidades de pagamento utilizadas no comércio internacional são:
PAGAMENTO ANTECIPADO: Nesta modalidade de pagamento o risco fica para o importador,
que deve remeter o valor da transação, pois somente após o
exportador ter recebido o valor remeterá a mercadoria e a
documentação. Esta modalidade de pagamento também é
conhecida por REMESSA ANTECIPADA.
REMESSA SEM SAQUE: São as importações realizadas em que o importador recebe os
documentos diretamente do exportador e promove o
desembaraço aduaneiro das mercadorias, remetendo o valor após
o desembaraço. É uma modalidade que oferece riscos para o
exportador, que fica sem garantias do recebimento da quantia.
Apesar disto. oferece vantagens em custos, pois as taxas
operacionais são consideravelmente menores do que as cobradas
nas outras modalidades.
COBRANÇA À VISTA: São operações realizadas por meio dos bancos. O exportador (cedente)
entrega ao banco remetente os documentos de embarque e um saque
contra o importador (sacado). O banco remetente enviará os documentos
para cobrança na praça do sacado, por intermédio de uma banco
correspondente (cobrador) Após o pagamento, o banco correspondente
transfere o valor em moeda estrangeira para que o banco remetente efetue
o pagamento ao exportador e entrega a documentação ao importador para
que promova o desembaraço aduaneiro das mercadorias.
COBRANÇA A PRAZO: Trata-se de uma operação realizada nos moldes da cobrança à vista, mas
com vencimento futuro. Assim, o importador receberá os documentos de
desembaraço do banco correspondente (cobrador), mediante aceite, sem
ter efetuado o pagamento. Neste caso, o exportador estará financiando o
importador, correndo os riscos advindos do negócio.
RED CLAUSE: A Red Clause (cláusula vermelha), assim chamada por geralmente vir
grifada em vermelho, é uma cláusula muito utilizada no comércio
exterior, que permite que o exportador receba antecipadamente o
valor de seu crédito, total ou parcial.
• é instituída quando o exportador necessitar de recursos para produzir o bem a ser
entregue, pois só acertará as contas do adiantamento recebido quando entregar os
documentos de embarque ao Banco. Assim como o pagamento antecipado, os riscos
são por conta do importador, que só deve aceitar tal cláusula se confiar no vendedor.
CRÉDITO DOCUMENTÁRIO: Este tipo de modalidade de pagamento internacional é a mais
utilizada e a que oferece maiores garantias, tanto ao exportador
quanto ao importador.
• Ex.: um banco (banco emitente), atendendo seu cliente importador emite um
documento, comprometendo-se a efetuar um pagamento ao exportador, contra
entrega de determinados documentos, desde que os termos e condições de crédito
sejam cumpridos.
• O procedimento para a emissão do crédito documentário envolve as seguintes fases:
abertura, utilização e liquidação.
Alguns tipos de Crédito Documentário (cartas de crédito) especiais, expostos a seguir:
Carta de Crédito Rotativa: utilizada para aquisições continuadas de mercadorias entre os mesmos
importadores e exportadores. Há a emissão de apenas uma carta de crédito para diversas aquisições
durante um período definido, com abertura de crédito rotativo.
Créditos Back-to-Back: operação envolvendo um importador que adquire mercadorias do exportador,
que por sua vez, adquire a mercadoria de um outro produtor oferecendo em garantia a carta de crédito
recebida.
Carta de Crédito de Viajante: carta de crédito remetidos por um banco a seus correspondentes no
exterior para que façam o pagamento uma pessoa em trânsito.
Bid Letter of Credit: é um documento (também chamado bid bond) dado em caução para
participação em concorrências internacionais, como garantia em caso de desistência de cumprimento
de contrato firmado como vencedor da concorrência.
Perfomance Letter of Credit: é um documento (também chamado perfomance bond) dado em
garantia para o cumprimento do contrato assinado em caso de concorrências internacionais.
Refundment Letter of Credit: é um documento (também chamado refundment bond) dado em
garantia pelo exportador em caso de pagamento de uma parcela antecipada pelo importador, como
garantia em caso de descumprimento do contrato de entrega da mercadoria.
Standy by Letter of Credit: é um documento destinado a garantir operações de importadores norte-
americanos, pois os bancos dos EUA não podem, por determinação legal, conceder cartas de garantia.
Em caso de não pagamento, o exportador emitirá uma letra de câmbio contra o banco garantidor.
���� Em resumo, é o contrato pelo qual um banco assume o compromisso, em nome do
importador, de EFETUAR O PAGAMENTO, mediante entrega dos documentos de
embarque da mercadoria.
14. CONTENCIOSO ADUANEIRO
���� O contencioso Aduaneiro tem por objeto a resolução de um conflito de interesses submetido
ao julgamento de um órgão atuando com função jurisdicional, tendo por um lado o Estado, credor de
uma obrigação tributário-aduaneira, cujo crédito e sanção são por ele reclamados e por outro lado, o
suposto infrator, o contribuinte ou o demandado, que procura a prestação de uma justiça e a defesa
de seus direitos fundamentais
O Contencioso Aduaneiro no Brasil ���� a problemática do contencioso aduaneiro brasileiro
é dividida em dois seguimentos:
• um em que se aplica o rito processual geral, comum a todos os tributos de competência
da União; e
• o outro, ao qual se aplicam ritos especiais, diferenciados portanto daquele preconizado
pelo Decreto regulamentador;
Processo de Determinação e Exigência de Créditos Tributários ���� A determinação e exigência de
créditos tributários decorrentes de infrações às normas aduanelras são apuradas mediante Processo
administrativo fiscal. Os créditos tributários podem ser constituídos em virtude de:
• Infrações apuradas no decorrer do despacho aduaneiro de mercadorias;
• Infrações apuradas em revisão do despacho aduaneiro procedida dentro do prazo
decadencial de 5 anos a partir do registro da declaração de importação.
PROCESSOS ESPECIAIS
PROCESSO DE PERDIMENTO DE MERCADORIAS:
Perdimento do veículo ���� quando o veículo transportador estiver em situação irregular,
quanto às normas que o habilitem a exercer a navegação ou o
transporte internacional correspondente à sua espécie; ou quando
o veículo conduzir mercadoria sujeita à pena de perdimento,
se pertencente ao responsável por infração punível com
aquela sanção.
Perdimento da mercadoria���� se a mercadoria encontrar-se de alguma das maneiras abaixo, será
passível de perdimento.
• oculta, a bordo do veículo ou na zona primária, qualquer que seja o processo utilizado;
• existente a bordo do veículo, sem registro no manifesto, em documento equivalente ou
em outras declarações;
• estrangeira, encontrada ao abandono, desacompanhada de prova do pagamento dos
tributos aduaneiros;
• estrangeira, exposta à venda, depositada ou em circulação comercial no Pais, se não
feita a prova de sua importação regular;
• estrangeira, acondicionada sob fundo falso, ou de qualquer modo oculta.
• Verificada a ocorrência de fatos que configurem dano ao erário, tal como definido na
legislação, seja em ato de fiscalização externa ou interna, deve ser lavrado Auto de
Infração.
DESTINAÇÃO DOS BENS: Sendo desfavorável ao sujeito passivo a decisão, as mercadorias
tem a destinação prevista na legislação e são as seguintes:
a) por alienação, sendo o produto recolhido aos cofres públicos como receita
da União:
b) por incorporação ao patrimônio;
c) inutilização:
PROCESSO DE VISTORIA ADUANEIRA : A determinação e exigência do crédito tributário
decorrente de vistoria aduaneira será formalizado
em notificação de lançamento, instruída pelo termo
de vistoria.
• A vistoria aduaneira é o procedimento fiscal que objetiva a verificação da
ocorrência de avarias ou falta de mercadoria estrangeira entrada no território
aduaneiro, identificar o responsável e apurar o crédito tributário.
EXECUÇÃO DE TERMOS DE RESPONSABILIDADE: O termo de responsabilidade é um titulo
representativo de direito liquido e certo em favor da Fazenda Nacional, cujo inadimplemento acarreta
ao devedor a imediata cobrança administrativa. O não atendimento à intimação para satisfazer a
obrigação espontaneamente implicará a sua remessa a Procuradoria da Fazenda Nacional para cobrança
judicial.
15. IMPOSTO SOBRE IMPORTAÇÃO/EXPORTAÇÃO DE BENS VIRTUAIS
• Este tema é abordado no Capítulo 12 da disciplina Relações Econômicas Internacionais
16. CÂMBIO
MODALIDADES
• As trocas de moedas estrangeiras são realizadas em diversas modalidades, que são:
• mercado de câmbio manual - é o comércio de dinheiro em espécie, quando uma ou todas as
moedas que estiverem sendo trocadas forem de países estrangeiros.
• mercado de câmbio sacado - compreende a maior parte das operações de câmbio realizadas
pelos bancos, mormente compra e venda de divisas estrangeiras, representadas por depósitos,
letras de câmbio, cheques, ordens de pagamento, etc. As operações são feitas mediante
débitos ou créditos nas contas que os bancos mantêm junto aos estabelecimentos bancários
correspondentes no exterior.
• mercado de câmbio primário - são realizadas operações entre o banco e os seus clientes,
movimentando divisas, por exemplo, entre os exportadores e os importadores.
• mercado de câmbio interbancário - em que são realizadas operações cambiais entre os
bancos.
• mercado de câmbio à vista - são realizadas as operações prontas de cambio (spot exchange)
que são operações de compra e venda de divisas para entrega imediata, de até dois dias úteis
contados da data da operação.
• mercado de câmbio a termo - são realizadas as operações futuras de câmbio (fonnrard
exchange). São operações de compra e venda de divisas estrangeiras, com taxa cambial
determinada na ocasião da contratação, a serem entregues em data futura, com a finalidade de
evitar riscos de flutuações nas taxas cambiais.
OPERAÇÕES PRONTAS E OPERAÇÕES FUTURAS
• Operações prontas (SPOT) são aquelas em que as moedas transacionadas devem ser entregues em
até dois dias úteis (working days), contados a partir da data da realização da operação.
• Operações futuras são operações cambiais contratadas no presente, a uma taxa fixada no momento
da contratação, mas prevendo entrega das respectivas moedas em uma data futura.
ARBITRAGEM
• Arbitragem de câmbio é a operação que consiste em remeter moedas de uma praça para outra, no
sentido de se obter vantagens de temporárias diferenças de preços. Aproveitando-se das
diferenças de cotações de uma moeda em diferentes mercados, procura-se a obtenção de lucro,
comprando-a onde estiver com menor cotação para vendê-la onde o preço estiver mais elevado.
• Existem dois tipos de operações de arbitragem: direta e indireta.
• Arbitragem direta � é aquela em que dois mercados de países diferentes arbitram suas
respectivas moedas nacionais;
• Arbitragem indireta ���� é aquela em que dois mercados localizados em países diferentes operam
com a moeda de um terceiro país.
• As operações de arbitragem produzem um efeito benéfico ao mercado, pois provocam
alterações nas cotações das moedas, fazendo com que as eventuais diferenças desapareçam
em pouco tempo. Pode-se dizer que estas operações transformam dois mercados separados
em um mercado único, no sentido econômico.
SWAPS ���� Operação de swap consiste na compra o venda de cambio pronto CONTRA a
simultânea venda ou compra de câmbio futuro, em um determinado prazo. Ex.:
operacionaliza-se um swap entre dois bancos, um nacional e um outro estrangeiro. O
banco nacional compra moeda estrangeira de que necessita efetuando a venda para o
mesmo banco, em um determinado prazo. O banco estrangeiro, na mesma operação,
adquire a moeda nacional, para posteriormente efetuar a troca. Este tipo de swap
pode ser realizado entre bancos e outras empresas.
• outras modalidades de swap:
• swap e investimento: ocorre quando um banco ou uma outra empresa compra moeda em um
mercado estrangeiro para posterior venda em prazo determinado, permanecendo os fundos no
exterior para aplicação em operações financeiras, definidas a critério do investidor.
• swap de exportação: utilizado para financiamento de exportações. Uma empresa necessitando
de adquirir produtos do cómércio internacional, para depois exportá-los, efetua a operação de swap,
comprando a moeda necessária à aquisiçao dos produtos, liquidando a operação quando do
recebimento das exportações, com a finalidade de evitar riscos de possíveis elevações das taxas de
câmbio durante o período entre importação das matérias-primas e a exportação dos seus produtos.
• linhas de swap: acordos de crédito mútuo por um determinado prazo, entre bancos centrais de
diferentes países com o objetivo de regular o mercado interna de câmbio evitando alterações das
cotações de suas próprias moedas.
TIPOS DE TAXAS CAMBIAIS
���� Os operadores do mercado cambial necessitam de consultas recíprocas para determinarem as
taxas em que vão efetuar seus negócios. Na determinação das taxas cambiais são levados em
consideração fatores econômicos e políticos que podem ocasionar alterações das cotações das moedas.
A partir disto são fixadas as taxas cambiais de abertura, que oscilarão à medida em que as operações
forem sendo efetuadas, de acordo com a demanda por outra moeda. Os tipos de taxas cambiais podem
ser resumidos da seguinte maneira:
Taxa de Câmbio de Repasse: é a TAXA DE COMPRA DE MOEDA ESTRANGEIRA que o
Banco Central adquire dos bancos comerciais;
Taxa de Câmbio de Cobertura: é a TAXA DE VENDA DE MOEDA ESTRANGEIRA do Banco
Central aos bancos comerciais.
Taxas de Câmbio Prontas: são aquelas aplicadas em operações de compra e venda de moeda
estrangeira para entrega em até 2 diais úteis, contados da data da
operação.
Taxas de Câmbio Futuras: são aquelas destinadas a operações de compra e venda de
moeda estrangeira para entrega em um período de tempo
determinado pelos negociadores.
Taxas de Câmbio Fixas: são aquelas mantidas invariáveis em um determinado patamar, por
determinação governamental. Difere da taxa estável, que se mantém em
um mesmo patamar devido ao próprio mercado, sem intervenção
governamental.
Taxas de Câmbio Variáveis: são aquelas que variam. Podem ser taxas flexíveis, reajustadas
gradualmente dentro de pequenos intervalos de tempo ou taxas
flutuantes, que oscilam livremente, de acordo com as
variações do mercado, embora possam sofrer intervenção
governamental, em caso de flutuações exageradas.
Taxas de Câmbio Oficiais: determinadas pelas autoridades monetárias, geralmente de
acordo com as próprias variações do mercado.
Taxas de Câmbio Livres: provenientes das condições de oferta e procura do mercado de
cambio, admitindo-se a atuação governamental mediante
operações de compra e venda de moedas estrangeiras.
Taxas Cruzadas (Cross-Rates): são resultantes das comparações das respectivas
cotações de duas moedas, expressas em uma terceira
moeda.
CONTRATAÇÃO, PRAZOS E LIQUIDAÇÃO
���� As operações de cambio devem ser formalizadas mediante um contrato de câmbio, que pode ser
na forma de um contrato mercantil, nas operações de compra e venda internacional ou de maneira
mais simplificada, nas operações de cambio manual, por exemplo.
• todas as operações de câmbio realizadas pelos bancos e corretores autorizados
devem ser informadas diariamente ao Banco Central pelo sistema SISBACEN.
���� Os prazos de contratação das operações cambiais variam de acordo com a modalidade adotada.
• Para exportação - são de ate 360 dias da data do embarque
• Para as importações - as operações devem ser com cláusula de pronta entrega da moeda
estrangeira, ou se com carta de crédito, com prazo suficiente para o embarque, da
mercadoria, geralmente de 30 dias mais o prazo de embarque. Nas importações, as
operações com cláusula de pronta entrega não podem ser prorrogadas, somente admitindo-se
prorrogação para as operações garantidas por carta de crédito, dentro do prazo de embarque e
que a mercadoria não tenha sido embarcada.
���� As operações cambiais de importação devem ser liquidadas em até 2 dias úteis após a data da
contratação se clausuladas para entrega pronta; ou dentro de 30 dias contados do embarque da
mercadoria, se garantidas por carta de crédito.
• Na liquidação das operações de exportação, o banco só efetuará o pagamento após
confirmar o recebimento do valor do importador, dentro do prazo de 5 (cinco) dias.
• No caso de operações de cambio manual, devem ser liquidadas no mesmo dia.
FORMAS DE CONTROLE CAMBIAL E O CONTROLE CAMBIAL DO BRASIL
���� As autoridades monetárias, atendendo os objetivos da política econômica governamental,
intervêm no mercado cambial com a finalidade de adequá-lo às condições do país, visando restringir
a demanda por divisas estrangeiras e corrigir os desequilíbrios no balanço de pagamentos do país.
���� O controle cambial é adotado principalmente quando dos períodos de instabilidade, em que é
necessário evitar evasão de divisas do país. Porém, quando motivado pelo receio da situação econômica
de um país, os detentores de divisas buscam alternativas de modo a burlar as medidas de controle
cambial, mormente pelo mercado paralelo.
���� Os instrumentos utilizados para o controle cambial são:
• a fixação do cambio;
• as regulamentações;
• as suspensões de operações de compra e venda de divisas;
• a normatização das operações de importações e exportações.
• Desse modo, as autoridades monetárias exercem o monopólio do mercado cambial,
centralizando todas as operações que envolvam divisas. A adoção do controle cambial pode
ser por prazo determinado ou não, de acordo com os motivos de sua implementação.
• As formas de controle cambial mais utilizadas pelos países que o adotam são a
centralização de divisas e o licenciamento de exportações e de importações.
Centralização de Divisas - é uma forma que exige forte esquema de controle, pois os
detentores de divisas tentarão de todas as maneiras possíveis
burlar essa centralização, por meio de subfaturamento das
exportações e superfaturamento das importações, fuga de
capitais pelo mercado paralelo ou fraudes contábeis.
Licenciamento Prévio de
exportações e importações - apesar de significar um trabalho enorme no acompanhamento e
verificação de todas as operações de comércio exterior efetuadas
no país, permite o controle administrativo das compras e vendas
internacionais e o conseqüente controle das remessas e
recebimentos de divisas externas.
• Desde março de 1995, o governo brasileiro adota o sistema de faixas cambiais de
flutuação, também denominadas de "bandas cambiais". O Banco Central intervém
obrigatoriamente no mercado cambial toda vez que os limites das taxas de
flutuação forem atingidos pelas taxas praticadas no mercado, bem como poderá
intervir preventivamente, a fim de evitar oscilações nas cotações.
17. REGIMES ADUANEIROS
JURISDIÇÃO DOS SERVIÇOS ADUANEIROS
���� O Regulamento Aduaneiro logo em seu início, trata da questão da Jurisdição dos Serviços
Aduaneiros. Não poderia ser diferente, uma vez que, antes de conhecer as normas que regem a área
aduaneira, é imprescindível saber como e onde elas serão aplicadas. É necessário saber, também,
de quem é a competência para aplicar tais mandamentos.
• Em sentido amplo, Jurisdição é a extensão e o limite do poder da autoridade para aplicar,
na sua área de competência, a Lei ao caso concreto.
• As autoridades que têm competência para tratar dos assuntos aduaneiros são os Auditores
Fiscais da Receita Federal e os Técnicos da Receita Federal.
Território Aduaneiro ���� É O ESPAÇO FÍSICO NO QUAL É APLICADA SUA LEGISLAÇÃO
ADUANEIRA.
• o território aduaneiro compreende todo o território nacional.
• a jurisdição dos serviços aduaneiros é estendida por todo o
território aduaneiro e abrange as zonas primária e secundária.
• ZONA PRIMÁRIA compreende ����
• a área terrestre ou aquática, contínua ou descontínua, ocupada pelos portos
alfandegados;
• a área terrestre ocupada pelos aeroportos alfandegados;
• a área adjacente aos pontos de fronteira alfandegados;
• para efeitos da legislação aduaneira, as ZPE – Zonas de Processamento de
Exportação (áreas de livre comércio com o exterior e que se destinam à
instalação de empresas voltadas para a produção de bens a serem
comercializados exclusivamente no exterior) são consideradas zonas
primárias para efeito de controle administrativo.
• zona secundária compreende ����
• a parte restante do território aduaneiro não compreendida pela zona primária,
incluídas as águas territoriais e o espaço aéreo;
Portos, Aeroportos e Pontos de Fronteiras Alfandegados ���� são ditos alfandegados desde que nele
possam:
I. estacionar ou transitar veículos procedentes do exterior ou a ele destinados;
II. ser efetuadas operações de carga, descarga, armazenagem ou passagem de
mercadorias procedentes do exterior ou a ele destinadas;
III. embarcar, desembarcar ou transitar viajantes procedentes do exterior ou a ele
destinados;
• somente pelos portos, aeroportos e pontos de fronteira alfandegados poderá efetuar-
se a entrada ou a saída de mercadorias procedentes do exterior ou a ele destinadas.
• as operações de carga, descarga ou transbordo de veículo procedente do exterior só
poderão ser executadas depois de formalizadas, pela autoridade aduaneira, a sua
entrada no porto, aeroporto, ou repartição jurisdicionante do ponto de fronteira
alfandegado.
Zona de Vigilância Aduaneira ���� para melhorar o controle sobre a entrada ou saída
clandestina de mercadorias do território aduaneiro, o
Ministro da Fazenda poderá demarcar, na orla marítima
ou na faixa de fronteira, zonas de vigilância aduaneira,
nas quais a existência ou circulação de mercadorias,
veículos, pessoas ou animais ficarão sujeitas às exigências
fiscais, poribições e restrições que forem estabelecidas.
Recintos Alfandegados ���� são lugares onde a Alfândega executa o controle e fiscalização
aduaneiros sobre as mercadorias objeto de operações do
comércio exterior, procedentes do exterior ou a ele destinadas.
Podem estar localizadas em zonas primárias ou secudárias.
• são RECINTOS ALFANDEGADOS DE ZONA SECUNDÁRIA:
• os entrepostos aduaneiros alfandegados;
• os depósitos especiais alfandegados;
• os terminais retro-portuários alfandegados;
• as estações aduaneiras interiores ou outras unidades destinadas ao
armazenamento de mercadorias sob controle aduaneiro;
• as dependências destinadas ao depósito de remessas postais internacionais
sujeitas a controle aduaneiro.
Lojas francas � são estabelecimentos autorizados a funcionar em zona primária de porto ou
aeroporto, nos termos e condições fixados pelo Ministro da Fazenda, para venda
de mercadoria nacional ou estrangeira a passageiros em viagens internacionais,
contra pagamento em cheque de viagem ou moeda estrangeira conversivel.
Competência para Alfandegar ���� Alfandegar é o ato de estabelecer Alfândega em portos,
aeroportos ou pontos de fronteira, aparelhando-a para que possam receber veículos, passageiros e
mercadorias procedentes ou destinadas ao exterior.
• A competência para alfandegar os portos, aeroportos e pontos de fronteira, os
recintos de zona secundária e de zona primária é do Secretário da Receita Federal.
Exercício da Autoridade Aduaneira ���� A área que compreende a zona primária deverá ser
demarcada pela autoridade aduaneira local, ouvido
o órgão ou empresa a que esteja afeta a
administração do porto, aeroporto ou estação de
fronteira
• A autoridade aduaneira poderá exigir que a zona primária, ou parte dela, seja
protegida por obstáculos que a ela impeçam o acesso indiscriminado de veículos,
pessoas e animais.
Precedência da Autoridade Aduaneira ���� a administração fazendária e seus
servidores fiscais TERÃO, dentro de suas
áreas de competência e jurisdição,
precedência sobre os demais setores
administrativos, na forma da lei.
Fiscalização Aduaneira ���� A fiscalização aduaneira deverá ser permanente na zona
primária e continuada nos recintos alfandegados de
zona secundária. A fiscalização é permanente quando
exercida ininterruptamente; é continuada, quando exercida
no dia ou horário em que haja manuseio ou movimentação
de mercadorias.
Acesso a Recintos Alfandegados ���� O acesso a recintos alfandegados é restrito às
pessoas que neles exerçam atividades
profissionais e aos veículos que estejam de
serviço, podendo, no entanto, ingressar outras
pessoas ou veículos, desde que, haja expressa
permissão da autoridade aduaneira.
Terminais Alfandegados ���� Para a execução dos serviços aduaneiros, podem ser alfandegados
terminais como estações aduaneiras ou terminais retro-portuários,
quando dispuserem de condições para a realização do controle
fiscal, desde que se situem em localidades que tenham fluxo de
operações de comércio exterior que justifique a existência deles.
• São terminais alfandegados de uso público:
a) as Estações Aduaneiras de Fronteira - EAF;
b) as Estações Aduaneiras Interiores - EADI ;
c) os Terminais Retro-portuários Alfandegados -TRA .
EAF - são terminais situados em zona primária de ponto alfandegado de fronteira, ou em
área contígua, nos quais são executados os serviços de controle aduaneiro de veículos de
carga em tráfego internacional, de verificação de mercadorias em despacho aduaneiro e
outras operações de controle determinados pela autoridade aduaneira.
TRA - são terminais situados em zona contígua à de porto organizado ou instalação portuária,
compreendida no perímetro de 5 Km dos limites da zona primária, demarcada pela
autoridade aduaneira local, nos quais são executados os serviços de operação, sob
controle aduaneiro com carga de importação e exportação
EADI - são terminais situados em zona secundária, nos quais são executados os serviços de
operação com mercadorias que estejam sob controle aduaneiro.
• Nas EADI poderão ser realizadas operações com mercadorias submetidas aos
seguintes regimes aduaneiros:
I. comum;
II. suspensivos:
a) entreposto aduaneiro na importação e na exportação
b) admissão temporária;
c) trânsito aduaneiro;
d) drawback;
e) exportação temporária;
f) depósito alfandegado certificado e depósito especial alfandegado.
g) entreposto internacional da Zona Franca de Manaus.
• Os serviços desenvolvidos em terminais alfandegados de uso público
poderão ser delegados a pessoas jurídicas de direito privado que tenham
como principal objeto social, cumulativamente ou não, a armazenagem, a
guarda ou o transporte de mercadorias.
• A delegação será efetivada mediante PERMISSÃO de serviço público,
salvo quando os serviços devam ser prestados em terminais instalados em
imóveis pertencentes à União, caso em que será adotado o REGIME DE
CONCESSÃO precedida da execução de obra pública.
Estações Aduaneiras ���� são os terminais alfandegado de uso público onde se executam serviços
aduaneiros. Podem ser de fronteira, quando situada em zona primária de
ponto alfandegado de fronteira ou em área a ela vinculada, ou interior,
quando situada em zona secundária.
Estação Aduaneira de Fronteira – EAF ���� A estação aduaneira de fronteira será instalada em
imóvel da União e administrada pela SRF ou por empresa habilitada, como permissionária.
Estação Aduaneira Interior – EADI ���� A estação aduaneira interior poderá ser instalada em região
onde houver expressiva concentração de carga de importação ou destinada à exportação, sendo
autorizada a operar com carga de importação e de exportação, ou apenas de exportação, tendo em vista
as necessidades e condições locais.
• As Estações Aduaneiras do Interior - EADI -, usualmente conhecidas como portos seco
(''dry ports") são terminais alfandegados de uso público situados em zona secundária e
destinados à prestação, por terceiros, dos serviços públicos de movimentação e
armazenagem de mercadorias sob controle aduaneiro. São instaladas, preferencialmente, nas
proximidades de regiões produtoras ou consumidoras. Essa proximidade do domicílio dos
agentes econômicos envolvidos proporciona grande simplificação de procedimentos para o
contribuinte, acarretando considerável economia de custos.
Terminais Retro-Portuários Alfandegados – TRA ���� são instalações retro-portuárias onde se
executam serviços de controle aduaneiro. São recintos alfandegados de zona secundária cuja função é
dar suporte aos portos no manuseio de containers, reboques e semi-reboques, realizando as tarefas de
unitização e desunitizaçáo da carga recebida. Trabalham, quando autorizados, excepcionalmente com
graneis ou cargas especiais.
REGIMES COMUNS
���� Regimes aduaneiros comuns ou normais de importação e de exportação são aqueles empregados na
grande maioria das importações e exportações brasileiras. Nesses regimes as mercadorias
importadas (ou exportadas) passam pelo despacho comum de importação (ou de exportação)
quando são pagos os tributos incidentes na operação e satisfeitos os demais requisitos
administrativos. Não há, portanto, suspensão das obrigações fiscais.
REGIMES ADUANEIROS ESPECIAIS
���� caracterizam-se como um ato ou negócio jurídico sob condição resolutiva, em que o fato
gerador dos tributos considera-se ocorrido e existentes os seus efeitos desde o momento
da prática do ato concessivo, sendo exigíveis os tributos retroativamente na hipótese de
inadimplemento.
• São comuns à maioria dos regimes aduaneiros especiais as características seguintes:
• suspensão da exigibilidade tributária; prazo e condições de permanência da
mercadoria no regime; garantia dos tributos suspensos
São regimes aduaneiros Especiais:
1. Trânsito Aduaneiro;
2. Admissão Temporária;
3. Drawback;
4. Entreposto Aduaneiro;
5. Entreposto Industrial;
6. Exportação Temporária.
1 - TRÂNSITO ADUANEIRO
Conceito: O regime especial de trânsito aduaneiro é o que permite o TRANSPORTE DE
MERCADORIAS, sob controle aduaneiro, de um ponto a outro do território
aduaneiro, com SUSPENSÃO DE TRIBUTOS.
Despacho ����
Concessão: O pedido de concessão do regime será formulado na Declaração de
Trânsito Aduaneiro - DTA, documento base do despacho, na qual é
especificada a mercadoria objeto de transito.
Aplicação: A autoridade fiscal, sob cuja jurisdição se encontra a mercadoria a ser
transportada, ao conceder o regime fixará a rota, os prazos para execução da
operação e para comprovação da sua chegada, e as cautelas fiscais julgadas
necessárias.
2 - ADMISSÃO TEMPORÁRIA
Conceito: A admissão temporária é o regime especial que permite a Importação de bens que
devam permanecer no Pais durante prazo fixado, com SUSPENSÃO DE TRIBUTOS.
Despacho ����
Concessão e Aplicação: O interessado pleiteia o regime, através de requerimento, que deve
ser apresentado à repartição onde será processado o despacho
aduaneiro da mercadoria, devendo constar de seu pedido, entre
outros, o enquadramento legal cabível, a finalidade, o prazo
pretendido, a descrição pormenorizada do bem e o local onde a
mercadoria será utilizada.
• Indeferida a admissão temporária, os bens devem ser reexportados no prazo
de 30 (trinta) dias da ciência da decisão ou, alternativamente, nacionalizados
e despachados para consumo, desde que observadas as exigências legais e
regulamentares, inclusive as relativas ao controle administrativo das
importações.
• Para a concessão do regime, a autoridade competente deve observar, ainda,
relativamente aos bens, o cumprimento cumulativo das seguintes condições:
• sejam importados com o caráter de temporariedade, comprovada
esta condição por qualquer meio julgado idôneo.
• sejam importados SEM cobertura cambial.
• sejam adequados à finalidade para a qual foram importados.
Extinção do Regime: Extingue-se a admissão temporária com a adoção de uma das seguintes
providências, que deve ser requerida pelo beneficiário, dentro do prazo
fixado para a permanência dos bens no País:
I. reexportação;
II. entrega à Fazenda Nacional, livres de quaisquer despesas, desde
que a autoridade aduaneira concorde em recebê-los;
III. destruição, às expensas do interessado;
IV. transferência para outro regime especial;
V. despacho para consumo, se nacionalizados.
• os prazos de validade do regime de admissão temporária SÃO CONTADOS a
partir do desembaraço aduaneiro, podendo ser dispensada a garantia para
algumas empresas idôneas.
• não pode ser concedido o regime de admissão temporária à importação de BENS
DOADOS, a qualquer título, devendo-se utilizar do regime comum de importação.
3. DRAWBACK
Conceito: O DRAWBACK é o regime aduaneiro especial que consiste na IMPORTAÇÃO, com
RESTITUIÇÃO dos tributos pagos, SUSPENSÃO ou ISENÇÃO dos tributos
incidentes nas IMPORTAÇÕES de mercadorias destinadas à fabricação,
complementação, beneficiamento e/ou acondicionamento de PRODUTOS
EXPORTADOS OU A EXPORTAR.
• A aplicação deste regime visa a dar poder competitivo à produção nacional, através
da redução do custo final dos produtos que foram ou que serão exportados,
conseguida pela redução da carga tributária incidente sobre as mercadorias
estrangeiras neles utilizadas.
• O Drawback é um estimulo à exportação e pode ser concedido à empresa industrial
ou comercial.
• Como se trata de estímulo à exportação, a mercadoria importada sob o regime de
Drawback não está sujeita ao exame de similaridade nem à obrigatoriedade de
transporte em navio de bandeira brasileira.
• Os incentivos do Drawback abrangem:
• Imposto de Importação;
• Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI;
• Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços de Transporte e de
Comunicação - ICMS;
• Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante.
DRAWBACK Restituição: É a modalidade de Drawback que possibilita a
restituição do valor dos tributos pagos na
Importação de mercadorias, desde que estes tenham
sido utilizados na fabricação de produtos já
exportados.
• Ex: Uma empresa importa 100 microprocessadores pagando os
tributos devidos na importação. Fabrica, com os processadores
importados, 100 microcomputadores, que são exportados. Adquire,
em razão do Incentivo do Drawback Restituição, direito de requerer a
concessão do crédito fiscal para ser utilizado em futuras importações.
DRAWBACK Suspensão: é a modalidade de Drawback que permite ao beneficiário
importar, com suspensão de tributos, matérias primas,
insumos, partes, peças e componentes para aplicação em
produtos que deverão ser exportados.
• Ex: Ao importar 100 microprocessadores para fabricação de 100
microcomputadores, o importador sabe que os computadores serão
exportados, requer a suspensão dos tributos devidos, mediante
garantia que se extinguira com a comprovação da efetiva exportação.
DRAWBACK Isenção: É a modalidade de Drawback que permite ao beneficiário, através
da importação com isenção, a reposição de estoque de
mercadorias em quantidade e qualidade equivalente às utilizadas
nos produtos exportados.
• Ex: Ao importar 100 microprocessadores para fabricação de 100
microcomputadores, a empresa não cogitava a exportação dos
computadores. Entretanto, encontrando melhores condições
comerciais no mercado externo, promoveu a exportação dos
produtos. Ao efetivar a exportação, a empresa obteve direito, através
do regime especial de Drawback Isenção, de importar outros 100
microcomputadores, com isenção de tributos, para a reposição de seu
estoque.
DRAWBACK Verde-Amarelo (Interno): Este incentivo à exportação consiste
em isentar de impostos internos
matérias-primas, produtos
intermediários e material de
embalagem, de fabricação nacional,
destinados à venda, no País, a
empresas que irão industrializar
esses insumos e depois exportar o
produto final.
• O Drawback Verde-amarelo não é um regime aduaneiro especial. É um
incentivo à exportação, que utiliza sistemática à utilizada no regime
aduaneiro especial de Drawback.
• O Drawback Verde-amarelo também denominado de Drawback Interno,
restringe-se ao IPI e ao lCMS.
4. ENTREPOSTO ADUANEIRO
Conceito e Permissionários: Entreposto aduaneiro é o regime especial que PERMITE , na
importação e na exportação, o depósito de mercadorias, em local
determinado, com suspensão do pagamento de tributos e sob
controle aduaneiro.
• O regime tem como base operacional unidade de entreposto de uso público ou de uso
privativo, onde as mercadorias ficam depositadas, salvo na modalidade de entreposto
extraordinário de exportação, na qual as mercadorias podem também ser embarcadas
diretamente.
• É ADMISSÍVEL a exportação das mercadorias entrepostadas sem que sejam
despachadas para consumo.
• A exploração de entreposto aduaneiro de uso privativo será PERMITIDA NA
EXPORTAÇÃO, na modalidade de regime extraordinário, relativamente a
mercadoria adquirida por empresa comercial exportadora (“trading company”)
Prazo de Permanência ���� A mercadoria pode permanecer no regime pelo prazo de
até um ano, prorrogável por período não superior a um ano.
Em casos especiais, pode ser concedida nova prorrogação,
respeitado o limite máximo de 03 anos.
Abandono���� Se, após vencido o prazo de vigência do regime, acrescido, de 45 dias, o
beneficiário não tiver tomado uma das providências previstas para
extinção do regime, as mercadorias serão consideradas abandonadas para
fins de aplicação da pena de perdimento.
Extravio ou Avaria ���� nestes casos, o depositário (permissionário do entreposto)
RESPONDE PELO PAGAMENTO DOS TRIBUTOS
incidentes sobre as mercadorias e penalidades cabíveis, exigíveis
na data da apuração do fato.
5. ENTREPOSTO INDUSTRIAL
Conceito: é o regime aduaneiro especial que permite a determinado departamento de uma indústria
IMPORTAR , com suspensão de tributos, mercadorias que, depois de submetidas à
operação de industrialização, devem destinar-se ao mercado externo.
• Todavia, É PERMITIDO QUE PARTE DA PRODUÇÃO do entreposto industrial
seja destinada ao mercado interno, desde que pagos os tributos suspensos relativos
às mercadorias importadas utilizadas nos produtos finais.
• O regime de entreposto industrial visa a:
• facilitar a importação de insumos industriais para serem beneficiados ou
agregados a produtos nacionais destinados à exportação;
• reduzir os custos dos produtos finais.
Concessão do Regime: Compete ao Coordenador-Geral do Sistema Aduaneiro, por subdelegação
de competência da Secretaria da Receita Federal, autorizar a instalação de
entreposto industrial, bem como fixar condições e prazo para o seu
funcionamento.
Permissionários e Beneficiários: As empresas industriais permissionárias são as
beneficiárias do regime de entreposto industrial.
Benefícios na Exportação: As mercadorias produzidas no entreposto industrial,
quando destinadas ao mercado externo, gozam de todos os
benefícios fiscais concedidos à exportação.
6. EXPORTAÇÃO TEMPORÁRIA
Conceito: Considera-se exportação temporária a saída, do País, de mercadoria nacional ou
nacionalizada, CONDICIONADA À REIMPORTAÇÃO em prazo determinado, no
mesmo estado ou após submetida a processo de conserto, reparo ou restauração.
• O regime visa a facilitar a salda dos bens que vão ao exterior para exposições, feiras,
competições, testes, promoções, reparos, consertos, restaurações, ou em auxilio ou
apoio a pessoa que viaja ao exterior deles necessitando para o exercício de suas
atividades profissionais ou de lazer. Tem, portanto, grande importância econômica e
cultural.
• O imposto de exportação é garantido por termo de responsabilidade e exaure-se
quando de sua concessão, não cabendo mais discutí-lo quando da reimportação,
se este for o caso.
Reimportação: Considera-se reimportação a entrada no País de mercadoria que tenha sido
exportada, definitivamente, ou em regime aduaneiro especial de exportação
temporária.
Concessão do Regime: poderá ser requerida à repartição que jurisdiciona o exportador ou aquela
que jurisdiciona o porto, aeroporto ou ponto de fronteira de saída dos bens
para o exterior.
• a entrada no território nacional de PRODUTO REIMPORTADO que não cumpriu as
condições do regime de exportação temporária CONSTITUI fato gerador do imposto de
importação.
São cinco os regimes aduaneiros atípicos:
1. Zona Franca de Manaus;
2. Loja Franca;
3. Depósito Afiançado;
4. Depósito Especial Alfandegado;
5. Depósito Franco.
ZONA FRANCA DE MANAUS ZFM
Conceito: As Zonas Francas são áreas de um país, ou de um conjunto de países em integração
econômica, especialmente demarcadas, onde o ingresso e a saída de mercadorias, do
exterior ou para o exterior, gozam de benefícios fiscais, como a isenção de gravames
e a não aplicação de restrições econômicas que existem em outras regiões do território
do país ou conjunto de países.
Administração: A ZFM é administrada pela Superintendência da Zona Franca de Manaus -
SUFRAMA - . autarquia com personalidade jurídica e patrimônio próprio, e
vinculada ao Ministério do Planejamento e Orçamento.
Incentivos Fiscais: A ZFM , desde sua implantação, tem sido contemplada com incentivos
fiscais na área federal, estadual e municipal. Na realidade, é nesses
incentivos fiscais que se encontra o fundamento básico para o incremento
e continuidade da Zona Franca.
• É isenta do Imposto de Importação e do Imposto sobre os Produtos
Industrializados a entrada na ZFM de mercadorias estrangeiras destinadas:
• a seu consumo interno;
• à industrialização em qualquer grau, inclusive beneficiamento;
• à pesca e à agropecuária;
• à instalação e operação de indústrias e serviços de qualquer natureza;
• à estocagem para reexportação.
• Excluem-se dos benefícios:
• armas e munições;
• fumo;
• bebidas alcoólicas;
• automóveis de passageiros;
• produtos de perfumaria ou de toucador;
Internação: As mercadorias de origem nacional ou estrangeira, ao saírem da ZFM para outros
pontos do Território Nacional, serão submetidas a um dos seguintes tratamentos
tributários:
• Pagamento de todos os impostos exigíveis na importação, através da
apresentação de Declaração de Importação / Internação - ZFM, quando se
tratar de internação de mercadorias estrangeiras admitidas na ZFM
• Redução do Imposto de Importação, calculado mediante a aplicação de
coeficiente de redução e isenção do IPI, através da apresentação de
Declaração de Importação/lnternação - ZFM, quando se tratar da internação
de produtos industrializados na ZFM com a utilização de insumos
estrangeiros
• Isenção do IPI, quando se tratar da internação de produtos industrializados na
ZFM com insumos 100% nacionais, mediante requerimento,
acompanhado de Nota Fiscal;
• Pagamento ou não do IPI, conforme o caso, quando se tratar da internação de
mercadorias nacionais produzidas fora da ZFM, mediante a simples
apresentação da Nota Fiscal. O pagamento ficará condicionado ao tempo
de permanência da mercadoria na ZFM (prazo para isenção: 3 anos);
Saída Temporária: as mercadorias importadas sob o regime instituído pelo Decreto-Lei 288/67
podem ser remetidas para qualquer ponto do território nacional, com
suspensão de tributos. Ex.: produtos manufaturados e acabados para
conserto, reparo ou restauração.
Controle Fiscal: Na ZFM, compete à Alfândega do Porto de Manaus o controle e a fiscalização da
entrada e da saída de mercadorias importadas, bem como da saída de qualquer
mercadoria com destino ao exterior ou ao restante do território nacional.
AMAZONIA OCIDENTAL E ÁREAS DE LIVRE COMÉRCIO
AMAZONIA OCIDENTAL: A Amazônia Ocidental abrange os estados do Amazonas, Acre,
Rondônia e Roraima. O Governo Federal estendeu às áreas pionei-
ras, zonas de fronteira e outras localidades da Amazônia Ocidental
alguns benefícios fiscais antes concedidos apenas para a ZFM.
OBS.: As mercadorias que saem da ZFM com destino à Amazônia Ocidental, quando não
incluídas na pauta interministerial, estarão sujeitas às regras estabelecidas para as
internações no restante do País.
MERCADORIAS NACIONALIZADAS ���� são consideradas as mercadorias estrangeiras
importadas a título definitivo, independentemente
de serem despachadas para consumo.
ÁREAS DE LIVRE COMÉRCIO: As Áreas de Livre Comércio - ALC, de importação e
exportação, sob regime fiscal especial, foram criadas por
lei com a finalidade de promover o desenvolvimento de
regiões fronteiriças específicas da Região Norte do Pais e
de incrementar as relações bilaterais com os países
vizinhos, segundo a política de integração latino-
americana.
Assim, existem Áreas de Livre Comércio nas seguintes regiões:
���� Pacaraíma (RR), Bonfim (RR), Macápa (AP), Santana (AP), Tabatinga (AM), Guajará-
Mirim (RO), Basiléia (AC) e Cruzeiro do Sul (AC).
• Estas áreas ficam sob controle da Suframa e gozam de incentivos fiscais
semelhantes aos previstos para a ZFM .
LOJA FRANCA
Conceito: Na zona primária de porto ou aeroporto poderá ser autorizado, nos termos e
condições fixados pelo Ministro da Fazenda, o funcionamento de LOJAS FRANCAS
para venda de mercadoria nacional ou estrangeira a passageiros de viagens
internacionais, contra pagamentos em cheque de viagem, moeda estrangeira
conversível ou cartão de crédito internacional.
Autorização: A autorização para instalar e operar loja franca será OUTORGADA à empresa
selecionada em concorrência pública. O processo licitatório é realizado
conjuntamente com a entidade administradora do porto ou aeroporto.
Operacionalização: A admissão de mercadoria em loja franca será feita mediante:
• Declaração de admissão, no caso de mercadorias estrangeiras;
• nota fiscal, no caso de mercadorias produzidas no Pais.
� A loja franca deverá ter, no mínimo, um depósito para guarda das mercadorias de seu
estoque, instalado em zona primária ou, em recinto previamente alfandegado de zona
secundária. As mercadorias permanecerão depositadas, com suspensão de tributos e sob
controle fiscal. Na venda dos produtos, a suspensão se CONVERTE em ISENÇÃO.
Controle Fiscal: Compete à unidade da SRF jurisdicionante a fiscalização e o controle das
operações realizadas pela loja franca.
DEPÓSITO ESPECIAL ALFANDEGADO
Conceito: O regime aduaneiro atípico de deposito especial alfandegado é o que permite a
estocagem de partes, peças e materiais de reposição ou manutenção para veículos,
máquinas, equipamentos, aparelhos e instrumentos, assim como de seus componentes,
estrangeiros, nacionalizados ou não, nos casos definidos pelo Ministro da Fazenda.
� Somente empresa que preste assistência técnica (reposição, reparo e manutenção) a veículos,
máquinas e equipamentos, nas condições descritas acima, pode ser autorizada a operar na
qualidade de beneficiária de Depósito Especial Alfandegado.
Base Operacional: A base operacional do regime é de uso privativo e denomina-se, igualmente,
Depósito Especial Alfandegado - DEA.
Autorização: A autorização para instalar DEA será dada pelo Secretário da Receita Federal, a
título precário, através de Ato Concessório.
Admissão: São condições para admissão de mercadoria em regime de DEA:
• a importação sem cobertura cambial, com exceção dos casos autorizados pelo
Ministro da Fazenda;
• constar do Conhecimento de Transporte Internacional cláusula indicativa de que a
mercadoria destina-se a DEA.
• o despacho para consumo será feito pela empresa beneficiária OU, nos casos de
isenção ou redução de tributos vinculados à qualidade do importador ou à
destinação das mercadorias, poderá ser feito pelo adquirente das mesmas, até o 10º
dia do mês subseqüente ao de sua saída do regime.
• A mercadoria admitida em DEA pode ter uma das seguintes destinações:
- reexportação;
- exportação:
- transferência para outro regime atípico ou especial;
- despacho para consumo;
- destruição, com autorização do consignante, às expensas do beneficiário.
• O prazo de permanência da mercadoria no regime será de 5 anos, a contar da admissão,
salvo em casos de interesse econômico relevante, autorizados pelo Ministro da Fazenda;
será considerada ABANDONADA a mercadoria que permanecer no depósito além do
prazo fixado.
Controle Fiscal: O controle fiscal sobre as operações do DEA é da competência do órgão
aduaneiro a que o estabelecimento está jurisdicionado.
DEPÓSITO AFIANÇADO
Conceito: Depósito afiançado é o local alfandegado destinado, mediante autorização da
autoridade aduaneira, à guarda de materiais de manutenção e preparo de
embarcações e aeronaves utilizados no transporte comercial internacional, de
empresas autorizadas a operar nesse serviço.
Base Operacional: Os depósitos afiançados das empresas de navegação marítima ou aérea
deverão LOCALIZAR-SE EM ZONA PRIMÁRIA , podendo localizar-
se na zona secundária os das empresas de transporte rodoviário.
Autorização: A autorização para instalação de DAF é dada a título precário, pela autoridade
aduaneira que jurisdiciona o local do depósito.
� A autorização para o funcionamento de depósitos afiançados de empresas estrangeiras é
condicionada a que estejam previstos em ato internacional firmado pelo Brasil, ou à
comprovada existência de reciprocidade de tratamento (RA, 403).
� A autorização para operar o regime de DAF em aeroportos internacionais está sujeita ao
atendimento cumulativo das seguintes exigências:
- a empresa deve ser titular de uma base operacional de depósito afiançado;
- as mercadorias devem ser importadas com suspensão dos tributos e sem cobertura
cambial;
- a empresa deve manter serviços de transportes aéreos internacionais regulares.
DEPÓSITO FRANCO
Conceito: Depósito franco é recinto alfandegado, instalado em porto brasileiro, para atender ao
fluxo comercial de países limítrofes com terceiros países.
Autorização: Só é admitida a instalação de depósito franco quando autorizada em acordo ou
convênio internacional firmado pelo Brasil.
� O país interessado manterá, no Depósito Franco, delegados que representarão, nas relações com
as autoridades alfandegárias brasileiras, os proprietários das mercadorias ali recebidas.
ZONAS DE PROCESSAMENTO DE EXPORTAÇÃO - ZPE
Conceito: O Poder Executivo tem autorização para criar, nas regiões menos desenvolvidas, Zonas
de Processamento de Exportações - ZPE - , sujeitas ao regime jurídico instituído por
Lei, com a finalidade de reduzir desequilíbrios regionais, bem como fortalecer o
balanço de pagamento e promover a difusão tecnológica e o desenvolvimento
econômico e social do País.
18. EXPORTAÇÕES
SISCOMEX EXPORTAÇÃO
���� O Sistema Integrado de Comércio Exterior - SISCOMEX, é a sistemática administrativa do
comércio exterior brasileiro. Integra as atividades afins da Secretaria de Comércio Exterior -
SECEX - , da Secretaria da Receita Federal - SRF - e do Banco Central do Brasil BACEN - ,
no registro, acompanhamento e controle das diferentes etapas das operações de exportação.
Registro do Exportador: O exportador pode acessar o SISCOMEX diretamente de sua empresa,
interligando-se ao sistema.
• Para exportar, as pessoas físicas e jurídicas devem estar cadastradas no REI
- Registro de Exportadores e Importadores da Secretaria de Comércio
Exterior. A inscrição no REI é automática, no ato da primeira operação, sem
o encaminhamento de quaisquer documentos, às quais poderão ser
solicitados, eventualmente, pelo DECEX, para verificação de rotina.
Registro da Operação de Exportação: através de um registro, o Registro de Exportação -
RE, e, eventualmente, de dois outros módulos: o
Registro de Operação de Credito - RC - e o
Registro de Venda - RV.
Registro de Exportação: O RE é o conjunto de informações de natureza comercial,
cambial e fiscal que caracterizam a operação de exportação de
uma mercadoria através de enquadramento específico. É
considerado como FATO GERADOR , para efeito do cálculo do
Imposto de Exportação, a data do registro da exportação no
SISCOMEX.
Registro de Exportação Simplificado – RES : Nas operações de exportação com valor de
venda abaixo de US$ 10,000.00, pode ser
utilizado o RES, desde que atendidas as
demais condições estabelecidas no
Comunicado DECEX nº 25/98.
Registro de Operação de Crédito – RC : O RC representa o conjunto de informações de
caráter cambial e financeiro, nas exportações com
prazo de pagamento superior a 180 dias.
ENTREPOSTO ADUANEIRO DE EXPORTAÇÃO
Conceito: é o regime aduaneiro especial que PERMITE , na exportação, o depósito de
mercadorias, em local determinado, com suspensão do pagamento de tributos e sob
controle fiscal. Subsiste na modalidade de regime comum, a partir da data da
entrada da mercadoria na unidade de entreposto.
DESPACHO ADUANEIRO DE EXPORTAÇÃO
Definição e Processamento: Despacho de exportação é o procedimento fiscal mediante o qual
se processa o desembaraço aduaneiro de mercadoria destinada
ao exterior, seja ela exportada a título definitivo ou não.
Documento Base: O documento base do despacho aduaneiro de exportação e a Declaração de
Despacho de Exportação - DDE - , formalizada pelo exportador e enviada à
unidade de despacho da mercadoria via SISCOMEX.
Despacho sem DDE: Em casos específicos, em razão da natureza da operação ou da
mercadoria, pode ser autorizado o despacho aduaneiro de exportação sem
registro da DDE no SISCOMEX.
Despacho sem Registro no SISCOMEX: o despacho de exportação é processado sem registro
no SISCOMEX, à vista de nota fiscal ou
documento especifico. Isso ocorre, por exemplo,
para:
• mercadorias nacionais adquiridas no mercado interno, observados os
limites e condições estabelecidos em normas próprias,
• amostras de diminuto ou nenhum valor comercial;
• pequenas encomendas sem cobertura cambial e donativos até o limite
de US$ 1.000,00 ou o equivalente em outra moeda;
• bagagem acompanhada;
• veículos, que saiam temporariamente do Pais, para uso de seu
proprietário ou possuidor no exterior.
Fracionamento: A mercadoria objeto de exportação por via terrestre poderá ter sua transposição
de fronteira fracionada quando não puder ser embarcada em um único veículo ou
composição.
Local de Despacho: O despacho de exportação pode ser realizado em recintos alfandegados de
zona primária ou de zona secundária ou, em certos casos, em locais não-
alfandegados, como. por exemplo, no próprio estabelecimento do
exportador.
Instrução do Despacho de Exportação: será instruído com os seguintes documentos:
• nota fiscal;
• via original do conhecimento e do manifesto internacional de carga,
nas exportações por via terrestre, fluvial ou lacustre;
• outros, indicados em legislação especifica.
• Em caso de exportação para país membro do MERCOSUL, o manifesto
internacional de carga será substituído:
• pelo Manifesto Internacional de Carga Rodoviária/Declaração de
Trânsito Aduaneiro MIC/DTA, quando se tratar de transporte
rodoviário;
• pelo Conhecimento - Carta de Porte Internacional/Declaração de
Trânsito Aduaneiro - TIF/DTA.
Conferência Aduaneira: é realizada de forma parametrizada pelo SISCOMEX, para um dos três
canais de conferência seguintes:
• CANAL VERDE: o desembaraço da mercadoria é procedido de
forma automática pelo sistema. Não há exame documental nem
verificação física da mercadoria; porém, nada impede que o chefe
da unidade da SRF onde se processou o despacho aduaneiro da
mercadoria, após o seu desembaraço, mas antes da entrega ao
importador, determine que se proceda à ação fiscal pertinente.
• canal laranja: é efetuado somente o exame documental.
• canal vermelho: é realizado o exame documental e a verificação
física da mercadoria.
Esquematização de uma Operação de Exportação Usual:
1 Registro da solicitação do Despacho
(SD)
2 Informação da
Presença da carga
3 Recepção dos Documentos
4 Averbação da SD
5 Distribuição do Despacho Aduaneiro
6 Seleção Parametrizada
7 Desembaraço para Embarque
8 Comprovante de Exportação
• A concessão de incentivos fiscais às exportações, mediante a ISENÇÃO, a SUSPENSÃO ou a
RESTITUIÇÃO DE TAXAS, tem por objetivo fundamental:
• Compensar a menor competitividade relativa de alguns setores da produção nacional,
tornando os preços de seus produtos competitivos nos mercados de exportação.
• No Brasil, a concessão de incentivos fiscais à exportação ENVOLVE IMUNIDADE do IPI , a
NÃO INCIDÊNCIA do ICMS e ISENÇÃO do COFINS e do PIS.
19. MECANISMOS DE FINANCIAMENTO DO COMÉRCIO EXTER IOR
���� Os financiamentos concedidos às operações de comércio exterior visam aumentar a
competitividade das empresas exportadoras nacionais, reduzindo os custos por meio de
empréstimos para capital de giro ou aumentando os prazos para pagamento, tornando mais atraente
aos importadores estrangeiros.
���� Os financiamentos obtidos pelos importadores nacionais podem ser feitos na modalidade
cobrança ou por carta de crédito. Os importadores nacionais podem obter o financiamento
diretamente com o exportador, na modalidade cobrança a prazo simples ou cobrança a prazo com
aval do banco ou crédito documentário (carta de crédito) a prazo.
���� A forma mais comum de financiamento às importações é a concessão, por um banco nacional, de
uma carta de crédito a prazo ao importador, geralmente com aval ou outro tipo de garantia
bancária.
���� As operações cambiais são acertadas e formalizadas em um contrato de câmbio, onde se definem
as obrigações contratuais do vendedor e do comprador. Uma vez formalizado o Contrato de
Câmbio, a operação cambial objeto deste passa a ser IRREVOGÁVEL, embora sujeita a alterações
acordadas pelas partes e previstas na legislação cambial.
EMPRÉSTIMOS DIRETOS
Adiantamento sobre contrato de câmbio (ACC) ����
Definição: consiste na antecipação ao exportador, total ou parcial, do valor, em moeda
nacional, do contrato de câmbio de exportação, antes do embarque das mercadorias.
• O exportador, a partir do momento da contratação do câmbio pode se beneficiar
deste financiamento junto a qualquer estabelecimento bancário autorizado a efetuar
operações cambiais até a data da entrega dos documentos de embarque no banco.
• Os bancos podem negociar livremente as condições e taxas, dentro dos limites
determinados pelo Banco Central, podendo adiantar até 100% do valor do valor do
contrato de câmbio. Esse adiantamento variará em função do prazo determinado
no contrato de câmbio, que não poderá ultrapassar 360 dias ANTES DO
EMBARQUE das mercadorias
Adiantamento sobre cambiais entregues (ACE) ����
Definição: é uma antecipação do valor do contrato de câmbio com as mesmas características do
ACC, mas é concedido dentro do prazo de 180 dias APÓS O EMBARQUE das
mercadorias, caracterizando-se como uma segunda fase da operação de ACC, e o valor
do adiantamento será de 100 % do valor do contrato de câmbio, podendo inclusive
complementar o valor do adiantamento já concedido em ACC.
Pagamento antecipado ou Pré-pagamento à exportação ����
Definição: é aplicado nos casos em que o exportador solicita adiantamento diretamente ao
importador , antes de efetuar a entrega da mercadoria vendida. Não é uma operação
feita usualmente, pois demanda um risco muito grande ao importador. Como é uma
transação direta entre o comprador e o vendedor não é controlada pelas autoridades
monetárias, exceto no controle de entrada e saída de divisas dos países, e tampouco
necessita de intermediação de instituições financeiras.
Câmbio travado ����
Definição: operação em que o exportador fecha o câmbio com o banco antes de embarcar a
mercadoria, mas não recebe em troca o valor equivalente em moeda.
• A efetivação desta operação recebe a denominação de trava e, no momento em que é
efetuada, fixa-se a taxa de conversão da moeda estrangeira, sendo que o exportador
perderá a correção cambial do período. O banco pagará ao exportador um valor adicional
(prêmio) pela não-utilização dos recursos em moeda estrangeira.
Flnamex (BNDES Exim) ����
Definição: são operações financiadas pelo BNDES com a finalidade de proporcionar à empresas
nacionais condições de competir no mercado internacional. E realizado pelos agentes
financeiros da FINAME.
Programa de Apoio à Exportação de Produtos Manufaturados ����
Definição: linha de crédito do BNDES destinada às empresas exportadoras de setores de
produtos manufaturados (calçados, confecções, móveis, cerâmicos, ferramentas,
eletrodomésticos, plástico, etc). Os financiamentos são concedidos no âmbito do
produto BNDES Automático, com prazo de 15 meses, com carência de 9 meses e
amortizações em 6 parcelas mensais.
Pro-Commodities ����
Definição: linha de crédito com recursos de bancos estrangeiros posta a disposição da produção
rural destinada à exportação. Tais empréstimos não precisam do aval do Tesouro
Nacional e não entram no estoque da divida externa, pois são realizados entre entidades
privadas e têm vencimento de curto prazo, no máximo de um ano.
Programa de Financiamento às Exportações (PROEX) ����
Definição: Em sua modalidade de financiamento, são linhas de crédito destinadas ao
financiamento DIRETO ao EXPORTADOR e IMPORTADOR de bens e serviços,
na fase pós-embarque, realizado pelo Banco do Brasil, com recursos do Tesouro
Nacional.
• São operações de empréstimos realizadas somente por agentes financeiros credenciados
(Banco do Brasil), mediante análise e aprovação do Comitê de Crédito à Exportação
(CECEX), órgão do Ministério da Economia.
OPERAÇÕES DE DESCONTO
���� É o tipo de financiamento concedido pelas instituições financeiras ao exportador, após a
entrega das mercadorias, mediante desconto das cambiais resultantes das vendas. Assim como no
mercado interno, no mercado internacional a concessão de prazo para pagamento é condição
fundamental para incremento das vendas. As operações de desconto são as seguintes:
Supplier's Credit: o financiamento é concedido por um banco ao exportador mediante o desconto
das cambiais representadas pelas vendas a prazo. O exportador continua
responsável perante o banco financiador, que terá direito de regresso em caso
do não-pagamento pelo importador.
• Os prazos destas operações variam de 30 dias ate 5 anos. No comércio
exterior, os créditos com prazo de ate 180 dias são considerados de "curto
prazo" , destinando se aos bens de consumo. Prazos mais longos, de até 5
anos são destinados às vendas de bens de produção, como máquinas e
equipamentos industriais.
Buyer's Credit; modalidade de financiamento às exportações em que o empréstimo é concedido
diretamente ao importador estrangeiro por um banco no exterior. Desse
modo, apenas o importador responsabiliza-se pelo pagamento das cambiais
de exportação. Para o exportador, as operações são à vista com entrada
imediata de divisas para o pais exportador.
Forfaiting: é uma cessão de crédito. O exportador vende suas mercadorias a prazo e recebe à
vista, com intermediação de um banco. O forfaiting é utilizado em vendas consideradas de alto risco,
como as realizadas para países politicamente instáveis (países do Oriente Médio, por exemplo).
• A operação é feita da seguinte maneira: o exportador remete um saque cambial ao
importador para aceite. Após, o banco analisará os ricos da operação e procederá ao
desconto da cambial.
Factoring: são operações semelhantes às de forfaiting , mas envolvem pequenos valores
(operações de varejo).
CONCESSÃO DE GARANTIAS
���� São as operações de financiamento feitas pela cessão dos direitos sobre cambiais originadas de
vendas de exportação ou de warrants. São as seguintes operações:
Export Notes: são operações em que o exportador obtém recursos juntos aos bancos locais para
financiar suas vendas ao exterior, mediante contratos de cessão de créditos de
exportação.
• A garantia da operação é feita por emissão de nota promissória pela empresa
exportadora, responsabilizando-se pelo embarque e pagamento da mercadoria. O
prazo para resgate varia entre 180 e 360 dias.
• O banco repassa a operação a investidores, nacionais ou estrangeiros, geralmente
empresas multinacionais, pois a export note é considerada um excelente
investimento, principalmente pelo fato de ser em moeda estrangeira, constituindo-se
em excelente oportunidade de hedge cambial.
• A operação se completa quando ocorre o pagamento da mercadoria pelo
importador , sendo que a empresa exportadora recebe em moeda estrangeira, efetua
a conversão e resgata a nota promissória ao cambio do dia e o investidor receberá
seu capital corrigido pela variação cambial do período mais os juros pactuados.
Debêntures cambiais: são operações realizadas nos moldes das export notes, mas, neste caso,
são garantidas por emissão de debêntures das empresas exportadoras
baseados na média das exportações efetuadas ou em receitas da carteira
de exportações futuras.
• Envolvem valores muito expressivos (mínimo de US$ 1 miIháo) e prazo de 3 anos.
Desconto de Warrants: são operações de financiamento realizadas através do desconto dos
WARRANTS , que são os CERTIFICADOS DE DEPÓSITO DE
MERCADORIAS destinadas à exportação, armazenadas nos recintos
alfandegados das companhias de armazéns gerais).
• A garantia dos empréstimos é o endosso dos certificados aos bancos
financiadores, que se tornam os legítimos possuidores das mercadorias.
Securitização das exportações: O exportador emite um papel (floating rate note),
comprometendo suas exportações por um prazo
determinado, com o objetivo de buscar financiamentos
no exterior, com abertura de uma conta no exterior para
pagamento posterior dos empréstimos, sob
acompanhamento do Banco Central.
• O Banco Central, ao realizar a securitização, com abertura desta conta no exterior,
teve como principais objetivos eliminar da operação o "risco Brasil " e evitar
qualquer suspeita de inadimplência dos pagamentos a serem feitos pelo exportador.
SEGURO DE CRÉDITO DE EXPORTAÇÃO (SCE)
���� este seguro funciona como instrumento de prevenção (análise e monitoramento constante da
situação financeira do importador), como ferramenta de cobrança (atendendo a legislação
específica de cada país e com custos cobertos pelo seguro) e pode ser utilizado como garantia
em operação de financiamento.
���� Visa garantir ao exportador a indenização por perdas líquidas definitivas que vier a sofrer em
conseqüência do não recebimento do crédito concedido a seus clientes no exterior.
���� Os riscos cobertos por esta modalidade de seguro são tanto de origem comercial (situações de
insolvência do importador de bens e serviços ou mora no pagamento da dívida), quanto de
natureza política e extraordinária (guerras internas ou externas, revoluções, embargos de
importação e exportação, intervenções governamentais que impeçam o cumprimento do contrato,
moratória governamental, restrições à transferência de divisas e desastres naturais).
���� Os limites de cobertura são determinados pelos fatores acima descritos e o teto de cobertura,
limitado ao volume de 85% das perdas, está vinculado à capacidade de resseguros, que
atualmente é monopólio estatal do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB).
20. FONTES DE FINANCIAMENTO INTERNACIONAL
SISTEMA BANCO MUNDIAL
���� O Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD ), também conhecido como
BANCO MUNDIAL , surgiu a partir da Conferência de Bretton Woods, juntamente com o Fundo
Monetário Internacional (FMI ). A administração do BIRD assemelha-se a do FMI , e os países
membros do BIRD devem se inscrever antes como membros do FMI .
���� O BIRD não possui objetivo de lucros. Os juros e comissões cobrados são destinados para as
despesas da instituição e para constituir um fundo de reserva.
���� Tem como principais objetivos: contribuir para o desenvolvimento dos países associados,
promover investimentos de capitais estrangeiros, mediante sua participação em empréstimos,
promover o crescimento equilibrado do comércio internacional, incentivando os investimentos
internacionais no desenvolvimentos dos países associados e coordenar os empréstimos feitos ou
garantidos pelo BIRD .
• Desse modo, o BIRD é um captador de capitais internacionais para investimentos
produtivos em países desenvolvidos.
• Estes empréstimos são efetuados pela Corporação Financeira Internacional (CIF), que tem
como função propiciar financiamentos a longo prazo para os empreendedores
particulares, sob a forma de empréstimos ou de participação em ações da empresa, caso
em que a CIF não interfere na administração da empresa, a não ser em situação de perigo para
seus interesses.
• Não concede financiamentos a empresas públicas ou estatais.
• Os prazos dos financiamentos variam de 7 a 15 anos, de acordo com as características
do projeto financiado, assim como as taxas de juros cobradas.
���� CIF – Corporação Financeira Internacional - é um órgão do BIRD que capta recursos
internacionais para investimentos produtivos em países desenvolvidos. Tem como função
propiciar financiamentos a longo prazo para os empreendedores particulares, sob a forma de
empréstimos ou de participação em ações da empresa, caso em que a CIF não interfere na
administração da empresa, a não ser em situação de perigo para seus interesses.
���� A Associação Internacional de Desenvolvimento (AID) é outro organismo filiado ao BIRD ,
com funções semelhantes ao do BIRD , de financiamento e empréstimos para o desenvolvimento
de países subdesenvolvidos. A diferença básica com as operações realizadas pelo BIRD é que, por
envolver regiões mais carentes, seus financiamentos são feitos em melhores condições de taxas e
prazos.
EXIMBANK
���� O Export-lmport Bank (EXIMBANK) é uma instituição financeira do governo dos Estados
Unidos, dirigido por uma diretoria composta de Presidente e diretores nomeados pelo Presidente e
aprovados pelo Senado daquele país.
���� E a principal agência financeira operando na área internacional, com a finalidade de ajudar a
promover a exportação de produtos ou serviços dos Estados Unidos. Além de seus recursos, pode
levantar recursos junto ao Tesouro Americano e organismos financeiros privados.
• O EXIMBANK concede empréstimos nas seguintes modalidades:
• empréstimos diretos a importadores estrangeiros para pagamento de mercadorias
ou serviços aos exportadores norte-americanos.
• desconto de títulos de financiamentos concedidos por instituições financeiras
privadas, desde que relacionados com a exportação de produtos americanos.
• concessão de garantia em caso de empréstimo a um importador estrangeiro
comprador de produtos norte-americanos.
• financiamento consorciado, em que o EXIMBANK coloca a disposição de uma
instituição financeira estrangeira uma linha de crédito para ser usada no pagamento
de exportações norte-americanas,
• seguro de crédito de exportação, compreendendo riscos de créditos e riscos políticos.
LINHAS DE CRÉDITO COMERCIAL DE BANCOS PRIVADOS
���� Os bancos privados internacionais dos países desenvolvidos, principalmente dos países europeus,
motivados pelo crescimento do mercado dos eurodólares, concedem empréstimos diretamente a
empresas estrangeiras, para as compras realizadas de empresas exportadoras de seus respectivos
países.
���� Desse modo, a atuação destes bancos no comércio internacional é altamente positiva, pois
estimula a produção nacional, gerando empregos e aumentando o nível de consumo interno, e
equilibra o saldo do balanço de pagamentos de seus países.
21. INCENTIVOS ÀS EXPORTAÇÕES NO BRASIL
INCENTIVOS PREVISTOS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
• O IPI NÃO INCIDE sobre produtos industrializados destinados ao exterior;
• O ICMS não incide sobre operações que destinem ao exterior produtos
industrializados, exceto os semi-elaborados definidos em lei complementar.
BEFIEX
���� É um programa de incentivo às exportações baseado na concessão de benefícios fiscais para a
importação de bens que serão utilizados na fabricação de produtos para exportação
• Como incentivos fiscais deste programa, as empresas que tiveram seus programas de
exportação aprovados, têm isenção do Imposto de Importação e do IPI vinculado à
importação. Essas empresas, além dos demais benefícios fiscais existentes para as
exportações comuns, gozam ainda de benefícios fiscais com relação ao Imposto
de Renda.
PIS E COFINS
���� Atualmente, são ISENTAS da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social -
COFINS e Contribuição para o Programa de Integração Social - PIS - as receitas:
• da exportação de mercadorias para o exterior;
• dos serviços prestados a pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no
exterior, cujo pagamento represente ingresso de divisas;
• vendas realizadas pelo produtor-vendedor às empresas comerciais
exportadoras, desde que destinadas ao fim específico de exportação para o exterior;
• vendas, com fim específico de exportação para o exterior , a empresas
exportadoras registradas na Secretaria de Comércio Exterior do Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio;
• o Regime de incentivo às exportações passou a ter como características, a partir de 1990,
a AMPLIAÇÃO DAS MEDIDAS FISCAIS e o GRADUAL REVIGORAMENTO DOS
MECANISMOS DE FINANCIAMENTO e a MENOR ÊNFASE ÀS MEDIDAS
CAMBIAIS .
22. DIREITO ADUANEIRO
���� Conceituado como o conjunto de normas jurídicas codificadas que servem para regular o
comércio exterior e as atividades desenvolvidas pelas pessoas na intervenção perante as
Alfândegas.
���� o Direito Aduaneiro tem como principais objetivos:
• disciplinar e controlar a movimentação de bens, serviços, capitais e de pessoas
• o atendimento dos interesses nacionais em face do comércio internacional, respeitando
as normas externas em vigor, notadamente os tratados internacionais sobre comercio
exterior.
• Direitos Aduaneiros são os tributos que o Estado faz incidir sobre as mercadorias que
transpõem as fronteiras do território nacional, no ato da entrada ou da saída, ou seja,
direitos de importação e direitos de exportação.
• Mesmo que se reconheça como o principal objetivo dos direitos aduaneiros a captação
de novas receitas, deve ser reconhecida a existência de outras normas que não visam
captar novos recursos, mas o controle do comércio exterior, as denominadas Barreiras
não-tarifárias, que são obstáculos não-tarifários, que desempenham papel importante na
proteção da produção local.
Barreiras não-Tarifárias: São aplicadas por meio de regulamentos que incidem sobre
diferentes produtos e formas de comércio. Podem ser efetivadas
por restrições quantitativas (fixação de quotas por determinados
tipos de produtos), restrições de câmbio, regulamentos técnicos
e administrativos, formalidades consulares, comércio de
Estado e intercâmbio de determinados produtos.
• Inserido no direito positivo brasileiro, o conjunto de normas sobre comércio exterior
ainda não é reconhecido como um ramo autônomo do Direito, ou seja, o Direito
Aduaneiro ainda é considerado um sub-ramo do Direito Tributário, o que, conforme
exposto acima, não corresponde à realidade dos fatos, pois não se pode mais negar o
reconhecimento do Direito Aduaneiro, o que vem acarretando conflito de
competências entre os Ministério da Fazenda, do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio Exterior e das Relações Exteriores, contribuindo para a ineficácia de
políticas no setor.
A política comercial brasileira pode ser considerada como resultante da in-teração de fatores internos e externos. Este estudo concentrará a atençãonos condicionantes externos, embora na seção final sejam consideradoscenários quanto a condicionantes internos e externos. Os fatores externosque condicionam a política comercial brasileira podem, algo artificialmen-te, ser classificados como de dois tipos: os que resultam de negociaçõesmultilaterais, regionais ou sub-regionais em que o Brasil esteja envolvidodiretamente; e os que decorrem de negociações entre parceiros brasileirosque tenham implicações importantes sobre interesses econômicos do paísmas das quais o Brasil não participe. A capacidade de o governo brasileirointerferir diretamente com sucesso para flexibilizar as restrições externasoriundas de negociações em que não esteja diretamente envolvido é nula,restando apenas a possibilidade de tentar adotar iniciativas que cancelemas conseqüências desfavoráveis originais.
Este trabalho está dividido em cinco seções, além desta introdução. Na Se-ção 2 são considerados de forma sumária os condicionantes internos à polí-tica comercial. A Seção 3 analisa a importância do Brasil na economiamundial e, portanto, em alguma medida, seu poder de barganha relativo,de acordo com vários possíveis critérios alternativos. Na Seção 4 são anali-sadas as grandes negociações nas quais o Brasil poderá estar engajado nospróximos três a cinco anos: Organização Mundial de Comércio (OMC),Área de Livre Comércio das Américas (Alca), União Européia-Mercosul eampliação do Mercosul. A Seção 5 trata de negociações fora do âmbitomultilateral que estejam tendo ou possam ter efeitos importantes sobre osinteresses brasileiros do ponto de vista de desvio de comércio ou de investi-mentos: North American Free Trade Area (Nafta), ampliação da União Eu-ropéia e criação do Asia-Pacific Economic Cooperation Forum (Apec). Naseção final são considerados cenários alternativos quanto ao progresso des-sas diferentes negociações e incluídas conclusões baseadas no tratamentocombinado das análises das seções anteriores, com particular ênfase nascaracterísticas interdependentes das diversas negociações programadas, etambém considerando cenários alternativos quanto a políticas internas, talcomo analisados na Seção 2. Serão examinadas possíveis recomendaçõescom base na avaliação das combinações mais prováveis de cenários relati-vos a diferentes negociações.
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Política comercial brasileira
2. Condicionantes Internos da Política ComercialA consideração, mesmo que sumária, dos condicionantes internos à políti-ca comercial é necessária, pois na seção final serão combinados cenáriosrelativos a restrições internas e externas para discutir alternativas à políticacomercial brasileira em prazo mais longo. Entre os fatores internos que con-dicionam a política comercial brasileira, podem ser mencionados comomais relevantes os relativos ao que se poderia chamar de economia políticada proteção, a aspectos macroeconômicos e a fatores estruturais. Estes últi-mos podem estar relacionados tanto a deficiências competitivas internas àsempresas (como, por exemplo, incapacidade de inovar) quanto a ineficiên-cias relativas a fatores externos (como infra-estrutura).
A “economia política da proteção” reflete não apenas o poder de barganhasetorial diferenciado, que a experiência brasileira tem demonstrado ser dis-tribuído de forma muito heterogênea entre setores, mas também o preçoque a sociedade está disposta a pagar pela adoção de políticas que redun-dam na queda de seu nível de bem-estar e que não alcançam necessaria-mente os objetivos inicialmente propostos. Há, além disso, a conhecida as-simetria entre os grupos de interesse favoráveis e contrários à tarifa alta: oprimeiro é tipicamente composto por um número limitado de indústriasoperando ineficientemente e/ou extraindo lucros extraordinários no mer-cado interno, freqüentemente em coalizão com sindicatos que represen-tam os trabalhadores nelas empregados; e o segundo grupo é compostopor um grande número de consumidores que pagam preços mais altos pe-los bens que adquirem do que seria o caso se a tarifa fosse mais baixa.Embora o custo da proteção do ponto de vista do consumo seja alto em ba-ses agregadas, isso é resultado da soma de um grande número de pequenasperdas de bem-estar. Conseqüentemente, os interesses desses consumido-res são dispersos, enquanto os dos produtores são concentrados. O estímu-lo a uma ação política eficaz é muito maior para os produtores do que paraos consumidores.1
Além disso, a persistência da proteção alta no Brasil teve a ver com uma pe-culiaridade brasileira. Dado que o país era market maker no mercado mun-
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1 Embora esse argumento seja geralmente associado a Olson (1965), um precursor extre-mamente importante, inclusive porque concentra a atenção em temas da política co-mercial dos Estados Unidos, é Schattschneider (1935).
dial de café, sua curva de custo marginal se refletia na curva de oferta mun-dial do produto. Tarifa alta significava custos mais altos de insumos impor-tados. Quanto maior fosse a importância do café na economia e quantomelhor os custos de importações refletissem os custos agregados com insu-mos na cafeicultura, mais realista seria essa hipótese. É possível mostrar em-piricamente que, durante longo período da história brasileira, variações nonível de proteção refletiram-se em variações no preço mundial do café.Assim, no Brasil, embora a imposição de uma tarifa de importação acarre-tasse as usuais distorções do ponto de vista do consumo e da produção,pelo menos parte do efeito desfavorável sobre o bem-estar era compensa-da pelos aumentos de preços internacionais do café. Dado que a demandapelo produto era inelástica em relação ao preço, tais aumentos não afeta-vam de forma significativa as quantidades exportadas [ver Abreu e Bevila-qua (2000)]. É claro que esse argumento deixou de ter relevância à medidaque se tornava mais diversificada a economia brasileira e que se esgotavade fato a possibilidade de substituir importações.
De qualquer modo, com base na história remota e nos argumentos usuaisquanto à indústria nascente, e dado o desempenho brasileiro extremamen-te satisfatório quanto ao crescimento econômico entre 1900 e 1980, con-solidou-se a idéia, até hoje popular, de que proteção alta e crescimento rá-pido estariam de alguma forma associados. O aumento da importância decritérios de eficiência na definição da política comercial brasileira a partirdo final da década de 80 certamente retratou o aumento da resistência, talcomo refletida no processo decisório, à manutenção de proteção alta emum quadro de estagnação da renda per capita.
Ambientes macroeconômicos diferentes têm implicações diferenciadas so-bre a política comercial. Entre 1947 e o início da década de 90, a crônicainstabilidade macroeconômica no Brasil, em certos períodos combinadacom sobrevalorização cambial, levou ao uso contínuo de controle quantita-tivo das importações, de acordo com as regras então bastante frouxas doGatt, com base no artigo XVIII:B. A incerteza quanto à capacidade de limi-tar importações levou também à baixa incidência de consolidações tarifá-rias brasileiras até a Rodada Uruguai. As disciplinas mais exigentes relacio-nadas ao artigo XVIII resultantes da Rodada Uruguai, bem como a consoli-dação de 100% das alíneas tarifárias brasileiras, tornam menos viável, cete-ris paribus, a adoção de regimes cambiais que gerem desequilíbrios siste-máticos do balanço de pagamentos. Além disso, obviamente, diferentes
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regimes fiscais têm implicações muito diferenciadas sobre a política co-mercial, especialmente em situações de transição, como a que atualmenteatravessa o país, nas quais critérios subótimos podem prevalecer na escolha daestrutura de taxação, com conseqüências indesejáveis sobre a competitivida-de externa. Um exemplo é o uso persistente de tributos que incidem sobre ovalor da produção e são, portanto, de difícil desoneração nas exportações.
A concentração da pauta de exportações brasileira em produtos e merca-dos de crescimento relativamente modesto é fato conhecido: infelizmente,as conclusões dos estudos do início da década de 90 continuam em geralválidas [ver BNDES (1993) e Batista (1998)]. A baixa sofisticação tecnológi-ca das exportações brasileiras, que leva à rigidez estrutural da pauta, estáassociada, de forma importante, a deficiências internas à firma. Os fatoresestruturais externos à firma que limitam a expansão das exportações (mas,em muitos casos, também as importações) foram exaustivamente analisa-dos no quadro das discussões sobre o que se apelidou de “custo Brasil” etêm merecido, no passado recente, menos atenção do que fazia supor aênfase original quanto a seus efeitos indesejáveis.
3. O Brasil na Economia Mundial
O Brasil é um país pequeno se for levada em consideração a sua importân-cia no total das exportações (ou importações) mundiais. Em 2000, essa par-ticipação era de apenas 0,87% do total,2 comparada a um pico no século20 de 2,2% em 1952, quando os preços do café cresceram espetacular-mente. É claro que no caso de produtos específicos essa participação ésubstancialmente maior, especialmente em alimentos – entre outros, café(17,8% das exportações mundiais), tortas para animais (10,2%), soja emgrão (15,5%), açúcar (13,5%) e suco de laranja (80%) –, mas também emprodutos industrializados selecionados, tais como manufaturas de ferro eaço em formas primárias (6,3%). Comparada com a estrutura das exporta-ções mundiais, a existente no Brasil caracteriza-se pela maior importânciaconferida aos alimentos (quase 30% das exportações totais em 1997, emcomparação com menos de 9% para o mundo), compensada pela menor
2 Estados-membros de zonas de livre-comércio ou mercados comuns sendo consideradosindividualmente.
importância das exportações de manufaturas (54% do total contra a 75%).O agregado minérios e combustíveis é comparável no Brasil e no mundo(em torno de 11%), mas o país praticamente não exporta combustíveis, en-quanto estes respondem por 8% das exportações mundiais totais [Unctad(2000b)]. Dados alternativos da OMC para 1999 confirmam a maior im-portância relativa das exportações brasileiras nos mercados de alimentos(3,2% do total mundial) e produtos siderúrgicos (2,5%), enquanto nas ex-portações de manufaturas em geral a participação é de apenas 0,61%[WTO (2000)].
Esses dados agregados merecem alguma qualificação. Embora o Brasil sejauma economia com exportações bastante diversificadas geograficamentequando comparada a todas as outras economias do hemisfério fora a dosEstados Unidos e as do Cone Sul, a importância comercial brasileira é mui-to maior nas Américas (Estados Unidos, Aladi e Mercosul) e na União Euro-péia do que em outros mercados, especialmente na Ásia. Por outro lado,mesmo nos mercados nos quais o país tem maior presença, a composiçãodo comércio varia substancialmente. Por exemplo, a proporção de manu-faturados, segundo definição do Ministério do Desenvolvimento, Indústriae Comércio Exterior (MDIC) no total das exportações brasileiras nos primei-ros 11 meses de 2001 foi de cerca de 56%. Mas, enquanto a proporção foide 90% nos mercados da Aladi, exclusive Mercosul, e no próprio Mercosul,e de 80% nos Estados Unidos, ficou em apenas 35% no mercado da UniãoEuropéia, de acordo com dados do MDIC.
Por outro lado, em relação a muitos dos temas que hoje tipicamente são in-cluídos em negociações comerciais, a variável mais relevante não é o fluxoexistente de comércio, mas sim algo que reflita o tamanho dos mercados.Dado que a economia do Brasil é bastante mais fechada do que na médiados países, não é surpreendente que medidas tradicionais de abertura ten-dam a subestimar a importância relativa do país em negociações comerciais.A participação brasileira no PNB mundial em 1999 era de 2,54% (2,74%com base em critérios de paridade do poder de compra),3 enquanto a po-
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3 Para as economias maiores do que a brasileira, as participações no PNB-PPC (PNB corri-gido para levar em conta a paridade do poder de compra da moeda nacional) mundialeram em 1999 de 21,52% para os Estados Unidos, 20,16% para a União Européia,10,6% para a China, 7,84% para o Japão e 5,53% para a Índia. O PNB-PPC do Canadá,interlocutor privilegiado dos Estados Unidos, da União Européia e do Japão em vários fo-ros internacionais, era apenas 1,87% do PNB-PPC mundial, segundo dados do WorldBank (2001, p. 274-275).
pulação representava 2,81% da população mundial e, portanto, o PNB percapita era algo inferior à média mundial (US$ 4.420 contra US$ 4.890). Aárea do Brasil, variável de forma genérica associada a possibilidades de ex-pansão econômica futura, corresponde a 6,4% da área total mundial.4
A importância relativa do Brasil como destino de investimento estrangeirodireto (IED) é ainda maior do que a referente ao PNB mundial. A participa-ção brasileira no estoque total de IED em 1999 era de 3,44% do total mun-dial (11,41% do estoque em economias em desenvolvimento). A participa-ção do Brasil nos fluxos de IED do final da década de 90 foi relativamentealta, especialmente se comparada à retração da entrada de capitais na dé-cada de 80 e na primeira metade da de 90: 3,63% do total em 1999(15,12% do fluxo para economias em desenvolvimento), conforme dadosde Unctad (2000a, Anexo B).
4. Negociações Simultâneas: OMC, Alca,Mercosul-União Européia e Ampliação eAprofundamento do Mercosul
Os acontecimentos dos últimos meses tenderam a confirmar que o Brasilenfrentará nos próximos anos uma agenda de negociações comerciais ex-tremamente pesada, as quais se desenvolverão pelo menos em quatro dire-ções, mesmo sem levar em conta novas iniciativas de natureza bilateral, emespecial a aproximação em relação a outras grandes economias em desen-volvimento com renda per capita semelhante ou inferior à brasileira, taiscomo África do Sul, China, Índia ou Rússia.5 Em qualquer caso, essas inicia-tivas, embora possam ter implicações políticas importantes, mesmo quecoroadas de sucesso no plano comercial, dificilmente terão grande impacto
4 Dados do World Bank (2001, p. 274-275), exclusive áreas árticas e antárticas, de peque-nas economias e de certas economias excluídas da listagem principal do Banco Mundial.Se a proporção referir-se a áreas em princípio com possibilidades de aproveitamentoeconômico, certamente a proporção referente ao Brasil é significativamente maior, ain-da segundo dados do World Bank (2001, p. 274-275).
5 Os níveis de PNB per capita PPC em 1999, segundo dados do World Bank (2001), eramde US$ 8.318 na África do Sul, US$ 3.291 na China, US$ 2.144 na Índia e US$ 6.339 naRússia, enquanto o do Brasil atingia US$ 6.317.
no médio prazo sobre os fluxos comerciais bilaterais, dada a modéstia dosfluxos atuais.6
As negociações relativas à promoção de nova rodada de negociações multi-laterais, em dúvida desde o abortado lançamento da Rodada do Milênio, emSeattle, foram coroadas de sucesso em Doha, onde se definiu que as nego-ciações relativas ao programa de trabalho deverão estar concluídas até o iní-cio de 2005. No âmbito da Alca, a aprovação da Trade Promotion Authoritypela House of Representatives dos Estados Unidos no fim do ano passado,embora acompanhada de condicionalidades que poderão comprometer oêxito das negociações, sugere que haverá aprovação pelo Senado, que legiti-mará a posição negociadora do Executivo norte-americano em processo queculminará também no início de 2005. As negociações entre Mercosul eUnião Européia estão em curso. Em julho de 2001, a União Européia apre-sentou sua oferta de negociação tarifária e não-tarifária relativa a bens, assimcomo propostas sobre serviços e compras governamentais. No final de se-tembro, o Mercosul apresentou sua proposta e, em princípio, a expectativaseria que o assunto fosse retomado no âmbito do Comitê de NegociaçõesBi-Regionais em reunião a ser realizada em Buenos Aires em março de 2002.O abandono da paridade argentina na virada do ano tem, entre suas conse-qüências mais importantes, a possível superação, pelo menos no médio pra-zo, das crescentes dificuldades bilaterais entre Argentina e Brasil desde a des-valorização brasileira do início de 1999. É possível, e até provável, que sejamenfrentadas grandes tensões de curto prazo, na medida em que o populismodo peronismo tradicional tenha reflexos na política comercial e implique aadoção temporária de políticas de substituição de importações. Mas, passa-da a fase mais atribulada da aterrissagem de um regime cambial alternativo àparidade fixa, estariam criadas as condições para retomar as negociaçõesquanto ao aprofundamento do Mercosul e, também, quanto a eventuais ne-gociações para a inclusão de outros parceiros.
4.1. Negociações na OMC
As negociações comerciais multilaterais ocupam posição de destaque nasprioridades da diplomacia comercial do Brasil, em vista da diversificaçãogeográfica de seu comércio. Em contraste com os demais países do hemis-
6 Esses mercados responderam por 0,6% (África do Sul), 3,4% (China), 0,5% (Índia) e 1,9%(Rússia) das exportações totais brasileiras nos primeiros 11 meses de 2001.
fério, o Brasil, os Estados Unidos e as economias do Cone Sul têm signifi-cativa participação em mercados extra-hemisfério. O lançamento denova rodada na OMC, em Doha, em novembro de 2001, com a definiçãode um programa de trabalho que deverá estar concluído até o início de2005, refletiu um compromisso bastante favorável aos interesses específi-cos brasileiros [ver WTO (2000)]. Um acordo paralelo permitiu conciliaros interesses relacionados à saúde pública com as regras preexistentes re-lativas à propriedade intelectual. Assim, foram bastante reduzidos os cus-tos para os países em desenvolvimento associados à implementação dalegislação relativa à TRIPs aprovada na Rodada Uruguai que seria imple-mentada depois do período de transição previsto. De fato, a posteriori, aocontrário das expectativas dominantes antes da conclusão da RodadaUruguai, era a legislação sobre a TRIPs que poderia ter implicações desfa-voráveis mais significativas para os países em desenvolvimento.
O Brasil em Doha esteve longe de ter objeções tão radicais quanto outrospaíses em desenvolvimento importantes, como a Índia, em relação à incor-poração no quadro da OMC de novas regras sobre os “temas de Cingapu-ra”, concorrência e investimento estrangeiro direto. De qualquer modo, es-ses temas foram postos em banho-maria até a próxima reunião ministerialda OMC, dentro de dois anos, com a agenda limitada a trabalhos prepara-tórios. Negociações poderão então ocorrer, desde que haja “consenso ex-plícito”. Com relação a meio ambiente, foi contida a proposta mais extre-ma da União Européia no que se refere à norma de precaução, e o texto foiqualificado pela reserva “sem implicar pré-julgamento quanto ao resultadodas negociações”. De qualquer modo, as negociações não parecem ofere-cer ameaça, pois se concentrarão nas relações entre as regras da OMC e asobrigações comerciais específicas estabelecidas em acordos multilateraissobre o meio ambiente.
No terreno menos defensivo, os interesses brasileiros concentravam-se emdois temas: protecionismo agrícola, em particular o desmantelamento desubsídios à exportação, e legislação antidumping. Como membro da coali-zão de Cairns, que reúne países favoráveis ao desmantelamento do prote-cionismo agrícola, o Brasil pressionou pela inclusão de menção explícita àeliminação de subsídios à exportação de produtos agrícolas (reductions of,with a view to phasing out, all forms of export subsidies), além de substancialmelhoria no acesso a mercados e de considerável redução do apoio à pro-dução doméstica que implique distorções no comércio de produtos agríco-
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las. A União Européia, embora tenha indicado sua discordância com rela-ção à menção ao phasing out, preferiu não arcar com os custos do fracassode uma outra tentativa de lançamento de uma rodada da OMC e satis-fez-se com a reserva de que não havia implicação de pré-julgamento quan-to ao resultado das negociações. A redação possui a grande virtude de po-der servir de base a que todas as facções em disputa reivindicassem ter sidovitoriosas. Resta saber que repercussões concretas terá o compromisso di-plomático nas negociações em Genebra.
De forma similar, houve grande pressão em Doha sobre os Estados Unidosquanto à efetividade das regras multilaterais existentes com relação a anti-dumping, em particular as limitações impostas pelo artigo 17 sobre consultase solução de controvérsias relativas a ações antidumping restringindo a açãode panels (grupos especiais) a questões factuais e os limites ao uso de legisla-ções nacionais com finalidades protecionistas. A resistência norte-americanasó foi contornada com uma linguagem de compromisso que, ao mesmo tem-po, mencionou negociações visando à clarificação e à melhoria das discipli-nas relevantes e enfatizou a preservação de conceitos básicos, princípios eeficácia dos acordos preexistentes. Também nesse caso a vitória foi reivindi-cada por todos, e a “prova do pudim” ficará por conta das negociações con-cretas em Genebra. As restrições recentemente impostas pela House of Re-presentatives e pelo Senado dos Estados Unidos aos termos da Trade Promo-tion Authority concedida ao governo para negociações comerciais regionaise multilaterais sugerem que o “espírito de Doha” não chegou ao Congressonorte-americano. Na Subseção 4.2, a seguir, esse assunto será retomado.
Do ponto de vista de países como o Brasil, um cenário extremamente favo-rável seria que um provável impasse com relação aos dois temas em Gene-bra pudesse ser resolvido por concessões recíprocas entre os Estados Uni-dos e a União Européia, de tal forma que aumentasse significativamente oritmo de redução do protecionismo agrícola e fossem viabilizados controlesmultilaterais aos excessos decorrentes da implementação da legislação an-tidumping norte-americana. Esse cenário é certamente excessivamente oti-mista. Talvez sejam possíveis avanços modestos nos dois casos, mas ambosos temas fazem parte do âmago das posições mais renitentemente prote-cionistas nos dois lados do Atlântico.
A história do Gatt e da OMC tem sido marcada pela sistemática vitória deformatos de negociação caso a caso, na base de trocas de concessões espe-
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cíficas definidas à luz de ofertas que não incluem o universo de produtos, arespeito do tratamento sem exceções de todas as barreiras tarifárias enão-tarifárias incidentes sobre o comércio de bens. A redução da proteçãoincidente sobre produtos ditos “sensíveis” foi sistematicamente protelada.Formou-se, assim, um significativo backlog de produtos à margem da libe-ralização multilateral, quase sempre, e não surpreendentemente, de inte-resse especial dos países em desenvolvimento, como ilustram os casos deprodutos têxteis e agrícolas. Com base na história, é difícil evitar o ceticismoe considerar provável que, de fato, a nova rodada na OMC marque umagrande descontinuidade em relação ao passado. De qualquer forma, não éperda de tempo insistir que o antídoto para o backlog seria a adoção de fór-mula de aplicação automática incidente sobre os equivalentes tarifários detodos os instrumentos de proteção.
4.2. Negociações Regionais no Âmbito da Alca
As preocupações brasileiras quanto às negociações da Alca podem ser sin-tetizadas como consistindo em três aspectos principais: distribuição tem-poral das concessões recíprocas referentes a acesso, especialmente no casode bens; garantia de inclusão de temas de especial interesse brasileiro, emparticular legislação antidumping, subsídios agrícolas e ajustes às regras re-lativas à propriedade intelectual; e garantia de que a inclusão de temascomo normas trabalhistas e meio ambiente não sirva de base para o uso deinstrumentos adicionais de proteção, especialmente nos Estados Unidos.
A Trade Promotion Authority aprovada na House of Representatives no iní-cio de dezembro de 2001, em tramitação final no Senado, habilitará o Exe-cutivo, a negociar em diversos foros de negociação comercial. A tramitaçãono Congresso exigiu substanciais concessões por parte do Executivo, de talforma que no formato que saiu da House of Representatives as condiciona-lidades correm o risco de inviabilizar o bom êxito das negociações, em es-pecial na Alca, embora as referências a meio ambiente e a normas traba-lhistas tenham sido relativamente inocentes, porque o escopo para conces-sões relevantes em cítricos, açúcar e têxteis foi consideravelmente restringi-do. Além disso, foi incluída uma espantosa cláusula sobre instrumentospara conter ameaças implícitas na possível manipulação da taxa de câmbiopor governos estrangeiros, do que resultariam vantagens comparativas “ar-
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tificiais” no comércio internacional. O precedente aberto pela universaliza-ção dessa provisão inepta aprovada pelo Congresso dos Estados Unidosconstitui séria ameaça ao atual ordenamento das relações comerciais e nãoencontra amparo na legislação internacional. Assim, tanto do ponto de vis-ta de acesso, no caso de exportações de bens, quanto dos temas mais carosao Brasil, como antidumping e subsídios agrícolas, as perspectivas sãopouco animadoras. O texto do Senado provavelmente incluirá emenda queviabilizaria a apreciação em separado de partes de acordos da atual legisla-ção norte-americana de defesa comercial, afetando de forma crucial a au-toridade negociadora do Executivo. É difícil imaginar que da conciliaçãodos dois textos surja algo animador quanto às perspectivas futuras das ne-gociações comerciais em âmbito regional ou multilateral.
Também na negociação relativa a bens no contexto hemisférico são enfren-tados temas familiares aparentados aos do backlog na OMC. A liberalizaçãoda política comercial dos Estados Unidos no longo prazo ocorreu de tal for-ma que, embora a tarifa média do país seja muito baixa, os picos tarifários,as quotas tarifárias e as barreiras não-tarifárias, incluindo direitos discricio-nários aplicados à sombra da legislação antidumping, tornam o mercadonorte-americano extremamente protegido no caso de diversos produtosagrícolas e, também, de insumos industriais. A tarifa média brasileira, em-bora significativamente mais alta que a dos Estados Unidos, retrata commuito maior precisão a real proteção de que goza a indústria domésticafrente às importações. Estudos recentes promovidos pela Embaixada doBrasil em Washington retratam essa disparidade, embora de forma rudi-mentar: enquanto a tarifa média incidente sobre os 15 mais importantesprodutos brasileiros importados pelos Estados Unidos foi de 45,6%, sobreas 15 mais importantes importações brasileiras provenientes dos EstadosUnidos ela foi de 14,3%. O problema é que esses cálculos para a tarifa nor-te-americana foram feitos tomando como referência as tarifas incidentessobre importações extraquota no caso das quotas tarifárias referentes aaçúcar (338,7%) e fumo (350%), embora nesse último caso nem mesmo ovolume além do qual se aplica a tarifa alta tenha sido alcançado. De qual-quer forma, é difícil caracterizar, de um lado, o Brasil como país protecio-nista e, de outro, os Estados Unidos como país liberal [Embaixada do Brasilem Washington (2001, p. 92-94)].
Estudos sobre o impacto da Alca nos fluxos comerciais brasileiros indicam,ao fim da desgravação tarifária total, uma expansão relativamente modesta
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das exportações e bastante mais significativa das importações. Isso se deve,ao menos em parte, às dificuldades de levar em conta as barreiras não-tari-fárias que afetam o comércio hemisférico, especialmente nos Estados Uni-dos.7 As estimativas de ganhos de bem-estar gerados pela Alca são modes-tas, talvez da ordem de 0,3% do PIB brasileiro, em comparação com umataxa de 1,06% no caso de um acordo preferencial com a União Européia[ver Pereira (1997)]. A racionalização para as vantagens da Alca estaria re-lacionada fundamentalmente, como no caso do Nafta, não à esfera comer-cial, mas à redução do custo de capital que adviria da queda do diferencialde taxas de juros entre os Estados Unidos e o Brasil. No momento, as indi-cações são que os Estados Unidos vivem a ilusão de que a estratégia de so-mething for nothing tem possibilidade de vingar. Parece improvável que,mesmo que não haja grande discontinuidade política no Brasil, seja fácilencontrar um compromisso mutuamente aceitável quanto ao timing dedesgravação no período de transição.
Entretanto, a viabilização política da Alca no Brasil depende crucialmenteda capacidade de os Estados Unidos se mobilizarem internamente paraque seja viável fazer ofertas relevantes quanto a subsídios agrícolas, legisla-ção antidumping e/ou acesso de exportações brasileiras sensíveis no mer-cado norte-americano. Só assim seria possível pensar em romper as re-sistências à abertura total do mercado brasileiro em um prazo entre 10 e15 anos.
A não entrada do país em uma “Alca exclusive Brasil”, ou exclusive Merco-sul, significaria um retrocesso para os Estados Unidos, cujos interesses co-merciais hemisféricos fora do Nafta estão fortemente concentrados noMercosul. O fracasso nos entendimentos entre Brasil (ou Mercosul) e Esta-dos Unidos e a eventual constituição de uma área de comércio preferencialhemisférica sem a participação brasileira teriam sérias conseqüências sobreos interesses comerciais brasileiros, em vista da importância dos mercadoslatino-americanos, especialmente no caso de manufaturas. De fato, as ex-portações de manufaturas para a Aladi (exclusive Mercosul) em 2001 foram
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7 Ver Carvalho e Parente (2000, p. 119). Neste estudo, estima-se que o impacto final daAlca (barreiras tarifárias) sobre as exportações e importações brasileiras seria de, respecti-vamente, 7% e 17%.
quase tão importantes quanto para a União Européia e da ordem de 45%para os Estados Unidos.
O cenário de fracasso tornaria necessária a implementação de uma estraté-gia brasileira de limitação de danos. Dado que, presumivelmente, as difi-culdades principais teriam origem na impossibilidade de acomodação dosinteresses recíprocos Mercosul-Estados Unidos, seria necessária a negocia-ção de um grande número de acordos bilaterais, idealmente de livre-co-mércio, que limitassem o impacto da concorrência das exportações nor-te-americanas nos mercados da Aladi, exclusive Mercosul. Seria de algumaforma a generalização de uma desejável política de compensação dos des-vios de comércio produzidos pelo Nafta especialmente no mercado mexi-cano, como se verá adiante.
4.3. Negociações entre Mercosul e União Européia
O interesse do Mercosul nas negociações com a União Européia está relacio-nado ao avanço de outras negociações comerciais tanto no âmbito da Alcaquanto na nova rodada da OMC. O interesse nas negociações União Euro-péia-Mercosul será tanto maior quanto mais rapidamente avancem as ne-gociações da Alca, pois liberalizações paralelas minimizarão desvios de co-mércio e pendências futuras com parceiros comerciais com interesses pre-judicados. Se as negociações na OMC não progredirem, a forma de replicarimperfeitamente as negociações multilaterais seria prosseguir paralelamen-te com as negociações na União Européia e na Alca.
Em julho de 2001 a União Européia fez uma modesta oferta de negociaçãotarifária e não-tarifária ao Mercosul.8 A proposta tarifária é simétrica, isto é,os dois lados desgravarão sua tarifa de acordo com o mesmo cronograma. Amédia de importações da União Européia com origem no Mercosul em1998/2000 foi de 18,4 bilhões de euros, dos quais 8,9 bilhões correspon-dem a produtos agrícolas, 8,8 bilhões a produtos industriais e 0,5 bilhão aprodutos da pesca. Destes, respectivamente, 60%, 47% e 1% entram na
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8 Ver www.europa.eu.int/comm/external_relations/mercosur, Fifth meeting of the Europe-an Union-Mercosur Biregional Negotiations Committee, 2-6 July 2001, Montevideo,Uruguay; Sixth meeting of the European Union-Mercosur Biregional Negotiations Com-mittee, 29-31 October 2001, Brussels, Belgium [ver CNI (2001a)].
União Européia sem tarifas. A proposta da União Européia trata, portanto,de importações de 3,1 bilhões de euros em produtos agrícolas, 2,1 bilhõesem produtos industriais e 0,5 bilhão em produtos de pesca.
Os bens foram divididos em seis categorias. As quatro primeiras teriam suastarifas reduzidas anualmente em bases lineares nos prazos de zero, quatro,sete e 10 anos. Para todos os produtos, exceto os agrícolas, a desgravaçãoestará completa em 10 anos, sendo que a maior parte da desgravação dastarifas sobre produtos industriais estará completa também em 10 anos. Paraos produtos agrícolas, entretanto, a maior parte da desgravação só ocorre-ria depois de sete anos, sendo previstas duas outras categorias: na categoria5 (vinhos e licores) haveria acordos específicos; e na categoria 6, que incluiampla gama de produtos (cereais, azeite de oliva, lácteos, carnes, fumo,açúcar e algumas frutas e legumes processados), a União Européia estariadisposta a negociar maior liberalização na forma de quotas tarifárias prefe-renciais. Embora a proposta mencione que as importações relativas à cate-goria 6 correspondem a 0,9 bilhão de euros, é claro que esse número pou-co significa em vista da alta proteção que afeta tais produtos na União Euro-péia, cuja proposta é omissa quanto a barreiras não-tarifárias e prevê tam-bém uma proposta quanto à inclusão de serviços e de compras governa-mentais no escopo do acordo de livre-comércio.
A contraproposta do Mercosul, apresentada no final de outubro de 2001,cobria a desgravação de 33% das importações da União Européia proveni-entes do Mercosul em 10 anos [ver CNI (2001b)] e tomava por base as tari-fas da TEC e não os 35%-55% consolidados na OMC. Essa oferta aparente-mente não foi condicionada a tratamento simétrico dos produtos do Mer-cosul que hoje se beneficiam do Sistema Geral de Preferências na UniãoEuropéia, embora se tenha mencionado que o Mercosul pretende obtertratamento que leve em conta benefícios já existentes sob tal sistema. Pare-ce difícil aceitar, com base em argumentos de reciprocidade, que, enquan-to a proposta do Mercosul baseia-se em tarifas efetivamente aplicadas, aoferta da União Européia restrinja-se a tarifas consolidadas na OMC. As ne-gociações devem incluir explicitamente barreiras não-tarifárias, eliminaçãode subsídios e barreiras internas, especialmente relevantes no caso de pro-dutos agrícolas. A proposta é assimétrica, ou seja, enquanto a liberalizaçãoda União Européia seria de acordo com a sua proposta original, a propostado Mercosul seria implementada mais lentamente, incluindo ainda, entre
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outros, temas tais como tratamento especial e diferenciado, redução de pi-cos tarifários europeus e acordos sobre equivalência de medidas sanitáriase fitossanitárias. Em grande medida, as limitações da proposta do Mercosulsão um reflexo das limitações da modesta oferta inicial européia. Nas nego-ciações com outros países em desenvolvimento pouco competitivos emagricultura com os quais celebrou recentemente acordos de livre-comércio(México, por exemplo), a União Européia concordou com desgravação as-simétrica, sendo a convergência para zero de suas tarifas para produtos in-dustriais em dois anos e meio, enquanto a redução das tarifas mexicanasserá implementada em quatro anos e meio.
A proposta do Mercosul pode ser considerada um tour de force, tendo emvista o quadro de dificuldades por que passava a Argentina e que culminouna crise cambial do final de 2001, o que torna mais verossímil a negociaçãodo Mercosul em bloco com a União Européia, uma vez superado o períodomais traumático de ajuste às novas condições nos próximos meses. Casofracassem as negociações com a União Européia, não há como conter asconseqüências relacionadas a atuais ou futuros desvios de comércio, emvista das características de mercado comum da União Européia e da conse-qüente aplicação de uma tarifa externa comum por seus membros atuais,bem como por novos integrantes na Europa Central e Oriental. A evidênciaquanto ao ocorrido até 1996 indica que os produtos brasileiros foram des-locados por uma ampla gama de fornecedores na União Européia, masprincipalmente pela China, pela Rússia e pelos países ibéricos (Espanha ePortugal), membros mais recentes da União Européia [ver Batista (2001,Quadro 7)].
4.4. Negociações sobre o Aprofundamento e a Ampliação doMercosul
A situação de instabilidade que atravessa a Argentina torna ainda mais es-peculativas as considerações sobre eventuais aprofundamentos e expan-sões do Mercosul do que seria normalmente o caso. O colapso argentinofaz mais verossímil futuras negociações relativas ao aprofundamento dobloco rumo ao mercado comum, mas torna mais difíceis as negociaçõesquanto à sua expansão, pelo menos no médio prazo, pois certamente os úl-timos acontecimentos fizeram com que eventuais parceiros ficassem bas-
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tante relutantes quanto à conveniência de associação a uma zona de co-mércio preferencial com tão atribulada história de desequilíbrios macroe-conômicos. A direção dos esforços continua a ser as economias do PactoAndino e a África do Sul. Nesse último caso, a mobilização é fundamental-mente política, pois interessa ao Brasil sublinhar que a negociação da Alcanão configura qualquer restrição à política externa brasileira em escala glo-bal. Só no longo prazo a integração do Mercosul com a Southern Africa De-velopment Community poderá ter importantes conseqüências econômi-cas. Dadas as limitações do atual comércio entre Brasil e África do Sul, asnegociações para implantação de uma área de comércio preferencial po-deriam ser conduzidas de forma bastante radical, com cronograma de im-plantação muito curto, exceto para o caso de um limitadíssimo conjunto deprodutos sensíveis, acompanhado de um sistema de salvaguardas para tra-tar de surtos de comércio que possam ter conseqüências temporárias inde-sejáveis para produtores nacionais competitivos com importações.
5. Interesses Brasileiros e Iniciativas de Integraçãoque Excluem o Brasil
A criação de novas áreas de comércio preferencial e a ampliação das jáexistentes estão tendo ou poderão ter impactos importantes sobre o co-mércio de exportação brasileiro e também sobre a atração de investimen-tos diretos, o que inclui seguramente as conseqüências do Nafta e a amplia-ção da União Européia na Europa Central e Oriental, assim como, em umfuturo mais remoto, o impacto da Apec. Em alguns casos, os prejuízos co-merciais poderão ser atenuados por iniciativas brasileiras relacionadas coma celebração de acordos preferenciais bilaterais, de tal forma que sejamcontrabalançados os desvios de comércio gerados pela área preferencialoriginal.
O mais importante caso recente de área de comércio preferencial que pro-vocou desvios de comércio desfavoráveis ao comércio de exportação brasi-leiro foi o Nafta. A evidência indica que preferências tarifárias tiveram pa-pel crucial no deslocamento das exportações brasileiras para os EstadosUnidos e o México. A China e o México, e em menor medida o Canadá, fo-ram os mais importantes competidores do Brasil no mercado dos EstadosUnidos entre 1992 e 1996, respondendo por cerca da metade das perdas
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sofridas pelo país. Só o México respondeu por cerca de um terço das per-das líquidas brasileiras no mercado dos Estados Unidos nesse período. Si-milarmente no mercado mexicano, mais da metade das perdas brasileirasdecorreram de competição direta das exportações norte-americanas.9 Pre-sumindo que os obstáculos relativos a uma negociação bilateral com osEstados Unidos sejam dominantes, não há nada a fazer com relação à com-petição de exportações dos parceiros do Nafta no mercado norte-america-no, a não ser com adesão à Alca. Mas para preservar o mercado mexicanoseria em princípio possível negociar um acordo bilateral, embora estudosempíricos indiquem que as exportações mexicanas para o Brasil poderãoexpandir-se significativamente, conforme se pode depreender pelas con-clusões de Batista (2000).
Outra fonte de preocupação quanto a desvios de comércio refere-se à am-pliação da União Européia, em particular quanto à expansão das exporta-ções das economias do leste europeu. Nesse caso, não há postura defensi-va possível, a não ser com a celebração de um acordo Mercosul-União Eu-ropéia, dada a natureza da União Européia e sua política comercial comume ao fato de que o Brasil não tem presença comercial importante no lesteeuropeu.
As preocupações brasileiras quanto à Apec, embora mais remotas, têm doisfocos: de um lado, as preferências comerciais poderiam abarcar diversaseconomias cujas exportações que poderiam competir diretamente com asexportações brasileiras para os Estados Unidos no caso de não prosperar aAlca; e, de outro, o acesso preferencial dos Estados Unidos e do México,entre outros competidores brasileiros, aos mercados asiáticos poderiacomprometer a estratégia que se pensa adotar no Brasil quanto à concen-tração dos esforços de promoção das exportações nos mercados asiáticos.A preempção de possíveis efeitos desfavoráveis relacionados às preferên-cias no contexto da Apec recomendaria negociações bilaterais defensivasdo Brasil com os seus principais parceiros comerciais potenciais no Orien-te, certamente a China e possivelmente a Coréia do Sul e Taiwan, entreoutros.
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9 Ver Batista (2001, Quadro 7). Para um tratamento detalhado das conseqüências do Naf-ta sobre os mercados dos Estados Unidos e do México, ver Batista (2000, passim) e Batis-ta e Azevedo (2000, passim).
6. Conclusões: Cenários de Médio Prazo para aPolítica Comercial Brasileira
Diferentes cenários quanto aos desdobramentos políticos no Brasil em2002 poderão afetar os rumos de sua diplomacia econômica, embora fre-qüentemente seja exagerada a margem de manobra para alteração radicaldo envolvimento ou mesmo da postura assumida pela diplomacia em di-versos foros de negociação. Há elementos inerciais importantes que devemser levados em conta: o Brasil continuará membro da OMC e com certezahonrará seus compromissos internacionais quanto a engajar-se em negocia-ções internacionais e buscar resultados que estejam em sintonia com os in-teresses nacionais e tenham o necessário respaldo político. No quadro daeconomia política da proteção, é provável que na maioria dos cenários in-ternos que hoje se pode vislumbrar a postura brasileira tenda a ser menoscomprometida com o avanço da liberalização do que atualmente. Mas essaconstatação não tem qualquer desdobramento substancial no plano multi-lateral. A nova rodada avançará ou não em função dos interesses dos Esta-dos Unidos e da União Européia e, talvez, de coalizões permanentes outemporárias de outros membros da OMC. No caso das negociações da Alcae no quadro Mercosul-União Européia, é claro que a posição brasileira temmuito mais peso e que em alguns cenários é certo que poderá haver granderesistência à abertura da economia à concorrência dos produtos industriaisnorte-americanos e europeus.
No que se segue, supõe-se que prevaleça, no plano político, uma posturarelativamente alinhada com a estratégia atual quanto à política comercial,ou seja, avanço da liberalização comercial brasileira condicionada à libera-lização dos mercados de exportação do Brasil. As negociações na OMC ser-virão de marco de referência para as demais negociações comerciais nasquais estará envolvida a diplomacia comercial do país nos próximos trêsanos. Como já mencionado, um cenário ideal do ponto de vista brasileiroquanto ao desenvolvimento das negociações na OMC seria que os EstadosUnidos e a União Européia trocassem como concessões recíprocas algumareforma da legislação norte-americana antidumping por um compromissoefetivo da União Européia quanto ao protecionismo agrícola, especialmen-te com relação a subsídios às exportações. As negociações na Alca e entre oMercosul e a União Européia poderiam então concentrar-se, no caso daAlca, nos picos de proteção norte-americanos (especialmente em produtos
C:\BNDES\Relatório\Relatório-02.Vp - Abreu’s System - E-mail: abreussystem@uol.com.br
agrícolas) e, no caso da União Européia, no aprofundamento da liberaliza-ção multilateral agrícola e na melhoria das tímidas propostas quanto a pro-dutos industriais apresentadas inicialmente.
Um perigo a ser evitado no plano bilateral ou regional é que o Mercosul (ouo Brasil) faça concessões relativas à obtenção de seus objetivos centrais (an-tidumping e agricultura) nas negociações com os Estados Unidos e a UniãoEuropéia e depois veja seu tratamento preferencial ser substancialmenteerodido pelo desenvolvimento das negociações multilaterais. Desse pontode vista, um cronograma ideal subordina as duas negociações não multila-terais aos avanços que possam ser obtidos em Genebra. Se realmente exis-tir base para otimismo quanto ao avanço na OMC, o ritmo das negociaçõesMercosul-União Européia e Alca deveria ser desacelerado, e até mesmoadiado o fim das negociações.
Se as negociações multilaterais não prosperarem em relação aos dois temasque são mais caros à diplomacia econômica brasileira, antidumping e agri-cultura, é muito improvável que tal aconteça no quadro da Alca ou das ne-gociações com a União Européia, dada a assimetria de interesses em jogo.Seria bastante duvidoso que essas negociações chegassem a bom termo,pelo menos do ponto de vista do Brasil, mantidos os objetivos menciona-dos até agora.
O sistema monetário internacional tem hoje a reputação de ser uma fonte de instabilidade das
taxas de câmbio, através da alta mobilidade dos capitais e da inexistência de um regime internacional
provido de instituições e regras suficientemente eficazes para ordenar os ajustes dos mercados e prevenir
os acidentes monetários e financeiros.
Após o desmoronamento do regime de Bretton Woods, vieram à luz inúmeras propostas para
lançar as bases de uma regulamentação das relações entre os sistemas financeiro e monetário
internacionais.
Ao término de um período de “relativo adormecimento”, a persistência das turbulências (crises
mexicanas, crise do câmbio na Europa, crise asiática recente) acabou por recolocar na ordem do dia a
conveniência de uma certa medida de institucionalização do quadro dos mercados financeiros e da criação
de regras capazes de balizar o comportamento dos operadores desses mercados. Se a globalização
financeira parece corresponder a uma perda de controle das autoridades públicas nacionais e
internacionais, ganha cada vez mais terreno a idéia de que essa limitação não passa do reflexo de uma
falta de organização do sistema financeiro internacional.
É sintomático que a proposta do chamado imposto Tobin, que remonta pelo menos a 1978 e que
desde então se mantivera como uma curiosidade teórica, venha, desde o início dos anos noventa,
despertando uma retomada do interesse e inspirando propostas similares, sob a forma de pseudotaxações.
Globalmente consideradas, as propostas podem ser distribuídas em três blocos:
� o bloco formado por um conjunto de medidas coercitivas, que
assumem sobretudo a forma de uma taxação direta ou indireta das operações;
� o bloco das medidas preventivas, que visam a estabelecer uma
“normalização financeira” ou a intensificar as informações recíprocas entre as
autoridades controladoras; e
Sistema financeiro internacional
� o bloco dos dispositivos de coordenação entre poderes públicos
nacionais e órgãos internacionais, ou entre os bancos centrais, a fim de prevenir ou
absorver, através de medidas pontuais, os acidentes de percurso (o tema do
emprestador internacional de última instância é uma das peças mestras desse bloco).
A variedade das propostas e a incerteza quanto a seu impacto macroeconômico são tais, que surge
um problema de esclarecimento. Ele concerne tanto aos objetivos exatos que elas visam quanto à
avaliação de sua eficácia potencial em relação a esses objetivos.
Este artigo tem por fim contribuir para esclarecer esse problema, cuja essência gira em torno da
questão das relações entre a “instabilidade” dos mercados de câmbio e a “rotação internacional” dos
capitais. Numa primeira parte, apresentaremos os dados empíricos, que muitas vezes são desconhecidos,
enquanto os fatos estilizados são bem estabelecidos e expõem sem ambigüidade os dados do problema. A
segunda parte faz um recenseamento e classificação das sugestões existentes e do estado das reformas em
andamento. A terceira parte procura avaliar seu impacto, a partir de uma simples formalização teórica das
relações entre a instabilidade dos mercados e a rotação dos capitais.
I. O CONTEXTO: QUATRO FATOS ESTILIZADOS, DOIS PARADOXOS
1.1. Estabilidade da volatilidade individual e
instabilidade da volatilidade estrutural das taxas de câmbio
Freqüentemente se acusa o sistema monetário atual de produzir uma acentuada volatilidade das
moedas. Essa “idéia aceita” precisa ser esclarecida. Considerando-se o indicador habitual da volatilidade,
ou seja, o desvio padrão das taxas de câmbio constatadas em relação a uma moeda de referência, verifica-
se que, embora a aparente volatilidade das principais moedas seja hoje globalmente mais importante do
que no regime de Bretton Woods, ela não evidencia uma deriva ascendente. O Gráfico 1 mostra que, nas
relações de câmbio entre o dólar norte-americano e as outras moedas, a instabilidade média mantém-se
relativamente constante desde meados dos anos setenta, apesar da existência de uma flutuação moderada
(ligeiro aumento da volatilidade média durante a década de 1980).
Estatísticas similares sobre as outras grandes moedas levam à mesma constatação (cf. Anexo 1).
[$$ INTRODUZIR FIG. P. 3, LEGENDAS ABAIXO:]
1. Gráfico 1
2. Volatilidade individual efetiva do dólar (em %)*
3. Fonte: MacCauley, 1997.
4. * A volatilidade é medida pelo desvio padrão anual das variações cotidianas da taxa
de câmbio efetiva (em percentagens) durante os doze meses do ano. O peso das moedas européias
no cálculo do câmbio efetivo do dólar é de 77,3%. As linhas horizontais indicam as volatilidades
médias.
Traçando o movimento bilateral da taxa de câmbio de uma moeda em relação a outra, ou em
relação a um conjunto de moedas, esse tipo de indicador concerne à volatilidade individual e temporal.
Esta não pode explicar a dinâmica da estrutura das taxas de câmbio. Precisamos de um indicador que
expresse o movimento do conjunto das taxas de câmbio, considerando o sistema monetário internacional
como um todo. Para esse fim, construímos um indicador da volatilidade estrutural, definido como o
coeficiente de variação das grandes moedas que compõem o núcleo do sistema monetário internacional.
Esse coeficiente é definido como um indicador pontual da volatilidade da estrutura das taxas de
câmbio. Em cada período no caso, o trimestre , mede-se o desvio padrão das variações das taxas de
câmbio das principais moedas (marco, franco, iene, libra e dólar canadense) em relação ao dólar. Essa
operação é refeita periodicamente, ou seja, em relação a uma moeda que também varia, enquanto os
indicadores habituais são calculados em torno de uma moeda histórica dada. Para eliminar o viés ligado a
taxas de câmbio expressas em índices (base 100 em 1975) e à evolução “pesada” dos fundamentos (dentre
eles, a tendência à depreciação do dólar a longo prazo), optamos por medir a volatilidade estrutural não
pelo desvio padrão, mas pelo coeficiente de variação, definido como a relação entre o desvio padrão e a
média (Gráfico 2). Observe-se que as relações de câmbio em questão representavam mais de 80% do
volume total das transações recenseadas pela BRI em abril de 1995, de modo que, com as cinco moedas
consideradas, apreende-se a essência da dinâmica das taxas de câmbio).
[$$ INTRODUZIR FIG. P. 4, LEGENDAS ABAIXO:]
1. Gráfico 2
2. Volatilidade estrutural das taxas de câmbio das principais moedas (Coeficiente de
variação)
3. (Marco, libra, iene e franco, variando em relação ao dólar)
4. Dados trimestrais. 1975/1 = 100
5. Fonte: FMI
Diversamente da volatilidade individual, a volatilidade estrutural evidencia uma tendência
acentuada para um caráter não estacionário. No conjunto do período de 1975-1997, com efeito, a
volatilidade estrutural foi multiplicada por cinco e a tendência de crescimento manteve-se mais ou menos
estável. Para sermos mais exatos, nota-se uma ligeira ruptura dessa tendência em meados dos anos
oitenta; a partir dessa data, a taxa de crescimento da tendência pende um pouco para a baixa, mas sem que
a volatilidade média chegue a se estabilizar em torno de um nível estacionário. É provável que essa
ruptura não deixe de ter relação com a cooperação monetária internacional que desde então se
desenvolveu, particularmente na Europa.
A volatilidade do sistema de câmbio instaurado em meados dos anos setenta, portanto, faz surgir
uma característica dupla e um paradoxo:
� A volatilidade individual das moedas manteve-se globalmente
estacionária;
� Em contrapartida, a volatilidade estrutural passou por uma deriva
regular para a alta. É essa deriva que se encontra na origem da atual idéia de que o
desmoronamento do sistema de Bretton Woods teria feito o sistema monetário
internacional entrar numa era de crescente volatilidade.
A conjunção dessas duas constatações aparentemente contraditórias passou despercebida até o
presente.
1.2. Financiamento internacional e movimentos de capital:
reciclagem da poupança e rotação dos capitais
É comum atribuir-se ao atual sistema financeiro internacional e a sua liberalização o mérito de
permitirem uma melhor circulação da poupança em escala mundial. Esse pretenso mérito requer uma
avaliação precisa. Se tomarmos como indicadores, como se costuma fazer, as necessidades e a capacidade
de financiamento das economias nacionais, ou indicadores semelhantes no plano continental, veremos
que essa avaliação não parece ter fundamento no que concerne às duas últimas décadas. A tabela seguinte
reúne os dados disponíveis por subperíodos de cinco anos, de 1975 a 1995: estabelece-se a relação entre o
investimento e a poupança internos, o que dá uma indicação sintética da situação da capacidade de
financiamento (razão inferior a 1) ou das necessidades de financiamento (razão superior a 1) e,
conseqüentemente, do saldo da balança das operações correntes perante o exterior; esse saldo,
evidentemente, é negativo (positivo) com uma razão superior (inferior) a 1.
[$$ INTRODUZIR TABELA DA P. 5, LEGENDAS ABAIXO:]
1. Tabela 1
2. RELAÇÃO
INVESTIMENTO/POUPANÇA (média
no período)
3. Países industrializados:
4. Europa (15)
5. Estados Unidos
6. Japão
7. Países em
desenvolvimento:
8. África
9. Ásia
10. América Latina
11. PECO
12. Fontes: cálculos baseados
nos do FMI e da UE.
A Tabela 1 mostra claramente que não se produziu uma tendência para o aumento da distância
entre o investimento e a poupança internos e, portanto, que a “globalização financeira”, ao contrário das
idéias aceitas, não esteve, ao menos aparentemente, na origem de uma melhor circulação da poupança dos
países ou zonas com capacidade de financiamento para os países ou zonas com necessidade de
financiamento.
Esse dado bruto encontra-se no cerne da afirmação de Feldstein e Horioka (1980) de que, num
mundo caracterizado por uma forte mobilidade do capital, devemos esperar correlações baixas entre a
poupança e o investimento internos. Os testes efetuados por eles com 15 países industrializados, no
período de 1960/1974, levaram-nos a concluir por uma forte correlação entre as taxas de poupança e as
taxas de investimento internas, tanto em termos de níveis quanto de variações a médio prazo. Disso eles
extraíram a dedução lógica de que, entre os países e no período considerado, a mobilidade do capital foi
baixa e não aumentou com o correr do tempo. Os testes posteriores, realizados segundo a mesma lógica
(Dooley et al., 1984; Oliveira Martins e Plihon, 1990; Bayoumi, 1990; Tesar, 1991; Dar et al., 1994),
confirmaram, de um modo geral, as conclusões iniciais. Todavia, convém notar que esses resultados
decorrem de uma definição particular da mobilidade do capital, como a condição segundo a qual as
distâncias entre os lucros esperados do capital “de longo prazo” entre os diferentes países são eliminadas
pelos fluxos líquidos de poupança, medidos pelos desequilíbrios das balanças correntes. Dentro dessa
lógica, a conclusão que convém guardar em mente, segundo o nosso ponto de vista, é esta: em termos de
fluxos líquidos a longo prazo, a circulação mundial da poupança final não foi impulsionada nem pela
liberalização mundial dos mercados nem pelas inovações financeiras.
Essa constatação básica contrasta com a imagem de um sistema financeiro internacional “febril”,
manipulando massas consideráveis de capital. Essa imagem não é falsa: os mercados de câmbio, desde a
derrocada do regime de Bretton Woods, foram plataformas giratórias de uma intensa circulação de
capitais em escala mundial. Duas séries de dados permitem situar a importância desse fenômeno:
� A primeira série relaciona-se com a parcela dos fluxos financeiros brutos (estatísticas
geralmente negligenciadas e cuja importância foi assinalada por D. Plihon [1996]) no total das operações
dos balanços de pagamentos. Essa parcela assinalou um aumento considerável nos últimos vinte anos. A
título indicativo, a Tabela 2 fornece a estrutura dos fluxos reais e financeiros brutos que constituíram o
balanço de pagamentos da França a partir de 1980.
[$$ INTRODUZIR TABELA DA P. 6, LEGENDAS ABAIXO:]
1. Tabela 2
2. Estrutura do balanço de pagamentos
francês
3. Distribuição dos fluxos brutos reais e
financeiros como % dos fluxos totais
4. Participação no balanço global (% de
fluxos brutos)
5. Crédito
6. Débito
7. Transações correntes
8. Movimentos de capital (a)
9. Investimentos em carteira
10. Investimentos diretos
11. Movimentos de capital como % do PIB
12. Fonte: segundo os Relatórios anuais do
balanço de pagamentos, Banco da França.
13. (a) variação do ...
Os movimentos de capital, que representavam em 1980 aproximadamente 28% das
transações externas da França, aumentaram sistematicamente, até atingirem mais de 85% em 1996. Em
outras palavras, mais de 3/4 das transações monetárias efetivas da França em 1996 representaram
operações sobre capitais, ao passo que, quinze anos antes, a relação era o inverso, em favor das operações
correntes.
� A segunda série de dados é mundial e diz respeito às massas de capital que
transitaram em todos os mercados de câmbio, considerando-se todas as moedas. A Tabela 3 traça a
atividade dos mercados de câmbio, tal como foi regularmente levantada pela BRI em 1989, 1992 e 1995.
[$$ INTRODUZIR TABELA DA P. 7, LEGENDAS ABAIXO:]
1. Tabela 3
2. Atividade nos mercados de câmbio*
3. (Médias diárias em bilhões de dólares
americanos)
4. Categoria
5. Abril de 1989
6. Abril de 1992
7. Abril de 1995
8. Variação percentual, abril’95/abril’89
9. Montante
10. Moeda corrente
11. A termo e swaps
12. Futuros e opções
13. Total geral
14. Fonte: Banco de Compensações
Internacionais [BIS]
15. * eliminada a dupla contagem
Esse quadro indica que as transações cambiais cotidianas, consideradas todas as
categorias, multiplicaram-se por mais de dois entre abril de 1989 e abril de 1995, o que é desproporcional
à evolução das necessidades em termos do fechamento das transações correntes. Note-se desde já que a
essência desse movimento deveu-se à explosão das transações em mercados futuros, o que atesta a
importância das exigências de gestão dos riscos cambiais na explosão dos movimentos de capital.
Examinar de perto os fatos estilizados relativos ao sistema financeiro internacional,
portanto, faz surgir um paradoxo evidente. Por um lado, constata-se que o sistema financeiro
internacional faz circular uma massa de capitais cada vez mais considerável, massa essa que transita pelos
mercados de câmbio num volume cotidiano superior a um trilhão de dólares, a contar de 1995; por outro,
constata-se, no final das contas, que nem por isso a função de financiamento “efetivo” das necessidades
reais fica mais garantida.
A explicação desse paradoxo reside na distinção entre o capital “de longo prazo”, objeto
implícito do estudo de Feldstein e Horioka, cuja mobilidade reduzida decorre basicamente das
condições de paridade não coberta das taxas de juros, e o capital “de curto prazo”, cuja mobilidade
acentuada decorre mais das condições de paridade coberta das taxas de juros (Moosa, 1997). Essa
distinção permitiria conciliar os resultados aparentemente contraditórios dos testes de mobilidade
internacional dos capitais que decorrem de uma lógica explícita da paridade internacional dos
rendimentos, concluindo por um nível elevado e crescente de integração financeira, e os dos testes “no
estilo de Feldstein-Horioka”, que levam ao resultado inverso.
Se essa explicação é correta, ela conduz, ao mesmo tempo, a situar o conceito de “rotação
internacional dos capitais” no centro da análise e a indagar sobre as incidências da aceleração regular
dessa rotação ao longo das últimas décadas.
A confusão que cerca a idéia de “rotação” internacional dos capitais não é sinônima de
mobilidade internacional dos capitais, com a qual é freqüentemente confundida. A mobilidade do capital
é relativa à liberdade de circulação espacial do capital entre espaços monetários desvinculados. Já a
rotação do capital refere-se à velocidade de circulação do capital por unidade de tempo. As duas variáveis
podem ter comportamentos opostos. Assim, pode haver um aumento da mobilidade internacional dos
capitais em decorrência de uma liberalização dos mercados financeiros, por exemplo, sem que aumente
simultaneamente a rotação internacional dos capitais. O grau de rotação internacional dos capitais
depende estreitamente do regime cambial, enquanto o grau de mobilidade é uma variável estrutural que
não tem relação direta com o regime monetário internacional. Num regime de câmbios fixos, por
exemplo, podemos ter, simultaneamente, uma forte mobilidade potencial dos capitais (e portanto, uma
intensa sensibilidade dos movimentos de capital aos diferenciais das taxas de juros) e um baixo grau de
rotação dos capitais, se as taxas de câmbio oficiais tiverem credibilidade.
O fato marcante da dinâmica do sistema financeiro atual é que ele está imbricado num
sistema monetário internacional volátil, segundo uma lógica na qual o aumento da mobilidade
internacional dos capitais traduz-se num aumento simultâneo de sua rotação internacional.
Se a análise da mobilidade internacional dos capitais tem sido desenvolvida na literatura
recente, o mesmo não acontece com a rotação internacional dos capitais. O objetivo deste artigo é
justamente explorar as ligações entre a volatilidade das taxas de câmbio e a rotação internacional dos
capitais, assim procurando construir uma explicação para os quatro fatos estilizados precedentes e os dois
paradoxos que eles representam.
II. PROPOSTAS E DESAFIOS
As constatações anteriores inscrevem-se num quadro em que os mercados financeiros não
são controlados e no qual prevalecem riscos cambiais consideráveis, ligados à flutuação das moedas e à
enorme heterogeneidade dos regimes de câmbio em vigor no plano mundial (cf. Anexo 2).
A falta de regulamentação explica a reiterada renovação do debate sobre a
regulamentação ótima. Começaremos por um inventário da regulamentação, para em seguida apresentar
as propostas de reforma.
2.1. Inventário da regulamentação e risco sistêmico
Poderíamos ficar tentados, a priori, a qualificar o sistema financeiro internacional de um
sistema totalmente anárquico, no qual cada Estado tem absoluta liberdade para estabelecer sua política em
relação aos capitais externos. Se essa avaliação constitui o pano de fundo da realidade financeira
internacional contemporânea, seria um exagero, no entanto, considerar que não existe nenhum sistema de
restrições internacionais capaz de limitar a soberania financeira dos Estados. Esses elementos, embora em
número ainda restrito, decorrem de dois tipos de lógica: uma série de medidas refere-se a dispositivos “ex
ante”, enquanto outras concernem aos mecanismos de intervenção “ex post”, através dos organismos
financeiros internacionais ou dos grandes bancos centrais. Se essas medidas não têm uma vocação
específica para regulamentar as relações financeiras internacionais, ao menos elas estabelecem
indiretamente uma base de harmonização e um quadro geral de implantação das condições de
concorrência entre os espaços bancários e financeiros.
No que concerne ao dispositivo “ex ante”, as autoridades reguladoras internacionais, a
começar pelo Comitê da Basiléia, a princípio lançaram as bases de uma regulamentação comum a todos
os estabelecimentos (cf. Anexos 4 e 5). Depois, incentivaram amplamente a descentralização da avaliação
dos riscos através da instauração de sistemas internos de controle.
Na totalidade dos casos, o conjunto dos dispositivos empregados visa fundamentalmente
um objetivo: a prevenção da manifestação do risco sistêmico, ou seja, a prevenção da propagação dos
acidentes financeiros localizados. A definição de risco sistêmico, no entanto, é complexa e expõe à
arbitrariedade, uma vez que, em última instância, trata-se de distinguir os mercados em questão, as fontes
potenciais de risco e insegurança, os agentes participantes e a natureza de seus objetivos e expectativas, e
os processos de geração e iniciação dos riscos, com sua dinâmica de disseminação. Diante desses
problemas, a regulamentação trata ao mesmo tempo dos riscos da liquidez, dos riscos do mercado, dos
riscos do crédito e de outros.
Para as autoridades controladoras, de fato, o que importa não é o risco que correm
individualmente os estabelecimentos de crédito ou os intermediários financeiros, nem o risco a que ficaria
exposto um segmento do mercado, mas apenas o risco sistêmico, que se aparenta teoricamente com um
brutal “efeito dominó”, para o qual os sistemas de pagamento e regulamentação desempenham o papel de
canais de propagação. O risco sistêmico é uma dinâmica cumulativa de choques, disseminação e contágio
que, a partir da fragilização de uma ou mais instituições participantes dos mercados, pode levar à crise
dos sistemas de pagamento e regulamentação e à desordem macroeconômica.
Além da complementaridade buscada entre esses dois níveis de controle e prevenção dos
riscos, o dispositivo preventivo coordenado abrange, hoje em dia, duas práticas complementares
(Léonard, 1997):
1. Maior eficiência e menor assimetria da informação. Os instrumentos já instaurados
ou em vias de ser criados consistem, por um lado, no reforço das trocas de informações entre os
controladores bancários e, por outro, na abertura crescente para outros tipos de controladores, em especial
a fim de restringir os riscos de contágio dentro dos conglomerados financeiros. Esse procedimento exige
uma harmonização permanente das regras entre os mercados e a elaboração de normas contábeis mais
fidedignas e, acima de tudo, mais transparentes, bem como a produção, em tempo real, de um fluxo eficaz
de informações sobre os novos instrumentos financeiros.
2. Prevenção dos comportamentos geradores de risco. Quanto a esse aspecto, a
harmonização do quadro preventivo nasceu da regulamentação pioneira referente à adequação do capital
próprio aos riscos de crédito (proporção de Cooke). Atualmente, ela se estende aos riscos de mercado em
três classes de ativos: títulos de crédito, títulos de propriedade e divisas. Além disso, há uma grande
inclinação para integrar elementos externos ao balanço na avaliação global dos riscos trazidos pelos
estabelecimentos financeiros. A idéia é limitar, através de restrições ao capital, a amplitude das posições
assumidas pelos estabelecimentos financeiros nos mercados, sendo estas avaliadas por seu valor de
mercado (value at risk). Nesse nível, aliás, observa-se que a regulamentação afeta mais os mercados
pulverizados (nos quais a compensação, quando muito, é bilateral) do que os mercados organizados (nos
quais a compensação é multilateral e onde o capital próprio só deve ser constituído com base numa
posição líquida). A eficácia do conjunto dessas medidas é assegurada pela gradação das sanções ou
penalidades associadas ao desrespeito a esses princípios. Por ora, como boa parte das medidas ainda se
encontra em fase de projeto ou recomendação, não se pode considerar que estejamos lidando com um
sistema coordenado e coerente em matéria de prevenção.
Embora continue embrionária em sua dimensão “ex ante” (prevenção das crises), a
cooperação caso a caso tem obtido alguns sucessos em sua forma “ex post” (gestão das crises), mesmo
exibindo um progresso lento em sua forma de coordenação, que é a mais importante. Esta última abrange,
ao mesmo tempo, a infra-estrutura dos mercados (principalmente seu aspecto de liquidez) e o quadro
preventivo (credibilidade e robustez dos intermediários).
O aspecto particularmente nocivo dos acidentes financeiros é que, mais para os bancos do
que para outros setores, o contágio do problema
produz-se rapidamente;
difunde-se com mais amplitude dentro do setor;
leva a um número maior de falências;
acarreta prejuízos mais importantes para os credores;
propaga-se para além do setor bancário e induz a prejuízos substanciais no conjunto
do sistema financeiro e na economia real.
Poderíamos dizer que a dimensão “ex post” refere-se a um segundo tipo de risco: não o da
ocorrência de um acidente financeiro localizado, mas o da transformação de um acidente financeiro
inicial numa crise financeira e monetária.
O objetivo maior da cooperação pública internacional, em matéria de controle e
prevenção dos riscos, só pode ser de ordem sistêmica: o desafio, evidentemente, é consolidar as
conquistas da cooperação caso a caso num conjunto institucional multilateral que assuma, não mais
simplesmente de fato, mas sobretudo de direito, a missão de emprestador internacional de última
instância. Ora, por enquanto, os avanços em matéria de controle preventivo ainda são sabidamente
insuficientes para garantir uma probabilidade mínima de surgimento do risco sistêmico. Acima de tudo,
porém, nessa eventualidade, as condições e formas de intervenção a título de socorro financeiro
continuam totalmente indefinidas. Os progressos nesse nível deverão, daqui por diante, acompanhar
imperativamente a intensificação do controle preventivo.
Tabela 4
Reforma do sistema financeiro internacional:
Variedade das propostas
Proposta
Fluxos considerados
Tipo de instrumento
Campo de aplicação
Modo de operação
TOBIN (1978) Todas as transações cambiais
Taxação proporcional ao volume (0,5 a 1%?)
Todos os agentes Regulamentação pelos preços
EICHENGREEN/ WYPLOSZ (1993)
Operações por conta própria
Depósito não remunerado em moeda local no Banco Central: proporção da posição líquida a curto prazo em moeda local
Todos os intermediários financeiros
Regulamentação pelas quantidades
SPAHN (1995) Todas as transações cambiais (a termo e opções)
Imposto uniforme mínimo + taxação da diferença entre a taxa de câmbio usada e o valor do limite da zona de referência
Todos os agentes Regulamentação pelos preços
GRIEVE SMITH (1997)
Todas as transações cambiais
Sustentação automática das taxas de câmbio
Mercados cambiais Regulamentação pelos preços
SOROS (1998) Todos os fluxos financeiros internacionais
Teto da dívida garantido pelos países
Todos os agentes Regulamentação pelas quantidades
EICHENGREEN/ WYPLOSZ/TOBIN (1995) SACHS (1998) AGLIETTA (1998)
Empréstimos a curto prazo aos não residentes
Estabelecimento de um teto dos compromissos em relação aos não residentes
Todos os intermediários financeiros
Racionamento
INSTITUTO DE FINANÇAS INTERNACIONAIS (1998)
Todos os fluxos financeiros internacionais
Reforço da cooperação entre as autoridades bancárias tutelares
Sistemas bancários Regulamentação preventiva
GREENSPAN/RUBIN (1998)
Todos os fluxos financeiros internacionais
Revisão geral do quadro regulamentar e preventivo internacional
Todos os agentes Regulamentação preventiva e regulamentação dissuasiva
FUNDO MONETÁRIO INTERNACIONAL (1998)
Todos os fluxos financeiros internacionais
Fortalecimento do quadro de informações e preventivo
Todos os agentes Regulamentação preventiva
Se o reforço da coleta de informações pertinentes, de seu controle e sua difusão, para fins
de regulamentação financeira internacional, implica uma limitação das soberanias nacionais nessa
matéria, também convém lembrar que o “empréstimo” de última instância nunca é um ato contratual: é
sempre uma intervenção monetária soberana, imprevista e não negociada (Aglietta, 1998), intervenção
esta que não é praticada no interesse dos devedores, mas no da continuidade dos pagamentos
internacionais. Pois bem, enquanto as informações pertinentes para identificar a formação das condições
propícias às crises de liquidez não são reunidas, o que pressupõe uma conscientização política das
conseqüências da globalização financeira, é perfeitamente lógico que a atenção fique polarizada nos
meios de uma regulamentação “branda” dos movimentos de capital e, em particular, na possibilidade de
restringir, por meio de princípios preventivos ou coercitivos, os créditos imprudentes a curto prazo dos
bancos internacionais.
2.2. Uma tipologia das propostas de reforma
A questão da reforma do sistema financeiro internacional em particular, o exame das
múltiplas propostas relativas à “contenção” dos movimentos de capital não pode ser dissociada,
evidentemente, do debate sobre os méritos e inconvenientes respectivos dos regimes cambiais
alternativos. Nesta seção, todavia, interessamo-nos unicamente pelas propostas relativas à reforma do
sistema financeiro internacional.
Assinalemos desde já a característica comum a todas essas propostas: seu objetivo não é
uma regulamentação das relações financeiras globais, mas o controle dos movimentos internacionais de
capital, administrando-lhes um tratamento diferenciado no cotejo com as relações financeiras
intranacionais. Essa orientação rompe com as tendências das reformas praticadas e discutidas no seio dos
organismos internacionais, que procuram controlar melhor o conjunto das relações e sistemas financeiros,
sem um tratamento discriminatório particular das relações internacionais.
O leque de propostas é muito amplo, a despeito de a literatura haver preservado
principalmente a proposta do imposto Tobin. Esta deu margem a trabalhos teóricos e econométricos.
Todavia, não convém desprezarmos as outras propostas existentes. A Tabela 4 registra nove famílias de
propostas que visam a ordenar melhor as relações financeiras internacionais.
A principal deficiência do conjunto dessas propostas está em elas não haverem dado
margem a uma avaliação da macroeconomia internacional. As avaliações, quando existem, limitam-se a
exercícios de simulação microeconômica em equilíbrio parcial.
Não obstante, apresentaremos sucintamente os resultados desses exercícios, reservando
para a terceira parte sua avaliação macroeconômica global, no contexto de um levantamento dos modelos
dos sistemas monetário e financeiro internacionais.
2.2.1. O imposto Tobin: balanço dos trabalhos
A proposta de instituição de um imposto sobre os movimentos internacionais de capital
pode servir de referência, em virtude de sua aparente simplicidade. A discussão da proposta inicial de
taxação dos movimentos de capital (Tobin, 1978, 1994) foi objeto, nos anos noventa, de uma literatura
abundante.
Como outras soluções coercitivas concorrentes, o imposto Tobin tem por vocação, na
hipótese de paridade das taxas de juros, separar a taxa de juros interna das expectativas em relação à taxa
de câmbio futura. Essa dissociação permite fortalecer a credibilidade da moeda interna, aliviando o custo
de sua defesa (Bensaïd e Jeanne, 1996). O papel estabilizador do imposto age através de três canais
complementares:
� Ele protege parcialmente a política monetária dos choques externos e, portanto,
permite isolar as conjunturas (Ozkan e Sutherland, 1995);
� Alivia o custo da defesa da moeda pelas autoridades públicas, na medida em que os
agentes do mercado são levados a rever na baixa suas expectativas de realinhamento
(Jeanne, 1996);
� Em última instância, ele pode levar à eliminação da possibilidade de surgimento de
uma especulação auto-realizadora, sob certas condições (Jeanne, 1996).
Assim, o imposto aumenta significativamente a autonomia das políticas econômicas
nacionais, reduzindo as exigências que os mercados financeiros lhes impõem. Na óptica do triângulo das
impossibilidades “no estilo de Mundell”, o imposto geraria graus de liberdade em matéria de política
monetária e, em especial, de fixação das taxas de juros para qualquer país inserido num universo de
liberdade de circulação de capitais mas, ainda assim, em busca da estabilidade monetária. Esse argumento
é tão mais forte quanto mais o objetivo primordial do imposto seja o de reduzir a probabilidade da
ocorrência de transações entre divisas para explorar pequenas diferenças nas taxas de juros, ou pequenas
variações nas taxas de câmbio; ora, 80% das operações cambiais correspondem justamente a idas e vindas
de um máximo de sete dias (Grieve Smith, 1997). Do ponto de vista formal, portanto, devemos ter em
mente que a instauração de um imposto Tobin equivaleria a encolher a banda de flutuações num regime
de paridade fixa ou numa zona alvo, ou o intervalo de rendimento esperado num regime de câmbio
flexível. Esse efeito encontra-se no centro das implicações estabilizadoras esperadas e do modelo que será
apresentado na terceira parte.
A justificação do imposto Tobin provém, em geral, de uma leitura keynesiana dos
mercados financeiros organizados. Segundo essa leitura, os custos de transação são muito baixos e o
desconhecimento do futuro conduz, naturalmente, a um predomínio da especulação sobre a iniciativa
empresarial. A importância dos volumes negociados e a volatilidade dos mercados são, portanto, sintomas
dessa tendência patológica (Arestis e Sawyer, 1997). Mais precisamente, qualquer aumento do volume
das transações cambiais não diretamente ligadas às necessidades comerciais tende a ampliar, pelo menos
potencialmente, a volatilidade dos mercados. Assim, supõe-se que o imposto teria o efeito de reequilibrar
os pesos dos fatores que influenciam a taxa de câmbio, principalmente as expectativas a curto prazo,
passando para considerações de prazo mais longo, diretamente relacionadas com as exigências do
comércio internacional. Assim, é claro, o imposto reduziria a importância das transações de curto prazo,
essencialmente baseadas nas variações de preço, em relação às transações de longo prazo, baseadas nos
níveis de preço, a partir do momento em que sua aplicação levasse, numa boa parte das primeiras, a um
custo global de transação superior ao lucro esperado. De certa maneira, os mercados de câmbio veriam
assim modificada a sua situação: descentralizados e regidos por intermediários, a instauração do imposto
os transformaria em mercados centralizados e regidos pelas necessidades (Frankel, 1996).
Todavia, permanece intacta a questão de saber qual seria o montante “ótimo” das
transações cambiais necessárias para garantir as conversões finais exigidas pelo comércio, pelo
investimento direto e pela carteira internacional. Nessa problemática, a volatilidade já não é
necessariamente resultante da especulação. Ela expressa os problemas de financiamento do balanço de
pagamentos e a falta de coordenação nas políticas monetárias nacionais; os chamados “especuladores”,
portanto, são empresas que operam nos mercados de câmbio para se proteger das eventuais perdas de suas
reservas de divisas; ao mesmo tempo, a multiplicidade dos interventores contribui mecanicamente para
“produzir” a liquidez do mercado (Mendez, 1996).
Os obstáculos presumíveis à criação do imposto Tobin são sobretudo políticos. Esse
imposto foi criticado por três razões (Arestis e Sawyer, 1997). A primeira é que ele deveria, logicamente,
ser estabelecido com base num acordo internacional, que abrangeria, em última instância, a totalidade do
planeta, a fim de evitar os desvios do trânsito financeiro. Podemos legitimamente duvidar que todos os
países do mundo, em especial o conjunto dos países do G7, aceitem ao mesmo tempo a taxação das
entradas de capital no presente contexto, que é de liberalização financeira e concorrência para atrair os
capitais externos. A segunda crítica é que esse imposto equivaleria a uma nova postura em relação aos
mercados financeiros, coisa da qual podemos duvidar, a julgar pelas estratégias públicas hoje dominantes,
que consistem em acompanhar os mercados sem questionamento. Mais precisamente, essa orientação
equivaleria a um ataque à renda extraída da especulação, renda esta que representa uma fonte de lucros
consideráveis em alguns países, como o Reino Unido, por exemplo. Por fim, uma terceira crítica: o
aparecimento de um novo tributo esbarraria na clássica aversão política à sobrecarga fiscal, a menos que
ele fosse instituído como uma taxação substituta; nesse caso, porém, surgiria com agudeza a questão das
arrecadações nacionais desiguais e de uma eventual distribuição equitativa do imposto.
O imposto Tobin e o regime de câmbios fixos
O tema do controle dos capitais, levantado por Tobin a partir de 1978 (Tobin, 1978),
esteve no centro das controvérsias relativas à interpretação da origem das crises do SME em 1992 e 1993
e ao contexto ótimo capaz de assegurar a passagem para a união monetária na Europa).
O debate sobre o controle dos capitais contrasta duas leituras alternativas da natureza dos
regimes de câmbio fixo, periodicamente ajustáveis ou não, e providos ou não de zonas-alvo: na primeira,
esses regimes são considerados a priori como intrinsecamente estáveis. Decorre daí que os controles de
capitais são não apenas inúteis, como podem, eles mesmos, revelar-se desestabilizadores em relação ao
regime cambial. Os aspectos essenciais dessa abordagem foram recentemente desenvolvidos na literatura:
assim, a simples previsão de um controle pode perfeitamente conduzir ao resultado inverso ao buscado,
ou seja, a um aumento compensatório prévio da taxa de juros nos países passíveis de empregar essa
medida (Goldstein et al., 1993); do mesmo modo, a ameaça ou o anúncio de um controle sobre um
mercado financeiro é não apenas capaz de desencadear um verdadeiro desvio do trânsito em benefício de
outros mercados (Grieve Smith, 1997), como também pode ter como resultado favorecer o surgimento,
por parte dos agentes residentes, de ataques especulativos auto-realizadores, por serem destrutivos para as
reservas cambiais do país (Gros, 1992; Dellas e Stockman, 1993). A probabilidade e, portanto, a
freqüência das crises dos balanços de pagamentos seriam aumentadas, assim como a volatilidade das
taxas de câmbio seria acentuada pelo estabelecimento de controles de capitais transitórios.
A segunda leitura, ao contrário, enfatiza o caráter intrinsecamente instável dos regimes de
câmbio fixo. As expectativas de ruptura do câmbio, por parte dos agentes privados, são auto-realizadoras
e, portanto, desestabilizadoras, na medida em que aumentam o custo com que efetivamente arcam as
autoridades públicas para manter a paridade da moeda. O controle dos movimentos de capital, de uma
forma ou de outra, afigura-se, pois, o meio privilegiado, se não único, de proteger esses regimes de
qualquer forma de ataque especulativo, uma vez que o eventual ataque não poderia ser justificado, de
maneira alguma, pela existência de uma ruptura entre as condições do mercado e os fundamentos
subjacentes: Wyplosz (1986); Park e Sachs (1987); Eichengreen e Wyplosz (1993); Ozkan e Sutherland
(1995); Eichengreen, Tobin e Wyplosz (1995): Spahn (1995); Bensaïd e Jeanne (1996).
A primeira dessas críticas não tem o caráter redibitório que lhe costuma ser atribuído. Se
considerarmos um conjunto monetário e financeiro significativamente importante e os índices de taxação
geralmente aceitos (0,5 a 1%), poderemos imaginar que os desvios do tráfego financeiro são muito
modestos, se não nulos, se compararmos os custos com os lucros esperáveis, em virtude da redução do
risco cambial para os operadores financeiros (Arestis e Sawyer, 1997). Visto que os índices de cobertura
dos riscos cambiais nunca são inferiores ao índice máximo de um imposto Tobin, por mais elevado que
ele seja, podemos esperar que os operadores financeiros pratiquem uma arbitragem que não seja
desfavorável ao país ou à zona monetária que aplicar esse imposto, num contexto em que o resto do
mundo se abstenha de fazê-lo. O caráter necessariamente universal do imposto Tobin não constitui,
portanto, uma exigência absoluta. Garber e Taylor (1995), assim como Grieve Smith (1997), sublinham,
com justa razão, que a viabilidade administrativa de tal projeto é um problema absolutamente secundário
em relação à exigência de uma vontade política real. Simplesmente, e para ser eficaz, é imperativo que o
imposto seja aplicado num campo ilimitado: depois de Tobin (1978), e em virtude, por um lado, da
impossibilidade prática de isolar corretamente as transações decorrentes de uma lógica especulativa e, por
outro, do risco da substituição de transações taxáveis por transações “isentas de imposto”, a maioria dos
autores concorda em admitir que o imposto deve abranger todas as transações externas (à vista, a termo e
com derivativos).
Um outro argumento vem reforçar a necessidade de que a base do imposto seja ilimitada.
Independentemente da viabilidade técnica, surge, com efeito, o problema da eficácia dessa medida.
Kenen (1995) mostrou que o imposto reduziria não apenas o estímulo dos responsáveis pelas relações de
comércio e dos investidores para apostar em amplos movimentos das taxas de câmbio, como também seu
estímulo para apostar em pequenas variações dessas taxas. Desse modo, querendo conter as transações
puramente especulativas e combater as crises cambiais, o imposto penalizaria as transações de câmbio
que compõem a contrapartida das operações reais, ou seja, precisamente aquelas que contribuem para
limitar a volatilidade das taxas de câmbio.
Assim, a primeira crítica não destrói a viabilidade econômica da proposta, como se
costuma supor. As outras duas decorrem de um problema de opção política e de redefinição do papel do
Estado. Essa questão não nos interessa diretamente aqui.
2.2.2. As outras propostas de reforma
Uma medida alternativa de controle dos capitais consiste em taxar os empréstimos de
residentes a não residentes, feitos em moeda nacional. Essa proposta foi formulada muitas vezes,
sobretudo em relação ao exame das condições ótimas de passagem do SME para a União Monetária
Européia (Wyplosz, 1986; Eichengreen e Wyplosz, 1993; Eichengreen, Tobin e Wyplosz, 1995). A
pertinência dessa proposta alternativa decorre do fato de que ela evitaria, a priori, duas das principais
críticas geralmente feitas ao imposto Tobin, quais sejam, seu irrealismo (campo geográfico de aplicação
necessariamente ilimitado) e sua dimensão ultracoercitiva (taxação de todos os tipos de transações,
monetárias e financeiras).
A priori mais fácil de aplicar, esse imposto (que podemos chamar de “imposto Wyplosz”,
usando o nome de seu principal defensor) visa também a um objetivo mais definido: ele atinge
indiretamente os não residentes que obtêm empréstimos dos residentes em moeda local, para investi-los
temporariamente em ativos financeiros estrangeiros, na expectativa de uma desvalorização que lhes
permita pagar seus empréstimos em moeda depreciada. Concretamente, a medida consiste em obrigar os
bancos e outras instituições financeiras que operem por conta própria a depositar no Banco Central, em
moeda local, sob a forma de uma conta não remunerada, uma proporção (igual a um, no máximo) de
todas as suas posições líquidas em divisas no dia-a-dia.
Essa proposta tem a vocação de reduzir os movimentos de capital, tornando-os
automaticamente mais sensíveis às taxas de juros domésticas. A propósito disso, observe-se que,
diferentemente do imposto Tobin, que é neutro em relação ao nível das taxas de juros internas, o
“imposto Wyplosz” tem a vantagem de sobrecarregar a sanção numa proporção direta ao nível dessas
taxas de juros. Mantida a igualdade das demais condições, portanto, ele tem por vocação evitar que a
autoridade monetária pratique taxas de juros exorbitantes, para barrar a especulação em períodos de
dificuldades cambiais.
Na prática, entretanto, e embora a medida não implique a priori uma cooperação
internacional, a evasão continua possível. As transações cambiais são realmente afetadas, no caso de
reequilibração das posições de câmbio: basta que um centro financeiro importante não coopere, para que
as posições cambiais abertas num país que pratique tal taxação pendam para esse centro e, por
conseguinte, não apareçam nos livros dos estabelecimentos domésticos afetados pelo imposto (Garber e
Taylor, 1995). A partir daí, os bancos nacionais limitam-se a fornecer crédito em moeda nacional aos
bancos estrangeiros, que vendem a moeda nacional e, desse modo, podem efetuar os pagamentos
correspondentes nessa moeda.
Outro exemplo: se um Banco Central tiver necessidade de intervir no mercado para
defender sua moeda, os bancos nacionais poderão, para se opor a essa medida, criar um verdadeiro
“balcão de venda” de moeda nacional a esse Banco Central, através dos bancos estrangeiros. Os
pagamentos serão simplesmente garantidos por empréstimos deles em moeda nacional aos bancos
estrangeiros, tendo esses empréstimos como garantia um refinanciamento do Banco Central. Em todos
esses casos, as instituições nacionais não registram posições cambiais em aberto e, desse modo, não
efetuam depósitos no Banco Central. Com isso, a política de defesa da moeda acaba por se revelar
totalmente inoperante (Garber e Taylor, 1995; Kenen, 1995).
Os próprios Eichengreen, Tobin e Wyplosz (1995) reconhecem que, no contexto dessa
regulamentação, um banco que quiser conceder um empréstimo em moeda nacional a um não residente
sempre poderá contornar a punição, emprestando essa moeda diretamente a uma firma nacional, que em
seguida a emprestará ao não residente em questão. Logo, seria preciso instaurar mecanismos de
acompanhamento do empréstimo inicial e taxar todos os empréstimos eventualmente interligados a partir
dele. O irrealismo, nesse caso, sem dúvida suplanta a pertinência técnica.
As duas propostas que acabamos de examinar compõem a essência da literatura. Contudo,
outras sugestões recentes devem ser lembradas. Spahn (1995), por exemplo, propôs um sistema de
taxação em duas etapas, passível de disciplinar as zonas-alvo: um pequeno imposto geral sobre o conjunto
das transações cambiais seria acrescido de um imposto específico, de índice altamente dissuasivo,
aplicável a todas as transações (a termo, com derivativos) efetuadas além dos limites permitidos,
proporcionalmente à distância entre o imposto sobre a transação e o imposto sobre o limite. Grieve Smith
(1997), por sua vez, vê no retorno a uma manutenção automática das taxas de câmbio, através de uma
estreita cooperação entre os bancos centrais, o elemento essencial de uma verdadeira reforma do sistema
financeiro internacional, com vistas a eliminar sistematicamente qualquer forma de especulação.
Assinalamos também o projeto de combinação da proposta inicial de Wyplosz com a
idéia do estabelecimento de um teto dos compromissos bancários a curto prazo em relação aos não
residentes (Eichengreen, Tobin e Wyplosz, 1995, retomada por Sachs, 1998). A proposta de Soros, por
sua vez, consiste em garantir um teto da dívida por país: ela ganha sentido à luz da experiência asiática de
1997.
Além de toda sorte de sugestões coercitivas, entretanto, é a regulamentação preventiva,
acima de tudo, que se coloca hoje em primeiro plano, pela constatação geral de que as finanças
globalizadas precisam de uma regulamentação e de que esta não pode prescindir de uma intervenção
soberana, imprevista e não negociada. Diante da indispensável continuidade dos pagamentos
internacionais, a reflexão derivou para o conteúdo informativo e preventivo da reforma a ser feita.
Aglietta (1998) coloca no centro desse processo a intervenção do emprestador de última instância.
Sob diversas formas, o Comitê de Basiléia, o Instituto de Finanças Internacionais, o
Fundo Monetário Internacional ou a Reserva Federal norte-americana concordam, hoje em dia, quanto à
necessária revisão geral do quadro regulamentar e preventivo internacional e quanto a um
desenvolvimento paralelo da cooperação entre as autoridades bancárias de controle. Essa idéia não é
nova, mas a crise mexicana de 1994 e a crise asiática de 1997 levam a crer que, não sendo feita nenhuma
reforma, a sucessão das crises se tornará cada vez mais grave e os efeitos de contágio serão mais
prováveis: sem uma progressão conjunta das redes de segurança, a probabilidade de manifestação do
risco sistêmico aumenta inelutavelmente, conforme o avanço da globalização dos mercados. Greenspan
(1998) acrescenta que, se os mercados financeiros tornaram-se muito sofisticados, hoje eles punem muito
depressa, e de maneira muito mais profunda do que no passado, os erros das políticas de governo, em
especial a confusão dos poderes. A crise asiática demonstrou que foram assumidos enormes riscos
privados, como se se tratasse de riscos soberanos.
III. ESTUDO COMPARATIVO DAS IMPLICAÇÕES MACROECONÔMICAS
DAS PROPOSTAS DE REFORMA
3.1. Modelo das ligações entre a volatilidade da estrutura
das taxas de câmbio e a mobilidade dos capitais
Diversamente das formalizações habituais, que se interessam por economias isoladas,
procuramos aqui criar um modelo do conjunto das taxas de câmbio, isto é, do sistema monetário
internacional como um todo. Considerando o sistema monetário internacional (SMI) como um conjunto,
limitamo-nos ao estudo de suas inter-relações com o sistema financeiro internacional (SFI). No plano
muito geral em que nos situamos, procuramos compor um modelo das relações entre dois valores
sintéticos: a “volatilidade das taxas de câmbio”, grandeza característica do SMI, e a “velocidade de
rotação internacional do capital”, grandeza característica do SFI. Embora cada um desses valores seja
próprio de cada um dos dois sistemas, existem interdependências entre eles, que são justamente as
interdependências cujo modelo procuramos estabelecer. O objetivo desse exercício é explicitar as
modalidades da interdependência e, mais precisamente, os fatores exógenos que determinam os valores
de equilíbrio, a fim de avaliar as implicações das “reformas” do SFI.
As interdependências entre o SMI e o SFI decorrem, evidentemente, do grau de
mobilidade internacional dos capitais, que é, para nós, uma variável exógena. Esta última define os
movimentos de capital associados à circulação da poupança mundial num período médio. Assim, existe
ex post um “financiamento” ao final do período, ou seja, K. Partimos da suposição de que, durante o
período considerado, essa massa de capitais encontra-se disponível e pode ser utilizada várias vezes. As
operações financeiras efetuadas, portanto, são operações com cobertura dos riscos ou sem cobertura
(“especulação”), isto é, operações que não têm uma contrapartida na balança das operações de base (que
são as “transferências”). A rotação do capital daí resultante fornece a modalidade de movimentos de
capital que nos interessa aqui.
Podemos dizer que a primeira modalidade dos movimentos de capital (mobilidade
internacional) é relativa à lógica dos fluxos compensatórios, e que a segunda (rotação internacional)
relaciona-se com uma lógica das transferências. A idéia deste artigo é considerar que essas duas
modalidades são dissociáveis: existe um volume de capital K (uma variação de estoque) disponível para
tantas quantas forem as operações desejadas durante o intervalo de tempo considerado (fluxo). Os capitais
que transitam durante esse período nos mercados cambiais, portanto, são uma função de k, a velocidade
de rotação dos capitais. Supomos que K é fixado pelos dados reais da economia mundial e procuramos
estabelecer o modelo de k (k≥1), variável que depende das interações entre o SMI e o SFI. Por definição,
chamando C de quantidade de fluxos de capital que transitam pelos mercados de câmbio, temos C = kK.
Apresentaremos sucessivamente a formação do modelo do SMI e a do SFI, antes de
considerarmos o quadro global.
3.1.1. O modelo do SMI
Para simplificar, vamos supor que todos os países que compõem o sistema internacional
pratiquem o mesmo regime cambial, ou seja, um regime de câmbios flutuantes dirigidos, que é um regime
intermediário entre os câmbios fixos e os câmbios flexíveis. Supõe-se que o regime representativo seja o
das zonas-alvo. O modelo das zonas-alvo foi suficientemente estudado pela literatura recente para ser
considerado como a representação menos ruim, sem dúvida, da estrutura atual, pelo menos no que
concerne às grandes moedas. Para simplificar o estudo, suporemos que a zona-alvo é perfeitamente digna
de crédito; o caso da “crise monetária” fica excluído, portanto, e nós nos limitaremos às situações
“normais”. Para não complicar desnecessariamente a formulação do modelo, suporemos ainda que os
limites dessas zonas são simétricos em torno do valor básico da taxa de câmbio e são idênticos para todos
os países.
Nessas condições, definem-se duas “volatilidades” das taxas de câmbio. A primeira
refere-se a sua aceitação habitual e concerne à volatilidade de uma taxa de câmbio em torno de seu valor
estacionário (“volatilidade individual”). A importância dessa volatilidade decorre da natureza do processo
estocástico que afeta a dinâmica do valor básico da taxa de câmbio e dos parâmetros do processo de
filtração que o transforma na dinâmica da taxa de câmbio efetiva. Como é de praxe, suporemos que a
marcha aleatória pode ser representada por um processo browniano, indicado por v, e que a dinâmica da
taxa de câmbio (indicada por s) é dada por v e pelas expectativas. Ou seja, com uma representação
logarítmica linear (Krugman, 1991):
$$ INTRODUZIR FÓRMULAS (1) E (2) DA P. 19,
A SEGUNDA PRECEDIDA PELA PALAVRA “COM”
O valor f é o valor básico, na ausência de choques aleatórios. Podemos considerar, por
exemplo, que f = m, onde m é a oferta de moeda nacional, ou f = m.m* com s como taxa de câmbio,
cotada ao acaso em relação a uma grande moeda de referência e m* a massa monetária do país que emite
essa moeda.
As inovações introduzidas em relação a essa notação padronizada são as seguintes:
1) Considera-se que γ não é uma constante, mas depende da “velocidade de rotação
dos capitais”; quanto mais elevada é essa rotação, mais a taxa de câmbio deve ser considerada como uma
reação às expectativas; em outras palavras, presume-se que o efeito ligado às expectativas depende
apenas das operações de capital, o que é uma hipótese perfeitamente razoável; por conseguinte,
γ = γ(k), onde k é a velocidade de rotação dos capitais,
e γ’>0 e γ ≥ 0; 0 = γ(1) e γ>0 para k>1.
Esta última condição exprime a hipótese anteriormente explicitada, ou seja, a de que
quando k=1, isto é, quando os movimentos internacionais de capital são apenas projeções passivas dos
desequilíbrios de base na balança, não há operações de capital ligadas a uma lógica de transferências e as
expectativas não desempenham papel algum nos mercados cambiais.
2) Passemos da “volatilidade individual” da taxa de câmbio para a “volatilidade
estrutural” do conjunto do SMI, considerando o desvio padrão das dinâmicas das taxas de câmbio, ou
seja, σs. Ao normalizar convenientemente as taxas de câmbio, a média de todas elas torna-se nula. Uma
vez que a curva em S, solução de (1) na hipótese (2) (tendo A como valor do limite), é correspondente a
$$ INTRODUZIR ÚLTIMA FÓRMULA DA P. 19, PRECEDENDO
A SEGUNDA PARTE DA PALAVRA “COM”
obtém-se, nas hipóteses de simetria entre todas as dinâmicas de câmbio e para n países (portanto, n-1
taxas de câmbio expressas em relação a uma enésima moeda):
$$ INTRODUZIR PRIMEIRA FÓRMULA DA P. 20
O desenvolvimento dá: [INTRODUZIR SEGUNDA FÓRMULA DA P. 20],
com {INTRODUZIR TERCEIRA FÓRMULA DA P. 20]
Em virtude de γ = γ (k) ser uma função crescente de k, σs é uma função decrescente de k.
No plano k.σs, a função k é uma hipérbole que tem como assíntotas B, no eixo dos σs, e 1, no eixo dos k.
A relação k = M(σs) define o que poderíamos chamar de uma macro-relação de ajuste
monetário que vai de k a σs. Ela pode ser interpretada da seguinte maneira: quando k aumenta, o capital
circula por um número maior de vezes e as taxas de câmbio são mais reativas às expectativas de
mudança. Assim, com uma dada flutuação aleatória, com determinadas políticas monetárias e
fundamentos dados e com determinados limites das zonas-alvo, as taxas de câmbio atingem mais
lentamente os pisos ou os tetos e, portanto, são mais estáveis. Essa propriedade é o resultado do modelo
de uma zona-alvo digna de credibilidade. Havendo credibilidade da zona-alvo, a probabilidade de
intervenção é reforçada à medida que a taxa de câmbio se aproxima de seu piso ou seu teto e, portanto,
repercute automaticamente na apreciação ou depreciação esperada, o que estabiliza a taxa de câmbio
(efeito “lua de mel”). Como uma zona-alvo com perfeita credibilidade é estabilizadora (as expectativas
tornam a taxa de câmbio mais estável do que a base), o aumento da reatividade às expectativas, que
resulta do aumento da velocidade de rotação dos capitais, age exatamente no mesmo sentido, ou seja, é
um fator de estabilização.
3.1.2. O modelo do SFI
O SFI faz transitarem nos mercados de câmbio três tipos de fluxo: as operações à vista, as
operações a termo e o exercício de opções. Os fluxos C que transitam pelos mercados de câmbio
excluem, por definição, as trocas de divisas, assim como as opções contratadas mas não exercidas.
Devemos considerar que esses três tipos de fluxo são tão mais importantes quanto mais
elevada é a volatilidade da estrutura das taxas de câmbio. Portanto, para um K fixo, o aumento de C deve
traduzir-se num aumento da velocidade k. De fato, quanto maior é a volatilidade entre as moedas, mais
existe uma subscrição de contratos a termo que se distanciam da média esperada. Quer se trate de
operações com cobertura ou sem cobertura (“especulação”), o aumento da volatilidade age no mesmo
sentido o de um aumento dos volumes subscritos e, portanto, de um aumento da velocidade de rotação
dos capitais segundo as hipóteses de nosso modelo, no qual a quantidade global de capital é fixa. O
mesmo acontece com o exercício das opções. Quando a volatilidade é acentuada, as expectativas levam a
uma variedade igualmente acentuada dos preços do exercício de opções, fator de aumento dos volumes de
opções exercidas no momento do fim da opção (abaixo ou acima do preço de exercício). Nas operações à
vista, as compras também são ativadas pelo aumento da volatilidade, em razão dos riscos previstos.
A descrição completa do modelo exigiria que formalizássemos os três tipos de fluxo, o
que seria uma exploração inútil em termos das necessidades da demonstração. Consideremos a existência
de uma função F crescente: k = F (σs). Sem perder a generalidade, é razoável supormos que os operadores
sejam sensíveis ao risco crescente, e portanto, que a segunda derivada dessa função seja negativa.
Sabemos que o valor mínimo de k é 1; trata-se, pois, de produzir o modelo de k acima de 1, isto é, de
fazer uma representação da sensibilidade de k à volatilidade. Uma especificação simples consiste em
considerar uma função potencial de elasticidade constante α. Considere-se a função F, na hipótese de uma
aversão crescente ao risco 0 < α < 1:
$$ INTRODUZIR FÓRMULA (4) DA P. 21
3.1.3. O modelo de análise
As funções M e F definem, por si mesmas, os valores de equilíbrio ... e ... . A obtenção
desse equilíbrio resulta de um processo dinâmico, uma vez que a função M associa a um determinado
valor de k um σs, enquanto a função F determina um valor de k para um σs. O Gráfico 3 representa o
equilíbrio e a dinâmica nos casos em que o processo é convergente.
Gráfico 3
Determinação conjunta da velocidade de rotação dos
capitais e da volatilidade estrutural das moedas
$$ INTRODUZIR FIGURA DA P. 21
O processo dinâmico é:
$$ INTRODUZIR FÓRMULA DA P. 22
Em outras palavras, é o SMI que produz a volatilidade para um dado valor da velocidade
de rotação dos capitais fornecido pelo SFI; inversamente, é o SFI que produz a velocidade de rotação dos
capitais para uma volatilidade dada pelo SMI. Cada sistema determina seu valor característico, mas os
dois são sistemas subdeterminados (para k>1) e abertos um para o outro.
É evidente que o conjunto formado pelo SMI e pelo SFI constitui um sistema de
interdependência, e que a “estabilidade” de um subsistema (SMI ou SFI) implica a “estabilidade” do
outro. No modelo, a convergência para os valores de equilíbrio de k e σs exige que se confirme uma
condição nas respectivas inclinações das duas curvas. De maneira intuitiva, podemos dizer que a
estabilidade do equilíbrio melhora quando a velocidade de rotação do capital é pouco sensível à
volatilidade (α relativamente pequeno) e quando, inversamente, na curva M, a volatilidade é muito
sensível à velocidade de rotação (por exemplo, quando γ é relativamente grande). Sendo o efeito
financeiro relativamente desestabilizador, enquanto o efeito monetário é relativamente estabilizador, a
convergência para o equilíbrio exige que o primeiro efeito não prevaleça sobre o segundo. Produz-se um
processo divergente quando a mobilidade do capital é muito intensamente sensível às variações da
volatilidade das taxas de câmbio, nos casos em que, por seu lado, o efeito estabilizador da mobilidade do
capital na volatilidade (o efeito monetário) é pequeno.
Assim, as reformas que visam à “estabilização”, quando o sistema é divergente, devem
contribuir para diminuir a sensibilidade dos movimentos de capital à volatilidade e para aumentar a
sensibilidade da hierarquia das taxas de câmbio aos movimentos de capital. Deste ponto em diante,
consideraremos que os parâmetros são tais que o sistema é convergente, para nos limitarmos aos
problemas que consistem em atuar sobre os valores de equilíbrio ... e ... .
3.2. Ensinamentos do modelo para a análise dos impactos
Inicialmente, consideraremos o problema em termos formais, antes de contemplar a
avaliação das propostas existentes.
3.2.1. A assimetria dos efeitos
É fácil constatar, com a ajuda do gráfico anterior, que os efeitos dos deslocamentos de
funções e das mudanças de inclinação não são simétricos, quando consideramos as ações na curva M ou
na curva F. Atribuamo-nos como objetivo, por exemplo, diminuir o valor de equilíbrio da “volatilidade”
do SMI. Esse resultado pode ser obtido de duas maneiras.
Pode ser obtido por um deslocamento da função M para baixo. Nesse caso, a redução da
volatilidade é simultaneamente acompanhada por uma diminuição do valor de equilíbrio da velocidade de
rotação do capital. Os meios que podem ser mobilizados para esse fim são descritos pela equação (3):
pode-se tratar de uma diminuição plausível dos limites (redução de A), ou de uma diminuição do número
de moedas presentes, ou ainda, de uma medida que vise a um valor menor das taxas básicas ou uma
estabilização maior da variância da perturbação (diminuição da abcissa B da assíntota).
A redução da volatilidade do sistema também pode ser obtida por uma ação na curva F,
ou seja, através de uma segunda série de recursos. A curva F apóia-se no valor 1 e, por conseguinte, as
únicas possibilidades de modificação concernem às mudanças de inclinação. O objetivo da diminuição da
volatilidade pode ser atingindo aumentando-se a inclinação da F, o que significa uma ação no sentido do
aumento da sensibilidade da velocidade de rotação dos capitais à volatilidade. Observe-se que as
mudanças referentes ao SFI têm efeitos contrários em relação às mudanças no SMI:
as modificações que visam a diminuir a volatilidade levam a um valor mais alto de
equilíbrio da velocidade de rotação dos capitais; as medidas centradas na esfera financeira implicam, pois,
um aumento dos capitais que circulam pelos mercados de câmbio, diversamente das ações centradas no
sistema monetário;
o lucro obtido em relação ao valor de equilíbrio pode ter uma contrapartida
negativa, em termos da dinâmica, pois é possível que o equilíbrio se torne instável. Um aumento da
sensibilidade dos capitais à volatilidade (aumento da inclinação de F), com efeito, é um fator capaz de
desestabilizar uma dinâmica até então estável.
Assim, os impactos são ambíguos, sobretudo se considerarmos as propostas de reforma
que têm o efeito de modificar simultaneamente as duas curvas.
3.2.2. Classificação dos impactos das propostas
As propostas existentes têm como efeito, principalmente, agir sobre dois dados do
modelo: o limite A da função M, pois, em geral, elas resultam numa mudança do rendimento esperado
dos capitais, e o valor α da inclinação da função F, pois elas modificam simultaneamente, em geral, a
sensibilidade dos movimentos de capital à volatilidade, ou seja, o parâmetro de risco.
Consideremos, primeiramente, os efeitos macroglobais de um imposto Tobin. Este leva a
que se atue simultaneamente na curva M e na curva F. A princípio, o imposto tem o efeito de fechar os
limites A da zona-alvo, diminuindo o rendimento esperado das aplicações de capital, como vimos
anteriormente. Portanto, ele desloca a curva M para a esquerda, o que parece funcionar no sentido de
reduzir a volatilidade cambial e frear os movimentos internacionais de capital.
Mas, ao diminuir o risco, ele diminui ao mesmo tempo a sensibilidade dos movimentos de
capital à volatilidade, isto é, a inclinação da função F, o que atua no sentido de uma freada dos
movimentos de capital e fortalece o efeito monetário, mas funciona, inversamente, no sentido de um
aumento da volatilidade das taxas de câmbio. Por conseguinte, se o efeito macroglobal de um imposto
Tobin é, incontestavelmente, permitir uma diminuição da velocidade de rotação dos capitais, sua
implicação na volatilidade é ambígua. A implementação de um imposto Tobin pode perfeitamente levar a
aumentar a volatilidade do SMI, ou, em outras palavras, falhar em seu objetivo principal, caso esse
objetivo seja estabilizar as variações cambiais.
Esse efeito perverso é fácil de interpretar: o imposto Tobin pode ter o efeito de diminuir
demais a sensibilidade ao risco e, portanto, paradoxalmente, aumentar a volatilidade das taxas de câmbio,
na medida em que estamos supondo que os movimentos de capital são intrinsecamente redutores da
volatilidade, por força de sua intensidade.
Tabela 5
Avaliação das implicações macroeconômicas Efeito em →
Medidas propostas
↓
Curva M Curva F Rotação de equilíbrio dos
capitais
Volatilidade de equilíbrio das
taxas de câmbio
Condições de estabilidade do
equilíbrio
Imposto proporcional (Tobin)
Deslocamento para a esquerda
Redução da inclinação
Diminuição Efeito ambíguo Efeito favorável
Depósito não remunerado (Eichengreen/ Wyplosz)
Deslocamento para a esquerda
Redução da inclinação
Diminuição Efeito ambíguo Efeito favorável
Taxa básica + imposto progressivo (Spahn)
Inalterada ou com
deslocamento muito pequeno
Redução acentuada da
inclinação
Diminuição Aumento Efeito favorável
Manutenção das taxas de câmbio (Grieve Smith)
Torna-se a vertical da abcissa B
Inalterada Diminuição Diminuição Efeito favorável
Teto da dívida por país (Soros)
Inalterada Redução da inclinação
Diminuição Aumento Efeito favorável
Teto dos compromissos bancários (Eichengreen, Wyplosz e Tobin, Sachs, Aglietta)
Inalterada Indeterminada Indeterminada Indeterminada Efeito indeterminado
Reforço do quadro pre-ventivo e regulamentar (Instituto de Finanças In-ternacionais, Tesouro e Reserva Fede-ral dos EUA, Fundo Monetá-
Deslocamento para a esquerda
Redução da inclinação
Diminuição Indeterminada Efeito favorável
rio Interna-cional)
Todavia, nota-se que, do ponto de vista dinâmico, um imposto Tobin continua a se prestar
a reforçar as condições de estabilidade do equilíbrio, pois diminui a inclinação da função F, em troca de
uma inclinação inalterada da função M.
As implicações das outras propostas são fáceis de apreciar, à luz dos seguintes critérios: o
efeito sobre os valores de equilíbrio e o efeito nas condições de estabilidade desse equilíbrio. A tabela
abaixo permite classificar as implicações associadas às propostas constantes da Tabela 4. Para destacar as
implicações contrastantes das diferentes propostas existentes, procuramos, na Tabela 5, levar ao extremo
a lógica que caracteriza cada uma delas.
CONCLUSÃO
A análise precedente procurou mostrar que a instabilidade dos mercados de câmbio e dos
mercados financeiros não exprime, necessariamente, um excesso de liquidez internacional, como se
costuma supor. Se essa análise estivesse certa, ela significaria que qualquer estratégia destinada a
restringir o nível das massas de capital falharia inelutavelmente em seu objetivo principal, que é o de agir
sobre as velocidades de rotação.
No modelo anterior, quisemos demonstrar a formação da velocidade de rotação
internacional dos capitais, partindo da idéia de que essa velocidade não podia ser determinada nem no
interior do sistema monetário internacional nem tampouco apenas no sistema financeiro internacional.
Num contexto de análise da interdependência monetária e financeira, mostramos que a velocidade de
rotação dos capitais não era indeterminada e podia estabilizar-se num “valor de equilíbrio”.
Nesse mesmo quadro de análise, foi possível avaliar as implicações dos diferentes
projetos de reforma do sistema financeiro internacional. Essa avaliação evidencia a necessidade de
especificar os objetivos visados por tais reformas, a fim de aquilatar sua eficácia. Sob esse ponto de vista,
consideramos algumas propostas gerais, mostrando que sua aplicação poderia ter efeitos contrastantes
sobre a velocidade de rotação dos capitais e sobre a volatilidade das taxas de câmbio, bem como sobre as
condições de estabilidade dos valores de equilíbrio. Alguns projetos traduzem-se, ao mesmo tempo, numa
diminuição dos valores de equilíbrio da rotação e da volatilidade, ao passo que outros se traduzem numa
troca entre a rotação e a volatilidade.
Visto por esse prisma, o artigo apresenta um primeiro arcabouço. A hierarquização exata
dos méritos e inconvenientes comparativos dos diferentes projetos e a escolha de uma reforma apropriada
implicariam ir mais adiante, com a ajuda de estudos teóricos e econométricos muito mais aprofundados.
De qualquer modo, fica bastante claro que as escolhas e a hierarquização não são uma questão de doutrina
que oponha uma filosofia “liberal preventiva” a uma filosofia “intervencionista coercitiva”. Cremos ter
mostrado, ao contrário, que o debate pode ser analiticamente formulado, levando em conta as interações
dinâmicas entre o sistema monetário internacional e o sistema financeiro internacional.
Anexo I
Volatilidade das taxas de câmbio nominais1
(Médias anuais em %)
País 19832-96 1993-94 1995-96
Bélgica 2,5 3,0 2,6
Holanda 2,8 2,6 3,0
França 2,9 2,8 3,0
Dinamarca 3,0 3,2 2,7
Espanha 3,3 4,6 3,1
Alemanha 3,4 3,7 3,9
Canadá 3,5 4,4 4,1
Itália 3,7 5,4 6,3
Suécia 3,9 6,8 5,6
Estados Unidos 4,7 4,2 3,8
Reino Unido 5,2 4,9 4,3
Japão 6,4 7,2 7,4
Austrália 7,5 8,0 7,1
Fonte: Banco de Compensações Internacionais
1 A volatilidade é medida como o desvio padrão anual das alterações percentuais diárias das taxas de
câmbio nominais efetivas, calculadas ao longo de um mês. As taxas de câmbio nominais efetivas
baseiam-se nos fluxos de comércio de produtos manufaturados entre 25 países.
2 Outubro a dezembro.
Anexo 2
Evolução dos regimes cambiais
Critérios
de classificação1
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
Moeda cuja taxa é estabelecida
em relação:
ao dólar (EUA) 24 24 21 23 22 21 21
ao franco francês 14 14 14 14 14 14 15
Ao rublo russo - 6 - - - - 5
a uma outra moeda 4 6 8 8 8 9 11
ao DTS 6 5 4 4 3 2 2
a um conjunto de outras moedas 33 29 26 21 19 20 17
Regime com flexibilidade limitada
em relação a uma única moeda
4
4
4
4
4
4
4
Mecanismo de cooperação monetária 10 9 9 10 10 12 12
Regime de ajuste da taxa de câmbio
em função de um conjunto de
indicadores
5
3
4
3
2
2
-
Regime de flutuação dirigida 27 23 29 33 44 45 48
Regime de flutuação independente 29 44 56 58 54 52 51
Total: 156 167 175 178 180 181 181
Fonte: Fundo Monetário Internacional.
1 No caso dos países que instituíram mercados de câmbio duplos ou múltiplos, o regime cambial
indicado é o que está em vigor no mercado principal.
Anexo 3
Condições de estabilidade na especificação aceita
O processo é:
[INTRODUZIR PRIMEIRA FÓRMULA DA P. 28 DO ORIGINAL].
O processo converge para um valor de equilíbrio quando:
[INTRODUZIR SEGUNDA FÓRMULA DA P. 28 DO ORIGINAL].
com µ, a derivada de (3) em relação a k, ou seja:
[INTRODUZIR TERCEIRA FÓRMULA DA P. 28 DO ORIGINAL].
Como µ é negativo e F’ é positivo, o produto µF’ é sempre negativo. A condição de
estabilidade impõe apenas que o produto seja superior a -1, isto é, que:
[INTRODUZIR QUARTA FÓRMULA DA P. 28 DO ORIGINAL].
Anexo 4
Principais iniciativas conjuntas dos bancos centrais:
nível micropreventivo
Ano Campo Resumo
1975 Atividades bancárias
transnacionais
“Concordata” de Basiléia. Define os princípios diretores da
distribuição das responsabilidades entre as autoridades do país de
origem e do país hospedeiro no controle dos estabelecimentos
bancários no exterior.
1983 Atividades bancárias
transnacionais
Revisão da “Concordata”. Introduz o princípio do controle
consolidado. Reforça o acordo inicial, de maneira a preencher as
lacunas que possam resultar de um controle inadequado dos
centros financeiros ou de estruturas específicas das companhias
controladoras.
1988 Adequação do capital próprio Acordo de Basiléia sobre o capital próprio. Pretende assegurar uma
convergência internacional da medida e das normas do capital
próprio. Trata explicitamente apenas do risco do crédito. Define:
(a) os elementos aceitos do capital próprio; (b) as diferentes
ponderações de risco aplicáveis a várias grandes categorias de
riscos de balanço e extra-balanço; (c) a proporção global mínima
de 8% do ativo para o capital próprio, ponderada em relação ao
risco, sendo pelo menos 4% para o núcleo (categoria 1) do capital
próprio; a definição dos componentes do núcleo é plenamente
harmonizada.
1990 Relações entre as autoridades
de controle
Troca de informações entre autoridades controladoras e
interventores dos mercados financeiros. Acordo sobre a
necessidade de eliminação progressiva dos obstáculos à troca
preventiva de informações entre as diferentes categorias de
autoridades de controle. Examina os meios de facilitar o fluxo das
informações.
1992 Atividades bancárias
transnacionais
Normas mínimas para o controle dos grupos bancários
internacionais e seus estabelecimentos no exterior. Reforça a
Concordata de Basiléia, introduzindo normas mínimas acerca de
alguns de seus aspectos, sobretudo sob a forma de condições
destinadas a impedir a implantação, no estrangeiro, de
estabelecimentos bancários não submetidos a um controle efetivo
consolidado, ou pertencentes a conglomerados obscuros.
1994 Instrumentos derivativos Diretrizes para a gestão dos riscos ligados aos instrumentos
derivativos (relatório conjunto com a OICV). Define diretrizes
para as autoridades controladoras e as organizações bancárias, no
intuito de promover uma gestão interna sadia dos riscos ligados às
atividades dos bancos com instrumentos derivativos; reúne os
métodos utilizados pelos grandes bancos internacionais.
(Documento complementado, em 1995, por um Esquema de
informações preventivas acerca das operações com instrumentos
derivativos dos bancos e financeiras.)
1995 Instrumentos derivativos/
negociações
Difusão de informações sobre as atividades de negociação e os
instrumentos derivativos dos bancos e empresas financeiras
(documento elaborado em conjunto com o OICV). Proporciona
uma visão global das práticas em matéria de disseminação de
informações e formula recomendações para aperfeiçoá-la; sublinha
a necessidade da transmissão de informações suficientes para que
se possa avaliar o caráter adequado dos sistemas de gestão dos
riscos (com base num relatório de 1995 [ver o item anterior] e em
alguns dos conceitos analisados num documento de trabalho de
1994 do Comitê Permanente de Euromoedas [bancos centrais do
G-10], intitulado Public disclosure of market and credit risks by
financial intermediaries [Revelação pública dos riscos de mercado
e de crédito pelos agentes financeiros], ou “Relatório Fischer”.
1995 Relações entre as autoridades
controladoras
Supervisão dos conglomerados financeiros. Relatório do Grupo
Tripartite (informal) de autoridades controladoras dos bancos,
empresas de investimento e companhias de seguros; examina
alguns aspectos da supervisão e formula diversas recomendações
para aprimorar as práticas de prevenção.
1996 Adequação do capital próprio Emenda ao acordo sobre o capital próprio, a fim de estendê-lo aos
riscos de mercado. Estabelece normas mínimas sobre o capital
próprio em relação aos riscos de mercado (os resultantes das
flutuações das taxas de juros e dos preços das ações somente
carteira de negócios , bem como dos movimentos cambiais e dos
preços das matérias-primas). Considera duas possibilidades: (a)
método padronizado, baseado num dispositivo comum de
mensuração dos riscos; (b) abordagem pautada nos modelos
nacionais, que permite aos bancos utilizá-los para calcular o risco,
desde que sejam observados alguns critérios qualitativos e
quantitativos e de que sejam atendidos alguns controles ex post.
1996 Adequação do capital próprio Multilateral netting of forward value foreign exchange transactions
[compensação multilateral de transações a termo em moeda
estrangeira]. Emenda ao acordo de 1988 sobre o capital próprio,
que entrou em vigor no fim de 1995 e estendeu o reconhecimento
dos sistemas de compensação bilateral (como mecanismos
destinados a reduzir a exposição aos riscos de crédito) a todos os
que fossem considerados eficazes nos termos das leis
correspondentes, e que estivessem em conformidade com as
normas mínimas definidas no Relatório Lamfalussy. O novo
documento forneceu diretrizes sobre a determinação das
exigências de capital próprio no caso dos sistemas de compensação
multilateral.
1996 Atividades bancárias
transnacionais
Supervisão das atividades bancárias transnacionais. Relatório
conjuntamente elaborado com o Grupo Offshore das autoridades
de controle bancário, contendo 29 recomendações destinadas a
reduzir os obstáculos a uma supervisão eficaz das atividades
bancárias transnacionais.
1997 Risco da taxa de juros Princípios para a gestão do risco da taxa de juros. Documento
submetido a exame, formulando 12 princípios que permitem
avaliar o caráter adequado da gestão do risco da taxa de juros pelos
bancos.
1997 Princípios fundamentais Princípios fundamentais para um controle bancário eficaz.
Documento submetido a exame, estabelecendo 25 princípios
preventivos que abrangem os seguintes campos: precondições de
um controle bancário eficaz; credenciamento e estrutura dos
estabelecimentos; regulamentação e exigências preventivas;
métodos de controle bancário permanente; exigências em matéria
de informação; poderes institucionais das autoridades
controladoras; atividades bancárias transnacionais. Destinado a
servir de referência para as autoridades encarregadas da prevenção
e outras dos diferentes países, bem como em escala internacional.
Fonte: Banco de Compensações Internacionais.
Anexo 5
Principais iniciativas conjuntas dos bancos centrais:
nível macropreventivo
Ano Campo Resumo
1990 Compensação interbancária Relatório do Comitê sobre os sistemas de compensação
interbancária dos bancos centrais dos países do Grupo dos Dez
(Relatório Lamfalussy). Recomenda uma série de normas mínimas
para o funcionamento dos sistemas transnacionais de compensação
divisas múltiplas e define os princípios de um
acompanhamento conjunto pelos bancos centrais. Sublinha a
necessidade de uma base jurídica sólida e de mecanismos bem
estruturados para a gestão dos riscos do crédito e da liquidez. Esses
sistemas devem permitir, no mínimo, assegurar o pagamento no
prazo previsto (dia a dia), caso o participante que apresenta a
posição devedora líquida mais elevada fique impossibilitado de
saldar seus compromissos.
Esse é um documento de referência para todos os sistemas
posteriores de compensação multilateral, inclusive os dispositivos
de caráter exclusivamente nacional (com base num relatório de
1989).
1992 Pagamento de operações com
títulos
Entrega contra pagamento nos sistemas de compensação de títulos
(G-10). Define e analisa os tipos e fontes de riscos associados ao
pagamento de títulos entre participantes de um mesmo sistema.
(Complementado, em 1995, por um relatório sobre os pagamentos
transnacionais de títulos.)
1993 Sistemas de pagamento de
grandes somas
Minimum common features for domestic payment systems (UE)
[Características mínimas comuns para os sistemas de pagamento
nacionais (UE)]. Estabelece normas mínimas para os sistemas de
transferência de grandes somas e recomenda a adoção, o mais cedo
possível, de um sistema de pagamento bruto em tempo real
(PBTR), para o qual deve ser direcionado o máximo desses
pagamentos. Seguindo essa óptica, o IME lançou, em 1994, um
projeto que pretende ligar os sistemas de PBTR nacionais
(TARGET), complementado, em 1995, por um relatório detalhado.
1994 Moeda eletrônica Report on prepaid cards (UE) [Relatório sobre cartões previamente
pagos (UE)]. Analisa essa nova técnica de pagamento e recomenda
que somente os estabelecimentos de crédito (bancos) sejam
autorizados a emitir cartões previamente pagos para utilização
múltipla.
1996 Pagamento de operações
cambiais
Risco de pagamento nas operações de câmbio (G-10). Fornece
uma definição clara do risco de pagamento nas operações
cambiais, um método para medi-lo e uma estratégia para reduzi-lo.
Esta última incentiva, em especial, as iniciativas dos
estabelecimentos, grupos profissionais e bancos centrais.
1996 Mercados de derivativos Proposal for improving global derivatives market statistics (G-10)
[Proposta de aperfeiçoamento das estatísticas de mercado dos
derivativos globais (G-10)]. Estabelece uma proposta minuciosa
para a compilação e publicação periódicas (a cada seis meses) de
estatísticas sobre os instrumentos derivativos pulverizados (dá
continuidade a um relatório de 1995).
1996 Moeda eletrônica Implications for central banks of the development of electronic
money (BRI) [Implicações do desenvolvimento da moeda
eletrônica para os bancos centrais (BRI)]. Analisa os aspectos que
apresentam interesse especial para os bancos centrais no que
concerne à política a ser adotada, sobretudo para aqueles que estão
ligados ao acompanhamento dos sistemas de pagamento, à
cunhagem de moedas, à política monetária e à regulamentação e
controle dos bancos.
1997 Pagamento de operações com
títulos
Disclosure framework for securities settlement systems (G-10 &
OICV) [Estrutura de divulgação de sistemas de pagamento de
títulos (G-10 e OICV)]. Estimula a transparência no
funcionamento dos sistemas de pagamento de títulos, a fim de que
os participantes possam compreender melhor seus direitos,
obrigações e riscos.
1997 Sistemas de transferência de
pagamentos de grandes
somas
Sistemas de pagamentos brutos em tempo real (G-10). Trata da
concepção desses sistemas e dos riscos que eles comportam.
1997 Pagamento de operações com
instrumentos derivativos
Clearing arrangements for exchange-traded derivatives (G-10)
[Acordos de compensação para derivativos vinculados ao câmbio
(G-10)]. Descreve a estrutura dos acordos de compensação
existentes e identifica os pontos fracos potenciais, tais como:
insuficiência de recursos dos órgãos de compensação, em caso de
falência de algum participante em conseqüência de flutuações
acentuadas nos preços; falta de controles em tempo real sobre as
posições dos membros; recurso a acordos de pagamento que não
assegurem a quitação diária no prazo prescrito.
Fonte: Banco de Compensações Internacionais
A economia brasileira no Século XIX.
No início do século XIX, as autoridades das capitanias não tinham autonomia de
ação administrativa, ainda eram subordinadas à autoridade do vice-rei , que cuidavam
da ordem na colônia e dos interesses portugueses aqui estabelecidos. Os vice-reis eram
responsáveis pelo correto envio da riqueza produzida no “Brasil colônia” para Portugal.
Depois da vinda da Família Real Portuguesa ao Brasil, em 1808, o Brasil fora
elevado à Reino Unido de Portugal e Algarves, oficialmente em 1815. Analisando os
aspectos econômicos do Brasil na época, percebemos um profundo atraso e estado de
deploração.
A agricultura no Brasil, ainda utilizava os mesmos mecanismos do século XVI,
no início do século XIX, houve grande queda da atividade canavieira, do algodão e do
tabaco. A pecuária estava concentrada em Minas Gerais e no Rio Grande do Sul,
produzindo laticínios e charque, respectivamente.
A mineração no início do século XIX, atingiu o seu mais baixo rendimento em
virtude do esgotamento das jazidas brasileiras. No Brasil, não havia desenvolvimento
industrial, pois a atividade era proibida desde 1785. O comércio, antes da abertura dos
portos, era restrito ao monopólio da Metrópole. A atividade de transportes dependia de
péssimas estradas que encareciam os produtos.
Um dos fatores que incentivaram a vinda da Família Real ao Brasil, o Tratado de
Fontainebleau, que estabelecia a divisão das colônias portuguesas entre França e
Espanha, apressou a decisão de Dom João. A vinda da Família garantiu a instalação da
indústria no Brasil e o acesso inglês ao mercado consumidor brasileiro, fortalecendo o
comércio da colônia. Um grande número de firmas inglesas se estabeleceram no Brasil
para difundir o consumo de artigos provindos da Inglaterra.
A EVOLUÇÃO DA ECONOMIA NA REPÚBLICA VELHA
A segunda metade do século XIX representou um período de grande
transformação econômica da história brasileira. Esta transformação foi conseqüência da
abolição do tráfico africano, ocorrida ainda no Brasil Imperial, após 1850, mas seus
efeitos se fizeram sentir ao longo de toda a segunda metade do Século XIX,
desencadeando um período de franca prosperidade e larga ativação da vida econômica
do país, mas boa parte dos empreendimentos que se fez foi apenas resultado da
especulação, estimulada pela liberação de capitais que antes eram utilizados no tráfico
negreiro e também pela inflação de crédito e grandes emissões de papel-moeda.
Inegavelmente, porém, podia se constatar que o país entrava numa fase antes
desconhecida, em relação às atividades financeiras, surgindo um capitalismo, embora
incipiente e foi na agricultura que se observaram os maiores crescimentos da produção
brasileira, tendo seu ponto forte na lavoura do café do Rio de Janeiro, que contou com
uma base financeira e de crédito, além de um aparelhamento comercial que permitiu
considerável expansão.
O período da Guerra do Paraguai, entre 1865 e 1870, serviu para comprometer
as finanças do Brasil, porque o país teve que arcar com grandes gastos que causaram
algum desequilíbrio financeiro que levaram o Império a ter dificuldades para equilibrar
seus orçamentos. Os males foram agravados pelos empréstimos, principalmente
externos, feitos durante a guerra, fazendo com que o Império se extinguisse vinte anos
depois sem ter podido restabelecer a ordem financeira.
Apesar disto, o progresso material do Brasil, já iniciado antes do conflito
retomou o seu curso logo depois, num ritmo rápido e seguro. Os decênios de 70 e 80
foram de grande prosperidade para o país, mostrando capacidade de recuperação de um
organismo econômico em pleno crescimento. O surto de atividades iniciado em 1850
não se interrompeu e já se podia observar a concentração de capitais de certo vulto,
provenientes da agricultura, cuja prosperidade foi notável. Neste período também teve
início a substituição do trabalho escravo por trabalhadores livres, que mobilizou os
capitais antes investidos na propriedade humana.
Por outro lado a vida financeira do país aparelhou-se com a multiplicação de
bancos, de empresas financeiras, de companhias de seguro, de negócios da bolsa, que
permitiram captar e mobilizar em escala significativa as fontes de acumulação
capitalista. A antiga colônia se modernizou com o esforço para sincronizar sua atividade
com o mundo capitalista contemporâneo, mas os grandes empreendimentos industriais,
indispensáveis para a realização de qualquer atividade posterior, estavam ainda abaixo
das possibilidades do capital privado local que apenas dava seus primeiros passos, desta
forma o capital estrangeiro, principalmente o inglês desempenhou um importante papel.
O Império, quando em 1889 se extinguiu deixou coberta uma ampla e
importante etapa da evolução econômica do país, que foi recebida pela República. O
aparelhamento técnico havia se desenvolvido bastante, as estradas de ferro, que tiveram
início em 1852 já somavam uma expressiva extensão, a navegação a vapor se estendera
largamente através de linhas internacionais e uma bem feita articulação ao longo do
litoral brasileiro desde o Pará até o Rio Grande do Sul, prolongando-se pelo Rio da
Prata e pela bacia dos rios Paraná e Paraguai até Mato Grosso, não deixando de alcançar
também o Amazonas.
O Império deixou também desenvolvida uma rede telegráfica de quase 1000 km
de linhas, articulando-se por todas as capitais e cidades mais importantes do país, isto
sem contar com os cabos submarinos que ligavam o Brasil a diferentes partes da Europa
e América. Juntava-se a isto o relativo progresso industrial, das manufaturas têxteis em
particular nas vizinhanças das fontes de matéria-prima, o algodão. A energia para as
indústrias que se concentravam no Rio de Janeiro, em Minas Gerais e alguns centros do
Nordeste, como Pernambuco e Bahia, era ainda um problema secundário.
A questão de mão-de-obra nos maiores centros, onde a indústria se localizava,
foi resolvida a baixo custo com uma população livre, mas pobre, porque para a indústria
nascente o trabalho escravo se mostrou completamente ineficaz. Mas, a indústria
brasileira estava apenas no começo e ainda tinha um longo caminho para percorrer antes
de sair de sua mediocridade e teria que lutar com dificuldades que limitaram
consideravelmente seus horizontes. Este painel apesar de todas as transformações se
manteria porque faltava o que a moderna indústria fabril e mecanizada exigia como
fundamental: um mercado amplo e em contínua expansão, que exigia condições sociais
e econômicas que a grande massa da população brasileira não podia oferecer.
A economia brasileira estava assim presa num círculo vicioso que somente
transformações futuras de vulto poderiam livrar: ela estava completamente dominada
por uma atividade produtiva baseada no trabalho escravo e voltada inteiramente para
uns poucos gêneros agrícolas destinados à exportação. Este fato se de um lado
representava a riqueza do Brasil, por outro lado era a causa de suas limitações, porque
estava restrita ao monopólio de um produto muito procurado nos mercados
internacionais: o café, complementado apenas pela borracha, pelo açúcar e pelo cacau.
Desta forma o Brasil tinha uma base econômica muito precária, dependente de uma
conjuntura de incertezas que estava fora de seu controle e isto viria a ser demonstrado
de forma dolorosa.
Graças ao café esta fase foi marcada pela expansão da economia e das finanças
públicas que apesar dos déficits constantes podia fazer frente às necessidades
administrativas e realizar algumas obras de vulto; até a moeda sempre tão precária, se
fortaleceu e dava à Monarquia certa estabilidade; o crédito brasileiro no exterior era
sólido, o que assegurava aplicações de capitais estrangeiros, sobretudo em empréstimos
públicos. Havia assim certo equilíbrio da economia, mas, esta situação embora sendo
conveniente para o momento presente, representava um saque ilimitado sobre o futuro.
O que impediu a ocorrência de problemas mais graves foi a coincidência entre os
déficits crônicos das finanças públicas e a contínua expansão da economia do país, que
de modo geral tinha numerário suficiente e as emissões não degeneravam em inflação.
Mas pode-se dizer que o Brasil sob o Império não gozou, em nenhum momento de
estabilidade e segurança financeira, e a instabilidade não permitiu a consolidação da
vida econômica e social, o que seria fonte de problemas para o futuro.
Uma importante contradição da evolução econômica nesta fase foi a questão do
trabalho. A decadência da escravidão, representada pela redução contínua da massa
escrava e a crise crônica da mão-de-obra, fazia com que o colapso do sistema produtivo
fosse previsto e isto se refletia em largas agitações políticas no Parlamento, na
imprensa, nas acirradas polêmicas da época, havia quem achasse que a abolição da
escravidão decretaria o fim da economia da grande lavoura porque seria impossível
conviver com o trabalho livre e assalariado substituindo a escravidão. Mas não foi isto
que aconteceu, porque a lavoura do café continuou a se desenvolver sob o regime do
trabalho livre de imigrantes europeus, mas não se pode dizer que a adaptação tenha sido
de fácil realização.
Outro ponto que deve ser considerado foi a grande modificação do equilíbrio
demográfico e geo-econômico do país na segunda metade do século XIX.
Primeiramente porque a decadência de uma região densamente povoada desde a
colônia, como a do Nordeste e seu empobrecimento, resultaram em correntes
demográficas fortes e constantes, que partiam em demanda de regiões com melhores
perspectivas de vida. e a grande seca de 1877-80 acelerou o processo e despovoou o
interior nordestino do Ceará até a Bahia. As regiões que a população buscava eram
sobretudo: o vale amazônico por causa da borracha; o sul da Bahia pelo cacau e
finalmente São Paulo o grande pólo em crescimento.
Outro fator importante e fundamental para o futuro foi a colonização estrangeira
no extremo sul do país, particularmente o Rio Grande do Sul. Nesta região não existia a
grande lavoura e o imigrante não se fixou como assalariado, mas encontrou facilidades
para estabelecer pequenas propriedades e assim nesta região, ao invés de grande lavoura
do tipo do café, açúcar ou algodão que produziam para o comércio exterior, surgiram
pequenas culturas e outras atividades de caráter local, destinadas ao abastecimento
interno do país.
O Endividamento Externo e o "Saneamento" Financeiro
Toda a transformação política e administrativa operada na história das finanças
brasileiras, não poderia se estabilizar e normalizar sem anos de lutas e agitações, do
Império unitário, o Brasil passou bruscamente com a República para uma federação
largamente descentralizada que entregou às antigas Províncias, então Estados, uma
considerável autonomia administrativa, financeira e até política.
Não demorou muito para que o país entrasse em forte crise financeira, derivada
das emissões incontroláveis e arbitrárias provenientes do Império, que se fazia sempre
que havia falta de meio circulante suficiente. O Império chegou a autorizar a emissão de
moeda por bancos particulares. A desorganização não permitia que fosse mantida uma
política de emissões que permitisse o equilíbrio entre o volume monetário e as
necessidades financeiras, as emissões eram realizadas por medidas de emergência, sem
qualquer controle.
O grande progresso das atividades econômicas ainda aumentava mais a
necessidade de emissões de moeda e no primeiro momento da República a arrecadação
normal de tributos foi impactada pela transferência, para os Estados, de alguns tributos,
com grande desfalque para as finanças nacionais e enquanto diminuía a receita, crescia
consideravelmente os encargos com as insurreições armadas e golpes que se sucederam
após 1891.
Às emissões se associou um momento de grande especulação financeira, devido
ao surgimento de grande número de novas empresas principalmente indústrias. A
maioria dessas novas empresas, no entanto, eram fantasmas e não tinha existência senão
no papel, organizadas para permitir a emissão de ações que eram despejadas no mercado
de títulos, com o único propósito de obter valorizações sucessivas. Esta abertura de
indústrias foi estimulada pelo governo positivista de Floriano Peixoto.
Em fins de 1891 estourou a crise e se desmanchou o falso castelo levantado pela
especulação. De um momento para outro despencou o valor da enxurrada de títulos que
abarrotava a bolsa e o mercado financeiro. A débâcle arrastou muitas instituições de
bases mais sólidas, mas que não resistiram à crise e as falências se multiplicaram, o ano
de 1892 foi de quebradeira e liquidação e em conseqüência de desemprego.
Paralelamente a situação deficitária da balança de pagamentos estava se
agravando e tudo isto se refletia nos centros financeiros do exterior, determinando a
suspensão de remessas de novos capitais para o Brasil e mais ainda a liquidação
apressada de todas suas disponibilidades. O mercado externo passou a não investir no
Brasil devido a instabilidade reinante e o resultado foi a queda do câmbio e uma rápida
desvalorização da moeda nacional que não tinha lastro em ouro.
A situação ainda foi agravada pela ação das finanças internacionais que
conseguiram penetrar cada vez mais profundamente na vida econômica do país,
conquistando fortes e sólidas posições no terreno da maior riqueza do país, o comércio
do café, que passou daí por diante a ser estreitamente controlado em função dos seus
interesses.
Todas as dificuldades somadas deram na crise e bancarrota de 1898. As falências
se multiplicaram, o Tesouro não pode mais fazer frente a seus compromissos e o Brasil
declarou falência: "Funding Load" que foi a moratória dos credores externos declarada
no governo de Campos Sales quando era Ministro da Fazenda Joaquim Murtinho, que
implantou uma política econômica ortodoxa, de liberalismo, na qual o Estado não
deveria influir na economia. Os compromissos externos passaram a ser os mais
importantes nas finanças do país.
Com o "Funding Load" as dívidas brasileiras foram unidas numa só e o Brasil
conseguiu um prazo de três anos para o pagamento dos juros, enquanto que o principal
só voltaria a ser amortizado em 1911. A suspensão dos pagamentos regularizou de
imediato a situação do Tesouro Público e aliviou o mercado de câmbio fortalecendo a
moeda cuja desvalorização chegou a proporções consideráveis. Nesta fase foram
vendidas empresas, navios de guerra e até a alfândega foi hipotecada. O ajuste
financeiro foi obtido, mas sob o ponto de vista social ele foi um desastre.
O acordo resolveu a angustiosa situação financeira do país, o Tesouro Público
bem como o mercado cambial foram desafogados, foi reencontrada a confiança perdida
no descalabro dos anos anteriores e foi possível iniciar uma política enérgica de
restauração, condição, aliás, imposta pelos credores e que obrigou o país a sacrifícios
consideráveis. As despesas públicas foram cortadas com grande prejuízo para a
administração e os impostos foram aumentados.
Os grandes beneficiários das reformas de 1898 foram sem dúvida as finanças
internacionais e o London & River Plate Bank foi quem ficou com a incumbência de
monitorar o acordo. Campos Sales cumpriu o estabelecido e a situação financeira do
Brasil pode encontrar alguma estabilidade, com o investimentos retornando ao país,
cujas portas se abriram nas mais vantajosas aplicações.
Os ajustes permitiram não somente o restabelecimento do equilíbrio das contas
externas do país, mas a obtenção de um saldo que tornou possível o aparelhamento
material e a sensível ascensão dos padrões da vida nacional, ajudada também pelo
incremento da produção e das exportações, que permitiram efetuar os pagamentos ao
exterior, tanto na remuneração dos capitais estrangeiros aqui invertidos, como nas
importações maciças de bens e serviços que começaram a transformar a vida do país.
Naquele momento o Brasil e a República precisavam dar ao mundo uma imagem
de país civilizado. O país se modernizou e a cidade do Rio de Janeiro, no governo de
Rodrigues Alves, tendo como Prefeito Pereira Passos passou por grande transformação:
o porto foi modificado e foi construída uma malha viária que abriu a Avenida Central,
atual Rio Branco e modificou todo o seu centro, transformando a capital numa cidade
limpa, arejada e moderna. Como parte dos investimentos da época começou a se
expandir as linhas de trem para os subúrbios: Central do Brasil e a Leopoldina e
também as linhas de bonde para a Zona Sul. Botafogo passou a ser o bairro mais "chic"
da cidade.
A situação folgada do comércio internacional e o aumento das inversões de
capital estrangeiro permitiram que o Brasil equilibrasse sua vida financeira e
consolidasse sua posição econômica. Mas este progresso não representou um efetivo e
real passo para o progresso, todas as mudanças executadas representaram um
aprofundamento na dependência do Brasil, com a vitória de um projeto de República
Conservadora que Lima Barreto chamaria ironicamente de "República dos
Conselheiros", título proveniente do Império.
O progresso se deu dentro dos quadros tradicionais da economia brasileira sem
modificações estruturais, mas apenas ajustando a um novo ritmo de crescimento, a
estrutura fundamental do país que continuou a ser um produtor de uns poucos gêneros
de grande expressão no comércio internacional baseando-se na organização herdada do
passado: a grande propriedade e exploração fundiária.
O país havia abolido a escravidão e transformado o regime de trabalho com a
imigração estrangeira, havia rompido com os quadros conservadores da Monarquia,
havia eclodido um novo espírito de negócios e especulação mercantil e havia acentuado
e consolidado o domínio das finanças internacionais na vida econômica do país, mas
tudo isto não deixou de representar passos preliminares e preparatórios para preparar a
nação para se ajustar ao equilíbrio mundial moderno, mas mantendo o lugar de semi-
colônia no círculo internacional do imperialismo financeiro. A inserção do Brasil na
nova ordem internacional se deu como o grande produtor de café.
O Apogeu de um Sistema
Os anos do primeiro decênio do Século XX representaram o apogeu da
economia voltada para a produção extensiva e em larga escala, de matérias-primas e
gêneros tropicais destinados à exportação. Para isto contribuíram, fatores externos como
o grande aumento do comércio internacional, fruto do considerável desenvolvimento da
população norte-americana e européia, como conseqüência da industrialização
associada ao aperfeiçoamento técnico dos sistemas de transporte e do tráfico mercantil e
financeiro, fazendo com que fossem aumentados os mercados, para os produtos de
países como o Brasil.
Nesta situação fatores internos também foram favoráveis para aumentar as
possibilidades no terreno econômico, foi solucionado o problema da mão-de-obra, de
um lado com a remoção do obstáculo para o desenvolvimento do trabalho livre; do
outro, pela imigração subvencionada facilitada pelo superpovoamento de várias regiões
da Europa, desta forma canalizando para o Brasil uma forte e regular corrente de
trabalhadores. Este fluxo de imigrantes só foi possível graças ao aperfeiçoamento
técnico da navegação e também ao próprio desenvolvimento econômico do país que
contou com o progresso da técnica moderna que permitiu o acentuado desenvolvimento
da produção brasileira, que pode utilizar uma maquinaria adequada e a energia
necessária para acioná-la, bem como os transportes ferroviários e marítimos
indispensáveis para a movimentação através de grandes distâncias, dos volumes
imensos da produção agrícola.
No terreno econômico pode-se observar a eclosão de um espírito que se não era
novo, se mantivera na sombra ou em plano secundário no Império: a ânsia de
enriquecimento, de prosperidade material que na Monarquia não era tido como um ideal
legítimo e plenamente reconhecido. O novo regime fez despontar o homem de negócios,
isto é, o indivíduo inteiramente voltado para o objetivo de enriquecer. A transformação
foi tão brusca que classes e indivíduos dos mais representativos da Monarquia, antes
ocupados unicamente com política e funções similares, que no máximo se preocupavam
com suas propriedades rurais, se tornaram ativos especuladores e negocistas, com o total
consentimento de todos.
As atividades brasileiras foram estimuladas por finanças internacionais mais
multiformes e ativas que as inversões esporádicas de capital que antes se fazia, mas que
passaram a ter participação efetiva, constante e crescente em diversos setores que
ofereciam oportunidades de bons negócios. A produção cafeeira, a grande atividade
econômica do país, foi naturalmente atingida e em torno dela se travou uma luta
internacional, boa parte dos fundos necessários ao estabelecimento das plantações e
custeio da produção foi proveniente dos bancos ingleses e franceses, ou então de casas
exportadoras estrangeiras ou financiadas com capitais estrangeiros.
O Brasil tornou-se neste momento um dos grandes produtores mundiais de
matérias-primas e gêneros tropicais e ao café foi acrescentada na lista dos grandes
produtos exportáveis, a borracha, que chegou quase a emparelhar-se a ele, o cacau, o
mate, o fumo. A produção de gêneros de consumo interno, no entanto, diminuiu e se
tornou cada vez mais insuficiente para as necessidades do país obrigando a importar do
estrangeiro a maior parte até dos mais vulgares artigos de alimentação. As exportações
maciças compensavam estas grandes e indispensáveis importações levando os saldos
comerciais a patamares apreciáveis.
Para atender aos compromissos e em reforço aos saldos comerciais, eram
necessárias inversões de capitais estrangeiros e empréstimos públicos. Não era mais
apenas o Governo Central que recorria ao crédito estrangeiro, os Estados, tornados
autônomos pela República, dele se utilizavam largamente e as simples municipalidades
seguiam o exemplo.
A grande concentração de produção em poucos gêneros exportáveis, como base
do crescimento das atividades do país, não levava a uma situação de estabilidade
econômica, porque estava assentada em frágeis alicerces muito dependentes dos
mercados internacionais e por isto bastante vulnerável. No caso do café, já ao final da
primeira década do Século XX, se faziam sentir algumas perturbações sérias como:
superprodução, queda de preços, dificuldade de escoamento da produção; mas o maior
problema ocorreu com a borracha, que depois de 1910 teve que enfrentar a concorrência
do Oriente e perdeu mercado. Em escala menor, situação semelhante aconteceu com o
cacau.
O fator de instabilidade se manifestou também em relação à mão-de-obra,
porque a introdução do trabalho livre teve que conviver com algumas dificuldades de
adaptação: o trabalhador livre não se encontrava preso ao empregador e por isto não
necessitava suportar passivamente a exploração de seu trabalho, podia buscar uma
situação que lhe fosse mais favorável em outro lugar. Para forçar o trabalhador a
permanecer no local se difundiu no Brasil o esquema de pagar salários reduzidos e
vender por preços elevados os gêneros necessários ao seu sustento, mantendo os
trabalhadores sempre endividados e impossibilitados de deixar o trabalho. O baixo nível
cultural da massa trabalhadora do país, tão recentemente saída da escravidão facilitou o
manejo arbitrário das contas, sempre em prejuízo do empregado.
Com o tempo os obstáculos que foram criados para impedir a livre circulação
dos trabalhadores não garantiram a sua estabilidade e o Brasil veio a conhecer, em lugar
da atitude passiva do antigo escravo, a luta permanente por direitos e reivindicações que
afetava muito seriamente a normalidade das relações de trabalho, os atritos eram
intensificados porque os fazendeiros em geral acostumados com o regime servil tiveram
grandes dificuldades para lidar com trabalhadores livres.
Em São Paulo, principal centro da imigração estrangeira, a administração
pública teve a iniciativa de adotar medidas de proteção ao trabalhador rural contra
excessos de seus patrões, para não comprometer o bom nome do país e garantir a
continuidade das correntes imigratórias necessárias à prosperidade. Foram criados
aparelhos judiciários e administrativos para zelar pelo cumprimento dos contratos de
trabalho por parte dos proprietários.
Assim teve início a substituição da grande pela pequena propriedade, que foi
uma ferramenta importante para o Brasil para remodelar a sua estrutura econômica e dar
início a uma nova base para o desenvolvimento de suas forças produtivas.
Desta forma, pode se ver que foi sob a ação de fatores contraditórios que evoluiu
a economia brasileira: por um lado ocorreu um desenvolvimento do sistema da
propriedade agrária, que teve seu máximo de expressão com o largo incremento de
umas poucas atividades de grande vulto econômico e a exclusão de tudo o mais e de
outro, os resultados, deste mesmo desenvolvimento comprometeram e destruíram a
estrutura econômica tradicional do país: a grande propriedade agrária.
A Economia Cafeeira
Nos primeiros anos da República houve uma expansão da economia cafeeira,
principalmente em São Paulo, que passou a ser o principal produtor desbancando o Rio
de Janeiro. Assim, o número de cafezais duplicou na década de 90 do Século XIX,
enquanto o volume de produção triplicava no mesmo período. O fator decisivo que
permitiu o aumento da lavoura cafeeira foi sem dúvida a imigração européia que
forneceu os braços necessários para o trabalho.(1)
Para Celso Furtado as razões do Brasil se transformar no maior produtor de
café, ao final do século XIX, foram: a oferta dos concorrentes estarem atravessando
uma séria de dificuldades; estar resolvido o problema da mão-de-obra, porque com a
descentralização, a imigração passou a ser feita pelos Estados, principalmente São
Paulo; o crédito fácil permitiu a obtenção de recursos para financiar a abertura de
novas terras e elevou os preços do produto em moeda nacional com a depreciação
cambial.
Os empresários de economias exportadoras de matérias-primas, ao realizarem
suas inversões, tinham de escolher entre um número limitado de mercadorias e no caso
do Brasil, na época era o café, portanto era inevitável que a oferta do café crescesse, não
só por causa da procura, mas por causa da mão-de-obra disponível e da quantidade de
terras sub-ocupadas.
O Brasil chegou a possuir 75% do mercado mundial, numa situação de quase
monopólio. Por isto podia manipular os preços através da oferta, criando uma situação
conveniente para o país, porém de fragilidade porque qualquer oscilação do mercado
afetava profundamente a economia brasileira.
A primeira crise derivada de fatores externos ocorreu com a queda dos preços
internacionais em 1893. Os efeitos desta crise foram absorvidos devido a depreciação
externa da moeda, que permitiu aos cafeicultores não terem prejuízos porque a moeda
brasileira era desvalorizada e eles continuavam a receber o mesmo apesar da queda dos
preços externos, numa situação chamada por Celso Furtado de "socialização dos
prejuízos", porque toda a sociedade pagava para que os produtores não tivessem perdas.
Esta situação manteve-se até 1897, quando o governo não conseguiu mais
aplicar a política de depreciação da moeda devido a situação de extrema pressão sobre
os consumidores urbanos, gerando instabilidade, neste momento teve então início a
Política de Valorização do Café.
A crise econômica do Brasil em 1896 fez com que os bancos privados fossem
proibidos de emitir, o crédito foi severamente reduzido e os investimentos e despesas
públicas em geral bastante limitadas, mas estas medidas não foram suficientes para
conter a crise. Em 1898 foi necessária a renegociação da dívida pública e o acordo feito
com os credores externos limitou bastante a autonomia financeira da nação e o controle
do comércio do café passou a ficar nas mãos dos agentes internacionais.
Apesar de sofrer pressões, o Governo Federal resistiu em aceitar um papel ativo
na defesa do setor cafeeiro, temendo neutralizar os esforços para solucionar a crise
financeira resultante da expansão creditícia desregrada dos primórdios da República e
também porque era contrário à filosofia liberal que pregava que o mercado deveria
regular-se por sim mesmo.
Política de Valorização do Café
Em 1905 foi vencido o argumento liberalista e o Congresso autorizou o Governo
a estabelecer acordos com os Estados produtores de café para regular o comércio,
promover a elevação de preços e estabelecer agências de propaganda do café no
exterior. Em 1906, os Estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro se reuniram
e assinaram o Convênio de Taubaté que estabelecia uma nova política para o café.
Ficava estabelecido com o Convênio que: o Governo compraria os excedentes de
café, com o objetivo de equilibrar a oferta e a procura; o financiamento para a compra
dos excedentes se faria com empréstimos externos; deveria ser criado um novo imposto
a ser cobrado sobre cada saca de café exportado, a ser paga pelo exportador; seriam
estabelecidas políticas estaduais de desestímulo à produção, para resolver o problema
em longo prazo, mas estas políticas nunca foram estabelecidas.
A descentralização republicana havia reforçado o poder dos plantadores de café
a nível regional e os empréstimos pedidos foram feitos pelos governos dos Estados
produtores, principalmente São Paulo, sem a interferência do Governo Federal. Só
depois de a primeira valorização ser feita com sucesso o Governo Federal entrou no
esquema.
Em 1908 foi solicitado ao Governo Federal levantar um empréstimo no mercado
internacional para levar à frente o plano de intervenção e muito embora tenham ocorrido
protestos contra os sacrifícios impostos a toda a nação para garantir os lucros dos
produtores de café, estas vozes não se fizeram ouvir num Congresso firmemente
vinculado aos interesses dos cafeicultores e os empréstimos foram feitos.
O êxito da solicitação de financiamento para o café, consolidou a vitória dos
cafeicultores, que puderam por mais de um quarto de século impor sua política ao
Governo Federal, porque ela permaneceu até 1929 e determinou que as fronteiras do
café fossem expandidas pelo interior de São Paulo, montando uma bomba de efeito
retardado.
Entre 1925 e 1929 a produção de café aumentou 100%, mas as exportações
mantiveram-se estabilizadas e a retenção da oferta mantinha os preços elevados no
mercado internacional. Em 1929 o Brasil estava numa situação em que os estoques
poderiam abastecer o mundo por três anos.
O erro da política residiu no fato de se desconsiderar as características de uma
atividade econômica de natureza tipicamente colonial. O equilíbrio entre a oferta e a
procura era obtido: na procura quando se atingia a saturação do mercado e do lado da
oferta quando se ocupavam os fatores de produção – a mão-de-obra e as terras
disponíveis; nestas condições era inevitável, que a longo prazo, os preços sofressem
queda e mantê-lo elevado fazia com que o desequilíbrio se aprofundasse cada vez mais.
Com a crise mundial o Brasil ficou numa situação bastante vulnerável, existia
um desequilíbrio estrutural entre a oferta e a procura e era óbvio que os estoques não
poderiam ser utilizados economicamente num futuro previsível, com a crise terminaram
os financiamentos externos, não permitindo mais que os excedentes fossem comprados
e desta forma teve fim a Política de Valorização do Café.
A partir de 1930, o Governo passou a comprar o café mais ao invés de estocar,
ele era destruído. Era impossível deixar o café apodrecer nos cafezais porque o próprio
Governo e outros empreendedores necessitavam do café e todos seriam prejudicados,
assim como toda a economia brasileira. O mal menor era comprar o café, porque
colocava a economia em ação, ela mantinha ser ritmo, evitando-se o desemprego e o
aumento da recessão.
Quando o governo destruía o café estava estabilizando o preço que não caía a
nível catastrófico, os recursos utilizados para a compra eram internos, de início emitindo
moeda, que gerava inflação, depois deslocando recursos de outras áreas. Foi o que
aconteceu entre 1930 e 34, fazendo com que o Brasil se recuperasse da crise mundial
antes mesmo do que os Estados Unidos.
O desequilíbrio setorial, representado pela longa duração de cerca de um século
de preponderância do café, gerou condições para a industrialização, para a concentração
demografia e para a urbanização da Região Sudeste, em particular de São Paulo.
Desde então, entre o Sudeste e as demais regiões brasileiras, as disparidades se
aprofundaram, à medida que a industrialização prosperava e mesmo na Região Sudeste
o desenvolvimento não foi uniforme, os outros Estados não conseguiram acompanhar
São Paulo e ficaram em posição secundária. Mesmo o Rio de Janeiro, apesar de sua
importância como Capital perdeu para São Paulo sua supremacia. Os outros Estados,
também se beneficiaram da industrialização, mas de forma precária e em um momento
posterior.
A década de 1930 foi um marco na história econômica e política do Brasil.
Em decorrência da Grande Depressão da economia mundial, precipitada
a partir da quebra da bolsa de valores de Nova Iorque, em 1929, o modelo
econômico vigente, baseado na exportação de bens primários, entrou
em colapso. Os cafeicultores perderam poder político e a economia
transformou-se. Gradualmente, o país agrário foi dando lugar a uma
sociedade de base urbano-industrial.
É bem verdade que o processo brasileiro de industrialização não começou
nos anos 1930. A indústria nacional começou a ter alguma importância
econômica a partir do final do século XIX, mas é a partir de 1930 que
esse processo se intensificou. A industrialização brasileira deu-se por
meio de substituição de importações, ou seja, passamos a produzir
domesticamente bens que anteriormente vinham do exterior. Pela sua
menor complexidade, o país começou produzindo bens de consumo não
duráveis e, posteriormente, passou a produzir também bens duráveis e
bens de capital.
A crise de 1929 e as décadas de trinta e quarenta
1. A QUEBRA DA BOLSA E A GRANDE DEPRESSÃO
As economias capitalistas parecem ser intrinsecamente instáveis. De
acordo com a teoria dos ciclos econômicos, períodos de expansão dos
investimentos, da produção e do consumo intercalam-se com períodos em
que essas mesmas variáveis se contraem. O intervalo entre uma expansão e
uma crise costuma variar entre sete e dez anos. Existem registros de várias
crises econômicas ao longo da história do capitalismo. A Primeira Grande
Depressão ocorreu entre 1873 e 1896; a Segunda Grande Depressão, que
normalmente as pessoas chamam apenas de Grande Depressão, ocorreu
entre 1929 e 1933.
A crise de 1930 começou com a formação de uma “bolha especulativa”
no mercado de ações. Bolha especulativa é um termo muito utilizado por
analistas de mercados financeiros. O crash ocorrido na bolsa de Nova Iorque,
em outubro de 1929, é, sem dúvida, a bolha especulativa mais famosa da
história. Vejamos como tudo aconteceu. A economia norte-americana
apresentava uma forte expansão na década de 1920, em conseqüência
houve um substancial aumento dos lucros das empresas daquele país.
Logicamente, todos queriam aproveitar esse momento favorável e lucrar
também, por isso muitos resolveram comprar ações. O crescimento brutal
da demanda fez aumentar os preços desses ativos, formou-se, então, uma
bolha. Em um determinado momento, várias pessoas perceberam que os
preços estavam exageradamente elevados e resolveram sair do mercado.
Essa saída, entretanto, não se deu de forma suave, muito pelo contrário, foi
uma corrida para vender rapidamente os papéis antes que desvalorizassem.
Os profissionais de mercado costumam chamar esse fenômeno de “efeito
manada”. Como conseqüência, os preços desabaram e a bolha estourou. A
quebra da bolsa foi o estopim de uma grande crise que afetou praticamente
todos os países do mundo, exceto a União Soviética. Somente nos Estados
Unidos, a crise gerou 85 mil falências e 15 milhões de desempregados. O
comércio internacional também foi bastante afetado com a crise. Estima-
se que a sua redução tenha sido de dois terços nessa mesma época.
2. A RUPTURA DO MODELO PRIMÁRIO-EXPORTADOR
Conforme já dissemos, a década de 1930 foi um ponto de inflexão da
economia brasileira. Até 1930, o Brasil era um típico exemplo de economia
primário-exportadora, ou seja, o país era um mero fornecedor de produtos
primários dos mercados internacionais. Entre os produtos exportados
pelo Brasil, estavam: borracha, cacau, açúcar, tabaco, algodão, erva-mate
e, logicamente, o café. A indústria era bastante incipiente e os produtos
industrializados eram, em sua maioria, importados. Com a crise mundial,
houve redução drástica das exportações brasileiras e, conseqüentemente,
falência desse modelo. Gradualmente, nossa economia foi se diversificando,
substituindo importações e voltando-se, cada vez mais, para o mercado
interno.
A crise mundial reduziu, drasticamente, as exportações de todos os
produtos brasileiros, mas, como nossa economia era altamente dependente
das exportações de café, a crise se manifestou com mais intensidade nesse
setor. Desde o final do século XIX, o Brasil vinha sofrendo os efeitos de
uma superprodução. O café era uma atividade altamente rentável, logo
o lucro proporcionado pelas exportações do produto era convertido na
produção de mais café. Como o Brasil detinha aproximadamente 75% da
oferta mundial, isso acabou gerando excesso de produção e queda no
preço. A Grande Depressão simplesmente precipitou o colapso inevitável
desse modelo. Com a crise, o governo brasileiro adotou a controvertida
política de compra e posterior destruição da produção excedente de café.
É verdade que a política de retenção de estoques começou a partir do
Convênio de Taubaté, em 1906. Mas, com a crise, o governo passou a não
somente comprar a produção excedente, mas também a destruí-la. Essa
política aparentemente absurda continha uma lógica do ponto de vista
econômico, primeiramente porque, ao reduzir a oferta, impediu que os
preços caíssem a patamares ainda mais baixos. Em segundo lugar, porque
gerou um aumento na renda que atenuou os efeitos da crise no país.
3. A REVOLUÇÃO DE 1930
As transformações decorrentes da crise do setor exportador não ficaram
restritas à economia, atingiram também a esfera política. Os produtores de
café perderam o poder para uma classe industrial ascendente. Todavia, não
foi somente isso. Pode-se dizer que um Estado Oligárquico (onde poucos
detinham o poder de fato) deu lugar a um Estado Populista (voltado para
as massas urbanas). Vejamos como isso aconteceu. O aparente liberalismo
político e econômico da Primeira República, marcada pela ampla autonomia
dos Estados, pelo voto universal e não obrigatório e pelo liberalismo
comercial, era, de fato, um engodo. O Estado brasileiro era atrasado, rural,
oligárquico e patrimonialista. As eleições eram marcadas por fraudes que
garantiam uma alternância entre presidentes paulistas e mineiros, por
isso chamada de política do “café-com-leite”. A base dessa estrutura de
dominação era o grande proprietário de terras, conhecido como “coronel”.
Como o voto era a descoberto (não secreto), as populações rurais eram
praticamente obrigadas a votar em quem o “coronel” determinasse, prática
política que ficou conhecida como “voto de cabresto”. Se isso ainda não
fosse suficiente para garantir a escolha do candidato “certo”, as eleições eram
simplesmente fraudadas. A moralização do processo eleitoral brasileiro era
uma antiga reivindicação de alguns setores da sociedade, principalmente
dos trabalhadores urbanos que se sentiam totalmente alijados do sistema
de representação. A mudança desse sistema foi uma bandeira empunhada
também pelo movimento tenentista na década de 1920, cujo lema era
“representação e justiça”. Não foi por acaso que os principais integrantes
desse movimento apoiaram a Revolução de 1930.
A eclosão do movimento revolucionário deu-se a partir de uma crise política
gerada durante a sucessão à Presidência da República. O Presidente de
Minas Gerais, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, era o sucessor natural do
Presidente Washington Luís, de acordo com os arranjos instituídos a partir
da política do café-com-leite. Washington Luis insistia, no entanto, em
lançar, como candidato oficial, o político paulista, Júlio Prestes. Os políticos
mineiros, logicamente, sentiram-se traídos, fizeram acordos com oligarquias
rurais de outros estados e outras forças políticas que resultaram na criação da
Aliança Liberal e no lançamento, como candidato à Presidência da República
e adversário de Prestes, o Presidente do Rio Grande do Sul, Getúlio Vargas.
Os esquemas políticos de voto de cabresto e fraudes eleitorais garantiram
a vitória do candidato de São Paulo. Todavia, os derrotados não aceitaram
o resultado das urnas e resolveram buscar por meio das armas o que não
foi possível por meio do voto. No dia 03 de outubro de 1930, começaram
as operações militares que conduziriam em pouco mais de vinte dias os
revolucionários ao poder.
4. O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA
Conforme já foi dito, a crise de 1930 foi um momento de ruptura da
economia brasileira. Vejamos, com mais detalhes, como a Grande Depressão
funcionou como estímulo positivo ao processo de industrialização do país.
Com a crise, houve redução na capacidade de importar do país. Como
resultado, fomos obrigados a substituir importações e expandir a produção
industrial. Mais precisamente, essa expansão entre 1929 e 1937 foi de 50%.
Pela primeira vez na nossa história, o mercado consumidor interno passou
a ser um fator preponderante na dinâmica da economia nacional.
Convém ressaltar, no entanto, que o processo de substituição de
importações continha certos limites e contradições. Por exemplo, ao
substituir importações, gerava-se, simultaneamente, necessidade de
novas importações. Vejamos como isso acontecia. A primeira indústria
a ser implantada no Brasil, pela sua complexidade inferior, foi a de bens
de consumo não duráveis, como têxteis, chapéus, círios, cigarros, cerveja
etc. Todavia, essa indústria gerava uma demanda, até então inexistente,
por bens de capital (máquinas e equipamentos) e bens intermediários
(matéria-prima), que não eram produzidos no país e que, por isso, teriam
de ser importados.
Um outro problema dessa primeira etapa da industrialização por
substituição de importações estava na sua incapacidade de acumular
capital autonomamente. Para ampliar a capacidade de produção, o país
dependia da importação de bens de capital do exterior, ou seja, havia,
no Brasil, um problema de “industrialização restringida”, que só seria
resolvido após a implementação do Plano de Metas, durante o governo
do Presidente Juscelino Kubitschek, na década de 1950.
Vejamos dois momentos diferentes da nossa história que ilustram bem
esse segundo problema. Durante a Primeira Guerra Mundial, a redução de
importações gerou um aumento da produção industrial brasileira. Porém,
essa expansão se deu meramente por redução de capacidade ociosa.
O Brasil não tinha como expandir sua capacidade produtiva, pois não
dispunha de uma indústria de bens de capital.
Da mesma forma, houve, também, durante a crise de 1930, um aumento
da produção industrial, mas desta vez acompanhada de um aumento da
capacidade produtiva. O país ainda não possuía uma indústria de bens
de capital, porém, com as falências geradas pela Grande Depressão, foi
possível comprar máquinas usadas no exterior por preços relativamente
baixos, ou seja, nos dois casos, o país não tinha autonomia no processo de
acumulação de capital.
Getúlio Vargas governou “provisoriamente” o Brasil de 1930 até 1934,
quando foi eleito presidente por uma Assembléia Constituinte. Seu mandato
deveria durar até 1938, mas, em 1937, Vargas lidera um golpe militar, dissolve
o Parlamento e nomeia interventores nos Estados. Tem início então a fase
ditatorial do seu governo conhecida como Estado Novo, que se estenderia
até 1945. Com Vargas, há uma forte centralização do poder e o país
assume um projeto desenvolvimentista, tendo o Estado como seu agente
primordial. As dificuldades em atrair investimentos estrangeiros bem como
a fragilidade do empresariado nacional, fazem o Estado assumir o papel
de produtor direto. Nesse período, começa a implantação da indústria de
base no país, com a criação da Companhia Siderúrgica Nacional (1941) e da
Companhia Vale do Rio Doce (1943).
Com o final da Segunda Guerra, em 1945, há uma pressão pela
redemocratização do país. Em 1945, é eleito presidente o general Eurico
Gaspar Dutra. Sob o ponto de vista econômico, o fato mais marcante desse
novo governo foi a implementação de uma política de controle cambial
e de importações, decorrente de um problema de desequilíbrio do setor
externo. O crescimento da produção industrial experimentado sobretudo
nos primeiros anos do pós-guerra pode ser considerado uma decorrência
dessa política de valorização cambial e seletividade nas importações.
A década dos cinquenta
Em 1951, Getúlio Vargas ocuparia novamente a Presidência da República,
desta vez eleito pelo voto direto. Entre as suas principais realizações nesse
segundo mandato, estão a criação do Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico (BNDE)1 e da Petrobrás, respectivamente em 1952 e 1953.
O desgaste político de Vargas começa em 1954, decorrente de uma
polêmica proposta de aumento do salário mínimo em 100%. Essa proposta
desagradou alguns setores da sociedade, que o acusavam de populista.
Além disso, outros problemas de ordem econômica e denúncias de
TENTATIVAS DE PLANEJAMENTO NO BRASIL
Uma das marcas do governo Kubitschek foi a realização do Plano de Metas,
a primeira tentativa bem sucedida de planejamento econômico no país. É
bem verdade que o planejamento econômico era uma espécie de modismo
em praticamente todo mundo após a Segunda Guerra. Vejamos como tudo
começou. Em 1929, a antiga União Soviética pôs em prática o seu primeiro
corrupção no governo deixaram o presidente politicamente isolado. A
oposição precisava apenas de um pretexto para depor o presidente. O
atentado contra o deputado e virulento crítico do regime, Carlos Lacerda,
serviu perfeitamente aos interesses dos oposicionistas. No dia 24 de agosto
de 1954, ao saber, por meio de assessores que seria deposto, Vargas se mata
com um tiro no peito. Com o suicídio de Vargas, assume o vice-presidente,
Café Filho, que governou o país até a eleição de Juscelino Kubitschek.
OS “ANOS DOURADOS”
Juscelino assumiu o poder em 1956 e governou até 1960. O período JK
normalmente costuma ser associado a uma espécie de “era de ouro” da
história do país. Essa percepção coletiva de “anos dourados” extrapola
o aspecto meramente econômico. O Brasil viveu neste período uma
efervescência no campo das artes, da cultura e do esporte. É nessa época que
surge a Bossa Nova, que o Brasil ganha a sua primeira Copa do Mundo e que
é inaugurada a nova capital do país, de arquitetura arrojada e modernista.
plano qüinqüenal. Essa experiência extremamente exitosa fez a participação
da produção industrial soviética em relação à produção mundial crescer de
5% para 18%, entre 1929 e 1938. Ao mesmo tempo em que a indústria se
desenvolvia na União Soviética, o mundo capitalista vivia a maior crise de
sua história, a Grande Depressão. Após a Segunda Guerra Mundial, com o
advento da teoria keynesiana, que propunha uma intervenção maior do
Estado na economia, o planejamento econômico ficou bastante popular
também nos países capitalistas.
No Brasil, a primeira tentativa de planejamento econômico ocorreu em
1947, durante o governo Dutra, com o Plano Salte, que previa investimentos
nas áreas de saúde, alimentação, transporte e energia (daí o nome Salte). O
plano não foi bem sucedido, na realidade, pode-se dizer que ele mal saiu
do papel. A inexistência de formas definidas de financiamento pode ser
considerada a principal razão do seu fracasso.
Em 1951, durante o segundo governo Vargas, uma comissão formada
por técnicos brasileiros e norte-americanos foi responsável pela segunda
tentativa de planejamento no país. A partir dos problemas detectados pela
Comissão Mista Brasil - Estados Unidos (CMBEU) seriam realizados diversos
investimentos, financiados pelo Banco de Exportação e Importação dos
Estados Unidos (Eximbank) e pelo Banco Mundial. Contudo, a eleição do
candidato republicano, general Eisenhower, à presidência dos Estados
Unidos, em 1952, abortaria essa segunda tentativa de planejamento. Com
o acirramento da Guerra Fria, a prioridade do governo norte-americano
passou a ser o combate ao comunismo. Logo ficou claro que o governo
norte-americano não manteria os financiamentos dos projetos propostos
pela Comissão Mista. Apesar desse revés, esse estudo teve grande
importância, pois foi a partir dele que se detectou a necessidade de um
banco de desenvolvimento no país e foi criado o BNDE, em 1952.
A terceira tentativa ocorreu em 1953, também durante o governo Vargas,
a partir da formação do Grupo Misto BNDE-Cepal. Essa equipe, formada
por técnicos do BNDE e da Cepal - Comissão Econômica para a América
Latina, órgão regional das Nações Unidas - levantou uma série de pontos
de estrangulamento, relacionados sobretudo aos setores de transporte,
energia, alimentação, educação e indústria de base. Esse estudo é sem
dúvida a base do Plano de Metas que seria implementado durante a gestão
de Juscelino Kubitschek.
SOBRE O PLANO DE METAS
O Plano de Metas foi elaborado em 1956, pelo Conselho de Desenvolvimento,
órgão diretamente subordinado ao Presidente da República, e começou a
ser implantado no início de 1957. Cinco áreas foram priorizadas: transporte,
energia, alimentação, educação e indústria de base No total, o plano continha
31 metas, entre elas estava a construção da nova capital federal, Brasília,
que foi inaugurada no dia 21 de abril de 1960. De modo geral, costuma-se
dizer que o plano foi bem sucedido, pois uma parte significativa das metas
propostas foi atingida, conforme pode ser observado na tabela abaixo:
Plano de Metas – Previsão e Resultados (1957-1961)
Meta Previsão Realizado %
Energia Elétrica (mil quilowatts) 2.000 1.650 82
Carvão (mil toneladas) 1.000 230 23
Petróleo – produção (mil barris/dia) 96 75 76
Petróleo – refino (mil barris/dia) 200 52 26
Ferrovias (mil quilômetros) 3 1 32
Rodovias – construção (mil
quilômetros)
13 17 138
Aço (mil toneladas) 1100 650 60
Cimento (mil toneladas) 1400 870 62
Carros e caminhões (mil unidades) 170 133 78
Fonte: Banco do Brasil. Relatório e anuário estatístico, vários anos. Apud
ABREU, Marcelo de Paiva. A ordem do progresso: cem anos de política
econômica republicana, 1889/1989. Rio de Janeiro: Campus, 1990.
O desenvolvimento industrial durante o período do Plano de Metas estava
estruturado em um tripé, constituído por: empresas estatais, pelo capital
privado nacional e pelo capital estrangeiro, sendo este último o agente
mais importante. As empresas multinacionais passaram a dominar os
setores mais dinâmicos da economia brasileira, como bens de consumo
duráveis e bens de capital. Por outro lado, a produção de bens não duráveis
ficou a cargo das empresas privadas nacionais. É bastante clara a relação
de subordinação do capital nacional em relação ao capital estrangeiro. Por
vezes assistia-se a uma situação onde a atividade produtiva mais complexa
era exercida por uma empresa estrangeira, enquanto as empresas privadas
nacionais eram meras fornecedoras de insumos e componentes. O setor
automobilístico é bom exemplo dessa situação. As empresas estrangeiras
produziam os automóveis e as empresas nacionais forneciam autopeças.
Os investimentos estrangeiros foram fundamentais para o sucesso do Plano
de Metas. Mas quais razões levaram a esse aumento drástico da participação
do capital estrangeiro no setor produtivo nacional nesse período? Sem
dúvida, o nível de investimentos exigidos tornava inevitável a supremacia
do capital estrangeiro, mas houve também um outro fator importante que
merece ser analisado. A partir da segunda metade da década de 1950, há
uma mudança na estratégia de investimento das grandes corporações
internacionais. Terminada a Segunda Guerra, houve um grande esforço de
reconstrução das economias mais atingidas, principalmente Europa e Japão.
Em meados dos anos 1950, esse esforço já via sido praticamente concluído,
começa então um movimento de transnacionalização dos investimentos
na direção de outras regiões, inclusive áreas não desenvolvidas como a
América Latina e o Brasil, mais especificamente.
Cabe aqui fazer uma comparação entre o desenvolvimento industrial
nos governos Vargas e JK. Conforme já foi visto na aula anterior, durante
o período Vargas, o Estado foi o grande indutor do desenvolvimento
industrial. Vargas criou várias estatais e ficou com pecha de nacionalista
por conta dessa política. Por outro lado, durante a gestão JK, houve uma
profunda internacionalização da produção industrial. Será que essa
opção de Vargas pelo nacionalismo e de Kubitschek pelos investimentos
estrangeiros tem alguma relação com o cenário externo? Na aula passada,
chamamos a atenção para a importância do ambiente externo para se
compreender a dinâmica da economia nacional. Não iremos aprofundar
nessa discussão, mas é evidente que a opção pelo investimento público ou
pelo capital estrangeiro está condicionada a uma dinâmica internacional.
Não era possível atrair investimentos estrangeiros durante o período Vargas,
havia uma preocupação dos setores público e privado em reconstruir o
que a guerra havia destruído e os movimentos de transnacionalização dos
investimentos estrangeiros era algo ainda bastante incipiente. Essa situação
muda radicalmente a partir da segunda metade dos anos 1950, durante o
governo de JK.
O modelo de desenvolvimento implementado durante o Plano de Metas,
comportava uma certa contradição, de acordo com a análise de REGO &
MARQUES (2005). Havia, nesse período, uma forte restrição às importações
o que constituía uma reserva de mercado para a produção de vários bens.
Essa política protecionista em relação ao comércio opunha-se a uma
postura bastante liberal no que diz respeito aos investimentos estrangeiros.
Não concordamos que haja aí uma contradição. Entendemos simplesmente
que essa foi a estratégia de desenvolvimento adotado no período, restringir
importações e incentivar os investimentos estrangeiros no setor produtivo.
Entendemos que as críticas mais coerentes ao Plano de Metas dizem
respeito ao impacto que este teve sobre a inflação e a distribuição de renda
entre indivíduos e entre regiões. Vamos entender melhor essa questão. O
financiamento dos gastos públicos se deu através da expansão dos meios de
pagamento. Porém, em economia, infelizmente “não existe almoço grátis”,
ou seja, tudo tem seu preço. Não é possível financiar investimentos sem
nenhum custo, simplesmente emitindo moeda. Essa expansão dos meios
de pagamento gerou inflação e, conforme ensina a teoria macroeconômica,
a inflação tem um forte efeito concentrador de renda entre os indivíduos.
A concentração se deu também entre regiões. Nesse período, já havia uma
forte disparidade de renda sobretudo entre a região sudeste (a mais rica)
e o nordeste (a região mais pobre). Os investimentos do Plano de Metas,
todavia, concentraram-se principalmente na região sudeste, aprofundando
ainda mais esse problema de desequilíbrio regional.
Finalmente, falta comentar um outro aspecto importante do Plano de
Metas. Com a implementação do plano, termina uma fase do processo
de industrialização por substituição de importações conhecido como
“industrialização restringida”. Relembrando o que já vimos na aula
anterior, o Brasil, até a década de 1950, não tinha condições de aumentar
autonomamente a sua capacidade de produção. Não havia no Brasil uma
indústria de bens de capital e bens intermediários, só através de importações
era possível acumular capital. Com Vargas, começa a implantação da indústria
de base no país, mas podemos dizer que, somente após os investimentos no
setor de bens de capital ocorridos com o Plano de Metas, encerra-se esse
ciclo e o país adquire a capacidade de “caminhar com as próprias pernas”.
A Crise Dos Anos 60
Os Governos Jânio Quadros E João Goulart
Em 1961, o ex-governador de São Paulo, Jânio Quadros, é eleito presidente
e herda um conjunto de problemas macroeconômicos da gestão JK, tais
como: aceleração inflacionária, déficit fiscal e pressão sobre o balanço
de pagamentos. Para resolver essa questão, Quadros lança um pacote
econômico ortodoxo, que incluía entre, outras medidas, a desvalorização
cambial, a unificação da taxa de câmbio, a redução do gasto público e
uma política monetária restritiva. Apesar de ter obtido apoio dos credores
internacionais e do Fundo Monetário Nacional (FMI), Quadros não conseguiu
levar adiante sua estratégia econômica. Proveniente do pequeno Partido
Trabalhista Nacional (PTN), o presidente não conseguiu formar uma base
de sustentação para o seu governo no Congresso Nacional, dominado
pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e pelo Partido Social Democrático
(PSD). Por fim, em agosto de 1961, após cumprir uma pequena fração do
seu mandato, o presidente de hábitos excêntricos renuncia de forma tão
enigmática quanto a sua própria personalidade.
De acordo com a Constituição da época, com a renúncia, o vice-presidente,
João Goulart, que estava em viagem oficial pela China comunista, deveria
assumir o poder. Considerado populista, de esquerda e muito ligado aos
sindicatos, Goulart não era bem aceito pelos setores mais conservadores
da sociedade. Os opositores tentaram impedir a sua posse, o que faz
surgir uma frente legalista, liderada pelo governador do Rio Grande do
Sul, Leonel Brizola (cunhado de João Goulart) exigindo a posse do vice-
presidente. Visando reduzir a tensão política, o Congresso Nacional tenta
uma medida conciliatória e aprova uma alteração do sistema de governo,
de presidencialista para parlamentarista. O objetivo dessa mudança era
diminuir os poderes do presidente. Em setembro de 1961, João Goulart
toma posse sob um sistema parlamentarista de governo que, no entanto,
não teria uma longa duração. O ato que estabeleceu o parlamentarismo
no Brasil, previa a realização de um plebiscito em 1965, onde a população
escolheria entre a manutenção do regime ou o retorno ao presidencialismo.
Porém o presidente Goulart, sentindo-se tolhido em seus poderes, não
queria esperar tanto e consegue antecipar a realização da consulta popular
para 1963. No plebiscito, o presidencialismo sai amplamente vitorioso.
A Crise Econômica E O Plano Trienal
Apesar das tensões políticas, a economia brasileira foi relativamente bem
até 1962. Em 1961, a taxa de crescimento foi de 8,6%, porém a inflação
atingiu nesse mesmo ano 47,8%, frente a 30,5% no período anterior.
Houve também, em 1961, uma redução da formação bruta de capital, o
que denotava que o auge dos investimentos pesados característicos do
processo de substituição de importações, já havia passado. Em 1962, frente
à crescente deterioração do quadro econômico, o governo lança o Plano
Trienal. O objetivo principal do plano era conciliar o combate à inflação
com um crescimento econômico próximo a 7%. A equipe responsável pela
elaboração do plano era liderada por Celso Furtado, que então ocupava
a função de ministro extraordinário para assuntos do desenvolvimento
econômico. A inflação foi diagnosticada como um problema de excesso de
demanda. Como acontece nessas situações, optou-se por uma política de
estabilização recessiva, baseada na contração monetária. Os resultados do
plano foram bastante negativos. Em 1963, o crescimento foi de 0,6%, frente
a uma taxa de 6,6% no ano anterior. Em julho de 1963, Celso Furtado deixa
o governo.
A política recessiva adotada durante o Plano Trienal pode ter contribuído
para a deterioração do quadro macroeconômico, mas a crise que estava
começando a ganhar forma tinha na realidade um conjunto de causas
variadas. Em 1961, a renúncia de Jânio precipitou uma crise política,
reduzindo o nível de investimentos no país. Concomitantemente, havia
na economia brasileira um problema de demanda reprimida decorrente
da baixa renda per capita, da forte concentração da renda e da ausência
de mecanismos de financiamento de longo prazo. Essa falta de demanda
agregada gerava capacidade ociosa na indústria e aumento nos custos
médios de produção. O agravamento da crise econômica aumenta cada
vez mais o desgaste político do presidente João Goulart. O desfecho desse
quadro é bem conhecido: o golpe militar de 1964, a interrupção do processo
político democrático e o fim do populismo.
Ruptura Democrática E O Fim Do Populismo
Conforme dissemos na aula anterior, com a ascensão de Getúlio Vargas
em 1930, temos o fim do Estado Oligárquico (dominado por poucos) e o
começo do Estado Populista. Entende-se por populismo um movimento
político comum em países em desenvolvimento, sobretudo na América
Latina. Suas características principais são o relacionamento direto de
amplas massas populares com a cúpula do Estado e o surgimento do
político carismático, que por vezes se coloca como defensor do povo. Na
América Latina, o auge do populismo se deu com Vargas, no Brasil, e Perón,
na Argentina. Mais recentemente, essa questão voltou ao centro do debate
político, principalmente por conta da projeção internacional conquistada
pelo presidente venezuelano Hugo Chaves.
Políticos populistas podem por vezes adotar medidas econômicas
sabidamente ruins com o objetivo de satisfazer os anseios da massa e obter
apoio popular. Por exemplo, aumentos salariais superiores ao aumento
da produtividade tendem a gerar inflação. Como se sabe, os segmentos
de menor renda são os mais atingidos pela inflação e isso acaba tendo
um efeito concentrador de renda. Logo, conclui-se que, se o objetivo é
redistribuir melhor a renda, essa é uma péssima medida econômica e que
deveria logicamente ser evitada. Mas por vezes o político populista age
exatamente dessa maneira, simplesmente para agradar seus eleitores.
Quando algo semelhante a isso acontece, diz-se que está sendo posta em
prática a pior versão do populismo, o chamado “populismo econômico”.
Os militares que assumiram o poder em 1964, acusaram o regime deposto
de populista. Os novos dirigentes da nação desejavam convencer a
sociedade de que tinham um projeto de modernização para o país e que
esse novo governo representava o fim do atraso populista. Convém aqui
fazer uma ponderação. De fato, os militares assumiram o poder em meio a
uma crise econômica. É verdade também que o Estado era populista no seu
sentido político, mas discutível sob o ponto de vista econômico. Todavia,
é inegável que o Brasil experimentou, durante o período populista, um
desenvolvimento industrial e um crescimento econômico extremamente
profundos. Segundo estudo realizado por MADDISON (1989), o Brasil foi o
país de maior crescimento mundial entre 1870 e 1987.
Outra crítica que os militares faziam ao regime deposto estava relacionada
ao seu nacionalismo exacerbado. Segundo os militares, políticas hostis ao
capital estrangeiro, como restrições às remessas de lucros ou estatização de
empresas multinacionais tenderiam a afugentar investidores internacionais
e aprisionar o país em uma situação de eterno subdesenvolvimento. Um
caso emblemático desse nacionalismo desmedido foi a encampação das
companhias telefônica e de fornecimento de energia elétrica (ambas norte-
americanas) pelo então governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola.
Uma das primeiras medidas adotadas pelo novo governo foi buscar uma
maior aproximação dos países desenvolvidos, sobretudo dos Estados
Unidos, e a normalização das relações com os organismos financeiros
internacionais.
O PAEG
O Paeg (Programa de Ação Econômica do Governo) foi um plano de
combate à inflação e reformas institucionais, elaborado pelos ministros
Roberto Campos (Planejamento) e Octávio Bulhões (Fazenda) e colocado
em prática durante a gestão do presidente Castello Branco (1964-66). A
causa essencial da crise econômica, de acordo com os elaboradores do
plano, estava na aceleração inflacionária que afetava o país desde o início
dos anos 1960. A inflação gerava um ambiente de insegurança no meio
empresarial, reduzindo os investimos e o ritmo de crescimento do país.
O diagnóstico da inflação brasileira era bastante ortodoxo. Segundo Campos
e Bulhões, a inflação era decorrente de um excesso de demanda para uma
oferta limitada de bens. Esse excesso de demanda tinha basicamente três
causas, a saber: monetização dos déficits públicos, expansão do crédito
privado e majorações salariais superiores aos aumentos de produtividade.
O combate à inflação seria feito por meio de ajuste fiscal, de uma política
monetária restritiva e de contenção salarial.
A estabilidade de preços foi relativamente bem sucedida. Em 1964, a
inflação foi de 92,1%, no ano seguinte já cairia para 34,2% e continuaria
caindo nos anos seguintes até se estabilizar em torno de 19%. Apesar
desse aparente sucesso, BACHA (1988) defende a teoria de que houve um
erro no diagnóstico da inflação brasileira. Não havia excesso de demanda
na economia, mas sim pressões dos preços agrícolas, decorrente de uma
quebra de safra. De acordo com a análise desse autor, o governo colocou em
prática uma política recessiva de combate a inflação desnecessariamente.
Síntese
.Você aprendeu nessa aula que o Brasil passou por uma forte crise política
e econômica no início da década de 1960, que acabou ensejando no golpe
militar de 1964. Os militares defendiam que, para se modernizar, o Brasil
deveria abandonar as ultrapassadas políticas populistas e implementar um
conjunto de reformas institucionais. Em 1964, o governo militar lançou o
Paeg, um programa de estabilização e reformas (financeira e tributária).
Apesar de várias críticas que podem ser feitas, a avaliação do Paeg, de forma
geral, costuma ser positiva.
Reformas Institucionais
Por conta do forte impacto que teria nos rumos da economia brasileira
nas próximas décadas, as reformas institucionais (financeira e tributária)
promovidas pelo Paeg costumam ser consideradas mais importantes que
o programa de estabilização dos preços. A reforma financeira criou duas
importantes instituições dentro do Sistema Financeiro Nacional (doravante,
SFN): o Conselho Monetário Nacional (CMN) e o Banco Central do Brasil
(Bacen). O primeiro teria por função estabelecer as diretrizes básicas de
política monetária e cambial, o segundo executaria essas políticas, bem
como fiscalizaria as demais instituições financeiras do sistema. Outra
importante inovação foi a criação dos bancos de investimentos privados. O
SFN vigente na época era constituído basicamente de quatro tipos diferentes
de instituições: i) bancos comerciais privados, que proviam as empresas de
recursos de curto e médio prazo; ii) financeiras, que financiavam a aquisição
de bens duráveis; iii) caixas econômicas estaduais e federais, que atuavam
no crédito imobiliário e iv) bancos públicos (Banco do Brasil e BNDE),
que eram as únicas instituições que proviam as empresas de recursos de
longo prazo. A reforma financeira de 1964 criou os bancos privados de
investimentos. Era basicamente o que faltava para completar o conjunto,
uma instituição privada que fornecesse recursos de longo prazo. Os bancos
de investimentos deveriam atuar de duas maneiras: como emprestador
final (em menor escala) ou auxiliando as empresas na colocação de títulos
no mercado de capitais.
Outra importante inovação do SFN foi a instituição da correção monetária,
até então a lei não permitia a indexação de contratos. No mercado de títulos
públicos, a correção monetária se consubstanciaria através da criação, em
1964, da Ordem Reajustável do Tesouro Nacional (ORTN) e no mercado de
títulos privados, a correção monetária passava a ser permitida pela nova Lei
dos Mercados de Capitais, de 1965.
A reforma tributária implementada nesse mesmo período tinha duas
finalidades básicas: aumentar a arrecadação de impostos e conferir uma maior
racionalidade ao sistema tributário. Sob o ponto de vista da arrecadação, a
reforma foi bem sucedida. Entre 1963 e 1967, a carga tributária aumentou
de 16 para 21% do PIB. Por outro lado, a reforma conferiu um caráter
centralizador e regressivo ao sistema tributário nacional. Centralizador
porque limitou a competência dos estados e municípios de legislar sobre
matéria tributária. Regressivo porque incidiu proporcionalmente mais
sobre os segmentos de menor poder aquisitivo, uma vez que predominava
os impostos indiretos ou sobre consumo.
Outra importante inovação promovida nesse período foi a criação do
Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), em 1964. O FGTS é um
fundo em nome do trabalhador, constituído a partir de depósitos mensais
efetuados pelo empregador de 8% do salário nominal. O FGTS veio
substituir a estabilidade no emprego a que o trabalhador tinha direito, após
trabalhar por dez anos na mesma empresa. O objetivo dessa mudança foi
o de promover uma maior flexibilidade no mercado de trabalho e com isso
aumentar a oferta de empregos formais.
A avaliação do Paeg, considerando o plano no seu todo, é positiva. O
governo conseguiu reduzir a inflação e promoveu um conjunto de reformas
fundamentais para o desenvolvimento do país. Todavia, algumas críticas
podem ser feitas. A primeira delas é a argumentação de BACHA, de que
houve um erro no diagnóstico da inflação brasileira e, por conta disso, a
implementação desnecessária de uma política recessiva com pesados
custos sociais. Além disso, podemos mencionar também um aumento
na concentração da renda devido à contenção (ou arrocho) salarial e à
instituição de um sistema tributário altamente regressivo.
O “Milagre” Econômico e o II PND
O “Milagre” econômico
Quando se fala em ditadura militar, as pessoas logo pensam em repressão,
censura, prisões arbitrárias, deportações, desaparecimentos, torturas
e uma série outros fatos que todos desejamos esquecer. Mas, por mais
contraditório que isso possa parecer para alguns, foi justamente nesse
período de cerceamento das liberdades individuais que a economia
brasileira teve o melhor desempenho da sua história. Estamos falando do
“milagre” econômico.
Para entender o “milagre”, vamos ter de retroceder até a gestão Castello
Branco (1964-66). Como já foi visto na aula anterior, esse período foi marcado
pela implementação do Paeg, plano de estabilização e reformas estruturais.
Apesar do sucesso do Plano no que diz respeito aos seus próprios objetivos
(estabilização e reformas), o pais continuava preso a um crescimento
medíocre e errático (normalmente chamado de stop and go).
Em 1967, sob a administração agora do presidente Costa e Silva, há uma
mudança radical na condução da economia. O novo presidente nomeia o
Prof. Delfim Netto como Ministro da Fazenda. Havia naquele período uma
forte necessidade de se legitimar o regime militar. O objetivo dos militares
era o de justificar o golpe, de mostrar para que vieram, ou ainda, o de
convencer a sociedade de que o novo governo era melhor que o deposto. E
isso somente seria possível através de crescimento econômico.
Com a mudança da política econômica implementada por Delfim Netto, o
crescimento tão cobiçado aconteceu. O “milagre” econômico ocorreu entre
1968-1973, durante os governos Costa e Silva e Médici. Nesses seis anos, o
Brasil cresceu a uma taxa média de 11% ao ano. Crescer seis anos seguidos
a uma taxa dessa já seria o suficiente para chamar esse período de milagre.
Mas, além disso, o Brasil conseguiu a enorme façanha de conciliar esse
crescimento vigoroso com inflação baixa e equilíbrio no setor externo.
Crescimento, Inflação e Equilíbrio Externo
Conciliar certos objetivos de política macroeconômica não é uma tarefa
muito fácil. Pelo menos desde a década de 1950, já se sabe que existe uma
certa dificuldade em se conseguir ao mesmo tempo inflação baixa e nível
de emprego elevado. Atualmente sabemos também que quando uma
economia cresce a um ritmo muito forte existe uma tendência de aceleração
inflacionária e desequilíbrio externo.
Você já ouviu alguma vez a expressão “crescimento sustentável”? Este
conceito está bastante relacionado com o que estamos tratando aqui.
Quando um país está crescendo a um ritmo muito acelerado, costuma-se
dizer que aquele crescimento não é sustentável no longo prazo e que em
determinado momento o governo deverá “frear” a economia. Se o governo
não o fizer, é bastante possível que uma crise inflacionária ou do setor
externo aborte o crescimento. Portanto, a Teoria Macroeconômica ensina
que é melhor crescer mais lentamente, mas de forma contínua, que ter um
crescimento rápido, mas que não se sustenta. Os economista até costumam
dizer o seguinte: o crescimento não pode ser como um “vôo de galinha”, ou
seja, algo que não se sustenta.
Por que quando a economia cresce existe essa tendência de inflação e
desequilíbrio externo? Bem, essa é uma questão complexa, que envolve
algumas noções de Macroeconomia. Vamos tentar entender. Se a economia
cresce muito rapidamente, alguns fatores de produção podem ficar escassos.
Por exemplo, se a economia começa a crescer aceleradamente, o fator de
produção mão-de-obra pode ficar escasso. Nesse caso, o que irá acontecer
com os salários? Deverão aumentar. Porém salários maiores representam
aumento no custo de produção, o que pode significar aumento de preços.
Compreendeu? E se o fator de produção matéria-prima se tornar escasso?
O raciocínio é o mesmo.
Além disso, o crescimento muito acelerado pode gerar desequilíbrio do setor
externo. Vejamos como isso acontece. Quando a economia cresce, a renda
dos consumidores também cresce, logo o consumo agregado aumenta.
Esse aumento do consumo ocorre tanto em relação a produtos nacionais
como importados. Portanto, pode-se concluir que quando a economia
cresce, as importações crescem. Por outro lado, com relação as exportações,
as coisas não acontecem necessariamente dessa forma. Para exportar mais,
é necessário que a demanda externa cresça. Compreendeu o problema?
O crescimento econômico gera aumento de importações, mas não de
exportações. Consequentemente, há uma tendência de desequilíbrio nas
contas externas. Você entendeu agora por que o “milagre” econômico tem
esse nome? Seis anos seguidos de crescimento vigoroso com baixa inflação
e sem desequilíbrio externo é realmente um milagre.
Concentração de Renda, Desequilíbrio Inter-setorial e Dependência Externa
Até o milagre teve o seu “calcanhar de Aquiles”. Apesar das incríveis taxas
de crescimento, associadas a inflação baixa e equilíbrio externo, o “milagre”
tinha suas limitações. A principal crítica que se faz ao milagre econômico
diz respeito à concentração de renda. Houve nessa época um aumento da
desigualdade entre ricos e pobres. O vigoroso crescimento da economia
não trouxe melhoria na qualidade de vida para todos os extratos sociais. Por
isso a famosa frase atribuída ao presidente Médici. Ao ser indagado sobre a
economia, teria respondido “a economia vai bem, mas o povo vai mal”.
Esse aumento na concentração da renda tem um conjunto de explicações.
Primeiramente, com o crescimento econômico, houve um forte aumento
da demanda por trabalhadores qualificados (engenheiros, administradores,
economistas, etc.). Mas não houve um crescimento significativo da demanda
por trabalhadores pouco qualificados. Em suma, o “milagre” fez com que a
renda dos mais qualificados crescesse proporcionalmente mais que a dos
poucos qualificados, gerando concentração na renda.
Outro fator que deve ser levado em conta para compreender esse aumento
de desigualdade de renda foi a contenção salarial imposta pelo regime militar.
Com o objetivo de controlar a inflação, o governo militar fazia um rigoroso
controle dos aumentos salariais e reprimia violentamente as manifestações
de trabalhadores. Essa contenção (ou arrocho) salarial também contribuiu
para aumentar o fosso entre ricos e pobres.
Além disso, o milagre gerou um desequilíbrio entre os diferentes setores
da indústria. Os investimentos realizados durante o período do ”milagre”
se concentraram principalmente no setor de bens de consumo duráveis.
Logo, começou a se formar um desequilíbrio entre os diferentes setores da
indústria. A produção no setor de bens duráveis crescia a um ritmo mais
acelerado que nos setores de bens de capital (máquinas e equipamentos)
e bens intermediários (petróleo, fertilizantes, produtos químicos, etc.). Com
o passar do tempo, esse desequilíbrio inter-setorial iria gerar um problema
de dependência externa. Ou seja, o país, por não ter o setor de bens de
produção (de capital e intermediários) suficientemente desenvolvido,
dependia da importação desses produtos.
O Choque de Petróleo e a Crise Internacional
Essa situação de dependência externa iria ficar muito mais complicada a partir
do primeiro choque do petróleo. Você se lembra quando nós discutimos
a importância de se estudar fatos internacionais para se compreender os
rumos da nossa economia? Bem, aqui nós teremos uma outra excelente
oportunidade para verificar como isso é realmente verdade.
No final de 1973, os países membros da Opep (Organização dos Países
Exportadores de Petróleo) tomaram a decisão radical de reduzir a oferta
mundial desse produto, provocando o aumento do seu preço. Essa decisão
estava relacionada a um problema geopolítico envolvendo a guerra entre
árabes e israelenses. À crise que se inicia a partir daí, convencionou-se
chamar de “primeiro choque do petróleo”, o segundo choque iria ocorrer
em 1979, a partir da guerra civil do Irã.
O Brasil tinha, como já vimos, um problema de dependência externa. O
país precisava importar bens de capital e bens intermediários (petróleo,
principalmente), uma vez que essa indústria era pouco desenvolvida. Com
a crise, essa dependência se torna um problema crítico. O que fazer diante
de uma situação como essa? O governo brasileiro tinha duas alternativas.
A primeira possibilidade seria promover um ajuste recessivo. Conforme já
dissemos, quando o país cresce menos, as importações diminuem. Logo, se
a economia crescesse a um ritmo mais lento (ajuste recessivo), o gasto com
importações diminuiria. A outra estratégia seria implementar um ajuste
estrutural: Ou seja, realizar mais investimentos e diminuir a dependência
por importações. Essa segunda estratégia era muito mais ousada, pois
implicava aumentar o desequilíbrio externo em um primeiro momento
para colher seus benefícios somente anos depois.
Conforme já dissemos, o regime militar buscava sua legitimação e para isso
deveria fazer o país crescer. Além disso, havia na sociedade (principalmente
entre empresários e banqueiros) uma pressão por um ajuste não-recessivo.
Pressionado, e necessitando justificar o golpe militar, o governo opta
pelo ajuste estrutural (não recessivo). É justamente a partir dessa decisão
de aprofundar o processo de substituição importações em meio a uma
crise econômica internacional que nasce o II PND (Plano Nacional de
Desenvolvimento Econômico).
O II PND
Se existiu um II PND, provavelmente deve ter existido também um I PND,
correto? Bem, o I PND foi implementado entre 1972-1974, durante a gestão
Médici, porém não costuma ser muito estudado por não ter tido um papel
muito importante na determinação dos rumos da economia nacional. O
II PND, por sua vez, foi posto em prática ente 1975-79, durante a gestão
Geisel. Esse plano é considerado a mais ampla experiência de planejamento
econômico no Brasil depois do Plano de Metas e teve uma importância
fundamental na consolidação do processo de substituição de importações
ocorrido no Brasil.
Um dos objetivos do II PND era o de solucionar o problema de dependência
externa decorrente do desequilíbrio inter-setorial. Por isso comportava uma
série de investimentos no setor de bens de capital e de bens intermediários.
Todavia, para realizar todos os investimentos exigidos pelo II PND, seriam
necessários, logicamente, recursos financeiros. Você se lembra que em
economia “não existe almoço grátis”, não é mesmo? Pois bem, esses recursos
viriam principalmente dos chamados “petrodólares”.
Com o aumento do preço do petróleo ocorrido a partir de 1973, o valor
das exportações dos países produtores do bem cresceu significativamente.
Como não havia muitas opções para se aplicar esses recursos nesses países,
a maior parte desses dólares foi depositada em bancos de países ricos.
A partir disso, surgem os famosos petrodólares. Com o II PND, o Brasil se
transformou em um dos maiores tomadores de recursos (petrodólares) no
mercado financeiro internacional.
A avaliação que se faz do II PND costuma ser positiva. De modo geral,
pode-se dizer que os objetivos de mudança estrutural que motivaram
o Plano foram alcançados. Contudo, os resultados concretos só vieram a
acontecer entre 83-84, com a maturação dos investimentos realizados.
Entre esses resultados, três merecem destaque: i) a reversão do saldo da
balança comercial, que se tornou superavitária, ii) uma dependência menor
das importações de petróleo, iii) uma maior diversificação na pauta de
exportações do país, com predomínio de bens manufaturados (no lugar de
bens primários, como era no passado).
A interrupção na década de oitenta, de uma longa história de crescimento que caracterizava o
Brasil, é resultado de um amplo conjunto de causas entre as quais, o peso insustentável da
dívida externa, o imobilismo gerado por uma excessiva protecção à indústria nacional, o
fracasso dos programas de estabilização no combate à inflação e o esgotamento de um
modelo de desenvolvimento, baseado fundamentalmente na intervenção generalizada do
Estado na economia, esgotamento esse assente na crise do Estado brasileiro que diminuiu
sensivelmente a sua capacidade de investimento, retirando-lhe o grande papel de principal
promotor do desenvolvimento.
No entanto, é no seu aspecto financeiro que a crise se torna mais aguda, levando a
economia a uma espiral inflacionária, que provocou uma queda nos níveis de poupança do
sector público, criando um ambiente de incertezas que dificultou a retomada dos
investimentos e continua a provocar o alargamento dos desníveis sociais, com consequências
imprevisíveis no futuro.
A Economia Brasileira na Década de 80
A partir de 1979, o padrão de crescimento baseado no financiamento externo ou estatal,
através do investimento directo do Estado ou do investimento privado subsidiado, que tinha
prevalecido durante a década de 70, entrou em crise, quando o fluxo de financiamento
externo líquido cessou em 1982.
Assim é que, em razão da crise nacional que se segue, emerge uma questão política básica,
que é a de que nos anos oitenta, o Brasil perdeu o controlo do seu destino. Três factores
contribuíram decisivamente para isso, frustrando os intentos de colocar o país na trajectória
do progresso e da modernidade: a dívida externa, as elevadas taxas de inflação e uma
profunda crise do Estado. Embora variem os graus de relevância destes três factores, eles
estiveram sempre presentes na conjuntura da crise.
Este trabalho procura assim, analisar as causas que provocaram a profunda crise brasileira da
década de oitenta, crise que aliás se estenderia a praticamente toda a América Latina,
naquela que é considerada pelos latino-americanos como a “década perdida”, bem como as
consequências das sucessivas medidas económicas e planos de estabilização tentados pelos
sucessivos governos, na tentativa vã de retornar a níveis de crescimento e de controlo
inflacionário que permitissem a recuperação económica do país.
1. Introdução
Ainda que durante a década de oitenta o desempenho económico dos diferentes países
latino-americanos não tivesse sido uniforme, com alguns conseguindo taxas de crescimento
razoáveis e uma relativa estabilidade de preços, na maioria destes países porém, o que
verificou foi a manutenção prolongada de elevadas taxas de inflação, problemas crescentes
com a gestão das dívidas externas, estagnação económica e redução da renda por habitante.
A crescente espiral inflacionária vivida na maior parte destes países, só foi parcialmente
interrompida em períodos de congelamentos de preços, através dos chamados choques
económicos heterodoxos, para logo a seguir voltar de uma forma geral a níveis iguais ou
superiores aos anteriormente estabelecidos.
TABELA 1: A CRISE NA AMÉRICA LATINA. ALGUMAS VARIÁVEIS
MACROECONÓMICAS NOS ANOS 80
Variações percentuais % 1980 1985 1989
Crescimento do PIB (índice) 100,0 103,5 113,1 Crescimento do PIB per-capita (índice) 100,0 92,2 91,7 Investimento/PIB 24,2 16,3 16,2 Inflação 54,9 274,7 1.157,6
Dívida/ Exportações 2,1 3,5 3,2
Fonte: CEPAL (Comissão Económica para a América Latina das Nações Unidas, Santiago, Chile), in
Bresser, L.C. "A CRISE DO ESTADO: ENSAIOS SOBRE A CRISE BRASILEIRA".
Os dados contidos na Tabela 1, são elucidativos do tamanho da crise latino-americana.
A renda por habitante na América Latina, reduziu-se em 8,3% no período de 1980 a 1989,
enquanto a inflação que era em média de 54,9% no início dos anos 80, subiu para 1157,6%
no final da década e a taxa de investimento em relação ao Produto Interno
Bruto (PIB) caiu de 24,2 para 16,21.
Estes dados claramente negativos, levaram vários economistas a formularem diferentes
teorias para o caos económico que se instalou no continente Latino-Americano, procurando
detectar as causas da crise e orientar os governos para que estes implementassem as
reformas necessárias.
No caso do Brasil, o maior e mais rico país da América Latina, não foi diferente. Os
economistas brasileiros dividem-se quanto ao grau de importância a conceder às principais
causas da crise, mas são praticamente unânimes quanto a elas: A dívida externa excessiva,
altas taxas de inflação, excesso de intervenção estatal na economia e uma crise fiscal
profunda do Estado que lhe retirou toda a capacidade de poupança e praticamente o
imobilizou.
De qualquer forma não há como negar que a grave crise que se abate sobre as economias
latino-americanas, inclusive a brasileira, está intimamente relacionada com o grande processo
de endividamento externo. Durante os anos setenta, a abundância de recursos em poder dos
bancos internacionais viabilizou o crescente endividamento dos países da América Latina, que
ultrapassou em 1982 os US$ 300 bilhões. No entanto, desde 1979, os bancos credores
mostravam já sinais de preocupação e impaciência, ao pressionarem os devedores com a
recusa da concessão de novos empréstimos, deixando-lhes clara a necessidade de se
ajustarem, adoptando políticas económicas ortodoxas com o objectivo de aumentar as
exportações, reduzir as importações e combater a inflação já então em níveis bastante
acentuados.
As políticas económicas ortodoxas, em função dos desequilíbrios mais comuns destas
economias, como a inflação e o desequilíbrio externo, estavam geralmente contidas nas
recomendações do Fundo Monetário Internacional (FMI) e consistiam basicamente em:
• reduzir as despesas do Estado e equilibrar o orçamento público;
• reduzir e controlar a quantidade de moeda em circulação;
• liberalizar os preços de quaisquer tabelamentos;
• liberalizar a taxa de juros, que dada a redução da oferta monetária, deverá aumentar;
• liberalizar (geralmente desvalorizar) a taxa de câmbio;
• eliminar todos os subsídios;
• reduzir os salários dos sectores público e privado.
É possível observar que à excepção da proposta para os salários, todas as demais são
liberalizantes. Aliás, uma constante das propostas ortodoxas de política económica, sempre
foi o arrocho salarial, adoptado em nome do combate à inflação.
Diagnosticar este tipo de política económica não é difícil. Se a inflação e o desequilíbrio
externo decorrem das distorções do mercado e do excesso de procura agregada, há que
corrigir essas distorções eliminando todo e qualquer controlo de preços e procurando reduzir a
procura agregada, provocando uma recessão na economia.
Assim, a redução das despesas do Estado, a redução da quantidade de moeda em circulação
e a elevação da taxa de juros (que leva tecnicamente à redução dos investimentos) têm como
consequência reduzir a procura agregada e provocar a recessão (aumentando as taxas de
desemprego e diminuindo os níveis de produção). Como consequência, a inflação cairia, uma
TABELA 2: BRASIL. TAXAS REAIS DE VARIAÇÃO ANUAL DO PIB E DO PIB
PER CAPITA 1970 / 1990
Taxas Reais de Variação Anual do PIB Índice PIB PIB Per Capita
AnosAgro-
pecuária Industria Serviços TotalReal
1980=100População
(Mil) Taxa Real de Variação
Índice Real 1980=100
1970 43,7 93.139 55,6
1971 10,2 11,8 11,2 11,3 48,6 95.450 8,6 60,4
1972 4,0 14,2 12,4 11,9 54,4 97.818 9,2 66,0
1973 0,1 17,0 15,6 14,0 62,0 100.244 11,2 73,4
1974 1,3 8,5 10,6 8,2 67,1 102.731 5,6 77,5
1975 6,6 4,9 5,0 5,2 70,6 105.280 2,7 79,5
1976 2,4 11,7 11,6 10,3 77,8 107.891 7,6 85,6
1977 12,1 3,1 5,0 4,9 81,7 110.568 2,4 87,6
1978 -2,7 6,4 6,2 5,0 85,7 113.311 2,5 89,8
1979 4,7 6,8 7,8 6,8 91,6 116.122 4,2 93,5
1980 9,5 9,2 9,0 9,2 100,0 118.623 6,9 100,0
1981 8,0 -8,9 -2,3 -4,5 95,5 120.918 -6,3 93,7
1982 -0,5 0,0 1,9 0,5 96,1 123.256 -1,4 92,4
1983 -0,6 -5,8 -0,8 -3,5 92,7 125.640 -5,3 87,6
1984 3,4 6,6 4,1 5,3 97,6 128.070 3,3 90,4
1985 10,0 8,3 6,4 7,9 105,4 130.547 5,9 95,7
1986 -8,0 11,8 8,2 7,6 113,4 133.072 5,6 101,1
1987 15,0 1,1 3,3 3,6 117,4 135.646 1,6 102,7
1988 0,8 -2,6 2,3 -0,1 117,3 138.270 -2,0 100,6
1989 2,9 2,9 3,8 3,3 121,2 140.944 1,3 102,0
1990 -3,7 -8,0 -0,8 -4,4 115,8 143.670 -6,2 95,7
Fonte: Fundação Instítuto Brasileiro de Geografia e Estatística (FIBGE)
vez que por definição é considerada como sendo causada por um excesso de procura. A
redução da procura interna teria um efeito duplo sobre as contas externas. De um lado, a
queda do consumo faria com que sobrassem mais mercadorias para serem exportadas. De
outro, a queda no investimento implicaria numa menor procura por bens importados.
Aumentadas as exportações e reduzidas as importações, a balança comercial tornar-se-ia
superavitária e o balanço de pagamentos tenderia a equilibrar-se.
2. O Caso Brasileiro
O Brasil tentou aplicar esta política económica ortodoxa em diversas ocasiões, com mais
efeitos negativos do que práticos. No entanto este tipo de política económica, começou a ser
sugerido pelos credores externos, em virtude das desconfianças quanto à s egurança dos seus
empréstimos, uma vez que no ano de 1979, ocorreram três choques externos que viriam a
causar graves problemas aos países latino-americanos.
Estes três choques foram o segundo choque do petróleo, que triplicou os seus preços, a
elevação brusca das taxas de juros internacionais, que aumentou de forma significativa o total
dos juros pagos pelos países devedores e finalmente a recessão norte -americana de 79/82,
que se considera ter sido a mais grave desde a Grande Depressão de 1930. A triplicação dos
preços de petróleo aumentava sensivelmente o valor das importações da maioria dos países
latino-americanos (excepto o México e o Equador) e particularmente do Brasil. O aumento da
taxa de juros elevava os pagamentos anuais de juros, decorrentes do grande volume de
financiamentos externos, captados durante a década de 70. E finalmente a recessão norte -
americana reduzia as exportações latino-americanas para aquele país, claramente o seu
principal parceiro comercial.
A pressão destes três factores foi contundente, levando a América Latina na década de 80 à
maior recessão de toda a sua história. Aqueles choques externos só poderiam ter sido
compensados com uma aceleração do endividamento externo, o que a esta altura e frente ao
elevado grau de endividamento dos anos 70, era impensável.
Dado o desequilíbrio externo, expresso por elevados défices na conta corrente do balanço de
pagamentos e frente à decisão dos bancos internacionais de não continuarem a financiar
esse défice com o aumento do endividamento externo, um processo de ajustamento capaz de
equilibrar a balança comercial, reduzindo importações e aumentando exportações era
inevitável.
Se nesta fase, os países latino-americanos tivessem podido e querido unir-se e usar o seu
poder de negociação para fazer face à questão da dívida, era provável que tivessem obtido
reduções nas taxas de juros e financiamentos adicionais, que permitissem um ajustamento
mais suave e gradual. Mas isso efectivamente não aconteceu. Os bancos credores
aumentaram a pressão, sobretudo após a moratória do México em 1982. Esta pressão
contava com o apoio dos seus respectivos países e também do Fundo Monetário
Internacional. E o ajustamento acabou realizando-se nos termos determinados pelos bancos
credores e por este organismo.
Foi um ajustamento realmente drástico, que levou o PIB per capita da América Latina, a uma
redução de 8,9% entre os anos de 198l e 1984. Os maiores prejudicados foram os
trabalhadores, uma vez que as desvalorizações reais das moedas locais (as chamadas maxi-
desvalorizações) necessárias para estimular as exportações e conter as importações,
mudaram os preços relativos, penalizando os salários e favorecendo o lucro dos
exportadores. Há estudos mostrando ter havido uma queda nos salários reais da América
Latina em 10% no mesmo período2. E a inflação que por exemplo, havia sido no Brasil de
93,5% em 1981, subiu em 1984 para 239%, tendo esta alta sido extensiva à generalidade dos
demais países latino-americanos.
Outra grave consequência foi que os países latino-americanos, de importadores de capital nos
anos setenta, passaram a exportadores líquidos de capital nos anos oitenta. Só na primeira
metade da década, cerca de 5% do PIB, passou a ser enviado directamente para o exterior,
para pagar os juros da enorme dívida externa.
O Brasil, a par dos demais países da América Latina viu assim iniciar-se a década de oitenta,
a que os economistas chamaram a década perdida, como um período que viria a ser pródigo
numa série de tentativas ortodoxas de estabilização na primeira metade da década e
TABELA 3: BRASIL. VARIÁVEIS MACROECONÓMICAS INTERNAS (%). 1970 / 1991
PIB Investim. Inflação PIB Per Poupança (% PIB)
Anos %/Anual / PIB IGP/IPC Capita % Anual Total Externa
1970 8,3 25,5 19,8 24,1 1,4
1971 11,3 26,0 19,7 8,6 23,4 2,6
1972 11,9 26,1 15,7 9,2 23,5 2,6
1973 14,0 27,2 15,5 11,2 25,2 2,0
1974 8,2 30,2 34,5 5,6 23,5 6,7
1975 5,2 31,7 29,4 2,7 26,4 5,3
1976 10,3 27,1 46,3 7,6 23,3 3,8
1977 4,9 25,7 38,8 2,4 23,5 2,2
1978 5,0 26,5 40,8 2,5 23,2 3,3
1979 6,8 22,0 77,2 4,2 17,5 4,5
1980 9,2 23,3 99,7 6,9 17,2 5,1
1981 -4,5 21,1 93,5 -6,3 16,8 4,3
1982 0,5 21,2 100,3 -1,4 15,4 5,8
1983 -3,5 16,9 178,0 -5,3 13,6 3,3
1984 5,3 16,4 209,1 3,3 16,5 -0,1
1985 7,9 17,0 239,1 5,9 19,0 -2,0
1986 7,6 19,2 58,6 5,6 17,1 2,1
1987 3,6 22,2 396,0 1,6 21,7 0,5
1988 -0,1 22,7 994,3 -2,0 24,0 -1,3
1989 3,3 24,8 1.863,6 1,3 25,0 -0,2
1990 -4,4 21,5 1.585,2 -6,2 20,7 0,8
1991 0,9 18,9 475,1 -1,0 18,6 0,3
Fonte: FIBGE/Banco Central do Brasil:
A. Brasil - Programa Económico nº 35 - Dezembro de 1992. Editado pelo Departamento
Económico do Banco Central do Brasil.
B. Boletim do Banco Central do Brasil, Volume 29 - nº 1, Julho de 1993.
heterodoxas na segunda. Estes planos económicos de estabilização heterodoxos tiveram a
sua máxima expressão em países como a Argentina e o Brasil, mas veremos que a exemplo
das receitas ortodoxas do FMI, foram incapazes de resolver os problemas básicos que
afligiam estas economias: a enorme dívida externa e interna, a quase hiperinflação e a
profunda crise fiscal do Estado.
A interrupção na década de 80, de uma longa história de crescimento que caracterizava o
Brasil, é resultado de um amplo conjunto de causas entre as quais, o peso insustentável da
dívida externa, o imobilismo gerado por uma excessiva protecção à indústria nacional, o
fracasso dos programas de estabilização no combate à inflação e o esgotamento de um
modelo de desenvolvimento, baseado fundamentalmente na intervenção generalizada do
Estado na economia, esgotamento esse assente na crise do Estado brasileiro que diminuiu
sensivelmente a sua capacidade de investimento, retirando-lhe o grande papel de principal
promotor do desenvolvimento.
No entanto, é no seu aspecto financeiro que a crise se torna mais aguda, levando a economia
a uma espiral inflacionária que provocou uma queda dos níveis de poupança do sector
público, criando um ambiente de incertezas que dificultou a retomada dos investimentos e
continua a provocar o alargamento dos desníveis sociais, com consequências imprevisíveis
no futuro.
Na história do seu desenvolvimento capitalista, a economia brasileira não parou de crescer
desde aproximadamente os anos 40 do século XIX, quando o desenvolvimento da cultura de
café permitiu superar a crise que se arrastava desde meados do século anterior, quando se
esgotara o ciclo do ouro.
Isto permite-nos constatar que foram cento e cinquenta anos de extraordinário crescimento,
mas a partir de 1981, a economia brasileira entra num longo período de estagnação que se
arrasta por toda a década. A renda por habitante, que nos oito anos anteriores 1973/1980
crescera 52,7%, é menor em 1990 do que no começo da década. Essa redução da taxa de
crescimento da economia brasileira para uma média praticamente constante ao crescimento
da população durante a década, quando a sua taxa histórica de crescimento tinha sido de
aproximadamente 7% ao ano desde os anos 40, não pode ser considerada acidental e está
intimamente ligada à queda do investimento no país. Esta taxa que tinha sido de 23% em
média nos anos 70, baixou para 17,4% a partir de 19813. A crise brasileira configurava-se
como uma crise estrutural, cujos sintomas básicos são a estagnação da renda por habitante e
a drástica redução da poupança e investimento do país, como se pode observar na tabela 3.
Observando esta tabela é possível examinar comparativamente o padrão de financiamento
dos investimentos na década de setenta e na década de oitenta. Enquanto a taxa de
crescimento do produto flutuou acentuadamente, as taxas de poupança e investimento
declinaram significativamente. A redução da taxa de poupança está claramente relacionada
com o declínio da poupança externa, e sobretudo com o da poupança do Estado, que era de
aproximadamente 10% no início dos anos setenta, o que significava 42% do total e que caiu
para zero em 1985, às vésperas do pr imeiro choque económico heterodoxo. De um valor
máximo de 31,75 do PIB em 1975, o total da poupança caiu para 16,4% em 1984,
recuperando-se posteriormente para o nível de 21,5% em 1990, mas com uma participação
externa insignificante.
Na verdade e durante este período, a poupança externa declinou de 5,3% para menos de 1%,
chegando a ser negativa em alguns períodos. Os investimentos caíram de 31,7% do PIB em
1975, para 18,9% em 1990, através de uma forte redução dos investimentos públicos que
eram em 1985 de zero, contrastando com os 8,2% de 1975, apesar dos investimentos
privados se terem mantido praticamente ao mesmo nível.
No Brasil, durante a década de 1970, o processo de financiamento dos investimentos seguiu o
padrão clássico dos primeiros estágios de desenvolvimento, em que o investimento total era
função do endividamento externo e do investimento estatal.
Em 1974, o investimento externo rondava os 22% do investimento total, enquanto o
investimento estatal se ficava em torno dos 27%. É necessário porém admitir que o
investimento estatal foi superior a este valor, uma vez que além de investir directamente ou
através das empresas estatais, o Estado subsidiou fortemente o investimento privado. Não há
dados exactos sobre o montante desses subsídios, mas durante os anos setenta, havia
subsídios para uma série de actividades, nomeadamente subsídios para exportação, crédito
subsidiado, subsídios fiscais para sectores industriais e regiões e preços artificialmente baixos
de bens e serviços produzidos pelas empresas estatais, sobretudo os preços do aço e da
energia eléctrica.
Porém a partir de 1979, esse padrão baseado no financiamento externo ou estatal, com
investimento directo do Estado ou com investimento privado subsidiado que prevaleceu
durante a década de setenta, entrou em crise, quando o fluxo de financiamento externo
líquido cessou em 1982.
Assim é que, em razão da crise nacional, emerge uma questão política básica, que é a de que
nos anos oitenta, o Brasil perdeu o controlo do seu destino. Três factores contribuíram
decisivamente para isso, frustrando os intentos de colocar o país na trajectória de progresso e
modernidade: a dívida externa, as elevadas taxas de inflação e uma profunda crise do Estado.
Embora variem os graus de relevância destes três factores, eles têm estado sempre
presentes na conjuntura da crise.
Na verdade a estagnação e as altas taxas de inflação são assim as principais características
da economia brasileira nos anos oitenta. O País que vinha ao longo de quase um século
crescendo a taxas elevadas, viu este ciclo de crescimento interrompido em 1981.
Num primeiro momento, entre 1981 e 1983, a diminuição do ritmo de crescimento do PIB
(4,5% em 81, 0,5% em 82 e -3,5% em 83) foi devida a um esforço de ajustamento imposto
pela crise da dívida e pelos choques externos já citados. Entre 1984 e 1986, a crise parecia
estar sendo superada, mas em 1987, um ano após a implementação do primeiro choque
económico heterodoxo, o denominado Plano Cruzado, a crise volta a instalar-se na economia
brasileira, com o PIB tendo uma taxa de crescimento negativa de 0,1% em 1988.
Em 1989, a economia volta a apresentar um crescimento positivo embora modesto, de 3,3%,
ao mesmo tempo em que a inflação chegava aos 50% mensais no final do ano, ou seja, uma
taxa de inflação que se poderia inserir num processo hiperinflacionário. Em 1990, a economia
volta a apresentar uma taxa negativa de crescimento do PIB em torno aos 4,4%, com a
constatação de que o PIB per capita era em 1990, inferior ao de 1980.
A crise da economia brasileira na década de oitenta pode ser explicada por várias causas.
Está de facto bem clara a sua relação com a dívida externa e com a crise fiscal do Estado que
se desenvolveu a partir desta dívida e que levou a economia a um prolongado processo de
estagnação.
GRÁFICO 1. BRASIL. EVOLUÇÃO DAS TAXAS REAIS DE VARIAÇÃO ANUAL DO
PIB E DO PIB PER CAPITA. 1970 / 1990 ( 1980 = 100 )
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P I B R e a l P I B P e r C a p i t a R e a l
A aceleração da inflação durante este período, está fortemente associada à crise fiscal e à
dívida externa, mas é o conflito distributivo, que caracteriza uma economia em que a renda é
fortemente concentrada, a causa fundamental dessa inflação e da sua aceleração. A dívida
externa, à medida que agiu ag ravando directa ou indirectamente o conflito distributivo, teve
um papel importante como factor alimentador da inflação.
Por sua vez, a inflação agrava o défice público, afasta os investimentos e diminui a
produtividade do capital. Entre 84 e 86, quando se alcançou o equilíbrio na conta corrente,
acreditou-se que a crise da dívida estava a ser superada e que o défice orçamentário estava
sobre controlo, pelo que a única causa visível dos problemas do país era a inflação.
Nos anos setenta, a taxa anual média de inflação no Brasil foi de 40%. Em 1979 essa taxa
sobe para 77%, mantendo-se em torno aos 100% até 1982 e coincidindo com a crise da
dívida, que se iniciara em 1979, com o segundo choque do petróleo e a subida dos juros
internacionais.
As principais causas para a subida da inflação nesse período foram uma maxi-desvalorização
do cruzeiro em 1979, o aumento das taxas de juros internas, uma nova política salarial e o
aumento de alguns preços dos bens públicos, que como veremos tinham sido mantidos
artificialmente baixos no período 74/78.
Em 1983, a inflação sofre uma nova aceleração para perto dos 200%, mantendo-se nesse
nível até 1985, fruto de uma nova maxi-desvalorização do cruzeiro, associada a um aumento
significativo dos preços agrícolas.
As recessões profundas de 1981 e 1983, foram pois incapazes de controlar a inflação, o que
levou um grupo de economistas brasileiros, a formular a teoria da inflação inercial e a propor
como solução, um congelamento geral de preços, o que viria a ser chamado de choque
heterodoxo. O Plano Cruzado, de Fevereiro de 1986 foi o resultado dessa proposição teórica.
O fracasso desse plano atribuiu-se não à concepção original do plano, mas sim à
administração populista que se lhe imprimiu. Esse plano assim como o Plano Bresser (Junho
de 87) e o Plano Verão (Janeiro de 89), foram incapazes de eliminar a inflação.
GRÁFICO 2. BRASIL. EVOLUÇÃO DAS TAXAS DE VARIAÇÃO ANUAL DO PIB,
INFLAÇÃO E TAXA REAL DO PIB PER CAPITA. 1970/1990 (1980 = 100)
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P I B P e r C a p i t a
Estes planos, baseados na mais importante contribuição dos economistas latino-americanos à
teoria económica, a teoria da inflação inercial, fracassam devido fundamentalmente à
incapacidade do governo de conter a procura agregada, na medida em que não se conseguiu
reduzir o défice público, nem se praticou uma política monetária rígida que garantisse taxas
de juros positivas, devido também à recusa do governo em corrigir os preços relativos que
estavam distorcidos à época dos choques e devido ainda e sobretudo, à cont inuidade de uma
dívida externa extremamente elevada e à incompatibilidade desta com a estabilidade dos
preços internos.
Estes planos, baseados na mais importante contribuição dos economistas latino-americanos à
teoria económica, a teoria da inflação inercial, fracassam devido fundamentalmente à
incapacidade do governo de conter a procura agregada, na medida em que não se conseguiu
reduzir o défice público, nem se praticou uma política monetária rígida que garantisse taxas
de juros positivas, devido também à recusa do governo em corrigir os preços relativos que
estavam distorcidos à época dos choques e devido ainda e sobretudo, à continuidade de uma
dívida externa extremamente elevada e à incompatibilidade desta com a estabilidade dos
preços internos.
As razões para que somente um congelamento de preços combinado com tímidas medidas de
política fiscal e monetária é incapaz de controlar a inflação, é que é necessário encontrar uma
solução definitiva para a crise da dívida externa, que por sua vez condiciona a acção do
Estado, através de uma evidente crise fiscal, só podendo ser eliminada através da redução da
dívida pública interna e a eliminação do défice orçamentário. Sem estas medidas, a inflação
não cede e estamos assim, perante um círculo vicioso cuja corrente é necessário quebrar,
para de uma vez por todas eliminar definitivamente a crise instalada de uma forma visível e
intensa na economia brasileira, sobretudo a partir do final dos anos setenta.
Na década de 1990 a dinâmica da economia brasileira sofreu alteraçõesdecorrentes não somente de umapolítica de estabilização, que garantiu a reduçãodoprocesso inflacionário,mas tambémdemudanças no âmbito das empresas quese alinharam a um novo padrão tecnológico e organizacional predominante nospaíses capitalistas avançados.
A industrialização brasileira apresentou, historicamente, diferenciais quedistanciaram o seu parque industrial das demais economias latino-americanas,todas integrantes da denominada periferia domundo desenvolvido capitalista. Oavançododesenvolvimento capitalista brasileiro, contudo, ocorreuparalelamentecom a emergência de pressões inflacionárias, agravamento das contas externas edeterioração das finanças públicas que se manifestaram, de forma contundente,nos anos de 1980.
No prenúncio dos anos de 1990, a nova proposta de desenvolvimentoeconômico, alicerçado na abertura econômica, entre outros aspectos, e a políticadeestabilização,apartirde julhode1994,propiciaramorealinhamentodaeconomiabrasileira a um novo contexto do desenvolvimento capitalista mundial em quepalavras como globalização e neoliberalismo tornaram-se representativas dosomatório de transformações e representações hegemônicas no período.
A abertura econômica é entendida aqui como a redução dos impostosincidentes sobre os bens importados, bem como a eliminação dos obstáculos,existentes nos regulamentos, leis, controles, normas, que impediam a livremovimentação das mercadorias e capitais estrangeiros. Esse processo ocorreuno Brasil ao longo da década de 1990 e representou o alinhamento do país àonda de expansão do comércio e de capitais liderados pelas empresas dospaíses desenvolvidos. O movimento de expansão, chamado de globalização,foi possível com as transformações tecnológicas.
Anos Noventa
A compreensão dessa nova realidade e o impacto no desenvolvimentocapitalista brasileiro, bem como a forma pela qual o país enfrentou seusproblemas, tornam-se fundamentais para traçar as perspectivas da economiabrasileira, além apontarem os desafios (novos e velhos) para se atingir umarealidade social menos excludente.
1 A reestruturação da economia mundial nosanos de 1980
O desenvolvimento capitalista mundial entra em processo dedesaceleração na década de 1970, depois de enfrentar uma expansão econômicasem precedentes, cuja origem encontra-se no pós-Segunda Guerra Mundial.O crescimento foi liderado pela economia norte-americana que, ao definir umanova forma de integração com a economia mundial, garantiu a dinamizaçãodas demais economias capitalistas com a expansão de sua estrutura industriale dos respectivos padrões de consumo baseado em bens duráveis.
As empresas européias e japonesas nos anos de 1950, reagindo àexpansão das empresas norte-americanas, iniciaram um esforço de atualizaçãotecnológica, possibilitando, em um segundo momento, um novo avanço dosinvestimentos em direção aos países periféricos em resposta à ação dos EUA,cuja hegemonia passa a ser contestada pelas tendências policêntricas que seafirmamundialmente.Opolicêntrismodecorreuda ascensão, emsuas respectivasregiões, daAlemanhaOcidental e Japão, dinamizando as respectivas economiasregionais bem como seus parceiros comerciais.
Ospaísesperiféricosoupobres sãoaseconomiasnacionaisqueapresentama condição de subdesenvolvimento, formando um subsistema composto, entreoutros, pelos países da América Latina, da África e Ásia Ocidental.
Algumas economias periféricas sofreram profundas transformaçõesnessa fase de expansão da economia mundial. O avanço das fronteiras docapitalismo, ao anexar as economias periféricas, produziu desequilíbriosindustriais nos países com base produtiva em estágios distintos quandocomparadas com países desenvolvidos. A eliminação (ou atenuação) dosdesequilíbrios exigiu o fortalecimento dos estados nacionais que assumiram opapel de centralizadores de recursos e coordenadores do processo deindustrialização, além de investidores emdeterminados segmentos econômicose em infra-estrutura.
O resultado não foi homogêneo, ocorrendo distintos avanços entre ospaíses da periferia, pois, enquanto alguns países industrializaram-se, outros
permaneceram nas etapas iniciais do processo. Contudo, o mais importante aser destacado é que ocorreu um processo de integração, desigual e marginalsem dúvida, das economias periféricas ao desenvolvimento capitalistamundiale, conseqüentemente, serão atingidas nos momentos de crise e reorganizaçãoda produção capitalista lideradas pelos países centrais.
O esgotamento do ciclo mundial de crescimento, manifestado a partirda década de 1970, deve-se à perda da capacidade de difusão tecnológica nossetores que lideraram a expansão nos países capitalistas desenvolvidos, bemcomode sua forma de internacionalização baseado nas empresasmultinacionaisque imprimiram transformações à economiamundial.
Nas economias industrializadas, a queda da demanda somada aoelevado desemprego resultou em aumento da capacidade ociosa e do custofixo e, por conseqüência, de níveis maiores de estoque e do índice de preços.A ação da política econômica não conseguiu evitar o colapso do modelo, e acrise econômica, que se manifesta também no âmbito social e político eminúmeros países, passa a exigir uma nova atuação do Estado e dos demaisatores sociais de cada economia.
A imposição ao final do ciclo, pelo padrão tecnológico vigente, dasobreutilização do uso dos recursos energéticos e matérias-primas aliadas auma demanda crescente, resultou em elevação dos preços relativos e uma ondade especulação no comércio internacional. A exaustão da internacionalizaçãodas grandes empresas teve no choque do petróleo o estopim de uma criseestrutural cujos resultados imediatos foram uma queda dos investimentos,aceleração inflacionária e crise energética.
A crise afeta o desenvolvimento econômico liderado pelos paísescapitalistas avançados bem como uma estrutura organizacional e uma basetécnica que foram incapazes de adequar-se para assegurar a manutenção deuma tendência de crescimento até então apresentada pelos indicadores dedesempenho econômico. A base técnica do modelo de desenvolvimentocapitalista, até então, esteve alicerçada nas inovações ocorridas nas áreas deeletricidade, química, fundição do aço e também nos métodos de organizaçãodo trabalho baseado no método de administração científico denominadotaylorismo, em homenagem a seu criador, FredericW. Taylor.
O padrão tecnológico e a produção em massa fundaram as bases paraa obtenção de ganhos de produtividade, ou seja, do aumento da produçãofísica por trabalhador, e de redução dos custos unitários de produção pelasempresas industriais, determinando patamares de indicadores de desempenhoque irão balizar a competência das empresas no mercado.
A crise manifesta-se quando da impossibilidade (técnica eorganizacional) de manutenção (ou ampliação) dos indicadores de
desempenho, tais como custos, produtividade do capital e trabalho, obtidosno passado. Neste momento, a competência do desenvolvimento capitalistano sentido de apropriação de lucros crescentes dos investimentos realizadosé questionada, forçando a adoção de um novo padrão tecnológico que permitarecriar as condições de valorização do capital.
Os empresários, para diminuir o custo médio de produção, irão cortar oscustos de mão-de-obra para disporem de recursos financeiros necessários aosnovos investimentos destinadas a repor maquinário, adquirir distintas máquinase equipamentos e introduzir tecnologias de processos e produtos, capazes deaumentar as condições de competitividade para enfrentar a acirrada concorrência.
A rigidez do sistema de produção das empresas, estruturado paraproduzir produtos padronizados e obter economias de escala (produção debens em grandes quantidades para reduzir custos unitários), mostrava-seincapaz de responder à crise manifestada.
As críticas aos conceitos e práticas gerenciais do modelo taylorista, aolongo dos anos de 1980, contrapunham-se à defesa do modelo de gestão�japonês�. As maiores críticas dirigiam-se às empresas norte-americanasenfatizando as estratégias implementadas, o atraso tecnológico e as inadequadasformas de cooperação entre as empresas.
2 A emergência do novo paradigmatecnológico, organizacional e produtivonos anos de 1990 na economia mundial
Na década de 1980 ocorre uma aceleração das mudanças tecnológicasnos países desenvolvidos, lideradas pelas tecnologias de informação(microeletrônica, computação e telecomunicações), com impacto nas estruturasindustriais. Além disso, a integração dos mercados financeiros e de capitais,possível com o fim das restrições à entrada do capital financeiro internacionalaos mercados nacionais, desemboca na chamada globalização financeira. Ainovações tecnológicas e a globalização financeira são indicativos dastransformações verificadas a partir dos anos de 1980 que irão impactar sobrea economia mundial, em particular nos países em desenvolvimento.
O resultado foi a emergência de umambientemais competitivo, tornandoas inovações um elemento estratégico central na busca da competitividade dasempresas. A expansão das redes de cooperação tecnológica, entre as empresasdos países capitalistas, foi uma das respostas para enfrentar o ambientecompetitivo na premência de incorporação e desenvolvimento de tecnologias,
estabelecendo mudanças nas formas de inter-relacionamento entre as grandesempresas. Outro movimento correlato foi à ampliação das fusões e aquisiçõesvisando a concentração (ou ampliação) dos recursos para desenvolvimento detecnologias. As fusões, que representam a união de duas ou mais empresasformando uma única empresa, permitem o fortalecimento das empresas paraenfrentarem a concorrência, ampliando omontante de recursos para realizaçãode pesquisa e desenvolvimento e tambémumamelhoria da produtividade comaredução dos custos.
A entrada de novas empresas nos mercados agora mais dinâmicos,porque formados por empresas detentoras e geradoras de tecnologiaspioneiras, tornou-se difícil, dado o conjunto de obstáculos ao ingresso defirmas isoladas de menor porte produtivo, financeiro e tecnológico. O núcleodinâmico é formado pelas seguintes indústrias: automotiva, aeronáutica,farmacêutico-química, eletrônica de bens de consumo,material elétrico pesado,autopeças, metais não-ferrosos, minerais não-metálicos e bens de capital porencomenda e seriados.
As políticas empresariais tornam-se concentradas nas matrizes dosgrandes grupos, pois, graças a telemática, a gestão empresarial pode ser online, ou seja, a empresa matriz pode rapidamente informar e implementar umamudança de gestão nas empresas filiais localizadas nos diferentes continentesmundiais. Desta forma, atividades de suprimentos, pesquisa edesenvolvimento, armazenagem, transporte, produção de peças, produção decomponentes e subcomponentes, conjuntos, sistemas complexos podem serimplementados em vários países, mas sob controle centralizado.
A cooperação para a retomada do crescimento e a estabilizaçãoeconômica verificada entre os países centrais nos anos de 1980 criaramcondições para um novo ciclo de investimento capaz de alavancar essaseconomias. Os investimentos provocaram um forte impacto nessas economias,quando as modernas tecnologias são adotadas por inúmeras empresasindustriais nos ramos considerados dinâmicos citados anteriormente.
No mundo industrializado as condições para a emergência desseprocesso se fazem presente quando há um amplo e crescente uso das novastecnologias, cuja oferta é capaz de atender à demanda acelerada. A utilizaçãoda tecnologia causa redução dos custos em várias etapas do processo deprodução e aumenta a produtividade do trabalho humano.
As empresas dos paísesdesenvolvidos lideraram o
processo de reestruturação daprodução, determinando novospadrões de concorrência nomercado internacional
Os novos processos de produção, ao contrário dos processos anteriores,tornam-se independentes da produção de grandes lotes para serem viáveis. Istoserá possível porque certos tipos de produtos, comobens de capitais não seriados,passaram a ser produzidos a um custo mais baixo, face ao uso de máquinas decomando numérico, que viabiliza a produção em pequenas quantidades.
A exigência do processo tecnológico produtivo mais avançado requerumamão-de-obramais qualificada.O critério �mão-de-obra barata e abundante�não se traduz em melhores resultados no mundo produtivo contemporâneo.Coma introdução da programação flexível, é preciso umamão-de-obra capaz deoperar e reprogramar os ajustes nos processos fabris, bemcomoque compreendao processo produtivo em sua totalidade.
Atualmente amplia-se a necessidade de investir nos denominadosintangíveis (software aplicado, capacitação da mão-de-obra, coordenação deprocessos, desenho e conexões das diferentes áreas da empresa) que possatraduzir-se em vantagens competitivas para as empresas. Desta forma, o velhomodelode trabalho fragmentado, repetitivo, nãocriativo, cede lugar aumprocessode organizaçãodo trabalho e da produção, emqueo conhecimento, a organizaçãoe a criatividade tornam-se fundamentais.
As empresas dos países desenvolvidos têm montado redes internascomputadorizadas para centralizar vendas, produção,marketing, produção, alémde estabelecer umdistinto padrão de relacionamento com fornecedores, clientese prestadores de serviços. Em parcerias com as universidades e centros depesquisa e tecnologia são desenvolvidas inúmeras pesquisas paramelhoramentoe criação de produtos e processos.
As grandes empresasmultinacionais, nos últimos anos, implementaramuma série de alianças tecnológicas, inclusive entre suas concorrentes. Essasalianças foram consubstanciadas através de acordos de cooperação produtiva,de desenvolvimento conjunto de produtos e processos com propósitosespecíficos, fortalecendo as suas competências.
Para os países centrais, a reestruturação produtiva e tecnológica nãoocorreu apenas coma atuação domercado e nemcompolíticas públicas passivas.OexemplodaAlemanhaque em1982, comonovogoverno, registra umaatuaçãocoordenadora e indutora do Estado e o empenho governamental foi específicoe direcionado para que o país reconquistasse sua capacidade produtiva.
A ação governamental na Alemanha possibilitou uma inserçãosoberana no contexto internacional encabeçando o projeto europeu demodernização das empresas dos países pertencentes à Comunidade Européia.O resultado desta política de competitividade foi um círculo virtuoso decrescimento alemão, que foi capaz de suportar a concorrência japonesa eamericana no cenáriomundial.
3 Os impactos da abertura comercial e daestabilização da economia brasileira nos anos 90
Aeconomia brasileira, enquanto economia periférica aodesenvolvimentocapitalistamundial, até a década de 1980 conseguiu avançar no seu processo deindustrialização apresentando um parque industrial com empresas produtorasde bens de capital e de insumos modernos, além das produtoras de bens deconsumo durável e não durável.
A instabilidademacroeconômicamarca operíodo seguinte que se estendeaté meados de 1994. A crise da dívida externa, impedindo o acesso a novaslinhas de crédito, a deterioração das finanças públicas e a conseqüente inflaçãoorientaram a implementação de políticas de ajuste impedindo que as empresasrealizassemumefetivo alinhamento àsmudanças organizacionais e tecnológicasdominantes no cenário econômico mundial. A prioridade das empresas será aadoção de estratégias defensivas, e de curto prazo, para enfrentar um cenáriomarcado pelo encarecimento e redução do crédito, contenção da demanda,congelamentos de preços, reformasmonetárias,mudanças de regras contratuais,entre outros quemarcam a economia brasileira nos anos de 1980 até o início dosanos de 1990. O contexto impede um esforço de desenvolvimento científico etecnológico alinhando-se ao que ocorre em termos mundiais.
Alémdisso, aPolítica Industrial e deComércioExterior (PICE) inauguradacom o Governo Collor a partir de 1990, pressiona para uma adequação dasorganizações em curto período de tempo. O fulcro da nova política industrialpassa a ser questão da competitividade que se torna indicadora do objetivoempresarial a ser perseguido. Apesar da política industrial do Presidente Collorser alicerçada emumapolítica de concorrência e umapolítica de competitividade,a primeira tornou-se mais efetiva com o processo de redução dos impostosincidentes sobre os bens importados, destacando-se pela desmontagem dosistema de proteção e de incentivos construídos nas décadas anteriores.
O ajuste realizado pelas empresas para fazer frente à política industrialsignificou reestruturações dos processos produtivos, pois estas são direcionadasparapriorizar as atividades internas emqueas empresas sãocompetitivas, eliminaras atividades até então realizadas e consideradas subsidiárias (terceirização),
A abertura do mercado brasileiro e avalorização do real foram condicionantesdo êxito do Plano Real, ou seja, para ocombate à inflação ao aumentarem aquantidade e reduzirem os preços dosbens importados, respectivamente
implementar programas visando àmelhoria de qualidade etc.Apalavra de ordemera a busca de aumento da produtividade, obtida, nesta primeira etapa, com aredução de custos e a maior racionalização da produção.
Ao fatode as indústrias, noperíodo, utilizaremequipamentos e instalaçõesdefasados, além da deficiência de suas tecnologias de processo e produto,somou-se às deficiências da infra-estrutura em especial nos segmentos deenergia, transportes e telecomunicações, atrasando a adoção do novo padrãotecnológico e organizacional vigente nas economias desenvolvidas. O longoperíodo de ajuste da economia brasileira também resultou emumestado incapazdearticular e fomentar umabasedeapoio aoavançodacompetitividade industrial,pelo peso, em suas finanças, dos encargos da dívida externa e dívida interna etambém das deficiências de seu aparato administrativo.
As medidas implementadas, porém, não atingiram as deficiências dosistema empresarial e nem alteraram a estrutura industrial brasileira. Ainda nãohá estudos conclusivos sobre o impacto da liberação comercial na participaçãoda indústria na produção total da economia e na estrutura industrial, pois nãoforam registradas queda efetiva da participação da indústria no produto total ea estrutura industrial não sofreu significativasmudanças,mantendo, em realidade,uma certa estabilidade. O destaque da estrutura industrial foi o crescimento docomplexo automotivo, setor favorecido pela política industrial das décadasanteriores, e perda da participação do segmento produtor de bens de capital.
A liberação comercial também foi fundamental para a queda da inflaçãoobtida comoPlanoReal em1994, pois a ampliação da oferta de bens importadosimpediu movimentos de alta dos preços. Além disso, a valorização do real emrelação às moedas estrangeiras, em particular ao dólar, no período de julho de1994 a janeiro de 1999, ampliou o impacto competitivo da liberação comercial,pois reduziu os preços dos bens importados.
Além da abertura comercial, outros fatores vinculados à situaçãomacroeconômica também afetaram as decisões produtivas e de investimentoindustrial na década de 1990, entre eles: a manutenção de elevadas taxas dejuros internas, as oscilações do nível de atividade econômica e a elevação dacarga tributária advindos, em particular, da elevação da tributação cumulativacomo o PIS, CPMF e Cofins.
O perfil industrial ao final dos anos de 1990 caracterizou-se pelosseguintes aspectos: as empresas multinacionais aumentaram sua participaçãonos setores de alimentos, eletrodomésticos e autopeças; preponderância naestrutura industrial, como no passado, das indústrias produtoras de bens de
consumo duráveis e de bens intermediários, pois foram os segmentos queobtiveram os maiores ganhos de competitividade, bem como foram osdominantes em termos de introdução de novas técnicas visando qualidade eprodutividade; a estrutura industrial não foi alterada e nem da pauta deexportações de bens industrializados; a desindustrialização, prevista com aabertura comercial, não ocorreu na magnitude preconizada ficando restrita aalguns segmentos como o produtor de bens de capital.
4 Os desafios da inserção competitiva daindústria brasileira no mercado mundial
Após a consolidação da estrutura superior da pirâmide industrial nosanos de 1970, objetivo já presente no Plano deMetas de Juscelino Kubitschek(1955-1960), oBrasil, no início dos anos de 1980, se depara comuma economiamundial transformada, em vários aspectos.
As mudanças tecnológicas, produtivas e organizacionais aliadas aosefeitos da abertura comercial e da relativa estabilização dos preços, resultaramna exposição do tecido econômico nacional frente à concorrência externa. Asmudanças no papel do Estado, das instituições tradicionais de fomento e daforma como os organismos empresariais e financeiros atuam não têm gerado oresultado necessário para que o país recupere a sua capacidade de crescer.Com poucas exceções, a indústria brasileira ainda não estabeleceu uma sólidabase em capacitação e inovação tecnológica que venha a refletir em alteraçãosignificativa na pauta de exportação e importação.
Os resultados positivos na balança de comércio (de 2001 até 2002) sãofruto muito mais da compressão das importações, advinda da desaceleraçãoeconômica, do que do incremento das exportações. A insuficiente capacitaçãotecnológica das empresas brasileiras, notadamente as de capital local, ao nãodesenvolverem emmaior quantidade e qualidade novos processos tecnológicose produtos, aliada à ausência de uma política industrial para a inovação ecompetitividade, constituem-se em entraves ao desenvolvimento nacional.
O saldo do período inflacionário, agravado por uma substancial reduçãono volume e na qualidade do investimento público e privado nos últimos vinteanos, não contribuiu para que o país tirasse maior proveito da aberturaeconômica dos anos de 1990.
Nas economias desenvolvidas registra-se a diminuição da participaçãoda indústria na composição do Produto Interno Bruto. No entanto, nessesmesmos países, é crescente a participação dos setores de alta tecnologia dovalor adicionado do setor industrial, inclusive com a entrada de pequenas emédias empresas organizacionalmente avançadas. Nesses países, as políticasde competitividade para indústria são estruturadas para alavancar toda a cadeiade valor e uma das formas de realizar esse processo é o desenvolvimento deagrupamento de empresas conhecido por clusters industriais.Opapel do governotem sido ativo ao induzir, coordenar e aglutinar esforços para que acompetitividade tenha a maior capilaridade possível, incluindo as pequenas emédias empresas. Exemplo disso são as aglomerações industriais, denominadasde cluster, de pequenas e médias empresas na Itália, Alemanha e EUA.
Quais são os desafios a serem enfrentados pela indústria brasileira?São vários, passíveis de serem alcançados a médio e longo prazo, desde quesejam buscados no mais breve tempo possível. Podemos considerar quatrocomo os mais importantes para o contexto atual.
Inicialmente deve ser destacado que segmentos líderes do crescimentoeconômico industrial com grande impacto não só na indústria, mas naagricultura e setor de serviços, são: informática, biotecnologia,telecomunicações, eletrônica, mecatrônica, novos materiais, aços especiais eoutros. São setores intensivos em conhecimento e informação, recursos tãoou mais importantes que o capital.
Em segundo lugar, destacam-se a formação e a capacitação de recursoshumanos necessários para transferir, criar, adaptar, desenvolver e aplicartecnologia, de forma a reduzir a dependência tecnológica e financeira que opaís tem frente ao exterior. Cabe aqui destacar o papel relevante a serdesempenhado por um competente Sistema Nacional de Inovações, em que ajunção dos recursos e ações pública e privada pode acelerar a capacitação daforça de trabalho para atuar na sociedade de conhecimento e da informação. A
Amelhoria da competitividade econômicae o aumento das exportações devem serincentivados como alternativas, entreoutras medidas, para a retomada docrescimento da economia brasileira
produtividade e a inovação também podem ser incrementadas nos setores deatividades consideradas tradicionais, possibilitando, inclusive, a produçãointerna de muitas importações.
Em terceiro lugar, aparece a formação de cadeias produtivas maiscompletas, em que a especialização produtiva contribuiria para o aumento daoferta interna de bens e serviços commaior qualidade emenor preço. As redesde empresas e os diversos arranjos produtivos locais estruturados, capazesde aumentar o grau de modernização, notadamente nas pequenas e médiasempresas, configuram-se como instrumentos de aumento de competitividade,sendo um dos mecanismos de incremento de produtividade e de remuneraçãomais adequada à força de trabalho mais bem qualificada.
Por último, amaior participação domercado externo requer uma posturamais ativa do setor público e da classe empresarial. O denominado custo-Brasil,que são os custos ou despesas de produção que dificultam as exportaçõesencarecendo os produtos quando comparados com os produtos importados,não é somente de responsabilidade do governo, pois 50%desse custo é derivadoda burocracia estatal, do emaranhado de leis, decretos, portarias e editais; osoutros 50%, porém, advémdas empresas privadas. Realizar a reforma tributária,que desonere a produção, também é uma iniciativa importante, pois parte damelhoria do grau de competitividade está dependendo dessa mudança.
Reduzir o desperdício e evitar retrabalhos são atividades que nãodependem de ações do setor público. Há que se tomar medidas ativas, nãoapenas visando, no curto prazo, a reduzir os custos e o grau de endividamento,mas também estruturar e preparar a empresa brasileira para crescer, e buscarnovas oportunidades de mercado, pois a lição das estratégias defensivas e decurto prazo, adotadas nos últimos vinte anos, resultaram emdesnacionalização,perda de competitividade e encolhimento da empresa nacional. Buscar ocrescimento sustentado é o grande desafio, pois um país que pretende sermoderno e respeitado no âmbito internacional não pode prescindir de umaatividade industrial significativa e eficiente.
A ECONOMIA BRASILEIRA SOB O GOVERNO LULA: RESULTADOS E CONTRADIÇÕES.
A economia brasileira passou por um longo processo de estagnação e inflação
durante os anos 80 decorrente da crise da dívida externa que se abateu sobre todos os
países endividados, em especial os da América Latina. Essa crise se manifestou através
de um agudo processo inflacionário que chegou a 2.012,6% em 1989 e 2.851,3% em
1993, estimados pelo índice geral de preços (IGP-DI) da Fundação Getúlio Vargas1.
Assim, a segunda metade da década de 80 e a primeira da de 90 foi marcada por
sucessivos planos de combate à inflação, que se iniciou com o Plano Cruzado em 1986 e
foi concluído, finalmente, em 1994, com o Plano Real2. Esse período foi marcado,
também, pelo esgotamento final do processo de industrialização conhecido como “de
substituição de importações”, e pelo início da adoção das políticas neoliberais no Brasil.
A última tentativa importante de continuidade da construção de uma economia
industrial integrada e relativamente independente das grandes potências econômicas foi
o ambicioso II Plano Nacional de Desenvolvimento, ainda no governo do General
Ernesto Geisel que terminou em 1979, ano que marca o início da crise da dívida3. Após
o II PND, os sucessivos governos enfrentam-se, por um lado, com a pressão externa
decorrente dos vultosos pagamentos de juros e amortização da dívida e, por outro, no
front interno, com a aceleração da pressão inflacionária. A economia passa, então, a ser
redirecionada no sentido de ampliar o esforço exportador visando obter as divisas
necessárias ao pagamento dos serviços da dívida. Em 1981 o saldo da balança
comercial, que até então era negativo, torna-se positivo e cresce continuamente até
1994, quando volta a ser negativo. A média desse saldo nesses 14 anos supera os US$
10,0 bilhões ao ano e todo ele é destinado ao pagamento dos juros da dívida externa. ∗ Fabrício Augusto de Oliveira, Doutor em economia, professor do curso de mestrado da Fundação João Pinheiro. Email: fabricioaugusto@hotmail.com. ∗∗ Paulo Nakatani, Doutor em economia, professor do Departamento de Economia e do Programa de Pós-Graduação em Política Social da Universidade Federal do Espírito Santo. Email: pnakatani@uol.com.br. 1 IPEADATA. http://www.ipeadata.gov.br/ipeaweb.dll/ipeadata?70563390. 2 MARQUES, Rosa e REGO, José Márcio (Org.). Economia Brasileira. São Paulo: Saraiva, 2000. Partes 4 e 5.
Esse esforço transformou-se em um círculo vicioso infernal em que o governo,
por um lado, estimulava as exportações e, por outro lado, comprava os dólares. A
produção para exportação gerava produto e renda, em que o primeiro era exportado e a
renda permanecia internamente. O resultado das exportações, as divisas, era adquirido
pelo governo através da emissão de moeda e devolvido ao exterior pelo pagamento do
serviço da dívida, e parte dessa emissão não era compensada pelo endividamento
interno devido ao ambiente extremamente instável decorrente das pressões
inflacionárias, que foram tornando-se incontroláveis. O resultado acumulado desse
processo, durante quase uma década, culminou com os surtos hiperinflacionários de
1989 e 1993, que felizmente não produziram integralmente os desastres típicos desse
fenômeno.
A crise aguda que se desenrolou no início dos anos 80 foi acompanhada pelas
grandes manifestações contra a ditadura militar e pelas eleições diretas para a
presidência da república. Com a queda da ditadura e o novo governo civil, a economia
recupera por pouco tempo as taxas de crescimento, mas não escapa do sufoco da dívida
e nem das pressões inflacionárias, que aguçam ainda mais as contradições internas. É
também neste contexto, de luta contra a ditadura militar, entre o final dos anos 70 e o
início dos anos 80, que surge e se expande o movimento sindical dos operários da
indústria paulista e o Partido dos Trabalhadores, cujo líder principal é Luís Inácio Lula
da Silva. Durante os anos 80 e 90, o PT ganha corpo, estrutura e significativo peso
político nacional, com centenas de milhares de filiados e militantes, tornando-se a
principal força política de oposição aos governos de José Sarney, Fernando Collor de
Mello, Itamar Franco e de Fernando Henrique Cardoso (FHC).
Assim, logo na primeira eleição direta à presidência da república, após a
ditadura militar, Lula venceu o primeiro turno e caminhava para uma vitória no
segundo. Entretanto, as classes dominantes retomaram rapidamente a iniciativa e
iniciaram uma ampla ofensiva contra ele, na qual utilizou sem limites as redes de
televisão, principalmente a rede globo de televisão. Dessa forma, elegeu Fernando
Collor de Mello, candidato de um partido minúsculo e politicamente inexpressivo, que
acabou renunciando em dezembro de 1992, para não ser cassado, sob acusações de
corrupção e desvio de recursos públicos. Lula ainda foi candidato em 1993 e em 1998 e
perdeu para Fernando Henrique Cardoso nas duas eleições. Nesse processo, a fração
3 O impacto da crise da dívida externa brasileira foi agravada pela conversão da dívida privada externa em dívida pública, permitida pela Resolução 432/77 do Conselho Monetário Nacional.
majoritária, dirigente do PT, foi mudando gradativamente de posição e de estratégia
eleitoral4, até a vitória de Lula em 2002.
Durante esse período são gestadas as condições e adotadas as medidas de
política econômica neoliberal, assim, o governo implementa progressivamente a
liberalização do comércio internacional, dos fluxos de capitais especulativos, a
privatização das empresas estatais, a reforma do estado, a reforma tributária e a reforma
da previdência do setor privado5. Em junho de 1994, ainda durante o governo de Itamar
Franco, o Ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso comanda a execução do
Plano Real que consegue controlar o processo inflacionário e reduzir a inflação a níveis
muito baixos, com isso consegue eleger-se presidente da república por dois mandatos
consecutivos.
2. O DESEMPENHO ECONÔMICO: O SUCESSO NOS FUNDAMENTOS.
O Plano Real6 foi implantado em junho de 1994. Seu principal resultado foi a
drástica redução da inflação, entretanto, sua concepção baseada em uma taxa de câmbio
semi-fixa e supervalorizada, taxas de juros elevadas e forte ingresso de capitais
estrangeiros, principalmente especulativo, estabeleceram seus próprios limites. As
contradições internas desse plano aceleraram rapidamente o endividamento interno e
externo, transformou o saldo positivo na balança comercial em déficit e aumentou o
saldo negativo em transações corrente. Em conseqüência, o aumento da vulnerabilidade
externa e as crises financeiras internacionais levaram-no ao colapso em fins de 19987.
A reformulação da política macroeconômica foi baseada em três pontos: a
implementação da política de metas de inflação, a mudança no regime cambial com taxa
flutuante e as metas de superávit primário. São esses os novos elementos introduzidos
4 Encontramos uma análise detalhada desse processo em: NETO, João Machado Borges. Um governo contraditório. Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política, no. 12, junho 2003. p. 7-27. 5 Não detalharemos esses pontos. Sobre essas questões em geral, ver FILGUEIRAS (2000). Sobre as privatizações, ver, BIONDI, Aloysio. O Brasil privatizado. Um balanço do desmonte do Estado. São Paulo: Perseu Abramo, 1999; sobre a reforma da previdência, MARQUES, Rosa.... 6 FILGUEIRAS, Luiz. História do Plano Real. São Paulo: Boitempo, 2000. 7 Para assegurar a vitória de Fernando Henrique Cardoso contra Lula, o FMI e a comunidade financeira internacional organizaram um gigantesco empréstimo de US$ 41,6 bilhões ao Brasil. Desse total, US$ 18,1 bilhões do próprio Fundo, mais de 600% da cota do Brasil, US$ 9,0 bilhões do Banco Mundial e do BID e US$ 14,5 bilhões dos Estados Unidos, Japão e Canadá.
na política econômica pelo governo de FHC e que são mantidos e aprofundados pelo
governo Lula8.
Tabela 2.1
Os resultados da política de metas de inflação
Anos Meta CMN Tolerância em pontos percentuais
Limite superior da
Meta
SELIC em dezembro IPCA
1999 8,00 2,0 10,0 19,00 8,94 2000 6,00 2,0 8,0 15,75 5,97 2001 4,00 2,0 6,0 19,00 7,67 2002 3,50 2,0 5,5 25,00 12,53 2003 4,00 2,5 6,5 16,50 9,30 2004 5,50 2,5 8,0 17,75 7,60 2005 4,50 2,5 7,0 18,00 5,69
Fonte: Bacen. Boletim do Banco Central do Brasil. Vários números.
Em março de 1999, foi implementado o sistema de metas de inflação no Brasil
com a utilização do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) como meta e a
substituição das Taxa Básica do Banco Central (TBAN) e Taxa de Assistência do Banco
Central (TBC) por uma única taxa chamada de SELIC. Naquele momento, a taxa básica
foi fixada em 45,0% ao ano, mas foi caindo rapidamente terminando o ano a 19,0%,
para uma inflação, estimada pelo IPCA, de apenas 8,94%, em 1999.
Considerando mais rigorosamente a meta de inflação, sem as tolerâncias, ela foi
cumprida em um único ano, segundo se observa na tabela 2.1. Considerando as
tolerâncias, as metas não foram cumpridas em 2001, 2002 e 2003 e não seriam
cumpridas nos dois anos seguintes se o governo não tivesse aumentado novamente as
metas e as tolerâncias além de manter as taxas básicas de juros a níveis elevadíssimos.
A média da taxa Selic anualizada considerando 252 dias úteis, em 2004, foi de 16,24% e
de 19,12%, em 2005, para uma inflação de 7,6% e 5,69%, respectivamente. Entretanto,
como o objetivo da política de metas de inflação é o controle inflacionário, pode-se
concluir que esse objetivo foi muito bem alcançado e o IPCA deve cair para menos de
5,0% em 2006. Além disso, a combinação de elevadas taxas de juros com uma inflação
em declínio conduz a um aumento da taxa real de juros, que serve de base para a
formação de toda a estrutura de juros da economia, em especial a taxa que incide sobre
a dívida mobiliária federal. Esse mecanismo produz polpudos lucros para as instituições
bancárias e financeiras, como os observados nos últimos anos9.
8 As demais medidas neoliberais, como as reformas tributária e da previdência, a privatização, a lei de falências e a liberação comercial e financeira continuam sendo impulsionadas pelo novo governo. 9 “Os balanços recém divulgados indicam um crescimento excepcional do lucro dos bancos em 2005. O lucro líquido dos principais bancos do país – Banco do Brasil (BB), Caixa Econômica Federal (CEF),
A mudança na política cambial e o aprofundamento dos benefícios concedidos
ao capital externo10, associado ao crescimento acelerado das exportações devido à
conjuntura internacional favorável dos últimos anos, permitiram que o Governo Lula
conseguisse uma significativa redução na vulnerabilidade externa. À primeira vista,
todos os indicadores apresentados na tabela 2.2 são extremamente positivos, entretanto,
nem tudo pode ser interpretado como resultado direto da política econômica.
Tabela 2.2
Indicadores de vulnerabilidade externa Indicadores 2000 2001 2002 2003 2004 2005
Dívida externa total/PIB (%) 36,02 41,18 45,87 42,41 33,29 21,28 Dívida externa total líquida/PIB (%) 28,41 31,92 35,88 29,79 22,43 12,69 Dívida externa total/Exportações (razão) 393,79 360,57 349,08 294,09 208,73 143,23 Dívida externa total líquida/Exportações (razão) 310,57 279,45 273,08 206,60 140,66 85,44 Serviço da dívida/PIB (%) 8,15 10,35 10,09 8,37 8,03 6,11 Serviço da dívida/Exportações (%) 89,08 90,64 76,80 58,07 50,32 41,14 Juros pagos ao exterior/PIB (%) 2,84 3,46 3,33 3,02 2,53 1,97 Juros pagos ao exterior/Exportações (%) 31,04 30,26 25,31 20,97 15,85 13,28 Transações correntes/PIB (%) -4,02 -4,55 -1,66 0,82 1,94 1,78 Transações correntes/Exportações (%) -43,98 -39,87 -12,65 5,72 12,14 12,00 Reservas internacionais/Dívida externa total (%) 15,22 17,08 17,95 22,94 26,29 31,75 Reservas internacionais/Serviço da dívida (razão) 67,27 67,96 81,59 116,15 109,03 110,55 Fonte: Bacen. Boletim do Banco Central do Brasil. Vários números.
A dívida externa total representava 45,87% do PIB, no final do governo FHC, e
caiu para 21,28% em dezembro de 2005, uma redução de mais de 50%, enquanto a
dívida total diminuiu 19,55% e o PIB cresceu a uma taxa média real de apenas 2,6% ao
ano. Esse fenômeno pode ser explicado pela forte desvalorização do real frente ao dólar,
principalmente pelo ataque especulativo em 2002. Com isso, a taxa média de câmbio
para a conversão do PIB aumenta até 2002 e passa a declinar a partir daí, depois que o
governo assegura o mercado financeiro de que continuará a mesma política
macroeconômica. O resultado foi uma forte queda do PIB avaliado em dólares, entre
2000 e 2002 e o contrário até 2005. Além disso, nem toda a dívida amortizada foi do
setor público, este reduziu a sua parcela de US$ 110,4 bilhões para US$ 87,6 bilhões e o
setor privado, de US$ 100,3 bilhões para US$ 81,9 bilhões entre 2002 e 2005.
Se observarmos com mais cuidado a relação entre os juros pagos ao exterior e o
PIB vemos que esse coeficiente aumentou de 8,15% em 2000, para 3,33% em 2002 e
Bradesco, Itaú e Unibanco – registrou um expressivo crescimento de 49,9%, somando R$ 18,8 bilhões” (DIEESE, 2006). 10 Em 15 de fevereiro de 2006, o Presidente Lula assinou a Medida Provisória 281, que isentou do Imposto de Renda e da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira o capital estrangeiro aplicados em títulos públicos. Ver também, ASSIS, J. Carlos de. Isenção de imposto para especulador estrangeiro. http://www.desempregozero.org.br/editoriais/insencao_de_imposto.php.
caiu para 1,97% do PIB, em 2005. Entretanto, o total de juros pagos em 2000 foi de
US$ 17,1 bilhões, de US$ 15,3 bilhões em 2002 e de US$ 15,7 bilhões em 2005.
Os indicadores mais impressionantes do sucesso do governo na construção de
seus fundamentos são as relações entre o saldo em transações correntes e o PIB, e o
mesmo saldo e as exportações. Ambos passaram de negativos para positivos entre os
três últimos anos de governo de FHC e os três primeiros de Lula. O primeiro coeficiente
sofre o mesmo problema de conversão cambial analisado anteriormente, mas um de
seus componentes, a conta de rendas, não só é negativo, como cresce bastante no
período, atingindo US$ 34,1 bilhões negativos em 2005.
O governo Lula continuou e aprofundou a política de geração de superávits
primários. Primeiro, aumento a meta de 3,75%, segundo o acordo com o FMI, para
4,25% do PIB. Enquanto o governo FHC atingiu 3,89%, em 2002, Lula conseguiu
superar a própria meta, realizando 4,59% e 4,85%, em 2004 e 2005. Entretanto, a conta
de juros foi de 7,26% e 8,13% do PIB, nos mesmos anos.
3. QUANDO OS FUNDAMENTOS NÃO AJUDAM O CRESCIMENTO
Apesar de estar exibindo indicadores financeiros e variáveis econômicas bem
mais favoráveis, de ter reduzido consideravelmente o grau de vulnerabilidade externa da
economia e caminhar bem, na visão do mercado, no ajuste fiscal, o Brasil não tem se
beneficiado dessas condições para os objetivos do crescimento econômico. Em 2005, o
PIB cresceu apenas 2,3%, contra uma expansão de 4,3% registrada para a economia
mundial. Na América Latina, que apresentou média de crescimento em torno da
observada para o mundo, o Brasil só conseguiu melhor resultado do que o Haiti, um
país mergulhado numa guerra civil que paralisou sua economia, para a qual se projetava
expansão inferior a 1,5%. A Argentina, com um índice de crescimento de 9,1% no ano,
a Venezuela, com 9%, e mesmo o México, com 3%, apesar de prejudicado pelos efeitos
dos furacões na sua agricultura no último trimestre, confirmam que o Brasil não está
conseguindo aproveitar a melhoria de seus fundamentos econômicos e nem o cenário
externo favorável para reverter a trajetória de perda de importância relativa de sua
economia em relação tanto ao mundo como à região.
Desde o seu lançamento, em 1994, o programa de estabilização, conhecido como
Plano Real, tem se mostrado inimigo do crescimento econômico. Apenas nos seus dois
primeiros anos de vida – 1994-1995 – o Brasil conseguiu superar a média de
crescimento da economia mundial, como mostra a tabela 3.1. De lá para cá, situou-se
sempre abaixo dessa média, aproximando-se desta apenas nos anos de 2000 e 2004, que
foram marcados por um cenário externo excepcionalmente favorável. Em todos os
demais, apresentou crescimento medíocre ou ficou estagnado como nos anos de 1998,
1999 e 2003.
Tabela 3.1
Taxas de Crescimento do PIB no Brasil e na economia mundial - 1994-2005
Taxa de crescimento do PIB (%) Ano Brasil Economia Mundial
1994 5,9 3,8 1995 4,2 3,6 1996 2,7 4,1 1997 3,3 4,2 1998 0,1 2,8 1999 0,8 3,7 2000 4,4 4,7 2001 1,3 2,4 2002 1,9 3,0 2003 0,5 4,0 2004 4,9 5,1 2005 2,3 4,3
Fonte: CNI. Sem crescer, não há saída. Revista da CNI. São Paulo, CNI, no. 62, abril de 2006, p.16-21
Não há diferenças significativas, neste período, do ponto de vista do
crescimento, entre os governos que comandam o país. Como mostra a tabela 3.2, no
primeiro mandato do governo Fernando Henrique Cardoso (1995-1998), a média de
crescimento anual foi de 2,6%, enquanto no segundo (1999-2002) essa média caiu para
2,1%. Nos três anos do governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva o crescimento
médio alcançou 2,6%, não devendo ser alterado de forma significativa com a expansão
projetada em 3% para 2006. Na média dos últimos dez anos (1996-2005), o crescimento
de apenas 2,2%, que pode ser considerado um nível medíocre para o país superar seus
desequilíbrios, atender as necessidade de emprego da população e melhorar suas
condições de vida.
Tabela 3.2
Brasil: taxas de Crescimento do PIB, por períodos e por governo - 1995-1998
Anos/períodos Governo Taxas de crescimento do PIB (%)
1995-1998 Fernando Henrique Cardoso 2,6 1999-2002 Fernando Henrique Cardoso 2,1
1995-2002 Fernando Henrique Cardoso 2,3 2002-2005 Luiz Inácio Lula da Silva 2,6
2006 – projeção Luiz Inácio Lula da Silva 3,0 1996-2005 FHC e Lula 2,2
Fonte: IBGE
Em favor do governo Fernando Henrique Cardoso pode-se argumentar que este
enfrentou uma série de intempéries econômicas internacionais e internas nos seus dois
mandatos, que prejudicaram os objetivos do crescimento, embora não se possa atribuir
exclusivamente a esses acontecimentos o insucesso de sua política econômica neste
campo. No primeiro, as crises financeiras que se abateram sobre as economias mexicana
(1995), do sudeste asiático (1997) e da Rússia (1998), que conduziram à falência e
desvalorização do Real, em 1999. No segundo, a desaceleração da economia norte-
americana, os ataques terroristas nos EUA (2001), a crise argentina e a crise na oferta de
energia no país, ambas também em 2001. No governo Luiz Inácio Lula da Silva,
contudo, tirante o primeiro ano (2003) em que a desconfiança em sua política
econômica não havia sido desfeita, o Brasil navegou em águas tranqüilas e favoráveis
do cenário internacional e, contando também com o apoio do mercado e das instituições
financeiras internacionais, conseguiu melhorar consideravelmente, como visto na seção
anterior, os indicadores financeiros, fiscais e de risco do país, o que o tem levado a
acenar, desde que assumiu o governo, com a promessa de que ingressaremos num longo
e permanente ciclo de crescimento. Até o momento, contudo, o fato é que, apesar de
todas essas melhorias a economia se encontra com o crescimento travado, sem
perspectivas de vislumbrar, no curto prazo, uma retomada mais forte e firme de seu
ritmo.
Os dados contidos na tabela 3.3 revelam, com maior clareza como, em virtude
dessa performance, o Brasil tem ficado para trás em relação às economias
desenvolvidas, às emergentes e, em boa media, às da América Latina. Nos últimos dez
anos (1996-2005), a média de crescimento de seu PIB per capita foi de apenas 0,7% ao
ano, apenas superior à observada para a Venezuela, que registrou taxa negativa de –
0,5%. Todos os demais países arrolados na tabela apresentaram crescimento superior,
destacando-se a China (7,7%), a Índia (4,4%) e as economias emergentes da Europa,
como a Polônia e a Rússia. Mesmo em relação às economias desenvolvidas, que
convivem com taxas mais modestas de crescimento, o desempenho do Brasil tem sido
pífio, situando-se, em alguns casos, em torno de um terço ou um quarto das que foram
por elas alcançadas. Com isso, não somente tem se ampliado a distância que separa o
país das nações desenvolvidas, em termos de renda per capita, como dele se
aproximam, rapidamente, países como a China e a Índia, que contam com populações
superiores em mais de cinco vezes.
Tabela 3.3
PIB per capita: Taxa média anual de crescimento entre 1996/2005 e Valor em 2004 (em US$), ajustado pela paridade do poder de compra
Países
Grupos País Crescimento médio anual
(1996/2005) (%)
Valor em 2004 (US$ ajustado pela PPP)
Estados Unidos 2,2 39.710 Japão 1,0 30.040 Alemanha 1,2 27.950 Reino Unido 2,4 31.460 França 1,7 29.320 Itália 1,2 27.860
G7
Canadá 2,4 30.660 Austrália 2,4 29.200 Coréia do Sul 3,7 20.400 Espanha 3,1 25.070
Outras economias avançadas
Portugal 1,6 19.250 Emergentes:
China 7,7 5.530 Ásia Índia 4,4 3.100 Polônia 4,1 12.640 Europa Rússia 4,3 9.620
África África do Sul 1,7 10.960 Argentina 0,9 12.460 Brasil 0,7 8.020 Chile 2,8 10.500 México 2,1 9.590
América Latina
Venezuela -0,5 5.760 Fonte. FMI e Banco Mundial. In: CNI Informa - Notas Econômicas. São Paulo, CNI, ano 7, n. 89, 15 de março de 2006.
Ora, se os fundamentos econômicos são, de fato, sólidos como vem sendo
defendido pelo mercado e pelos gestores da política econômica, não se justifica o país
abdicar do crescimento e não aproveitar, também como as demais economias
emergentes, os ventos favoráveis da economia mundial. Afinal, a construção de
fundamentos econômicos sólidos visa exatamente criar as condições para o crescimento
sustentado. A menos que a estabilidade monetária alcançada no país tenha se
transformado em um objetivo em si mesmo ou que estes fundamentos não sejam assim
tão sólidos como se apregoa, o país estaria novamente perdendo a oportunidade de
aproveitar essas condições para avançar na correção de seus desequilíbrios e de muitos
de seus problemas. É o que se discute em seguida.
4. AS TRAVAS DO CRESCIMENTO: O MODELO DE ESTABILIZAÇÃO
Para se entender as razões que têm inibido o crescimento e impedido vôos mais
altos dos governantes brasileiros nessa direção, é necessário lançar um olhar para as
peças que compõem a arquitetura do modelo de estabilização, o Plano Real, desde a sua
implementação em 1994: nele é possível identificar a armadilha em que o país se viu
enredado para garantir a estabilidade monetária, em detrimento do crescimento
econômico.
Em sua primeira fase (1994-1998), o plano, para ser vitorioso no combate à
inflação, valeu-se, na ausência de uma âncora fiscal confiável, da combinação de um
câmbio sobrevalorizado, que cumpriu o papel de âncora nominal dos preços, com a
manutenção de elevadas taxas de juros voltadas para manter desaquecida a demanda
interna e garantir a atração de capitais externos para o país, ao mesmo tempo em que
promoveu uma rápida abertura comercial, visando também obter ganhos no front
inflacionário, embora com prejuízos para a produção nacional.
Com esse mix de medidas, a inflação desfaleceu e caiu para níveis moderados
(entre 5% e 10% ao ano), mas seus resultados foram desastrosos para as contas externas
e para o aumento dos desequilíbrios fiscais do setor público: de um equilíbrio na
balança de conta-corrente obtido em 1994, o país amargou um déficit de US$ 33 bilhões
em 1998 e viu a relação Dívida Líquida do Setor Público/PIB evoluir de 30% para 43%
(treze pontos percentuais do PIB em apenas 4 anos!).
Diante desses números, alguns analistas não têm dúvidas em afirmar que a
estabilidade só foi alcançada à custa de um brutal endividamento, o qual limitaria suas
possibilidades de crescimento nos períodos seguintes11. Com o aumento de sua
vulnerabilidade externa, o país tornou-se altamente sensível ao efeito-contágio das
crises externas, que se abateram sobre a economia mundial a partir da metade da
década de 1990, obrigando-o a promover fortes ajustamentos em sua economia. Com a
crise da economia russa, em 1998, e a rápida fuga de capitais externos do país, não lhe
restou outra alternativa senão a de recorrer ao FMI e sujeitar-se a adotar um novo
modelo de estabilização, que, pela sua arquitetura, se revelaria ainda mais desfavorável
para os objetivos do crescimento.
Na sua segunda fase, que se inicia em 1999 e prossegue até os diais atuais, as
peças do modelo foram ajustadas para estancar e reverter a trajetória de crescimento da
dívida, e assegurar, ao mesmo tempo, a estabilidade de preços. No novo modelo, o
11 Para essa questão, ver Oliveira & Nakatani (2002)
câmbio tornou-se flutuante, a âncora de preços deslocou-se para o regime de metas
inflacionárias estabelecidas pelo Banco Central (inflation targenting) e o compromisso
com a geração de crescentes e elevados superávits fiscais primários foi nele incluído
para garantir uma trajetória mais confiável para a relação dívida/PIB, com o pagamento
de parcela de seus encargos para os credores do Estado.
Eleitas como prioridades absolutas neste modelo, a estabilidade monetária e o
controle da dívida não deixam muito espaço para o crescimento econômico, dada a
interação de suas peças, a não ser em períodos em que a conjuntura internacional se
mostre extremamente favorável, como nos últimos anos. Mesmo neste caso, se a
política econômica não for suficientemente capaz de aproveitar essa oportunidade –
como tem ocorrido no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva -, primando-se
pelo conservadorismo – ou pelo medo de crescer! -, o país continuará fadado a conviver
com baixas e medíocres taxas de crescimento.
O fato de o modelo possuir um forte viés anti-crescimento explica-se por que os
instrumentos que são manejados para viabilizar o atingimento das metas de inflação e
da relação dívida/PIB asfixiam a atividade produtiva e operam contra os investimentos –
públicos e privados -, aumentando o “custo-Brasil” e impedindo a remoção de gargalos
estruturais da economia brasileira, o que é indispensável para a criação das condições
necessárias para o crescimento sustentado.
São três, basicamente, os instrumentos que têm sido utilizados para garantir o
atingimento dessas metas: a taxa de juros, a carga tributária e os gastos públicos.
A manutenção de elevadas taxas de juros reais (atualmente em torno de 11% ao
ano, a mais alta do mundo) inibe o consumo, desestimula o investimentos e, também
importante, garante um acentuado e permanente ingresso de capitais externos na
economia brasileira, em busca de lucros rápidos e fáceis, valorizando a moeda nacional
(o Real) e prejudicando o setor exportador. Embora este ainda venha apresentando um
excelente desempenho, beneficiado pela continuidade do crescimento da economia
mundial, vários setores já enfrentam dificuldades para sustentar suas atividades com a
situação atual do câmbio, como os de calçados, vestuário e até mesmo o
automobilístico, entre outros. Os sinais de que o crescimento da economia mundial pode
se desacelerar nos próximos anos indicam que o Brasil pode enfrentar dificuldades com
um dos poucos setores que ainda tem conseguido garantir algum dinamismo para sua
economia. De quebra, e nem por isso menos importante, as elevadas taxas de juros
contaminam e expandem a dívida pública, exigindo esforços ainda maiores na geração
de superávites primários para evitar seu descontrole.
A elevação da carga tributária, instrumento preferencial que tem sido utilizado
pelo governo, desde 1999, para garantir a geração de superávites primários, aumenta o
“custo-Brasil”, reduz a lucratividade dos investimentos privados e inibe o mercado
interno, ao reduzir a renda disponível da população. Não bastasse a forte elevação que
conheceu nos últimos seis anos – entre 1998 e 2004 a carga tributária brasileira deu um
salto de 29,7% para 35,9% do PIB – sua composição é ainda mais perversa para o
crescimento econômico: contando com cerca de 80% de impostos indiretos em sua
estrutura, o que torna o sistema tributário um forte instrumento de concentração de
renda, cerca de 35% de toda arrecadação provêm de impostos cumulativos, também
como conhecidos impostos “em cascata”, prejudiciais para a tão cara questão da
competitividade no mundo globalizado e para a integração econômica regional.
O terceiro instrumento de que tem lançado mão o governo para garantir a
geração de superávites primários – os cortes de gastos públicos – não alimenta apenas as
forças da recessão, mas impede que o governo realize os investimentos em infra-
estrutura econômica para remover os gargalos estruturais da economia que poderiam
melhorar as expectativas do setor privado e dar um novo impulso aos seus
investimentos, se convencido de que não encontraria rapidamente limites à expansão de
sua capacidade produtiva. Isso porque, com o orçamento público, comprometido com
despesas de caráter obrigatório e com o compromisso de pagamento de parcela
expressiva dos juros da dívida pública, os cortes de gastos têm se centrado,
predominantemente, nos investimentos públicos e em despesas sociais que não contam
com receitas protegidas por alguma norma constitucional ou legal, como se verifica para
os casos dos setores da saúde e da educação, por exemplo. Sem investimentos públicos,
que atualmente estão reduzidos a algo em torno 0,5% do PIB não há como gerar um
estado de confiança indispensável para a retomada dos investimentos privados e para o
crescimento sustentado.
Não sem razão, o Brasil vem apresentando as mais baixas taxas de investimento
no mundo de acordo com levantamento realizado pela Confederação Nacional das
Indústrias (CNI) apresentados na tabela 4.1. Como se percebe na tabela, enquanto se
registrou para a economia mundial uma taxa média de investimento de 22,1% do PIB,
no período 1995/2004, a observada para o Brasil não foi além de 19,3%. Essas
diferenças se tornam ainda mais acentuadas quando se considera esses países por
blocos: as economias emergentes da Ásia investiram, em média, 32,6% ao ano neste
período, seguidos pelos países do Leste e do Centro da Europa, com 23,9%. Apenas em
relação aos resultados atingidos pela América Latina e África, o Brasil apresenta-se
mais próximo, mas, ainda assim, em posição inferior.
Tabela 4.1
Grupos selecionados de países: investimentos em porcentagem do PIB
Grupos de Países Média 1995/2004 2004 Economias Desenvolvidas 21,3 20,6 África 20,0 21,3 Leste e Centro europeu 23,9 24,5 Economias emergentes da Ásia 32,6 35,4 América Latina 20,8 20,4 Brasil 19,3 19,6 Mundo 22,1 21,9 Fonte: FMI e Banco Mundial. In: CNI Informa - Notas Econômicas. São Paulo, CNI, ano 7, n. 89, 15 de março de 2006.
Ora, com baixo nível de investimentos não há como crescer de forma mais
expressiva a longo prazo. E mais grave: sem aumento na capacidade de oferta, qualquer
pressão de demanda dele resultante termina gerando pressões adicionais sobre os
preços, exigindo que a recuperação seja abortada para impedir o comprometimento das
metas de inflação, como ocorreu no Brasil, por exemplo, em 2000 e 2004. Os
instrumentos do modelo, neste caso, terminam sendo acionados e retorna-se ao circulo
vicioso da armadilha da estabilização: elevação dos juros, desaquecimento do consumo,
paralisia dos investimentos, contaminação da dívida pública, aumento do superávit
primário, com mais cortes de gastos e ampliação da carga tributária, produzindo novo
período de baixo crescimento ou de estagnação.
Para o mercado e os responsáveis pela política econômica, a manutenção dessa
estratégia, por tempo prolongado, poderá permitir, ao país, colher os frutos do
crescimento sustentado e compensar os elevados custos impostos à sociedade. É uma
questão de fé, da qual continua se beneficiando – e muito! – o capital financeiro. Para os
críticos deste modelo, sem alterações e mudanças importantes em sua arquitetura, é
mais fácil que produza a “paz dos cemitérios”, com o progressivo enfraquecimento do
tecido econômico, o aumento do desemprego, da pobreza e da exclusão social. Por
enquanto, os resultados dão razão aos últimos: depois de dez anos de baixo crescimento,
não se vislumbra possibilidades de reversão dessa trajetória num futuro próximo,
enquanto o controle da dívida pública, o principal objetivo perseguido com o modelo,
tem se mantido insistentemente em níveis superiores a 50% - e isso sem enfrentar
nenhuma crise externa nos últimos anos.
Os cenários político e ideológico brasileiros, reforçados pela atual crise
capitalista, apontam para um renascimento das teses desenvolvimentistas como uma
saída da condição periférica do nosso país. No plano político, vemos o início de uma
corrida presidencial em torno de candidaturas que se intitulam desenvolvimentistas ou,
pelo menos, se dizem contrárias ao ideário neoliberal. No plano teórico, autores
influentes do pensamento econômico nacional – tal como Luiz Carlos Bresser Pereira –
buscam atualizar as teses desenvolvimentistas para o presente.
Em um passado não muito distante, o marxismo brasileiro (e latino-americano)
desenvolveu uma instigante e consistente linha de crítica às teses desenvolvimentistas.
Esta crítica ganhou ainda mais força com o aparecimento de saídas socialistas para o
impasse da condição periférica e dependente da América Latina e com o esgotamento
histórico que o modelo de substituição de importações – expressão política e econômica
daquelas teses burguesas – sofreu nos anos 1960/70.
A presente comunicação tem como objetivo central resgatar a controvérsia que
envolveu as teses dual-estruturalistas e as teses marxistas sobre o desenvolvimento
desigual e combinado das nações periféricas nos anos 1960/70. Acreditamos que este
resgate pode nos ajudar, feitas as devidas mediações, a entender os atuais rumos das
teorias e da política brasileira e latino-americana. Como hipótese central, apresentamos
o argumento que a categoria analítica do desenvolvimento desigual e combinado é um
conceito-chave da crítica socialista à ideologia desenvolvimentista.
I. O PENSAMENTO ECONÔMICO BRASILEIRO E A HEGEMONIA DESENVOLVIMENTISTA
A bibliografia sobre a história do pensamento econômico (HPE) brasileiro é
formada por poucos títulos; ela é basicamente composta de alguns artigos publicados
• Pesquisador do Laboratório de Estudos Marxistas José Ricardo Tauile (LEMA)/UFRJ, doutorando da ESS/UFRJ e docente do UniFOA. A presente comunicação foi elaborada dentro do projeto de pesquisa O
desenvolvimentismo no Brasil: um estudo sobre o pensamento econômico para o desenvolvimento
nacional, coordenado pela profª Maria Malta (IE/UFRJ, LEMA) e financiado pelo IPEA. O autor agradece a Bruno Borja pelos valiosos comentários, eximindo-o de qualquer responsabilidade sobre o resultado final.
Pensamento econômico e desenvolvimentismo no Brasil
em revistas acadêmicas e coletâneas de artigos e entrevistas1. Os trabalhos mais
significativos, entretanto, são duas teses de doutorado escritas na década de 1980 e que
foram publicadas na forma de livros. Estamos nos referindo às obras A economia
política brasileira, de Guido Mantega (1984) e Pensamento Econômico Brasileiro: o
ciclo ideológico do desenvolvimentismo, de Ricardo Bielschowsky (1988)2.
Bielschowsky desenvolveu sua tese de doutorado na UFRJ durante a década de
1980 sob orientação dos professores Leo Katzen e Carlos Lessa. O seu objeto de
pesquisa era o pensamento econômico brasileiro na era desenvolvimentista. O método
de pesquisa fundamentou-se em um diálogo crítico com a teoria de Schumpeter, que
indica a necessidade do historiador do pensamento econômico dissociar os elementos
analíticos e ideológicos nas obras inventariadas. Bielschowsky não promove tal
dissociação, mas elenca como prioridade dos seus estudos os elementos ideológicos
presentes no pensamento econômico brasileiro.
Durante meio século, desde a Era Vargas até a década de 1980, a corrente
desenvolvimentista, em particular a relacionada aos nacionalistas do setor público,
obteve a hegemonia ideológica dentro do pensamento econômico brasileiro. O livro de
Bielschowsky narra-nos com competência a história dos inúmeros embates políticos e
controvérsias teóricas que levou ao resultado final da vitória desenvolvimentista. Neste
período, tal hegemonia foi tão acentuada que as agendas teóricas e políticas dos liberais
e até mesmo dos socialistas giraram em torno daquele projeto.
Apesar da diversidade de correntes dentro do desenvolvimentismo3, podemos
apontar algumas características básicas do seu consenso ideológico. O grande destaque
analítico da corrente desenvolvimentista é sem dúvida a teoria do subdesenvolvimento
formulada por Celso Furtado a partir dos seus estudos sobre a história das formações
1 Cf. Maria Rita Loureiro (org.), 50 anos de ciência econômica no Brasil: pensamento, instituições e
depoimentos, Petrópolis, Vozes, 1997; Tamás Szmreczanyi e Francisco da Silva Coelho (orgs.), Ensaios
de história do pensamento econômico no Brasil contemporâneo, São Paulo, Atlas, 2007; Ciro Biderman, Luis Felipe Cozac e José Márcio Rego, Conversas com economistas brasileiros, volume I, São Paulo: Editora 34, 1995; Guido Mantega e José Marcio Rego, Conversas com economistas brasileiros, volume
II, São Paulo: Editora 34, 1999. 2 Ricardo Bielschowsky, em parceria com Carlos Mussi, voltou recentemente ao tema e escreveu um longo artigo sobre o pensamento econômico brasileiro, atualizando a sua antiga pesquisa até o ano de 2005. Cf. Ricardo Bielschowsky e Carlos Mussi, O pensamento desenvolvimentista no Brasil: 1930-1964 e anotações sobre 1964-2005, texto apresentado para o seminário Brasil-Chile: uma mirada hacia América Latina y sus perspectivas, Santiago de Chile, junho de 2005. 3 Dentro da era desenvolvimentista, Bielschowsky identifica três grandes correntes ideológicas: a neoliberal (Eugenio Gudin), a socialista (Caio Prado Jr. e Ignácio Rangel) e a desenvolvimentista, sendo esta subdividida em três subcorrentes, a saber, a do setor privado (Roberto Simonsen), a não-nacionalista do setor público (Roberto Campos) e a nacionalista do setor público (Celso Furtado).
econômicas do Brasil e da América Latina e das contribuições de Prebisch acerca do
modelo centro-periferia de economia internacional.
Segundo as formulações de Furtado, o subdesenvolvimento latino-americano
deitava raízes profundas na formação do mercado mundial desde a expansão marítima e
comercial européia. A divisão internacional do trabalho desenvolveu mecanismos de
extração do excedente econômico produzido na periferia e canalizado para o centro,
criando condições estruturais e sistêmicas de assimetria nas relações internacionais. As
forças de mercado, deixadas ao sabor da sua lógica interna, não seriam capazes de
mudar o estado de coisa vigente. Desta forma, a América Latina e, em particular o
Brasil, estariam condenados ao subdesenvolvimento. Seria necessária a firme atuação de
um agente externo ao mercado para o rompimento dos elos de dominação econômica,
política e cultural que ligam a periferia ao centro.
A promoção do desenvolvimento nacional seria resultado de uma política
econômica orquestrada e conduzida pelo Estado, seja atuando diretamente como
produtor de bens e serviços, seja como indutor de investimentos privados. Cabe destacar
que o processo de industrialização e o planejamento estatal não previam o controle total
da economia, como ocorria nas economias centralizadas socialistas. Uma das intenções
era corrigir anomalias, desvios e suprir carências da otimização realizada pelos
mercados. O Estado nacional era, assim, apontado como o agente social de
transformação, preservando-se, todavia, uma autonomia relativa do empresariado.
A ideologia desenvolvimentista ganhou força e se tornou hegemônica quando foi
encampada pela burguesia (e por amplos setores organizados do proletariado) como
arma de combate contra os interesses oligárquicos dos latifundiários agro-exportadores.
Tal burguesia, conjuntamente com setores da burocracia estatal, tomou-a para si e
transformou-a numa ideologia para seus projetos de industrialização e autonomia
nacional. Nas primeiras formulações desenvolvimentistas, a industrialização era tida,
inclusive, como condição suficiente para acabar com a concentração de renda e
reproduzir os índices sociais homogêneos e convergentes do centro aqui na periferia.
A história econômica, social e política da América Latina e a mobilização de
organizações populares atestaram a falsidade (e a ingenuidade) dos desenvolvimentistas.
A industrialização aprofundou, por exemplo, a heterogeneidade social e produtiva na
periferia. A hegemonia burguesa ficou, assim, abalada, abrindo possibilidades de
contestação ao projeto de desenvolvimento periférico pela via do capitalismo autônomo.
Deste modo, apareceram críticas socialistas à ideologia desenvolvimentista.
II. A CRÍTICA MARXISTA AO MITO DO DESENVOLVIMENTO CAPITALISTA
Desde os escritos de Marx e Engels, o marxismo desenvolve uma crítica ao
desenvolvimento econômico sob o comando do capital. Talvez a principal síntese desta
crítica esteja contida no capítulo XXIII de O Capital, intitulado A lei geral da
acumulação capitalista. Neste trecho do livro, o processo de desenvolvimento
econômico é analisado a partir da exploração da força de trabalho, da geração da mais-
valia e da acumulação capitalista. Neste sentido, está explícita a crítica à visão
tradicional dos economistas a respeito do desenvolvimento, entendido como um tema
ligado fundamentalmente a taxas de crescimento do produto interno de um determinado
país, bem como de inversão capitalista, emprego (ou desemprego) dos fatores de
produção e distribuição de renda.
Ainda no mesmo capítulo, Marx descreve de forma precisa os impactos sociais
da acumulação capitalista na classe trabalhadora, resultando na riqueza das classes
proprietárias e no pauperismo (relativo e, em alguns casos, absoluto) dos trabalhadores.
Sob esta perspectiva, Marx entende o desenvolvimento econômico como um mito
fundador do capitalismo, pois seus resultados – alienação, subsunção, dominação e
pauperismo – são sempre desfavoráveis à classe trabalhadora. Em linhas gerais, para
Marx, a acumulação capitalista não pode prover o bem-estar social para a totalidade da
população, mas somente para uma fração. Desta impossibilidade, ele defende a
revolução socialista como sendo a única saída para os trabalhadores construírem uma
sociabilidade que atenda seus interesses próprios enquanto classe social.
Apesar da profundidade desta crítica, o marxismo entende o tema do
desenvolvimento para além das suas determinações econômicas mais diretas. É possível
dizer que a porta de entrada do marxismo na temática é a sua abordagem histórica, que
discorre a respeito das grandes transformações dos modos de produção, isto é, como
eles se sucedem ao longo do desenvolvimento das forças produtivas, das revoluções
políticas e como formas pretéritas de organização social sobrevivem e se articulam com
o modo de produção capitalista. Isto está presente tanto nos clássicos internacionais
quanto nacionais do marxismo.
Algumas tradições dentro do marxismo, como as formuladas pelas II e III
Internacionais, adotaram uma abordagem evolucionista para explicar o processo de
desenvolvimento histórico dos modos de produção. Segundo esta visão, a história da
humanidade seria contada mecanicamente como uma sucessão ordenada de modos de
produção: comunismo primitivo, asiático, antigo, feudal e capitalista. Por meio das
crises ocasionadas pelas contradições geradas pelo desenvolvimento das forças
produtivas e das relações sociais de produção, um novo modo de produção sucederia o
antigo na escala evolucionista.
Alguns dos escritos mais influentes de Karl Marx demonstram certo grau de
influência do evolucionismo na sua obra4. Já no final da sua vida, Marx, todavia, viu-se
novamente envolto em questões a respeito do desenvolvimento histórico dos modos de
produção. Por conta do seu contato com os socialistas russos, Marx recebeu uma carta
que continha a seguinte pergunta: “Será verdade que todos os países do mundo devem,
por uma necessidade histórica, passar por todas as fases da produção capitalista?” Em
resumo, Vera Zasulitch, uma das líderes do movimento operário russo, questionava a
forma evolucionista de sucessão dos modos de produção (do comunismo primitivo ao
capitalismo).
Este contato com o movimento operário russo obrigou-o a estudar com mais
afinco a história, as estruturas de propriedade e as relações sociais de produção no
campo daquele país então considerado atrasado. Examinada a literatura, Marx responde
que, dentro de certas condições sociais, seria possível operar a revolução socialista na
Rússia tendo como base a propriedade comunal do país. Ou seja, seria possível a
transição para o socialismo por meio de elementos presentes em modos de produção
não-capitalistas, sem passar necessariamente pela fase capitalista do desenvolvimento
das forças produtivas.
Na carta de resposta a Vera Zasulitch5, Marx declara que a forma de transição
operada na Europa Ocidental do feudalismo para o capitalismo por meio da
expropriação dos meios de produção dos camponeses trata-se de uma especificidade
histórica daquela região. Esta forma de transição não deve ser entendida, segundo suas
4 No Manifesto Comunista, o autor anota que “sob a ameaça da ruína, ela [a burguesia] obriga todas as nações a adotarem o modo burguês de produção; força-as a introduzir a assim chamada civilização, quer dizer, a se tornar burguesas. Em suma, ela cria um mundo à sua imagem e semelhança”. No prefácio do livro Para a Crítica da Economia Política, afirma-se que “em grandes traços podem ser caracterizados, como épocas progressivas da formação econômica da sociedade, os modos de produção: asiático, antigo, feudal e burguês moderno. As relações burguesas de produção constituem a última forma antagônica do processo social de produção (...)”. Até mesmo em O Capital, aparecem traços evolucionistas na forma que Marx vê o desenrolar do processo histórico: “o país mais desenvolvido não faz mais do que representar a imagem futura do menos desenvolvido”. 5 Karl Marx a Vera Zasulitch, 8 de março de 1881. In: Dilemas do socialismo: a controvérsia entre Marx, Engels e os populistas russos. Rubem César Fernandes (org.). Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1982, p. 187-188.
próprias palavras, como uma “fatalidade histórica”, como um modelo generalizável para
todos os países. Assim, podemos concluir que:
Diversos escritos de Marx e Engels, em primeiro lugar o Manifesto
do Partido Comunista, contêm, seguramente, aspectos de uma tendência evolucionista ou econômico-determinista na sua interpretação da História. Entretanto, é totalmente equivocado reduzir o conjunto do pensamento de Marx a uma visão da sociedade e da História resultante das leis naturais do desenvolvimento das forças produtivas, ou a uma série de etapas calcadas no modelo europeu6.
Após a morte dos epígonos, desenvolveram-se correntes dentro do marxismo
que romperiam com a visão evolucionista da história dos modos de produção. O
primeiro passo foi dado por Lênin na obra O desenvolvimento do capitalismo na Rússia
(1898). Neste título, Lênin escreveu a respeito do desenvolvimento capitalista numa
formação econômico-social periférica, averiguando como um mesmo país comportava
diferentes níveis de desenvolvimento das forças produtivas entre setores como indústria
e agricultura. Já na década de 1920, Antonio Gramsci e José Carlos Mariátegui
escreveram a respeito da coexistência muito particular de diferentes modos de produção
dentro de países periféricos tais como Itália e Peru, respectivamente. Nestas localidades,
o desenvolvimento capitalista tinha uma história muito específica, que diferia
enormemente, por exemplo, dos modelos clássicos da Inglaterra e da França. Lá setores
modernos (industriais e mineração) e arcaicos (agricultura de subsistência de base
familiar e indígena) conviviam em regiões dentro de uma mesma nação.
Contudo, a primeira formulação mais bem acabada a respeito de uma visão
dialética da história do desenvolvimento capitalista na periferia foi elaborada por Leon
Trotsky a partir da lei do desenvolvimento desigual e combinado. Segundo esta lei7, a
formação econômico-social russa é vista como uma formação histórica sui generis que
escapa ao esquematismo evolucionista e mecanicista, pois ela mescla, de forma desigual
e combinada, elementos modernos e arcaicos. Dos setores modernos, tinha-se a
6 Michael Löwy, Nacionalismos e internacionalismos. São Paulo, Xamã, 2000, p. 30-31. 7 “As leis da História nada têm em comum com os sistemas pedantescos. A desigualdade do ritmo, que é a lei mais geral do processus histórico, evidencia-se com maior vigor e complexidade nos destinos dos países atrasados. Sob o chicote das necessidades externas, a vida retardatária vê-se na contingência de avançar aos saltos. Desta lei universal da desigualdade dos ritmos decorre outra lei que, por falta de denominação apropriada, chamaremos de lei do desenvolvimento combinado, que significa aproximação das diversas etapas, combinação das fases diferenciadas, amálgama das formas arcaicas com as mais modernas. Sem esta lei, tomada, bem entendido, em todo o seu conjunto material, é impossível compreender a história da Rússia, como em geral a de todos os países chamados à civilização em segunda, terceira ou décima linha”. Leon Trotsky, História da Revolução Russa, volume 1. Rio de Janeiro, Saga, 1967, p. 25.
indústria moderna trazida pelo capital estrangeiro internacional dos países imperialistas
(Inglaterra, França e Alemanha). Dos setores arcaicos, o governo autocrático dos tzares
e o baixo nível de desenvolvimento das forças produtivas rurais. Ambas conviviam
dentro de uma mesma totalidade – a formação econômico-social russa – e o setor
arcaico não era tido como uma barreira ao avanço do capitalismo mas, ao contrário,
proporcionava certos estímulos a ele, como a repressão autocrática do czarismo ao
nascente movimento operário.
Em suma, nas primeiras três décadas do século XX, certa tradição heterodoxa do
marxismo – Lênin, Gramsci, Mariátegui e Trotsky – se colocou em posição de combate
contra as tendências mecanicistas e evolucionistas proferidas pelos órgãos oficiais do
movimento operário mundial, como as II e III Internacionais. Tais revolucionários, a
partir de análises concretas de situações concretas, desenvolveram uma rica leitura
dialética do desenvolvimento histórico dos modos de produção, estabelecendo os elos
de ligação entre formas não-capitalistas e o capitalismo dentro de formações
econômico-sociais periféricas, determinando, assim, suas especificidades históricas, e
não simplesmente comparando-os com modelos ideais e clássicos do desenvolvimento
capitalista. Anos mais tarde, este método marxista seria apropriado por diversos
intelectuais brasileiros na tentativa de se decifrar a natureza do capitalismo neste rincão
mais desigual do mercado mundial. Este será o tema da seção final do presente texto.
III. A CRÍTICA DO MARXISMO HETERODOXO BRASILEIRO AO DESENVOLVIMENTISMO
De acordo com a economia política cepalina, o subdesenvolvimento não deveria
ser entendido como uma etapa primitiva e originária do desenvolvimento econômico.
Segundo suas principais teses, o processo de desenvolvimento dos países atrasados não
seria determinado naturalmente pela evolução temporal, ao contrário do que pregavam o
modelo neoclássico de Rostow e as teorias sociológicas da modernização. O
subdesenvolvimento significava uma condição histórica imposta pela expansão mundial
do capitalismo, e nada garantia que os padrões de vida dos países centrais seriam
alcançados pelos periféricos. Para lá chegar, argumentavam os desenvolvimentistas da
CEPAL, as nações subdesenvolvidas deveriam fazer escolhas a partir de um
determinado nível de consciência dos limites e possibilidades contidos em cada etapa
histórica, visando desenvolver ações políticas8 no sentido da industrialização, tida,
como vimos, como a tábua de salvação da periferia.
O subdesenvolvimento, assim, não se inscrevia numa cadeia de evolução que começava no mundo primitivo até alcançar, por meio de estágios sucessivos, o pleno desenvolvimento. Antes, tratou-se de uma singularidade histórica, a forma do desenvolvimento capitalista nas ex-colônias transformadas em periferia, cuja função histórica era fornecer elementos para a acumulação de capital no centro.9
Tradicionalmente, a HPE brasileira aponta os seminais trabalhos da CEPAL
como o ponto de partida de uma genuína teoria latino-americana. De fato, a economia
política cepalina destaca-se pela postura combativa, força argumentativa e criatividade
teórica nos embates ideológicos enfrentados nas décadas de 1950/60, em especial nas
suas críticas ao a-historicismo dos neoclássicos e ao esquematismo histórico das teses
dos Partidos Comunistas latino-americanos, que reproduziam as teses estalinistas da III
Internacional a respeito do caráter feudal/colonial dos países periféricos.
A nossa hipótese central é que, com maior profundidade e antes do
desenvolvimentismo cepalino, o pensamento marxista heterodoxo gestou – na
contramão da hegemonia estalinista dentro do pensamento e da ação comunistas
na América Latina ao longo dos anos 1920/30/40 – uma teoria capaz de desvelar as
especificidades históricas desta região e de apontar rumos políticos para
determinados sujeitos históricos lutarem contra os elos externos e internos de
dominação, exploração e dependência. Como exemplos dessa tradição heterodoxa do
marxismo, podemos citar Mariátegui como o fundador nos anos 1920, seguido por
historiadores do porte de Caio Prado Jr., Sergio Bagú e Marcelo Segall nos anos 1940.
Já na década de 1960, temos o surgimento de diferentes teorias marxistas brasileiras que
irão se bater frontalmente com as teses desenvolvimentistas e seus projetos políticos.
Deste destacamos Florestan Fernandes, Octávio Ianni, Francisco de Oliveira e os
teóricos da dependência10.
8 No sentido de uma ação orientada para um determinado fim, os cepalinos valeram-se das teorias weberianas. Enquanto a teoria evolucionista darwinista da seleção natural opera por uma finalidade pré-determinada aos animais – a da reprodução das espécies –, a weberiana parte de ações realizadas com um sentido determinado pelo sujeito, a partir de escolhas. Ou seja, a evolução histórica das nações e sua posição relativa dentro do sistema mundial capitalista não são determinadas por questões naturais (como prega a teoria das vantagens comparativas de Ricardo), mas sim por escolhas políticas. 9 Francisco de Oliveira, “O ornitorrinco”. In: Francisco de Oliveira, Crítica a razão dualista/O
ornitorrinco. São Paulo, Boitempo, 2003, p. 126. 10 Cf. Michael Löwy (org.), O marxismo na América Latina: uma antologia de 1909 aos dias atuais. São Paulo, Fundação Perseu Abramo, 1999.
No nosso entendimento, a categoria analítica desenvolvimento desigual e
combinado11 fornece boa parte do fundamento teórico-metodológico do marxismo
heterodoxo latino-americana. Esta corrente do marxismo coloca questões importantes
a respeito da constituição histórica da América Latina como uma região integrada aos
circuitos comerciais, produtivos e financeiros do imperialismo, tais como a integração
de setores pré-capitalistas na dinâmica da acumulação capitalista internacional, o papel
das burguesias nacionais e a natureza da revolução na periferia.
Chegamos a esta hipótese por uma dupla via. Em primeiro lugar, pelo estudo de
obras do pensamento econômico brasileiro ao longo dos anos 2007-200812. A segunda
via foi a leitura de uma interessante análise escrita pelo historiador Felipe Demier sobre
a influência de Trotsky e sua lei do desenvolvimento desigual e combinado no
pensamento nacional. No seu artigo, Demier expõem como a referida lei teórica
trotskista “acabou por se constituir em uma matriz interpretativa para os estudos de
renomados intelectuais acadêmicos brasileiros que, nas décadas de 1960-70, opuseram-
se às leituras ‘etapistas’ e ‘dualistas’ sobre as condições sócio-históricas do Brasil”13.
Para isto, o autor cita as obras de Caio Prado Jr., Florestan Fernandes, Octávio Ianni,
Francisco de Oliveira, Fernando Henrique Cardoso e Francisco Weffort como
referências daquela influência – direta e/ou indireta – de Trotsky na intelectualidade
brasileira. Cabe ressaltar que esta influência varia de caso a caso: por exemplo, a
categoria desenvolvimento desigual e combinado está exposta de forma patente em
Florestan Fernandes, Octávio Ianni e Francisco de Oliveira, mas como uma noção
(difusa) em Caio Prado Jr.
A nossa hipótese também pode ser corroborada nos escritos de Francisco de
Oliveira sobre a produção bibliográfica de Celso Furtado. No livro A navegação
venturosa, o cientista social pernambucano anota que
a tese cepalino-furtadiana da dualidade distingue-se da constatação geral e histórica do ‘desenvolvimento desigual e combinado’ da tradição marxista (Lenin e Trostki) precisamente porque para Furtado e a Cepal o desenvolvimento é desigual – tanto pelas diferenças de grau e ritmo de desenvolvimento quanto pelas diferenças qualitativas
11 Cf. Michael Löwy, “A teoria do desenvolvimento desigual e combinado”. In: Michael Löwy e Daniel Bensaïd, Marxismo, modernidade e utopia. São Paulo, Xamã, 2000, p. 160-167. 12 Em 2007 e 2008, o Laboratório de Estudos Marxistas José Ricardo Tauile (Instituto de Economia/UFRJ) organizou um curso de extensão intitulado Clássicos do Pensamento Social Brasileiro. Nesta atividade estudamos obras dos seguintes autores: Caio Prado Jr., Celso Furtado, Florestan Fernandes, Francisco de Oliveira, Ignácio Rangel, Nelson Werneck Sodré, Octávio Ianni e Ruy Mauro Marini. 13 Felipe Demier, “A lei do desenvolvimento desigual e combinado de León Trotsky e a intelectualidade brasileira”. In: Revista Outubro, nº16, 2007, p. 77.
entre setores que se desconhecem entre si –, mas não é combinado. Os dois setores não têm relações articuladas: o setor ‘atrasado’ é apenas um obstáculo ao crescimento do setor ‘moderno’, principalmente porque, por um lado, não cria mercado interno e, por outro, não atende aos requisitos da demanda de alimentos. Nem sequer a clássica função de ‘exército [industrial] de reserva’ o ‘atrasado’ cumpre em relação ao ‘moderno’ (...)14.
De acordo com Chico de Oliveira, os cepalinos haviam conseguido perceber
determinadas relações internacionais de dominação do centro frente à periferia e
correlacionar a condição de subdesenvolvimento dos países do sul com o
desenvolvimento dos países do norte. Este seria o grande mérito de Furtado, que não
entendia o subdesenvolvimento como ausência de desenvolvimento, mas sim como
condição histórica do processo de expansão espaço-temporal do capitalismo. A CEPAL,
todavia, não conseguia transpor tais relações de dominação para o interior dos países
periféricos, nem estabelecer os elos que ligam os setores modernos e arcaicos de cada
formação econômico-social da América Latina:
O dual-estruturalismo não é de modo nenhum uma teorização vulgar. Sua força residiu, sobretudo, em apontar a emergência de processos que não eram perceptíveis nem importantes para as outras vertentes teóricas. A dualidade ‘atrasado-moderno’ escapa, por exemplo, tanto à a-historicidade do método neoclássico quanto ao mecanicismo das ‘etapas’ e dos modos de produção seqüenciais próprios do stalinismo convertido em oráculo do marxismo. Mas ele também – inclusive
porque teoriza contemporaneamente os próprios processos que
percebe – mascara os novos interesses de classe que se põem agora
como ‘interesses da Nação’15
Em suma, temos no desenvolvimentismo cepalino a presença da noção do
desenvolvimento desigual das forças produtivas entre regiões – centro e periferia – da
divisão internacional do trabalho, bem como uma incapacidade teórica de articular
dialeticamente as contradições internas entre os setores moderno e arcaico de um país.
Ou seja, a economia política cepalina, ao contrário do marxismo heterodoxo brasileiro
(e latino-americano), ignorava a dimensão combinada do desenvolvimento capitalista na
periferia, persistindo no erro de ver o setor atrasado como uma barreira ao pleno
desenvolvimento do capitalismo na periferia.
14 Francisco de Oliveira, A navegação venturosa: ensaios sobre Celso Furtado. São Paulo, Boitempo, 2003, p. 13, grifos originais. 15 Idem, ibidem, p. 15, grifos originais.
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