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Paredes com arte: os afrescos de Fulvio Pennacchi
Todos que entram no Hotel
Toriba notam imediatamente:
no bar, na sala de café e chá, no
restaurante e no aconchegante
salão onde hóspedes e visitantes
se reúnem ao redor da lareira,
as paredes são quase totalmente
recobertas por belíssimos afrescos,
onze ao todo, somando mais de
60 metros lineares de pintura.
O autor da obra é Fulvio
Pennacchi, desenhista, pintor,
muralista e ceramista de origem
italiana, radicado em São Paulo
desde 1929, e integrante do
chamado Grupo Santa Helena —
junto com Alfredo Volpi,
Francisco Rebolo, Aldo Bonadei,
Alfredo Rizzotti, Mario Zanini
entre outros, na maioria
imigrantes ou descendentes
diretos. Chegou ao Brasil com o
diploma do Reggio Istituto di
Belle Arti com Licença do Curso
Superior de Belas Artes na Seção
de Decoração Mural, e combinava
elementos clássicos da formação
italiana com a atmosfera brasileira
que tão bem compreendia.
Não se sabe ao certo qual
era a relação do artista com os
fundadores do hotel, mas, de
acordo com o pesquisador e
estudioso Valério Pennacchi,
seu parente, Luiz Villares
Paredes com arte: os afrescos de Fulvio Pennacchi
provavelmente já tinha alguma
intimidade com o trabalho do
artista quando o convidaram a
adornar as paredes do hotel.
Nessa época, Pennacchi já havia
conquistado certa fama graças aos
murais executados na Igreja Nossa
Senhora da Paz, em São Paulo,
e em elegantes residências da
capital, além de agências bancárias
e instituições privadas.
Enquanto pintava as paredes do
hotel, escrevia em forma de poema
sobre a beleza da paisagem de
Campos do Jordão para Filomena
Maria dall’Aste Brandolini
Matarazzo, na época sua noiva:
69 Portadas e salões
Portals and Salons | Zwischentüre und Säle
72 Restaurante Pennacchi, década de 1940
Pennacchi Restaurant, 1940s | Restaurant
Pennacchi, 40er-Jahre
77
O Toriba na Cultura de Campos do Jordão78
73/71 Afresco de Pennacchi
Fresco by Pennacchi | Freske von Pennacchi
Campos do Jordão
Colli montagne sfuggono nel cielo;
verde con verde e terra vario pinte
di toni caldi: sembrano i monti
di velluto antico, di belezza regale;
i verdi chiari e verdi rosso terra,
e sentieri che vanno girovaghi
intorno agli ondulanti immensi monti.
Intercalate con le vaste curve
da boschi verdi, tanto ricchi e belli;
e verdi oliva, e verdi di smeraldo,
e verdi arancio ed infiniti toni
di goiezza composti.
Vasto e si bello il paesaggio intorno
ch’io dipinger ni só, mi mantengo muto,
osservando, osservando
e meravilgia mi prende tutto
e penso alla potenza di Dio infinita
sopra questo mondo.
“Colinas e montanhas que se arrastam para o céu;
Verde com verde e multicoloridas
Terras de tons quentes
Parecem montes de veludo antigo,
De beleza régia;
E verdes claros, e verde vermelho terra
Os rodeantes caminhos acompanham
Os imensos e ondulados e montes
Intercalados, nas vastas curvas, estão
Os bosques tão verdes, tão ricos e belos;
E verde oliva, e verde esmeralda, e verde alaranjado.
Engendram infinitos prazenteiros tons.
Tão grande e bela é a paisagem circunvizinha
Que eu não consigo pintá-la
Mantenho-me mudo, observando, observando
E tal deslumbre me invade, todo,
Me faz pensar ao infinito poder de Deus
Sobre esse mundo!”
70/77 Afresco de Pennacchi
Fresco by Pennacchi | Freske von Pennacchi
Paredes com arte: os afrescos de Fulvio Pennacchi
no terreiro, a bandeirola de um
santo junino, a espiga de milho, a
primeira colheita, o fruto da terra,
a oferenda. Nos versos, as palavras
do tocador de viola Angelino de
Oliveira, de Botucatu, e de Luiz
Peixoto, personagem carioca misto
de poeta, compositor, caricaturista
e teatrólogo entre outros dotes
artísticos.
Tristeza do JecaAngelino de Oliveira, 1918
Nestes versos tão singelos,
minha bela, meu amor,
p’ra você quero contar
o meu sofrer e a minha dor.
Eu sou como o sabiá,
quando canta é só tristeza
desde o galho onde está.
Nesta viola eu canto e gemo de
verdade
Cada toada representa uma saudade
Eu nasci naquela serra
num ranchinho à beira chão,
todo cheio de buraco,
onde a lua faz clarão.
Quando chega a madrugada
lá no mato a passarada,
principia um barulhão.
Vou parar com minha vida já não
posso mais cantar
Pois o Jeca quando canta tem
vontade de chorar
E o choro que vai caindo
Devagar vai se sumindo como as
águas vão pro mar.
Pennacchi mergulhou no
cancioneiro popular em busca de
inspiração e dele extraiu temas
singelos relacionados à vida
campestre, numa narrativa visual
de três famosas canções cujos
versos foram reproduzidos no
rodapé de algumas das cenas.
Nos afrescos do bar, estampou
uma vindima e, para o restaurante,
criou uma festa rural focada no
churrasco gaúcho, relacionando,
assim, os temas aos espaços. Já no
salão da lareira, apropriou-se do
folclore e explorou as Entradas e
Bandeiras, na sala do chá e café.
A obra contém símbolos
inequívocos da cultura nacional:
a viola, o violeiro, o cachorro
companheiro do
caipira, as
galinhas
83
70/77 Afresco de Pennacchi
Fresco by Pennacchi | Freske von Pennacchi
Casinha da ColinaLuiz Peixoto
Você sabe de onde eu venho?
De uma casinha que eu tenho,
Fica dentro de um pomar.
É uma casa pequenina,
lá no alto da colina,
de onde se ouve longe o mar.
Entre as palmeiras bizarras,
cantam todas as cigarras,
sob o pó de ouro do sol.
Do beiral vê-se o horizonte,
no jardim canta uma fonte
e há na fonte um caracol.
Do jasmineiro tão branco,
tomba de leve no banco
a flor que ninguém colheu.
No canteiro há uma rosinha,
no aprisco uma ovelhinha,
e na casa meu cão e eu.
Junto a minha cabeceira,
minha santa padroeira,
que está sempre em seu altar,
cuida de mim se adoeço,
vela por mim se adormeço,
e me acorda devagar.
(...)
Mas se acaso anoitecer
tudo pode acontecer
(que será de mim, depois?).
A casinha pequenina,
lá no alto da colina,
chega bem para nós dois.
Paredes com arte: os afrescos de Fulvio Pennacchi 85
74 Afresco de Pennacchi
Fresco by Pennacchi | Freske von Pennacchi
76 Afresco de Pennacchi
Fresco by Pennacchi | Freske von Pennacchi
Paredes com arte: os afrescos de Fulvio Pennacchi 87
78 Afresco de Pennacchi
Fresco by Pennacchi | Freske von Pennacchi
O Toriba na Cultura de Campos do Jordão88
De acordo com Valerio
Pennacchi, dar vida a uma parede
por intermédio de poesias não era
novidade para o artista. Muitos anos
antes, ainda na Itália, havia se inspi-
rado no poema O Triunfo de Baco e
Ariana, de Lourenço, o Magnífico,
da família Dei Medici, decorando
com murais a têmpera a residência
de Valerio Pennacchi dei Notari na
Garfagnana, Lucca, Itália.
Desde o início da década de
1990, Ivani e Domingos Barbosa
da Rocha incluíram na agenda de
descanso o Hotel Toriba. Ao
contrário do que acontece com
muitos outros hóspedes, eles não
conheciam o hotel, não haviam
freqüentado na infância ou
adolescência e não chegaram lá
por conselho de amigos. “Um dia
decidimos passar o fim de semana
fora e, sem idéia para onde ir,
fomos vasculhar o Guia 4 Rodas.
Estava lá o detalhe que me atraiu:
os afrescos do Pennacchi, artista
que admiro e de quem possuo uma
tela”, explica Domingos.
De maio de 2004 a março de
2005, Julio Moraes e equipe
restauraram os afrescos, um tanto
danificados pela passagem do
tempo. Durante meses, na dança
dos andaimes, pequenas fendas
foram fechadas, novas tonalidades
se revelaram e uma luminosidade
diferente foi surgindo, trazendo de
volta o brilho do trabalho original,
depois de mais de sessenta anos.
Valeu a pena! A coleção de
murais preservados e restaurados
do Hotel Toriba é uma das maiores
e mais importantes obras em
exposição permanente do artista.
79 Restauro de afrescos, Julio Moraes
Conservação e Restauro SCL
Fresco restoration, Julio Moraes Conservação
e Restauro SCL | Restaurierung von Fresken,
Julio Moraes Conservação e Restauro SCL
Paredes com arte: os afrescos de Fulvio Pennacchi 89
75 Afresco de Pennacchi
Fresco by Pennacchi | Freske von Pennacchi
81/80 Restauro de afrescos, Julio Moraes
Conservação e Restauro SCL
Fresco restoration, Julio Moraes Conservação
e Restauro SCL | Restaurierung von Fresken,
Julio Moraes Conservação e Restauro SCL
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