pontifÍcia universidade catÓlica de sÃo paulo puc … soares... · a minha orientadora...
Post on 08-Nov-2018
218 Views
Preview:
TRANSCRIPT
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Marcello Soares Castro
Tutela de Urgência Satisfativa na Proteção dos Direitos de Marca
MESTRADO EM DIREITO
SÃO PAULO
2014
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Marcello Soares Castro
Tutela de Urgência Satisfativa na Proteção dos Direitos de Marca
MESTRADO EM DIREITO
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como
exigência parcial para a obtenção do título de Mestre
em Direito, sob a orientação da Profª. Livre-Docente
Drª. Teresa Celina de Arruda Alvim Wambier.
SÃO PAULO
2014
Banca Examinadora
__________________________________________
__________________________________________
__________________________________________
"Eu só não queria significar.
Porque significar limita a imaginação."
(Manoel de Barros)
Ao
meu pai, Webster,
minha mãe, Teresinha de Jesus,
e meu irmão, Junior,
três pedaços de mim.
AGRADECIMENTOS
Ao meu pai, minha mãe e meu irmão, pelo amor e dedicação constantes em minha
vida. E a todos meus familiares, pelo apoio, afeto e confiança sempre destinados a mim.
A minha orientadora Professora Teresa Arruda Alvim Wambier, pela amizade
constituída no ambiente de estudos e reflexão, a confiança conferida a mim, assim como por
todas as lições processuais e lições de vida que com ela pude aprender.
A Alexandre Reis Siqueira Freire, pela amizade constituía na lealdade, lições
processuais e lições de vida que me possibilitaram a concretização de mais esta missão.
Aos professores que, entre as lições de processo e experiência expostas,
evidenciaram que com a oportunidade de aprimoramento em um ambiente acadêmicos de
altos estudos, como é a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, ocorre o
aprimoramento como pessoal, evidenciando a missão que nos é dada frente à realidade social,
econômica, cultural, política e jurídica no mundo em que vivemos. Agradeço especialmente
aos professores com quem tive a sorte de cursar disciplinas, debater em eventos ou aprender
pelos livros, Cassio Scarpinella Bueno, João Batista Lopes, Arlete Inês Aurelli, Nelson Nery
Junior, José Manuel de Arruda Alvim Netto, Thereza Celina Diniz de Arruda Alvim, Eduardo
Arruda Alvim, Sergio Seiji Shimura, Donaldo Armelin, Nelson Luiz Pinto, Rodrigo Barioni,
Willian Santos Ferreira, Marcus Vinicius de Abreu Sampaio, Claudia Elisabete Schwerz
Cahali, Elizabeth de Castro Lopes, Olavo de Oliveira Neto, Georges Abboud, Pedro Miranda
de Oliveira, Dierle Nunes, Ronaldo Cramer e Bruno Dantas.
Aos professores e amigos com quem trabalhei no Curso de Graduação em Direito
e no Curso de Especialização em Direito Processual Civil da Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo, Claudio Zarif, Rita Dias Nolasco, Luis Eduado Simardi Fernandes, Luciano
Tadeu Telles, Sidney Palharini, Berenice Magri, Cristiane Druve, Lílian Gaspar, Luiz Cezare,
e aqueles que tive a oportunidade de acompanhar em palestra, José Miguel Garcia Medina,
Rogério Licastro Torres de Mello e Luiz Rodrigues Wambier.
A Pró-Reitoria de Pós-Graduação e a Coordenação do Programa de Estudos Pós-
Graduados em Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, na pessoa dos
coordenadores Professor Wagner Balera, Professora Rosa Maria Barreto Boriello Andrade
Nery, Professor Paulo de Barros Carvalho, assim como Rui e Rafael, pelo excelente trabalho
desenvolvido.
Ao Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito (CNPq), pelo
foemnto e apoio para o desenvolvimento do curso de mestrado.
Aos amigos feitos ao logo desse período na Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo, com quem tive a sorte de estudar e me divertir, na pessoa de Vivian Zaroni, Ivie
Malafaia, Izabel Pantaleão, Stella Economides, Letícia Zuccolo, Taciana Smania, Mirian
Facin, Rosangela Gazdovich, Camila Salgueiro, Julia Camargo, Monica Rodrigues, Monica
Judicie, Thais Cordeiro, Gustavo Gomes, Andre Bruni, Ségio Lualri, Lucas Rister, Marcos
Cavalcanti, Welder Queiroz, Helder Câmara, Thiago Rodovalho, Henrique Ávila, Paulo
Nasser.
Aos laços de amizade em São Luís, na pessoa de Rebeca de Holanda, Alonso
Freire, Carolina Fecury, Márcio Aleandro, Edith Ramos, Suzanne Lobo, Ítala Costa, Karla
Linhares, Sedivan Junior, Marcus Vasconcelos, Paolla Normando, Isabela Bacelar, Luciana
Lêda, Gustavo Porto, Leonardo Lourenço, Diego Emir, Alessandra Amorim, João Neto,
Jéssica Moraes, Marylu Coelho, Rayssa Brito, Ana Augusta Guterres, Danielle Frasão,
Conceição Schliebe, Carolina Diniz, Juliana Gonzalez, Carla Miranda, Greyce Helal, Lorenna
Falcão, Isadora Diniz, Martha Jackson, Renata Braga, Lucas Furtado e Alexandre Maia, que
independente da distância e do tempo, sempre serão importantes para mim.
Àqueles que encontrei em São Paulo e tenho a sorte de tê-los como amigos,
Cleiton Gonçalves, Reinaldo Ramos, Guilherme Almeida, Alexandre Penteado, Andre
Carvalho, Augusto Pontes, Fabrício Torres, Rodolfo Sobreira, Antonio Bassan Cruz, Gustavo
Prado, Marcello Teixeira, Maximiliano Gonzalez, Marcelle Bernardo, Vicente Penna, Denise
Ferreira, Carola Oliveira, Luiza Mello.
A Rodi Marin, por sua lealdade, e sua família, na pessoa da Tia Rose, Tio José
Carlos Cassemiro, Tia Adriana, Tio Evaldo, Renan Marin, Celene Luiza, Ricardo Cassemiro,
Ana Silvia Almeida, Emanuel e Maria Clara, pela relação de afeto construída.
Aos queridos Tia Marisa e Tio Loracy, assim como Lorisa, Marcio, Valentina,
Maricy e Maria Fernanda, que me receberam como um filho em sua família.
A Raísa e Natália, por me acolherem nesta cidade e me mostrarem que, seja qual
for o caminho a ser escolhido para se viver, como cantou Legião Urbana, que se possa
caminhar por ele “amando as pessoas como se não houvesse amanhã”.
RESUMO
O presente trabalho Tutela de Urgência Satisfativa na Proteção dos Direitos de Marca,
desenvolvido por Marcello Soares Castro, tem como objeto a proteção dos direitos de marca
sob a ótica da tutela jurisdicional efetiva, veiculada pela tutela de urgência satisfativa. Assim
se justifica analisar o aparato técnico-processual da tutela de urgência satisfativa como
conjunto instrumental efetivamente de protetivo dos direitos de marca, detectando as
características e exigência do direito material, para identificar e apresentar formas adequadas
de aplicabilidade dessas técnicas caso seja fundamental a concessão imediata de tutela
jurisdicional. Com investigações doutrinárias e jurisprudenciais, almeja-se examinar as
estratégias processuais efetivas e sensíveis à realidade jurídica dos direitos de marca, com a
finalidade de apresentar uma tutela jurisdicional efetiva. Adotou-se neste projeto uma
abordagem construtiva da nova perspectiva em que se configura o Direito Processual Civil, a
da utilização das técnicas processuais como instrumentos idôneos para a tutela dos direitos.
Os procedimentos metodológicos desta pesquisa partem da revisão bibliográfica e legislativa
acerca do tema, posteriormente a análise jurisprudencial. Após realizados estes
procedimentos, sistematizaremos o uso da técnica processual ao instituto de direito material,
destacando concomitantemente a construção do Direito Processual Civil como instrumento de
eficácia dos direitos de marca. As técnicas básicas de pesquisa adotadas são a bibliográfica e
documental jurisprudencial. A pesquisa bibliográfica será desenvolvida a partir de obras de
destaque quanto ao tema, e artigos científicos especializados, ambos dirigidos a público
específicos, os operadores do direito. A pesquisa documental consistirá no estudo detidos de
documentos relevantes, como diplomas normativos referentes ao tema e jurisprudências
atualizadas dos principais tribunais que se ocupam com estes problemas. Em síntese, como
resultados obtidos, inicialmente se destaca aspectos como a superação de paradigma no direito
processual civil, a colaboração da doutrinária, jurisprudencial e debates legislativos sobre esse
aspecto, assim como apontar como a tutela jurisdicional de urgência se constituiu um standard
da efetividade. Noutro espaço, apresentam-se pontos específicos da interpretação das normas
atinentes à referida tutela jurisdicional, com o objetivo de conduzir o leitor a uma compressão
diferenciada quanto à aplicabilidade, eficácia e imperatividade da técnica processual. Por fim,
elencados esses elementos para debate, ocupou-se em analisar a aplicação da tutela de
urgência satisfativa na proteção dos direitos de marca, quando os mesmos exigem imediata
proteção jurisdicional.
Palavras-chaves: tutela de urgência; marca; efetividade; aplicabilidade; imperatividade.
ABSTRACT
This study Jurisdictional Urgent Relief of Protection of the Trade Mark Rights, conducted by
Marcello Castro Soares, has as its object the protection of trademark rights from the
perspective of effective judicial protection, conveyed by satisfativa tutelage of urgency. Thus
it is justified to analyze the technical and procedural apparatus of guardianship satisfativa
urgency and instrumental ensemble of effectively protective of trademark rights, detecting the
characteristics and requirement of substantive law, to identify and provide appropriate forms
of applicability of these techniques if the prompt granting to judicial review. With doctrinal
and jurisprudential research, the aim is to examine the effective and sensitive to the legal
reality of trademark rights, in order to present an effective judicial remedy procedural
strategies. We adopted this approach to design a constructive new perspective in which
configures the Civil Procedure Law, the use of procedural techniques as suitable for the
protection of rights instruments. The methodological procedures of this research leave from
literature and legislative review on the subject, later the jurisprudential analysis. After
performing these procedures, sistematizaremos the use of procedural technique to institute
substantive law, simultaneously highlighting the construction of the Civil Procedure Law as
an instrument of efficiency of trademark rights. The basic research techniques used are the
jurisprudential literature and documentary. The literature will be developed from prominent
works on the subject, and specialty papers, both directed to specific public jurists. The desk
research will involve the study of relevant documents held as normative acts related to the
topic and current jurisprudence of the main courts dealing with these problems. In short, like
the findings, initially highlights aspects such as overcoming paradigm in civil procedural law,
the collaboration of doctrinal, jurisprudential and legislative debates on this aspect, as well as
show how the judicial protection of urgency was a standard of effectiveness. In another room,
we present the specific interpretation of the relevant rules to that legal protection, with the
goal of leading the reader to a different compression on the applicability, effectiveness and
imperative nature of technical procedural points. Finally, these elements listed for debate, he
strove to analyze the application's tutelage satisfativa urgency in protecting trademark rights,
when they require immediate judicial protection.
Keywords: jurisdictional urgent relief; trade mark; effectiveness; applicability;
imperativeness.
SUMÁRIO
1
INTRODUÇÃO
Este trabalho é resultado de reflexões sobre alguns temas que, em um determinado
momento da trajetória de estudos dos processualistas, tomaram a atenção por se ocuparem
fundamentalmente da análise de questões atinentes à efetividade da Justiça. Nele, aponta-se a
efetividade como elemento fundamental ao processo, à tutela jurisdicional. Por isso, desde
logo, submetemo-nos ao questionamento de “o que é ser efetivo?”
A efetividade tornou-se o standard, o elemento de conclusão das argumentações
jurídicas na análise de todo tema processual. Importa questionar, pois, qual o sentido pensado
à palavra efetividade, quando esta se refere ao processo, à tutela jurisdicional, ou quando este
sentido é estabelecido como direito.
Então, objetiva-se apontar elementos suficientes para a reflexão sobre “o que é ser
efetivo?”, no âmbito processual, a partir do estudo de um dos temas apontados como símbolo
da efetividade, que é a tutela de urgência.
Nesse sentido e para incitar a reflexão sobre o objeto de estudo deste trabalho, a
análise do tema “tutela de urgência” será realizada tendo em vista os direitos de propriedade
intelectual, especificamente os direitos atinentes aos sinais distintivos, com o intuito de
suscitar não somente questões teóricas, relacionadas a um instituto processual, mas também
questões práticas de como esta tutela de urgência é utilizada para a proteção efetiva de
direitos.
Portanto, àqueles que se ocupam do estudo do processo civil deve competir o
cuidado de observar a conjugação fundamental entre o direito processual e o direito material.
O esforço de relacionar institutos do direito processual e institutos do direito material –
direitos de propriedade intelectual no caso deste trabalho – é árduo. Contudo, mesmo com os
riscos oferecidos, mas realizando um estudo interdisciplinar e de comprometimento, explica o
enfrentamento deste tema, tendo em vista o entendimento de que as técnicas processuais
devem ser pensadas e testadas sob a luz da proteção dos direitos debatidos no processo e que
se objetiva proteger. Assim, justificou-se a escolha da tutela de urgência como objeto de
estudos.
Entretanto, no que tange à escolha dos direitos de propriedade intelectual,
especificamente os direitos referentes a marcas e outros sinais distintivos, estes ocupam o
interesse de diversos segmentos na sociedade contemporânea.
2
A propriedade intelectual – manifestada em criações como obras literárias e
artísticas, softwares, domínios na rede mundial de computadores, cultura imaterial, patentes
de invenção, modelos de utilidade, desenhos industriais, indicações geográficas, cultivares,
entre outros, e destacadamente nas marcas – atualmente detém evidente valor econômico,
social e político, constituindo-se num arsenal competitivo em âmbito global.
Nesse contexto, os debates acerca dos direitos de propriedade intelectual têm se
elevado, conquistando espaço nas reflexões dos juristas, que devem analisar e pensar soluções
aos problemas, trazidos por esta realidade que se apresenta, inclusive aqueles de caráter
processual.
Aliado a isso e por identificar que tais direitos detêm uma variedade ímpar de
características, quanto mais específicos e complexos são os direitos e as relações existentes no
seu tráfego jurídico mais situações, questionamentos, reflexões podem surgir, ao se verificar a
aplicação de determinada técnica processual para a sua proteção.
Exatamente por isso que, ao estudar a tutela de urgência, observamos que, além da
construção teórica acerca de elementos do direito processual como finalidade, características,
efeitos etc., importava verificar sua efetividade na proteção de um direito material e, pelas
razões expostas, os processos nos quais estão em pauta direitos de marca, litígios envolvendo
atos de contrafação, concorrência desleal, utilização indevida da proteção conferida a
determinados sinais distintivos, que se demonstraram plurais em possibilidade.
De fato, existe um risco de analisar o tema da tutela de urgência, enfrentando a
sua construção prática, mas este risco é compensado pela coragem de escolher a
jurisprudência como laboratório de testes acerca da efetividade das técnicas processuais em
questão.
Por tudo o que até agora se afirmou, trata-se de um ambiente decisional plural, na
interpretação e aplicação de princípios, cláusulas gerais, regras diferenciadas e vasto tanto nas
questões de direito quanto nas questões de fato debatidas, e que exige um cuidado no âmbito
probatório.
Em um momento inicial este trabalho se ocupa em demonstrar suscintamente as
transformações e superação de paradigmas no direito processual civil, destacadamente no seu
estudo. Entendendo ser relevante, trata-se ainda de alguns princípios processuais, cuja
concretização é verificada, quando da analise da aplicação de determinadas técnicas
processuais, a partir da jurisprudência.
3
Em seguida, a proposta apresentada é a de analisar a construção da tutela de
urgência. tendo em vista as exigências dos direitos de propriedade intelectual, destacadamente
os direitos de marca.
Neste caso, não se ocupa tão somente de fazer uma digressão histórica, apontando
se determinada técnica processual não existia em um momento, mas existia noutro. A
tentativa é a de demonstrar como as características e exigências de um direito material
fomentaram o debate jurisprudencial de questões processuais, como isto ocorreu,
concomitantemente com a superação de paradigmas no estudo do direito processual, assim
como com as alterações legislativas atinentes a essas técnicas processuais e qual o resultado, o
impacto desse encontro de esforços em pensar uma tutela jurisdicional efetiva.
Com este intuito, detivemo-nos no estudo de alguns assuntos que nem sempre
figuravam como os mais atrativos ao processualista, destacadamente a importância das
decisões judiciais e da construção jurisprudencial, como instrumentos capazes de possibilitar
a reflexão acerca de problemas que atingem o sistema processual, bem como instrumento
instrutivo de técnicas processuais efetivas. Esta outra linha de abordagem, ou mesmo
metodologia, integra o que atualmente designa-se como direito jurisprudencial.
O enfrentamento de questões como a importância da flexibilidade e estabilidade
jurisprudencial, a apresentação de pauta de conduta, a existência de ambientes decisionais
tornam-se fundamentais ao estudo, que objetiva realizar a análise jurisprudencial acerca de
um tema processual. E, por compreender a sua importância, empregam-se tais elementos neste
trabalho.
Após delinear o contexto no qual as técnicas processuais de urgência –
acautelatória e satisfativas – foram elaboradas, segue a tentativa de pensar, no sistema
processual civil atual, a existência de um regime único de tutela de urgência. Identificando os
elementos comuns dessas técnicas, suas finalidades, características e efeitos, assim como os
elementos diferenciadores entres as mesmas, sustenta-se a organização de um sistema único
capaz de dinamizar a aplicação da tutela de urgência no processo.
Para além dessas questões eminentemente processuais, segue o momento no qual
verifica-se a utilização da tutela de urgência na proteção dos direitos atinentes às marcas e
sinais distintivos. Identificam-se, dentre vários aspectos, a possibilidade e o momento de
aplicação dessa tutela jurisdicional, os elementos suficientes para a sua concessão e
realização, o contexto probatório envolvido para a determinação do direito à tutela de
urgência, os mecanismos de apoio e a imperatividade dessas decisões, entre outros.
4
Portanto, a postura pragmática adotada é realizada com o estudo da
jurisprudência, no intuito de evidenciar nossas reflexões e conclusões sobre a utilização das
técnicas processuais examinadas. Apresentando as decisões, com o objetivo de analisar seus
fundamentos, bem como o contexto processual no qual a mesma foi articulada, apontam-se as
razões de considerá-las corretas ou erradas.
Certamente sabe-se que o portfólio jurisprudencial sobre o objeto de estudo
“tutela de urgência” é vasto e plural, no que se refere aos diversos entendimentos existentes,
mas torna-se específico quando se exige o refinamento da escolha – por ocupar-se da
aplicação dessa técnica processual nos litígios –, envolvendo os direitos de marca. Contudo,
na tentativa de evitar questionamentos quanto à escolha da jurisprudência, elencaram-se
acórdãos condizentes e não condizentes ao que se entende correto no trabalho, ocupando-se
mais com a seleção das decisões que apresentavam mais elementos e que contribuíssem para
uma reflexão. Este esclarecimento é fundamental, pois, evidenciar aos leitores os critérios
adotados para a realização e utilização desta metodologia de estudo, garante a transparência e
cautela quando da utilização e manejo desta modalidade de informação.
O caminho percorrido: (i) a apresentação da trajetória jurisprudencial acerca da
edificação das tutelas de urgência no sistema processual civil; (ii) a construção de um
microssistema de tutela de urgência, com suas respectivas normas – princípios, cláusulas
gerais e regras; e (iii) a verificação de sua aplicação para a proteção dos direitos de marca,
utilizando a jurisprudência como laboratório de estudo, conduz ao destaque da importância
que as decisões detêm não somente para o caso submetido, mas para a manutenção e
constante construção de determinado sistema jurídico.
Existe, neste trabalho, mesmo não sendo seu objeto de estudo central, a
inquietação de evidenciar o valor fundamental das decisões de tribunais, com ênfase àqueles
cuja missão institucional é cuidar da estabilidade da interpretação do direito, com destaque às
situações em que o direito debatido encontra-se envolvido por normas que garantem a
flexibilidade interpretativa em ambientes decisionais variados, como se configura a tutela de
urgência satisfativa.
Nas observações finais, retomaremos a ideia de efetividade, destacada na tutela de
urgência satisfativa, para se verificar, como sugere o título deste nosso trabalho, se esta tutela
jurisdicional é suficiente para enfrentar situações que exigem concretização imediata de
proteção via atividade jurisdicional.
5
CAPÍTULO I
JURISDIÇÃO E EFETIVIDADE PROCESSUAL
1.1 Considerações gerais
A importância de verificar como a utilização da tutela jurisdicional de urgência
garante a otimização da atividade jurisdicional, contribuindo para a constituição de um
processo efetivo e a proteção dos direitos – em exame os direitos atinentes às marcas –, foi a
razão que justificou a escolha do referido tema para a redação deste ensaio.
O contexto processual no qual se exige a aplicação de determinada medida de
urgência é composto por diversos elementos, dentre os quais:
(i) o ambiente decisional no qual as mais variadas questões de direito e questões
de fato devem ser resolvidas – pluralidade observada nos casos que envolvem direito de
marca;
(ii) a interpretação do texto processual que conduz à apresentação de normas com
finalidades e dimensões diferenciadas;
(iii) o entendimento de que, além do texto processual, as decisões judicias também
são construídas observando-se a jurisprudência;
(iv) a existência de normas estruturadas a partir de cláusulas gerais – como ocorre
no sistema de tutela de urgência –, possibilitando a adaptabilidade e flexibilização
interpretativa quanto ao caso concreto;
(v) a importância da estabilidade, com a elaboração de padrões interpretativos –
pautas de conduta –, tendo em vista a exigência por segurança jurídica.
(vi) a compreensão do processo – seus princípios, estrutura, metodologia,
institutos jurídicos e finalidade – a partir do plano constitucional.
(vii) a construção do direito fundamental à efetividade da jurisdição.
6
Isto destaca a importância das reflexões acerca da tutela de urgência, sua
finalidade e seu impacto – efeitos – na realidade conduzida pelo processo.
Entendeu-se que, dentre os possíveis temas processuais que reivindicam estudos,
as situações que envolvem os efeitos negativos do tempo no processo e o risco da ocorrência
de dano ao direito que se objetiva proteger, mereceu atenção.
Como suscitou-se, o questionamento “o que é ser efetivo?” acompanhará os
assuntos tratados neste trabalho, na missão de compreender se atividade jurisdicional detém
um arsenal de técnicas processuais suficientes para a devida proteção dos direitos e capaz de
garantir um processo efetivo.
1.2 Dimensão da atividade jurisdicional
As relações existentes entre particulares e as relações entre particulares e o Estado
reivindicam a observância de limites e possibilidades no exercício e na proteção de direitos.
Portanto, este tráfego jurídico pode ocorrer quando do exercício de algumas das
atividades fundamentais ao Estado de Direito – atividade legislativa, atividade
executiva/administrativa e atividade jurisdicional –, ou quando particulares se relacionam
transacionando valores e exercendo atividades na medida que acreditam que lhe é de direitos.
Contudo, quando o exercício dessas atividades se constitui capaz de violar um
direito – existindo um conflito de interesses –, exige-se a manifestação da atividade
jurisdicional, com a finalidade de resolver os conflitos e garantir a estabilidade na sociedade.
A dimensão da atividade jurisdicional é fundamentalmente delineada nestes
termos, como realizadora da ordem jurídica e da estabilidade social, elementos que garante a
edificação e harmonização entre os três poderes, assim como a segurança da vida em
sociedade.
Por isso mesmo que a atividade jurisdicional não se confunde com o mero
exercício funções. Nestes casos, existe a divisão de trabalho para garantir a sua realização – é
técnica para a prática de uma atividade –, ao passo que, quando referem-se à separação de
poderes almeja-se a garantia das liberdades – é escolha política.1
1 “Pode haver função sem poder e nunca poder sem função. Função é faculdade e o ato de proceder dentro das
leis. Poder é, além de função, a faculdade de operar por delegação directa da soberania. DÓRIA, Antônio
Sampaio. Direito Constitucional. São Paulo, Max Limonad, 1958, 4ª. ed. vol. I, tomo I, página. 272.
7
A separação de poderes, na qual se destaca o “poder de julgar”, confere ao Poder
Judiciário a missão controladora, com o objetivo de garantir a liberdade. Em um contexto
mais atual, a missão do Poder Judiciário não se limita tão somente a controlar o exercício do
poder estatal ou as relações entre particulares, mas também garantir a eficácia dos direitos
fundamentais.
Neste raciocínio, o exercido da atividade jurisdicional – dotada do poder de julgar
–, é realizada por meio da prática de diversas funções para o cumprimento da missão
destinada ao Poder Judiciário, sendo que estas funções são concretizadas por atos
devidamente regulados por lei.
Esta é a razão pela qual, reconhecida a importância da atividade jurisdicional, por
exercer controle tanto sobre as relações existentes nos ambientes privados, quanto nos
ambientes públicos – quando conflituosas –, elaborou-se um instrumento pelo qual o Poder
Judiciário exerceria sua atividade, sendo o mesmo composto por mecanismos garantidores do
exercício do direito de estar em juízo, técnicas de proteção efetiva de direitos e meios que
submetam os atos jurisdicionais a um controle.
E o instrumento pelo qual esses atos e direitos são exercidos em torno da atividade
jurisdicional é pensado na figura do processo, como método institucional de resolução de
conflitos.
Na verdade, e isso evidencia-se durante o ensaio, mais que resolver conflitos,
atualmente o processo deve ser pensando como instrumento apto a concretizar de direitos,
pois do que serve uma decisão que aponte quem é o detentor direito, se o bem da vida que
deveria ser protegido foi perdido?
Isto esclarece a atual postura do estudo na ciência processual, ocupando-se na
reflexão sobre a tutela jurisdiciona efetiva, pois ao Poder Judiciário não se destina somente a
missão controladora e resolutiva de conflitos, mas também a missão protetiva de direitos.
1.3 Estudos do processo e superação de paradigmas
O processo é instrumento idôneo pelo qual, com o exercício da atividade
jurisdicional, objetiva-se solucionar conflitos de interesses e garantir a estabilidade social,
estabelecendo proteção aos direitos.
8
As normas jurídicas materiais têm o desígnio de indicar à sociedade os princípios
e as regras que devem reger, espontaneamente, as relações existentes, estabelecendo-lhe
harmonia.
No entanto, o conflito de interesses daqueles que integram a sociedade é
inevitável, e o processo, resguardado de seu aparato técnico, tem por finalidade direcionar o
exercício da atividade jurisdicional à solução das controvérsias, com finalidade precípua de
restabelecer a harmonia social e a proteção do bem da vida objeto da lide.2
Transpor a finalidade de “proteção de direitos” ao lado da finalidade de
“resolução de conflitos” – ou resolução de lides, ou solução de controvérsias – quando nos
referimos ao processo, tem utilidade e adquire relevância no presente estudo pois, tendo em
vista que um dos objetos analisado é a efetividade, o exame da tutela de urgência perpassa
pela necessidade de conferir a adequada proteção a direitos.
Conceituar o processo como instrumento à disposição dos litigantes, pelo qual
deve se realizar a atuação da atividade jurisdicional e administração da justiça, ou seja, sendo
método institucional de resolução de lides3, como sustentam Teresa Arruda Alvim Wambier e
José Miguel Garcia Medina, já seria suficiente.
Todavia, a escolha feita neste ensaio foi a de compreender a proteção efetiva dos
direitos como desígnio do processo, por concordar que as regras relacionadas a este método
devem ser interpretadas de modo a que a sua finalidade seja concretizada do melhor modo
possível.4
Cumprir sua finalidade do melhor modo possível significa ser efetivo, sendo que,
para o processo, isto ocorre quando seus escopos são observados e quando este método
constitui-se apto a realizar materialmente os direitos subjetivos, analisando o contexto (ou
ambiente) no qual esses direitos se inserem, as relações e trafego jurídico ao qual os mesmos
são submetidos e as variações sociais. Assiste-se, assim, o entendimento de Teresa Arruda
Alvim Wambier e José Miguel Garcia Medina:
A controvérsia, a ser solucionada à luz do ordenamento jurídico, emerge da
sociedade, motivo pelo qual o processo deve ter a aptidão para realizar
2 Entende-se por lide o conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida ou insatisfeita, conceito
apresentado pela doutrina italiana à doutrina brasileira do direito processual civil. CARNELUTTI, Francesco.
Instituições do processo civil. trad. Adrián Sotero de Witt Batista. vol. 1. Campinas: Servanda, 1999. p. 78. 3 MEDINA, José Miguel Garcia. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Processo Civil Moderno: parte geral e
processo de conhecimento. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 30. 4 Neste sentido, “o escopo do processo é a solução de controvérsias, devendo as regras relacionadas a este
método sem interpretadas de modo que es finalidade seja alcançadas do melhor modo possível”. MEDINA, José
Miguel Garcia. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Processo Civil Moderno: parte geral e processo de
conhecimento. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 30.
9
materialmente os direitos subjetivos amoldando-se à variações sociais. Tem-se,
diante disso, que o ponto de partida do estudo do processo civil consiste na
compreensão da controvérsia social que haverá de ser solucionada.5
Reconhecendo essas variações sociais, assim como seus impactos e exigência no
processo, a atenção dos estudos processuais se voltaram para além da compreensão da técnica
processual e a sua aplicação para solucionar controvérsias, mas também para a necessidade de
pensar um processo que realize concretamente os direitos.
Hodiernamente, a constante transformação da sociedade tem proporcionado o
surgimento e variação de interesses, personagens e direitos a serem protegidos, por
conseguinte outros conflitos a serem solucionados. Nesta perspectiva, o ordenamento jurídico
deve se mostrar capaz de responder às estas situações trazidas, por ser regente das relações
sociais. Assim, frente outra realidade social, o Direito obriga-se a adequar suas normas
materiais e processuais com a finalidade de concretizar a harmonia, garantindo a tutela dos
direitos.
A tutela jurisdicional deve observar as mudanças ocorridas na sociedade, para que
possa, efetivamente, viabilizar a proteção dos direitos.
Atento a esses fenômenos sociais, o estudo do processo civil vivenciou relevante
transformação, principalmente no que data a segunda metade do século XX. O que ocorreu,
nas palavras do Luiz Guilherme Marinoni6, foi uma rebelião da prática contra o processo
civil.7
Com o intuito de se constituir como ciência e dotar-se de autonomia, o processo
civil propôs um isolamento frente ao direito material. Ora, é atualmente a distinção entre o
direito processual e o direito material é evidente, constatando-se a confusão feita pela escola
sistemática do processo, entre a suposta autonomia e a indiferença8.
5 MEDINA, José Miguel Garcia. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Processo Civil Moderno: parte geral e
processo de conhecimento. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 31. 6 MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos, São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010. ps. 62 - 65. 7 Também compreendendo as transformações ocorridas nesse momento, “houve intensas alterações
socioeconômicas nas últimas décadas do Século XX e no princípio do atual, que repercutem no Direito, e
inexoravelmente na estrutura do processo. Nesse período – que coincide com o surgimento da Constituição
Federal de 1988, e, antes, do CPC (em 1973) e com as dezenas de reformas legislativas que este Código sofreu –
a sociedade se desenvolveu e se diversificou intensamente, o que gerou o surgimento de valores que fizeram com
que muitos dos princípios sociais tido anteriormente como “verdadeiros” se tornassem obsoletos”. MEDINA,
José Miguel Garcia. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Processo Civil Moderno: parte geral e processo de
conhecimento. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 31. 8 MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos, São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010. ps. 62 - 65.
10
Mas esta diferenciação entre direito processual e direito material nem sempre foi
evidente, sendo fundamental o papel desempenhado pela escola sistemática do processo em
delinear os limites entre um e outro.
Entretanto, ao almejar a autonomia científica, os processualistas tornaram-se
indiferentes ao direito substantivo, desconsiderando assim as variações na realidade social.
Este equívoco é manifesto, posto que dotar de autonomia o processo civil “não significa que
ele possa ser neutro ou indiferente às variadas situações de direito substancial. (...) Autonomia
não é sinônimo de neutralidade e indiferença”.9
Esta desconsideração por muito tempo deixou de ser notada, isso porque o
processo civil clássico respondia às exatas aspirações do Estado Liberal-Clássico, e a sua
preocupação com a liberdade do cidadão. O isolamento garantiu a apenas alguns grupos a
proteção de seus direitos, assim como manteve a ação do Estado distante da esfera dos
direitos individuais e, consequentemente, alheio às questões que envolviam as relações entre
particulares.
Como bem tratou Marinoni, tinha-se um processo civil preocupado com a
liberdade do cidadão, dando ao juiz um papel residual e de mero aplicador das regras
especificamente tipificadas. A ampla defesa e o contraditório, no mesmo sentido, não eram
vistos como direitos de provar o seu direito, e sim armas contra o arbítrio do juiz. Impôs-se
um mito da necessidade de uniformidade procedimental, ocasionando a despreocupação à
existência de desigualdade entre as posições sociais e os bens discutidos. O ilícito era
confundido com o dano, demonstrando que a busca não era pela proteção do direito, e sim
pelo ressarcimento pecuniário frente a prática do dano. Inexistiam tutelas verdadeiramente
manejáveis contra o ilícito, somente tutelas ressarcitórias, que ao fim não protegiam o direito,
somente resumiam o dano ao seu valor econômico.10
Neste rumo, o processo civil mostrava-se adequado a um Estado Liberal-Clássico,
pois, de fato, era um instrumento capaz de reger os conflitos de interesses daquela sociedade,
e harmonizá-la nos acordes liberais.
Afirma Marinoni que o intuito de constituir uma ‘ciência’ neutra, ocasionou o
isolamento entre o processo civil e a realidade social”11
. Entretanto, outras notas ingressaram
9 MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos, São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010. ps. 43. 10
MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos, São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010. ps. 62 - 65. 11
MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos, São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010. p. 64.
11
nesta realidade, e a ciência neutra do processo civil mostrou-se incapaz reger harmonicamente
as relações sociais e solucionar os conflitos.
A realidade posta ao Direito reclamava instrumentos verdadeiramente idôneos a
solucionar suas relações conflituosas e, assim, tutelar adequadamente as relações sociais e as
variáveis dos direitos. Esta realidade trouxe ao Poder Judiciário outros personagens que se
afirmavam detentores de direitos, assim como diversas relações conflituosas, dentre os quais
se discutiam direitos como os atinentes à propriedade intelectual sobre bens imateriais e seus
originadores12
.
Em razão dos motivos aludidos, considerável parte da doutrina processual e
jurisprudência têm adquirido um perfil conformador das normas de caráter processual à
realidade social, e, por consequência, refletindo sobre a adequada proteção desses direitos que
cada vez mais se incluem nas relações sociais, como são os relativos à propriedade intelectual.
Arruda Alvim enfatiza este movimento de conformação das normas processuais
ao refletir sobre a mutação da tutela jurisdicional, quando se passa a estabelecer que esta
corresponda às exigências da realidade social. Este fenômeno é adequadamente representado
pela construção da tutela de urgência no direito brasileiro. Segundo o autor, esta evolução
“envolve, além da alteração de valores no âmbito do processo [...], uma alteração no próprio
modo de encarar a lei e o direito.”13
A alteração de valores exigiu um processo efetivo, com técnicas processuais que
viabilizassem a realizam concreta dos direitos subjetivos. A tutela urgência é um dos
exemplos mais paradigmáticos desta característica do atual estudo do processo civil, com a
elaboração de um microssistema processual de proteção dos direitos que se encontram em
situações risco de dano irreparável ou de difícil reparação – situações de urgência.
Já a alteração do modo de encarar a lei e o direito é elemento essencial nessa
transição de pensamento do processo civil pois. Na medida em que a solução jurídica não é
mais facilmente identificável na letra do texto processual, exigindo a interpretação e aplicação
de princípios, conceitos vagos, cláusulas gerais para a adequada proteção dos direitos
debatidos, juízes, tribunais e as suas decisões conquistam um papel ainda mais relevante no
processo e no sistema jurídico: ajustar a interpretação dessas normas à realidade e colaborar
para a harmonização do sistema com a estabilização interpretativa.
12
A terminologia “originador” é utilizada por Denis Borges Barbosa (2009) quando se refere àquele que tem
função de criação intelectual. 13
ALVIM, Arruda. A Evolução do Direito e a Tutela de Urgência. In ARMELIN, Donaldo (coord.) Tutelas de
Urgência e Cautelares. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 157.
12
Sendo assim, o ajuste das normas à realidade é exatamente a conformação na
interpretação do direito e sua aplicação ao caso concreto. Explica Scapinella Bueno que:
O direito precisa ser interpretado para ser aplicado. Ele serve para ser interpretado e
aplicado. É como se dissesse, sem muito exagero, que não há, propriamente,
‘direito’ sem sua interpretação e sem sua específica aplicação aos casos concretos.14
Se a composição dos dispositivos legais que referem-se à tutela de urgência
ocorre por meio da utilização de conceitos vagos, como risco de dano irreparável ou risco de
dano de difícil reparação, exige-se a interpretação do texto, sendo que o direito à aplicação
da técnica processual ocorrerá se analisado o caso concreto, observando-se o ambiente
decisional, o contexto probatório e as exigências do direito substantivo, verificar-se uma
situação de urgência.
Estas alterações repercutiram na ciência processual, acarretando a reflexão sobre
alguns paradigmas, transformação essa identificada por Marinoni como a rebelião da prática
contra o processo civil clássico15
.
Assim, a ciência do Direito Processual passou por um “movimento de
estruturação”, no qual refletiu-se sobre a investigação do seu objeto científico, as normas que
determinavam a organização do Poder Judiciário e as técnicas de realização do Direito através
da atividade jurisdicional. Sobre construção do Direito Processual como ciência, Aroldo
Plínio Gonçalves leciona que:
essa realidade normativa, dada pelas leis que organizam e disciplinam a jurisdição e
o instrumento de sua manifestação, o Direito Processual – enquanto ciência, na
acepção de atividade que produz conhecimento – trabalha, elabora seus conceitos,
unifica pontos dissociados e fragmentados, descobre semelhanças não aparentes em
seu campo de investigação, desenvolve sua tarefa de racionalização, de construção,
reúne, no mesmo conjunto, normas, pelos critérios específicos da conexão da
matéria, criando, assim, categorias e institutos jurídicos, e organiza, a partir desses
dados, os campos de seu desdobramento que podem, sob o aspecto didático-
metodológico, constituir-se em novas disciplinas autônomas. 16
Tal “movimento” possibilitou a construção do que a doutrina contemporânea
denomina como processo civil constitucional, ou nas palavras de Cassio Scapinella Bueno,
14
BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual
civil. 4ª. Ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010. p. 99. 15
O sobredito autor segue elencando que este é o espaço para técnicas processuais inovadoras, como as
referentes ao processo coletivo, à especialidade da Justiça, e as de caráter diferenciado. MARINONI, Luiz
Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. ps. 62 -
65. 16
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Belo Horizonte: Del Rey, 2012. p. 38.
13
“modelo constitucional do direito processual civil”, compreendendo a importância a
compatibilização entre os resultados objetivados por meio do processo e a técnica processual
utilizada, com a finalidade de realizar os direitos fundamentais tais quais como assegurados
no pano constitucional.17
Neste raciocínio:
o estudo contemporâneo do direito processual civil caracteriza-se pelo máximo
equilíbrio entre os “resultados do processo” e a “técnica processual”. Este tema, que
tem assento expresso na Constituição Federal, extrapola, por isto mesmo, sua
concepção como mera “proposta filosófica de estudar o processo civil”.18
O “equilíbrio” entre os resultados do processo e a técnica processual, é mais que
uma metodologia de estudo no direito processual civil, estabelecendo-se como elemento
essencial para a realização dos direitos fundamentais por meio da atividade jurisdicional,
tendo com paradigma a Constituição Federal.
1.4 Técnica processual e tutela dos direitos
As técnicas processuais são “mecanismos” existentes no processo – observado
como método – que possibilitam a realização da tutela dos direitos.
Se não existiam técnica processuais idôneas para tutelar alguns direitos, como os
relacionados à propriedade intelectual, a realidade social e as relações que envolviam tais
direitos estabeleceram que os juristas propusessem técnicas alternativas para suprir essas
exigências.
Não obstante, a doutrina e a jurisprudência apresentaram algumas estratégias
processuais para tutelar os direitos de propriedade intelectual, dentre esses o direito de marca.
Entretanto, estas estratégias não atingiram uma dimensão suficiente para amparar
efetivamente aqueles direitos em outras várias situações de riscos, principalmente aquelas que
solicitavam uma proteção urgente.
Atento a essas lacunas e visando respeitar a designação do legislador
constitucional em garantir a proteção dos direitos em situações de lesão ou ameaça de lesão ao
direito, proteção esta viabilizada por meio da atuação do Poder Judiciário, o legislador
17
BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual
civil. vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 88. 18
BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito
processual civil. vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 93.
14
infraconstitucional apresentou técnicas processuais audazes para proteger os direitos de
marca: as técnicas processuais realizadoras da tutela de urgência.
Marinoni entende que o processo é composto por todo o aparato técnico destinado
atingir a sua finalidade: a tutela dos direitos. Se as técnicas processuais são os mecanismos
utilizados pelo processo com a finalidade de tutelar os direitos, estas devem ser próprias à
aplicação na realidade social da qual o processo é o instrumento de solução de conflitos.19
Ressalta-se, assim, o sentido da advertência as técnicas processuais devem estar
adaptadas às diferentes modalidades de tutela de direito. Sendo assim, para a aplicação de
uma ou de outra técnica processual, não é suficiente apenas fazer alusão ao fenômeno da
interpretação do direito, realizado pelo jurista.
A solicitação de uma ou outra técnica processual, assim como a aplicação de um
ou de outra, é tarefa que vai além do ato de interpretação, sendo essencial compreender o que
se objetiva como resultado – tutela jurisdicional de um direito – e a “técnica processual”
adequada para cumprir este objetivo. E a escolha da técnica processual adequada solicita a
análise do ambiente no qual o direito material está imerso, assim como de suas características.
Scarpinella Bueno afirma que ser importa:
compreender que todas as vicissitudes, dificuldades e valores que habitam o plano
material são transportados, de uma forma ou de outra, para o plano do processo,
fazendo com que estes dois planos do ordenamento jurídico (o material e o
processual) comuniquem-se e alimentem-se necessariamente. Diversos institutos
processuais civis só têm sentido, é esta a grande verdade, quando analisados à luz do
plano material. É importantíssimo, destarte, que o estudo do direito processual civil
tenha consciência de que o plano material lhe diz respeito também e influencia, de
forma mais ou menos tênue, consoante o caso, o próprio “ser” do direito processual
civil.20
No mesmo entendimento, Marinoni aconselha que os procedimentos, as decisões
e os meios executivos – a aplicação das técnicas processuais –, não podem ser neutros, não se
facultando pensá-los à distância da tutela dos direitos, e, por consequência, da realidade
social.21
Apreciando a expressão técnica processual, Bedaque considera inclusos nesta
tanto o momento de formulação da norma quanto o de interpretação, e ainda o método de
19
MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010. p. 112
20 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual
civil. vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 81. 21
MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010. P. 112.
15
lecionar o direito processual22
. Desta perspectiva, a técnica processual manifesta-se em três
planos: elaboração, conhecimento e interpretação.
Noutra perspectiva, Robson Renaut Godinho vislumbra a existência de dois
planos: o que propõe a técnica disponível para a tutela de direitos e o que propõe o correto
manejo das regras processuais pelos sujeitos presentes. Leciona o autor que a consagração da
técnica como amoldada à realidade social realiza-se, no primeiro plano, com a disponibilidade
de técnicas a tutelar os direitos, respeitando as especificidades destes, e no segundo plano,
com o manejo acertado agentes no processo, as partes, o juiz, e quem mais venha a integrá-
lo.23
Sem nenhum deslustre aos critérios distintivos expostos, admitir-se-á ambos,
sendo que o elemento em comum é a apreciação da técnica processual adequada a tutelar os
direitos: ajuste da técnica processual às exigências do direito.
1.5 Princípios processuais relevantes nos litígios envolvendo direitos de marca
1.5.1 Efetividade: exigência de uma tutela jurisdicional verdadeiramente protetiva
A tutela jurisdicional possibilita a quem se encontram em situações conflituosas,
a “proteção” de um direito ou de uma situação jurídica, por meio da via jurisdicional. Este
fenômeno caracteriza a atuação do Direito nos casos concretos submetidos ao exame do Poder
Judiciário.24
Desde logo, deve-se esclarecer que o resultado da tutela jurisdicional - que
protege um direito ou uma situação jurídica – direciona-se a quem está respaldado no plano
material. Neste raciocínio, protege-se o direito ou a situação jurídica de quem deveria tê-los
sob proteção no plano material, mas que não os teve e por isso almeja a proteção a partir do
exercício da jurisdição, no plano processual.
22
BEDAQUE, Jose Roberto dos Santos. Efetividade do Processo e Técnica Processual. 3ª ed. Rio de Janeiro:
Malheiros, 2010. p. 75.
23 GODINHO, Robson Renaut. Tutela Jurisdicional Diferenciada e Técnica Processual. In. Temas Atuais da
Tutelas Diferenciadas: obra em homenagem ao Professor Donaldo Armelin. São Paulo: Saraiva, 2010.
24 Assim, tutela jurisdicional tem o significado de proteção de um direito ou de uma situação jurídica, pela via
jurisdicional. Implica prestação jurisdicional em favor do titular de uma situação substancial amparada pela
norma, caracterizando a atuação do Direto em casos concretos trazidos à apreciação do Poder Judiciário. É o
estudo da técnica processual a partir do seu resultado e em função dele. BEDAQUE, José Roberto dos Santos.
Direito e Processo. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 37 e 38.
16
Inseridos no processo, pode-se afirmar que todos detêm suas garantias processuais
para o devido exercício de atos na realização de direitos – direito de agir, direito de se
defender, direito de utilizar todos os meios e provas, direito de recorrer etc. Mas a tutela
jurisdicional é garantida apenas àqueles que demonstrarem o respaldo no plano material,
devendo ser este suficiente para que seja concedida a proteção do direito ou da situação
jurídica debatidos.
Nesta concepção, Flávio Luiz Yarshell leciona que a locução tutela jurisdicional
“designa o resultado final do exercício da jurisdição estabelecido em favor de quem tem razão
(e assim exclusivamente), isto é, em favor de quem está respaldado no plano material do
ordenamento.”25
Sendo assim, se a tutela jurisdicional é concedida no plano processual àquele que
detém fundamentado respaldo no plano material, esta “proteção” deve ser realizada com
efetividade.
Bedaque adverte que “a efetividade da tutela jurisdicional depende muito da
sensibilidade do jurista, principalmente do estudioso do direito”26
, na missão de construir um
instrumento adequado à realidade social na qual a atividade jurisdicional é realizada.
Esta sensibilidade mencionada corresponde à reivindicação de um processo
aproximado às exigências dos direitos e das situações jurídicas que pretende-se proteger.
Diante disto, sendo o processo o método pelo qual a tutela jurisdicional
desenvolve-se, este instrumento deve ser apto a proporcionar a realização íntegra (ou o mais
próximo possível dessa integridade) dos direitos, assim cumprindo exatamente sua finalidade.
E se o processo cumpre a sua finalidade, considera-se efetivo.
Com a lucidez que lhe é característica, Barbosa Moreira se debruça sobre o
significado da expressão efetividade do processo, questionando:
Que é que se quer dizer quando se fala em um processo efetivo? Efetivo é sinônimo
de eficiente. Penso que a efetividade, aqui, consiste na aptidão para desempenhar, do
melhor modo possível, a função própria do processo. Ou, noutras palavras, talvez
equivalentes, para atingir da maneira mais perfeita o seu fim.27
25
YARSHELL, Flávio Luiz. Tutela jurisdicional. 2. Ed. São Paulo: DPJ Editora, 2006. p. 24. 26
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e Processo: influência do Direito Material sobre o Processo.
São Paulo: Malheiros, 2011. p. 42. 27
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A efetividade do processo de conhecimento. Revista de processo, n.
74, p. 126-137. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, abr.-jun. 1994. p. 128.
17
Em semelhante entendimento, e a teor de oportuno juízo, Dinamarco adverte que,
“falar em efetividade do processo e ficar somente nas considerações sobre o acesso a ele,
sobre o seu modo-de-ser e a justiça das decisões que produz significaria perder a dimensão
teleológica e instrumental de todo o discurso.”28
Tratar da efetividade do processo exige o alinhamento entre os resultados e a
técnica processual escolhida, assim como cumprir sua finalidade como método institucional
de solução de conflitos e protetor de direitos. Sendo o método de atuação efetivo, a proteção
almejada via atividade jurisdicional será adequadamente desempenhada, assim podendo se
afirmar que a tutela jurisdicional também é efetiva.
A norma que anuncia o princípio da efetividade encontra-se no art. 5º, XXXV da
Constituição Federal de 1988, expressando que “a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
Observa-se que, seja utilizado referindo-se ao processo, seja utilizado referindo-se
à tutela jurisdicional, o emprego do princípio da efetividade exige que o método pelo qual o
Poder Judiciários exerce sua atividade – plano processual – seja apto a proteger direitos e
situações jurídicas daqueles que estão amparados no plano material.
Como sustenta Carlos Alberto Siqueira Castro, a norma constitucional em
comento não se limita em garantir o acesso ao Poder Judiciário. Vai além, concedendo o
direito de exigir junto ao Poder Judiciário a proteção dos direitos fundamentais29
. Aponta em
sua inferência que, com a previsão constitucional deste direito “ter-se-á restaurada a nossa
mais lídima tradição constitucional, que a rigor nunca deveria ter sido interrompida.”30
Na medida em que o dispositivo constitucional afirma que a ordenamento jurídico
não pode excluir do Poder Judiciário o desígnio de apreciar a lesão ou ameaça de lesão ao
direito, deduz a missão de disponibilizar normas processuais que possibilitem a realização
desta ordem emanada da Constituição Federal.
Ao se ocupar dos direitos de marca, a lesão ao direito poderia simplesmente ser
apreciada em demandas ressarcitórias – com a ocorrência do dano. Contudo, neste caso, o
ressarcimento muitas das vezes é insuficiente para a realização concreta do direito de
exclusividade e os danos ocorridos nem sempre pode ser exatamente mensurado.
28
DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do Processo. Rio de Janeiro: Editora Malheiros,
2009. p. 351. 29
CASTRO, Carlos Roberto Siqueira. O Devido Processo Legal e os Princípios da Razoabilidade e da
Proporcionalidade. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010. p. 307. 30
CASTRO, Carlos Roberto Siqueira. O Devido Processo Legal e os Princípios da Razoabilidade e da
Proporcionalidade. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010. p. 307.
18
Mas se a apreciação comportar a ameaça ao direito, como por exemplo, em casos
em que os atos de contrafação estão na eminência de ocorrer, ou já ocorrida a lesão ao direito,
ainda não produziram dano em face do bem da vida, a realização do direito aproxima-se ao
máximo de sua integridade. Nestes casos, a tutela inibitória e a tutela de remoção do ilícito
são as mais adequadas à aplicação, e as tutelas de urgência (cautelar ou satisfativa) servem de
suporte à tutela jurisdicional.
Destarte, se incumbe ao Estado-Juiz tutelar os direitos quando há a possibilidade
destes serem agredidos ou quando já houve a ocorrência desta agressão. Nota-se, então, que a
dimensão da tutela jurisdicional não se limita à ocorrência ou não do dano, mas se expande à
proteção do direito contra possível lesão, ou mesmo o restabelecimento da ordem jurídica
caso já tenha ocorrido esta lesão ao direito.
A lesão ou ameaça de lesão, neste contexto, são atos contrários ao direito,
distinguindo-se substancialmente do dano. O ato contrário ao direito, se não suficientemente
suprimido, constitui-se capaz de acarretar o dano.
Por isso se afirmar que a tutela jurisdicional para ser designada como efetiva não
pode se restringir apenas à ocorrência ou não de dano. Ao contrário, preocupa-se
precipuamente em combater o ato atentatório ao direito e consequentemente impedindo a
ocorrência do dano.
É que não basta garantir o ressarcimento pela prática de um ato de contrafação de
marca, deve-se inibir ou remover o ato de contrafação para se realizar o direito de
exclusividade.
Portanto, mesmo aplicando-se uma tutela ressarcitória referente aos danos
possivelmente ocasionados, preexiste a necessidade de uma tutela contra o ilícito. O
ressarcimento quanto ao dano cometido poucas vezes (para não correr o risco de se afirmar
que nunca) é suficientemente capaz de restabelecer o status de proteção a um direito; é apenas
uma compensação.31
Por isso é que, ao titular do registro de marca, além do ressarcimento, lhe é
conferido o direito de inibir ou remover o ato ilícito, sem a necessidade de referir-se ao dano.
A proposta de uma tutela jurisdicional efetiva é construída na ideia de proteção dos direitos –
31
Marinoni, lecionando sobre o assunto, explica esta distinção tendo em pauta o direito de marca. Ilustra a
utilização da busca e apreensão de produtos contrafeitos quanto à marca e a remoção de propaganda que
conformam concorrência desleal. MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos, São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. ps. 53 e 54.
19
proteção contra atos ilícitos –, consequentemente, não dependendo da existência ou
possibilidade de ocorrência de dano32
.
Esta é a razão de desvincular a aplicação de uma tutela jurisdicional à figura do
dano, viabilizando a ampliação das situações em que essa proteção pode ser conferida.
Assim concluindo, em um conflito de interesses o que objetiva é a proteção do
direito fundamental existente, suprimindo o ato ilícito e consequentemente a possibilidade
manifestação de dano.
1.5.2 Razoável duração do processo: critérios para uma celeridade adequada
É oportuno apontar um princípio que guarda estreita relação com a proposta da
tutela jurisdicional efetiva: duração razoável do processo.
Este é apresentado no art. 5º, LXXVIII da Constituição Federal, explicitando que
“a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do
processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.
A exigibilidade de uma tutela razoavelmente tempestiva enseja a necessidade de
uma distribuição da carga temporal do processo, não se aceitando que apenas uma das partes
suporte seus efeitos negativos. Destarte, concebe-se que na vigente sistemática, sensível à
realidade social na qual é aplicada, deve haver uma racionalização temporal do processo,
como ônus tanto para as partes que o integram, quanto uma obrigação do juiz que o
administra.
Importa ressaltar que uma das formas de concretização deste dispositivo
constitucional, que preza pela razoável duração do processo, foi a edificação das técnicas
processuais realizadoras das tutelas de urgência – cautelares ou satisfativas –, caracterizadas
por conferir celeridade às prestações jurisdicionais, ao mesmo tempo que garante segurança.
Aferir a “razoabilidade da duração do processo” exige a adoção de critérios
objetivos e sua verificação em hipóteses concretas. Nelson Nery Junior aponta como critérios:
a) a natureza do processo e a complexidade da causa; b) o comportamento das partes
e de seus procuradores; c) a atividade e o comportamento das autoridades judiciárias
e administrativas competentes; d) a fixação legal de prazos para a prática de atos
processuais que assegure efetivamente o direito ao contraditório e ampla defesa.33
32
MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos, São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010. ps. 53 e 54. 33
NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo na Constituição Federal: processo civil, penal e
administrativo. 9ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 316.
20
No mesmo sentindo, analisando a orientação firmada pela Corte Européia dos
Direitos do Homem, consolidada e aplicada no famoso caso Capuano em 1987, José Rogério
Cruz e Tucci idêntica três critérios que devem ser observados quando da apreciação do limite
razoável da duração de um processo, a saber: “(i) a complexidade do assunto; (ii) o
comportamento dos litigantes e de seus procuradores; e (ii) a atuação do órgão
jurisdicional”.34
Isto torna-se perceptível se aplicarmos estes critérios aos processos que ocupam-
se de situações envolvendo direitos de propriedade intelectual, por exemplo, onde faz-se
necessário aplicar de forma acessória as medidas de urgência, como suporte à inibição e
remoção de ilícito, ou ressarcimento pela ocorrência de dano.
A complexidade das causas que envolvem os direitos de marca muitas das vezes
impõe dilação probatória, com a realização de perícia técnica para se verificar se ocorreu ou
não o ato de contrafação, se o ato concorrência pode ser considerado desleal, qual a extensão
dos danos causados por esse impacto à empresa ou detentor dos direitos de exclusividade.
Nestas situações em que a complexidade do caso seja maior, exigindo uma análise
detida e mais demorada das questões de fato e questões de direito, a razoabilidade da duração
do processo transita pelo tempo exigido para adequada compreensão dos elementos
apresentados.
Visando compensar esta demora e evitar os efeitos negativos do tempo no
processo, apresenta-se a tutela de urgência como instrumento apto a garantir a proteção do
direito.
No que se refere o comportamento das partes e de seus procuradores no processo
civil, os mesmos devem comportar-se com diligência normal, sem obstruir o trânsito regular
do processo, fazendo uso excessivo de técnicas processuais ou lançando mão de manobras
com o intuito evidentemente protelatórios; pelo contrário, devem colaborar para a resolução
tempestiva e suficiente do litígio em questão, agindo com lealdade35
no processo.
Com o intuito de desestimular e combater estas atitudes, podemos elencar técnicas
processuais de suporte como as multas coercitivas contra atos atentatórios à dignidade da
34
CRUZ E TUCCI, José Rogério. Tempo e processo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1997. p.69. 35
Sergio Bermudes afirma que “as partes encontram-se vinculadas umas às outras, e todas ao Estado, pelo
princípio da lealdade processual, de intenso conteúdo moral, que determina a elas observar a verdade, conduzir-
se com boa-fé, não praticar atos protelatórios. BERMUDES, Sergio. Introdução ao processo civil. 5. Ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2010. p. 109.
21
justiça e para o cumprimento das decisões judicias, assim como medidas punitivas em casos
em que se evidencie atos protelatórios ou excessivos das partes.
Quanto à atividade e comportamento das autoridades judiciárias, deve-se ter em
vista a exigência da prestação eficiente do serviço jurisdicional. Sabe-se que no processo o
juiz exerce atividade decisória, mas também realiza atividades de direção e administração,
devendo garantir a resolução rápida – razoavelmente tempestiva – do litígio.
Todavia, deve o juiz não somente dirigir o processo, no sentido de encaminhá-lo
para o fim na tentativa de solucionar o litígio, como também administrar os interesses, direitos
e situações que estão em pauta.
Administrar também significa proteger os direitos e situações jurídicas debatidas,
o que pode ser vislumbrado, por exemplo, quando o juiz vale-se do poder-dever de cautela
para assegurar o resultado útil do processo, determinando a retirada de cartazes elaborados
com marcas contrafeitas, protegendo tanto o direito de exclusividade, quanto o consumidor,
assim adequadamente prestando tutela jurisdicional efetiva.
Observando a questão da imposição dos prazos para a prática de atos processuais,
estes devem ser proporcionais à atividade realizada e o resultado almejado, para que não se
acarrete restrição ao exercício do contraditório, ampla defesa e outros direitos relacionados à
atividade probatória.
Almejar uma solução rápida do litígio só é expediente saudável ao processo, ao
direito em questão e às partes se forem garantidos a realização razoável dos atos processuais.
Certo é que, como demonstrou-se, ao tratar do tema da tempestividade da tutela
jurisdicional, vislumbra-se a tutela de urgência e suas técnicas realizadoras como
vocacionadas a cumprir essa exigência.
A tutela jurisdicional é tempestiva quando protege o direito ou a situação jurídica
a tempo de suprimir os efeitos corrosivos do ato ilícito. Ao passo que garante-se a duração
razoável do processo quando, além de permitir a proteção tempestiva do direito, também se
garante a prática adequada nos atos processuais por quem integra o processo, verificando-se
todos aqueles critérios objetivos mencionados.
Portanto, deve-se ressalvar que a duração razoável do processo não estar
restritamente relacionada à existência de tutelas de urgência – e à tentativa de concretizar a
22
celeridade no processo –, mas também à “compreensão da sua duração de acordo com o uso
racional do tempo pelas partes e pelo juiz.”36
Neste sentido, Nery Junior que escreve que:
a busca da celeridade e razoável duração do processo não pode ser feita a esmo, de
qualquer jeito, a qualquer preço, desrespeitando outros valores constitucionais e
processuais caros e indispensáveis ao estado democrático de direito. (...) O que se
busca não é uma “justiça fulminante”, mas apenas uma “duração razoável do
processo”, respeitados os demais valores constitucionais. 37
A celeridade apresenta-se conjugada à razoável duração do processo tendo em
vista que, em uma realidade em que o serviço jurisdicional é prestado com demora e muita
das vezes a tutela jurisdicional apresentada é intempestiva.
Evidenciar a ideia de aceleração do processo é o viés compensador frente ao
fenômeno da lentidão da tutela jurisdicional.
A morosidade no Poder Judiciário não pode ser considerada apenas na perspectiva
do processo – como método de atuação da atividade jurisdicional –, pois é um fenômeno
também ocasionado por questões externas ao processo, como i) a estrutura administrativa dos
organismos jurisdicionais; ii) a relação entre a demanda apresentada, a sua absorção/resolução
e as etapas mortas do processo38
; iii) a capacidade de gestão processual39
; iv) custos
econômicos e políticos no aprimoramento do serviço jurisdicional; v) o desinteresse dos
governantes em modificar esta realidade de demora do processo.40
36
MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010. p. 141.
37 NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo na Constituição Federal: processo civil, penal e
administrativo. 9ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 318. 38
O que retarda intoleravelmente a solução dos processos são as etapas mortas, isto é, o tempo consumido pelos
agentes do Judiciário para resolver a praticar os atos que lhes competem. O processo demora é pela inércia e não
pela exigência legal de longas diligências. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Celeridade e efetividade da
prestação jurisdicional. In WAMBIER, Luiz Rodrigues. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Princípios e temas
gerais do processo civil. Coleção doutrinas essenciais: processo civil; v. 1. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2011. p. 308. 39
Humberto Theodoro Júnior destaca a extrema necessidade de “reforma dos serviços judiciários e no
aparelhamento de seus operadores em todos os níveis, que para solucionar conteciosamente os conflitos, quer
para estimular a busca de soluções consensuais alternativas. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Celeridade e
efetividade da prestação jurisdicional. In WAMBIER, Luiz Rodrigues. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim.
Princípios e temas gerais do processo civil. Coleção doutrinas essenciais: processo civil; v. 1. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2011. p. 315. 40
Melhorar a prestação do serviço público para melhor servir a população no que tange os processos judiciais e
administrativos tem custo econômico e político e deveria estar nas prioridades dos governantes, que, de outra
parte, têm interesse em manter o status quo da demora do processo, pelas razões aqui apontadas. NERY
JUNIOR, Nelson. Princípios do processo na Constituição Federal: processo civil, penal e administrativo. 9ª
ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 320.
23
O problema da morosidade não é diretamente (ou apenas) decorrente do processo,
como método de atuação do Poder Judiciário, mas também da situação estrutural existente,
que envolve interesses econômicos políticos. As reformas da legislação processual não são
suficientes para solucionar todos esses problemas se não existir a conjugação de esforços no
aprimoramento estrutural do Poder Judiciário, e como sustenta Humberto Theodoro Júnior, o
aprimoramento de quem irá manejar os instrumentos jurídicos.41
A advertência serve para que não se direcione os esforços almejando alcançar a
celeridade a qualquer custo – sacrificando algumas garantias no processo. A duração razoável
do processo deve ser pensada compatibilizando a celeridade, segurança e economia42
,
concretizados os valores processuais garantidos constitucionalmente.
1.5.3 Contraditório: a importância da prova no exercício dos direitos de ação e defesa
O direito fundamental à prova garante a manifestação do contraditório no
processo.43
O contraditório, por sua vez, constitucionalmente previsto no art. 5º, LV da Carta
Republicana, é um princípio que garante o exercício do direito de ação e de defesa no
processo; não o mero exercício, mais o exercício concreto e isonômico daqueles que a
legislação infraconstitucional designa como personagens atuantes na esfera processual.44
41
Sem aprimorar os homens que irão manejar os instrumentos jurídicos, toda reforma da lei processual será
impotente para superar os verdadeiros problemas da insatisfação social com o deficiente acesso à Justiça que,
entre nós, o Poder Judiciário hoje proporciona. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Celeridade e efetividade da
prestação jurisdicional. In WAMBIER, Luiz Rodrigues. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Princípios e temas
gerais do processo civil. Coleção doutrinas essenciais: processo civil; v. 1. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2011. p. 315. 42
Em consonância com a duração razoável do processo, a questão da economia processual surge também
alinhada como preceito cardeal do processo contemporâneo. Nas palavras de Sergio Bermudes, este princípio
determina dispensar a prática de atos inúteis, tendo em vista que “a jurisdição se deve exercer na medida em que
for aproveitável, não se concebendo práticas ociosas, supérfluas, desnecessárias.” BERMUDES, Sergio.
Introdução ao processo civil. 5. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p. 108. Os debates acerca do princípio da
duração razoável do processo, com a sua elevação a princípio processual constitucionalmente escrito, permite
afirmar que também a preocupação com a economia na prática dos atos processuais, assim como na prestação
da atividade jurisdicional, adquiriu valor político, indo além do valor técnico-jurídico a esse já estabelecido.
43 Sobre o contraditório, conferir BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A garantia do contraditório na atividade
de instrução. In WAMBIER, Luiz Rodrigues; ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa. (organizadores). Coleção
Doutrinas Essenciais: Processo Civil; v. 4. Atividade Probatória. São Paulo: Editora Revista dos Trinais, 2011.
pp. 1111 – 1134. 44
Sobre o direito a prova e a construção do princípio do contraditório como garantia constitucional, Egas Dirceu
Moniz de Aragão já sustentava que o contraditório como garantia constitucional abrangente ao processo em geral
(incluindo o processo civil), e não somente ao processo penal. Assim, no entendimento do autor, “certo é, no
entanto, que o princípio, embora sem status de garantia constitucional, destina-se ao processo em geral e
abrange, por isso, o processo civil, no qual deve ser assegurada aos litigantes a maior igualdade possível de
oportunidades. ARAGÃO, Egas Dirceu Moniz de. Direito à prova. In WAMBIER, Luiz Rodrigues; ARRUDA
24
Logo, Nelson Nery Júnior leciona que o texto constitucional, ao esculpir
expressamente o princípio do contraditório, quer constituir que o direito de ação e o direito de
defesa são manifestações desse princípio, mantendo direta ligação com o princípio da
igualdade das partes.45
Assim indica o texto constitucional: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes: XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito; LV - aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa,
com os meios e recursos a ela inerentes;”.
Vejamos que: (i) o caput do art. 5ª, da Constituição Federal, apresenta o princípio
da isonomia, dispondo que “todos são iguais perante a lei”, ou seja, qualquer interpretação
deve atentar-se à realização desta isonomia; (ii) o inciso XXXV sustenta o princípio da
inafastabilidade do controle judicial sobre toda e qualquer ameaça ou lesão a direito, o que
consequente viabiliza o direito de ação frente a atos ilícitos, estejam estes na iminência de
ocorrer, ocorrendo ou os que já ocorreram; (iii) e o inciso LV é a base normativa expressa do
princípio do contraditório, prevendo concomitantemente o direito de defesa e a garantia dos
meios e recursos para o seu exercício.
Neste raciocínio, podemos afirmar que: ao Judiciário incumbe a missão de
realizar a tutela jurisdicional em face das situações a esse apresentadas, estejam estas
situações referindo-se à prática de um ato ilícito na iminência de ocorrer, que esteja
ocorrendo ou que já ocorrera, contra um direito, devendo ser disponibilizados os direitos de
ação e defesa a partir da utilização de todos os instrumentos, meios e recursos a aqueles
inerentes, assim realizando o contraditório, devidamente regulamentado pelas normas do
método institucional de resolução de conflitos e pelas normas de direito substantivo,
garantindo-se a efetividade, o devido processo legal e a isonomia.
No que interessa os instrumentos disponibilizados, apontados no texto
constitucional como “meios e recursos”, estes compõe o “arsenal” com o qual aqueles que
exercem o direito de ação e defesa realizam estes direitos e, portanto, concretizam o princípio
do contraditório; deste “arsenal” podemos destacar a prova. ALVIM WAMBIER, Teresa. (organizadores). Coleção Doutrinas Essenciais: Processo Civil; v. 4. Atividade
Probatória. São Paulo: Editora Revista dos Trinais, 2011. p. 111. 45
NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do Processo na Constituição Federal: processo civil, pena e
administrativo. 9ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2009. p. 205.
25
Nelson Nery sustenta que “o direito à prova, manifestação do contraditório no
processo, significa que as partes têm o direito de realizar a prova de suas alegações, bem
como de fazer contraprova do que tiver sido alegado pela parte contrária.”46
Nesse sentido é
que podemos sustentar o direito à prova como direito fundamental, devendo, portanto, existir
quantas técnicas forem possíveis para assegurar e realizar este direito.
A análise do direito à prova como manifestação do contraditório no processo
permite afirmar que esse direito é fundamental ao exercício dos direitos de ação e defesa. Tal
constatação é importante quando verificamos as técnicas processuais de asseguração e
realização do direito a prova, pois assim se confere autonomia ao direito à prova.
Sendo assim, o direito à prova é autônomo47
e deve viabilizar a concretização do
direito de ação e defesa, bem como a manifestação do contraditório, e não necessariamente e
de forma imediata a realização do direito objeto do litígio.
O resultado final do processo não deve atrelar diretamente o exercício do direito à
prova, mesmo sabendo que em uma perspectiva mais abrangente a concretização do direito de
prova influencia o resultado final do processo.
Por isso que sustentar um direito autônomo de prova é importante, pois se
maximiza a proteção deste direito e os direitos que desse dependem (como os direitos de ação
e defesa), deixando a proteção do direito debatido em juízo a encargo de outros instrumentos
ou técnicas processuais.
Tal entendimento se torna claro a partir da compreensão de que a finalidade do
direito de prova é possibilitar o bom exercício os direitos de ação e defesa; e que, a finalidade
do direito de ação e defesa, concretizados no contraditório, é possibilitar o diálogo sobre um
direito em juízo, almejando-se a concretização do direito como resultado final do processo.
Nesta linha, o direito a prova está mais próximo dos direitos de ação e defesa, do
que do resultado final do processo e do direito a ser concretizado; não que o direito à prova
não incida no direito concretizado ao final do processo – pelo contrário, é fundamental –, mas
o faz por via do exercício do contraditório.
1.6 Eficácia dos direitos fundamentais na atividade jurisdicional
46
NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do Processo na Constituição Federal: processo civil, pena e
administrativo. 9ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2009. p. 205. 47
Em excelente e diferenciado trabalho, Flávio Luiz Yarshell sustenta o direito autônomo à prova, analisando a
técnica de antecipação da prova. Ver: YARSHELL, Flávio Luiz. Antecipação da prova sem requisito da urgência
e direito autônomo à prova. São Paulo: Editora Malheiros, 2009.
26
Dispostas estas questões, torna-se possível a análise da eficácia dos direitos
fundamentais tendo como elementos de análise a técnica processual, a finalidade da tutela
jurisdicional e a sua efetividade.
A eficácia dos direitos fundamentais pode ser vista tanto vertical quanto
horizontalmente. Como escreve Luiz Guilherme Marinoni, a eficácia vertical se trata da
vinculação do Poder Público – legislador, administrador e juiz – em concretizar os direitos
fundamentais. Já a eficácia horizontal versa sobre a gerência dos particulares em suas relações
tendo a observância obrigatória da efetividade dos direitos fundamentais.48
Estudando a eficácia vertical, invariavelmente deve-se trazer à baila a Teoria dos
deveres de proteção do Estado. Afirma-se que, para os adeptos desta teoria49
, “os deveres de
proteção derivados das normas jusfundamentais impõe aos poderes públicos um dever de
proteção aos particulares face às violações aos bens jurídicos constitucionais”, como no caso
dos bens imateriais de propriedade intelectual, “mesmo quando estes atentados consistem em
atos perpetrados por outros particulares”.50
Marinoni concorda com o pensamento exposto acima, pois indica o Estado como
destinatário dos direitos fundamentais, obrigando-se a protegê-los com a edição de normas.
Continua seu raciocínio levantando a hipótese de não cumprimento destas normas, o que
concederia a determinado particular o direito de resistir contra aquele que não respeitou a
norma e agiu ilicitamente51
. Neste caso, é dado ao particular o direito de agir, utilizando a
tutela jurisdicional como instrumento de proteção ao seu direito52
.
Portanto, na eficácia vertical dos direitos fundamentais o Estado é responsável a
disponibilizar normas idôneas à tutela dos direitos. Em que se pense a atividade jurisdicional
48
MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010. p. 132 – 134.
49 Cita, Alexandre Freire (2010), em seu estudo, que são adeptos à Teoria dos deveres de proteção do Estado
Joseth Isensee, Stefan Oeter e Claus-Wilhelm Canaris. 50
FREIRE, Alexandre Reis Siqueira Freire. Eficácia dos Direitos Fundamentais nas Relações entre Particulares.
In. RAMOS, Paulo Roberto Barbosa (coord.); RAMOS, Edith Maria Barbosa (coord.); FREIRE, Alexandre Reis
Siqueira (coord.). O Direito no Século XXI: estudos em homenagem ao Ministro Edson Vidigal. Florianópolis:
Editora Obra Jurídica, 2010. p. 24.
51 MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010. p. 133 – 134. 52
Destaca, Luiz Guilherme Marinoni, que o exercício de ação pode voltar-se contra atos de ameaça a lesão do
direito, o que se daria com o manejo da técnica inibitória. MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e
Tutela dos Direitos. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. Nas palavras de Luiz Fernando C. Pereira
2006), a inibitória é técnica vocacionada a proteção da propriedade industrial. PEREIRA, Luiz Fernando C..
Tutela Jurisdicional da Propriedade Industrial: aspectos processuais da Lei 9.279/1996. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2006.
27
atribuída ao Estado, e tendo em foco as técnicas processuias referentes a propriedade
intelectual, atualmente, disponíveis estão as tutelas autônomas contra o ilícito e as tutelas
interinais de urgência.53
No que tange a eficácia horizontal54
, existem aqueles que a vislumbram sob a
incidência mediata e outros sob a incidência imediata. Ao destacar esta diferença, Marinoni
indica que aqueles que a vêm sob a incidência mediata entendem “que a força jurídica dos
preceitos constitucionais somente se afirmaria, em relação aos particulares, por meio dos
princípios e normas do direito privado.”55
, sendo possível a influência dos preceitos
constitucionais em caráter subsidiário. Segue distinguindo que, na incidência mediata, “os
direitos fundamentais são aplicáveis diretamente em relação aos particulares”56
, incidindo em
entidades de direito privado que detenham poderes sociais, em indivíduos superiores nas
relações em contraposição de outros, por serem detentores de poder econômico social
diferenciado, e, ainda, em indivíduos comuns.
Esclarece-se que para os concordantes da incidência mediata dos direitos
fundamentais nas relações entre particulares, é negativa a aplicabilidade desses direitos nesta
modalidade de relação. Portanto, constata que para esses, os direitos fundamentais “apenas
podem incidir no comércio jurídico entre entidades privadas após a aplicação, interpretação e
integração das cláusulas gerais, bem como conceitos jurídicos indeterminados do direito
privado na medida dos direitos fundamentais.”57
. Majoritariamente, adota-se a tese da
incidência imediata daqueles direitos nas relações entre particulares.
Em análise jurisprudencial, Alexandre Reis Siqueira Freire indica esta incidência
em caso concreto envolvendo direitos de propriedade intelectual. Neste intuito, percebeu-se
que para a Ministra Ellen Gracie, Relatora do RE 201.819-8/RJ, a garantia dos direitos
fundamentais em pauta só poderia ser proposta frente atos praticados pelo Estado, ao passo
53
Esta classificação é apresentada por Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, quando do estudo da
tutela cautelar. MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil, vol. 4:
Processo Cautelar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.
54 Além da terminologia “eficácia vertical”, com mesmo conteúdo coexistem as terminologias “eficácia na
relação de terceiros”, “eficácia na relação entre particulares”, e “eficácia entre particulares”. 55
MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010. p. 133. 56
MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010. p. 134.
57 FREIRE, Alexandre Reis Siqueira Freire. Eficácia dos Direitos Fundamentais nas Relações entre Particulares.
In. RAMOS, Paulo Roberto Barbosa (coord.); RAMOS, Edith Maria Barbosa (coord.); FREIRE, Alexandre Reis
Siqueira (coord.). O Direito no Século XXI: estudos em homenagem ao Ministro Edson Vidigal. Florianópolis:
Editora Obra Jurídica, 2010. p. 13.
28
que, para o Ministro Gilmar Mendes, os direitos fundamentais têm aplicabilidade imediata nas
relações entre particulares. Neste sentido concluiu que:
Conforme aventado ao versar sobre a eficácia dos direitos fundamentais em relação
aos poderes públicos a prescrição contida no art. 5º, § 1º da Constituição Federal de
1988 chancela não somente a vinculação dos direitos fundamentais nas relações
travadas entre o cidadão e o Estado, mas também assegura a vinculação dos
particulares em geral aos direitos fundamentais.58
Utilizando o breve esboço feito, no tocante à eficácia horizontal dos direitos
fundamentais, impele-se concordar com a proposta de sua eficácia imediata. Ora, ao imaginar
um conflito de interesses que tenha como pauta um direito de propriedade intelectual, isentá-
los da proteção concedida pelas cláusulas fundamentais previstas constitucionalmente
acarretaria a não observância, por exemplo, da sua função social. E, como no início destes
escritos foi devidamente afirmado, o processo, como instrumento de proteção de direitos
fundamentais deve almejar, como fim último, sua efetividade.
Independente que exista ou não limites privados delineadores das relações entre
particulares, a eficácia dos direitos fundamentais deve ser imediata. O processo, sendo
protetor desses direitos fundamentais, deve também dotar-se desta imediaticidade, para a
aplicabilidade de direitos fundamentais como o devido processo legal, o amplo aceso à
justiça, a duração razoável do processo e, em destaque, a efetividade da tutela jurisdicional.
Marinoni traz para esta discussão, ainda, a existência da eficácia vertical com
repercussão lateral. Constata que o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva vincula o
Poder Público e repercute na esfera das relações entre particulares. Sua funcionalidade, ou
mais precisamente, sua eficácia, seria vertical – por envolver o Estado-Juiz – com repercussão
lateral, por incidir imediatamente na esfera jurídica dos particulares.59
O debate acerca dos direitos fundamentais é essencial para o pensamento do
direito processual civil contemporâneo. Tanto no estudo, quanto na prática do processo, os
direitos fundamentais são considerados elementos integrativos do sistema jurídico e sua
leitura ocorre a partir dos princípios jurídicos, alicerçados na Constituição Federal.
58
FREIRE, Alexandre Reis Siqueira Freire. Eficácia dos Direitos Fundamentais nas Relações entre Particulares.
In. RAMOS, Paulo Roberto Barbosa (coord.); RAMOS, Edith Maria Barbosa (coord.); FREIRE, Alexandre Reis
Siqueira (coord.). O Direito no Século XXI: estudos em homenagem ao Ministro Edson Vidigal. Florianópolis:
Editora Obra Jurídica, 2010. p. 24. 59
MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010. p. 134 – 135.
29
Estas são as razões que justificam a existência de um “direito fundamental à
efetividade da jurisdição”.60
Em síntese a tutela jurisdicional deve ser prestada efetivamente, para que,
independente da esfera jurídica que sua repercussão possa atingir, se concretizem os direitos
fundamentais.
1.7 Elaboração da tutela jurisdicional “efetiva” na proteção dos direitos de marca
1.7.1 Utilização do “Direito Jurisprudencial” no estudo
As breves linhas que se seguem objetivam demonstrar o caminho percorrido pela
doutrina, jurisprudência e legislação brasileira na utilização das técnicas processuais para a
proteção dos direitos de propriedade industrial – em destaque os direitos de marca.
Ressalta-se que, ao expor como se construiu uma tutela jurisdicional “efetiva”
para a proteção dos direitos de marca, não simplesmente se apresentou uma digressão história
– meramente apontando como se constituíam a tutela de urgência em um momento e noutro
momento, mencionando as alterações pelas quais passou o ordenamento jurídico e como a
legislação processual dispõe técnicas processuais agora –, mas indo além disso.
Utilizamos elementos que entendemos relevantes, que atualmente são objeto de
atualmente de diversos processualistas, com destaque àqueles aspectos trabalhados pela
professora Teresa Arruda Alvim Wambier, ao se dedicar ao estudo da Teoria Geral do
Direito, Teoria da Decisão Jurídica e Teoria Geral do Processo, como flexibilidade e
estabilidade, ambiente decisional, entre outros. Importante é que, a partir desses aspectos se
pode identificar com rigor técnico e utilidade porque determinada tutela jurisdicional é mais
60
“Por esta razão é que o destaque da importância de se levar em conta a teoria dos direitos fundamentais para a
adequada compreensão do estudo dos direitos fundamentais para a adequada compreensão do estudo do direito
processual civil justifica-se. Não há como deixar de lado a noção de que a função jurisdicional é (também)
mecanismos de concretização, isto é, de realização concreta dos valores idealizados pela própria Constituição
Federal para busca, em última análise, de melhor vida em sociedade para todos. Com este deslocamento
metodológico, o estudo do direito processual civil passa a servir, em última análise, ao próprio homem inserido
na sua vida social, no seu Estado, e não mais ao “direito em si mesmo considerado”.” BUENO, Cassio
Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil. vol. 1. São
Paulo: Saraiva, 2010. p. 91.
30
“adequada” para ser aplicada a um caso que outra, sendo possível essa análise tendo em
vista as considerações doutrinárias, a experiência jurisprudencial e a atividade legislativa.61
Para tanto, verifica-se como a flexibilidade e a estabilidade interpretativa
jurisprudencial se constituíram fenômenos neste ambiente decisional de proteção dos direitos
de propriedade industrial e como ocorreu o manejo das técnicas processuais audazes de
concretizar esta proteção. Aliado a isto, identificamos as pautas de condutas apresentadas em
cada um desses momentos da respectiva trajetória jurisprudencial.62
Inicialmente, trabalharemos as ideias de flexibilidade, estabilidade, pauta de
conduta e ambiente decisional, e como tais elementos são importantes para uma análise
jurisprudencial.
Posteriormente, reservamos a análise da referida trajetória jurisprudencial, assim
como as trajetórias doutrinária e legislativa paralelas, no que se refere a tutela jurisdicional e a
proteção dos direitos de propriedade industrial; os resultados desta análise nos permitiu
identificar os momentos de flexibilidade e estabilidade interpretativas quanto a utilização de
determinadas técnicas processuais.
Por fim, apontaremos qual o atual estado da arte de aplicabilidade das técnicas
processuais para a proteção dos direitos de marca.
1.7.2 Elementos para a análise de uma trajetória jurisprudencial
61
“Trata-se, isto sim, de enxergar como possíveis, e como mais convenientes em determinados casos, soluções
tomadas não com base na letra da lei, mas com base no sistema: lei, doutrina, jurisprudência, manejados
criativamente.” WABIER, Teresa Arruda Alvim. O princípio da fungibilidade sob a ótica da função instrumental
do processo. In Princípios e temas gerais do processo civil (Coleção doutrinas essenciais: processo civil; v. 1)
Luiz Rodrigues Wambier, Teresa Arruda Alvim Wambier (organizadores). São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2011; p. 249. 62
Como evidenciaremos, em alguns momentos, existiram dúvidas sobre qual técnica processual o ordenamento
jurídico brasileiro disponibilizara para tutelar, em âmbito jurisdicional, aqueles direitos; nestas ocasiões, os
intérpretes e operadores do direito debatiam sobre qual técnica utilizar e como conforma-la à exigências do
direito material: isto é o que designamos como adaptabilidade interpretativa. Noutros momentos, após este lapso
temporal de dúvidas, debates e reflexões, ocorria um período de certeza sobre qual técnica processual correta a
ser aplicada; neste tempo, os intérpretes e operadores do direito manejavam as técnicas já apontadas como
adequadas àquele direito material, pois doutrina e jurisprudência conformavam entendimentos e apresentavam
uma pauta de conduta para aquele determinado fim: este fenômeno é o apontamos como estabilidade
interpretativa. Identificaremos, ainda, o movimento legislativo paralelo, com o intuito de perceber qual o espaço
disponível aos contributos das construções doutrinárias e jurisprudenciais ao processo de produção legislativa,
assinalando em que momentos o legislador observou adequadamente, ou não, os debates e apresentou
transformações legislativas processuais condizentes à exigências dos direitos materiais, ou não. Insta destacar
que quando trabalhamos a ideia de flexibilidade e estabilidade “interpretativas”, este termo abrange tanto o
papel da doutrina – no estudo das técnicas processuais -, quanto da jurisprudência – na aplicação das técnicas
processuais ao caso concreto.
31
1.7.2.1 A importância da jurisprudência como sensor das transformações sociais
Como escreveu Friedrich Müller, “o caso jurídico concreto é tão importante, é tão
co-fundador da norma jurídica como a prática é da teoria.”63
Partindo desta esclarecedora ideia é irrefutável a conclusão de que a
jurisprudência desempenha missão fundamental na construção da norma jurídica, na
constituição de direitos.
Analisar a trajetória jurisprudencial sobre determinado tema tem se mostrado
ferramenta bem útil para detectarmos não somente como juízes e tribunais têm decidido, mas
como a flexibilidade/estabilidade decisional pode erigir direitos.
Portanto, é a jurisprudência um dos sensores mais próximos e capazes de captar a
realidade social, detectando transformações do pensamento social, assim como viradas de
paradigmas do pensamento científico, o que permite uma melhor compreensão do interprete
do direito sobre o caso jurídico e a norma jurídica.
A constante transformação da sociedade ocasiona o surgimento de outras relações
entre sujeitos, assim como situações conflituosas, às quais os paradigmas pretéritos não são
mais capazes de reger e solucionar. Se essas concepções não são mais suficientes, paradigmas
presentes surgem com o objetivo de serem condizentes à realidade social, econômica e
política vigentes. Isto não exclui a possibilidade de que, por ocasião de vindouras
transformações, paradigmas futuros existirão e que devemos ser sensíveis e atentos a estes
fenômenos.
Isto é perceptível quando verificamos as trajetórias das variadas escolas do direito
processual civil, desde aquelas filiadas ao sincretismo, passando-se pelas que encamparam o
autonomismo, até às atualmente existentes, que adotam a ideia de efetividade processual, com
vistas nas garantias constitucionais do processo e proteção dos direitos fundamentais; estas
últimas adotando como eixo metodológico e interpretativo a tutela jurisdicional e modelo
constitucional do processo, ou processo civil constitucional.64
63
MÜLLER, Friedrich. O Novo Paradigma do Direito. In LUCCA, Newton De; MEYER-PFLUG, Samantha
Ribeiro; NEVES, Mariana Barboza Baesta. (coord.) Direito Constitucional Contemporâneo. Homenagem ao
Professor Michel Temer. São Paulo: Quartier Latin, 2012. p. 272. 64
Leciona Cassio Scarpinella Bueno que duas foram as fases mais características do estudo científico do direito
processual civil: a sincrética e a autonomista; e ambas dispuseram fundamentais contributos para a constituição
da atual fase da ciência do direito processual. BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito
processual civil: teoria geral do direito processual civil. vol. 1. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 72 e 73.
32
Nestes momentos, os paradigmas sociais, econômicos e políticos exerceram
efeitos diretos nas escolas do direito processual civil, que refletiram os valores fundamentais
de um tempo.65
Evidenciar os fenômenos da virada de paradigmas e de outras transformações
sociais, por meio de uma leitura jurisprudencial, permite construir teoria e prática mais
sensíveis à realidade social.66
Parece-nos ser esta uma característica que passa a compor o direito processual
civil contemporâneo, e por isso que afirmamos que a análise da trajetória jurisprudencial –
análise da trajetória de interpretação do direito caso a caso – é ferramenta de importância para
a teoria e a prática pensadas pelo processualista civil.
Sabendo que a jurisprudência é um dos captadores mais sensíveis das
transformações sociais, é relevante examinar o papel desempenhado por essa na constituição e
proteção de direitos.
1.7.2.2 Tendências contemporâneas e a importância da flexibilidade e estabilidade da
jurisprudência
Contemporaneamente, é o modelo constitucional do direito processual civil o eixo
metodológico e interpretativo que matem o sistema de normas processuais harmônico,
unificado, pronto para ser aplicado e reger o método institucional de solução de conflitos e
pacificação social.67
65
Hodiernamente existe um movimento de acesso à justiça e de constitucionalização do processo. Buscou-se
superar três obstáculos: o econômico, o organizacional e o processual – o econômico, relacionado ao direito
amplo acesso à justiça, caracterizou-se por garantir àqueles desfavorecidos economicamente a possibilidade de
buscar em juízo a proteção de seus direitos; o organizacional, relacionado à proteção dos direitos difusos e
coletivos, esquecidos em codificações de caráter eminentemente individualista; e o processual, relacionado à
efetividade e racionalidade das técnicas processuais, noutras palavras, ao direito a uma tutela jurisdicional
efetiva. BEDAQUE, Jose Roberto dos Santos. Efetividade do Processo e Técnica Processual. 3ª ed. Rio de
Janeiro: Malheiros, 2010. p. 24.
66 Isto porque, como bem indica Georges Abboud, “a função básica da jurisprudência é interpretação e
concretização do próprio direito. Assim, a jurisprudência teria quatro funções primordiais em relação à lei, que
seriam: explicativa, supletiva, diferencial e renovadora.” ABBOUD, Georges. Precedente judicial versus
jurisprudência dotada de efeito vinculante: a ineficácia e os equívocos das reformas legislativas na busca de uma
cultura de precedentes. In WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Direito Jurisprudencial. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2012. p. 504.
504 67
A harmonia e a ideia de unicidade em um sistema de normas passaram ser verificadas não pela existência de
codificações, pois as constantes reformas, leis extravagantes, e outros textos, ocasionaram uma suposta
fragmentação do sistema jurídico; para conferir harmonia e unicidade ao sistema adotou-se outro elemento, um
eixo metodológico e interpretativo capaz de estruturar toda a “pluralidade” normativa: o modelo constitucional.
33
As ideias de harmonia e unicidade em um sistema jurídico originariamente de
civil law, como é o caso do sistema jurídico brasileiro68
, passaram ser verificadas não somente
pela existência de codificações, pois as constantes reformas, leis extravagantes e outros textos
normativos, ocasionaram uma suposta fragmentação do sistema jurídico.
Almejando conferir harmonia e unicidade ao sistema, adotou-se outro elemento,
um eixo metodológico e interpretativo capaz de estruturar toda esta “pluralidade normativa”:
o modelo constitucional. 69
Analisando a constitucionalização do direito e o atuar de juízes e tribunais, Arruda
Alvim destaca a importância da jurisprudência no contexto brasileiro atual:
Entre outros aspectos, a função jurisdicional é ampliada para comportar a análise do
alcance e significados dos conceitos jurídicos interminados, a efetivação das normas
constitucionais, bem como o controle da validade e eficácia das normas jurídicas em
geral. Admite-se uma abrangência cada vez maior na atuação dos juízes e tribunais
na aplicação do direito, de tal modo que o estudo da jurisprudência passa a merecer
especial atenção”.70
Neste modelo, direito e realidade devem ser capturados juntos, sob pena de que
as normas processuais não produzam os efeitos esperados pois foram pensadas alheias à
realidade social na qual são aplicadas. Direito e realidade não podem mais figurar como
elementos opostos, mas atuar conjuntamente “como elementos da ação jurídica, sintetizáveis
no trabalho jurídico efetivo de caso para caso – na forma da norma jurídica produzida.”71
68
Como nos propusemos a escrever este estudo tendo em vista a experiência brasileira achamos por bem, sempre
que possível, nos referirmos ao sistema jurídico brasileiro em si, e não simplesmente, e de forma genérica, a
sistemas de civil law, por dois motivos: primeiro, a distinção entre sistema de civl law e common law é
instrumento bem empregado quando se pretende fazer uma reflexão em direito comparado pois a análise de um
sistema jurídico especificamente comporta inúmeras variáveis que aqueles conceitos não são capazes de
abranger; segundo, o sistema jurídico brasileiro pode ser indicado como de origem civil law, pois atualmente este
também comporta características dos ditos sistemas common law. Portanto, sempre que possível, quando nos
referirmos ao sistema jurídico brasileiro, estaremos tratando de um sistema que tem suas origens comuns às
origens de civil law, mas que passa a deter também caracterizas dos aludidos sistemas de common law. 69
É este modelo constitucional do direito processual civil que, como explica Cassio Scarpinella Buneo,
apresenta os princípios constitucionais do processo civil, os procedimentos jurisdicionalmente diferenciados, a
organização judiciária e as funções essências à Justiça, que deve ser adotado como o elemento essencial para o
exercício da tutela jurisdicional e a estruturação do método institucional de solução de conflitos: o processo.
BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual
civil. vol. 1. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 124 – 279.
70 ARRUDA ALVIM. Apontamentos sobre o papel do juiz e dos tribunais na ordem constitucional vigentes:
enfoque comparativo entre jurisprudência e os sistemas de precedentes. In LUCCA, Newton De; MEYER-
PFLUG, Samantha Ribeiro; NEVES, Mariana Barboza Baesta. (coord.) Direito Constitucional Contemporâneo.
Homenagem ao Professor Michel Temer. São Paulo: Quartier Latin, 2012. p. 681 e 682. 71
MÜLLER, Friedrich. O Novo Paradigma do Direito. In LUCCA, Newton De; MEYER-PFLUG, Samantha
Ribeiro; NEVES, Mariana Barboza Baesta. (coord.) Direito Constitucional Contemporâneo. Homenagem ao
Professor Michel Temer. São Paulo: Quartier Latin, 2012. p. 270.
34
E se a norma jurídica é construída em cada caso – e de caso por caso como ocorre
na jurisprudência –, destaca-se ainda mais a importância da função desempenhada pelos juízes
e tribunais na elaboração de um portfólio jurisprudencial que seja adaptável e estável.
Teresa Arruda Alvim Wambier72
, destacando as características dos sistemas de
civil law, depreende a importância da estabilidade e adaptabilidade como objetivo do direito.
Como afirma a autora supracitada, estes sistemas fundamentam-se na legislação escrita,
afastando-se relativamente o caráter vinculante dos precedentes. Regido pelo princípio da
legalidade, os juízes deveriam decidir os casos de acordo com a lei escrita.
Contudo, se por um lado preza-se pela rigidez, exigindo-se a observância da lei
escrita, por outro flexibiliza-se o sistema na medida em que se insere no ordenamento a
adoção de conceitos vagos, cláusulas gerais e princípios jurídicos como fontes para decidir73
.
Estas três modalidades de poros existentes no rígido sistema civil law o tornam permeável,
pois “permitem ao juiz (rectius, ao Judiciário) adaptar o direito a mudanças e também às
peculiaridades dos casos concretos.”74
Esta adaptação permite ao juiz ampliar seu raio cognitivo e decisório, não se
restringindo apenas à aplicação da lei escrita. Todavia, a adaptabilidade, quando aproveitada
sem a utilização de critérios objetivos, acarreta instabilidade e insegurança ao jurisdicionado,
efeito contrário do esperado. Esta é a advertência feita por Teresa Arruda Alvim Wambier,
subscreve-se:
72
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Estabilidade e adaptabilidade como objetivos do direito: civil law e
common law. RePro 172. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 136 e 137.
73 Contudo, deve-se lembrar que ao legislador incumbe o árduo empreendimento de elaboração normativa, e nem
sempre o legislador contemporâneo é capaz de prospectar uma situação vindoura e, com isto, legislar para o
futuro. Em tempos presentes, em que as transformações ocorrerem em notável velocidade, é missão de todos
aqueles responsáveis pela proteção dos direitos, estarem sensíveis às exigências da sociedade. Medina e
Wambier identificaram que o legislador tem se preocupado com essa complexidade fenomenológica, pois: “o
mesmo se preocupa em elaborar normas que explicitem os objetivos do sistema jurídico, não mais se limitando a
regrar condutas. Vê-se, com isso, o surgimento de normas jurídicas ainda mais gerais, que trazem em seu bojo
noções de conteúdo variável (de conceito vago ou indeterminado), a fim de possibilitar, ao órgão jurisdicional,
aplicar a norma jurídica levando em conta as peculiaridades de cada caso, particularidades estas insuscetíveis de
serem minuciosamente reguladas pelo legislador. [...] Na medida em que o ordenamento jurídico se apresenta
permeado de normas pouco precisas e vagas, como são as cláusulas gerais e os princípios, torna-se ainda mais
importante o processo, já que é deste espaço que se dará a criação da solução jurídica precisa, ajustada às
peculiaridades da controvérsia.” Nesta perspectiva, aqueles personagens do processo (partes e órgão
jurisdicional) adquirem status ativo no método, colaborando todos na propositura da solução jurídica. MEDINA,
José Miguel Garcia; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Parte Geral do Processo do Conhecimento. Processo
Civil Moderno. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 34 – 37). 74
Como afirma Teresa Arruda Alvim Wambier, a adaptabilidade (aplicação de conceitos vagos, cláusulas gerais
e princípios jurídicos) permite ao órgão jurisdicional adequar, conformar o direito aplicado à situação conflituosa
existente. Nesta perspectiva, flexibiliza-se a vinculatividade da lei neste sistema, permeabilizando sua rigidez.
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Estabilidade e adaptabilidade como objetivos do direito: civil law e common
law. RePro 172. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 139.
35
A rigidez que poderia se esperar encontrar nos sistemas de civil law, como uma de
suas principais características, tem um contrapeso, que pode gerar um imenso
desequilíbrio (como ocorre no Brasil): juízes podem decidir de acordo com suas
próprias opiniões a respeito do sentido da lei.75
Doutro lado, exige-se uma estabilidade para o sistema de civil law, pois a
flexibilização da rigidez do texto normativo, por meio da adaptação do direito ao caso
concreto, nada tem de correspondente a ausência de critérios objetivos ao decidir.
O juiz em sistemas de origem civil law, ao decidir, deve levar em consideração a
lei escrita, e ainda os conceitos vagos, as cláusulas gerais e os princípios jurídicos. Aliado a
isto, exige-se que o Poder Judiciário garanta segurança jurídica às partes, o que ocorre
somente quando existe o respeito aos precedentes, em destaque quando existe jurisprudência
estabilizada. Veja-se:
a jurisprudência dominante, mesmo nos países de civil law, é fonte do direito e ao
mesmo tempo é o próprio direito. Esta concepção encontra apoio na visão do direito
como sendo um sistema autopoiético. [...] o direito nasce de si mesmo. Nascendo de
si mesmo, não deveria ser sempre o mesmo? Não, porque o direito tem poros, por
meio do qual a realidade social pode penetrar.76
Portanto, a estabilidade dos sistemas de civil law não deve ser compreendida
apenas através de sua suposta rigidez ou da vinculatividade à lei escrita, e sim sob a ótica da
utilização de critérios objetivos ao se decidir e do respeito à jurisprudência – assim como o
seu adequado estudo.
A adaptabilidade nos sistemas de origem civil law permite que o juiz realize uma
melhor conformação do direito ao caso concreto, pois o juiz, no exercício de sua atividade, e
as partes, agindo ativamente no processo tendo em vista o contraditório, utilizarão todos
aqueles “instrumentos” indicados para a construção da melhor solução possível.77
Já a estabilidade é exigida para garantir o tratamento igualitário dos
jurisdicionados, e quanto ao ambiente decisional em análise, para se saber qual é a técnica
processual adequada aos direitos de propriedade industrial.
75
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Estabilidade e adaptabilidade como objetivos do direito: civil law e
common law. RePro 172. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 137. 76
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Estabilidade e adaptabilidade como objetivos do direito: civil law e
common law. RePro 172. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 138. 77
Sustenta Teresa Arruda Alvim Wambier que “embora isto seja extremamente polêmico, manifestamos nossa
opinião no sentido de que há uma decisão melhor para cada caso. Se assim não fosse, o próprio juiz não se
sentiria estimulado a buscá-la.” WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Estabilidade e adaptabilidade como
objetivos do direito: civil law e common law. RePro 172. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 143.
36
Esta estabilidade é um elemento necessário para equilibrar a equação
desenvolvida juntamente com a adaptabilidade. Isso porque, se por um lado se flexibiliza a
rigidez do sistema ampliando as possibilidades cognitivas e decisórias do juiz, por outro se
confere constância a estes atos cognitivos e decisórios. Somente com esta harmonia pode-se
afirmar que o sistema de civil law está cumprindo sua finalidade conferindo a apropriada
tutela dos direitos.
Falamos em adaptabilidade como elemento de flexibilização da rigidez de alguns
sistemas jurídicos, por meio da inserção de princípios, conceitos vagos e interminados.
Aludimos, ainda, que faz-se necessária a estabilidade. Esta estabilidade pode ser buscada
tanto pela rigidez do texto normativo, quanto pela uniformização da jurisprudência sobre a
interpretação de determinado texto normativo.
Contudo, a flexibilização não ocorre somente por meio da adaptabilidade que
utiliza princípios, conceitos vagos e interminados, mas também pela própria flexibilização da
jurisprudência. Este deve ser um momento em que juízes e tribunais entendam que, ocorridas
transformações sociais e virada de paradigmas, exige-se que uma jurisprudência
uniformizada, dominante, estável seja flexibilizada – afastando a aplicação daquela em
determinado caso, imprimindo interpretação que supere aquela jurisprudência, ou utilizando
outros mecanismos de flexibilização.
Mas frisamos, a flexibilização jurisprudência é um fenômeno que deve ocorre
somente se o contexto de sua aplicação exigir, pois a sua ocorrência excessiva causa séria
insegurança jurídica. Por isso a necessidade do respeito à jurisprudência, principalmente
quando estabilizada; e também, por isso, a importância de se estudar a trajetória
jurisprudencial sobre determinado tema.
Esclarecidos estes elementos, nos tópicos seguintes passaremos a analisar
especificamente a flexibilidade e estabilidade jurisprudencial.
1.7.2.3 Ambiente decisional e pauta de conduta: limites e possibilidades da flexibilidade e
estabilidade interpretativa
A terminologia ambiente decisional refere-se às áreas do direito e a todo o
contexto objeto de debate em uma decisão sobre o qual se busca resolver um conflito. 78
78
Teresa Arruda Alvim Wambier, apresenta bem a ideia de ambientes decisionais, e como este elemento é
importante para compreender porque em algumas áreas do direito a estabilidade é fundamental para a
constituição de uma interpretação que garanta a proteção de determinados direito, e porque noutras áreas a
37
Analisando observação feita por Norman Marsh, sobre o estabelecimento de
critérios identificadores de contextos (ambientes decisionais) que exigem flexibilidade ou
estabilidade interpretativa, Teresa Arruda Alvim Wambier afirma que:
há campos em que é desejável abrir-se mão da flexibilidade, a favor da segurança,
da previsibilidade; e outros, em que delicadas questões sociais estão envolvidas, em
que é conveniente dar-se ao juiz certa margem de flexibilidade para decidir, em
detrimento dos valores segurança e previsibilidade.79
Como indicamos, este ensaio objetiva analisar a trajetória jurisprudencial sobre as
técnicas processuais para a proteção dos direitos de propriedade industrial. Assim, temos
como ambiente decisional os elementos atinentes aos direitos de propriedade industrial e o
direito processual civil.
Aqui, vale deixar evidente nosso entendimento de que, por se tratar de um debate
sobre as técnicas processuais disponíveis para a proteção de determinado direito, a
estabilização é uma característica importantíssima.
Existem alguns ambientes decisionais mais permissivos a uma flexibilidade
interpretativa, pois o debate nestes perímetros giram em torno de questões eminentemente de
fato: como é o caso do direito de propriedade industrial. Esta flexibilidade, decorrente da
adaptabilidade, é um fenômeno saudável nestes casos.
Contudo, quando o objeto de discussão é a técnica processual a ser manejada –
aplicabilidade, eficácia, imperatividade etc.– um momento de flexibilização interpretativa
jurisprudencial também é saudável, mas deve logo ser seguido de um momento concreto de
estabilidade.
flexibilidade é essencial para a boa conformação da interpretação normativa ao contexto em que é aplicada.
Afirma que “o ambiente decisional seria a área do direito material ou substancial, com seus princípios e regras,
em que o conflito deve ser resolvido.” WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Precedentes e evolução do direito. In
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Direito Jurisprudencial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012. p.
53. Nos arriscamos a acrescentar dois tópicos a esta definição, com o intuito de colaborar a esta interessante
ideia que de ambientes decisionais: (i) não somente a área do direito material ou substancial, mas também a área
do direito processual deve ser identificado como ambiente decisional, pois não podemos esquecer que várias
vezes, juízes e tribunais, ocupam-se em decidir sobre questões eminentemente processuais ou que giram em
torno que questões processuais, pois não se pode olvidar que é por meio do processo que, muita das vezes, os
direitos subjetivos são realizados; (ii) não somente a área do direito, mas todo o contexto no qual o conflito
ocorre, deve ser elemento que compõe determinado ambiente decisional. Assim, aproveitando a ideia sustentada
pela professora Teresa Arruda Alvim Wambier, poderíamos afirmar que o ambiente decisional seria a área do
direito (contexto jurídico), com seus princípios e regras, assim como o contexto social, econômico, político, em
que o conflito deve ser resolvido. 79
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Precedentes e evolução do direito. In WAMBIER, Teresa Arruda Alvim.
Direito Jurisprudencial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012. p. 53.
38
Se o direito processual deve ser entendido como instrumento de concretização do
direito material, os operadores e interpretes do direito devem saber exatamente qual a pauta
de conduta processual a ser adotada para agir em juízo e proteger o direito.
Reitera-se: quando o debate gira em torno de técnicas processuais, o momento de
flexibilização é indubitavelmente essencial, mas deve o ser de forma a não acarretar a
insegurança jurídica da dúvida sobre “qual a técnica deve-se ser utilizada”.
A flexibilização interpretativa jurisprudencial deve ser concretizada, e logo em
seguida deverá também ser concretizada a estabilização interpretativa jurisprudencial.
Isto é fundamental para que a pauta de conduta seja apresentada e o
jurisdicionado saiba exatamente quais as normas regentes do processo, sabendo qual a
técnica processual adequadamente utilizável para proteger os direitos decorrentes das
patentes, desenhos industriais ou marcas.
A pauta de conduta é uma das formas de compatibilização interpretativa, pois
apresenta igual interpretação, igual solução a conflitos quando identificados ambientes
decisionais iguais.
É inadmissível que a “liberdade de decidir” seja encarada somente como poder
juiz, sem que seja adotada uma conduta responsável por esses ao utilizá-la.
Como sustenta a professora Teresa Arruda Alvim Wambier, “aceitar, de forma
ilimitada, que o juiz tem liberdade para decidir de acordo com sua própria convicção, acaba
por equivaler a que haja várias pautas de conduta diferentes (e incompatíveis) para os
jurisdicionados.”80
Por isso que afirmamos que, no caso da interpretação de normas processuais civis,
a existência de uma flexibilização jurisprudencial que acarrete a existência de várias e
incompatíveis pautas de condutas, não produz efeitos positivos no processo e ao
jurisdicionado.
Neste ambiente decisional, mesmo sendo permitida certa flexibilidade, esta deve
ser comedida, pois é fundamental se saber qual a técnica processual a ser aplicada, e essa
certeza decorre de uma jurisprudência verdadeiramente dominante81
, estável que apresente
uma pauta de conduta.
80
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Estabilidade e adaptabilidade como objetivos do direito: civil law e
common law. RePro 172. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 144. 81
Sobre a identificação de jurisprudência verdadeiramente dominante, Luiz Rodrigues Wambier afirma que:
“Não se coaduna com a seriedade do serviço jurisdicional e suas imprescindibilidade para o vigor democrático,
que a sociedade que imprimir ao Brasil, a circunstância de existirem decisões tomadas com bases falsa, como se
jurisprudência dominante se tratasse. Há que se construir uma base sólida, confiável, para que a sociedade possa
entender a legitimidade das decisões dos Tribunais (inclusive locais) nesse ou naquele sentido. WAMBIER, Luiz
39
Teresa Arruda Alvim Wambier completa seu raciocínio frisando a existência de
um paradoxo que envolve a suposta racionalidade de um sistema de civil law destinada a
conter abusos e a interpretação flexibilizada e irrestrita para cada caso. 82
É uma
incongruência do sistema solucionar controvérsias repetidas ou semelhantes de formas
diferentes ou diametralmente conflitantes.83
A instabilidade jurisprudencial não produz qualquer efeito saudável ao sistema
jurídico, ao Poder Judiciário com instituição, tampouco ao jurisdicionado. No entendimento
da autora supracitada:
A dispersão da jurisprudência, fruto de diversas causas, é realmente um paradoxo,
na exata medida em que os sistemas de civil law foram concebidos por um ato
racional especificamente destinado a conter abusos. Foram estruturados e moldados
para gerar segurança, previsibilidade e respeitar a igualdade. Ora, de que adianta ter-
se uma só lei com diversas interpretações possíveis? Tantas pautas de conduta
haverá, quantas forem estas interpretações. É como, repetimos, se houvesse várias
leis disciplinando a mesma matéria.84
Esclarecidos estes elementos, passa-se à análise da trajetória jurisprudencial
acerca da utilização das técnicas processuais para a proteção dos direitos de propriedade
industrial.
1.7.3 Trajetória de elaboração da tutela jurisdicional efetiva dos direitos de propriedade
industrial
O ambiente contemporâneo surge em meio a diversas transformações sociais,
econômicas, políticas e culturais.
As transformações, céleres, amplas e profundas ensejaram o surgimento de outros
cenários, outros personagens e outras relações sociais. Esta complexidade exigiu não só
Rodrigues. Uma proposta em torno do conceito de jurisprudência dominante. In Revista de Processo, vol. 100.
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000. p. 86. 82
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Estabilidade e adaptabilidade como objetivos do direito: civil law e
common law. RePro 172. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 146. 83
Tratando de forma crítica a questão da adequada análise da constitucionalização do sistema processual, a
importância do o atuar de juízes e tribunais e a padronização decisória, Dierle Nunes conclui que “Vivemos um
altíssimo grau de complexidade da sociedade e do Direito, de modo que as soluções utilitaristas e neoliberais de
geração de números (a qualquer custo) vão sempre esbarrar no modelo constitucional de processo e em nosso
paradigma democrático de direito, que clama por soluções com eficiência qualitativa e que busquem a percepção
panorâmica do fenômeno da litigância no Brasil.” NUNES, Dierle. Precedentes, padronização decisória
preventiva e coletivização. In WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Direito Jurisprudencial. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2012. p. 276. 84
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Estabilidade e adaptabilidade como objetivos do direito: civil law e
common law. RePro 172. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 146.
40
respostas aos conflitos sociais, ou o reconhecimento de direitos diferenciados os direitos de
marcas, mas também a reflexão sobre os paradigmas do direito processual civil e a disposição
de técnicas processuais vocacionadas a conferir efetividade ao processo.
E direitos diferenciados exigem tutela jurisdicional diferenciada.
Tendo em sob exame os direitos de propriedade industrial – destacadamente os
direitos de marca –, suas diversidades advêm de seu caráter eminentemente imaterial, por
deterem diversas características e especialidades quanto à concessão, limites, suspensão,
anulação etc., exigindo uma tutela jurisdicional diferenciada para sua proteção.
Donaldo Armelin sustenta que a necessidade de cumprir objetivos diferenciados,
dotando de efetividade o processo, ensejou o surgimento de tutelas diferenciadas, tendo em
vista que os paradigmas já não se amoldavam à atual finalidade do processo. Para tanto, o
autor sustenta a pertinência das tutelas diferenciadas, afirmando que “a vinculação do tipo de
prestação à sua finalidade específica espelha a atendibilidade desta; a adequação do
instrumento ao seu escopo potencializa o seu tônus de efetividade.”85
.
Donaldo Armelin, ao mesmo tempo, indica o imperativo da adaptabilidade da
tutela jurisdicional à sua finalidade, isto em resposta da problemática existem na dilação
exacerbada do lastro temporal processual. O autor escreve que:
Essa permanente necessidade de adaptação da tutela jurisdicional e de seus
instrumentos à sua finalidade vê-se, no presente, exacerbada pela constância e
crescimento do indesejável fenômeno da demora na prestação jurisdicional, o qual,
embora não adstrito apenas ao nosso país, repercute negativamente na efetividade de
tal prestação, impondo a adoção de várias medidas direcionadas à sua atenuação, em
sendo impossível a sua total erradicação.86
Nesse sentido, a tutela jurisdicional deve estar atenta às transformações da
sociedade e das relações existentes, para que possa, efetivamente, ser o instrumento utilizado
para proteção dos direitos.
Sob esta perspectiva, com efeito, a pertinência de se estudar a técnica processual
através da tutela do direito que almeja proteger é tão lógica quanto a de propor um processo
coeso com a sua finalidade.
Certo que se indica como diferenciado aquilo que não corresponde ao padrão
adotado. Atualmente, as tutelas de urgência – cautelares e satisfativas –, assim como as tutela
85
ARMELIN, Donaldo. Tutela de Urgência. In MARINONI, Luiz Guilherme (org.). O Processo Civil
Contemporâneo. Curitiba: Juruá, 1994. p. 103. 86
ARMELIN, Donaldo. Tutela de Urgência. In MARINONI, Luiz Guilherme (org.). O Processo Civil
Contemporâneo. Curitiba: Juruá, 1994. p. 103.
41
inibitória e tutela de remoção do ilícito são consideradas de aplicação comum – ou mais que
isso: tutela jurisdicional de aplicação fundamental para a concretização da efetividade. À
tutela ressarcitória restou o espaço no qual, não sendo suficientes as tutelas específicas,
repara-se o dano causado ressarcindo o titular do direito.
Àquelas são tutelas diferenciadas por se amoldarem às diversidades dos direitos
que se almeja proteger efetivamente.
Ressalta-se que nesta relação não é adequado supor que o direito processual
desempenha função meramente acessória frente ao direito material. Isto porque a realização
dos direitos materiais se concretiza, diversas vezes, por meio do processo. Como relembram
Medina e Wambier, “é através do processo que se realizam os direitos subjetivos”.87
No intuito de evidenciar isso, desenharemos a trajetória jurisprudencial das
técnicas processuais de proteção dos direitos de propriedade intelectual – apontando destaques
aos direitos de marca.
Na vigência do Código de Processo Civil de 1939, as medidas cautelares não
satisfaziam plenamente o direito dos titulares, acarretando a utilização de outras técnicas,
como as ações cominatórias. Estas supriam parcialmente algumas necessidades, pois
possibilitavam a concessão de liminares e a incidência de multa para efetivar esse
cumprimento. No mesmo momento passou-se a empregar ações negatórias e cominatórias
cumulativamente, contudo, ambas não eram dotadas de uma sumariedade suficiente para a
proteção dos direitos de propriedade industrial.
Percebemos ser este um momento de flexibilização interpretativa jurisprudencial
no qual se debateu qual técnica processual poderia ser manejada. A solução adotada
respondeu bem às exigências dos direitos de propriedade industrial e logo alcançou certa
estabilidade. Isso foi importante pois o jurisdicionado passou a adotar esta pauta de conduta
processual e utilizar estas técnicas processuais.
Com o advento do Código de Processo Civil de 1973, a ausência de proteção
efetiva se exacerbou, pois a sumariedade subsidiária das ações cominatórias foi extinta.
Acentuou-se o ônus temporal àqueles que, sem alternativas, deveriam suportar todo o trânsito
processual até alcançar o provimento final, e as multas coercitivas da cominatória restaram
vinculadas ao trânsito em julgado.88
87
MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Parte Geral e Processo do Conhecimento.
Processo Civil Moderno. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 32. 88
Vide a dura crítica de Luiz Fernando C. Pereira, que ressalta “no âmbito da propriedade industrial a
inefetividade da medida se relevava inequívoca [...] E o pior é que boa parte da jurisprudência ainda vinculava a
execução da multa ao trânsito em julgado das ações cominatórias, mesmo em casos de propriedade industrial.
42
Pode-se afirmar que aquela lacuna foi provisoriamente suprida com os interditos
possessórios, manobra processual que vingou por certo tempo. Posteriormente, esta técnica
sofreu descrédito doutrinário e jurisprudencial, ao compreenderem que os direitos de
propriedade industrial, por referenciarem-se a bens imateriais, não se submetiam ao regime da
posse civil sobre coisa determinada.89
Como afirma Marinoni, o uso da ação possessória para a tutela dos direitos de
propriedade intelectual decorreu de uma exigência prática de se conferir, àqueles direitos,
uma tutela adequada, efetiva e de caráter preventivo. Portanto, não existindo uma ação
preventiva autônoma “capaz de dar tutela adequada aos direitos que não se compadecem com
o ressarcimento em pecúnia, é que obrigou os tribunais a admitirem o uso da ação possessória
para a proteção do direito à marca, autoral, de invento etc.”90
Neste cenário, é perceptível que o legislador não observou os debates travados
sobre as técnicas processuais de proteção desses direitos diferenciados. Certo que, por outro
lado, o Código de Processo Civil de 1973 disponibilizou um rol exaustivo de tutelas
cautelares nominadas, muito úteis quando em juízo se debatiam direitos de propriedade
industrial.
Percebendo não ser capaz de disponibilizar tantas técnicas cautelares quanto
fossem necessárias ao caso concreto, o legislador infraconstitucional estabeleceu cláusulas
gerais fundamentadas no poder cautelar geral e disponibilizou a técnica da medida cautelar
inominada.
Neste panorama, almejando novamente apresentar uma tutela jurisdicional
protetiva, passou-se a aplicar a tutela cautelar, em sua modalidade inominada, com caráter
satisfativo. Esta utilização, mesmo distorcendo o caráter acautelatório da medida de urgência,
Para esses casos de ação cominatória em propriedade industrial não é demais afirmar que a efetividade ligava-se
a uma espécie de homenagem póstuma à patente ou marca usurpada”. PEREIRA, Luiz Fernando C.. Tutela
Jurisdicional da Propriedade Industrial: aspectos processuais da Lei 9.279/1996. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2006. p. 73.
89 Salienta Luiz Fernando C. Pereira que “é lícito concluir que as possessórias não estavam a serviço da proteção
à propriedade intelectual porque a construção da melhor doutrina não indicava relevante diferença entre bens
corpóreos e incorpóreos. O contrário ocorria, como se viu. A doutrina – assim como parte da jurisprudência –
reconhecia a dificuldade de se valer de classificação única para realidades distintas, mas noutra ponta, não
reputava apropriado castrar a proteção jurisdicional efetiva que só as possessórias, à época, podiam outorgar. É
inegável que todo aquele debate fundava-se na efetividade das possessórias. É dizer: a tentativa de forçar a
classificação dos direitos intelectuais como direito de propriedade não se pautava efetivamente por critérios
próprios da doutrina di direito civil, mas, em verdade, pela necessidade evidenciada pelo processo civil em
oferecer uma proteção eficaz ao direito de marca.” PEREIRA, Luiz Fernando C.. Tutela Jurisdicional da
Propriedade Industrial: aspectos processuais da Lei 9.279/1996. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2006. p. 47. 90
MARINONI, Luiz Guilherme. Direito Processual Civil: Soluções Práticas de Direito. vol. 1. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 71.
43
apresentava como finalidade obstar imediatamente a prática de atos contrários ao direito de
propriedade industrial. Entretanto, a tutela cautelar não detinha um suporte coercitivo que
garantisse seu cumprimento, sua imperatividade, porquanto esta não possibilitava seu manejo
cumulado com uma cominação de multa.
A solução da tutela cautelar inominada surge em resposta ao possível conflito
entre o princípio da tipicidade e o princípio da efetividade processual.91
Esta via foi possível
pela interpretação das normas infraconstitucionais sob a luz da Constituição Federal, que
garante o exercício do Poder Judiciária nas situações em que se exista a possibilidade de dano
ou lesão a direito.
Portanto, como afirma Medina, mesmo na ausência de regra processual específica
para tutelar determinada situação material que exija proteção, “deverá ser admissível a tutela
de urgência, já que a tutela de urgência atípica tem raiz constitucional, à qual não se sobrepõe
a tipicidade formal dos procedimentos criados pelo legislador.”92
Marinoni conclui que “a ação cautelar era utilizada apenas para permitir a
obtenção de liminar, o que seria impossível em sede de ação cominatória ou de ação
declaratória”. Contudo, o autor supracitado adverte que, mesmo com este uso estratégico,
“não se conferia à ação cautelar efetividade necessária, pois não se concebia a possibilidade
de o Juiz, em sede de ação cautelar incidental à ação cominatória ou à ação cominatória,
ordenar sob pena de multa.”93
A realidade apresentou muitas outras situações e a ação cautelar inominada
completava, dentro de seus limites, as lacunas do sistema processual. Assim, a exigência de
uma tutela de caráter sumário e satisfativo, fundada em urgência, para corrigir os problemas
ocasionados pela ausência de efetividade no procedimento ordinário, ocasionou o uso
distorcido da tutela cautelar inominada para antecipar a tutela jurisdicional correlata ao direito
material em perigo.
É notável o caráter de adaptabilidade da tutela de urgência inominada, que logo
passou a ser utilizada para a grande maioria das situações que o Código de Processo Civil não
91
Marinoni e Arenhart entendem que “a ação cautelar inominada é fruto da necessidade de se conferir tutela
cautelar adequada ao caso concreto, constituindo ação ou forma processual capaz de suprir a insuficiência de
técnica processual expressamente estabelecida”. MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART, Sérgio Cruz.
Curso de Processo Civil. v. 4. Processo Cautelar. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. p. 100. 92
MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de; GAJARDONI, Fernando da Fonseca.
Procedimentos Cautelares e Especiais. Processo Civil Moderno. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2009. p. 33.
93 MARINONI, Luiz Guilherme. Direito Processual Civil: Soluções Práticas de Direito. vol. 1. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 74.
44
se ocupou em apresentar técnicas processuais. Neste momento também identificamos a
estabilidade nesta interpretação, neste entendimento, de manejo desta técnica processual como
uma verdadeira cláusula geral protetiva.
A suposição do uso distorcido da tutela cautelar inominada decorreu do
controvertido entendimento doutrinário e jurisprudencial acerca do poder cautelar geral. De
tal modo, ensejou-se um debate que tinha como pauta a dúvida sobre a finalidade das medidas
provisionais do art. 798 do CPC, se essas referiam-se apenas às garantias processuais, ou
poderiam abranger as antecipatórias de tutela do direito material.
Neste ambiente, “questionou-se largamente sobre a legitimidade ou não, no
âmbito do processo cautelar, das chamadas medidas cautelares satisfatórias”.94
A falta de um
consenso doutrinário sobre esta controvérsia refletiu diretamente na jurisprudência, sempre
instável na tratativa dessas questões.95
A instabilidade e a utilização distorcida da tutela cautelar com caráter
antecipatório e satisfativo explicitou a necessidade de um procedimento mais efetivo, “o qual
culminasse com uma sentença mandamental ou executiva latu sensu, bem como possibilitasse
a expedição de uma ordem imediata, dotada de efetividade, para satisfazer o direito do
autor.”96
Este debate ocasionou a macroreforma processual que concedeu a indubitável
possibilidade de uma tutela sumária e satisfativa totalmente desvinculada da tutela cautelar.
A Lei nº 8.952/1994 reformou a redação do art. 273 do Código de Processo Civil
e incluiu outros dispositivos, e ainda reformou o art. 461, prevendo ainda a tutela inibitória e a
tutela de remoção do ilícito, com sua respectiva possibilidade de antecipação. Eis aqui um
momento que podemos indicar que o legislador observou bem os debates doutrinários e
jurisprudenciais e apresentou normas condizentes à realidade.
A exposição da trajetória processual das técnicas processuais de proteção dos
direitos de propriedade industrial demonstrou como ocorrem os fenômenos da flexibilização e
estabilização jurisprudência, assim como os seus efeitos no atuar dos juízes e tribunais, do
94
ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 41.
95 Teori Albino Zavascki salienta que, à época, a instabilidade dos critérios apresentados, referentes às
finalidades e requisitos das tutelas cautelares e antecipatórias, refletiu-se na jurisprudência. Todavia, divergindo
do posicionamento radicalmente contrário à aceitação dessas medidas antecipatórias, passou-se a permitir o
manejo da ação cautelar inominada com a finalidade de urgente fruição da tutela de mérito ZAVASCKI, Teori
Albino. Antecipação da Tutela. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. ps. 44 e 45. 96
MACHADO, José Mauro Decoussau. Aspectos da Antecipação da Tutela na Propriedade Industrial: patentes,
desenhos industriais e marcas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 122.
45
legislador e dos cientistas jurídicos: em um constante diálogo que resultou no surgimento de
técnicas processuais vocacionadas a proteger os direitos de marca.
CAPÍTULO II
PROPRIEDADE INTELECTUAL E SISTEMA DE MARCAS
2.1 Aspectos gerais dos Direitos de Propriedade Intelectual
Em termos gerais, a “propriedade” pode ser sistematizada como material e
imaterial. A “propriedade material” consubstancia-se nas coisas presentes no mundo físico
(concretas), distinguindo-se da “propriedade imaterial” (que caracteriza-se por seu caráter
abstrato), estando ou não presentes no mundo físico; esta modalidade é oriunda da
personalidade ou do intelecto humano.
Neste raciocínio, a propriedade intelectual, é espécie do gênero propriedade
imaterial, que por sua vez integra a classe das propriedades. Neste aspecto, o Direito protege a
situação real que vincula o originador – criador ou inventor – à sua obra ou invento, tutelando
as atividades intelectuais criativas ou inventivas.
O direito à propriedade está visivelmente previsto na Carta Federal de 1988, em
seu artigo 5º, que propugna, todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade
do direito à propriedade.
A previsão da propriedade como direito fundamental abrange as diversas
manifestações que essas possam ter, superando as antigas concepções adotadas no direito
privado. Neste sentido, consiste o sentido amplíssimo que a terminologia propriedade, que
46
deve corresponder no texto constitucional, extrapolando as definições constantes do direito
privado97
.
No entendimento de Gilmar Mendes, observando a disciplina no direito alemão, não
somente bens móveis ou imóveis estão protegidos, mas também outros valores patrimoniais.
Articula que outros direitos estão inclusos no conceito de propriedade, como os direitos de
marca.98
Portanto, não somente os direitos de propriedade inerentes aos bens materiais, mas o
direito de propriedade relativos aos bens imateriais, necessitam de instrumentos jurídicos que
o protejam.
Vislumbrando este cenário atual dos direitos, uma leitura contemporânea elenca a
propriedade intelectual como direito fundamental, encontrando expresso amparo
constitucional, no art. 5º, incisos XXVII, XVIII e XVIX da presente Carta Republicana: “aos
autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras,
transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar”; “são assegurados, nos termos da lei,
a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz
humanas, inclusive nas atividades desportivas, e o direito de fiscalização do aproveitamento
econômico das obras que criarem ou de que participarem aos criadores, aos intérpretes e às
respectivas representações sindicais e associativas”; e “a lei assegurará aos autores de
inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às
criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos
distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do
País”.
Desta feita sustenta-se que o direito de propriedade intelectual tem designação
fundamental, visto que garante tanto ao originador, ou àquele titular do direito, quanto à
sociedade a possibilidade de proteção e acesso ao resultado da produção intelectual.
Em sentido igual, a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 indica em
seu artigo 27º que:
toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da
comunidade, de fruir das artes e de participar do progresso científico e nos
benefícios que deste resultam; todos tem direito à proteção dos interesses morais e
materiais ligados a qualquer produção científica, literária ou artística da sua autoria.
97
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de
Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 468 - 469. 98
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de
Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 469.
47
Importa expor uma relevante questão: direito do originador ou direito da
sociedade, qual prepondera sobre a bem imaterial?
Respondendo, Denis Borges Barbosa e Karin Grau-Kuntz afirmam haver
tendências de prevalência tanto para o originador quanto para a sociedade, concluindo que “a
individualidade e universalidade e interdependência dos direitos humanos entre si.”99
É salutar destacar que o direito fundamental à propriedade intelectual não se
limita ao bem já dotado de exclusividade, seja qual for o mecanismo que o conferiu
exclusividade100
. Portanto, “ninguém é menos protegido pelos direitos humanos ou
fundamentais pelo fato de, tendo criado, ainda não depositou o pedido de patente.”101
As concessões de direitos de propriedade intelectual limitam a livre concorrência,
reflexamente limitando a livre iniciativa, isto porque concede direitos de exclusividade sobre
determinados bens imateriais ao titular da propriedade intelectual. A exclusividade da
exploração destes direitos e de defesa dos mesmos contra atos ilícitos, não somente protegem
direitos individuais, mas regulam, paralelamente, uma harmonia nos empreendimentos no
âmbito econômico e social.
Destarte, se por uma perspectiva há a restrição da livre concorrência, face à
proteção dos direitos de exclusividade conferidos a determinada propriedade intelectual, por
outra há a conformação desse direito de exclusividade a determinados objetivos aos quais a
propriedade industrial deve obedecer, quais sejam: interesse social e o desenvolvimento
tecnológico e econômico do país.
Na égide do direito fundamental à proteção da propriedade intelectual, não
existem apenas concessões ou restrições impostas àquele que se pretende portador, mas
partindo da emissão de normas de conformação de direitos fundamentais102
, existe também a
busca da concretização desse direito frente a sociedade. Esta concretização, ou adaptação à
vida real, torna-se possível a partir do momento que o público e o privado obedecem o
99
BARBOSA, Denis Borges; GRAU-KUNTZ, Karin. Ensaios sobre o Direito Imaterial: estudos dedicados a
Newton Silveira. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 395. 100
A proteção jurídica da Propriedade Intelectual não está restrita à titularidade jurídica almejada via processos
administrativos ou judiciais. Esta proteção não se configura somente pela concessão do título, incluem-se,
também, a possibilidade de produção e o acesso ao resultado da produção intelectual. 101
BARBOSA, Denis Borges; GRAU-KUNTZ, Karin. Ensaios sobre o Direito Imaterial: estudos dedicados a
Newton Silveira. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 396. 102
Neste sentido, Alexandre Reis Siqueira Freire (2004), afirma que as norma de conformação – ou configuração
– referentes aos direitos fundamentais complementam, concretizam, definem o conteúdo de proteção do direito
fundamental, dando-lhe precisão.
48
conselho de respeito à função social e ao desenvolvimento tecnológico e econômico, previsto
do texto constitucional.
Assim, consoante ao afirmado, cabe perfeitamente os preceitos normativos dos
arts. 218 e 219 da Constituição Federal, sendo esses, que “o Estado promoverá e incentivará
o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas”, e que “o mercado
interno integra o patrimônio nacional e será incentivado de modo a viabilizar o
desenvolvimento cultural e socioeconômico, o bem-estar da população e a autonomia
tecnológica do País, nos termos de lei federal”.
Destaque ao Código Civil no art. 1.228, a advertência que o direito de propriedade
constitui-se o poder do proprietário, de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do
poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
Nesse sentido, consoante ao que afirma Pontes de Miranda103
, o direito da
propriedade pntelectual preexiste à proteção buscada por meio desta, e ainda, que o conteúdo
do Direito da Propriedade Intelectual é a exploração, seja qual for sua manifestação. Ensina, o
referido autor, que “o conteúdo do direito é a exploração, o usus, o fructus, a que se junte o
abusus”.104
Portanto, decorre dessas considerações a idéia de que: a propriedade intelectual é
uma modalidade de propriedade sobre o bem imaterial; o bem neste caso é imaterial, pois a
tutela jurídica recai sobre coisa incorpórea, abstrata; esta coisa incorpórea é tratada como bem
na medida em que lhe é atribuído, naquele momento e território, determinado valor,
mensurado por sua raridade, originalidade ou utilidade por um interessado.
Após aludir-se sobre a previsão do direito a propriedade intelectual no diploma
constitucional, assim como realçado alguns tópicos referentes o direito a propriedade em sua
acepção ampla, salutar é o destaque da definição daquele direito na Convenção do OMPI105
,
assim redigindo106
:
103
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcante. Tratado de Direito Privado, vol. 7. Parte Especial. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1983. p. 252. 104
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcante. Tratado de Direito Privado, vol. 7. Parte Especial. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1983. p. 252. 105
O OMPI (Organização Mundial da Propriedade Intelectual) ou, em inglês, WIPO (World Intellectual
Property Organization) definiu o conceito de propriedade intelectual após a consolidação da discussão acerca
do tema em diversas convenções, como a Convenção de Paris, em 1883, e a Convenção de Berna, em 1886,
assim como a de outras convenções e tratados. O OMPI figura, atualmente, como órgão autônomo integrante do
sistema das Nações Unidas, ao passo que discute e delibera sobre assuntos que envolvam propriedade intelectual. 106
The Convention Establishing the World Intellectual Property Organization (1967) gives the following list of
subject matter protected by intellectual property rights: literary, artistic and scientific works; performances of
performing artists, phonograms, and broadcasts; inventions in all fields of human endeavor; scientific
discoveries; industrial designs; trademarks, service marks, and commercial names and designations; protection
49
a soma dos direitos relativos às obras literárias, artísticas e científicas, às
interpretações dos artistas intérpretes e às execuções dos artistas executantes, aos
fonogramas e às emissões de radiodifusão, às invenções em todos os domínios da
atividade humana, às descobertas científicas, aos desenhos e modelos industriais, às
marcas industriais, comerciais e de serviço, bem como às firmas comerciais e
denominações comerciais, à proteção contra a concorrência desleal e todos os outros
direitos inerentes à atividade intelectual nos domínios industrial, científico, literário
e artístico.107
Destarte, uma vez apresentados estes aspectos, conclui-se que compreendendo as
características dos bens imateriais, além da proteção presente no direito substantivo, faz-se
necessário a utilização de técnicas processuais efetivas para a proteção da propriedade
intelectual.
2.2 Marcas: conceituação e processo administrativo de obtenção do direito de marca
A marca é uma modalidade de propriedade – imaterial – de caráter temporário,
conferida a sinais perceptíveis e diferenciadores de serviços e produtos, outorgada pelo
Estado ao originador ou outras pessoas físicas ou jurídicas que detenham direito sobre o
respectivo signo, possibilitando àquele explorá-lo economicamente, e proteger seus direitos
em face de terceiros.
De acordo com o art. 122 da Lei de Propriedade Industrial, são registráveis como
marcas “[...] os sinais distintivos visualmente perceptíveis, não compreendidos nas proibições
legais”.
Observando o ordenamento jurídico nacional, Barros afirma que a marca é “o
sinal visualmente perceptível que distingue produto ou serviço de seus semelhantes e afins de
outras origens, ou atesta a conformidade de produto ou serviço a exigência de ordem técnica
ou, ainda identifica produto ou serviço de membros de uma entidade”108
. Na concepção de
against unfair competition; and all other rights resulting from intellectual activity in the industrial, scientific,
literary or artistic fields. http://www.wipo.int/ acessado em 06.05.2011.
107
Convention Establishing the World Intellectual Property Organization, 1967. 108
BARROS, Carla Eugenia Caldas. Manual de direito da propriedade intelectual. Aracaju: Evocati, 2007. p.
325.
50
Fróes, “a marca pode ser definida [...] como o sinal distintivo ou identificador de produto ou
serviço”109
Estes sinais distintivos (aos quais se incluem as marcas) não são diretamente obras
do espírito, como ocorre com as invenções, mas, por sustentarem a relação entre o produto ou
serviço e a percepção identificadora e diferenciada àqueles, faz-se necessário sua tutela, neste
caso, por meio do registro.
Newton Silveira sustenta que tais sinais não são bens imateriais propriamente
ditos, mas acessórios, e que, observando-se a necessidade de proteção desses signos, o
ordenamento jurídico os conferiu status de bens imateriais. Conclui que a lei perfilha a
existência de bens imateriais – invenções, modelo de utilidade e desenhos industriais – e de
novos bens imateriais – marcas –, posto que esses últimos são necessários para repressão de
atos ilícitos como a concorrência desleal, reunindo, conseqüentemente, todos esses como bens
imateriais – as invenções, modelos de utilidade, desenhos e os signos que os identificam e
diferenciam.110
Seguindo a mesma sistemática quanto às modalidades de propriedade industrial
abordadas em linhas anteriores, a Lei nº. 9.279/1996, em seu art. 124, após uma breve
definição dos signos que podem deter a tutela do registro de marca, elenca um rol de sinais
não registráveis como marca.111
109
FRÓES, Carlos Henrique de Carvalho. Marca: Aquisição de distintividade e degenerescência. In
SANTOS, Manoel J. Pereira dos; JABUR, Wilson Pinheiro. (coordenadores) Propriedade intetelctual: sinais
distintivos e tutela judicial e administrativa. Série GVlaw. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 84. 110
SILVEIRA, Newton. Propriedade intelectual: propriedade industrial, direito de autor, software, cultivares,
nome empresarial. 4. ed. Barueri: Manole, 2011. 111
São sinais não registráveis: i) brasão, armas, medalha, bandeira, emblema, distintivo e monumento oficiais,
públicos, nacionais, estrangeiros ou internacionais, bem como a respectiva designação, figura ou imitação; ii)
letra, algarismo e data, isoladamente, salvo quando revestidos de suficiente forma distintiva; iii) expressão,
figura, desenho ou qualquer outro sinal contrário à moral e aos bons costumes ou que ofenda a honra ou imagem
de pessoas ou atente contra liberdade de consciência, crença, culto religioso ou idéia e sentimento dignos de
respeito e veneração; iv) designação ou sigla de entidade ou órgão público, quando não requerido o registro pela
própria entidade ou órgão público; v) reprodução ou imitação de elemento característico ou diferenciador de
título de estabelecimento ou nome de empresa de terceiros, suscetível de causar confusão ou associação com
estes sinais distintivos; vi) sinal de caráter genérico, necessário, comum, vulgar ou simplesmente descritivo,
quando tiver relação com o produto ou serviço a distinguir, ou aquele empregado comumente para designar uma
característica do produto ou serviço, quanto à natureza, nacionalidade, peso, valor, qualidade e época de
produção ou de prestação do serviço, salvo quando revestidos de suficiente forma distintiva; vii) sinal ou
expressão empregada apenas como meio de propaganda; viii) cores e suas denominações, salvo se dispostas ou
combinadas de modo peculiar e distintivo; ix) indicação geográfica, sua imitação suscetível de causar confusão
ou sinal que possa falsamente induzir indicação geográfica; x) sinal que induza a falsa indicação quanto à
origem, procedência, natureza, qualidade ou utilidade do produto ou serviço a que a marca se destina; xi)
reprodução ou imitação de cunho oficial, regularmente adotada para garantia de padrão de qualquer gênero ou
natureza; xii) reprodução ou imitação de sinal que tenha sido registrado como marca coletiva ou de certificação
por terceiro, observado o disposto no art. 154; xiii) nome, prêmio ou símbolo de evento esportivo, artístico,
cultural, social, político, econômico ou técnico, oficial ou oficialmente reconhecido, bem como a imitação
suscetível de criar confusão, salvo quando autorizados pela autoridade competente ou entidade promotora do
51
São legitimados para requerer o registro de marca, como anuncia o art. 128, “[...]
as pessoas físicas ou jurídicas de direito público ou de direito privado”. Em se tratando de
pessoas de direito privado, estas só poderão requerer o registro de marca referente a atividade
que exerçam de forma efetiva e lícita, podendo transferir esse direito a empresas que
controlem direta ou indiretamente. Se for o caso de registro de marca coletiva, este se
realizará a requerimento de pessoa jurídica que represente a coletividade, e, em casos de
marca de certificação, o requerimento deverá ser realizado por pessoa sem interesse comercial
ou industrial quanto ao produto ou serviço.
Em se tratando de pedido de prioridade, como dispõe o a art. 127, “ao pedido de
registro de marca depositado em país que mantenha acordo com o Brasil ou em organização
internacional, que produza efeito de depósito nacional, será assegurado direito de prioridade”,
sendo que o documento que comprove a prioridade deverá ser apresentado no prazo de 4
(quatro) meses.
Após a publicação do pedido, abre-se o prazo de 60 (sessenta) dias para que
terceiros apresentem suas oposições, indicação dado no art. 158 da Lei em estudo. Nos casos
de oposições fundamentadas em solicitação de má-fé ou marca notoriamente conhecida do
público, respectivamente art. 124 e art. 126, aquele que opôs deverá depositar seu pedido de
registro de marca em 60 (sessenta) dias, caso não o faça, sua oposição não deverá ser
conhecida.
São requisitos formais para o conhecimento do pedido os seguintes documentos:
i) requerimento; ii) etiquetas, quando for o caso; e iii) comprovante do pagamento da
retribuição relativa ao depósito. Estes documentos deverão ser redigidos em língua
portuguesa, sendo obrigatória a tradução daqueles que estiverem em língua estrangeira, seja
evento; xiv) reprodução ou imitação de título, apólice, moeda e cédula da União, dos Estados, do Distrito
Federal, dos Territórios, dos Municípios, ou de país; xv) nome civil ou sua assinatura, nome de família ou
patronímico e imagem de terceiros, salvo com consentimento do titular, herdeiros ou sucessores; xvi)
pseudônimo ou apelido notoriamente conhecidos, nome artístico singular ou coletivo, salvo com consentimento
do titular, herdeiros ou sucessores; xvii) obra literária, artística ou científica, assim como os títulos que estejam
protegidos pelo direito autoral e sejam suscetíveis de causar confusão ou associação, salvo com consentimento
do autor ou titular; xviii) termo técnico usado na indústria, na ciência e na arte, que tenha relação com o produto
ou serviço a distinguir; xix) reprodução ou imitação, no todo ou em parte, ainda que com acréscimo, de marca
alheia registrada, para distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, suscetível de
causar confusão ou associação com marca alheia; xx) dualidade de marcas de um só titular para o mesmo
produto ou serviço, salvo quando, no caso de marcas de mesma natureza, se revestirem de suficiente forma
distintiva; xxi) a forma necessária, comum ou vulgar do produto ou de acondicionamento, ou, ainda, aquela que
não possa ser dissociada de efeito técnico; xxii) objeto que estiver protegido por registro de desenho industrial de
terceiro; e xxiii) sinal que imite ou reproduza, no todo ou em parte, marca que o requerente evidentemente não
poderia desconhecer em razão de sua atividade, cujo titular seja sediado ou domiciliado em território nacional ou
em país com o qual o Brasil mantenha acordo ou que assegure reciprocidade de tratamento, se a marca se
destinar a distinguir produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, suscetível de causar confusão ou
associação com aquela marca alheia.
52
no ato do depósito, seja no prazo de 60 (sessenta) dias, sob pena de não conhecimento do
pedido. Caso subsistam pendências sanáveis, e que estas não comprometam a identidade do
pedido, o INPI estabelecerá a exigências cabíveis para a regularização do feito, no prazo de 5
(cinco) dias. Sanadas as irregularidades, o depósito será considerado pronto a submeter-se ao
exame de mérito, conforme o art. 155, art. 156 e art. 157.
Caso o exame de mérito considere registrável a marca, como escrevem os art. 160
e art. 161, defere-se o pedido, e, com o pagamento das respectivas taxas, conceder-se-á o
registro da marca ao titular, não sendo esta decisão impugnável por recurso administrativo.
Entretanto, as demais decisões proferidas no decorrer do processo administrativo em análise
são impugnáveis por recurso, no prazo de 60 (sessenta) dias.
Insta ressaltar, ao se tratar do lapso temporal de vigência do registro de marca,
que, de acordo com o art. 133, “o registro da marca vigorará pelo prazo de 10 (dez) anos,
contados da data da concessão do registro, prorrogável por períodos iguais e sucessivos”.
Obtido o registro do sinal distintivo, a proteção de exclusividade concorrencial é
exercida de forma negativa, impossibilitando que terceiros façam uso da marca de produto ou
serviço lesando o direito do titular do registro.
A proteção conferida ao titular da marca ou ao depositante, como dispõe o art. 130
da LPI, assegura o direito de ceder seu registro ou pedido de registro, licenciar seu uso e zelar
pela sua integridade material ou reputação.
Além dessa proteção, de acordo com o art. 129 da LPI, é assegurado ao titular do
registro de marca o exercício de seu direito de exclusividade quanto à utilização da marca,
agindo contra terceiros que objetivem praticar atos ilícitos contra o seu direito, inclusive na
esfera judicial civil.
2.3 A importância da “distintividade”
A partir dos contornos constitucionais e infraconstitucionais do ordenamento
jurídico brasileiro, a marca é pensada tanto em uma perspectiva individual, na qual se
considera o fluxo das relações entre particulares, como também em uma perspectiva coletiva,
na qual este sinal distintivo deve pautar-se na noção de função social da propriedade.
Como sinal distintivo que é, serve como elemento identificador e diferenciador de
produtos e serviços, sendo útil ao particular detentor do registro, pois exerce os direitos de
exclusividade sobre determinada marca. Esta configura-se, ainda, fundamental à coletividade,
53
pois permite que o consumidor a identifique entre várias outras, diferencie o objeto de
consumo partir da sua marca, e consuma o produto ou serviço sem qualquer confusão.
Portanto, a marca pode ser compreendida em três perspectivas: (i) como
propriedade; (ii) como elemento de exclusividade nas relações concorrenciais; e (iii) como
instrumento de proteção de interesses sociais. Notadamente, como explica Denis Borges
Barbosa, nestas circunstancias “existe uma tensão entre liberdade de concorrência e a
exclusividade, com vistas a servir determinados interesses socialmente relevantes”112
Quanto aos fins sociais, podemos afirmar que a marca é importante para “proteger
o investimento em imagem empresarial, mas sem abandonar, e antes prestigiar, o interesse
reverso, que é o da proteção do consumidor”113
. E neste raciocínio também reside a ideia do
interesse do particular em “proteger” determinado público consumidor frente a outros
produtos ou serviço, para que consuma o seu produto ou serviço, valendo-se da distinção
conferida pela marca.
Na esfera de interesses entre particulares, a marca detém natureza dúplice, pautada
no direito de propriedade e no direito concorrencial. Isto permite que o titular do registro da
marca ingresse por via judicial e exija uma tutela inibitória, de remoção do ilícito, ou mesmo
ressarcitória de danos, tendo em vista a prática de atos de contrafação de marca.
Como leciona Fróes, a proteção conferida a determinada marca tem por objetivo
“garantir, de um lado, o interesse de seu titular e, do outro, o do consumidor, que não pode ser
enganado quanto ao produto que compra ou o serviço que lhe é prestado.”114
.
Tendo em vista os debate jurisprudenciais sobre o tema em análise, este raciocínio
pode ser extraído de acórdão do STJ, no julgamento do REsp 3.230/DF, pela Quarta Turma,
sob a relatoria do Ministro Sávio de Figueiredo Teixeira, no qual dispõe-se que “no estagio
atual da evolução social, a proteção da marca não se limita apenas a assegurar direitos e
interesses meramente individuais, mas a própria comunidade, por proteger o grande
publico”, e segue indicando os segmentos da sociedade beneficiados por esta concepção
constitucional de marca, como “o consumidor, o tomador de serviços, o usuário, o povo em
112
BARBOSA, Denis Borges. O direito constitucional dos dignos distintivos. In SANTOS, Manoel J. Pereira
dos; JABUR, Wilson Pinheiro. (coord.) Propriedade intetelctual: sinais distintivos e tutela judicial e
administrativa. Série GVlaw. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 8. 113
BARBOSA, Denis Borges. O direito constitucional dos dignos distintivos. In SANTOS, Manoel J. Pereira
dos; JABUR, Wilson Pinheiro. (coordenadores) Propriedade intetelctual: sinais distintivos e tutela judicial e
administrativa. Série GVlaw. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 21. 114
FRÓES, Carlos Henrique de Carvalho. Marca: Aquisição de distintividade e degenerescência. In
SANTOS, Manoel J. Pereira dos; JABUR, Wilson Pinheiro. (coordenadores) Propriedade intetelctual: sinais
distintivos e tutela judicial e administrativa. Série GVlaw. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 85.
54
geral, que melhores elementos terá na aferição da origem do produto e do serviço prestado.”
Destaca-se, ainda, a importância da repressão da concorrência desleal, da possibilidade de
confusão ou dúvida, e do locupletamento com o esforço e o labor alheios.
É neste sentido que as questões referentes à contrafação de marca não devem ser
menosprezadas do ponto de vista probatório e quanto à formação do juízo, pois se a decisão
atinge os interesses entre particulares, tendo em vista o direito de propriedade e o direito
concorrencial, também atingem o interesse coletivo do consumidor e da sociedade em geral.
Simplificar o direito de marca no âmbito do processo civil, a partir da
simplificação da atividade probatória que visa aferir supostos atos de contrafação, pode
acarretar efeitos nefastos não só ao particular, mas a toda à sociedade ou a determinado
segmento social. Isto já demonstra que os litígios envolvendo contrafação de marca detêm
uma complexidade que vai além da simples comparação de elementos estéticos de signos
distintivos.
A ideia de distintividade é de evidente relevância neste estudo, pois é a partir da
comparação entre as marcas, e da distinção ou não distinção existente entre essas, que se
identifica a prática de atos de contrafação. Aqui surge uma questão interessante: qual o
espaço ou importância de alguns meios de prova para a identificação da prática de atos
ilícitos contra as marcas, quanto ao ato de aferir a distintividade?
Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu ser a distintividade o
elemento essencial da marca, apresentando relevância para o exercício do direito de
propriedade e do direito concorrencial, quanto aos interesses particulares, assim como a
importância social a marca em face de uma coletividade. Assim dispôs-se no informativo nº.
0411/STJ, referente ao julgamento do REsp 605.738/RJ, sob a relatoria do Ministro Luis
Felipe Salomão, julgado em 15.10.2009:
Na espécie, a empresa requereu ao INPI o registro da sua marca, sendo indeferido
administrativamente tal registro pelo fato de que a expressão traduzida significa
“marca inigualável”, constituindo, embora em outra língua, menção genérica
pertencente ao patrimônio comum. Isso posto, a Turma conheceu do recurso e lhe
deu provimento ao entendimento de que a vedação legal ao registro de marca cujo
nome é genérico ou comum visa emprestar a ela singularidade suficiente para
destacá-la do domínio comum, do uso corriqueiro. Isso porque a razão imediata da
existência do direito sobre marca é a distintividade, de sorte que não se pode
conceder direito de registro quando outra pessoa, natural ou jurídica, já possui sobre
o nome direito de uso, ou mesmo quando a coletividade possui direito de uso sobre o
mesmo objeto, o qual, por sua vulgaridade ou desvalor jurídico, já se encontra no
domínio público. Porém, o caráter genérico ou vulgar da marca deve ser aferido
segundo os usos e costumes nacionais, ou seja, deve-se analisar se, muito embora
em outra língua, o nome cujo registro se pretende é de uso comum, tal como
grafado. Assim, conquanto traduzido o nome, revele ele expressão genérica, não há
55
óbice no registro da marca se, analisada a expressão em sua literalidade, nada disser
ao homem médio brasileiro. (grifos nossos).
Vale expor, ainda, a narrativa de Fróes referente a um vídeo institucional exibido
pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial, a um grupo de advogados e agentes da
propriedade industrial, o qual “mostrava pessoas andando na rua, todas elas com uma máscara
branca ocultando seus rostos, para mostras que um produto sem marca é como uma pessoa
sem rosto.”115
.
Nesta conjectura, uma pessoa com uma máscara idêntica à de outra pessoa poderia
causar confusão quando da identificação de uma, ou de outra: nesta conjectura é que se
constitui a importância da “distintividade” à marca.
2.4 Atos de contrafação de marca
A expressão “atos de contrafação” indica um conjunto de atos ilícitos praticados
contra determinados direitos de propriedade industrial. Neste estudo implica identificarmos
alguns desses atos ilícitos, quando praticados contra os direitos relativos à marca.
Adotamos a acepção mais abrangente quanto à “contrafação” ou “atos de
contrafação de marca”, referindo-nos a toda prática que consista no desrespeito ao direito
de exclusividade por meio da utilização ilícita da distintividade de determinada marca.
Sendo assim, podemos apontar como práticas de “atos de contrafação”, (i) a
reprodução de marca, (ii) a imitação de marca, assim como (iii) a utilização da marca na
composição de determinadas denominações.
A reprodução consiste na cópia, total ou parcial, da marca. Neste sentido, induz-
se o consumidor do produto ou serviço ao erro de assimilar um objeto de consumo marcado
ilicitamente, como o objeto de consumo marcado licitamente.
Nos casos de reprodução, identificando o símbolo distintivo, ou mesmo partes
desse símbolo distintivo, em um produto ou serviço ilicitamente marcado, o consumidor
adquire um objeto de consumo equivocadamente, na certeza de ser aquele produto ou serviço
legítimo.
115
FRÓES, Carlos Henrique de Carvalho. Marca: Aquisição de distintividade e degenerescência. In
SANTOS, Manoel J. Pereira dos; JABUR, Wilson Pinheiro. (coordenadores) Propriedade intetelctual: sinais
distintivos e tutela judicial e administrativa. Série GVlaw. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 84.
56
Quanto à imitação, a finalidade da prática do ilícito é a mesma, confundir o
consumidor e fazê-lo adquirir um produto ou serviço ilicitamente marcado. Entretanto, neste
caso, não se copia elementos de determinada marca, e sim se reproduz camufladamente.
Com a prática da imitação, o terceiro utiliza ilicitamente todo o empreendimento
na constituição daquela marca frente ao mercado consumidor, em favor do seu produto ou
serviço, em detrimento do produto ou do serviço do titular do registro de marca. A imitação,
certamente, é uma das práticas mais convenientemente utilizadas, pois a ilicitude é disfarçada,
sem a necessária reprodução de elementos da marca legítima.
Machado, pautando-se nos estudos de Gama Cerqueira, define que “a reprodução
ocorre com a cópia da marca, seja total ou parcial, ao passo que a imitação caracteriza-se pela
reprodução disfarçada com algumas diferenças inseridas pelo contrafator.”116
A reprodução e a imitação são praticadas, sobretudo, quando o produto ou o
serviço que se pretende marcar ilicitamente integram um contexto de atividades
empreendedoras ou atividades de consumo específicas, tais atividades idênticas ou afins, com
o objetivo de maximizar a confusão. No mesmo sentido, conclui que:
A prática de contrafação, seja mediante reprodução, seja por imitação, normalmente
só ocorrerá se os produtos ou serviços distinguidos pela marcas confrontadas
pertencerem a ramos de atividade idênticos ou afins, sendo possível que o
consumidor seja induzido à confusão.117
Identificamos, ainda, a utilização de uma marca na composição de determinadas
denominações, como nome comercial e nome de domínio, como outra prática de contrafação.
Sobre esta possibilidade, afirma-se que:
A prática de contrafação de marca também ocorre quando há a sua reprodução, por
terceiro, como parte integrante de nome empresarial. Essa utilização é passível de
causar confusão ao público, notadamente quando há identidade ou afinidade entre os
ramos de atividade (...). Além disso, marcas registradas também não podem ser
utilizadas, sem autorização, como nomes de domínio, os quais são utilizados para
localizar páginas (ou sites) na internet.118
A análise da prática de contrafação exige a identificação da distintividade, alvo da
contrafação, no intuito de perceber as similitudes entre a marca legítima e a marca contrafeita.
116
MACHADO, José Mauro Decoussau. Aspectos da Antecipação da Tutela na Propriedade Industrial:
patentes, desenhos industriais e marcas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 108 e 109. 117
MACHADO, José Mauro Decoussau. Aspectos da Antecipação da Tutela na Propriedade Industrial:
patentes, desenhos industriais e marcas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 109. 118
MACHADO, José Mauro Decoussau. Aspectos da Antecipação da Tutela na Propriedade Industrial:
patentes, desenhos industriais e marcas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. 112 e113.
57
Insta destacar que os atos de contrafação de marca podem acarretar, e comumente
acarretam, a prática de concorrência desleal. Dispõe o art. 195 da LPI um rol exemplificativo
de condutas consideradas como crime de concorrência desleal, destacando-se a previsão do
inciso III, informando que: comete crime de concorrência desleal quem emprega meio
fraudulento, para desviar, em proveito próprio ou alheio, clientela de outrem.
A correlação entre a contrafação de marca e a concorrência desleal contribui para
a identificação de atos de contrafação, possibilitando a concessão de tutela inibitória ou de
remoção do ilícito. Além disso, o vinculo entre estes dois atos ilícitos, contrafação e
concorrência desleal, permite a investigação dos prejuízos causados pela prática daquele
ilícito, evidenciando o direito à tutela ressarcitória referente à utilização fraudulenta de
determinada marca em ambientes como o empresarial e consumidor.
Machado, analisando o referido dispositivo da LPI, afirma que a previsão é
genérica, ao apontar que “o crime é praticado por todo aquele que se utiliza de um meio
fraudulento para desviar a clientela alheia em seu proveito ou de outrem”, definindo como
meios fraudulentos, “todos e quaisquer meios ilegais, dentre os quais certamente se inclui a
contrafação de bens imateriais”; sustenta, nesta linha de raciocínio, que “tal utilização tem
como finalidade lógica fazer com que o consumidor deixe de adquirir o produto original para
adquiri o contrafeito, isto é, tem como finalidade desviar a clientela do titular do direito de
propriedade industrial.”119
Neste contexto, é indiscutível que a prática de atos de contrafação de marca, e
consequentemente de concorrência desleal, acarretam inúmeros danos ao direito do titular do
registro e à marca em si, muitas das vezes ocasionando prejuízos que vão além da diminuição
do consumo do produto ou serviço legítimo, pelo mercado consumidor. Essas práticas podem
acarretar prejuízos como a desvalorização da marca, frente ao meio empresarial e
consumidor, ou mesmo a degenerescência com a perda da distintividade.
Esses aspectos merecem atenção diferenciada quando aferidos, pois a
identificação da prática do ato de contrafação tem como objeto o ato ilícito, ao passo que
identificar e mensurar os efeitos da prática do ilícito tem como objeto o dano, sendo
importante a colaboração técnica de especialistas.
119
MACHADO, José Mauro Decoussau. Aspectos da Antecipação da Tutela na Propriedade Industrial:
patentes, desenhos industriais e marcas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 115 e 116.
58
CAPÍTULO III
TUTELA DE URGÊNCIA E PROTEÇÃO DOS DIREITOS DE MARCA
3.1 Considerações gerais
A tutela de urgência é um dos temas processuais que mais ocupa o interesse da
comunidade jurídica, tendo em vista estar evidentemente relacionada à ideia de efetividade, valor tão
almejado atualmente e que tornou-se fundamental ao processo.
Pautados em um modelo constitucional de processo120
, os estudiosos e intérpretes do
processo civil compreenderam a exigência de superar obstáculos econômicos, organizacionais e
processuais121
, para pensar o processo não somente como método de realização da atividade
jurisdicional, mas também como instrumento de concretização dos direitos fundamentais.
É notável que, tanto na atividade intelectual doutrinária – que se dedica em estudar a
tutela de urgência e apresentar reflexões no sentido de otimizar sua aplicabilidade –, como na
atividade jurisdicional – que no cotidiano jurisprudencial interpreta o texto processual e aplica a tutela
120 É este modelo constitucional do direito processual civil que, como explica Cassio Scarpinella Bueno,
apresenta os princípios constitucionais do processo civil, os procedimentos jurisdicionalmente diferenciados, a organização judiciária e as funções essências à Justiça, que devem ser adotados como elementos essenciais para o exercício da tutela jurisdicional e a estruturação do método institucional de solução de conflitos: o processo. BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil. vol. 1. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 124 – 279. 121 Hodiernamente existe um movimento de acesso à justiça e de constitucionalização do processo. Buscou-se
superar três obstáculos: o econômico, o organizacional e o processual – o econômico, relacionado ao direito amplo acesso à justiça, caracterizou-se por garantir àqueles desfavorecidos economicamente a possibilidade de buscar em juízo a proteção de seus direitos; o organizacional, relacionado à proteção dos direitos difusos e coletivos, esquecidos em codificações de caráter eminentemente individualista; e o processual, relacionado à efetividade e racionalidade das técnicas processuais, noutras palavras, ao direito a uma tutela jurisdicional
efetiva. BEDAQUE, Jose Roberto dos Santos. Efetividade do Processo e Técnica Processual. 3ª ed. Rio de
Janeiro: Malheiros, 2010. p. 24.
59 de urgência no intuito de realizar uma proteção efetiva dos direitos –, e ainda na atividade legislativa –
que cada vez mais tem se comprometido em analisar a importância da tutela de urgência e inseri-la nas
codificações e leis extravagante –, o princípio da efetividade foi consagrado e a tutela de urgência
tornou-se essencial neste fenômeno.
Neste caminho, a superação de paradigma que atingiu o “como pensar o direito
processual civil”, que influenciou tanto doutrina e jurisprudência, ainda acarretou reformas
processuais relevantes no Código de Processo Civil.
A tutela de urgência cautelar já se fazia presente no CPC, sendo amplamente utilizada
para proteger os direitos que exigiam medidas urgentes, servia para suprir imperfeições técnicas do
sistema e salvaguardar situações ainda não protegidas.
Mas a necessidade de uma tutela com o objetivo de combater os efeitos negativos
decorrentes do transcurso do processo, com finalidade não somente acauteladora, como também
satisfativa, ocasionou a expansão na utilização do processo cautelar com o objetivo de proteger os
direitos submetidos às mais diversas situações emergenciais.122
E em atenção à exigência de mais efetividade, o CPC passou a comportar a técnica
processual da antecipação de tutela, viabilizadora da tutela de urgência satisfativa, garantindo-se o
aprimoramento da tutela de urgência, estendendo seu âmbito de aplicação e protegendo de maneira
mais extensa outros direitos e situações jurídicas, como os relativos às marcas e signos distintivos.
É perceptível que, após essas reformas na legislação processual, a doutrina nacional se
propôs a sistematizar essas modalidades de tutela diferenciada e a jurisprudência, muitas vezes,
acolheu corretamente as ideias apresentadas, assim como prestou seu contributo na edificação da
tutela de urgência.
Observando no sistema processual civil, pode-se afirmar que a tutela de urgência tem por
finalidade conceder tutela jurisdicional acauteladora ou satisfativa, tendo em vista a compensação dos
efeitos do tempo no processo, objetivando a proteção efetiva de um direito ou de uma situação
jurídica.
3.2 Identificação de um microssistema de tutela de urgência no Código de Processo Civil
Topologicamente, as espécies de tutela de urgências estão eminentemente condensadas
nos arts. 796 e seguintes do CPC – referente ao processo cautelar –, art. 273 do CPC – antecipação de
122
Nas palavras de Castagna, “Quando tratamos da expansão do processo cautelar como alternativa à
ordinarização do processo, concluímos que o abuso por que passou esta modalidade de provimento urgente se
deveu à necessidade de uma tutela destinada a afastar o periculum in mora com satisfatividade, diante de
situações específicas de direito material, o que, embora atentatório à técnica processual, era tolerado ou mesmo
ignorado pela jurisprudência.” Castagna, Ricardo Alessandro. Tutela de urgência: análise teórica e dogmática.
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 225.
60 tutela – e art. 461 e 461-A do CPC – que disciplina a antecipação de tutela nas obrigações de fazer,
não fazer e entrega de coisa.
Todavia, não necessariamente todas as técnicas processuais designadas como cautelares
podem ser consideradas como viabilizadores de una tutela de urgência cautelar, sendo que mesma
advertência se aplica ao à antecipação da tutela, pois nem todas as técnicas descritas correspondem a
tutela de urgência satisfativa.
Com o objetivo de esclarecer alguns desses aspectos, apresentam-se algumas
classificações que, mesmo adotando critérios diferentes entre si, explicitam exatamente a distinção
entre as técnicas processuais apresentadas e a tutela jurisdicional correspondente.
Entre as diversas classificações existentes na doutrina brasileira, identifica-se a proposta
sustentada por José Miguel Garcia Medina, Fernando da Fonseca Gajardoni e Ricardo Alessandro
Castagna, a mais adequada ao atual sistema apresentado no atual Código de Processo Civil, com
destaque às considerações e classificações apresentadas por Luiz Rodrigues Wambier, Eduardo
Talamini, Teori Albino Zavascki, Luiz Guilherme Marinoni e Luiz Fux, na diferenciação entre as
espécies de tutela de urgência (e tutela da evidência), na tentativa de apresentar uma sistematização
útil quando aplicadas para a proteção dos direitos de marca.
3.2.1 Tutela de urgência: cautelar e satisfativa (autônoma ou interinal)
De acordo com Medina, Gajardoni e Castagna, o atual sistema processual comporta três
modalidades de tutela de urgência: (i) tutela de urgência cautelar; (ii) tutela de urgência satisfativa
autônoma; (iii) tutela de urgência satisfativa interinal.
Neste entendimento, a tutela de urgência cautelar tem escopo de assegurar o direito da
parte ou a situação jurídica almejada, garantindo a eficácia e a utilidade do provimento final,
acarretando efeitos noutro processo ou no processo em que foi solicitada.
A utilização da terminologia “assegurar” 123
é adequada pois, na prática, a tutela cautelar
possibilita a satisfação futura de um direito caso o pedido principal seja deferido, criando condições
para sua proteção, mas sem realizar os efeitos práticos daquele direito.
123
De acorodo com Medina e Gajardoni, “a tutela cautelar tem escopo assecuratório: garantir a eficácia e a
utilidade de providência jurisdicional pleiteada em caráter “principal” – em outro processo (de conhecimento ou
de execução) ou no mesmo processo (no caso do art. 273 do CPC). (...) A tutela cautelar, a rigor, não realiza a
satisfação da pretensão da parte, mas cria condições para que tal satisfação se dê, se acolhido o pedido principal.
Tecnicamente, não há espaço para se falar em tutela “cautelar satisfativa”. A rigor, se a medida é satisfativa não
é cautelar; se é cautelar, não poderá ser satisfativa.” MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fabio Caldas de;
GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Procedimentos cautelares e especiais. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010. p. 69 e 70. Castagna conclui que, “a cautelar visa assegurar o exercício do direito da parte, e
nessa condição, deve necessariamente garantir a eficácia da sentença final, sob pena de não atingir a sua
finalidade institucional”. Castagna, Ricardo Alessandro. Tutela de urgência: análise teórica e dogmática. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 171.
61
Se a tutela de urgência cautelar tem função assecuratória do direito, a tutela de urgência
satisfativa (autônoma ou interinal) tem o condão de realizar o direito no plano dos fatos, quando se
constata o perigo de dano eminente e irreparável ao direito da parte, pois não podendo aguardar um
pronunciamento final futuro, exige-se a realização de uma tutela jurisdicional satisfativa apta a
proteger um direito ou uma situação jurídica naquele momento.
A tutela de urgência satisfativa autônoma realiza (satisfatividade) integralmente o objeto
da ação, via cognição sumária, e autônomo porque, sem guardar dependência a outro processo, ou
outra pretensão de direito, a não ser aquela já viabilizada na tutela de urgência, prescinde de
confirmação obtida em decisão por cognição exauriente.124
Mesmo que viabilizada para proteger um direito que encontra-se em situação que exige
uma proteção jurisdicional urgente, e ainda detendo caráter satisfativo, a característica essencial da
tutela de urgência satisfativa autônoma é a imutabilidade (ou irreversibilidade) dos seus efeitos na
realidade fática. Isto a distingue da tutela de urgência satisfativa interinal, pois nesta exige-se a
mutabilidade (ou reversibilidade) dos efeitos práticos da tutela jurisdicional concedida.125
A tutela de urgência satisfativa interinal, portanto, via cognição sumária, possibilita a
fruição imediata de efeitos práticos (satisfatividade), que só poderiam ser produzidos na tutela
jurisdicional concedida ao final, almejados na pretensão de caráter principal submetida a cognição
plenamente exauriente, sendo que os efeitos antecipados são provisórios, submetidos a confirmação ou
revogação na decisão principal.126
124
Medina e Gajardoni sustentam que “as tutelas de urgência satisfativas atutônomas são suficientes em si
mesmas, já que realizam, integralmente, o objeto da ação, precindindo-se, pois, de confirmação por sentença
fundada em cognição exauriente. Embora fundada em cognição sumária, acaba, muitas vezes, por criar situações
fática irreversíveis, em virtude da imutabçidade dos efeitos da decisção concedida.” MEDINA, José Miguel
Garcia; ARAÚJO, Fabio Caldas de; GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Procedimentos cautelares e especiais.
2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. p. 60 e 61. Sustenta Castagna que, “trata-se de uma tutela
que, plasmada pela urgência e pela cognição sumária, é deferida no bojo de um processo também sumariamente
formal, no qual não se desenvolve ulterior cognição plena e exauriente, mesmo que inapto a forma coisa julgada
material.” Castagna, Ricardo Alessandro. Tutela de urgência: análise teórica e dogmática. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2008. p. 191. 125
“A tutela de urgência satisfativa autônoma possui traço marcante que a diferencia da tutela interinal: se
apresenta como meio de tutela suficiente e autônomo, não havendo relação de dependência com outro processo
ou acessoriedade em relação à pretenção de direito material outra que não a deduzida desde logo no pedido de
tutela de urgência.” Castagna, Ricardo Alessandro. Tutela de urgência: análise teórica e dogmática. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 192. 126
Referindo-se à antecipação de tutela, o que pode, neste caso, ser empregado à tutela de urgência satisfativa
interinal, Medina e Gajardoni explicam que através daquela, “permite-se a fruição imediata dos efeitos que
seriam produzidos apenas com a prolação da decisão principal, ou, em caso de rejeição do pedido, serão
revogadas. Cria-se, portanto, em favor da parte, uma situação provisória, que pode vir a torna-se definitiva, em
caso do acolhimento do pedido feito em caráter principal. MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fabio
Caldas de; GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Procedimentos cautelares e especiais. 2. ed. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2010. p. 49. Castagna define que, a tutela satisfativa interinal constitui, portanto, o
provimento de urgência satisfativo, não autônomo, emitido no bojo de um processo plenário capaz de produzir
coisa julgada material. Com efeito, a provisoriedade da tutela interinal deve ser medida em relação à
imutabilidade pan-processual da decisão que a confirmar, e não ao processo em que é ela deferida e efetivada.”
Castagna, Ricardo Alessandro. Tutela de urgência: análise teórica e dogmática. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2008. p. 226.
62
A característica diferenciadora desta espécie de tutela de urgência satisfativa é que,
mesmo produzindo de imediato os efeitos que só poderiam ser produzidos mais à frente no processo,
esses efeitos não podem ser irreversíveis, tendo em vista seu caráter provisório (interinal / não
autônomo), sendo a concessão antecipada ser modificada durante o transcurso do processo e no
momento da decisão principal.127
3.2.2 Cautelares
As “cautelares” detém um livro próprio no CPC, que disciplina, dentre vários aspectos,
os fundamentos da tutela cautelar, seu procedimento geral, o poder geral de cautela, a possibilidade de
utilização de tutela cautelar inominada, as cautelares específicas etc.
Contudo, nem todas as técnicas processuais presentes correspondem necessariamente à
concretização de genuína tutela de urgência cautelar.
Observando o critério da tipicidade adotado na legislação, a classificação das cautelares
se daria em inominadas (ou atípicas) e nominadas (ou típicas).
As cautelares inominadas seriam aquelas prestadas com base no poder geral de cautela
do juiz, expresso no art. 798 do CPC. Na ausência de procedimento cautelar típico ou apto a assegurar
um direito, ou mesmo de tutela jurisdicional efetivamente asseguradora, é possível utiliza cautelar
inominada para pleitear esta proteção.
Assim, como demonstrou Marcus Vinicius de Abreu Sampaio, o poder geral de cautela
pode ser analisado sob o prisma de quem postula ou se beneficia o poder exercitado – as partes –, ou
de que exerce esse poder e a quem o mesmo é conferido – o juiz. Concordamos com a observação
apresentada pelo autor, e realçamos o seu entendimento no qual o poder geral de cautela detém na sua
essência eminentemente natureza pública, pois mesmo servindo aos interesses das partes, extrapola e
torna-se mecanismo de proteção dos direitos via atividade jurisdicional.
Paralelamente, acomodam-se as cautelares nominadas, aquelas arroladas nos arts. 813 a
887, e art. 888 do CPC, e as demais previstas em lei especial.
127
Diferenciando a tutela de urgência satisfativa interinal das tutela de urgência cautelar e tutela de urgência
satisfativa autônoma, Castagna afirma que: “a tutela satisfativa interinal diferencia-se da cautelar por três
aspectos essência: a) enquanto a primeira não possui autonomia processual, a segunda se apresenta como
provimento autônomo; b) a tutela satisfativa interinal tem conteúdo antecipatório dos efeitos executivos e
mandamentais da sentença de mérito, enquanto a cautelar limita-se a assegurar a eficácia da sentença e a
proteção do direito, sem contudo, satisfazê-lo; c) a tutela satisfativa interinal, quando substituída pela sentença
final de mérito, está apta a formar coisa julgada material, ao passo que a tutela cautelar não possui tal condão,
uma vez que não adentra no exame do mérito da ação principal. (...) São também marcantes duas diferenças
principais entre a tutela de urgência satisfativa interinal e a tutela de urgência satisfativa autônoma: a) enquanto a
primeira não possui autonomia procedimental, a segunda a apresenta; e b) a satisfativa interinal, quando
substituída pela sentença final de mérito, está apta a formar coisa julgada material, ao passo que tutela satisfativa
urgente autônoma não possui tal condão, uma vez que ao utilizar o procedimento cautelar, não apresenta ulterior
cognição plena e exauriente, com o exercício dos direitos consagrados pela cláusula do devido processo legal.”
Castagna, Ricardo Alessandro. Tutela de urgência: análise teórica e dogmática. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2008. p. 226 e 227.
63
Mas como afirmamos, nem todas as técnicas processuais arroladas no setor das cautelares
detém o desígnio somente de assegurar, outras utilizam-se da autonomia existentes nas cautelares e
possibilitam a satisfação do direito.
Assim, o que ocorre é que, em muitos casos, o procedimento cautelar é utilizado para a
viabilização destas tutelas de urgência satisfativas autônomas, tendo em vista ser este mais adequado a
tutelar as situações de urgência e corresponder às exigências do direito material, comparado aos
demais procedimentos ordinários previstos no CPC.
Assim, podemos destacar que em alguns casos, antes da inserção do art. 273 do CPC, era
comum a utilização da cautelar inominada não corresponde à viabilização de efeitos meramente
assecuratórios, mas concretizam efeitos satisfativos. A cautelar inominada realizava tutela de
urgência cautelar ou tutela de urgência satisfativa autônoma, mas, atualmente, a cautelar inominada
só deve ser utilizada para fins assecuratórios.
Marinoni adverte que, “não é mais admissível – após a reforma do Código – que alguém
pretenda propor ação (de cognição) sumária “satisfativa” com base no art. 798”, pois com o art. 273,
“agora é possível, portanto, que a tutela sumária satisfativa seja requerida no curso do processo de
conhecimento”128
, e não via processo cautelar.
No mesmo raciocínio, nem todas medidas cautelares específicas visam somente
assegurar a possibilidade de concreta realização da decisão final, pois em alguns casos as mesmas
podem ser satisfativas ou objetivar assegurar outro objeto, que não o provimento final.
Wambier e Talamini, adotando como critério a função, indicam quatro espécies de
medidas cautelares, as que visam “(a) adiantar uma produção probatória, em relação ao seu
momento processual oportuno (ex.: produção antecipada de provas, exibição de documentos,
justificação)”, essa se atendo à atividade probatória; “(b) resguardar a possibilidade de concreta
realização do provimento final, mediante a conservação de bens ou de um estado jurídico (ex.:
sequestro, arresto, atentado, arrolamento...)”, com evidente caráter de tutela de urgência cautelar;
“(c) determinar a contracautela a fim de evitar danos que possam advir de outro provimento sumário
e provisório (caução);”, funcionando como mecanismos de apoio a tutela jurisdicionais realizadas via
cognição sumária; e “(d) antecipar total e parcialmente os efeitos do provimento final, a fim de evitar
danos irreparáveis a uma das partes (tutela antecipada).”129
, que como os próprios autores destacam,
é categoria que ainda causa polêmica na doutrina brasileira.
É relevante destacar ainda a previsão de outras medidas, que são os alimentos
provisionais previstos no art. 852 do CPC e as medidas provisionais do art. 888 do CPC, que estão
128
MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da tutela. 11. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
p. 143 e 144. 129
WAMBIER, Luiz Rodrigues. TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil: processo cautelar e
procedimetos especiais. vol. 3. 13. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. p. 56.
64 arroladas no setor das cautelares, sendo estas, no entendimento de Castagna, outros exemplos de tutela
de urgência satisfativa autônoma.
Desta forma, observando o espaço reversado à cautelares a partir do art. 796 CPC,
podemos identificar:
(i) tutela de urgência cautelar: cautelar inominada com finalidade
assecuratória; sequestro; arresto; atentado; arrolamento, entre outros.
(ii) tutela de urgência satisfativa autônoma: alimentos provisionais; e outras
medidas provisionais.
(iii) técnicas de asseguração do direito à prova: produção antecipada de
provas, exibição de documentos, justificação
(iv) técnica de contracautela: caução.
Isto reflete que, mesmo na proposta estrutural apresentada no CPC, na tentativa de
reservar um espaço às cautelares, inclui-se técnicas processuais não somente realizadoras de tutela
cautelar, assim como satisfativas ou mesmo asseguradoras noutros aspectos.
3.2.3 Antecipação da tutela
A “antecipação de tutela” instituto processual inserido após algumas reformas no CPC,
disposto nos arts. 273, 461 e 461-A, disciplina fundamentalmente a tutela de urgência satisfativa
interinal, quando haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Entretanto, os
demais dispositivos referem-se a espécies de tutela jurisdicional que não estão essencialmente
alicerçadas no periculum in mora e na possibilidade da ocorrência de dano, mas no abuso do direito
de defesa e na existência de parte incontroversa da demanda.
Mesmo diferenciando-se em alguns aspectos, certo é que nas técnicas processuais
dispostas no art. 273 do CPC, ou noutras distribuídas pelo CPC e em legislação especial130
, o que se
almeja é racionalização do tempo no processo com a distribuição do ônus a quem verdadeiramente
deve suportá-lo, tornando a atividade jurisdiciona efetiva.
É neste sentido que Teresa Arruda Alvim Wambier afirma que “a função da tutela
antecipatória é a de tornar a prestação jurisdicional efetiva.”131
130
A técnica de antecipação da tutela prevista no art. 273 é generalizadora, funcionando como cláusula geral,
podendo ser aplicada a todas as demais espécies de tutela jurisdicional. Todavia, também viabilizam tutela de
urgência satisfativa a liminar em mandado de segurança, a liminar nas ações possessória, a liminar na ação de
busca e apreensão no Dec.- lei 911/69, a liminar nos embargos de terceiro, como explica Castagna ao analisar
outras espécies de técnicas processuais além das previstas nos arts. 273, 461 e 461-A do CPC. Castagna, Ricardo
Alessandro. Tutela de urgência: análise teórica e dogmática. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p.
233-239. 131
WAMBIER, Teresa Arrruda Alvim. Da liberdade do juiz na concessão de liminares e a tutela antecipatória.
In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. (Org.). Aspectos Polêmicos da Antecipação de Tutela. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1997. p. 533.
65
Acertadamente, Cassio Scapinella Bueno entende que a tutela antecipada enseja a
produção dos efeitos práticos da decisão final, o que não ocorreria se este momento de concessão fosse
dilatado para o futuro, pois teria ocorrido a perda do objeto do processo, e o direito que deveria ter
sido protegido acabaria não o sendo.132
Portanto, a antecipação da tutela adianta os efeitos práticos da decisão final exatamente
para que, com a proteção do direito ou situação jurídica discutida em processo, esta mesma decisão
final possa realizar efeitos práticos no futuro. Neste sentido, João Batista Lopes ressalta que a
antecipação de tutela implica no “adiantamento de efeitos da sentença de mérito com caráter
satisfativo”133
, por meio de decisão interlocutória.
Na incumbência de classificar as hipóteses de antecipação da tutela prevista no art. 273
do CPC, Teori Albino Zavascki sistematiza a antecipação de tutela em três hipóteses: assecuratória,
punitiva e do pedido incontroverso. Neste entendimento, os pressupostos complementares são
apontados nos incisos I e II, e § 6º do art. 273, que articulam: “haja fundado receio de dano irreparável
ou de difícil reparação”; “fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito
protelatório do réu”; e “quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se
incontroverso.”134
Na primeira hipótese há a antecipação por segurança no curso do processo, buscando-se
evitar o perecimento do objeto processual ou a incidência de danos sobre o direito afirmado. Aplica-se
a segunda hipótese com o intuito de concretiza a devida prestação jurisdicional, punindo as situações
que obstam o fluxo processual, e que acarretam restrições à celeridade. E a terceira hipótese realiza a
denominada tutela dos direitos evidentes, prezando pela pronta efetivação dos direitos não mais
controvertidos no processo, possibilitando desde logo a fruição deste por aquele que tem direito.
Marinoni classifica as espécies de antecipação de tutela como: (i) fundada contra o
perigo; (ii) fundada em abuso de direito de defesa; (iii) fundada em parte incontroversa da demanda.
Neste raciocínio, o art. 273 do CPC viabiliza a antecipação tendo em vista fundamentos diversos, pois
cada uma das possibilidades exige situação fático-processual135
diferentes, mesmo que todas
132
Em sua obra, Tutela Antecipada, Cassio Scarpinella Bueno reservou um tópico para responder a pergunta: Por
que tutela antecipada? Antecipa o que? Responde que “a tutela antecipada, vale ênfase, é assim chamada porque
precipita a produção dos efeitos práticos de uma sentença, os quais, de outro modo, não seriam perceptíveis, pois
não seriam sentidos na realidade concreta, no plano exterior ao processo, no plano material, portanto, até um
evento futuro: proferimento da sentença, processamento de recursos de apelação com efeito suspensivo e,
eventualmente, seu trânsito em julgado.” BUENO, Cassio Scarpinella. Tutela Antecipada. São Paulo: Saraiva,
2004. p. 33.
133
LOPES, João Batista. Tutela antecipada no processo civil brasileiro. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2009. p. 72. 134
ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 77-78. 135
Nos referimos a situação fático-processual pois a concessão da antecipação de tutela exige tanto a verificação
da situação fática na qual se encontra o direito que se busca proteger, assim como analisar aspectos referentes ao
professo, como o momento em que o mesmo se encontra, a atuação das partes, assim como a estabilização do
contraditório para se identificar o que se tornou ou não se tornou controvertido.
66 possibilitem a satisfatividade imediata com a realização de efeitos que só poderiam ocorrer em
momento futuro.
Assim, quando fundada contra o perigo, a antecipação da tutela se apresenta no inciso I
do art. 273 do CPC, se respalda no “fundado receio” de que: (i) o ato contrário ao direito ocorra; (ii) o
ato contrário ao direito já praticado, continue existindo; (iii) o dano se torne irreparável ou de difícil
reparação. Analisaremos, mais à frente, como a antecipação de tutela se manifesta quando utilizada
como apoio à tutela inibitória do ilícito, à tutela de remoção do ilícito e à tutela ressarcitória.
Percebe-se que nas três situações sugeridas o que se busca é impedir ou minimizar o ônus
causado pelo tempo no processo (periculum in mora), assim como os efeitos negativos decorrentes,
que possam atingir aquele que já demonstra ter direito à tutela jurisdicional. Estes elementos
fundamentam, ao nosso entender, a tutela de urgência satisfativa.
Se fundada em abuso do direito de defesa, esta antecipação da tutela está prevista no
inciso II do art. 273 do CPC, nos casos em que “fique caracterizado o abuso do direito de defesa ou o
manifesto propósito protelatório do réu”, que ocorre, em geral, nos casos de apresentação de defesa
indireta infundada. Sabe-se que a defesa, quanto ao mérito, pode ser direta (quando nega-se fato
constitutivo) e indireta (quando afirma-se fato impeditivo, modificativo ou extintivo). Assim, se na
defesa afirma-se fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito pleiteado, a outra parte admite o
fato constitutivo, este se tornando incontroverso, sendo que, também, o fato constitutivo pode ser
considerado incontroverso quando não contestado ou utilizada prova documental suficiente.
Ressalta-se que neste aspecto fundamenta-se a ideia de evidência dos fatos constitutivos,
o que possibilita indicar a antecipação da tutela fundamentada no abuso do direito de defesa como
tutela da evidência.136
Mas mesmo o fato constitutivo se tornando incontroverso, é necessário que se realize
atividade probatória para a verificação dos fatos apontados na defesa indireta, dilatando o tempo do
processo. Assim, sendo incontroverso o fato constitutivo do direito, a cognição exauriente se ocuparia
em verificar os fatos impeditivos, modificativos e extintivos do direito indicados pela outra parte, ou
seja, a defesa de mérito indireta não pode ser de imediata solução.137
Sabe-se que o exercício do
direito de defesa comporta a possibilidade do réu apresentar defesa indireta e esta situação processual,
136
Quanto ao caráter de evidência existente nesta técnica processual antecipatória, Marinoni explica que “a
evidência dos fatos constitutivos é condição imprescindível para a tutela antecipatória com base na reserva da
cognição da defesa de mérito indireta infundada. Em outras palavras, a análise da seriedade da defesa de mérito
indireta só tem razão de ser quando há evidência dos fatos constitutivos. MARINONI, Luiz Guilherme. Abuso
do direito de defesa e parte incontroversa da demanda. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p.
73. 137
“A tutela antecipatória, através da técnica da reserva da cognição da defesa de mérito indireta infundada,
somente tem razão de ser quando a defesa requer instrução dilatória, podendo adiar o momento de realização do
direito. Quando a defesa pode ser imediatamente apreciada, independentemente da produção de prova pericial ou
testemunhal, obviamente não há motivo para a reserva da cognição da defesa indireta, bastando o juiz proferir a
sentença.” MARINONI, Luiz Guilherme. Abuso do direito de defesa e parte incontroversa da demanda. 2. ed.
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 67.
67 por si só, não é suficiente para a concessão da antecipação da tutela. O abuso do direito de defesa
surge quando a defesa indireta apresentada é aparentemente infundada.138
Nesta esteira, transfere-se a
cognição exauriente exigida para a verificação dos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos, para
um momento futuro e, via cognição sumária, concede-se a tutela jurisdicional imediata quanto aos
efeitos práticos referentes aos fatos constitutivos incontroversos, ocorrendo a distribuição do tempo no
processo.
A antecipação da tutela fundada em parte incontroversa da demanda manifesta,
exatamente, uma tutela jurisdicional pautada em direito evidente.139
Isto porque, na dicção do § 6º do
art. 273 do CPC, é possível a antecipação de tutela quando “um ou mais dos pedidos cumulados, ou
parcela deles, mostrar-se incontroverso”, ou seja, possibilita-se a realização imediata dos efeitos da
tutela jurisdicional através das técnicas de não contestação e do reconhecimento jurídico (parcial) do
pedido.
Importa elucidar que a ideia de incontroverso refere-se a algo que não necessita ser
esclarecido e consequentemente não exigirá a realização de atividade probatória para verifica-lo.
Assim, torna-se incontroverso aquilo que é objeto admissão ou confissão dos fatos constitutivos
(derivado da não contestação ou confissão), assim como aquilo que, analisado a natureza dos fatos
articulados, já se apresenta esclarecido e não merece ser objeto de prova.140
A ideia de incontroverso
não se limita ao ato de contestação, pois adquire mais importância e objetividade quando considerado
o momento no qual, durante o processo, se determina o que é controvertido e o que é incontroverso.
Tendo em vista os direitos de marca, imagine-se o caso em que exista o uso ilegal de
determinado signo distintivo e se solicita tutela de remoção do ilícito e tutela ressarcitória, com a
finalidade de retirar das prateleiras os produtos contrafeitos, assim como os cartazes de propaganda
que acarretam concorrência desleal, e também receber indenização por perdas e danos. Se quem
pleiteia a tutela de remoção do ilícito apresenta prova do registro da marca no INPI, a embalagem do
138
“Como a incontrovérsia dos fatos constitutivos – condição para se pensar na análise de fundamento da defesa
indireta – tem grande peso e influência sobre a convicção do juiz, apenas a defesa indireta fundada pode ser
capaz de abalar a convicção judicial acerca da existência do direito, ou seja, a incontrovérsia dos fatos
constitutivos gera uma espécie de presunção da existência do direito, exigindo do réu o ônus de demonstrar, na
defesa indireta, que o fato extintivo, modificativo ou impeditivo – que ainda deverá ser provado – pode se
sobrepor à incontrovérsia dos fatos constitutivos. Caso isso não ocorra, a defesa deve ser considerada
infundada, ou melhor, incapaz de dissolver a força da incontrovésia dos fatos constitutivos e, assim, de protelar
a prestação da tutela jurisdicional do direito.” MARINONI, Luiz Guilherme. Abuso do direito de defesa e parte
incontroversa da demanda. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 67. 139
“Em resumo: incontroverso é o direito que se torna evidente no curso do processo, exigindo, em razão disso,
imediata tutela”, sendo este o raciocínio para se conceder tutela aos direitos evidentes. MARONINI, Luiz
Guilherme. Antecipação da Tutela. 11. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 286. 140
“Não há dúvida que incontroverso é algo que diz respeito ao que não precisa ser esclarecido e, assim, não
deve ser objeto de prova. Quando, porém, faz-se a associação de “incontroverso” com os “fatos que não
dependem de prova”, não se pensa na incontrovérsia que pode derivar da contestação, mas sim naquela que
decorre da natureza do fato articulado na petição inicial – fato notório – ou da atuação do réu que implica na
admissão ou na confissão dos fatos constitutivos – não contestados e confissão. MARINONI, Luiz Guilherme.
Abuso do direito de defesa e parte incontroversa da demanda. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2011. p. 67.
68 produto com a marca objeto do ato ilícito (sendo for evidente o ato de contrafação), e, ainda, os
cartazes veiculadores da propaganda desleal, mesmo a outra parte contestando a totalidade dos fatos
constitutivos, pode ser que essa não apresente argumentos suficientes na sua defesa de mérito direita.
Então, fixando em audiência preliminar o que acredita ser controvertido, o juiz poderá deferir provas
para esclarecer os fatos relacionados com o dano, atrelado à tutela ressarcitória, e entender
incontroverso que existe o ato ilícito e consequentemente o direito de remoção dos produtos
contrafeitos das prateleiras e os cartazes de propaganda.
Explicita-se que o art. 273 do CPC é capaz de distribuir o ônus do tempo do processo,
seja possibilitando a realização de tutela jurisdicional pautada na urgência, seja pautado no direito
evidente.
Destacando a ideia de tutela da evidência, é fundamental mencionar a lição de Luiz Fux,
afirmando que “sob o prisma processual, é evidente o direito cuja prova dos fatos sobre os quais incide
revela-os incontestáveis ou ao menos impassíveis de contestação séria”.141
Portanto, tendo em vista o espaço reversado à antecipação da tutela generalizada no art.
273 do CPC, acomodam-se:
(i) tutela de urgência satisfativa interinal: antecipação da tutela fundada contra o perigo
(relacionado ao ato ilícito ou relacionado ao dano);
(ii) tutela da evidência: antecipação da tutela fundada em abuso de direito de defesa e
antecipação da tutela fundada em parte incontroversa da demanda.
3.2.4 Fungibilidade: elemento integrativo da tutela de urgência
Fundando-se nas similitudes existentes entre a tutela de urgência cautelar e tutela de
urgência satisfativa, como a finalidade – proteção de direito ou situação jurídica que exige tutela
jurisdicional urgente – e com a distribuição do ônus do tempo no processo e os efeitos que este tempo
ocasiona, podemos afirmar que atualmente existe um regime único de tutela de urgência, mesmo que
os dispositivos que disciplinam cada uma dessas modalidades de tutela diferenciada encontram-se
pulverizados no Código de Processo Civil.
Outro elemento importante que nos permite sustentar um regime único de tutela de
urgência é a existência expressa no art. 273, § 7º, do CPC, que permite a fungibilidade entre as
espécies de tutelas de urgência: cautelar e satisfativa. São aptas a se submeterem a este mecanismo as
técnicas processuais que apresentam características semelhantes, mas que encontram-se em uma zona
141
“Os fatos, como sabido, são levados ao juiz através de prova, razão pela qual, quando se fala em direito
evidente, diz-se direito evidenciado ao juízo através das provas. Esse caráter é um misto de atributo material e
processual. Sob o ângulo civil, o direito evidente é aquele que se projeta no âmbito do sujeito de direito que
postula. Sob o prisma processual, é evidente o direito cuja prova dos fatos sobre os quais incide revela-os
incontestáveis ou ao menos impassíveis de contestação séria.” FUX, Luiz. Tutela de segurança e tutela da
evidência. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 311.
69 cinzenta
142 (aspecto essencial para na aplicação do princípio da fungibilidade). Observado o princípio
da instrumentalidade do processo, afastam-se peculiaridades formais da técnica no intuito de
concretizar a finalidade do processo, em viabilizar uma tutela jurisdicional efetiva.
A dúvida existente na aplicação entre uma tutela de urgência cautelar ou uma tutela de
urgência satisfativa é importante na medida que exige da doutrina e da jurisprudência a caracterização
aperfeiçoada e a fixação de critérios objetivos para a realização daquelas medidas, assim contribui para
o aprimoramento do sistema jurídico, ainda mais tendo em vista que a própria legislação
expressamente143
aponta uma válvula de escape, permitindo expressamente a fungibilidade.
Assim esclarece Teresa Arruda Alvim Wambier, ao lecionar que:
dúvidas são desejáveis e salutares como caracterizadores de um estágio para chegar
à certeza, e não como fonte de insuportável insegurança e às vezes causa de integral
insucesso da verdadeira função do processo, fundamentalmente instrumental, que é a
de dar direitos a quem os têm e não a de inventar direitos a que não os tenha ou de
retirá-los das mãos de seus titulares.144
Talamini, observando que para a concessão da tutela de urgência, o direito positivo indica
vias diferentes (tendo em vista que no Código de Processo Civil as medidas conservativas “cautelares”
e as satisfativas “antecipação da tutela” têm procedimentos diversos para sua obtenção), surge um
problema prático pois entres estas medidas existe uma “zona cinzenta”, acarretando dúvida objetiva145
quanto ao manejo de um ou outro procedimento e solicitação da tutela jurisdicional. Entende que a
fungibilidade entre o pleito e concessão da tutela de urgência se aplica restritivamente aos casos “de
dúvida objetiva acerca da natureza da medida”, e “de extrema urgência na concessão da providência
142
“De acordo com Teresa Arruda Alvim Wambier, o pressuposto para a incidência do princípio da
fungibilidade é a existência de uma zona cinzenta, significando “a existência de opiniões divergentes
manifestadas no plano doutrinário e jurisprudencial conflitante no país, (...) sobre qual seja o veículo correto para
formular determinado pedido ou pretensão perante o Poder Judiciário.” WABIER, Teresa Arruda Alvim. O
óbivio que não se vê: a nova forma do princípio da fungibilidade. In Princípios e temas gerais do processo civil
(Coleção doutrinas essenciais: processo civil; v. 1) Luiz Rodrigues Wambier, Teresa Arruda Alvim Wambier
(organizadores). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 319. 143
“O art. 273, § 7.º, consagra, agora expressamente, regra que, pensamos, já existia mesmo antes de constar
expressamente na lei.” WABIER, Teresa Arruda Alvim. O princípio da fungibilidade sob a ótica da função
instrumental do processo. In Princípios e temas gerais do processo civil (Coleção doutrinas essenciais: processo
civil; v. 1) Luiz Rodrigues Wambier, Teresa Arruda Alvim Wambier (organizadores). São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2011. p. 255. 144
WABIER, Teresa Arruda Alvim. O princípio da fungibilidade sob a ótica da função instrumental do processo.
In Princípios e temas gerais do processo civil (Coleção doutrinas essenciais: processo civil; v. 1) Luiz Rodrigues
Wambier, Teresa Arruda Alvim Wambier (organizadores). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p.
294. 145
Pode-se afirmar que existe dúvida objetiva quando, pela inexatidão da lei ao tratar as espécies de tutela de urgência, o jurisdicionado não identifica com exatidão no texto normativo qual caminho tomar para alcançar a tutela jurisdicional adequada ao caso, e, existindo esta inexatidão na legislação, ainda se identifique dúvida doutrinária e jurisprudencial quanto a diferenciação entre essas tutelas de urgência e sua aplicação.
70 para afastar o dano grave”, e advertindo o risco de se fazer tábula rasa a disciplina positiva, noutras
palavras, destacando o cuidado no emprego da fungibilidade.146
Examinando o referido dispositivo, Mitidiero conclui que o mesmo possibilita a
intertrocabilidade plena, em suas palavras, “pouco importa se a parte pediu antecipadamente tutela
satisfativa quando era o caso de tutela cautelar ou se formulou pedido de tutela cautelar quando seria
o caso de requerer tutela satisfativa”, justificando este entendimento pois “o que interessa para a sua
aplicação é que a parte alegue e prove os requisitos próprios à tutela adequada para proteção de sua
esfera jurídica.”147
Ao examinar este dispositivo, Malachini (2010) afirma que a fungibilidade proposta, de
acordo com a letra da lei, somente poderá ocorrer de tutela antecipatória para medida cautelar, mas
indica que a doutrina entende que esta norma abrange a fungibilidade entre ambas as tutelas,
antecipatória e cautelar.
No entanto, como poderia haver uma interpretação neste sentido se o legislador
categoricamente dispôs somente acerca daquela primeira possibilidade?
Sabe-se que a tutela antecipatória deverá ser requerida na ação proposta, inclusa na
petição inicial ou em simples petição no curso processual, ao passo que a tutela cautelar deverá ser
requerida por ação própria, instaurando um processo à parte, apensado aos autos do processo principal,
mesmo nos casos em que a medida cautelar é requeria incidentalmente. Nesta linha não haveria como
supor a fungibilidade entre o pedido de tutela cautelar para o de tutela antecipatória, pois aquela
deveria ser proposta em petição inicial e formação de processo separado do processo principal.
No entanto, a possibilidade do pedido de medida cautelar incidente, que poderá ser
requerido tanto em petição inicial quanto em simples petição no curso do processo referente à ação
principal. Assim, possibilita-se que esta medida cautelar incidental solicitada no processo de cognição
iniciado, por simples petição, deixando em aberto a via da fungibilidade da tutela cautelar para a tutela
antecipatória, caso seja necessária.
A interpretação literal do dispositivo limitaria a sua finalidade de conceder tutela
jurisdicional de urgência adequadas a quem tem direito, limitando, consequentemente, o caráter
instrumental do processo e a concretização do princípio da efetividade.
Malachini faz alusão ainda a outro problema de redação deste dispositivo, referindo-se ao
“necessário equívoco” da parte em requerer uma tutela jurisdicional ao passo que outra seria a
cabível, ou seja, “segundo esta interpretação, o equívoco, o engano, o erro do autor seria elemento
146
TALAMINI, Eduardo. Tutela relativa aos deveres de fazer e de não fazer. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2001. p. 367 e 368. 147
MITIDIERO, Daniel. Antecipação da tutela: da tutela cautelar à técnica antecipatória. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2013. p. 164.
71 essencial do tipo previsto na disposição legal”
148. Considera ser de alto grau de dificuldade a aferição,
por parte do juiz, se houve ou não equívoco da parte ao requerer uma tutela pela outra, dando realce a
quais critérios o juiz poderia adotar para ter convicção que foi realmente um erro ou a parte agiu
disfarçadamente, buscando medida cautelar em sede de antecipação de tutela simplesmente para
sobrepor a necessidade de não submeter-se aos procedimentos mais dilatados que detém uma ação
cautelar.
O referido autor entende que este erro redacional não pode ser solucionado pela simples
constatação de dúvida objetiva ou não, pois a expressão é contraditória ao passo que qualquer dúvida é
subjetiva. Afirma que na letra deste dispositivo “quer-se aludir, na verdade, à referida ‘zona cinzenta’,
àquelas providências sobre as quais se fica efetivamente, em dúvida, se devem ser consideradas casos
de antecipação de tutela ou de medidas cautelares”.149
Sustentando a convivência harmônica entre tutela de urgência cautelar e tutela de
urgência satisfativa, Mirna Cianci e Rita Quartieri afirmam que “evoluiu o sistema de fungibilidade,
instaurada pelo § 7º do art. 273 ao permitir que a pretensão, seja acautelar, seja antecipatória, possa ser
recebida e, coincidentes os requisitos, sofra a adaptação à sua natureza.”150
Neste raciocínio, afirmam as autoras supracitadas que a fungibilidade é elemento que
fundamenta este tratamento unificado. Escrevem que “esse é o passo mais importante na direção do
tratamento unificado das tutelas de urgência e na sua sistematização, respeitada a adequação e terreno
de atividade de cada uma dessas medidas.”151
Entendemos que atualmente existe um regime único disciplinador da tutela de urgência
(com reserva um espaço para a tutela da evidência). Contudo, a pulverização dos respectivos
dispositivos disciplinadores dessas tutelas diferenciadas no CPC acarreta alguns equívocos,
principalmente na aplicação cotidiana do direito, mas com criatividade no manejo da lei, doutrina e
jurisprudência se tem encontrado soluções razoáveis na aplicação da tutela de urgência e das técnicas
processuais a esta inerente.
3.2.5 A ideia de unificar o regime da tutela de urgência e tutela da evidência
148
MALACHINI, Edson Ribas. A Fungibilidade das Tutelas Antecipatória e Cautelar (CPC, art. 273, § 7º). In: ARMELIN, Donaldo. (coord.) Tutelas de urgência e Cautelares: estudos em homenagem a Ovídio A. Baptista da Silva. São Paulo: Editora Saraiva, 2010. p. 417. 149
MALACHINI, Edson Ribas. A Fungibilidade das Tutelas Antecipatória e Cautelar (CPC, art. 273, § 7º). In: ARMELIN, Donaldo. (coord.) Tutelas de urgência e Cautelares: estudos em homenagem a Ovídio A. Baptista da Silva. São Paulo: Editora Saraiva, 2010. 150
CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Unificação do regime das tutelas de urgência. In CIANCI, Mirna;
QUARTIERI, Rita de Cássia Rocha Conte; MOURÃO, Luiz Eduardo; GIANNICO, Ana Paula Chiovitti.
(coordenadores). Temas atuais das tutelas diferenciadas: estudos em homenagem ao professor Donaldo Armelin.
São Paulo: Saraiva, 2009. p. 605. 151
CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Unificação do regime das tutelas de urgência. In CIANCI, Mirna;
QUARTIERI, Rita de Cássia Rocha Conte; MOURÃO, Luiz Eduardo; GIANNICO, Ana Paula Chiovitti.
(coordenadores). Temas atuais das tutelas diferenciadas: estudos em homenagem ao professor Donaldo Armelin.
São Paulo: Saraiva, 2009. p. 606.
72
A partir das considerações apresentadas, podemos concluir que existe um microssistema
de tutela de urgência Código de Processo Civil em vigor, mesmo que os dispositivos relacionados
àquele não se encontrem topologicamente unificados. A classificação que agora descrevemos
demonstra-se útil quando caso aplicada aos litígios que envolvam direito de marca, como
verificaremos mais à frente.
Esta sistematização coincide com a ideia proposta no Anteprojeto de Novo Código Civil,
assim como nas versões debatidas e apresentadas no Senado Federal e na Câmara de Deputados.
Considerando algumas alterações no texto e quanto às terminologias jurídicas utilizadas, podemos
concluir que a ideia de unificar a disciplina da tutela de urgência e tutela da evidência se mantém,
com possibilidade se ser esta a estrutura adotada na legislação processual futura.
Assim, considerar-se a “tutela de urgência”152
, fundada contra o perigo, sendo:
152
A proposta estrutural sustentada pela Comissão de Juristas responsável por elaborar o Anteprojeto de Novo
Código de Processo Civil, mantida no Senado federal e na Câmara de Deputados é a mais adequada, veja-se: (i)
tutela de urgência (cautelar ou satisfativa); e (ii) tutela da evidência.
Nas disposições gerais percebe-se o cuidado de deixar explícito que a tutela de urgência e a tutela da evidência,
mesmo presentes em um regime unificado, não se confundem, além de deixar incontroverso a possibilidade de
requere medidas de natureza cautelar ou satisfativa em momento antecedente ao processo ou incidentalmente;
assim dispõe o PLS nº 166/2010:
Art. 277. A tutela de urgência e a tutela da evidência podem ser requeridas antes ou no curso do procedimento,
sejam essas medidas de natureza cautelar ou satisfativa.
Na versão aprovada no Senado Federal, referente ao PL nº 8046/2010, contribuiu-se com a inclusão de dois
parágrafos nos quais se diferencia medidas satisfativas e medidas cautelares. Veja-se:
Art. 269. A tutela de urgência e a tutela da evidência podem ser requeridas antes ou no curso do processo,
sejam essas medidas de natureza satisfativa ou cautelar.
§ 1º São medidas satisfativas as que visam a antecipar ao autor, no todo ou em parte, os efeitos da tutela
pretendida.
§ 2º São medidas cautelares as que visam a afastar riscos e assegurar o resultado útil do processo.
No texto apresentado no Relatório de Atividades da Comissão Especial à Câmara de Deputados, também
ocorreram modificações que, fora o equívoco da terminologia, como já sustentamos, manteve-se as linhas dos
textos anteriormente aprovados na outra casa legislativa.
Art. 276. A tutela antecipada pode:
I – ser satisfativa ou cautelar;
II – ser concedida em caráter antecedente ou incidental;
III - fundamentar-se em urgência ou em evidência.
Notamos que a primeira seção traz o regramento comum às tutela de urgência e tutela da evidência,
especificamente: i) finalidade; ii) interinidade das tutelas de urgência; iii) o caráter provisório do provimento
urgente ou evidente; iv) as técnica processuais de efetivação; v) a importância e exigência expressa de
fundamentação da decisão que concede, nega ou modifica a tutela de urgência ou a titela da evidência; vi) a
competência para apreciação e a tramitação dessas tendo em vista a ordem de processos; vii) meio de
impugnação manejável.
O art. 270 do PL nº 8046/2010 aprovado no Senado Federal, que manteve na íntegra a redação apresentada pelo
art. 278 do PLS nº 166/201, pode ser identificado respectivamente com os arts. 798 e 805 do CPC em vigor, o
que nos leva à conclusão que foi ampliado o tradicional poder geral de cautela, a um poder geral de urgência e
evidência. A ampliação deste poder, que é redigido nos moldes de uma cláusula geral, exigirá uma delimitação e
adequação por parte da doutrina e da jurisprudência; assim propõe:
Art. 270. O juiz poderá determinar as medidas que considerar adequadas quando houver fundado receio de que
uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação.
Parágrafo único. A medida de urgência poderá ser substituída, de ofício ou a requerimento de qualquer das
partes, pela prestação de caução ou outra garantia menos gravosa para o requerido, sempre que adequada e
suficiente para evitar a lesão ou repará-la integralmente.
73
(i) tutela de urgência “cautelar”;
(ii) tutela de urgência “satisfativa.”
A tutela de evidência figuraria como gênero autônomo, que comportaria técnicas que tem
como fundamento o direito evidente e a distribuição do ônus do tempo no processo, nos casos em que
(i) ficar caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do
requerido, (ii) um ou mais dos pedidos cumulados ou parcela deles mostrar-se incontroverso, caso em
que a solução será definitiva, (iii) a inicial for instruída com prova documental irrefutável do direito
alegado pelo autor a que o réu não oponha prova inequívoca; ou (iv) a matéria for unicamente de
direito e houver jurisprudência firmada em julgamento de casos repetitivos ou súmula vinculante.
3.2.6 Ato ilícito e dano: tutela inibitória, tutela de remoção do ilícito e tutela ressarcitória
A construção de uma tutela jurisdicional efetiva se alia à existência de técnicas
processuais idôneas a ensejar esta proteção. Reconhecer os aspectos diferenciadores de um direito –
suas características e o ambiente no qual ocorre seu tráfego jurídico/econômico/social – direito frente
ao ordenamento jurídico demonstra uma sensibilidade quanto à realidade no qual o mesmo integra.
Neste contexto, para que haja uma real proteção do direito de propriedade intelectual – em destaque
aqueles relativos às marcas e signos distintivos –, as técnicas processuais apresentadas devem
viabilizar efetividade.
Quanto ao tema, parece que na versão proposta no relatório apresentado à Câmara de Deputados ocorreu a
diminuição deste poder geral, resumindo-se a medidas cautelares. Esta foi uma alteração importante pois assim
limita-se o atuar do juiz somente ao manejo, caso seja necessário, da utilização de medidas que preservem os
efeitos úteis das tutelas definitivas, não possibilitando a concessão de ofício de tutelas de urgência satisfativas ou
tutelas de evidência.
Art. 283. Em casos excepcionais ou expressamente autorizados por lei, o juiz, incidentalmente, poderá conceder
tutela antecipada cautelar de ofício.
Em seguida, os arts. 271 e 273 do PL nº 8046/2010, aprovados no Senado Fedearl, mantendo as linhas do PLS nº
166/2010, utilizam boa parte da disciplina do art. 273 do CPC em vigor, referente à antecipação de tutela. Desta
forma, expande-se a boa dicção do texto legal rerente à técnica de antecipação de tutela do CPC em vigor, à
tutela cautelar e à tutela da evidência do CPC projetado. Indica-se, ainda, para solucionar controvérsias, o meio
de impugnação cabível da decisão em sede dessas tutelas diferenciadas.
Art. 271. Na decisão que conceder ou negar a tutela de urgência e a tutela da evidência, o juiz indicará, de
modo claro e preciso, as razões do seu convencimento.
Parágrafo único. A decisão será impugnável por agravo de instrumento.
Art. 273. A efetivação da medida observará, no que couber, o parâmetro operativo do cumprimento da sentença
definitivo ou provisório, no que couber.
Na versão apresentada à Câmara de Deputados, transferiu-se a inteligência do art. 273 do PL nº. 8046/2010, para
o art. 279, parágrafo único, do relatório; o art. 271, do PL nº. 8046/2010 manteve-se quase que intacto, agora
figurando no art. 280 do relatório:
Art. 280. Na decisão que conceder ou negar a tutela antecipada, o juiz justificará, de modo claro e preciso, as
razões de seu convencimento.
Parágrafo único. A decisão será impugnável por agravo.
Na versão aparentada à Câmara de Deputados à uma visível redução do número de dispositivos que tratam das
disposições comuns entre as tutela de urgência e as tutela da evidência. Como a proposta deste ensaio é analisa o
regime único entre estas tutelas diferenciadas e por não existir nenhuma outra alteração substancial, nos
restringiremos à análise até o art. 281 do relatório, que nessa versão encerra as disposições comuns.
74
Como sustentamos, por certo tempo estas considerações não eram atendidas, o que levava
à não proteção integral dos direitos de marcar. Ora, os mecanismos processuais postos à disposição
não se constituíam idôneos para esse feito e, por consequência, ocorria o manejo equivocado (mas à
realidade criativo e útil) de técnicas processuais na tentativa de alcançar a efetiva proteção .
Utilizavam-se técnicas cominatórias, assecuratória, entre outras, mas que não traziam a proteção
integral almejada via atividade jurisdicional.
As aspirações de um processo apto a tutelar direitos e situações jurídicas diferenciadas,
como os relacionados às marcas (assim como à concorrência), constituem uma tendência de
aproximação do processo à realidade econômica e social. É uma discussão global e suas disposições
neste sentido podem ser encontradas em alguns pactos e acordos internacionais, como a exemplo do
TRIPS153
que, além das várias implicações referentes a propriedade intelectual, assinalou a
necessidade de procedimentos idôneos a proteger esses direitos.
Observa-se que o acordo TRIPS impele que o Brasil assegure em sua legislação:
procedimentos para a aplicação de normas de proteção (...), de forma a permitir uma
ação eficaz contra qualquer infração dos direitos de propriedade intelectual previstos
(...), inclusive remédios expeditos destinados a prevenir infrações e remédios que
constituam um meio de dissuasão contra infrações ulteriores.
Dentre os “remédios expeditos” processuais manejáveis para a proteção do direito de
propriedade intelectual têm-se: as tutelas jurisdicionais autônomas contra o ato ilícito, como a
inibitória do ilícito e a de remoção do ilícito, podendo aplicá-las conjuntamente com a ressarcitória, as
tutelas interinais de urgência, de caráter assecuratório ou satisfativo, como são as cautelares e as
antecipatórias.
Com o intuito de obstar a prática de atos contrários ao direito de marca se utiliza a tutela
inibitória. É enquadramento exato, pois esta tutela jurisdicional se dirige contra o ilícito, prescindindo
tanto à prática do ilícito, quanto ao dano que este pode causar contra o direito de marca.
No acordo TRIPS, a tutela inibitória configuraria como remédio expedito destinado a
prevenir infrações. Isto porque, como afirma Pereira, esta modalidade de tutela é eminentemente
preventiva, vocacionada a proteger estes direitos, além de prescindir a existência ou não de dano,
independendo de culpa para o deferimento.154
Configura, ainda, como tutela jurisdicional contra o ilícito a tutela de remoção do ilícito.
Quando se trabalham os direitos de marca, esta espécie de tutela se mostra eficaz na medida em que
remove situações de ilícito, independentemente deste ter ocasionado danos ou não.
153
Agreement on Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights (TRIPS) ou Acordo sobre Aspectos dos
Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (ADPIC) de 1994. 154
PEREIRA, Luiz Fernando C.. Tutela Jurisdicional da Propriedade Industrial: aspectos processuais da Lei 9.279/1996. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. ps. 96 – 101.
75
Em referência ao acordo TRIPS, a tutela de remoção do ilícito figura como remédio de
dissuasão contra infrações ulteriores. Trabalhando esta modalidade de tutela, Pereira destaca sua
vocação de remover situações que configurem ilicitude, justificando-se pela existência do ilícito e a
necessidade de retirado do mesmo do plano real.155
Percebemos que a distinção entre essas técnicas é eminentemente funcional, sendo uma
aproveitada para inibir o ato ilícito e a outra para remover o ato ilícito, ambas prevenindo a posterior
ocorrência do dano contra o direito de propriedade industrial.156
A tutela ressarcitória também se constitui hábil a proteger os direitos relacionados às
marcas, pois essa é aplicável nos casos de ocorrência do dano. Portanto, buscando-se a compensação
(a exemplo da indenização por perdas e danos) do ato lesivo ao direito que, em muitos casos, repercute
efeitos concretos contra a integridade distintiva da marca frente ao mercado consumidor, assim como
causa impacto econômico negativo.
Como destacado, estas espécies de tutela jurisdicional – de inibição, de remoção e de
ressarcimento – podem ser utilizadas cumulativamente, o que majora a sua efetividade em face do
caso concreto.
Quanto às tutelas de urgência – cautelar e tutela antecipatória –, essas se constituem, na
ótica do acordo TRIPS, como procedimentos para a aplicação de normas de proteção, servindo como
mecanismos de apoio àquelas tutelas autônomas.
Diferentemente da tutela inibitória e da tutela de remoção do ilícito, as tutelas cautelares e
antecipatórias estão relacionadas com uma tutela final. Portanto estas tutelas, “podem ser ditas
interinais de urgência, no sentido de que não aspiram assumir a posição de ‘tutela definitiva’ e, assim,
a característica de autonomia ou de independência em relação a outra forma tutela.”157
As tutelas cautelares almejam a garantia e eficácia da tutela do direito. São indispensáveis
à tutela dos direitos de marca, pois, em diversas situações, esses carecem de proteção processual que
evite a perda do objeto da demanda ou a frutuosidade da tutela que será concedida ao final.
Neste sentido, Marcelo Junqueira Inglez de Souza entende que as tutelas cautelares
mostram-se essenciais, pois garantem a eficácia do exercício destes direitos, configurando-se como
proteção processual adequada.158
155
PEREIRA, Luiz Fernando C.. Tutela Jurisdicional da Propriedade Industrial: aspectos processuais da Lei
9.279/1996. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. ps. 96 – 101. 156
PEREIRA, Luiz Fernando C.. Tutela Jurisdicional da Propriedade Industrial: aspectos processuais da Lei
9.279/1996. Coleção Temas atuais de direito processual civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. p.
217. 157
MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil, vol. 4: Processo Cautelar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. p. 87. 158
SOUZA, Marcelo Junqueira Inglez de. Tutelas de Urgência na Propriedade Industrial: as Medidas Cautelares. In, ROCHA, Fabiano de Bem. Capítulos de Processo Civil na Propriedade Intelectual. Rio de Janeiro, Editora Lumen Juris, 2009. ps. 367 – 368.
76
Com este fulcro, a garantia do direito por meio da tutela cautelar se mostra possível por
diversas alternativas quanto a sua utilização – adaptabilidade. A escolha adequada e estratégica
corresponde à necessidade vislumbrada no caso concreto. Detectam-se estas modalidades de medidas
cautelares em diversas esferas, como no TRIPS, na legislação nacional especializada e no próprio
Código de Processo Civil.
A antecipação de tutela é utilizada para evitar a ocorrência dos efeitos negativos
consequentes do ônus temporal do processo, fundando-se contra o perigo ou nos caos de direito
evidente, podendo ser manejada em inúmeras situações – também se identifica a característica de
adaptabilidade.
Na concepção de José Mauro Decossau Machado, a antecipação de tutela figura como
técnica processual capaz, de obstar os efeitos prejudiciais do tempo, configurando-se como divisor do
ônus temporal do processo, uma vez que, principalmente em face de interesses que envolvam
propriedade intelectual – dentre esses os relacionados à marca e à concorrência –, tais efeitos
constituem irreparáveis ou de difícil reparação.159
Evidencia-se, assim, a exigência de uma tutela que se volte contra o ato ilícito (e que isso
ocorra imediatamente), e, somente se o ato ilícito ocasionou dano, que se volte também contra o dano.
Na perspectiva das relações envolvendo direitos de marca, concorrência, existência ou
não de contrafação, ou mesmo nos casos que se almeja a nulidade de determinado registro de marca,
ter uma tutela jurisdicional cujo objeto seja o dano acarreta somente a obrigação de ressarcir, deixando
todas as situações que envolvam o ato ilícito desprotegidas.
Portanto, o dano nem sempre é consequência do ato ilícito, assim como o ato ilícito não
tem como consequência necessária o dano. Enquanto o dano é elemento fundamental para a obrigação
de ressarcir, o ato ilícito se torna elemento para o surgimento da obrigação de fazer e não fazer.
Pereira adverte que existe, em algumas situações envolvendo essas modalidades de tutela
jurisdicional, uma zona de penumbra que “decorre fundamentalmente da impossibilidade de se
‘separar’, cronologicamente, o ilícito do dano. Essa eventual sobreposição entre ilícito w dano, embora
não os confunda, produz sobreposição também de tutela.”160
Na prática, com vista nos direitos de marca, determinar tutela jurisdicional contra o ato
ilícito e tutela jurisdicional contra o dano viabiliza uma proteção mais efetiva, pois ao compreendê-las
159
MACHADO, José Mauro Decoussau. Antecipação de Tutela na Propriedade Industrial. In: ROCHA, Fabiano de Bem. Capítulos de Processo Civil na Propriedade Intelectual. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2009. p. 283. O autor trabalha este tema com mais profundidade na obra Aspectos da Antecipação da Tutela na Propriedade Industrial: patentes, desenhos industriais e marcas. MACHADO, José Mauro Decoussau. Aspectos da Antecipação da Tutela na Propriedade Industrial: patentes, desenhos industriais e marcas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 99. 160
PEREIRA, Luiz Fernando C.. Tutela Jurisdicional da Propriedade Industrial: aspectos processuais da Lei
9.279/1996. Coleção Temas atuais de direito processual civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. p.
225.
77 de forma autônoma, cada uma dessas detêm um objeto diferente (ato ilícito ou dano), o que possibilita
a sua adaptação a diversas situações e especificidades fáticas.
Pensar em tutela jurisdicional efetivamente protetiva de um direito fundamental, é pensar
em manter o “status quo de direito protegido em sua integridade”: (i) se existe a possibilidade da
prática de um ato ilícito, ou a possibilidade da continuação de sua prática, para manter o “status de
proteção”, importa utilizar a tutela inibitória; (ii) se ocorrido a prática do ato ilícito, para se
estabelecer o “status de proteção”, vale manejar a tutela de remoção do ilícito, para a cessação desta
prática; e (iii) se ocorrido o dano, não necessariamente se alcançará o reestabelecimento integral do
“status de proteção”, mas se compensará o detentor do direito via tutela ressarcitória.161
É salutar destacar para as tutelas contra o ilícito os aspectos referentes à culpa ou ao dolo
na prática do ato não são fundamentais para a sua concessão, tendo em vista que o que se almeja é
impedir a prática do ato ilícito ou eliminar o ilícito. A verificação desses esses elementos se relaciona
à tutela contra o dano (ressarcitória por equivalente ou ressarcitória na forma específica), na qual o
ofendido deve provar a responsabilidade daquele ao qual o dano é imputado. 162
Todos estes aspectos nos permitem adotar nesse estudo a classificação sustentada por
Marinoni, como a mais útil para elabora um raciocínio que possibilite a efetiva tutela jurisdicional do
direito de marca. Fundada no critério considerando o elemento “ato ilícito” ou considerando o
elemento “dano”, sendo viabilizada no art. 461 do CPC, possibilita-se a concessão de tutela específica
da obrigação ou resultado prático equivalente. Assim, com a imposição de fazer ou não fazer, a tutela
161
“Imaginou-se, por muito tempo que a lei, por obrigar quem comete um dano a indenizar, não diferenciasse
ilícito de dano, ou melhor, considerasse o dano como elemento essencial e necessário da fattispecie constitutiva
do ilícito. Entretanto, o dano não é consequência necessária do ato ilícito. O dano é requisito indispensável para
o surgimento da obrigação de ressarcir, mas não para a constituição do ilícito. É óbvio que o dano não pode estar
entre os pressupostos da inibitória. Sendo a inibitória uma tutela voltada para o futuro e genuinamente
preventiva, é evidente que o dano não lhe diz respeito. Na realidade, se o dano não é elemento constitutivo do
ilícito, podendo este último existir independente do primeiro, não há razão para não se admitir uma tutela que
leve em consideração apenas o ilícito, deixando de lado o dano. Da mesma forma que se pode pedir a cessação
de um ato ilícito sem aludir ao dano, é possível requerer que um ilícito não seja praticado sem a demonstração de
um dano futuro. “A tutela inibitória não pune quem pode praticar o ilícito, mas apenas impede que o ilícito seja
praticado. Se alguém, ainda que sem culpa, está na iminência de praticar um ilícito, é cabível ação inibitória. (...)
Deixando claro que a tutela inibitória visa eliminar o ilícito, e assim não tem relação com o dano, esclarece-se,
igualmente, que esse tipo de tutela, à semelhança da tutela inibitória, não tem entre os seus pressupostos a culpa
ou o dolo. Consoante Cezare Salvi, a tutela ressarcitória (seja pelo equivalente ou na forma específica) pressupõe
que o ofendido prove a responsabilidade do sujeito ao qual o dano é imputado (a não ser, obviamente, nos casos
de responsabilidade sem culpa), o que não acontece no outro âmbito de tutela, em que está presente a tutela que
visa a eliminar o ilícito.” MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória: individual e coletiva. 4. ed. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2006. p. 46. 162
“A tutela inibitória não pune quem pode praticar o ilícito, mas apenas impede que o ilícito seja praticado. Se
alguém, ainda que sem culpa, está na iminência de praticar um ilícito, é cabível ação inibitória. (...) Deixando
claro que a tutela inibitória visa eliminar o ilícito, e assim não tem relação com o dano, esclarece-se, igualmente,
que esse tipo de tutela, à semelhança da tutela inibitória, não tem entre os seus pressupostos a culpa ou o dolo.
Consoante Cezare Salvi, a tutela ressarcitória (seja pelo equivalente ou na forma específica) pressupõe que o
ofendido prove a responsabilidade do sujeito ao qual o dano é imputado (a não ser, obviamente, nos casos de
responsabilidade sem culpa), o que não acontece no outro âmbito de tutela, em que está presente a tutela que visa
a eliminar o ilícito.” MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória: individual e coletiva. 4. ed. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2006. p. 48 e 155.
78 jurisdicional prestada torna-se sensível ao direito e ao ambiente ao qual esse direito integra,
adequando-se à situação apresentada no caso concreto.163
3.2.7 Adaptabilidade como característica essencial da tutela de urgência
A efetividade observada quando se estuda a tutela de urgência não se remete apenas à
questão da compensação dos efeitos negativos causados pelo tempo no processo – a busca pela
celeridade em uma realidade de morosidade na prestação jurisdicional – na busca de uma duração
razoável do processo.
O que se destaca na tutela de urgência – apontada como tutela diferenciada – e, assim, a
torna elemento essencial na construção de uma tutela jurisdicional efetiva, é o caráter de
adaptabilidade do instrumento processual à realidade do direito ou situação jurídica que se quer
proteger.
Afirmamos que a tutela de urgência é tutela diferenciadas pois estas são pautadas na
sensibilidade à realidade no qual o caso concreto existe e a possibilidade de flexibilização
interpretativa, a “adaptabilidade”.164
Esta adaptabilidade é um elemento importante no exercício interpretativo que
determinados textos normativos são submetidos, pois permite, partindo de uma flexibilização, a
melhor conformação da norma aplicada ao caso concreto.
Esta flexibilidade obtida a partir da adaptabilidade da tutela jurisdicional torna-se ainda
mais importante quando ambiente decisional do caso concreto é vasto em elementos fáticos – diversas
questões de fato a serem resolvidas – como ocorre nos casos que envolvem direito de marca, signos
distintivos, concorrência etc.
Por isso que disciplina processual da tutela de urgência exige essa adaptabilidade – como
elemento de flexibilidade no sistema jurídico –, sob pena de limitar o alcance protetivo da tutela
jurisdicional.
Nestes casos, a técnica legislativa emprega cláusulas gerais, conceitos vagos e
indeterminados que são verificados caso a caso, otimizando e ampliando as possibilidades de
aplicação da tutela de urgência, ao captar elementos da realidade e realizarem a proteção adequada a
determinado direito.165
163
MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória: individual e coletiva. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2006. p. 156. 164
Para aprofundamento sobre o tema tutela jurisdicional diferenciada, recomendamos: ARMELIN, Donaldo.
Tutela jurisdicional diferenciada. Doutrinas Essenciais de Direito Processual Civil. WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim.São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2011; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre; CÂMARA, Bernardo Ribeiro; SOARES, Carlos Henrique. Curso de direito processual civil: fundamentação e aplicação. Belo Horizonte: Fórum, 2011. pp. 443-459. 165
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Estabilidade e adaptabilidade como objetivos do direito: civil law e
common law. RePro 172. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
79
Contudo, a adaptabilidade tem sua amplitude regulada na medida em que o legislador
apresenta critérios objetivos para a concessão da tutela jurisdicional, que devem ser observados
quando realizada a interpretação destas cláusulas gerais, conceitos vagos e indeterminados. Conjugado
a isto, a apresentação de critérios objetivos e sistematização pela doutrina e jurisprudência colaboram
para a estabilização na aplicação destas técnicas processuais adaptáveis.
Neste raciocínio, é importante a flexibilização do sistema jurídico, via mecanismos de
adaptabilidade, assim como um momento de debate entre doutrina e jurisprudência acerca da
aplicação de determinada norma processual. Tão importante quanto é o momento seguinte, de
estabilidade interpretativa, via objetivação dos critérios recomendados para a aplicação da tutela
jurisdicional ao caso concreto, com a determinação de pautas de conduta.
Examinando a tutela de urgência satisfativa (inciso I do art. 273 do CPC) se evidencia
alguns destes aspectos, veja-se: o juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou
parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca,
se convença da verossimilhança da alegação e haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil
reparação.
Nestes dispositivos estão inseridos três conceitos vagos (ou indeterminados) que, se
identificados, possibilitam a concessão da tutela de urgência satisfativa: prova inequívoca,
verossimilhança e fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Analisaremos mais à
frente cada um desses, mas para demonstrar a grau de indeterminação de um desses, verifica-se que o
texto ao se referir a fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação aponta, em síntese, o
perigo (periculum), sendo a tutela de urgência satisfativa fundada contra o perigo, seja: (i) perigo de
que ocorra o ato ilícito – instrumental à tutela inibitória; (ii) perigo de que, com a ocorrência do ilícito,
este continuamente ocasionando efeitos contra o direito, ou até possibilite a ocorrência de dano, caso
não seja eliminado – instrumental à tutela de remoção; e (iii) que ocorrido o dano, este continue e se
torne irreparável – instrumento da ressarcitória. Isto tudo dependerá, como se sustentou, da análise dos
elementos jurídicos e dos elementos fáticos que integram o ambiente decisional relacionado aos
direitos de marca e concorrência.
Portanto, ao se constatar a existência de um microssistema de tutela de urgência
atualmente, assim como sustentar a sua aplicabilidade para a efetiva proteção dos direitos de marca,
fez-se necessário que todos esses elementos - adaptabilidade / flexibilidade e objetivação / pauta de
conduta / estabilidade / ambiente decisional – sejam inseridos no debate apresentado neste trabalho.
Aproveitando estas considerações, pode-se limitar o objeto de estudo deste trabalho, sem
o risco de não esclarecer o porquê da escolha em analisar determinada tutela jurisdicional e sua
utilidade na proteção “efetiva” dos direitos de marca: a aplicação da tutela de urgência satisfativa
para concretizar a tutela contra o ilícito, a tutela contra o dano, assim como para possibilitar a
anulação imediata do registro de marca.
80
3.3 Tutela de urgência satisfativa na proteção dos direitos de marca
3.3.1 Tutela de urgência satisfativa: uma cláusula geral
O texto processual tem, cada vez mais, sido permeado por conceitos vagos e
indeterminados, cláusulas gerais e exigindo que, para a interpretação do texto e apresentação da norma
adequada ao caso concreto, sejam empregados os princípios jurídicos.
É que, atualmente, existe uma tendência de expansão dos poderes do juiz no que diz
respeito ao ato de decidir, noutras palavras, quanto à interpretação da lei e a sua adequação às
exigências do direito e dos elementos fáticos que integram o ambiente decisional ao qual o mesmo
integra.166
Como leciona Teresa Arruda Alvim Wambier, este fenômeno (ou aspectos) “resulta da
complexidade e da mobilidade das sociedades atuais e da pretensão de que o direito cubra ou
disciplina a vida social, sob todos os aspectos.” Sustenta, ainda, que passa a se exigir do direito “a
realização de tudo quanto dele se espera. De fato, as tarefas do juiz no Estado Social democrático
vêm-se multiplicando e vêm se tornando cada vez mais complexa a função de decidir.”167
Esta tendência alcançou o direito processual civil de maneira que, basta perceber que um
princípio que era consagrado por conceder segurança jurídica, como é o caso do princípio da
taxatividade, tem seu âmbito de aplicabilidade cada vez mais reduzido – quantos vezes doutrina e
jurisprudência já utilizou a ideia de “este é um rol meramente exemplificativo” ou “este não é um rol
taxativo”? Não que a segurança jurídica tenha sido minimizada, afinal, como sustentou a referida
autora, com a qual concordamos, cada vez mais se quer que o direito seja protegido e a vida social
seja disciplinada, ou seja, cada vez mais se almeja estabilidade. Todavia, passou-se a se entender que
esta segurança jurídica não é concretizada apenas com taxatividade, juízos de verdade ou limitação
dos poderes do juiz.
Ao contrário, cláusulas gerais cada vez mais são utilizadas e, com a sua aplicação, a
adequação da tutela jurisdicional ao caso concreto viabiliza a efetiva proteção dos direitos. A suposta
segurança obtida nos juízos de verdade (pois sobre o qual se pensava que a verdade vem com a
cognição exauriente) ainda tem espaço, mas se direcionou atenção aos juízos de verossimilhança (pois
com sumariedade é possível se conceder tutela jurisdicional urgente e proteger o direito
166
“Sente-se, no mundo contemporâneo ocidental, uma tendência que aponta para o incremento dos poderes do
juiz, tanto no que diz respeito à sua conduta no processo quanto no que tange a interpretação da lei. WAMBIER,
Teresa Arruda Alvim. Cada caso comporta uma única solução? In MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro;
MARINONI, Luiz Guilherme; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coords.) São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2014. p. 1225. 167
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Cada caso comporta uma única solução? In MENDES, Aluisio Gonçalves
de Castro; MARINONI, Luiz Guilherme; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coords.) São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2014. p. 1225 e 1226.
81 imediatamente). E as limitações dos poderes do juiz têm sido flexibilizadas, principalmente quanto à
atividade interpretativa, submetida a controle jurisdicional e outros aspectos que garantem, ou pelo
menos se apresentam como garantidores de uma atividade jurisdicional efetiva.168
Assim, a segurança jurídica também pode existe se ocorrer uma abertura e flexibilização
do direito, com a estabilidade jurisprudencial e o aprimoramento da atividade interpretativa do juiz.
Constatando isso, Teresa Arruda Alvim Wambier afirma que “as cláusulas gerais são
sintoma de que o direito contemporâneo tende a ser aberto e flexível. Um direito que tenha estas
feições pretende abranger a realidade que há hoje e a que está por vir.”
Entendemos que exista uma cláusula geral da tutela de urgência satisfativa, disciplinada
no art. 273 do CPC, nos casos em que a antecipação se fundamenta contra o perigo.
As cláusulas gerais se utilizam conceitos vagos, mais têm vocação mais ampla que esses
conceitos. Isto porque “as cláusulas gerais incorporam princípios, diretrizes e máximas de conduta
originalmente estranha ao corpus codificado’ e a atividade de concentração destas normas acaba
resultando na constante formulação de novas normas”.169
Neste raciocínio a referida cláusula geral da tutela de urgência cautelar apresenta três
conceitos vagos – “prova inequívoca”, “verossimilhança da alegação” e “fundado receio” – e
encampa, destacadamente, o “princípio da efetividade”.
Quanto ao princípio da efetividade, já nos ocupamos em apontar algumas noções e sua
consagração no direito processual civil, a nível de princípio constitucional (item 1.5.1).
A tutela de urgência satisfativa (antecipação da tutela fundada no perido) detém, como
pressupostos necessários para seu deferimento a prova inequívoca e a verossimilhança da alegação,
conceitos com evidente grau de indeterminabilidade.170
168
“Hoje se considera que o direito não é um sistema impecável e irrepreensivamente lógico. Fala-se muito mais
em racionalidade. O que de mais marcante existe no direito dos nossos tempos é uma série de noções-chaves,
que desempenham um papel fundamental no que diz respeito à argumentação e à discussão de problemas
jurídicos. Estes topoi (= noções-chaves) se exteriorizam justamente por meio de conceitos vagos, presentes nos
princípios jurídicos, nas cláusulas gerais, que assumem determinados significados em função dos problemas a
serem solucionados.” WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Cada caso comporta uma única solução? In MENDES,
Aluisio Gonçalves de Castro; MARINONI, Luiz Guilherme; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coords.) São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. p. 1226. 169
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Recurso especial, recurso extraordinário e ação rescisória. 2. ed. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 162. 170
Noutra perspectiva, sob a ótica da antecipação da tutela, a prova inequívoa e a verosimilhança da alegação
são considerados pressupostos sempre correntes que, para a concessão da medida, devem se aliar a um dos
pressupostos complementares: (i) fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; (ii) abuso do direito
de defesa ou propósito protelatório; (iii) pedido incontroverso. Na primeira hipótese há a antecipação por
segurança no curso do processo, buscando-se evitar o perecimento do objeto processual ou a incidência de danos
sobre o direito afirmado. Aplica-se a segunda hipótese com o intuito de concretiza a devida prestação
jurisdicional, punindo as situações que obstam o fluxo processual, e que acarretam restrições à celeridade. E a
terceira hipótese realiza a denominada tutela dos direitos evidentes, prezando pela pronta efetivação dos direitos
não mais controvertidos no processo, possibilitando desde logo a fruição deste por aquele que tem direito.
Contudo, para fins de configuração daquilo que identificarmos como tutela de urgência satisfativa, fazem-se
necessários somente a prova inequívoca e a verossimilhança, relacionadas com o fundado receio de dano
irreparável ou de difícil reparação; as demais hipóteses podem ser enquadradas como espécies de tutela da
82
Aponta o caput do art. 273 do CPC que o juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar
os efeitos da tutela pretendida, total ou parcialmente desde que exista “prova inequívoca”, se
convença da “verossimilhança da alegação.”
Contudo, para a concessão da tutela de urgência satisfativa, identificamos como
pressupostos tanto a prova inequívoca como a verossimilhança, e concorrentemente somente o
fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.
A prova inequívoca e a verossimilhança são conceitos vagos171
, todavia a identificação da
manifestação desta na situação é controvertida, haja vista a dificuldade definir os limites dos conceitos
de convicção, de verossimilhança e de sua demonstração pelas partes.
Quanto a prova inequívoca para a concessão da tutela de urgência satisfativa, entendemos
que o arsenal probatório deve estar constituído de uma robustez suficiente para convencer o juiz da
importância de uma proteção urgente a determinado direito172
. Quando envolvidos direitos de
propriedade industrial tal assertiva torna-se ainda mais cogente se refletirmos sobre os impactos
econômicos que tais decisões acarretam.
Scarpinella Bueno define prova inequívoca como um instrumento contundente e que
agiliza a ampliação da margem de segurança necessária para que o juízo indique a existência ou não
do fato descrito pela parte. Afirma ainda que “o que interessa, pois, é que o adjetivo ‘inequívoca’ traga
segurança suficiente para o magistrado decidir sobre os fatos que lhe são apresentados.”173
No entanto, a expressão prova inequívoca oferece a idéia da existência de uma prova de
caráter absoluto ou inflexível, e conseqüentemente a formação de um juízo de verdade. Esta não é a
interpretação adequada para a expressão, mesmo porque esta expressão deve ser interpretada
paralelamente à idéia de verossimilhança174
.
Afirma João Batista Lopes que “o cotejo entre prova inequívoca e verossimilhança da
alegação leva a conclusão de que , para a obtenção da tutela antecipada, é suficiente a prova segura
dos fatos, de que exsurja a probabilidade do direito pretendido.”175
evidência. Conferir em: ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.
77 e 78. 171
Conferir em ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa. Da liberdade do juiz na concessão de liminares e a
tutela antecipatória. In: ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa. (Org.). Aspectos Polêmicos da Antecipação de
Tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. pp. 530 a 535. 172
Marinoni afirma que “a prova existe para convencer o juiz, de modo que chega a ser absurdo identificar prova
como convencimento, como se pudesse existir prova de verossimilhança ou prova de verdade.”172
MARONINI,
Luiz Guilherme. Antecipação da Tutela. 11. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 167. O
objetivo da produção de prova pela parte é convencer o juiz da existência de seu direito, estabelecendo um liame
lógico-jurídico entre a prova apresentada e o direito afirmado. 173
BUENO, Cassio Scarpinella. Tutela Antecipada. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 37. 174
João Batista Lopes ressalta que “é curioso notar que o próprio legislador, preocupado com as conseqüências
da expressão ‘prova inequívoca’, cuidou de abrandá-la, logo a seguir, ao aludir à verossimilhança da alegação.”
LOPES, João Batista. Tutela antecipada no processo civil brasileiro. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2009. p. 95. 175
LOPES, João Batista. Tutela antecipada no processo civil brasileiro. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2009. p. 95.
83
Já a verossimilhança, na compreensão de Athos Gusmão Carneiro, não se limita à
cognição fundada em fumus boni iuris e não alcança ou extrapola a evidência indiscutível. Isto porque
“o ‘juízo de verossimilhança’, supõe não apenas a constatação pelo juiz relativamente à matéria de
fato exposta pelos demandantes, como igualmente supõe a plausividade na subsunção dos fatos à
norma de lei inovada.”176
Portanto, para a análise adequada da aplicabilidade ou não da tutela de urgência
satisfativa, é fundamental a análise conjunta da prova inequívoca e da verossimilhança.
Importa ainda que o juiz justifique sua decisão, devendo fazê-lo com critérios objetivos
devidamente dispostos, como os seguintes:
“(i) as razões que o levaram a acreditar, ou não, na prova; (ii) a ligação que realizou
entre as provas e os fatos; (iii) os motivos que o levaram a estabelecer, ou não, uma
presunção; e (iv) de referir e fundamentar as regras de experiência que guiaram seu
raciocínio. Assim, nada significa dizer, seca e simplesmente, que há, ou não,
verossimilhança, pois essa convicção deve resultar da justificativa da decisão
“antecipatória”.177
A partir do exposto, é oportuna a proposição de alguns critérios lógico-jurídicos acerca da
análise da aplicabilidade da tutela de urgência satisfativa, quais sejam: (i) identificação da prova
inequívoca e verossimilhança, assim como do fundado receio de dano irreparável ou de difícil
reparação; (ii) razões de fato e de direito da inequivocidade da prova; (iii) conexão entre as provas e os
fatos; (iv) estabelecimento da presunção de verossimilhança; (v) regras de experiências que conduzam
o raciocínio.
O fundado receio deve se fundamentar com dados concretos, extrapolando a perspectiva
subjetiva do requerente em simplesmente supor e afirmar a existência de urgência. É por saber que as
expressões dano irreparável e dano de difícil reparação são conceitos jurídicos vagos, que se conclui
que somente com elementos de objetivação poder-se-á afirmar a existência dessas situações que
exijam uma prestação jurisdicional urgente.178
E, como já sustentamos, quando se ler o texto fundado receio de dano grave ou de difícil
reparação, não se quer dizer, a partir de uma compreensão literal, que a tutela de urgência só viabiliza
a antecipação dos efeitos de tutela que tenha como objeto o dano. A interpretação deve ser adaptada à
ideia que fundamenta esta modalidade de tutela jurisdicional, a “efetividade”, e nada mais efetivo para
proteger um direito contra a sua violação do que as tutelas jurisdicionais voltadas conda o ato ilício.
176
CARNEIRO, Athos Gusmão. Da antecipação de tutela. 7. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2009. p. 32. 177
MARONINI, Luiz Guilherme. Antecipação da Tutela. 11. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2009. p. 178. 178
LOPES, João Batista. Tutela antecipada no processo civil brasileiro. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2009. p. 98.
84
Nesta esteira, quanto maior o grau de objetividade dos elementos e constatações trazidos
pela parte acerca do receio de dano, maior a probabilidade da aplicação da antecipação de tutela e
concessão da tutela de urgência satisfativa.
No que se refere aos direitos de marca, mesmo sendo estes direitos imateriais, os dados
comprovativos do perigo de dano devem ser objetivos. Para tanto, o requerente tem ao seu dispor não
somente as provas que demonstrem a prática de ato ilícito (ou que demonstrem a anulabilidade do
registro), mas ainda todos os elementos apresentados no registro de marcas, assim como elementos
relativos à concorrência desleal.
É salutar destacar que,como anuncia o art. 273 § 1º do CPC, ao apreciar o pedido de
tutela de urgência satisfativa, o juiz deverá indicar com exatidão as razões de sua decisão, seja de
deferimento ou de indeferimento.
Assim, garante-se o controle da decisão judicial (e segurança jurídica), ainda mais
pertinente nas situações em que o caráter ordinário padrão do processo é substituído pela sumariedade
na cognição, para a concessão de uma tutela jurisdicional.
3.3.2 Efeitos veiculados pela tutela de urgência satisfativa
Os efeitos veiculados pela tutela de urgência são aqueles efeitos práticos que poderiam
ser obtidos na decisão de mérito.
Assim entende Cassio Scarpinella Bueno, ao afirmar a referida técnica possibilita que os
mesmos efeitos da sentença sejam sentidos imediatamente no plano exterior ao processo (plano
material), noutras palavras, na realidade concreta.179
Marinoni afirma que esta técnica de antecipação possibilita a realização das
consequências concretas da decisão de mérito, ensejando a aplicação imediata dos efeitos externos
dessa decisão. Estas consequências podem ser identificadas como os “efeitos que operam fora do
processo e no âmbito das relações de direito material.”180
Na realidade não há a antecipação dos efeitos da sentença, mas a produção imediata (ou
antecipada) do efeito executivo para a prática do direito. Assim, exclui-se a eficácia dos efeitos
internos, aplicando-se somente os efeitos externos da decisão final – realização fática dos direitos.
Examinado os limites da expressão “efeitos da tutela pretendida”, João Batista Lopes
destaca que o legislador não faz diferença entre os efeitos principais, secundários, anexos e/ou reflexos
de uma decisão de mérito, para determinar a extensão que pode ser alcançada pelos efeitos
antecipados. Adverte que “interpretação atrelada à literalidade do art. 273 pode conduzir ao equívoco
179
BUENO, Cassio Scarpinella. Tutela Antecipada. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 33. 180
MARONINI, Luiz Guilherme. Antecipação da Tutela. 11. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
p. 44.
85 de confundir o objeto da tutela antecipada com o próprio decisum da sentença de mérito.”
181 Feitas
algumas ressalvas182
, conclui que os efeitos veiculados são os “efeitos práticos da sentença, que podem
assumir caráter executivo ou mandamental, conforme o caso. (...) a ficácia propriamente declaratória
não pode ser objeto de antecipação.”183
Teori Albino Zavascki assevera que os efeitos antecipáveis seriam aqueles que
potencialmente seriam produzidos na decisão de mérito. Entre os efeitos possíveis em uma decisão
estão os efeitos preponderantes – decorrentes da declaração, da constituição, da condenação, da
mandamentalidade ou da executividade da decisão – e os demais efeitos, forças ou eficácias. Sendo
assim, “antecipar os efeitos da tutela pretendida significa antecipar as eficácias potencialmente
contidas na sentença”.184
Contudo, afirma o autor que a antecipação desses feitos somente concretizará a
efetividade do processo se “pela sua natureza, se tratar de efeito (a) que provoquem mudanças ou (b)
que impeçam mudanças no plano da realidade fática, ou seja, quando a tutela comportar, d alguma
forma, execução.”185
Utiliza o termo “execução” no sentido de atividade de execução latu sensu e
181
LOPES, João Batista. Tutela antecipada no processo civil brasileiro. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2009. p. 76. 182
Afirma que “não se figura razoável interpretação que estenda, indiscriminadamente, o âmbito da tutela antecipada a todos os e feitos da sentença, como se cuidasse do julgamento antecipado da lide”
182.
Fundamenta seu posicionamento tendo em vista as características da provisoriedade e revogabilidade da tutela antecipada, o que impediria o juiz de dotá-la de eficácia integral, produzindo os efeitos internos e externos da sentença de mérito. LOPES, João Batista. Tutela antecipada no processo civil brasileiro. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 76. 183
João Batista sustenta que não podem ser antecipados a eficácia declaratória, constitutiva e condenatória, pois
“não pode o juiz declarar existente provisoriamente uma relação jurídica, conquanto lhe seja claração. (...) À luz
dessas considerações, conquanto se possa afirmar, em linha de máxima, que a sentença declaratória não é
passível de execução, é de rigor esclarecer que, em certas hipóteses, a declaração vem acompanhada de ordem,
concedida como antecipação de tutela. Assim sendo, quando presentes os requisitos do art. 273 do CPC, haverá
possibilidade de antecipação desses feitos práticos na ação declaratória, como retro exposto. Mas não será
possível a antecipação da própria eficácia declaratória, como já se disse.
(...)
As ações constitutivas contêm, além da carga declaratória de toda sentença, um plus: a alteração de um estado ou
de uma relação jurídica. A eficácia constitutiva pressupõe, pois, eficácia declaratória, isto é, para constituir (ou
desconstituir) é necessário declarar. Diante disso, valem para as ações contitutivas o que foi dito para as
declaratórias.
(...)
As ações condenatórias parecem constituir a sede própria da tutela antecipada, mas dificuldades de ordem
técnica impõem cuidados especiais no tratamento da matéria. É que do mesmo modo que as ações constitutivas,
as condenatórias são, antes de mais nada, declaratórias, de modo que, para condenar, é preciso antes, declarar a
relação jurídica, o que, como foi dito, não pode ser antecipado provisoriamente. Defronta-se, pois, o aplicador do
direito com a seguinte dificuldade: como satisfazer provisoriamente o autor, concedendolhe, por exemplo, o
adiantamento da soma em dinheiro se ainda não se declarou seu direito? (...) A antecipação de efeitos práticos
tem caráter executivo latu sensu e está em perfeita harmonia com a tendência doutrinária moderna de superação
do binômio conhecimento-execução. Em suma, não há falar, tecnicamente, em antecipação da condenação, mas
apenas de efeitos executivos, sem prejuízo do exame da lide, no momento próprio. LOPES, João Batista. Tutela
antecipada no processo civil brasileiro. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 77, 78, 79, 84,
85, 88 e 89. 184
ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 86. 185
ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 86.
86 mandamental, afastando essa possibilidade quanto às eficácias declaratórias, constitutivas e
condenatórias.186
Destes entendimentos, é possível identificar três aspectos importantes: (i) são veiculados
imediatamente, via tutela de urgência satisfativa, os efeitos totais ou parciais da decisão de mérito; (ii)
é veiculada a eficácia executiva ou a eficácia mandamental, sendo que parcela da doutrina sustenta que
também podem ser veiculadas imediatamente as eficácias declaratória, constitutiva e condenatória; e
(iii) são antecipáveis somente os efeitos práticos, aqueles aptas a se realizar no plano concreto, ou seja,
sendo estes considerados de repercussão externa ao processo quanto a decisão de mérito, visando
proteger o direito.
Assim, se a parte pleiteia tutela de urgência em tutela inibitória ou tutela de remoção do
ilícito, o que se almeja é a imediata realização da obrigação de fazer ou não fazer (por exemplo, não
vincular propaganda que veicule a marca supostamente alvo de contrafação, não permitir a
distribuição da mercadoria e sua disposição aos consumidores, não produzir mais a mercadoria que
detenha signo distintivos que possa ocasionar confusão ao público consumidor, ou retirar os cartazes
que detenham possivelmente produto ou serviço alvo de contrafação de marca, ou retirar as
mercadorias das prateleiras), para evitar a ocorrência do ato ilícito ou possibilitar o desfazimento do
ato.
As características dos direitos de marca, sua relação com a propriedade imaterial e com as
relações de concorrência, reclamam meios processuais capazes de tutelá-los com efetividade, exigindo
tutela jurisdicional imediata, pois aguar um momento processual mais à frente para a concessão da
tutela jurisdicional deixa-os vulneráveis a inúmeros eventos e situações concretas com efeitos
irreversíveis (irreparáveis ou de difícil reparação).
Por isso a importância da tutela inibitória orienta-se para o futuro, impedindo a
ocorrência do ato ilícito, e por consequência o dano.187
Assim, o caráter eminentemente preventivo da
186
“O princípio da necessidade impõe se observe a adequação da medida antecipatória ao fim a que se destina a
antecipação, e que outro não é senão o de assegurar a efetividade da função jurisdicional. Assim, nos casos em
que a tutela somente poderá servir ao demandante quando concedida em forma definitiva, não haverá utilidade
alguma em antecipá-la provisoriamente. É o caso da eficácia meramente declaratória ou da meramente
constitutiva que, pela própria natureza de cada uma, não se compatibilizam com deferimento em caráter
provisório e, por isso mesmo, sua antecipação é medida absolutamente neutra em relação ao desiderato do
legislador de alcançar utilidade e celeridade da prestação da tutela definitiva. Assim, é incabível antecipar
simplesmente efeitos declaratórios ou constitutivos. (...) Aliás, também em se tratando de tutela condenatória, o
que se antecipa não é a condenação propriamente (que não comporta provisoriedade), e sim os efeitos executivos
que dela decorrem. ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 86 e
87. 187
Superando esses equívocos, a macro-reforma processual ocorrida em 1994 apresentou, a partir da
remodelagem do art. 461 do Código de Processo Civil, o que Pereira denominou de uma ação genuinamente preventiva, “a tutela inibitória. Plena de efetividade, pode ser conjugada com uma ação de remoção do ilícito, a precindir de dano e, por isso, de culpa para ser deferida. Uma tutela com uma fase sumária expressamente prevista. Enfim, uma tutela que se ajuste à demanda do Direito Industrial material. PEREIRA, Luiz Fernando C.. Tutela Jurisdicional da Propriedade Industrial: aspectos processuais da Lei 9.279/1996. Coleção Temas atuais de direito processual civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. ps. 96-97.
87 tutela inibitória nos permite afirmar que a mesma se constitui apropriada para proteção dos direitos
atinentes à marca.
Outra característica importante é que a tutela inibitória é aproveitada tanto para a
possibilidade de uma violação, quanto para a possível repetição ou continuação dessa violação, o que
amplia a sua extensão protetiva.
A tutela de remoção do ilícito pode ser manejada quando ocorre a violação do direito
referente ao exercício e exclusividade do direito de marca, sem necessária referência dano. Trata-se de
tutela voltada para o presente, tendo em vista que objetiva eliminar o ato ilícito que ocorre naquele
momento. Seu manejo permite extirpar o ato contrário ao direito do mundo real, restabelecendo o
atendimento ao exercício e exclusividade inerentes aos direitos de marca, consequentemente
prevenindo a ocorrência de dano.
A tutela de remoção do ilícito, seguindo esta linha de raciocínio, tem por finalidade
remover os meios para a prática do ilícito ou desfazer o ato transgressor que direciona à prática do ato
ilícito contra o direito de propriedade industrial.188
Podemos, nestes termos, considerar tanto a tutela inibitória, quanto a tutela de remoção
do ilícito, técnicas com efeitos mandamentais e executivos, direcionadas contra o ilícito e dotadas de
autonomia processual, pois não dependem de referibilidade a outra tutela jurisdicional para a sua
aplicação.
Todavia, essas tutelas contra o ilícito não seriam tão úteis se, para a sua concretização, se
aguardasse um momento futuro para a realização de seus efeitos práticos, possibilitando a ocorrência
do ato ilícito e, na sua continuidade, a ocorrência de danos irreparáveis ou de difícil reparação.
Tendo em vista viabilizar a concretização dessas tutelas contra o ilícito, importa a
aplicação instrumental da tutela de urgência satisfativas, para a realização imediata dos efeitos
mandamentais e executivos relacionados.
Neste sentido sustenta Pereira, quando afirma que tanto para a tutela inibitória, quanto a
tutela de remoção do ilícito, não corresponderiam ao seu escopo de proteção contra o ilícito sem um
provimento sumário satisfativo, pois esta espera acarretaria a perda da natureza de tutela especifica.189
Importar ressaltar, ainda, quais os efeitos veiculados imediatamente nos casos em que a
tutela jurisdicional é direcionada para a nulidade do registro de marca. Entendemos que, tendo em
vista que o objeto principal dessa tutela jurisdicional é a anulação do registro de marca, que porventura
foi concedido pelo INPI em desacordo com os aspectos legais, a tutela jurisdicional de urgência
satisfativa realiza imediatamente tutela com eficácia predominantemente desconstitutiva e
188
PEREIRA, Luiz Fernando C.. Tutela Jurisdicional da Propriedade Industrial: aspectos processuais da Lei
9.279/1996. Coleção Temas atuais de direito processual civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. p.
217. 189
PEREIRA, Luiz Fernando C.. Tutela Jurisdicional da Propriedade Industrial: aspectos processuais da Lei
9.279/1996. Coleção Temas atuais de direito processual civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. p.
229.
88 mandamental, com certa carga de declaração, pois além de suspender os efeitos do registro de marca,
garante que o titular do registro não utiliza a referida marca.
3.3.3 Legitimados
Quanto aos legitimados para requerer a tutela de urgência satisfativa, partilha-se do
entendimento que tanto o autor quanto o réu, este na reconvenção, podem pleitear a aplicabilidade
desta técnica.
Isto porque, não somente o autor, mas em alguns casos o réu, interessat-se pelo
julgamento célere e resolução do processo. Assim considera João Batista Lopes:
a tutela antecipada só pode ser pleiteada pelo autor, com o registro, porém, de que o
réu, na reconvenção, exerce o papel de verdadeiro autor. Concede-se que, em muitos
casos, o réu também tem interesse num julgamento célere da causa (v.g. quando for
manifestamente inconsistente a pretensão do autor). Mas o legislador objetivou, com
a antecipação da tutela, proteger o autor que lograr demonstrar a probabilidade da
existência do direito e o receio de dano irreparável ou de difícil reparação (ou, então,
abuso do réu no direito de defesa). Ao réu será lícito, na hipótese de pretender
pronto deslinde do processo, requerer o julgamento antecipado, presentes os
requisitos do art. 330 do CPC. 190
Isso se justifica pois, assim como o faz na ação, o réu na reconvenção formula pedido e
solicita a tutela jurisdicional. Abordando situação ainda mais complexa, Marinoni questiona se o ré, ao
se restringir a apresentar a contestação, mas não realizar pedido, pode ou não solicitar a tutela
antecipada:
Questão mais difícil é a de saber se o réu, quando se limita a apresentar contestação,
sem realizar pedido, pode requerer a tutela antecipatória. A doutrina não tem
admitido tal possibilidade. (...) A princípio, de fato, seria possível argumentar que o
réu não faz “pedido inicial” e que, portanto, não pode requerer a tutela. Tal
argumento, porém, filiado a uma interpretação literal da norma, não é suficiente, já
que o legislador infraconstitucional deve estar atento ao princípio da isonomia e o
réu pode necessitar, em determiandos casos, da tutela antecipatória. O réu, na
contestatção, de lado ashipóteses excepcionais de ações díplices, não formula
pedido. Entertanto, o réu, ao solicitar a rejeição do pedido formulado pelo autor,
requer tutela jurisdicional.191
Em rol exemplificativo, podemos indicar alguns legitimados para requerer tutela de
urgência satisfativa nas ações que envolvam direitos de marca. Nos casos de contrafação de marca, o
titular do registro, quem efetivou o pedido de depósito do registro de marca, o coproprietário, o
190
LOPES, João Batista. Tutela antecipada no processo civil brasileiro. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2009. ps. 90-91. 191
MARONINI, Luiz Guilherme. Antecipação da Tutela. 11. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
p. 146 e 147.
89 cessionário, o licenciado, o terceiro interessado etc. Já nos casos de nulidade de marcas, são
legitimados o INPI, o terceiro interessado, ou mesmo pelo titular do registro de marca etc.
3.3.4 Imperatividade da tutela de urgência satisfativa
Para a efetivação da decisão que antecipa a tutela, disponibilizam-se alguns
métodos para coibir seu descumprimento. O art. 273, § 3º informa que as técnicas de
efetivação desta tutela podem ser absorvidas das normas dos arts. 588, 461 § 4º e 5º, e 461-A.
A multa é um meio de coerção indireta e age sobre o psicológico daquele que deve
cumprir o ato mandamental proferido em juízo. Aliás, a multa, por ter como finalidade coibir a parte
para o cumprimento da decisão antecipatória, deverá ser estipulada nos limites suficientes para a
concretização da tutela.
Com o mesmo intuito, existem as medidas de apoio que visam efetivar a tutela do direito,
caracterizando-se como meio de coerção indireta. Notadamente, poderia se supor que estas medidas só
abrangeriam as técnicas processuais de caráter exauriente, tendo em vista que a letra da lei prevê a
efetivação da tutela específica.
Contudo, o mesmo dispositivo faz expressa referência à garantia da obtenção do resultado
prático equivalente, sendo esta clara previsão de antecipação de tutela, podendo assim aplicar estas
medidas de apoio nestes casos.
Estes meios de coerção são instrumentos audazes de efetivar a antecipação de tutela,
majorando o grau de imperatividade desta técnica e garantindo a eficácia da decisão.
3.3.5 Reversibilidade dos efeitos da medida satisfativa
Importa destacar que a reversibilidade do provimento antecipatório é prevista no art. 273,
§ 2º do Código de Processo Civil, não podendo o juízo conceder o pedido antecipatório quando houver
perigo de irreversibilidade do provimento antecipado. Esse dispositivo apresenta um pressuposto
negativo para a aplicabilidade desta técnica, pois é exata a previsão negativa caso exista o perigo de
irreversibilidade. Em vista disso, a existência de tal norma, sob uma perspectiva, obstaria a ilicitude ou
a perpetuação dos danos que o provimento antecipatório pudesse ocasionar, prezando-se pela sua
reversibilidade.192
A importância da não irreversibilidade do provimento consiste no caráter provisório da
antecipação da tutela, atribuído à possível confirmação ou não em momento posterior. Nesta situação é
192
Noutra em outra perspectiva, a interpretação desta norma de forma rigorosa ocasionaria a inutilidade da
técnica da antecipação de tutela, posto que sempre se apontaria alguma probabilidade, mesmo que ínfima, de
irreversibilidade do provimento. Conferir posicionamento do STJ: AgRg no Ag 736.826/RJ, Rel. Ministro
Herman Bejamin, Segunda Turma, julgado em 12/12/2006, DJ 28/11/2007.
90 recomendável que os seus efeitos práticos não produzam uma situação irreversível, impossibilitando o
retorno ao estado anterior à antecipação da tutela. Esta exigência existe, como sustenta Cassio
Scarpinella Bueno:
Porque se ela, durante o procedimento, for “revogada” ou “modificada” ou, ao final
do procedimento, não for “confirmada” pela sentença, tudo volte ao status quo ante
sem maiores problemas ou prejuízos para o réu. Se uma das questões mais
relevantes quando o assunto é tutela antecipada ou, mais amplamente, tutela de
urgência, é a busca de uma igualdade substancial entre os litigantes no limiar ou ao
longo do procedimento (mas, por definição, sempre antes do “tempo” em que,
tradicionalmente, habituou-se a tê-la), colocando-os em pé de igualdade, ela não
pode criar, para um deles, situação de desigualdade tal que, uma vez não
confirmada, por qualquer motivo, cause prejuízos ou efeitos irreversíveis ao outro.193
Neste raciocínio, a irreversibilidade torna-se um requisito negativo desta modalidade de
tutela de urgência, mas com sustentado, sua aplicação requer uma análise razoável do caso concreto,
utilizando-se critérios objetivos.
Com entendimento semelhante, Medina, Araújo e Gajardoni trabalham este aspecto como
reversibilidade dos efeitos antecipados, tendo em vista o que denominam de periculum in mora
inverso analisado a partir do princípio da proporcionalidade. Como ensinam os autores, para a
concessão da antecipação de tutela é necessária a possibilidade fática de reversibilidade, ou seja, o
retorno ao estado anterior. Além disso, deve o juiz verificar a presença do periculum in mora inverso,
noutras palavras, analisar se a concessão da antecipação de tutela ao autor causará dano irreparável ao
réu.194
Contudo, existem situações que mesmo se verificando que não será possível o retorno à
situação fática anterior, a ameaça a direito não poderá ser afastada de apreciação, tampouco deverá
restar desprotegida ou não tutela devidamente. Deverá o juiz, com vistas no princípio da
proporcionalidade, examinar quais são os bens jurídicos em confronto, e conceder a medida mesmo
que esta produza efeitos fáticos irreversíveis. 195
Neste contexto estar-se-ia presente autêntica tutela de
urgência satisfativa autônoma.196
193
BUENO, Cassio Scarpinella. Tutela Antecipada. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 57. 194
MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de; GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Procedimentos
Cautelares e Especiais. Processo Civil Moderno. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 49. 195
MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de; GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Procedimentos
Cautelares e Especiais. Processo Civil Moderno. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 50-51. 196
Medina, Araújo e Gajardoni escrevem que “as tutelas de urgência satisfativas autônomas são suficientes em si
mesmas, já que realizam, integralmente, o objetivo da ação, prescindindo-se, pois, de confirmação de sentença
fundada em cognição exauriente. Embora fundada em cognição sumária, acaba, muitas vezes, por criar situações
fáticas irreversíveis, em virtude da imutabilidade dos efeitos da tutela concedida.” MEDINA, José Miguel
Garcia; ARAÚJO, Fábio Caldas de; GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Procedimentos Cautelares e
Especiais. Processo Civil Moderno. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 57.
91
Insta ressaltar que é expressa a previsão, no art. 273, § 4º do Código de Processo
Civil, da revogação ou modificação da antecipação de tutela, podendo ocorrer a qualquer
tempo, em decisão fundamentada.
3.3.6 Tutela de urgência fundada contra o perigo (ato de contrafação de marca e dano)
Como sustentado, as tutelas autônomas contra o ilícito estão aptas a conferir proteção aos
direitos de propriedade industrial, em face de atos de contrafação, agindo efetivamente contra o ilícito
e consequentemente impedindo o dano.
Aliando-as à tutela de urgência satisfativa, majora-se a extensão protetiva destas e,
conjugada com os meios de coibir seu descumprimento, constrói-se a estratégia capaz de efetivamente
proteger os direitos decorrentes das patentes, desenhos industriais e marcas em face de atos ilícitos e
possíveis danos.
Nesse casos, a tutela de urgência satisfativa deve fundamentar-se em três aspectos:
(i) demonstração ser o requerente o titular do direito de marca afirmado, assim como
delinear os limites desses direitos (probabilidade do direito);
(ii) demonstração da existência de atos ilícitos que poderão ocorrer, já ocorreram, ou que
se constituam capazes de ocasionar dano (provas da prática de atos ilícitos, como
contrafação, concorrência desleal etc.);
(iii) demonstração que a permanência dessa situação poderá acarretar a perda do objeto
do processo, ou mesmo o perecimento do direito de propriedade industrial (fundado
receio).
O primeiro aspecto – probabilidade do direito – deve ser demonstrado com a
apresentação exata, por parte do requerente, de todas as provas possíveis que comprovem a existência
de uma situação jurídica legítima que deve ser protegia via tutela jurisdicional urgente satisfativa.
Quando se trata de marcas e sinais distintivos197
, a probabilidade do direito é comumente
demonstrada a partir destes elementos: (i) a apostila, demonstrando os limites característicos dos sinais
197
Com objetivo meramente exemplificativo, tendo em vista que o trabalho se ocupa somente das marcas, a
probabilidade do direito a ser verifica quanto às patentes, pode-se afirmar que a probabilidade do direito deve
ser demonstrada com a anexação de todos os documentos que o INPI disponibilizou que concedam a titularidade
à parte requerente, assim como os demais que também demonstrem a essência dos direitos de exclusiva;
podemos elencar os seguintes elementos: (i) carta-patente; (ii) documentos que comprovem as informações
presentes no requerimento, no relatório descritivo, nas reivindicações, nos desenhos, no resumo, no comprovante
do pagamento da retribuição relativa ao depósito, e na redação do pedido em língua portuguesa; (iii) provas que
demonstrem a fruição efetiva dos direitos da patente sem a autorização do seu titular; (vi) laudo pericial que
comprove o ato de contrafação, derivado de perícia judicial ou extrajudicial; (v) parecer técnico. Quanto às
situações referentes à prática de atos ilícitos e registro de desenhos industriais, podemos arrolar os seguintes
elementos: (i) o registro de desenho industrial; (ii) documentos comprobatórios do requerimento, relatório
descritivo, reivindicações, desenhos ou fotografias, campo de aplicação do objeto, e comprovante do pagamento
da retribuição relativa ao depósito; (iii) provas que demonstrem o consumo não autorizado dos direitos do titular
do registro; (vi) laudo pericial que comprove o ato de contrafação, derivado de perícia judicial ou extrajudicial;
92 distintivos; (ii) documentos comprobatórios do requerimento, etiquetas, e o comprovante do
pagamento da retribuição relativa ao depósito; (iii) provas que demonstrem o consumo não autorizado
dos direitos do titular do registro; (vi) laudo pericial que comprove a contrafação, derivado de perícia
judicial ou extrajudicial; (v) parecer técnico.198
Quanto ao segundo aspecto, atinente às provas da prática de atos ilícitos ou dano, o
requerente do provimento antecipatório poderá instruir seu pedido com elementos que demonstrem a
possibilidade ou existência do ato ilícito ou do dano, tendo em vista os respectivos limites da
concessão de direitos conferida ao titular do registro de marca.
Marinoni, diferenciando as tutelas inibitória, de remoção do ilícito e ressarcitória,
identifica o que deve ser provado para se obter a aplicação da antecipação de tutela e concessão da
tutela de urgência satisfativa. Na dicção do autor, “ação inibitória se preocupa com um ato ilícito
futuro, a ação de remoção do ilícito com um ato ilícito passado e a ação de ressarcimento com um
dano já ocorrido.”199
Portanto, na tutela inibitória cumulada com antecipação de tutela, deve-se provar que um
fato ocorrido indica a possível contrafação e que esta ameaça é urgente o suficiente para que seja
proferida a antecipação; caso contrário, a contrafação se concretizará.
Para a tutela de remoção do ilícito aliada à antecipação de tutela, é necessário provar a
ocorrência da contrafação, e que a sua permanência no mundo fático poderá acarretar danos ao direito
do requerente, devendo com urgência obter-se uma decisão que retire o ato contrário ao direito.
(v) parecer técnico. Entretanto, a ausência de um arsenal probatório robusto que demonstre a probabilidade do
direito ou a verossimilhança, deve acarretar o indeferimento da antecipação de tutela, pela razão de que “a
contrafação de patentes envolve aspectos eminentemente técnicos, que dependem de perícia conduzida por
profissionais especializados para que sejam elucidados.” MACHADO, José Mauro Decoussau. Aspectos da
Antecipação da Tutela na Propriedade Industrial: patentes, desenhos industriais e marcas. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2007. p. 134. O mesmo raciocínio se emprega, se analisada a questão da probabilidade do
direito quando aos desenhos industriais, podemos arrolar os seguintes elementos: (i) o registro de desenho
industrial; (ii) documentos comprobatórios do requerimento, relatório descritivo, reivindicações, desenhos ou
fotografias, campo de aplicação do objeto, e comprovante do pagamento da retribuição relativa ao depósito; (iii)
provas que demonstrem o consumo não autorizado dos direitos do titular do registro; (vi) laudo pericial que
comprove o ato de contrafação, derivado de perícia judicial ou extrajudicial; (v) parecer técnico. Importante
destacar que, em se tratando de desenhos industrias, a fragilidade dos elementos apresentados quanto ao registro
poderá acarretar a não concessão da tutela antecipatória, haja vista serem necessários exames e provas periciais
para a obtenção da certeza do cumprimento dos pressupostos positivos de concessão. Portanto, “a fragilidade do
registro, de tal modo, poderia não transmitir segurança jurídica ao julgador quanto à probabilidade do direito do
autor.” MACHADO, José Mauro Decoussau. Aspectos da Antecipação da Tutela na Propriedade Industrial:
patentes, desenhos industriais e marcas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 139. 198
Ao examinar a possível contrafação de marca, o juízo deve identificar as similitudes, e não as diferenças entre
a totalidade ou partes dos signos. Nesta perspectiva, “o magistrado deve analisar a questão com os olhos de um
consumidor – que é, de fato –, a fim de concluir se a atualização da marca que lhe é apresenta causa confusão
com outra validamente registrada.” MACHADO, José Mauro Decoussau. Aspectos da Antecipação da Tutela na
Propriedade Industrial: patentes, desenhos industriais e marcas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2007. p. 140. 199 MARONINI, Luiz Guilherme. Antecipação da Tutela. 11. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p.
319.
93
Nos casos de tutela ressarcitória cumulada com antecipação de tutela, é suficiente a
apresentação de provas que indiquem à existência de dano, assim como das que convenção o juízo de
que, a continuação desta situação fática poderá acarretar a majoração dos efeitos negativos, culminado
em um dano irreparável ou de difícil reparação à marca.
Pontual destaque deve ser atribuído à prova pericial, isto porque a propriedade industrial
detém características eminentemente técnicas. Surge, assim, a questão da necessidade ou não, em sede
de antecipação de tutela, de perícia técnica judicial para a formação de um juízo acerca da tutela
urgente.
Quanto ao terceiro aspecto – “fundado receio –, o requerente deve demonstrar que a
permanência da situação ilícita ou do dano, poderá acarretar prejuízos à frutuosidade do provimento
jurisdicional, ou até mesmo frustrá-lo em sua totalidade. É visível que na maioria das demandas que
envolvam direitos de propriedade industrial o trânsito temporal do processo poderá acarretar a
irreparabilidade dos efeitos do ato ilícito ou do dano.
Nesta coerência, Machado afirma que devido a natureza diferenciada dos bens imateriais
protegidos pelo direito de marca, “lhes torna inerente a dificuldade de que haja, posteriormente à
violação, na maioria dos casos, uma reparação pecuniária satisfatória, e restabeleça plenamente a
situação anterior.”200
Deve ser demonstrado, ainda, para fins de antecipação de tutela, o receio de que a
demora do provimento final cause a sua ineficácia, haja vista o perecimento do objeto do processo.
Seria ineficaz um provimento inibitório, em que o ato contrário ao direito tenha já tenha ocorrido; em
sede de remoção o ilícito, isso ocorreria se a permanência do ilícito no tempo tenha acarretado o dano;
e ainda, seria tardio um provimento de ressarcimento dos danos aos direitos de propriedade industrial,
se o trâmite processual acarretou um dano irreparável, ou mesmo de difícil reparação.
Observando estes aspectos e respeitando-se as vicissitudes do ambiente decisional
atinente aos direitos de propriedade industrial, poder-se-á interpretar razoavelmente o texto legal e
conceder, ou não, a antecipação de tutela e os efeitos da tutela de urgência satisfativa.
Retratando o que foi exposto, faz-se a análise de um julgado interessante que cuida de
questões referentes a possível ato de contrafação de marca, tutela de urgência satisfativa e as provas
suficientes para se construtir um juízo adequado sobre o caso apresentando.
Atualmente, o STJ tem enfrentado muitas questões envolvendo a interpretação e
aplicação das tutelas jurisdicionais na proteção dos direitos de marca. Em linhas gerais,
compreendemos que esse Tribunal detém entendimento no sentido da possibilidade de aplicação de
tutelas contra o ilícito (tutela inibitória e tutela de remoção do ilícito) e tutelas ressarcitória do dano,
cumuladas com tutela de urgência, seja cautelar ou satisfativa.
200
MACHADO, José Mauro Decoussau. Aspectos da Antecipação da Tutela na Propriedade Industrial: patentes,
desenhos industriais e marcas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 144.
94
Contudo, os grandes debates que alcançam o STJ são aqueles em que se discute não a
possibilidade de aplicação destas tutelas diferenciadas, mas como a qualificação dos fatos poderão
possibilitar a concessão da tutela jurisdicional almejada.
Aliado a isto, observando que os litígios que envolve os direitos de marcas exigem a
análise de questões de fato, o STJ também tem enfrentado inúmeras questões de direito envolvendo a
atividade probatória e a interpretação das normas referentes a prova no processo civil.
Com esta constatação, entendemos ser interessante analisar não simplesmente o número
de decisões que possibilitam ou não a concessão de tutela de urgência, tutelas contra o ato ilícito ou
tutela contra o dano, já que é entendimento estável desse Tribunal no sentido da sua possibilidade de
utilização nos casos que envolve contrafação de marca ou nulidade de registro de marco.
Admitindo um critério qualitativo, e não somente um critério numérico, identificamos
uma decisão apresentada pelo STJ que comporta a análise de temas que consideremos intricados do
ponto de vista processual, a saber: (i) aplicação de tutela contra o ilícito; (ii) a utilização de tutela de
urgência satisfativa; e (iii) a importância da prova pericial na identificação do ato ilícito.
O estudo deste caso específico demonstrará a atenção que o STJ confere aos litígios que
envolvem direitos de marca, deixando evidente que a análise realizada considera as características
diferenciadas desses direitos, para a correta reflexão e aplicação da tutela jurisdicional.
O litígio envolvendo Reckitt Benckiser N. V. e Reckitt Benckiser do Brasil LTDA “vs.”
Bombril Mercosul S.A. e Bombril S.A., foi apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça por
impugnação via REsp nº. 1.284.971/SP, em 20.11.2012, e apresenta um excelente debate acerca da
utilidade da prova pericial nos casos de contrafação de marca.
Em síntese, Reckitt Benckiser N. V. e Reckitt Benckiser do Brasil LTDA (recorrente)
ajuizou ação pleiteando tutela inibitória, em face de Bombril Mercosul S.A. e Bombril S.A.
(recorrida), reivindicando a titularidade na utilização dos direitos de marca e comercialização de
alvejantes “VANISH”, tendo em vista a possibilidade de fabricação, comercialização e divulgação do
produto “VANTAGE”, o que implicaria na violação da marca “VANISH”, assim como concorrência
desleal, por existirem semelhanças gráficas, fonéticas e de forma das embalagens, o que ocasionaria
confusão ao público consumidor.
No primeiro grau de jurisdição, o Juiz deferiu o pedido liminar no sentido de impedir o
lançamento do produto das recorridas, concedendo em sede de antecipação de tutela (tutela de
urgência satisfativa) os efeitos da tutela inibitória do ilícito. Contudo, na sentença, o Juiz julgou os
pedidos os pedidos improcedentes. Esta decisão foi impugnada via apelação, sendo que a decisão do
Tribunal de Justiça de São Paulo, mesmo julgando improcedente a apelação e não reformando a
sentença, o fez de forma não unânime, o que nos permite afirmar que a questão não restou bem
esclarecida nem mesmo no tribunal a quo. Desta decisão, a apelante opôs embargos de declaração,
sendo os mesmos rejeitados pelo TJ/SP.
95
O recurso especial interposto por Reckitt Benckiser N. V. e Reckitt Benckiser do Brasil
LTDA, contra a decisão do TJ/SP, em face da recorrida Bombril Mercosul S.A. e Bombril S.A., dentre
várias causas de pedir, cerceamento de defesa, pois o Juiz não possibilitou a produção de prova
pericial, decisão esta reafirmada pelo TJ/SP. Este é o ponto que interessa a esse estudo: identificar, no
julgamento do STJ, a compreensão da Corte sobre a utilidade da prova pericial nos casos de
contrafação de marcas.
Podemos afirmar que o STJ não detém posicionamento estável no sentido de afirmar pela
necessidade ou pela desnecessidade de prova pericial nestes casos de contrafação, isto porque as
variáveis fáticas que integram este ambiente decisional muitas das vezes não permitem uma afirmação
absoluta em sentido positivo ou negativo. Percebe-se que o STJ, na análise caso a caso, trata a questão
sobre o prisma da utilidade que o juiz identifica na prova pericial na formação do juízo, deixando ao
julgador o espaço para eleger ou não a produção de prova pericial.
Todavia, é extremamente intricada esta questão da prova pericial e o pleno exercício do
direito de defesa, tanto que o STJ, no caso envolvendo as marcas “VANISH” e “VANTAGE”,
proporcionou um debate jurídico acirrado, como demonstraremos a frente.
O acórdão que decidiu o mérito do REsp nº. 1.284.971/SP não foi unânime, ocorrendo,
inclusive, voto-vista, da Ministra Nancy Andrighi, por reconhecer a complexidade da questão
processual referente à prova pericial e o cerceamento de defesa. E se a questão processual no âmbito
da atividade probatória já se configura complexa e controvertida, podemos refletir o quão complexa
deveriam ser as questões atinentes ao direito material e aos fatos.
Neste acórdão não unânime, após o voto-vista da Ministra Nancy Andrighi, que
inaugurou a divergência na Terceira Turma do STJ, a mesma foi acompanhada pelo Ministro Paulo de
Tarso Sanseverino; entretanto negou-se provimento ao recurso especial, por maioria de votos,
seguindo o voto do Ministro Relator Massami Uyeda, os Ministros Sidnei Beneti e Ricardo Villas
Bôas Cueva. Analisaremos os entendimentos divergentes sobre o problema investigado.
O Relator Ministro Massami Uyeda, apresentou voto no sentido de não provimento do
recurso especial, sendo este entendimento seguido pelo Ministro Sidnei Beneti e pelo Ministro Ricardo
Villas Bôas Cueva. De acordo com o voto do relator:
Sem respaldo jurídico, igualmente, a alegação de cerceamento de defesa, em razão
do julgamento antecipado da lide, obstando-se, por conseqüência, a produção de
prova pericial requerida. Bem de ver, na espécie, que o Tribunal de origem, ao
respaldar o proceder do r. Juízo a quo, considerou que os elementos probatórios
reunidos nos autos, em cotejo com os fatos aduzidos, inclusive, pelos próprios
recorrentes, são suficientes para o deslinde da controvérsia, o que torna possível,
de fato, o julgamento antecipado da lide. Tem-se, assim, não consubstanciar
cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide, isoladamente considerado,
na hipótese de o magistrado, destinatário das provas, considerar despicienda a
produção de outras provas. (grifos nossos)
96
Quanto à questão da prova pericial, a sua produção deve ser analisada em dois momentos:
(i) quando se concedeu liminarmente a antecipação dos efeitos da tutela inibitória, pois o Juiz
entendeu existir uma situação de urgência suficiente para a concessão a tutela de urgência satisfativa,
sem a necessária produção da prova pericial; e (ii) quando, em momento posterior, o Juiz, na sentença,
revoga os efeitos da tutela de urgência em favor das autoras, e sentencia no sentido de não haver
possibilidade de confusão entre as marcas “VANISH” e “VANTAGE”, julgando improcedente o pedido
de tutela inibitória.
No primeiro momento, no qual o Juiz analisa o pedido de tutela de urgência, a não
produção de prova pericial beneficia aquele que afirma que o seu direito de marcar corre o risco de
dano irreparável ou de difícil reparação, caso os produtos da marca “VANTAGE” fossem fabricados e
comercializados, pois isto ocasionaria confusão como o produto de marca “VANISH”, já existente no
mercado, ocasionado confusão ao no público consumidor, e consequentemente coerência desleal.
Portanto, o Juiz entendeu que, se a produção da prova pericial ocorresse neste momento, o lapso
temporal existente entre o pedido de tutela de urgência e o resultado final da perícia poderia ocasionar
efeitos negativos ao titular da marca “VANISH”.
Em um segundo momento, solucionada esta situação de urgência, não se justifica o fato
do Juiz não permitir a produção de prova pericial, e julgar antecipadamente a lide. De acordo com o
entendimento do Ministro Massami Uyeda, os elementos probatórios reunidos nos autos, relacionados
com os fatos apresentados, seriam suficientes para o deslinde da controvérsia, o que tornaria possível o
julgamento antecipado da lide.
Contudo, parece que para o Juiz, a identificação de possível ato de contrafação de marca,
suposta confusão e risco de prática de concorrência desleal, é algo que pode ser aferido simplesmente
com a comparação entre uma marca e o conjunto imagem adotados por dois produtos, com base em
impressões sobre alguns elementos estéticos, como letras, figuras, cores. E assim também entendeu o
Ministro Ministro Massami Uyeda, ao afirmar que “efetivamente, seja no que diz respeito à grafia,
seja no que se refere à fonética dos vocábulos em confronto, não se constata qualquer similaridade,
apta a induzir a erro o consumidor.”
Importa destacar que as recorrentes abordam somente aspectos estético, referentes à
grafia, fonética, coloração, disposição do conjunto imagem, tendo em vista que, documentalmente,
estes são os únicos elementos possíveis de serem apresentados ao debate.
A perícia, se produzida, certamente apresentaria outros elementos para a compreensão
dos fatos e a formação do juízo, tendo em vista a explicação acerca de outros elementos estéticos e
ideológicos que integram a marca, o que poderia ser apresentado por um especialista na área de
design, assim como questões referentes ao mercado consumidor e ao segmento empresarial, a partir de
uma perícia de pesquisa de mercado orientada por especialista na área de marketing, economia ou
administração.
97
Todavia, não pretendemos tecer graves criticas este posicionamento, pois a
fundamentação no sentido de que o juiz deve identificar a necessidade ou não da produção de prova
pericial foi algo sustentado no TJ/SP, assim como no STJ por aqueles que seguiram o voto do Ministro
Massami Uyeda. A análise deste voto serve para verificar o posicionamento do STJ e de seus
Ministro, assim como alerta acerca da importância da prova pericial em determinados casos
envolvendo suposta contrafação de marcas.
A Ministra Nancy Andrighi, que inaugurou a divergência na Terceira Turma do STJ,
sendo seguida pelo Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, apresenta interessantes argumentos no
sentido da utilidade da prova pericial no caso “VANISH” e “VANTAGE”, sustentando ainda a tese de
cerceamento de defesa.
Quanto à análise da suposta violação dos direitos de marca da recorrente, a Ministra
Nancy Andrighi identifica duas linhas de raciocínio:
Pode-se argumentar que a identidade entre os produtos “VANTAGE” e “VANISH”
visa a facilitar no consumidor a percepção de que são produtos destinados a um
mesmo fim, porém não a ponto de induzi-lo a erro, levando um pelo outro. Em
outras palavras, essas semelhanças permitem que o consumidor, ao ver o
“VANTAGE” na gôndola do mercado, suponha tratar-se de um produto equivalente
ao “VANISH”, abrindo-lhe a possibilidade de escolha entre os dois, conforme sua
conveniência. Situação análoga ocorre com diversos produtos, inclusive de limpeza
e higiene pessoal, como detergentes, sabões em pó e em barra, amaciantes, pastas de
dente, shampoos etc. O objetivo, então, seria possibilitar a identificação do
segmento ao qual o produto pertence, e não de confundir os diversos produtos de um
mesmo segmento. Por outro lado, haverá quem enxergue a colidência de marcas,
afirmando que a similitude entre os produtos na verdade objetiva confundir o
consumidor, sobretudo aquele mais desatento, desinformado ou apressado, que
acabará levando um produto pelo outro.(grifos nossos)
Conclui-se que, “os limites entre uma concorrência saudável ou desleal são extremamente
tênues, de sorte que fica difícil, apenas do ponto de vista empírico, concluir pela existência ou não de
violação do direito marcário.” Noutras palavras, colocar um produto do lado do outro na tentativa
simplória de identificar semelhanças entre a marca e o conjunto imagem, para apontar o risco de
confusão e a prática de concorrência parasitária, não é uma forma adequada de se identificar o ilícito
de contrafação de marca.
A dúvida quanto a compreensão do contexto fático no caso “VANISH” e “VANTAGE” é
tão evidente que a Ministra Nancy Andrighi dispõe que, “no primeiro grau de jurisdição, o Juiz
inicialmente deferiu o pedido liminar no sentido de impedir o lançamento do produto das recorridas,
para depois, na sentença, julgar os pedidos improcedentes”, destacando ainda a complexidade do
contexto fático, ao afirmar que a decisão do TJ⁄SP “não foi unânime, tendo o voto vencido ressaltado
que “a cor preponderante (rosa), o nome do produto e as disposições das embalagens (...) podem
causar confusão entre os consumidores e desvio de clientela”.
98
A complexidade, neste caso, gira em torno de questões de fato, e não de questões de
direito, pois o debate travado não alcança os conceitos jurídicos de marca, concorrência desleal,
contrafação etc.
O exame atento da decisão do Juiz de base, do TJ/SP, e do STJ, nos permite afirmar que o
debate teve por objeto a possibilidade de confusão entre as marcas “VANISH” e “VANTAGE”, assim
como impacto que tal concorrência (saudável ou parasitária) acarretaria ao mercado consumidor,
questões eminentemente de fato.
Isto é ainda mais perceptível se observados que o debate de questões jurídicas se limitara
à questões referentes ao direito de prova e o cerceamento de defesa, que consequentemente afeta o
modo de aferir as questões de fato no caso concreto.
A Ministra Nancy Andrighi critica a análise fática nas instâncias ordinárias, afirmando
que, “em todas essas decisões, contudo, na tentativa de resolver o impasse, o que cada julgador fez foi
consultar o seu íntimo para, baseado quase que exclusivamente em máximas de experiência, dizer se
houve ou não colidência de marcas”, sustentando que:
A constatação de que as decisões proferidas neste processo se basearam,
fundamentalmente, em máximas de experiência dos julgadores quanto ao fato de a
semelhança entre as embalagens ser capaz de confundir o consumidor, faz com que a
afirmativa de cerceamento de defesa ganhe relevância. (...) No particular, contudo,
a similitude das embalagens – fato evidente – não constitui o cerne da controvérsia
material posta a desate. O desafio, como visto, está em estabelecer se essa
identidade é suficiente para confundir o consumidor. Nesse contexto, salvo melhor
juízo, não estamos diante de uma questão puramente de direito. Ainda que existam
aspectos legais a serem considerados e aplicados, a definição do potencial ofensivo
da embalagem das recorridas exige, antes de mais nada, uma análise técnica de
propaganda e marketing tendente a estabelecer se o produto gera ou não confusão
para o consumidor. Não se ignora que o Juiz deve decidir com base em seu livre
convencimento, mas sua manifestação deve ser racional e motivada, nos termos do
art. 131 do CPC, o que somente será possível se ele dispuser de elementos
suficientes para tanto, o que, em se tratando de questão eminentemente técnica, via
de regra demanda subsídios derivados de prova pericial. Na realidade, o critério
central para se averiguar a necessidade de produção da prova pericial deriva da
interpretação conjugada dos arts. 145 e 335 do CPC, os quais estabelecem,
respectivamente, que o Juiz: (i) deve ser assistido por perito quando a prova
depender de conhecimento técnico ou científico; e (ii) pode valer-se de regras de
experiência comum e também de eventual experiência técnica acessível a quem não
é especializado em assuntos alheios ao direito, ressalvando os casos em que é de
rigor a prova pericial. (grifos nossos)
O que podemos perceber é que as instâncias ordinárias afastam a prova pericial,
utilizando somente impressões pessoas de cada julgador. Notadamente, estas impressões devem ser
consideradas, pois os julgadores também são consumidores, mas tais impressões não apresentam
elementos ou critérios suficientes para uma adequada análise de mercado, tampouco o contexto no
99 qual o consumidor, ou o empresário, estão inseridos. Estes elementos, com base em critérios técnicos
ou científicos, somente poderiam ser corretamente apresentados por um especialista na área.
A Ministra Nancy Andrighi segue afirmando que:
Diante disso, do ponto de vista de propaganda e marketing, o que cada julgador
decidiu não passou, na prática, de um palpite, apoiado em sua experiência pessoal,
mas que pode se revelar totalmente equivocado se confrontado com estudos
especializados, realizados por profissionais da área, capazes de revelar se a conduta
das recorridas é admissível no meio publicitário, bem como se há bases concretas
para se presumir a confusão dos produtos, aí considerada a totalidade dos
consumidores (ou pelo menos uma amostragem confiável e segura, apta a revelar o
comportamento médio dos consumidores) e não só a experiência individual de cada
julgador enquanto consumidor. (grifos nossos)
O voto-vista apresentado pela Ministra Nancy Andrighi, seguido pelo Ministro Paulo de
Tarso Sanseverino, apresenta argumentação sólida no sentido de que, no caso VANISH” e
“VANTAGE”, a formação do juízo sem a produção de prova pericial acarreta cerceamento do direito
de defesa.
Tal decisão nos despertou interesse pela riqueza dos argumentos apresentados, sendo que
os entendimentos divergentes, neste caso, não demonstram instabilidade jurisprudencial, mas um
momento saudável em que o STJ, responsável por apresentar pautas de condutas interpretativas acerca
texto infraconstitucional federal, reflete sobre temas intricados do direito processual civil, como tutela
contra o ilícito, tutela de urgência e atividade probatória nos litígios que envolvem direitos de marca.
No caso específico, não podemos identificar uma pauta de conduta interpretativa
apresentada pelo STJ, pois o debate travado girou em torno de três entendimentos: (i) a desnecessidade
de produção pericial nos casos de contrafação de marca; (ii) a tarefa do juiz ao identificar utilidade da
prova pericial; (iii) a utilidade da prova pericial mesmo nos casos de contrafação de marca.
Quanto ao primeiro entendimento, que aponta a desnecessidade de produção pericial nos
casos de contrafação de marca, podemos incluir os votos dos Ministro Massami Uyeda, Ministro
Ricardo Villas Bôas Cueva e Ministro Sidnei Beneti. Ao analisar o caso envolvendo as marcas
“VANISH” e “VANTAGE”, os mesmos constatam pela desnecessidade de prova pericial, acarretando o
não provimento do recurso especial.
Já o segundo entendimento, que conclui pela tarefa do juiz ao identificar utilidade da
prova pericial, localiza-se entre os dois outros entendimentos, sendo apresentado pelo Ministro Sidnei
Beneti. Mesmo sustentando que no caso envolvendo suposta contrafação entre as marcas “VANISH” e
“VANTAGE, a não produção de prova pericial não acarretaria cerceamento de defesa, o Ministro
Sidnei Beneti é firme no argumento de que ao juiz cabe o dever-poder de identificar a utilidade da
produção de prova pericial, não apresentando um entendimento absoluto de que, nos litígios
100 envolvendo contrafação de marca, é desnecessário a produção de prova pericial pois o juiz é capaz de
aferir se existe distintividade entre um e outros signos distintivos.
E quanto ao terceiro posicionamento, que afirma a utilidade da prova pericial mesmo nos
casos de contrafação de marca, a Ministra Nancy Andrighi e o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino,
entendem que no caso analisado a prova pericial seria essencial para a identificação ou não o ato
ilícito. Destaca-se, ainda, que os dois ministros também apontam o dever-poder do juiz em identificar
a utilidade da produção de prova pericial, e por isso constatam que no caso concreto a colaboração de
um expert seria fundamental. Contudo, divergindo do entendimento do Ministro Sidnei Beneti,
afirmam que no caso envolvendo as marcas “VANISH” e “VANTAGE”, a não produção de prova
pericial acarretou cerceamento de defesa.
Observamos que a decisão em análise não discute a possibilidade ou não da concessão de
tutela de urgência, ou de tutela contra o ilícito, pois como já afirmamos, o STJ apresenta entendimento
estável quanto a possibilidade da aplicação de ambas para a proteção dos direitos de marca.
O debate é travado acerca da atividade probatória e a interpretação das normas referentes
à prova no direito processual civil, observando de maneira adequada as peculiaridades dos direitos de
exclusiva na utilização de signo distintivos.
3.3.7 Tutela de urgência fundada na anulação do registro de marca
3.3.7.1 Considerações acerca da tutela de anulação dos direitos de propriedade industrial
As ações de nulidade buscam desconstituir o direito de propriedade industrial conferido
às invenções, modelos de utilidade, desenhos industriais e de marcas que tenham sido protegidas em
desacordo com as disposições constitucionais, infraconstitucionais, e administrativas do INPI. Por isso
a necessidade de demonstrar, nas linhas acima, como ocorre o processo administrativo para a obtenção
do respectivo direito de exclusividade sobre bens industriais – sejam estes tecnológicos, sejam de
sinais distintivos.
A ação de nulidade do registro de marca é o instrumento voltado a desconstituir a
exclusividade concedida a determinada pessoa por parte do INPI, tendo em vista que a concessão do
direito, via processo administrativo, foi executada com erros e inobservância do disposto em lei.
O processo administrativo de concessão de direitos de marcas, como descrito em linhas
pretéritas, compõe-se por diversas etapas, cada uma dessas eivadas de rigor técnico, para que ao fim
seja concedido ao requerente a exclusividade de exploração de determinado bem imaterial.
Mesmo que todas essas etapas e análises sejam realizadas por técnicos experientes em
áreas específicas, o procedimento administrativo de concessão de direitos de exclusividade poderá
incorrer em erro – formal ou material.
101
A situação em que existe um direito de exclusividade concedido erroneamente não pode
permanecer, pois acarretaria a consumação de um ato ilícito durante o período de vigência da
patente, desenho industrial ou marca. Deste modo, mediante ação de nulidade se discute estes vícios e
extirpar-se a situação de ilicitude.
Sem a intenção de elencar em rol exaustivo, indicam-se alguns possíveis equívocos que
podem ocorrer no processo administração de concessão de registro de marca: não observância às
matérias excluídas da proteção dos direitos de propriedade industrial; infração às regras de validade do
objeto do registro de marca; não observância e infração às condições legais de fundo – ou
pressupostos; infração às condições legais de forma e infração ao processo de obtenção; infração a
direitos de terceiros etc.
Precede, à análise da antecipação de tutela em ações de nulidade de direitos de marca, a
indicação dos efeitos produzidos pela decisão em sede desta ação de nulidade. Se procedente, o réu
terá contra si o efeito declaratório, que assevere a nulidade do direito, e conseqüentemente o
(des)constitutivo do direito de exclusividade. Já o INPI terá contra si um provimento mandamental,
ordenando a esse que cumpra os desígnios necessários para que o registro de marca deixem de
produzir efeitos contra terceiros. Mas, em casos de improcedência, o réu terá a seu favor uma decisão
declaratória que reafirme ser este o detentor do direito de exclusividade.
A Lei de Propriedade Industrial ocupa-se desta matéria nos arts. 56, 57 e 118 – para as
patentes e analogicamente para os desenhos industriais –, e nos art. 173, 174 e 175 – para o registro de
marcas.
3.3.7.2 Nulidade de registro de marcas
A ação de nulidade de registro de marca201
é semelhante à utilizada nas demais
modalidades de direito de propriedade industrial, admitindo-se as mesmas considerações escritas no
tópico anterior. Diferencia-se das demais ações de nulidade presentes na Lei n. 9.279/1996 por deter
tratamento específico quanto ao processamento.202
202 Art. 165. É nulo o registro que for concedido em desacordo com as disposições desta Lei.
Parágrafo único. A nulidade do registro poderá ser total ou parcial, sendo condição para a nulidade parcial o fato de a parte subsistente poder ser considerada registrável. Art. 166. O titular de uma marca registrada em país signatário da Convenção da União de Paris para Proteção da Propriedade Industrial poderá, alternativamente, reivindicar, através de ação judicial, a adjudicação do registro, nos termos previstos no art. 6º septies (1) daquela Convenção.
102
Os legitimados para propor esta ação são o INPI, terceiros interessados ou, ainda, mesmo
não previsto neste diploma, o Ministério Público, nos casos em que for latente a existência de interesse
público em denunciar irregularidade de determinado registro de marca. Poderá o juiz, entendendo ser
pertinente, determinar a suspensão dos efeitos do registro e do uso da marca, caso demonstrados os
requisitos processuais necessários para o ato. O ajuizamento da ação de nulidade de registro de marca
se dará no foro da Justiça Federal, devendo o INPI ser interventor nos casos que não estiver compondo
o polo ativo ou passivo da ação. Após o trânsito em julgado da ação de nulidade, o INPI deverá
publicar esta informação para ciência de terceiros.
Com estas considerações, passa-se à análise das técnicas processuais de proteção
do direito de propriedade industrial, pois como sustentado, a compreensão do direito
processual transita, impreterivelmente, pelo conhecimento acerca do direito material que se
pretende conferir tutela jurisdicional.
3.3.7.3 Tutela de urgência satisfativa: suspensão imediata dos direitos de exclusividade
A ação de nulidade dos direitos concedidos pelos registro de marca, comporta o pedido de
suspensão imediata da exclusividade na exploração da patente, desenho industrial ou marca. Neste
estudo deter-se-á na análise dos mecanismos capazes de conceder esta suspensão, previstos tanto na
Lei de Propriedade Industrial, quanto no Código de Processo Civil.
Como sustentamos, a ação de nulidade de registro de marca pode ser proposta sempre que
não se observarem no sinal distintivo os pressupostos para a concessão da exclusividade de
exploração, assim como se identificados erros no referido procedimento administrativo. É possível a
suspensão dos efeitos do registro, obstando não somente o direito de exclusividade, como também o
direito de uso da marca.
É precisa a dicção do art. 173 da Lei de Propriedade Industrial, afirmando que é
admissível a suspensão dos efeitos do registro e uso da marca, se atendidos os pressupostos
processuais para o feito. A redação não deste texto não deixa dúvidas acerca do caráter satisfativo
Art. 167. A declaração de nulidade produzirá efeito a partir da data do depósito do pedido Art. 173. A ação de nulidade poderá ser proposta pelo INPI ou por qualquer pessoa com legítimo interesse. Parágrafo único. O juiz poderá, nos autos da ação de nulidade, determinar liminarmente a suspensão dos efeitos do registro e do uso da marca, atendidos os requisitos processuais próprios. Art. 174. Prescreve em 5 (cinco) anos a ação para declarar a nulidade do registro, contados da data da sua concessão. Art. 175. A ação de nulidade do registro será ajuizada no foro da justiça federal e o INPI, quando não for autor, intervirá no feito. § 1º O prazo para resposta do réu titular do registro será de 60 (sessenta) dias. § 2º Transitada em julgado a decisão da ação de nulidade, o INPI publicará anotação, para ciência de terceiros.
103 desta suspensão, assim como possibilita desde logo impedir a exclusividade e o uso dos direitos de
marca – sendo este último um efeito mandamental, não havendo referibilidade ao provimento
desconstitutivo final.
Destaca-se, desde logo, para esta suspensão, também são exigidos os requisitos presentes
mo art. 273 do Código de Processo Civil: (i) verossimilhança e prova inequívoca; (ii) receio de dano
irreparável ou de difícil reparação; (iii) negativa de irreversibilidade do provimento.
Poderá a parte instruir seu pedido com as seguintes meios de provas (documental): a
apostila, demonstrando os limites característicos dos sinais distintivos; documentos comprobatórios do
requerimento, etiquetas, e comprovante do pagamento da retribuição relativa ao depósito; parecer
técnico, somente se for extremamente controvertida a identificação de nulidade, para a identificação de
não atendimento dos pressupostos positivos – distintividade e perceptibilidade – e negativos.
A suspensão dos direitos de uso ocorrerá sempre em que a exploração do sinal distinto
ocasionar confusão, sendo imperioso um ato mandamental de não utilização da marca. Assim entende
Machado, pois “[...] havendo risco de confusão, a tutela deve ser antecipada não apenas para
suspender os efeitos do registro, mas também para impedir o uso da marca pelo réu, que poderá causa
prejuízo ao autor.”203
O receio de dano irreparável ou de difícil reparação ocorrerá sempre que, a permanência
daquela situação de ilicitude tiver aptidão de causar danos, ocorrendo a demora no processo de
nulidade e o concomitante o ilícito deste direito de marca.
Por fim, tratando da não irreversibilidade do provimento antecipatório nas ações de
nulidade de marca, é fato que a suspensão dos efeitos dota-se de reversibilidade, o que permite o
direito retroceder ao estado anterior. Contudo, salvaguardando algumas situações em que haja dano,
poder-se-á estipular caução com o intuito de garantir o ressarcimento a possíveis prejuízos causados
durante a eficácia da antecipação de tutela.
A utilização de tutela de urgência satisfativa nas ações de nulidade de direitos de marca é
questão ainda controvertida, mas que é enfrentada com autoridade por diversos tribunais. O
assentimento da utilização desta técnica para conferir efeito suspensivo aos direitos de exclusividade, e
mesmo na utilização da maraca, pode ser aferido em diversos julgados, como este sob a relatoria do
Juiz Teori Albino Zavaski, da Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da Quarta Região:
PROPRIEDADE INDUSTRIAL. PEDIDO DE REGISTRO DE MARCA. AÇÃO
DE NULIDADE. ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. LEI 9.279, DE 1996. l. O uso da
mesma marca por duas empresas concorrentes acarreta não apenas prejuízos àquela
que seja legítima titular do direito de propriedade industrial, como também aos
consumidores, que ficam sujeitos à natural e inevitável confusão decorrente da
203
MACHADO, José Mauro Decoussau. Aspectos da Antecipação da Tutela na Propriedade Industrial: patentes, desenhos industriais e marcas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 174.
104
identidade de marca para atividades comerciais semelhantes desenvolvidas na
mesma região por pessoas jurídicas distintas. 2. É cabível, em situações dessa
natureza, a outorga de tutela jurisdicional, ainda que provisoriamente, em favor
daquela demandante cuja posição jurídica guardar grau mais elevado de
verossimilhança. Trata-se de providência cabível genericamente no procedimento
comum (CPC, art. 273) e que tem igualmente previsão específica para a proteção do
direito de propriedade industrial, inclusive nas ações de nulidade de registro de
marca (Lei n.9.279, de 1996, art. 173, parágrafo único). 3. No caso, é a autora quem
ostenta posição jurídica mais verossímil. A expressão "via porto" integra a sua
denominação social (Via Porto Veículos Ltda.). Razão pela qual, à primeira vista,
não pode ser registrada como marca por outra pessoa, ainda mais por empresa
concorrente, conforme prevê o artigo 124, V, da Lei 9.279, de 1996.204
Nota-se como foi precisamente indicada a verossimilhança e a prova inequívoca,
o que possibilitou a aplicação do art. 173, parágrafo único, da Lei de Propriedade Industrial,
ensejando a suspensão dos efeitos do registro e do uso da marca em debate, posto que foram
atendidos os requisitos processuais para a concessão da tutela de urgência satisfativa.
CONCLUSÃO
A tutela de urgência satisfativa, desenhada na antecipação de tutela, desempenha
relevante papel na garantia dos direitos de marca e proteção dos mesmos contra ilícitos, como atos de
contrafação, assim como nos casos de nulidades de registro de marca.
Tal técnica, além de encampar a ideia de efetividade da tutela jurisdicional, apresenta
solução às situações de urgência à qual direitos são comumente submetidos e adequação da técnica
processual às exigências do direito material – neste caso os direitos de marca.
Neste estudo, evidenciamos que a tutela de urgência satisfativa, pensada sob a ótica da
antecipação de tutela presente no Código de Processo Civil, detém três importantes elementos: prova
204
TRF4, AG 2000.04.01.102408-2, Terceira Turma, Relator Teori Albino Zavascki, DJ 20/06/2001
105 inequívoca, verossimilhança e fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Tais
elementos, mesmo sendo considerados conceitos vagos ou indeterminados, exigem sua objetivação
para a concessão da tutela de urgência satisfativa.
Estes conceitos vagos, se interpretados adequadamente ao caso concreto, viabilizam a
realização do princípio da efetividade, constituindo que indicamos como: cláusula geral da tytela de
urgência satisfativa.
Sendo assim, no ambiente decisional atinente aos direitos de propriedade industrial
devem ser considerados tanto a perspectiva da atribuição protetiva patrimonial a estes direitos, como
as vicissitudes do trafego jurídico e os limites e possibilidade do exercício do direito.
Tendo em vista a análise concluída, a tutela de urgência satisfativa se constitui
instrumento fundamental de efetivação da tutela jurisdicional e proteção dos direitos de marca.
REFERÊNCIAS
ABBOUD, Georges. Precedente judicial versus jurisprudência dotada de efeito vinculante: a
ineficácia e os equívocos das reformas legislativas na busca de uma cultura de precedentes. In
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Direito Jurisprudencial. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2012.
ALVIM, Arruda. Apontamentos sobre o papel do juiz e dos tribunais na ordem constitucional
vigentes: enfoque comparativo entre jurisprudência e os sistemas de precedentes. In LUCCA,
106
Newton De; MEYER-PFLUG, Samantha Ribeiro; NEVES, Mariana Barboza Baesta. (coord.)
Direito Constitucional Contemporâneo. Homenagem ao Professor Michel Temer. São Paulo:
Quartier Latin, 2012.
_______. A Evolução do Direito e a Tutela de Urgência. In ARMELIN, Donaldo (coord.)
Tutelas de Urgência e Cautelares. São Paulo: Saraiva, 2010.
ARAGÃO, Egas Dirceu Moniz de. Direito à prova. In WAMBIER, Luiz Rodrigues.
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. (organizadores). Coleção Doutrinas Essenciais: Processo
Civil; v. 4. Atividade Probatória. São Paulo: Editora Revista dos Trinais, 2011.
ARMELIN, Donaldo. Tutela jurisdicional diferenciada. Doutrinas Essenciais de Direito
Processual Civil. WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim.São Paulo:
Revistas dos Tribunais, 2011.
_______. Tutela de Urgência. In MARINONI, Luiz Guilherme (org.). O Processo Civil
Contemporâneo. Curitiba: Juruá, 1994.
BAHIA, Alexandre; CÂMARA, Bernardo Ribeiro; SOARES, Carlos Henrique. Curso de
direito processual civil: fundamentação e aplicação. Belo Horizonte: Fórum, 2011.
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A garantia do contraditório na atividade de instrução. In
WAMBIER, Luiz Rodrigues; ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa. (orgs.). Coleção
Doutrinas Essenciais: Processo Civil; v. 4. Atividade Probatória. São Paulo: Editora Revista
dos Trinais, 2011.
_______. A efetividade do processo de conhecimento. Revista de processo, n. 74, p. 126-137.
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, abr.-jun. 1994.
BARBOSA, Denis Borges. O direito constitucional dos dignos distintivos. In SANTOS,
Manoel J. Pereira dos; JABUR, Wilson Pinheiro. (coord.) Propriedade intetelctual: sinais
distintivos e tutela judicial e administrativa. Série GVlaw. São Paulo: Saraiva, 2007.
BARBOSA, Denis Borges; GRAU-KUNTZ, Karin. Ensaios sobre o Direito Imaterial: estudos
dedicados a Newton Silveira. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.
BARROS, Carla Eugenia Caldas. Manual de direito da propriedade intelectual. Aracaju:
Evocati, 2007.
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e Processo. São Paulo: Malheiros, 2011.
_______. Efetividade do Processo e Técnica Processual. 3ª ed. Rio de Janeiro: Malheiros,
2010.
BERMUDES, Sergio. Introdução ao processo civil. 5. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.
107
BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do
direito processual civil. 4ª. Ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010.
_______. Tutela Antecipada. São Paulo: Saraiva, 2004.
CARNEIRO, Athos Gusmão. Da antecipação de tutela. 7. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense,
2009.
CARNELUTTI, Francesco. Instituições do processo civil. trad. Adrián Sotero de Witt Batista.
vol. 1. Campinas: Servanda, 1999.
CASTAGNA, Ricardo Alessandro. Tutela de urgência: análise teórica e dogmática. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.
CASTRO, Carlos Roberto Siqueira. O Devido Processo Legal e os Princípios da
Razoabilidade e da Proporcionalidade. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010.
CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Unificação do regime das tutelas de urgência. In
CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita de Cássia Rocha Conte; MOURÃO, Luiz Eduardo;
GIANNICO, Ana Paula Chiovitti. (coordenadores). Temas atuais das tutelas diferenciadas:
estudos em homenagem ao professor Donaldo Armelin. São Paulo: Saraiva, 2009.
CRUZ E TUCCI, José Rogério. Tempo e processo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
1997.
DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do Processo. Rio de Janeiro: Editora
Malheiros,
DÓRIA, Antônio Sampaio. Direito Constitucional. 4ª. ed. vol. I, tomo I. São Paulo: Max
Limonad 1958.
FREIRE, Alexandre Reis Siqueira Freire. Eficácia dos Direitos Fundamentais nas Relações
entre Particulares. In. RAMOS, Paulo Roberto Barbosa (coord.); RAMOS, Edith Maria
Barbosa (coord.); FREIRE, Alexandre Reis Siqueira (coord.). O Direito no Século XXI:
estudos em homenagem ao Ministro Edson Vidigal. Florianópolis: Editora Obra Jurídica,
2010.
FRÓES, Carlos Henrique de Carvalho. Marca: Aquisição de distintividade e degenerescência.
In SANTOS, Manoel J. Pereira dos; JABUR, Wilson Pinheiro. (coordenadores) Propriedade
intetelctual: sinais distintivos e tutela judicial e administrativa. Série GVlaw. São Paulo:
Saraiva, 2007.
GODINHO, Robson Renaut. Tutela Jurisdicional Diferenciada e Técnica Processual. In.
Temas Atuais da Tutelas Diferenciadas: obra em homenagem ao Professor Donaldo Armelin.
São Paulo: Saraiva, 2010.
108
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Belo Horizonte: Del
Rey, 2012.
LOPES, João Batista. Tutela antecipada no processo civil brasileiro. 4. ed. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2009.
MACHADO, José Mauro Decoussau. Antecipação de Tutela na Propriedade Industrial. In:
ROCHA, Fabiano de Bem. Capítulos de Processo Civil na Propriedade Intelectual. Rio de
Janeiro: Editora Lumen Juris, 2009.
MALACHINI, Edson Ribas. A Fungibilidade das Tutelas Antecipatória e Cautelar (CPC, art.
273, § 7º). In: ARMELIN, Donaldo. (coord.) Tutelas de urgência e Cautelares: estudos em
homenagem a Ovídio A. Baptista da Silva. São Paulo: Editora Saraiva, 2010.
MARINONI, Luiz Guilherme. Abuso do direito de defesa e parte incontroversa da demanda.
2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.
_______. Direito Processual Civil: Soluções Práticas de Direito. vol. 1. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2011.
_______. ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil, vol. 4: Processo Cautelar. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.
_______. Técnica Processual e Tutela dos Direitos, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2010.
_______. Antecipação da tutela. 11. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
_______. Tutela inibitória: individual e coletiva. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2006.
MEDINA, José Miguel Garcia; ARAÚJO, Fabio Caldas de; GAJARDONI, Fernando da
Fonseca. Procedimentos cautelares e especiais. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010.
_______. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Processo Civil Moderno: parte geral e processo
de conhecimento. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet.
Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009.
MITIDIERO, Daniel. Antecipação da tutela: da tutela cautelar à técnica antecipatória. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.
MÜLLER, Friedrich. O Novo Paradigma do Direito. In LUCCA, Newton De; MEYER-
PFLUG, Samantha Ribeiro; NEVES, Mariana Barboza Baesta. (coord.) Direito
109
Constitucional Contemporâneo. Homenagem ao Professor Michel Temer. São Paulo: Quartier
Latin, 2012.
NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo na Constituição Federal: processo civil,
penal e administrativo. 9ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
NUNES, Dierle. Precedentes, padronização decisória preventiva e coletivização. In
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Direito Jurisprudencial. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2012.
PEREIRA, Luiz Fernando C.. Tutela Jurisdicional da Propriedade Industrial: aspectos
processuais da Lei 9.279/1996. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006.
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcante. Tratado de Direito Privado, vol. 7. Parte
Especial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1983.
SILVEIRA, Newton. Propriedade intelectual: propriedade industrial, direito de autor,
software, cultivares, nome empresarial. 4. ed. Barueri: Manole, 2011.
SOUZA, Marcelo Junqueira Inglez de. Tutelas de Urgência na Propriedade Industrial: as
Medidas Cautelares. In, ROCHA, Fabiano de Bem. Capítulos de Processo Civil na
Propriedade Intelectual. Rio de Janeiro, Editora Lumen Juris, 2009.
TALAMINI, Eduardo. Tutela relativa aos deveres de fazer e de não fazer. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2001.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Celeridade e efetividade da prestação jurisdicional. In
WAMBIER, Luiz Rodrigues. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Princípios e temas gerais do
processo civil. Coleção doutrinas essenciais: processo civil; v. 1. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2011.
_______. O óbivio que não se vê: a nova forma do princípio da fungibilidade. In Princípios e
temas gerais do processo civil (Coleção doutrinas essenciais: processo civil; v. 1) Luiz
Rodrigues Wambier, Teresa Arruda Alvim Wambier (organizadores). São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2011.
WAMBIER, Luiz Rodrigues. TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil:
processo cautelar e procedimetos especiais. vol. 3. 13. ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2014.
_______. Uma proposta em torno do conceito de jurisprudência dominante. In Revista de
Processo, vol. 100. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000.
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Cada caso comporta uma única solução? In MENDES,
Aluisio Gonçalves de Castro; MARINONI, Luiz Guilherme; WAMBIER, Teresa Arruda
Alvim (coords.) São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014.
110
_______. Precedentes e evolução do direito. In WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Direito
Jurisprudencial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.
_______. Estabilidade e adaptabilidade como objetivos do direito: civil law e common law.
RePro 172. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
_______. Recurso especial, recurso extraordinário e ação rescisória. 2. ed. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2008.
_______. Da liberdade do juiz na concessão de liminares e a tutela antecipatória. In:
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. (Org.). Aspectos Polêmicos da Antecipação de Tutela.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.
YARSHELL, Flávio Luiz. Antecipação da prova sem requisito da urgência e direito
autônomo à prova. São Paulo: Editora Malheiros, 2009.
_______. Tutela jurisdicional. 2. Ed. São Paulo: DPJ Editora, 2006.
ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da Tutela. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
top related